Revisitar A Batalha de Alcacer Quibir PDF
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Resumo
Poucas vezes um a batalha teve um impacto tão determinante como Alcácer
Quibir. A derrota dos portugueses trouxe a breve trecho a anexação espanhola
que redesenhou o mapa da Europa. Do lado islâmico, a dinastia Sádida consolidou o
seu domínio do norte de África e iniciou um notável período de afirmação, tanto
no continente africano como em relação aos reinos europeus. Talvez por estas
razões a historiografia contemporânea venha a renovar o interesse pela época
sebástica. Contudo, esta tremenda derrota continua ancorada numa abordagem
demasiado focada na personalidade do rei português, mau grado a publicação de
documentação coeva fundamental que ainda carece de estudos aprofundados.
Palavras-chave
Alcácer Quibir; D. Sebastião; Sádidas; Guerra; Século XVI.
Abstract
The Battle of the Three Kings was a major event of global proportions, as the
overwhelming Portuguese defeat had international political and cultural
results, in North Africa and Europe. The Muslim victory firmly established the
power of the Sa’adian dynasty in Morocco whose sultans gained unparalleled
international recognition and prestige, and led to the conquest of vast territories
of the Songhay Empire to the south. In Portugal, the loss of the king triggered
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a military invasion that brought the union of the Iberian Peninsula under
Spanish rule. The events that led to Alcácer Quibir had been one of the most
written subjects of Portuguese culture, with the polemic personality of the
Portuguese King still prevailing on almost every study. As this is probably the
most documented single battle of the Portuguese sixteenth century, a renewed
historical analysis – more documented-based than driven by passion – is,
certainly, still an utmost need.
Keywords
Alcácer Quibir; Dom Sebastian; Saadi; War; 16th century.
p. 151.
2 Otília FONTOURA, Portugal em Marrocos na época de D. João III. Abandono ou
permanência?, ERTC-CEHA, Fuchal, 1988.
3 Leonor Garcia CRUZ, “As Controvérsias ao Tempo de D. João III sobre a Política
Portuguesa no Norte de África”, Mare Liberum, nos 13-14, 1997, pp. 5-164.
4 António Dias FARINHA, Os Portugueses em Marrocos, Instituto Camões, s.l., 2002.
5 David LOPES, A expansão em Marrocos, Teorema, Lisboa, s.d.
6 Dahiru YAHYA, Morocco in the Sixteenth Century. Problems and Paterns in African
Foreign Policiy, Humanities Press, Bristol, 1981.
10 Queiroz VELLOSO, D. Sebastião (1554-1578), ENP, Lisboa, 1945, 3ª ed. Ver. E amp., p.8
11 Maria Augusta Lima CRUZ, D. Sebastião, Círculo de Leitores, 2006.
12 Idem.
13 Idem.
14 Francisco de Sales LOUREIRO, D. Sebastião e Alcácer Quibir, Alfa, Lisboa, 1989.
morte do irmão pugnou pelo seu direito à sucessão, causa que o sultão
Murad III não enjeitou, entrevendo a possibilidade de pressionar as
negociações que decorriam com a Espanha. Com a morte de al-Ghalib
em 1574, o trono teria de caber a al-Malik, mas aquele designou o seu
filho Mulei Muhammad – que adoptou o nome real de al-Mutawakkil
– lançando uma luta que culminaria com a batalha de Alcácer Quibir.
Em 1576 Ab al-Malik saiu de Argel com um exército relativamente pe-
queno mas coeso, que contava com mercenários experientes e arma-
mento moderno. O trem de artilharia era comandado por Muhammad
Zarqun, um veterano da revolta de Alpujarras, que depois esteve pre-
sente em Alcácer Quibir. Al-Malik bateu o sobrinho em dois encontros
perto de Fez, e pouco tempo depois entrava vitorioso em Marraquexe.
