Artigo Sobre Citologia Cérvico-Vaginal
Artigo Sobre Citologia Cérvico-Vaginal
Artigo Sobre Citologia Cérvico-Vaginal
CURITIBA
2005
Outros haverão de ter o que houvermos de perder.
Outros poderão achar o que, no nosso encontrar,
Foi achado, ou não achado, segundo destino dado.
ii
Dedico este trabalho à minha família, em cujo
grande amor sempre me senti acolhida.
Nenhum gesto seria grande o suficiente para
agradecê-los, pois sem vocês eu sequer seria
capaz de viver.
iii
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus pelo sopro da vida e por ser o amigo certo nas horas
incertas.
Agradeço aos meus pais Celso e Lúcia, sobretudo a minha mãe por estar
sempre ao meu lado dando todo o suporte para que esse trabalho pudesse ser
concluído. Agradeço por todos os dias em que abdicou de seus afazeres e
prioridades para cuidar do meu anjinho, permitindo que eu tivesse tempo de me
dedicar as minhas atividades. Obrigada mãe, eu não seria nada sem você. Pai,
obrigada por todo suporte de vida que sempre me deu, o meu caminho com
certeza é muito menos penoso e os fardos menos pesados graças a você.
Agradeço ao meu irmão por sua dedicação e boa vontade, por ter me ajudado
sempre com minha filha, por dar todo suporte, inclusive técnico, fazendo com
que os computadores estivessem funcionando para realização da dissertação.
Obrigada por tudo. Agradeço a minha filha, Ana Júlia, por ser a grande
inspiração e motivação de tudo. Você é meu maior tesouro e trouxe um sentido
maior para minha vida.
Agradeço aos meus orientadores Prof. Aguinaldo e Profa Maria Suely,
excepcionalmente disponíveis e envolvidos com meu trabalho, como fosse este o
afazer mais importante de suas vidas. Agradeço pelas longas tardes, às vezes dias
inteiros, de dedicação. Agradeço não só pela orientação, mas acima de tudo pela
amizade que com certeza fará com que os guarde para sempre em meu coração.
Agradeço a todos os meus amigos por sempre tentarem me mostrar que eu
era capaz, mesmo nos piores momentos de desânimo e por estarem sempre ao
meu lado dizendo muitas vezes até o que eu não queria ouvir. Muitas lições
ficaram em meu coração e muito ainda está por vir, pois sei que nossa amizade
vai durar por muitos anos mais. Irene, um agradecimento especial a você minha
amiga, por sempre levantar meu moral, me tratar com carinho e me ouvir quando
era necessário. Muito obrigada.
Agradeço às Farmacêuticas Bioquímicas Leila Phillippi e Jaqueline
Plewka, bem como à Biomédica Júlia Araújo Torres por sua colaboração e
informações de alta relevância para a realização do trabalho.
Agradeço ao Farmacêutico Bioquímico Jorge Nunes Basso por sua
valorosa e desprendida colaboração, por tratar meu estudo como algo realmente
importante e por estar sempre disponível mesmo diante de seu dia-a-dia cheio de
atribuições.
Agradeço ao Professor Márcio Chimelli por seu desprendimento e
disponibilidade, sempre ajudando nos momentos difíceis e por ter tornado
possível fotografar as células desse trabalho. Muito Obrigada.
Por fim, agradeço a todos os revezes da vida e a todos os meus desamores,
que constituíram pedras com as quais ao invés de construir um muro, levantei
uma escada que me trouxe até aqui.
iv
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 1
2. OBJETIVOS ............................................................................................................... 4
2.1. OBJETIVO GERAL.................................................................................................. 4
2.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS .................................................................................... 4
3. REVISÃO DE LITERATURA.................................................................................. 5
3.1. PATOLOGIA E FUNÇÕES DO CRESCIMENTO CELULAR ........................ 5
3.2. PATOLOGIA DA DIFERENCIAÇÃO CELULAR ............................................ 6
3.3. ADAPTAÇÕES CELULARES DE CRESCIMENTO ........................................ 7
3.4. PRINCIPAIS ALTERAÇÕES DA DIFERENCIAÇÃO CELULAR:
ANAPLASIA, METAPLASIA E DISPLASIA ...................................................... 10
3.5. A DOENÇA E SUAS CAUSAS ............................................................................ 13
3.5.1. INJÚRIA CELULAR, REAÇÕES CELULARES E REPARO TECIDUAL...... 14
3.6. MORTE CELULAR ............................................................................................. 15
3.7. CÂNCER ................................................................................................................ 17
3.7.1. NOMENCLATURA............................................................................................. 19
3.8. CONTROLE DO CÂNCER ................................................................................. 20
3.9. CÂNCER DO COLO UTERINO......................................................................... 21
3.10. PROGRAMAS DE RASTREAMENTO CITOLÓGICO ............................... 23
3.11. COLO UTERINO E SUAS REGIÕES.............................................................. 26
3.12. COLETA DE AMOSTRA PARA CITOLOGIA CERVICAL ....................... 26
3.13. TERMINOLOGIA E SISTEMAS PARA RELATO DE RESULTADOS EM
