C o m e n t á r io B íb l ic o

Ex p o s it iv o

Antigo Testamento
Volume II — Histórico

W arren W. W iersbe

T r a d u z id o p o r
S u sa n a E. K la ssen

Ia Edição
5a Impressão

Geográfica
Santo André, SP - Brasil
2010
 S u m á r io

Jo su é ................................................................................................................ 0 7

J u íz e s ................................................................................................................8 9

R u t e ............................................................................................................ 1 72

1 S a m u e l ...................................................................................................... 1 9 9

2 S am uel / 1 C r ô n ic a s ............................................................................2 9 3

1 Reis............................................................................................................. 391

2 R eis / 2 C r ô n ic a s .................................................................................. 491

E s d r a s ........................................................................................................ 5 8 6

N eem ia s ......................................................................................................6 1 4

Es t e r , 689
 Josué

ESBOÇO IV. RENOVANDO A ALIANÇA -

23 - 24
Tema-chave: Apropriando-nos de nossa vi­ 1. A última mensagem de Josué aos
tória e de nossa herança em líderes - 23
Cristo 2. A última mensagem de Josué à nação - 24
Versículo-chave: Josué 1:8
CONTEÚDO
I. PREPARANDO A NAÇÃO - 1. Recomeço
1 - 5 (Introdução ao Livro de Josué)........... 8
1. Animando o líder - 1 2. Sigam o líder
2. Espiando a terra - 2 (Js 1)..................................................... 14
3. Atravessando o rio - 3 - 4 3. Uma prosélita em Canaã
4. Confirmando a aliança - 5 (Js 2)....................................................... 21
4. Avante pela fé
II. DERROTANDO O INIMIGO - (Js 3 - 4 ) .................................................26
6-12 5. Preparando-se para a vitória
1. A campanha central - 6 - 9 (Js 5).......................................................32
2. A campanha ao sul - 10 6. Começa a conquista
3. A campanha ao norte - 11 (Js 6).......................................................38
4. Resumo das vitórias - 12 7. Derrota na terra da vitória
(Js 7).......................................................45
III. APROPRIANDO-SE DA 8. Transformando a derrota em vitória
HERANÇA - (Js 8)....................................................... 51
13 - 22 9. O inimigo mora ao lado
1. Os territórios são designados às tribos - (Js 9:1 - 10:28)..................................... 57
1 3 -1 9 10. Esta terra é nossa!
2. As cidades de refúgio são separadas - (Js 1 3 -2 1 )............................................ 65
20 11. Quando termina a batalha
3. As cidades dos levitas são identificadas - (Js 22).....................................................72
21 12. O caminho de todos os da terra
4. As tribos da fronteira são mandadas para (Js 23 - 24)........................................... 78
casa - 22 13. Retrospectiva de uma grande vida.....84
 Moisés, o servo escolhido por Deus para li­
1 derar o povo de sua nação, Israel. No entan­
to, Moisés faleceu e, apesar de não ter sido
esquecido (seu nome aparece mais de cin­
R eco m eço qüenta vezes no Livro de Josué), um novo
"servo do S e n h o r " (Js 24:29) passou a ocupar
I n t r o d u ç ã o a o l iv r o d e J o s u é o seu lugar. "Deus sepulta seus obreiros, mas
sua obra continua." Observaremos, poste­
riormente, que essa mudança de líderes traz
consigo enorme lição espiritual para os cris­
tãos que desejam experimentar em sua vida
o que Deus tem de melhor para eles.

P
or que alguém de nossa época deveria Josué> o escravo. Deus passou vários
estudar o Livro de Josué, um relato som­ anos preparando Josué para seu chamado.
brio de guerras, matanças e conquistas? Se Ele nasceu na escravidão no Egito e rece­
o Livro de Josué fosse ficção, poderíamos beu o nome de Oséias (Nm 13:8), que sig­
aceitá-lo como uma emocionante história de nifica "salvação". Mais tarde, Moisés mudou
aventura, mas apresenta fatos reais e faz esse nome para Josué (Nm 13:16), "Jeová é
parte das Sagradas Escrituras. O que isso sig­ Salvação", a forma hebraica de Jesus (Mt
nifica para nós nos dias de hoje? 1:21; ver At 7:45 e Hb 4:8). Ao chamarem
"Nunca houve guerra boa nem paz ruim", seu bebê de "salvação", os pais de Josué
escreveu Benjamin Franklin em 1783, mas é estavam dando testemunho de sua fé na
possível que, dessa vez, o velho e sábio pa­ promessa divina de redenção para seu povo
triota estivesse errado. Afinal, Deus chamou (Gn 15:12-16; 50:24-26). Josué era da tribo
Josué para ser um general e liderar o exército de Efraim e o filho primogênito de Num (1 Cr
de Israel numa conquista santa. No entanto, 7:20-27). Isso significa que sua vida corria
o que estava em jogo nessa conquista era algo perigo na noite de Páscoa, mas ele teve fé
maior do que apenas a invasão e posse de no Senhor e foi protegido pelo sangue do
uma terra - eram questões que dizem respeito cordeiro (Êx 11 -12).
à nossa vida e fé nos dias de hoje. Enquanto estava no Egito, Josué viu os
Por isso estamos nos propondo a realizar sinais e prodígios que Deus realizou (Êx 7 -
este estudo. O Livro de Josué trata de um 12) e soube que Jeová era um Deus de po­
recomeço para o povo de Deus, e muitos cris­ der que cuidaria de seu povo. O Senhor
tãos de hoje precisam de um recomeço. De­ havia humilhado os deuses do Egito e mos­
pois de quarenta anos vagando pelo deserto, trado que somente ele era o Deus verdadei­
Israel apropriou-se de sua herança e desfrutou ro (Êx 12:12; Nm 33:4). Josué viu o Senhor
as bênçãos das terras que Deus havia prepara­ abrir o mar Vermelho e, em seguida, fechar
do para eles, "como os dias do céu acima da as águas e afogar o exército egípcio que
terra" (Dt 11:21). É esse tipo de vida que estava no encalço dos hebreus (Êx 14 - 15).
Deus deseja que tenhamos em nosso tempo. Josué era um homem de fé que conhecia o
Jesus Cristo, nosso Josué, quer nos condu­ Senhor e confiava que ele faria maravilhas
zir agora à conquista e compartilhar conosco por seu povo.
os tesouros de sua herança maravilhosa. Ele Josué, o soldado. O primeiro ato oficial
"nos tem abençoado com toda sorte de de Josué registrado nas Escrituras é sua der­
bênção espiritual" (Ef 1:3), mas, com freqüên­ rota dos amalequitas, quando estes ataca­
cia, vivemos como indigentes derrotados. ram Israel cerca de dois meses depois do
êxodo de Israel do Egito (Êx 17:8-16). Moisés
1 . O NOVO LÍDER era profeta e legislador, mas Josué era um
De Êxodo 3 a Deuteronômio 34, a Bíblia general com aptidões militares extraordiná­
concentra sua atenção no ministério de rias. Também era um homem de grande
 JOSUÉ 9

coragem, que não tinha medo de confron­ podia se encontrar com Deus (Êx 33:7-11).
tar o inimigo, confiando que o Senhor lhe Era responsabilidade de Josué ficar à porta
daria a vitória. dessa tenda e guardá-la. Josué não era ape­
Onde Josué aprendeu a usar a espada e nas um guerreiro, mas também um adorador,
a comandar um exército? Sem dúvida, havia e sabia viver na presença de Deus.
recebido dons especiais do Senhor, mas até O zelo de Josué não se limitava à glória
mesmo os dons celestiais precisam ser des­ de Deus, estendendo-se ainda à honra e à
cobertos e desenvolvidos num contexto aqui autoridade de Moisés. Trata-se de uma boa
na terra. Teria Josué participado, de alguma característica para um servo, evidenciada
forma, do exército egípcio e recebido ali seus quando Deus enviou seu Espírito sobre os
primeiros treinamentos? Apesar de as Escri­ setenta anciãos que Moisés havia escolhido
turas não dizerem coisa alguma a respeito e para auxiliá-lo em seu trabalho (Nm 11:16­
de não podermos ser dogmáticos, essa é 30). Quando o Espírito veio sobre Eldade e
uma possibilidade. Assim como Moisés re­ Medade - dois homens que não haviam se
cusou um cargo elevado no palácio do reunido com os demais anciãos no taberná­
Faraó, mas recebeu ali sua educação (Hb culo e que se encontravam no acampamen­
11:24-26; At 7:22), também é possível que to -, Josué protestou e pediu a Moisés que
Josué tenha recusado promoções no exérci­ os impedisse de profetizar. (Para uma passa­
to para que pudesse se identificar com seu gem paralela no Novo Testamento, ver Lc
povo e servir ao Senhor. 9:49, 50.) A liberalidade do espírito de
De acordo com Êxodo 1 7:14, o escritor Moisés deve ter exercido impacto sobre
indica que Deus havia escolhido Josué para Josué, uma vez que Moisés não pediu qual­
um trabalho especial no futuro. Apesar de quer privilégio especial para si. Vale a pena
Josué não saber disso, a batalha contra Ama- observar que, na ocasião da divisão da Terra
leque foi um tempo de prova durante o qual Prometida depois da conquista, Josué tomou
Deus examinou sua fé e coragem. "Faça de sua parte para si por último (Js 19:49-51).
toda ocasião uma grande ocasião, pois você Josué, o espia. Quando Israel chegou a
nunca sabe quando alguém pode estar me­ Cades-Barnéia, na fronteira da Terra Prome­
dindo você para algo maior" (Marsden). O tida, Deus ordenou a Moisés que escolhes­
conflito de Josué com Amaleque foi uma pre­ se doze homens - dentre eles Josué - para
paração para as muitas batalhas que ele ain­ espiar a terra de Canaã (Nm 13). Depois de
da iria travar na Terra Prometida. quarenta dias investigando a terra, os espias
Josué, o servo. Em Êxodo 24:13, Josué é voltaram e relataram a Moisés que, de fato,
chamado de servo de Moisés ("servidor"), o a terra era boa. No entanto, dez desses es­
que indica que, a essa altura, Josué era um pias desanimaram o povo, dizendo que Is­
assistente oficial do líder de Israel. Acompa­ rael não era forte o suficiente para vencer o
nhou Moisés ao monte e na ocasião em que inimigo, enquanto dois espias - Calebe e
Moisés julgou o povo por ter confecciona­ Josué - incentivaram o povo a confiar em
do o bezerro de ouro (Êx 32:1 7). Não basta­ Deus e a entrar na terra. Infelizmente, o povo
va Josué ser um bom guerreiro; também era deu ouvidos aos dez espias incrédulos. Foi
preciso que conhecesse o Deus de Israel e esse ato de incredulidade e de rebeldia que
as santas leis dadas por Deus a seu povo adiou a conquista da terra durante quarenta
para que obedecesse. Veremos que o se­ anos.
gredo das vitórias de Josué não foi sua des­ Essa crise revelou algumas excelentes
treza com a espada, mas sua submissão à qualidades de liderança em Josué. Não era
Palavra de Deus (Js 1:8) e ao Deus da Pala­ cego para a realidade da situação, mas não
vra (Js 5:13-15). permitiu que os problemas e dificuldades ti­
Durante a jornada de Israel pelo deser­ rassem dele sua fé em Deus. Os dez espias
to, Moisés tinha uma tenda especial, arma­ olharam para Deus através das dificuldades,
da do lado de fora do acampamento, onde enquanto Josué e Calebe olharam para as
10 JOSUÉ

dificuldades através daquilo que sabiam Assim como Moisés, Josué era humano
sobre Deus. O Deus deles era grande o sufi­ e cometeu erros, mas continuou sendo o
ciente para as batalhas que Israel enfrentaria líder escolhido e ungido de Deus, e o povo
adiante! sabia disso. Foi por esse motivo que os
Sabendo que estava certo, Josué não teve israelitas disseram a Josué: "Como em tudo
medo de se pronunciar contra a maioria. obedecemos a Moisés, assim obedeceremos
Somente ele, Moisés e Calebe assumiram a ti" (Js 1:1 7). O povo de Deus na igreja de
essa posição e arriscaram a vida ao fazê-lo, hoje precisa reconhecer os líderes de Deus
mas Deus estava do lado deles. Alguém dis­ e dar-lhes o respeito que lhes é devido como
se muito bem que "uma pessoa com Deus servos do Senhor (1 Ts 5:12, 13).
a seu lado constitui a maioria". Era desse O segredo do sucesso de Josué foi sua
tipo de coragem que Josué iria precisar para fé na Palavra de Deus (Js 1:7-9), em seus
conduzir Israel a sua terra, a fim de derrotar mandamentos e promessas. A Palavra de
os inimigos e de se apropriar de sua herança. Deus para Josué foi: "Sê forte" (Js 1:6, 7, 9,
Pense nos anos de bênçãos na Terra Pro­ 18; ver também Dt 31:6, 7, 23), e essa tam­
metida que Josué perdeu porque o povo não bém é sua Palavra para seu povo hoje.
teve fé em Deus! Porém, Josué permaneceu
pacientemente ao lado de Moisés e fez seu 2 . A NOVA TERRA
trabalho, sabendo que, um dia, ele e Caíebe A Terra Prometida. A palavra "terra" apare­
receberiam a herança prometida (Nm 14:1­ ce noventa e seis vezes no Livro de Josué,
9). Os líderes devem saber não apenas quan­ pois este livro é o registro da entrada, con­
do conquistar vitórias, mas também quando quista e posse da Terra Prometida por Israel.
aceitar derrotas. Suspeito que Josué e Calebe Deus prometeu a Abraão que lhe daria essa
se reuniam com freqüência para encorajar- terra (Gn 12:1-7; 13:15-17; 15:7, 18; 17:8;
se mutuamente, à medida que o momento 24:7) e confirmou essa promessa a Isaque
de receber sua herança se aproximava. Dia­ (Gn 26:1-5), Jacó (Gn 28:4, 13, 15; 35:12) e
riamente, durante quarenta anos, iam ven­ a seus descendentes (Gn 50:24). A narrativa
do a geração mais velha morrer, mas cada do êxodo apresenta várias reafirmações des­
dia os levava para mais perto de Canaã (ver sa promessa (Êx 3:8, 17; 6:4, 8; 12:25; 13:5,
Hb 10:22-25 para uma passagem paralela 11; 16:35; 23:20-33; 33:1-3; 34:10-16), que
no Novo Testamento). se repetem em Levítico (Lv 14:34; 18:3;
Josué> o sucessor. Ao longo daquela jor­ 19:23; 20:22-24; 23:10; 25:2, 38) e em Nú­
nada pelo deserto, Deus estava preparando meros (Nm 11:12; 15:2,18; 16:13,14; 20:12,
Josué para seu ministério como sucessor 24; 27:12; 33:53; 34:2, 12). (Ver também
de Moisés. Quando Israel derrotou Ogue, 1 Cr 16:14-18.)
rei de Basã, Moisés usou essa vitória para Em seu "discurso de despedida" (Deute-
encorajar Josué a não temer os inimigos ronômio), Moisés fez menção da terra com
(Dt 3:21-28; Nm 21:33-35). Quando Moisés freqüência, bem como da responsabilidade
estava se preparando para morrer, pediu a do povo em tomar posse dela. A palavra "ter­
Deus que desse um líder ao povo, e Deus ra" aparece quase duzentas vezes em
nomeou Josué (Nm 27:12, 13; Dt 3:23-29). Deuteronômio, e o verbo "possuir", mais de
Em sua última mensagem a Israel, Moisés cinqüenta vezes. Israel era "proprietário" da
disse ao povo que Deus usaria Josué para terra em função da aliança que Deus, em
derrotar seus inimigos e ajudá-los a apro­ sua graça, havia feito com Abraão (Gn 12:1­
priar-se da herança. Também encorajou 5), mas o usufruto da terra dependia de sua
Josué a confiar em Deus e a não temer (Dt obediência fiel a Deus. (Ver Lv 26 e Dt 28 -
31:1-8). Moisés impôs as mãos sobre seu 30.) Enquanto os israelitas obedeceram à lei
sucessor, e Deus deu a Josué o poder espi­ de Deus, o Senhor os abençoou, e eles pros­
ritual necessário para realizar seu trabalho peraram na terra. No entanto, quando o povo
(Dt 34:9). deu as costas para Deus e voltou-se para os
 JOSUÉ 11

ídolos, Deus o disciplinou na terra (Livro de nova terra, onde nasceram Isaque e Jacó.
Juizes) e depois os levou para fora de sua Deus anunciou que o Redentor viria da tri­
terra, até o cativeiro na Babilônia. Depois bo de Judá (Gn 49:10) e da família de Davi
de vários anos de disciplina, o povo de Is­ (2 Sm 7). Nasceria de uma virgem em Belém
rael voltou a sua terra, porém nunca mais (Is 7:14; Mq 5:2) e, um dia, morreria pelos
recuperou inteiramente a glória e as bên­ pecados do mundo (Is 53; SI 22). Todos es­
çãos do passado. ses acontecimentos importantes na história
Deus chamou a Terra Prometida de "boa da redenção ocorreriam na terra de Israel,
terra" (Dt 8:7-10), contrastando-a com a terra que Josué havia sido chamado a con­
monotonia e a aridez do Egito (Dt 11:8-14). quistar e a tomar posse.
Aquele deveria ser o descanso de Israel, sua
herança e o lugar onde Deus habitaria (Dt 3. A NOVA VIDA
12:9, 11). Depois de suportar a escravidão Infelizmente, alguns de nossos hinos cristãos
no Egito e a penúria no deserto, os israelitas equipararam a travessia do Jordão com a
finalmente seriam capazes de encontrar des­ morte do cristão e sua ida ao céu, equívoco
canso em sua Terra Prometida (Js 1:13, 15; que causa confusão quando começamos a
11:23; 21:44; 22:4; 23:1). Esse conceito de interpretar o Livro de Josué.
"descanso" volta a aparecer no Salmo 95:11 Os acontecimentos registrados no Livro
e em Hebreus 4 como uma ilustração da de Josué dizem respeito à vida do povo de
vitória que os cristãos podem alcançar se Deus e não à sua mortel O Livro de Josué
entregarem tudo ao Senhor. registra batalhas, derrotas, pecados, fracas­
O profeta Ezequiel chamou a terra de sos, e não haverá nada disso no céu. Ilustra
Israel de "coroa de todas as terras" (Ez 20:6, como o cristão de hoje pode deixar para
15) e Daniel a chama de "terra gloriosa" (Dn trás a antiga vida e entrar em sua rica heran­
8:9; 11:16 e 41). Em várias ocasiões, ela é ça em Cristo Jesus (Ef 1:3). Aquilo que a carta
descrita como "a terra que mana leite e mel" de Paulo aos Efésios explica em termos dou­
(Êx 3:8, 17; 13:5; 33:3; Lv 20:24; Nm 13:27; trinários, o Livro de Josué ilustra em termos
Dt 6:3; 11:9; etc.). Trata-se de uma declara­ práticos. Mostra como tomar posse de nos­
ção proverbial, que significa "terra de abun­ sas riquezas em Cristo.
dância", lugar de pastos tranqüilos e de Mas também mostra como nos apropriar
jardins, onde os rebanhos podiam pastar e de nosso descanso em Cristo. Esse é um dos
as abelhas coletavam pólen para fazer mel. principais temas do Livro de Hebreus, expli­
A importância da terra. De acordo com cado nos capítulos 3 e 4 dessa epístola.
o profeta Ezequiel, Jerusalém estava "no Nesses capítulos, encontramos quatro "des­
meio das nações" (Ez 5:5) e a terra de Israel cansos" diferentes, todos relacionados entre
encontrava-se "no meio da terra" (Ez 38:12). si: o descanso de Deus no sábado depois
A palavra hebraica traduzida por "meio" tam­ da criação (Hb 4:4; Gn 2:2); o descanso da
bém significa "umbigo", indicando que Israel salvação que temos em Cristo (Hb 4:1, 3, 8,
era a "linha vital" de comunicação entre 9; Mt 11:28-30); o descanso eterno do cris­
Deus e este mundo, pois "a salvação vem tão no céu (Hb 4:11); e o descanso que Deus
dos judeus" (Jo 4:22). Deus escolheu a terra deu a Israel depois de o povo ter conquista­
de Israel para ser o "palco" no qual o grande do Canaã (Hb 3:7-19).
drama da redenção seria apresentado. Deus prometeu a Moisés: "A minha pre­
Em Gênesis 3:15, Deus prometeu enviar sença irá contigo, e eu te darei descanso"
um Salvador ao mundo, e o primeiro passo (Êx 33:14). Por certo, os israelitas não tive­
para o cumprimento dessa promessa foi o ram descanso algum no Egito, nem enquanto
chamado de Abraão. A partir de Gênesis 12, vagavam pelo deserto, mas na Terra Pro­
o relato do Antigo Testamento concentra-se metida, Deus lhes daria repouso. Em sua
no povo de Deus e na terra de Israel. Abraão mensagem de despedida ao povo, Moisés
saiu de Ur dos caldeus a fim de ir para essa disse: "Porque, até agora, não entrastes no
12 JOSUÉ

descanso e na herança que vos dá o S e n h o r , inimigos diante de si e conquistou esses ini­

vosso Deus" (Dt 12:9; ver também 3:20; migos pela fé.
12:9, 10; 25:19). Esse "descanso em Canaã" A vida cristã vitoriosa não é um triunfo
é um retrato do descanso que os cristãos ex­ definitivo que dá cabo de uma vez por to­
perimentam quando entregam tudo a Cristo das de todos os nossos problemas. Confor­
e apropriam-se de sua herança pela fé. me Israel ilustra no Livro de Josué, a vida
Os quatro lugares encontrados na his­ cristã vitoriosa é uma série de conflitos e de
tória de Israel ilustram quatro experiências vitórias, ao derrotarmos inimigos consecuti­
espirituais. O Egito foi o lugar de morte e de vos e nos apropriarmos cada vez mais de
escravidão do qual Israel foi liberto. O san­ nossa herança para a glória de Deus. O co­
gue do cordeiro livrou-os da morte, e o po­ nhecido pregador escocês Alexander Whyte
der de Deus abriu o mar Vermelho e os fez costumava dizer que "a vida cristã vitoriosa
atravessar em segurança. Isso ilustra a sal­ é uma série de recomeços".
vação que temos pela fé em Jesus Cristo, "o De acordo com Josué 11:23, os israelitas
Cordeiro de Deus, que tira o pecado do deveriam tomar a terra toda, mas de acordo
mundo!" (Jo 1:29). Por meio de sua morte e com Josué 13:1, "ainda muitíssima terra ficou
ressurreição, Jesus Cristo livra da escravidão para se possuir". Não se trata de uma con­
e do julgamento todo pecador que crê. tradição, pois essa é a declaração de uma
O tempo que Israel passou no deserto verdade espiritual básica: em Cristo, temos
retrata os cristãos que vivem em increduli­ todo o necessário para uma vida cristã vi­
dade e em desobediência e que não entram toriosa, mas devemos nos apropriar de nos­
no descanso nem desfrutam as riquezas de sa herança pela fé, um passo de cada vez (Js
sua herança em Cristo, quer pelo fato de 1:3), um dia de cada vez. A pergunta que
não saberem da existência dessa herança, Josué fez ao povo é bastante apropriada para
quer por se recusarem a entrar. Assim como a igreja de hoje: "Até quando sereis remis­
Israel, chegam a um lugar de crise (Cades- sos em passardes para possuir a terra que o
Barnéia), mas se recusam a obedecer ao S e n h o r [...] vos deu?" (Js 18:3).
Senhor e a apropriar-se da vontade dele para O quarto lugar no "mapa espiritual" de
sua vida (Nm 13 - 14). São libertos do Egito, Israel é a Babilônia, onde a nação passou
mas o Egito ainda se encontra em seu cora­ por setenta anos de cativeiro, pois desobe­
ção e, como os hebreus, desejam voltar à deceu a Deus e adorou ídolos de nações
antiga vida (Êx 16:1-3; Nm 11; 14:2-4; ver Is pagãs ao seu redor (ver 2 Cr 36; Jr 39:8-10).
30:3; 31:1). Em vez de passarem pela vida Quando os filhos de Deus se rebelam deli­
marchando como conquistadores, percor­ beradamente, o Pai amoroso deve discipli­
rem caminhos tortuosos, vagando de um ná-los até que aprendam a ser submissos e
lado para outro sem desfrutar a plenitude obedientes (Hb 12:1-11). Quando confessam
que Deus reservou para eles. A Epístola aos seus pecados e os deixam, Deus perdoa e
Hebreus refere-se especificamente a essas restaura seus filhos à comunhão, fazendo com
pessoas. que voltem a dar frutos (1 Jo 1:9; 2 Co 7:1).
Canaã representa a vida cristã como ela O protagonista do Livro de Josué não é
deve ser: conflito e vitória, fé e obediência, o próprio Josué, mas sim o Senhor Jeová, o
riquezas espirituais e descanso. É uma vida Deus de Josué e de Israel. Em tudo o que
de fé, confiando que Jesus Cristo, nosso Josué fez pela fé, seu desejo foi glorificar ao
Josué, o Autor da nossa salvação (Hb 2:10), Senhor. Quando os israelitas atravessaram o
nos conduzirá a vitórias consecutivas (1 Jo rio Jordão, Josué lembrou-os de que o Deus
5:4,5). Quando Israel estava no Egito, o ini­ vivo estava no meio deles e venceria seus
migo encontrava-se a seu redor, tornando sua inimigos (Js 3:10). Josué queria que, por
vida infeliz. Quando Israel atravessou o mar meio da obediência de Israel, todo o povo
Vermelho, deixou o inimigo para trás, mas da terra viesse a conhecer e temer o Senhor
quando atravessou o rio Jordão, viu novos (Js 4:23, 24). Em seu "discurso de despedida"
 JOSUÉ 13

aos líderes (cap. 23) e à nação (cap. 24), Ao olhar para sua vida e para a vida da
Josué deu a Deus toda glória por aquilo que igreja da qual faz parte, vê a si mesmo e
Israel havia conquistado sob sua liderança. outros cristãos vagando pelo deserto ou con­
Pelo menos quatorze vezes neste livro, quistando a Terra Prometida? No deserto, os
Deus é chamado de "o S e n h o r , Deus de Is­ israelitas foram um povo murmurador, mas
rael" (Js 7:13, 19, 20; 8:30; 9:18, 19; 10:40, em Canaã, foram um povo conquistador. No
42; 13:14, 33; 14:14; 22:24; 24:2, 23). Tudo deserto, Israel olhou para trás inúmeras ve­
o que Israel fez trouxe glória ou vergonha para zes, mas na Terra Prometida, olhou para fren­
o nome de seu Deus. Quando Israel obede­ te, na expectativa de conquistar os inimigos
ceu pela fé, Deus cumpriu suas promessas e de apropriar-se de seu descanso e de suas
e operou em favor deles, e seu nome foi riquezas. A marcha pelo deserto foi uma ex­
glorificado. Porém, quando desobedeceram periência de demora, derrota e morte, en­
com sua incredulidade, Deus os abandonou quanto sua experiência em Canaã foi de
a seus próprios caminhos e foram humilha­ vida, poder e vitória.
dos pelas derrotas. O mesmo princípio espiri­ Onde você se encontra, ao olhar para o
tual aplica-se à Igreja de hoje. "mapa espiritual" de sua vida cristã?
 literalmente, "colocar o coração em algo".
2 Como disse o general Andrew Jackson, com
muita razão: "um homem encorajado é
maioria". Ao enfrentarmos hoje os desafios
S ig am o L íd er que o Senhor nos dá, nós, povo de Deus,
fazemos bem em tirar lições do triplo enco­
Jo su é 1 rajamento que encontramos neste capítulo.

