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Perguntas e respostas em Anestesia e temas correlatos
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E-book1.172 páginas15 horas

Perguntas e respostas em Anestesia e temas correlatos

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Sobre este e-book

O que tem mais no corpo, sódio ou potássio? Na soroterapia, por que os rótulos das soluções informam a osmolaridade se eu preciso saber a tonicidade delas? É possível uma solução hiperosmolar funcionar como isotônica? Como fazer um soro glicosado 5%? Como começar a ventilação mecânica na UTI ou no pronto-socorro? Por que a face interna da membrana das células eletroexcitáveis é negativa e a externa é positiva? Como proceder no paciente de entubação difícil? O que é "steady state"? Como funcionam os bloqueadores neuromusculares? O que minimamente devo saber sobre farmacocinética e farmacodinâmica? Como funciona os anticoagulantes? O que é minimamente importante no pré-operatório? O que é pKa do anestésico local e como ele influencia no início de ação dele? Por que o diurético de alça pode produzir hipocalcemia e o tiazídico hipercalcemia? Por que da dieta hipossódica em quem tem insuficiência cardíaca? O que quer dizer cada dado de uma gasometria? Por que o sistema tampão bicarbonato/bicarbonato de sódio não tampona a acidose respiratória aguda? Como explicar os sintomas da hipertermia maligna?
Essas são algumas perguntas que serão respondidas, através da fisiologia ou fisiopatologia, neste livro. Os temas do livro são importantes para acadêmicos de Medicina que cursam a disciplina de Anestesiologia, para professores de Medicina que ministram aulas de Anestesiologia e para médicos clínicos que trabalham em pronto-socorro e UTI.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento12 de ago. de 2024
ISBN9786527014997
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    Perguntas e respostas em Anestesia e temas correlatos - Thiago Marques Tourinho

    PARTE 1

    ANESTESIA

    CAPÍTULO 1

    ANESTESIA GERAL

    1) Defina anestesia, sedação e anestesia geral.

    a) A anestesia é a retirada da dor a fim de se realizar algum procedimento médico. Sedação se refere a uma situação de conforto. A anestesia geral se busca alcançar com o uso de medicamentos: hipnose (inconsciência), relaxamento muscular (bloqueio neuromuscular), bloqueio dos reflexos autonômicos e analgesia.

    2) Esquematize ou explique o circuito circular semiaberto de anestesia, nomeie os seus componentes e discrimine o que não é permitido na distribuição dos elementos no circuito.

    b) Os circuitos de anestesia podem ser abertos, quando não há reinalação do CO2; semiaberto, com reinalação parcial do CO2; e fechado, quando não há liberação do CO2 do circuito para o meio ambiente. Geralmente, os circuitos usados para se fazer anestesia geral são do tipo semiaberto. O sistema circular semiaberto é formado por uma fonte de entrada de gás fresco (FGF)*, que abastece o circuito com O2, anestésico inalatório – se for o caso – e ar comprimido; dois tubos corrugados, um inspiratório e outro expiratório; duas válvulas unidirecionais, uma inspiratória que fica no tubo corrugado inspiratório e outra expiratória que fica no tubo corrugado expiratório; uma peça em Y, que conecta os tubos corrugados ao tubo endotraqueal do paciente; um absorvedor de CO2 e uma válvula aliviadora de pressão (pop-off). A posição desses elementos no sistema circular semiaberto pode mudar, desde que: a válvula unidirecional inspiratória esteja no tubo corrugado inspiratório e a válvula unidirecional expiratória esteja no tubo corrugado expiratório; o FGF não deve ser colocado entre o paciente e a válvula expiratória; a válvula expiratória não deve ser colocada entre a válvula inspiratória e o paciente; a válvula aliviadora de pressão (pop-off) não deve ser colocada entre a válvula inspiratória e o paciente.

    *Considerando que o paciente expira vapor de água e que a própria ação do absorvedor de CO2 produz água, o mais correto é dizer que durante a anestesia se trabalha com vapores e não gases. Gás é um estado da matéria composto por um só tipo de moléculas (O2, CO2, anestésico inalatório e etc); o vapor ocorre quando também há moléculas de água. Aos gases medicinais, O2 e ar comprimido, quando entram no circuito anestésico, são acrescentadas moléculas de água – da expiração do paciente e do absorvedor de CO2¥ –, tornando-se vapores. Toda vez que se usar o termo gás nesse capítulo, a rigor trata-se de vapor, e não gás.

    ¥Vide questão abaixo como funciona o absorvedor de CO2.

    3) Esquematize ou explique as reações que ocorrem no absorvedor de CO2 com cal sodada e aponte quais as vantagens do uso do absorvedor de CO2 para o paciente na anestesia. Como se percebe que o absorvedor de CO2 deve ser trocado?

    c) O absorvedor de CO2 tem a função de retirar o CO2 do sistema circular semiaberto de anestesia, e ele faz isso umidificando e aquecendo o sistema. Isso porque o absorvedor de CO2, que pode ser a cal sodada ou a cal baritada*, possui reagentes que combinam com o CO2 exalado pelo paciente numa reação do tipo ácido + base produzindo sal + água e calor (reação exotérmica). A cal sodada e a cal baritada vêm com um indicador de pH que muda de cor quando há diminuição do pH (< 10,7) marcando diminuição da capacidade absortiva da cal, de forma que se a cal sodada, por exemplo, estiver branca, significa que ela está adequada para o uso; se mudar de cor para violeta, a cal sodada estará imprópria para o uso e deverá ser trocada. Seguem as reações que acontecem com o CO2 exalado pelo paciente e com a cal sodada:

    * A cal sodada é formada por 80% de Ca(OH)2 ,15% de H2O, 4% de NaOH e 1% de KOH. A cal baritada é formada por 20% de Ba(OH)2 e 80% de Ca(OH)2.

    4) Um dos cuidados de se usar o absorvedor de CO2 diz respeito à produção de CO e de composto A (éter vinílico), que em cobaias demonstrou ser nefrotóxico. Quais os fatores que aumentam a produção desses dois componentes no absorvedor de CO2?

    d) Um dos cuidados quanto ao uso do absorvedor de CO2 é a monitorização quanto à formação de CO e de composto A (éter vinílico). O CO é criado no absorvedor de CO2 quando há ressecamento do absorvedor (absorvedor não usado por vários dias ou baixas taxas de FGF), com altas concentrações de halogenados, quando em altas temperaturas e com o uso de cal baritada em vez de cal sodada. O composto A tem a produção aumentada quando o FGF é baixo, quando há altas temperaturas no absorvedor de CO2, altas concentrações de sevoflurano e cal baritada em vez de cal sodada.

    5) Cite as características ideais de um anestésico inalatório.

    e) Um anestésico inalatório ideal é aquele que tem ação previsível, indução/despertar rápidos, mínimos efeitos colaterais (náuseas, vômitos, depressão miocárdica, depressão respiratória, hipertermia maligna, toxicidade renal ou hepática), odor agradável, não inflamável e de baixo custo. Não se usa mais como anestésico inalatório o éter, por ser inflamável; ciclopropano, por ser explosivo; clorofórmio, por ser hepatotóxico; e metoxiflurano, por ser nefrotóxico e de indução lenta.

    6) Cite o(s) mecanismo(s) de ação dos anestésicos inalatórios

    f) São várias as teorias do mecanismo de ação dos anestésicos inalatórios. Primeiro, a da lipossolubilidade: quanto mais solúvel o anestésico inalatório em azeite de oliva, mais potente é o anestésico. Acredita-se por essa teoria de que a incorporação do anestésico na membrana do neurônio é responsável por alterações do metabolismo do neurônio que levam à anestesia. Teoria anfifílica ou anfipática: quanto mais solúvel em octanol o anestésico inalatório é, mais potente ele também é. Nessa teoria, o anestésico inalatório agiria em moléculas polares e apolares. Teoria do aumento de entropia: o anestésico inalatório penetraria pela membrana do neurônio, alteraria o volume intracelular do neurônio, aumentaria a entropia dos lipídios em estado gel e haveria bloqueio de canais iônicos. Teoria da inibição da oxidação: o anestésico inalatório inibe certos processos oxidativos. Teoria dos microcristais: o anestésico inalatório formaria microcristais no SNC. Teoria dos receptores: o anestésico inalatório, semelhante ao barbitúrico, atuaria em receptores específicos aumentando a inibição e diminuindo a excitação deles.