CITOLOGIA CERVICAL ...................................................................................... 28
3.14. ACURÁCIA DIAGNÓSTICA E CONTROLE DE QUALIDADE ................ 29
3.14.1. GARANTIA INTERNA E EXTERNA DA QUALIDADE .............................. 31
3.14.2. ADEQUAÇÃO E ESCRUTÍNIO DA AMOSTRA ........................................... 36
3.15. EPITÉLIO DO CÉRVIX UTERINO ................................................................ 38
3.15.1. CÉLULAS NORMAIS DO EPITÉLIO CERVICAL ........................................ 38
3.15.2. ALTERAÇÕES CELULARES BENIGNAS..................................................... 40
3.15.3. CÉLULAS METAPLÁSICAS ........................................................................... 44
4. MATERIAL .............................................................................................................. 46
5. MÉTODOS................................................................................................................ 48
5.1. ANÁLISE DOS ESFREGAÇOS .......................................................................... 48
5.2. REVISÃO E SEMIQUANTIFICAÇÃO DOS CRITÉRIOS
MORFOLÓGICOS UTILIZADOS PARA A INTERPRETAÇÃO DOS
ESFREGAÇOS DE MATERIAL CERVICAL ..................................................... 49
5.2.1. DESCRIÇÃO DE ALTERAÇÕES MORFOLÓGICAS INDICATIVAS DE
ANORMALIDADES EM CÉLULAS DE MATERIAL CERVICAL ...................... 50
5.2.1.1. Células escamosas atípicas (ASC)..................................................................... 50
5.2.1.2. Lesão intraepitelial escamosa de baixo grau (LSIL) ......................................... 51
5.2.1.3. Lesão intraepitelial escamosa de alto grau (HSIL)............................................ 52
5.2.1.4. Carcinoma escamoso invasor ............................................................................ 55
5.2.1.5. Células glandulares atípicas (AGC) .................................................................. 55
5.2.1.6. Adenocarcinoma in situ ..................................................................................... 56
5.2.1.7. Adenocarcinoma invasor ................................................................................... 57
5.2.2. SEMIQUANTIFICAÇÃO DOS PRINCIPAIS CRITÉRIOS MORFOLÓGICOS
UTILIZADOS PARA CLASSIFICAÇÃO DE ESFREGAÇOS DE MATERIAL
CERVICAL ................................................................................................................ 58
v
5.3. CODIFICAÇÃO PROPOSTA PARA AS CATEGORIZAÇÕES GERAL E
ESPECÍFICA DOS ESFREGAÇOS, COM DIVISÃO EM GRUPOS E
SUBGRUPOS POSSÍVEIS DE CLASSIFICAÇÃO ............................................. 61
5.4. ANÁLISE ESTATÍSTICA DOS DADOS ........................................................... 64
6. RESULTADOS ......................................................................................................... 66
7. DISCUSSÃO ............................................................................................................. 93
8. CONCLUSÕES....................................................................................................... 108
9. REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 109
vi
LISTA DE QUADROS
vii
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 - CONCORDÂNCIA ENTRE OS RESULTADOS DE 4
OBSERVADORES E O RESULTADO DE CONSENSO NA CATEGORIZAÇÃO
POR GRUPOS PARA 46 ESFREGAÇOS DE CITOLOGIA CERVICAL:
FREQÜÊNCIA DE DISTRIBUIÇÃO DE 230 OBSERVAÇÕES INDIVIDUAIS .. 67
TABELA 2 - CONCORDÂNCIA GLOBAL ENTRE 4 OBSERVADORES NA
CATEGORIZAÇÃO POR GRUPOS PARA 46 ESFREGAÇOS DE CITOLOGIA
CERVICAL: FREQÜÊNCIA DE DISTRIBUIÇÃO DE 276 OBSERVAÇÕES
PAREADAS ............................................................................................................... 67
TABELA 3 – CONCORDÂNCIA ENTRE OS RESULTADOS DE 4
OBSERVADORES E O RESULTADO DE CONSENSO NA CATEGORIZAÇÃO
POR SUBGRUPOS PARA 46 ESFREGAÇOS DE CITOLOGIA CERVICAL:
FREQÜÊNCIA DE DISTRIBUIÇÃO DE 230 OBSERVAÇÕES INDIVIDUAIS .. 68
TABELA 4 - CONCORDÂNCIA GLOBAL ENTRE 4 OBSERVADORES NA
CATEGORIZAÇÃO POR SUBGRUPOS PARA 46 ESFREGAÇOS DE
CITOLOGIA CERVICAL: FREQÜÊNCIA DE DISTRIBUIÇÃO DE 276
OBSERVAÇÕES PAREADAS ................................................................................. 68
TABELA 5 – DISTRIBUIÇÃO DOS RESULTADOS DE 4 OBSERVADORES E DO
CONSENSO PARA A CLASSIFICAÇÃO DE 46 ESFREGAÇOS DE MATERIAL
CERVICAL, DIVIDIDOS EM 9 CATEGORIAS: SOMATÓRIO PARA 184
OBSERVAÇÕES ....................................................................................................... 69
TABELA 6 - DISTRIBUIÇÃO DOS RESULTADOS DE CADA OBSERVADOR E
DO CONSENSO PARA 46 ESFREGAÇOS DE MATERIAL CERVICAL,
DIVIDIDOS EM 9 CATEGORIAS ........................................................................... 69
TABELA 7 - CONCORDÂNCIA INTEROBSERVADORES EM ANORMA-
LIDADES EPITELIAIS EM RELAÇÃO AO CONSENSO PARA GRUPOS......... 70
TABELA 8 - CONCORDÂNCIA INTEROBSERVADORES EM ANORMA-
LIDADES EPITELIAIS EM RELAÇÃO AO CONSENSO PARA SUBGRUPOS . 70
TABELA 9 – ANÁLISE DE ACURÁCIA INTEROBSERVADORES PARA
ANORMALIDADES EPITELIAIS EM RELAÇÃO AO CONSENSO: VALORES
DE SENSIBILIDADE E ESPECIFICIDADE PARA CLASSIFICAÇÕES
SUSPEITA X NEGATIVA ........................................................................................ 71