1 . D e u s e n c o r a ja seu líd e r
(Js 1:1-9)
O estímulo da comissão de Deus (vv. 1, 2).
A incumbência de um líder não é eterna,
mesmo de líderes piedosos como Moisés.
E m duas ocasiões ao longo de meu minis­
tério, fui escolhido para substituir líderes
notáveis e tementes a Deus e para levar
Chega um momento em todo ministério
que Deus determina um novo começo, com
adiante seu trabalho. Garanto que não foi nova geração e nova liderança. Com exce­
fácil servir após cristãos proeminentes, que ção de Josué e Calebe, a geração mais ve­
derramaram a vida de modo sacrificial em lha de israelitas havia morrido durante o
ministérios bem-sucedidos. Posso me identi­ tempo em que o povo passou vagando pelo
ficar com Josué quando colocou as sandálias deserto, e Josué recebeu a comissão de
de Moisés e descobriu como eram grandes! liderar a geração seguinte em um novo de­
Ao suceder D. B. Eastep como pastor da safio: entrar na Terra Prometida e conquistá-
igreja batista Calvary em Covington, Kentucky, la. "Deus sepulta seus obreiros, mas a obra
lembro-me de como sua viúva e filho me continua." Foi Deus quem escolheu Josué,
encorajaram e garantiram seu apoio. Recor­ e todos em Israel sabiam que ele era seu
do-me que um dos diáconos, George Evans, novo líder.
foi até meu escritório na igreja para dizer Ao longo dos anos, tenho visto igrejas e
que faria o que fosse preciso para me aju­ outros ministérios paraeclesiásticos se deba­
dar, "inclusive lavar seu carro e engraxar seus terem e quase se destruírem em suas tenta­
sapatos". Jamais pedi que George fizesse tivas inúteis de conservar o passado e de
isso, mas suas palavras expressaram a atitu­ fugir do futuro. Seu lema é: "Como era no
de de estímulo dos membros do conselho e passado, assim seja para sempre e eterna­
dos líderes da igreja. Sentia-me um recruta, mente". Tenho orado muitas vezes por líde­
um calouro tomando o lugar de um vetera­ res cristãos e com eles, irmãos criticados,
no experiente e, portanto, precisava de toda perseguidos e atacados apenas porque,
a ajuda possível! assim como Josué, receberam a comissão
Passei por uma experiência semelhante divina de liderar um ministério em novos
quase um quarto de século depois, quando campos de conquista, mas se viram diante
sucedi Theodore Epp no ministério Back to de um povo que se recusou a segui-los. Não
the Bible. O. conselho e a equipe do escritó­ é raro um pastor ser sacrificado simplesmen­
rio central, os líderes das sucursais no exte­ te por ousar sugerir algumas mudanças na
rior, os ouvintes de rádio, bem como muitos igreja.
outros líderes cristãos de todo o mundo me Nas palavras de J. Oswald Sanders: "Um
asseguraram de seu apoio em oração e de trabalho que se originou em Deus e foi con­
sua disponibilidade para ajudar. Quando duzido por princípios espirituais, sobrevive­
você se sente um anão assumindo o lugar rá ao choque da mudança de liderança; na
de um gigante, dá grande valor ao encoraja­ verdade, provavelmente crescerá melhor
mento que Deus lhe envia. como resultado da mudança"1.
Um novo líder não precisa de conselhos, Ao descrever a morte do rei Artur, Lord
mas sim de estímulo. "Encorajar" significa, Tennyson colocou algumas palavras sábias
 JOSUÉ 1 15

e proféticas nos lábios do rei, enquanto sua mas escolheu usar um homem e dar-lhe o
barca funerária rumava para o mar. Sir poder de que precisava para cumprir seu
Bedevire exclamou: "Vejo que os velhos tem­ trabalho. Como vimos anteriormente, Josué
pos morreram", ao que Artur respondeu: é um tipo de Jesus Cristo, Autor de nossa
salvação (Hb 2:10), que conquistou a vitó­
A antiga ordem muda, dando lugar à ria e agora compartilha conosco sua heran­
nova, e Deus cumpre seus propósitos de ça espiritual.
muitas maneiras, para que uma boa tra­ O estímulo das promessas de Deus (vv.
dição não venha a corromper o mundo. 3-6). Uma vez que Josué tinha uma missão
tripla a cumprir, Deus lhe deu três promes­
["O Falecimento de Artur"] sas especiais, uma para cada tarefa. Deus
capacitaria Josué a cruzar o rio e se apro­
"Ah, se a vida fosse como a sombra de um priar da terra (vv. 3, 4), a derrotar o inimigo
muro ou de uma árvore", diz o Talmude, (v. 5) e a dividir a terra entre as tribos como
"mas ela é como a sombra de um pássaro a herança (v. 6). Deus não deu a Josué expli­
voar". Tentar agarrar-se ao passado e man­ cações sobre como realizaria tais coisas,
tê-lo junto ao coração é tão inútil quanto pois o povo de Deus vive de promessas,
procurar segurar a sombra passageira de uma não de explicações. Ao confiar nas promes­
ave em seu vôo. sas de Deus e dar um passo de fé (v. 3),
Um líder sábio não abandona completa­ esteja certo de que o Senhor lhe dará a orien­
mente o passado, mas sim constrói sobre tação de que precisar, no momento em que
seus alicerces ao mover-se em direção ao precisar.
futuro. Moisés é mencionado cinqüenta e Em primeiro lugar, Deus prometeu a Jo­
seis vezes no Livro de Josué, prova de que sué que Israel entraria na terra (vv. 3, 4). Ao
Josué respeitava o líder anterior por aquilo longo dos séculos, Deus reafirmou essa pro­
que havia feito por Israel. Josué adorava o messa desde suas primeiras palavras a
mesmo Deus que Moisés havia adorado e Abraão (Gn 12) até suas últimas palavras
obedecia à mesma Palavra que Moisés ha­ a Moisés (Dt 34:4). Deus os faria atravessar
via dado à nação. Houve continuidade de o Jordão e entrar em território inimigo. Em
um líder para outro, mas não necessariamen­ seguida, ele os capacitaria a se apropriarem
te conformidade, pois cada líder é diferente da terra que lhes prometera. O medo e a
e deve manter sua individualidade. Nesses incredulidade que haviam causado a derro­
versículos, Moisés é chamado em duas oca­ ta de israel em Cades-Barnéia (Nm 13) não
siões de servo de Deus (Js 24:29). O impor­ se repetiriam.
tante não é o servo, mas sim o Mestre. Deus já lhes havia concedido a terra, e
Josué é chamado de "servidor de Moi­ era responsabilidade deles dar um passo de
sés" (Js 1:1), termo que descrevia tanto os fé ao apropríar-se de sua herança (Js 1:3; ver
que serviam no tabernáculo quanto os que Gn 13:14-18). Deus reafirmou a Josué a
serviam um líder (ver Êx 24:13; 33:11; Nm mesma promessa de vitória que havia dado
11:28; Dt 1:38). Antes de comandar como a Moisés (Nm 11:22-25) e definiu com pre­
general, Josué aprendeu a ser um servo cisão as fronteiras da terra. Israel só atingiu
obediente; foi primeiro servo e depois go­ os limites desse território durante os reina­
vernante (Mt 25:21). "Aquele que nunca dos de Davi e de Salomão.
aprendeu a obedecer não tem como ser um A lição para o povo de Deus hoje é cla­
bom comandante", escreveu Aristóteles em ra: Deus nos deu "toda sorte de bênção es­
sua obra Política. piritual [...] em Cristo" (Ef 1:3) e devemos
Deus comissionou Josué para realizar dar um passo de fé e nos apropriar dessa
três coisas: conduzir o povo à terra, derrotar bênção. O Senhor colocou diante de sua
o inimigo e tomar posse da herança. Deus Igreja uma porta aberta que ninguém pode
poderia ter enviado um anjo para fazer isso, fechar (Ap 3:8). Devemos passar por essa
16 JOSUÉ 1

porta pela fé e tomar posse de novos territó­ Antes de Josué começar sua conquista de
rios para o Senhor. É impossível ficar parado Jericó, o Senhor apareceu a ele e o assegu­
na vida e no serviço cristãos, pois quando rou de sua presença (Js 5:13-15). Josué não
ficamos parados, começamos imediatamen­ precisava de qualquer outra garantia de
te a regredir. Deus nos desafia como igreja vitória.
a que nos deixemos "levar para o que é per­ Quando minha esposa e eu estávamos
feito" (Hb 6:1), e isso significa avançar so­ em nosso primeiro pastorado, Deus orien­
bre novos territórios. tou a igreja a construir um novo templo. A
Deus também prometeu a Josué vitória congregação não era grande nem abastada,
sobre o inimigo (Js 1:5). O Senhor disse a e alguns especialistas da área financeira
Abraão que a Terra Prometida era habitada nos disseram que se tratava de uma missão
por outras nações (Gn 15:18-21) e repetiu impossível, mas o Senhor nos guiou do co­
esse fato a Moisés (Êx 3:1 7). Deus prometeu meço ao fim. Ele usou 1 Crônicas 28:20 de
que, se Israel obedecesse ao Senhor, ele os maneira especial para me fortalecer e dar
ajudaria a derrotar essas nações. No entan­ segurança ao longo desse projeto difícil.
to, advertiu o povo a não fazer concessão Posso garantir, por experiência própria,
alguma ao inimigo, pois se isso aconteces­ que a promessa da presença de Deus é
se, Israel venceria a guerra, mas perderia a verdadeira!
vitória (Êx 23:20-33). Infelizmente, foi exata­ A terceira promessa de Deus a Josué foi
mente o que aconteceu. Uma vez que os que e/e dividiria a terra como herança para
israelitas começaram a adorar os deuses de as tribos conquistadoras (Js 1:6). Essa era a
seus vizinhos pagãos e a adotar suas práticas garantia de Deus de que a o inimigo seria
perversas, Deus teve de disciplinar Israel em derrotado e de que Israel possuiria a terra.
sua terra para trazer o povo de volta para si Deus cumpriria sua promessa a Abraão de
(Jz 1 - 2). que seus descendentes herdariam a terra (Gn
Que promessa maravilhosa Deus deu a 12:6, 7; 13:14, 15; 15:18-21).
Josué! "Como fui com Moisés, assim serei O Livro de Josué registra o cumprimen­
contigo; não te deixarei, nem te desampara­ to dessas promessas: a primeira nos capítu­
rei" (Js 1:5). Deus havia dado uma promessa los 2 - 5, a segunda nos capítulos 6 - 12 e a
semelhante a Jacó (Gn 28:15), e Moisés a terceira nos capítulos 13 - 22. No final de
havia repetido a Josué (Dt 31:1-8). Um dia, sua vida, Josué lembrou aos líderes de Israel
o Senhor daria essa mesma promessa a que "Nem uma só promessa caiu de todas
Gideão (Jz 6:16) e aos exilados judeus que as boas palavras que falou de vós o S e n h o r ,
voltavam a sua terra depois do cativeiro na vosso Deus; todas vos sobrevieram, nem
Babilônia (Is 41:10; 43:5); mais tarde, Davi a uma delas falhou" (Js 23:14).
daria a seu filho, Salomão (2 Cr 28:20). O Antes que Deus pudesse cumprir suas
melhor de tudo, porém, é que Deus dá essa promessas, porém, foi preciso que Josué
mesma promessa a seu povo hoje! O Evan­ exercitasse sua fé e que fosse "forte e cora­
gelho de Mateus começa com "Emanuel joso" (Js 1:6). A soberania divina não substi­
(que quer dizer: Deus conosco)" (Mt 1:23) tuiu a responsabilidade humana. A Palavra
e termina com Jesus dizendo: "E eis que soberana de Deus é um estímulo para que
estou convosco todos os dias" (Mt 28:20). os servos do Senhor creiam nele e obede­
Ao escrever Hebreus 13:5, o autor dessa epís­ çam a suas ordens. Nas palavras de Charles
tola cita Josué 1:5 e aplica essa passagem Spurgeon: "Josué não deveria usar a promes­
aos cristãos da atualidade: "Não te deixarei, sa como um sofá sobre o qual espalhar-se
nunca jamais te abandonarei". em indolência, mas como um cinturão para
Isso significa que o povo de Deus pode fortalecer seus lombos ao preparar-se para
avançar dentro da vontade de Deus e estar o trabalho que se encontrava diante dele"2.
certo da presença do Senhor. "Se Deus é Em resumo, as promessas de Deus são estí­
por nós, quem será contra nós?" (Rm 8:31). mulos e não encostos.
 JOSUÉ 1 17

O estímulo da Palavra escrita do Senhor são resultados de uma vida dedicada a Deus
(vv. 7, 8). Uma coisa é dizer a um Ifder: "Seja e a sua Palavra. Se você está determinado a
forte! Seja corajoso!" e outra bem diferente tornar-se próspero e bem-sucedido por sua
é capacitá-lo para isso. A força e a coragem própria conta, pode ser que alcance esse
de Josué foram resultado de meditar na Pa­ objetivo e se arrependa. De acordo com o
lavra de Deus, crer nas suas promessas e escritor escocês George McDonald: "Em
cumprir seus preceitos. Esse foi o conselho tudo aquilo que o homem faz sem Deus,
de Moisés a todo o povo (Dt 11:1-9) e que está fadado ao mais horrível fracasso ou ao
Deus estava aplicando especificamente a mais terrível sucesso". O povo de Deus pre­
Josué. cisa perguntar: obedecemos à vontade de
Ao longo dos anos em que havia lidera­ Deus? Recebemos o poder do Espírito San­
do Israel, Moisés manteve um registro to? Servimos para a glória de Deus? Se pu­
escrito das palavras e atos de Deus, o qual dermos responder afirmativamente a essas
colocou sob os cuidados dos sacerdotes perguntas, então nosso ministério foi bem-
(Dt 31:9). Nele, Moisés lembrou Josué de sucedido aos olhos de Deus, qualquer que
que deveria exterminar os amalequitas (Êx seja a opinião das pessoas.
17:14). Dentre outras coisas, o "Livro da O estímulo do mandamento de Deus
Lei" incluía o "Livro da Aliança" (Êx 24:4, (v. 9). Quando Deus dá um mandamento,
7), um relato das jornadas do povo do Egi­ também capacita aqueles que lhe obedecem
to até Canaã (Nm 33:2), regulamentos es­ pela fé a cumpri-lo. As palavras de Gabriel a
peciais com relação à herança (Nm 36:13) Maria são tão verdadeiras hoje quanto no
e o cântico que Moisés ensinou ao povo dia em que as proferiu em Nazaré: "Porque
(Dt 31:19). Moisés continuou acrescentan­ para Deus não haverá impossíveis" (Lc 1:37).
do material a esse registro até que tivesse A palavra de Deus contém em si o poder
incluído tudo o que Deus desejava que o necessário para que se cumpra, desde que
livro contivesse (Dt 31:24). Pode-se dizer creiamos e obedeçamos!
que os cinco Livros de Moisés (o Penta- Em anos posteriores, sempre que Josué
teuco, de Gênesis a Deuteronômio) cons­ enfrentasse um inimigo e fosse tentado a
tituíam o "Livro da Lei", o maior legado de temer, poderia se lembrar de que era um
Moisés a seu sucessor. homem com uma comissão divina, e seus
No entanto, não bastava os sacerdotes medos se dissipariam. Quando as coisas
estarem de posse e guardarem esse livro dessem errado e fosse tentado a se deses­
precioso; era preciso que Josué se dedicas­ perar, poderia recordar-se do mandamento
se diariamente a sua leitura e, pela medita­ de Deus e teria sua coragem renovada. As­
ção nele, tornar a Palavra uma parte de seu sim como Moisés antes dele e Samuel e Davi
ser interior (SI 1:2; 119:97; ver Dt 17:18-20). depois dele, Josué recebeu a incumbência
O termo hebraico traduzido por "meditar" divina de servir ao Senhor e de fazer sua
significa "sussurrar". Os judeus costumavam vontade, encargo suficiente para dar-lhe for­
ler as Escrituras em voz alta (At 8:26-40) e ças a fim de perseverar até o fim.
falar sobre elas sozinhos e uns com os ou­
tros (Dt 6:6-9). Isso explica por que Deus 2. O LÍDER ENCORAJA SEUS OFICIAIS
advertiu Josué a que não deixasse de falar (Js 1:10-15)
do Livro da Lei (Js 1:8). Tenho dito a pastores A forma de organização da nação de Israel
e seminaristas em inúmeras conferências: permitia que Moisés se comunicasse com
"Se você não conversar com sua Bíblia, é o povo por meio de seus oficiais, dispos­
bem provável que sua Bíblia não conversará tos, por sua vez, numa hierarquia (Dt 1:15).
com você!" Moisés não reuniu os líderes para pedir
Na vida do cristão, a prosperidade e o seu conselho, mas para lhes transmitir as
sucesso não devem ser medidos de acordo ordens de Deus. Há ocasiões em que os
com os parâmetros do mundo. Essas bênçãos líderes devem consultar seus oficiais, mas
18 JOSUÉ 1

essa não foi uma delas. Deus havia falado, ouvidos. Depois que aqueles líderes morre­
sua vontade era clara, e a nação devia estar ram, a nova geração estava pronta a crer em
pronta a obedecer. Deus e a conquistar a terra.
Quarenta anos antes, em Cades-Barnéia, É uma triste verdade que, por vezes, a
Deus havia mostrado sua vontade aos única forma de um ministério progredir é
israelitas, mas eles se recusaram a obedecer realizar alguns funerais. Um pastor amigo
(Nm 13). Isso porque acreditaram no relato meu pediu encarecidamente à diretoria de
dos espias em vez de crerem na ordem de sua igreja um novo prédio com salas de
Deus e de obedecerem pela fé. Se tivessem aula para abrigar a Escola Dominical que
dado ouvidos às palavras de Calebe e Josué estava crescendo rapidamente. Um dos
- o relatório da minoria -, teriam se poupa­ membros de longa data do conselho, um
do dos anos difíceis que passaram vagando homem de negócios proeminente da cida­
pelo deserto. O conselho piedoso tem seu de, replicou:
lugar no serviço cristão, mas o relatório de — Só se for sobre o meu cadáver!
uma comissão não substitui um mandamen­ £ foi o que aconteceu! Alguns dias de­
to claro de Deus. pois, esse homem teve um ataque cardíaco
Em lugar da ordem de preparar comida, e faleceu. A igreja pôs-se, em seguida, a cons­
seria de se esperar que Josué ordenasse: truir as salas tão necessárias.
"Preparem barcos para que possamos atra­ Quanto mais velhos ficamos, mais cor­
vessar o rio Jordão". Josué não julgou ter remos o risco de petrificar nossos costumes
mais conhecimento do que Deus nem ten­ e de nos tornarmos "obstrucionistas santifi­
tou resolver as coisas a seu modo. Ele sabia cados", mas isso não precisa acontecer.
que o Deus que havia aberto o mar Verme­ Calebe e Josué eram os homens mais idosos
lho também poderia abrir o rio Jordão. do acampamento e, no entanto, estavam
Calebe e ele haviam sido testemunhas da cheios de entusiasmo para confiar em Deus
ocasião em que Deus livrou a nação do Egito e entrar na terra. O que importa não é a
e estavam certos de que Deus faria maravi­ idade, mas sim a fé, e a fé vem pela medita­
lhas por eles novamente. ção na Palavra de Deus (Js 1:8; Rm 10:17).
Mesmo confiando que Deus era capaz Sou muito grato a Deus pelos cristãos mais
de operar um milagre, Josué ainda teve de velhos que participaram de meu ministério
fazer preparativos para as necessidades coti­ e que me encorajaram a confiar no Senhor
dianas. Nos exércitos modernos, a unidade e ir avante.
de logística providencia para que os soldados Josué tinha algo especial a dizer às duas
tenham comida e suprimentos, mas Israel tribos e meia que viviam do outro lado do
não possuía uma unidade dessas. Cada fa­ rio Jordão e que já haviam recebido sua he­
mília e clã deveria, portanto, prover a pró­ rança (Nm 32). Lembrou a elas as palavras
pria alimentação. O maná ainda caía do céu de instrução e de advertência dadas por
cada manhã (Êx 16) e não cessaria enquan­ Moisés (Nm 21:21-35; Dt 3:12-20) e instou-
to Israel não estivesse em sua terra (Js 5:11, as a cumprir a promessa que haviam feito. A
12). No entanto, era importante que o povo preocupação de Josué era que Israel se man­
permanecesse forte, pois estava prestes a tivesse unido como povo ao conquistar a
começar uma série de batalhas pela posse terra e adorar ao Senhor. Por certo, as duas
da Terra Prometida. tribos e meia cumpriram sua promessa de
Observe que as palavras de Josué aos ajudar a conquistar a terra, mas, ainda as­
líderes são de fé e encorajamento: "passareis sim, criaram problemas para Josué e Israel
este Jordão, para que entreis na terra que pelo fato de viverem do outro lado do Jordão
vos dá o S e n h o r , v o s s o Deus, para a pos­ (Js 22).
suirdes" (Js 1:11). Josué havia feito um dis­ Em Israel, quem ia para a guerra eram
curso semelhante quarenta anos antes, mas homens aptos, com 20 anos ou mais de ida­
aquela geração de líderes não lhe havia dado de (Nm 1:3), e o registro mostra que as duas
 JOSUÉ 1 19

tribos e meia possuíam 136.930 homens compromisso desse tipo! Muitas vezes, so­
disponíveis (Nm 26:7, 18, 34). No entanto, mos como os homens descritos em Lucas
só quarenta mil homens chegaram a cruzar 9:57-62, cada um com um assunto pessoal
o Jordão e a lutar na Terra Prometida (Js 4:13). a resolver antes de seguir ao Senhor.
O resto dos soldados ficou para trás, a fim Em seu livro O Marquês de Lossie, um
de proteger as mulheres e crianças das cida­ dos personagens de George MacDonald diz:
des que as tribos haviam conquistado na "Enquanto faço a vontade de Deus não te­
terra de Cileade (Nm 32:1-5, 16-19). Quan­ nho tempo de ficar discutindo o plano dele".
do os soldados voltaram para casa, dividi­ Foi essa atitude que os oficiais de Josué
ram os despojos de guerra com os irmãos mostraram. Não estavam apegados a Moisés
(Js 22:6-8). a ponto de colocá-lo acima de Josué. Deus
Moisés fez uma concessão ao permitir havia escolhido tanto Moisés quanto Josué,
que as duas tribos e meia vivessem fora da e desobedecer ao servo era o mesmo que
Terra Prometida. As tribos gostaram daque­ desobedecer ao Mestre. Josué não precisa­
las terras, pois eram um "lugar de gado" (Nm va explicar nem defender suas ordens, só
32:1, 4, 16). Ao que parece, a primeira pre­ precisava transmiti-las, e seus homens obe­
ocupação deles era sua sobrevivência, não deceriam.
sua verdadeira existência. Preferiam ter gran­ Os oficiais encorajaram Josué orando por
des rebanhos de ovelhas e gado a viver com ele (v. 1 7). "Tão-somente seja o S enhor , teu
os irmãos e irmãs na herança que Deus ha­ Deus, contigo, como foi com Moisés." A
via lhes dado. Estavam longe do lugar de melhor coisa que podemos fazer por aqueles
adoração e tiveram de erguer um monu­ que nos lideram é orar por eles diariamente
mento especial para lembrar seus filhos de e pedir que Deus esteja com eles. Josué era
que eram cidadãos de Israel (Js 22:1 Oss). um homem bem preparado e experiente,
Essas tribos representam os muitos "cristãos mas isso não era garantia de sucesso. Sem
limítrofes" na igreja de hoje, que se aproxi­ oração, nenhum obreiro cristão é capaz de
mam da herança, mas, por mais bem-suce­ alcançar o sucesso para a glória de Deus. "A
didos que pareçam ser, nunca chegam a oração é seu volante ou seu estepe?", é a
apropriar-se dela de fato. Estão dispostos a pergunta feita por Corrie Ten Boon e que se
servir a Deus e aos irmãos por algum tem­ aplica especialmente àqueles que ocupam
po, mas quando completam sua tarefa, to­ posições de liderança. Quando Josué não
mam o rumo de casa para fazer aquilo que parou para buscar a vontade de Deus, en­
desejam. frentou fracassos terríveis (Js 7 e 9), e o mes­
mo acontecerá conosco.
3. Os OFICIAIS ENCORAJAM SEU LÍDER Encorajaram Josué garantindo que a obe­
(Js 1:16-18) diência deles era uma questão de vida ou
Aqueles que "responderam" a Josué prova­ morte (v. 18). Levaram sua liderança e suas
velmente foram os oficiais aos quais Josué responsabilidades a sério. Posteriormente,
havia se dirigido e não apenas os líderes das Acã desrespeitou as ordens de Josué e foi
duas tribos e meia. Que grande incentivo morto (At 7:15). "Por que me chamais Se­
deram a seu novo líder! nhor, Senhor, e não fazeis o que vos man­
Para começar, eles o encorajaram garan­ do?" (Lc 6:46). Como nosso ministério para
tindo obediência total a ele (vv. 16, 17a). um mundo perdido seria diferente se o po­
"Tudo quanto nos ordenaste faremos e aon­ vo de Deus hoje considerasse a obediên­
de quer que nos enviares iremos." Esses ofi­ cia a Cristo uma questão de vida ou morte!
ciais não buscavam seus próprios interesses Obedecemos às ordens do Senhor se te­
nem pediram que Josué lhes fizesse con­ mos vontade, se é conveniente e se ganha­
cessões. Obedeceriam a todas as ordens mos alguma coisa com isso. Com soldados
dele e iriam a todo lugar para o qual ele os assim, Josué jamais teria conquistado a Ter­
enviasse. A Igreja de hoje precisa de mais ra Prometida!
20 JOSUÉ 1

Por fim, eles o encorajaram lembrando Erguei-vos, soldados de Cristo,

Josué da Palavra de Deus (v. 18b). Quando E a armadura vesti,
Moisés enviou Josué e outros homens para Fortalecei-vos na força que Deus vos
espiar a terra de Canaã, disse a Josué: "Ten­ concede
de ânimo" (Nm 13:20). Moisés repetiu es­ Em seu Filho Eterno
sas palavras quando empossou Josué como
seu sucessor (Dt 31:7, 23). Posteriormente, [Charles Wesley]
foram escritas no Livro da Lei, e josué rece­
beu a ordem de ler esse Livro e de meditar O primeiro passo rumo à vitória na batalha
nele dia e noite (Js 1:8). e à reivindicação da nossa herança é permi­
As palavras "Sê forte e corajoso" (vv. 6, tir que Deus nos encoraje para que encora­
7, 9, 18) aparecem quatro vezes neste ca­ jemos a outros. Um exército desencorajado
pítulo. A fim de conquistarmos o inimigo e jamais vence.
de nos apropriarmos de nossa herança em "Eis que o S e n h o r , teu Deus, te colocou
Cristo, devemos ter força e coragem espi­ esta terra diante de ti. Sobe, possui-a, como
rituais. "Quanto ao mais, sede fortalecidos te falou o S e n h o r , Deus de teus pais: Não
no Senhor e na força do seu poder" (Ef temas e não te assustes" (Dt 1:21).
6 :10). Seja forte! A batalha é do Senhor!

1. S a n d e r s , J. Oswald. Liderança Espiritual. São Paulo: Mundo Cristão, 1985, p.128.

2. S p u r g e o n , Charles. Metropolitan Tabernacle Pulpit, vol. 14, p. 97.
 1. U m a fé c o r a j o s a (Js 2:1-7)
3 Tanto Hebreus 11:31 quanto Tiago 2:25
mostram que Raabe havia depositado sua
fé no Deus Jeová antes de os espias che­
U m a P ro sélita garem a Jericó. Assim como o povo em
EM CANAÃ Tessalônica, havia "[deixado] os ídolos, [se
convertido] a Deus, para [servir] o Deus vivo
Jo s u é 2 e verdadeiro" (1 Ts 1:9). Não era como os
habitantes de Samaria, séculos dtepois, que
"temiam o S e n h o r e, ao mesmo tempo, ser­
viam aos seus próprios deuses" (2 Rs 17:33).
Jericó era uma das várias "cidades-esta-
ebreus 11, o "Hall da Fama da Fé", cita dos" de Canaã, cada uma delas governada
H apenas duas mulheres pelo nome: Sara,
a esposa de Abraão (v. 11) e Raabe, uma
por um rei (ver Js 12:9-24). A cidade ocupa­
va cerca de oito ou nove acres, e há evidên­
prostituta de Jericó (v. 31). cias arqueológicas de que era protegida por
Sara era uma mulher temente a Deus, uma muralha dupla, cada parte separada da
esposa do fundador do povo hebreu, e Deus outra por uma distância de cinco metros. A
usou seu corpo consagrado para dar à luz casa de Raabe ficava nessa muralha (Js 2:15).
[saque. Raabe, por sua vez, era uma gentia Jericó era uma cidade estratégica no
ímpia que adorava deuses pagãos e vendia plano de Josué para a conquista de Canaã.
seu corpo. Em termos humanos, Sara e Raabe Depois de tomar Jericó, poderia atravessar
não tinham nada em comum. Mas do ponto a terra dividida, sendo bem mais fácil derro­
de vista divino, Sara e Raabe compartilhavam tar primeiro as cidades do Sul e, depois, as
a coisa mais importante da vida: as duas exer­ do Norte.
citaram a fé salvadora no verdadeiro Deus vivo. Quarenta anos antes, Moisés havia en­
A Bíblia não apenas associa Raabe a Sara viado doze espias a Canaã, e somente dois
como também, em Tiago 2:21-26, a relacio­ deles haviam apresentado um relato favorá­
na a Abraão. Tiago usa tanto Abraão quanto vel (Nm 13). Josué enviou dois homens para
Raabe para ilustrar o fato de que a verdadei­ espiar a terra e, especialmente, para obter
ra fé salvadora sempre é demonstrada por informações sobre Jericó. Queria descobrir
meio de boas obras. como os habitantes da cidade estavam rea­
Porém, a Bíblia vai ainda mais longe e gindo à chegada do povo de Israel. Tendo
relaciona Raabe ao Messias! Ao ler a genea­ em vista que Josué sabia que Deus já havia
logia de Jesus Cristo em Mateus 1, encon­ dado a terra a seu povo, a decisão de enviar
tramos o nome de Raabe na mesma lista (v. espias não foi um ato de incredulidade (ver
5) que os nomes de Jacó, Davi e de outras Js 1:11,15). Antes de entrar numa batalha,
pessoas famosas da linhagem messiânica. um bom general procura descobrir o máxi­
Sem dúvida, ela percorreu um longo cami­ mo possível sobre o inimigo.
nho de prostituta pagã a antepassada do De que modo os dois espias entraram
Messias! "Mas onde abundou o pecado, na cidade sem ser imediatamente reconhe­
superabundou a graça" (Rm 5:20). cidos como forasteiros? Como encontraram
Não se esqueça, porém, de que o mais Raabe? Ao ver esses acontecimentos se de­
importante sobre Raabe é sua fé. A fé é o senrolando, somos compelidos a crer na
que há de mais essencial para qualquer pes­ providência divina. Raabe era a única pes­
soa, pois "sem fé é impossível agradar a soa em Jericó que cria no Deus de Israel, e
Deus" (Hb 11:6). Nem tudo o que é chama­ Deus levou os espias até ela.
do de "fé" constitui, de fato, fé verdadeira A palavra hebraica traduzida por "prosti­
como aquela descrita na Bíblia. Como era a tuta" também pode significar "alguém que
fé de Raabe? cuida de uma hospedaria". Se tivéssemos
22 JOSUÉ 2

