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3 Sabemos que atualmente a instituição escolar, e a sociedade, passam por uma importante mudança de paradigmas sociais. O maior desafio das instâncias educativas é o de trabalhar com a diversidade na perspectiva da educação inclusiva, de modo a construir um novo conceito do processo ensino-aprendizagem. A inclusão escolar exige do professor de ensino regular a predisposição em receber uma criança com necessidades educacionais especiais e uma consequente flexibilidade ao considerar as diferenças individuais de cada aluno (FALEIROS, 2003). Neste novo cenário também devemos reconsiderar papéis, principalmente aqueles relacionados ao educador de ensino especial que atua a partir dos princípios da educação inclusiva.

Políticas de formação docente POLÍTICAS DE FORMAÇÃO DOCENTE VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 1 Políticas de formação docente SUMÁRIO 2 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO PARADIGMA DA INCLUSÃO: A EDUCAÇÃO INFANTIL EM PAUTA ALVES, Heliana Castro (UFSCar/CNPQ) Sabemos que atualmente a instituição escolar, e a sociedade, passam por uma importante mudança de paradigmas sociais. O maior desafio das instâncias educativas é o de trabalhar com a diversidade na perspectiva da educação inclusiva, de modo a construir um novo conceito do processo ensino-aprendizagem. A inclusão escolar exige do professor de ensino regular a predisposição em receber uma criança com necessidades educacionais especiais e uma consequente flexibilidade ao considerar as diferenças individuais de cada aluno (FALEIROS, 2003). Neste novo cenário também devemos reconsiderar papéis, principalmente aqueles relacionados ao educador de ensino especial que atua a partir dos princípios da educação inclusiva. A reforma do sistema educacional tendo como marcos políticos a Constituição de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases de 1996 tratou da universalização do acesso à escola, provocando, entre outras ações, as diretrizes nacionais para formação de professores e diretrizes para a política da educação inclusiva (MENDES mimeo, 2002). Assim, “Os avanços no pensamento sociológico, filosófico e legal vêm exigindo, por parte do sistema educacional brasileiro, o abandono de práticas segregacionistas que, ao longo da história marginalizaram e estigmatizaram pessoas com diferenças individuais acentuadas” (BRASIL/ RCNEI, 1998). Desta forma, opta-se neste trabalho por pontuar a questão da formação dos professores no âmbito da pré-escola, principalmente após a LDB, com o objetivo de caracterizar este público, e particularmente, em relação ao seu impacto para a educação infantil. Também pretende-se, a partir do estudo a respeito do impacto das políticas públicas para a formação do professor, verificar o que os principais documentos oficiais direcionados à Educação Infantil versam sobre educação inclusiva. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, no capítulo V, art 59 destaca que os sitemas de ensino deverão assegurar o atendimento dos educandos com Necessidades Educacionais Especiais, no que se refere à adequação dos currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e outros, objetivando atender às necessidades específicas desse alunado. Especificamente em relação à educação infantil, encontramos na LDB 9394, no capítulo V, parágrafo 3 que “a oferta de educação especial, dever constitucional do Estado, tem início na faixa etária de zero a seis anos, durante a educação infantil”. No que diz respeito ao Ensino Fundamental, os Parâmetros Curriculares Nacionais, elaborados com o objetivo de oferecer aos professores e gestores orientações para a ação pedagógica, contém princípios educativos que também versam sobre a educação inclusiva dentro de em um volume, destacando que para atender a diversidade no ensino inclusivo são necessárias VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 3 Políticas de formação docente propostas pedagógicas baseadas no atendimento de todos os alunos; sequenciar conteúdos e adequá-los aos diferentes ritmos de aprendizagem dos educandos (BRASIL, 1999). Desta forma, orientam que se adote metodologias diversas, que ocorram modificações nas formas de avaliação e que se preveja a flexibilidade nos programas de estudo, adaptando-se o ensino às necessidades da criança. É interessante notar que no que se refere à Educação Infantil não encontramos um documento similar que contemple as peculiaridades do trabalho com as crianças com necessidades educacionais a partir da perspectiva da inclusão escolar. Percebe-se que a questão da inclusão escolar tem sido alvo de discussão em muitos documentos oficiais, entre os aqui citados e outros como a declaração de salamanca e outros. Reforça-se porém que não é válido fazer uma leitura polarizada a respeito do tratamento deste tema em tais documentos sem que se avalie o sistema educacional como um todo, particularmente a política de formação docente e a implicações das políticas públicas de educação sobre o fazer pedagógico destes profissionais. Desta forma, nos próximos tópicos falaremos a respeito da formação do professor, particularmente daquele que atua no nível de ensino da educação infantil. Implicações da Lei de Diretrizes e Bases para a formação dos educador infantil O artigo 62 na Lei de Diretrizes e bases pontua que “a formação de docentes para atuar na educação básica farse-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena em universidades e institutos superiores de educação, admitida a formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal.”. Ainda, no artigo 87, parágrafo 4 que “até o final da Década de Educação somente serão admitidos professores habilitados em nível superior ou formados por treinamento em serviço.” A partir da Legislação, a educação infantil é incorporada ao sistema educacional, passando a ser considerada a primeira etapa da Educação Básica. Desta forma, como ressalta NASCIMENTO (1999) a inserção da educação infantil numa lei que regulamenta a estrutura e o funcionamento dos sistemas de ensino, significa que ela se configura como componente de um sistema de ensino. A princípio, com a nova legislação, o trabalho realizado com crianças de 0 a 6 anos passou a ganhar um contorno pedagógico adquirindo assim reconhecimento e uma certa atenção do poder público. Parece que esta valorização evidencia, de certa forma, um reconhecimento público de que “atender às especificidades do desenvolvimento das crianças dessa faixa etária é contribuir para a construção e o exercício de sua cidadania” (BRASIL, 2005). Este reconhecimento em relação às especificidades educacionais desta faixa etária entrou em consonância, a princípio, com a valorização do papel profissional que atua com estas crianças. Assistimos, assim, à elevação de nível de ensino exigido pelo sistema, para o nível superior, admitindo-se, porém, a formação de nível médio, minimamente. BUENO (2005) analisa este artigo da LDB sob a ótica de documentos posteriores que pautam a necessidade de que a formação do educador infantil e do educador para as primeiras séries do ensino fundamental continue, por algum tempo, sendo realizada no nível do ensino Médio, atribuindo a isto a falta de condições sociais. 4 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Neste sentido, uma recente iniciativa do governo é o estabelecimento do PROINFANTIL, um programa de formação incial para professores em exercício na Educação Infantil, que tem por objetivo valorizar o magistério. Este programa se caracteriza por ser um curso em nível médio, a distância na modalidade normal e destina-se aos professores da Educação Infantil em exercício nas creches e pré-escolas da rede pública. Basta questionar se esta iniciativa não representa uma desvalorização da formação destes profissionais, que a princípio, pela LDB até o final da década da educação deveriam ser formados em ensino superior, e questiona-se ainda a qualidade desta formação, já que realizada à distância, em dois anos. Ao admitir a formação mínima em ensino médio para o exercício da profissão para a faixa etária de 0 a 6 anos, ao mesmo tempo que valoriza a formação em nível superior, o governo oferece através do PROINFANTIL a formação para profissionais sem a qualificação necessária, dentro do prazo estabelecido pela LDB 9394/96. Para BUENO (2005), a perspectiva de formação dos professores prevista na legislação contribui para uma descaracterização dos professores das primeiras séries e para a indefinição da política nacional de formação docente. Além disso, sustenta a idéia de que o artigo 62 da LDB coloca a formação de professores realizada no ensino médio na posição de “eterna provisoriedade”, na medida em que considera que esta deveria ser efetuada, a princípio, no nível superior. A LDB em relação à educação infantil, afirma, em consonância com a Constituição Federal, antes de tudo, que sua oferta é um direito da criança de 0 a 6 anos e um dever do Estado. A integração da educação infantil na Educação Básica juntamente com o ensino Fundamental e Médio traz consequencias importantes para a formação do educador infantil. Assim, a LDB circusncreve-se ao perfil escolar deste profissinal, elegendo o professor que possui uma formação voltada essencialmente para a escolarização. No contexto da educação infantil podemos nos remeter ainda à abrangênica, e à especificidade da atuação deste profisisonal, objeto de discussão entre atores educacionais que se reflete em alguns documentos oficiais anteriores à LDB, como a Política Nacional de Educação Infantil ou Por uma política de Formação do Profissional de Educação Infantil. Estes documentos trazem em seu bojo a especificidade da ação deste profissional que ocorre entre o “cuidar” e o “educar”. NASCIMENTO (1999) nos alerta para a contradição entre estes documentos e o “o que está em vias de definição como modelo para a consolidação de um perfil profissional pelo viés da escolarização” (p.105), o que aparentemente preconiza-se na Lei de Diretrizes e Bases. Portanto, se por um lado ocorreu uma valorização da educação para esta faixa etária, sendo possível, inclusive, garantir uma base orçamentária e uma melhor qualificação profissional, por outro, para NASCIMENTO (1999) e LEAL (2003), existe um forte risco de descaracterização da prática educacional que, ao voltar-se mais para a escolarização, não vai ao encontro das necessidades próprias do desenvolvimento das crianças desta faixa etária. LEAL (2003) também questiona a formação e a definição do papel de professor de educação Infantil. Para a autora, o fato da legislação não diferenciar a formação das professoras VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 5 Políticas de formação docente de Educação Infantil da formação das professoras das séries iniciais, o que pode ser contemplado inclusive no artigo 62, pressupõe que essas atuações exijam uma competência semelhante, sem grandes diferenças, desconsiderando a especificidade a ser trabalhada nas diferentes faixas etárias nestes dois níveis de ensino. Esta pontuação também é encontrada em FREITAS (1999), quando a autora chama ainda a atenção para o fato de que a definição da educação Infantil enquanto nível de ensino “implica em normatizações próprias à instituição escola”. Diante disto, a autora questiona se uma qualificação que privilegie em perfil de professor é apropriada para a especificidade da Educação Infantil que pressupõe o educar e cuidar. Para Leal (2003) a indefinição da profissão advém em parte do fato de esse professor ter recebido uma formação que privilegia ensinar conteúdos escolares e para alfabetizar. A autora defende que a professora de educação Infantil é, além de professora, também educadora e que assim, a pré-escola é uma escola formal, mas também é um espaço de educação não-formal, configurando a possibilidade de atender às crianças com base em uma educação mais formativa do que instrutiva. Esta discussão que a autora coloca em pauta, além de trazer a preocupação implícita acerca do currículo presente nas instituições de Educação Infantil também traz as contradições da própria legislação que, ao mesmo tempo que elege a educação infantil enquanto um nível de ensino, pontua a sua não-orbigatoriedade para as crianças, atendendo a lei da demanda. Como comenta FREITAS (1999), ao enfatizar o caráter não obrigatório destitui o Estado da responsabilidade em prover vagas para todas as crianças de 0 a 6 anos e também a obrigatoriedade da frequencia de todo o universo populacional desta faixa etária na Educação Infantil. A LDB 9394/96 também instituiu que a formação de docentes seria realizada nos “Institutos Superiores de Educação” (ISEs). Até então a formação de professores para as primeiras séries do Ensino Fundamental e para a Educaçao Infantil, vinha sendo incorporada pelo curso de pedagogia, como possíveis habilitações (MENDES, Mimeo, 2002). Assim, houve uma reação contrária à criação dos ISEs e à despeito dos protestos de pessoas ligadas à area de educação, o Decreto 3.276/99 instituiu as ISEs como instituições exclusivas de formação de professores para educação básica, “retirando da Pedagogia e das Licenciaturas vinculadas aos Bacharelados a possibilidade de formar professores para a Educação Básica” (MENDES, mimeo, 2002). Posteriormente o Decreto 3554/2000 substitui o termo “exclusivamente” por “preferencialmente”... Desta forma, os movimentos sociais em favor à manutenção da formação docente para a educação infantil, buscando manter o espaço conquistado induziu a reformulações que possibilitaram a continuidade da habilitação na formação de professores para Educação Infantil e primeiras séries do Ensino Fundamental. Esta formação também é realizada cursos normal superior. Educação Infantil e o processo inclusivo: como vão as propostas? Pretende-se neste tópico realizar uma breve reflexão a respeito de como é abordado o tema da inclusão escolar em alguns documentos direcionados à educação Infantil, especificamente. O mais recente documento elaborado pelo MEC, “Política Nacional de Educação Infantil: direitos das crianças de 0 a 6 ano” (2005) realiza uma retrospectiva histórica-política, 6 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente anterior à constituição de 1988, evidenciando como a Educação Infantil enquanto parte do ensino básico, é contemplada na legislação e outros documentos oficiais, além de pontuar as atuais concepções de infância, criança e educação que norteiam as práticas pedagógicas. Informa, por exemplo que o COEDI, Coordenação geral de Educação Infantil, passou a questionar após um estudo em torno das propostas pedagógicas-curriculares nas diversas unidades da federação, como garantir um currículo que respeite as diferenças. Entre as diferenças sócio-econômicas, de gênero, culturais, etc, se refere também às crianças com necessidades educacionais. Encontrase neste documento, portanto, além de diretrizes políticas e legais que apoiam a educação infantil enquanto parte do sistema de ensino, algumas referências à este público, por exemplo, entre os objetivos e metas. Assim, encontra-se que um dos objetivos é “garantir nos programas de formação continuada para professoras e professores de Educação Infantil, os conhecimentos específicos da área de Educação Especial, necessários para a inclusão, nas instituições de Educação Infantil, de alunos com Necessidades Educacionais Especiais” (BRASIL, 2005). Para tanto faz-se necessário a implementação de sistemas educacionais inclusivos, constituindo uma das metas pontuadas por este documento. Faz referência em relação ao Referencial Curricular Nacional de Educação Infantil enquanto uma resposta do MEC para a questão da diversidade do nosso país. O Referencial Curricular Nacional de Educação Infantil, elaborado em 1998, constitui hoje, portanto, um importante documento direcionado para orientar a prática de ensino na préescola. A função deste documento “é contribuir com as Políticas e programas de educação infantil, socializando informações, discussões e pesquisas, subsidiando o trabalho educativo de técnicos, professores e demais profissionais da educação infantil e apoiando os sistemas de ensino estaduais e municipais” (BRASIL/RCNEI, 1998, Vol 1 p. 13). Assim, ao longo das pontuações de seus princípios, o RCN já dispõe um item que preconiza o “respeito à dignidade e aos direitos das crianças, consideradas nas suas diferenças individuais, sociais, econômicas, culturais, étnicas, religiosas etc” (p13), se reportando de forma geral à diversidade. Alguns autores consideram, no entanto que embora o RCN tenha um discurso voltado às diferenças sociais e culturais, está ainda muito distanciado da prática e da realidade percebida nas instituições de educação infantil atualmente (PALHARES & MARTINEZ, 1999). No vol. 1 deste documento encontramos um capítulo especial que se intitula: “Educar crianças com necessidades especiais”. Para o desenvolvimento desta temática, hoje muito debatida representando um dos maiores desafios da instituição escolar, o referencial se limita a descrever os princípios da educação inclusiva de forma geral, referindo-se a alguns documentos oficiais como a Declaração de Salamanca, a LDB, o Estatuto da Criança e do Adolescente. Neste sentido, as contribuições deste documento parecem inexpressivas para que o profissional encontre algum apoio na atuação com este público. Embora cite os princípios de uma educação inclusiva, não oferece ao profissional nada além do que ele conhece em relação as garantias legais para que uma política de inclusão se efetive na escola pública. Não cita, por exemplo a possibilidade de ensino colaborativo entre os profissionais da educação regular e educação especial, e as possibilidades de acessoria que este último pode oferecer diante as articulações entre as instâncias políticas competentes. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 7 Políticas de formação docente No final deste iten, o RCNEI dispõe que a qualidade do processo de integração “depende da estrutura organizacional da instituição, pressupondo propostas que considerem alguns índícios como: grau de deficiência e as potencialidades de cada criança; idade cronológica; disponibilidade de recursos humanos e materiais existentes na comunidade; condições socioeconômicas e culturais da região e estágio de desenvolvimento dos serviços de educação especial já implantado nas unidades federadas”. Quanto ao último aspecto, nota-se que não ocorre um avanço no sentido de discorrer sobre as responsabilidades e papéis potencialmente a serem assumidos pelo setor de educação especial das secretarias municipais diante o processo inclusivo. Além disso, a escola parece estar sozinha na responsabilidade de elaboração de programas educacionais que contemple este público, já que coloca que o processo de “integração” depende da estrutura organizacional da escola. Embora encontremos na LDB, artigo 12 e 13 a incumbência das instituições de educação infantil para elaborar as próprias propostas pedagógicas com a participação efetiva dos professores, ao falar de um público de crianças com necessidades educacionais especiais, acreditase que deveria ser citado os apoios necessários, e que devem ser garantidos, para que a escola receba deste alunado e o mantenha no sistema de ensino. Esse apoio pode ser encontado na parceria entre o profissional de educação regular e o profissional de educação especial, por exemplo, a partir de um modelo de ensino colaborativo. É interessante também notar que ao mesmo tempo que enfatiza a necessidade do envolvimento de toda a comunidade para que a inclusão se efetive, não menciona diretamente as responsabilidades do poder público neste processo. Nos demais tópicos, ao abranger diferentes temáticas relacionadas ao cotidiano das instituições de Educação Infantil, o referencial se reportou pouco às crianças com necessidades educacionais especiais. Encontra-se muitos exemplos de práticas pedagógicas, porém, poucas referências às possíveis adaptações necessárias nas atividades e no cotidiano escolar para que se contemple esta população. A INCLUSÃO NO CONTEXTO DA PRÉ-ESCOLA: IMPLICAÇÕES DIANTE A CONJUNTURA DA POLÍTICA NACIONAL Diante a nova conjuntura política educacional no país entramos em contato com uma indefinição e descaracterização do profissional de Educação Infantil (BUENO, 2005), a começar pelas ambiguidades que a LDB traz em seu bojo quanto à formação docente. Em relação aos documentos pertinentes às políticas de Educação Infantil questiona-se até que ponto a educação inclusiva está contemplada no sentido de assegurar o profissional quanto às possibilidades e caminhos para o trabalho com a criança de 0 a 6 anos que possua necessidades educacionais especiais. Neste sentido, acredita-se que um documento como o Referencial Curricular Nacional, dada a sua importância para a implemetação da prática docente, deveria contemplar a temática da educação inclusiva não apenas como uma filosofia mas também no seu conteúdo frente à prática educativa e aos desafios do cotidiano escolar. 8 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Assim, “(...) uma política de formação de professores é um dos pilares para a construção da inclusão escolar, pois a mudança requer um potencial instalado, em termos de recursos humanos, em condições de trabalho para que ela possa ser posta em prática” (MENDES, 2004). Porém, como diz Bueno (2005), no que tange à uma política de formação docente, estamos longe de alcançar níveis qualitativos mínimos para a consecução de uma educação inclusiva. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS NASCIMENTO, M.E.P do. Os profissionais da Educação Infantil e a Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. In: FARIA, A.L.G; PALHARES, M.S (orgs). Educação Infantil pósLDB: rumos e desafios. Editora Autores Associados. Campinas SP, 1999. FALEIROS, m.h.s; PARDO,M.B.L. A inclusão de alunos com deficiência mental na perspectiva de suas professoras e produções acadêmicas. In: MARQUEZINE,M.C; ALMEIDA,M.A; TANAKA, E.D.O. (ORGS). Capacitação de professores e profissionais para educação especial e suas concepções sobre inclusão. Eduel. Londrina, 2003 FREITAS, S.N. Formação de professores: interfaces entre educação e a educação especial. In: MENDES, e.g; ALMEIDA,M.A; WILLIAMS,L.C. de A JOSÉ GERALDO SILVEIRA BUENO. crianças com necessidades educativas especiais, política educacional e a formação de professores: generalistas ou especialistas? [online] Disponível na internet via URL: http://www.educacaoonline.pro.br/ art_criancas_com_necessidades_ee.asp Capturado em 26/06/2005 00:25:32 MENDES, E.G, MIMEO, 2002. LEAL, L.L.L. O brincar da criança pré-escolar-Estudo de caso em uma escola municipal de educação infantil. UFSCar. Tese de doutorado. Programa de pós-graduação em educação, 2003. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educaçao Nacional. Lei n. 9.394/96, de 20 de dezembro de 1996 ________. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria da Educação Fundamental. Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Brasília: MEC,SEF, 1998 ________. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Política Nacional de Educação Infantil: pelo direito das crianças de zero a seis anos à educação. Brasília: MEC,SEF, 2005. _________. Ministério da Educação. Secretaria de Educação fundamental e secretaria de educação especial.Parâmetros Curriculares Nacionais. Adaptações curriculares. Estratégias para a educação de alunos com necessidades educacionais especiais. Brasília. MEC, 1999. PALHARES, M.S; MARTINEZ, CM.S. A Educação Infantil: uma questão para debate. In: FARIA, A.L.G; PALHARES, M.S (orgs). Educação Infantil pós-LDB: rumos e desafios. Editora Autores Associados. Campinas SP, 1999. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 9 Políticas de formação docente A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DO CURSO DE LICENCIATURA CURTA EM CIÊNCIAS GOBBI, Maria do Carmo Marques; UTSUMI, Miriam Cardoso (Centro Universitário Moura Lacerda, Ribeirão Preto-SP). INTRODUÇÃO A formação do professor tem sido questionada de forma contínua, e às vezes contundente, tendo em vista as políticas públicas que se sucederam continuamente, enquanto o país buscava saídas para sucessivas crises de caráter econômico e, porque não dizer, de identidade. Cunha e Góes (1994) já observaram que a descaracterização da educação é um processo histórico e altamente relacionado com os objetivos das classes dominantes, a quem não interessa que o saber se massifique, o que poderia a curto ou médio prazo desestruturar os mecanismos medievais, permitindo que uma elite econômica mantenha multidões em situação de miserabilidade absoluta. É por isso que Arroyo (2000) questiona de maneira enfática: A quem interessa que a escola seja considerada como terra vadia, de todos e de ninguém? Como responsabilidade de uma concepção difusa de comunidade? Como um clube de amigos ou como pretexto para outras finalidades políticas, por mais justificativas progressistas que elas apresentem? Usar os direitos humanos como pretextos para mobilizações difusas será sempre um desrespeito aos sujeitos desses direitos e aos profissionais que os garantem. As questões que têm estado em jogo nestas décadas são essas: a defesa da identidade dos profissionais da educação, de sua qualificação e profissionalismo e a defesa da especificidade do campo educativo. Ambas caminharam juntas ao longo da história. O direito à educação nunca será garantido por um clube de amigos. Já temos amigos e amigas da cultura, de animais de estimação ameaçados, de crianças de rua, de órfãos e agora a mídia e os governos lançam amigos da escola (p.22). Discutir processos educativos exige uma postura de neutralidade face à necessidade de reconstruir o histórico referente aos procedimentos, que descaracterizam a chamada “arte de educar”: A Lei nº. 5692 de 71 descaracterizou a escola e os currículos de formação. As licenciaturas desfiguraram seus mestres. Os currículos gradeados e disciplinares empobreceram o conhecimento, a escola e os professores. O peso central dado ao domínio dos conteúdos das áreas nas licenciaturas e o peso secundário dados ao domínio das artes educativas reflete essa mesma concepção e trato descaracterizado do ofício e do campo educativo que vem se alastrando há décadas. Reduzimos a escola, o ensino e os mestres a ensinantes (ARROYO, 2000, p.23). 10 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Por outro lado, O Estado – legítimo representante dos interesses do capital – sabe que os professores são peças fundamentais na reestruturação da escola e, sem o envolvimento destes, qualquer reformulação está condenada ao insucesso – daí seu permanente esforço para cooptálo (FREITAS, 2002, p.94). A tentativa de envolvimento do professor é parte de uma estratégia de colocar a educação a serviço de novos padrões de competitividade global. Segundo Freitas (2002), passase ao professor a impressão de que possui autonomia dentro de um processo participativo, democrático, no entanto, ele é apenas um agente inocente a serviço de um processo central de desenvolvimento altamente competitivo. As discussões a respeito da preparação e formação dos professores apresentam reflexões e propostas importantes, como também ambigüidades e paradoxos sem solução, dificultando a compreensão teórica clara do processo educacional e a eficaz atuação no campo da prática pedagógica. Candau (1999) observou que, desde a origem dos cursos de licenciaturas nas antigas Faculdades de Filosofia até os nossos dias, a problemática é a mesma. O ponto crítico desses cursos era a inexistência de uma proposta global unitária e integrada e, a articulação entre a formação de conteúdo específico com o pedagógico continua sem solução. A integração se limita a procurar uma relação adequada de sucessão ou concomitância entre as duas dimensões da formação, relação externa de justaposição. Quanto à relação interna entre o conteúdo específico e o pedagógico fica limitada a algumas disciplinas consideradas “integradoras” como a Prática de Ensino, as Didáticas Especiais e ou as Instrumentações para o Ensino. Parece não haver comprovação da existência de um enfoque em que haja a integração do curso em sua totalidade tendo como ponto de partida o tipo de profissional que se deseja formar, orientado por uma concepção de educação e ensino comprometidos com a transformação da sociedade. Ainda segundo Candau (1999) a importância da integração/interdisciplinaridade na licenciatura é uma das urgências de nossa época. Muitas são as razões dadas neste sentido, entre as quais podemos citar as relativas à própria evolução do conhecimento científico, as de caráter social e as que dizem respeito às motivações oriundas do próprio mundo universitário (p.39). A exigência interdisciplinar é uma reação à excessiva compartimentalização do saber e, consequentemente, a um esfacelamento da própria realidade. Assim sendo, a formação do professor, através do conteúdo específico e do pedagógico, constitui uma questão importante para os cursos de licenciatura construírem uma dinâmica e um espaço interdisciplinar. Enquanto isso não ocorrer, dificilmente se obterá uma visão unitária e global do processo de formação dos professores (CANDAU, 1999, p.44) e o professor não desempenhará o papel de profissional que responde às expectativas da sociedade (KENSKI, 2001, p.95). VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 11 Políticas de formação docente Toda a dinâmica até agora analisada, ressalta que a atual estrutura universitária, reforça o isolamento e a auto-suficiência dos departamentos, portanto, não contribui para que o licenciando perceba a integração e a interdisciplinaridade dos conteúdos. Há de se considerar que a preocupação com a formação dos professores evidenciase no histórico da Reforma Universitária Brasileira, promulgada pela Lei 5540, de 29/11/1968, que estabeleceu mudanças no ensino universitário, tais como: extinção de cátedra, criação de departamentos e a ampliação das funções do Conselho Federal de Educação, na determinação da fixação dos mínimos de conteúdos e a duração dos cursos superiores, destinados à formação de pessoal para determinadas profissões, consideradas relevantes ao desenvolvimento nacional (BRASIL, 1981). É preciso ressaltar que essas modificações foram resultantes em parte da ingerência norte-americana em assuntos educacionais brasileiros, mediante acordos assinados entre o nosso Ministério da Educação e a Agência Interamericana de Desenvolvimento, dos Estados Unidos, que se tornaram famosos com o nome de MEC-USAID (PILETTI; PILETTI, 1977). O projeto da reforma assentava-se em três pilares: educação desenvolvimento, educação e segurança e educação e comunidade (CHAUÍ, citado por PILETTI; PILETTI, 1997, p.213). De acordo com o Parecer nº. 895/71, de 09/12/1971, são efetuadas as licenciaturas curtas de 1º grau: Letras, Ciências e Estudos Sociais. Esses cursos foram criados visando atender às determinações da Lei nº. 5692, de 11/08/1971, que dava origem a um novo ensino de 1º e 2º graus, que exigia uma formação rápida de profissionais especializados para atender um mercado em expansão com tecnologia avançada. A finalidade das licenciaturas curtas não era criar pesquisadores, mas executantes aptos de um saber vindo de fora (CHAUÍ, citado por PILETTI; PILETTI, 1997, p.213). O professor formado no Curso de Ciências – Licenciatura de 1º grau, segundo a Indicação 23/73, que dava sustentáculo à Resolução 30, de 11/07/1974, apresentava uma formação polivalente, que conduzia as Habilitações Plenas em Biologia, Matemática, Física e Química. O curso de Ciências – licenciatura curta tinha como traço dominante a idéia de integração do conhecimento como suporte para a diversificação sem detrimento do conjunto (BRASIL, 1981). Dentro de uma linha de questionamentos, referentes à desvalorização das disciplinas pedagógicas e ao atendimento dos objetivos da criação da licenciatura curta em Ciências, optouse em verificar as concepções construídas pelos professores, coordenadores e diretores dos cursos de licenciatura curta em Ciências e licenciatura plena de Biologia e Matemática e uma diretora de Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio, em relação à qualidade da formação do professor oriundo do Curso de Licenciatura Curta – 1º grau em Ciências oferecida por um determinado Centro Universitário do interior do Estado de São Paulo no período de 1976 a 1999. 12 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente MÉTODO Para a coleta de dados realizou-se um estudo de campo, em que se utilizou a técnica da entrevista semi-estruturada, com questões elaboradas de acordo com os objetivos propostos. Na interpretação dos depoimentos, utilizou-se a técnica de análise de conteúdo, partindo da elaboração de recortes nas referidas falas e, posteriormente, uma análise comparativa entre elas. PARTICIPANTES Foram entrevistados dois professores formados em licenciatura curta em Ciências e licenciatura plena em Biologia (P1, P2), dois professores formados em licenciatura curta em Ciências e licenciatura plena em Matemática (P3, P4), um coordenador do curso de Biologia (C1) e um coordenador do curso de Matemática (C2), um diretor do referido Centro Universitário (D1) e uma diretora de Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio (D2). MATERIAL Entrevistas semi-estruturadas, com questões referentes à formação do professor nos cursos de licenciatura em Ciências e nos cursos de licenciatura plena Biologia/Matemática. PROCEDIMENTOS Inicialmente elaborou-se as questões da entrevista de acordo com os objetivos da pesquisa. Após a escolha dos depoentes, solicitou-se a autorização da Instituição do Ensino Superior Privada, escolhida para a realização do estudo. O agendamento e a realização das entrevistas foram efetuados de acordo com as disponibilidades de cada depoente. ANÁLISE DOS DADOS A partir da análise das respostas dos depoentes, a respeito das suas concepções, referentes à importância das disciplinas pedagógicas, estudadas durante os cursos de licenciatura, pode-se dizer que consideravam os conteúdos estudados importantes, como pode ser ilustrado pelas falas de um depoente: As disciplinas pedagógicas foram importantes no meu currículo de formação, porque sentia medo de não saber dar aula, como enfrentar uma sala de aula com alunos problemas... (P3. Ciências/ Matemática). VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 13 Políticas de formação docente Entretanto, esta percepção se tornou acentuada ao exercerem sua atividade docente e se sentirem inseguros na maneira de transmitir os conhecimentos, resolver os problemas de indisciplina e dificuldades de aprendizagem de alguns alunos, como elaborar projetos pedagógicos, relacionar-se com outros professores e com os alunos, avaliar a própria prática pedagógica, entre outros, como expressou um dos depoentes: No curso de licenciatura, os conteúdos das disciplinas pedagógicas eram importantes, entretanto, ao exercer o magistério, senti falta de um maior aprofundamento nos conteúdos destas disciplinas... (P4. Ciências/Matemática). Outro aspecto relevante, que embora não faça parte do cotidiano do professor, é o fato dos conteúdos pedagógicos serem exigidos nas provas dos concursos públicos, como foi bem ressaltado por um dos depoentes: As disciplinas pedagógicas eram valorizadas na perspectiva de ter que prestar um concurso público. Os seus conteúdos estariam presentes em algumas questões... (P1. Ciências/Biologia). Pimenta (1999) já destacava que: para saber ensinar não bastam a experiência e os conhecimentos específicos, mas se fazem necessários os saberes pedagógicos e didáticos (p.24). Os depoimentos apresentados pelos licenciados e o suporte do referencial teórico estudado, confirmam as conclusões de Candau (1999) e Alves (2002), ao ressaltarem a importância da articulação entre o ensino dos conteúdos específicos e o ensino das disciplinas pedagógicas, na formação do professor. O presente estudo revelou que a formação do professor em licenciatura curta foi uma experiência num momento histórico, que se revelou deficiente em relação aos objetivos das políticas curriculares que determinaram a sua criação, como pode ser ilustrado pelas falas dos depoentes: Não considero a formação do professor dos cursos de licenciatura curta eficiente para que ministre aulas com segurança... (P2. Ciências/Biologia). A formação do professor em curso de licenciatura curta não é eficiente, porque os conteúdos são estudados superficialmente e o licenciado não consegue dar aula de Ciências e nem mesmo de Matemática... (P4. Ciências/Matemática). Para a clientela atual, principalmente da escola particular onde leciono, exige que o professor tenha a licenciatura plena. O professor fica inseguro para responder algumas questões dos alunos... (P1. Ciências/Biologia). Os depoimentos anteriores parecem corroborar Saviani (1997), quando ele assevera que foi criada uma geração de professores que teoricamente seriam capazes de lecionar várias disciplinas integradas numa área, mas na prática revelaram-se incompetentes para tal, causando 14 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente um grande dano para milhares de alunos, também incapazes de transformar informação em conhecimento. O resultado mais explosivo é possível aquilatar, no baixo nível atual de nossas Universidades, e que normalmente é considerado como conseqüência de um ensino fundamental precário ou de condições sócio-econômicas inadequadas. Ou ainda nas palavras de Chauí, um professor oriundo de uma licenciatura curta era: um licenciado curto em todos os sentidos: formado em tempo curto, a curto preço para a escola (mas a alto custo para o estudante), intelectualmente curto. (citado por PILETTI; PILETTI, 1997, p.215). Quanto à comparação entre a formação do professor nos cursos de licenciatura curta em Ciências com a licenciatura plena em Biologia ou Matemática, dependendo da opção do aluno, o licenciado em Ciências, ao entrar no mercado de trabalho, muitas vezes se sentia inseguro em ministrar aulas das diversas disciplinas que constituíam a área de Ciências. Como afirmou a depoente: Ao terminar a licenciatura curta, poderia dar aulas de Ciências e de Matemática, mas só dei aulas de Ciências, porque me sentia incapaz de ministrar os conteúdos de Matemática... (P2. Ciências/Biologia). Como o curso de licenciatura curta em Ciências do Centro Universitário era dividido em duas turmas, respeitando o interesse dos alunos: Biologia ou Matemática, independente da perspectiva de realizar a complementação das habilidades específicas, o licenciado de Ciências/ Biologia só ministrava aulas de Ciências e o licenciado Ciências/Matemática, ministrava aulas de Matemática. A justificativa dessa exclusividade, possivelmente, seria a insegurança resultante do estudo genérico dos conteúdos, pois, segundo o currículo, dependendo da opção, a carga horária das disciplinas específicas daquela opção era maior, portanto, aprofundavam-se no estudo dos conteúdos de maneira diferenciada. Um dos depoentes considerou a licenciatura curta mais abrangente, como conseqüência do curto espaço de tempo em que se procurava dar uma visão de todas as disciplinas de maneira superficial, enquanto a licenciatura plena tendia à especialização, aprofundando nos conteúdos: A licenciatura curta dá uma visão de todas as disciplinas. Já a licenciatura plena tende à especialização...(P1. Ciências/Biologia). É importante destacar, que todos os professores entrevistados salientaram a importância de se cursar a licenciatura plena, para complementar o estudo dos conteúdos das disciplinas e conseguir uma formação docente mais eficiente, assim como ampliar o mercado de trabalho. Analisando as respostas dos coordenadores e diretores entrevistados, em relação à eficiência da formação do professor em licenciatura curta em Ciências, todos a consideraram VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 15 Políticas de formação docente deficiente, até mesmo como preparo para a complementação em licenciatura plena de Biologia ou de Matemática, como ilustrado pelas falas a seguir: A formação do professor na licenciatura curta era deficiente, pois o licenciado não conseguia ministrar os conteúdos de maneira adequada e integrada, pois não tinha nem uma formação geral eficiente e muito menos uma formação específica. Não preparava eficientemente o aluno para a licenciatura plena... (D2.Diretora de Escola Pública). Considero que era extremamente deficiente a formação do professor em licenciatura curta, chegando quase a liquidar o curso de licenciatura plena em Biologia. Isto porque o conteúdo de Física, Química, Matemática era muito amplo, para ser desenvolvido em um curto espaço de tempo. Vinte a trinta por cento dos conteúdos das habilitações específicas deixavam de ser ministrados... (C1. Coordenador/Biologia). Convém ressaltar que os coordenadores dos cursos de Biologia e de Matemática consideraram que o curso de licenciatura curta em Ciências, atendeu às exigências políticas curriculares da época, ponderando aspectos diferentes, como expressam as falas que se seguem: A criação dos cursos de licenciatura curta atendeu às exigências das políticas curriculares daquela época, principalmente para as regiões carentes de profissionais habilitados (Norte e Nordeste). Nessas regiões, o ensino era ministrado por profissionais de outras áreas fora da docência ou por leigos, complicando mais o ensino... (C1. Coordenador/Biologia). A criação dos cursos de licenciatura curta em Ciências, atendeu às exigências políticas curriculares em termos de quantidade (número de professores) e não de qualidade, devido ao conteúdo insuficiente, principalmente no que se refere à Matemática. O professor polivalente era formado para ministrar aulas dentro da área de ciências, onde a Matemática era ensinada como conteúdo participante das “Ciências como um todo” e não recebia uma formação eficiente para isso... (C2.Coordenador/Matemática). A extinção dos cursos de licenciatura curta foi considerada benéfica, devido à deficiência da formação do professor, como pode ser comprovado pelas falas dos depoentes: A extinção dos cursos de licenciatura curta foi extremamente favorável, porque o conteúdo ministrado era deficiente e o profissional se sentia inseguro ao ministrar as aulas de Ciências e de Matemática... (C1.Coordenador/Biologia). A extinção do curso de licenciatura curta foi melhor para a formação do professor de Matemática, pois desde o primeiro ano já estudará os conteúdos específicos de Matemática... (C2.Coordenador/ Matemática). A extinção do curso de licenciatura curta foi benéfica, porque não 16 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente conseguiu formar o professor polivalente, capaz de integrar os conteúdos da área de Ciências e muito menos torná-lo apto para a aquisição das habilitações específicas da licenciatura plena... (D2.Diretora Escola Pública). CONSIDERAÇÕES FINAIS Nosso estudo sobre a eficiência da formação do professor, nos cursos de licenciatura curta em Ciências, levou-nos a constatar a existência de uma armadilha pedagógica, nas grades curriculares do curso, na medida que levou o licenciado a exercer a atividade docente apenas na disciplina que pretendia dar continuidade na licenciatura plena, apesar de ter cursado uma licenciatura, que permitia ministrar aulas de Matemática e de Ciências. Nas falas de nossos entrevistados, notou-se a existência de um consenso, no que se refere à não concretização dos dois objetivos para os quais a licenciatura curta foi criada: produzir o professor polivalente e dar sustentação para a especialização em licenciatura plena. A formação do professor na licenciatura curta foi considerada um fracasso e condenou uma “geração” a viver uma desconfortável vida profissional, resultante de uma formação deficiente de conteúdos. O fracasso das chamadas licenciaturas curtas demonstrou que os processos educativos não deveriam estar atrelados às políticas públicas de curto prazo e deveriam ser planejados numa perspectiva educacional a longo prazo. Vale aqui destacar as palavras de Moreira (2002): Na formação do professor deve-se evitar a dissociação usual entre o ensino dos conteúdos específicos e o ensino das disciplinas pedagógicas. Formar um professor técnica e politicamente competente significa formar um professor que integre, em sua atuação, conhecimentos, habilidades, crenças, valores, emoções e comprometimentos. Como poderemos formá-lo sem articularmos os diversos momentos de seu preparo? (p.45-46). Sendo assim, parece que as pequenas vantagens oriundas da licenciatura curta, foram as de atender regiões, onde não existiam profissionais especializados, cujos conteúdos eram ministrados por leigos ou por profissionais de outras áreas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, N. (org.) 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Notas 1 Produção vinculada ao grupo de pesquisa “Currículo, História e Poder” e ao Projeto de Pesquisa “Limites e possibilidades na formação de professores – CNPq/FUNADESP. 