TABELA 10 - CONCORDÂNCIA INTEROBSERVADORES, EM RELAÇÃO AO
CONSENSO, PARA CLASSIFICAÇÃO DE ESFREGAÇOS COMO NEGATIVAS
PARA ANORMALIDADES EPITELIAIS ............................................................... 72
TABELA 11 - CONCORDÂNCIA INTEROBSERVADORES, EM RELAÇÃO AO
CONSENSO, PARA ANORMALIDADES EPITELIAIS NO GRUPO DE
CLASSIFICAÇÃO CÉLULAS ESCAMOSAS ATÍPICAS (ASC) .......................... 72
TABELA 12 - CONCORDÂNCIA INTEROBSERVADORES, EM RELAÇÃO AO
CONSENSO, PARA ANORMALIDADES EPITELIAIS NO GRUPO DE
CLASSIFICAÇÃO LESÃO INTRAEPITELIAL DE BAIXO GRAU (LSIL) ......... 72
TABELA 13 - CONCORDÂNCIA INTEROBSERVADORES, EM RELAÇÃO AO
CONSENSO, PARA ANORMALIDADES EPITELIAIS NO GRUPO DE
CLASSIFICAÇÃO LESÃO INTRAEPITELIAL DE ALTO GRAU (HSIL)........... 72
TABELA 14 - COMPARAÇÃO PELO TESTE χ2 ENTRE OS RESULTADOS
APRESENTADOS PELOS OBSERVADORES 2 E 3 ANTES E DEPOIS DA SUGESTÃO
DE APLICAÇÃO DA PADRONIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ESTABELECIDA PARA ESTE
TRABALHO PARA ANORMALIDADES EPITELIAIS EM CITOLOGIA CERVICAL .. 75
viii
LISTA DE FIGURAS
ix
FIGURA 12 – FOTOMICROGRAFIA DE MATERIAL CERVICAL DO
ESFREGAÇO 17 AO MICROSCÓPIO DE LUZ: CÉLULAS SUGESTIVAS
LESÃO INTRAEPITELIAL DE BAIXO GRAU (LSIL) DE ACORDO COM A
INTERPRETAÇÃO DO CONSENSO. Coloração de Papanicolaou (400x). ............ 85
FIGURA 13 – FOTOMICROGRAFIA DE MATERIAL CERVICAL DO
ESFREGAÇO 22 AO MICROSCÓPIO DE LUZ: CÉLULAS SUGESTIVAS
LESÃO INTRAEPITELIAL DE BAIXO GRAU (LSIL) DE ACORDO COM A
INTERPRETAÇÃO DO CONSENSO. Coloração de Papanicolaou (400x). ............ 86
FIGURA 14 – FOTOMICROGRAFIA DE MATERIAL CERVICAL DO
ESFREGAÇO 31 AO MICROSCÓPIO DE LUZ: CÉLULAS SUGESTIVAS
LESÃO INTRAEPITELIAL DE BAIXO GRAU (LSIL) DE ACORDO COM A
INTERPRETAÇÃO DO CONSENSO. Coloração de Papanicolaou (400x). ............ 87
FIGURA 15 – FOTOMICROGRAFIA DE MATERIAL CERVICAL DO
ESFREGAÇO 1 AO MICROSCÓPIO DE LUZ: CÉLULAS SUGESTIVAS LESÃO
INTRAEPITELIAL DE ALTO GRAU (HSIL) – DISPLASIA MODERADA, DE
ACORDO COM A INTERPRETAÇÃO DO CONSENSO. Coloração de Shorr
(400x). ........................................................................................................................ 88
FIGURA 16 – FOTOMICROGRAFIA DE MATERIAL CERVICAL DO
ESFREGAÇO 37 AO MICROSCÓPIO DE LUZ: CÉLULAS SUGESTIVAS
LESÃO INTRAEPITELIAL DE ALTO GRAU (HSIL) – DISPLASIA MODERADA
DE ACORDO COM A INTERPRETAÇÃO DO CONSENSO. Coloração de
Papanicolaou (400x). .................................................................................................. 89
FIGURA 17 – FOTOMICROGRAFIA DE MATERIAL CERVICAL DO
ESFREGAÇO 39 AO MICROSCÓPIO DE LUZ: CÉLULAS SUGESTIVAS DE
ADENOCARCINOMA INVASOR ENDOCERVICAL DE ACORDO COM A
INTERPRETAÇÃO DO CONSENSO. Coloração de Papanicolaou (400x). ............ 90
FIGURA 18 – FOTOMICROGRAFIA DE MATERIAL CERVICAL DO
ESFREGAÇO 21 AO MICROSCÓPIO DE LUZ: CLASSIFICAÇÃO COMO
CÉLULAS GLANDULARES ATÍPICAS (AGC) EM ASSOCIAÇÃO COM LESÃO
INTRAEPITELIAL ESCAMOSA DE BAIXO GRAU (LSIL) DE ACORDO COM A
INTERPRETAÇÃO DO CONSENSO. Coloração de Papanicolaou (400x). ............ 91
FIGURA 19 – FOTOMICROGRAFIA DE MATERIAL CERVICAL DO
ESFREGAÇO 34 AO MICROSCÓPIO DE LUZ: CLASSIFICAÇÃO COMO
CÉLULAS GLANDULARES ATÍPICAS (AGC) EM ASSOCIAÇÃO COM LESÃO
INTRAEPITELIAL ESCAMOSA DE BAIXO GRAU (LSIL) DE ACORDO COM A
INTERPRETAÇÃO DO CONSENSO. Coloração de Papanicolaou (400x). ............ 92
x
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
xi
RESUMO
A neoplasia cervical constitui um problema de saúde pública em âmbito mundial,
estimando-se que seja a terceira mais comum na população feminina, de
prevalência vinculada ao grau de subdesenvolvimento do país. As ações para seu
controle contam com tecnologias acessíveis que permitem o diagnóstico precoce
e a cura em 100% dos casos. O exame citológico de Papanicolaou, utilizado para
a detecção de lesões precursoras, tem significado um avanço na prevenção de
câncer cervical, embora no Brasil os programas existentes ainda não tenham
reduzido consideravelmente o número de casos. Porém, ocorrem erros devidos à
coleta e preparação do material e a falhas na detecção ou na interpretação das
alterações celulares significantes. Este trabalho visou estudar a variação
interobservadores na categorização citológica de material cervical, antes e após o
estabelecimento de critérios morfológicos padronizados, para a interpretação de
lesões pré-neoplásicas e neoplásicas. Para tanto, foram avaliados 46 esfregaços
de citologia cervical por 4 observadores, responsáveis por laboratórios de
pequeno porte nos Estados do Paraná e Santa Catarina, de acordo com seus
procedimentos rotineiros, após consentimento informado das respectivas
pacientes. Os mesmos esfregaços foram revisados por dois dos observadores, de
acordo com critérios morfológicos baseados na literatura recente e no consenso
mundial segundo o Sistema Bethesda para citologia cervical, incluindo-se uma
semiquantificação dos principais critérios utilizados para discernimento entre os
diferentes graus de alterações, e submetidas ao consenso de dois observadores no
Laboratório de Citologia Clínica da UFPR. Ao todo, foram realizadas 322
observações individuais, de acordo com grupos e subgrupos de classificação,
comparando-se os resultados dos participantes entre si e em relação ao consenso.