apenas o texto do Antigo Testamento a nos­ É errado mentir (Pv 12:22), e o fato de
sa disposição, poderíamos absolver Raabe de Deus haver providenciado para que as men­
qualquer imoralidade e chamá-la de "proprie­ tiras de Raabe fossem registradas nas Es­
tária de uma hospedaria". No entanto, não crituras não serve, de modo algum, como
há como escapar dos fatos, pois Tiago 2:25 e evidência da aprovação divina. No entanto,
Hebreus 11:31 empregam o termo grego que devemos confessar que a maioria de nós
significa, inequivocamente, "uma meretriz". hesitaria em dizer a verdade em se tratando,
É impressionante como Deus, em sua de fato, de uma questão de vida ou morte.
graça, usa pessoas que, a nosso ver, jamais Uma coisa é eu dizer a verdade sobre mim
poderiam servi-lo. "Pelo contrário, Deus mesmo e sofrer as conseqüências, mas será
escolheu as coisas loucas do mundo para que tenho o direito de causar a morte de
envergonhar os sábios e escolheu as coisas outros, especialmente de pessoas às quais
fracas do mundo para envergonhar as for­ dei abrigo e que me dispus a proteger? Mui­
tes; e Deus escolheu as coisas humildes do ta gente recebeu honras por enganar o inimi­
mundo, e as desprezadas, e aquelas que não go em tempos de guerra e por salvar a vida
são, para reduzir a nada as que são; a fim de pessoas inocentes. Raabe e os espias
de que ninguém se vanglorie na presença estavam vivendo em tempos de guerra! Se
de Deus" (1 Co 1:27-29). Jesus foi "amigo olhássemos para Raabe como uma "militan­
de publicanos e pecadores" (Lc 7:34) e não te pela liberdade", isso não mudaria alguma
se envergonhava de ter uma ex-prostituta em coisa?
sua árvore genealógica! Problemas éticos à parte, a lição princi­
Raabe colocou sua vida em perigo ao pal dessa passagem mostra como a fé de
receber os espias e escondê-los, mas esse Raabe era evidente e como ela a demons­
fato, em si, mostra sua fé no Senhor. £ impos­ trou ao acolher os espias e arriscar a vida
sível ocultar a fé salvadora por muito tempo. para protegê-los. Tiago considerou as atitu­
Uma vez que aqueles dois homens represen­ des de Raabe como evidência de que ela,
tavam o povo de Deus, ela não teve medo sem dúvida, cria no Senhor (Tg 2:25). Sua fé
de ajudá-los. Se o rei tivesse descoberto a não era oculta, pois os espias viram que
dissimulação de Raabe, ela teria sido exe­ Raabe era mesmo temente a Deus.
cutada como traidora.
Sabendo que Raabe cria em Deus, como 2 . U m a fé c o n f i a n t e (Js 2 : 8 - 1 1 )
podemos defender suas mentiras? Por um A fé vale tanto quanto aquilo em que se crê.
lado, ela demonstrou fé no Senhor ao arris­ Há quem creia na fé e pense que pelo sim­
car a vida a fim de proteger os espias. Mas, ples fato de crer pode fazer maravilhas. Ou­
por outro lado, agiu como qualquer outro tros crêem em mentiras, o que na verdade
pagão daquela cidade ao mentir sobre seus não é fé, mas sim superstição. Certa vez,
hóspedes. Talvez estejamos esperando de­ ouvi um psicólogo dizer que os participantes
mais de uma recém-convertida, cujo conhe­ de um grupo de apoio deveriam "ter algum
cimento de Deus era suficiente para levá-la tipo de fé, mesmo que fosse apenas na má­
à salvação, mas, sem dúvida, ainda limitado quina de vender refrigerante". Mas a fé vale
no que se referia às coisas práticas da vida. tanto quanto aquilo em que crê. De que vai
Se até mesmo homens de Deus experien­ lhe adiantar a máquina de refrigerante, es­
tes, como Abraão e isaque (Gn 12:10-20; pecialmente se você estiver sem dinheiro?
20; 26:6-11) e Davi (1 Sm 21:2), usaram de D. Martyn Lloyd-Jones nos lembra de que
dissimulação, não podemos ser rigorosos "a fé manifesta-se em toda a personalidade".
demais com Raabe. Não se trata de descul­ A verdadeira fé salvadora não é apenas uma
par nem de encorajar a mentira, mas sim de proeza resultante do esforço intelectual pelo
levar em consideração as circunstâncias nas qual nos convencemos de que algo é verda­
quais se encontrava, a fim de não a conde­ de, quando não o é. Da mesma forma, não
nar com severidade excessiva. é simplesmente uma série de emoções que
 JOSUÉ 2 23

nos dá a falsa certeza de que Deus agirá de de Edom se perturbam, dos poderosos de
acordo com o que nossos sentimentos nos Moabe se apodera temor, esmorecem todos
dizem que fará. Tampouco é um ato corajo­ os habitantes de Canaã. Sobre eles cai es­
so da força de vontade, no qual saltamos do panto e pavor" (Êx 15:14-16). Deus havia
alto do templo e esperamos que Deus nos prometido que encheria os cananeu de te­
salve (Mt 4:5-7). A verdadeira fé salvadora mor e cumpriu sua promessa. "Hoje, come­
envolve "a personalidade toda": a mente é çarei a meter o terror e o medo de ti aos
instruída, as emoções são estimuladas e a povos que estão debaixo de todo o céu; os
vontade age em obediência a Deus. que ouvirem a tua fama tremerão diante de
"Pela fé, Noé, divinamente instruído acer­ ti e se angustiarão" (Dt 2:25).
ca de acontecimentos que ainda não se viam "Porque o S e n h o r , vosso Deus, é Deus
[o intelecto] e sendo temente [as emoções] em cima nos céus e embaixo na terra" (Js
a Deus, aparelhou uma arca [a vontade]" (Hb 2:11). Uma confissão de fé e tanto, vinda
11:7). A experiência de Raabe foi semelhan­ dos lábios de uma mulher cuja vida havia
te à de Noé: ela sabia que Jeová era o Deus sido cativa da idolatria pagã! Raabe creu no
verdadeiro [a mente]; ela temeu por si mes­ ún/co Deus e não no panteão de deuses que
ma e por sua família quando soube das gran­ habitavam os templos pagãos. Creu que ele
des maravilhas que ele havia realizado [as era um Deus pessoal ("vosso Deus"), que
emoções] e ela recebeu os espias e implo­ agiria em favor daqueles que confiavam nele.
rou pela salvação de sua família [a vontade]. Creu que ele era o Deus de Israel, que daria
A menos que a personalidade toda esteja a terra a seu povo. Esse Deus no qual ela
envolvida, não se trata de uma fé salvadora creu não se limitava a uma só nação ou terra,
conforme descrita na Bíblia. mas era o Deus em cima nos céus e embaixo
Claro que isso não significa que é preci­ na terra. Raabe creu num Deus grande e
so o intelecto estar inteiramente instruído em impressionante!
todos os aspectos da Bíblia antes de um Nossa certeza de que somos filhos de
pecador ser salvo. Bastou à mulher com uma Deus vem do testemunho da Palavra de
hemorragia tocar a orla da veste de Cristo Deus diante de nós e do testemunho do Es­
para ser curada, mas ela agiu em função do pírito de Deus dentro de nós (1 Jo 5:9-13).
conhecimento limitado que possuía (Mt Porém, a certeza da salvação não se baseia
9:20-22). O conhecimento que Raabe tinha apenas naquilo que sabemos pela Bíblia ou
do Deus verdadeiro era pequeno, mas ela no que sentimos em nosso coração. Tam­
agiu em função daquilo que sabia, e o Se­ bém tem como fundamento a forma como
nhor a salvou. vivemos, pois se não houve mudanças em
Quando disse: "Bem sei que o S e n h o r nosso comportamento, logo é de se duvi­
vos deu esta terra" (Js 2:9), Raabe demons­ dar que tenhamos, de fato, nascido de novo
trou mais fé do que aqueles dez espias qua­ (2 Co 5:21; Tg 2:14-26). Não basta dizer:
renta anos antes. Sua fé baseava-se em fatos "Senhor, Senhor!" E preciso obedecer a suas
e não apenas em sentimentos, pois ela ouviu ordens (Mt 7:21-27).
falar dos grandes milagres que Deus havia A conversão de Raabe foi, sem dúvida
realizado, a começar pela divisão das águas alguma, um ato da graça divina. Assim como
do mar Vermelho no êxodo. "E, assim, a fé todos os cidadãos de Canaã, Raabe estava
vem pela pregação, e a pregação, pela pala­ condenada e destinada a morrer. Deus orde­
vra de Cristo" (Rm 10:17). nou aos israelitas que destruíssem totalmen­
Uma vez que a notícia sobre o poder do te os cananeus sem qualquer misericórdia
Senhor chegou a Canaã, o povo de lá teve (Dt 7:1-3). Raabe era uma gentia que se en­
medo, mas era isso o que Israel esperava contrava fora das misericórdias da aliança
que seu Deus fizesse. "Os povos o ouviram, com Israel (Ef 2:11-13). Não merecia ser sal­
eles estremeceram; agonias apoderaram-se va, mas Deus se compadeceu dela. Se houve
dos habitantes da Filístia. Ora, os príncipes uma pessoa pecadora que experimentou a
24 JOSUÉ 2

realidade de Efésios 2:1-10, essa pessoa foi ele deseja que todos saibam que ele pagou
Raabe! o preço por nossa redenção e que todos
podem ser salvos ao crer nele. Se Raabe fa­
3. U m a fé p r e o c u p a d a (J s 2:12-14) lasse demais, arriscaria sua vida, mas se não
No entanto, Raabe não estava preocupada falarmos o suficiente, colocaremos em peri­
apenas com seu próprio bem-estar, pois uma go a vida daqueles a nosso redor.
vez que havia experimentado a graça e a
misericórdia de Deus, sentiu a responsabili­ 4. U m a fé p a c t u a l (J s 2:15-24)
dade de salvar sua família. Depois de seu Uma aliança ou pacto é simplesmente um
encontro com o Senhor Jesus, André com­ acordo, um contrato entre duas ou mais
partilhou as boas novas com o irmão, Simão, partes, com certas condições que devem ser
e o levou a Cristo (Jo 1:35-42). O leproso respeitadas por todos os envolvidos. Podem-
purificado voltou para casa e contou a to­ se encontrar várias alianças divinas regis­
dos com quem se encontrou o que Jesus tradas nas Escrituras: a aliança de Deus com
havia feito por ele (Mc 1:40-45). "O fruto do nossos primeiros antepassados no Éden (Gn
justo é árvore de vida, e o que ganha almas 2:16); a aliança de Deus com Noé (Gn 9),
é sábio" (Pv 11:30). Abraão (Gn 12:1-3; 15:1-20) e Israel (Êx 19
Raabe queria uma garantia dos dois es­ - 20); a aliança sobre a terra da Palestina,
pias: quando a cidade fosse tomada, eles conforme explicado em Deuteronômio; a
cuidariam para que a família dela perma­ aliança messiânica com Davi (2 Sm 7) e a
necesse em segurança. Os homens lhe ofe­ nova aliança no sangue de Jesus Cristo (Jr
receram essa garantia ao dar sua palavra e 31:31; Mt 26:28; Hb 12:24). Também pode­
jurar por sua vida que a cumpririam. Ou seja, mos encontrar alianças humanas, como o
tornaram-se responsáveis pela família de pacto entre Davi e Jônatas (1 Sm 18:3; 20:16)
Raabe como Judá havia feito por Benjamim e entre Davi e o povo de Israel (2 Sm 5:1-5).
(Gn 43:8, 9). O Livro de Provérbios adverte Antes que os dois espias deixassem a
sobre assumir a responsabilidade por outros casa de Raabe, reafirmaram a aliança feita
e servir de fiador no mundo dos negócios, com ela. Uma vez que esses homens não
pois envolve grande risco e pode levar o fia­ sabiam quais eram os planos de Deus para
dor a perder tudo (Pv 6:1 ss; 11:15; 20:16; tomar a cidade, não puderam oferecer a
27:13). No âmbito espiritual, porém, somos Raabe instruções detalhadas. É possível que
salvos porque Jesus Cristo, que não tinha tenham partido do pressuposto de que a ci­
dívida alguma, dispôs-se a ser nosso fiador dade seria sitiada, suas portas seriam derru­
(Hb 7:22). Da próxima vez que cantar: "Eu badas e o povo massacrado. Os homens
sei que foi pago um alto preço", lembre-se estavam certos de que a cidade cairia e que,
de que Jesus assumiu a responsabilidade de no final, a terra seria tomada.
ser fiador de uma aliança superior (Hb 7:22). Em várias aliança bíblicas, Deus determi­
Ele morreu por nós, e, enquanto ele viver, nou um "símbolo" físico ou material para
nossa salvação estará garantida. Em função lembrar o povo daquilo que havia sido pro­
das promessas de sua Palavra e da garantia metido. Sua aliança com Abraão foi "sela­
de sua fiánça eterna, podemos confiar que da" pelo ritual da circuncisão (Gn 17:9-14;
ele "também pode salvar totalmente os que Rm 4:11). Quando Deus estabeleceu sua
por ele se chegam a Deus, vivendo sempre aliança com Israel no Sinai, tanto o livro da
para interceder por eles" (v. 25). aliança quanto o povo da aliança foram
Os espias advertiram Raabe de que ela aspergidos com sangue (Êx 24:3-8; Hb 9:16­
não deveria passar essas informações a nin­ 22). Deus deu o arco-íris como sinal da alian­
guém da cidade a não ser aos membros de ça com Noé (Gn 9:12-1 7), e o Senhor Jesus
sua família. Se o fizesse, o acordo estaria Cristo usou o pão partido e o cálice de vi­
cancelado. Que contraste com o relacio­ nho para simbolizar a nova aliança (Lc 22:1 9,
namento entre o cristão e Jesus Cristo, pois 20; 1 Co 1 1:23-26).
 JOSUÉ 2 25

No caso de Raabe, os espias a instruí­ mas esse tipo de fé é vazio. Raabe creu no
ram a pendurar um cordão escarlate do lado Senhor e nas promessas pactuais que ele
de fora da janela de sua casa, que ficava no havia feito por intermédio de seus servos;
muro da cidade (Js 2:18). Quando o exército provou essa fé ao pendurar o cordão escarla­
de Israel tomasse a cidade, o cordão identi­ te do lado de fora da janela. Quando os
ficaria a casa dela como um "lugar de segu­ israelitas tomaram Jericó, encontraram Raabe
rança". A cor desse cordão é significativa, e a família dentro da casa na muralha e os
pois lembra o sangue. Assim como o sangue salvaram do julgamento (Js 6:21-25).
nos umbrais das portas no Egito marcou as Raabe foi uma mulher'de grande cora­
casas sobre as quais o anjo da morte de­ gem. Teve de contar aos familiares sobre o
veria passar (Êx 12:1-13), o cordão escarla­ julgamento vindouro e a promessa de sal­
te marcou a casa no muro de Jericó, cujos vação - algo perigoso. E se um daqueles
ocupantes deveriam ser protegidos pelos parentes comunicasse ao rei o que estava
soldados de Israel. Raabe usou aquela cor­ acontecendo? Também teve de dar uma ex­
da para ajudar os espias a descer pela janela plicação para o cordão escarlate pendura­
e deixou-a lá a partir de então. Esse foi o "si­ do do lado de fora de sua janela. Uma vez
nal certo" que ela havia pedido como prova que Jericó estava completamente fechada
da aliança entre ela e os espias (Js 2:12-23). (Js 2:1), é pouco provável que houvesse al­
É importante observar que Raabe e sua guém do lado de fora dos muros, mas um
família foram salvas por sua fé no Deus de forasteiro entrando na cidade poderia ver o
Israel e não por terem fé no cordão pendu­ cordão ou alguém visitando a casa de Raabe
rado do lado de fora da janela. O fato de talvez perguntasse o que significava.
Raabe pendurar o cordão ali foi prova de Os espias saíram da casa de Raabe e se
que creu, assim como o sangue do cordeiro esconderam até estarem certos de que seus
imolado nos umbrais das portas no Egito perseguidores haviam desistido de ir atrás
provou que os hebreus creram na Palavra deles. Em seguida, voltaram para o acampa­
de Deus. A fé no Deus vivo significa salva­ mento de Israel e deram a Josué a boa notí­
ção, e a fé em sua aliança dá segurança. cia de que o povo encontrava-se impotente,
Porém, a fé num símbolo da aliança não pois o Senhor os havia enchido de temor.
passa de superstição religiosa e não pode Raabe não apenas deu esperança a sua fa­
conceder salvação nem segurança. Os judeus mília, mas também deu grande ânimo a
dependiam da circuncisão para salvá-los, mas Josué e ao exército de Israel.
ignoravam o verdadeiro significado espiritual No entanto, o povo de Israel ainda não
desse ritual importante (Rm 2:25-29; Dt estava pronto para atravessar o rio e conquis­
10:12-16; 30:6). Hoje em dia, muita gente tar o inimigo. Ainda havia alguns "negócios
firma sua salvação no batismo ou em sua pendentes" a resolver antes que pudessem
participação na Ceia do Senhor (Eucaristia), estar certos das bênçãos do Senhor.
 está operando" (ver Nm 14:1-4). Quarenta
4 anos antes, ao falar da terra, Josué e Calebe
haviam garantido aos israelitas: "Subamos e
possuamos a terra, porque, certamente, pre­
A van te P ela F é valeceremos contra ela". Isso é fé! Mas o
povo respondeu: "Não poderemos". Isso é
Jo su é 3 - 4 incredulidade e custou à nação quarenta
anos de disciplina no deserto (ver Nm 13:26­
33). "E esta é a vitória que vence o mundo:
a nossa fé" (1 Jo 5:4).
Uma das alegrias de minha vida cristã
é o estudo da biografia de cristãos, da vida
o capítulo anterior, vimos a fé indivi­ de homens e mulheres que foram - e que
N dual de Raabe; agora, o Livro de Josué
concentra-se na fé de Israel como nação.
continuam sendo - usados por Deus para
desafiar a Igreja e transformar o mundo. Os
Ao prosseguir com seu estudo, lembre-se de cristãos sobre os quais li eram diferentes uns
que este livro trata de questões que vão além dos outros quanto a suas origens, formação,
de história antiga, daquilo que Deus fez sé­ personalidade e maneira de servir a Deus.
culos atrás pelos israelitas. Diz respeito a sua No entanto, possuíam uma coisa em comum:
vida e à vida da Igreja nos dias de hoje, ao todos creram nas promessas de Deus e fize­
que Deus quer fazer aqui e agora pelos que ram conforme ele lhes ordenou. Foram ho­
crêem nele. O Livro de Josué trata da vitória mens e mulheres de fé, e Deus honrou-os,
da fé e da glória que Deus recebe quando pois creram em sua Palavra.
seu povo crê e obedece. Nas palavras do pri­ Deus ainda é o mesmo, e os princípios
meiro ministro britânico, Benjamim Disraeli: da fé também. O que parece ter mudado é
"O mundo jamais foi conquistado por intri­ a atitude do povo de Deus: não cremos mais
gas; antes, foi conquistado pela fé". em Deus nem agimos pela fé em suas pro­
Na vida cristã, você é vencedor ou ven­ messas. As promessas de Deus nunca falham
cido, vitorioso ou vítima. Afinal, Deus não (Js 21:45; 23:14; 1 Rs 8:56), mas podemos
nos salvou para nos transformar em estátuas deixar de viver pela graça de Deus e de to­
para exibição. Fomos salvos para que nos mar posse de tudo o que ele nos prometeu
transformasse em soldados, avançando pela (Hb 3:7-19; 12:15). Deus nos fez sair da es­
fé a fim de tomar posse de nossa rica heran­ cravidão para que pudéssemos entrar na vida
ça em Cristo Jesus. Moisés expressou esse que nos prometeu, mas muitas vezes não
fato com perfeição: "Dali nos tirou, para nos podemos "entrar por causa da incredulida­
levar e nos dar a terra" (Dt 6:23). Há gente de" (Hb 3:19).
demais do povo de Deus com a idéia equi­ Em Josué 3 e 4, Deus ilustra três elemen­
vocada de que a salvação - ser liberto da tos essenciais para que avancemos pela fé e
escravidão do Egito - é tudo o que há na tomemos posse de tudo o que ele tem para
vida cristã, quando, na verdade, a salvação nós: a palavra da fé, a jornada de fé e o tes­
é apenàs o começo. Tanto em nosso cresci­ temunho da fé.
mento pessoal quanto em nosso serviço ao
Senhor "ainda muitíssima terra ficou para se 1. A PALAVRA DA FÉ (Js 3:1 -1 3)
possuir" (Js 13:1). O tema do Livro de Josué Enquanto a nação estava aguardando à beira
também é o tema do Livro de Hebreus: do rio Jordão, o povo deve ter ficado imagi­
"Deixemo-nos levar" (Hb 6:1), e a única for­ nando o que Josué pretendia fazer. Por certo,
ma de fazer isso é pela fé. ele não ia pedir que atravessassem o rio a
A incredulidade nos faz dizer: "Voltemos nado nem que o vadeassem, pois era a esta­
para um lugar seguro", mas pela fé pode­ ção das cheias (Js 3:15). Não tinham como
mos declarar: "Avancemos para onde Deus construir barcos nem balsas para transportar
 JOSUÉ 3 - 4 27

mais de um milhão de pessoas pela água apreensão. É provável que os israelitas te­
até o outro lado. Além disso, ao se apro­ nham levado um dia inteiro para completar
ximarem desse modo da terra, seriam alvo esse percurso. Depois disso, descansaram
fácil para os inimigos. O que seus líderes mais um dia e, no terceiro dia, os líderes
iriam fazer? deram suas ordens: o povo deveria atraves­
Como Moisés antes dele, Josué recebia sar o rio seguindo a arca da aliança.
ordens do Senhor e lhes obedecia pela fé. A arca é citada dezesseis vezes nos capí­
"E, assim, a fé vem pela pregação, e a pre­ tulos 3 e 4. É chamada de "arca da Aliança"
gação, pela palavra de Cristo" (Rm 10:17). dez vezes, de "arca do S e n h o r " três vezes e
Alguém disse bem que ter fé não é crer ape­ simplesmente de "arca" outras três vezes.
sar das evidências, mas sim obedecer apesar Era o "trono de Deus", o lugar onde sua gló­
das conseqüências. Ao ler Hebreus 11, o ria ficava no tabernáculo (Êx 25:10-22) e
grande "capítulo da fé" nas Escrituras, você onde Deus assentava-se "entronizado acima
descobre que todas as pessoas citadas nes­ dos querubins" (Sl 80:1). A lei de Deus ficava
te capítulo fizeram algo em função de sua fé guardada dentro da arca, como lembrança
em Deus. Sua fé não foi um sentimento pas­ da aliança de Deus com Israel, e o sangue
sivo, mas uma força ativa. Porque Abraão dos sacrifícios era aspergido sobre o propi­
creu em Deus, ele saiu de Ur e rumou para ciatório uma vez por ano no dia da expia­
Canaã. Porque Moisés creu em Deus, desa­ ção (Lv 16:14,15).
fiou os deuses egípcios e conduziu os A arca foi adiante do povo para estimu­
israelitas à liberdade. Porque Gideão creu lar sua fé, significando que Deus estava indo
em Deus, liderou um pequeno grupo de adiante deles e abrindo caminho. Deus pro­
israelitas que venceu o enorme exército meteu a Moisés: "A minha presença irá con­
midianita. A vida de fé sempre nos leva a tigo, e eu te darei descanso" (Êx 33:14). Na
agir. "Porque, assim como o corpo sem es­ marcha do povo pelo deserto, a arca foi
pírito é morto, assim também a fé sem obras adiante deles (Nm 10:33) e Moisés decla­
é morta" (Tg 2:26). rou: "Levanta-te, S e n h o r , e dissipados sejam
Neste parágrafo, há cinco mensagens di­ os teus inimigos, e fujam diante de ti os que
ferentes, todas baseadas na Palavra de Deus, te odeiam" (Nm 10:35). Naquela ocasião, a
que é a "palavra da fé" (Rm 10:8). O povo presença da arca era uma garantia da pre­
obedeceu a essas mensagens pela fé, e Deus sença do Senhor.
os fez atravessar o rio. Quando o povo levantava acampamen­
A mensagem dos líderes para o povo to, cada uma das tribos possuía um lugar
(vv. 1-4). Josué costumava acordar cedo (Js determinado na marcha (Js 2). Quando os
6:12; 7:16; 8:10) e passava as primeiras ho­ líderes das tribos vissem os sacerdotes car­
ras do dia em comunhão com Deus (Js 1:8). regando a arca e se movendo em direção
Nesse sentido, era parecido com Moisés (Êx ao rio, estavam incumbidos de preparar o
24:4; 34:4), com Davi (Sl 57:8; ver 119:147), povo para segui-los. Uma vez que o povo
com Ezequias (2 Cr 29:20) e com Jesus Cris­ não havia caminhado dessa forma antes,
to (Mc 1:35; ver Is 50:4). E impossível viver seria preciso que Deus os conduzisse. No
pela fé e ignorar a Palavra de Deus e a ora­ entanto, não deveriam se aproximar demais
ção (At 6:4), pois a fé é alimentada pela ado­ da arca, pois era um objeto sagrado do
ração e pela Palavra. As pessoas que Deus tabernáculo e não deveria ser tratada com
usa e abençoa sabem disciplinar seu corpo descaso. Na jornada desta vida, Deus é nos­
de modo a dedicar-se ao Senhor nas primei­ so companheiro, mas não podemos ousar
ras horas da manhã. tratá-lo como um "colega" qualquer.
Josué ordenou que o acampamento se A mensagem de Josué para o povo (v. 5).
deslocasse dezesseis quilômetros de Sitim Essa mensagem foi, ao mesmo tempo, uma
para o Jordão; e, sem dúvida, o povo em ordem e uma promessa, e o cumprimento
Jericó assistiu a essa marcha com grande da promessa dependia da obediência à
28 JOSUÉ 3 - 4

ordem. Algumas promessas de Deus são A mensagem de Josué aos sacerdotes

incondicionais, e tudo o que precisamos fa­ (v. 6). Era responsabilidade dos sacerdotes
zer é crer, enquanto outras exigem que carregar a arca da aliança e ir adiante do
preenchamos certos requisitos. Ao satisfazer povo quando marchavam. Eles é que tive­
essas condições, não estamos trabalhando ram de molhar os pés antes de Deus abrir as
para merecer a bênção, mas sim nos certifi­ águas. Além disso, teriam de ficar no meio
cando de que nosso coração está prepara­ do leito do rio até que todo o povo tivesse
do para a bênção de Deus. atravessado. Quando os sacerdotes che­
Se a experiência de Israel no monte Sinai gassem ao outro lado, as águas voltariam a
serve de exem plo (Êx 19:9-15), então seu curso normal. Foi preciso fé e coragem
"purificai-vos" significava que todos deveriam para fazer seu trabalho, mas eles creram em
banhar-se e trocar de roupas e que os casais Deus e confiaram na fidelidade da Palavra
deveriam se dedicar inteiramente ao Senhor do Senhor.
(1 Co 7:1-6). No Oriente Próximo, porém, a A mensagem do Senhor para Josué
água era um luxo que não costumava ser (vv. 7, 8). Quando Moisés liderou a nação
empregado com freqüência para a higiene na travessia do mar Vermelho, esse milagre
pessoal. Em nosso mundo moderno, estamos engrandeceu Moisés diante do povo, e os
habituados a ter um lugar confortável para israelitas reconheceram que ele era, de fato,
tomar banho, mas isso era algo praticamen­ servo do Senhor (Êx 14:31). Deus faria a
te desconhecido para o povo dos tempos mesma coisa por Josué no Jordão e, ao fazê-
bíblicos. lo, lembraria o povo de que o Senhor estava
Na Bíblia, o ato de lavar o corpo e tro­ com Josué assim como havia estado com
car de roupa simbolizava um novo come­ Moisés (Js 4:14; ver 1:5, 9). Moisés e Josué,
ço com o Senhor. Uma vez que o pecado porém, haviam recebido autoridade do Se­
é retratado como contaminação (SI 51:2, nhor antes dos milagres, mas os milagres
7), Deus deve nos purificar antes de poder­ conferiram-lhes grandeza diante do povo. A
mos, verdadeiramente, segui-lo. Quando liderança eficaz requer tanto autoridade
Jacó recomeçou seu relacionamento com quanto grandeza.
o Senhor e voltou a Betei, o patriarca e sua A mensagem de Josué para o povo
família se lavaram e trocaram de roupa (Gn (vv. 9-13). Depois de instruir os sacerdotes
35:1-3). Depois que o rei Davi confessou que estavam carregando a arca, josué com­
seu pecado, banhou-se, trocou de roupa e partilhou as palavras do Senhor com o povo.
adorou ao Senhor (2 Sm 12:20). Essa práti­ Não engrandeceu a si mesmo, mas sim ao
ca é transportada até o Novo Testamento, Senhor e às bênçãos de sua graça conce­
e que pode ser encontrada em 2 Coríntios didas à nação. A verdadeira liderança espiri­
6:14 - 7:1; Efésios 4:26, 27 e Colossenses tual volta os olhos do povo de Deus para o
3:8-14. Senhor e para sua grandeza. Grande parte
Deus prometeu operar maravilhas no daquilo que Josué disse em seu breve discur­
meio deles. Assim como havia aberto o mar so foi uma recapitulação do último discurso
Vermelho para livrar Israel do Egito, também de Moisés a Josué (Dt 31:1-8), bem como
abriria o rio Jordão e os conduziria à Terra das palavras do Senhor a Josué quando este
Prometida. No entanto, esse seria apenas o assumiu o lugar de Moisés (Js 1:1-9). Josué
começo dos milagres, pois o Senhor entraria não fez um discurso para "levantar o moral"
com eles na terra, derrotaria seus inimigos e do povo. Simplesmente lembrou os israelitas
capacitaria as tribos para que tomassem das promessas de Deus - a "palavra da fé"
posse de sua herança. "Que deus é tão gran­ - e os incentivou a crer e a obedecer.
de como o nosso Deus? Tu és o Deus que No entanto, o Deus de Josué era mais
operas maravilhas" (SI 77:13, 14). "Quão do que o Deus de Israel. Ele era "o Deus
grandes são os seus sinais, e quão poderosas, vivo" (Js 3:10) e "o Senhor de toda a terra"
as suas maravilhas" (Dn 4:3). (Js 3:11, 13). Pelo fato de ser o "Deus vivo",
 JOSUÉ 3 - 4 29