Dois anos depois da ascensão de Ab al-Malik ao poder, a situação não
se encontrava de forma alguma estabilizada. A verdade é que o apro-
fundamento das reformas militares de Muhammad es-Sheiq, e em espe-
cial a vulgarização de muitos dos costumes otomanos, colidiu com uma
sociedade multifacetada mas profundamente conservadora. Por outro
lado, o papel fulcral desempenhado pelos descendentes do reino de Gra-
nada, cujos últimos representantes haviam sido recentemente expulsos
depois da revolta das Alpujarras, era contestado pela ascensão de uma
nova elite militar16; o novo protagonismo cabia agora aos “elches”, que
por serem convertidos ao Islão – dependendo directamente do sultão
– ofereciam uma lealdade mais consistente. Os andaluzes haviam sido
instrumentais para a vitória de al-Malik, nomeadamente a deserção des-
te contingente durante a batalha de Kandoq er-Rihan17, e o desconten-
tamento era inevitável. Suspeitava-se de que se encontrava em prepa-
ração uma possível traição de al-Dogali18, mas não convinha eliminar
definitivamente um homem tão influente – pelo menos antes de resolvi-
da a campanha crucial que se avizinhava. Foi decidido deixar na região
do Sus todos os alcaides suspeitos, vigiados por soldados “xarracas” às
ordens do filho de Ab al-Malik, Muhammad al-Saidj19.
Figura 1.
Figura 1: As formaturas em Orão (1509) e Azamor (1513)
As formaturas em Orão (1509) e Azamor (1513)
38 “Relacion de la batalia de el-Ksar el Kebir, 4 Agosto 1578 (Luís de Oxeda) ”, SIHM, ed.
Henry de Castries, v. 1, Ernest Ledoux, Paris, 1904, p. 603.
39 David NICOLLE, The Janissaries, Osprey, Londres, 2000.
40 “Relação de Luís de Oxeda...”, p. 19.
41 Antonio de SALDANHA, Crónica de Al-Mansor, Sultão de Marrocos (1578-1603), ed.
Antonio Dias Farinha, IICT, Lisboa, 1997, nota 1, p. 511.
42 Crónica de Almansor...
43 Crónica do xarife Mulei Mahamet e d’El-Rei D. Sebastião, ed. Francisco de Sales
Loureiro, Europress, Odivelas, 1989.
44 Crónica de Almansor..., p. 501.
45 David NICOLLE, The Janissaries, Osprey, Londres, 2000.
46 “Relacion de Luís de Oxeda...”, p. 592.
47 Crónica de Almansor...
48 Dahiru YAHYA, Morocco in the Sixteenth Century...
53 Diego de TORRES, Relación Del origen y suceso de los Xarifes y del Estado de los Reino de
Marruecos, Fez y Tarudante, ed. Mercedes García-Arenal, Siglo XXI, Madrid, 1980, p. 5.
54 Diego de TORRES, Relación del origen y suceso de los xarifes..., introdução, pp. 1-23.
55 Maria José Martinez LÓPEZ, “La primera redacción de las Octavas dirigidas a Felipe
II de Francisco de Aldana y su inédita dedicatória en prosa, Criticón, nº 70, 1997, pp.
31-70.
56 Pelo teor da carta que Juán da Silva escreveu a 6 de Janeiro de 1578, aquando da
chegada de Torres a Portugal, deduz-se que existiriam instruções de Filipe II no
sentido de agravar as dificuldades da jornada.
57 “Cópia de carta original de Juan da Silva á S. Maj.d, 6 de enero de 1578”, CODOIN, v.39,
p. 467.
58 Jornada de África del Rei D. Sebastião Escrita por um Homem Africano, Lisboa, Livro
Aberto, 2004, p. 16.
59 Jerónimo de MENDONÇA, Jornada a África, v. 1,Scriptorio, Lisboa, 1904, p. 39.
60 Jerónimo de MENDONÇA, Jornada a África, p. 41.
Figura 2.
Itinerário da frota portuguesa (2 Junho – 18 Julho)
Figura 3.
Bernardo de Alderete, gravura da cidade
Figura 3: Bernardo de Alderete, gravura da cidadede
de Larache, 1614
Larache, 1614 (BNE)
(BNE)
59
Jerónimo de1,MENDONÇA,
e-Stratégica,
Jornada pp.
2017 • ISSN 2530-9951, a África,
111-159v. 1,Scriptorio, Lisboa, 1904, p. 39. 133
60
Jerónimo de MENDONÇA, Jornada a África, p. 41.
61
Jerónimo de MENDONÇA, Jornada a África…
Luís Filipe Guerreiro da Costa e Sousa
Figura 4.