As freqüências das observações foram: negativo para lesão intraepitelial ou
malignidade 65,2%; células escamosas atípicas (ASC) 5,4%; lesão intraepitelial
escamosa de baixo grau (LSIL) 12%; lesão intraepitelial escamosa de alto grau
(HSIL) 11,4%; carcinoma escamoso invasor 1,1%; células glandulares atípicas
(AGC) 1,6%; adenocarcinoma in situ (AIS) 0,5%; adenocarcinoma invasor 0,5%;
alterações mistas 2,2%. Esses resultados indicam a prevalência de resultados
suspeitos ou positivos de 34,8% pelos observadores, contra a prevalência de
56,5%, do consenso. Observou-se percentagens globais médias de concordância
de 76,8 % e 67,4 % e índices kappa de 0,5 e 0,3 para grupos e subgrupos,
respectivamente, indicando menor concordância em relação aos subgrupos.
Quando os esfregaços foram considerados como suspeitos e negativos, a
sensibilidade média dos observadores participantes foi de 56,7% e a
especificidade média, de 93,8%. No entanto, a percentagem global média de
concordância para ASC foi de 15,0%; para LSIL, de 32,5% e para HSIL, de
50,0%. Assim, observou-se maior concordância para os grupos de classificação,
e menor prevalência e concordância mais baixa dos observadores em relação ao
consenso para esfregaços suspeitos. Não foi verificada diferença estatisticamente
significativa na comparação entre os resultados concordantes e discordantes com
o consenso nas avaliações antes e depois da padronização (teste χ2; p> 0,05). A
padronização de critérios e o estudo das variações podem contribuir para a
melhoria da qualidade.
xii
ABSTRACT
The cervical neoplasia constitutes a worldwide problem of public health,
considered the third more common in the feminine population, whose prevalence
is directly linked to the degree of the country underdevelopment. The actions for
control count on accessible technologies for the precocious diagnosis and the
cure in 100% of the cases, when diagnosed in initial phase. The Papanicolaou
test, used for the detection of precursor lesions, determined a progress in the
prevention of cervical cancer, however in Brazil, a decrease in the rates of its
incidence had not been observed. Even so, mistakes happen during the collection
and preparation of the material and failure in detection or in interpretation of
abnormal morphological features. The aim of this work was to study the inter-
observers variation in the cytological categorizations of cervix-vaginal material,
before and after the establishment of standardized morphologic approaches, for
the interpretation of pre- and neoplasic lesions. It were utilized a 46-slide set of
cervical cytology for 4 observers, responsible for small laboratories in the states
of Paraná and Santa Catarina, after patient informed consent, in agreement with
its routine procedures. The same slides were revised by two of the observers, in
agreement with morphologic approaches based on the recent literature and in the
world consensus according to the Bethesda System for cervix-vaginal cytology,
including a semi-quantification of the main approaches used for discernment
among the different degrees of alterations submitted to the consensus of two
observers' of the Laboratory of Clinical Cytology in UFPR. It was analyzed 322
individual observations, in agreement with groups and sub-groups classification,
being compared between the 4 cytologists related to the consensus. The
frequencies of the observations were: negative for intraepithelial lesion or
malignancy 65.2%; atypical squamous cells (ASC), 5.4%; low grade squamous
intraepithelial lesion (LSIL), 12%; high grade squamous intraepithelial lesion
(HSIL), 11.4%; invasive squamous cell carcinoma 1.1%; atypical glandular cells
(AGC) 1.6%; adenocarcinoma in situ (AIS) 0.5%; invasive adenocarcinoma
0.5%; mixed alterations 2.2%. Those results indicate the prevalence of suspicious
or positive results of 34.8% for the observers, against the consensus prevalence
of 56.5%. It was observed averages of global concordance of 76.8% and 67.4%
and unweighted kappa indexes of 0.5 and 0.3 for groups and sub-groups,
respectively, indicating smaller agreement in relation to the sub-groups. When
the slides were considered as suspicious and negatives, the observers' medium
sensitivity was 56.7% and specificity 93.8%. However, the global concordance
for ASC was 15.0%; LSIL, 32.5%, and HSIL, 50.0%. Thus, good agreement was
observed for the classification groups, and lesser prevalence and concordance
related to the consensus for suspicious slides. Statistically significant difference
was not verified in the comparison for the results in the evaluations before and
after the standardization (χ2 test; p> 0.05). The criteria padronization and
variation knowledge contributes for the quality of the Pap test.
xiii
1
1. INTRODUÇÃO
2. OBJETIVOS
3. REVISÃO DE LITERATURA
ciclo celular de uma mitose a outra, repondo células que estão continuamente
sendo destruídas e estão presentes em muitos tecidos, entre eles o epitélio
superficial do cérvix uterino. As células quiescentes normalmente demonstram
um baixo nível de replicação, mas podem se submeter à rápida divisão em
resposta a estímulos, reconstituindo o tecido de origem. Os fibroblastos, em
particular, o fazem amplamente, constituindo a resposta do tecido conjuntivo à
inflamação (COTRAN et al., 1994). As células permanentes não conseguem se
dividir mitoticamente na vida pós-natal. A esse grupo pertencem as células
nervosas, as musculares esqueléticas e as cardíacas (COTRAN et al., 1994;
LODISH et al., 2002).
Embora as células lábeis e estáveis sejam capazes de promover
regeneração, não haverá necessariamente restituição da estrutura normal do
tecido. O estroma de suporte das células, particularmente a membrana basal, é
necessário para a regeneração organizada, dando suporte para as células em
replicação. Quando as membranas basais estão rompidas, as células podem
proliferar e produzir massas desorganizadas que não lembram o arranjo original
(COTRAN et al., 1994).
A regeneração celular atua através do mesmo mecanismo da renovação, a
mitose. Diferencia-se por não fazer parte da reposição normal das células, mas
sim de uma resposta à perda repentina ou contínua de grande quantidade de
células especializadas devido a algum processo patológico (TAMAYO, 1987;
COTRAN et al., 1994). Em tecidos com poucas ou sem células de reserva como
fígado, rins e tireóide, a perda de equilíbrio devido às demandas funcionais
aumentadas conduz a um tipo de regeneração que não tem paralelo na renovação.
