SR Esqueleto
SR Esqueleto
SR Esqueleto
PROFESSOR-ALUNO-
-CONHECIMENTO
vamos começar a dar aulas de Ciênciasl C)timo; mas será que sabemos
como se dá a construçãodo conhecimento científico? O que devemossaber e
saber fazer para ensinar Ciências?
Neste capítulo analisaremos a experiência de um jovem professor que foi
dar aula para criançasde 6 e 7 anos. Pelaanálisedesse relato apresentaremos
princípios básicos relacionados à orientação construtivista para o ensino-apren-
dizagem. Em seguida exploraremos a natureza do conhecimento científico de
maneira coerente com estes princípios: uma construção de mentes humanas,
vinculada ao contexto social e sujeita a mudanças.
CAPÍTULO l PROFESSOR-ALUNO-CONHECIMENTO 7
l
De olho na sala de aula Professor se o esqueleto está aí, como é que ele morreu?
-- Ué! -- exclamei, por considerar a resposta óbvia demais. Ele está aqui, mas
Boatarde.sr.Esqueleto! jó não tem mais vida. Ele está morto. EZechegou aqui porque nós o trouxemos para a
Ainda me lembro com certa clarezade uma das primeiras aulasque dei para escola.
criançasde 6 e 7 anos.Era recém-formadoe julgava ter um bom conhecimentoe Não, pr($essor! O qüe eu quero saber é como é qtle eie morreu.
domínio das ciências. Julgava também conhecer suficientemente bem a psicologia Comoassim,como ele morreu?
infantil e, portanto, estar apto para "enfrentar" as criançasem sala de aula. Sentia- Ora, como eZemorreu,pr(#essor?
me seguro e convicto de que tudo daria certo. Afinal, naquela época pensava:o que Meu avõ morreu de velhice, professor -- disseuma outra criança.
pode ser mais simples do que dar aula de Ciências para crianças?
É. O meu tio-avõ também morreu porque era velho. E a minha mãe me disseque
Começariapor mostrar-lhesum esqueletodo corpo humano. Afinal, sabiamuito rodo mundo, quando.Êca velho, morre de velhice.
bem o nome dos principais ossosdo nosso corpo, havia um esqueleto em tamanho real
Bom... Este aqui. Este aqui... -- e ZÓestava eü, gagudando novamente -- este
à disposição,criançassuperanimadaspara vê-lo e 50 minutos inteiros pela frente.
aqui... também morreu de velhice! -- disse./inaZmente,não mtiíto convencido de minha
Também acreditava saber lidar adequadamente com as crianças: falava com elas
resposta.
em um tom diferente daquele que existe na fala entre adultos. Era atencioso, gostava
delas
e Ah, bom, que nem o meu avõ.
-- Eu não conheçoninguém qtiejá morreu, professor -- disseuma criança que até
Então, era só chegar diante das crianças e mostrar-lhes as costelas, os ossos das
entãoestavaquieta.
pernas e dos braços, indicar-lhes que os pés e as mãos tinham muitos ossinhos,
Devo afirmar que, a essaaltura, a aula começava a ficar muito mais interessante
dizer-lhes o nome de algumas partes do nosso esqueleto.
para mim do que para as crianças. Pessoalmente, acho que já estava mais curioso do
Mas mal as crianças se encontraram frente a frente com o esqueleto, situações
que elas para saber detalhes como: "De quem tinha sido aquele esqueleto?","Como
inesperadas começaram a acontecer:
ele veio parar em nossaescola?","Será que a tal pessoatinha mesmo morrido de
-- Boa tarde, sr Esqueleto!-- algumas delas diziam, esticando as mãosna intenção velhice?'
de cumprimenta-Zo.
E eu, qüe estou viva, também tenho üm... esqueletodesses? perguntotl-me
Boa tarde, tio EsqueZetoJ-- diziam outras, qüe estavam com medo de encostar no uma mesma
esqueleto, mas levantavam as mãos, acenavam elaziam caretas estranhas.
-- Sim, todos nós temos um esqueleto -- respondi
Então comecei a sentir algo um tanto quanto paradoxal: ao mesmo tempo que
-- Onde é qüe.$ca o meü? -- pe7lguntaram alguns em coro.
me animavam e agradavam aquelasatitudes infantis, preocupava-me o fato de que a
-- Bom, o esqueletoda gente.#ca dentro de nós. Dá até para sentir Estão vendo as
situação parecia fugir do meu controle. Seguiu-seentão um diálogo mais ou menos
assim: costelas aqtli do sr Esqueleto?
Qual é o nome dele?-- perguntou-me tina aluna. . Ah, então o nome do esqueleto é Esqueleto mesmo, professor?
É, sím. Pois bem, continuando... --Jui dizendo, como se quisesseenganar a mim
Nome?/ Como assim, nome?! -- perguntei, um tanto descotzcertadoe quase
mesmo, supondo-me senhor de toda a linha de argumento, com o pensamento bastante
gagüdarldo.
estruturado.
Ué?/ O nome dele, pr(@ssor É nome de homem ou de mulher?
-- VocêestavalaZandodas costelas,professor -- disse üma criança, que na verdade
Fala logo, professor ç2ua!é o nome dele? Todo mundo [em tlm nome! dizia
parecia ter muito mais certeza dos ramos da aula do que eü.
outro de seuscolegas.
Pois então, as costelas/ Obsewem as costelas do st: Esqueleto. Eü estou passando
-- Bom, mas acortfeceque eZenão é igual a todo mundo -- aproveitei para dizei
a mão nelas. Agora eu volt passar as mãos nas minhas costelas.Dá até para perceber
com toda a minha autoHdade científica. EZeestá morto/ -- continuei, tentando colo-
que elas são parecidas. Vamos sentir nossas costelas?
car üm ponto-#ínaZnaquela discussãosemsentido para mim.
E começaram todos eles a mexer os braços. Contorceram-se, apalparam as pró-
Ah, pr(Zfessor! Morto?.r Ah, qüe nojento.r
prias costelas.Levantavamas camisas,encolhiam a barriga e tentavam mostrar as
-- Como é que eie pode estar morro?! -- admirou-se uma criança, insisfindc2em costelas uns aos outros
discutir o assunto.
Mas a minha mãe melaloti qüe a costela é um osso/ Não é esqüeZefo! protestou
SÓentão percebi que já era tarde: a aula estava ficando fora de controle. Jamais um menino.
havia imaginado uma conversa daquelas,justamente na aula sobre o esqueleto.
Mas é tudo osso! Você não sabe que o esqueleto é inteihnho de osso?Não é, pro-
Já que a aula parecia tomar esserumo, aproveitei o interesse das crianças e, pro- /essor? -- interpelou outro.
curando manter certo rigor em relação às minhas propostas didáticas, imaginei que -- Sim, vocêestácerto..
seria bom começar a mencionar mais algumas informações sobre o esqueleto nas
De repente, uma garota apalpou o próprio pulso e me disse
minhas falas. Mas colocar essaideia em prática não foi tão simples.
-- Aqui também tem osso,não tem, professor?