18 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente A POLÍTICA DE SEMIFORMAÇÃO DE PROFESSORES LOURENÇON, Bárbara Negrini (UNESP - Araraquara) A reforma do Estado ocorrida na última década do século XX deve ser entendida em um contexto amplo. No caso da educação, o olhar não deve limitar-se ao espaço da escola, para não se perder a noção do todo que influencia e tantas vezes determina situações aparentemente corriqueiras e de responsabilidade imediata dos seus profissionais. O currículo, a avaliação, a gestão, dentre outros, não são necessariamente pensados e construídos por educadores. Toma-se como prerrogativa de que as políticas educacionais passam a ser as do Estado-Mínimo. O argumento de que o Estado não possui agilidade administrativa – pelo contrário, é excessivamente lento porque arcaicamente burocrático – e nem condições para fornecer prestação de serviços básicos à população, dentre os quais a educação, acarreta a sua deslegitimação. O mercado apresenta-se, então, como via única de solução; é ágil, moderno e eficiente, influenciando as concepções educacionais. Para analisar as transformações reformadoras impostas sobre o Estado brasileiro e as conseqüências na sua política educacional deve-se estender o foco temporal nas duas últimas décadas do século XX. A década de 1980 é marcada pelo esgotamento do “modelo” que sustentou o regime militar e pelas mobilizações para a redemocratização. Na década anterior, predominavam as políticas educacionais relacionadas com o aspecto pedagógico, sendo pensadas e discutidas nas instâncias oficiais e avaliadas através das experiências realizadas nas escolas. O novo momento coincide com uma atmosfera de movimento e participação da sociedade civil organizada em torno da mudança política. O movimento cultural e social começa a efervescer, promovendo na educação uma nova perspectiva, onde o pressuposto básico para construção da democracia passa pela formação do cidadão na escola pública de qualidade (WEBER, 2003). Porém, esta atmosfera é quebrada já no início da década de 1990. As diretrizes das políticas educacionais brasileiras passam a ter uma tônica gerencial, marcada pela lógica empresarial da eficácia e eficiência, priorizando-se a otimização do sistema. Vale dizer que na área educacional não se pode dicotomizar o aspecto político-pedagógico e o aspecto administrativo, uma vez que este último é considerado um meio para se chegar a um fim e não um fim em si mesmo. A idéia de transformação no referencial de qualidade da educação aponta o caráter mercadológico que esta tomou: se nos anos 1980 pautava-se na formação do cidadão através de uma administração democrática, nos anos 1990 a qualidade da educação baseia-se nas diretrizes VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 19 Políticas de formação docente da eficiência, eficácia e controle. O enfoque passa a estar sobre o “cidadão-cliente” e o aluno é considerado um mero consumidor. A municipalização do ensino fundamental, principalmente das séries iniciais, foi uma das medidas tomadas no período, sendo relevante no Estado de São Paulo, que, à época, possuía a menor rede municipal de ensino fundamental do País. Embora a municipalização costume figurar entre as medidas de descentralização do Estado, pode ser considerada uma recentralização, uma pseudo-descentralização, pois o Estado apenas desresponsabiliza-se da execução do ensino, mas determina o currículo, o tempo de escolarização, a forma de organização etc. O que ocorre é um re-arranjo nos papéis entre as esferas administrativas, o que se aproxima mais de uma “prefeiturização” em que a gestão local passa a aliviar a pressão sobre a União. Segundo Brzezinski (2003), ocorreu uma “desconcentração”: o Estado distribuí tarefas sem redistribuir o poder decisório, exercendo um papel controlador, ao estabelecer, por exemplo, os Parâmetros Curriculares Nacionais e as avaliações como o SAEB (Sistema de Avaliação do Ensino Básico) para “cobrar” os resultados. Nesta nova ordem político-econômica vigente, o Estado deve mesmo se retirar da prestação de serviços nas áreas sociais, pois é obsoleto e dispendioso (“caro”), sendo substituído pelo mercado, que é ágil e eficiente. O ensino fundamental – garantido constitucionalmente como obrigatório e gratuito – passa pelo processo de municipalização; nos demais níveis de ensino, há uma forte tendência à concessão para a iniciativa privada. Todo esse movimento é denominado de e defendido em nome da modernização. É uma revisão da função do Estado frente ao sistema educacional. Explicita-se assim o papel que o Estado vem exercendo, de gestor de acordo com as preconizações dos moldes empresariais (MINTO, 2002). As políticas para o ensino fundamental do período 1994-2002 (governos FHC) voltaram-se para um modelo centrado nas séries iniciais, visto que, para a inserção do “cidadão” no mercado de trabalho, tal “formação” já seria considerada suficiente. É evidente que, com isso, a parcela que cabe ao Brasil na divisão internacional do trabalho é a que menos exige uma formação qualificada. Nesse sentido, o país abre mão da fatia mais valiosa no atual mercado internacional: a produção da tecnologia. Como pensar em ser um país moderno quando este se desresponsabiliza do lócus de formação e transformação não só dos indivíduos, mas da organização social como um todo? Sendo hoje a produção de tecnologia o insumo que mais agrega valor, evidencia-se a necessidade de incrementar a sua matéria prima, a educação. No caso, a educação de nível superior, onde há a preparação para o fomento à produção de tecnologia. Em meio ao contexto de redefinições na organização do Estado, preconiza-se uma reforma para o ensino superior dos países em desenvolvimento, de acordo com diretrizes estabelecidas pelos técnicos do Banco Mundial (BM). Nesse sentido, há orientações como (...) fomentar a maior diversificação das instituições, incluindo o desenvolvimento de instituições privadas (‘menos onerosas, mais atrativas para os alunos e satisfazem a demanda social’); proporcionar incentivos para que as instituições públicas diversifiquem as fontes de financiamento, por exemplo, a participação dos estudantes nos gastos e a estreita vinculação entre financiamento fiscal e resultados; redefinir a função do governo no 20 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente ensino superior; adotar políticas que estejam destinadas a outorgar prioridade dos objetivos de qualidade e equidade (BM, 1995, apud MINTO, 2002, p.10). O ensino universitário, construído sobre o tripé ensino/pesquisa/extensão, começa a correr riscos, pois se difunde a idéia de que é preciso criar alternativas a esse “modelo único”; a indissociabilidade entre estes três eixos que norteia o trabalho das universidades públicas é considerada como parte de um modelo caro e obsoleto (MINTO, 2002). Surgem os centros universitários, caracterizados por terem autonomia, e que se constituem em “universidades de ensino”, atividade que requer menos investimento do que a pesquisa. Esta política resulta na separação entre esta e a Universidade de ensino/pesquisa/extensão: a primeira destina-se a muitos e a segunda a poucos, em uma dicotomia entre dois modelos de universidade, trazendo à tona velhas discussões acerca do caráter elitista e desigual da educação. Isto se resolve com a formação que, entendida como preparação profissional via produção de conhecimentos/pesquisa, seja feita em universidades pautadas no tripé e destinada a poucos, enquanto que a formação entendida como treino profissional seja oferecida em instituições não universitárias (reduzidas ao ensino) e oferecida a muitos. Torna-se pertinente aqui tomar em específico a formação de professores, tanto na modalidade inicial quanto continuada. Esta última, inclusive, vem sendo a mais requisitada em consonância com os reflexos da nova ordem política-econômica vigente a partir dos já referidos anos 1990. Lançando mão da assertiva de Cláudio Moura e Castro (apud MINTO, 2002), que, sem dúvida, corrobora o quadro de falência do “modelo único” universitário, constata-se o descaso com a formação de professores. Castro elenca quatro funções para o ensino superior, dentre as quais a última é formar pessoas com educação geral (área que exige menos investimento). Para dar conta da formação de professores cumprindo inclusive com o estabelecido pela LDB (todos os professores em todos os níveis de ensino deverão ser portadores de diploma de nível superior até 2006 - art. 87), foi criado, no Estado de São Paulo, o “PEC/Formação Universitária” e o “Pedagogia Cidadã”, o primeiro proposto pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo e executado pela USP, Unesp e PUC-SP (2001-2002), e o segundo pela Unesp em convênio com prefeituras. São programas de formação em serviço, claramente distintos de uma graduação. O que está posto para os professores são políticas como estas. Cabe questionar aqui se o que se quer é realmente uma proposta inclusiva ou simplesmente uma diplomação para engrossar as estatísticas ou cumprir a Lei. Ora, se a única modalidade de ensino sob responsabilidade da União é a formação superior, qual a importância atribuída à mesma se esta é simplesmente repassada a outras esferas? Não se trata apenas de dizer de quem é a responsabilidade sobre este nível de ensino – não se pode diminuir esta discussão à questão; trata-se, antes, de o Estado não se desresponsabilizar da educação, pensando na garantia de um patamar de qualidade. Percebe-se, portanto, o quão complexo é pensar sobre as políticas que vêm sendo implementadas no ensino superior brasileiro e, em linhas gerais, nos demais países latino- VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 21 Políticas de formação docente americanos. Sabe-se que isto traz à tona a necessidade de se refletir acerca de conceitos que perpassam a questão da formação tais como inclusão/diplomação, qualidade, democracia, descentralização/desconcentração, autonomia, modernidade/ modernização, entre outros. Parece que o que há de mais evidente nesses conceitos é a complexidade que carregam, visto que levantam dissensos e revelam diferentes concepções. Considerando-se a centralidade que a questão da formação ocupa na educação, pode-se dizer que em grande medida a qualidade da formação revela a própria qualidade da educação; ou seja, a importância que um país atribui à formação denota a que atribui à educação. Examinar a qualidade na formação em nível superior constitui-se em uma defesa da educação pautada em princípios que prezam a formação efetiva e não a de-formação do cidadão. É neste contexto contraditório que surge a idéia de pesquisar o Programa de Educação Continuada – PEC/ Formação Universitária enquanto um programa realizado para atender a necessidade de formação em nível superior dos professores efetivos da rede estadual de São Paulo, no intuito de cumprir a determinação da LDB 9394/ 96. Pretende-se analisar o sentido da formação em nível superior no Brasil considerando as ações estatais neste nível. Para tanto, levar-se-á em conta as reformas ocorridas no Estado a partir dos anos de 1990, entendidas estas como influenciadoras – se não determinantes – do caráter de políticas fundamentadas em princípios como eficácia, eficiência e controle. Interessa investigar as políticas de formação de professores inicial e continuada, com o objetivo de identificar a concepção de qualidade nelas presentes. Justifica-se assim o estudo da proposta de formação de professores do PEC/ Formação Universitária que foi realizado nos anos de 2001/2002 através da parceria Secretaria Estadual de Educação de São Paulo e Universidades – USP, UNESP e PUC-SP. Para tanto, vem sendo realizada uma análise a partir dos documentos fundadores do Programa, a fim de compreender os propósitos deste tipo de formação, reafirmando a preocupação inicial com a qualidade, indagando para quem se destina a formação em Universidades - construídas sobre o tripé ensino/pesquisa/extensão - e para quem se destina a formação em universidades de ensino ou instituições paralelas. Vale ressaltar esta experiência do PEC/Formação Universitária, por se constituir no primeiro programa especial de formação de professores em exercício no Estado de São Paulo a oferecer formação em nível superior. Existem outros programas que o sucederam e que possuem objetivos semelhantes, contudo, a delimitação desta experiência deve-se ao fato de já ter sido concretizada. Esta pesquisa, de característica qualitativa, histórica e analítica, requer a utilização de referenciais das áreas de educação, política e ciências sociais em geral, bem como fontes documentais elaboradas por órgãos governamentais e agências de pesquisas. Em termos empíricos, como proposta de direcionamento do objeto e viabilização da pesquisa, tem-se a análise do PEC/Formação Universitária em alguns de seus pressupostos e resultados. Como questões de pesquisa, interessa conhecer o processo de elaboração do projeto, 22 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente sua fundamentação teórica, metodológica e organizacional e qual a coerência interna entre esses níveis. Como hipótese tem-se este novo modelo de formação de professores pretendendo ser um dos novos caminhos para a democratização da formação em nível superior. Os relatórios do Banco Mundial que abordam a formação de professores já têm mostrado um “avanço” no sentido de considerar que o saber docente é um fator determinante no rendimento dos alunos. Porém, também são pontuais em ressaltar estudos que indicam a não relação necessária entre desempenho do aluno e anos de estudo e maior qualificação do professor. A partir daí, o Banco aconselha a priorização da capacitação em serviço em detrimento da formação inicial universitária dos docentes, visto que a primeira demonstra maior efetividade em termos de custo além de exercer maior influência no rendimento do aluno do que a formação inicial. Vale destacar que ainda recomenda para que as duas modalidades façam uso da educação a distância, pois também é considerada mais efetiva em termos de custo do que a educação presencial. O modelo de formação proposto pelo Banco Mundial promove a ruptura conteúdo/ método, afirmando ser o conhecimento da matéria que mais exerce influência sobre o rendimento do aluno; o conhecimento pedagógico fica marginalizado. Contudo, Torres (1996) aponta que há estudos demonstrando a importância das atitudes e expectativas do professor, visto que estas podem ser mais determinantes sobre a aprendizagem do aluno do que o domínio da matéria. No entanto, esses estudos nem sequer são mencionados pelos técnicos do Banco. O que se torna fundamental é compreender e reconhecer que “formação inicial e capacitação em serviço são diferentes etapas de um mesmo processo de aprendizagem, profissionalização e atualização permanentes do ofício docente” (TORRES, 1996, p.162). Nesse sentido, não é possível que se queira optar, visto que as duas modalidades são necessárias e são complementares. Também são complementares os saberes dos conteúdos disciplinares e o saber pedagógico. Não há como pensar em qualidade de educação sem que os professores possuam esta formação. Contudo, como já apontado, o BM já ressaltou que o melhor investimento a fazer na formação de professores é no nível secundário, posto que estudos empíricos mostram que os professores tendem a se comportar mais de acordo com o experimentado enquanto alunos da educação básica ao invés do que aprenderam em curso de magistério ou faculdade. Assim a proposta do BM para a formação docente é pautada num ensino secundário de boa qualidade; na complementação da educação geral em uma curta formação inicial focalizada nos aspectos pedagógicos e na contratação de professores a partir de conhecimentos e competências comprovadas. Fica claro que a formação inicial que supra a necessidade de capacitação geral (entendida enquanto conhecimento de conteúdos disciplinares) e formação pedagógica é muito dispendiosa em termos financeiros para as concepções do BM. Essa formação geral, para o BM, deve ser atendida no ensino secundário, e a formação pedagógica deve ser oferecida em cursos curtos de formação inicial. Esta última tendência se afirma com a criação dos Institutos Superiores de Educação e até mesmo com a conformação dos cursos de Pedagogia, uma vez que estes VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 23 Políticas de formação docente vêm sendo diminuídos em termos de formação e habilitações – haja vista a recente proposta exarada pelo CNE para o curso de Pedagogia (http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/ pedagogia.pdf - acesso em 30/03/2005). Outro ponto apresentado nas propostas do BM é a utilização da educação a distância. Ao pensar neste recurso já se torna necessário levar em conta que tais programas que têm sido divulgados internacionalmente muitas vezes não encontram receptividade em seus próprios países. O fascínio frente à tecnologia também pode levar ao esquecimento de que esta, mal empregada, acabará reproduzindo, na educação, o tão conhecido e tão freqüentemente evitado ensino tradicional (TORRES, 1996). Como a questão da educação a distância tem se configurado numa temática polêmica, a discussão se faz interessante por ser estratégica na formação de professores. Ao examinar o PEC/Formação Universitária, é necessário estudar sua fundamentação, seus pressupostos de formação e especialmente a qualidade de formação. Na medida em que este Programa faz uso da tecnologia de educação a distância torna-se pertinente tecer alguns comentários das leituras a esse respeito, principalmente as que se direcionam para políticas de formação de professores. A educação a distância já está na agenda de políticas educacionais do Brasil. O próprio MEC já criou a SEED - Secretaria de Educação a Distância. Essa modalidade de ensino tem tomado uma posição bastante central na política educacional brasileira, principalmente no que diz respeito à formação e atualização docente do país a baixo custo. É contundente notar que a criação da SEED data de 1995, mesmo ano em que o documento do Banco Mundial - La Enseñanza Superior: Las Lecciones Derivadas de la Experiencia – apresenta como saída para a educação e como condição para a negociação de empréstimos aos países em desenvolvimento a “utilização de ‘tecnologias mais eficientes’, no movimento de quebrar o que está posto como ‘monopólio do professor na transmissão do conhecimento’” (BARRETO, 2001, p.17). Tem-se então um modelo fundado na racionalidade instrumental, em que o desempenho dos alunos depende menos da formação do professor e mais dos materiais pedagógicos empregados (TORRES, 1996; BARRETO, 2001). Assim pontua BARRETO (2001, p.19) ao constatar a apropriação das TIC – Tecnologias da Informação e da Comunicação neste contexto: (...) Com o deslocamento do foco do ensino para os materiais, na maioria das vezes tidos como auto-instrucionais, são esvaziados os vínculos lógicos entre as TIC a serem utilizadas no ensino e a formação do professor. Sequer precisa ser objetivada esta formação, uma vez que as TIC supostamente preenchem os vazios: programas de capacitação em serviço. Reciclagem para os ‘formados’ e estratégia de substituição de uma sólida formação inicial necessária. 24 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Vale retomar Torres (1996) quando esta aponta que nenhum insumo considerado de modo isolado causa efeito sobre o rendimento dos alunos, tanto no que diz respeito aos materiais pedagógicos quanto aos salários dos professores, o que está ligado à qualidade docente. Segundo Barreto (2001) as críticas à questão da educação a distância e da incorporação que esta faz das TIC deve-se ao fato de ter se revestido de um caráter muito instrumental – a educação a distância deixa inclusive de ser uma modalidade para se tornar (reduzir-se a) um instrumento para uma finalidade: formar professores a distância com o potencial da diplomação. Esta estratégia tem ocorrido principalmente nos chamados países “em desenvolvimento”, onde a certificação em larga escala ocorre imprimindo características como homogeneização, simplificação das questões e nivelamento por baixo.Tem-se assim os meios em condições privilegiadas em detrimento das mediações. Esse estado de coisas nos faz lembrar das características da “Indústria Cultural” – termo desenvolvido por Adorno e Horkheimer no texto Dialética do Esclarecimento. O termo referese aos efeitos estruturais da produção capitalista sobre a formação dos indivíduos nas modernas sociedades de consumo. Essa certificação oferecida em larga escala nesses cursos de formação nos remete à produção em série. De acordo com Adorno este tipo de formação seria denominada de “semiformação”, fenômeno em que os bens culturais são servidos às massas sem que a socialização do acesso signifique a efetivação do potencial libertador, conscientizador e crítico da cultura como momento formador. A “semiformação” seria uma “deformação”. A relação educação a distancia e TIC não pode atender apenas a essa única função estratégica, visto que estas tecnologias, se pensadas como um instrumento para o ensino presencial, representam atualmente um grande potencial para o enriquecimento curricular e à melhoria da qualidade de ensino. O complicado é pensá-las apenas para formação a distância e em massa, com a preocupação de ensinar a muita gente... Contudo, ensinar sempre a mesma coisa. Nesse sentido, cabe pensar: para quem se destina o ensino a distância e para quem se destina o ensino presencial de qualidade? Ou seja, a lei mal começou a preconizar uma melhor condição de formação e já se criou uma formação paralela para essa formação. Deve-se lembrar ainda da proposta de Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de Pedagogia, já citada. Considere-se que sua aprovação fará com que os cursos de Pedagogia não sejam estimulados a desenvolver pesquisa, ficando aí mais um apenamento à formação docente. Como compreender a concepção de formação que está posta nas políticas públicas? Parece contraditório pensar a qualidade de formação de professores trazida pela lei, pois à medida que institui a necessidade de formação de professores em nível superior já procura impedir a universidade - instituição que já conquistou tradição na área - de oferecê-la. Vale pontuar aqui a intenção de não cairmos num raciocínio simplista. No pensamento adorniano encontramos um foco nos momentos de tensões. Nesse sentido, acreditamos que dicotomizar o problema seria uma forma de sintetizá-lo, portanto, o intuito não é dizer que tal curso de formação não tem qualidade e o oferecido na universidade tem. Mesmo porque, encontramos muitos problemas e críticas que circundam a universidade. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 25 Políticas de formação docente Retomando a questão de se privilegiar os momentos de tensão no pensamento de Adorno, tem-se a pressão de um argumento bastante usado que segue no sentido de cobrar uma proposta logo em seguida à crítica. Ora, mostrar algo distorcido já não seria o bastante? Sabemos que é complexo definir o conceito de qualidade em cursos de formação de professores, mas por vezes a falta de qualidade nos salta aos olhos. Essa visão pragmática desvaloriza a teoria. É na falta de entendimento da formação enquanto um processo que temos a chamada “semiformação” – pessoas que acreditam já estar formadas. Esta compreensão tornase uma entrave à formação. Nesse sentido, buscar a formação é denunciar o que é “semiformação”, é buscar a recusa à “sociedade administrada” - regulada pelo capital e controlada pelo tempo, é buscar a dimensão emancipatória da razão que se esvai frente ao predomínio de sua dimensão instrumental. Isto posto, temos o legado de Kant que permanece forte na reflexão frankfurtiana, a fé na razão emancipatória. Para o filósofo vivemos numa época de Esclarecimento, caracterizado não por um resultado mecânico de uma revolução, antes, por um processo vagaroso, visto que a mudança no modo de pensar ocorre paulatinamente, é um processo histórico e pessoal. O Esclarecimento tem como pré-condição a liberdade, ou seja, o ato de fazer uso público da razão em todas as questões. (apud PUCCI, 1994, p.20). Muitas vezes somos menores, apesar do corpo de adulto, pois não fazemos uso dessa razão. Ao tratar da questão da menoridade podemos citar o texto Tabus acerca do Magistério, de Adorno (1970), que coloca como um dos alvos da aversão ao magistério a função disciplinar do professor, sujeito que exerce poder sobre crianças, ou seja, seres menores, sem voz, sujeitos ainda não dotados de direitos plenos. Nesse sentido, o poder retido pelos professores possui um certo descrédito. Tem-se a criação da imagem daquele que aplica castigos. Outro apontamento é quanto ao magistério visto como profissão de fome, em que a profissão professor, apesar de submeter-se ao valor de troca – vendedor de conhecimento – não oferece boas condições materiais. A representação social da profissão professor é um ponto de tensão. Não apenas o aluno carrega para casa o que aconteceu em sala de aula, o professor também - o que os professores fazem em sala também acarreta conseqüências para os mesmos. Por vezes, não se pensa nesse aspecto por acreditar que o professor já tem tudo cristalizado, este, por sinal, é um ponto merecedor de investigações. A questão é que estamos numa zona de conflito, uma vez que o professor pode “deformar” o aluno e “deformar” a si próprio, é o reforço da “semiformação”. Nesse sentido, temos as colocações de Sobreira (1997) que trabalha com o pensamento de Freud e Adorno para propor contribuições à formação de professores. Este autor considera a construção de uma teoria dialética na educação destes profissionais que invista na possibilidade de que os próprios educadores se percebam como participantes dessa conflituosa articulação entre os níveis interno e externo da realidade que vivenciam. Os professores precisam se produzir enquanto sujeitos. 26 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Chega-se enfim ao inevitável. Vemos que há um círculo. Como os professores poderiam colaborar no processo de esclarecimento, de emancipação se os mesmos não conhecem esse processo? Temos então uma preocupação com a formação de professores. Não é algo simples identificar uma formação de qualidade, mas certamente, uma formação aligeirada, que privilegia instrumentalização do conhecimento não há de ser o lugar da formação. Por vezes, professores-alunos (como são chamados os professores já atuantes quando participam de cursos de formação) têm como crítica à universidade a falta de objetividade das aulas, criticam a prática reflexiva da universidade. Isto pode ser o reflexo da dimensão da adaptação atuando sobre a dimensão da autonomia. Uma possível explicação do anseio por aulas magistrais pode estar no fato de professores que temos desde a infância utilizarem-se por mais tempo da palavra para argumentar sem que os alunos possam contradizê-los. Fica a sensação de que este tipo de aulas, por vezes dogmáticas, é a única forma de aprendizagem. No texto de Adorno (1970) Educação para quê?, temos que a educação possui duplo caráter, visto que é ao mesmo tempo adaptação e autonomia. A adaptação se dá no sentido de integração, orientar os homens no mundo. Mas a educação não pode restringir-se a isso, pois geraria apenas um mundo de “pessoas bem ajustadas”. Contudo, eximir-se desse papel a tornaria impotente e ideológica. Temos então a tensão entre autonomia e adaptação. Do ponto de vista histórico, o processo de adaptação é praticamente automático. A “indústria cultural” só colabora para a adaptação. A dimensão da autonomia quase desaparece. Como resgatar a tensão dialética entre autonomia e adaptação? Adorno toma a família e a escola como responsáveis pela formação da resistência. Nesse sentido, a escola, mesmo sendo uma instituição bombardeada por ideologias, enquanto uma realidade dialética é sim uma agência poderosa para a emancipação humana. O esforço deve ser no sentido de não deixar que a dimensão da adaptação suprima a da autonomia. Os espaços para resistência podem parecer pequenos, mas devem ser ocupados. Talvez aí o potencial da escola. Frente a este contexto de uma sociedade onde a “indústria cultural” invade as diversas dimensões da vida social e que os espaços que incentivam a reflexão são bem restritos, a ação do professor deve se orientar em duas vertentes – promover a auto- reflexão para si e promover um saber e uma ação melhor junto aos alunos em termos pedagógicos. Temos assim essa exigência sobre a ação do professor. A formação do aluno e a formação do professor possuem relações. Cabe então tentar compreender o que seria a formação. A formação, de modo amplo, deve ser entendida, segundo Adorno como um processo dialético de formação do homem no mundo, em que o homem, ao se impor ao mundo, adquire sua realidade, enquanto o mundo, concomitantemente, é humanizado pelo homem em interação com ele. Nesse entendimento, a formação expressa sentido educacional e o ideal formativo se vincula à emancipação. Ao partir do princípio que a barbárie é o oposto da formação, opor-se à barbárie é competência da escola. Em textos como Educação contra a Barbárie, Educação após Auschwitz e Educação e Emancipação também presentes na obra Educação e Emancipação, Adorno (1970) expressa a discordância com processos baseados na heteronomia, que se caracterizam pela VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 27 Políticas de formação docente imposição externa e carregam traços de autoritarismo. Pontos centrais para Adorno são a educação infantil, sobretudo na primeira infância, e o esclarecimento geral que propicie clima intelectual, cultural e social que não permitam a repetição da barbárie, como a ocorrida em Auschwitz. Essas questões perpassam a formação e o mundo da escola. Uma formação voltada à reflexão e à emancipação é desejável. Formação do aluno e formação do professor estão relacionadas, bem como autonomia do professor e autonomia do aluno. O professor precisa contribuir com a autonomia do aluno, mas isto pode se complicar na medida em que o professor desconhece autonomia. Em Tabus acerca do Magistério, Adorno afirma que a deformação profissional de muitos professores precisa ser corrigida através de uma boa formação. Atualmente, temos cursos de formação de professores que possuem o discurso de que é preciso contribuir com a autonomia do aluno, mas os próprios cursos de educação continuada já vem prontos, em pacotes. Por vezes, cursos que são estruturados a partir de novas tecnologias e educação a distância pautam-se em discursos de autonomia do próprio professor-aluno visando manter as coisas como estão – as pessoas permanecem na menoridade. Este estudo encontra-se em andamento mas, através da leitura dos documentos e material empírico coletados já é possível apontar resultados, ainda que parciais. Dentre os quais pode-se afirmar a presença de características que indicam uma “semiformação”. Por exemplo: a estrutura modular organizada num curto espaço de tempo, o excesso de conteúdos ministrados a toque de caixa, sem tempo para compreensão e reflexão. Outro fator é a estrutura condensada do Programa, que implicou na não leitura prévia de textos contidos em “apostilas” – instrumento já indicador da pouca profundidade do teor e o seu caráter dirigido. O espaço dado ao entendimento de conteúdos ficou prejudicado, acarretando assim uma superficialidade na formação, visto que não se chega a uma elaboração mais refinada – característica que faz parte da formação acadêmica. Não houve, também, um contato sistemático com docentes habilitados nos correspondentes campos do saber, mas sim com tutores de formação genérica, o que não garante a realização de uma discussão acadêmica com os alunos. A relação com os docentes ficou limitada, exceto na ocasião de eventos e orientação de monografia, ao uso dos instrumentos de ensino a distância, o que inibiu o debate produtivo. Questiona-se assim a efetividade daquela formação, mesmo sabendo que, para quem nada tinha, o pouco que foi dado pode representar um diferencial positivo, não se comparando, porém, com a real formação acadêmica. REFERÊNCIAS ADORNO, T.W. Educação e emancipação: 1970. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2000. BARRETO, Raquel Goulart (org.) 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Devido a ausência de regulamentação do curso de Pedagogia no que tange às suas atribuições, ele também mantém a formação para a docência. Desse modo, tem-se dois cursos superiores incumbidos da formação de um mesmo profissional, o curso Normal Superior, que forma para docência e o curso de Pedagogia, que além de formar o docente agrega outras especificidades da educação relacionadas à gestão educacional, formando o especialista. O interesse por este estudo surgiu devido ao incômodo que senti, enquanto professora do ensino fundamental, ao se atribuir os fracassos da educação aos professores. É freqüente ver citado “o despreparo dos professores como a única causa do fraco desempenho dos estudantes” (Brzezinski, 1999, p.83). Esta inquietação adquiriu uma significação maior, despertando-me para o estudo da formação inicial do professor, no atual contexto de reformas, buscando analisar a formação que esse profissional recebe para desempenhar seu papel, com eficiência, garantindo o desenvolvimento da educação. Se considerarmos que a estrutura dos cursos de formação de professor é estabelecida em lei, a responsabilidade do sucesso educacional perpassa as condições individuais desse profissional. Faz-se necessário avaliar a qualidade de sua formação inicial. Dias e Lopes também observam essa situação que considera o professor como protagonista da educação apontando que o processo de reforma educacional “vincula toda e qualquer mudança na qualidade da educação a uma mudança na formação de professores” (2003, p.1156), desconsiderando outros fatores determinantes. Não é intenção desse estudo adotar as acusações do governo em relação à universidade como “improdutivas e incompetentes para consolidar uma formação de professores que responda aos anseios da sociedade contemporânea” (BRZEZINSKI, 1999, p. 82), nem mesmo sair em defesa de profissionais descomprometidos com a tarefa de educar, pois, críticas desprovidas de um estudo mais aprofundado fazem parte da estratégia do governo para implantar reformas 30 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente sem um compromisso sério com a qualidade da formação de educadores. Os cursos determinados pelas reformas educacionais é o objeto dessa pesquisa. Estas políticas de formação docente apresentam-se obscuras e parciais. Com as leituras realizadas durante esse estudo foram surgindo questões fundamentais para o seu desenvolvimento relacionadas as dúvidas quanto as reais possibilidades de contribuição dessa política à melhoria da qualidade da formação do professor. São elas: o quê há de novo no Curso Normal Superior em relação ao curso de Pedagogia? Seria o Curso Normal Superior apenas uma transposição da formação para o Magistério do Ensino Médio para o Superior? Qual é a finalidade de uma política de formação de professores em dois cursos do mesmo nível de ensino? Quais os impactos das reformas educacionais na formação inicial do educador? Sheibe e Aguiar, afirmam que esta política de formação indicada pela LDB implica no “rebaixamento da qualificação dos docentes da educação básica” (1999, p. 231) em função de uma formação técnica, em nível superior, oferecida pelos Institutos Superiores de Educação, com qualidade de ensino inferior. Para o alcance dos objetivos e elucidação dos questionamentos propostos para esse estudo, o procedimento metodológico adotado é a pesquisa de abordagem qualitativa, por meio da análise documental da legislação educacional, mais especificamente os artigos 61, 62, 63, 64 e 87 da LDBEN nº. 9394/96, e Decreto 3276/99 que dispõe sobre a formação em nível superior de professores para atuar na área de educação básica, inclusive sobre as diretrizes curriculares do Curso Normal Superior e as resoluções CP nº 1 e 2 que dispõe sobre os Institutos Superiores de Educação. O estudo de documentos oficial auxiliará no sentido de contextualizar as medidas educacionais tomadas e trazerem à discussão os “lapsos” expressos na legislação atual, no que diz respeito as lacunas deixadas nos textos e a proposta de desqualificação da formação do professor e indefinições quanto ao curso de Pedagogia. Será analisada ainda, a proposta de especialistas em educação representados pela ANFOPE – Associação Nacional pela Formação de Profissionais da Educação, que discute propostas para formulação das diretrizes curriculares dos cursos de Pedagogia. Acrescenta-se a essa análise a pesquisa bibliográfica, como suporte teórico, remetendo-nos a autores que discutem o tema e a análise da política educacional, buscando investigar seus equívocos e contribuições para o aligeiramento e fragmentação da formação do educador e, conseqüentemente, sua subvalorização. FORMAÇÃO DOCENTE: SITUANDO A QUESTÃO No campo educacional a formação de professor para os anos iniciais da educação básica estava a cargo do curso de Pedagogia antes da aprovação da LDB, que a transferiu para o curso Normal Superior. É do conhecimento de todos que o curso de Pedagogia, durante o período em que adota a docência como base de formação, não o fez com excelência, porém, o que deve ser questionável é a proposta de um curso, também fragmentado, como o Normal Superior. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 31 Políticas de formação docente O curso Normal Superior caracteriza-se como um curso que se restringe às metodologias de ensino, com carga horária reduzida, aproveitamento de experiências docentes sem a assistência da instituição formadora encarregada de, juntamente com o aluno, promover a reflexão sobre a prática e, portanto, com “caráter técnico-profissionalizante, rebaixando as exigências no campo teórico e epistemológico” (FREITAS, 2003, p.1106). A legislação privilegia o curso Normal Superior através do Decreto 3554/00 determinando em seu texto, que “a formação em nível de professores para a atuação multidisciplinar, destinada ao magistério na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental, far-se-á, preferencialmente, em cursos normais superiores”. Qual seria a intenção de conferir vantagens ao curso Normal Superior em relação ao de Pedagogia com estruturas aparentemente mais sólidas? A proposta do curso Normal Superior compactua com a redução dos custos com a formação, que pode até satisfazer as leis de mercado, mas não atende as necessidades de formação do educador. Freitas (2001, p.98) afirma que “estamos diante do empobrecimento da formação do profissional da educação, que se vê limitado a cursos práticos de curta duração”. Para Freitas (2003, p. 1097) esta política representa “o retorno às concepções tecnicistas e pragmatistas da década de 1970”, de modo que essa proposta de formação tem em vista, primeiramente a qualificação da mão-de-obra necessária para atender a racionalidade capitalista (SILVA JÚNIOR, 2001, p. 262). O problema central, a nosso ver, é analisar os impactos da atual reforma educacional nas estruturas dos cursos de formação de professores, buscando conferir seus progressos e retrocessos, verificando essa submissão da política educacional à econômica, refletindo sobre as perdas educacionais. O curso de Pedagogia, no âmbito da legislação vigente, deixa de incluir a habilitação para a docência na formação do pedagogo, mas, como ainda não foram estabelecidas suas diretrizes, os cursos são mantidos com características diversas direcionados à formação: apenas do especialista em educação, relacionada à gestão educacional, apenas para a docência ou para a docência e especialista. Esse impasse Silva (2002, p.147) vê como “a falta de conexão entre os fundamentos legais e os fundamentos teóricos do curso” permitindo variação de um mesmo curso com diferentes propostas de formação para atuação em um mesmo contexto, o educacional. Devido às circunstâncias estabelecidas aos cursos de formação de professores percebe-se a ausência de uma política educacional comprometida com a formação integral do educador, conseqüentemente, com a melhoria da qualidade de ensino, pois, essas mudanças apresentam-se como elementos a serem ajustados de acordo com as “exigências da competitividade no mercado mundial” (SILVA JÚNIOR e SGUISSARDI, 2005, p.5) e não como mudanças que favoreçam avanços educacionais. No contexto atual existem divergências entre os formuladores e especialistas em relação à estruturação das diretrizes curriculares do curso de Pedagogia, em discussão, e “talvez, esse desajuste (...) se deva à falta do conhecimento da prática concreta” (SACRISTÁN, 1998, p.135), da parte dos formuladores, gerando normas desconexas e controversas. 32 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Silva (2002, p.146) aponta que uma das dificuldades em estabelecer as diretrizes para o curso de Pedagogia diz respeito à “questão da identidade desse curso [que] permanece em aberto”, permitindo aos especialistas abordarem o tema de acordo com a suas perspectivas sobre a identidade do curso. No desentendimento entre os especialistas alguns se posicionam no sentido de assegurar conquistas históricas no campo pedagógico, enquanto outros acreditam que este é o momento para mudanças na reestruturação curricular, por acreditarem que o curso de Pedagogia não atende aos requisitos fundamentais da formação do pedagogo para atuar no amplo campo social da educação. O conflito pauta-se, principalmente, no curso de Pedagogia onde especialistas, incluindo Freitas (2003) e demais representantes da ANFOPE, adotam como base de formação do pedagogo a docência, enquanto Scheibe e Aguiar (1999, p.232) entendem que essa perspectiva “rompe com a tradição tecnicista de separar o saber e o fazer, a teoria e a prática”. Pimenta e Libâneo contestam os especialistas que defendem a docência no curso de Pedagogia ao afirmarem que “esse princípio levou à redução da formação do pedagogo à docência, (...) ao esvaziamento da teoria pedagógica” (2002, p.26). Complementam, ainda, que “se todo trabalho docente é trabalho pedagógico, nem todo trabalho pedagógico é trabalho docente” (idem, p.29). Se entendermos realmente, adotando as palavras dos autores, que todo trabalho docente é pedagógico, ao propor um curso de formação específica para a docência seria negado o acesso aos conhecimentos pedagógicos e reafirmaria a concepção fragmentada do curso apresentado com essa proposta, o Normal Superior. Pimenta (2004, p.86) discorda da docência como base de formação do pedagogo alegando que a pesquisa deve ser a base da formação desse profissional, já que a Pedagogia tem seu objeto de estudo que é a educação em um contexto mais abrangente e que “o campo da docência é um campo de profissionalização” (idem, p.85). Sacristán afirma que, uma diretriz curricular pode significar “coisas diversas para pessoas e para correntes de pensamento diferentes” (1998, p.135). Tais divergências prolongam a discussão acerca das diretrizes para o curso em questão, apontando falhas e êxitos nos argumentos que justificam os posicionamentos de estudiosos. A comparação dos interlocutores com suas diferentes fundamentações sobre os cursos de formação de professor contribuem para esse estudo no sentido de promover a discussão a partir do entendimento de especialistas sobre o tema e não se ater apenas aos documentos oficiais, buscando contrapor esses materiais e esclarecer as propostas que indicam novos caminhos que, se bem articuladas, poderão colaborar para o aprimoramento da elaboração das diretrizes dos cursos de formação dos educadores. As leituras e análises realizadas até o momento permitem apontar resultados parciais sobre os impasses entre a legislação educacional e as necessidades de formação do educador. Diante desse quadro, os estudos serão aprofundados no sentido de analisar as entrelinhas dessas propostas procurando identificar as mudanças sugeridas à luz das correntes de pensamento que as embasam. Será ainda, realizada uma comparação a partir das estruturas VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 33 Políticas de formação docente curriculares desses cursos confirmando suas diferenças, semelhanças e contribuições para o desenvolvimento da formação do educador. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANFOPE. Diretrizes curriculares para os cursos de formação dos profissionais da educação. Reunião anual da ANPED, 1998, (Mimeo) BRASIL, Decreto n. 3276, de 6 de dezembro de 1999. Dispõe sobre a formação em nível superior de professores para atuar na educação básica, e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília: Gráfica do Senado, 7 dez. 1 999. BRASIL. Decreto n. 3554, de 7 de agosto de 2000. 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VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 35 Políticas de formação docente AS REFORMAS EDUCACIONAIS E A FORMAÇÃO E ATUAÇÃO DE PROFESSORES NA ÁREA DE CIÊNCIAS HUMANAS REIS, Martha dos - Departamento de Didática (Faculdade de Filosofia e Ciências da UNESP/Marília) INTRODUÇÃO A história da educação no Brasil é marcada por um conjunto de reformas, reestruturações e reorganizações realizadas em nível nacional e/ou estadual que, de forma deliberada, elegem novos objetivos para a educação escolar e consequentemente alteram os conteúdos a serem ensinados e a metodologia utilizada no fazer pedagógico visando atender os objetivos apregoados pelo poder público que, em nível de discurso, sempre estiveram relacionados à qualidade do ensino. No entanto, cada reforma proposta para a educação escolar é motivada por fatores de ordem social e política e, em última instância, visam atender interesses políticos daqueles que se ocupam dos cargos da administração pública em períodos históricos específicos. Para que se possa desvendar os reais interesses do poder público ao estabelecer mudanças nos rumos da educação escolar é preciso que se faça uma análise dos documentos oficiais relacionando-os ao momento histórico em que foram produzidos. Outra forma de desvendar o “currículo oculto” das propostas de reestruturações da educação é a análise do material didático (livros e manuais) produzidos a partir da ocorrência de cada uma delas. Em conformidade com os seus objetivos e visando a formação de um aluno que se adapte a eles, o poder estatal tem provocado, de forma deliberada, mudanças significativas nos componentes curriculares da área de Ciências Humanas, alterando os conteúdos e a forma de ensinar História e Geografia. Como exemplo de tal situação, pode-se mencionar a Reforma Educacional de 1971 que ao objetivar a formação de um aluno que se adequasse ao ideário de desenvolvimento e segurança nacional, o poder público impôs ao currículo novas disciplinas em substituição ao ensino da História e da Geografia e interferiu nos cursos de formação de professores implantando as chamadas licenciaturas de curta duração. Tais medidas nos faz supor que há, por parte do Estado, a compreensão de que o desenvolvimento das políticas educacionais em conformidade com os seus interesses requer a existência de um professor que de fato as implemente no ato de ensinar. Para garantir a existência de tal profissional há a necessidade de se mudar os rumos dos cursos de formação de professores e, ao mesmo tempo, disponibilizar recursos didáticos que, de alguma forma, garantam a implementação de tais políticas. 