    7) O que é CAM? Qual a correspondência entre CAM e DE50 do anestésico inalatório? Como se atinge a DE95 do anestésico inalatório? O que é CAM acordado e como atingi-lo?

    g) CAM é a concentração alveolar mínima do anestésico inalatório, a 1 atmosfera (1 ATM), para que em 50% dos indivíduos não haja resposta motora quando de um estímulo nóxico (incisão da pele) após tempo suficiente para absorção, distribuição e estabelecimento de equilíbrio. A CAM do anestésico inalatório é a DE50 dele para o efeito de não haver resposta motora diante de um estímulo nóxico. Quando se administra 1,5 x CAM do anestésico inalatório, administra-se a DE95 dele para o efeito de não haver resposta motora diante de um estímulo nóxico. A CAM acordado é a concentração alveolar do anestésico inalatório em que 50% da população não responde ao estímulo tátil não nocivo e nem ao estímulo verbal. Em outras palavras, 50% da população está prestes a acordar quando atinge a CAM acordado. A CAM acordado corresponde a 0,4 x CAM.

    8) É correto dizer que, após atingido o equilíbrio (steady state), se há 1 CAM no alvéolo, também há 1 CAM no SNC? Por quê?

    h) O conceito de CAM se refere à concentração do anestésico inalatório em um sítio, que é o alvéolo, cujo efeito – não ter resposta motora quando de um estímulo nóxico (incisão da pele) – está em outro sítio, o SNC. Por isso, é correto dizer que se no alvéolo, após atingido o equilíbrio (steady state), há 1 CAM do anestésico inalatório, também há 1 CAM no SNC.

    9) Correlacione CAM, potência e lipossolubilidade dos anestésicos inalatórios. Dentre essas características, qual anestésico inalatório mais relacionado à característica ideal de indução anestésica rápida?

    i) Para o anestésico inalatório, quanto maior a CAM, menor a potência dele e menos lipossolúvel ele é. Dentre os anestésicos N2O e os halogenados (desflurano, enflurano, sevoflurano, isoflurano e halotano), o N2O é o menos potente (CAM = 104) e menos lipossolúvel (coeficiente de partição óleo/gás = 1,4) e o halotano é o mais potente (CAM = 0,75) e mais lipossolúvel (coeficiente de partição óleo/gás = 224). Para haver indução anestésica rápida com inalatório, é necessário que se alcance a CAM o mais rápido possível e que o inalatório tenha odor agradável. Quanto maior for a CAM do anestésico inalatório, menor será a potência, menor a lipossolubilidade dele e mais difícil esse anestésico deixará o alvéolo para a circulação pulmonar (absorção/ captação). Ora, se menos anestésico inalatório deixa o alvéolo, mais rápido para ele se acumular no alvéolo e alcançar a CAM. Apesar do N2O ser o anestésico inalatório com maior CAM (CAM = 104), para se atingir a CAM somente com N2O seria necessário administrar uma mistura hipóxica, o que claramente é contraindicado*. O desflurano (CAM = 6) seria a opção seguinte ao N2O para indução anestésica rápida, porém o desflurano irrita as vias aéreas e, por isso, não há como fazer indução inalatória com o desflurano. O sevoflurano é o anestésico inalatório de maior CAM (CAM=1,8), menor potência, menor lipossolubilidade que permite indução inalatória, porque ele tem odor agradável e não irrita a via aérea.

    *Repare que essa explicação é um modelo teórico, ou seja, se considerou que para alcançar a indução anestésica deve necessariamente haver 1 CAM no alvéolo, porém o conceito de CAM se refere a uma porcentagem da população. É perfeitamente possível que mesmo com 0,5 CAM no alvéolo, parcela da população – no caso, 25% da população – não terá resposta motora ao estímulo nóxico.

    10) Descreva os estágios de profundidade anestésica com o uso de anestésico inalatório. Como se pode monitorizar a profundidade anestésica do paciente quando em anestesia inalatória?

    j) A profundidade anestésica, quando se usa somente anestésico inalatório, passa por fases: no estágio I, o paciente ainda está consciente, mas com diminuição da percepção da dor; no estágio II, que é o estágio do delírio, o paciente está inconsciente, há padrão irregular da respiração e os reflexos ainda estão presentes – a presença dos reflexos faz com que, por exemplo, caso se faça uma laringoscopia para intubação, poderá haver espasmo de glote –; no estágio III, que é da anestesia cirúrgica, há relaxamento muscular e não há reflexos como o de proteção da via aérea, por exemplo; no estágio IV, há depressão medular com depressão miocárdica e respiratória. A monitorização do grau de inconsciência na anestesia inalatória pode ser feita com o BIS ou com o analisador de gases, que informa a concentração do anestésico inalatório expirado*.

    * Se o analisador de gases informa que, após o equilíbrio, o paciente expira 1 CAM de anestésico inalatório, é porque pelo menos mais de 1 CAM do anestésico inalatório está no alvéolo dele.

    11) Cite fatores que aumentam e diminuem a CAM dos anestésicos inalatórios.

    k) São fatores que aumentam a CAM dos anestésicos inalatórios, ou seja, tornam-nos menos potentes: uso crônico de álcool, até os 6 meses de idade, hipernatremia, hipertermia (temperatura > 45⁰C), uso de anfetaminas, cocaína e efedrina. São fatores que diminuem a CAM dos anestésicos inalatórios, ou seja, tornam-nos mais potentes: uso agudo do álcool, idosos, hiponatremia, hipotermia, anemia (Hb < 5 g/dl), hipercarbia, hipóxia, acidose metabólica, gravidez, uso concomitante de opioides, benzodiazepínicos, propofol, α2 agonistas, cetamina e lidocaína EV.

    12) Explique como se dá a mudança dos componentes dos gases do circuito externo ao paciente em direção à composição dos gases administrados pelo fluxo de gases frescos (fração inalada ou FI).

    l) A mudança dos componentes dos gases do circuito externo ao paciente em direção à composição dos gases administrados pelo fluxo de gases frescos (fração inalada ou FI) se dá como uma função exponencial negativa de fator de mudança constante – o fator de mudança constante se chama constante de tempo. A constante de tempo é determinada pela razão entre o volume do circuito externo pelo fluxo administrado. Então, por exemplo, em um circuito externo de volume 4l e com administração de um FGF de 2l/min, a constante de tempo é 2 min, o que significa que nos primeiros 2 minutos (1 constante de tempo) de administração daquele fluxo naquele volume de circuito externo, a composição dos gases do volume do circuito externo será 63% da composição dos gases administrados pelo FGF (FI); após 4 minutos (2 constantes de tempo), a composição dos gases do volume do circuito externo será 84% da composição dos gases administrados pelo FGF (FI); após 6 minutos (3 constantes de tempo), a composição dos gases do volume do circuito externo será 95% da composição dos gases administrados pelo FGF (FI); após 8 minutos (4 constantes de tempo), a composição dos gases do volume do circuito externo será 98% da composição dos gases administrados pelo FGF (FI)*. Resumindo, após 4 constantes de tempo, a concentração de anestésico inalatório no circuito externo ao paciente é 98% da concentração do anestésico inalatório oferecido pelo FGF (FI), ou seja, quase a mesma.

    *Por exemplo, caso se administre pelo FGF 1% de sevoflurano, após 1 constante de tempo, 0,63% do volume do circuito externo ao paciente será de sevoflurano; após 2 constantes de tempo, 0,84% do volume do circuito externo ao paciente será de sevoflurano; após 3 constates de tempo, 0,95% do volume do circuito externo ao paciente será de sevoflurano; após 4 constantes de tempo, 0,98% do volume do circuito externo ao paciente será de sevoflurano.

    13) Explique como se dá a mudança dos componentes de gases dos pulmões (capacidade residual funcional) do paciente em direção à composição dos gases administrados pelo fluxo de gases frescos (fração inalada).

    m) A mudança dos componentes dos gases dos pulmões do paciente em direção à composição dos gases administrados pelo fluxo de gases frescos (fração inalada ou FI) se dá, também, como uma função exponencial negativa de fator de mudança constante. Assim, para que a quantidade de anestésico inalatório dos pulmões do paciente se iguale ao que é oferecido (FI), considera-se a CRF como o volume que será modificado pela FI e a ventilação alveolar* como o fluxo que provoca a modificação. Considerando que um adulto tem CRF de aproximadamente 2l e que a ventilação alveolar na indução anestésica é de 4l/min, então a constante de tempo para os pulmões é 0,5 minuto. Logo, em 2 minutos a fração alveolar (FA), que é o volume de gás presente no alvéolo, se iguala à FI¥.