Ordem de marcha do exército português (29 Julho – 3 Agosto 1578)
Figura 4: Ordem de marcha do exército português (29 Julho – 3 Agosto 1578)
légua, fez acampamento num local que os cronistas designaram “dos moinhos”. Na
Revisitar a Batalha de Alcácer Quibir
A jornada desde Arzila até ao local onde teve lugar a batalha demo-
rou seis dias, durante os quais o exército sentiu grandes dificuldades
pelo acidentado da topografia66. A coluna saiu de Arzila terça-feira dia
29, pela manhã, e, depois de caminhar cerca de uma légua, fez acam-
pamento num local que os cronistas designaram “dos moinhos”. Na
quarta-feira caminharam apenas outra légua e o exército acampou
numa eminência do terreno conhecido por ”Almenara” e, reconhecendo
as dificuldades surgidas, decidiu-se retirar para Arzila onde o exército
embarcaria para atacar Larache por mar, como planeado inicialmente.
Todavia, a armada já havia partido seguindo as instruções do rei. Che-
garam entretanto 500 soldados espanhóis com o capitão Francisco de
Aldana, e o exército reiniciou a marcha logo pela manhã de sexta-feira 1
de Agosto, e depois de percorrer cerca de três léguas alojou-se num local
designado “três ribeiros”. Retomou-se a marcha para norte, ao longo de
um dos rios que partia do alojamento – o Makhazen – até que chegaram
a uma ponte romana, que estava guardada por um importante efecti-
vo estimado em cerca de 5.000 cavaleiros. O exército inflectiu para sul,
alojando-se num local designado nas crónicas por “Soveral de Larache”:
esta era uma excelente posição, altaneira e protegida pela ribeira, que se
reforçou depois com a abertura de uma trincheira.
Abd al-Malik partiu de Marraquexe a 20 de Abril, aparentemente
com o intuito de percorrer todo o sul do recém-conquistado reino para
levantar as tropas necessárias para fazer face à expedição iminente.
Esta saída prematura tinha, todavia, como principal objectivo calar
uma importante revolta em favor do seu rival que havia estalado per-
to de Tarudante67. Só em finais de Julho chegou a Salé, onde se reu-
niu com o seu irmão Ahmad, que trazia os contingentes do norte do
país, nomeadamente de Fez68. Mandou fundir três peças de artilharia
de grande calibre sob a sua supervisão pessoal69, situação habitual en-
tre os otomanos, em especial quando se tratava de grandes calibres70.
Pouco tempo depois adoeceu, como ficamos a saber pelo relato do seu
médico pessoal. O exército fez-se ao caminho, e chegados alguns dias
66 Sobre a marcha do exército, cf. Queirós Vellozo, Queiroz VELLOSO, D. Sebastião..., pp.
337-356 e Pierre Berthier, La bataille de l’oued El-Makkazem, ditte battaile dês trois
Róis (4 Aout 1578), CNRS, Paris, 1985, pp. 127-137.
67 Jornada de África del rei D. Sebastião Escrita por um Homem Africano...
68 “Lettre d’un Médecin Juif a son Frère”, SIHM, 1.ª série, Inglaterra, v. 1.
69 Jornada de África del rei D. Sebastião Escrita por um Homem Africano...
70 Rhoads MURPHEY, Ottoman Warfare...
Figura 5.
Figura 5: Marcha do exército português 29 julho a 3 de Agosto
Marcha do exército português 29 julho a 3 de Agosto
67
Jornada de África del rei D. Sebastião Escrita por um Homem Africano…
68
exército fez-se ao caminho, e chegados alguns dias depois às imediações de Alcácer
Quibir, ergueram o acampamento. No primeiro dia de Agosto chegava a notícia que o
Revisitar a Batalha de Alcácer Quibir
rei português já havia deixado Arzila e marchava ao seu encontro. Abd al-Malik
ordenou que se levantasse o campo para mais perto da vila. A 3 de Agosto os
Por volta
portugueses das 10
chegavam horas,
perto o exército
da ponte romanaatravessou
ao norte deoAlcácer
Makhazen.
que o Gastou-
seu irmão
-se grande parte da manhã nesse trabalho, 71 e a coluna seguiu para novo
Ahmad guardava com cerca de 4.000 cavalos , e enviou três alcaides com uma parte da
alojamento, descendo ao longo do rio. Saindo por detrás de uma colina,
72
cavalaria
Ahmad para se lhe no
seguiu juntar.
seuImpedidos
encalço, de prosseguirque
e ordenou , osseportugueses,
rodeasse ose dirigiram-se
portugue-na
direcção de um vau situado
ses. Aparentemente, mais
teria a sul, provavelmente
intenção aquele queinimiga,
de atacar a retaguarda na toponímia
ondedo
marchavam
início do século XXdois “terços”designado
se encontra às ordens pordovau
coronel
do SultãoVasco
73
. da Silveira.