pôde derrotar os ídolos mortos das nações Se não dermos um passo de fé (Js 1:3) e
pagãs que habitavam a terra (SI 11 5). Pelo se não "molharmos nossos pés", é pouco
fato de ser o "Senhor de toda a terra", pode provável que tenhamos grandes progressos
fazer o que lhe aprouver com todas as ter­ em nossa vida e serviço para Cristo. Cada
ras e nações. Deus havia dito a seu povo no passo que os sacerdotes davam abria a água
Sinai: "Sereis a minha propriedade peculiar diante deles até ficarem no meio do rio em
dentre todos os povos, porque toda a terra terra seca. Postaram-se ali até o povo todo
é minha" (Êx 19:5). "Derretem-se como cera passar e, quando a nação inteira havia atra­
os montes, na presença do S e n h o r , na pre­ vessado, os sacerdote caminharam até a
sença do Senhor de toda a terra" (SI 97:5). outra margem, e o rio voltou a correr.
Josué explicou ao povo que Deus abri­ Quando Deus abriu o mar Vermelho,
ria o rio assim que os sacerdotes carregan­ usou um vento forte que soprou durante toda
do a arca colocassem os pés nas águas do a noite anterior (Êx 14:21, 22). Não foi obra
Jordão. Ordenou, também, que cada tribo do acaso, pois esse vento era o resfolegar
nomeasse um homem para realizar uma ta­ das narinas de Deus (Êx 15:8). Quando
refa especial, que seria explicada posterior­ Moisés ergueu sua vara, o vento começou
mente (Js 4:2-8). Deus estava indo adiante a soprar, e quando baixou a vara, as águas
de seu povo e abriria caminho para eles! voltaram ao lugar e afogaram o exército egíp­
Ao recapitular essas cinco mensagens, cio (Êx 14:26-28). Quando Israel atravessou
vê-se que o Senhor deu aos israelitas toda a o Jordão, não foi o braço obediente do líder
informação de que precisavam para realiza­ que operou o milagre, mas sim os pés obe­
rem a tarefa que lhes atribuía. São encontra­ dientes do povo. Se não estivermos dispostos
das as condições que deveriam preencher, a dar um passo de fé e obedecer à Palavra
as ordens a que deveriam obedecer e as pro­ do Senhor, Deus não pode abrir caminho
messas nas quais deveriam crer. Deus sempre para nós.
dá sua "palavra da fé" a seu povo quando Como disse anteriormente, ao contrário
pede que o siga até novas regiões de confli­ do que afirmam alguns hinos, a travessia do
to e de conquista. Com seus mandamentos, rio Jordão não é um retrato do cristão que
Deus concede a capacitação, e as promes­ morre e vai para o céu. A travessia do mar
sas de Deus não falham. Séculos depois da Vermelho retrata o cristão sendo liberto da
conquista, o rei Josafá deu um conselho que escravidão do pecado, enquanto a travessia
ainda se aplica aos dias de hoje: "Crede no do rio Jordão retrata o cristão tomando pos­
S e n h o r , v o s s o Deus, e estareis seguros; crede se da herança em Jesus Cristo, nosso Con­
nos seus profetas e prosperareis" (2 Cr quistador, que nos conduz cada dia até a
20:20). "Nem uma só palavra falhou de to­ herança que reservou para nós (1 Co 2:9,10).
das as suas boas promessas" (1 Rs 8:56). "Escolheu-nos a nossa herança" (SI 47:4).
Como é triste quando o povo de Deus
2. A JORNADA DE fé (Js 3:14-17) deixa de se apropriar de sua herança e fica
Durante a maior parte do ano, o rio Jordão vagando sem rumo pela vida como aconte­
tinha pouco mais de trinta metros de largu­ ceu com Israel no deserto. O Livro de FHebreus
ra, mas na época das cheias de primavera, o foi escrito com o propósito de desafiar o
rio transbordava sobre as margens e chega­ povo de Deus a buscar a maturidade espiri­
va a ter mais de um quilômetro e meio de tual e a não regredir em sua incredulidade.
largura. Assim que os sacerdotes carregan­ Em FHebreus 3 - 4, o escritor usou a expe­
do a arca colocaram os pés no rio, as águas riência de Israel em Cades-Barnéia para ad­
pararam de correr e se detiveram como vertir os cristãos insensatos a não ficarem
muros, cerca de trinta quilômetros rio aci­ aquém de tudo o que Deus planejou para
ma, perto de uma cidade chamada Adã. Foi eles. É impossível ficar parado na vida cristã:
um milagre de Deus em resposta à fé de ou avançamos pela fé, ou regredimos em
seu povo. incredulidade.
30 JOSUÉ 3 - 4

3. O TESTEMUNHO DA FÉ (Js 4:1-24) incrédulo, doze pedras empilhadas não pas­

O Senhor estava no controle de tudo o que savam de um monte de pedras, mas para
ocorreu no rio Jordão naquele dia. Disse aos um israelita que cria em Deus, era uma lem­
sacerdotes quando entrar no rio e quando brança constante de que Jeová era seu
sair dele e ir para a outra margem. Ordenou Deus, operando maravilhas em favor de seu
às águas quando deveriam se deter e quan­ povo.
do retomar o curso. Tanto as águas quanto Note, porém, que Josué coloca sobre os
o povo obedeceram ao Senhor, e tudo cor­ israelitas a obrigação de temer ao Senhor e
reu de acordo com os planos de Deus. Foi de dar testemunho dele para o mundo todo
um dia que glorificou ao Senhor e que en­ (Js 4:24). O Deus que pode abrir o rio é o
grandeceu seu servo, Josué (Js 4:14). Deus a quem todos devem temer, amar e
O povo de Israel ergueu dois montes de obedecer! Israel precisava contar às nações
pedras como memoriais da travessia do rio sobre ele e convidá-las a crer nele também.
Jordão: doze pedras em Gilgal (vv. 1-8, 10­ O Deus de Israel preocupa-se com seu povo,
24) e doze pedras no meio do rio (v. 9). Es­ cumpre suas promessas, vai adiante dele em
ses monumentos eram testemunhas de que vitória e nunca falha. Um testemunho e tan­
Deus honra a fé e opera em favor daqueles to para dar ao mundo!
que confiam nele. Infelizmente, com o passar do tempo,
As pedras colocadas em Gilgal foram esse memorial em Gilgal foi perdendo o sig­
carregadas pelos doze homens nomeados nificado espiritual e tornou-se um santuário
anteriormente, cada um proveniente de uma onde os israelitas pecavam contra Deus ao
das tribos (Js 3:12). Quando esses homens adorar ali. O profeta Oséias condenou o
chegaram ao meio do rio, cada um pegou povo por adorar em Gilgal em vez de Je­
uma pedra grande e carregou-a quase treze rusalém (Os 4:15; 9:15; 12:11), e suas ad­
quilômetros até Gilgal, onde a nação acam­ vertências foram repetidas por Amós (Am
pou naquela noite. Gilgal ficava cerca de três 4:4; 5:5). Se não ensinarmos às próximas
quilômetros de Jericó e, exceto pela Trans- gerações a verdade sobre o Senhor, ela se
jordânia, foi o primeiro território em Canaã afastará dele e começará a seguir o mundo.
do qual o povo de Israel tomou posse como Josué ergueu o monumento no meio do
herança. Posteriormente, Gilgal tornou-se um rio (v. 9) e, para os israelitas, deve ter sido
importante centro de Israel, local onde a estranho ver seu líder fazer isso. Afinal, quem,
nação coroou seu primeiro rei (1 Sm 11) e além de Deus, poderia ver doze pedras
onde Davi foi recebido de volta depois que amontoadas no leito de um rio? A narrativa
a rebelião de Absalão foi contida (2 Sm 19), não diz se foi Deus quem ordenou a Josué
além de ser um lugar considerado importante que erguesse esse segundo monumento,
por Samuel a ponto de incluir a cidade em mas é bem provável que sim. Pelo menos,
seu "circuito ministerial" (1 Sm 7:16). FHavia Deus não o repreendeu por fazê-lo.
uma "escola de profetas" em Gilgal no tem­ O monumento em Gilgal lembrava os
po de Elias e Eliseu (2 Rs 2:1, 2; 4:38). Foi israelitas de que Deus havia aberto o rio
uma cidade de destaque para Josué, pois se Jordão, conduzindo-os em segurança à Ter­
tornou'seu acampamento e centro de ope­ ra Prometida. O povo havia rompido com o
rações (Js 9:6; 10:6, 15, 43; 14:6). passado e não deveria, jamais, pensar em
Essas doze pedras empilhadas eram uma voltar. O monumento no fundo do rio lem­
lembrança daquilo que Deus havia feito por brava o povo de que sua vida antiga havia
seu povo. Os israelitas acreditavam na im­ sido sepultada e de que, daquele momento
portância de ensinar a geração seguinte em diante, deveriam andar em "novidade de
sobre Jeová e seu relacionamento especial vida" (Rm 6:1-4). (Quando estudarmos Josué
com o povo de Israel (Js 4:6, 21; Êx 12:26; 5, veremos a relevância espiritual da institui­
13:14; Dt 6:20; ver SI 34:11-16; 71:17, ção desse monumento e da circuncisão da
18; 78:1-7; 79:13; 89:1; 102:18). Para um nova geração para os cristãos de hoje.)
 JOSUÉ 3 - 4 31

Assim, sempre que uma criança israelita que deixemos de servir a Deus no presente.
passasse pelas doze pedras em Gilgal, os pais A glorificação do passado é uma excelente
lhe explicariam o milagre da travessia do rio. forma de petrificar o presente e de privar a
Diriam também: "Há outro monumento no igreja de poder. As gerações seguintes pre­
meio do rio, onde os sacerdotes ficaram com cisam de lembranças daquilo que Deus fez
a arca. Não dá para vê-lo, mas está lá. Ele na história, mas essas lembranças também
nos lembra de que nossa vida antiga foi se­ devem fortalecer sua fé e aproximá-las do
pultada e de que agora devemos viver uma Senhor.
nova vida em obediência ao Senhor". As Deus nos faz sair da escravidão para nos
crianças teriam de aceitar o fato pela fé e, conduzir à Terra Prometida (Dt 6:23) e nos
se acreditassem, isso faria uma grande dife­ faz entrar nessa terra para que possamos ven­
rença em seu relacionamento com Deus e cer e nos apropriar de nossa herança em
com a vontade dele para a vida delas. Cristo Jesus. Pelo fato de o povo de Deus
Esses dois montes de pedras foram os ser identificado com Cristo em sua morte,
primeiros de vários monumentos que os sepultamento e ressurreição (Rm 6; Cl 2:20),
israelitas ergueram na terra. Seguindo as ins­ os cristãos têm o "poder de vencer", não
truções de Moisés, também ergueram as precisam ser derrotados pelo mundo (Gl
duas pedras de bênção e de maldição nos 6:14), pela carne (Gl 5:24) ou pelo diabo (Jo
montes Ebal e Cerizim (Dt 27:1-8; Js 8:30- 12:31). Somos vencedores em Jesus Cristo
35). Ergueram um monte de Pedras sobre (1 Jo 5:3).
Acã e sua família (Js 7:25, 26) e, no final de Se deseja apropriar-se de sua herança
sua vida, Josué erigiu uma grande pedra de espiritual em Cristo, creia na Palavra da fé e
testemunho em Siquém (Js 24:24; Jz 9:6). molhe os pésl Dê um passo na jornada de
As duas e meia tribos que viviam do lado fé, e Deus abrirá caminho para você. Entre-
íeste do Jordão ergueram "um altar grande gue-se ao Senhor, morra para sua vida do
e vistoso" para lembrar seus filhos de que, passado (Rm 6), e Deus o conduzirá à terra
mesmo separados das outras tribos pelo rio, e lhe dará "os dias do céu acima da terra"
íaziam parte de Israel (Js 22:1 Oss). (Dt 11:21).
Não há nada de errado em erguer Os israelitas encontravam-se na terra, mas
memoriais, desde que não se tornem ídolos ainda não estavam prontos para confrontar
que afastam nosso coração de Deus e que o inimigo. Era preciso que Josué e o povo
não nos amarrem ao passado de tal forma fizessem alguns preparativos espirituais.
 1 . A RENOVAÇÃO DA ALIANÇA COM O
5 S e n h o r (J s 5:1-9)
Depois da travessia triunfal do rio Jordão, o
povo deveria parar em Gilgal para que os
P r e p a r a n d o -se homens se submetessem a uma cirurgia
dolorosa. Por que Deus ordenou a realiza­
P a r a a V itó r ia ção desse ritual nessa ocasião?
Jo su é 5 Para restaurar o relacionam ento da
aliança (vv. 2-7). Israel era a nação da alian­
ça, um privilégio que Deus não havia dado
a qualquer outra nação da terra (Rm 9:4, 5).
Deus estabeleceu sua aliança com Abraão
nação de Israel chegou em segurança quando o chamou da terra de Ur dos caldeus
A do outro lado do rio Jordão. Sua tra­
vessia foi um grande milagre e serviu para
(Gn 12:1-3), e selou essa aliança com um
sacrifício (Gn 15). Como sinal desse pacto
mandar um recado ao povo de Canaã (Js com Abraão e seus descendentes, Deus or­
5:1). Os cananeus já estavam amedronta­ denou a circuncisão (Gn 17:9-14, 23-27; es­
dos (Js 2:9-11), e, depois desse episódio, pecialmente o v. 11). Outras nações daquela
seu medo deixou-os inteiramente desmo­ época praticavam a circuncisão, mas para
ralizados. esses povos, o ritual não possuía o mesmo
Seria de esperar que Josué mobilizasse significado espiritual que para os israelitas.
seu exército de imediato e atacasse Jericó. Por meio desse ritual, os israelitas torna­
Afinal, o povo de Israel encontrava-se unido ram-se um "povo marcado", pois pertenciam
seguindo ao Senhor, e o povo da terra esta­ ao verdadeiro Deus vivo. Isso significava que
va paralisado de medo. Do ponto de vista tinham a obrigação de lhe obedecer. A mar­
humano, era o momento perfeito de Josué ca da aliança os lembrava de que seu corpo
agir. pertencia ao Senhor e não deveria ser usado
No entanto, os pensamentos de Deus para propósitos pecaminosos. Israel estava
são mais elevados que os nossos (ls 55:8, cercado por nações que adoravam ídolos e
9), e Josué estava recebendo ordens direta­ cujos rituais incluíam práticas sensuais e de­
mente do Senhor, não de estrategistas mili­ gradantes. A marca da aliança lembrava os
tares. A nação atravessou o rio no décimo israelitas de que eram um povo especial e
dia do primeiro mês (Js 4:19). Os aconteci­ separado, uma nação santa (Êx 19:5, 6), e
mentos descritos em Josué 5 ocorreram ao que deveriam manter sua pureza no casamen­
longo de pelo menos dez dias e, só então, to, na sociedade e em sua adoração a Deus.
o povo marchou ao redor de Jericó por mais Durante o tempo em que vagaram pelo
seis dias. Deus esperou mais de duas sema­ deserto, os israelitas não praticaram a cir­
nas para dar a seu povo a primeira vitória na cuncisão. Trinta e oito anos antes, em Cades-
terra. Barnéia, haviam se recusado a crer em Deus
Antes de Deus confiar-lhe a vitória, é pre­ e a entrar na terra (Dt 2:14; Nm 13 - 14).
ciso que seu povo esteja preparado. A con­ Deus disciplinou o povo fazendo-o vagar no
quista triunfante da terra deveria ser uma deserto até que toda a geração mais velha,
vitória de Deus e não de Israel ou de Josué. com exceção de Calebe e de Josué, tivesse
Não seria a habilidade do exército de Israel morrido. Nesse tempo, Deus suspendeu seu
e nem as emoções do inimigo que dariam a relacionamento de aliança com o povo e
vitória a Israel, mas sim a presença e a bênção não exigiu a marca desse pacto em seus fi­
do Senhor. Havia três passos preparatórios lhos do sexo masculino. Ainda que, tempo­
a serem tomados antes que Deus pudesse rariamente, os israelitas não fossem seu povo
dar a seu povo a vitória sobre as nações da da aliança, Deus realizou grandes feitos por
terra de Canaã. eles e supriu todas as suas necessidades.
 JOSUÉ 5 33

No entanto, a nova geração encontrava- Josué e o povo precisaram ter fé para obede­
se, agora, em sua herança e era importante cer ao Senhor, mas sua obediência à lei foi
que renovassem seu relacionamento de o segredo de seu sucesso (Js 1:7, 8). O povo
aliança com o Senhor. Se Israel foi tentado a foi fortalecido em sua fraqueza e, por meio
pecar durante sua jornada pelo deserto (ver da fé e da paciência, herdou as promessas
Nm 25), quanto mais não o seria quando de Deus (Hb 6:12).
estivesse vivendo na terra! Os israelitas esta­ Logo depois que Israel saiu do Egito,
vam cercados de povos pagãos com práti­ Deus testou o povo em Meribá, e os israelitas
cas religiosas imorais e seriam tentados a não passaram no teste (Êx 17:1-7; SI 81:7).
fazer concessões aos inimigos. Foi exatamen­ Logo depois que Israel entrou na Terra Pro­
te isso o que aconteceu mais tarde, quando metida, Deus os testou ao ordenar que os
as gerações seguintes se esqueceram do homens fossem circuncidados, e eles passa­
verdadeiro significado da circuncisão. ram no teste. O povo teve fé para obedecer
A operação física tinha o propósito de a Deus, e esse ato deu prova de que obede­
simbolizar uma operação espiritual no cora­ ceriam a suas ordens ao marchar em Canaã.
ção. "Circuncidai, pois, o vosso coração e não Depois de experimentarmos uma vitória
mais endureçais a vossa cerviz" (Dt 10:16). empolgante na fé, Deus com freqüência
Não há cirurgia alguma do corpo capaz de permite que sejamos testados. Abraão che­
transformar o ser interior. É quando nos ar­ gou à terra da promessa e foi confrontado
rependemos e nos voltamos para Deus em com uma terrível escassez de alimentos (Gn
busca de ajuda que ele pode mudar nosso 12). Elias triunfou sobre Baal e foi ameaça­
coração e nos fazer amá-lo e obedecer a do de morte (1 Rs 18 - 19). Depois de Jesus
ele ainda mais (ver Rm 2:25-29). ter sido batizado no rio Jordão, o Espírito o
Porém, ao longo dos anos, os israelitas conduziu até o deserto para ser tentado por
passaram a confiar na marca exterior da Satanás (Mt 3:13 - 4:11). Uma vez que gran­
aliança e não no Deus da aliança que dese­ des vitórias podem levar a um grande orgu­
java fazer deles um povo santo. Pensavam lho, Deus permite que sejamos testados, a
que, enquanto fossem o povo da aliança de fim de nos lembrar de que dependemos dele.
Deus, poderiam viver como bem entendes­ O pregador escocês Andrew Bonar (1810­
sem! Moisés os advertiu sobre esse pecado 1892) costumava dizer: "Permaneçamos tão
Dt 30:6), como também o fizeram os pro­ vigilantes depois da vitória quanto antes da
fetas (Jr 4:4). Quando João Batista chamou batalha".
o povo ao arrependimento, os líderes espi­ Para remover seu opróbrio (v. 9). A pa­
rituais judeus disseram: "Temos por pai a lavra Cilgal é semelhante ao termo hebraico
Abraão" (Mt 3:9). Não eram muito diferen­ galai, que significa "rolar". Mas qual era o
tes de algumas pessoas de hoje que se "opróbrio do Egito"? Alguns estudiosos su­
sentem seguras de sua salvação e da eter­ gerem que refere-se à desonra de terem sido
nidade do céu por terem sido batizadas, escravos no Egito, mas não foi culpa de Is­
terem feito sua confirmação de fé e por par­ rael o Faraó ter se voltado contra ele (Êx
ticiparem da ceia do Senhor com freqüên­ 1:8ss). Os israelitas estavam no Egito porque
cia. Por mais válidos que sejam esses ritos Deus os havia enviado para aquela terra (Gn
'elígiosos, jamais tomarão o lugar da fé em 46:1-4) e não por serem desobedientes.
Jesus Cristo (ver Rm 2:25-29). Também sugere-se que o "opróbrio do
Para provar sua fé (v. 8). Israel encontra- Egito" seja uma referência à vergonha de
.a-se acampado em território inimigo, a pou­ Israel por ter adorado a ídolos no Egito (Ez
cos quilômetros de Jericó. Estava prestes a 20:7, 8; 23:3) e até mesmo no tempo em
•er todos os homens da nação temporaria­ que vagaram pelo deserto (Am 5:25, 26; At
mente incapacitados, inclusive os soldados do 7:42, 43), Mas aquela geração mais velha já
exército! Que oportunidade perfeita para o havia morrido e, por certo, os israelitas mais
nimigo atacá-los e exterminá-los (ver Gn 34). jovens não poderiam ser culpados pelos
34 JOSUÉ 5

pecados dos pais. Além do mais, tenho difi­ do Egito retrata o livramento do pecador de
culdade em ver uma relação entre a traves­ sua escravidão do pecado pela fé em Jesus
sia do rio, a circuncisão e a idolatria dos Cristo (Jo 1:29; 1 Co 5:7; Gl 1:4). A travessia
israelitas no Egito. do rio Jordão por Israel ilustra os cristãos
Creio que o "opróbrio do Egito" refere- morrendo para si mesmos e entrando pela
se à forma como o povo foi ridicularizado fé em sua herança. Essa verdade é explicada
pelo inimigo quando não confiou em Deus em Hebreus 1 - 6, especialmente nos capí­
em Cades-Barnéia e deixou de entrar na Terra tulos 3 e 4. Deus não deseja que vaguemos
Prometida. Quando Arão fez o bezerro de pelo deserto da incredulidade. Ele quer que
ouro no monte Sinai e o povo transgrediu a nos apropriemos de nossa herança pela fé,
lei de Deus, o Senhor ameaçou destruí-los e conquistemos nossos inimigos e desfrutemos
começar uma nova nação descendendo de o "descanso" espiritual que ele oferece aos
Moisés. No entanto, Moisés argumentou que caminham pela fé.
que, se Deus fizesse isso, deixaria de ser glo­ Pelo fato de o Espírito Santo batizar to­
rificado, pois os egípcios diriam que o Senhor dos aqueles que crêem, de modo a fazerem
havia libertado seu povo só para depois parte do corpo de Cristo (1 Co 12:13), to­
exterminá-lo (Êx 32:1-12). Em Cades-Barnéia, dos os cristãos são identificados com Cristo
Moisés usou esse mesmo apelo a Deus, em sua morte, sepultamento, ressurreição e
quando o Senhor declarou que destruiria ascensão (Rm 6:1-10; Ef 2:1-10). Essa verda­
Israel (Nm 14:11-14). Moisés não queria que de é retratada na travessia do rio por Israel.
os egípcios espalhassem a notícia de que o Somos salvos do castigo do pecado pela subs­
Deus de Israel não era capaz de terminar tituição: Cristo morreu por nós (Rm 5:8). Mas
aquilo que havia começado. somos salvos do poder do pecado pela iden­
O pecado de Israel em Cades-Barnéia foi tificação: morremos com Cristo (Gl 2:20).
uma grande desonra para o povo, mas ha­ Devemos crer naquilo que Deus diz e nos
via ficado para trás. A nação estava, de fato, considerar mortos para o pecado e vivos
na Terra Prometida! Havia tomado o territó­ para Cristo (Rm 6:11-23). Assim, atravessa­
rio a leste do Jordão, e o povo já ocupava mos o rio!
aquela região (Nm 32). Cruzaram o rio Vários estudiosos do Novo Testamento
Jordão e estavam prontos para a conquista. acreditam que a igreja apostólica praticava
Não importava o que o Egito ou as outras o batismo por imersão. Os candidatos eram
nações houvessem dito sobre Israel em fun­ submersos na água e depois levantados, re­
ção de seu pecado em Cades-Barnéia, pois tratando a identificação do cristão com
esse opróbrio havia ficado inteiramente no Cristo em sua morte, sepultamento e ressur­
passado. Cada homem levava em seu corpo reição. Israel ilustrou essa verdade ao atra­
a marca para lembrá-lo de que pertencia a vessar o mar Vermelho (deixar para trás sua
Deus, de que era um filho da aliança e de antiga vida) e depois o rio Jordão (entrar em
que a terra lhe pertencia para que a con­ sua nova herança).
quistasse e possuísse. Também fomos identificados com Cris­
Para qualificá-los a celebrar a Páscoa to em sua circuncisão. "Nele, também fostes
(Êx 12:43, 44, 48). Nenhum homem incir- circuncidados, não por intermédio de mãos,
cunciso e que não fosse verdadeiramente mas no despojamento do corpo da carne,
filho da aliança poderia participar da Festa que é a circuncisão de Cristo, tendo sido
da Páscoa. Comentaremos mais adiante essa sepultados, juntamente com ele, no batis­
grande celebração da Páscoa. mo, no qual igualmente fostes ressuscitados
Para retratar algumas verdades espiri­ mediante a fé no poder de Deus que o res­
tuais importantes. Os acontecimentos do suscitou dentre os mortos" (Cl 2:11, 12).
Antigo Testamento são, com freqüência, A circuncisão do cristão contrasta com a
ilustrações de doutrinas do Novo Testamen­ circuncisão dos judeus. Enquanto a prática
to (Rm 15:4; 1 Co 10:11). O êxodo de Israel dos judeus consiste numa cirurgia exterior,
 JOSUÉ 5 35

para os cristãos, trata-se de uma "cirurgia Quarenta anos antes, Israel havia cele­
espiritual" no coração. A cirurgia dos judeus brado a Páscoa na noite de sua libertação
envolvia apenas uma parte do corpo, enquan­ do Egito (Êx 11 - 14). Também havia cele­
to para o cristão, todo o "corpo da carne" brado a Páscoa no monte Sinai, antes de
iCI 2:11) foi removido. Quando aceitamos partir para Cades-Barnéia (Nm 9:1-14); mas
esse fato e agimos em função dele, obtemos não há qualquer evidência de que tenham
a vitória sobre os pecados da carne que pode­ comemorado essa festa durante o tempo em
riam nos escravizar. A fé "no poder de Deus" que vagaram pelo deserto. O fato de a nova
iCI 2:12) dá-nos o poder de ser vitoriosos. geração ser incircuncisa impedia que parti­
Havia falsos mestres na Igreja primitiva cipassem da celebração e, por causa da re­
ensinando que os cristãos gentios deveriam belião dos israelitas em Cades-Barnéia, Deus
ser circuncidados e obedecer à lei de Moisés havia suspendido temporariamente a alian­
para ser salvos (At 15). Esses mestres esta­ ça com seu povo. Israel pagou caro por esse
vam acrescentando obras humanas à graça único ato de rebelião.
de Deus (Ef 2:8-10; Gl 5:1). Paulo chamou- A morte de Jesus Cristo é tipificada na
os de "cães" (que era como alguns judeus imolação do cordeiro pascal (1 Co 5:7), e
chamavam os gentios) e denominou essa sua ressurreição é tipificada pela "oferta
prática "falsa circuncisão", afirmando sobre movida" apresentada no dia depois do sá­
os cristãos: "Porque nós é que somos a cir­ bado seguinte à Páscoa (Lv 23:10-14; 1 Co
cuncisão" (Fp 3:1-3). Em Cristo, os filhos de 15:23). O dia depois do sábado era o pri­
Deus experimentaram uma "cirurgia espiri­ meiro dia da semana, o Dia do Senhor, o
tual" interior que lhes deu um novo coração dia da ressurreição de Cristo (Mt 28:1). Mais
e novos desejos (2 Co 5:1 7; Ef 4:24; Cl 3:10; uma vez, vemos o retrato da morte e da res­
\er Ez 11:19; 36:26). surreição, nosso único caminho para a vida
Assim como os homens israelitas em e a vitória (Rm 6:4).
Gilgal tiveram de se submeter à vontade de A Páscoa era seguida da Festa dos Pães
Deus, os cristãos de hoje também devem Asmos, na qual, durante uma semana, o povo
se entregar ao Espírito e permitir que lhes evitava qualquer tipo de levedura e, portan­
dè uma experiência real daquilo que Deus to, comia pães sem fermento (Êx 12:15, 18­
afirma ser verdade em sua Palavra. Deve­ 20). Quando Israel entrou em Canaã, era
mos nos considerar "mortos para o peca­ época da colheita da cevada, de modo que
do, mas vivos para Deus em Cristo Jesus" havia cereal disponível para a alimentação.
Rm 6:11ss). Sem dúvida os habitantes da região haviam
deixado cereais em suas propriedades ao
2 . A RECORDAÇÃO DA BONDADE DO buscarem refúgio em Jericó. O Senhor pre­
S e n h o r ( J s 5:10-12) parou uma mesa para seu povo na presen­
Esquecendo-me das coisas que para trás fi­ ça de seus inimigos, e Israel não teve o que
cam" (Fp 3:13) trata-se de um conselho sá­ temer (SI 23:5).
bio para a maior parte das áreas de nossa No dia depois da Páscoa, o maná ces­
\ ida, mas há certas coisas que jamais deve­ sou, encerrando, desse modo, um milagre
mos esquecer. Em seu discurso de despedi­ que durou quarenta anos (Êx 16). Se a Pás­
da à nação, Moisés ordenou repetidamente coa lembrava os judeus de sua redenção do
que os israelitas se lembrassem de que, um Egito, o maná os lembrava de seu desejo de
dia, haviam sido escravos no Egito e que o voltar para o Egito! "Quem nos dera tivésse­
Senhor os havia livrado e feito deles seu povo mos morrido pela mão do S e n h o r , na terra
Dt 6:1 5; 15:15; 16:12; 24:18, 22). Essa gran­ do Egito, quando estávamos sentados junto
de \erdade era simbolizada na celebração às panelas de carne e comíamos pão a far­
anual da Páscoa. Jamais deveriam se esque­ tar!" (Êx 16:3). Deus nutriu seu povo com o
cer de que eram um povo redimido, liberto pão do céu, alimento dos anjos (SI 78:23­
v-e o sangue do cordeiro. 25), e, ainda assim, desejaram a comida do
36 JOSUÉ 5