A regeneração celular está intimamente relacionada com a reparação de tecidos
(TAMAYO, 1987).
epitelial pode ser parcial ou total e o epitélio escamoso resultante pode ser
maduro ou imaturo (KOSS, 1992). A metaplasia não parece ir além da
modulação fenotípica e não se conhecem casos de mudança na determinação
celular, por exemplo, um tecido epitelial se transformar em uma estrutura
mesenquimática ou vice-versa (TAMAYO, 1987). Segundo KOSS (1992),
embora a metaplasia seja citada como um dos passos no desenvolvimento do
câncer de pulmão e certas lesões intraepiteliais malignas tenham características
semelhantes às da metaplasia, a relação entre os dois eventos não é clara.
A displasia apresenta algumas alterações celulares que se sobrepõem às
que caracterizam a neoplasia, sugerindo que, embora esta ainda não esteja
presente, pode-se esperar que se desenvolva no futuro (MITCHINSON et al.,
1996).
“No cérvix, o termo é aplicado a um espectro de reações heteroplásicas
envolvendo epitélio escamoso estratificado ou metaplásico. Como o termo
indica, esse grupo de reações é caracterizado por malformação ou
desenvolvimento desordenado, que se manifesta morfologicamente por variações
na maturação citoplasmática, em associação com certas anormalidades
nucleares” (PATTEN, 1966; PATTEN, 1969). Fundamentalmente, a displasia é
uma reação à injúria nuclear, uma vez que um estímulo agindo em epitélio
normal resulta em algumas alterações morfológicas. Segundo a Organização
Mundial da Saúde (OMS), displasia é uma lesão na qual parte da espessura do
epitélio é composta por células mostrando vários graus de atipia (BIBBO, 1997).
3.7. CÂNCER
Com base em algumas estatísticas, pode-se estimar que entre três e sete eventos
ao acaso, cada um com baixa probabilidade, são tipicamente requeridos para
transformar uma célula normal em cancerosa (ALBERTS et al., 1994).
O corpo sadio é um tipo peculiar de sociedade onde a regra é o auto-
sacrifício, ao invés da competição. Todas as linhagens de células somáticas
morrem sem deixar progênie, dedicando sua existência a dar suporte para células
germinativas, que têm chance de sobreviverem sozinhas. Mutação, competição e
seleção natural operando na população de células somáticas são ingredientes
básicos do câncer, doença na qual células individuais mutantes começam a
prosperar em detrimento das vizinhas, mas acabam destruindo a sociedade
celular e morrendo (ALBERTS et al., 1994).
Neoplasia significa novo crescimento. O termo tumor foi originalmente
aplicado ao inchaço causado pela inflamação (COTRAN et al., 1994;
MITCHINSON et al., 1996; STEVENS e LOWE, 1996). Neoplasmas também
podem induzir inchaços, mas há muito tempo não se faz uso da palavra tumor em
situações não-neoplásicas, de tal forma que o termo hoje é considerado sinônimo
de neoplasma. Câncer é o termo comum para os neoplasmas malignos
(COTRAN et al., 1994; STEVENS e LOWE, 1996). Tem sido
surpreendentemente difícil desenvolver uma definição acurada para neoplasma.
Em 1952, o oncologista britânico Rupert Willis conseguiu uma aproximação:
“um neoplasma é uma massa anormal de tecido, cujo crescimento não é
coordenado, excede aquele dos tecidos normais e persiste da mesma maneira
após cessar o estímulo que provocou a mudança.” A aparente autonomia não é
completa, pois o neoplasma depende do organismo para sua nutrição e
suprimento vascular e muitas formas de neoplasia também requerem suporte
endócrino (COTRAN et al., 1994).
Para o crescimento descontrolado, mais de 50% das células filhas devem
permanecer como células tronco ou o processo de diferenciação deve estar
desarranjado, de modo que as células filhas, em sua rota, continuem a se dividir
indefinidamente, prevenindo a morte ou descarte no fim da linha de produção
(ALBERTS et al., 1994; MITCHINSON et al., 1996).
19
3.7.1. NOMENCLATURA
não houve algum falso negativo (BRASIL, 2001). Essa prática tem se mostrado
um dos métodos mais usados para identificar resultados falso-negativos
(ANDERSON et al., 1987; ROHR, 1990; DODD et al., 1993; KOSS, 1993;
ALLEN et al., 1994; JONES, 1996; CIBAS e DUCATMAN, 1996; BIBBO,
1997; JONES e DAVEY, 2000; BRASIL, 2001). Se for detectada uma
anormalidade epitelial em uma paciente com resultado anterior negativo há duas
possibilidades: a anormalidade não existia quando o esfregaço negativo foi
coletado ou a anormalidade já existia, mas não foi reconhecida, por erro de
interpretação ou processamento da amostra, ou não estava representada na
amostra, ou seja, houve erro de coleta (GRAAF et al., 1987). Há um benefício
educacional em rever esfregaços prévios classificados como alterações celulares
benignas. Um número significativo de erros será detectado nesses esfregaços,
mas tais erros vão ser predominantemente de classificação, em contraste com o
predomínio de erros de rastreamento detectados em lâminas classificadas como
dentro dos limites da normalidade (JONES, 1995). Em um estudo comparativo
de três procedimentos sugeridos para melhorar a acurácia diagnóstica, ROHR
(1990) verificou que a comparação histologia/citologia é uma medida insensível
para cobrir erros de falso-negativos quando comparada com a revisão
retrospectiva de material citológico de pacientes apresentando esfregaço com
atipias. O programa Q-Probes do Colégio Americano de Patologistas tem sido
uma ferramenta valiosa para descrever de maneira acurada os padrões práticos e
o desempenho nos laboratórios dos Estados Unidos e em vários outros países.