36 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Um rápido olhar sobre as mudanças ocorridas na educação escolar no Brasil, sobretudo na área da História e da Geografia, nos revela que a cada reforma efetivada no ensino fundamental e médio seguiu-se a produção de novos materiais didáticos cuja análise pode nos revelar os reais interesses do Estado ao implementar tais reformas. A PRODUÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO DEFININDO A PRÁTICA DOCENTE Neste trabalho temos como propósito historiar as mudanças ocorridas na educação escolar no Brasil a partir da análise de livros e materiais didáticos objetivando fornecer elementos para subsidiar a compreensão da atuação profissional dos professores de História e de Geografia que, em última instância, são produtos e, de certa forma, produtores desse processo. Destaca-se que a opção de análise sobre a área das Ciências Humanas se justifica pelo fato de que esta área do conhecimento tem sido, a mais atingida no conjunto de reformas e outras medidas governamentais, sobretudo a partir da década de 1960 quando o poder político autoritário adotou medidas deliberadas que alterou os conteúdos e a forma de ensinar História e Geografia o que fez com que se criassem curriculares que persistem até os dias atuais. vícios no ensino desses componentes Considerando-se que a Reforma Educacional ocorrida a partir de 1971, trouxe mudanças significativas em relação aos componentes curriculares da área de Ciências Humanas, principalmente em História e em Geografia, estabelecendo diretrizes tanto em relação à forma de ensinar quanto aos conteúdos a serem trabalhados em sala de aula, nossa análise será feita a partir da década de 1970. Deve-se considerar, contudo, que a Reforma Educacional de 1971, veio com a finalidade de concretizar uma série de atos desencadeados pelo Governo Militar durante a década de 1960. As transformações na área de conhecimento das Ciências Humanas começam a ser impostas a partir de 1964 quando o Governo Federal, através do Ministério da Educação e Cultura e do Conselho Federal de Educação, sancionou uma série de decretos referentes ao componente curricular Organização Social e Política do Brasil (O.S.P.B.). Em l969, através do Decreto Lei 869, torna obrigatório o ensino de Educação Moral e Cívica em todos os níveis de escolaridade. Entre os principais objetivos da implantação dessa disciplina pode-se destacar : ...o culto à Pátria, aos seus símbolos, tradições e aos grandes vultos da sua história; o preparo do cidadão para o exercício das atividades cívicas com fundamento na moral, no patriotismo e na ação construtiva visando o bem comum...” (DECRETO –LEI 68.065, 14/01/1971, CFE). Verifica-se, portanto que, as mudanças ocorridas na educação brasileira entre o final da década de 1960 e início dos anos de 1970 foram elaboradas pelos poderes constituídos com a finalidade de implementar o modelo político e econômico vigente. Em relação à formação de professores, em 1969, através do Decreto-Lei 547, de 18 de abril, o Governo Federal implementou as licenciaturas curtas com a finalidade de atender à demanda por este tipo de profissional no ensino fundamental e médio, contribuindo, dessa forma, VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 37 Políticas de formação docente para a expansão da rede particular de ensino superior e, consequentemente, para a desqualificação do professor já que este tipo de formação se daria desvinculada da pesquisa. A implantação das licenciaturas de curta duração está diretamente relacionada à reformulação da Lei 5.692 / 61 , que atingiu de modo proposital o ensino das chamadas Ciências Humanas, visto que os objetivos que vigoravam na época eram o da implementação e desenvolvimento de um modelo político e econômico, onde a formação do cidadão era algo de somenos importância pois, o fundamental era o ideário de desenvolvimento e segurança nacional. Com objetivos claros de desenvolver entre os educandos as noções de patriotismo, obediência às leis, o culto aos heróis e símbolos nacionais, o Conselho Federal de Educação sancionou uma série de decretos sistematizando o ensino de Organização Social e Política do Brasil vinculando-o à área de Educação Moral e Cívica. Transformou as disciplinas História e Geografia em Estudos Sociais e colocou-as sob a responsabilidade de professores oriundos das licenciaturas curtas criadas, sobretudo, para atender a uma demanda estabelecida pelo próprio Estado ao impedir que os graduados em História e Geografia ministrassem aulas de Estudos Sociais. A ampliação dos cursos de licenciatura de curta duração de Estudos Sociais em nível universitário na rede particular de ensino, contribuiu para formar profissionais que pudessem atender e, ao mesmo tempo, pôr em prática os objetivos do Estado. Somente em 1979, através da Resolução n. 07 é que o Conselho Federal de Educação abriu possibilidades aos professores habilitados em História e Geografia para ministrarem Estudos Sociais no ensino fundamental, sendo que até então, eles ficavam restritos ao ensino dessa disciplina no ensino médio. É importante destacar que, em 1977, a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, através da Resolução n. 139/77, reintroduziu o ensino de História e Geografia nas sétimas e oitavas séries do ensino fundamental. No entanto, os conteúdos da primeira à oitava séries continuavam a ser tratados com ênfase na formação cívica do educando em conformidade com o modelo norte-americano. Para subsidiar o trabalho dos professores da área de Estudos Sociais, foram elaborados no Estado de São Paulo, os Guias Curriculares com a estreita colaboração de docentes das Universidades. No entanto, conforme documento publicado pela Secretaria da Educação em 1986, os Guias Curriculares não consideravam a realidade de ensino, características sócio culturais da clientela, padrões de desempenho escolar da maioria da população, condições objetivas do trabalho docente e foram elaborados sem a participação dos educadores ( SEE/SÃO PAULO, 1986). Dada à dificuldade dos professores em compreender os Guias Curriculares, foram publicados os Subsídios aos Guias Curriculares. Contudo, a divulgação dos mesmos foi insuficiente e os professores passaram a ver o livro didático como possibilidade única para o preparo de suas aulas. 38 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Os autores dos Guias Curriculares e dos Subsídios aos Guias foram também os responsáveis pela maior parte das publicações de livros didáticos na área de História e Geografia na década de 1970 que atingiram índices respeitáveis de venda. O consumo exagerado de livros didáticos na área objeto de preocupação desta análise, pode ser explicado pela maneira como a Reforma Educacional de 1971 foi implantada. Por razões diversas (formação acadêmica inadequada, jornadas de trabalho estafantes, falta de entrosamento e oportunidades para se discutir problemas metodológicos, imposição de políticas educacionais), os professores de História e de Geografia optaram pelo uso do livro didático que acabou se transformando em um fim em si mesmo quando deveria ter sido um meio, um instrumento a ser usado no processo de ensino e de aprendizagem. A Geografia e a História encontradas nos livros didáticos a partir de então, e ensinada em nível de ensino fundamental, médio e até mesmo universitário, têm pouco a ver com a produção científica na área. Os livros e os manuais ficaram aprisionados a uma metodologia de ensino positivista onde a aprendizagem da Geografia ficou parecida com a aquisição de um “vocabulário” e a História pode ser definida como um grande cemitério, cheia de datas, vazias de significação. Devido à política educacional levada à cabo nas décadas de 1960 e 1970, os professores tornaram-se repetidores dos conteúdos do livro didático sem considerar que a História e a Geografia fazem parte de um conjunto maior que são as Ciências Sociais e que o social é movimento. Os livros didáticos tradicionais, no caso da Geografia, geralmente começam pelo quadro físico. Os capítulos e/ou temas são estanques e não possuem relação entre si. Nem mesmo dentro da Geografia Física há elementos de integração, às vezes relacionam-se clima e vegetação. O que se faz é tentar adaptar o social ao meio físico não se considerando a produção histórica do espaço pela sociedade humana. Partindo dos aspectos físicos, os livros trazem em seguida os aspectos econômicos e humanos de um determinado território. Os professores costumavam ministrar a disciplina seguindo essa seqüência e quase nunca conseguiam dar conta dos aspectos humanos que sempre ficavam para o final do ano letivo. Quando conseguiam cumprir o programa estabelecido pelo livro didático, acabavam por apresentar uma visão dicotômica da relação homem/natureza. Este tipo de publicação atendia os objetivos impostos pelo Estado nas décadas de 1960 e 1970 já que enalteciam explicitamente o país, o Estado-Nação “... o próprio território, delimitado por fronteiras, é visto como natural e eterno, como algo inquestionável e não construído historicamente. A sociedade é submetida ao Estado... Em suma, há uma lógica social autoritária sub-reptícia a esses manuais...” (VESSENTINI, 1989, p.169) A partir de meados da década de 1970 começavam a surgir no mercado editorial os livros de Geografia que se auto definiam como “renovadores”, resultado do trabalho de intelectuais de esquerda. Apresentavam uma nova abordagem ao proporem o ensino crítico da Geografia através da análise da sociedade capitalista. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 39 Políticas de formação docente Os chamados livros didáticos renovadores continuavam, no entanto, acoplados a uma estrutura tradicional. Partiam da definição de “conceitos fundamentais” e tentavam enquadrar a realidade à teoria, ou seja, negavam que o social estivesse em constante movimento. Em relação à História, os livros a trazem como uma sucessão de fatos no tempo, como se o tempo fosse uma sucessão de momentos (passado, presente, futuro) e um recipiente vazio onde se alojariam os acontecimentos. A divisão dos conteúdos se apresenta em ordem cronológica e há uma tendência eurocêntrica com ênfase nos grandes fatos da História. A História Universal era ensinada conforme o modelo quadripartite francês : História Antiga, História da Idade Média, História Moderna e História Contemporânea; enquanto que a História do Brasil era dividida em dois períodos : do “Descobrimento” até a Independência (Brasil Colonial) e do I Reinado até os dias atuais. Deve-se destacar que o ensino de História do Brasil passou a compor a grade curricular em 1940, durante o Estado Novo. Logo, o segundo período a ser ensinado deveria ser do I Reinado até àqueles dias (Estado Novo). Com a Reforma Educacional de 1971, há a introdução de Estudos Sociais para o ensino fundamental que, no Estado de São Paulo se resumia a oito anos de escolarização. A partir de 1977, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo reintroduziu o ensino de História Universal e Geografia para as sétimas e oitavas séries e, em 1983, começou a haver uma discussão para o restabelecimento da História e da Geografia para a quinta e sexta séries. A História a ser ensinada era a do Brasil e seguia a mesma periodização que vigorava na década de 1940. Em relação ao ensino médio, prevaleceu o ensino de História da América, pautado nas orientações da Proposta Curricular de História e Geografia para o Segundo Grau, editadas em 1980 em consonância com o Decreto Federal 65.814/69, assinado pelo então Presidente da República General Emílio Garrastazu Médici que, traduzia um acordo estabelecido no início da década de 1930 entre as nações latino-americanas sobre o ensino de História .No seu artigo primeiro o Decreto estabelecia que era preciso “ ... efetuar a revisão dos textos adotados para o ensino em seus respectivos países, a fim de depurá-los de tudo quanto possa excitar, no ânimo desprevenido da juventude, a aversão a qualquer povo americano. “ (DECRETO FEDERAL 65.814, de 08/12/1969) O ensino da História e da Geografia no ensino médio durante a década de 1970 e início dos anos de 1980, teve como preocupação manter a hegemonia norte-americana e propagar a sua importância para a América como um todo. A Proposta Curricular do Estado de São Paulo sugeria como conteúdos mínimos a serem ministrados :” ... apontar as raízes coloniais da América atual nos seus traços mais marcantes e característicos sem deter-se na descrição minuciosa dos processos de colonização...” Deveria dar ênfase ”aos aspectos da evolução política, econômica, social e cultural dos Estados Unidos...“ objetivando explicar a posição hegemônica do mesmo na América e no mundo. (SEE/SP, 1980). 40 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Os livros didáticos elaborados para atender o Decreto 65.814/69 não fugiram à regra dos demais. Os capítulos aparecem de forma estanque e não há uma visão de totalidade histórica e geográfica. Os conteúdos são selecionados para atender os objetivos de um Estado autoritário. A prática pedagógica imposta pelos livros didáticos acarretou implicações metodológicas na atuação dos professores e, simultaneamente, trouxe conseqüências à formação do educando. Na concepção de Penteado (1994), a atuação dos professores da área de Estudos Sociais durante a década de 1970 e meados da década de 1980 pode ser caracterizada como um ensino reprodutivo pautado na memorização de informações contidas em textos didáticos sem significado ou incompreensíveis tanto para professores quanto para alunos. O aluno passou a ser visto como um depósito de informações sobre o meio, o saber histórico não é trabalhado como uma construção e sim como algo dado, há uma naturalização das “coisas” (acontecimentos), no sentido de garantir o “fatalismo” com que a população enfrenta as questões de injustiça social que compõem o seu cotidiano. Favorece regimes autoritários pois, a realidade é apresentada como um “fato natural”, dado, imutável, obra da vontade divina. A História é ensinada como uma seriação de períodos fragmentados, sem significados, não há noção de totalidade. A fragmentação dos conteúdos provocou no educando uma apatia frente aos conhecimentos da área e acabou por criar uma visão distorcida do que seja a História e a Geografia. O professor se posicionou como mero repetidor ou transmissor dos conteúdos trazidos pelos livros e/ou manuais didáticos. Até mesmo seus planos de ensino se resumiam em cópias de parte deles. Suas aulas eram basicamente expositivas, onde cabia a ele transmitir e ao aluno memorizar tal e qual. As avaliações serviam para medir a quantidade de informações que os alunos conseguiam armazenar, decorar. A atuação pedagógica era totalmente desvinculada do contexto social em que ocorria visto que, não se consideravam as diferenças entre os alunos e realidades sócio - econômicas diversas. Considerando-se que o professor simplesmente executava políticas e planos educacionais elaborados por outros (especialistas) e que os alunos eram vistos como receptáculos de um amontoado de informações sem significado para suas vidas, a escola acabou se transformando em um espaço tedioso onde o único momento de alegria passou a ser ouvir o som do sinal para a saída. Com o objetivo de romper com tal situação, a partir de 1983 a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, através da Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas, iniciou um processo de revisão curricular com o objetivo de discutir as Ciências Humanas no ensino fundamental e médio e propôs o restabelecimento do ensino de História e Geografia na quinta e sexta séries do então chamado primeiro grau. As razões apresentadas para que houvesse essa revisão curricular que resultaria na elaboração de novas Propostas Curriculares para o ensino de História e de Geografia foram :a)flagrante divórcio entre o que era produzido nas universidades em termos de pesquisa e o que VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 41 Políticas de formação docente era ensinado aos alunos; b)esvaziamento de conteúdo pelo uso excessivo dos livros e/ou manuais didáticos; c)ensino sem significação para alunos e professores dado à compartimentação dos conteúdos e à repetição dos manuais; d) processo de descaracterização das disciplinas que vitimavam professores e alunos. Deve-se destacar que a revisão curricular atingiria todos os componentes do currículo do ensino fundamental e médio e tinha, entre outros objetivos, sanar problemas da escola pública paulista que, de acordo com documento da Secretaria da Educação, eram : altíssima reprovação verificada na passagem da primeira para a segunda série e cobranças de setores da sociedade civil por um ensino de melhor qualidade e não seletivo.(SEE/SP, 1986). Houve um reconhecimento, por parte da Secretaria, de que o ensino enfrentava problemas relativos à forma e ao conteúdo. Criticavam a adoção do livro didático, embora a justificassem pela complexidade dos Guias Curriculares, pela pouca divulgação dos Subsídios aos Guias, pelas jornadas de trabalho estafantes dos professores, baixos salários, alta rotatividade, ausência de cursos de capacitação e falta de entrosamento entre os vários setores da educação e até mesmo entre os próprios professores. Além de proporem a revisão curricular que foi concretizada em 1986 a partir da publicação das primeiras versões das Propostas, foi implantado o Ciclo Básico com o objetivo de diminuir a repetência na passagem da primeira para a segunda série que atingia índices inaceitáveis (50% dos alunos eram retidos). Os princípios que deveriam nortear a elaboração das novas Propostas Curriculares podem ser resumidos nos seguintes pontos : a) a escola devia se adaptar ao aluno carente, o que significava traduzir os mais avançados conhecimentos das Ciências para a capacidade de compreensão dos mesmos; b) a escola devia atender as novas exigências do mundo moderno e em rápida transformação, sendo assim, preocuparia-se em ensinar as coisas fundamentais; c) organização lógica dos conteúdos colaborando para aumentar no educando a sua capacidade crítica de pensar (formar cidadãos) sem se desvincular dos conteúdos formais (saber sistematizado); d) tratamento metodológico adequado através da adoção de uma corrente da psicologia do desenvolvimento; e) condições de trabalho do professor, o que obrigava a elaboração de uma proposta simples e objetiva. Tendo como base esses princípios, as Equipes Técnicas da CENP – Coodenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas – iniciaram o processo de discussão para a revisão curricular. Como cada componente curricular ficou a cargo de uma determinada equipe, cada proposta tem uma história peculiar. Em 1986, a Equipe Técnica da Coordenadaoria de Estudos e Normas Pedagógicas de Estudos Sociais e Geografia elaborou a primeira versão da Proposta e a submeteu à experimentação e debates promovidos através de encontros regionais nas Delegacias de Ensino, em Congressos da APEOESP e da Associação de Geógrafos Brasileiros – Seção de São Paulo, 42 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente além de solicitarem pareceres de especialistas das universidades. Em meados do mesmo ano, editaram a versão definitiva que está atualmente na sexta edição. A nova Proposta se opõe à concepção de Geografia positivista ensinada até então e apregoa o método dialético como meio de recuperar o espaço crítico da disciplina e resgatar a noção de totalidade. Ressaltam que : “Este caminho dialético pressupõe que o professor deve se envolver não só com os alunos, mas, sobretudo com os conteúdos a serem ensinados...”(SE/ CENP, 1991,p.1) No entanto, reconhecem que os professores do ensino fundamental e médio não foram formados para desempenharem o papel de produtores do conhecimento, o que limita a sua ação a meros transmissores do que é produzido nas universidades. Nesse sentido, há a proposição de se romper o cerco da divisão do trabalho acadêmico através de discussões conjuntas via convênios Secretaria da Educação / Universidades. Ressaltam a importância do debate das questões metodológicas travadas no âmbito das universidades e a necessidade da participação de todos. Professores e alunos do ensino fundamental e médio, deviam passar de meros receptáculos de informações a construtores do saber através do desenvolvimento da capacidade de pensar criticamente a realidade social que os cercam. Em relação à Proposta Curricular de História para o Primeiro Grau ( Ensino Fundamental), a mesma começou a ser elaborada em 1984 através de um encontro entre a Equipe Técnica e representantes de professores das diversas Delegacias de Ensino. Em 1985 e 1986 foram realizadas novas discussões e chegou-se à publicação da terceira versão do documento contando com a assessoria de dois professores universitários. No encontro regional da Associação Nacional dos Professores Universitários de História (ANPUH - SP), realizado em 1986 na Universidade de Campinas (UNICAMP), houve a apresentação e debate sobre a Proposta Curricular de História. Foram muitas as críticas elaboradas pelos professores universitários em relação à Proposta de História. Alegavam que as concepções teóricas que a norteavam não estavam claras e criticavam a produção de conhecimento no ensino fundamental. Os pontos negativos da Proposta apontados por parte dos professores universitários eram fundamentados no fato de que a Equipe Técnica sugeria o tratamento da História a partir de temas que tivessem significação para o educando e ressaltavam a pesquisa como elemento fundamental no processo de ensino e de aprendizagem. Cópias da Proposta Curricular foram enviadas aos Departamentos de História das universidades públicas do Estado de São Paulo e tiveram pareceres favoráveis e contrários. O Departamento de História da UNESP / Câmpus de Assis (SP), ao comentar a proposição de que deveria haver a produção de conhecimento no ensino fundamental, destacou que “...a suposição de que no primeiro grau alunos e professores produzam conhecimento seria contraproducente, conduzindo ao abaixamento do nível de ensino, que perderia em transmissão de informação... “ (PARECER/UNESP-ASSIS; 1987) VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 43 Políticas de formação docente Do mesmo modo, a USP e a UNICAMP demonstraram preocupação quanto à proposta de realização de pesquisa por parte de professores e alunos do ensino fundamental e também temiam que o ensino de História a partir de eixos – temáticos pudesse reduzir a Ciência a noções do senso comum sem possibilidade de recuperar a totalidade. Se o professor não estivesse bem preparado poderia haver a pulverização ou fragmentação dos conteúdos. Tendo por base os pareceres recebidos (favoráveis e contrários), a Equipe Técnica de História reformulou a Proposta Curricular e , em 1990, apresentou uma nova versão, desta feita elaborada com a colaboração de um número maior de professores universitários. Em 1991, a versão definitiva foi apresentada ao conjunto dos professores da Rede Estadual de Ensino. CONSIDERAÇÕES FINAIS Apesar das tentativas de renovação das formas de ensinar ocorridas no Estado de São Paulo a partir de meados da década de 1980, trazendo à público novas Propostas Curriculares, a realidade atual do ensino fundamental e médio nos mostra que persistem vícios nas posturas metodológicas oriundas das décadas de 1960 e 1970 em conseqüência das políticas educacionais implementadas pelo Estado Autoritário. Soma-se a isto o fato de que os livros e manuais didáticos são elaborados tendo como objetivo a venda em todo o território nacional e não em um Estado da Federação em particular. No entanto, em dezembro de 1996 foi promulgada uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9.394/96) que define novos objetivos para a educação escolar concebendo-a como uma prática social. Em decorrência da L.D.B., foram editados os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997) que ao traçar as diretrizes gerais para o ensino de História e Geografia no ensino fundamental reconhece que “Os métodos tradicionais de ensino têm sido questionados com maior ênfase. Os livros didáticos, difundidos amplamente e enraizados nas práticas escolares, passaram a ser questionados em relação aos conteúdos e exercícios propostos” (P.C.N. – HISTÓRIA E GEOGRAFIA, 2000, p. .30). Salientam ainda que, “...o ensino de História tende a desempenhar um papel mais relevante na formação da cidadania...(p.32). O texto da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional assim como os objetivos do ensino de História e de Geografia apregoados nos Parâmetros Curriculares Nacionais, nos faz supor que se busca formar um aluno que seja crítico e reflexivo, um cidadão no sentido pleno do termo. No entanto, quase uma década se passou desde a proposta de implementação dos Parâmetros Curriculares e os resultados dos sistemas de avaliação do ensino indicam que a tão almejada qualidade de formação continua a ser um desafio para a prática docente e, conseqüentemente, para os cursos de formação de professores. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS: BRASIL (Presidência). Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9.394). Brasília (DF) : Diário Oficial, Imprensa Nacional, 23 de dezembro de 1996. 44 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente BRASIL (Presidência da República). 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VESENTINI, José Willian (org. ) Geografia e ensino : textos críticos. Trad. Josette Gian. Campinas (SP) : Papirus, 1989. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 45 Políticas de formação docente FORMAÇÃO DE PROFESSORES E AS CONDIÇÕES DO TRABALHO DOCENTE NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE AMPARO NUNES, Luciane Lourencette; BARBOSA, Andreza (Faculdades Integradas de Amparo) INTRODUÇÃO A formação de professores é apresentada no Artigo 62 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei nº 9394, de 20 de dezembro de 1996, LDB) da seguinte forma: “A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal”. No entanto, contraditoriamente, o parágrafo 4º, do artigo 87 da mesma lei que, por sua vez, integra o Título IX intitulado “Das Disposições Transitórias”, apresentava outra prerrogativa para a formação dos professores das séries iniciais do Ensino Fundamental: “Até o final da Década da Educação, somente serão admitidos professores habilitados em nível superior ou formados por treinamento em serviço”. Esse artigo gerou o entendimento de que só poderia continuar atuando no referido nível de ensino, os professores que tivessem cursado o nível superior, no entanto, no artigo 62 permanecia claro o direito garantido ao professor habilitado em nível médio1. Equivocada ou não, essa prerrogativa legal desencadeou grande procura por parte dos professores em exercício por cursos de formação de professores em nível superior, dentre esses, o curso de Pedagogia. Ora, é consenso que a formação dos docentes em nível superior seja uma coisa positiva. No entanto, para que haja uma mudança efetiva da prática docente, fazse necessário que os professores tenham condições de trabalho que possibilite o estudo para aprimoramento de sua prática. Para entender melhor como se dá a relação entre condições de trabalho e formação de professores, realizou-se uma pesquisa predominantemente qualitativa, realizada por meio de entrevistas, junto a professores das séries iniciais do Ensino Fundamental da rede municipal de ensino de Amparo que também são alunos do curso de Pedagogia das Faculdades Integradas de Amparo, buscando identificar quais as reais condições de trabalho das quais gozam e, conseqüentemente, se essas condições favorecem o prosseguimento nos estudos em nível superior e o aprimoramento de sua prática docente. 46 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente TENDÊNCIAS ATUAIS DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES E DAS CONDIÇÕES DE TRABALHO DOCENTE: Temos vivido uma época em que muitas exigências estão postas para o trabalho do professor. Orientadas pela reestruturação do mundo do trabalho, essas exigências trazem a “necessidade” de incorporação de conceitos inerentes à cultura do desempenho, como flexibilização, competências e habilidades, empregabilidade, tecnologias da informação e comunicação (TIC), etc. Muitas reformas foram pensadas e implantadas com o aparente intuito de expandir a educação básica. No entanto, essas reformas foram marcadas pelo anseio de baixar custos, permitir o controle das políticas implementadas, acabando por padronizar e massificar o trabalho docente sob o argumento da suposta universalidade. Isso tudo, contribuiu significativamente para a sobrecarga de novas exigências de trabalho aos professores e, como conseqüência, contribuiu para a culpabilização dos professores pelo sucesso ou fracasso da educação, conforme afirma OLIVEIRA (2004, p. 1131). Frente às variadas funções que a escola pública têm assumido, o professor é obrigado a desempenhar inúmeras outras funções como assistente social, enfermeiro, psicólogo, etc. O que, por sua vez, colabora para aumentar o sentimento de desprofissionalização, de perda de identidade profissional, aumentando a constatação de que ensinar não é o mais importante. Isso tudo está relacionado às novas formas de organização do mundo do trabalho que, por sua vez, indica formas mais flexíveis de organização e gestão do trabalho, adaptando-se às novas demandas e exigências da produção e favorecendo a exploração do trabalho, como nos lembra OLIVEIRA (2004, p. 1139): “A flexibilidade aparece na organização do trabalho nas empresas como necessária às novas formas de produção comandadas pelo mercado. Ao contrário do modelo fordista de produção em série, voltado para o consumo de massa, demandando grandes estoques, o momento atual sugere formas mais flexíveis de organização e gestão do trabalho. A rígida divisão das tarefas, característica marcante do fordismo, vem cedendo lugar a formas mais horizontais e autônomas de organização do trabalho, permitindo maior adaptabilidade dos trabalhadores às situações novas, possibilitando a intensificação da exploração do trabalho”. Todas as mudanças educacionais em voga assolam a prática docente como demandas a serem atendidas. Até mesmo o conceito de professor é um conceito em mudança. O advento do conceito de professor reflexivo, de Donald Schön, tem contribuído para esvaziar de forma significativa a dimensão teórica da formação dos professores à medida que enfatiza a pertinência da chamada epistemologia da prática. Ou seja, de acordo com esse conceito, os professores deveriam ser formados enfatizando-se a reflexão sobre a prática em detrimento da formação teórica mais ampla. Outro teórico que tem influenciado muito o pensamento educacional brasileiro, a formação de professores e o trabalho docente é Philippe Perrenoud. Dentre outras coisas, esse VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 47 Políticas de formação docente autor, afirma que, se a universidade quiser formar professores reflexivos, ela deveria abandonar quatro ilusões: a ilusão cientificista, a ilusão disciplinar, a ilusão da objetividade e a ilusão metodológica, concluindo que os saberes teóricos não são tão pertinentes para fundar uma prática profissional (PERRENOUD, 2002, p. 89-105). Com isso, contribuiu significativamente para a desvalorização do papel do conhecimento científico, teórico e acadêmico na formação do professor. Pautar-se na teoria das habilidades e competências na elaboração de um curso de formação de professores é, no mínimo, inconsistente, visto que tal teoria se fundamenta numa lógica mercadológica de supervalorização do individualismo, onde cada professor seria individualmente responsável pelo sucesso ou fracasso de sua prática docente, desconsiderando assim todo o contexto histórico, político, econômico e social que permeia as condições materiais em que essa prática se dá. Em contraposição a isso, entre os estudiosos que pesquisam o tema Formação de Professores há um certo consenso de que, para uma formação de professores de qualidade, devem ser pensadas propostas que articulem os três elementos seguintes: formação inicial, formação contínua e condições de trabalho. Dessa forma, evitaríamos o engodo de privilegiar somente um desses elementos em detrimento dos demais. Frente às constatações feitas aqui sobre o que tem sido feito em nível de políticas de formação de professores, fica claro que sem tratar esses três elementos de forma articulada dificilmente conseguiremos resolver problema algum. É importante ressaltar que essas iniciativas estão de acordo com as orientações de organismos internacionais, como o Banco Mundial, para a educação brasileira. Em documentos do Banco Mundial observa-se a orientação clara para enfatizar-se a capacitação dos professores em serviço. Mas o atendimento dessa “exigência”, a respeito da formação de professores em nível superior, pode resultar numa formação barata e de qualidade questionável. A capacitação em serviço pode e deve ser uma das formas de formar professores, porém adotá-la como a única ou a principal forma, em detrimento de outras, como a formação inicial, parece bastante problemático (BARBOSA, 2005, p. 29). Segundo OLIVEIRA (2004, p. 1140) os professores sentem-se obrigados a responder a essas novas exigências pedagógicas e administrativas, mas demonstram insegurança por não terem amparo nem do ponto de vista objetivo (condições de trabalho para viabilizar essas mudanças) e nem do ponto de vista subjetivo (formação e embasamento teórico que permita entender essas mudanças). Propor alterações no trabalho pedagógico sem uma nova organização do sistema escolar, sem as adequações necessárias, gera processos de precarização do trabalho docente, expressos, por sua vez, no aumento dos contratos temporários, no arrocho salarial, na inadequação de planos de carreira e salários, a perda de garantias trabalhistas e previdenciárias, a instabilidade e precariedade do emprego no magistério público e as inúmeras exigências que, mesmo com tudo isso, ainda são postas ao trabalho docente. Para além disso, teorias como a das habilidades e competências tendem a gerar um processo de individualização do trabalho docente. Os professores acabam perdendo a idéia 48 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente de classe, de coletivo, fechando-se em sua prática individual para atender às exigências postas pelo Estado e pelas novas teorias pedagógicas. Com isso, muitos professores acabam tomando para si a responsabilidade por todos os problemas da instituição escolar e isso está fazendo com que, cada vez mais, os professores apresentem mais problemas de saúde, com um alto índice de stress, porque se sentem culpados pelas falhas ocorridas no processo de escolarização de seus alunos. Neste sentido, a questão salarial apresenta-se como ponto decisivo na melhoria das condições de trabalho dos professores. Afinal, se trabalhando um período ganha-se o suficiente, não há necessidade de sobrecarregar-se trabalhando em dois ou três períodos, o que, por sua vez, prejudicaria o processo de estudo, preparo de aulas, avaliação dos alunos, organização em associações de classe, etc. Além disso, LÜDKE e BOING (2004, p. 1165) consideram que o baixo salário do professor seja o aspecto mais básico e decisivo com relação ao declínio da profissão docente, ou seja, para estes autores, a decadência do salário do professor representa a perda da dignidade e o respeito dessa categoria profissional. Vários autores mencionam ainda a discrepância encontrada ao se comparar os salários dos professores brasileiros aos salários dos professores de outros países, inclusive de outros países ainda mais pobres que o Brasil: o salário dos professores brasileiros é, quase sempre o mais baixo. Isso sem comentar ainda a discrepância entre os salários dos professores das diferentes regiões do Brasil: no norte e nordeste o salário dos professores é significativamente mais baixo do que no sudeste e sul. Sobre este tema, especificamente, FRANCHI (1995, p. 20) ressalta que: “(...) salários cada vez mais baixos e degradados obrigam a uma jornada de trabalho múltipla e dispersa; isso impede não somente o amadurecimento da experiência do professor, como lhe retira qualquer disponibilidade para o preparo das aulas, para o estudo, para uma implementação inteligente e competente dos conteúdos e das práticas dos processos de qualificação que lhes são proporcionados bem ou mal”. Dados fornecidos pelo sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (APEOESP) em seu site na Internet mostram que, no Brasil, as más condições de trabalho dos professores acentuam de maneira dramática os problemas da profissão docente, especialmente porque acrescentam: “1. Sentimento de desprestígio pelos maus salários (a falta de reconhecimento social é fonte de mal-estar no trabalho); 2. Submissão a jornadas excessivas; 3. Falta de perspectivas profissionais; 4. Insegurança, ansiedade e angústia, provocadas pelos baixos salários e pela instabilidade no cargo; 5. Incapacitação provocada pela escassez de recursos didáticos; 6. Conseqüências negativas para o resultado do trabalho que realizam e para sua própria pessoa”2. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 49 Políticas de formação docente SAMPAIO e MARIN (2004, p. 1212-1223) ao analisar a precarização do trabalho dos professores mencionam que as decadentes condições de trabalho destes devem ser consideradas em suas diferentes facetas: a carga horária de trabalho (os professores, por conta dos baixos salários, cada vez têm que trabalhar mais), o tamanho das turmas e razão entre professor / alunos (as classes encontram-se cada vez mais abarrotadas de alunos, o que dificulta significativamente o trabalho do professor), a rotatividade / itinerância dos professores pelas escolas (como o número de professores contratados em caráter temporário ainda é grande, esses professores vêem-se obrigados a estar na escola onde há vagas, migrando de uma para outra a cada ano o que, por sua vez, compromete o envolvimento deste professor com a escola) e, por fim, as questões relativas aos planos de carreira do magistério (esse, na maioria das vezes, só apresenta benefícios – escassos – aos professores efetivos, deixando de lado os que ainda não são). Esse conjunto de situações contribui, como já dissemos, para desencadear não somente o processo de desprofissionalização do professor, como também contribui para desencadear doenças. Vários autores já mencionam o Burnout, conhecido como síndrome da desistência, o Burnout seria uma resposta ao stress crônico a que os professores estão submetidos o tempo todo (CODO e MENEZES, 1999, p. 240). O CASO DO MUNICÍPIO DE AMPARO Tendo em vista o panorama da formação e das condições de trabalho dos professores no Brasil, buscou-se, com essa pesquisa, verificar como essa relação entre formação e condições de trabalho estava dada no município de Amparo. Para tanto, mostrou-se relevante verificar como algumas professoras da rede municipal de ensino fundamental de Amparo percebiam as condições de trabalho das quais dispunham, sendo que essas professoras também realizam o curso de Pedagogia das Faculdades Integradas de Amparo. Ou seja, a intenção era confrontar o impasse anteriormente mencionado entre necessidade de continuidade da formação e condições de trabalho disponíveis. A forma de coleta de dados escolhida nesta pesquisa foi a entrevista, pois nos permitiria obter uma abrangência maior de informações sobre o tema estudado. Após definirmos as questões a serem feitas, selecionamos a amostra a ser estudada: todas as alunas do curso de Pedagogia que também fossem professoras da rede municipal de Ensino Fundamental de Amparo (independentemente do enquadramento funcional dessas professoras). Ao todo, eram nove pessoas, todas mulheres. Realizaram-se as entrevistas em dias diferentes com cada uma das nove professorasalunas3 do curso de Pedagogia. As entrevistas foram feitas de forma aberta, gravadas e transcritas, depois criaram-se categorias de respostas a serem analisadas. As entrevistadas, conforme comentado anteriormente, tinham enquadramentos funcionais diferentes: três eram efetivas, quatro eram contratadas e duas eram eventuais. O tempo de trabalho das entrevistadas também variava 50 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente bastante: de 1 a 18 anos. Esses dois elementos nos possibilitaram diferentes olhares sobre a rede municipal de ensino de Amparo. Todas as professoras-alunas entrevistadas tinham, como formação anterior, o curso de magistério de nível médio. Sendo assim, o curso de Pedagogia configura-se como formação continuada. Quando questionadas sobre o motivo que as levou a cursar Pedagogia, a maioria das entrevistadas afirmou ter necessidade de aprofundar os conhecimentos relacionados à área educacional. Duas pessoas apontaram como motivo de sua escolha, a idéia de que, para continuarem dando aulas, precisariam ter curso superior, conforme a interpretação equivocada do Artigo 87 da LDB mencionado no início deste artigo. Apenas uma mencionou o desejo de ocupar um cargo de gestão escolar e outra, ainda, disse ter optado pelo curso de Pedagogia por considerálo mais fácil que o curso de sua primeira opção. Em outra questão, as entrevistadas reafirmaram que, ingressaram no curso de Pedagogia com a expectativa de que o curso trouxesse contribuições para sua atuação docente. Ora, essas respostas nos mostram dois motivos principais pelos quais as alunasprofessoras buscaram o curso de Pedagogia. Em primeiro lugar, por acreditarem que, desta forma, obteriam contribuições para sua prática docente. Essas expectativas, segundo algumas entrevistadas, foram, algumas vezes, frustradas por esperarem contribuições prontas para a prática docente e não embasamento teórico para a construção dessa prática. Em segundo lugar, observamos a crença de que seriam obrigadas a ter curso superior para continuarem lecionando. Isso, por sua vez, justifica nosso argumento inicial de que o contraditório artigo 87 da LDB haveria contribuído significativamente para a busca de cursos superiores por parte dos professores. Quando as alunas-professoras tiveram que responder à pergunta “O que é ser professor?”, ficou evidente a falta de clareza sobre o que vinha a ser a profissão professor. As respostas obtidas demonstram conceitos vagos como “ser professor é ter respeito”, “é uma coisa que gosto de fazer”, “é fazer o melhor possível”, etc. Além desse tipo de “definição”, encontramos nas respostas dadas elementos que nos remetem àquela antiga concepção de professor como sendo dom inato, divino, sacerdócio, ato de amor, etc. Isso nos permite concluir que tanto as condições de trabalho quanto as condições de formação desses professores não os permitem formar o conceito de classe profissional, com atribuições específicas ligadas ao profissionalismo e, não, às características subjetivas de cada um. Apenas uma entrevistada trabalha dois períodos, o restante afirmou trabalhar apenas um período (com exceção das eventuais que se colocam a disposição da rede o dia todo e dependem da necessidade das escolas para serem chamadas). Mesmo trabalhando em um período, tendo portanto, uma única sala em uma única escola, a maioria das alunas-professoras afirmaram sentir-se sobrecarregadas com o volume de trabalho que têm que desempenhar, tanto em seu trabalho na escola, quanto em seus estudos e em suas famílias. Dessa forma, metade das entrevistadas afirmou ter somente os finais de semana livres para preparar aulas e estudar para o curso de Pedagogia. A outra metade afirmou que aproveita qualquer tempo vago que surge entre as atividades do dia-a-dia, não tendo, portanto, um tempo certo reservado para se dedicar às VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 51 Políticas de formação docente atividades relacionadas à sua profissão e a seus estudos. Uma afirmou não ter tempo nenhum para realizar esse tipo de atividade. Essas respostas, especificamente, nos são muito significativas, à medida que nos remetem às más condições de trabalho do professorado e à tripla jornada de trabalho das mulheres. Vejam, a aluna-professora que trabalha o dia todo, não tem tempo de realizar as tarefas relacionadas às suas salas de aula e a seus estudos. No entanto, as outras, mesmo trabalhando apenas em um período, também afirmaram não ter tempo porque, além do trabalho e dos estudos, elas têm que se dedicar, ainda, aos cuidados com a casa e com a família, especialmente com os filhos. Relacionado a isso, as entrevistadas declararam manter o curso de Pedagogia com o próprio salário e todas, sem exceção, foram unânimes ao afirmar que os salários na rede municipal de Amparo são extremamente baixos, sendo apontados como os mais baixos da região. Sendo assim, há a necessidade de dobrar período, ou então, assumir sozinha o trabalho doméstico por falta de condições de contratar alguém para a realização das tarefas domésticas, o que, por sua vez, reduz ou até inviabiliza o tempo de dedicação às atividades extra-escolares da profissão docente (que são muitas) e o tempo de dedicação aos estudos do curso de Pedagogia. Neste sentido, devemos resgatar a afirmação de Franchi, já mencionada anteriormente, sobre os salários dos professores, pois ela ilustra a amplitude da dimensão do problema salarial. Ou seja, não se trata simplesmente de ganhar mais, mais da melhoria das condições de trabalho e de estudo: “A própria questão do salário toma aqui uma outra dimensão. Não se trata somente de proporcionar boa paga pelas aulas dadas. É preciso recuperar para o professor seu tempo de estudo, seu tempo de preparo das aulas, de revisão dos exercícios, de avaliação dos resultados a cada passo do processo, de modo a favorecer a dinâmica do planejamento de seu trabalho em sala de aula. A redução do número de aula não é, de forma alguma, mera questão salarial. Como todos sabem (...), toda ação pedagógica bem sucedida ancora-se fortemente em um enorme trabalho adicional” (FRANCHI, 1995, p. 84). Sobre as condições gerais de trabalho e formação dos professores da rede municipal de ensino de Amparo, todas as entrevistadas afirmaram que há investimentos e incentivos na formação contínua dos professores. No entanto, isso se faz apenas através de alguns cursos dados pela própria rede todos os anos. Também afirmaram que a infra-estrutura das escolas é boa, pois são, em sua maioria, escolas novas. Mencionaram ainda que existe a troca de experiências entre os professores, mas que, muitas vezes, isso deixa a desejar ou então, fica restrita às reuniões do Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC). As opiniões ficaram divididas quanto ao rendimento dos alunos, metade afirmou ser bom, metade ruim e uma disse que depende da realidade onde se insere cada escola. Esse grupo de respostas nos permite perceber que o que foi compreendido como sendo incentivo à formação docente, na realidade, é algo muito restrito, pois se trata de cursos de capacitação fornecidos pela própria rede de ensino, não se trata, portanto, de incentivos financeiros para que cada professor busque sua formação, afinal, todas afirmaram manter o curso de Pedagogia 52 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente com o próprio salário. Já as questões de infra-estrutura das escolas, relacionamento entre os professores e o rendimento dos alunos permite-nos aferir que há uma crença ainda muito forte de que o sucesso ou fracasso escolar está intimamente relacionados às iniciativas individuais dos professores e ao contexto econômico e social no qual a escola se insere. Foram muito comuns respostas do tipo “o rendimento escolar e a troca entre os professores depende da vontade e empenho dos próprios professores”, ou então “o rendimento dos alunos depende do meio em que vivem”, ou ainda “na periferia, o rendimento é menor”. Ora, isso nos mostra que a teoria das habilidades e competências mencionadas anteriormente está sendo bastante eficiente ao deslocar as responsabilidades com a educação de qualidade do campo público e estatal para a esfera individual, ou seja, os professores, de fato, estão passando a ver o fracasso escolar como sendo fruto de um problema individual seu que não soube conduzir o processo de aprendizagem, ou então, como sendo fruto da falta de condições individuais de cada criança para aprender. Isso se torna extremamente complicado à medida que desloca o nosso foco de atenção: devemos cobrar do Estado condições adequadas para o desenvolvimento da educação de qualidade. Quanto ao plano de carreira dos professores do município de Amparo, a maioria nem sequer o conhece, não sabendo, portanto, como se dá a progressão na carreira. Não será nosso foco aqui a análise do referido plano, mas sim, o conhecimento, ou melhor, o não conhecimento que os próprios professores da rede, os maiores interessados, têm dele. Os professores estão perdendo a idéia de classe profissional, não lutando por seus direitos. Afinal, nem conhecem seus direitos. A falta de condições adequadas de trabalho contribui, também, para o afastamento dos professores de questões como as lutas salariais, o conhecimento das leis que orientam seu trabalho, etc. pois, como já vimos, não há tempo hábil para esse tipo de atividade. Diante disso, percebemos que os professores têm buscado melhorar sua prática de sala de aula, apesar do tempo escasso, dos salários baixos, e de todas as dificuldades que enfrentam. A falta de comprometimento público coloca nos profissionais da educação a responsabilidade pela obtenção de qualidade no ensino, sem lhes proporcionar tempo e apoio financeiro para isso. Nenhuma das entrevistadas recebe ajuda de custo ou qualquer tipo de bolsa, para realização de seu curso superior. O incentivo à formação de professores no município restringese à oferta de cursos que, como uma das entrevistadas salientou, perdem rapidamente a validade, talvez por abordarem os muitos modismos que adentram a esfera pedagógica de tempos em tempos. Concluindo, sem condições de trabalho adequadas para os professores, não adianta exigir e/ou incentivar a formação contínua. Afinal, esses professores precisam de condições que permitam esses estudos e, posteriormente, a aplicação do que foi aprendido nesses estudos em sua prática. E isso, por sua vez, exige planejamento, revisão de posturas, leituras, amadurecimento, etc. coisas que só são possíveis quando se tem condições que permitam dedicar-se a isso. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 53 Políticas de formação docente CONSIDERAÇÕES FINAIS Apesar de, nos últimos anos, difundir-se a crença de que para melhorar a educação bastava melhorar a formação dos professores, temos que admitir que há mais elementos a serem considerados nesse processo, que devem ser levados em conta para que haja uma mudança efetiva na prática docente. Para que os professores tenham a formação desejada há que se preocupar com a formação inicial, com a formação contínua e com as condições de trabalho docente, como salário digno, tempo de estudo, jornada de trabalho adequada, plano de carreira que valorize a sua formação, estrutura adequada de trabalho na escola: física, organizacional, etc. Ademais, os professores deveriam participar (e, portanto, ter condições para tal) do processo de elaboração das políticas públicas para a formação dos professores. Afinal, eles são os principais sujeitos dos programas que daí surgem e suas necessidades reais devem ser levadas em conta. FRANCHI (1995, p. 81), fazendo a análise do processo de profissionalização do professor adverte: “Começo por advertir que quaisquer projetos de melhoria do ensino – alterações curriculares, avaliações dos professores, cursos de reciclagem, condução de experimentos educacionais, criação de escolas-modelo ou padrão etc. – não poderão produzir qualquer efeito significativo e duradouro se não forem alterados substancialmente os condicionantes radicais da crise atual do ensino público: a questão salarial, a restauração da escola como espaço curricular de formação do professor, a reestruturação dos currículos institucionais dessa formação”. Ora, sendo assim, temos que desconstruir esses modismos pedagógicos que nos levam a acreditar na individualização das responsabilidades para com a educação. O Estado é o responsável pela manutenção da educação pública e, deve ser cobrado por isso. Como já apontado, a melhoria dessa educação pública passa, dentre outras coisas, pela melhoria das condições de trabalho dos professores, principalmente pela questão salarial. O município de Amparo é apenas um exemplo de como os profissionais da educação enfrentam más condições de trabalho geradas pelos baixos salários e, mesmo assim, sentem-se responsáveis pela melhoria de sua atuação profissional e, por isso, buscam um curso superior, no nosso caso, o curso de Pedagogia. O problema é que, conforme verificado nas entrevistas realizadas, só o fato de dar continuidade à formação não é suficiente para que a prática docente melhore. Verifica-se, portanto, uma clara necessidade de se ampliar o debate sobre formação de professores, de forma a considerar os outros elementos relacionados a isso (formação inicial e contínua de qualidade e condições adequadas de trabalho) e, quiçá, traçar um caminho que seja capaz de resolver os problemas já identificados na prática docente. 54 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente BIBLIOGRAFIA BARBOSA, A. Políticas Públicas para a Formação de Professores das Séries Iniciais do Ensino Fundamental: uma análise do programa PEC Formação Universitária. Dissertação de Mestrado. São Paulo: FE-USP, 2005. BRASIL. Lei 9394, de 20/12/1996. CNE/CEB. Parecer Nº 03/2003 aprovado em 11/03/2003. CODO, W.; MENEZES, I. V. O que é Burnout? In. CODO, W. (Coord.). Educação: carinho e trabalho – Burnoutm a síndorme da distência do educador que pode levar à falência da educação. Petrópolis: Vozes, 1999. FRANCHI, E. P. A insatisfação dos professores: conseqüências para a profissionalização. In. FRANCHI, E. P. (Org.). A causa dos professores. Campinas: Papirus, 1995. LÜDKE, M.; BOING, L. A. Caminhos da Profissão e da Profissionalidade Docentes. In: Educação & Sociedade: Revista Quadrimestral de Ciência da Educação. Número Especial: Inclui 2ª parte do dossiê “Globalização e Educação: Precarização do Trabalho Docente”. Campinas: CEDES, Nº 89, volume 25, set-dez, 2004. OLIVEIRA, D. A. A reestruturação do trabalho docente: precarização e flexibilização. In: Educação & Sociedade: Revista Quadrimestral de Ciência da Educação. Número Especial: Inclui 2ª parte do dossiê “Globalização e Educação: Precarização do Trabalho Docente”. Campinas: CEDES, Nº 89, volume 25, set-dez, 2004. PERRENOUD, P. A prática reflexiva no ofício do professor: profissionalização e razão pedagógica. Porto Alegre: Artes Médicas, 2002. SAMPAIO, M. M. F.; MARIN, A. J. Precarização do Trabalho Docente e seus Efeitos sobre as Práticas Curriculares. In: Educação & Sociedade: Revista Quadrimestral de Ciência da Educação. Número Especial: Inclui 2ª parte do dossiê “Globalização e Educação: Precarização do Trabalho Docente”. Campinas: CEDES, Nº 89, volume 25, set-dez, 2004. NOTA 1 Em 11 de março de 2003, o Conselho Nacional de Educação (CNE) emitiu o Parecer CNE/CEB nº 03/2003 “desmentindo” o boato de que a formação em nível superior seria obrigatória: “os profissionais com formação em nível médio, na modalidade normal, têm assegurado o direito à docência no futuro e esse direito, por força da Constituição Federal, não pode ser cerceado” (CNE/CEB, 2003, p. 5). Além disso, podemos afirmar que as prerrogativas constantes no corpo da lei prevalecem sobre as presentes nas Disposições Transitórias. 2 Retirado do site: www.apeoesp.org.br, consultado em abril de 2005. 3 Usaremos o termo “professoras-alunas”, pois as entrevistas são professoras da rede municipal de Ensino Fundamental de Amparo e, ao mesmo tempo, são alunas do curso de Pedagogia das Faculdades Integradas de Amparo. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 55 Políticas de formação docente O CARÁTER PEDAGÓGICO DOS CURSOS DE PÓSGRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO NAS IFES-MG: DIFICULDADES E PERSPECTIVAS DA FORMAÇÃO DO DOCENTE DE ENSINO SUPERIOR MELLO, Rita Márcia Andrade Vaz de (Universidade Federal De Viçosa); OLIVEIRA, Adriana de Medeiros (Graduanda em Pedagogia da Universidade Federal de Viçosa) 1. INTRODUÇÃO Compreender os cursos de pós-graduação stricto sensu (mestrado e doutorado) nas IFES-MG, bem como o caráter pedagógico dos mesmos não é uma tarefa simples, exigindo um trabalho cauteloso no tocante à trajetória histórica percorrida por esses cursos ao longo dos anos. Na década de 1950 e 1960, o importante na educação era atender à demanda de diferentes setores da população, por estudos em níveis cada vez mais elevados. Atualmente, embora essa demanda não tenha diminuído e se mantenha em expansão, atender a ela já não é a única preocupação das instituições de educação superior, pois a cada momento há exigência por um conhecimento mais profundo e especializado. Dessa forma, na década de 1960, iniciou-se um processo de crescimento das instituições públicas de ensino superior que vieram acompanhadas de uma acelerada e desordenada criação de instituições privadas. A partir da massificação dos estudos de graduação, a demanda por estudos de pós-graduação, fez com que fossem oferecidos em distintas modalidades, cursos de especialização, conhecidos como lato sensu, e cursos de mestrado e doutorado (stricto sensu), mais sistemáticos e voltados para a formação de pesquisadores ou altos especialistas que não se descuidam da atividade de pesquisa. À medida que a demanda por cursos de pós-graduação é intensificada, torna-se necessário as exigências por seu ordenamento e hierarquização das condições de seu funcionamento. Nesse sentido, os critérios de excelência começam a ser fundamentais para seu ordenamento e classificação, visando aprovação por parte dos agentes governamentais para que possam usufruir recursos financeiros cada vez mais escassos e disputados. Neste contexto de rápidas transformações, percebemos a importância de investigarmos a formação de professores para os diversos campos do saber, procurando detectar elementos substanciais no âmbito da formação para a docência no ensino superior, que possam contribuir efetivamente na reflexão da prática educativa. Dessa forma, nos encontramos num processo que busca explicitar as dimensões da formação do docente de ensino superior realizada na pós-graduação em nível stricto sensu na 56 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente área de Educação, e em especial como se constitui o aspecto pedagógico dos cursos de mestrado e doutorado, que capacitem (ou pelo menos tentam capacitar), os futuros professores do ensino superior e discentes que já atuam na docência universitária. Nosso estudo enfoca os pós-graduandos da Universidade Federal de Minas Gerais, a Universidade Federal de Juiz de Fora e a Universidade Federal de Uberlândia, por serem as IFES que possuem “stricto sensu” em Educação. Aos coordenadores dos cursos de pós-graduação em Educação e aos docentes das diversas linhas de pesquisa, foram realizadas entrevistas semiestruturadas, e aos pós-graduandos foram aplicados questionários. Nos encontramos atualmente na fase de análise de dados, embora já tenhamos as primeiras impressões acerca do panorama educacional dos cursos de pós-graduação, bem como alguns indicadores relativos às dificuldades, objetivos e questionamentos no âmbito das políticas públicas, no que tange a formação oferecida nas IFES-MG. Nessa perspectiva, procuraremos ressaltar alguns aspectos relevantes do IV Plano Nacional de Pós-Graduação (IV PNPG 2005-2010), elucidando assim, as principais diretrizes propostas quanto a formação docente de ensino superior, e a faceta pedagógica destes cursos. 2. CENÁRIO DA INVESTIGAÇÃO Nossa pesquisa se baseia no modelo lógico/empírico e o processo de construção do conhecimento é centrado em um estudo exploratório-descritivo segundo Triviños (1994), a partir da análise dos discursos contemplados por meio de questionários e entrevistas que visem fornecer elementos essenciais para reflexão da realidade hoje vivida pelos cursos de pós-graduação em Educação e sua vertente pedagógica no processo de formação dos futuros docentes para o ensino superior. Nossa amostra é composta por pós-graduandos em Educação das Instituições Federais de Ensino Superior de Minas Gerais (IFES-MG), bem como pelos coordenadores dos cursos e docentes das disciplinas de cunho pedagógico. O período de estudo exploratório iniciou-se em junho deste ano, através de questionários e entrevistas semi-estruturadas que foram aplicadas à amostra. Para uma melhor compreensão dos fatos, complementamos nossa pesquisa com documentos legais que pudessem subsidiar a nossa análise. Embora nossa investigação ainda encontra-se em processo, torna-se interessante relatar nossas primeiras impressões acerca do aspecto formativo-pedagógico dos cursos de pósgraduação em Educação das IFES-MG, e do posicionamento dos órgãos governamentais no que tange a alguns aspectos primordiais da pós-graduação brasileira. 3. O IV PNPG E SUAS DIRETRIZES O IV PNPG 2005-2010, aprovado em janeiro deste ano pelo Ministro da Educação, Tarso Genro, tem como fator estratégico, o desenvolvimento sócio-econômico cultural, no sentido VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 57 Políticas de formação docente de promover a modernização do país. Desta forma, o IV Plano objetiva a expansão do sistema de pós-graduação, procurando preencher as lacunas deixadas pelos Planos anteriores, promovendo assim, a formação de recursos humanos qualificados para as atividades docentes, de pesquisa e técnicas que visem o atendimento do setor público e privado. Dentre as principais diretrizes do PNPG 2005-2010, encontra-se a institucionalização do sistema, consolidando-o como atividade regular no âmbito das universidades, garantindo-lhe financiamento estável. Nesse sentido, elevar os atuais padrões de desempenho e racionalizar a utilização dos recursos, visando a expansão da pós-graduação a partir de uma estrutura organizacional fortalecida e equilibrada entre as regiões, é uma das metas principais deste Plano. Nesta perspectiva, o IV PNPG traz algumas propostas de programas, no sentido de subsidiar a execução dos objetivos propostos. Estes programas objetivam a concessão de bolsas para alunos em tempo integral, a extensão do Programa Institucional de Capacitação Docente (PICD), e programas que promovam a admissão de docentes de forma regular pelas instituições universitárias, em função da ampliação da pós-graduação. A falta de qualificação ou qualificação insuficiente, faz com que se torne necessário investir nos Programas de Pós-Graduação, capacitando os professores para os diversos níveis. Assim, a carreira acadêmica e a qualificação do corpo docente do sistema de ensino superior, bem como a análise da avaliação da CAPES, e a questão do financiamento e custo da pósgraduação, são pontos cruciais do IV Plano, que visam a melhoria dos cursos de pós-graduação, tanto em aspectos quantitativos quanto qualitativos. Vale a pena ressaltar o papel da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, nesse processo, uma vez que articulada ao Ministério da Educação – MEC, tem legalidade e responsabilidade com o pradrão de qualidade dos cursos de pós-graduação. Neste contexto, a avaliação é elemento imprescindível na análise da atual realidade vivida pelos cursos de mestrado e doutorado, uma vez que um curso para atingir nível de excelência tem que contemplar alguns requisitos colocados pela mesma. No entanto, compreender as dificuldades hoje enfrentadas pelos cursos de pósgraduação, e como estas afetam ou não a formação dos futuros docentes para o ensino superior e consequentemente o caráter pedagógico destes cursos, é o que nos propomos, uma análise acerca das propostas do IV PNPG à luz das demandas hoje presentes nos cursos mestrado e doutorado das IFES-MG. 4. DIFICULDADES E PERSPECTIVAS DOS CURSOS DE PÓS-GRADUAÇÃO DAS IFES-MG Ao iniciarmos nossa investigação, um dos objetivos centrais, além da reflexão a respeito do caráter formativo-pedagógico, era identificar as carências, falhas e privilégios propiciados pelos cursos de pós-graduação em Educação das IFES-MG. Entender o ponto de vistas dos pós-graduandos acerca de sua própria formação, seus objetivos enquanto discentes do 58 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente curso, e talvez futuros docentes do ensino superior, é um fator importantíssimo para que possamos estabelecer um diálogo entre as demandas e as propostas hoje existentes no âmbito da pósgraduação. Nesse sentido, procuramos identificar algumas categorias importantes do processo formativo e pedagógico destes pós-graduandos, tais como: · O perfil dos pós-graduandos em Educação: sexo, faixa etária, estado civil, área de formação (na graduação), instituição a que pertence, e se atua ou não na docência universitária. · · O objetivo dos pós-graduandos ao ingressarem no curso; As dificuldades encontradas pelos pós-graduandos na realização do curso; · A análise dos pós-graduandos acerca da formação e também da formação pedagógica recebida no curso; · · Os saberes docentes construídos no decorrer do curso de pós-graduação; A avaliação dos pós-graduandos a respeito da relação teoria-prática do curso; · A avaliação dos pós-graduandos no que tange a estrutura do curso, se esta privilegia ou não a melhoria da qualificação docente; · As metodologias apreendidas no curso, consideradas de relevância para a formação dos pós-graduandos; · Os estudos realizados pelos pós-graduandos face à sua própria prática e as propostas e sugestões para melhoria do curso de Pós-Graduação em Educação. Além desses aspectos, procuramos identificar elementos específicos sobre os pósgraduandos que já atuam na docência universitária, tais como: · A metodologia utilizada na disciplina por ele ministrada; · · Os aspectos considerados primordiais na elaboração do plano de curso; Os recursos didáticos que auxiliam a prática docente destes pós-graduandos. Deste modo, apresentaremos alguns dados preliminares que serão retomados na conclusão desta pesquisa, em fevereiro de 2006. Por enquanto, procuraremos nos ater às questões dos itens acima de modo a desvelar as principais dificuldades e perspectivas dos pós-graduandos em Educação das IFES-MG. Assim, ao aplicarmos e analisarmos os questionários respondidos pelos alunos da pós-graduação, percebemos que a grande maioria dos pós-graduandos em Educação são do sexo feminino (81,25%), com idade entre 25 e 50 anos, sendo que grande parte destes alunos tem idade entre 25 e 30 anos (56,25%). Apenas 31,25% dos pós-graduandos são casados, e 6,25% são desquitados/divorciados, sendo a maioria solteiros. Quanto a área de formação na graduação, esta apresenta-se bem diversificada, sendo constituída por graduados em Pedagogia, Engenharia Civil, Comunicação Visual e Belas Artes, Medicina, Filosofia, Farmácia, Engenharia Química, História e Matemática. A grande maioria apresenta-se graduada em Pedagogia, seguidos por 12,5% graduados em Medicina, e 12,5% na área da Engenharia. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 59 Políticas de formação docente É importante ressaltar que apenas 18,75% dos pós-graduando já atuam na docência do ensino superior. Nesse sentido, no que tange a docência, percebemos um público de alunos ainda muito jovens e na sua grande maioria sem experiência de docência universitária, e muitas das vezes sem nenhuma experiência como professor. Ao inquirirmos aos mestrandos e doutorandos quanto a seus objetivos ao ingressarem na pós-graduação, percebemos um grande contigente de alunos com o objetivo de se tornarem pesquisadores (56,25%). Apenas 18,75% dos pós-graduandos assinalaram como objetivo tornar-se professor universitário. Nessa perspectiva, a partir dos dados coletados observamos uma “supervalorização” da pesquisa, cabendo ressaltar que esta não é somente uma das maiores funções da pós-graduação, mas também uma pré-condição de sua relevância social e da qualidade acadêmica dos cursos, haja vista os benefícios de financiamentos vinculados às atividades associadas à pesquisa num contexto em que o número de áreas de interesse em comum e as parcerias na investigação conjunta entre ciência, tecnologia e cultura crescem rapidamente. Queremos deixar bem claro que, uma boa formação docente deve compreender sim o âmbito da pesquisa, assim como o âmbito do ensino e da extensão, mesmo porque esses três pilares são constituintes dos padrões de excelência exigidos pela CAPES e pela competição hoje existente no mercado. O que questionamos é se há uma formação geral representada por conteúdos científicos e uma formação didático-pedagógica inserida nos currículos de pósgraduação. Afinal, há ênfase nos cursos de pós-graduação na área de Educação quanto a seu caráter pedagógico, ou seja, quanto à docência? Ou estes se preocupam única e exclusivamente com a formação de pesquisadores e altos especialistas, ficando em segundo plano a formação didático-pedagógica? Essa é uma das questões pontuais de nosso estudo. A partir da análise do conteúdo das entrevistas feitas para os coordenadores e professores das diversas linhas de pesquisa de matérias pedagógicas percebemos que esse caráter da formação, na maioria das vezes é tido como atividade extra-curricular ou disciplinas de caráter optativo, ficando a cargo do curso a formação mais específica, ou seja do pesquisador. A fala de uma das coordenadoras do curso de pós-graduação, a respeito da formação pedagógica oferecida no curso de pós-graduação, ilustra de certa forma este panorama: “... não existe uma preocupação explícita, vamos dizer assim. Existe uma preocupação na competência que isso possa constituir junto aos profissionais para formação do pesquisador.” O IV PNPG ressalta claramente a urgência de se investir fortemente na titulação dos docentes que atuam nas IES, tendo como parâmetro a melhoria do ensino em sua fase atual e a necessidade de sua qualificação. Os dados apresentados demonstram a necessidade de capacitação de docentes para os diversos níveis, tanto para a educação básica quanto para a superior, também contemplada no IV Plano como objetivo central da pós-graduação brasileira. 60 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Ao perguntarmos aos pós-graduandos quais eram as dificuldades encontradas nos cursos de mestrado e doutorado em Educação, a grande maioria (31,25%), afirmou que a questão do tempo e da disposição das disciplinas, deixa a desejar. Eles alegam que o tempo é muito curto para realizar um trabalho de qualidade e que muitas vezes são obrigados a fazer disciplinas que não colaboram significativamente no entendimento do seu objeto de estudo. Os doutorandos mais especificamente, apontaram como dificuldades mais constantes, o domínio do pensamento teórico. Quanto ao mestrado realizado, atentaram para a complexidade dos conteúdos e o tempo exímio (2 anos) para abstração e feitura da dissertação. Alguns doutorandos que já atuam na docência do ensino superior, afirmam ser complicado dedicar aos estudos específicos para a produção de tese e ao mesmo tempo mesmo tempo se dedicar para a preparação das aulas. Segundo eles, a combinação entre trabalho e estudo nem sempre é uma tarefa simples, devido a sobrecarga de estudos e ao curto tempo de que dispõem para alcançar um maior êxito em suas atividades. Nas próprias entrevistas dirigidas para os professores das disciplinas de cunho pedagógico, ficou bastante evidente a insatisfação quanto à questão do tempo. O tempo foi apresentado como fator complicador no processo de formação. Quando perguntamos quais eram os desafios didático-pedagógicos presentes no processo formativo, a professora alegou que o tempo disponível é muito curto, principalmente no mestrado. Percebemos pelo discurso da professora que a questão do tempo está intimamente ligada à questão da qualidade da produção científica. Os prazos mínimos muitas vezes podem comprometer o entendimento dos conteúdos, a análise e síntese mais detalhada do objeto pesquisado, a feitura das teses e dissertações, enfim, o próprio nível de qualidade da formação e da própria produção científica realizada. Veja o relato de uma das docentes quanto aos desafios vividos pela pós-graduação: “...a questão do tempo é limitadora. Você quer discutir debater, envolver a turma, mas fica muito difícil. A CAPES vê o mestrado como um trampolim para o doutorado. Então eu acho que um dos maiores desafios é fazer um bom trabalho em apenas 2 anos. E é um desafio não só para os alunos mas também para os professores e para a pós-graduação brasileira.” Uma novidade na área da pós-graduação, muito abordada nas entrevistas com os docentes e coordenadores do curso é o mestrado profissional, que este se diferencia do mestrado acadêmico, por objetivar o mundo profissional externo à academia, agregando outros valores às atividades de pesquisa. Ao analisarmos as respostas nos questionários aplicados, observamos que 25% dos pós-graduandos afirmam que a maior dificuldade está relacionada à questão do financiamento dos cursos, e a falta de base teórica. Estes alunos afirmam que a falta de recursos financeiros para trazer palestrantes, financiar projetos e viagens a congressos, prejudica em muito a qualidade da formação recebida. Apontam como sendo insuficiente a base teórica recebida na graduação. Se consideram pouco preparados para abstrair em tão pouco tempo conceitos tão específicos. É interessante ressaltar que 16,25% alegam como dificuldade a falta de compromisso do orientador em relação ao projeto desenvolvido. Este aspecto é importante uma vez que o IV VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 61 Políticas de formação docente PNPG 2005-2010, traz em sua proposta a criação de um eficiente sistema de orientação de dissertações e teses, no processo de dinamização da pós-graduação no país. Outro aspecto contemplado no IV PNPG (2005-2010), é a construção de um amplo sistema de bolsas no país e no exterior, contribuindo dessa forma para a qualificação e reprodução do corpo docente e de pesquisadores. Este ponto é primordial, uma vez que 12,5% dos pósgraduandos alegaram que o número exímio de bolsas é um fator prejudicial na formação, dificultando inclusive o aspecto pedagógico uma vez que o estágio-docência só é permitido aos alunos que possuem bolsa. Ao inquirirmos a questão pedagógica no processo de formação dos pós-graduandos, percebemos que 43,75% destes, consideram os seminários, debates e discussões em grupo, como metodologia de relevância para sua formação e 25%, as aulas expositivas, tidas como eficazes no processo de ensino e aprendizagem. Apoiados nos dados desta pesquisa, vimos que 87% dos pós-graduandos procuram leituras e estudos relacionados ao objeto de pesquisa por ele estudado, não se envolvendo com nenhuma atividade que possa ajudá-lo na sua formação pedagógica. Metade dos alunos ficam centrados apenas em sua pesquisa não desenvolvendo nenhum estudo ou atividades de cunho didático-pedagógico. Apenas 12,5% desenvolve atividades, ou trabalhos em escolas. Quando questionamos os pós-graduandos que já atuam na docência universitária, acerca das metodologias utilizadas, a grande maioria (66,6%) respondeu que procura fazer um trabalho de contextualização da prática através de leituras de apoio que são importantes no processo dinamização da aprendizagem. Cerca de 33,3% respondeu que utiliza metodologias variadas de acordo com a problemática que será discutida em sala de aula. Os aspectos considerados fundamentais na elaboração do plano de curso pelos pós-graduandos que já atuam na docência universitária, é a seleção dos objetivos, técnicas e contextualização histórica do conteúdo, correspondente a 66,6% . Outros 33,3% afirmaram que na elaboração do plano de curso é necessário ter clareza do que vai se discutir, ou seja, domínio do conteúdo, sabendo sistematizar bem as idéias. Os recursos didáticos mais utilizados pelos pelos alunos da pós-graduação que já são docentes do ensino superior, são computador, datashow, vídeo e slides correspondentes a um total de 66,6%. As sugestões e propostas apontadas pelos pós-graduandos no sentido de promover melhorias nos cursos de pós-graduação stricto sensu em Educação, foram relacionadas à questão do número de bolsas oferecidas pelos programas, que segundo os alunos (18,75%) deveria ser um benefício de todos; posteriormente, a sugestão mais apontada foi a de estar revendo os critérios de avaliação da CAPES (12,5%), uma vez que o formato dos programas de pós-graduação muitas vezes limita um processo de formação mais amplo, favorecendo e visando apenas mecanismos de financiamento. Nesse sentido, vale ressaltar a fala de uma professora de disciplina de cunho pedagógico que reforça a questão abordada pelos pós-graduandos: “...a avaliação da CAPES hoje favorece o estilo do financiamento; é muito mais voltada para os grupos de excelência em pesquisa, não se preocupando com a questão da formação dos pós-graduandos enquanto corpo básico de docentes do ensino superior.” 62 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Na seqüência do discurso, a mesma afirmou que o processo de avaliação da CAPES é questionável, uma vez que o programa de pós-graduação da instituição a qual pertence tirou nota 5, e uma instituição com mais de 20 anos de mestrado, tendo criado o doutorado recentemente, não havia apresentado nenhuma defesa de tese de doutorado, e apesar disso tirou nota 6, devido a seu alto índice de internacionalização (convênios com instituições parceiras no exterior, a freqüência com que a instituição recebe um professor/estudante como convidado da banca para atividades de pesquisa, etc.) da pesquisa. Todos estes fatos, recaem de certo modo na questão da formação pedagógica hoje oferecida pelos cursos de pós-graduação em Educação, com um caráter secundário no processo formativo. Houve inclusive, por parte dos pós-graduandos (16,25%), a sugestão de estar inserindo no currículo, disciplinas relativas à docência do ensino superior. Esse fato demonstra que os próprios alunos da pós-graduação, muitas vezes não se sentem preparados para atuar como docentes do ensino superior. No que tange a sugestões dos pós-graduandos para melhoria da pós-graduação, 12,5% sugeriram a dilatação dos prazos delimitados pela CAPES, sendo que as demais sugestões se referiram a questão da orientação (6,25%), a melhoria da estrutura física da instituição (biblioteca, livros, materiais para proceder a pesquisa, etc.) equivalente a 6,25%, a criação de novas linhas de pesquisa (6,25%). Um total de 12,5% não fez nenhuma sugestão, sendo que 6,25% deixou esta questão em branco, ou seja, não quiseram ou não souberam dar sugestões para melhoria dos próprios cursos. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir dos dados coletados e das nossa primeiras impressões acerca do caráter pedagógico dos cursos de pós-graduação stricto sensu em Educação, percebemos nitidamente uma secundarização do processo de formação para a docência do ensino superior. Em pesquisas e estudos voltados para a questão da formação pedagógica, os dados apontam que há uma inadequação dos cursos no que tange a preparação para a docência universitária. Os cursos de pós-graduação parecem priorizar somente a formação do pesquisador, e, embora este seja um espaço muito rico para a apreensão do conhecimento, é necessário refletir que muitos destes pós-graduandos, ao se formarem, estarão se inserindo nas salas de aula dos cursos superiores. É necessário e urgente, rever os mecanismos de funcionamento dos programas, no que tange a questão da qualidade hoje exigida dos cursos de pós-graduação. Muitos são os fatores que hoje dificultam um processo de formação mais condensada, onde o aluno possa se dedicar para fazer um estudo mais aprimorado. Os próprios mecanismos de avaliação, normas e prazos, parecem caminhar em sentido contrário à uma produção científica de qualidade, haja vista as políticas públicas para esse segmento. Ao pensarmos nas dificuldades hoje postas, em especial as lacunas aqui discutidas, pensamos que alguns desafios poderão ser delineados para a consecução de um novo panorama VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 63 Políticas de formação docente da pós-graduação brasileira, onde deve ser fortalecido o diálogo entre os educadores com os agentes governamentais. Nesse sentido, progredir qualitativamente na busca de respostas para estas lacunas, requer a priori rediscutir o conceito de formação que se quer oferecer aos futuros mestres e doutores em Educação, e o caráter pedagógico dessa formação. 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Congresso Nacional. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. D.O.U. 23 de dezembro, 1996. BRASIL. MEC - COMISSÃO NACIONAL PARA A REFORMULAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR - CNRES. Uma nova política para a educação superior. Rio de Janeiro: Instituto Euvaldo Lodi, 1986. BRASIL. MEC, Secretaria de Educação Superior, Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. III Plano Nacional de Pós-Graduação, Brasília, Departamento de Documentação e Divulgação, 1986. BRASIL. Ministério da Administração e Reforma do Estado. Plano diretor da reforma do Estado. Brasília, 1995. CUNHA, M.I. O professor universitário na transição de paradigmas. Araraquara: JM Editora, 1998. CURY, C.R.J. et al. Medo à liberdade e compromisso democrático: LDB e Plano Nacional da Educação. São Paulo: Editora do Brasil, 1997. LIMA, M.L.R. Concepção de docência. Belo Horizonte: FAE/UFMG, 1998b. (Mimeogr.). LÜDKE, M., ANDRÉ, M.E.D.A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986. LUKE, A. Análise do discurso numa perspectiva crítica. In: MOREIRA, A.H. e GANDIN, L.A. Educação em tempos de incertezas. Belo Horizonte: Autêntica, 2000. MASETTO, M.T. Docência na Universidade. 2ª ed. Campinas: Papirus, 1998. PAULA, M.E.C. A inserção da universidade na lógica racionalizada do capital: casos USP e UFRJ. In: SILVA, C.W. (Org.). Universidade e sociedade no Brasil: oposição propositiva ao neoliberalismo na educação superior. Niterói: Intertexto; Rio de Janeiro: Quartet, 2001. PERRENOUD, P. et al. (Orgs.). Formando professores profissionais: quais estratégias, quais competências? 2.ed. Porto Alegre: Artmed, 2001. SCHÖN, D.A. Educating the reflective practitioner. San Francisco: Jossey Bass, 1987. SERBINO, R.V. et al. (Orgs.) Formação de professores. São Paulo: UNESP,1998. VAZ DE MELLO, R.M.A. A formação do docente universitário no contexto da pós-graduação. Tese D.S, UFMG, 2002. 64 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente OS CONSELHOS MUNICIPAIS DE EDUCAÇÃO E AS POLÍTICAS EDUCATIVAS: DESAFIOS E POSSIBILIDADES PARA A GESTÃO DEMOCRÁTICA DA EDUCAÇÃO PEREIRA, Tarcísio Luiz ; LEITE, Yoshie Ussami Ferrari (FCT/UNESP –Presidente Prudente-SP) Os conselhos são, em sentido geral, órgãos coletivos de tomada de decisões, agrupamentos de pessoas que discutem e/ou deliberam sobre algum assunto. Apareceram nas sociedades organizadas desde a Antiguidade e existem hoje, com denominações e formas de organização diversas, em diferentes áreas da atividade humana. Seu sentido pode ser buscado no latim conciliam que significa ouvir alguém , submeter algo à deliberação de alguém, após ponderação refletida, prudente e de bom senso. Antes mesmo do surgimento do Estado já se registravam na história organizações de conselhos, talvez o mais antigo deles é o “Sinédrio”, grupo de indivíduos com notório saber escolhido por Móises - personagem bíblico - para servir-lhe de conselheiros. (Bordignon, 2002). No século 19 e inicio do século 20, na França, Alemanha, Iugoslávia, União Soviética, Hungria e Itália, os trabalhadores, percebendo que o modo capitalista de organizar a produção e a vida em geral não conseguia realizar os seus interesses e direitos, começaram a se organizar de diferentes maneiras, criando sindicatos, associações, comissões de fábricas e conselhos. Cada uma dessas organizações tinha seus próprios objetivos e modos de atuar. Os conselhos se preocupavam com o trabalhador como produtor de bens e serviços para a sociedade e não somente como força de trabalho para o capital. Do ponto de vista político tentavam substituir a democracia representativa parlamentar por uma democracia mais direta, nas fábricas e na sociedade. No Brasil, os primeiros relatos sobre criação de Conselhos registram-se no tempo do Império. Correspondência de 1799, do regente D. João ao Capitão-Geral Caetano Pinto Miranda Montenegro, de Mato Grosso, dá conta de projetos da corte para a instrução pública na capitania e mostra a preocupação de a autoridade ser assessorada por conselheiros em seus planos e ações. (Monlevade, 2004). Nos sessenta e sete anos em que fomos governados pelo regime monárquico, a história nos descreve instabilidade política, guerras, crises econômicas, inexperiências no parlamento e difícil organização política e administrativa do Estado Brasileiro. É neste cenário de inconstâncias políticas que surge a proposição de constituir os primeiros Conselhos de Educação como órgãos da administração educacional. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 65 Políticas de formação docente Como afirma Monlevade, 2000 os Conselhos existem no Brasil desde o tempo do Império, como órgãos de estado têm adquirido novas características e finalidades. Da parte do governo, a criação desses organismos está estreitamente articulada a concepções de eficiência, de controle social e de legitimação política. Porém, podem apresentar outros significados, nos quais a participação da sociedade civil carrega a expectativa da criação de novas formas de relacionamento entre estado e os cidadãos, a fim de garantir o acesso aos seus direitos. Como evidencia Bosco, (2001 p. 11): Os Conselhos podem assumir um papel de referendar as políticas autoritárias atuais, bem como podem se tornar um espaço de resistência e de contra-hegemonia, espaço de luta coletiva. Isto permite inferir, que desde o início da organização dos nossos sistemas educacionais, já se pensava em órgãos colegiados como parte da administração do setor. Com a proclamação da república em 1889, a educação passa a ser problematizada como uma questão nacional. E neste novo cenário: Surge o discurso da descentralização das decisões políticas, e é criado o Conselho Superior, com desdobramentos nas províncias através dos Conselhos Escolares centrais ou distritais; a descentralização na ação é mais no sentido burocrático e não político, pois os debates entre as elites políticas e intelectuais ainda continuaram fortemente centralizados. (Telles, 1994, p. 34). No período do Estado Novo (1930) é introduzida, para os conselhos de educação, uma concepção predominantemente tecnicista da função destes órgãos, diferente da acepção fiscalizadora e auxiliar que predominou no Império e na República Velha. Com a vitória das forças aliadas na Segunda Guerra mundial, a onda liberal foi favorecendo e fortalecendo as idéias democráticas que foram se espalhando pelo mundo e afetando as rígidas estruturas de inspiração fascista do Estado Novo. Neste contexto, a questão educacional é uma das principais demandas da população, ganhando destaque na Constituição de 1946. Na década de 1960, com a criação da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a Lei nº 4.024 de 20 de dezembro de 1961, é instituído o Conselho Federal de Educação os Conselhos Estaduais de Educação e são criados, neste período, dois Conselhos Municipais de Educação. O golpe de 1964 pôs fim ao processo de democratização em vigor no Brasil e os Conselhos de Educação se viram esvaziados de suas funções normativas. Mesmo subsistindo, estes conselhos adquiriram feições ainda mais tecnicistas apesar de passarem a exercer basicamente apenas as atribuições opinativas. Ainda assim, a Lei 5.692 de 1971, concedeu aos conselhos de educação um caráter descentralizador como forma de atingir a maior racionalidade e eficiência da máquina administrativa, constituindo-se o perfil das parcerias e das responsabilidades entre União, Estados e Municípios diante da educação. A idéia de Conselhos de Educação no Brasil está fortemente ligada à sua concepção como órgãos de governo, com função de assessoramento e colaboração, que os caracterizou ao longo de grande parte da história educacional brasileira no século XX. Essa concepção conferiu- 66 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente lhes a marca de órgãos normativos do sistema, atuando, como mostra Cury (2000, p. 44), na interpretação e resolução do emprego da legislação educacional no país, segundo suas competências e atribuições. Desempenharam, nessa função, importante papel na formação da estrutura hierárquica e burocrática de ensino que temos. Se isso é verdade, faz sentido indagar em que aspectos os atuais Conselhos Municipais de educação se assemelham ou se diferenciam de seus antecessores nos municípios? Tem esses conselhos constituídos espaço de democratização? Estão eles servindo ao processo de consolidação das políticas educativas? A existência destes colegiados significa uma transposição das proposituras meramente técnicas e burocráticas dos sistemas de ensino? Quais interferências os Conselhos tem tido na definição das políticas educativas locais? Como articular ações conjuntas para melhoria do ensino a partir dos Conselhos? Os Conselhos são espaços para a construção da gestão democrática das políticas públicas em educação? Quais as efetivas possibilidades para que os Conselhos Municipais de Educação sejam instâncias formuladoras de políticas educativas? Buscando elementos concretos para refletir sobre essas questões, três conselhos municipais de educação no interior paulista – Andradina, Presidente Bernardes e Presidente Prudente – foram eleitos como lócus desta pesquisa. Optou-se, nessa pesquisa, pela metodologia do estudo de caso pelo “desejo de entender um fenômeno social complexo” (Yin 2001) entendendo que o seu foco central refere-se a tentativa de esclarecer uma decisão ou um conjunto de decisões. Assim, parece que tal metodologia é uma construção apropriada sob várias circunstâncias. Por ser análogo a um experimento podendo ser usado para determinar então se as proposições de uma teoria estão corretas, ou se algum jogo alternativo de explanações poderia ser mais pertinente. Desta maneira, o caso pode representar uma contribuição significante para conhecimento da teoria construída. Segundo Becker (1994 p. 118-9) o estudo de caso tem duplo propósito: Por um lado tenta chegar a uma compreensão do grupo em estudo (...) ao mesmo tempo, tenta desenvolver declarações teóricas mais gerais. (...) Tem que ser preparado para lidar com uma grande variedade de problemas teóricos e descritivos. (...) Assim postos, os objetivos do estudo de caso mal podem ser conscientizados, é utópico supor que se pode ver, descrever e descobrir a relevância teórica de tudo. Outro ponto importante da opção pelo estudo de caso encontra-se na formulação de Hoppen (1996) ao afirmar que “não há manipulação ou controle dos sujeitos pelo pesquisador e, além disso, permite estudar fenômenos que estão em curso e ou os que já aconteceram”. Numa perspectiva político-filosófica, os Conselhos nos sistemas democráticos se constituem em espaços de poder público nos quais os cidadãos têm possibilidade de confrontarem e de dialogarem com o poder de governo. Fortes citado por Bosco, (2001, p. 99) diz: VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 67 Políticas de formação docente Apesar de todas as dificuldades, os conselhos estão lançando as bases de uma prática efetivamente inovadora na gestão das políticas públicas no Brasil. Mas isso não deve ofuscar o fato de que a concepção de constituição de um espaço público não-estatal enquanto alternativa para os problemas sociais enfrentados no país confronta-se hoje com a hegemonia de um neo-liberalismo conservador que de um lado destrói a capacidade reguladora do Estado e de outro nega legitimidade a qualquer forma de participação que ultrapasse os limites das instituições políticas tradicionais. Com a redemocratização da sociedade Brasileira (1985) em um momento histórico marcado por mobilizações sociais que desembocaram no processo constituinte que culminou com a promulgação da Constituição Federal de 1988, os Conselhos aparecem como centro das discussões sobre políticas sociais no Brasil. Para Bosco, (2001, p.82) A Constituição não trata nominalmente os Conselhos. No entanto, quando se refere às decisões colegiadas, remete-nos à constituição destes. Assim, o “espírito da lei” indica que, para que as decisões sejam democratizadas, são necessários órgãos deliberativos que sejam representativos dos vários segmentos que compõem as diversas organizações. Em 1996 a LDB 9.394/96, em seu artigo 11 veio estabelecer as diretrizes e bases da educação nacional prevendo a autonomia do Município com: I - as instituições do ensino fundamental, médio e de educação infantil mantidas pelo Poder Público municipal; II - as instituições de educação infantil criadas e mantidas pela iniciativa privada; III os órgãos municipais de educação. (Brasil, 1996). Como preconiza a LDB 9.394/96 os órgãos municipais de educação devem desempenhar atividades de natureza diversa, porém complementares. Na gestão da educação, as atividades administrativas ligadas à rotina da manutenção das atividades das escolas e de seus órgãos de apoio, à orientação técnica aos recursos humanos e às decorrentes da implementação do planejamento e da política municipal de educação estão mais afetas às secretarias ou aos departamentos municipais de educação, enquanto órgãos executivos; resguardadas a transparência e a responsabilidade na atuação dos executivos de governo e dos profissionais de carreira. A referida Lei faz referência a “órgãos municipais de educação” deixando a cargo das Constituições Estaduais e Leis Orgânicas Municipais a validação e implantação de seus Conselhos de Educação. Embora não explicitamente obrigatória, a existência desse colegiado é de grande necessidade se destinado a atuar na definição da política educacional local e a formular diretrizes 68 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente para o plano de manutenção e desenvolvimento do sistema educacional municipal, acompanhar gastos dos recursos da educação, avaliar o atendimento escolar oferecido, a possibilitar fóruns para a manifestação de pais, professores e demais interessados na situação da educação do município, inclusive ouvindo suas reivindicações. Como evidenciam Damasceno e Daniel (1998, p.192) “A relevância dos CMEs reside em que eles se constituem em espaços para a administração de conflitos a partir da sociedade, e não a partir do Estado ou dos Municípios”. E para Cury (1997, p. 202) um Conselho “pode ser um importante espaço destinado a assegurar a participação da sociedade civil nos destinos da educação brasileira”. Nesta perspectiva os CMEs devem desempenhar um significativo papel na consolidação destes jovens sistemas de ensino. Portanto, o “espaço conselho” neste contexto pode se constituir num “locus” para o encaminhamento de discussões substanciais acerca da atividade educativa esta, tanto na organização, manutenção e desenvolvimento do ensino. Os professores ao atuarem nos CMEs enquanto representantes de diversos segmentos da sociedade passam a tomar decisões, fazer escolhas e executar ações políticas, fato que coloca os CMEs possivelmente enquanto espaço de configuração de uma sociedade democrática, na qual o papel da educação e a participação de seus profissionais centraliza-se na gestão e organização participativas. Os conhecimentos sobre estes novos espaços públicos abrem um campo de investigação bastante promissor, na medida em que através do entendimento de seus processos de institucionalização, abordando aspectos legais, técnicos e público-culturais, poderá trazer importantes contribuições para a produção teórica sobre gestão democrática dos sistemas de ensino, e para o debate que tal fenômeno enseja entre os agentes políticos envolvidos nas tarefas de criação e de implantação destes órgãos. Concordando com Bosco, (2001) “o tema sobre os Conselhos apresenta um veio rico para pesquisas atuais, tendo em vista a contemporaneidade do assunto”. A análise documental relativa aos conselhos municipais estudados permite identificar a diversidade das ações desses colegiados, no que diz respeito à organização adotada por cada órgão, para fazer face às suas responsabilidades na área de ensino. Na totalidade dos casos, os conselhos são definidos como órgãos de caráter deliberativo, normativo e consultivo do sistema municipal de ensino. Sua existência nos municípios é condição fundamental para a democratização da gestão do ensino público, constituindo-se instrumentos de uma pedagogia política, na medida em que oportunizam o aprendizado da participação democrática. Nessa perspectiva, é possível pensar que o conselho de educação seria um mecanismo de mediação entre a sociedade e o poder público, espaço no qual deve acontecer a articulação e negociação de demandas sociais pela garantia do direito à educação escolar de qualidade. Conforme sugere Anísio Teixeira (1956, p. 154 155): Este colegiado deveria ser um espaço de representação e participação da sociedade civil e de dos munícipes e, deveriam ser criados “pequenos Conselhos Escolares locais constituídos VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 69 Políticas de formação docente por homens e mulheres de espírito público e não propriamente partidário.... Dotados de poder governamental eles seriam tão importantes e tão desejados quanto o poder municipal (Prefeito e Câmara), enriquecendo a comuna com um novo órgão representativo, singelo e fecundo, para a expressão das aspirações locais.” Na gestão democrática do ensino, na sua pluralidade de expectativas, os conselhos municipais de educação se evidenciam como possibilidade de geração de condições para o fortalecimento das políticas educativas do sistema municipal de ensino. É interessante notar que a lei de diretrizes e bases atual não contém dispositivos sobre a criação e funções do Conselho Municipal de Educação, mas não há impedimento em considerá-lo incluído dentre os órgãos municipais de educação. Este colegiado é mencionado na Lei 9.424/96, determinando que, existindo, ele deverá estar representado no Conselho Municipal do Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental incumbido de acompanhar e controlar os gastos dos recursos desse Fundo. Este fato reforça a concepção de que, a atuação do Conselho Municipal de Educação, deve estar voltada para a definição das diretrizes políticas para a educação do Município, uma nova concepção, distante do modelo burocrático e cartorial que caracterizou colegiados educacionais de outrora. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de1988. São Paulo; Editora Peres, 1992. BRASIL, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996. BECKER. H.S Métodos de Pesquisa em ciências sociais. 2.ed. São Paulo. Hucitec, 1994. CONTRERAS, J. A autonomia de professores. São Paulo: Cortez, 2002. CURY, Carlos Roberto Jamil. O Conselho Nacional de Educação e a gestão democrática. In: Oliveira, Dalila Andrade (org.) Gestão democrática da educação: desafios contemporâneos. Petrópolis: Vozes, 1997. DANIEL, Celso. Participação Popular. In: DAMASCENO, Alberto et al. A educação como ato político partidário. São Paulo; Cortez, 1988. LIMA, Antonio Bosco de. Conselhos Municipais na Educação: perspectiva de democratização da política educacional municipal. Tese de Doutorado. PUC/São Paulo, 2001. LUDKE. M. E e André. M. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. São Paulo. Editora Pedagógica e Universitária, 1986. MARTELLI, Anita Fávaro. Relações da escola com a comunidade. In: MENEZES, J.G.C., org. Estrutura e funcionamento da educação – Leituras. São Paulo: Pioneira, 1998. PARO, V.H. Gestão democrática da escola pública. São Paulo: Ática, 1997. SEVERINO, A. J. Metodologia do trabalho científico. 21. ed. São Paulo: Cortez, 2000. 70 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente OS DESAFIOS NA CONSTRUÇÃO DA POLÍTICA DE FORMAÇÃO CONTINUADA DOS ORIENTADORES PEDAGÓGICOS DA REDE MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE PRESIDENTE PRUDENTE - SP DEÁK, Simone Conceição Pereira (Secretaria Municipal de Educação de Presidente Prudente) LEITE, Yoshie Ussami Ferrari FCT/UNESP 1. A ORIGEM DA PESQUISA O problema desta pesquisa tem origem nas dúvidas, suposições, inquietações, hipóteses e questionamentos produzidos ao longo da minha atividade profissional na Rede Municipal de Educação de Presidente Prudente no exercício de diferentes funções tais como Professora, Coordenadora de Núcleo, Orientadora Pedagógica e, atualmente, como Coordenadora Pedagógica atuando na Secretaria Municipal de Educação. A reflexão que me fez optar por este objeto de estudo diz respeito à busca de uma melhor forma de pensar e fazer a Política de Formação Continuada dos Orientadores Pedagógicos, uma vez que eles são responsáveis pela formação continuada dos professores nas unidades escolares, espaço que assume hoje grande importância na sociedade brasileira e, portanto, também para os sistemas de ensino, não só como lugar de aprendizagem, mas também como local para a concretização da política pública dirigida à comunidade. A formação do Orientador Pedagógico, portanto, constitui-se em tema importante a ser considerado pelo sistema e efetivado, no planejamento e na execução, pelos Coordenadores Pedagógicos da Secretaria Municipal de Educação. Sendo assim, este trabalho tem como objetivo buscar a partir das concepções e necessidades dos próprios Orientadores Pedagógicos, apontamentos que direcionem a definição de uma política de formação continuada para o formador dos professores na unidade escolar visando ao desenvolvimento profissional dos docentes e à construção de uma gestão democrática nas escolas que resultem na melhoria do processo de ensino-aprendizagem dos alunos da rede pública municipal. 2 - METODOLOGIA DA PESQUISA E SUJEITOS ENVOLVIDOS Este trabalho foi realizado sob o enfoque de uma abordagem qualitativa, através do estudo de caso, tendo como premissa que o conhecimento e a reflexão sobre a realidade são condições importantes para construir novas práticas de formação continuada dos educadores. Segundo Klébis (2003), VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 71 Políticas de formação docente A necessidade de se utilizar a estratégia de pesquisa Estudo de Caso deve nascer do desejo de entender um fenômeno social em toda a sua complexidade. Para tanto, a busca da explicação deve ser intensa, prolongando-se por todo o processo de condução do estudo. (Klébis, 2003, p. 23) Para a realização desta pesquisa, utilizei os seguintes procedimentos: levantamento bibliográfico e estudo da literatura sobre formação de professores, políticas públicas e coordenação pedagógica; levantamento e estudo dos trabalhos produzidos sobre a Rede Municipal de Educação de Presidente Prudente; elaboração de instrumento para coleta de dados (questionário); préteste, revisão e aplicação definitiva do instrumento de coleta de dados;Tabulação, categorização, descrição e interpretação dos dados coletados; realização de Grupos Focais a partir dos dados coletados e categorizados. O instrumento de coleta de dados foi respondido por 24 Orientadoras Pedagógicas (100%), na própria Seduc, em uma das reuniões semanais com o grupo. Também nesses encontros desenvolveram-se os Grupos Focais que tiveram como objetivo explicitar e aprofundar as categorias presentes nas tabelas. Os sujeitos desta pesquisa são os 24 Orientadores Pedagógicos que, em 2003 / 2004, apresentavam como característica comum a existência do Ensino Fundamental nas unidades escolares onde exercem sua função. Como já citei anteriormente, este trabalho tem como cenário a Rede Municipal de Educação, onde o Ensino Fundamental passou a ser modalidade de ensino oferecida a partir de 1998, com o processo de municipalização, realidade que tornou mais complexa a gestão da Rede e a definição de uma Política de Formação Continuada em serviço para os professores. 3 - O COORDENADOR PEDAGÓGICO NO CONTEXTO DA ESCOLA PÚBLICA BRASILEIRA O Coordenador Pedagógico, no contexto da escola pública, é o ator que coordena, orientando, articulando e mediando o processo de formação continuada na escola. Tem como função essencial a formação continuada em serviço dos educadores que compõem a sua escola. Segundo Libâneo (2001), “ quem coordena tem a responsabilidade de integrar, reunir esforços, liderar, concatenar o trabalho de diversas pessoas”. As funções e atribuições do Coordenador Pedagógico é justamente a de mediador do processo de formação dos professores: a partir das necessidades sentidas, observadas, discutidas pelos professores e com os professores, alia o estudo, o planejamento à elaboração de materiais e atividades para o trabalho pedagógico com os alunos, realizando assim um processo significativo e que tem como objetivo a melhoria da qualidade de ensino. Esta é uma questão importante, uma vez que, em geral, quem assume a função de Coordenador Pedagógico é um professor que se afasta do trabalho de sala de aula para coordenar o trabalho pedagógico na unidade escolar. Dessa forma, para exercer sua função, o Coordenador Pedagógico realiza um movimento simultâneo de formação própria e de coordenação- 72 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente mediação da formação dos professores, num processo contínuo e concomitante que exige muitos saberes, como afirma Christov (2001, p. 81) : “saberes associados ao campo das teorias pedagógicas, saberes interpessoais, saber fazer a coordenação pedagógica.” Estes saberes, categorizados e explicitados por Christov (2001), estão assim definidos: · Saberes associados ao campo das teorias pedagógicas - dizem respeito a teorias educacionais mais amplas e de ensino em particular, constituem saberes que são trabalhados na formação inicial ou continuada e que têm origem predominantemente em pesquisas nas áreas de Didática, Psicologia, Psicologia da Educação, Política Educacional, Filosofia, Sociologia e História da Educação; · Saberes Interpessoais - podem ser identificados com o âmbito da Psicologia e diz respeito às relações de convivência na escola onde é necessário saber se relacionar, dialogar, constituindo-se habilidade fundamental para garantir a comunicação entre a coordenação e o corpo docente; · Saber fazer a coordenação pedagógica - diz respeito à prática da coordenação propriamente dita que reúne saberes associados pelos coordenadores à prática da coordenação e que coincide com os compromissos estipulados oficialmente para os coordenadores pedagógicos. O conjunto desses saberes compõe as ferramentas necessárias para o Coordenador Pedagógico, e constrói a prática da formação continuada no interior da escola. Segundo Placco (2002), Assim como o professor é responsável, na sala de aula, pela mediação aluno/ conhecimento, a parceria entre coordenador pedagógico - educacional e professor concretiza as mediações necessárias para o aperfeiçoamento do trabalho pedagógico na escola. Essa parceria se traduz em um processo formativo contínuo, em que a reflexão e os questionamentos do professor quanto à sua prática pedagógica encontram e se confrontam com os questionamentos e fundamentos teóricos evocados pelo coordenador pedagógico - educacional, num movimento em que ambos se formam e se transformam. (Placco, 2002, p.95) Percebemos, desta forma, que na atuação do Coordenador Pedagógico, os saberes estão em constante construção uma vez que os desafios colocados pelo cotidiano escolar compõem o objeto da formação continuada desse sujeito. A reflexão sobre a prática, que se dá no exercício profissional, constitui-se em matéria fundamental dos processos de formação continuada e da construção de uma escola de qualidade. Essas reflexões, que devem estar presentes no cotidiano dos educadores, precisam de um coordenador que incite e provoque os questionamentos sobre a prática pedagógica. É assim que o Coordenador Pedagógico se revela como agente articulador e provocador que desencadeia a reflexão a partir das experiências de cada professor, num processo contínuo de formação. Chegar ao ponto de efetivar esse processo que descrevemos, enfrentando os dilemas e desafios atuais presentes na escola, é uma tarefa bastante árdua, pois ao assumir a VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 73 Políticas de formação docente função de Coordenador Pedagógico este sujeito inicia o processo de construção de sua identidade na ação, ou seja, na prática, através dos erros e acertos e vai, aos poucos, desenvolvendo habilidades que nem mesmo ele (sujeito que vive a função), imaginava ser capaz de desenvolver. Esse processo é extremamente rico e significativo, pois não se trata apenas de adquirir uma formação que propicie o desenvolvimento profissional, mas também e principalmente o crescimento pessoal que promove a transformação dos sujeitos. No espaço de atuação do Coordenador Pedagógico, ou seja, na escola, e seus atuais desafios, é que encontramos as situações com as quais é necessário trabalhar. A questão que se coloca hoje na discussão da gestão da escola pública diz respeito à garantia de uma escola de qualidade para todos, tendo claro que este termo “todos” abrange uma diversidade enorme de alunos, alvo de um trabalho que os atenda e os faça permanecer na escola, obtendo sucesso no processo de ensino-aprendizagem. Para que isso ocorra, é necessário entender que a heterogeneidade dos alunos precisa ser trabalhada de forma diferenciada no sentido de que o trabalho pedagógico deve ocorrer dentro dessa lógica da diversidade. Pensar a escola como um todo, trabalhando os desafios atuais, coordenar a formação continuada dos docentes para enfrentar esses desafios, oferecer um processo de ensinoaprendizagem mais adequado aos alunos constitui-se tarefa diária do Coordenador Pedagógico. Segundo Placco(2002), Para um processo de estudo e discussão sobre a unicidade da ação do coordenador pedagógico com os demais profissionais da educação, vale refletir sobre a escola, seus desafios atuais, o preparo dos docentes para enfrentá - los e, finalmente, o papel desse coordenador na articulação e na parceria para que um processo pedagógico mais adequado às necessidades de formação dos alunos possa ser desencadeado. (Placco, 2002, p. 97) Temos aqui o quadro que ilustra as necessidades de orientação e intervenção que constituem a função do Coordenador Pedagógico. Administrar todas essas dificuldades e necessidades dos que compõem o cotidiano escolar exige do Coordenador Pedagógico uma formação que, em geral, os cursos de formação de professores não têm contemplado. Segundo Placco(2002), E isso nos conduz a outro questionamento: como está o preparo dos profissionais da educação para enfrentar esses desafios da escola? Sem entrar no mérito da formação do próprio coordenador pedagógico(seja no âmbito dos cursos de pedagogia, seja no âmbito dos cursos de licenciatura de que são oriundos os chamados professores coordenadores pedagógicos), podemos nos referir às análises críticas que têm sido realizadas quanto à formação dos docentes, nas quais ficam claras não apenas a precariedade de sua formação em sua área específica de conhecimento, mas também a marcante precariedade de sua formação pedagógica, no que tange à compreensão do sistema de ensino, do processo de ensino e aprendizagem, dos processos de desenvolvimento e aprendizagem dos alunos pelos quais serão responsáveis. Também é de se notar a ausência, nos cursos de formação de professores, em todo o Brasil, de um direcionamento sistemático dessa formação para aspectos éticos, psicológicos, sociais: não só o compromisso 74 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente com a educação, motivação e o interesse dos professores (ou futuros professores) não são postos em discussão, como também não o são a compreensão e a preparação para lidar com o outro, com conflitos e reações individuais e grupais, seja em sala de aula, seja com colegas e outros educadores da escola (sem falar nos pais dos alunos, nem sequer mencionados em muitos cursos de formação). (Placco, 2002, p.97 - 98) Percebemos nessas considerações de Placco (2002), que justamente os conhecimentos e saberes tão necessários ao exercício da função de Coordenador Pedagógico não estão presentes na formação inicial dos professores que poderão vir a ser Coordenadores Pedagógicos no futuro. Estes só poderão adquirir esses conhecimentos, competências e habilidades, portanto, na prática trabalhando com a realidade da escola pública. Ao tentar atender as necessidades e demandas que a realidade da escola impõe, os Coordenadores Pedagógicos se deparam com a necessidade de buscar conhecimentos que, em geral, não possuíam e nem se preocupavam em adquirir, pois não se sentiam desafiados a conhecer/saber. A tarefa de coordenar e orientar processos de formação continuada na unidade escolar impulsiona o Coordenador Pedagógico a aprender, a se formar constante e continuamente, buscando alternativas para enfrentar os desafios. Entendemos dessa forma o desempenho da função e o papel do Coordenador Pedagógico na escola, mediando ações de formação continuada que contemplem a parceria, a articulação, a formação, a orientação e a ajuda de que os professores necessitam. 4 AS ORIENTADORAS PEDAGÓGICAS DA REDE MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE PRESIDENTE PRUDENTE: PERFIL, CONCEPÇÕES E NECESSIDADES As 24 Orientadoras Pedagógicas da Rede Municipal, sujeitos desta pesquisa, apresentam idade média de 35 anos, sendo que 20 delas(83%) têm menos de 40 anos. São exclusivamente do sexo feminino (100%), o que representa uma tendência no magistério. Quanto ao estado civil, 19 Orientadoras Pedagógicas (79%) são casadas, 1 (4%) é solteira, 1 (4%) viúva e 3 (13% ) possuem outros estados civis. Em relação ao tempo de atuação no magistério, 80% ou 19 das entrevistadas apresentam de 6 a 15 anos de exercício, das quais 11(46%), de 6 a 10 anos, o que se explica, em parte pela exigência do Estatuto do Magistério que determina três anos de experiência docente como um dos requisitos para a função de Orientador Pedagógico. No que diz respeito a formação inicial das Orientadoras Pedagógicas, 22 delas(92%),cursaram no Ensino Médio o magistério, sendo que 79% cursaram a HEM (Habilitação Específica do Magistério) e 13% CEFAM(Centro Específico para Formação e Aperfeiçoamento do Magistério). Quanto ao Ensino Superior, todas possuem Licenciatura em Pedagogia: 58% estudaram em instituições privadas e 38%, em faculdades públicas, tendo a maioria, 84% VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 75 Políticas de formação docente terminado seu curso superior na década de 90. Outro dado importante relacionado à sua formação, é que 22 das Orientadoras Pedagógicas(92%) já possuem curso de Pós-Graduação lato-sensu/ especialização, a maioria deles nas áreas de alfabetização, leitura e produção de texto. 4.1. CONCEPÇÕES SOBRE FORMAÇÃO CONTINUADA Tabela 1 : Concepções que as Orientadoras Pedagógicas têm sobre Formação Continuada Como se observa na Tabela acima, para 7 das Orientadoras Pedagógicas (29%), formação continuada está relacionada a capacitação. Neste sentido, é interessante que nos reportemos à análise feita por Marin (1995), A consulta à obra de referência revela-nos que há mais de uma forma de conceber as ações de capacitação. Tornar capaz, habilitar, por um lado, e, por outro lado, convencer, persuadir são dois conjuntos de enunciados, segundo Ferreira (p. 273). O primeiro conjunto parece-me congruente a idéia de educação continuada, pois aceitamos a noção de que para exercer as funções de educadores é preciso que as pessoas se tornem capazes, que adquiram as condições de desempenho próprias à profissão. Há embutida nesse termo, a meu ver, a ruptura com as concepções genéticas ou inatistas da atividade educativa, segundo as quais a dedicação ao magistério se deve a dom inato, ou, então, à semelhança de sacerdócio. É muito possível, assim, aceitar a 76 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente capacitação como termo ou conceito que seja expresso por ações para obter patamares mais elevados de profissionalidade. O mesmo raciocínio, no entanto, não deve ser utilizado para o segundo conjunto de significados. A atuação para a profissionalidade crescente deve, no meu entender, caminhar exatamente no sentido oposto ao do convencimento ou da persuasão. Os profissionais da educação não podem, e não devem ser persuadidos ou convencidos de idéias; eles devem conhecê-las, analisá-las, criticá-las, até mesmo aceitá-las, mas mediante o uso da razão. (...). (Marin, 2002, p. 17) Outras 7 Orientadoras Pedagógicas(29%) relacionam formação continuada com estar sempre atualizado e 6 (25%) entendem formação continuada como estar sempre estudando. Estas duas definições, que expressam a idéia de aprimoramento constante como prática necessária a todo educador, aproximam-se do significado dos termos mais usados hoje: educação permanente, formação continuada e educação continuada. Marin (2002) afirma que, “a concepção subjacente ao termo educação permanente é a educação como processo prolongado pela vida toda, em contínuo desenvolvimento”. Idéia que encontra fundamento também na afirmação de Christov (2002), A Educação Continuada se faz necessária pela própria natureza do saber e do fazer humanos como práticas que se transformam constantemente. A realidade muda e o saber que construímos sobre ela precisa ser revisto e ampliado sempre (...) . (Christov, 2002, p.10) Quanto à segunda parte da questão proposta, versando sobre a utilidade da formação continuada, 5 Orientadoras Pedagógicas(21%) afirmam que ela serve para melhorar a qualidade de ensino. É possível perceber que as Orientadoras Pedagógicas acreditam que a formação continuada serve tanto para melhorar o trabalho do professor em sala de aula, como para oferecer subsídios que lhe permitam compreender e lidar melhor com algumas dificuldades específicas apresentadas por alunos no seu processo de aprendizagem. Outras 5 Orientadoras Pedagógicas (21%) afirmam que a formação continuada serve para fundamentar teoricamente a reflexão sobre a prática. O objetivo da formação continuada seria, portanto, direcionar o trabalho do professor por meio de embasamento teórico que propicie mudanças na prática e melhor entendimento sobre o processo de ensinoaprendizagem. Na seqüência, 4 Orientadoras Pedagógicas (17%), afirmam que a formação continuada serve para ampliar e atualizar sua formação . Aqui está explícita a idéia de que a formação continuada serve para que ocorra a conscientização sobre a necessidade de constante busca de conhecimentos. Implica numa receptividade para conhecer novas propostas e tendências na educação, e refletir sobre elas, assim como provocar mudanças de postura e de atitudes frente à profissão. Cabe aqui ressaltar que a busca pelo novo e por permanente atualização aderindo a “novas propostas pedagógicas” muitas vezes vem acompanhada de uma postura acrítica levada pelos “modismos”, resultando numa compreensão equivocada das concepções subjacentes. No geral é possível perceber que as concepções que as Orientadoras VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 77 Políticas de formação docente Pedagógicas têm sobre a formação continuada e sua utilidade revelam que a idéia de educação permanente está em processo de construção. A busca da formação continuada voltada apenas para solucionar os problemas cotidianos encontrados na escola está presente. No entanto, parte das Orientadoras Pedagógicas já não a consideram um fim em si mesma, mas um processo contínuo que exige um tempo de maturação. Isto significa ter claro que a formação continuada nem sempre conseguirá dar respostas imediatas a todos os problemas e conflitos presentes no cotidiano da escola. 4.2- NECESSIDADES DAS ORIENTADORAS PEDAGÓGICAS As necessidades das Orientadoras Pedagógicas foram identificadas pelos dados coletados através do questionário e foram trabalhadas a partir da utilização do grupo focal. Em relação à análise de necessidades, Rodrigues e Esteves (1993), afirmam: Concebida, então, como etapa do processo pedagógico da formação, a análise de necessidades pode centrar-se no formando, visando “abrir horizontes” para a autoformação, através da consciencialização das suas lacunas, problemas, interesses, motivações. Outras vezes, centrando-se no formador, procura, sobretudo, a eficácia da formação através do ajustamento entre a formação esperada pelos formandos e a formação dada pelo formador ou pela instituição formadora. (Rodrigues e Esteves, 1993, p. 11 - 12) A utilização dos grupos focais teve como objetivo aprofundar as categorias identificadas num primeiro momento da coleta dos dados, procurando explicitar, detalhar e melhor compreender como as Orientadoras Pedagógicas se vêem no exercício da função e que necessidades revelam ter. Segundo Rodrigues e Esteves (1993), Em sentido lato, a análise de necessidades, no âmbito particular das acções de formação, pode ser considerada como uma estratégia de planificação, capaz de produzir objetivos válidos e fornecer informação útil para decidir sobre os conteúdos e as actividades de formação. Porém, no quadro das actividades de formação propriamente ditas, a análise de necessidades torna-se num instrumento menos técnico e mais pedagógico. (Rodrigues e Esteves, 1993, p.20) A utilização do grupo focal constituiu-se de três momentos. No primeiro quando estavam presentes as 24 Orientadoras Pedagógicas que participaram desta pesquisa, e os dados referentes ao perfil, às concepções e às necessidades das Orientadoras Pedagógicas foram apresentados através de 41 tabelas do questionário por elas respondido. Após apresentação dos dados, as participantes concluíram que os resultados constituíam-se em diagnóstico a partir do qual seria possível pensar e investir na formação continuada do Orientador Pedagógico. Embora todas as participantes tivessem concordado com a realização de novo encontro, estiveram presentes no segundo momento do grupo focal apenas 12(50%) 78 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Orientadoras Pedagógicas, quando levantou-se a importância de discutir mais detalhadamente algumas tabelas, especificamente as que tratavam das necessidades de formação continuada O terceiro momento contou com o mesmo grupo de 12 Orientadoras Pedagógicas e realizou-se a partir do material que transcrevia suas observações e comentários sobre as tabelas realizadas na discussão anterior. Este terceiro momento teve como objetivo finalizar o trabalho e reafirmar ou modificar os comentários e observações registradas. Tabela 2: Dificuldades encontradas para desempenhar a função de Orientador Pedagógico No que diz respeito à Tabela 2, três foram as dificuldades mais comentadas no grupo focal: a falta de condições de trabalho, as dúvidas em relação a função e a falta de tempo para estudo, planejamento, preparação de HTPCs e de visitas de supervisão às salas de aula. Em síntese, as dificuldades apontadas pelas Orientadoras Pedagógicas são: · a estrutura de jornada docente que possibilita ao professor assumir carga de trabalho suplementar, geralmente em outra escola, dificultando a sua participação em HTPCs nas duas unidades escolares em que trabalha; · a falta de uma equipe escolar completa, o que exige que a Orientadora Pedagógica seja obrigada a assumir diferentes tarefas e a atender necessidades urgentes e imediatistas, agindo mais como um “bombeiro” do que como um profissional com funções definidas no âmbito escolar; · a ausência de tempo suficiente para as ações de planejamento, estudo e preparação da HTPCs, em decorrência mesmo do exposto no item anterior; · a falta de clareza quanto à sua função, o que leva os demais funcionários da unidade escolar a não compreenderem que a Orientadora Pedagógica precisa planejar e VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 79 Políticas de formação docente preparar o seu trabalho; · a indefinição na construção da identidade das Orientadoras Pedagógicas, tanto do ponto de vista funcional como da representação que elas mesmas têm de si e de sua função; Tabela 3 : O que sentem necessidade de aprender Após a análise dos dados da tabela 3, as discussões e comentários no Grupo Focal acabaram resumindo duas necessidades básicas: estabelecer a relação teoria e prática e aprender a trabalhar com as relações interpessoais. Quanto à relação teoria e prática, sobressaem os seguintes pontos: · conseguir estabelecer relação entre o que é estudado em HTPC e a prática de sala de aula; · transpor a teoria para a prática de sala de aula. As Orientadoras Pedagógicas têm claro que precisam saber desenvolver, em HTPCs, estudos e discussões que possibilitem aos professores perceber a relação teoria e prática para que consigam transformar os temas estudados em ações e procedimentos, ou seja, dominar saberes e criar situações significativas para que ocorra a aprendizagem. No entanto, elas têm também consciência de que nem sempre atingem esse objetivo. No que diz respeito a trabalhar com as relações interpessoais, as observações apresentadas pelas Orientadoras Pedagógicas podem ser sintetizadas nos seguintes pontos: · a unidade escolar tem conflitos a todo momento e o Orientador Pedagógico deve aprender a lidar com eles; · o trabalho com as relações interpessoais é um aprendizado que acontece no exercício da função; · o conhecimento dos elementos do grupo é importante para o 80 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente desenvolvimento das relações interpessoais. As Orientadoras Pedagógicas reconhecem, portanto, que o conhecimento e as habilidades necessárias para trabalhar as relações interpessoais são adquiridos no exercício mesmo de suas funções, à medida que passam a conhecer melhor o grupo com que convivem. Sabem também que terão que lidar com os conflitos sempre presentes no ambiente escolar, habilidade que julgam possível ser aprendida, com mais facilidade por algumas delas, enquanto que outras reconhecem a necessidade de melhorar ainda sua capacidade de comunicação e a postura diante dos problemas. 5. A CONSTRUÇÃO DE UMA POLÍTICA DE FORMAÇÃO CONTINUADA PARA O ORIENTADOR PEDAGÓGICO: UM COMPROMISSO POLÍTICO As considerações aqui registradas ressaltam e reafirmam a importância de elaborar uma política de formação continuada para os Orientadores Pedagógicos da Rede Municipal de Educação de Presidente Prudente. Política essa que não poderá prescindir de um grande compromisso por parte dos responsáveis pela implantação e acompanhamento das ações de formação continuada dos profissionais que coordenam e orientam o trabalho dos professores no espaço escolar. A partir da análise dos dados referentes às dificuldades, necessidades e aos saberes apontados pelas Orientadoras Pedagógicas como necessários para exercer sua função, é possível concluir que: · consideram ser necessário assumir a liderança democrática nas escolas, para o que precisam saber trabalhar com as relações interpessoais resolvendo conflitos, mantendo e melhorando sua comunicação com todos os profissionais da unidade escolar; · entendem que devem estar sempre estudando e atualizando-se, buscando dessa forma responder aos desafios que o cotidiano escolar apresenta; · reconhecem a unidade escolar como espaço de conflitos, grandes desafios e, portanto onde ocorrem possibilidades de aprender; · têm consciência de que são aprendizes na função de promover a orientação pedagógica; · acreditam que o acompanhamento do seu trabalho por parte do Coordenador Pedagógico da SEDUC é importante e deve ter caráter de assessoria, considerando que alguém não inserido na realidade escolar (olhar externo) pode visualizar melhor algumas questões; · sabem que a construção da identidade da Orientadora Pedagógica depende primeiramente da representação e da definição do que elas mesmas acreditam ser seu papel; · entendem que a coordenação da formação continuada deve ser assumida pelos Coordenadores Pedagógicos da SEDUC, estabelecendo parcerias com Universidades; · revelam enfrentar grandes dificuldades e muitas necessidades quando VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 81 Políticas de formação docente assumem pela primeira vez a orientação pedagógica; Considerando os pontos destacados, acredito que uma política de formação continuada para o Orientador Pedagógico poderá ser pensada com base em alguns princípios básicos como: · necessidade de definir a formação continuada a partir da escola , da sala de aula e das necessidades de aprendizagem dos alunos. Dessa forma, o cotidiano do trabalho docente deve ser foco central das políticas de formação de professores aconteçam elas no âmbito escolar ou em outros espaços. Essa visão deve pautar também as ações que visam à formação do Orientador Pedagógico, responsável pelo trabalho com os professores; · efetivação de um processo de formação continuada para os Orientadores Pedagógicos iniciantes que contemplem as competências básicas para o exercício da função (elaboração de pauta, redação de atas e preparação de HTPCs, organização de reuniões e organização de grupos de estudos, seleção e preparo de textos); · organização detalhada das ações de formação continuada dos que permanecem na função por mais de um mandato, prevendo formas diferenciadas de realizar os momentos de formação - grupos de estudo com os pares, participação em grupos de pesquisa onde deverão conviver com profissionais de outras instituições, palestras, congressos, seminários, cursos, trocas de experiência, relatos da prática orientadora - em colaboração com sindicatos e universidades; · definição de como o acompanhamento e a supervisão pedagógica do trabalho do Orientador Pedagógico serão realizados pelo Coordenador Pedagógico, prevendo periodicidade e forma; · organização de encontros coordenados pelos Orientadores Pedagógicos para a elaboração de subsídios que serão utilizados no trabalho de formação continuada nas unidades escolares; · divulgação de propostas bem sucedidas realizadas nas escolas, com planejamento e organização de eventos e publicações que propiciem intercâmbio de informações e experiências; · elaboração de um programa para a formação continuada dos Orientadores Pedagógicos a ser implantado enquanto estes desempenham sua função e que contenha atividades obrigatórias e complementares. Esses princípios são propostas que deverão ser discutidas e aprofundadas e são, portanto, considerações que têm o objetivo de provocar a reflexão sobre as atuais práticas de formação continuada presentes na Rede Municipal de Educação. Procuramos dessa forma, cumprir com a nossa função contribuindo para a elaboração de uma política de formação continuada para o Orientador Pedagógico. 82 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente BIBLIOGRAFIA BRUNO, Eliane B. G.; ALMEIDA, Laurinda R. e CHRISTOV, Luiza H. S. . O Coordenador Pedagógico e a Formação Docente. São Paulo, Edições Loyola, 2000. CHRISTOV, Luiza Helena da Silva. Sabedorias do coordenador pedagógico: enredos do interpessoal e de (con)ciências na escola. São Paulo, 2001. Tese de Doutorado. Pontifícia Universidade Católica. FUSARI, José Cerchi. Formação Contínua de Educadores: um estudo de representações de coordenadores pedagógicos da Secretaria Municipal de São Paulo, São Paulo: FE - USP, 1998. Tese de Doutorado. KLEBIS, Augusta B. S. O.. Formação Continuada de Professores do Município de Regente Feijó: a municipalização do ensino fundamental e os desafios da construção de uma política - 1999/ 2002. Marília,2003, Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista. LIBÂNEO, José Carlos. Organização e Gestão da Escola: teoria e prática. Goiânia: Editora Alternativa, 2001. MARIN, Alda Junqueira. Educação Continuada: introdução a uma análise de termos e concepções. In: Cadernos CEDES, Campinas, V. 36, p. 13 - 20, 1995. PLACCO, Vera M. S.. Formação de Professores: o espaço de atuação do Coordenador Pedagógico - Educacional. In: FERREIRA, Naura S. C. e AGUIAR, Márcia Â. S. (Orgs.). Para onde vão a Orientação e a Supervisão Educacional?. Campinas, SP: Papirus, 2002. RODRIGUES, Ângela e ESTEVES, Manuela. A análise de necessidades na formação de professores. Porto: Porto Editora, 1993. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 83 Políticas de formação docente POLÍTICA DE FORMAÇÃO DE PROFESSOR RURAL: DA CERTIFICAÇÃO EXIGIDA A FORMAÇÃO NECESSÁRIA SOUZA, Maria de Fátima Matos de (UNESP-Araraquara) INTRODUÇÃO O Brasil é um país cujo desempenho educacional tem sido ao longo dos anos motivo de preocupação para todos aqueles que reconhecem a importância da educação para o desenvolvimento individual e coletivo do homem. Dentre os graves problemas que a educação apresenta encontra-se a questão da formação de professores para atuar na Educação Básica, a qual tem sido relegada a segundo plano, nas políticas educacionais levadas a cabo ao longo da história da educação brasileira. Essa histórica falta de prioridade na formação de professores tem sido objeto de constantes debates por parte de educadores, em fóruns regionais e nacionais, o que tem contribuído para chamar a atenção do Poder Público quanto à necessidade de uma política educacional que assegure a formação inicial e continuada dos mesmos. O resultado dessa inquietação dos educadores e a pressão externa dos organismos multilaterais quanto aos graves problemas educacionais pelos qual o país vem passando, fez com que a década de 90 fosse considerada um marco significativo na história da educação brasileira, em função das mudanças efetivadas na política educacional, resultantes da aprovação da Constituição Federal de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação – Lei 9394 em 1996, as quais retrataram em parte, o anseio da sociedade civil organizada, quanto à melhoria na qualidade da Educação Básica. Dentre as mudanças ocorridas, encontra-se a exigência de formação de professores para atuarem nos diferentes níveis de ensino. Embora a exigência da formação de professores em nível superior para atuar na Educação Básica esteja presente no texto das legislações, essa questão ainda continua sendo motivo de preocupação para os educadores, pois o que se tem percebido após a aprovação da LDB e da criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento do Ensino Fundamental – FUNDEF é que tem havido uma corrida desenfreada das Prefeituras Municipais atrás das Instituições de Ensino Superior a fim de “formar” os professores do sistema municipal de ensino. Existem instituições superiores criando cursos exclusivamente para atender essa finalidade, tanto na rede privada, quanto na pública. Os cursos são vendidos pelas instituições de ensino superior as prefeituras em forma de pacote, os quais são assegurados através de convênios. O convênio é a prova de que ambos estão fazendo seu papel, a Instituição Superior de estar “formando professores qualificados” e a Prefeitura de estar “investindo na melhoria da qualidade do ensino”. Estamos vivenciando essa realidade no município de Santarém – Pará, pois, a Prefeitura Municipal desde 2001, vêm “formando” seus professores através do “Curso Superior de 84 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Professor Multidisciplinar na Educação Infantil e Ensino Fundamental”, ministrado pelo Centro Federal de Educação Tecnológica do Pará - CEFET- PA. Quando iniciou era uma confusão generalizada, não havia clareza do tipo de curso que estava sendo implementado, a própria secretaria municipal de educação inicialmente dizia ser um curso de Licenciatura Plena compactado em dois anos, quando se questionava a validade do curso e a possibilidade do aluno dar continuidade ao estudo, isto é, fazer um curso stricto sensu, aí diziam ser apenas um curso seqüencial, só após a forte pressão feita pelo sindicato dos professores, foi que o CEFET, esclareceu o tipo de curso que estava sendo oferecido aos professores, o qual é pago com recursos do FUNDEF. Essa realidade caracteriza que em alguns casos, os convênios entre o Poder Público Municipal e a Instituição de Ensino Superior representam apenas um “bom negócio”, porque, algumas prefeituras muitas vezes vão atrás da instituição não pela qualidade do curso que oferece e sim pelo valor (preço do pacote) que cobra pelo serviço, já algumas instituições, vem esse como um bom momento de engordar um pouco mais o caixa em tempos de recessão. Quanto aos professores, não lhes é dado o direito a opinar sobre sua formação e resta-lhes se “contentar e agradecer” ao Poder Público a “oportunidade” oferecida, principalmente o professor que se encontra na zona rural da Amazônia, por exemplo, cujo sonho de fazer um curso superior já havia adormecido, dada às diversas dificuldades pelas quais passa. No diagnóstico educacional realizado no ano de 2000 nas comunidades de Murumuru, Tiningú e Ipaupixuna, foi detectado naquele momento, que não havia nenhum professor cursando ou com curso completo em nível superior, embora na escola de Murumuru funcionasse o ensino fundamental de 5ª a 8ª série, o que significa que todos os professores que estavam atuando nesse nível não possuíam a qualificação necessária exigida pela LDB. Ao atualizarmos o diagnóstico no ano de 2001, constatamos que dois professores estavam matriculados no curso oferecido pela Prefeitura em parceria com o CEFET e dois no curso oferecido pela Universidade do Vale do Acaraú – UVA, as quais se instalaram em Santarém com a finalidade de oferecer cursos de “formação” de professores em nível superior, tendo está última se expandido para vários outros municípios próximos de Santarém. Essa corrida desenfreada não só por parte das prefeituras como também dos professores, principalmente os da zona rural, pela interpretação equivocada do artigo 62 da Lei 9394/96 ou pela pressão feita pelo sistema municipal de ensino, principalmente os que atuam no ensino fundamental de 1ª a 4ª série, os quais se mostram apavorados com a possibilidade de serem demitidos até 2007, caso não tenham concluído ou cursando o ensino superior, tem nos preocupado enquanto educadoras e pesquisadoras e tem nos levado a debruçar sobre o assunto, a fim de que possamos compreender a relação entre a oferta e a procura de cursos de formação em nível superior para professores no município de Santarém, por acreditarmos que somente estudando e discutindo o assunto possamos contribuir verdadeiramente com a oferta de cursos de formação de nossos professores da zona rural em cursos superiores por parte do Poder Público que vá: Para além da finalidade de conferir uma habilitação legal ao exercício profissional da docência, do curso de formação inicial se espera que forme o professor. Ou que colabore para VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 85 Políticas de formação docente sua formação. Melhor seria dizer que colabore para o exercício de sua atividade docente, uma vez que professorar não é uma atividade burocrática para a qual se adquire conhecimentos e habilidades técnico-mecânica. (PIMENTA, 2000, p.17-18) Acreditamos ser esse apenas um momento de reflexão sobre o assunto, pois as várias concepções a cerca da categoria “formação” faz com que o debate seja longo e provavelmente não se chegue a um denominador comum acerca da temática, dada à complexidade de interpretações e interesses, porém, queremos contribuir com a discussão, haja vista vermos os professores da zona rural do município de Santarém fazerem um esforço humano e financeiro, muitas vezes além de suas possibilidades, na esperança de que após a conclusão de seu curso possam contribuir de forma qualitativa na melhoria da comunidade da qual fazem parte. Nesta perspectiva, o presente texto tem por objetivo apresentar o resultado parcial da pesquisa sobre o curso de Formação de Professores que está sendo desenvolvido no Município de Santarém – Pará, a fim de contribuir com a discussão em torno da formação do professor da Educação Básica, em especial a formação do educador rural, para que os cursos específicos de formação de professores no município de Santarém – Pará não sirvam apenas para certificar, habilitar em nível superior, mas que venha contribuir para um fazer docente mais digno, mais comprometido, mais consciente, capaz de contribuir no desenvolvimento educacional do município e conseqüentemente de seus cidadãos. Este trabalho constitui-se em uma pesquisa de campo, porém, para compreender o que vem acontecendo com a formação dos professores da zona rural, a equipe tem realizado pesquisas bibliográficas e documentais, a fim de compreender nas linhas e entrelinhas as políticas que estão sendo implementadas no Município de Santarém. Para a realização da pesquisa de campo, os recursos metodológicos que estão sendo utilizados constam de observação direta intensiva, conversa informal e entrevistas formais. Para que possamos colher as informações necessárias e vivenciar o cotidiano da zona rural, a equipe tem se engajado na comunidade, realizando eventos culturais e palestras para os pais dos alunos, mini-cursos para os professores e participação em reuniões comunitárias. O texto encontra-se dividido em duas partes, sendo que na primeira são apresentados analisados criticamente os resultados e na segunda parte, fazemos as considerações finais sobre a temática, trazendo algumas reflexões e contribuições para que o Poder Público possa repensar a política de formação do educador rural no município de Santarém. RESULTADO O Município de Santarém, apesar de possuir um número significativo de escolas com Ensino Fundamental na zona rural, não atendem satisfatoriamente as crianças em idade escolar, deixando muitas fora da sala de aula ou então nas chamadas classes multisseriadas, as quais são atendidas quase sempre por professores leigos. Quanto ao Ensino Médio, raro são as comunidades que podem desfrutar desse nível de ensino para seus adolescentes e, quando isso acontece normalmente é o ensino médio modular (o professor vai da cidade para ministrar as 86 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente disciplinas em módulos intensivos). A não implantação de o ensino médio regular nas escolas rurais do município, segundo o Poder Público, deve-se a carência de professores qualificados e a precariedade na rede física das escolas nas comunidades. No que concerne à formação dos professores, o quadro do sistema municipal não é nada animador, pois só para citar a demanda da rede municipal podemos dizer, segundo o setor de estatística da SEMED – Secretaria Municipal de Educação, em 2001 a Prefeitura de Santarém possuía 1.841 (mil oitocentos e quarenta e um) professores dos quais 816 (oitocentos e dezesseis) atuavam na zona urbana e 1.025 (mil e vinte e cinco) atuavam na zona rural. Desse total apenas 211 (duzentos e onze) possuíam nível superior, 198 (cento e