    *O volume da ventilação alveolar é o volume a partir do bronquíolo terminal descontado o espaço morto alveolar. Para se calcular o volume da ventilação alveolar, basta retirar do volume minuto (FR x VC) o volume morto – vias aéreas até o bronquíolo respiratório + volume do espaço morto alveolar (alvéolos ventilados, mas não perfundidos).

    ¥É claro que se deve levar em conta que, para que o fluxo de gases frescos (FI) chegue ao paciente, o circuito externo ao paciente deve estar em equilíbrio com o fluxo de gases frescos (vide resposta anterior). Ainda, esse cálculo de como a fração alveolar do paciente se equilibra com a fração inspirada (FI) é teórico, porque não considera a absorção/ captação da mistura gasosa pela circulação pulmonar.

    14) Para haver anestesia inalatória, é necessário que a razão entre a fração alveolar e a fração inspirada dos gases seja 1 (FA/FI = 1) * para que haja CAM no alvéolo. Como se relacionam as variáveis concentração do anestésico inalatório no fluxo de gases frescos (FI), ventilação, coeficiente de partição sangue-gás do anestésico inalatório€ e débito cardíaco direito ou fluxo sanguíneo pulmonar¶ com a facilidade em se alcançar a CAM do anestésico inalatório e a facilidade de se alcançar FA/FI = 1?

    n) Ao chegar no alvéolo, o anestésico inalatório será absorvido/ captado, para depois ser distribuído, metabolizado e excretado¥. Na anestesia inalatória, a absorção do anestésico inalatório também é chamada de captação. Sabe-se que para haver anestesia inalatória, é necessário que FA/FI = 1 para que o anestésico inalatório atinja a CAM no alvéolo. Quanto maior for a concentração do anestésico inalatório oferecido, ou seja, no fluxo de gases frescos (FI), mais rápido ocorrerá FA/FI = 1, e mais rápido o anestésico inalatório alcançará a CAM no alvéolo. Quanto maior for a ventilação, ou seja, maior o volume x minuto, mais rápido ocorre FA/FI = 1, e mais rápido o anestésico inalatório alcançará a CAM no alvéolo. Quanto maior for o coeficiente de partição sangue-gás do anestésico inalatório, maior será a absorção/ captação dele, menos dele ficará no alvéolo, mais difícil será para ocorrer FA/FI = 1, mais difícil será para atingir a CAM. Quanto maior é o débito cardíaco direito ou fluxo sanguíneo pulmonar, maior é a quantidade de anestésico inalatório que deixa o alvéolo e vai para a circulação, maior a absorção/ captação dele, mais difícil para se atingir FA/FI = 1, mais difícil para o anestésico inalatório potente atingir a CAM. Note que a influência do débito cardíaco direito ou fluxo sanguíneo pulmonar é tanto maior quanto mais potente for o anestésico inalatório, por exemplo, a absorção/ captação do óxido nitroso (N2O), CAM=104, é pouco influenciada pelo débito cardíaco, já a absorção/ captação do halotano, CAM=0,75, aumenta com o aumento do débito cardíaco. Resumindo, a velocidade de alcance de FA/FI = 1 e da CAM do anestésico inalatório tem uma relação direta com o aumento da concentração do anestésico inalatório oferecido no fluxo de gases frescos (FI), direta com o aumento do volume minuto, inversa quando maior é o coeficiente de partição sangue-gás do anestésico inalatório e, para os anestésicos inalatórios potentes, inversa para o aumento do débito cardíaco direito ou da circulação pulmonar₹.

    *Se o que há no alvéolo - fração alveolar (FA) – é igual ao que se está se administrando – fração inspirada (FI) –, ou seja, FA/FI = 1, significa que o sistema está em equilíbrio e todo anestésico inalatório que tinha que ser absorvido/ captado já fora absorvido/ captado e, por isso, a CAM do anestésico inalatório é alcançada.

    €O coeficiente de partição sangue/gás é uma variável farmacocinética que relaciona, quando há equilíbrio, a quantidade de anestésico inalatório no sangue e no alvéolo. O desflurano tem o menor coeficiente de partição sangue/gás, 0,45, e significa que, quando há equilíbrio, 45 moléculas de desflurano estão no sangue enquanto há 100 moléculas no alvéolo. O halotano tem coeficiente de partição sangue/gás de 2,5 e significa que, quando há equilíbrio, 250 moléculas de halotano estão no sangue enquanto há 100 moléculas no alvéolo. O metoxiflurano tem coeficiente de partição sangue/gás de 15 e significa que, quando há equilíbrio, 1.500 moléculas de metoxiflurano estão no sangue enquanto há 100 moléculas no alvéolo. O coeficiente de partição sangue/gás estima a velocidade com que as pressões parciais do anestésico inalatório no sangue e no alvéolo se tornam iguais, ou seja, a situação de equilíbrio em que a velocidade de passagem do anestésico do alvéolo para o sangue é a mesma da velocidade de passagem do anestésico do sangue para o alvéolo. Assim, o desflurano, que tem baixo coeficiente de partição sangue/gás (0,45), necessita que menos moléculas dele saiam do alvéolo para saturar o sangue, ou seja, o alcance do equilíbrio e o fim da captação são rápidos, ao passo que o halotano, que tem alto coeficiente de partição sangue/gás (2,5), necessita que muitas moléculas dele saiam do alvéolo para saturar o sangue, ou seja, alcance do equilíbrio tardio e prolongamento do tempo de captação.

    ¶É comum a literatura usar como sinônimos débito cardíaco direito, circulação pulmonar e débito cardíaco para explicar a influência da quantidade de sangue na circulação pulmonar na rapidez de se alcançar a CAM e FA/FI = 1 para os inalatórios potentes.

    ¥ Uma das características do anestésico inalatório ideal é que ele não sofra metabolismo para que não surjam compostos com ações diferentes dele. É importante destacar que a maioria do anestésico inalatório administrado numa anestesia não sofre o ADME da farmacocinética porque intencionalmente se busca que o anestésico inalatório fique no alvéolo para alcançar a CAM. Quanto menos absorção/ captação, ou seja, quanto menos anestésico inalatório deixa o alvéolo para a circulação pulmonar, melhor. Para finalizar, a via de administração do anestésico inalatório é a pulmonar, e o anestésico inalatório é excretado pelos próprios pulmões quando se encerra a administração do anestésico inalatório.

    ₹A absorção/ captação é regida pela fórmula: A = λ . Q . ( ), em que A é absorção/ captação, λ é a solubilidade do anestésico inalatório no sangue, Q é débito cardíaco ¶, PA é pressão parcial do anestésico inalatório no alvéolo e PV é pressão parcial do anestésico inalatório no sangue venoso. Para que a absorção/ captação cesse, FA/FI se torne igual a 1 e a CAM do anestésico inalatório seja alcançada é necessário que A seja a menor possível, próximo a 0. Quanto menor λ, menor A; quanto menor Q (depressão miocárdica grave), menor A; quanto menor a diferença de pressão parcial entre o alvéolo e o sangue venoso, menor A. Pois bem, anestésicos inalatórios menos potentes têm menor λ (baixo coeficiente de partição sangue gás). As mudanças do débito cardíaco, conforme já dito, influenciam quanto mais lipossolúvel for o anestésico inalatório, e o débito cardíaco influencia na captação semelhantemente ao aumento de solubilidade do anestésico inalatório. Como assim? Um anestésico inalatório A que tem o dobro da solubilidade em sangue de outro anestésico B significa que o sangue consegue reter de A o dobro da quantidade de B. O débito cardíaco dobrado dobra a capacidade do sangue em reter anestésico por dobrar o volume sanguíneo exposto ao capilar alveolar. Por fim, a diferença de pressão parcial alvéolo-venosa do anestésico inalatório igual a zero significa que a distribuição do anestésico aos diversos tecidos já aconteceu, a quantidade de anestésico no sangue arterial é semelhante ao venoso e não há mais absorção/ captação (tempo de anestesia prolongado).