Embora não requerido pela regulamentação, a maioria dos laboratórios
participantes reportou que revêem rotineiramente também os casos prévios
quando se classifica uma lâmina como LSIL (61%) ou de significado
indeterminado (73%), essa conduta identificará erros de rastreamento e
classificação, o que será útil no monitoramento da qualidade de muitos
laboratórios (JONES, 1996). Devem ser revisados 100% dos casos negativos em
geral utilizando-se revisão rápida, caso não seja viável devem ser revistos pelo
menos 5% dos casos negativos (BRASIL, 2001). Deve-se procurar sempre fazer
correlação dos resultados citológicos com os diagnósticos de biópsia. A releitura
35
4. MATERIAL
5. MÉTODOS
Para a avaliação dos esfregaços no terceiro estágio (C), foi entregue aos
profissionais participantes um texto com descrições e critérios morfológicos de
possíveis alterações citológicas observadas em material cervical, bem como
quadros com a semiquantificação dos principais critérios utilizados (Quadros 2 e
3), para o discernimento entre os diversos graus de alterações. Cada observador
foi orientado a realizar uma segunda revisão de todos os esfregaços, levando em
conta a padronização proposta neste trabalho, com base em estudo de consenso
entre os autores mais conceituados na área e o Sistema Bethesda. Recomendou-
se que as características observadas, bem como a opção que se referia à
classificação ou resultado, fossem assinaladas em um tipo de laudo padrão
(Apêndice 4), elaborado com base nas recomendações do Sistema Bethesda, e
que contém uma seção para a expressão em cruzes dos principais critérios.
Apenas dois dos observadores participaram deste estágio.
Os resultados fornecidos pelos participantes nas etapas B e C foram
confrontados entre si e com o consenso (A) para acessar a variabilidade
interobservadores existente, além de verificar se os resultados obtidos em C
correlacionavam-se melhor com o de consenso (A).
e que esse padrão se baseava também nas idéias de quantidade expressas pelos
principais autores da área, que constam das descrições morfológicas revisadas
neste estudo.
A semiquantificação proposta para os principais critérios utilizados na
classificação de lâminas de material cervical consta nos Quadros 2 e 3. Esta foi
dividida para lesões escamosas e glandulares devido às diferenças das
classificações nessas categorias.
61
Irregularidade
Aumento da Padrão Contorno
Hipercro Cariome de Pleomorfismo Nucléolos
relação núcleo granular da irregular
masia galia distribuição celular aberrantes
citoplasma cromatina do núcleo
da cromatina
DIS-PLA-SIA DIS-PLA-SIA
DE BAIXO
GRAU
LEVE
Finamente
+ + a ++ + + a ++ 0 0 0
LESÃO INTRA-EPITE-LIAL ESCA-MOSA
granular
CINOMA in ACENTUA- MODERADA
Finamente
++ ++ ++ ++ + 0 0
granular
DE ALTO GRAU
DIS-PLA-SIA
Grosseirame
DA
Grumos
situ
Grumos +++ a
CARCINOMA INVASOR ++++ ++ ++ a +++ ++++ +++ a ++++ +++
grosseiros ++++
61
62
Grumos
++ a +++ ++ a +++ +++ +++ + a ++ Micronucléolos ++ a +++ células muito sobrepostas, com núcleos
grosseiros
em pseudo-estratificação se estendendo
para fora da faixa.
INVASOR
62
63
20 - ASC-US
21 – ASC-H
50 Carcinoma invasor
6. RESULTADOS
Adeno- Alterações
Negativo ASC LSIL HSIL carcinomas mistas
Observadores N % n % n % N % n % n %
1 17 89,5 2 40,0 6 60,0 3 50,0 1 100 1 25,0
2 19 100 1 20,0 3 30,0 4 66,7 0 0 1 25,0
3 13 68,4 1 20,0 7 70,0 6 100 0 0 1 25,0
4 16 84,2 1 20,0 3 30,0 2 33,3 0 0 2 50,0
Consenso 19 5 10 6 1 4
NOTA: alterações mistas correspondem a combinações entre alterações em células escamosas e
glandulares.
72
Observadores
Comparações 1 2 3 4
concordância positiva 4 2 4 2
discordância negativa 2 4 2 4
Média
% global de concordância 66,7 33,3 66,7 33,3 50,0
NOTA: obs indica observador.
75
Obs2 Obs3
Grupos Sub-G Grupos Sub-G
S 35 28 21 28
Antes N 10 17 24 17
S 34 30 24 27
Depois N 11 15 21 18
NOTA: Grupos: Obs2 - χ2 = 0,062; GL = 1; p = 0,803; Obs3 - χ2 = 0,400; GL = 1;
p = 0,527.
Subgrupos: Obs2 - χ2 = 0,194; GL = 1; p = 0,660; Obs3 - χ2 = 0,194; GL =
1; p = 0,660.
S – concordâncias; N - discordâncias com o consenso; obs - observador.
Nota: as setas indicam células com alterações nucleares que levaram à classificação
ASC-H para a lâmina 14.
82
Nota: as setas indicam células com alterações nucleares que levaram à classificação
ASC-US para a lâmina 16.
83
Nota: as setas indicam células com alterações nucleares que levaram à classificação
ASC-US para a lâmina 23.
84
Nota: as setas indicam células com alterações nucleares que levaram à classificação
ASC-H para a lâmina 35.
85
Nota: as setas indicam células com alterações nucleares que levaram à classificação
LSIL para a lâmina 5.
86
Nota: as setas indicam células com alterações nucleares que levaram à classificação
LSIL para a lâmina 8.
87
Nota: as setas indicam células com alterações nucleares que levaram à classificação
LSIL para a lâmina 17.
88
Nota: as setas indicam células com alterações nucleares que levaram à classificação
LSIL para a lâmina 22.
89
Nota: as setas indicam células com alterações nucleares que levaram à classificação
LSIL para a lâmina 31.
90
Nota: as setas indicam células com alterações nucleares que levaram à classificação
HSIL - NICII para a lâmina 1.
91
Nota: as setas indicam células com alterações nucleares que levaram à classificação
HSIL – NICII para a lâmina 37.
92
Nota: as setas indicam células com alterações nucleares que levaram à classificação
Adenocarcinoma invasor para a lâmina 39.
93
Nota: as setas indicam células com alterações nucleares que levaram à classificação
AGC + LSIL para a lâmina 21.
94
Nota: as setas indicam células com alterações nucleares que levaram à classificação
AGC + LSIL para a lâmina 34.