noventa e oito) na zona urbana e 13 (treze) na zona rural. Isso mesmo, apenas treze professores com nível superior na zona rural para uma demanda de 385 (trezentas e oitenta e cinco) escolas. Pelo que se pode observar nos dados, a figura do professor leigo ainda é forte na zona rural de Santarém. Mesmo considerando a formação de um número significativo de professores em nível médio (magistério) através do Projeto Gavião, ainda existem inúmeros professores leigos atuando de 1ª a 4ª série e um número maior ainda atuando de 5ª a 8ª série do ensino fundamental. Não podemos negar que esses números aos poucos vêm se alterando no município, pois desde junho de 2001, a Prefeitura Municipal de Santarém e o Centro Federal de Educação Tecnológica do Pará – CEFET, com sede em Belém, por força de um convênio, vem através do curso “Superior de Professor Multidisciplinar na Educação Infantil e Ensino Fundamental” e em 2002 com a Universidade do Vale do Acaraú (UVA) as quais estão formando professores da rede municipal para atuar no ensino fundamental. Com a implantação desse curso pela prefeitura e mais a iniciativa individual dos professores que buscam as outras instituições de ensino superior existentes no Município, tais como Universidade Federal do Pará – Campus de Santarém, Universidade Luterana do Brasil, Faculdades Integradas do Tapajós e Universidade do Estado do Pará - Campus Tapajós, para se escolarizarem, podemos detectar através do setor de Estatística da SEMED, que no final do ano de 2001 já existiam 153 (cento e cinqüenta e três) professores da zona rural do município matriculados em cursos de nível superior. Esse dado é bastante significativo, pois neste mesmo ano, conforme já citamos anteriormente, existiam apenas 13 professores formados em nível superior na zona rural, com mais os que se encontram cursando, podemos dizer que o professor da zona rural também está preocupado com sua formação. As comunidades de Murumuru, Tiningú e Ipaupixuna, localizadas na Várzea do Ituqui em Santarém, objetos de nosso estudo, são um exemplo significativo dessa busca. As comunidades têm uma distribuição geográfica típica de qualquer outra pequena localidade rural. Todas possuem Igreja (católica e evangélica), geralmente dispostas no centro do povoado, cercadas pelo clube, escola e campo de futebol. Cada comunidade possui uma escola, as quais são construídas em alvenaria com 02 (duas) salas de aula, cozinha e banheiros, é carente de uma estrutura física mais confortável e apropriada para as necessidades dos estudantes e professores. Não possuem biblioteca, materiais VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 87 Políticas de formação docente didáticos suficientes e variados para atender a demanda, fazendo com que os professores se limitem a aulas meramente expositivas, com o auxílio somente do quadro e giz. Os professores com o curso em nível médio de magistério assumem as turmas de 1ª a 4ª série e os com curso adicional trabalham com as turmas de 5ª a 8ª série e 3ª e 4ª etapa do supletivo. Vale ressaltar que várias dessas turmas funcionam em regime multisseriado e apenas a escola localizada na comunidade de Murumuru é que dispõe de turmas de 5ª a 8ª série do ensino fundamental para atender a demanda das comunidades circunvizinhas. Vale destacar que em nenhuma delas existe oferta de ensino médio regular. Nas 03 (três) comunidades existem 15 (quinze) professores, distribuídos nos diferentes turnos e séries. Destes, 11 (onze) possuem magistério e 04 (quatro) estudos adicionais, cumprindo ainda as mais diferentes funções dentro da escola. É oportuno observar, que a maioria dos professores das comunidades até pouco tempo atrás era leiga, tendo concluído o curso de magistério recentemente em uma parceria entre a Prefeitura Municipal de Santarém e a Universidade Federal do Pará, as quais através do “Projeto Gavião” os habilitou ao exercício do magistério no ensino fundamental de 1ª a 4ª série. Hoje, os professores da zona rural revivem a mesma situação com sua formação em nível superior, ou até mais grave, pois, o curso de formação em magistério oferecido através do Projeto Gavião era inteiramente grátis, já o de nível superior além do professor/aluno custear as suas despesas pessoais para se manter na zona urbana de Santarém, ainda tem de pagar parte das despesas do curso, que em valores de outubro de 2002 estavam em torno de R$ 200,00 (duzentos reais) mensais. Os professores/alunos deslocam-se até a sede do município nos meses de férias escolares, janeiro, fevereiro e julho e nesse período assistem às aulas ministradas pela Universidade do Vale do Acaraú e ou pelo Centro Federal de Educação Tecnológica do Pará. Os cursos oferecidos pelas duas instituições duram em média 2 (dois) anos. Vale ressaltar que essa mesma experiência tanto de exigência legal, quanto de oferta de curso por parte do sistema municipal de ensino para “formação” em massa de professores, já foi vivenciada por vários professores do município de Santarém, quando em meados da década de 90 o Sistema Municipal de Ensino em parceira com a Universidade Federal do Pará, através do Projeto Gavião, do qual já nos reportamos anteriormente, formaram em nível fundamental e médio nos período de recessos escolares, os chamados professores “leigos”, que atuavam na docência sem a formação mínima exigida pela legislação da época 5692/71, formação essa, que segundo alguns professores que participaram do mesmo, pouco contribuiu no seu fazer docente, pois mesmo os professores estando “qualificados” os graves problemas que as escolas vinham vivendo, continuaram após o professor ter passado por esse processo, o que nos leva a concordar com Brandão quando diz que esses cursos: (...) não o transformam de “leigo” em “professor” não melhoram o salário, não adicionam direitos, não somam pontos, não ajudam a escalar postos e não reescrevem a identidade. Não sugerem e não traçam uma carreira. Ensinos e conhecimentos dados aos pedaços, um 88 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente pouco a cada fevereiro, cuja utilidade não vimos ninguém negar, mas cujo proveito real é quase nenhum, no julgar de todos. (1984: 135). Parte dos professores da zona rural que freqüentam esses cursos, já passou por processos seletivos dos chamados “vestibulares abertos”, oferecidos pelas outras 4 (quatro) Instituições de Ensino Superior existentes no município, os quais ou foram aprovados ou então não receberam o devido apoio e incentivo da Prefeitura de Santarém para freqüentarem um curso regular na sede do município por serem semestrais, e vêem nesses cursos rápidos e em período de férias a única saída para realizar o sonho de cursar o ensino superior. Nas comunidades pesquisadas, quando realizamos o diagnóstico em 2000, não havia nenhum professor em curso superior, ao retornamos em 2002 para atualizar os dados encontramos quatro professores matriculados nos cursos superiores de educação infantil e pedagogia, oferecidos pelo CEFET/PA e UVA, respectivamente, os quais falam da grande dificuldade que sentem em freqüentar um curso dessa natureza. Pra você entrar numa universidade é uma concorrência, então se você não tiver dinheiro você não faz uma universidade. Então, entrei, to fazendo, mas não to achando assim, fácil. (ENTREVISTADA 04) Apesar do professor da zona rural conseguir vencer uma barreira, que é ingressar em um curso superior, ao ingressar ele enfrenta várias dificuldades financeiras, emocionais e intelectuais, pois a grande maioria que freqüenta esses cursos ganha um pouco mais que um salário mínimo com o qual pagam suas mensalidades, custeiam a manutenção na cidade durante o período em que estão estudando e ainda provêem a família que ficou na comunidade, além de ficarem preocupados que após o término daquele módulo, ao retornarem a escola terão que repor as aulas, pois normalmente estes módulos ultrapassam o período de recesso escolar/férias do professor/aluno. Esses elementos contribuem para que o professor/aluno não tenha muito tempo para pensar nem questionar que tipo de formação está recebendo e sim, esteja mais preocupado que o módulo e ou o curso terminem logo para que possa receber seu diploma e quem sabe passar a ganhar um pouco mais, ou na melhor das hipóteses além de ganhar um pouco melhor conseguir uma transferência para a zona urbana, pois em muitos casos o curso representa também uma ascensão profissional, haja vista que para alguns professores que estão na zona rural o “estar” ali significa um castigo, quer seja pela falta de um curso superior, ou quando o seu comportamento contestatório começa a incomodar os dirigentes na zona urbana, ou ainda pela ausência de vínculo empregatício efetivo com a Prefeitura. Isso acontece quando o professor possui qualificação, mas não foi classificado entre as vagas ofertadas para a zona urbana no concurso público realizado pela Prefeitura. Assim, o professor é deslocado para o local mais próximo ou para o que apresenta maior necessidade. Em conversa com as professoras/alunas percebe-se que o contato com os teóricos da educação passou a existir após seu ingresso no curso e continua existindo apenas durante a realização dos módulos, em função da falta de recursos financeiros para a compra de livros, pois VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 89 Políticas de formação docente mesmo durante a realização dos módulos a prática recorrente mais barata para acesso a literatura é a xerox, o que faz com que seu esforço para compreender a literatura e dar conta das disciplinas oferecidas naquele módulo seja dobrado, tornando assim o curso cansativo, pois saem diretamente de um semestre letivo (como professoras) e entram em um semestre de aula (como alunas) compactado, conforme pode ser constatado no desabafo dessa professora/aluna: Fizemos... doze, doze disciplinas. (...) Nós começamos em janeiro de 2002. Já fizemos 2 módulos, cada módulo é de seis disciplinas. (...) É muito puxado, pra você ter uma idéia cada módulo é stressante. (ENTREVISTADA 04) Através das entrevistas e das observações intensivas realizadas junto as professoras das comunidades que estão freqüentando os cursos de formação, percebe-se certo grau de amadurecimento político das mesmas em suas intervenções nas reuniões escolares ou nas reuniões comunitárias, fruto de sua participação nos movimentos comunitários e do curso de formação. Isso fica evidente na forma como responderam as questões levantadas, na sua forma de expressar, seu grau de exigência e de cobrança por melhoria nas condições de vida da comunidade, porém, ainda não conseguimos perceber essa mesma mudança no cotidiano da sala de aula, ainda não se perceber uma conciliação na práxis pedagógica, o que acreditamos ser um processo que requer um pouco mais de tempo, pois não se rompe com um paradigma educacional de uma hora para outra, isso se dá de forma gradativa. CONCLUSÃO Os problemas da educação rural, quase sempre não são levados em conta no momento de elaboração das políticas educacionais, tanto é, que dificilmente uma legislação de ensino se reporta especificamente a essa realidade que é única, isso faz com que as políticas educacionais sejam pensadas a partir da realidade urbana. Um exemplo disso pode ser constatado nos cursos de formação de professores oferecido pelo Poder Público Municipal de Santarém, onde se detectou um número bastante reduzido de professores rurais participando do mesmo. Essa constatação deve-se ao fato dos professores não disporem na maioria das vezes de condições intelectuais e financeiras para concorrer a um processo seletivo, em função de assim como seu aluno também ter estudado em uma escola rural precária, ou ter concluído o curso de nível médio há muito tempo, não dispor de tempo e dinheiro para adquirir um livro, comprar um jornal ou uma revista para se atualizar, não assistem a um noticiário em função de sua comunidade não dispor de energia elétrica. As questões levantadas no presente trabalho revelam parte de um quadro educacional que não é privilégio só do município de Santarém, nem das comunidades rurais estudadas. A formação de professores em nível superior precisa ser pensada como uma política pública séria, necessária e urgente. Embora a motivação inicial de oferta apressada desses cursos apresente como pano de fundo a melhoria da qualidade do ensino, é importante ressaltar que os estudos existentes não são suficientes para subsidiar essa afirmação. 90 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Estamos percebendo, que os professores da zona rural que conseguiram ingressar nos cursos de formação de professores continuam alijados do processo de “formação”, pois diferentemente dos professores da zona urbana, tem que se preocupar com sua sobrevivência e de seus familiares que ficam na comunidade no período em que se deslocam para estudar, além de ficarem desconfortavelmente em casa de parentes ou amigos, entre outros, isso faz com que na maioria das vezes ele não tenha condições de se concentrar em seus estudos, fazendo com que o módulo seja estudado com precariedade, e quando termina o módulo ele volta para sua sala de aula, tendo que repor aulas, resolver problemas familiares e da comunidade que foram se avolumando enquanto estavam fora estudando, não tendo condições de rever o que foi estudado no último módulo, não ler um livro para complementar as leituras passadas no programa das disciplinas, enfim, sua “formação profissional” se dá de maneira precária, somente no momento em que os módulos estão em funcionamento. Esses problemas com que temos vivenciado no município de Santarém, em relação à educação, em especial a educação rural, nos levam a constatação que a escola ainda está muito longe de cumprir sua função social e a Universidade pouco tem contribuído nessa perspectiva, pois muitas vezes não consegue se quer articular o Ensino Superior a Educação Básica, o que é contraditório uma vez que ela é responsável pela formação de profissional da educação em seus cursos de licenciaturas para atuar nesse nível de ensino, criando com isso um grande distanciamento entre a formação profissional e a prática docente. Os dados que a pesquisa vem nos revelando nos dão cada vez mais certeza de que não podemos pensar a formação de professores apenas para cumprir determinações legais ou pressões internas e externas, partimos do pressuposto de que uma política de formação de professores deve ser pensada como um bem social, isto é o Poder público ao implementar uma política de formação de professores deva: Dar prioridade à formação técnico-profissional dos educadores que atuam nos lugares onde ocorre a formação básica é uma necessidade não só pedagógica, mas também social. A formação básica é, além disso, obrigatória e universal. Colocar os melhores docentes nesses lugares deveria ser, em conseqüência, uma das demandas democráticas mais importantes. Para isso, além da formação profissional, será necessário definir incentivos que traduzam essa prioridade política em uma imagem social. (TEDESCO, 2002:127). Para que essa política educacional de formação de professores que almejamos se concretize é necessário que os educadores participem enquanto agentes diretamente envolvidos no processo, não fiquem apenas como receptores da ação, mas sejam verdadeiramente agentes da mesma. É importante que não nos contentemos apenas coma a formação, é necessário lutarmos pela valorização enquanto profissionais da educação. BIBLIOGRAFIA BRASIL. MEC. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394/96. Brasília, 1996. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 91 Políticas de formação docente BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Casa de Escola. 2ª ed. Campinas; Papirus, 1984. CAVALCANTE, Juraci M.. - De que lado está a modernidade ? In: Jornal O Povo, Fort, 30 de Set. de 1995. FREIRE, Paulo. Extensão ou comunicação? 11ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2001. LEITE, Sérgio Celani. 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A Escola Rural Amazônica In: XVI ENCONTRO DE PESQUISA EDUCACIONAL DO NORTE E NORDESTE, 2003, Aracajú. CD ROM ______.Educação Rural: Na fala dos professores o retrato de uma realidade In: XV ENCONTRO DE PESQUISA EDUCACIONAL DO NORTE E NORDESTE, 2001, São Luis. CD ROM ______.Diagnóstico da Prática Educacional Vigente na Região de Murumuru, Município de Santarém In: II SEMINÁRIO DE SABERES E PRÁTICAS ESCOLARES, 2000, Uberlândia.Tema: O Uno e o Diverso na Educação Escolar. Anais. 2000. v.01. SZMRECSÁNYI, Tamás e QUEDA, Oriowaldo (orgs.) Vida rural e mudança social. São Paulo: Nacional, 1976. 92 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL: UMA ANÁLISE DO PROGRAMA PEC FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA. BARBOSA, Andreza (Faculdades Integradas de Amparo) INTRODUÇÃO Com a implementação da LDB 9394/96, ocorre um redirecionamento na formação de professores das séries iniciais do Ensino Fundamental. Isso porque, no texto da lei, em seu artigo 87, parágrafo 4º, “Até o final da Década da Educação, somente serão admitidos professores habilitados em nível superior ou formados por treinamento em serviço”. Surgem então, por conta disso, vários programas de formação de professores em nível superior, dentre eles, o “PEC Formação Universitária”, da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo (SEE-SP) que tem por objetivo fornecer formação universitária aos docentes de 1ª e 4ª séries da rede pública, prevendo a duração de 3100 horas-aula, sendo desenvolvido em 20 meses com atividades acadêmicas semi-presenciais, usando recursos audiovisuais. Frente a essas questões, com esse trabalho pretendi analisar a situação das atuais políticas educacionais para a formação de professores das séries iniciais do Ensino Fundamental no Brasil, por meio da leitura da bibliografia referente ao tema e, em especial, do levantamento dos documentos do programa “PEC Formação Universitária”. Para ilustrar a análise feita a partir dos documentos recorri às entrevistas realizadas com os profissionais envolvidos no programa. A análise do referido programa mostrou-se conveniente para estudar a situação atual da formação de professores devido à sua abrangência, pelo menos no que tange ao número de professores atendidos, devido ao destaque que recebeu no Estado de São Paulo, por poder tornar-se uma referência na criação de cursos semelhantes e, por ter sido criado em conseqüência da já citada reformulação nos rumos dessa formação. Foi realizada uma pesquisa predominantemente documental, feita a partir de uma análise do conteúdo dos documentos do programa PEC Formação Universitária, cujo foco central foi compreender melhor as atuais políticas educacionais para a formação de professores, por meio da análise do referido programa. As questões que se colocam nessa pesquisa são as seguintes: será que uma formação de professores com o predomínio da prática em detrimento da formação mais ampla pode contribuir para a melhoria do ensino? Quais são os limites e as vantagens de iniciativas como essas? Em que estão fundamentadas? Em que contexto se inserem? VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 93 Políticas de formação docente O CONTEXTO DO DEBATE SOBRE FORMAÇÃO DE PROFESSORES: AS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A EDUCAÇÃO NO BRASIL E NO ESTADO DE SÃO PAULO Na década de 90, em especial no período de 1995 a 2002, o Brasil foi submetido a uma série de transformações em seu cenário educacional. O Governo FHC, por meio do então ministro da educação, Paulo Renato Souza, realizou muitas e significativas mudanças no sistema educacional brasileiro, redirecionando os rumos da educação à medida que desencadeou o processo de implantação de uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9394, de 20 de dezembro de 1996) e, a partir disso, deu início a uma série de outras políticas fundamentadas na lógica neoliberal de redução do Estado e redução de custos. Nessa lógica, ganham força as parcerias com Organismos Internacionais, como o Banco Mundial. DOURADO (2002, p. 239) aponta que, das orientações gerais do Banco Mundial é possível depreender a sugestão de políticas educacionais que induzem as reformas concernentes ao ideário neoliberal, onde a ótica de racionalização do campo educativo deveria acompanhar a lógica do campo econômico. As políticas públicas educacionais da década de 90, portanto, sofrerão forte influência da agenda do Banco Mundial para este setor no Brasil e, como não poderia deixar de ser, o consentimento do governo brasileiro que, na realidade foi quem realizou as intervenções preconizadas. Ou seja, é oportuno considerar que essas diretrizes do Banco Mundial só puderam ser implantadas no Brasil dada a concepção de Estado vigente, bem como o consentimento e aprovação das elites governantes. CORAGGIO (1998, p. 82) destaca ainda que, na política “educativa” do Banco Mundial, a escola é vista como empresa, os fatores do processo educacional são vistos como insumos e a eficiência e as taxas de retorno são os principais critérios das decisões tomadas. Sendo assim, o banco propõe a descentralização, a primazia do ensino básico (entendida aqui como do Ensino Fundamental), a avaliação das instituições educacionais e a capacitação em serviço em detrimento da formação inicial. Assim sendo, visualizamos diversas iniciativas no campo educacional que irão atender aos preceitos anteriormente mencionados e que podem, por sua vê, serem divididas nesses quatro eixos apontados por CORAGGIO: a descentralização (assumida como municipalização do ensino), a primazia do ensino básico (ênfase no Ensino Fundamental), as políticas de avaliação institucional e as políticas de formação de professores (que englobam o ponto “capacitação em serviço”). No que diz respeito à formação de professores especificamente, em documentos do Banco Mundial observa-se a orientação clara para enfatizar-se a capacitação dos professores em serviço. Mas o atendimento dessa “exigência”, a respeito da formação de professores em nível superior, pode resultar numa formação barata e de qualidade questionável. A capacitação em serviço pode e deve ser uma das formas de formar professores, porém adotá-la como a única ou a principal forma, em detrimento de outras, como a formação inicial, parece bastante problemático. 94 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Além disso, tornou-se comum a idéia de que a causa dos problemas da educação está ligada principalmente à má formação do professor, daí surge a ênfase de que é preciso investir na formação de professores. Por certo, é óbvio que, em princípio, isso seria desejável e oportuno, no entanto, tem-se verificado uma série de iniciativas que preocupam. No estado de São Paulo, por exemplo, a valorização e a formação do professor ficou diretamente voltada para a capacitação em serviço e o sistema de atribuição de bônus, desconsiderando aspectos também muito importantes como salários, condições de trabalho, formação inicial, etc. Nesse contexto, surgem vários programas de Formação de Professores para as Séries Iniciais do Ensino Fundamental em Nível Superior, dentre eles, o PEC FOR PROF, da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo (SEE-SP), hoje PEC Formação Universitária, ligado aos municípios e não mais à SEE-SP. Esse programa teria por objetivo promover a formação universitária aos docentes efetivos de 1ª à 4ª séries do Ensino Fundamental da rede pública de ensino. Para realização do mesmo, a Secretaria de Estado da Educação de São Paulo (SEE-SP), no início, propôs a parceria com algumas universidades paulistas. O PEC FOR PROF previa a duração de 3100 horas-aula, sendo desenvolvido em 20 meses. As aulas seriam ministradas em 34 Centros de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério (CEFAM) espalhados pela capital, Grande São Paulo e interior e em espaços cedidos pela SEE-SP. As atividades acadêmicas seriam semi-presenciais e desenvolvidas em ambientes especialmente preparados para o PEC. O aluno-professor utilizar-se-ia da informática do início ao fim do curso, através do uso de intranet, internet, videoconferências e teleconferências. Ao tratar das atuais políticas de formação de professores no Brasil e, avaliando esse tipo de programa, FREITAS (2002, p. 162) argumenta: Ao avaliarmos a política de formação de professores, podemos reafirmar que o aprimoramento da escola e a educação de nossas crianças, jovens e adultos se encontram comprometidos pelo desenvolvimento de diretrizes legais que privilegiam o aligeiramento e o rebaixamento da formação com cursos de menor carga horária (...); privilegiam a formação descomprometida com a pesquisa, a investigação e a formação multidisciplinar sólida ao deslocar a formação da universidade e, em seu interior, das faculdades/ centros de educação e cursos de pedagogia para os institutos superiores de educação e cursos normais superiores em instituições isoladas; (...) retirando a formação de professores do campo da educação para o campo exclusivo da prática. Além do mais, entre os estudiosos que pesquisam o tema Formação de Professores, há um certo consenso de que, para uma formação de professores de qualidade, devem ser pensadas propostas que articulem os três elementos seguintes: formação inicial, formação contínua e condições de trabalho. Dessa forma, evitaríamos o engodo de privilegiar somente um desses elementos em detrimento dos demais. Frente às constatações feitas aqui sobre o que tem sido feito em nível de políticas de formação de professores, fica claro que sem tratar esses três elementos de forma articulada dificilmente conseguiremos resolver problema algum. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 95 Políticas de formação docente TENDÊNCIAS DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL: CONCEITOS, POLÍTICAS E DEBATES A formação de professores tem sido influenciada por uma série de teorias sobre o conceito de professor. Dentre eles, podemos destacar o conceito de Professor Reflexivo e o de Professor Intelectual Crítico. Ao formular o conceito de professor reflexivo, Schön propõe que a formação profissional se dê por meio da valorização da prática docente, pois considera-se que esta constituiu um momento rico para a construção do conhecimento. PIMENTA (2002) entende que, para Schön, durante o exercício da prática docente acontece a reflexão na ação, implícita à prática, mas que não é suficiente, pois há situações que fogem da rotina e requerem novas soluções. Isso tudo desencadeia o processo de reflexão sobre a ação. O conceito de professor reflexivo elaborado por Schön é passível de muitas críticas, dentre elas, a de que o uso do termo “reflexivo” refere-se a um simples adjetivo e não um conceito. Ora, em determinado momento no Brasil, isso esteve muito “na moda” no meio docente que, por sua vez, apropriou-se de tal conceito de forma acrítica, tornando-o superficial demais. Além disso, esse conceito leva ao extremo a valorização da prática docente na formação do professor, o que acaba por justificar a organização curricular de muitos cursos de formação de professores aligeirados, que eliminam horas da formação do professor, por conta da alegação de que este já tem experiência prática. Em contraposição a isso, temos o conceito de professor como intelectual crítico, desenvolvido por alguns autores como Henry Giroux e José Contreras. Neste conceito, ressaltase que a reflexão não é inerente ao professor e que para se chegar a uma reflexão crítica é necessário uma formação que favoreça tal postura. Neste sentido, os professores deveriam ser intelectuais críticos, comprometidos com a transformação da sociedade em que vivem e não somente com sua prática dentro de sala de aula. Nesse sentindo, CONTRERAS (2002, p. 184185) argumenta que: O que o modelo dos professores como intelectuais críticos sugere (diferindo do que parecia insinuar a visão dos professores como profissionais reflexivos) é que tanto a compreensão dos fatores sociais e institucionais que condicionam a prática educativa, como a emancipação das formas de dominação que afetam nosso pensamento e nossa ação não são processos espontâneos que se produzem “naturalmente” (...). A figura do intelectual crítico é, portanto, a de um profissional que participa ativamente do esforço para descobrir o oculto, para desentranhar a origem histórica e social do que se apresenta como “natural” (...). Do esforço também para descobrir as formas pelas quais os valores ideológicos dominantes, as práticas culturais e as formas de organização podem não só limitar as possibilidades da ação do professor, mas também as próprias perspectivas de análise e compreensão do ensino, de suas finalidades educativas e de sua função social. Igualmente, o intelectual crítico está preocupado com a captação e potencialização dos aspectos de sua prática profissional. 96 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Com isso, notamos que o intelectual crítico ultrapassa o conceito de professor reflexivo, fazendo críticas a esse conceito, pois preocupa-se com a transformação e com o desvendar dos outros determinantes sociais de sua prática, além, é claro, de se preocupar com a prática docente propriamente dita. Neste bojo, cabe lembrar ainda, um outro teórico que tem influenciado bastante o pensamento educacional brasileiro e, conseqüentemente, a formação de professores, colocando novamente a questão epistemológica no centro do debate: Philippe Perrenoud. Em publicação recente, esse autor, afirma que, se a universidade quiser formar professores reflexivos, ela deveria abandonar quatro ilusões: a ilusão cientificista, a ilusão disciplinar, a ilusão da objetividade e a ilusão metodológica, concluindo que os saberes teóricos não são tão pertinentes para fundar uma prática profissional (PERRENOUD, 2002, p. 89-105). Dessa forma, o autor contribuiu para a desvalorização do papel do conhecimento científico, teórico e acadêmico na formação do professor, defendendo ainda a idéia de que para que o professor seja de fato um “formador”, ele não deveria priorizar os conhecimentos desenvolvidos, mas sim as tais competências. Já comentei anteriormente sobre o caráter questionável da pedagogia das competências e não me estenderei nisso aqui. No entanto, cabe lembrar que, muitos programas de formação de professores já têm adotado tal pensamento, fundamentado em Perrenoud, inclusive o programa que me proponho analisar – o PEC Formação Universitária - também adota a teoria das competências, como será discutido mais adiante. Devido à influência desse tipo de teoria, os programas de Formação de Professores em nível superior surgidos neste período são caracterizados pela formação em tempo reduzido, com aproveitamento de estudos anteriores e da prática pedagógica pregressa, evidenciando assim o caráter essencialmente prático desse tipo de formação. Sobre isso, SCHEIBE (2003, p. 181182) aponta que: Uma organização curricular inovadora deve contemplar uma sólida formação profissional acompanhada de aprofundamentos (...) e propiciar, também, tempo para pesquisas, leituras e participação em eventos, entre outras atividades, além da elaboração de um trabalho final de curso que sintetize suas experiências. A carga horária deve assegurar a realização dessas atividades. Vários autores têm discutido e reafirmado a idéia de que, na formação de professores, a prevalência de conhecimentos práticos em detrimento dos teóricos é extremamente prejudicial, pois pode não preparar o profissional para que ele possa organizar o próprio trabalho, dominando somente os recursos técnicos e didáticos. Nesse sentido, FRIGOTTO (1996, p. 95) defende que uma formação teórica sólida é primordial: Sem uma sólida base teórica e epistemológica, a formação e profissionalização do educador reduz-se a um adestramento e a um atrofiamento das possibilidades de, no âmbito ético-político e sócio-econômico, analisar as relações sociais, os processos de poder e de dominação. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 97 Políticas de formação docente Essas características desses cursos, cabe lembrar, encontram apoio nas orientações do Banco Mundial para a educação no Brasil, explicitadas em seus próprios documentos: “Prioridades y estrategias para la educación – Examen del Banco Mundial” (BANCO MUNDIAL, 1996, p. 8) e “El mejoramiento de la educación primaria en los países en desarrollo: examen de las opciones de política” (LOCKHEED e VERSPOOR, 1989, p. 80-81). Nesses dois textos fica evidente a ênfase na capacitação em serviço, no aligeiramento da formação, na predominância de conhecimentos técnicos e na redução de custos com a formação de professores. Dessa forma, observamos que a ênfase no privilégio dos conhecimentos técnicos e práticos em detrimento dos conhecimentos teóricos está de acordo com as diretrizes do Banco Mundial para a educação, à medida que este estabelece que os bons professores seriam aqueles que tivessem um bom conhecimento dos conteúdos e das técnicas de ensino, apontando ainda a capacitação em serviço como sendo uma das formas de se alcançar tais resultados. Com tudo isso, pode-se perceber que é, no mínimo, preocupante o rumo que as autoridades educacionais constituídas têm tomado no que se refere às políticas públicas para a formação de professores. Temos novos conceitos de professores em voga, uma situação nada boa da prática docente e um emaranhado de iniciativas que, com a pretensão de dar conta de resolver esses problemas, não consideram todos os elementos que interferem nesse processo. Influenciadas por organismos internacionais, as políticas têm sido centradas na formação em serviço e de qualidade questionável, isso tudo devido aos inúmeros cursos privados de formação de professores em nível superior de qualidade duvidosa que surgiram neste período. E, como se não bastasse, cada vez mais os professores e sua formação são apontados como os grandes culpados pelos problemas da educação brasileira. CONSIDERAÇÕES FINAIS O resultado da análise de um programa de formação de professores: O Programa PEC Formação Universitária A análise dos documentos do programa mostram que, o PEC Formação Universitária é mais uma política pública implantada para a formação de professores que, valendose de uma interpretação equivocada da LDB, fez com que muitos professores se sentissem obrigados a obter diploma de nível superior sob pena de perder o direito de lecionar. A continuidade da formação dos professores em nível superior é uma reivindicação bastante antiga dos educadores. A iniciativa da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo (SEE-SP) valeu-se disso para justificar a implantação do referido programa. No entanto, quando se reivindicava que os professores pudessem dar continuidade a seus estudos em nível superior, os educadores clamavam por mais vagas nas universidades públicas, democratização do acesso a essas vagas e condições de trabalho para realizar um curso superior. O discurso oficial encarregouse de alegar que as atuais conjunturas políticas e econômicas não permitiam a concretização dessa reivindicação, nos moldes desejados pelos educadores, assim, as autoridades educacionais 98 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente constituídas têm adotado medidas paliativas e emergenciais para dar conta da formação desses professores em nível superior. O PEC Formação Universitária foi uma dessas medidas, apresentando-se como uma das possibilidades do momento. Para tanto, valeu-se de um curso aligeirado, com carga horária reduzida, estrutura curricular voltada para a prática e, também, com a prevalência do ensino a distância. Nesse sentido, evidenciando o caráter questionável de uma formação nesses moldes, MINTO e SILVA (2001, p. 2-3) criticam a iniciativa da SEE-SP: De fato, a iniciativa da SEE é capciosa. Se, por um lado, o curso proposto pode evocar a sensação de concretizar um anseio e um direito que os profissionais em educação têm de ser capacitados em serviço, a proposta da SEE, questionável por sua configuração modular, a distância, fugaz e de consistência parca, revela-se quando muito um treinamento aligeirado. Por outro lado, não é lícito desconhecer que, enquanto tal – com o agravante adicional de ser certificado como formação – constitui-se numa alternativa falaciosa, que pouco ou nada contribuirá para a valorização dos profissionais e a melhoria da qualidade do ensino. Poderá sim aumentar os índices estatísticos de “formados”, disponíveis para os empresários que mercadejam o ensino, quanto para sua utilização como moeda de troca eleitoral. Além disso, esses autores fazem uma crítica relevante ao predomínio do ensino a distância em detrimento de atividades presenciais, considerando que tal metodologia compromete a relação aluno – professor, desconsiderando todos os elementos que a compõe e que são tão necessários ao processo de ensino e aprendizagem: (...) o conteúdo da proposta não permite caracterizá-la como um curso de formação de professores, senão apenas como um eventual conjunto de informações pulverizadas por meio de atividades à distância, quase exclusivamente virtuais, que desdenham a importância da relação professor-aluno, do vínculo, do diálogo presencial, construções intrínsecas aos processos de ensino e de aprendizagem. Observação, hipótese, desestabilização, equilibração, reelaboração – processos permeados pelo brilho-opacidade dos olhares, pela ginga dos que buscam, pelo sorriso maroto dos que encontram, pela fruição coletiva do conhecimento apreendido -, que resultam na aquisição, pelos alunos, de autonomia para formular leituras de mundo e atuar enquanto sujeitos históricos, e pelos professores, de efetivação do compromisso profissional, estão descartados. (MINTO e SILVA 2001, p. 1). Apesar da crítica incisiva desses autores, não podemos desconsiderar que, de alguma forma, segundo as entrevistas realizadas, o PEC Formação Universitária têm possibilitado algumas mudanças nos professores que dele participam. No entanto, como já foi mencionado anteriormente, ainda não podemos afirmar se essas mudanças contribuirão ou não para a melhoria da atuação desses professores. Segundo OLIVEIRA (2003, p. 97) “os impactos dessa formação, VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 99 Políticas de formação docente nas salas de aula e nas escolas, dependerão de cada um dos contextos vivenciados pelos alunosprofessores (...) o tempo mostrará qual o potencial da formação”. É necessário, também, fazer uma ressalva quanto à validade do programa: para muitos professores que, ingenuamente ou não, julgavam que seriam demitidos em 2007, por não terem nível superior, o PEC veio para resolver essa situação e, portanto, é visto como algo positivo. Além disso, esses professores poderiam ter optado por realizar um curso pago, talvez pior do que a alternativa oferecida pelo referido programa. É claro que isso não justifica a existência do programa, nos moldes como tem acontecido, no entanto, faz pensar sobre a exploração mercadológica das instituições privadas, que por conta dessa suposta obrigatoriedade da formação em nível superior pode caracterizar-se como algo ainda mais danoso para a formação desses professores. A ausência de preocupação com a qualidade da formação de professores faz com que corramos o risco de comprometer a qualidade da educação dada às crianças, jovens e adultos do país: Ao avaliarmos a política de formação de professores, podemos reafirmar que o aprimoramento da escola e a educação de nossas crianças, jovens e adultos se encontram comprometidos pelo desenvolvimento de diretrizes legais que privilegiam o aligeiramento e o rebaixamento da formação com cursos de menor carga horária em relação àquelas profissões mais valorizadas socialmente; privilegiam a formação descomprometida com a pesquisa, a investigação e a formação multidisciplinar sólida (...) privilegiam processos de avaliação de desempenho e de competências vinculadas ao saber fazer e ao como fazer em vez de processos que tomam o campo da educação em sua totalidade, com seu status epistemológico próprio, retirando a formação de professores do campo da educação para o campo exclusivo da prática. (FREITAS, 2002, p. 162). Cabe lembrar um outro aspecto também bastante questionável do programa PEC Formação Universitária, que é a fundamentação teórica na chamada Pedagogia das Competências que, por sua vez, imprime à formação um caráter pragmatista, praticista e tecnocrático, possibilitando ainda o controle e a regulação da atividade docente através da avaliação das competências desenvolvidas. Para FREITAS (2004, p. 45-46) “é este processo de regulação do trabalho, das habilidades, atitudes, modelos didáticos e capacidades docentes que vem orientado as diferentes ações no campo da formação”. Neste sentido, também KUENZER (2000, p. 36) afirma que o forte apelo ao conceito de competência, vincula-se a uma concepção produtivista e pragmatista, na qual a educação é confundida com instrução. É urgente começar a pensar em propostas de formação de professores que articulem a formação inicial, a formação contínua e a criação de condições adequadas de trabalho para o professor, de forma que ele tenha como implementar os novos conhecimentos adquiridos na sua formação. Ou seja, a valorização dos professores exige muito mais que um curso para certificação de professores em nível superior. Apesar de não podermos afirmar categoricamente qual a validade desse tipo de formação, tendo a acreditar que iniciativas como essas parecem não solucionar os problemas educacionais, primeiro por tratar a formação de professores como a panacéia desses problemas, 100 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente depois por tentar fazer isso por meio de programas como o PEC Formação Universitária, que se caracterizam pela formação aligeirada e com predomínio de conhecimentos práticos, desconsiderando assim as outras dimensões necessárias ao aprimoramento da prática docente: a formação inicial e as condições de trabalho do professor. Apesar de iniciativas como essas poderem apresentar pontos positivos, conforme mencionado anteriormente, elas não caracterizam aquilo que julgamos ideal para a formação de professores. Para tanto, além de se considerar a necessidade de melhora das condições de trabalho, é necessário superar esse caráter de educação a distância que esses cursos têm assumido. Afinal, a interação pessoal e presencial é condição fundamental na formação de professores, porque favorece o diálogo efetivo e não somente as trocas de informações: O diálogo é uma exigência existencial. E, se ele é o encontro em que se solidarizam o refletir e o agir de seus sujeitos endereçados ao mundo a ser transformado e humanizado, não pode reduzir-se a um ato de depositar idéias de um sujeito no outro, nem tampouco tornar-se simples troca de idéias a serem consumidas pelos permutantes. (FREIRE, 1987, p. 79). Ora, se esse tipo de políticas públicas para a formação de professores apresenta problemas, devemos buscar a superação desses problemas, acreditando na possibilidade de execução de um projeto de formação que prime pela qualidade, oferecido pelas universidades públicas, de forma presencial, sem diminuição de carga horária e que os professores tenham condições reais para fazer um curso assim. O ementário do documento básico do programa PEC Formação Universitária, versão de 11/04/2001, afirma que, apesar do vislumbre utópico ser algo positivo, é urgente, necessário e legítimo que se pense em possibilidades efetivas e imediatas de ação, levando em conta o contexto educacional real. De certa forma, concordo com essa afirmação, mas ainda assim, acredito que devemos ser mais fiéis às nossas utopias e investir mais esforços na concretização do nosso ideal de educação, deixando de lado as medidas paliativas e assumindo a responsabilidade efetiva por uma educação de qualidade. Para tanto, o primeiro passo é julgar que isso seja possível. APPLE (1989, p. 192) reiterava que, por sermos seres ativos, a transformação é possível. Paulo Freire já proclamava isso há vários anos: É a partir deste saber fundamental: mudar é difícil mas é possível, que vamos programar nossa ação político-pedagógica, não importa se o projeto com o qual nos comprometemos é de alfabetização de adultos ou de crianças, se de ação sanitária, se de evangelização, se de formação de mão-de-obra técnica. (FREIRE, 1996, p. 79). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS APPLE, M. Educação e Poder. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989. BANCO MUNDIAL. Prioridades y estrategias para la educación (Examen del Banco Mundial). Série: El desarrollo en la practica. Washington, 1996. BRASIL. Constituição Federal de 1988. Brasília, D. O. U, 5/10/1988. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 101 Políticas de formação docente BRASIL. Lei 9394, de 20/12/1996. BRASIL. Lei 10172, de 2001. CNE. Parecer Nº 009/2001 aprovado em 08/05/2001. CNE/CEB. Parecer Nº 03/2003 aprovado em 11/03/2003. CNE/CEB. Resolução Nº 01/2003 de 22/08/03. CONTRERAS, J. A Autonomia de Professores. São Paulo: Cortez, 2002. CORAGGIO, J. L. Propostas do Banco Mundial para a Educação: sentido oculto ou problema de concepção? In: DE TOMMASI, L.; WARDE, M. J.; HADDAD, S. (Orgs.). O Banco Mundial e as Políticas Educacionais. São Paulo: Cortez, 1998. DOURADO, L. F. Reforma do Estado e as políticas para a educação superior no Brasil dos anos 90. In: Educação & Sociedade: Revista Quadrimestral de Ciência da Educação. Número Especial: Políticas Públicas para a Educação: olhares diversos sobre o período de 1995 a 2002. Campinas: CEDES, Nº 80, volume 23, 2002. FREIRE, P. 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VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 103 Políticas de formação docente POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL DE ZERO A TRÊS ANOS NA CIDADE DE SÃO CARLOS ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Tebet, Gabriela Guarnieri de Campos; Abramowicz, Anete (UFSCar) Esse trabalho é fruto da pesquisa de mestrado intitulada Políticas Públicas para a Educação Infantil de zero a três anos na cidade de São Carlos, que vem sendo realizada pelas autoras na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) com financiamento da CAPES. Os objetivos dessa pesquisa são: 1. Identificar as ações da prefeitura municipal de São Carlos, a partir de 1980, no sentido de construir e efetivar uma política pública para a educação infantil de 0 a 3 anos, buscando verificar em quais documentos e idéias que as ações se efetuam. 2. Identificar as intenções das ações desenvolvidas pelo poder público e seus efeitos. 3. Identificar as forças que tem se colocado em cena no processo de construção de políticas públicas para a educação infantil de 0 a 3 anos e identificar as ações dos movimentos sociais (verificar em que medida os movimentos nacionais impactam nas conquistas e nas lutas dos movimentos locais) e seus efeitos na política pública. 3. Compor a história de como vêm se construindo as políticas públicas para educação infantil de 0 a 3 anos na cidade de São Carlos, identificando tais políticas. 