    15) Por que não se pode usar a estratégia de altas concentrações do anestésico inalatório no fluxo de gases frescos (fração inalada) para aumentar a rapidez de alcance de CAM e da FA/FI = 1 com os anestésicos inalatórios potentes?

    o) Como os anestésicos inalatórios potentes têm baixa CAM, ao se administrarem altas concentrações (FI) de anestésico inalatório potente, uma vez alcançado o steady state, o paciente estará sob efeito de várias CAM, que podem dar uma profundidade anestésica ameaçadora à vida. Tomemos como exemplo o halotano, halogenado muito potente, cuja CAM é 0,75, caso se administre na fração inspirada (FI), em uma situação hipotética – e isso é possível porque não se trata de uma mistura hipóxica – 7,5% de halotano e 92,5% de O2, após estabelecido o steady-state, o paciente estaria sob efeito de 10 CAM! Sabe-se que 1,5 x CAM do anestésico inalatório corresponde aproximadamente à DE95 dele; no caso em tela, a DE95 do halotano é 1,125, muito abaixo das 10 CAM administradas.

    16) Explique por que pacientes com shunt esquerda-direita têm mais dificuldade em atingir a CAM quando se usam anestésicos inalatórios potentes.

    p) O shunt esquerda-direita é uma condição na qual o sangue do lado esquerdo do coração é desviado para o direto sem passar pela circulação maior, como, por exemplo, na comunicação interventricular, e com isso há aumento da circulação pulmonar. É sabido que quanto maior o débito cardíaco direito ou a circulação pulmonar, maior é a quantidade de anestésico inalatório potente transferido do alvéolo para o sangue, maior é a absorção/ captação do anestésico inalatório potente, e menos inalatório potente fica no alvéolo para alcançar a CAM.

    17) O que o médico pode fazer para induzir o mais rápido possível numa anestesia inalatória?

    q) Para se ter uma indução inalatória rápida, que é um dos fatores ideais da anestesia inalatória, idealmente é necessário que exista volume mínimo do circuito externo ao paciente, fluxo de gases frescos (fração inalada) com altas concentrações do anestésico inalatório, alta ventilação (volume x minuto), o anestésico inalatório deve ter alta CAM, ser pouco lipossolúvel, pouco potente, com baixo coeficiente de partição sangue-gás e deve-se usar a técnica do efeito do 2° gás (usar o N2O concomitante ao anestésico inalatório).

    18) Explique o efeito do 2° gás e como ele pode diminuir a quantidade de consumo de anestésico inalatório e aumentar a velocidade de indução anestésica inalatória. Por que só o N2O pode ser usado como 2° gás?

    r) O efeito do 2° gás ocorre quando se administra na mistura gasosa do fluxo de gases frescos (FI), junto com o anestésico inalatório, altas concentrações de N2O. Esse efeito só pode ser feito com o N2O porque ele tem altíssima CAM (104) e, por isso, pode ser administrado em altas concentrações sem o risco de submeter o paciente a várias CAM. Parte dessa grande quantidade de N2O que chega ao alvéolo será absorvida/ captada até que haja equilíbrio entre o alvéolo e a circulação pulmonar. Essa perda de N2O pela absorção/ captação faz com que a concentração do anestésico inalatório aumente no alvéolo, já que o N2O é um diluente do anestésico inalatório no alvéolo. Além disso, a saída de N2O do alvéolo para a circulação faz com que esse alvéolo tenha menor volume ao fim da expiração e possa ser ventilado com maior volume na próxima respiração. Ora, por esses dois mecanismos há aumento da concentração do anestésico inalatório no alvéolo e de forma rápida. Se há aumento da concentração de anestésico inalatório no alvéolo por causa do efeito do 2º gás, pode-se administrar uma concentração menor de inalatório (menor FI), economizando-o. Se há aumento da velocidade de aumento da concentração do inalatório no alvéolo devido ao efeito do 2º gás, mais rápido FA/FI = 1, mais rápido para o inalatório alcançar a CAM, mais rápida a indução inalatória.

    19) Por que os anestésicos inalatórios, que têm altos Vd para a gordura, não se concentram na gordura?

    s) Uma vez absorvido/ captado, o anestésico inalatório é distribuído para os diversos órgãos, inclusive a biofase (SNC). A distribuição do anestésico inalatório em determinado órgão depende da solubilidade do anestésico no tecido do órgão*, do fluxo sanguíneo do órgão e da diferença de pressão parcial do anestésico no tecido do órgão em questão com o sangue arterial€. Os anestésicos inalatórios têm alto volume aparente de distribuição (Vd) para a gordura porque são lipossolúveis, o que levaria a pensar que eles ficariam concentrados na gordura, mas isso não acontece porque o tecido gorduroso tem baixa perfusão tecidual, menos que 10% do débito cardíaco. Assim, o uso clínico costumeiro dos anestésicos inalatórios não se dá em tempo suficiente para que os anestésicos inalatórios entrem em equilíbrio com o tecido adiposo e, por isso, eles não são armazenados na gordura¥.

    * O coeficiente de partição tecido/sangue é uma variável farmacocinética que relaciona, quando há equilíbrio, a quantidade de anestésico inalatório no tecido em questão e no sangue. Por exemplo, para o desflurano o coeficiente de partição cérebro/sangue é 1,3 e significa que, no equilíbrio, há 13 moléculas de anestésico inalatório no cérebro e 10 moléculas no sangue; para o sevoflurano o coeficiente de partição fígado/sangue é 1,8 e significa que, no equilíbrio, há 18 moléculas de anestésico inalatório no fígado e 10 moléculas no sangue; para o halotano o coeficiente de partição gordura/sangue é 51 e significa que, no equilíbrio, há 510 moléculas de anestésico inalatório no tecido adiposo e 10 moléculas no sangue.

    € Absorção/ captação tecidual= λ t. Q . ( ), λt é a solubilidade do anestésico inalatório no tecido, Q é débito cardíaco, PA é pressão parcial do anestésico inalatório no sangue arterial e Pt é pressão parcial do anestésico inalatório no tecido.

    ¥As pressões parciais dos anestésicos inalatórios em tecidos ricamente vascularizados (cérebro, pulmões, coração, fígado, rins e glândulas endócrinas), que correspondem a 10% da massa corporal total e 75% do débito cardíaco, se equilibram com as do sangue arterial em cerca de 8 minutos de anestesia. As pressões parciais dos anestésicos inalatórios em músculos, que correspondem a 50% da massa corporal total e 20% do débito cardíaco, se equilibram com as do sangue arterial entre 2 e 4 horas.

    Referências

    Este livro é uma proposta de trabalho feita pelo autor para os acadêmicos do curso de Anestesiologia da faculdade de Medicina. O objetivo do livro é apresentar um conhecimento básico em anestesiologia, que é importante a qualquer médico clínico, e não esgotar os temas, usando vasta bibliografia. Qualquer recurso iconográfico deste livro (desenhos, gráficos, fluxogramas) foi feito toscamente pelo autor usando o Word, copiando o material iconográfico da bibliografia. O autor recomenda vivamente que o leitor busque a bibliografia de cada capítulo porque, além de mais completa, ela traz recursos iconográficos (desenhos, gráficos, fluxogramas, tabelas) que facilitam muito o estudo. Por exemplo, neste livro, alguns fluxogramas e tabelas da bibliografia foram transformados em perguntas, e, para o autor, é muito mais fácil o aprendizado por recurso iconográfico do que por texto corrido.

    1) HAYS, Stephen Robert, MD, FAAP. Inhalation anesthetic agents: Clinical effects and uses. Up to Date, 2022.

    2) GUEDES, Alexandre. Farmacocinética da anestesia inalatória. Vídeo aberto no YouTube, endereço: www.youtube.com/watch?v=oqslPlQvbeU

    3) BERG, Sheri M.; BITTNER, Edward A.; ZAO, Kevin H. Equipamentos. Revisão em anestesiologia, detonando as bancas, 2018, p. 1-16.

    4) AMARAL, José Luiz Gomes do. Farmacocinética dos anestésicos inalatórios. Tratado de anestesiologia (7ª edição) SAESP, 2011, p. 1027-1050.

    5) HELFENSTEIN, Eduardo; SERZEDO, Paulo Sérgio Mateus Marcelino; DA COSTA, Clóvis Tadeu Bueno; GOMES Thiago de Freitas. Anestésicos inalatórios. Tratado de Anestesiologia (9ª edição) SAESP, 2021, p. 627-650.

    6) TARDELLI, Maria Ângela. Farmacocinética dos anestésicos inalatórios. Tratado de Anestesiologia (9ª edição) SAESP, 2021, p. 651-660.

    7) BÚRGIO, Tiago Gomes. Absorvedores de gás carbônico. Tutorial da semana, SBA.