95
7. DISCUSSÃO
também mostrou, de certa forma, essa tendência, uma vez que se constatou que
17% dos esfregaços haviam sido subestimadas no primeiro escrutínio.
Na tabela 9 pode-se verificar que, o valor preditivo positivo, ou seja, a
probabilidade da paciente realmente ter a lesão foi em média de 94,4%, com
valores de 100% para os observadores 2 e 4. Já o valor preditivo negativo médio,
isto é, a probabilidade da paciente realmente não apresentar lesão foi 63,7%, com
valor mais baixo para o observador 2 (55,6%). Os achados para o valor preditivo
positivo são corroborados pelos de SOOST et al. (1991), que consideraram tais
resultados muito altos para um procedimento de rastreamento como a citologia.
O valor preditivo negativo encontrado por este mesmo autor foi 99,8%, superior
ao encontrado nesse estudo. Uma provável explicação para esse fato reside na
tendência de alguns dos observadores em fornecer interpretações subestimadas
em relação ao consenso. Uma importante implicação nesse caso reside no fato de
que uma lâmina contendo células anormais, classificada como negativa, pode
afastar uma paciente que deveria ser seguida (HINDMAN, 1987).
Analisando-se os resultados individuais dos observadores em relação ao
consenso para as interpretações citomorfológicas dos esfregaços (Tabelas 10 a
13), a percentagem global média de concordância encontrada foi: para negativos
93,7%, para ASC 15,0%, para LSIL 32,5% e para HSIL 50,0%. Esses dados são
apoiados pelos resultados conseguidos para a categoria ASCUS no estudo de
COCCHI et al. (1996), no qual essa categoria apresentou o índice de
concordância mais baixo e os dados indicaram que quando um dos laboratórios
interpretou uma lâmina como ASCUS, 40,3% dos laudos pareados indicaram
HSIL ou carcinoma. Há concordância, também, com os dados para a
classificação negativa encontrados no trabalho de GUPTA et al. (2001) em que a
acurácia média foi melhor para alterações benignas e LSIL do que para HSIL.
SOUZA (2004) confirmou a existência de subjetividade nos laudos de ASCUS,
além de critérios imprecisos de um mesmo observador na formatação dos
achados. Esse autor também observou graus bastante distantes de concordância
intraobservadores. YOBS et al. (1987) verificaram concordância
interobservadores mais baixa para a categoria HSIL, sendo que as maiores
102
1994, YOUNG et al., 1994; COCCHI et al., 1996). Isso justificaria, em parte, as
discordâncias observadas.
Na categoria LSIL (Figura 2) os esfregaços 5, 8, 17, 22 e 31 foram
consideradas como tendo a maior variação. Na maioria dos casos os esfregaços
foram subestimadas como negativas, reativas ou inflamatórias, a não ser a lâmina
17 que foi superestimada como displasia moderada e carcinoma in situ,
respectivamente, na primeira e na segunda revisão realizadas pelo laboratório 3.
A lâmina 31 foi classificada pelo laboratório 1 como células glandulares atípicas
(AGC), não havendo menção a anormalidades escamosas.
No grupo HSIL (Figura 3) as diferenças de interpretação foram
geralmente de um grau de displasia, dentro do esperado pela subjetividade e
variabilidade interobservadores. Mas, no caso dos esfregaços 1 e 37, que foram
classificadas pelo consenso como displasia moderada, a maioria dos participantes
forneceu resultados negativos.
Os esfregaços 21 e 34 (Figura 5), que de acordo com o consenso
apresentavam células glandulares atípicas e LSIL, foram subestimadas como
inflamatórias ou reativas pelos participantes. A não ser pelo laboratório 1 que
classificou a lâmina 21 como HSIL – displasia moderada.
Por fim, a lâmina 39 (Figura 4) considerada como adenocarcinoma invasor
foi classificada por dois dos observadores como AGC e um dos participantes a
classificou como AGC associadas a displasia acentuada.
Em alguns casos, pode-se observar também classificações superestimadas
por parte dos participantes, além das subestimações já constatadas anteriormente,
o que sugere não haver tendenciosidade nos resultados de consenso.
Em contraste com os falso-negativos, pouco tem sido escrito em relação
aos resultados citológicos falso-positivos. Efeitos de radiação ou outras condutas
terapêuticas podem causar alterações que mimetizam displasia ou carcinoma. Da
mesma forma, as alterações celulares de inflamação e reparo podem lembrar as
neoplásicas e ocasionalmente serem mal interpretadas por citologistas
experientes como lesão de alto grau (DODD et al., 1993). Isso poderia explicar a
105
preditivo dos critérios uma vez que ambos determinam a possibilidade de seu uso
geral.
Com base em informações pessoais dos profissionais participantes,
observou-se que seus sistemas de controle de qualidade interno incluem a
realização de revisão de lâminas, sobretudo a revisão de 10%, exceto no caso do
observador 2. Apenas dois dos observadores têm acesso a programas externos de
controle de qualidade. De acordo com ROMBACH et al. (1987) e CONFORTINI
et al. (1993), em locais onde há baixa prevalência de lesões do colo uterino, a
revisão de lâminas pode ser muito útil no controle de qualidade para decisões
diagnósticas importantes, embora traga benefício questionável para a detecção de
falso-negativos. De um modo geral, os participantes deste estudo também
relataram, como medidas de controle interno de qualidade, contato freqüente com
os clínicos e busca pelos resultados dos exames colposcópicos e histológicos de
pacientes com resultados suspeitos no exame citológico. O estabelecimento de
uma rotina de controle interno é muito importante para monitorar o dia-a-dia do
laboratório. Segundo HINDMAN (1987), laboratórios que não operam um
programa formal de controle de qualidade possivelmente não terão noção da
magnitude do seu problema com falso-negativos.
Os resultados deste estudo também poderão proporcionar informações
acerca da relevância dos procedimentos para controle de qualidade.