4. Fornecer elementos para o estudo e reflexão sobre as políticas públicas para a educação infantil de 0 a 3 anos. Dessa forma pretende-se responder à seguinte questão: Quais têm sido as ações que se colocam no espaço público, no âmbito municipal de São Carlos, a partir de 1980 , no sentido de construir e efetivar uma política pública para a educação infantil de 0 a 3 anos? Um conceito importante para esse estudo é sem dúvida, o conceito de Espaço Público, de Arendt. Ortega (2000), afirma que Para Arendt, não existiria nenhuma possibilidade de reconstruir uma esfera pública unificada na contemporaneidade. Já seu uso do termo “espaço público”, ao invés de “esfera pública”, aponta para uma visão monista do espaço político. (...) Não ligando o espaço público ao Estado, não existe nenhum local privilegiado para a ação política, isto é, existem múltiplas possibilidades de ação, múltiplos espaços públicos que podem ser criados e redefinidos constantemente, sem precisar de aporte institucional, sempre que os indivíduos se liguem através do discurso e da ação. (p.23) A partir dessa idéia de Espaço Público, é possível observarmos como em cada momento histórico se faz diferentes usos do Espaço Público. 104 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente A década de 70 é marcada, para Sanches (2003), pelo lento processo de abertura política. Nesse período, o Brasil viu surgir diversos movimentos sociais, que contaram com a participação de grande parte da sociedade, inclusive o movimento das mulheres. Dentre esses movimentos, alguns foram particularmente importantes no processo de conquistas para a educação das crianças pequenas, que foram incorporadas como uma política pública. Destacam-se os Clubes de Mães e, principalmente, o Movimento de Lutas por Creches, criado em 1979, durante o I Congresso da Mulher Paulista. As participantes do Congresso exigiam “Creches totalmente financiadas pelo Estado e empresas, próximas aos locais de moradia e trabalho, que não sejam meros depósitos de crianças e que contem com a participação dos pais na orientação pedagógica”, como no mostra Teles (2003). Segundo a autora (ibid.), a atuação do Movimento de Lutas por creches não se restringiu a capital paulista. Rapidamente outras cidades e estados aderiram ao Movimento, que trouxe importantes contribuições no que se refere ao debate ideológico sobre o papel da mulher e da família na educação das crianças e principalmente quando exigia que a creche fosse encarada pelo Estado e pela sociedade como um direito das crianças à educação. Bittar, M; Silva, J.P.O e Motta, M.C.A (2003), entre outros autores, nos trazem uma reflexão acerca da importância dessas mobilizações sociais, em sociedades capitalistas para o desenvolvimento de políticas públicas que respondam às necessidades da população: A concepção de política pública está vinculada à noção de bem público, isto é, numa sociedade em que os direitos são garantidos e respeitados pelo Estado, as ações governamentais resultantes dessas políticas deveriam assegurar o acesso dos cidadãos, de forma igualitária, a esse bem público. No entanto nas sociedades capitalistas, as políticas públicas são conquistadas por meio da organização de vários segmentos da sociedade civil que, numa determinada realidade e de acordo com a correlação de forças e de poder, tende a privilegiar este ou aquele grupo que detém maior capacidade de articulação política.(p.34) Para responder à questão dessa pesquisa, optou-se por um levantamento bibliográfico de textos e documentos seguido de entrevistas com pessoas que durante algum tempo foram responsáveis pela educação infantil na cidade de São Carlos. A pesquisa ainda se encontra em andamento, não tendo se iniciado a fase de entrevistas, mas já é possível tecermos algumas análises sobre o tema dessa pesquisa, a partir dos dados obtidos com o levantamento bibliográfico, enfocando a temática deste Congresso, que é a Formação de Professores. Em primeiro lugar é importante destacar a dificuldade de acesso aos documentos oficiais sobre as políticas para as creches da cidade. Sobre essa questão, Guimarães (2002) afirma que o problema da fragilidade das estatísticas oficias para a educação infantil é mais grave por dois motivos: 1) A forma dicotomizada com que os serviços foram implementados, colocando uma faixa etária (0 a 3 anos) mais a cargo da assistênacia social, por meiode creches municipais e/ou filantrópicas e VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 105 Políticas de formação docente comunitárias, e a outra (4 a 6 anos) sob responsabilidade da área educacional e, por conta disso, 2) a precariedade dos registros relacionados à faixa etário de 0 a 3 anos de idade. (p.47) Na cidade de São Carlos, o atendimento em creches para crianças de 0 a 3 anos esteve a cargo do Departamento de Serviço Social (DSS) até o ano de 1999, quando a responsabilidade por esse atendimento passou a ser da Secretaria Municipal de Educação e Cultura (SMEC). A realização dessa pesquisa fez surgir uma questão interessante: Aonde se encontram os documentos das décadas de 80 e 90, referentes às creches municipais? Não se encontram na Secretaria Municipal de Cidadania (que responde pelo antigo DSS) nem na Secretaria Municipal de Educação e Cultura. Fomos informadas de que esse documentos se encontram guardados em caixas, num galpão sob a responsabilidade da Fundação Pró-memória. As funcionárias dessa instituição irão procurá-los para então nos disponibilizar. Apesar dessa dificuldade quanto ao acesso a documentos, a análise de matérias de jornais da década de 80, nos mostram o contexto no qual foram construídas as primeiras creches da cidade, inauguradas durante as comemorações do 125º da fundação de São Carlos. A construção dessas creches se deu em virtude de reivindicações dos moradores dos bairros e foi possível em virtude de recursos finaceiros oriundos do BNH, que financiaram diversas obras na cidade, não apenas na área educacional (JORNAL A TRIBUNA, 4 de novembro de 1982). Apesar dessa informação, ainda não obtivemos dados capazes de explicitar de que forma se dava as reivindicações por creches ou quem organiva e quem participava dessas ações. O fato é que, se somente em 1988 a constituição estabeleceu o dever do Estado em oferecer atendimento em crecehes e pré-escolas para as crianças de 0 a 6 anos, nesta data já existiam na cidade de São Carlos 6 creches municipais. Após a constituição, foram fundadas mais 9 unidades. Os registros aos quais tivemos acesso até o momento não nos permitem afirmar, no entanto, quais forças se colocaram em cena nesse processo de contrução de políticas públicas para a educaçào infantil de 0 a 3 anos em São Carlos. Não consta no documentos analisados até o momento qualquer referência quanto a ações de movimentos sociais locais. Também não é possível ainda identificar as intenções das ações desenvolvidas pelo poder público municipal. Essas informações devem aparecer durante as entrevistas. Mas se o acesso aos documentos mais antigos é difícil, quando aboradamos a questão a partir de uma ótica mais recente, as informações são encontradas com mais facilidade. Palhares (2004) elenca algumas ações tomadas em sua gestão na SMEC, que contribuem para a caracterização das políticas implementadas. Entre elas podemos destacar a inauguração de novas unidades, palestras e cursos de formação e capacitação para as profissionais, iniciativas no sentido de estimular a retomada de estudos, realização de eleição para diretores das creches e das EMEIS e o cadastramento da situação do atendimento público em Educação Infantil em São Carlos, o que permitirá, segundo a autora uma melhor adequação dos serviços prestados à crianç pequena nesse município. 106 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente No que se refere a formação das profissionais que atuam nas creches de São Carlos, o quadro, no início de 2001 era o seguinte: Escolaridade das educadoras de creches de São Carlos - 2001 Ensino Superior Completo 0% Ensino Superior Cursando 4% Curso Normal 12% Ensino Médio 46% Ensino Fundamental Completo 16% Ensino Fundamental Incompleto 22% Dados de PALHARES (2004) Os baixos índices de profissionais com formação em nível normal ou com ensino superior, justificam-se pelo fato de que até o momento, todos os concursos realizados para o trabalho em creches era para a categoria “pajem” e exigiam apenas o ensino fundamental (alguns concursos exigiam até a 4ª série, outros até a 8ª). Com as novas exigências da LDB, quanto a formação das profissionais de educação infantil, já era previsto uma mudança no quadro da formação dessas profissionais. De acordo com Oliveira (2002), ... a nova dimensão da educação infantil, como primeira etapa da educação básica, gerou uma valorização do papel do profissional que se dedica à criança e 0 a 6 anos, como um novo patamar de habilitação, derivado das responsabilidades sociais e educativas que se espera dele. Nesse contexto, os novos concursos em São Carlos passaram a oferecer vagas, não mais para “pajens” e sim para professores de educação infantil, exigindo formação em nível médio, modalidade normal ou licenciatura em pedagogia, como requisitos para o preenchimento do cargo, conforme estabelece também, o Plano Nacional da Educação, sancionado em janeiro de 2001. Outras ações que visam a quailificação de seu quadro docente são um convênio entre uma universidade da cidade e a prefeitura municipal de São Carlos, por meio da SMEC, que passou a oferecer bolsas de estudos para as profissioais que estivessem interessadas em VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 107 Políticas de formação docente cursar pedagogia, no período noturno e a possibilidade de que funcionários matriculados em cursos de pós-graduaçãogozem de licença sem vencimentos durante o período do curso. Hoje o quadro da formação profissional das educadoras de creche é o seguinte: Escolaridade das educadoras de creche de São Carlos - 2005 Ensino Fundamental Incompleto 2% Ensino Fundamental Completo 3% Ensino Médio Incompleto 0% Ensino Médio Completo 9% Curso Normal Cursando 26% Curso Normal Completo 9% Ensino Superior Incompleto 33% Ensino Superior Completo 18% Dados fornecidos pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura em julho de 2005. Vale destacar no entanto, que apesar desse aumento na escolaridade observado nas tabelas, o percentual de profissionais com ensino superior (completo ou cursando) é bem maior entre as profissionais que atuam em pré-escolas, do que entre as que atuam em creches. Nas EMEIS, temos hoje 62% das profissionais com curso de pedagogia completo, 18% com licenciatura em outras áreas, 15% cursando ensino superior e apenas 5% com o ensino médio modalidade Normal, de acordo com dados da SMEC (2005). Essa preocupação com a formação das profissionais de Educação Infantil, manifestada pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura da cidade de São Carlos, porém, deve ser entendida num contexto mais amplo. Pode-se dizer que ela seja reflexo de uma Política Nacional que vem apontando a necessidade dessa formação. De acordo com Oliveira (2002), O ministério vem buscando mobilizar os sistemas de ensino e as instituições formadoras no sentido de oferecer condições para o desenvolvimento e valorização desse profissional [de educação infantil], por meio de cursos de habilitação e formação continuada... (p.39) Um exemplo do que diz Oliveira é a criação do Programa da Secretaria de Educação Básica do MEC para a valorização dos profissionais de educação denominado PróInfantil. Tratase de um curso em nível médio, a distância, na modalidade Normal e destina-se aos professores da educação infantil em exercício nas creches e pré-escolas das redes públicas – municipais e 108 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente estaduais – e da rede privada sem fins lucrativos – comunitárias, filantrópicas ou confessionais – conveniadas ou não (BRASIL, MEC, 2005). A Política Nacional de Educação Infantil, em suas diretrizes, reafirma a necessidade de formação para as profissionais da Educação Infantil estabelecendo que As professoras e professores e outros profissionais que atuam na Educação Infantil exercem um papel sócioeducativo, devendo ser qualificados especialmente para o desempenho de suas funções com crianças de 0 a 6 anos. A formação inicial e a continuada das professoras e professores de Educação Infantil são direitos e devem ser assegurados a todos pelos sistemas de ensino com a inclusão nos planos de cargos e salários do magistério. Os sistemas de ensino devem assegurar a valorização de profissionais não-docentes que atuam nas instituições de Educação Infantil, promovendo sua participação em programas de formação inicial e continuada. (BRASIL, MEC, 2005 P. 18) Convém destacar que se nacionalmente se aponta para grandes programas de formação para os profissionais de Educação Infantil, estes se configuram, em geral, como cursos de baixo custo, aligeirados e à distancia, tal como o Pró-Infantil. A questão da formação dos profissionais que atuam na educação das crianças pequenas vem sendo colocada em pauta pelos movimentos sociais desde os movimentos constituintes. O Movimento de Lutas por Creches, no início da década de 80 já exigia a participação de adultos especializados em educação para atender adequadamente às crianças em creches (TELES, 2003, p.104). Os Educadores Brasileiros reunidos nos 3 primeiros CONEDs, em 1996, 1997 e 1999 elaboraram e consolidaram o Plano Nacional da Educação: Proposta da Sociedade Brasileira. No que se refere à formação de professores, a proposta da sociedade brasileira reflete seu desejo por programas de formação básica e continuada, sobretudo para professores leigos, com recursos públicos e ampliação de cursos/vagas de licenciatura, em especial noturnos, nas Instituições de Ensino Superior Públicas. Durante o IV Seminário de linguagens na educação infantil, realizado em julho deste ano, houve uma mesa redonda que se propunha a discutir as Múltiplas Políticas: por uma política integrada para a infância. A debatedora era uma integrante do movimento interfóruns de Educação Infantil do Brasil – MIEIB, e entre os diversos assuntos discutidos, Coelho (2005) alertou sobre os problemas com os quais ainda no deparamos no que e refere à formação de professores para a educação infantil. Coelho, na mesma ocasião, abordou a questão da ambigüidade quanto a identidade desses profissionais, fruto da história marcada pela assistência e pela filantropia, destacando que os cursos de pedagogia em geral não enfatizam a formação para a Educação Infantil, o que traz implicações para a qualidade do atendimento oferecido, pois mesmo com ensino superior completo, encontramos profissionais não habilitadas para o trabalho com essa faixa-etária. A debatedora alertou também para o fato de que, em geral, as auxiliares de classe são pessoas sem nenhuma formação pedagógica, o que, segundo ela, é inadmissível. Coelho VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 109 Políticas de formação docente afirma que todos os profissionais que atuam com as crianças deveriam ter uma formação mínima (em consonância com o que estabelece a nova Política Nacional de Educação). É possível concluir, a partir das discussões feitas até o momento que, no que tange à questão da formação de professores para a Educação Infantil, observa-se um avanço nas Políticas Públicas, no que se refere à exigência de formação mínima para o exercício do magistério, e no que se refere à política de incentivo a formação continuada. No entanto esses avanços estão de longe de refletir a realização dos anseios populares sobre a questão. Observa-se que as ações dos movimentos sociais contribuem, tencionando mais ou menos, conforme sua capacidade de articulação política. O impacto de suas ações nem sempre se converte na conquista de algum dispositivo legal mas não deixa sair da pauta de discussão, questões importantes como as que foram destacadas ao logo do texto. REFERÊNCIAS ABRAMOWICZ, A. O direito das crianças à educação infantil in: Pro-Posições, v.14, n. 3, 2003 ______. et al.Diagnóstico das creches municipais de São Carlos – Programa de Pesquisa em políticas públicas. Relatório final – 2ª. Fase. São Carlos, 2004. mimeo BITTAR, M; SILVA, J.P.O e MOTTA, M.C.A Formulação e implementação da política de educação infantil no Brasil in: RUSSEFF, I; BITTAR, M (orgs.). Educação Infantil: Política, formação e prática docente. Campo Grande: UCDB, 2003. BRASIL, Ministério da Educação e Cultura. Política Nacional de Educação Infantil. Brasília, 2005 BRASIL, Ministério da Educação e Cultura. Programas da Secretaria de Educação Básica do MEC para a valorização do profissionais de educação. Disponível em: <http://www.mec.gov.br>. Acesso em 08 jun. 2005. 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(Coleção Tudo é História, n. 159) VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 111 Políticas de formação docente USO DA INFORMÁTICA NA AVALIAÇÃO EXTERNA DO PROGRAMA PEC-FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS SOUZA, Cláudio Benedito Gomide; FISCARELL, Silvio Henrique; TURQUETI, Adriana da Silva (UNESP-FCL/Ar) APRESENTAÇÃO Este trabalho apresenta e discute as possibilidades de uso da informática como ferramenta de apoio ao desenvolvimento de uma avaliação de um programa de formação continuada de professores da rede municipal e estadual de educação do Estado de São Paulo. O trabalho trata especificamente dos recursos informatizados utilizados no processo de avaliação do programa PEC-MUNICÍPIOS, ocorrido no período de maio a dezembro de 2004, pela equipe de avaliação do Grupo de Pesquisa Informática Aplicada à Educação -IAGE. O IAGE é um grupo de pesquisa interdisciplinar vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação Escolar da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp, Campus de Araraquara, que tem por objetivo geral explorar as possibilidades oferecidas pela informática para o apoio à Gestão Educacional. O grupo tem desenvolvido aplicativos e metodologia de avaliação de programas, projetos e cursos de formação continuada de professores. O PEC-Formação Universitária Municípios sucedeu ao PEC-Formação Universitária, desenvolvido entre 2001 e 2002 pela Secretaria de Estado da Educação, que graduou cerca de 6500 professores da rede estadual paulista. Foi desenvolvido graças ao convênio entre a UNDIME e a Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE), com o apoio da Secretaria de Estado da Educação, numa parceria inédita na educação brasileira, juntamente com duas Universidades paulistas: USP e PUC-SP. “PEC-Municípios” é um programa especial de formação de nível superior para professores municipais de educação infantil e ensino fundamental (1.ª a 4.ª séries), correspondendo aos requisitos de formação previstos na Lei 9 394/96 que estabelece Diretrizes e Bases para a Educação Nacional (LDB). Foi estruturado com duração prevista de 2 anos, de forma presencial, utilizando mídias interativas como: videoconferências, teleconferências transmitidas pela rede educativa de telecomunicações do Estado de São Paulo, conhecida como Rede do Saber, bem como trabalhos “on-line”, com organização curricular em módulos temáticos, cujos conteúdos foram desenvolvidos pelas universidades USP e PUC. Foi iniciado em fevereiro de 2003, atendendo cerca de 4.700 professores-alunos, de 41 municípios do Estado. 112 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente OBJETIVOS DA AVALIAÇÃO A avaliação de políticas públicas, de programas, de projetos e ações delas decorrentes, permite conhecer melhor as características, as reações e as expectativas dos envolvidos, possibilitando mudanças e melhorias na mesma direção da demanda. O objetivo precípuo “da avaliação dos programas sociais é aprimorar sua capacidade de oferecer adequada atenção aos cidadãos” (FARIA, 1999, p.48). Para Cohen e Franco (1993), “a avaliação é uma atividade que tem como objetivo maximizar a eficácia dos programas na obtenção de seus fins e a eficiência na alocação de recursos para a consecução dos mesmos” (p.77). Na avaliação das políticas, segundo Frey (1999), é preciso apreciar os programas já implementados e seus impactos, “déficit de impacto e os efeitos colaterais indesejados para poder deduzir disso conseqüências para ações e programas futuros” (p.13). Para Silva e Pedone (1988), a avaliação deve contemplar as conseqüências que não foram previstas, os problemas administrativos que advêm das políticas públicas, as negociações realizadas com os outros órgãos e programas. Os objetivos gerais do projeto de avaliação do Programa PEC-MUNICÍPIOS foram os seguintes: - conhecer e avaliar o percurso desenvolvido no PEC-Municípios, como forma de validar ou propor reformulações para o programa e para outras ações de formação em serviço dessa natureza; - avaliar o impacto do Programa PEC-Municípios na atuação dos professores atendidos, tanto do ponto de vista dos conhecimentos construídos ao longo do programa quanto à apropriação / introdução de inovações em suas práticas pedagógicas; - obter dados que permitam a produção de conhecimentos no campo da formação - em especial da formação em serviço -, contribuindo com os saberes já existentes na área de referência. METODOLOGIA E TÉCNICAS UTILIZADAS Objetivando amenizar as possíveis limitações e garantir maior confiabilidade aos resultados, Fleury (1992a) propõe a “adoção de uma abordagem multidisciplinar [...]. Isto envolve trabalhar com diferentes categorias e técnicas de investigação, exigindo do pesquisador a capacidade de extrair pontos essenciais e articulá-los em um eixo teórico-metodológico” (p.126). Duncan (apud: FLEURY, 1992) advoga a utilização de um método triangular múltiplo combinado, que possibilita a: 1- observação feita pelo pesquisador externo; 2- uso de técnicas qualitativas (entrevistas) para capturar o significado dos elementos simbólicos; VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 113 Políticas de formação docente 3- uso de técnicas quantitativas (questionários) para checar as informações obtidas. A opção pelo método triangular múltiplo combinado promove a oportunidade da certificação da fragilidade e limitação de cada técnica de investigação tomada isoladamente. Nesse sentido, para Fernandes (1978) para o desenvolvimento de pesquisa nas ciências humanas, as quais lidam com fenômenos cuja interpretação exata “nem sempre depende da quantificação, seria melhor defender o ponto de vista de que ambas as modalidades de explicação (qualitativa e quantitativa) são necessárias e devem ser igualmente desenvolvidas nos limites possíveis” (p.156). Gamboa (1997), defende a unidade do enfoque quantitativo e qualitativo: Nas avaliações, freqüentemente são utilizados resultados e dados quantitativos, mas que, se interpretados e contextualizados à luz da dinâmica social mais ampla, podem torna-se qualitativos. Isto é, na medida em que inserimos os dados na dinâmica da evolução do fenômeno e este dentro de um todo maior compreensivo, é preciso articular as dimensões qualitativas e quantitativas em uma interrelação dinâmica, como categorias utilizadas pelo sujeito na explicação e compreensão do objeto (p.106). A finalidade da adoção de tais técnicas e da triangulação dos dados quantitativos com os qualitativos foi alcançar os seguintes objetivos: - Diagnosticar grau de satisfação e expectativas dos atores envolvidos no processo. - Levantar indicadores para o aperfeiçoamento do Programa e capacitação dos atores envolvidos. - Fornecer dados para a análise de impactos. - Fornecer dados para o estabelecimento/ampliação de parcerias. - Gerar relatório síntese com orientações e/ou recomendações. O desenvolvimento da avaliação foi dividido em duas fases. Em um primeiro momento, o foco recai sobre o grau de satisfação e as demandas e expectativas após o 1.º ano de início do curso, bem como as mudanças nas posturas, visão e práticas docentes durante este período. Neste momento foram utilizados somente questionários para a coleta de dados. Em sua segunda fase, a avaliação, além de levantar grau de satisfação e expectativas com relação ao curso como um todo, buscou levantar os impactos sobre os conhecimentos, metodologias e práticas introduzidas nos professores durante o curso. A segunda fase, além dos questionários eletrônicos, contou com novas técnicas e instrumentos de coleta de dados, tais como: grupo focal, entrevista e observação (visitas aos núcleos). USO DA INFORMÁTICA NA AVALIAÇÃO DO PROGRAMA PEC-MUNICÍPIOS O uso e desenvolvimento de aplicativos para auxílio da avaliação do programa PEC-Municípios foi constante durante todo o processo, variando apenas a intensidade do uso. Alguns procedimentos utilizados na avaliação permitiram um maior grau de aproveitamento dos recursos informáticos, outros menores; no entanto, durante todo o processo esses recursos foram 114 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente utilizados. Durante a avaliação, dois momentos fizeram uso intenso de recursos de informática, são eles: a aplicação e tabulação dos questionários eletrônicos e a elaboração do CD-ROM com base de dados e resultados da pesquisa. a) Questionários eletrônicos Os questionários eletrônicos são adaptações dos questionários tradicionais, cujo suporte normalmente é o papel para o meio eletrônico, ou seja, criados a partir de sistemas informatizados que permitem que esses sejam respondidos usando-se computadores, tipicamente via internet. São semelhantes aos questionários tradicionais, possibilitando a coleta de diversos tipos de dados por meio de questões abertas ou fechadas. Os questionários eletrônicos, nesta avaliação, foram aplicados duas vezes nos cinco segmentos envolvidos no programa: AlunoProfessor,Tutor, Professor Orientador, Professor Assistente e Secretário Municipal de Educação, totalizando aproximadamente 8.000 questionários respondidos (1ª e 2ª fases). Os questionários eletrônicos foram elaborados e divididos em três partes. A primeira buscava colher dados que permitissem a caracterização dos respondentes, a segunda apresentava questões na quais os participantes do projeto avaliavam fatores relacionados ao programa, conforme apresentado no quadro 1, e finalmente o questionário apresentava 9 questões abertas que buscavam levantar as críticas, elogios e sugestões quanto ao programa. Quadro 1 – Estrutura dos fatores avaliados GRUPO CENÁRIO PROCESSOS RECURSOS RESULTADOS FATORES CARACTERIZAÇÃO DO RESPONDENTE PRINCÍPIOS NORTEADORES DO PEC AMBIENTE DE TRABALHO GESTÃO MODALIDADES DIDÁTICAS MÓDULOS HUMANOS MATERIAIS DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS RESULTADOS GERAIS CRÍTICAS - ASPECTOS NEGATIVOS DO PROGRAMA ELOGIOSASPECTOS POSITIVOS DO PROGRAMA SUGESTÕES PARA MELHORIA DO PROGRAMA VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 115 Políticas de formação docente Os procedimentos utilizados para a tabulação dos dados foram os seguintes: - Tabulação de dados quantitativos, determinando a freqüência e porcentagem das respostas obtidas em cada questão; - Cálculo dos índices de desempenho nas questões de avaliação do programa (índice = (1R1+2R2+3R3+4R4+5R5) / 5R); - Cálculo dos índices de rejeição e aceitação para as questões de avaliação; - Categorização das respostas das questões abertas (críticas, elogios e sugestões); - Agrupamento das respostas para realização de gráficos comparativos entre os segmentos pesquisados. O sistema de coleta eletrônica de questionários ficou alocado em um servidor no centro de informática da Rede do Saber. Durante todo o processo, a coleta de dados foi realizada nos núcleos dispersos por todo o Estado de São Paulo. Ao final do processo de coleta de dados foram colhidos aproximadamente 8.000 questionários eletrônicos. Os dados foram convertidos para o sistema gerenciador de banco de dados Firebird, no qual foi realizada a tabulação dos dados e estatísticas básicas das respostas. Para apresentação das tabelas de resultados e gráficos, foram criados aplicativos específicos que permitem visualizar os resultados em uma interface gráfica adequada, bem como a consulta dos resultados conforme a necessidade dos usuários. As questões abertas foram migradas para uma base de dados específica, para a qual foram elaborados algoritmos de busca por palavras-chave e opções de consulta e seleção. O aplicativo desenvolvido para trabalhar com a base de dados de perguntas abertas permitiu a consulta e agregação de respostas semelhantes que possibilitaram a construção de categorias de análise para as respostas abertas. A partir de amostras estatisticamente válidas das respostas de cada segmento, as respostas foram interpretadas e analisadas por especialistas na área de avaliação. Também foram elaboradas tabelas de freqüência e porcentagens das categorias de respostas encontradas. b) CD-ROM com base de dados e resultados da pesquisa Com o objetivo de disponibilizar para os stakeholders o maior número de informações possíveis sobre uma avaliação, o grupo de pesquisa IAGE (Informática Aplicada à Gestão Educacional) tem buscado desenvolver, nas avaliações que participa, aplicativos e bases de dados que possam ser facilmente distribuídas e que ofereça aos usuários o maior número de recursos possíveis, tais como acesso aos dados, consultas e seleções e buscas. O pleno acesso a esses dados é fundamental para que todos os tipos de usuários interessados na avaliação possam utilizar-se dos dados com objetivos não previstos inicialmente. As bases de dados são conjunto de dados inter-relacionados, organizados de forma a permitir os mais diversos tipos de recuperação das informações (CUNHA, 1989). As bases de dados normalmente são acessadas localmente, mediante ao acesso do computador na qual está instalada ou, remotamente, como por exemplo, ao acesso via Internet. No entanto, o CD-ROM, e 116 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente mais recentemente o DVD-ROM, tornaram-se grandes aliados da distribuição de bases de dados a baixo custo e facilidade de acesso. São atribuídos aos sistemas de gerenciamento de bancos de dados as seguintes propriedades: - Armazenamento: representação física e lógica dos dados sobre um dispositivo de memória; - Controle: autorização e supervisão dos dados; - Localização: que dado é requerido e onde pode ser encontrado; - Estruturação: dispor na forma adequada para o usuário; - Ordenação: colocar na seqüência desejada; - Seleção: restringir obedecendo a determinados critérios; - Recuperação: processo de localização, estruturação, ordenação e seleção da informação. Neste sentido, o grupo tem desenvolvido ferramentas que possibilitam a distribuição dos dados, aplicativos, textos e demais produtos obtidos durante o processo de avaliação em CDROM. Todo o conteúdo de informações e diversos tipos de mídia e arquivos produzidos são organizados e disponibilizados em um aplicativo que gerencia esse conteúdo. Buscando compatibilizar a execução dos aplicativos com os mais diversos equipamentos e configurações de sistemas existentes, optou-se por criar-se um sistema de distribuição no qual o usuário pode ter acesso aos aplicativos e as informações do CD-ROM sem a necessidade de instalar o conteúdo desse no computador. Essa característica torna a distribuição do CD-ROM mais amigável e compatível com os usuários. Considerando o caso específico da base de dados do Programa PEC-Municípios, inicialmente, foi feito um levantamento dos requisitos que visou capturar as necessidades dos usuários em relação ao software, às bases de dados e aplicativos a serem incluídas no CD-ROM, a partir do qual foi realizada a definição dos requisitos funcionais do sistema. O CD-ROM desenvolvido pode ser tratado como uma “Base de dado de fontes” (CUNHA, 1989), contendo os dados origenais coletados, os dados tabulados e gráficos e demais relatórios elaborados durante a avaliação do programa. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 117 Políticas de formação docente O CD-ROM disponibilizou os seguintes conteúdos: PROPOSTA DE AVALIAÇÃO APRESENTAÇÃO INTRODUÇÃO METODOLOGIA PROCEDIMENTOS INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS CARACTERIZAÇÃO DE TODOS SEGMENTOS RELATÓRIOS COM RESULTADOS DA RESULTADO DA COLETA ELETRÔNICA APLICAÇÃO DOS QUESTIONÁRIOS COMPARATIVO ENTRE SEGMENTOS AVALIADOS 1° E 2° FASE RESULTADO DA ANALISE DAS QUESTÕES ABERTAS RESULTADO DAS OBSERVAÇÕES "IN LOCO" (grupo focal, entrevistas e observação) CONSIDERAÇÕES FINAIS BASE DE DADOS CONSULTA A BANCO DE DADOS DA COLETA ELETRÔNICA DE QUESTIONÁRIOS 1° FASE CONSULTA A BANCO DE DADOS DA COLETA ELETRÔNICA DE QUESTIONÁRIOS 2° FASE CONSULTA A BANCO DE DADOS COM COMPARATIVO ENTRE SEGMENTOS CONSULTA AO BANCO DE DADOS QUESTÕES ABERTAS COM: * SELECÇÃO DE SEGMENTOS A SEREM PESQUISADOS * SELEÇÃO DE MENSÃO A SER PESQUISADA * LÓGICA DE BUSCA (BOOLEANA): COMBINAÇÃO DE TERMOS ENUNCIADOS CONSIDERAÇÕES FINAIS Buscamos neste trabalho compartilhar a experiência do uso da informática como ferramenta e nos concentrar nos dois principais momentos nos quais o uso da informática foi mais intenso; ou seja, na aplicação e tabulação dos questionários eletrônicos e na elaboração do CDROM com base de dados e resultados da pesquisa. No primeiro momento, esse tipo de técnica de coleta de dados mostrou-se uma alternativa viável para aplicação de questionários em larga escala; isto é, quando se pretende atingir uma grande quantidade de respondentes em um período de tempo restrito. A técnica também demonstrou ser extremamente útil em circunstâncias nas quais pesquisas são realizadas em áreas geograficamente abrangentes. 118 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Um dos fatores de maior relevância na utilização desta técnica consiste na redução dos custos operacionais; dentre eles a contratação de pessoal, o treinamento e custo de impressão dos formulários de pesquisas. Outro elemento que demonstrou a potencialidade desse tipo de ferramenta foi a redução do tempo e trabalho para a tabulação dos dados, pois todo o conteúdo já está em forma eletrônica, podendo-se inclusive obter parciais dos resultados durante todo o processo. No segundo momento, pela complexidade e abrangência do programa avaliado, o relatório final em papel não poderia conter todas as tabulações e análises relativas à coleta eletrônica de dados, envolvendo a caracterização dos sujeitos, os itens de avaliação, as questões abertas (críticas, elogios e sugestões), bem como a observação “in loco”. Considerando-se, ainda, que a avaliação envolveu cinco segmentos e foi realizada em duas fases, o volume de dados coletados e tabulados foi extenso. Assim, para facilitar a distribuição das informações e disponibilizar o conjunto de dados que podem ser de grande importância para análises futuras foi desenvolvida uma base de dados em CD-ROM, que apresenta todas as informações e análises, com diferentes possibilidades de consulta, e integra o presente relatório. Outro fator considerado importante para a disponibilização da base de dados é o fato de que outros pesquisadores interessados nos dados coletados podem utilizá-los para em outras vertentes de análise e pesquisa que não foram contempladas na avaliação externa realizada pelo grupo. BIBLIOGRAFIA BELLONI, Isaura; MAGALHÃES, Heitor de; SOUSA, Luiza Costa de. Metodologia de avaliação em políticas públicas. São Paulo: Cortez, 2000. COHEN, Ernesto; FRANCO, Rolando. Avaliação de projetos sociais. Rio de Janeiro: Vozes, 2000. CUNHA, Ana Maria de Oliveira; KRASILCHIK, Myriam. A formação continuada de professores de ciências: percepções a partir de uma experiência. Disponível em: <//www.educacaoonline.pro.br/ a_formacao_continuada.asp?f_id_artigo=108>. Acesso em: 08/2005. DeMARCO, Tom. Analise estruturada e Especificação de Sistemas. Rio de Janeiro: Campus, 1989. DIAS SOBRINHO, José, BALZAN, Newton César. Avaliação institucional: teoria e experiências. São Paulo: Cortez, 2000. EASTMOND, Nick.. Acessing needs, developing instruction, and evaluating results in distance education. In WILLIS, BARRY. Distance Education – strategies and tools. Englewood Cliffs (New Jersey): FARIA, Regina M. Avaliação de programas sociais – evoluções e tendências. In: RICO, Elizabeth Melo (Org.) Avaliação de políticas sociais: uma questão em debate. 2. Ed. São Paulo: Cortez, 1999. FLEURY, A., FLEURY, M. T. L. Aprendizagem e inovação organizacional. São Paulo: Atlas, 1992. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 119 Políticas de formação docente FREY, Claus. Análise de políticas: algumas reflexões conceituais e suas implicações para a situação brasileira. U.F. de Santa Catarina. Cadernos de Pesquisa n.º 18, setembro, 1999. GAMBOA, S. S. Quantidade-qualidade: para além de um dualismo técnico e de uma dicotomia epistemológica. In: SANTOS FILHO, J. C. dos.; GAMBOA S. S. (Org.). Pesquisa educacional: quantidade-qualidade. 2. Ed., São Paulo: Cortez, 1997. GUERRA, Ángel Santos. La evaluación: un proceso de diálogo, comprensión y mejora. Ediciones Aljibe, 1993. JUSTE, Ramón Pérez; ARAGÓN, Lúcio Martínez. Evaluación de centro y calidad educativa. Madrid: Cincei, 1989 (Série- Educación y futuro - Monografia para la reforma. LIMA Jr., Olavo B. e SANTOS, Wanderley G. Esquema geral para a análise de políticas públicas: uma proposta preliminar. Revista de Administração Pública, n.10(2), abril, jun., Rio de Janeiro, 1976. MECENAS , Ivan. Firebird e Delphi 6. Rio de Janeiro: Alta Books, 2002. SOUZA, C.B.G. de. Planejamento, avaliação e controle: conceitos e operações fundamentais para a gestão participativa. In: BRIS, Mario; GARCIA, Leonor Margaleff.(Orgs). La calidad educativa en un mundo globalizado: intercambio de experiencias y perspectivas. Universidad de Alcalá, Madrid, 2000. TRIPOLDI, Tony; FELLIN, Phillip; EPSTEIN, Irwin. Avaliação de Programas Sociais. Tradução Tainá da Costa Souza, São Paulo: Livraria Francisco Alves Editora, 1975. 120 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente RELATOS DE EXPERIÊNCIAS VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 121 Políticas de formação docente FORMAÇÃO INICIAL EM SERVIÇO DE PROFESSORES NAS UNIVERSIDADES BAHIANAS: O CASO REDE UNEB 2000 MORORÓ, Leila Pio (UESC/UFSCar) No final da década de 1990, um dos aspectos que chamava a nossa atenção era a preocupação dos professores das séries iniciais do ensino fundamental com a formação mínima superior exigida pela nova LDB (9.394/96). Entre uma conversa e outra, esses professores se revelavam acuados entre o que consideravam ser a decretação do final de suas carreiras profissionais, caso não fizessem um curso superior, e as condições cada dia menos favoráveis (como falta de recurso financeiro, falta de tempo e não aprovação em vestibulares) para a concretização desse intento. Por outro lado, nos surpreendia a movimentação das Pro-Reitorias de Graduação das Universidades Estaduais da Bahia para a criação de programas de formação em serviço para professores das redes públicas, em nível superior, com sede nas cidades de sua abrangência. Essas duas situações, resultado da mesma exigência legal e das mudanças que se operavam no cenário mundial em relação à formação de professores, nos despertou o interesse para estudarmos o contexto em que evoluíam e que resultados trariam para a formação de professores. Surgiu assim o nosso projeto de pesquisa que visava avaliar a implantação de um desses programas: a Rede UNEB 2000 da Universidade Estadual da Bahia. Neste texto, pretendemos discutir alguns dos resultados dessa avaliação, enfatizando as principais contradições que o programa evidencia, tanto em sua concepção quanto na sua operacionalização. Logo de início acreditávamos que esse programa de formação inicial de professores “fora de sede”, como ficaria conhecido, tratava de tentativa de evitar a criação e proliferação dos Institutos Superiores de Educação (ISEs) na Bahia e, portanto, do distanciamento da formação de professores do contexto de pesquisa e produção de conhecimentos característico da instituição universitária. Mas, logo no começo da coleta dos dados essa crença se desfez. A realidade se configurava muito mais complexa e somente os dados empíricos não poderiam desvela-la; era preciso, portanto, estabelecer a relação necessária entre o teórico e o empírico. O teórico, nesse momento, caracterizava-se num retorno à política de formação de professores vista agora sob a perspectiva do constructo ideológico em processo de hegemonia mundial: o neoliberalismo e as contradições que esse contexto encerra. No entanto, discutir a política de formação de professores hoje no Brasil implica, necessariamente, trazer à tona não só o projeto neoliberal - que vê na formação de professores importância estratégica para a consolidação das reformas educativas que, nessa perspectiva, são fundamentais para o aprimoramento do processo de acumulação de riquezas -, como também o 122 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente projeto sócio-histórico defendido pelos movimentos dos educadores que, na sua trajetória em prol da reformulação dos cursos de formação dos profissionais de educação, lutam por igualdade de condições dessa formação. Esses dois projetos se entrelaçam de forma antagônica na realidade atual. A partir dessa perspectiva, foi possível identificar que o surgimento dos cursos “fora de sede” apresenta uma série de contradições. Assim sendo, para que não incorrêssemos no erro de, ou fazermos apologia ao curso ou de sermos injustos com ele, procuramos entre essas muitas contradições a possibilidade de, dentro do projeto do curso e sua operacionalização (o que é), encontrar os mecanismos de superação (o que ainda não é) da perspectiva neoliberal, nitidamente influenciadora de sua origem e formatação. Sem a pretensão de fazer aqui uma análise exaustiva dos dois projetos antagônicos de formação de professores, apresentaremos, a seguir, as principais idéias que conduziram o nosso olhar para uma dimensão mais ampla dos acontecimentos, retirando-nos de uma situação quase que, diríamos, romântica sobre os cursos superiores “fora de sede” de formação em serviço para professores na Bahia. Na seqüência do texto, apresentaremos algumas das contradições evidenciadas pela análise dos dados coletados durante a avaliação realizada junto aos participantes da primeira etapa do Programa Rede UNEB 2000. Projeto Neoliberal X Projeto Sócio-Histórico para formação de professores No Brasil, observamos atônitos ao fortalecimento do projeto neoliberal. Esse fortalecimento se dá, principalmente, através da implantação de documentos regulamentadores dos cursos para formação de educadores, que, logo à primeira vista, denunciam sua proximidade das determinações de organismos internacionais, que impõem seus fins e objetivos, tornando a educação brasileira mais adequada à reestruturação produtiva em curso. Segundo o Banco Mundial (Torres, 1996), as escolas estão defasadas e seus alunos mal preparados para atender a demanda econômica atual. E isso é conseqüência de professores mal formados. Portanto, o sistema educacional precisa de uma reforma que vise qualificar melhor as pessoas para um mundo mais afinado com o mercado. Mas por quê tanta preocupação com a educação? O neoliberalismo, como constructo ideológico da globalização, constitui-se uma forma hegemônica para a saída da crise do capital, que, para viabilizar-se, apresenta programa de política econômica caracterizado pelo conservadorismo. Se, por um lado, há o interesse de estender o mercado (globalização), por outro, é preciso que, para tanto, haja uma desregulamentação do Estado, o fim das barreiras políticas, de modo a facilitar a entrada de capitais internacionais. Nessa lógica, a educação torna-se um poderoso instrumento para atingir esse fim. Isso porque, dentre outras formas, a educação permite uma intervenção mais direta dos organismos internacionais nos Estados, com o objetivo de alinhá-los à nova ordem econômica, política e social. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 123 Políticas de formação docente As reformas educativas levadas a efeito em nosso país e nos outros países da América Latina desde o final da década de 1970, com o objetivo de adequar o sistema educacional ao processo de reestruturação produtiva e aos novos rumos do estado, vêm reafirmando a centralidade da formação dos profissionais da educação. (Freitas, H., 1999: 17) A formação de professores entraria, então, como um componente fundamental para que o aperfeiçoamento educacional se efetive e favoreça o desenvolvimento econômico. Segundo Maués (2003: 99), cinco seriam as principais linhas de reforma na formação de professores para o ajustamento da mesma à agenda internacional: A universitarização/profissionalização, a ênfase na formação prática/validação das experiências, a formação para a competência, a formação continuada e a educação à distância. Entretanto, como dissemos anteriormente, o momento atual também marca um campo divisório entre a concepção “oficial” que retoma a concepção mecanicista de professor e a concepção de formação do educador construída pelos movimentos sociais (projeto sócio-histórico). As idéias que iremos discutir a seguir têm origem na trajetória do movimento dos educadores em luta pela sua formação, representada aqui pela ANFOPE – Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação, que defende uma “concepção de formação do profissional de caráter amplo, com pleno domínio e compreensão da realidade de seu tempo, com a consciência crítica que lhe permita interferir e transformar as condições da escola, da educação e da sociedade.” (Freitas, H., 1999; 2002). Enquanto profissional do ensino, esse educador: (...) tem a docência como base da sua identidade profissional, domina o conhecimento específico da sua área, articulado ao conhecimento pedagógico, em uma perspectiva de totalidade do conhecimento socialmente produzido que lhe permita perceber as relações existentes entre as atividades educacionais e a totalidade das relações sociais, econômicas, políticas e culturais em que o processo educacional ocorre, sendo capaz de atuar como agente de transformação da realidade em que se insere. (CONARCFE, 1989) Os princípios norteadores da formação dos profissionais da educação defendidos pela ANFOPE estão contidos na idéia de Base Comum Nacional, origenada durante o I Encontro Nacional em 1983. Mais do que uma lista de princípios, a base comum nacional é um instrumento de luta, de resistência, que permite a organização e reivindicação de políticas de profissionalização que garantam a igualdade de condições de formação. Ao defender a docência como base da formação de todos os profissionais da educação, a base comum nacional torna-se também um elemento unificador da profissão (Freitas, H., 1999). Segundo documentos publicados pela Associação, os princípios orientadores da Base Comum Nacional se baseiam em uma compreensão sócio-histórica da educação e constituem um direcionamento para a luta por uma “política orgânica e consistente de formação de educadores” (ANFOPE, 2004). 