    CAPÍTULO 2

    ANESTÉSICOS VENOSOS

    1) Ao se usar os anestésicos venosos, busca-se a hipnose (inconsciência). Quais os tipos de hipnose e com quais medicamentos ela pode ser obtida?

    a) Os anestésicos venosos produzem a hipnose (inconsciência) de duas formas distintas: a primeira é aquela parecida com o sono, realizada por propofol, etomidato, benzodiazepínicos e barbitúricos. A segunda é a anestesia dissociativa, caracterizada por profunda analgesia e aparência de desconecção com o entorno*, que é feita pela cetamina.

    *Anestesia dissociativa também pode se referir à dissociação entre o eletroencefalograma do hipocampo com o eletroencefalograma do córtex/tálamo. Há inibição do córtex e tálamo e aumento da atividade do sistema límbico.

    2) A hipnose pelos anestésicos venosos é dose-dependente e deprime o córtex de forma reversível. Como monitorizar o grau de hipnose?

    b) A hipnose pelos anestésicos venosos é dose-dependente e deprime o córtex de forma reversível. A hipnose pode ser do tipo sedação, que é uma situação de conforto para o paciente, até o coma. Há como a profundidade da hipnose ser avaliada clinicamente, através das escalas de Ramsay e RASS; com instrumentos, como o BIS; e na anestesia inalatória, pelo analisador de gases, que informa a porcentagem de anestésico inalatório exalada em uma expiração*.

    * O BIS funciona colocando-se eletrodos na cabeça do paciente, e o aparelho informa um número que corresponde ao nível de hipnose: em 0, há supressão de onda (sem atividade neuronal); de 0 a 40, há hipnose profunda; de 40 a 55, hipnose intermediária; de 70 a 55, hipnose superficial; de 70 a 80, sonolência; em 100, há consciência. O analisador de gases mede a concentração do anestésico inalatório presente no ar expirado do paciente. Quando, após o equilíbrio, o paciente expira 1 CAM, significa que há no alvéolo dele pelo menos 1 CAM.

    3) O que são sinapses inibitórias e excitatórias do SNC? Explique como agem os anestésicos venosos quanto a sinapses inibitórias e excitatórias do SNC.

    c) No sistema nervoso central (SNC) há sinapses excitatórias, como glutamato com receptor n-metil d-aspartato (NMDA), e sinapses inibitórias, como o ácido aminogamabutírico (GABA) com receptor GABA A. As sinapses excitatórias promovem a despolarização do neurônio-alvo, enquanto as inibitórias hiperpolarizam o neurônio alvo. A cetamina é um antagonista não competitivo do glutamato no NMDA e, por isso, a ação dela é inibir a sinapse excitatória. A maioria dos outros anestésicos venosos são moduladores alostéricos do GABA A para com o GABA e, por isso, ativam a sinapse inibitória.

    4) Explique como se dá a hipnose e despertar rápidos dos anestésicos venosos. Quais características dos anestésicos venosos e da sua biofase que determinam esse comportamento clínico?

    d) O que explica a rápida hipnose e o rápido despertar dos anestésicos venosos é o fato de eles serem altamente lipossolúveis; têm altíssimo volume aparente de distribuição (Vd); e têm como biofase o SNC – o SNC e os outros órgãos centrais contribuem com apenas 10% do peso corporal total, mas recebem 75% do débito cardíaco. Como o anestésico venoso já entra no compartimento central - ou seja, ele não é absorvido porque é administrado EV -; como ele tem altíssimo volume aparente de distribuição (Vd) por ser muito lipossolúvel; como a biofase dele (SNC) é altamente perfundida, primeiramente ele é distribuído para os órgãos altamente perfundidos, como o SNC, e, por isso, a hipnose rápida. À medida que o anestésico venoso é redistribuído para órgãos de menor perfusão, diminui-se a concentração sanguínea dele e, assim, o anestésico venoso sai da sua biofase para a circulação sanguínea, resultando em despertar rápido.

    5) Correlacione taxa de extração hepática com metabolismo, ou biotransformação, ou depuração hepática do fluxo dependente ou capacidade dependente.

    e) Se a taxa de extração hepática de um medicamento é alta, significa que o metabolismo, ou biotransformação, ou depuração hepática depende da quantidade de fluxo sanguíneo hepático (fluxo dependente). Se a taxa de extração hepática de um medicamento é baixa, significa que o metabolismo, ou biotransformação, ou depuração hepática depende da capacidade das enzimas hepáticas (capacidade dependente). Propofol, etomidato, cetamina são medicamentos com depuração hepática fluxo dependente; tiopental e benzodiazepínicos são medicamentos com depuração hepática capacidade dependente.

    6) O que é t1/2α e t1/2β? Como é o t1/2α e o t1/2β dos anestésicos venosos? Por que, EM TESE, propofol e etomidato seriam mais adequados para infusão contínua?

    f) O t1/2α é o tempo em que uma droga reduz pela metade sua concentração sanguínea devido à sua distribuição; t1/2β é o tempo em que uma droga reduz pela metade sua concentração sanguínea devido à sua eliminação (distribuição, metabolismo, excreção). O t1/2α dos anestésicos venosos é pequeno devido à sua alta lipossolubilidade e ao seu altíssimo volume aparente de distribuição (Vd). Porém, o t1/2β deles difere bastante, pois nem todos os anestésicos venosos têm velocidades de metabolização e excreção semelhantes. Propofol e etomidato, em tese, por terem os menores t1/2β, acumulam-se pouco no organismo, o que é uma característica adequada para infusão venosa contínua*.

    *A variável adequada para determinar se um anestésico venoso é apropriado para infusão contínua é a meia-vida (t1/2) contexto sensitiva dependente.

    7) Explique o que ocorre com a fração de droga livre no sangue, volume aparente de distribuição (Vd) e t1/2β dos anestésicos venosos nas seguintes situações: neonato, 3 meses a 1 ano, 5 anos a 15 anos, idosos, hepatopatas, nefropatas, sépticos, naqueles com trauma e queimaduras e nos desnutridos.

    g) Os anestésicos venosos no neonato têm aumento da fração livre, devido à albumina fetal, que tem dificuldade de ligação ao anestésico venoso; volume aparente de distribuição (Vd) diminuído, devido à porcentagem maior de água no neonato; e aumento de t1/2β, devido à diminuição da função enzimática do fígado e baixa filtração glomerular renal do neonato.

    Os anestésicos venosos nos indivíduos de 3 meses a 1 ano têm fração livre praticamente normal, devido à diminuição de albumina fetal, que tem dificuldade de ligação ao anestésico venoso; volume aparente de distribuição (Vd) quase normal, devido à porcentagem menor de água do que no neonato; e t1/2β quase normal, devido ao aumento da função enzimática do fígado em relação ao neonato.

    Os anestésicos venosos nos indivíduos de 5 a 15 anos têm fração livre normal, devido à albumina ser igual a dos adultos; volume aparente de distribuição (Vd) quase que normal, sem diferença clínica significativa do adulto; e t1/2β menor, devido ao aumento da função enzimática do fígado em relação ao adulto.

    Os anestésicos venosos no idoso têm aumento da fração livre, devido à hipoalbuminemia e à dificuldade de ligação do anestésico venoso à albumina do idoso; maior volume aparente de distribuição (Vd), devido à porcentagem maior de gordura em relação à água no corpo do idoso; e aumento de t1/2β, devido à diminuição da função hepática e renal do idoso.

    Os anestésicos venosos nos pacientes com hepatite têm fração livre aumentada, devido à diminuição de albumina; e aumento do t1/2β, devido à diminuição da função enzimática do fígado. Os cirróticos compensados têm fração livre normal, porém com aumento do volume aparente de distribuição (Vd), devido à incapacidade do fígado em metabolizar estrogênios, o que causa acumulação de gordura corporal. Os cirróticos descompensados têm fração livre aumentada, devido à hipoalbuminemia; e diminuição do volume aparente de distribuição (Vd), devido ao aumento do fluido extracelular.

    Os anestésicos venosos nos nefropatas têm fração livre aumentada, devido à produção de uma albumina que se liga com dificuldades aos anestésicos venosos. Nos sépticos há hipoalbuminemia, que eleva a fração livre dos anestésicos venosos; disfunções renais e hepáticas, que aumentam o t1/2β dos anestésicos venosos; e choque distributivo, que altera o volume aparente de distribuição (Vd).