Os consensos mundiais de classificação podem ter falhas que influenciam
as variações entre citologistas e, portanto, merecem ser criticados e revisados. O
estudo de STASTNY et al. em 1998 verificou que o CLIA’88 ainda possuía
trechos que permitiam que os profissionais interpretassem de diferentes maneiras
um mesmo termo, por exemplo, “discrepância significativa”. Em 1990 um corpo
de editores da revista Obstetrics and Gynecology publicou um editorial
sumarizando várias falhas potenciais no Sistema Bethesda de 1988 (BOTTLES et
al., 1991). GUPTA et al. (2001) verificaram que os critérios citológicos para
atipias epiteliais escamosas descritos no Sistema Bethesda estavam estabelecidos,
mas ainda ocorria ampla variabilidade interobservadores, o que seria uma das
principais limitações da reprodutibilidade de tal sistema. Segundo COCCHI et al.
107
qual está baseada na concepção que o citologista tem a respeito daquilo que
observa.
110
8. CONCLUSÕES
Na análise da variabilidade das classificações de 46 lâminas de material
cervical por 4 observadores de laboratórios dos Estados do Paraná e Santa
Catarina, em relação ao consenso estabelecido para as interpretações
citomorfológicas divididas em grupos e subgrupos, no Laboratório de Citologia
Clínica da Universidade Federal do Paraná, observou-se:
Valores razoáveis para percentagem global de concordância e kappa, com
valores médios de 76,8% e 0,51 para grupos e 67,4% e 0,33 para
subgrupos, respectivamente;
Sensibilidade média de 56,7% e especificidade média de 93,8% ao se
considerar o consenso como padrão e os esfregaços como suspeitas ou
negativas;
Prevalência de 56,5% de lâminas suspeitas de acordo com o consenso e de
34,8%, em média, de acordo com os observadores, no total de
interpretações;
Maior concordância para os grupos de classificação, menor prevalência e
concordância mais baixa dos observadores em relação ao consenso para
lâminas suspeitas;
Que não houve diferença estatisticamente significativa na comparação dos
resultados de dois dos observadores antes e após a aplicação de
padronização baseada na literatura recente, no consenso mundial segundo
o Sistema Bethesda e na semiquantificação de critérios morfológicos para
citologia cervical.
Ainda constitui uma dificuldade modificar conceitos já amplamente
aplicados por citologistas em sua rotina. Porém, apesar da dificuldade de se
estabelecer valores em uma ciência tão subjetiva quanto a citologia, deve-se
continuar buscando formas de reduzir as variações através do aprofundamento e
uniformização de critérios, bem como da aplicação de sistemas eficientes de
controle de qualidade, otimizando, assim, o atendimento às pacientes com
relação à detecção de uma patologia tão importante como o câncer de colo
uterino.
111
9. REFERÊNCIAS
ALBERTS, B.; et al. Molecular biology of the cell. 3.ed. New York: Garland
Publishing Inc., 1994.
COCCHI, V.; SINTONI, C.; CARRETI, D.; SAMA, D.; CHIARI, U.; SEGALA,
V.; DELAZER, .L.; GRILLI, N.; PAPALEO, R.; GHIRARDINI, C.; BUCCHI,
L. External quality assurance in cervical/vaginal cytology: interlaboratory
agreement in the Emiglia Romana region of Italy. Acta Cytologica, Chicago, v.
40, n. 3, 1996.
DIEHL, A.R.; PROLLA, J.C. Rapid rescreening of cervical smears for internal
quality control. Acta Cytologica, Chicago, v. 42, n. 4, p. 949-1053, 1998.
GRAAF, Y.V. D.; VOOIJS, G.P.; GAILLARD, H.L.J.; GO, D.M.D.S. screening
errors in cervical cytologic screening. Acta Cytologica, Chicago, v. 31, n. 4, p.
434-438, 1987.
KOSS, L.G. Cervical (Pap) smear. Cancer, New York, v. 71, p. 1406-1412,
1993.
RAAB, S. S.; BISHOP, N. S.; ZALESKI, M. S. Long term outcome and relative
risk in women with atypical squamous cells of undetermined significance.
American Journal of Clinical Pathology, Philadelphia, v. 112, p. 57-62, 1999a.
SOMER, M.L.; WILLOCX, F.; van ROY, J. Standardized model for diagnosing
cervical carcinoma in situ based on the cytologic signs. Acta Cytologica,
Chicago, v. 31, n. 6, p. 878-882, 1987.
b) Caso você participe da pesquisa, não será necessário fazer exames, uma vez que, serão
utilizados esfregaços de material cervical coletado anteriormente para seu acompanhamento
de rotina.
c) A sua participação na pesquisa não acarretará desconfortos por não haver necessidade de
nenhum procedimento de coleta de material.
e) Estão garantidas todas as informações que você queira obter, antes, durante e depois do
estudo.
f) A sua participação neste estudo é voluntária. Você tem a liberdade de recusar participar do
estudo, ou, se aceitar participar, retirar seu consentimento a qualquer momento.
h) Todas as despesas necessárias para a realização da pesquisa (como exames, etc) não são
de responsabilidade do paciente.
i) Pela sua participação no estudo, você não receberá qualquer valor em dinheiro.
j) Quando os resultados forem publicados, não aparecerá seu nome, e sim um código.
QUESTIONÁRIO
6) Qual a média de lâminas avaliadas por observador por dia em seu laboratório?
Caso julgue pertinente faça sugestões em relação ao trabalho que estamos realizando
ou sugira algo que possamos adicionar ao nosso estudo (algo que constitua uma
dificuladade laboratorial por exemplo).
126
Adequação da amostra:1
Satisfatória para avaliação
Insatisfatória
amostra não processada
amostra processada e avaliada, mas insatisfatória para avaliação
Observações:
Categorização Geral:
Negativa para lesão intraepitelial ou malignidade ( )
Anormalidades em células epiteliais: células escamosas ( ) células glandulares ( )
Outros ...................................................................................................
Interpretação/Diagnóstico *:
Normalidade
Alterações celulares reativas ou reparativas ( )6
Organismos ( )4;
Efeitos citopáticos de organismos ( )5
Reação Inflamatória: leve ( ) moderada ( ) acentuada ( )
Lesão Intraepitelial de Baixo Grau (LSIL) – displasia leve/NIC I7
Notas Educacionais:
http://bethesda2001.cancer.gov/terminology.html
129