Figura 6.
A ponte
Figura doponte
6: A rio Lucos, aguarela
do rio Lucos, de de
aguarela José
JoséDaniel
Daniel Colaço
Colaço
70
Rhoads MURPHEY, Ottoman Warfare…
71
Dahiru YAHYA, Morocco in the Sixteenth Century…, p. 81.
72
“Lettre d’un Médecin Juif…”.
73
O cronista anónimo da relação Tarikh al-Dawlah as-Sadiyya afirma que a ponte foi destruída na noite
anterior à batalha (Dahiru YAHYA, Morocco in the Sixteenth Century…, p.81), facto corroborado pela
tradição oral, e aparentemente confirmado pelos vestígios da ponte. Contudo, a aguarela do orientalista
Daniel Colaço, de finais do século XIX, mostra-nos a mesma ponte intacta (“Ocidente”, 1º ano, v.1, nº15,
Agosto 1878).
Pore-Svolta das
tratégica, 1, 10
2017horas, o exército
• ISSN 2530-9951, pp. atravessou
111-159 137 da
o Makhazen. Gastou-se grande parte
manhã nesse trabalho, e a coluna seguiu para novo alojamento, descendo ao longo do
Luís Filipe Guerreiro da Costa e Sousa
Figura 8.
Movimentos dos exércitos português
e sádida dos dias 3 (cinzento) e 4 (preto) de Agosto
Poucas vezes se vê referido que existiu uma diferença substancial entre a formatura com
4. Os dispositivos tácticos
que os portugueses planeavam dar batalha e o dispositivo adoptado no dia 4 de Agosto.
Poucas vezes se vê referido que existiu uma diferença substancial
O desenho inicial da ordem de batalha foi acordado num conselho de guerra em Arzila,
entre a formatura com80que os portugueses planeavam dar batalha e o
provavelmente
dispositivoaadoptado
20 de Julho no ,dia
e deveria consistir
4 de Agosto. de quatroinicial
O desenho esquadrões dispostos
da ordem de em
forma quadrada,
batalha de acordonum
foi acordado comconselho
um modelo idealizado
de guerra emcom clara
Arzila, filiação teórica na
provavelmente
a 20 de Julho 80
, e deveria consistir de quatro esquadrões dispostos
tratadística espanhola e italiana. A configuração quadrangular era considerada em por
forma quadrada, de acordo com um modelo idealizado com clara filia-
capitães e tratadistas como a ideal para fazer a guerra em África81. A superioridade
ção teórica na tratadística espanhola e italiana. A configuração quadran-
numérica
gular dos
era inimigos
considerada implicava, inevitavelmente,
por capitães que um
e tratadistas exército
como teria
a ideal parade fazer
combater
a guerra em África 81
. A superioridade numérica dos inimigos implicava,
cercado, portanto o facto de oferecer a mesma frente defensiva em todas as direcções
inevitavelmente, que um exército teria de combater cercado, portan-
consistia numa vantagem apreciável. A construção da formatura final ilustra a
to o facto de oferecer a mesma frente defensiva em todas as direcções
articulação entre
consistia numateoria e prática,
vantagem ou seja, como
apreciável. se adaptava
A construção a forma planeada
da formatura final às
ilustra a articulação
circunstâncias particulares do entre
campoteoria e prática, ou seja, como se adaptava
de batalha.
a forma planeada às circunstâncias particulares do campo de batalha.
Figura 9.
A ordem de batalha planeada e diagrama no tratado
Figura 9: A ordem de batalha planeada e diagrama no tratadode
deDomenico Mora(1570)
Domenico Mora (1570)
80
Revisitar a Batalha de Alcácer Quibir
tribuídos por fileiras um “pouco mais delgadas”88. Neste mesmo lado di-
reito, atrás do batalhão do duque, estavam os aliados mouros com cerca
de 250 cavalos e 400 arcabuzeiros. Os cavaleiros oriundos da praça de
Tânger, liderados por D. Duarte de Meneses, que inicialmente seguiam
na frente do exército em exploração. Ao chegar à vista dos inimigos to-
maram lugar no dispositivo, provavelmente na frente do batalhão do
centro em posição
duque saliente.
e chegados ao Cada um destes
lado direito, esquadrões erasalientes
eventualmente apoiados –pelas
comohabituais
os
“mangas” de atiradores, no caso dos aventureiros este papel era desempenhado pelos
“aventureiros”. O seu total devia cerca de 400 ou 500 cavalos. A artilharia
seguiria entre o batalhão do rei e os espanhóis89, defendida de qualquer
mercenários italianos e por um contingente de soldados veteranos, provenientes de
eventualidade.