    Os anestésicos venosos nos pacientes com trauma e queimados têm fração livre alterada, devido à diminuição de albumina e ao aumento de α1-glicoproteína ácida, uma proteína inflamatória que se liga aos anestésicos venosos, diminuindo a fração livre deles. Nos desnutridos, há hipoalbuminemia com elevação da fração livre dos anestésicos venosos.

    8) Esquematize o receptor GABA A, mostre o sítio de ligação dos anestésicos venosos e o que acontece na célula uma vez ele é ativado.

    h) O receptor GABA A trata-se de um pentâmero formado por 2 subunidades α, 2 subunidades β e 1 subunidade γ. O GABA A, no período extrauterino, tem ação inibidora por excelência, que se dá quando 2 moléculas de GABA se ligam ao mesmo tempo entre as subunidades α e β do receptor. Uma vez que há essa interação entre receptor e as moléculas de GABA, o receptor se abre e permite que o cloro passe do extracelular para o intracelular, hiperpolarizando a célula. Os anestésicos venosos, em sua maioria, agem como moduladores alostéricos do receptor GABA A, aumentando a afinidade do GABA ao receptor GABA A, porém cada qual em sítios diferentes do receptor (propofol subunidade β, etomidato em β, benzodiazepínicos e barbitúricos entre subunidades γ e α).

    9) Quais os mecanismos de ação do propofol?

    i) O propofol se liga à subunidade β do GABA A, aumentando a afinidade do GABA ao GABA A e a duração de abertura do GABA A. Também atua como antagonista NMDA, depressor direto da medula espinhal, inibe a liberação de acetilcolina no hipocampo e córtex pré-frontal, aumenta a quantidade de dopamina no núcleo accumbens e diminui os níveis de serotonina na área postrema.

    10) Como é a formulação do propofol?

    j) O propofol é o 2,6-di-isopropilfenol e vem numa formulação altamente lipossolúvel com lecitina de ovo, glicerol e óleo de soja. Edetato dissódico é acrescentado para reduzir crescimento bacteriano. Essa formulação produz dor ao se injetar o propofol. Após preparar o propofol em condições estéreis, deve-se descartar o que não se usou em 6 a 12h.

    11) Escreva sobre distribuição, t1/2α, t1/2 β e metabolismo do propofol.

    k) O pico de ação do propofol é 90 segundos (baixa t1/2α, de 2 a 8minutos), mas o t1/2β é de horas. O propofol é metabolizado no fígado, mas também em outras regiões. No fígado, ele é conjugado a glicoronídeos, e é excretado pelos rins.

    12) Quais são as ações do propofol no SNC? Por que o propofol produz diminuição da pressão de perfusão do SNC?

    l) No SNC, o propofol provoca diminuição da pressão intracraniana, diminuição da pressão intraocular, diminuição da pressão de perfusão cerebral, aumenta o limiar convulsivo e diminui náuseas e vômitos pós-operatórios. Pressão de perfusão cerebral é PAM – pressão intracraniana (PPC = PAM – PÌC). O propofol diminui a PAM mais importantemente que a pressão intracraniana, por isso o seu uso provoca diminuição da pressão de perfusão cerebral.

    13) Quais são as ações do propofol no aparelho cardiovascular?

    m) No aparelho cardiovascular, o propofol diminui a pressão arterial por causa de vasodilatação, o que reduz tanto a pré-carga como a pós-carga, o débito cardíaco, o volume sistólico ejetado e a resistência vascular periférica, por isso a contraindicação do propofol em hipovolêmicos, em hemodinamicamente instáveis e naqueles com débito cardíaco fixo (estenose aórtica, por exemplo). Produz também leve redução da contratilidade cardíaca e há relatos de bradicardia ou de taquicardia leve diante da diminuição da pressão arterial.

    14) Quais são as ações do propofol no aparelho respiratório?

    n) No aparelho respiratório, o propofol age como depressor respiratório ao diminuir a resposta ventilatória ao CO2; diminui a resposta ventilatória à hipóxia; diminui a frequência respiratória e o volume corrente a ponto de chegar à apneia. O propofol é um broncodilatador.

    15) Quais são os efeitos colaterais do propofol?

    o) Como efeitos colaterais do propofol, pode-se citar: hipotensão, apneia, dor à injeção por causa da formulação. Nos pacientes com distúrbios do metabolismo dos lipídios, quando em infusão prolongada, o propofol pode provocar hipertrigliceridemia ou até pancreatite. Em pacientes pediátricos, quando em infusão prolongada (> 48h), principalmente naqueles com algum tipo de disfunção mitocondrial, pode ocorrer a síndrome da infusão do propofol com clínica de bradicardia, acidose metabólica, rabdomiólise e colapso cardiovascular.

    16) Quais os mecanismos de ação do etomidato?

    p) O etomidato é um derivado imidazólico cuja compreensão de seu mecanismo ainda é obscura. Acredita-se que o etomidato interaja com a subunidade β do receptor GABA A, e dessa interação há aumento da afinidade do GABA com o GABA A. Em doses elevadas, parece que o etomidato ativa GABA A mesmo sem GABA.

    17) Como é a formulação do etomidato? Onde é metabolizado o etomidato?

    q) A formulação do etomidato é uma solução hiperosmolar diluída em propilenoglicol que causa dor à injeção. A dose de etomidato é 0,2 a 0,6 mg/kg e ele é metabolizado no fígado (desalquilação) e por esterases plasmáticas (hidrólise da ligação éster), depois é excretado pelos rins e bile.

    18) Quais são as ações do etomidato no SNC? Por que o etomidato produz aumento da pressão de perfusão do SNC e diminuição do fluxo sanguíneo cerebral?

    r) No SNC, o etomidato provoca diminuição da pressão intracraniana, diminuição do fluxo sanguíneo cerebral, aumenta a pressão de perfusão cerebral, ativa focos epilépticos, por isso o cuidado de se usar o etomidato em quem tem epilepsia parcial. A diminuição da pressão intracraniana e a pouquíssima alteração da PAM explicam por que o etomidato aumenta a pressão de perfusão cerebral (PPC = PAM – PÌC). Como parece que o etomidato interage com a subunidade β do receptor GABA A e dessa interação há aumento da afinidade do GABA com o GABA A, a abertura de GABA A aumenta a entrada de cloro na célula, hiperpolariza-a, diminui a formação e propagação do potencial de ação, diminui o metabolismo da célula cerebral, diminui o consumo de O2 e, consequentemente, há redução do fluxo sanguíneo cerebral.

    19) Quais são as ações do etomidato no aparelho cardiovascular?

    s) No aparelho cardiovascular, o etomidato quase não altera a pressão arterial, nem a frequência cardíaca, nem a pressão de artéria pulmonar e nem o débito cardíaco. Tem efeitos mínimos sobre o sistema nervoso simpático e sobre a função barorreceptora. Diz-se ser o etomidato uma droga altamente cardioestável.

    20) Quais são as ações do etomidato no aparelho respiratório?

    t) O etomidato no sistema respiratório diminui o drive respiratório, mas não tanto quanto o propofol e o barbitúrico. A dose de indução do etomidato provoca breve hiperventilação com breve apneia.

    21) Quais são os efeitos colaterais do etomidato? Por que o etomidato é contraindicado no paciente séptico?

    u) O etomidato tem como efeitos colaterais: atividade mioclônica em até 70% dos pacientes, náuseas e vômitos em até 40% dos pacientes, tromboflebite superficial na injeção em 20% dos pacientes, dor à injeção, inibição dose-dependente da 11 β-hidroxilase e mínima inibição da 17 α-hidroxilase. A 11 β-hidroxilase é uma enzima presente no córtex da suprarrenal, que no metabolismo do colesterol converte a 11-deoxicorticosterona em corticosterona, que depois é convertida em aldosterona, e a 11-deoxicortisol, em cortisol. Uma dose única de etomidato pode suprimir a esteroidogênese por 24 a 72h, mas essa inibição é reversível e dose-dependente. A supressão suprarrenal tem efeitos mínimos no indivíduo saudável, mas pode contribuir com o aumento da mortalidade de indivíduos sépticos ou graves na UTI. Por isso, a contraindicação do etomidato em pacientes sépticos.

    22) Quais os mecanismos de ação dos barbitúricos?

    v) Os barbitúricos parecem agir entre subunidades γ e α do receptor GABA A, e eles aumentam o tempo de abertura do receptor do GABA A quando o GABA se liga. Também parecem ser agonistas de GABA A e diminuir a atividade NMDA.