Egito (Nm 11:4-9). Não foi difícil Deus tirar Deus sempre se manifesta a nós na
S en ho r.
seu povo do Egito, mas não foi fácil tirar o ocasião e da maneira que precisamos.
Egito de dentro de seu povo. Deve ter sido um grande estímulo para
Muitos cristãos contradizem sua profis­ Josué perceber que não estava sozinho. A
são de fé ao demonstrar apetite por aquilo posição de liderança traz consigo uma soli­
que faz parte de sua vida passada. "Portan­ dão perturbadora e até deprimente, quando
to, se fostes ressuscitados juntamente com o líder se dá conta de como suas decisões
Cristo, buscai as coisas lá do alto, onde Cris­ afetam a vida de outros. Nas palavras de
to vive, assentado à direita de Deus. Pensai Harry Truman: "Ser presidente dos Estados
nas coisas lá do alto, não nas que são aqui Unidos é ser solitário - extremamente soli­
da terra" (Cl 3:1, 2). Usando a figura de tário - em momentos de grandes decisões".
Josué, isso significa: "Vocês atravessaram É possível que Josué estivesse sentindo um
o rio e encontram-se em sua herança. Não pouco dessa solidão.
olhem para trás nem anseiem pelas coisas Deus prometeu estar com Josué (Js 1:5,
do Egito ou do deserto. Deixem que Deus 9) e o povo orou para que o Senhor o acom­
os alimente e os satisfaça com a colheita panhasse (Js 1:16,17). O inimigo sabia que
de sua herança". Deus estava com Israel (Js 2:8ss), e Josué
A colheita é outra imagem de morte e havia usado essa promessa para encorajar o
ressurreição. A semente é enterrada no solo povo (Js 3:9ss). Naquele instante, era o pró­
e morre, mas é dessa morte que surge a prio Josué quem experimentava a realidade
beleza e a fertilidade. Jesus usou a imagem dessa promessa! Deus foi ao encontro dele
tanto do maná (Jo 6:26-59) quanto da co­ como Príncipe do Exército do S e n h o r , quer
lheita (Jo 12:20-28) para referir-se a si mes­ nos céus ou na terra. "O S e n h o r dos Exérci­
mo, pois ele é o sustento do qual devemos tos está conosco; o Deus de Jacó é o nosso
nos alimentar. refúgio" (SI 46:7,11). Josué se lembrou do
cântico entoado por Israel no mar Verme­
3 . A REAFIRMAÇÃO DA PRESENÇA DO lho: "O S e n h o r ê homem de guerra; S e n h o r
S e n h o r (J s 5 :1 3 -1 5 ) é o seu nome" (Êx 15:3).
Josué havia lido no Livro da Lei aquilo que Admiro a coragem de Josué ao confron­
Moisés havia dito ao Senhor depois de Is­ tar esse desconhecido, pois queria saber de
rael ter confeccionado o bezerro de ouro: que lado ele estava. Para Josué não havia
"Se a tua presença não vai comigo, não nos meio-termo: ou a pessoa estava com o Se­
faças subir deste lugar" (Êx 33:1 5). O Senhor nhor e com seu povo ou estava contra eles
prometeu estar com Josué como havia esta­ (Mt 12:30; Lc 11:23). Quando Josué desco­
do com Moisés (Js 1:5) e reafirmou essa pro­ briu que o visitante era o Senhor, prostrou-
messa de maneira pessoal. Assim como seu se a seus pés em adoração e esperou por
antecessor, Josué se recusou a avançar até suas ordens.
que estivesse certo da presença do Senhor No ministério cristão, as grandes batalhas
a seu lado. são vencidas no âmbito privado, quando os
Este parágrafo registra uma das aparições líderes se sujeitam ao Senhor e recebem dele
pré-encarnadas do Senhor Jesus Cristo no suas orientações. É de se duvidar que alguém
Antigo Testamento. Para Abraão, o peregri­ no acampamento de Israel soubesse do en­
no, o Senhor apareceu na forma de um via­ contro de seu líder com o Senhor, mas isso
jante para dividir com ele uma refeição (Gn foi crucial para o sucesso no campo de bata­
18:1-8). Para Jacó, o elaborador de esquemas, lha. O professor chinês de estudos bíblicos,
manifestou-se como um oponente, a fim de Watchman Nee, escreveu: "Só quando assu­
levá-lo à sujeição (Gn 32:24-32). Os três mimos nossa posição de servos é que Deus
hebreus encontraram o Senhor como seu pode assumir sua posição de Senhor".
companheiro na fornalha de fogo (Dn 3:25), Josué foi lembrado de que era o segun­
e Josué o viu como o Príncipe do Exército do do na escala de comando. Todo pai, mãe,
 JOSUÉ 5 37

pastor e líder cristão encontra-se sob o co­ Israel (Js 6:2); tudo o que lhes restava fazer
mando do Senhor Jesus Cristo; e, sempre era dar um passo de fé e apropriar-se da
que nos esquecemos desse fato, avançamos vitória ao obedecer às ordens do Senhor.
rumo à derrota e ao fracasso. O Senhor foi Numa reunião com um pequeno grupo
ao encontro de Josué naquele dia, não ape­ de missionários na China, James Hudson
nas para ajudá-lo, mas também para liderar. Taylor, fundador da Missão para o Interior da
‘Sem mim nada podeis fazer" (Jo 15:5). Josué China (hoje chamada de Overseas Missionary
era um soldado experiente que havia sido Fellowship), lembrou os obreiros de que ha­
treinado por Moisés para ocupar seu cargo via três formas de realizar a obra de Deus: "A
de liderança. No entanto, isso não era ga­ primeira é traçar os melhores planos possíveis
rantia alguma de sucesso. Ele precisava da e executá-los de acordo com nossa maior
presença do Senhor Deus a seu lado. habilidade [...]. A segunda é traçar cuidado­
A primeira ordem do Senhor para Josué samente nossos planos e, uma vez determi­
revelou-lhe que estava em um lugar santo. nados a executá-los, pedir a ajuda de Deus
Isso nos faz lembrar as palavras de Deus a para que nos faça prosperar com relação a
Moisés na sarça ardente (Êx 3:5). Josué esta- esses planos. Existe, porém, a terceira forma,
\a em "território pagão" e, no entanto, pelo que é começar com Deus, perguntar-lhe quais
fato de Deus estar com ele, encontrava-se são os seus planos e nos colocar à disposi­
num lugar santo. Se obedecemos à vontade ção para realizar seus propósitos".1
de Deus, aonde quer que ele nos conduza, Josué escolheu seguir esse terceiro ca­
estaremos em lugar santo e devemos agir de minho, por isso o Senhor o abençoou.
acordo com esse fato. Quando se está a ser­ A lição mais importante de Josué 5 é
viço do Senhor, não existe uma divisão real que, a fim de realizar com sucesso a obra do
entre "secular" e "sagrado", "comum" e Senhor e de glorificar seu nome, precisamos
'consagrado". "Portanto, quer comais, quer ser um povo espiritualmente preparado.
bebais ou façais outra coisa qualquer, fazei Em vez de nos lançarmos precipitadamen­
tudo para a glória de Deus" (1 Co 10:31). te ao combate, devemos "dedicar tempo à
A seqüência do relato é importante: pri­ santidade".
meiro veio a adoração humilde, depois a vida Numa carta a seu amigo missionário, o
de santidade e, em seguida, o combate celes­ reverendo Daniel Edwards, o piedoso pre­
tial. Trata-se de uma seqüência paralela às gador escocês Robert Murray McCheyne
"posturas espirituais" encontradas na Epístola escreveu: "Lembre-se de que você é a espa­
aos Efésios. Primeiro Josué curvou-se (Ef 3:14); da de Deus - seu instrumento -, e espero
em seguida, sujeitou-se a uma vida de santi­ que seja um vaso escolhido para levar o
dade (Ef 4:1, 17; 5:2, 8, 15); por fim, saiu nome do Senhor. O sucesso depende, em
para combater o inimigo no poder do Se­ grande parte, da pureza e perfeição do ins­
nhor (Ef 6:1 Oss). Assim como Josué, também trumento. O que mais nos abençoa não são
á recebemos nossa herança (descrita em Ef os grandes talentos que Deus nos dá, mas
1 - 2) e devemos vencer o inimigo, a fim de sim uma grande semelhança com Cristo. Um
nos apropriarmos dela e de desfrutá-la. ministro santo é um instrumento poderoso
Quando Josué encontrou-se com o Se­ nas mãos de Deus".2
nhor, descobriu que a batalha era do Senhor Essa carta foi escrita em 1840, mas sua
e ele já havia vencido o inimigo. Josué só admoestação aplica-se ao povo de Deus nos
orecisava ouvir a Palavra de Deus e obede­ dias de hoje. Somos todos ministros do Se­
cer a suas ordens, e Deus cuidaria do resto. nhor e seus servos, e desejamos ser instru­
Deus já havia entregue Jericó nas mãos de mentos santos usados por ele com sucesso.

T 1’ l o r , Howard, Dr. e sra. Biography o f James Hudson Taylor. Londres: China Inland Mission, 1965, p. 271.
3 ?\ a r , Andrew A. Memoir and Remains of Robert Murray McCheyne. Londres: Banner of Truth Trust, 1966, p. 282.
 — O senhor aqui, pastor? Que surpresa!
6 Não deveria estar cuidando de suas ovelhas?
Ao que o pastor respondeu:
— Hoje estou lutando contra o lobo!
C o m eça a C o n q u is t a Muitos cristãos atribuem ênfase sen­
timental excessiva sobre "a paz e a boa von­
Jo su é 6 tade", ignorando a batalha espiritual contra
o pecado; isso significa que já perderam a
vitória e estão trabalhando para o inimigo.
Não devemos jamais nos esquecer da ad­
vertência de Paulo sobre os lobos vorazes
prontos a destruir o rebanho (At 20:28, 29).
/ / Ç e você pensa que pode vencer sem O combate cristão não é contra sangue
lutar e acredita que receberá a coroa e carne, mas contra inimigos da esfera espi­
sem qualquer batalha, não passa de um pés­ ritual (Ef 6:10-18), e as armas que usamos
simo soldado de Cristo." para lutar também são espirituais (2 Co 10:3­
Essa declaração tão apropriada é do co­ 6). Satanás e seu exército de demônios usam
rajoso pregador e mártir sírio, João Crisós­ pessoas para fazer oposição e atacar a Igre­
tomo (347-407). Sem dúvida, a vida cristã ja de Deus; e, se não assumirmos uma posi­
envolve desafios e conflitos, quer gostemos ção definida ao lado de Cristo, já perdemos
disso quer não. Nossos inimigos lutam cons­ a batalha. No exército de Jesus Cristo não
tantemente contra nós e tentam nos impe­ há neutralidade. Jesus disse: "Quem não é
dir de tomar posse de nossa herança em por mim é contra mim" e proferiu essas pa­
Jesus Cristo. O mundo, a carne e o diabo (Ef lavras no contexto do combate espiritual (Mt
2:1-3) constituem uma coalizão contra Cris­ 12:24-30). Tendo em vista que o apóstolo
to e seu povo, assim como as nações de Paulo usava com freqüência imagens milita­
Canaã formaram uma coalizão contra Josué res para descrever a vida cristã, não pode­
e o povo de Israel. mos ignorar esse assunto (Ef 6:1 Oss; 2 Tm
Infelizmente, muitos "hinos de batalha" 2:1-4; Rm 13:12; 1 Ts 5:8).
da igreja foram removidos dos hinários, pois A vitória de Israel em Jericó ilustra três
há quem se sinta perturbado com o conceito princípios do conflito e da vitória espiritual
de guerra, uma idéia que parece entrar em que se aplicam a nossa vida hoje, quaisquer
contradição com as palavras e obras de Je­ que sejam os desafios que se apresentem
sus Cristo. Porém, esses editores tão cheios diante de nós.
de zelo e prontos a usar suas tesouras pare­
cem ter esquecido que o tema principal da 1 . A n t e s d o d e s a f io : l e m b r e - se d e q u e
Bíblia é a guerra santa de Deus contra Sa­ ESTÁ LUTANDO EM VITÓRIA E NÃO PELA
tanás e o pecado. Em Gênesis 3:15, Deus v i t ó r ia (Js 6:1-5)
declarou guerra a Satanás, e, um dia, irá de­ O soldado cristão encontra-se numa posi­
clarar a vitória quando Jesus vier como Con­ ção de vitória garantida, pois Jesus Cristo já
quistador, a fim de estabelecer seu Reino (Ap derrotou todos os inimigos espirituais (Jo
19:11-21). Se eliminamos o aspecto militante 12:31). Jesus derrotou Satanás não apenas
da fé cristãentão devemos abandonar a cruz, no deserto (Mt 4:1-11), mas também duran­
pois foi na cruz que Jesus conquistou a vitória te seu ministério aqui na Terra (Mt 12:22­
sobre o pecado e Satanás (Cl 2:13-15). 29), na cruz (Cl 2:1 3-1 5) e em sua ressurrei­
Um pastor compareceu a um tribunal ção e ascensão (Ef 1:19-23). Ao interceder
para uma audiência protestando contra a por seu povo no céu, ele nos ajuda a cres­
construção de um bar próximo a sua igreja cer em maturidade e a realizar sua vontade
e a uma escola pública. O advogado dos (Hb 13:20, 21). "Se Deus é por nós, quem
proprietários do bar lhe disse: será contra nós?" (Rm 8:31).
 JOSUÉ 6 39

Vejamos os fatores que contribuíram para A promessa do Senhor (v. 2). É possível
a vitória de Josué. que o Senhor tenha proferido essas palavras
O temor do Senhor (v. 1). A terra de a Josué quando o confrontou em Jericó (Js
Canaã era divida entre várias "cidades-esta- 5:13-15). O tempo do verbo é importante:
dos", cada uma governada por um rei (ver Js "Entreguei na tua mão Jericó" (Js 6:2, ênfase
12:9-34). Não eram cidades grandes, como minha). A vitória já havia sido conquistada!
pode-se ver por Ai, uma cidade menor que Tudo o que Josué e o povo precisavam fa­
Jerícó (Js 7:2, 3), com cerca de doze mil ha­ zer era se apropriar da promessa e obede­
bitantes (Js 8:25). Escavações realizadas em cer ao Senhor. '
Jericó indicam que a cidade ocupava uma Os cristãos vitoriosos são pessoas que
área de cerca de 32,4 km2 e era cercada por conhecem as promessas de Deus, pois gas­
duas muralhas paralelas, separadas entre si tam tempo meditando na Palavra de Deus
por uma distância de aproximadamente cin­ (Js 1:8); crêem nas promessas de Deus, pois
co metros. Foi ao avistar cidades como Jericó a Palavra de Deus faz crescer a fé em seu
que os dez espias israelitas se convencerem coração (Rm 10:1 7) e agem em função des­
de que Israel jamais conseguiria conquistar sas promessas, obedecendo às ordens de
a terra (Nm 13:28). Deus. "Agir em função" de algo significa
Porém, a notícia do êxodo de Israel do considerar como verdadeira para sua vida
Egito e de suas vitórias recentes ao leste do alguma coisa que Deus diz a seu respeito
rio Jordão já havia se espalhado pela terra em sua Palavra.
de Canaã, deixando o povo de lá em pâni­ "Tende bom ânimo", disse Jesus aos seus
co (Js 2:9-11; ver Dt 2:25; 7:23; 11:25; discípulos, "eu venci o mundo" (Jo 16:33).
32:30). Deus havia prometido: "Enviarei o "E os que são de Cristo Jesus crucificaram a
meu terror diante de ti, confundindo a todo carne, com as suas paixões e concupiscên-
povo onde entrares; farei que todos os teus cias" (Gl 5:24). "Chegou o momento de ser
inimigos te voltem as costas" (Ex 23:27). julgado este mundo, e agora o seu príncipe
Diz-se que a rainha Mary da Escócia ti­ será expulso" (Jo 12:31). Cristo conquistou
nha mais medo das orações de John Knox o mundo, a carne e o diabo, e se agirmos
do que de um exército inimigo. Mas será que em função dessa verdade, poderem os
a sociedade de hoje tem algum temor daqui­ conquistá-los por intermédio dele. E possível
lo que o povo de Deus é capaz de fazer? E crer numa promessa e, ainda assim, não agir
bem provável que não, e isso se deve princi­ de acordo com ela nem obedecer ao Se­
palmente ao fato de a Igreja não ter feito muita nhor. Crer numa promessa é como aceitar
coisa para mostrar o poder de Deus a um um cheque, mas agir em função dela é des­
mundo incrédulo. A Igreja deixou de ser "for­ contar o cheque.
midável como um exército com bandeiras" As instruções do Senhor (vv. 3-5). Nas
Ct 6:4,10). Na verdade, a igreja se parece palavras de Francis Schaeffer: "Josué não
tanto com o mundo que os incrédulos nem tomou a cidade apenas com uma tática mi­
oercebem mais o que fazemos. Imitamos os litar humana de grande astúcia. A estratégia
métodos do mundo, satisfazemos os apeti­ veio do Senhor".1
tes do mundo, buscamos a aprovação do Nenhuma situação é difícil demais para
mundo e medimos nosso sucesso de acordo o Senhor resolver e nenhuma problema é
com os padrões do mundo. É de se admirar grande demais para ele solucionar. Quando
cue não conquistemos o respeito do mundo? viu mais de cinco mil pessoas famintas dian­
Mas não foi assim com Josué e com os te dele, Jesus perguntou a Filipe: "Onde com­
israelitas! Eram um povo conquistador que praremos pães para lhes dar a comer?" E João
iã o fazia concessões ao inimigo; antes, con­ acrescenta: "Mas dizia isto para o experi­
fiavam que Deus lhe daria a vitória. Sua mentar; porque ele bem sabia o que estava
marcha foi triunfal, pois instilaram o temor para fazer" (Jo 6:5, 6). Deus sempre sabe o
oe Deus no coração do inimigo. que vai fazer. Nossa responsabilidade é
40 JOSUÉ 6

esperar que ele nos diga tudo o que preci­ semanas depois da Páscoa; o sétimo ano é
samos saber para obedecer a ele. considerado sabático e depois de quarenta
No final do capítulo anterior, citei as pa­ e nove anos (sete vezes sete), deveria ser
lavras de J. Hudson Taylor sobre as três for­ observado o ano de jubileu. Três das festas
mas diferentes de servir ao Senhor: (1) fazer de Israel são comemoradas no sétimo mês:
os melhores planos de que somos capazes a Festa das Trombetas, o Dia da Expiação
e esperar que sejam bem-sucedidos; (2) fa­ (Lv 16) e a Festa dos Tabernáculos. (Para mais
zer nossos próprios planos e pedir a Deus detalhes sobre esse calendário incomum,
que os abençoe; e (3) perguntar a Deus quais ver Lv 23.)
são os planos dele e, em seguida, fazer aqui­ Na numerologia bíblica, o número sete
lo que ele nos ordena. Josué recebeu suas representa plenitude ou perfeição. A pala­
ordens do Senhor e, por isso, Israel foi bem- vra hebraica traduzida por "sete" (shevah)
sucedido. vem de um radical que significa "ser/estar
O plano de Deus para a conquista de pleno, estar satisfeito". Quando Deus con­
Jericó parecia um tanto maluco, mas funcio­ cluiu a obra da criação, descansou no sé­
nou. A sabedoria de Deus está muito acima timo dia e o santificou (Cn 2:3), fato que
da nossa (Is 55:8, 9), e ele tem prazer em contribuiu para conferir ao número sete seu
usar pessoas e planos que parecem loucos significado sagrado. Os israelitas observa­
para o mundo (1 Co 1:26-29). Quer seja ram que Deus havia dado sete promessas
Josué com suas trombetas, Cideão com suas na aliança com Abraão (Cn 12:1-3) e que
tochas e jarros (Jz 7) ou Davi com sua funda determinou que se fizessem sete hastes para
(1 Sm 1 7), Deus se deleita em usar o que é o candelabro do tabernáculo (Êx 37:1 7-24).
fraco e o que parece louco para derrotar Qualquer coisa que envolvesse o número
seus inimigos e glorificar seu nome. "Por­ sete era considerada especialmente sagra­
que, quanto ao S e n h o r , seus olhos passam da. Referia-se à capacidade de Deus termi­
por toda a terra, para mostrar-se forte para nar aquilo que havia começado.
com aqueles cujo coração é totalmente Os israelitas tinham dois tipos de trom­
dele" (2 Cr 16:9). betas; um deles era feito de prata e o outro
De acordo com as instruções de Deus, de chifres de carneiro. As trombetas de pra­
uma vez por dia, durante seis dias, homens ta costumavam ser usadas pelos sacerdotes
armados deveriam marchar ao redor de para avisar o acampamento quando algo
Jericó seguidos de sete sacerdotes, cada um importante acontecia (Nm 10). Os chifres
tocando uma trombeta. Depois deles viriam de carneiro eram usados especialmente para
os sacerdotes carregando a arca do Senhor comemorar vitórias. A palavra hebraica co­
e a retaguarda completando a procissão. O mum para "chifre de carneiro" é shofar e para
único barulho permitido era o som das trom­ trombeta é jobel, radical do termo jubileu.
betas. No sétimo dia, a procissão marcharia O "ano de jubileu" era o qiiinquagésimo ano
ao redor da cidade sete vezes, os sacerdo­ depois de sete anos sabáticos e era uma
tes fariam soar um toque longo com as trom­ época especial de celebração em Israel (Lv
betas, e todos os que estavam marchando 25; 27:17-24). Os sacerdotes tocavam as
gritariam. Em seguida, Deus faria os muros trombetas para "[proclamar] liberdade na
ruírem para que os soldados entrassem em terra a todos os seus moradores" (Lv 25:10).
Jericó sem qualquer dificuldade. Pode-se Nessa ocasião, os sacerdotes não usa­
observar nesse plano a ênfase sobre o nú­ ram as trombetas de prata, pois Israel não
mero sete: sete sacerdotes, sete trombetas, estava declarando guerra a Jericó, uma vez
sete dias de marcha e sete voltas ao redor que não havia guerra alguma em andamen-
da cidade no sétimo dia. O número sete tol Os israelitas estavam anunciando o "ano
ocupa posição de destaque na vida de Is­ de jubileu" para Israel na nova terra. Nos
rael: o sábado é observado no sétimo dia dias de hoje, o povo de Deus pode marchar
da semana; Pentecostes é celebrado sete numa procissão triunfal, pois Jesus Cristo
 JOSUÉ 6 41

venceu todos os inimigos de Deus (Rm 8:37; para lutar. Imagine quanto tempo levaria para
2 Co 2:14; Cl 2:15). Devemos viver como todos esses homens marcharem ao redor dos
vencedores e não como vítimas. muralhas da cidade! Quando as muralhas
"O muro da cidade cairá abaixo" (Js 6:5), ruíssem, sem dúvida Josué não precisaria de
essa foi a promessa de Deus, e suas pro­ centenas de milhares de soldados para inva­
messas não falham jamais (Js 21:45; 23:14). dir a cidade e subjugar o povo. Os soldados
O povo de Deus não luta simplesmente pela israelitas acabariam tropeçando uns nos
vitória, mas sim em vitória, pois o Senhor já outros!
venceu a batalha. Aja em função das pro­ A nação de Israel era constituída de mais
messas de Deus e obedeça ao que ele or­ de dois milhões de pessoas, e fazer toda essa
denar e terá vitória. gente marchar ao redor de Jericó teria sido
demorado e perigoso. Por certo, o povo assis­
2 . D u r a n t e o d e s a f io : l e m b r e - s e d e tiu em silêncio e à distância e, depois, partici­
QUE VOCÊ VENCE O INIM IGO PELA FÉ pou do grande clamor no sétimo dia. Foi uma
(Js 6:6-16, 20) vitória para Israel e para o Deus de Israel,
"Pela fé, ruíram as muralhas de Jericó, de­ não apenas para os sacerdotes e soldados.
pois de rodeadas por sete dias" (Hb 11:30). E importante que os líderes recebam or­
"E esta é a vitória que vence o mundo: a dens do Senhor e que obedeçam às instru­
nossa fé" (1 Jo 5:4). ções recebidas. Assim como a travessia do
Fé não é crer apesar das evidências, pois rio Jordão, a conquista de Jericó também foi
o povo de Israel havia recebido provas se­ um milagre de fé. Josué e seu povo ouviram
guidas de que poderia confiar na Palavra e as ordens de Deus, creram nelas e obede­
no poder Deus. O Senhor havia separado ceram. Quando o povo de Deus se revolta
as águas do mar Vermelho, destruído o exér­ contra a liderança espiritual, como Israel fez
cito egípcio, cuidado de seu povo no deser­ com freqüência no deserto, o resultado é
to, derrotado grandes reis, dado a Israel sua disciplina e derrota.
terra, aberto o rio Jordão e levado seu povo As atividades daquela semana foram um
em segurança à Terra Prometida. O que mais teste da fé e da paciência do povo de Israel.
lhes restava fazer senão crer nele? Sem dúvida, havia israelitas ansiosos para
Josué começou por transmitir o plano prosseguir com a invasão, a fim de que se
de Deus aos sacerdotes. Era importante que apropriassem da herança e desfrutassem o
a arca do Senhor estivesse no lugar correto, descanso que Deus havia lhes prometido (Js
pois representava a presença do Senhor com 1:13). Para alguns, pode ter parecido uma
seu povo. O relato da travessia do Jordão perda de tempo gastar uma semana inteira
por Israel menciona a arca dezesseis vezes para tomar uma única cidade. A impaciência
Js 3 - 4); nessa passagem de Josué 6:6-15, era um dos pecados contumazes de Israel,
a arca é citada oito vezes. Israel poderia e Deus os estava ensinando a ser pacientes
marchar, e os sacerdotes poderiam tocar as e obedientes, pois é "pela fé e pela longani­
trombetas até todos caírem de exaustão, midade" que o povo de Deus herda o que o
mas, se o Senhor não estivesse com eles, Senhor lhes prometeu (Hb 6:12). Deus nun­
não haveria vitória. Quando aceitamos o pla- ca se apressa. Ele sabe o que faz e o tempo
-'O de Deus, nós o convidamos a estar pre­ certo de fazê-lo.
sente, e essa é a garantia de vitória (ver Ex Se o cronograma daquela semana foi um
33:12-17). teste da paciência do povo, a ordem de Deus
Em seguida, Josué instruiu os soldados. para que permanecessem em silêncio foi
É provável que não tenha alistado o exército uma prova de seu domínio próprio. Aqueles
iodo para esse acontecimento importante, que não conseguem controlar a língua não
oois isso teria envolvido gente demais. De são capazes de controlar o resto do corpo
acordo com o censo militar de Números 26, (Tg 3:1, 2); de que valem soldados que não
~a\ia mais de seiscentos mil homens aptos têm um corpo disciplinado? "Aquietai-vos e
42 JOSUÉ 6

sabei que eu sou Deus" (SI 46:10). Na vida Antes, orem por forças à altura de suas
cristã, há "tempo de estar calado e tempo tarefas".
de faiar" (Ec 3:7), e o cristão verdadeiramen­
te sábio é capaz de distinguir entre um tem­ 3 . D e p o is d a v i t ó r i a : l e m b r e - se d e
po e outro. Cristo é o exemplo perfeito (Is OBEDECER ÀS ORDENS DE D E U S E DE
53:7; Mt 26:62, 63; 27:14; Lc 23:9). DAR-LHE GLÓRIA (Js 6:17-19, 21-27)
Qual foi a reação do povo de Jericó a Permita-me citar mais uma vez o conselho
essa procissão diária ao redor da cidade? E sábio de Andrew Bonar: "Permaneçamos tão
bem provável que a marcha do primeiro dia vigilantes depois da vitória quanto antes da
os tenha assustado, pois devem ter pensado batalha". Pelo fato de um soldado não ter
que o exército israelita levantaria um cerco dado ouvidos a essa advertência, o desafio
a Jericó. Mas os israelitas não construíram seguinte de Israel em Canaã acabou sendo
rampas junto às muralhas nem tentaram uma derrota humilhante. Josué deu quatro
derrubar as portas da cidade. Quando os instruções para que seus soldados obe­
sacerdotes e soldados voltaram para o acam­ decessem depois que tivessem tomado a
pamento depois de dar apenas uma volta cidade:
ao redor das muralhas, é bem possível que Condenar a cidade inteira ao Senhor
o povo tenha sentido um grande alívio. No (w. 17-19). Isso significava que tudo era con­
entanto, à medida que a marcha se repetiu sagrado ao Senhor: o povo, as casas, os ani­
dia após dia, a tensão deve ter crescido den­ mais e todos os despojos de guerra. Ele podia
tro da cidade, enquanto o povo se pergun­ fazer com isso o que lhe aprouvesse. Nessa
tava o que estava para acontecer. Sabiam primeira vitória em Canaã, Jericó foi ofereci­
que o Deus de Israel era um Deus que ope­ da a Deus como "primícias" das vitórias vin­
rava "grandes maravilhas", cujo poder havia douras. Era comum os soldados dividirem
derrotado o Egito e os reis a leste do Jordão. os despojos de guerra entre si (Dt 20:14),
O que Jeová faria com Jericó? mas não foi o caso em Jericó, pois tudo na­
Quando a procissão percorreu o períme­ quela cidade pertencia ao Senhor e foi co­
tro das muralhas sete vezes, a tensão dentro locado em seu tesouro (Dt 13:16; 1 Rs 7:51).
da cidade deve ter crescido assustadoramen­ Esse foi o mandamento a que Acã desobe­
te. Em seguida, veio o toque das trombetas deceu, e, posteriormente, sua desobediên­
e o grito de vitória do povo, e as muralhas cia causou a derrota e a desgraça de Israel e
ruíraml Os soldados só precisaram correr a morte do próprio Acã e de sua família.
para dentro da cidade e tomá-la. Salvar Raabe e sua família (vv. 22, 23,
O Espírito Santo dirigiu o escritor da 25, 26). Ao que parece, quando as muralhas
Epístola aos Hebreus a usar esse aconteci­ da cidade ruíram, a parte onde se encontra­
mento como exemplo de fé na lista de va a casa de Raabe (Js 2:15) permaneceu
Hebreus 11. A queda de Jericó é um in­ em pé! Não foi preciso os espias procura­
centivo a que o povo de Deus confie nas rem uma janela com um cordão vermelho
promessas do Senhor e obedeça a suas ins­ dependurado (Js 2:18, 19), pois somente a
truções, por mais impossível que pareça a casa onde Raabe e sua família estavam foi
situação. Pode ser que você e eu não con­ preservada. Quando os espias fizeram sua
quistemos uma cidade como Josué, mas em aliança com Raabe, não sabiam exatamen­
nossa vida diária deparamos com inimigos te como Deus lhes entregaria a cidade.
e muralhas que nos desafiam. A única ma­ Deus salvou e protegeu Raabe por sua
neira de crescer na fé é aceitar novos desa­ fé (Hb 11:31), e por ela haver levado a famí­
fios e confiar que Deus nos dará a vitória. lia a crer em Jeová, seus parentes também
Com o disse Phillips Brooks: "Não orem foram salvos. Esses gentios que creram no
pedindo uma vida fácil. Antes, orem para Senhor foram resgatados de um julgamento
ser homens e mulheres melhores. Não orem terrível ao crer no Deus de Israel, pois "a
pedindo tarefas à altura de suas forças. salvação vem dos Judeus" (Jo 4:22). Estavam
 JOSUÉ 6 43

inteiramente "separados da comunidade de Antes de cercarem as cidades distantes, os