Tânger.
Figura 10.
A ordem de batalha no dia
Figura 10: A ordem de batalha 4 de
no dia Agosto
4 de Agosto
Figura 12.
Figura 12: Ordem de batalhaexército
Ordem de batalha do dede
do exército Mulei
MuleiAbd
Abd al-Malik
al-Malik
No 144
centro do exército estava o próprio al-Malik debaixo
e-Stratégica de •um
, 1, 2017 ISSNpequeno
2530-9951, pavilhão
pp. 111-159 de
brocado, ocupando uma praça com 35 ou 40 metros de lado com as tendas dos
Revisitar a Batalha de Alcácer Quibir
105 Luís de Mármol CARVAJAL, Primera parte de la Descripcion general de Affrica, con
todos los successos de guerras que a auido entre los infieles, y el pueblo Christiano, y
entre ellos mesmos desde que Mahoma inue[n]to su secta, hasta el año del señor mil y
quinientos y setenta y uno, ed. Agustín G. de Amezúa, IEA-PDSF, Madrid, 1953.
106 Andrzej DZIUBINSKY, , “L’Armée et la flotte de guerre Marocaines...”
107 Andrzej DZIUBINSKY, “L’Armée et la flotte de guerre Marocaines...”
108 “Relacion de Luís de Oxeda...”, p. 31.
109 Jornada del-rei Dom Sebastião a África..., p. 103.
110 Sebastián de MESA, Jornada de África por El Rey Don Sebastián y Union del Reyno de
Portugal ala Corona de Castilla, Barcelona, 1630.
111 Luís de Mármol CARVAJAL, Primera parte de la Descripcion general de Affrica...
112 Crónica do Xarife Mulei Mahamet...
113 cf. a “Relação de Luís de Oxeda...” com a Jornada del-rei Dom Sebastião a África...
114 Sebastián de MESA, Jornada de África por El Rey Don Sebastián, p. 69v.
Figura 13.
O ataque Figura 12: O ataque«a
da vanguarda, da gente
vanguarda,
mais«a gente mais
escolhida escolhida e honrada»
e honrada»
Os aventureiros (A) atacam,
Os aventureiros apoiadosapoiados
(A) atacam, por uma violenta
por uma carga da cavalaria
violenta cargacomandada
da cavalariapelo rei; os inimigos põem-s
em
comandada pelo rei; os inimigos põem-se em fuga (C); o resto da vanguarda seguefileiras de aventureiro
fuga (C); o resto da vanguarda segue atrás (B); forçando o andamento, as cinco primeiras
chegam aos canhões inimigos, arrebatando dois estandartes.
atrás (B);pelo
Consternado forçando o andamento,
desbarato as Abd
das suas tropas, cinco primeiras
al-Malik acabafileiras de aventureiros
por sucumbir, talvez atingido pelos cristãos que s
chegam aos canhões inimigos, arrebatando dois estandartes. Consternado pelo
encontram a escassos 20 metros da liteira (D).
desbarato das suas tropas, Abd al-Malik acaba por sucumbir, talvez atingido pelos
cristãos que se encontram a escassos 20 metros da liteira (D).
Ao lado da liteira, o seu médico presenciou o assalto à bagagem por parte dos “alarves
oriundos das cabildas, e o próprio alcaide que a devia guardar, o genovês Hozem, julgo
a batalha perdida e juntou-se aos fugitivos. Abd al-Malik ainda tentou impedir a fug
132 Miguel Leitão de ANDRADA, Miscellanea..., p. 130.
dos seus homens, mas uma síncope – outros dizem um tiro de arcabuz – fê-lo cair d
150
cavalo inconsciente. A menos de 20 emetros,
-Stratégica,quase
1, 2017 •em
ISSN cima dospp.canhões
2530-9951, 111-159 inimigos, o
Figura 14.