    23) Como é a formulação dos barbitúricos? Onde se dá o seu metabolismo e onde são excretados?

    w) Os barbitúricos vêm sob a forma de sais de sódio, são altamente alcalinos e podem se precipitar quando administrados simultaneamente com soluções ácidas como a succinilcolina. O tiopental tem como dose de indução 3 a 4 mg/kg. Os barbitúricos têm metabolismo hepático, onde são oxidados, desalquilados e dessulfurados para depois serem excretados pelos rins.

    24) Quais são as ações dos barbitúricos no SNC?

    x) No SNC, os barbitúricos provocam diminuição da pressão intracraniana, diminuição do fluxo sanguíneo cerebral, diminuição do consumo de O2 pelo cérebro e aumento do limiar convulsivo (ação anticonvulsivante).

    25) Quais são as ações dos barbitúricos no aparelho cardiovascular?

    y) No aparelho cardiovascular, os barbitúricos diminuem a pressão arterial por causa de vasodilatação, o que diminui tanto a pré-carga como a pós-carga, reduz débito cardíaco, volume sistólico ejetado e a resistência vascular periférica, por isso a contraindicação dos barbitúricos em hipovolêmicos, em hemodinamicamente instáveis e naqueles com débito cardíaco fixo (estenose aórtica). Produzem, também, redução da contratilidade cardíaca.

    26) Quais são as ações dos barbitúricos no aparelho respiratório?

    z) No sistema respiratório, os barbitúricos induzem à depressão respiratória com apneia após a administração em bolus, e diminuem as respostas ao CO2.

    27) Quais os efeitos colaterais dos barbitúricos?

    aa) Os efeitos colaterais dos barbitúricos incluem: hipotensão, depressão respiratória, soluços, dor à injeção, mioclonia e indução à síntese de porfiria, por isso os barbitúricos são contraindicados em quem tem porfiria, para se evitar as crises agudas.

    28) Onde agem os benzodiazepínicos? Quais as suas funções? Qual a classificação dos benzodiazepínicos quanto à duração de ação?

    bb) Os benzodiazepínicos parecem agir entre subunidades γ e α do receptor GABA A. Eles provocam: relaxamento muscular, amnésia anterógrada, hipnose, ansiólise e são anticonvulsivantes. Podem ser classificados como de curta duração (midazolam), média duração (lorazepam) e longa duração (diazepam). A dose de indução anestésica do midazolam é 0,05 a 0,15 mg/kg.

    29) Quais são as ações dos benzodiazepínicos no SNC?

    cc) No SNC, os benzodiazepínicos provocam diminuição do fluxo sanguíneo cerebral e diminuição do consumo de O2 pelo cérebro. Também aumentam o limiar convulsivo (ação anticonvulsivante).

    30) Quais são as ações dos benzodiazepínicos no cardiovascular?

    dd) No cardiovascular, os benzodiazepínicos têm efeitos hemodinâmicos mínimos. Há leve redução na resistência vascular periférica e na pressão arterial. Quando usados com opioide como o fentanil, pode haver potencialização dos efeitos cardiovasculares, evoluindo com hipotensão.

    31) Quais são as ações dos benzodiazepínicos no sistema respiratório?

    ee) No sistema respiratório, os benzodiazepínicos são depressores respiratórios leves.

    32) Qual medicamento usado na contaminação com benzodiazepínicos? Qual o mecanismo de ação desse medicamento? O que esperar no uso desse medicamento em dependentes crônicos de benzodiazepínicos?

    ff) Os benzodiazepínicos têm o antagonista competitivo, que é o flumazenil, que serve para reverter a contaminação com benzodiazepínicos. Como o flumazenil tem t1/2 curta, às vezes é necessária a administração repetida de flumazenil diante de uma contaminação por benzodiazepínicos. Naqueles dependentes crônicos de benzodiazepínicos, a administração de flumazenil pode levar à síndrome de abstinência.

    33) Qual o mecanismo de ação da cetamina? Como é a hipnose da cetamina? Por que ela pode ser usada no tratamento da dor aguda ou como analgésico preemptivo? Por que ela diminui a tolerância aos opioides?

    gg) A cetamina é um antagonista não competitivo do glutamato no NMDA, que, como hipnótico, induz à anestesia dissociativa. A cetamina pode deprimir seletivamente o sistema talâmico-neocortical antes mesmo de ser obtida a paralisação dos centros cerebrais mais antigos e de suas respectivas vias (sistema ativador reticular e sistema límbico). Em outros termos, a cetamina deprime córtex e tálamo, enquanto o sistema límbico é estimulado. Também tem potente efeito analgésico, principalmente na dor nociceptiva em vez da visceral, e pode ser usada no tratamento da dor aguda. Pode ser usada como analgésico preemptivo porque o antagonismo ao glutamato evita o fenômeno wind up, que hipersensibiliza os receptores NMDA. Também atua em receptores opioides, o que pode diminuir a tolerância aos opioides*. Pode, ainda, a cetamina inibir a recaptação de noradrenalina, serotonina e dopamina.

    * A ação da cetamina em receptores opioides também explica o uso dela como analgésico no tratamento da dor aguda.

    34) A cetamina tem isomeria? O que isso afeta em sua função? Onde se dá o metabolismo da cetamina?

    hh) A cetamina é a mistura racêmica de dois estereoisômeros: a S-cetamina e a R-cetamina. A S-cetamina ou escetamina tem mais afinidade ao receptor NMDA do que a R-cetamina. Evidências mostram que a ação em receptores opioides da cetamina melhora os sintomas de pacientes com depressão grave resistente ao tratamento; que é provável que a inibição não competitiva dos receptores NMDA feita pela S-cetamina ou escetamina possa estar envolvida na ação antidepressora da cetamina; que a ativação do receptor AMPA por metabólitos dextrógiros da cetamina – (2R, 6R) - hidroxinorcetamina – também pode estar envolvida no efeito antidepressivo da cetamina. A dose de indução é 2 mg/kg; após a indução, os pacientes ficam anestesiados e irresponsíveis, porém podem parecer despertos com olhos abertos e respirando. A cetamina é metabolizada pelo fígado por desmetilação para formar a norcetamina. A norcetamina tem um terço da potência da cetamina, e ela é conjugada com produtos hidrossolúveis para ser eliminada pelos rins.

    35) Quais são as ações da cetamina no SNC? Por que ela produz sintomas pós-anestésicos como alucinações, psicose, euforia, disforia, medo? Por que a cetamina é contraindicada no TCE?

    ii) No SNC, a cetamina cria a anestesia dissociativa, em que há depressão de córtex e tálamo e estímulo do sistema límbico, por isso as reações pós-anestésicas comuns, como alucinações, psicose, euforia, disforia, medo, especialmente quando administrada sem um benzodiazepínico. Além disso, a cetamina é um poderoso analgésico, aumenta a pressão intracraniana, aumenta o fluxo sanguíneo cerebral, aumenta a pressão intraocular, pode provocar nistagmo e lacrimejamento e mantém os reflexos corneano, laríngeo e faríngeo (tosse e deglutição) *. No TCE, é comum haver hipertensão intracraniana, e a cetamina aumenta a pressão intracraniana, por isso a contraindicação da cetamina no TCE.

    *A manutenção do reflexo de tosse não significa que a via aérea do paciente esteja protegida. Se o paciente estiver de estômago cheio, toma-se conduta específica para estômago cheio mesmo com o uso da cetamina.

    36) Quais são as ações da cetamina no sistema cardiovascular? Por que em estados de estresse crônico, como o hipovolêmico de várias horas e o doente crítico, a cetamina pode causar redução da pressão arterial?

    jj) No sistema cardiovascular, a cetamina estimula o sistema nervoso simpático, aumenta o débito cardíaco, a frequência cardíaca, a pressão arterial, o consumo de O2 pelo miocárdio e pode aumentar a pressão da artéria pulmonar. Em estado de estresse crônico, em que o paciente está há tempos com o tônus simpático muito aumentado e tem depleção de catecolaminas endógenas, a cetamina pode provocar redução da pressão arterial de forma paradoxal.

    37) Quais são as ações da cetamina no sistema respiratório? Por que o uso da cetamina pode provocar laringoespasmo?

    kk) No sistema respiratório, a cetamina é um broncodilatador e tem mínimos efeitos respiratórios; ocorre breve apneia após a dose em bolus e diminuição transitória na ventilação minuto. Uma complicação não rara da cetamina é que ela provoca sialorreia. Como os reflexos laríngeos estão presentes, a saliva pode atravessar a glote, provocando laringoespasmo.