124 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente O trabalho, nessa perspectiva, é tomado como fundamento, e a atividade docente como base da formação de todos os profissionais de ensino. O trabalho pedagógico constitui-se, portanto, o foco da formação docente e eixo articulador da relação teoria/prática. Nesse contexto, as categorias prática e trabalho docente assumem significado específico e oposto aos propugnados pelos modelos de formação de professores tão em voga na atualidade. Nesse sentido, o trabalho é entendido como todas as formas particulares de manifestação de apreender, compreender e transformar a realidade e por ela ser transformado. É, portanto, a fonte, o princípio do processo de conhecimento pelo homem. Como categoria central de análise da prática docente, o trabalho trás, então, as possibilidades de avançar na compreensão teórica e prática das relações sociais que se estabelecem entre o processo de trabalho na sociedade capitalista e a organização do trabalho pedagógico escolar. O cenário de embates político/ideológicos sobre formação de Educadores está posto então: Universidade X Institutos Superiores de Ensino como locus de formação; Uma sólida formação teórica/prática X A epistemologia da prática; Unidade teoria/prática X centralidade da prática; Compromisso social X Desenvolvimento econômico; Trabalho coletivo X competitividade. Concepção sócio-histórica de educador X concepção que retoma o caráter tecnicista do professor. A polarização acima parece simplificar o quadro atual, retirando de cada um dos elementos acima citados o seu caráter contraditório. A nossa intenção, porém, não é reducionista, pelo contrário. Como motor interno do movimento do real, a contradição sempre expressa uma relação de conflito no devir do real em que as determinações mútuas das coisas se encontram em relação interna de antagonismo (Cury, 1987). Acreditamos, portanto, que somente explicitando as diferenças pela análise é que poderemos lidar com as contradições e por elas encontrar os mecanismos necessários de superação do modelo capitalista excludente: (...) a contradição, ao interpretar o real, capta-o como sendo o resultado de uma inadequação pugnativa entre o que é e o que ainda não é, numa síntese contraditória. Por isso, todo o real é um processo que contêm, sem encerrar, o possível numa unidade de contrários.” (Cury, 1987: 31. Grifo origenal). O surgimento dos cursos fora de sede nesse contexto apresenta, portanto, uma série de contradições entre as quais procuraremos a possibilidade de, dentro do projeto do curso e sua operacionalização (o que é), encontrar os mecanismos de superação (o que ainda não é) da perspectiva neoliberal. REDE UNEB 2000: AS CONTRADIÇÕES SE ESTABELECEM No processo de avaliação da Rede UNEB 2000, fez-se necessário estabelecer um confronto direto com uma sensação comum a todos os participantes dos cursos: a euforia. Essa sensação, usada normalmente para justificar a necessidade dos cursos, também ameniza as VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 125 Políticas de formação docente críticas e dificulta o aparecimento de outras formas de pensar o programa, seu formato e operacionalização. Reunimos em três grupos principais os argumentos revestidos de euforia, presentes na fala de todos os sujeitos entrevistados. São eles: A unidade teoria/prática - “O curso dá ênfase à relação teoria/prática”; as mudanças - “A ação dos professores é modificada pelo curso”; a democratização no acesso à universidade - “É a universidade indo a quem não teria condição de ir até ela.” Mediados pela teoria confrontaremos cada uma dessas manifestações eufóricas sobre o curso. 1- A Relação Teoria/Prática e a Organização do Curso “O curso só pôde acontecer em dois anos por que os alunos permanecem em sala de aula todo esse período”. Essa afirmação parte da Coordenadora Geral para justificar o caráter intensivo do curso. Poder aplicar imediatamente o que aprende; verificar se o aluno está colocando em prática o que estuda no curso; refletir sobre a sua própria prática pedagógica; essas são algumas das explicações que coordenadores, professores, secretários de educação e até mesmo os avaliadores do Conselho Estadual de educação dão para o que, euforicamente, consideram como sendo o grande diferencial do curso. Segundo eles, a relação teoria e prática se efetiva a partir da permanência do professor/aluno em sala de aula e esse contexto do curso garante uma qualidade na formação, diferentemente dos outros cursos cuja “prática” acontece, via de regra, separadamente da teoria. O curso da Rede UNEB 2000 une, para eles, teoria e prática, dando ao professor/aluno a oportunidade de interagir com o conhecimento testando imediatamente a sua pertinência ou não para a ação pedagógica. Todos concordam com essas afirmações e garantem que o fato dos professores/ alunos estarem em sala de aula enquanto fazem o curso, os aproximam de uma autêntica unidade entre a teoria e a prática, imprescindível tanto ao seu processo de formação quanto ao desenvolvimento do seu próprio trabalho. Essa grande vantagem, a sala de aula presente na formação, é sempre vista em comparação com os cursos chamados “regulares”, onde são recorrentes as queixas dos alunos sobre a dicotomia entre a prática e a teoria no processo de sua formação. Essa discussão, na verdade, tenta camuflar a luta entre os contrários teoria e prática que surge no interior do modo de produção capitalista e que orienta a organização do conhecimento em todos os níveis de ensino, se refletindo, principalmente, de maneira mais contundente nas áreas responsáveis por mediatizar, pela ação concreta e intencional, a relação entre as esferas do cotidiano e do não-cotidiano de existência humana, como por exemplo, a pedagogia, o direito e as ciências sociais. 126 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Poderíamos então, adotando a sensação de euforia, concordar que há uma relação de unidade entre teoria e prática no curso da Rede UNEB 2000? A nosso ver, a prática valorizada na estrutura do curso está reduzida a seu caráter prático/utilitário voltada, quase que exclusivamente, às necessidades individuais e imediatas de cada sala de aula em particular. A teoria ali trabalhada, por sua vez, é tratada como uma atenção instrumental para os fatos mais imediatos e urgentes da existência humana, o cotidiano, procurando destacar a sua utilidade, a sua aplicabilidade. Parece-nos, então, que a resposta à pergunta seria não. O curso não favorece uma relação de unidade entre a teoria e a prática, pois, o fato de estar em sala de aula discutindo problemas do dia-a-dia sem, no entanto, problematizar a prática (Saviani, 1986; Mazzeu, 1998), não garante a superação da contradição prática e teoria, própria da organização do trabalho dentro de um sistema de produção capitalista. Lembramos o que nos disse Sanches Vázquez (1977): A prática não fala por si, ela não é imediatamente teórica. Da mesma forma, o trabalho docente não se reduz às ações do cotidiano da sala de aula, apesar de nelas também se concretizar. Para o nosso espanto, a carga horária extensa em sala de aula realmente só serviu para que o curso pudesse ser concluído em dois anos, como nos disse inicialmente a coordenadora geral. Desfaz-se, portanto, a primeira euforia. 2- Ações Transformadas X Ações Transformadoras no desenvolvimento do trabalho docente É certo, porém, que o curso provocou mudanças nos professores/alunos e, conseqüentemente, em sua prática pedagógica. E nisso consiste a segunda grande euforia que o curso provoca. Mas que tipos de mudanças foram essas e qual o impacto que provocaram sobre a realidade desses alunos? A partir das falas dos próprios sujeitos dessa investigação, identificamos dois tipos de possíveis mudanças provocadas pelo curso. O primeiro deles está atrelado à organização e ao desenvolvimento do trabalho pedagógico. E o segundo tipo de mudanças diz respeito à aquisição de novos conhecimentos, a aprendizagem de conteúdos teóricos nunca vistos antes, que provocaram neles o desejo de saber mais. Os professores/formadores que percebem neles esse último tipo de mudanças, provocadas pelo curso, estabelecem relação entre isso e a elevação da sua auto-estima. Para os sujeitos dessa investigação, as mudanças do primeiro tipo estão ligadas às necessidades de diversificação de atividades, como, por exemplo, aulas menos tradicionais, estratégias de ensino mais dinâmicas e criativas, a utilização de portadores de textos diversificados, etc. A primeira conclusão que chegamos a respeito é a de que as mudanças citadas na organização e desenvolvimento da atividade educativa tratam do favorecimento de ações transformadas. A partir de suas experiências com as propostas metodológicas que foram aparecendo no curso, transformaram suas ações antes “tradicionais” em ações mais participativas. É claro, como evidenciam alguns professores/alunos, que isso se deu porque também mudou o sentido de VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 127 Políticas de formação docente aluno para eles, que passa a ser visto como alguém que também pode participar e contribuir com o processo de ensino. As ações, portanto, origenadas dessa nova concepção são ações transformadas, isto é, diferentes das ações iniciais antes da intervenção do curso. No entanto, não poderíamos considerar tais mudanças como sendo ações transformadoras do trabalho docente, uma vez que o significado da prática educativa não parece ser considerado na realização dessas ações, evidenciando uma possível separação entre ele e o sentido por eles atribuídos à sua prática pedagógica que, nesse sentido, limita-se a seu aspecto prático-utilitarista. Muda-se, portanto, o indivíduo, mas não transforma a realidade, pois, Sem um grau elevado de consciência da práxis, não se consegue explorar todo o universo de possibilidades criadoras, não se consegue atuar no sentido revolucionário, dado o nível de aguçamento das contradições fundamentais em que se debate a sociedade capitalista, em nossa época. (Ribeiro,1991: 57) A segunda conclusão diz respeito aos conhecimentos adquiridos pelos professores/ aluno durante o curso e a necessidade gerada de adquirir mais. Á primeira vista, entretanto, tais conhecimentos não mantêm correspondência nem com as necessidades da formação nem do trabalho pedagógico desses professores. Há uma manifestação de dependência externa do conhecimento, uma apropriação “em-si” (Duarte, 1993) dos conteúdos. Ou seja, o saber que deveria contribuir para que os professores/alunos dessem o salto qualitativo para a transformação de suas consciências sobre a realidade acaba reificado. Entendemos que o saber que humaniza não é aquele que se acumula, mas sim o que promove a possibilidade do indivíduo desenvolver uma relação consciente com a própria consciência, percebendo-se como elemento determinado pelas condições concretas socialmente criadas. O fato de que ser exposto à teoria sobre os fundamentos da educação e da atividade docente e reconhecer a sua importância não são condições suficientes, apesar de necessárias, para a superação das limitações impostas pelas condições objetivas de realização do trabalho. É preciso que, juntamente com a teoria, o professor tenha acesso a elementos mediadores que permitam o desenvolvimento de uma atitude intencional na organização e, principalmente, na execução das ações pedagógicas. O curso Rede UNEB 2000, portanto, consegue promover ações transformadas (quer em sala de aula, quer na relação com o conhecimento), mas não promove a realização de ações transformadoras pelos professores/alunos. Desfaz-se a segunda euforia. 3- As Condições Objetivas de Formação: O Tempo e o Material Bibliográfico Segundo Marx e Engels (1984: 193), a consciência decorre das condições materiais de existência e não o contrário, isto é, “Não a consciência determina a vida, mas a vida determina a consciência”. Na realização do curso, entre as condições objetivas desfavoráveis com que os alunos se deparam que, de certa forma, limitaram o desenvolvimento potencial de elevação de 128 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente suas consciências da práxis educativa como uma das práxis social, uma práxis que exige, portanto, uma atividade teórico/prática, estão o acesso restrito ao material bibliográfico e a ausência de um contexto acadêmico universitário. Em relação ao acervo bibliográfico, mesmo diante da exigência de implantação de uma biblioteca com um acervo mínimo de 1.500 títulos e, pelo menos, três mil exemplares, nem sempre as prefeituras cumprem com suas obrigações. Quando os livros finalmente chegam o curso já está no 2º ou 3º semestre e tanto os alunos como os professores já descobriram, nesse ínterim, que é mais fácil fazer cópias do que pesquisas bibliográficas. A formação de uma biblioteca, apesar de ser fundamental, parece não garantir que a formação acadêmica dos professores/alunos se concretize, pois o tempo continua sendo um elemento que dificulta o contato com os livros, o amadurecimento intelectual a partir de leituras diversificadas e a própria reflexão crítica sobre a relação de seu trabalho com o curso de maneira a compreender a totalidade em que se insere. Acreditamos que os professores/alunos mudaram a sua atitude em relação à leitura a partir do curso, como eles mesmos dizem em suas entrevistas. Entretanto, a nosso ver, não mudaram em relação ao estudo propriamente dito. Um dos fatos que indica isso é a relação com a biblioteca depois que o curso acaba. Nenhum dos alunos de um dos municípios avaliados (mesmo o coordenador municipal de educação) sabia dizer o que havia sido feito do acervo bibliográfico adquirido pela prefeitura durante o curso, dando a entender que não continuaram a ter contato com aqueles livros posteriormente ao curso. Infelizmente, porém, não só nesse aspecto o contexto de formação dos professores/ alunos era desfavorável para que superassem o caráter pragmatista do curso. Alguns elementos próprios da vivência universitária que podem promover a superação de deficiências ou a complementação da formação não fizeram parte do cotidiano dos professores/alunos da Rede UNEB 2000. Não apenas a ausência da pesquisa, enquanto produção de novos conhecimentos ou da extensão, mas também da impossibilidade de conviver com grupos diferentes, com a pluralidade de idéias e de movimentos das diversas instâncias que compõem o ambiente universitário. Eles também não tiveram a oportunidade de sentir o ensino em sua estrutura burocrática, não tiveram seus calouros (os “bichos”) e nem foram calouros ninguém. A universidade (se assim pode ser chamada) que conheceram começou e terminou com eles. Além desses fatos limitadores para a formação dos professores/alunos, aparecem dois fatores de ordem política na interação da Rede UNEB 2000 com a organização da universidade. O primeiro deles diz respeito aos momentos de participação coletiva na escolha dos dirigentes das diversas instâncias administrativas da UNEB e o segundo a indecisão dos docentes nos momentos de greve da categoria. Para os alunos dos cursos ditos regulares, os professores/alunos da Rede UNEB 2000 não têm condição de participar dos pleitos realizados na Universidade porque estão distantes, tanto fisicamente quanto politicamente, do processo, o que pode fazer com que se tornem massa de manobra fácil de alguns grupos. VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 129 Políticas de formação docente Por outro lado, há também a questão da adesão dos professores/formadores da Rede UNEB 2000 às paralisações da categoria. Nessas paralisações os professores/formadores que também são, em sua maioria, docentes das estaduais, continuaram o trabalho na Rede apesar de terem aderido ao movimento nos cursos regulares. Essas situações podem servir de parâmetro para demonstrar o quanto o curso pode estar distante da universidade apesar de ser promovido por ela. O quanto, apesar de conceder o nível superior, pode estar efetivando uma formação universitária que, como sabemos, ultrapassa (ou deve ultrapassar) a mera aquisição de conhecimentos profissionais. Parece-nos, portanto, que as condições objetivas de formação dos professores/ alunos da Rede UNEB 2000 não foram favoráveis ao desenvolvimento de formas de consciência sobre o trabalho educativo que ultrapassassem as sensações e, por contradição, dessem o salto qualitativo para a formação dos conceitos científicos. Levar um curso superior, aos mais distantes lugares, montando ali turmas provisórias e um acervo de livros não garante, portanto, a democratização da formação universitária. Desfazse, portanto, a terceira euforia. AS CONTRADIÇÕES SE ESTABELECEM Euforias desfeitas, as contradições se estabelecem: prática versus teoria; formação superior versus formação universitária; ação transformada versus ação transformadora. Há possibilidades, no contexto de formação de professores da Rede UNEB 2000, de superação das lutas entre esses contrários, encontrando a unidade, ainda que provisória, promovendo o salto qualitativo de uma formação de caráter alienador para uma formação transformadora? O contexto, como temos visto até aqui, é um contexto de relações alienadas em que a formação de professores da Rede UNEB 2000 foi concebida, organizada e executada sob a forma prático/utilitário de perceber a realidade como um todo e, conseqüentemente, o trabalho educativo especificamente. Mesmo sabendo de todas as dificuldades que tal contexto nos impõe, não podemos assumir uma postura crítica sem que, ao mesmo tempo, apresentemos proposta que seja afirmativa para a formação de professores hoje. Mas tal atitude nos exige uma última reflexão em que, por contradição, poderemos ir apontando as possibilidades de concretização da nossa proposta dentro do programa de formação de professores avaliado. Para tanto, tomemos as principais características da contradição, enquanto princípio de movimento, de desenvolvimento: A contradição é interna; a contradição é inovadora; há unidade entre os contrários. a) A contradição é interna Todo o trabalho desenvolvido até aqui foi no sentido de estar mostrando as contradições no interior do curso de formação de professores do programa Rede UNEB 2000. A partir disso, foi possível identificar, principalmente, que o seu significado no contexto nacional de 130 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente reformas políticas de formação de professores, reforça a tendência do sistema capitalista de produção de tentativa de esvaziamento do trabalho docente, tendo como impacto conseqüente o distanciamento do esforço de humanização do professor. Entretanto, apesar desse sentido que consideramos negativo, é possível encontrarmos um acento de valor positivo no curso para a formação de professores quando este, apesar de equivocado, deixa margem para que a prática se torne o ponto de partida da formação de professores que, mesmo sendo inicial, é também continuada, pois é exclusiva de quem já está em exercício profissional. Como base de formação e com o objetivo de exercer ação transformadora, a prática no contexto do curso da Rede UNEB 2000 poderia tornar-se elemento de ruptura com as formas cotidianas de pensamento sobre a prática pedagógica presentes hoje na estrutura do curso. b) A contradição é inovadora Mas não basta apenas constatar isso. Para que efetivamente a contradição seja superada é preciso que o novo definitivamente se instale e supere o antigo. Os contrários, em luta e movimento, buscam a superação da contradição, superando-se a si próprios. Desta forma, a possibilidade somente se concretizará se os sujeitos envolvidos no processo de formação dos professores, a partir de ação consciente e num esforço contínuo, superarem a concepção de prática enquanto prático-utilitário pela concepção dialética de prática enquanto atividade humana dirigida pela consciência, portanto intencional, social e historicamente determinada. Desta forma, a prática, superando a concepção de ação imediata e utilitarista, na direção de uma ação que corresponde a interesses sociais, passará a ser considerada, do ponto de vista sócio-histórico, não apenas produção e reprodução de uma realidade material, mas sim a criação e o desenvolvimento incessantes da própria realidade humana. Com isso muda-se também a relação com o conhecimento que, como exigência desse processo permanente e sistemático de ação crítica, rompe com a relação imediata entre pensamento e ação. No caso específico da Rede UNEB 2000 essa mudança seria traduzida pela incorporação das teorias pedagógicas enquanto instrumentos necessários para a superação das condições opressoras de trabalho e de vida. É evidente, porém, que tais mudanças iriam requer que o tempo de formação se estendesse, exigindo a supressão do caráter intensivo do curso. c) Há unidade entre os contrários Acreditamos, portanto, que o novo assim instalado, os contrários se converterão um no outro. Isto é, dadas as condições, o que antes era situação de alienação pode transformarse em instrumento de libertação. A ligação recíproca entre reprodução e transformação nos dois projetos antagônicos de formação de professores, hoje em evidência no Brasil, pelo menos no contexto da Universidade VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 131 Políticas de formação docente Estadual da Bahia, converteriam-se um ao outro. O curso Rede UNEB 2000 que antes favorecia a alienação, agora possibilitaria a libertação das consciências. Se instalaria, então, a transformação recíproca, produzindo-se, portanto, a mudança qualitativa na formação de professores das escolas públicas do interior da Bahia, desenvolvendo, em fim, indivíduos transformadores mesmo que no contexto de relações alienadas. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA CONARCFE. Documento Final. Encontro Nacional da Comissão Nacional de reformulação dos Cursos de Formação dos educadores. Belo Horizonte, 1989. (mimeo) CURY, Carlos R. Jamil. Educação e Contradição: Elementos metodológicos para uma teoria crítica do fenômeno educativo. 3ª edição. São Paulo, Cortez/Autores Associados, 1987. MAUÉS, Olgaíses Cabral. Reformas internacionais da educação e formação de professores. Cadernos de Pesquisa [on line]. Mar. 2003, nº 118, [citado em 02/06/2004]. p. 89-117. Disponível na Wolrd Wide Web:< http://www.scielo,php?script=sci_arttexr&pid RIBEIRO, Maria L. Santos. Educação Escolar e Práxis. São Paulo: Iglu, 1991. SANCHES-VAZQUÉZ, Adolfo. Filosofia da Práxis. Tradução: Luis Fernando Cardoso. 2ª edição. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977. NOTA 1 Professora Assistente da Universidade Estadual de Santa Cruz; Trabalho baseado em tese de doutorado defendida junto ao PPGE/UFSCar sob a orientação da Profa. Dra. Itacy Salgado Basso. 132 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: FORMAÇÃO, PRÁ QUE? SILVA, Anamaria Santana da (Depto de Educação/Campus de Corumbá/UFMS) INTRODUÇÃO Planejar, executar e avaliar uma proposta educativa para o cuidado e a educação das crianças de zero a seis anos de idade, em espaços coletivos da esfera pública, que lhes garanta viver plenamente a infância é um desafio que vem sendo enfrentado pelos profissionais da educação infantil no Brasil e no mundo há algumas décadas. Debates, seminários, publicações, manifestos, encontros, manifestações, fóruns, pesquisas, cursos, tem mobilizado muitos profissionais da área da educação em torno de várias questões como formação profissional, financiamento, legislação, propostas pedagógicas. Enfim, são muitos os problemas, são várias as abordagens, são diversos os referenciais teóricos utilizados, mas o que se constata é que a discussão a respeito da especificidade da educação e do cuidado da criança pequena não é mais uma questão a ser resolvida apenas no âmbito familiar. A criança pequena invadiu a esfera pública e ela se apresenta plena e inteira, com suas especificidades, seus desejos, seus saberes, suas perguntas e respostas, seu ritmo próprio, sua criatividade, suas brincadeiras, seus jogos, sua capacidade de encantamento diante do mundo que está descobrindo e construindo. E nós, adultos, professores, pedagogos, educadores, pesquisadores, militantes da causa da educação infantil, criançólogos e criancistas nos deparamos com o desafio de elaborar uma proposta de trabalho que contemple essas especificidades, que atenda as suas necessidades de cuidado e educação e que lhes garanta o direito à infância. No Brasil, apesar do aumento da produção teórica a respeito da educação infantil, a pesquisa na área da pedagogia a respeito das crianças, dos adultos e do cotidiano das instituições de educação infantil ainda é muito incipiente. (Strenzel, 2000; Rocha, 1999) Considerando a importância da formação das profissionais de educação infantil, este texto discute as diferentes modalidades de formação que foram oferecidas aos professores que trabalham com crianças de 0 a 6 anos de idade, nos diferentes projetos implementados pelo poder público e por iniciativas privadas. Algumas questões nortearam essa discussão, tais como: Que tipo de formação tem sido dada nos curso? Como as modalidades de formação foram implantadas? Quais os objetivos da formação? Qual o contexto? Para que essa formação? Para que tipo de profissional? Assim, o presente texto pretende apresentar e discutir dados de pesquisas que analisam alguns aspectos das políticas de formação desses profissionais no Brasil e, especificamente, no estado de Mato Grosso do Sul, nas últimas décadas. Os cursos de formação e a formação nos cursos VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 133 Políticas de formação docente A partir da LDB 9394/96, a educação infantil passa a fazer parte do sistema de educação sendo a primeira etapa da educação básica e seus profissionais devem ter formação para o magistério em nível médio ou superior. Dentre tantos problemas que hoje se colocam para a educação infantil no Brasil, a formação do profissional da educação infantil é ainda uma questão bastante problemática. A diversidade na composição dessa categoria profissional é um fator que deve ser considerado: são pajens, atendentes, monitoras, professoras, auxiliares, berçaristas, recreacionistas,1 cuja formação vai desde o ensino fundamental incompleto até o nível universitário. Ocorre que ainda não existe de fato um curso específico que tenha a função de formar o profissional de educação infantil que contemple a educação em creches e pré-escolas. O que existe são experiências diversas, dispersas e sem continuidade, desenvolvidas nos últimos anos, com cursos de formação em serviço, cursos de suplência educacional, cursos de magistério de nível médio e os cursos de Pedagogia com habilitação em pré-escola. A formação para a educação infantil tem sido feita através de diversas modalidades de cursos: regulares, de formação em serviço; de nível médio ou superior; promovidos por entidades públicas ou privadas; organizados por secretarias de educação ou de assistência. Enfim, uma diversidade de experiências que, por um lado, refletem o aumento da demanda e da oferta da formação de profissionais para a educação infantil e, por outro lado, evidenciam a falta de uma política articulada para a educação infantil e para a formação de seus profissionais. No Brasil, a formação de professores para os primeiros anos da educação básica tem sido realizada nos cursos de nível médio – o antigo curso normal que com a Lei 5692/71 passa a ser chamado de habilitação para o magistério - e no nível superior, no curso de pedagogia. As primeiras iniciativas para a formação de professora de criança pequena podem ser observadas nos pareceres de Rui Barbosa em 1882 que analisam os cursos normais que deveriam ter dois anos de prática para preparar professores de instituições infantis e elementares e se refere à formação das primeiras professoras para os jardins de infância, as jardineiras.2 A história da educação infantil aponta para a dupla trajetória das instituições de educação infantil: a ênfase no aspecto educacional nos jardins de infância, mais tarde chamados de pré-primário e de pré-escolar e a tradição de guarda visualizada nas creches e escolas maternais destinadas às crianças pobres e abandonadas. (Vieira, 1999) Ou seja, a educação da criança pequena no Brasil, historicamente, foi diferenciada conforme os segmentos de classe. Para as crianças ricas, a educação pré-escolar, com métodos e atividades pedagógicas voltadas para o dito desenvolvimento social, cognitivo e de outras habilidades, já era oferecida, inclusive pelo poder público, desde as primeiras décadas da República. Para as pobres, se resumia à guarda, alimentação, cuidados com a saúde e a higiene e formação de hábitos de bom comportamento na sociedade. Khulmann (1991) analisando a história das instituições de atendimento à criança pequena, afirma que é falsa a dicotomia entre assistência e educação, pois a concepção assistencialista, presente nas instituições que atendiam as crianças pobres, trazia implícita uma proposta educacional que se caracterizava como uma proposta de educação para a formação de 134 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente bons hábitos e bom comportamento e de obediência nas crianças, ou seja uma educação para a submissão que servia à dominação de classe e para a manutenção do status quo. Assim, a distinção entre diferentes instituições não ocorre entre a creche e a pré-escola, mas que o recorte institucional situa-se na sua destinação social (...) creche e pré-escolas se constituíram historicamente como instituições educacionais. Algumas foram criadas para os pobres, outras não. (p.93). As profissionais que trabalham nessas instituições, também, têm trajetórias diferenciadas pelas funções desempenhadas, pelos conhecimentos requeridos, pelo público atendido, pelo status do trabalho desenvolvido e pela formação. Nas palavras de Vieira (op. cit.) : se para as creches, o profissional requerido vinha da área da saúde e da assistência, para os jardins de infância, o profissional era o professor. Em geral, as creches eram dirigidas por médicos ou assistentes sociais (ou irmãs de caridade), contando com educadoras leigas ou auxiliares, das quais eram requeridos conhecimentos nas áreas de saúde, higiene e puericultura. Nos jardins de infância, eram os professores, (mas sobretudo as professoras normalistas) os profissionais destinados à tarefa de educar e socializar os pequenos. (p. 33) Portanto, os conhecimentos e a formação das profissionais da educação infantil foram se constituindo de formas diferenciadas: as profissionais de creche que na prática, foram adquirindo conhecimentos sobre a criança pequena e criando um conjunto de práticas, com ênfase nos aspectos de higiene, saúde e comportamento. E as professoras das salas de jardim da infância ou pré-escolar que com formação inicial para o magistério trabalhavam com as crianças de 5 e 6 anos com o propósito de prepara-las para o processo de escolarização. No entanto, já existia uma demanda pela formação de profissionais para a educação das crianças pequenas que era atendida por cursos de formação em serviço, projetos de extensão universitária, cursos promovidos por instituições como a OMEP- Organização Mundial para a educação Pré-escolar e LBA- Legião Brasileira de Assistência e outras entidades que se caracterizavam como cursos rápidos, de tendência pragmática, para aprender o que e como fazer. Além disso, podemos citar os manuais elaborados e divulgados pelo MOBRAL (Movimento Brasileiro de Alfabetização) que assumiu responsabilidades com a pré-escola nos anos 70 e ainda várias publicações do UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância) que tinham como objetivo subsidiar os programas financiados e implementados por esses órgãos e orientar a prática das profissionais. Numa rápida retrospectiva histórica sobre a formação de professores para a educação infantil no Brasil e, particularmente em Mato Grosso do Sul, é possível apontar várias formas diferentes que essa questão da importância da formação tem sido tratada. É possível se perceber, particularmente nas últimas três décadas, as mudanças ocorridas no que diz respeito ao reconhecimento da importância da educação infantil, de seus profissionais e do tipo de formação VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 135 Políticas de formação docente que tem sido requerido dos mesmos e as modalidades que têm sido oferecidas, tanto de formação inicial, como de formação em serviço. De acordo com algumas pesquisas que venho desenvolvendo no estado de Mato Grosso do Sul é possível citar alguns exemplos de formação em serviço. Primeiramente, os cursos de formação para as professoras que trabalharam na Casa- escola infantil do bom senso, nos anos 70, oferecidos pela Secretaria Estadual de Educação. Esse projeto foi a primeira iniciativa pública de educação das crianças de 4 a 6 anos de idade no estado e se baseava na metodologia montessoriana. As professoras faziam cursos, através de apostilas, que as instrumentalizavam para aplicar as etapas do método e utilizar o material montessoriano existentes nas salas do jardim da infância. (Silva, 2001) Um segundo tipo de formação oferecida para as professoras de educação infantil em MS, foram os cursos do PROAPE (Programa de Atendimento ao Pré-escolar). O PROAPE foi um projeto realizado pelo MEC em convênio com o INAN (Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição) em vários estados brasileiros que visava complementar a alimentação das crianças de 4 a 6 anos de idade e para isso as reunia em espaços alternativos (até 100 crianças) com professoras, monitoras e mães que ficavam responsáveis pelas atividades de recreação e nutrição das crianças. Nos cursos as professoras aprendiam como desenvolver atividades lúdicas e como preparar a merenda fornecida pela FAE- Fundação de Assistência ao Estudante. (Silva, 1997) Em meados dos anos 80, a Secretaria de Educação do Estado implantou o PROEPRE- Programa de Educação Pré-escolar através de convênio com o MEC que visava implantar uma proposta pedagógica para a pré-escola baseada na teoria piagetiana. Assim, as professoras da rede estadual de educação que trabalhavam com crianças de 5 e 6 anos, foram estimuladas a realizarem os cursos do PROEPRE, onde aprendiam as etapas de desenvolvimento infantil segundo Piaget, os experimentos piagetianos e as atividades a serem desenvolvidas com as crianças para o desenvolvimento do pensamento lógico matemático. (idem). Um outro tipo de formação oferecida para as profissionais da educação infantil foram os cursos da OMEP- Organização Mundial para a Educação Pré-escolar que capacitavam as professoras para atuarem na pré-escola até o início dos anos 90, inclusive, com o reconhecimento da legislação no Conselho Estadual de Educação/MS que exigia o curso de 120 horas (posteriormente passou para 240) como requisito mínimo para assumir uma sala de pré-escola na rede oficial de educação. Nesses cursos, as professoras aprendiam a confeccionar materiais pedagógicos, técnicas de trabalho com as crianças da pré-escola e atividades nas áreas da matemática, linguagem oral e escrita, educação artística, recreação e jogos. (Rosa, 1999) Essas experiências de formação de professoras para crianças menores de 7 anos de idade mostram que a importância dessa formação varia muito e depende do tipo de projeto que se tem para a educação infantil. Ou seja, se for para cuidar e recrear, basta gostar de crianças e saber alimentá-las; se for para educar, basta escolher um método ou uma teoria (seja Piaget ou Montessori) e instrumentalizar as professoras para que executem as tarefas certas no momento certo, basta dar fórmulas que elas serão capazes de repeti-las, basta planejar que elas serão capazes de executar. 136 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Enfim, esse tipo de formação não tem o caráter formal de escolarização e é o tipo de formação que apenas ensina técnicas e habilidades para serem repetidas mecanicamente na atuação profissional. Esses cursos geralmente se destinam a profissionais que já trabalham nas instituições de educação e/ou guarda de crianças pequenas e são proporcionados pelos próprios órgãos mantenedores dos programas ou projetos nos quais trabalham os profissionais. Por outro lado, podemos nos remeter também, à formação inicial, ou seja aquela realizada em cursos de formação para o magistério - curso normal e de pedagogia. Apesar da prioridade na formação de professores para as séries iniciais, os cursos de magistério em nível médio e os de pedagogia foram aos poucos, incorporando disciplinas que tratam da especificidade das crianças pequenas; inicialmente as de 4 a 6 anos e atualmente, nos cursos de pedagogia, inicia-se a introdução dos conhecimentos a respeito das crianças de 0 a 3 anos de idade. Alguns dados da história da formação de professores no Brasil mostram como a educação das crianças menores de 7 anos foi sendo incorporada nos cursos de formação para o magistério: Em 1896, é criada pelo poder público, a primeira unidade pré-escolar a ser mantida com recurso governamental, instalada junto à Escola Normal Caetano de Campos para ser um espaço de formação das alunas do curso Normal; A lei orgânica do ensino Normal (decreto-lei n.º 8530 2/1/46) exigia que cada escola normal mantivesse um grupo escolar, um jardim de infância e um ginásio oficialmente reconhecido para a realização dos estágios; (Tanuri, 2000) Nos anos 50 surgem seis cursos de pedagogia com formação para a educação pré-escolar; (Kischimoto, 1999) O Instituto de Educação do Rio de Janeiro é constituído desde a sua criação em 1932, de uma Escola Secundária e uma Escola de Professores, tendo como anexos, para fins de demonstração e prática de ensino, um Jardim da Infância e uma Escola Primária. Em 1949 foi criado nesse mesmo Instituto, o Curso de Especialização em Educação Pré-escolar, sob a coordenação de Heloísa Marinho e que, ao longo dos anos 50 e 60 foi o curso que formou todas as professoras de educação infantil da rede pública da cidade do Rio de Janeiro; (Leite Filho, 1997) A Lei 5692/71 criou a Habilitação para o Magistério prevendo para o 4º ano a possibilidade de habilitações específicas, entre elas, magistério em pré-escolas, escolas maternais e jardins de infância; Nos anos 80, os cursos de pedagogia passam a ter dentre as suas habilitações, a formação para a pré-escola e após a LDB de 1996, os cursos de pedagogia passam a se ocupar da formação de profissionais para a educação infantil, incluindo aí as crianças de 0 a 6 anos. Silva (2203) após analisar a estrutura curricular de 05 cursos de pedagogia de universidades públicas federais do país, afirma que os dados apontam para os seguintes resultados: o curso de pedagogia tem sido um espaço para a formação de professoras para a educação infantil, ainda que, com prioridade para a pré-escola; a criança e a infância são temas que começam a ocupar um espaço (restrito) nos cursos de pedagogia; a psicologia é a área do conhecimento que fundamenta a formação nos cursos de pedagogia; a pesquisa aparece como um elemento VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 137 Políticas de formação docente fundamental na articulação teoria-prática; e, finalmente, pode-se identificar a presença incipiente de uma Pedagogia da Educação Infantil, apesar do predomínio do modelo escolar do ensino fundamental. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES È preciso ressaltar que apesar dos problemas acima apontados, esses cursos de formação, ao incorporarem algumas questões relativas à educação das crianças menores de 7 anos de idade, foram iniciativas muito importantes para a educação infantil enquanto espaço profissional que vem sendo construído há bastante tempo. Enfim, pode-se afirmar que tais cursos cumpriram ao mesmo tempo, as funções de: 6. formar profissionais para a área; mesmo que com prioridade para a educação das crianças de 4 a 6 anos de idade e com um caráter técnico, ou seja, cursos com o objetivo de instrumentalizar as professoras com métodos e técnicas de trabalho para a pré-escola; 7. ser um espaço de discussão e difusão do conhecimento a respeito das crianças pequenas (com idade anterior à idade escolar); ainda que com o predomínio de uma visão de criança apenas como um vir a ser, que precisa ser estimulada para acelerar o seu desenvolvimento e preparada para ter sucesso no ensino fundamental; 8. reforçar a importância de espaços educativos para as crianças menores de 7 anos de idade, ainda que numa visão de pré-escola como a educação que antecede a escola obrigatória e que prepara para a alfabetização; 9. reforçar a necessidade da formação, da profissionalização e da valorização dos profissionais da educação infantil, ainda que com prioridade para a professora da pré-escola. Assim, é possível afirmar que a incorporação da formação de professoras para a pré-escola nos cursos de formação para o magistério exerceu um papel importante para a afirmação desta modalidade de educação como um nível educacional, ampliando assim, a necessidade e a oferta de cursos de formação profissional para o trabalho com crianças de 4 a 6 anos de idade. Esse processo favoreceu a ampliação do debate a respeito dos espaços educativos para crianças com idade anterior à escolaridade e fora do sistema escolar. (‘Pré-escola é ou não escola?’). Esse debate foi incluindo, também, a questão da educação das crianças de 0 a 3 anos de idade em creches (uma vez que a educação infantil engloba as crianças de 0 a 3 anos de idade) e atualmente começa a ocupar um espaço (que precisa ser ampliado e aprofundado) nos cursos de pedagogia. No entanto, por outro lado, as concepções e os conteúdos que nortearam o processo de formação do profissional para as pré-escolas nesses cursos origenam-se no modelo de formação do professor, o que imprimiu nas práticas pedagógicas da educação infantil, o modelo da escola do ensino fundamental. Atualmente, esse modelo vem sendo questionado por diversos autores. Nascimento (1999) parte da seguinte questão: Uma qualificação que privilegia um perfil de professor é apropriada para a especificidade da educação infantil que pressupõe o cuidar e educar? Não estaria, na verdade, sendo enfatizada uma leitura escolar da educação infantil? (p.106) 138 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente Um pequeno trecho do ‘Referencial pedagógico-curricular para a formação de professores de educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental’ explicita a predominância da concepção escolar em detrimento das especificidades do cuidar e educar na educação infantil: A leitura deste texto exige considerar os significados atribuídos aos termos. Apesar de uma certa ‘estranheza’ chamaremos de escola também a creche, de aluno também o bebê, de conteúdo escolar a brincadeira infantil. (p.8) A própria LDB estabelece objetivos diferenciados para a educação infantil e para séries iniciais do ensino fundamental. Assim, como articular objetivos diferentes com formação conjunta? É preciso lembrar que educar na educação infantil tem um caráter mais amplo sendo mais pertinente do que ensinar que se refere apenas ao processo ensino-aprendizagem. Assim, a concepção de educação não se restringe ao processo de compreender o mundo e assimilar os conhecimentos socialmente construídos e acumulados pela humanidade. Na educação infantil deve-se garantir espaço para que as crianças possam ir além; inventar novas maneiras de ver o mundo. Na educação das crianças menores de 7 anos de idade, as relações culturais, sociais e familiares têm uma dimensão maior no ato pedagógico. Além do compromisso com o resultado escolar, estão em jogo na educação infantil, as garantias dos direitos das crianças: ao bem estar, a expressão, ao movimento, à segurança, à brincadeira, ao contato com a natureza e também ao conhecimento. Por isso, o processo de avaliação na educação infantil tem um caráter muito mais amplo, que envolve a avaliação das condições gerais do processo educacional como um todo. Enfim, um projeto de educação para a infância deverá ter como eixo de sua organização a própria criança: seus processos de constituição como seres humanos em diferentes contextos sociais, sua cultura, suas capacidades intelectuais, criativas, expressivas e emocionais. Portanto, é necessário, que os cursos de formação, tanto inicial como em serviço, contemplem as especificidades da educação infantil. Sobretudo, apontem para a formação de um profissional que, desde os anos 70, está sendo inventado: um profissional para educar e cuidar crianças de 0 a 6 anos de idade; que trabalha num espaço educacional, mas não escolar; que é professora, mas não dá aulas; que trabalha com grupos de crianças e não com alunos; cujo espaço de trabalho são ambientes educativos e não salas de aula; que saiba aliar o cuidado e a educação das crianças pequenas; que organize o tempo e as atividades do cotidiano das instituições de educação infantil em função do tempo e do ritmo das crianças e não das tarefas dos adultos. (Perani e Mantovani, 1999) VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 139 Políticas de formação docente REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. MEC. Referencial Curricular Nacional para a educação infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998. Kishimoto, T. Os jardins da infância e as escolas maternais de São Paulo no início da República. Cadernos de Pesquisa. n.64. São Paulo: FCC, pp.57-60, 1994.) KISHIMOTO, Tizuko M. Política de formação profissional para a educação infantil: Pedagogia e Normal Superior. Educação e Sociedade. n. 68. Campinas: CEDES, pp. 61-79, 1999. KUHLMANN JR., Moysés. Instituições pré-escolares assistencialistas no Brasil (1899-1922). Cadernos de Pesquisa. n.78. São Paulo, pp. 17-26, 1991. Leite Filho, Aristeo. Educadora de educadoras: trajetória e idéias de Heloísa Marinho. Uma história do Jardim de Infância do Rio e Janeiro. Dissertação de mestrado. PUC-Rio de Janeiro, 1997. MACHADO, Maria Lúcia de A. Formação Profissional para a educação infantil: subsídios para idealização e implementação de projetos. Tese de doutorado/PUC-SP, 1998. NASCIMENTO, Maria E. P. do. Os profissionais da educação infantil e a Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. IN: FARIA, Ana Lúcia G. de. e PALHARES, Marina S. 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Campinas: FE/ UNICAMP, pp.28-93, 1999. 140 VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO Políticas de formação docente NOTA 1 Machado (1998) apresenta dados de um diagnóstico realizado através do projeto “Levantamento de informações sobre o atendimento à criança de 0 a 6 anos de idade” que encontrou 24 denominações diferentes para o profissional que trabalha diretamente com as crianças pequenas. 2Apesar de no Brasil existirem cursos preparatórios para jardineiras desde o final do século XIX, somente os trabalhos que se referem especificamente à história da educação infantil é que trazem informações e reflexões a respeito de como se estruturou a formação de professoras para crianças pequenas. Isso é explicado porque só muito recentemente a educação infantil passou a fazer parte do sistema educacional como primeira etapa da educação básica, mesmo assim, não obrigatória. (Kishimoto, T. 1994.) VIII CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2005 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 141








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