Figura 14: O “esquadrão dos aventureiros” em relação à posição de Abd al-Malik
O “esquadrão dos aventureiros” em relação à posição de Abd al-Malik
Os aventureiros mais adiantados ainda clamavam “vitória, vitória, vitória, ao que logo
Osacrescentaram,
outros aventureirosvitória,
maisvitória,
adiantados
vitória, ainda
o Malucoclamavam
é morto”133“vitória,
, quando avitória,
situação
vitória, ao que logo outros acrescentaram, vitória, vitória, vitória, 134 o Ma-
se inverteu por completo: “D. Álvaro esforçava os seus diante de todos” quando uma
luco é morto” , quando a situação se inverteu por completo: “D. Álvaro
133
135
“uma bala deosum
esforçava tirodiante
seus de campo” o atingiu
de todos” 134 numa uma
quando perna.“uma
Feridobala
com degravidade,
um tiroo
capitão dos “aventureiros”
de campo” 135
o atingiu caiu
numa no perna.
chão; o Ferido
sargentocom
Pêrogravidade,
Lopes correuo imediatamente
capitão dos
“aventureiros” caiu no chão; o sargento Pêro Lopes correu
em seu auxílio. Neste transe apercebe-se de que se tinham adiantado demasiado imediata- dos
mente em seu auxílio. Neste transe apercebe-se de que se tinham adian-
seus companheiros, e vendo os homens continuar na direcção da liteira onde jazia Abd
tado demasiado dos seus companheiros, e vendo os homens continuar
al-Malik, pegou na alabarda e atravessou-se na frente gritando “ter, ter!” e depois
na direcção da liteira onde jazia Abd al-Malik, pegou na alabarda e atra-
acrescentando
vessou-se na “retira,
frenteretira”; “se quebrou
assim“ter,
gritando ter!” e odepois
esquadrão por detrás e, sem
acrescentando fazer
“retira,
retira”; assim “se
quebrou o esquadrão por detrás e, sem fazer mais de-
133
Miguel Leitão de ANDRADA, Miscelanea…, p.129. 136
tença,
134 os homens começaram a retirar” . Incrédulos, os soldados mais
Jerónimo de MENDONÇA, Jornada de África…, p.70
adiantados
135
“Que vinha empararam em desordem,
chapeletas…” (Frei Bernardo no
da centro do dispositivo
CRUZ, Chronica d’El-Rei D.inimigo,
Sebastião, en-
v..2,
Escriptorio, Lisboa, 1903, p. 78).
quanto o resto do “esquadrão” retirava.
Figura 15.
Figura 15: As fases da derrota
As fases da derrota
que os137
138
seusMiguelcompanheiros Leitão de ANDRADA,se retiravam
Miscelanea…” em desordem. Os “aventureiros”
p. 133.
Tratam-se dos soldados “peiq” da guarda do sultão.
mais adiantados
139
Jornada del-rei Dom ficaram Sebastiãocompletamente a África…, p. 108. isolados, “sem bandeira, de-
samparados dos companheiros que voltaram para trás, deixando-os sós,
E-STRATEGICA, 1, 2017, pp. 40
guel de Noronha chegou perto do rei muito animado, e logo lhe deu con-
ta do esforço e acerto com que se pelejava ali. Animados pela presença
de D. Sebastião, ouviram-se vozes, depois um grande clamor, a chamar
pelo rei, juntando-se-lhes também alguns – poucos – cavaleiros que ain-
da deambulavam, dispersos, pelo campo.
Alertados de que o rei inimigo se encontrava na retaguarda, uma au-
têntica massa compacta de soldados, com os “elches” na frente, carre-
gou. A presença do rei animou os soldado, que ainda conseguiram sus-
ter o embate com grandes perdas para os assaltantes152. Seguiu-se novo
assalto com tropas frescas, ainda mais avassalador: o coronel Francisco
de Távora – a alma da defesa, por assim dizer – foi atingido e morto,
fazendo desmoronar a defesa. Pouco depois o rei português fugia a ca-
valo com outros cinco companheiros, entre os quais se encontrava o
seu privado Cristóvão de Távora. “Eram quatro ou cinco horas da tarde,
havendo-se começado a batalha às onze”153.
6. A morte do rei
clarificar, o episódio não terá passado de um expediente para estes homens ficarem a
salvo de do
uma captura de
embuçado certa, caso
Arzila155 tivessem permanecido fora das muralhas da cidade.