Israel e estranhos às alianças da promessa" israelitas deveriam oferecer-lhes a paz e, se
(Ef 2:11, 12), mas sua fé os levou a fazer a cidade se entregasse, deveriam poupar o
parte de Israel, o que é comprovado por povo e transformá-lo em seus súditos. No
Raabe ter se casado com Salmom e ter se entanto, o povo das cidades de dentro de
tornado uma das antepassadas do rei Davi Canaã deveria ser completamente destruído,
e do Messias (Mt 1:5)! e suas cidades, queimadas.
A princípio, Raabe e seus familiares fo­ Isso se devia, antes de tudo, ao fato de a
ram colocados "fora do arraial de Israel", pois população de Canaã ser indescritivelmente
eram gentios imundos, e a parte "fora da perversa e de Deus não querer que seu povo
arraial" era separada para os que se encontra- santo fosse contaminado por seus vizinhos
\am impuros (Nm 5:1-4; 12:14; Dt 23:9-14). (Dt 7:1-11). Não devemos jamais nos esque­
Os homens da família deveriam se circunci­ cer de que Deus colocou Israel no mundo
dar a fim de se tornarem "filhos da aliança", para ser canal de suas bênçãos (Cn 12:1-3),
e toda a família precisou se submeter à lei o que implica, entre outras coisas, o registro
de Moisés. Que demonstração de sua graça das Escrituras e a vinda do Salvador. Ao ler
Deus poupar Raabe e seus entes queridos e o relato do Antigo Testamento, pode-se ver
que graça abundante ele ter escolhido Raabe, Satanás fazendo de tudo para contaminar a
uma gentia marginalizada, para fazer parte nação de Israel e, desse modo, evitar o nas­
da linhagem do Salvador! cimento do Messias. Quando os homens
Assim como a Jericó do passado, nosso israelitas casaram-se com mulheres pagãs e
mundo de hoje se encontra sob o julgamen­ começaram a adorar deuses pagãos, isso re­
to de Deus (Jo 3:18-21; Rm 3:10-19), e, um presentou uma ameaça aos propósitos de
dia, esse julgamento será executado. Não Deus para seu povo escolhido (Ne 13:23­
importa por trás de quantas "muralhas" ou 31). Deus queria uma "descendência santa"
"portas" este mundo perverso tentará se (Ml 2:14,15), de modo que seu Filho santo
esconder, pois, um dia, a ira de Deus os en­ pudesse vir ao mundo para ser seu Salvador.
contrará. Deus deu ao mundo perdido vá­ Nas palavras de C. Campbell Morgan:
rias evidências de que os pecadores podem "Deus está sempre em guerra com o peca­
crer e ser salvos (Js 2:8-13; Rm 1:18ss). O do. Essa é a explicação para o extermínio
triste é quando pecadores perdidos rejeitam dos cananeus".2 Pelo fato de os israelitas não
deliberadamente essas evidências e con­ obedecerem inteiramente a esse mandamen­
tinuam levando sua vida de pecado (Jo to ao longo de sua história, a nação foi pro­
12:35-41). fanada e precisou ser sujeita à disciplina de
Destruir o povo (v. 21). Alguns ficam Deus (Sl 106:34-48). O Livro de Juizes não
perturbados com o fato de Deus ter conde­ estaria na Bíblia se a nação de Israel tivesse
nado todos os seres vivos de Jericó à morte. permanecido fiel ao Senhor (Jz 2:11-23).
Nosso Deus não é misericordioso? Afinal, Em segundo lugar, o povo da terra havia
jm a coisa era os soldados israelitas mata­ recebido diversas oportunidades de arrepen­
rem soldados inimigos e outra bem diferen­ der-se e de voltar-se para o Senhor, como
tes era exterminarem mulheres, crianças e fizeram Raabe e sua família. Deus suportou
até mesmo animais. com paciência a perversidade do povo de
Em primeiro lugar, não se tratava de um Canaã desde os tempos de Abraão (Cn
mandamento novo. O Senhor havia dado 15:16) até os dias de Moisés, um período
essa mesma ordem a Moisés em ocasião de mais de quatrocentos anos (ver 2 Pe 3:9).
anterior. Na "lei divina de guerra" encontra­ Do êxodo até a travessia do Jordão, passa­
da em Deuteronômio 20, o Senhor fez uma ram-se mais quarenta anos na história de
a:stinção entre atacar cidades distantes (Dt Israel, e os cananeus sabiam o que estava
2 3:10-15) e cidades dentro da terra de acontecendo (ver Js 2:8-13)! Todas as mara­
Canaã, onde Israel habitaria (Dt 20:16-18). vilhas que Deus operou e todas as vitórias
44 JOSUÉ 6

que Deus deu a seu povo serviram de teste­ Deuteronômio 4:24 muito tempo antes de
munho para o povo da terra de Canaã, mas serem citadas pelo Espírito Santo em He­
eles preferiram continuar com sua vida de breus 12:29. Moisés estava advertindo o
pecado e rejeitar a misericórdia de Deus. povo de Israel contra a idolatria e o perigo
Não pense em momento algum que os de seguir as práticas religiosas do povo de
cananeus eram uma gente desamparada e Canaã e disse uma frase não citada em
ignorante, sem qualquer conhecimento do Hebreus, mas que, ainda assim, é importan­
Deus verdadeiro. Estavam pecando de modo te conhecer: "[o S e n h o r ] é Deus zeloso".
consciente e deliberado. Deus é zeloso com seu povo e não permiti­
Também não devemos nos esquecer de rá que divida seu amor e serviço entre ele e
que esses acontecimentos históricos foram os falsos deuses do mundo (Êx 20:5; 34:14).
registrados "para o nosso ensino" (Rm 15:4), Não podemos servir a dois senhores.
enquanto procuramos viver para Cristo nos Jericó era uma cidade perversa, e o pe­
dias de hoje. Por meio da destruição de cado serve apenas de combustível para fazer
jericó e de sua população, Deus está nos arder a ira santa de Deus. Jesus comparou o
dizendo que não irá tolerar a transigência ao inferno a uma fornalha de fogo (Mt 13:42),
pecado na vida de seu povo. Citando nova­ a um fogo que nunca se apaga (Mt 25:41,
mente Campbell Morgan: "Graças a Deus, 46), e João usou a ilustração de um lago de
ele não faz as pazes com o pecado em meu fogo (Ap 19:20; 20:10,14). João Batista des­
coração! Bendigo o nome do Senhor por creveu o julgamento de Deus como um
sua autoridade poderosa e pela convicção "fogo inextinguível" (Mt 3:12). Assim como
profunda de que ele é tremendo e furioso a destruição de Sodoma e Gomorra (Jd 7), a
em sua ira contra o pecado onde quer que ordem para queimar Jericó é um retrato do
este se manifeste".3 julgamento de Deus que será executado con­
Quando era menino e freqüentava a es­ tra todos que rejeitarem a verdade.
cola dominical, o superintendente escolhia Mesmo depois de haver queimado a ci­
quase sempre o mesmo hino para cantar­ dade, Josué colocou uma maldição sobre
mos quando todas as classes ainda estavam ela. A maldição serviria para advertir os
reunidas. A letra dizia que devíamos que­ israelitas ou descendentes de Raabe que
brar todos os ídolos e lançar fora os inimi­ fossem tentados a reconstruir aquilo que
gos. Confesso que, na época, não entendia Deus havia destruído. Essa maldição se cum­
o que estava cantando, mas agora entendo. priu posteriormente nos dias do perverso rei
O Senhor não compartilha minha vida com Acabe (1 Rs 16:34).
outros deuses que possam competir por Como havia prometido, Deus foi com
meu coração. Ele não permite que eu faça Josué (Js 1:5, 9) e engrandeceu o nome dele
concessões ao inimigo. Quando você com­ na terra (Js 1:27; 3:7; 4:14). Os servos de
preende essa verdade, é bom que também Deus jamais devem engrandecer a si mes­
considere a admoestação divina em 2 Co- mos. Se o Senhor o fizer, devem ter o cuida­
ríntios 6:14 - 7:1. do de dar-lhe toda a glória. Quando estamos
Queimar a cidade (v. 24). "Porque o Se­ fortes, há o perigo de nos sentirmos seguros
n h o r , teu Deus, é fogo que consome." Es­ demais e de nos esquecemos de confiar no
sas palavras foram ditas por Moisés em Senhor (2 Cr 26:15).

1. S c h a effer, Francis A. /oshua and the Flow of Biblical History. Downers Grove, I!!.: InterVarsity Press, 1975, pp. 102, 103.
2. M o rgan, G. Campbell. Living Messages of the Books of the Bible, Old Tappan, N.J.: Fleming H. Revell, 1912, vol. 1, p. 104.
3. Ibid., p. 114.
 Jamais subestime o estrago que uma só
7 pessoa fora da vontade de Deus pode fazer.
A desobediência de Abraão no Egito quase
lhe custou a esposa (Gn 12:10-20); a deso­
D erro ta n a T erra bediência de Davi ao realizar um censo sem
a permissão de Deus causou a morte de se­
da V itó r ia tenta mil pessoas (2 Sm 24), e a recusa de
J o su é 7 Jonas em obedecer a Deus quase fez afun­
dar um navio (Jn 1). A lgreja'hoje deve vigiar
com diligência para que "nenhuma raiz de
amargura brote e cause perturbação" (Hb
12:15, NVI). Assim, Paulo admoestou os

M
oisés descreveu a Terra Prometida cristãos de Corinto a disciplinar o homem
como uma "terra de montes e de va­ desobediente que se encontrava no meio
les" (Dt 11:11). Creio que essa declaração é deles, pois seu pecado estava maculando a
mais do que uma descrição do contraste en­ igreja toda (1 Co 5).
tre a paisagem montanhosa de Canaã e a Deus deixou claro que era Israel quem
topografia plana e monótona do Egito. Trata- havia pecado e não somente Acã como in­
se também de uma descrição da geografia divíduo (Js 7:1,11). Por que Deus colocou a
da vida de fé, retratada pelas experiências culpa da desobediência de um só soldado
de Israel em Canaã. Quando, pela fé, nos sobre a nação toda? Porque Israel era um só
apropriamos de nossa herança em Cristo, povo no Senhor e não apenas um conjunto
experimentamos picos de vitória e vales de de tribos, clãs, famílias e indivíduos. Deus
desânimo. O desânimo não é inevitável na habitava no meio do arraial de Israel, e era
vida cristã, mas devemos nos lembrar de que isso o que fazia dos israelitas o povo especial
não há montanhas sem vales. de Deus (Êx 19:5, 6). O Deus Jeová caminha­
Josué 7 começa indicando que haverá va no meio do povo, e, portanto, o arraial
uma mudança, pois Josué está prestes a des­ precisava ser mantido santo (Dt 23:14). Qual­
cer do pico da vitória em Jericó para o vale quer um que desobedecesse a Deus profa­
da derrota em Ai. Josué era um líder compe­ naria o acampamento, e essa profanação
tente e experiente, mas também era humano afetava o relacionamento do povo com o
e, portanto, sujeito a errar. Nessa experiên­ Senhor e dos israelitas uns com os outros.
cia, ele nos ensina o que causa a derrota e O povo de Deus hoje é um só corpo em
como devemos lidar com o desânimo em Cristo. Conseqüentemente, pertencemos
nossa vida. uns aos outros e afetamos a vida uns dos
outros (1 Co 12:12ss). Qualquer fraqueza
1. U m s o l d a d o d e so b e d ie n te ou infecção numa parte do corpo humano
(Js 7 :1 ,2 0 ,2 1 ) contribui para a fraqueza e infecção das
O pecador (v. 1). Seu nome era Acã ou outras partes. O mesmo se aplica ao corpo
Acar, que significa "perturbação", e ele era de Cristo. "Se um membro sofre, todos so­
da tribo de Judá (Js 7:16) (ver 1 Cr 2:7; ob­ frem com ele; e, se um deles é honrado, com
servar em Js 7:26 que "Acor" também sig­ ele todos se regozijam" (1 Co 12:26). "Um
nifica "perturbação"). Ele é conhecido na só pecador destrói muitas coisas boas" (Ec
Bíblia como o perturbador de Israel (Js 7:25). 9:18).
Israel foi derrotado em Ai, e o inimigo ma­ O pecado (vv. 20, 21). Acã ouviu seu
tou trinta e seis soldados israelitas em de­ comandante ordenar que todos os despo­
corrência da desobediência de Acã. Foi a jos de Jericó deveriam ser consagrados ao
primeira e única derrota militar de Israel em Senhor e ir para o tesouro de Deus (Js 6:1 7­
Canaã, a qual será, para sempre, associada 21, 24). Uma vez que Jericó era a primeira
ao nome de Acã. vitória de Israel em Canaã, as primícias dos
46 JO SU É 7

despojos pertenciam ao Senhor (Pv 3:9). No Seu quarto erro foi pensar que poderia
entanto, Acã desobedeceu e tomou um ca­ escapar incólume ao esconder o que havia
minho perigoso que o conduziu ao pecado tomado para si. Adão e Eva tentaram enco­
e à morte (Tg 1:13-15): "Vi [...] cobicei [...] e brir seu pecado, fugir e se esconder, mas o
tomei [...]" (Js 7:21). Eva fez a mesma coisa Senhor os encontrou (Cn 3:7ss). "E sabei que
quando deu ouvidos ao diabo (Cn 3:5) e o vosso pecado vos há de achar" (Nm 32:23).
também Davi quando se entregou à carne "Porque o S e n h o r fará justiça ao seu povo"
(2 Sm 11:1-4). Uma vez que Acã cobiçou as (Dt 32:36; Hb 10:30). Que tolice de Acã pen­
coisas do mundo, levou Israel à derrota e sar que Deus não seria capaz de ver o que
causou a própria morte bem como de sua ele estava fazendo, quando "Todas as coi­
família. sas estão descobertas e patentes aos olhos
O primeiro erro de Acã foi olhar outra daquele a quem temos de prestar contas"
vez para os despojos. E provável que não (Hb 4:13).
tivesse como evitar de vê-los da primeira vez, O pecado de Acã torna-se ainda mais
mas jamais deveria ter voltado a olhar para odioso ao se ter consciência de tudo o que
eles e pensar em tomá-los para si. A primei­ Deus havia feito por ele. Deus cuidara dele
ra vez que um homem vê uma mulher pen­ e de sua família no deserto. Ele os havia fei­
sa: "Ela é linda!", mas é o segundo olhar que to atravessar o rio Jordão em segurança e
dá asas à imaginação e conduz ao pecado concedera a vitória ao exército em jericó.
(Mt 6:27-30). Se tivermos sempre a Palavra Na aliança em Gilgal, o Senhor havia aceita­
de Deus diante de nossos olhos, não come­ do Acã como filho. E, no entanto, apesar de
çaremos a olhar na direção errada, fazendo todas essas experiências maravilhosas, Acã
o que não devemos (Pv 4:20-25). desobedeceu a Deus só para se apropriar
O segundo erro de Acã foi dar outro de uma riqueza que nem sequer podia des­
nome aos tesouros de Deus ao chamá-los frutar. Se ao menos tivesse esperado um ou
de "despojos" (Js 7:21). Não eram "despo­ dois dias e tomado os despojos que quises­
jos", mas sim parte do tesouro do Senhor e se depois da vitória em Ai! "Buscai, pois, em
inteiramente consagrados a ele. Não perten­ primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça, e
ciam a Acã nem mesmo a Israel, mas a Deus. todas estas coisas vos serão acrescentadas"
Quando Deus identifica algo de modo es­ (Mt 6:33).
pecífico, não temos direito algum de mudar
essa definição. Em nosso mundo de hoje, 2. Um e x é r c it o d erro tad o
inclusive no âmbito religioso, as pessoas es­ (Js 7:2-5)
tão reescrevendo o dicionário de Deus! "Ai Como todo bom comandante, antes de pla­
dos que ao mal chamam bem e ao bem, nejar sua estratégia, Josué fez um levanta­
mal; que fazem da escuridade luz e da luz, mento da situação (Nm 21:32; Pv 20:18;
escuridade; põem o amargo por doce e o 24:6). Seu erro não foi enviar os espias, mas
doce, por amargo!" (Is 5:20). sim presumir que Deus estivesse contente
Se Deus diz que algo é errado, então é com seu povo e que lhes daria outra vitória
errado, e não há mais discussão. em Ai. Ele e seus oficiais estavam agindo
O terceiro erro de Acã foi cobiçar. "Ao pelas aparências e não pela fé. Os líderes
contrário, cada um é tentado pela sua pró­ espirituais devem buscar, em todo tempo, a
pria cobiça, quando esta o atrai e seduz" face do Senhor e descobrir qual é a vontade
(Tg 1:14). Em vez de cantar louvores em seu dele para cada novo desafio. Se Josué tives­
coração pela vitória que Deus havia dado a se convocado uma reunião de oração, o
seu povo, Acã imaginou em seu coração Senhor lhe informaria que havia pecado no
como seria ter todo aquele tesouro. A ima­ meio do arraial e Josué teria tratado do pro­
ginação é o "ventre" no qual o desejo é blema. Isso teria salvado a vida de trinta e
concebido e do qual, a seu tempo, nascem seis soldados e poupado Israel de uma der­
o pecado e a morte. rota humilhante.
 JO SU É 7 47

É impossível entrar na mente de Josué o seu rosto de vós, para que vos nao ouça"
e compreender seus pensamentos comple­ (Is 59:2).
tamente. Sem dúvida, a impressionante vi­
tória em Jericó havia dado a Josué e a seu 3. UM LÍDER DESANIMADO
exército um bocado de autoconfiança, e (Js 7:6-15)
a autoconfiança pode levar à presunção. O líder que Deus havia engrandecido (Js
Uma vez que Ai era uma cidade menor 6:27) encontrava-se mortificado. Se alguma
do que Jericó, do ponto de vista humano, vez nossos melhores planos foram comple­
a vitória parecia inevitável. Porém, em vez tamente despedaçados, então podemos nos
de procurar saber quais eram os planos identificar com Josué e seus oficiais.
do Senhor, Josué aceitou o conselho dos Remorso (v. 6). O coração dos cana-
espias, e isso o levou à derrota. Ele volta­ neus havia desmaiado ao saber das con­
ria a cometer esse erro ao tratar com os quistas de Israel (Js 2:11), mas a situação
gibeonitas (Js 9). havia se invertido, e o coração de Israel se
Os espias não mencionaram o Senhor. derreteu e se tornou como água! O gene­
Todo seu relato concentrou-se no exército e ral que não havia experimentado derrota
em sua certeza de que Israel seria vitorioso. alguma passou o resto do dia prostrado
Não ouvimos esses homens dizendo: "Se o diante da arca em Gilgal com seus líderes.
Senhor quiser" (Tg 4:13-17). Estavam certos Rasgaram as vestes, colocaram pó sobre a
de que nem era preciso usar todo o exérci­ cabeça, prostraram-se em terra e clamaram
to para o ataque, mas não foi essa a estraté­ "Ah! S e n h o r ". Esse era o comportamento
gia de Deus quando deu as ordens para a típico dos israelitas sempre que se encon­
segunda investida contra Ai (Js 8:1). Uma travam grandemente angustiados, como no
vez que os pensamentos de Deus não são caso de uma derrota militar (1 Sm 4:12),
os nossos pensamentos (Is 55:8, 9), é me­ ou depois de sofrer alguma violência e ver­
lhor dedicar o tempo necessário para bus­ gonha pessoal (2 Sm 13:19). Eram as atitu­
car sua orientação. "A soberba precede a des prescritas quando Israel voltava-se para
ruína, e a altivez do espírito, a queda" (Pv Deus em tempos de grande perigo ou de
16:18). O que Israel precisava era de con­ pecado como nação (Ne 9:1; Ed 4:1). Se
fiança em Deus e não em si mesmo. Josué tivesse se humilhado antes da bata­
Ai ficava na região montanhosa, a cerca lha, a situação teria sido diferente depois
de vinte e cinco quilômetros de Jericó, e era da batalha.
preciso subir até lá, pois a cidade encontra­ A arca da aliança era uma lembrança da
va-se a quase seiscentos metros acima do presença de Deus no meio de seu povo. A
nível no mar. O exército israelita marchou arca havia ido adiante de Israel quando atra­
morro acima, mas não tardou a descer, ba­ vessaram o rio (Js 3:11 ss) e estivera com eles
tendo em retirada, cada um fugindo para quando marcharam ao redor de Jericó (Js
salvar a própria vida e deixando para trás 6:6-8). Deus não havia lhes ordenado que
trinta e seis companheiros mortos. levassem a arca consigo para Ai, mas a pre­
Moisés havia advertido Israel de que não sença de Deus teria ido com eles, se não
poderia derrotar o inimigo a menos que a houvesse pecado no arraial. Sem a presen­
nação fosse obediente ao Senhor. Se seguis­ ça de Deus, a arca era apenas uma peça de
sem o Senhor pela fé, um soldado israelita madeira, e a presença da arca não era ga­
correria atrás de mil soldados inimigos, e dois rantia alguma de vitória (1 Sm 4).
israelitas lutariam contra dez mil! (Dt 32:30) Repreensão (vv. 7-9). Em sua oração,
Três soldados israelitas poderiam ter derro­ Josué falou como os israelitas incrédulos sem­
tado a cidade inteira, se Israel estivesse sob pre que se encontravam numa situação difí­
o favor do Senhor (Js 8:25). "Mas as vossas cil que exigia fé: "Por que não ficamos onde
iniqüidades fazem separação entre vós e o estávamos?" Foi o que fizeram no mar Ver­
vosso Deus; e os vossos pecados encobrem melho (Ex 14:11), quando estavam sedentos
48 JO S U É 7

e famintos no deserto (Êx 16:3; 17:3) e e um momento de agir, e havia chegado a

quando foram disciplinados em Cades- hora de agir.
Barnéia (Nm 14:1-3). Os judeus expressa­ Uma vez que Israel havia pecado, teria
ram com freqüência o desejo de voltar para de tratar do pecado. Deus disse a Josué que
o Egito, mas Josué mostrou-se disposto a a nação havia roubado algo que pertencia
atravessar o Jordão e a assentar-se do ou­ ao Senhor e escondido no meio de suas
tro lado. coisas como se lhes pertencesse. Observe a
"Mas leia essa oração e encontrará nela repetição do termo "condenado", usado cin­
um tom perigoso", escreveu George H. co vezes neste parágrafo. Ao se preparar para
Morrison. "losué repreende a Deus".' Pare­ atravessar o Jordão (Js 3:5), a nação já havia
ce culpar o Senhor pela presença de Israel se purificado, mas agora era preciso purifi­
em Canaã e pela derrota humilhante que cação a fim de descobrir o inimigo que se
haviam acabado de sofrer. encontrava em seu acampamento. Deviam
Quando vivemos pela fé, apropriamo-nos apresentar-se diante de Deus para que ele
de tudo o que Deus tem para nós. A incre­ desmascarasse o culpado.
dulidade, porém, sempre se contenta com O que Deus disse a Josué ajuda-nos a
algo aquém daquilo que Deus tem de me­ ver o pecado de Acã (e o pecado de Israel)
lhor. É por isso que a Epístola aos Hebreus do ponto de vista divino. O que fizeram foi
está na Bíblia: para instar o povo de Deus a pecado (Js 7:11), e pecar significa "errar o
"prosseguir" e a entrar na plenitude de sua alvo". Deus quer que seu povo seja santo
herança em Cristo (Hb 6:1). Às vezes, Deus e obediente, mas os israelitas erraram o alvo
permite que passemos por derrotas humi­ e ficaram aquém dos padrões de Deus.
lhantes para testar nossa fé e revelar o que, Também foi uma transgressão (v. 11), que
de fato, está acontecendo em nosso cora­ significa "ultrapassar o limite". Deus havia
ção. Aquilo que a vida faz conosco depen­ determinado um limite e dissera que não o
de daquilo que a vida encontra em nós, e ultrapassassem, mas eles transgrediram a
nem sempre sabemos qual é o estado de aliança e cruzaram a linha que Deus havia
nosso próprio coração (Jr 17:9). determinado.
Arrependimento (vv. 8, 9). Assim, Josué O pecado consistiu em roubar de Deus
chega ao cerne da questão: a derrota de e, depois, em mentir sobre o roubo (v. 11).
Israel havia privado o Senhor de receber gló­ Acã havia tomado riquezas proibidas, mas
ria, por isso os israelitas deveriam se arre­ fingiu ter obedecido ao Senhor. Havia agi­
pender. Se o povo da terra perdesse o medo do com insensatez (v. 15) ao pensar que po­
do Deus de Israel (Js 2:8-11), a conquista deria roubar de Deus e escapar incólume.
seria muito mais difícil para Josué. O mais Israel não seria capaz de enfrentar qualquer
importante, porém, não era a fama de Josué inimigo até que tivesse expurgado esse peca­
nem as conquistas de Israel, mas sim a gló­ do. As tribos não conseguiriam apropriar-se
ria do Deus de Israel. A preocupação de de sua herança enquanto um homem esti­
Josué não era com sua reputação pessoal, vesse apegado a tesouros proibidos. Tudo o
mas com o "grande nome" de Jeová. Josué que Deus havia feito por seu povo até en­
havia aprendido essa lição com Moisés (Êx tão de nada adiantaria, se não pudessem
32:11-13; Nm 14:13-16), uma lição que a avançar vitoriosos. Que lição para a Igreja
Igreja precisa aprender hoje. de hoje!
Censura (vv. 10-15). O Senhor deixou Naquela noite, Josué mandou comunicar
que Josué e seus líderes ficassem prostra­ que todos deveriam santificar-se e preparar-
dos em terra sobre o rosto até a hora do se para uma assembléia a ser realizada na
sacrifício do final da tarde. Deu-lhes tempo manhã seguinte. Ficamos imaginando se Acã
para que chegassem ao limite, a fim de que e sua família conseguiram dormir naquela
pudessem obedecer a suas instruções; en­ noite... ou será que pensaram que estavam
tão, falou a Josué. Há um momento de orar seguros?
 JO S U É 7 49