    Referências

    Este livro é uma proposta de trabalho feita pelo autor para os acadêmicos do curso de Anestesiologia da Faculdade de Medicina. O objetivo do livro é apresentar um conhecimento básico em anestesiologia, que é importante a qualquer médico clínico, e não esgotar os temas, usando vasta bibliografia. Qualquer recurso iconográfico deste livro (desenhos, gráficos, fluxogramas) foi feito toscamente pelo autor, usando o Word, copiando o material iconográfico da bibliografia. O autor recomenda vivamente que o leitor busque a bibliografia de cada capítulo porque, além de mais completa, ela traz recursos iconográficos (desenhos, gráficos, fluxogramas, tabelas) que facilitam muito o estudo. Por exemplo, neste livro alguns fluxogramas e tabelas da bibliografia foram transformados em perguntas e, para o autor, é muito mais fácil o aprendizado por recurso iconográfico do que por texto corrido.

    1) BERG, Sheri M.; BITTNER, Edward A.; ZAO, Kevin H.. Fármacos de indução. Revisão em anestesiologia, detonando as bancas, 2018, p. 19-44.

    2) DUARTE, Danilo Freire. Farmacocinética e farmacodinâmica dos anestésicos venosos. Revista brasileira de anestesiologia, 1994; 44: 1: 35-42.

    3) BRAVENEC, Brian, MD. General anesthesia: Intravenous induction agents. Up to Date, 2022.

    4) THASE, Michael, MD; CONNOLLY, K. Ryan, MD, MS. Ketamine and esketamine for treating unipolar depression in adults: Administration, efficacy, and adverse effects. Up to Date, 2022.

    5) KHORSAND, Sarah M., MD. Maintenance of general anesthesia: Overview. Up to Date, 2022.

    CAPÍTULO 3

    ANESTÉSICOS LOCAIS

    1) Conceitue anestésicos locais.

    a) Anestésicos locais são medicamentos que se ligam reversivelmente em canais de sódio voltagem dependentes da membrana de células eletroexcitáveis, diminuindo a condutância ao sódio desses canais e, dessa forma, impedindo a formação ou propagação do potencial de ação.

    2) Explique o(s) mecanismo(s) de ação ou a farmacodinâmica dos anestésicos locais.

    b) Os mecanismos de ação dos anestésicos locais são dois. O primeiro, mais bem conhecido, se trata da passagem da forma não iônica do anestésico local através da membrana da célula eletroexcitável para o citoplasma; quando o anestésico local alcança o citoplasma da célula eletroexcitável, ele se torna ionizado, e a forma ionizada do anestésico local tem alta afinidade para se ligar ao seu sítio no canal de sódio voltagem dependente das membranas das células eletroexcitáveis. Uma vez que o anestésico local se liga ao seu sítio no canal, há mudança do canal de sódio voltagem dependente, diminuindo a condutância ao sódio do canal. Explicando de forma mais fácil e tomando como exemplo o axônio de um neurônio: a membrana do axônio é bilipídica e, portanto, apolar; para atravessar a membrana do axônio, o anestésico local deve estar na forma não ionizada porque é apolar; uma vez que o anestésico local penetra o citoplasma do neurônio, ele se torna ionizado, ou seja, polar; a forma ionizada do anestésico local tem alta afinidade para se ligar ao seu sítio no canal de sódio voltagem dependente situado na membrana do axônio; uma vez que o anestésico local se liga ao seu sítio no canal, há mudança do canal de sódio voltagem dependente, que diminui/ impede a condutância ao sódio do canal; ocorre o impedimento da formação/propagação do potencial de ação. O segundo mecanismo de ação, chamado de expansão da membrana, é aquele em que a forma não ionizada do anestésico local penetra na membrana da célula eletroexcitável e da membrana mesmo, sem alcançar o citoplasma; o anestésico local inativa o canal de sódio voltagem dependente, diminuindo/ impedindo a condutância de sódio do canal.

    3) Quais características das fibras nervosas que as tornam mais sensíveis ao anestésico local?

    c) São características das fibras nervosas que as tornam mais sensíveis ao anestésico local: o fato d e a fibra nervosa ser mielinizada e o menor diâmetro da fibra.

    4) Nas fibras mielinizadas, quantos nódulos de Ranvier devem ser bloqueados/inativados para se bloquear a passagem do potencial de ação?

    d) É necessário que, no mínimo, 3 nódulos de Ranvier consecutivos sejam bloqueados para que a fibra nervosa seja bloqueada, ou seja, impeça a passagem do potencial de ação através dela.

    5) O efeito do anestésico local na anestesia periférica é gradual. Qual a sequência de efeitos ou de bloqueios do anestésico local na anestesia periférica (efeito ou bloqueio mais rápido para o mais tardio)?

    e) O anestésico local na anestesia periférica primeiro bloqueia o sistema nervoso autônomo; depois, a sensibilidade à dor; depois, a sensibilidade à temperatura; depois, a sensibilidade ao toque; depois, bloqueio da propriocepção; e, por fim, bloqueio motor.

    6) Quais as funções orgânicas dos anestésicos locais? Qual função orgânica é mais usada na prática médica?

    f) Os anestésicos locais são bases fracas de função orgânica amina-éster, como a clorprocaína, a tetracaína, a prilocaína e a cocaína, ou amina-amida, como a lidocaína, a bupivacaína, a levobupivacaína, a ropivacaína e a mepivacaína. Na prática médica, usa-se mais as aminas-amidas.

    7) A lipossolubilidade dos anestésicos locais é definida por quem na estrutura química dos anestésicos locais?

    g) Com exceção da articaína, tanto nas aminas-amidas como as aminas-ésteres a lipossolubilidade é definida pela cadeia aromática (lipofílica) e pelo fato de a amina estar na forma terciária (lipofílica) e não quartenária (lipofóbica).

    8) Como se apresentam os anestésicos locais quando manufaturados? Nas soluções de anestésico local em que há epinefrina, como se preserva a epinefrina? Para que e como se alcalinizam as soluções de anestésico local em que há epinefrina?

    h) Os anestésicos locais são manufaturados sob a forma de solução de sais, como o cloridrato de lidocaína, e, por estar em solução, a amina do anestésico local está carregada sob forma de amônio. Nas apresentações de anestésico local em que há epinefrina (vasoconstritor), o pH da solução é mantido ácido para preservação da epinefrina. Assim, nas formulações de anestésico local com epinefrina pode-se, antes da aplicação, deve-se acrescentar NaHCO3 (alcalinização) a fim de aumentar o pH da solução, para que mais moléculas do anestésico local fiquem na forma não ionizada, que é a forma que atravessa a membrana das células eletroexcitáveis. Alguns cuidados com a alcalinização das soluções de anestésico local: a alcalinização pode precipitar o anestésico local; solução de anestésico local que tem pH próximo a 6, como as soluções sem vasoconstritores, a alcalinização não interfere na latência; e a bupivacaína precipita facilmente quando pH > 6,5, por isso a dose para alcalinização da bupivacaína com epinefrina é 0,1 ml de NaHCO3 a 8,4% para cada10 ml de bupivacaína com epinefrina, já na solução de lidocaína com epinefrina, a dose é 1 ml de NaHCO3 a 8,4% para cada10 ml de lidocaína com epinefrina.

    9) Cite as diferenças entre as aminas-amidas e a aminas-ésteres quanto à armazenagem e quanto à probabilidade de reações alérgicas.

    i) As aminas-ésteres têm ligações menos estáveis que as aminas-amidas e por isso têm menor tempo de armazenagem (menor validade). Com relação a alergias, alguns anestésicos locais, como a procaína e a benzocaína, têm como produto de metabolismo o ácido para-aminobenzoico (PABA). No passado, alergias eram atribuídas a ele, porém faltam estudos para confirmar esse mecanismo. A maioria dos sintomas idiossincráticos com anestésico local é de natureza não alérgica, porém é rotulada como tal. A absorção do vasoconstritor (epinefrina), reflexos vagais e sintomas de ansiedade são exemplos de eventos que costumeiramente são atribuídos às alergias, mas que de fato não são. Os episódios de reações alérgicas ao anestésico local são raros e podem ser tardios ou rápidos. A forma tardia é dada por hipersensibilidade tipo IV e dificilmente é grave, caracteriza-se por alergia de contato após a administração do anestésico local, surge 3 a 72h após a administração do anestésico local com qualquer combinação de dermatite localizada, ou edema, ou inflamação de

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