: quatro cavaleiros fugidos do campo de batalha
Contudo,apresentaram-se dianteportuguês
a morte do monarca das portasdurante
de Arzila;
a pediam
batalha que
não lhes abrissem
levanta as dúvidas,
muitas
portas, alegando escoltarem o rei. Mas embora com vários pontos por cla-
se lermosrificar,
com oatenção
episódioasnão
relações dos veteranos
terá passado que coligiram
de um expediente os depoimentos
para estes homens dos
ficarem a salvo
últimos companheiros doderei.
uma captura
Todos certa, são
os relatos casoconcordantes
tivessem permanecido fora a morte
quando situam
das muralhas da cidade. Contudo, a morte do monarca português durante
depois dea batalha
este abandonar o muitas
não levanta último dúvidas,
foco deseresistência.
lermos com D. Sebastião
atenção retirou-se na
as relações
direcção dos
do vau situadoque
veteranos a norte do campo
coligiram de batalha,dos
os depoimentos que o exército
últimos tinha atravessado
companheiros
do rei. Todos os relatos são concordantes quando situam a morte depois
no dia anterior. Escoltavam-no
de este abandonar Cristóvão
o último foco dederesistência.
Távora, o D.conde de Vimioso,
Sebastião retirou-seVasco da
Silveira, na
D. direcção
JerónimodoLobo
vau e D. Nuno
situado de Mascarenhas,
a norte e acabavam
do campo de batalha, que de se juntar a uma
o exército
tinha atravessado no dia anterior. Escoltavam-no Cristóvão de Távora, o
pequena conde
colunadedeVimioso,
soldados que também fugiam na mesma direcção. Rapidamente os
Vasco da Silveira, D. Jerónimo Lobo e D. Nuno de Mas-
fugitivoscarenhas,
foram cercados por uma
e acabavam de larga tropaa de
se juntar umacavaleiros
pequenamuçulmanos. O rei ofereceu
coluna de soldados
que também fugiam na mesma direcção. Rapidamente os fugitivos foram
resistência à captura, e no calor da disputa foi ferido mortalmente na cabeça. Daqueles
cercados por uma larga tropa de cavaleiros muçulmanos. O rei ofereceu
que acompanhavam
resistência à ocaptura,
rei, foie D. Nunoda
no calor dedisputa
Mascarenhas que
foi ferido presenciouna
mortalmente este
ca- episódio
beça. Daqueles que acompanhavam o rei, foi D. Nuno de Mascarenhas
final; viu depois alguém assinalar o corpo, rasgando um pedaço da camisa e atando-lha
que presenciou este episódio final; viu depois alguém assinalar o corpo,
ao pescoço.
rasgando um pedaço da camisa e atando-lha ao pescoço.
Figura 16.
Ahmad (al-Mansur), gravura de Richard L. Smith. ©Mary Evans Picture Library
Figura 16: Ahmad (al-Mansur), gravura de Richard L. Smith. ©Mary Evans Picture Library
No acampamento
155 Jerónimodos vencedores
de MENDONÇA, o moço
Jornada de câmara
de África..., pp. 95-101.do rei, Sebastião de Resende,
7. Conclusão
Poucas vezes uma batalha teve um impacto tão determinante como o
confronto entre marroquinos e portugueses no dia 4 de Agosto de 1578.
A derrota dos portugueses trouxe a breve trecho a anexação por parte
do poderoso vizinho castelhano. A sociedade portuguesa, irremediavel-
mente fragilizada pelas perdas humanas de 4 de Agosto – e ferida no
seu amor-próprio – sucumbiu finalmente à invasão militar formal. Do
lado islâmico, pelo contrário, a dinastia sádida consolidou o seu domínio
do norte de África muçulmano, iniciando pouco depois um curto mas
notável período de afirmação, tanto no continente africano como em
relação aos reinos europeus. A guerra encontra-se no cerne destas pro-
fundas alterações na geopolítica, e foi decidida no confronto entre duas
formas de combater provenientes de Ocidente e Oriente. A influência
dos otomanos fez-se sentir, sobretudo, a partir da época de Mohamed
es-Sheik, e consolidou-se com a entrada em cena de Abd al-Malik. Pode-
mos apreciar o poder desta máquina de guerra, se tomarmos consciên-