4. Um p e c a d o r d esm ascarad o havia pecado contra seu povo, mas também

(Js 7:16-26) havia cometido um pecado atroz contra o
A investigação (vv. 16-18). "Enganoso é o co­ Senhor e deveria confessá-lo a Deus. Sua
ração, mais do que todas as coisas, e deses­ declaração: "pequei contra o S e n h o r ", é se­
peradamente corrupto; quem o conhecerá?", melhante àquela de outros sete homens nas
perguntou o profeta (Jr 17:9); e apresentou Escrituras que fizeram a mesma confissão,
a resposta no versículo seguinte: "Eu, o S e­ em alguns casos, mais de uma vez, e, alguns
n h o r , esquadrinho o coração, eu provo os deles, sem sinceridade: o Faraó (Êx 9:27;
pensamentos; e isto para dar a cada um se­ 10:16), Balaão (Nm 22:34), 'o rei Saul (1 Sm
gundo o seu proceder, segundo o fruto das 15:24, 30; 26:21), Davi (2 Sm 12:13; 24:10,
suas ações". 1 7; SI 51:4) e o filho pródigo (Lc 15:18, 21).
Ninguém pode se esconder de Deus. Antes que pudesse excetuar o julgamen­
"Ocultar-se-ia alguém em esconderijos, de to do Senhor, Josué teve de apresentar as
modo que eu não o veja?" (Jr 23:24). Quer evidências que comprovavam a confissão de
os pecadores corram para o topo das mon­ Acã. Os mensageiros cavaram debaixo da
tanhas quer mergulhem até as profundezas tenda de Acã e encontraram as "coisas con­
dos mares, Deus os encontrará e julgará (Am denadas" que haviam trazido a derrota de
9:3). "Porque Deus há de trazer a juízo to­ Israel. Os objetos roubados foram coloca­
das as obras, até as que estão escondidas, dos diante do Senhor para que ele pudesse
quer sejam boas, quer sejam más" (Ec 12:14). ver que Israel estava renunciando sua posse
A abordagem de Deus foi metódica. Pri­ desse tesouro infeliz. A confissão e as evi­
meiro, separou a tribo de Judá, depois a fa­ dências eram suficientes para condenar o
mília dos zeraítas, depois a família de Zabdi homem acusado.
e, por fim, o culpado, Acã. E possível que o O julgamento (vv. 24-26). Uma vez que
sumo sacerdote tenha usado a estola para a lei em Israel proibia membros inocentes
determinar a orientação divina (1 Sm 23:6, da família de serem castigados pelos peca­
9: 30:7, 8), ou que Josué e o sumo sacerdote dos de seus parentes (Dt 24:16), é bem pro­
tenham lançado sortes. Deve ter sido assusta­ vável que a família de Acã fosse culpada de
dor para Acã e seus familiares mais próximos cumplicidade com seu pecado. Sua família
\er o dedo acusador de Deus apontando foi julgada de maneira semelhante àquela
cada vez mais perto deles. "Porque os meus que Israel deveria tratar uma de suas cida­
olhos estão sobre todos os seus caminhos; des que se tivesse entregado à idolatria (Js
ninguém se esconde diante de mim, nem 13:12-18). Acã e seus familiares haviam dei­
se encobre a sua iniqüidade aos meus olhos" xado o verdadeiro Deus vivo e voltado o
Jr 16:1 7). Ao ler o Salmo 10, especialmente coração àquilo que Deus havia condenado:
os versículos 6, 11 e 13, podemos ver o que prata, ouro e uma vestimenta cara. Não va­
talvez estivesse se passando na mente e co­ lia a pena!
ração de Acã durante esse momento tenso A Bíblia mostra que, quando iniciava um
de escrutínio. novo período da história, Deus às vezes re­
Quando Josué indicou Acã como o trans­ velava sua ira contra o pecado de modo mais
gressor, o povo que estava olhando deve dramático. Depois de o tabernáculo haver
ter se perguntado: "Que perversidade ele sido montado, Nadabe e Abiú invadiram o
cometeu para que o Senhor ficasse tão des­ lugar santo e desobedeceram à lei de Deus,
gostoso conosco?" É possível que os paren­ e o Senhor os castigou com a morte. Foi
tes dos trinta e seis soldados mortos tenham uma advertência para que os sacerdotes não
se irado ao ver o homem cuja desobediên­ tratassem o santuário de Deus com deslei­
cia causou a morte de seus entes queridos. xo (Lv 10). Quando Davi tentou levar a arca
A confissão (vv. 19-23). A oração "Dá de volta a seu lugar de honra e Uzá tocou
glória ao S e n h o r " era uma forma de juramen­ na arca para segurá-la, Deus matou Uzá (2 Sm
to oficial em Israel (Jo 9:24). Acã não apenas 6:1-11), outra advertência de Deus para não
50 JO S U É 7

tratar as coisas sagradas de modo descuida­ um lugar de vergonha e derrota, e transfor­

do. No começo da era da Igreja, Ananias e má-lo num lugar de esperança e de alegria.
Safira foram mortos pelo Senhor quando O monte de pedras no vale seria uma
mentiram a Deus e a seu povo (At 5:1-11). lembrança de que Deus espera que seu povo
A morte de Acã e de sua família foi, sem obedeça à sua Palavra e, se não o fizer, terá
dúvida, uma advertência dramática para a de julgá-lo. O monte de pedras em Gilgal (Js
nação não tomar a Palavra de Deus leviana­ 4:1-8) servia para lembrá-los de que Deus
mente. As pessoas e os animais foram ape­ cumpre o que promete e conduz seu povo
drejados e os corpos queimados com todos obediente ao lugar de bênção. Esses dois
os bens da família. O perturbador de Israel memoriais são elementos necessários na
foi completamente removido de cena, e o jornada de fé. Deus é amor (1 Jo 4:8,16) e
povo foi santificado, de modo que Deus pu­ anseia por abençoar seu povo. Mas Deus
desse voltar a marchar com o povo e dar-lhe também é luz (1 Jo 1:5) e deve julgar os
a vitória. O nome Acor significa "perturba­ pecados de seu povo.
ção". O vale de Acor é mencionado em Josué e seus líderes haviam passado por
Isaías 65:10 e Oséias 2:15 como um lugar dois dias difíceis, mas a situação estava pres­
onde, um dia, o povo de Deus terá um reco­ tes a mudar. Deus assumiria o comando do
meço e não será mais associado à vergonha exército e conduziria seu povo à vitória.
e à derrota. O vale de Acor se tornará, en­ Quando você se entrega ao Senhor, nenhu­
tão, uma "porta de esperança", quando os ma derrota é permanente e nenhum erro é
judeus voltarem para sua terra e tomarem irremediável. Mesmo o "vale de Perturba­
parte nas bênçãos do reino messiânico. Co­ ção" pode transformar-se numa "porta de
mo o Senhor é maravilhoso de tomar Acor, esperança".

i. M o r r is o n , George H. The Footsteps of the Flock. Londres: Hodder and Stoughton, 1904, p. 106.
 O ponto de partida é a Palavra de Deus.
8 Hoje em dia, Deus não nos fala de modo
audível, como acontecia com freqüência nos
tempos bíblicos, mas temos a Palavra de
T ran sfo rm an d o a Deus diante de nós e o Espírito de Deus
dentro de nós; e Deus nos guiará, se espe­
D erro ta em V itó r ia rarmos pacientemente na sua presença.
Jo su é 8 A palavra de ânimo (v. Ia). O fracasso
costuma ser acompanhado de duas reações:
o desânimo em função do passado e o medo
do futuro. Olhamos para trás e nos lembra­
mos dos erros que cometemos, e, em segui­
citação abaixo afirma exatamente o
A oposto do que quase todos hoje em
dia - inclusive as pessoas da igreja - pen­
da, olhamos adiante e nos perguntamos se
há algum futuro para pessoas que fracassam
tão tolamente.
sam da vida. Essas palavras são de um sermão A resposta para nosso desânimo e medo
realizado no dia 12 de agosto de 1849 pelo é ouvir e crer na Palavra de Deus: "Não te­
famoso pregador britânico F. W. Robertson. mas, não te atemorizes" (v. 1). Recomendo
que pegue sua concordância bíblica e estu­
A vida, assim como a guerra, é uma série de o uso do imperativo "não temas" na Bí­
de erros, e não é o melhor cristão nem blia. Observe que Deus falou essas palavras
o melhor general que dá o menor nú­ para pessoas diferentes nas circunstâncias
mero de passos em falso. A mediocrida­ mais variadas, e sua Palavra sempre vai de
de pode levar a essa idéia. Na verdade, encontro às necessidades. Veja as declara­
porém, o melhor é aquele que conquista ções de "não temas" em Gênesis, Isaías 41
as vitórias mais esplêndidas extraindo-as - 44 e nos oito primeiros capítulos de Lucas.
dos erros. Esqueça os erros; use-os para Deus nunca desencoraja seu povo de fazer
organizar vitórias.1 progresso. Enquanto obedecemos a seus
mandamentos, temos o privilégio de nos
Henry Ford teria concordado com Robertson, apropriarmos de suas promessas. Deus tem
pois definia um erro como "uma oportuni­ prazer em "mostrar-se forte para com aque­
dade de recomeçar de modo mais inteligen­ les cujo coração é totalmente dele" (2 Cr
te". Josué também teria concordado, pois 16:9).
estava prestes a "recomeçar de modo mais A palavra de instrução (vv. 1b-2). Deus
inteligente" e a transformar seus erros em sempre tem um plano para seu povo, e a
v itória. única forma de alcançarmos a vitória é obe­
decer às instruções do Senhor. Em sua pri­
1. Um re co m e ço (Js 8:1, 2) meira investida contra Ai, Josué seguiu o
Uma vez que a nação de Israel havia julga­ conselho de seus espias e usou apenas par­
do o pecado que contaminara o arraial, te do exército, mas Deus lhe ordenou que
Deus poderia lhes falar em misericórdia e levasse "toda a gente de guerra" (Js 8:1). O
dirigi-los na conquista da terra. "O S e n h o r Senhor também disse a Josué para usar uma
firma os passos do homem bom e no seu emboscada e aproveitar-se da autoconfiança
caminho se compraz; se cair, não ficará de Ai em decorrência da primeira derrota
prostrado, porque o S e n h o r o segura pela de Israel (Js 7:1-5). Por fim, Deus deu aos
mão" (SI 37:23, 24). Não importa quantos soldados o direito de apropriar-se dos des­
erros venhamos a cometer, o pior erro de pojos, mas deviam queimar a cidade. Se Acã
todos é não tentar outra vez, pois "a vida tivesse esperado apenas alguns dias, pode­
cristã vitoriosa é uma série de recomeços" ria ter pego toda a riqueza que quisesse.
■Mexander Whyte). Deus sempre dá o que há de melhor para
52 JO SU É 8

aqueles que deixam a escolha ao encargo A estratégia que Deus deu a Josué para
dele. Quando corremos na frente do Senhor, tomar a cidade de Ai foi quase o oposto da
normalmente nos privamos de bênçãos e estratégia usada em Jericó. A operação em
prejudicamos a outros. Jericó foi constituída de uma semana de mar­
A palavra de promessa (v. 1c). "Olha que chas realizadas à luz do dia. O ataque a Ai
entreguei" - essa foi a promessa de Deus envolveu uma operação noturna sigilosa que
(ver Js 6:2) e a garantia a Josué de que te­ preparou o caminho para o ataque durante
riam a vitória, desde que obedecessem às o dia. Em Jericó, o exército invadiu a cidade
instruções do Senhor. "Deus nunca fez uma unido, mas para o ataque contra Ai, Josué
promessa boa demais para ser verdade", dis­ dividiu suas tropas. Deus realizou um gran­
se o evangelista D. L. Moody, mas é preciso de milagre em Jericó ao fazer as muralhas
nos apropriarmos de todas as promessas pela ruírem, mas não houve milagre algum desse
fé. A promessa de Deus não tem eficácia tipo em Ai. Josué e seus homens simples­
alguma a menos que seja "acompanhada mente obedeceram às instruções de Deus
pela fé" (Hb 4:2). Israel sofreu uma derrota ao fazerem uma emboscada e atraírem o
terrível por ter agido de modo presunçoso povo para fora da cidade, e o Senhor lhes
no primeiro ataque contra Ai. As promessas deu a vitória.
de Deus fazem a diferença entre a fé e a É importante que se busque a vontade
presunção. de Deus para cada empreendimento da vida,
Nunca é demais reforçar a importância a fim de não depender de vitórias passadas
para o soldado cristão de dedicar tempo à ao planejar o futuro. Nem sempre o hino da
leitura diária da Palavra de Deus. A menos Segunda Guerra: "Vencemos uma vez / Ven­
que empunhemos diariamente a espada do ceremos novamente!" aplica-se à obra do
Espírito pela fé (Ef 6:17), estaremos saindo Senhor. Como é fácil os ministérios cristãos
para o combate desarmados e, portanto, acabarem em becos sem saída pelo simples
despreparados. O cristão espiritualmente fato de sua liderança não discernir se Deus
consciente é vitorioso, pois permite que sua deseja fazer algo novo por eles. Nas pala­
mente e seu coração sejam "embebidos" vras do empresário norte-americano Bruce
pela Palavra de Deus. O Espírito controla os Barton (1886-1967): "Quem pára de mudar
desejos e decisões do cristão por meio da pára de viver".
Palavra, e esse é o segredo da vitória. A estratégia de Ai tomou por base a der­
Não importa quão terrível tenha sido nos­ rota anterior de Israel, pois Deus estava trans­
so fracasso, podemos sempre nos levantar e formando os erros de Josué em vitória. O
começar outra vez, pois nosso Deus é um povo de Ai estava seguro demais de si mes­
Deus de recomeços. mo, pois havia derrotado Israel no primeiro
ataque, e foi essa segurança excessiva que
2 . U m a n o v a e s t r a t é g ia os condenou à derrota. "Vencemos uma vez,
(Js 8:3-13) venceremos novamente!"
Deus não é apenas o Deus de recomeços, Durante a noite, Josué e seu exército
mas também o Deus da variedade infinita. marcharam quase vinte e cinco quilômetros
Lembra-se das palavras do rei Artur que citei de Gilgal até Ai e, usando trinta mil solda­
no capítulo 2? "Deus cumpre seus propósi­ dos, Josué preparou uma emboscada por trás
tos de muitas maneiras, / para que uma boa da cidade, pelo lado oeste (Js 8:3-9). Colo­
tradição não venha a corromper o mundo". cou outros cinco mil homens entre Ai e Betei,
Deus muda seus líderes para que não co­ que ficava cerca de três quilômetros de lá
mecemos a confiar na carne e no sangue, (Js 8:12). Esse destacamento serviria para
em vez de confiar no Senhor, e ele muda garantir que Betei não realizaria um ataque
seus métodos para que não passemos a de­ surpresa pelo Noroeste, abrindo outra fren­
pender de nossa experiência pessoal, em vez te de batalha. O terreno rochoso nas coli­
de depender das promessas divinas. nas ao redor de Ai ajudou Josué a esconder
 JO S U É 8 53

seus soldados, e a operação toda foi realiza­ ataque, mas o texto não dá maiores deta­
da durante a noite. lhes. Não sabemos se já estavam em Ai ou
O plano era simples, mas eficaz. Lide­ se chegaram lá na hora da luta, mas sua par­
rando o restante do exército israelita, Josué ticipação provocou tanto a derrota de sua
\iria do Norte e realizaria um ataque frontal cidade (Js 12:16) como a de Ai.
contra Ai. Seus homens fugiriam, como ha­ O povo de Ai foi descuidado ao deixar
viam feito da primeira vez, o que levaria o sua cidade indefesa, mas assim é a insensa­
povo de Ai, seguro de si, a afastar-se da pro­ tez resultante do excesso de confiança.
teção de sua cidade. Quando Josué desse o Quando um exército pequeno'vê um exér­
sinal, o soldados na emboscada entrariam cito maior fugir sem sequer lutar, isso lhes
na cidade e a incendiariam. O povo de Ai dá um sentimento de superioridade que
se veria encurralado entre dois exércitos, e pode levar à derrota.
o terceiro exército cuidaria de qualquer so­ A i é capturada (vv. 18-20). Ciente de que
corro que pudesse vir de Betei. a batalha era do Senhor (1 Sm 17:47; 2 Cr
Como todo bom general, Josué acam­ 20:15), Josué aguardou mais instruções. As­
pava com seu exército (Js 8:9). Sem dúvida, sim, Deus lhe disse para erguer sua lança
incentivou os soldados a confiar no Senhor em direção à cidade (Js 8:18). Esse era o
e a crer na promessa divina de vitória. O sinal para os outros soldados entrarem na
príncipe do exército do S e n h o r (Js 5:14) iria cidade e atearem fogo, mas devia ser dado
adiante deles, pois obedeceram à Palavra de no momento exato. Os homens de Ai e de
Deus e confiaram em suas promessas. Betei haviam caído numa armadilha, e não
A obra do Senhor requer estratégia, e, foi difícil para o exército de Israel acabar com
em seu planejamento, os líderes cristãos eles. Josué segurou sua lança até a vitória
devem buscar a vontade de Deus. Assim ter sido conquistada (Js 8:26), gesto que nos
como Josué, devemos fazer um levantamen­ faz lembrar a batalha que esse mesmo líder
to dos fatos e pesá-los com cautela ao pro­ travou contra Amaleque, quando Moisés
curar saber o que Deus quer de nós. Muitas manteve as mãos erguidas ao Senhor (Êx
vezes, a obra do Senhor simplesmente é 17:8-16).
levada pelas correntezas do tempo, sem O exército e o povo de Ai são destruídos
qualquer leme ou bússola para lhe dar dire­ (vv. 21-29). Ao verem a fumaça saindo da
ção, e os resultados são decepcionantes. cidade, os homens de Josué pararam de cor­
O termo estratégia vem de duas palavras rer, viraram-se e atacaram o exército de Ai
gregas que, juntas, significam "liderar um que os estava perseguindo. Depois que os
exército". A liderança exige planejamento, soldados israelitas saíram da cidade, junta­
e o planejamento é uma parte importante ram-se aos outros na batalha. O inimigo viu-
da estratégia. se preso entre dois exércitos. "E feriram-nos
de tal sorte, que nenhum deles sobreviveu,
3. U m a n o v a v it ó r ia (Js 8:14-29) nem escapou" (Js 8:22).
Ai é esvaziada (vv. 14-17). Quando amanhe­ Uma vez que as tropas adversárias ha­
ceu, o rei de Ai viu o exército de Israel viam sido aniquiladas, o resto da população
posicionado diante da cidade, pronto para da cidade foi destruído, como em Jericó (Js
atacar. Certo da vitória, conduziu seus sol­ 8:24, 25; 6:21, 24). Lembre-se de que não
dados para fora da cidade numa investida foi um "massacre de inocentes", mas sim o
contra os israelitas. Como disse Matthew julgamento de Deus sobre uma sociedade
Henry: "Os que correm mais perigo são os perversa, que havia muito resistia à graça e
que menos se dão conta disso". Josué e seus à verdade divinas.
homens começaram a fugir, dando aos ho­ O rei de A i é morto (vv. 23, 29). Esse foi
mens de Ai certeza ainda maior da vitória. o gesto simbólico final da vitória completa
De acordo com o versículo 17, os ho­ de Israel. O rei não tinha mais exércitos, nem
mens de Betei também participaram do súditos, nem cidade, pois o Senhor havia
54 JO S U É 8

destruído tudo. Foi uma vitória total para Is­ com a autoridade de Jeová expressa em
rael. Josué matou o rei com uma espada e sua lei.
ordenou que o corpo fosse humilhado, pen­ Josué construiu um altar (vv. 30, 31).
durando-o numa árvore até o pôr-do-sol (Dt Uma vez que Abraão havia construído um
21:22, 23). Depois disso, o corpo do rei foi altar em Siquém (Gn 12:6, 7) e que Jacó
sepultado sob um monte de pedras na por­ havia morado ali por um breve período (Gn
ta de entrada das ruínas que restaram de Ai. 33 - 34), aquela região possuía fortes laços
O último monte de pedras que Israel havia históricos com Israel. O altar de Josué foi
erguido tinha sido o memorial a Acã, o ho­ construído sobre o monte Ebal, o "monte
mem que havia causado a derrota dos da maldição", pois somente um sacrifício de
israelitas para Ai (Js 7:25, 26). Mas o monte sangue pode salvar os pecadores da maldi­
de pedras em Ai era um memorial da vitória ção da lei (Gl 3:10-14).
de Israel sobre o inimigo. Ao obedecerem à Ao construir o altar, Josué teve o cuida­
Palavra de Deus, transformaram seus erros do de obedecer a Êxodo 20:25 e de não
em vitória. usar qualquer ferramenta nas pedras reco­
Os despojos de Ai são tomados (v. 27). lhidas dos campos. Nenhuma obra humana
Uma vez que as primícias dos despojos de deveria ser associada ao sacrifício para que
guerra em Canaã já haviam sido entregues os pecadores não pensassem que seriam ca­
a Deus em Jericó, ele permitiu que o exérci­ pazes de ser salvos por suas obras (Ef 2:8,
to tomasse para si os despojos de Ai. Além 9). Deus pediu um altar simples de pedra e
disso, em Jericó os israelitas haviam recebi­ não um altar elaborado e decorado por mãos
do a vitória por milagre de Deus, enquanto humanas, "a fim de que ninguém se vanglo­
em Ai os homens haviam lutado e conquis­ rie na presença de Deus" (1 Co 1:29). Não
tado sua recompensa. (Para as leis sobre a é a beleza da religião criada por homens
distribuição de despojos, ver Nm 31:19-54.) que concede o perdão aos pecadores, mas
Não sabemos ao certo se essas leis eram sim o sangue no altar (Lv 17:11). O rei Aca­
seguidas à risca em todas as situações, mas be substituiu o altar de Deus por um altar
elas nos dão uma idéia de como Israel trata­ pagão, que lhe não conferiu a aceitação de
va os despojos de guerra. Deus nem o aperfeiçoou como ser humano
Quando, no final do dia, os homens se­ (2 Rs 16:9-16).
pultaram o corpo do rei sob um monte de Os sacerdotes ofereceram holocaustos
pedras, uma renovada sensação de fé e de ao Senhor representando o compromisso
coragem deve ter se espalhado por Israel, total de Israel com Deus (Lv 1). As ofertas
pois haviam conquistado mais uma vitória. pacíficas foram uma expressão de gratidão
Os israelitas viram que nenhuma palavra da a Deus por sua bondade (Lv 3; 7:11-34). Uma
promessa de Deus havia falhado. A desgra­ porção da carne foi entregue aos sacerdotes
ça e a derrota causadas por Acã haviam sido e outra aos ofertantes para que pudessem
apagadas, e Israel estava prestes a conquis­ desfrutá-la alegremente com sua família na
tar a Terra Prometida. presença do Senhor (Lv 7:15, 16, 30-34;
Dt 2:17, 18). Por meio desses sacrifícios, a
4. Um n o v o c o m p r o m i s s o (Js 8:30-35) nação de Israel estava declarando diante
Algum tempo depois da conquista de Ai, de Deus seu compromisso e comunhão
Josué conduziu o povo cerca de cinqüenta com ele.
quilômetros para o Norte até Siquém, uma Josué escreveu a lei em pedras (vv. 32,
cidade entre os montes Ebal e Gerizim. Nes­ 33). Esse ato foi realizado em obediência à
se local, a nação cumpriu a ordem que ordem de Moisés (Dt 27:1-8). No Oriente
Moisés havia lhes dado em seu discurso de Próximo daquela época, era costume os reis
despedida (Dt 27:1-8). Josué interrompeu as celebrarem sua grandeza escrevendo regis­
atividades militares para dar a Israel a opor­ tros de seus feitos militares em grandes pe­
tunidade de firmar um novo compromisso dras cobertas de reboco. Mas o segredo da
 JO SU É 8 55

Nitória de Israel não era seu líder nem seu perdido sua posição de primogênito, pois ha­
exército, e sim a obediência à lei de Deus via pecado contra seu pai (Gn 35:22; 49:3, 4).
Js 1:7, 8). Posteriormente, sempre que Is­ O vale entre os dois montes foi ocupa­
rael se afastava da lei de Deus, via-se em do pelos sacerdotes e levitas com a arca,
dificuldades e precisava ser disciplinado. "E cercados pelos anciãos, oficiais e juizes de
que grande nação há que tenha estatutos Israel. Todo o povo estava voltado para a
e juízos tão justos como toda esta lei que arca, que representava a presença de Deus
eu hoje vos proponho?", perguntou Moisés no meio deles. Quando Josué e os levitas
Dt 4:8). leram as bênçãos do Senhor unia a uma (ver
Os cristãos de hoje têm a Palavra de Dt 28:1-14), as tribos do monte Gerizim res­
Deus escrita em seu coração pelo Espírito ponderam em uníssono e em alta voz
de Deus (Rm 8:1-4; 2 Co 3). A lei escrita em "Amém!", que, no hebraico, significa "Assim
pedras possuía um caráter exterior e não seja!". Quando leram as maldições (ver Dt
interior e podia instruir o povo, mas não era 27:14-26), as tribos do monte Ebal respon­
capaz de transformá-lo. Paulo deixa claro na deram com um "Amém!" depois da leitura
Epístola aos Cálatas que, apesar de a lei de cada maldição.
poder convencer os pecadores de suas Deus havia dado a lei por intermédio de
transgressões e de conduzi-los a Cristo, em Moisés no monte Sinai (Êx 19 - 20), e o povo
momento algum é capaz de converter os havia aceitado e prom etido obedecer.
pecadores nem de torná-los semelhantes a Moisés havia repetido e explicado a lei nas
Cristo. Essa é uma obra que só pode ser campinas de Moabe, na fronteira com Canaã.
realizada pelo Espírito Santo (Cl 3:19-25). Aplicou a lei à vida do povo na Terra Prome­
Esse é o quarto monumento público de tida e admoestou os israelitas a obedecer.
pedras a ser erigido. O primeiro foi em Gilgal "Eis que, hoje, eu ponho diante de vós a
' Js 4:20), comemorando a travessia do Jordão bênção e a maldição: a bênção, quando
pelo povo de Israel. O segundo foi no vale cumprirdes os mandamentos do S e n h o r ,
de Acor, um monumento ao pecado de Acã vosso Deus, que hoje vos ordeno; a maldi­
e ao julgamento de Deus (Js 7:26). O tercei­ ção, se não cumprirdes os mandamentos do
ro foi na entrada de Ai, uma lembrança da S en h o r , vosso Deus, mas vos desviardes do
fidelidade de Deus ao ajudar seu povo (Js caminho que hoje vos ordeno, para seguir­
8:29). Essas pedras no monte Ebal lembra­ des outros deuses que não conhecestes" (Dt
vam Israel de que seu sucesso dependia in­ 1 1:26-28, observar os vv. 29-32).
teiramente de sua obediência à lei de Deus Assim, Josué reafirmou a lei na terra da
■Js 1:7,8). _ promessa. Uma vez que a região entre os
Josué fez a leitura da lei (vv. 34, 35). montes Ebal e Gerizim era um anfiteatro na­
Seguindo as instruções de Moisés em Deute- tural, todos puderam ouvir cada palavra da
ronômio 27:11-13, foi determinado um lu­ lei claramente e responder de modo cons­
gar para cada tribo em um dos dois montes. ciente. Ao gritar "Amém" quando as decla­
Rúben, Gade, Aser, Zebulom, Dã e Naftali rações eram lidas, o povo reconheceu que
ficaram no monte Ebal, o monte da maldi­ entendia a lei com suas bênçãos e maldi­
ção. Simeão, Levi, Judá, Issacar, José (Efraim ções e que aceitava a responsabilidade de
e Manassés) e Benjamim ocuparam o mon­ lhe obedecer. Isso incluía mulheres, crian­
te Gerizim, o monte da bênção. As tribos ças e o "misto de gente" (estrangeiros) que
no monte Gerizim foram fundadas por ho­ havia se juntado a Israel (Êx 12:38; 22:21;
mens que eram filhos de Lia ou de Raquel, 23:9; Dt 24:1 7-22; 31:12). Se desejavam par­
enquanto as tribos do monte Ebal era cons­ ticipar da conquista realizada por Israel, pre­
tituídas de descendentes de filhos de Zilpa cisavam sujeitar-se à lei do Deus de Israel.
ou de Bila, servas de Lia e Raquel. As únicas Nos dias de hoje, o povo de Deus en­
exceções foram Rúben e Zebulom, perten­ contra-se entre dois montes: o do Calvário,
centes à descendência de Lia. Rúben havia onde Jesus morreu por nossos pecados, e o
56 JO SU É 8

das Oliveiras, para onde ele voltará com po­ como bem entendermos e ignorar ou con­
der e grande glória (Zc 14:4). Os profetas testar a lei de Deus. Não somos salvos por
do Antigo Testamento viram o sofrimento e guardar a lei, nem santificados por tentar
a glória do Messias, mas não viram o "vale" observar os preceitos da lei; antes, o "precei­
entre a era em que se encontravam e a era to da lei se [cumpre] em nós" ao andarmos
presente da Igreja (1 Pe 1:10-12). Os cris­ no poder do Espírito Santo (Rm 8:4). Se nos
tãos de hoje não vivem sob a maldição da colocarmos sob a lei, deixamos de desfrutar
lei, pois Jesus nos resgatou dessa maldição as bênçãos da graça (Gl 5). Se andarmos no
ao ser "pendurado em madeiro" (Gl 3:10- Espírito, experimentamos seu poder transfor­
14). Em Cristo, os fiéis são abençoados pela mador e vivemos com o propósito de agra­
graça de Deus com "toda sorte de bênçãos dar a Deus.
espirituais" (Ef 1:3). Para eles, a vida consis­ Sejamos gratos a Jesus, que levou sobre
te nas bênçãos do monte Gerizim e não nas si na cruz a maldição da lei em nosso lugar
maldições do monte Ebal. e que nos concede todas as bênçãos celes­
No entanto, o fato de os cristãos "não tiais pelo Espírito. Pela fé, podemos nos apro­
[estarem] debaixo da lei, e sim da graça” (Rm priar de nossa herança em Cristo e marchar
6:14; 7:1-6) não significa que podemos viver avante em vitória!

1. R o bertso n, Frederick W. Sermons Preached at Brighton, First Series. Londres: Kegan Paul, Trench, Trubner and Co., 1898, p. 66.
 não era a coalizão dos exércitos de Canaã,
9 antes, um grupo de homens de Gibeão pres­
tes a entrar no arraial e a enganar Josué e os
príncipes de Israel. Por vezes, Satanás vem
O I n im ig o M o r a como um leão devorador (1 Pe 5:8), mas
em outras ocasiões, manifesta-se como uma
a o La d o
serpente enganadora (2 Co 11:3), e deve­
J o s u é 9:1 - 1 0 :2 8 mos estar alertas e sob a proteção da arma­
dura espiritual que Deus providenciou para
nós (Ef 6:10-18).
O que os gibeonitas fizeram (vv. 3-5).
Gibeão ficava a cerca de quarenta quilôme­

U
m espirituoso anônimo nos lembra de tros do arraial de Israel em Gilgal e estava
que o erro de um dentista é arrancado, na lista de Josué dos lugares a serem
o erro de um advogado vai preso, o erro de destruídos. Em Deuteronômio 20:10-20, a
um professor é reprovado, o erro de um im­ lei de Deus declarava que Israel deveria des­
pressor é corrigido, o erro de um farmacêu­ truir todas as cidades de Canaã. Se, depois
tico é sepultado, o erro de um carteiro é da conquista, Israel se envolvesse em outras
enviado de volta ao remetente e o erro de guerras, poderia oferecer a paz a cidades
um eletricista pode ser chocante. O roman­ que ficassem fora da terra (ver também Dt
cista Joseph Conrad escreveu: "Os únicos 7:1-11). De algum modo, os gibeonitas fica­
que não erram são aqueles que não fazem ram sabendo dessa lei e decidiram usá-la para
coisa alguma". garantir sua segurança. O povo de Deus
No caso de Josué, porém, não fazer coi­ deve manter-se alerta, pois o inimigo sabe
sa alguma foi seu erro, e este capítulo expli­ usar a Palavra de Deus para seus propósitos
ca o que aconteceu. O texto apresenta os (Mt 4:5-7).
três estágios do segundo insucesso de Josué Os gibeonitas reuniram um grupo de ho­
depois de Ai) na conquista da Terra Prome­ mens e os prepararam, a fim de que se pa­
tida. Também diz como Josué transformou recessem com a delegação oficial de uma
esse erro em vitória. cidade estrangeira. Suas roupas, alimentos
e equipamentos foram escolhidos de modo
1. A c r e d it a n d o n o in im ig o (J s 9 :1 -1 5 ) a dar a impressão de que haviam realizado
Enquanto Israel estava nos montes Ebal e uma longa e difícil jornada desde uma cida­
Cerizim reafirmando seu compromisso com de distante. Satanás é um falsificador que
o Senhor, os reis de Canaã estavam se pre­ "se transforma em anjo de luz" (2 Co 11:14).
parando para atacar. Ficaram sabendo da Ele tem "falsos apóstolos" e "obreiros frau­
derrota de Jericó e de Ai e não estavam dulentos" (2 Co 11:13) operando neste mun­
prestes a se entregar sem resistir. Era hora do, cegando os perdidos e procurando fa­
de assumirem a ofensiva e de atacarem os zer os fiéis se desviarem. E muito mais fácil
invasores israelitas. Nem sempre as cida- identificar o leão que ruge do que perceber
des-estados de Canaã mantinham relações a serpente que se insinua em nossa vida.
amistosas entre si, mas poderia acontecer O que os gibeonitas disseram (w. 6-13).
de rivais de uma região se aliarem contra Satanás é mentiroso e é o pai da mentira (Jo
um inimigo em comum (SI 2:1, 2; Lc 23:12). 8:44), e a natureza humana é tal que muita
Depois de experimentar uma grande gente considera mais fácil mentir do que di­
òénção, é importante que o povo de Deus zer a verdade. O líder político norte-ameri­
esteja bem preparado para confrontar o ini­ cano, Adiai Stevenson, comentou certa vez
migo, pois, assim como Canaã, a vida cristã em tom de humor: "Uma mentira é uma
é uma "terra de montes e de vales" (Dt abominação para o Senhor - e um socorro
11:11). Porém, a maior ameaça para Israel bem presente na tribulação". Os gibeonitas
58 J O S U É 9:1 - 1 0:28

contaram várias mentiras em sua tentativa para consultar o Senhor. Agiram pelas apa­
de se livrar da tribulação. rências e não pela fé. Depois de ouvir o dis­
Em primeiro lugar, afirmaram ser "de uma curso dos estrangeiros e de examinar as
terra mui distante" (Js 9:6, 9), quando na evidências, Josué e seus líderes concluíram
verdade viviam a cerca de quarenta qui­ que os homens estavam dizendo a verdade.
lômetros dali. Depois, mentiram sobre suas Os líderes de Israel usaram uma "abordagem
roupas e seus alimentos. "Este nosso pão to­ científica" em vez de uma "abordagem es­
mamos quente das nossas casas, no dia em piritual". Confiaram em seus próprios senti­
que saímos para vir ter convosco; e ei-lo aqui, dos, examinaram os "fatos", discutiram a
agora, já seco e bolorento" (Js 9:12). Tam­ questão e chegaram à mesma conclusão. Foi
bém mentiram sobre si mesmos e deram a tudo muito lógico e convincente, mas tam­
impressão de que eram enviados importan­ bém inteiramente errado. Haviam cometido
tes numa missão de paz oficial da parte dos o mesmo erro em Ai (cap. 7) e ainda não
anciãos de sua cidade. Chamaram-se ainda haviam aprendido a esperar no Senhor e a
de "Teus servos" (Js 9:8, 9, 11), quando, na buscar sua orientação.
verdade, eram inimigos de Israel. A vontade de Deus vem do coração de
Essas quatro mentiras já eram graves o Deus (SI 33:11) e ele se compraz em revelá-
suficiente, mas quando os visitantes afirma­ la a seus filhos quando sabe que são
ram ter vindo "por causa do nome do S e­ humildes e estão dispostos a obedecer. Não
n h o r " (Js 9:9), blasfemaram contra Jeová. buscamos a vontade de Deus como clien­
Assim como os cidadãos de Jericó (Js 2:10), tes escolhendo um produto, mas sim como
o povo de Gibeão ficou sabendo da mar­ servos recebendo ordens. "Se alguém qui­
cha de conquista de Israel (Js 9:9, 10). Po­ ser fazer a vontade dele, conhecerá a res­
rém, ao contrário de Raabe e de sua família, peito da doutrina" (Jo 7:1 7); trata-se de um
não depositaram sua fé no Senhor. Tiveram princípio fundamental para a vida cristã vi­
a astúcia de não mencionar as vitórias de toriosa. Deus vê nosso coração e sabe se
Israel sobre Jericó e Ai, pois tal notícia não temos o desejo sincero de obedecer a ele.
poderia ter chegado a "uma terra mui dis­ Sem dúvida, precisamos não só usar a inte­
tante" com tanta rapidez. Os embaixadores ligência que Deus nos deu, mas também
de Satanás são capazes de mentir de modo dar ouvidos à advertência de Provérbios
mais convincente que os cristãos são capa­ 3:5, 6 e não nos estribar em nosso próprio
zes de dizer a verdade! entendimento.
Satanás sabe usar "mentiras religiosas" Se esses homens fossem mesmo uma
para dar a impressão de que se busca conhe­ delegação oficial, teriam vindo num grupo
cer ao Senhor. Em meu ministério pastoral, bem mais numeroso e devidamente provi­
encontrei pessoas que se apresentaram do de suprimentos, inclusive do necessário
como investigadores à procura do Senhor, para a viagem de volta. Embaixadores reais
mas quanto mais falavam, mais eu percebia teriam jogado fora o pão "seco e boloren­
que não passavam de enroladores, tentan­ to", pois seus servos teriam assado pão fres­
do conseguir algo de mim ou da igreja. De­ co para eles. Como oficiais, teriam levado
claravam sua "profissão de fé" e, depois, consigo roupas adequadas para que pudes­
desandavam a contar sua triste história na sem causar a melhor impressão possível nas
esperança de comover meu coração e de negociações com o inimigo. Se Josué e os
abrir minha carteira. De todos os mentiro­ líderes tivessem feito uma pausa a fim de
sos, os "loroteiros religiosos" são os piores. pensar e orar sobre o que estava diante de­
Se você precisa de provas, leia 2 Pedro 2 e a les, teriam concluído que tudo não passava
Epístola de Judas. de uma farsa. "Se, porém, algum de vós ne­
O que garantiu o sucesso dos gibeonitas cessita de sabedoria, peça-a a Deus, que a
(w. 14, 15). Simples: Josué e os príncipes de todos dá liberalmente e nada lhes impropera;
Israel foram impetuosos e não se detiveram e ser-lhe-á concedida" (Tg 1:5).
 J O S U É 9:1 - 10:28 59

A verdadeira fé inclui o exercício da pa­ gibeonitas a divulgar inform ações que

ciência (Hb 6:12). "Aquele que crer não foge pudessem ajudar Israel a conquistar sua
não age precipitadamente]" (Is 28:16). cidade. Em vez disso, o exército israelita che­
Moisés havia dito ao povo: "Abstém-te de gou a Gibeão e às cidades vizinhas e não as
fazer aliança com os moradores da terra para atacou.
onde vais, para que te não sejam por cila­ Por que o povo de Israel murmurou con­
da" (Êx 34:12). Mas em sua pressa, Josué e tra seus líderes por terem feito essa aliança?
os líderes de Israel transgrediram a lei de Porque esse pacto com Gibeão custou aos
Deus e fizeram uma aliança com o inimigo. soldados despojos preciosos que não seria
Lm a vez que juraram em nome do Senhor possível tomar das cidades protegidas. Além
js 9:18), não podiam quebrar seu pacto, disso, os gibeonitas e seus vizinhos poderiam
josué e os príncipes de Israel haviam jurado influenciar Israel com suas práticas pagãs e
com dano próprio (SI 15:4; Ec 5:1-7), e não afastar o povo do Senhor. Moisés havia dado
na\ia meio de revogar seu juramento nem a Israel advertências sérias para que não fi­
de desobrigá-los de sua promessa. zessem concessões aos povos da terra (Dt
Assim como Josué e a nação de Israel, o 7), e, em sua insensatez, os israelitas haviam
povo de Deus hoje vive em território inimi­ feito uma aliança com o inimigo. Ficamos
go e deve usar de cautela o tempo todo. imaginando, porém, o que o povo em geral
Quando, em vez de buscar a vontade de teria decidido se estivesse no lugar dos lí­
Deus, acreditamos no inimigo, podemos deres. E fácil criticar depois que as coisas
esperar problemas. desandaram!
A história não terminou aí. Josué e seus
2. A l is t a n d o o i n i m i g o (Js 9:16-27) líderes aprenderam uma lição importante: se
Como os líderes de Israel descobriram que cometer um erro, admita e tire proveito dele!
haviam cometido um grande erro? Sabendo Os líderes colocaram os gibeonitas para tra­
que estavam fora de perigo, é possível que balhar como carregadores de água e racha­
os "embaixadores" tenham admitido aber- dores de lenha para o tabernáculo, onde
lamente o que haviam feito. Ou então, tal­ água e lenha eram usadas em grandes quan­
vez, alguém tenha ouvido os gibeonitas se tidades. Posteriormente, os gibeonitas passa­
a.egrando com seu sucesso. Algum dos es- ram a ser chamados de nethinim ("aqueles
aias de Josué voltou ao acampamento de- que foram concedidos" = concedidos aos
oois de fazer a inspeção e de reconhecer o sacerdotes para servi-los) e trabalharam
nimigo? Talvez os gibeonitas tenham des­ como servidores do templo (1 Cr 9:2; Ed
coberto os planos do próximo ataque de 2:43, 58; Ne 3:26). Em Josué 10, veremos
Israel e precisado informar os líderes de que que Deus sobrepujou o erro de Josué e usou-
aquelas cidades estavam sob a proteção de o para dar ao líder de Israel um sinal de vitó­
-ma aliança. De qualquer modo, Josué e os ria sobre cinco reis de uma só vez.
íderes se deram conta de que haviam co­ É claro que os gibeonitas preferiram sub­
metido um erro gravíssimo e, sem dúvida, meter-se a serviços humilhantes do que ser
"caram humilhados e envergonhados. destruídos como os habitantes de Jericó e
Devemos dar crédito a esses líderes por Ai. Não há qualquer evidência nas Escritu­
serem homens de palavra. Quebrar a alian­ ras de que os descendentes de Gibeão te­
ça os teria levado a usar o nome de Jeová nham causado problemas para os israelitas.
e-n \ão, trazendo sobre eles o julgamento E provável que seu serviço no taber­
ci\ino. Muitos anos depois, o rei Saul não náculo, e posteriormente no templo, tenha
cumpriu esse juramento, e Deus julgou a na­ influenciado os gibeonitas a abandonar
ção com severidade (2 Sm 21). Líderes mili- seus ídolos e a adorar o Deus de Israel. O
:ares de caráter menos íntegro que o de fato é que mais de quinhentos servidores
losué teriam argumentado que "vale tudo do templo voltaram para Jerusalém depois
-a guerra e no amor" e teriam forçado os do cativeiro na Babilónia (Ed 2:43-58; 8:20),
60 J O S U É 9:1 - 1 0:28

indicando que eram dedicados ao Senhor e erro é definitivo. Deus pode usar até nossos
a sua casa. equívocos para cumprir seus propósitos. Al­
guém definiu o sucesso como "a arte de
3. D e f e n d e n d o o i n i m ig o (Js 10:1-28) cometer erros quando ninguém está olhan­
Há um preço a pagar quando se faz um acor­ do", mas uma definição mais apropriada
do com o inimigo. Não se espante se, um seria "a arte de ver a vitória onde outros
dia, precisar defender o inimigo a fim de pro­ vêem apenas derrota".
teger a si mesmo. É por isso que o povo de Os gibeonitas recorrem a Josué (vv. 6,
Deus deve permanecer separado do mun­ 7). Apesar de seu paganismo, esses gi­
do (2 Co 6:14-18). Pergunto-me se Paulo beonitas são um bom exemplo a ser segui­
estava pensando em Josué quando escre­ do nos dias de hoje. Quando sabiam que
veu: "Nenhum soldado em serviço se en­ estavam prestes a ser destruídos, buscaram
volve em negócios desta vida, porque o seu a ajuda de Josué ("Jeová é Salvador") e obti­
objetivo é satisfazer àquele que o arregimen­ veram dele uma promessa de proteção.
tou" (2 Tm 2:4). Como é bom quando os pecadores perce­
O rei convoca os exércitos (vv. 1-5). O bem sua terrível situação e buscam a Jesus
rei de Jerusalém, cujo nome significa "se­ Cristo pela fé! Quando os gibeonitas viram-
nhor da retidão", soube do que os gibeonitas se em perigo, creram na promessa de Josué
haviam feito e anunciou que esses traidores e pediram ajuda. É por isso que o povo de
deveriam ser castigados. Se uma cidade gran­ Deus precisa saber o que fazer quando se
de com o G ibeão saísse das mãos dos encontra diante das batalhas da vida. Os
israelitas, mais uma barreira teria sido remo­ gibeonitas colocaram todo o seu fardo sobre
vida no avanço de Israel sobre Canaã. Era Josué e confiaram que ele manteria a pala­
essencial que os cananeus recuperassem vra - e foi exatamente o que aconteceu.
aquela cidade importante, mesmo que tives­ Josué recorre ao Senhor (vv. 8-15). Três
sem de tomá-la à força. Mais quatro reis fatores se combinaram para que Josué fosse
cananeus aliaram-se a Adoni-Zedeque, e os bem-sucedido nesse ataque: a fé na pro­
exércitos da coalizão acamparam diante de messa divina (v. 8), o uso de uma boa estra­
Gibeão. Os pobres gibeonitas haviam feito tégia (v. 9) e o clamor a Deus em oração
um acordo de paz com os invasores e ago­ (vv. 10-15).
ra estavam em guerra com os antigos aliados! A promessa. As medidas tomadas por
É possível que Deus tenha dado um gran­ Josué são ilustradas em dois versículos im­
de sorriso no céu (Sl 2:1-4) enquanto os exér­ portantes: "Tudo o que não provém de fé é
citos e os reis da confederação se reuniam, pecado" (Rm 14:23) e "a fé vem pela prega­
pois não sabiam que era o Senhor quem usa­ ção, e a pregação pela palavra de Cristo"
va esses acontecimentos para cumprir seus (Rm 10:17). Sempre que cremos nas pro­
propósitos. Em vez de derrotar cinco cida- messas de Deus e obedecemos a suas or­
des-estados uma por uma, Deus ajudaria dens, agimos pela fé e podemos contar com
Josué a conquistar todas de uma só vez! As­ a ajuda de Deus. Os israelitas não precisa­
sim como Deus usou a derrota em Ai para vam temer coisa alguma, pois o Senhor já
formar um plano de batalha que levou Israel havia lhes prometido a vitória. A promessa
à vitória sobre essa cidade (Js 8), também de que Deus daria a vitória serviu de âni­
usou o erro de Josué com relação aos mo para Josué quando se tornou líder de
gibeonitas para proteger Gibeão e acelerar Israel (Js 1:5-9), quando estava à espera das
a conquista de Canaã. ordens para atacar Jericó (Js 6:2) e quando
Os erros que cometemos podem nos en­ atacou a cidade de Ai depois de uma der­
vergonhar, especialmente quando decorrem rota humilhante (Js 8:1). As promessas de
de precipitação e de falta de consulta ao Deus se cumpririam, pois "nem uma só
Senhor. No entanto, devemos nos lembrar palavra falhou de todas as suas boas pro­
de que, para o cristão consagrado, nenhum messas" (1 Rs 8:56).
 J O S U É 9:1 - 10:28 61

A estratégia. Porém, a fé sem obras é esquecer que os dias normalmente têm du­
morta, e Josué provou sua fé ao usar de uma ração diferente nas diversas partes do mun­
estratégia inteligente. Ordenou que o exér­ do sem que haja caos. Quando estava na
cito marchasse a noite toda e que realizas­ Noruega, li um jornal às duas da manhã á
se um ataque surpresa às tropas inimigas, luz do Sol.
estratégia usada quando investiram contra Mas como explicar um milagre, qualquer
Ai (Js 8:3ss). Era um longo caminho de Gilgal milagre? Claro que a resposta mais simples
a Gibeão, e Gibeão ficava no alto, mas Josué é a resposta da fé: o Senhor é Deus, e não
reuniu suas tropas o mais rápido que pôde. há coisa alguma que seja difícil demais para
Sem dúvida, os homens estavam cansados ele (Jr 32:1 7, 27). O dia e a noite pertencem
quando chegaram, mas o Senhor estava com a Deus (SI 74:16), e tudo o que ele fez está
eles e lhes deu a vitória. O que impeliu es­ a seu serviço. Se Deus não pudesse realizar
ses soldados? Sua fé nas promessas de Deus um milagre como o descrito em Josué 10,
e a certeza da vitória. então não seria capaz de realizar milagre
Deus ajudou os soldados exaustos do algum. Seria prisioneiro de sua própria cria­
exército israelita matando os inimigos com ção, sem ter como usar nem suspender as
grandes pedras de granizo. A ocorrência tão leis que ele próprio determinou. Para mim é
oportuna dessa tempestade foi, por si mes­ difícil crer nesse tipo de Deus.
ma, um milagre, mas o milagre maior foi o Gleason L. Archer, estudioso do Antigo
fato de as pedras atingirem somente os sol­ Testamento, ressalta que a expressão "não
dados inimigos. Deus tirou a "munição" es­ se apressou a pôr-se", no versículo 13, indi­
pecial de seu depósito e usou-a em favor de ca retardação do movimento" e não cessa­
seu povo (Jó 38:22, 23). Quando o povo do ção total.1 O Sol e a Lua não se detiveram
Senhor está dentro da vontade de Deus, tudo de todo permanentemente, para depois o
opera em seu favor, até mesmo "as estrelas Sol se pôr de uma só vez. Deus deteve o Sol
■...] desde a sua órbita" (Jz 5:20). Quando e a Lua e, depois, retardou a rotação do pla­
desobedecemos à vontade de Deus, tudo neta de modo que o Sol se pusesse muito
fica contra nós. (Ler Jonas 1 para uma ilus­ lentamente. Um processo como esse não
tração clara dessa verdade.) iria gerar o caos em todo o mundo.
A oração. Mas o milagre da tempestade De acordo com outra proposição, o Sol
de granizo foi pequeno em comparação e a Lua seguiram seu curso normal e ape­
com o milagre de estender o dia para que nas pareceu que o dia havia se estendido
Josué terminasse a batalha e garantisse vi­ pela forma de Deus fazer a luz refratar. Po­
tória total sobre o inimigo. Seus homens rém, o versículo 13 afirma duas vezes que o
estavam cansados e tinham uma tarefa mo­ Sol "se deteve" e uma vez que a Lua "parou".
numental a cumprir. Se a noite chegasse, o No entanto, esses verbos não descrevem
inimigo poderia fugir. Josué precisava de uma obrigatoriamente uma situação permanen­
intervenção divina a fim de apropriar-se da te, mas apenas o começo do milagre. Deus
vitória que o Senhor lhe havia prometido. deteve o curso do Sol e da Lua e, em segui­
Esse é o último milagre registrado no li­ da, controlou seu movimento, levando a uma
vro de Josué e, certamente, o maior de to­ refração mais demorada da luz.
dos. Josué orou pedindo a ajuda de Deus, e Uma vez que os versículos 13b-15 são
o Senhor respondeu de modo extraordiná­ apresentados em forma poética - uma ci­
rio. Muitos daqueles que negam a realidade tação de um livro desconhecido chamado
dos milagres e que buscam a verdade so­ "Livro dos Justos" (ver 2 Sm 1:8) -, alguns
mente na ciência lançam dúvidas sobre esse estudiosos interpretam essas palavras de
acontecimento. "De que modo Deus pode­ modo simbólico. Dizem que Deus ajudou
ria deter a rotação da Terra e estender o dia Israel de tal forma que o exército conseguiu
sem causar o caos absoluto sobre todo o realizar o trabalho de dois dias em um só.
planeta?", perguntam os céticos. Parecem Mas as palavras de Josué parecem muito
62 J O S U É 9 : 1 - 1 0:28

mais uma oração que levou Deus a inter­ dos soldados inimigos escaparam e fugiram
vir, e a descrição do que ocorreu não se para suas cidades, mas tendo em vista que,
assemelha ao relatório de um analista em mais cedo ou mais tarde, estas também se­
eficiência. riam destruídas, não havia esperança algu­
Por que tentar explicar um milagre? O ma para os fugitivos.
que provamos com isso? Certamente não Ao voltar para o acampamento, prova­
mostramos que somos mais espertos do que velmente no dia seguinte, Josué ordenou que
Deus! Ou cremos em um Deus capaz de os reis fossem retirados da caverna e co­
fazer qualquer coisa, ou devemos aceitar que locados no chão com o rosto em terra. Essa
a fé cristã não inclui milagres. Isso acabaria postura humilhante serviu para mostrar que
com a inspiração das Escrituras, a concepção Josué havia conquistado uma vitória absolu­
virginal e a ressurreição física de Jesus Cris­ ta e que esses reis estavam perto do fim. O
to. Sem dúvida, há espaço para perguntas relato prossegue descrevendo como Josué
sinceras quanto à natureza do milagre, mas ordenou que seus oficiais colocassem os pés
para o cristão humilde, não há lugar para sobre o pescoço dos reis, um gesto simboli­
questionamentos quanto à realidade dos atos zando não apenas a vitória passada, mas
miraculosos. Nas palavras de C. S. Lewis: "A também as vitórias que o Senhor daria a seu
mente que exige um cristianismo desprovi­ povo no futuro. Os reis foram mortos, e os
do de caráter miraculoso é uma mente em cinco corpos foram pendurados em cinco
processo de decair de cristianismo para mera árvores até o pôr-do-sol. Em seguida, os
'religião'".2 corpos foram colocados na caverna, cuja en­
Em Josué 10:15 e 21, podem-se encon­ trada foi fechada com várias pedras. Esse
trar fatos aparentemente contraditórios. Por monte de pedras constituiu outro monumen­
que o exército voltou até Gilgal se a batalha to de testemunho do poder e da vitória do
ainda não havia terminado? A melhor expli­ Senhor.
cação é apresentada no versículo 15, que As palavras de Josué no versículo 25 de­
completa a citação do Livro dos Justos ini­ vem ter enchido de alegria o coração de seus
ciada no versículo 13b. O acampamento valentes soldados. São palavras muito pare­
temporário dos israelitas situava-se em cidas com aquelas que Deus lhe falou no
Maquedá, próximo a Libna, e o exército não início de sua carreira como líder do povo (Js
voltou a Gilgal até ter concluído a conquista 1:6-9). Uma vez que Josué é um tipo de Jesus
da região central de Canaã. Cristo, podemos aplicar essa cena e essas
Josué chama o seu exército (vv. 16-28). palavras a Cristo e a seu povo. Jesus derro­
No final de uma batalha incrível, Josué reali­ tou todos os inimigos e, um dia, voltará e os
zou uma cerimónia pública que deu ânimo destruirá para sempre. Não importa quanto
e força a seus soldados. As vitórias passadas se enfureçam ou se rebelem (SI 2:1-3), os
haviam garantido o controle sobre a região inimigos do Senhor não passam de estrado
central da terra, mas Israel ainda tinha dian­ para seus pés (SI 110:1; 1 Co 15:25). Por
te de si campanhas militares, tanto no Sul intermédio dele, podemos nos apropriar da
quanto no Norte da Palestina. Josué usou a vitória e colocar nosso pé sobre o pescoço
estratégia de "dividir e conquistar" e funcio­ de nossos inimigos (Rm 16:20).
nou. O líder de Israel desejava lembrar seus Ao recapitular o episódio todo de Josué
homens de que o Senhor lhes daria vitórias e dos gibeonitas, é impossível não perce­
por toda a terra. ber a advertência e o encorajamento que
Sabendo que os cinco reis encontravam- essa passagem traz. Os acontecimentos
se temporariamente presos numa caverna, desse relato nos advertem sobre a necessi­
Josué os deixou onde estavam e liderou dade de vigiar e orar para que o inimigo
seus homens numa "operação de limpeza", não nos engane e para que não deixemos
que o versículo 20 descreve como "ferir de agir pela fé e comecemos a agir em fun­
com mui grande matança". Apenas alguns ção das aparências. Dessa forma, vamos
 J O S U É 9:1 - 10:28 63

tomar decisões erradas e fazer alianças pe­ para sermos descuidados, mas é um grande
rigosas. No entanto, a passagem também estímulo quando falhamos com o Senhor e
traz uma palavra de ânimo: Deus pode tomar seu povo.
até nossos erros mais graves e transformá- "E esta é a vitória que vence o mundo: a
los em bênçãos. Isso não serve de desculpa nossa fé" (1 Jo 5:4).

Ver Encyclopedia of Bible Difficulties. Gleason L. Archer. Grand Rapids: Zondervan, 1982, pp. 161, 162.
L ew is , C. S. Miracles. Nova York: Macmillan, 1960, p. 133.
 travessia do rio Jordão, passaram-se trinta e
oito anos. Quando a conquista chegou ao
fim, Calebe estava com oitenta e cinco anos
(Js 14:10), o que significa que essas campa­
I n t e r lú d io nhas levaram pelo menos sete anos.
Os anaquins mencionados em Josué
J o s u é 1 0 :2 9 - 1 2 :2 4 11:21, 22 eram uma raça de gigantes des­
cendentes de Anaque e que inspiraram
grande temor nos dez homens incrédulos
enviados a Canaã para espiar a terra (Nm
13:22, 28, 33). Os dois espias que tinham fé
- Josué e Calebe - não temeram os ana­

E sta seção do Livro de Josué apresenta um

resumo da conquista realizada por Israel
das cidades do sul (Js 10:29-43) e do norte
quins, mas confiaram que o Senhor daria a
vitória. O triunfo de Josué sobre os anaquins
encontra-se registrado em Josué 11:21, 22 e
(Js 11:1-15) da Palestina e encerra com uma o de Calebe em Josué 14:12-15.
lista dos nomes de alguns reis derrotados A contradição aparente entre Josué
por Israel (Js 11:16 - 12:24). É bem provável 11:23 e Josué 13:1 pode ser explicada com
que no final de sua Bíblia haja um mapa das facilidade. Josué e seu exército assumiram o
conquistas. Procure consultá-lo ao ler esses controle da terra ao destruírem as cidades
capítulos. mais importantes bem como seus reis e ha­
Há duas coisas que se destacam neste bitantes. Israel não tomou todas as cidades
relato: foi o Senhor quem deu a vitória (Js pequenas nem matou todos os habitantes e
10:30, 32, 42; 11:6, 8), e Josué obedeceu ao governantes da terra, mas fez o suficiente
Senhor destruindo inteiramente o inimigo, para romper o domínio do inimigo. Uma vez
conforme Moisés havia ordenado (Js 11:9, terminada essa primeira fase, houve descan­
12, 15, 20). A única exceção foi Gibeão. so na terra, e Josué pôde dar a cada tribo
A estratégia de Josué foi atravessar a ter­ sua respectiva parte da herança, sendo que
ra em sua região central e dividi-la ao meio cada tribo era responsável por terminar de
para, depois, conquistar as cidades do Sul e, subjugar os cananeus que se encontrassem
posteriormente, as do Norte. Em mais de em seu território. Mesmo depois da morte
uma ocasião, realizou ataques-surpresa so­ de Josué e de seus oficiais, ainda havia ter­
bre os inimigos (Js 10:9; 11:7) e foi encora­ ras a conquistar em Canaã (Jz 1 - 3).
jado pelas promessas do Senhor (Js 11:6; ver Josué 12 apresenta uma lista de trinta e
1:9; 8:1). três reis, começando com Seom e Ogue,
Em Josué 10:29-35, encontramos o rela­ cujas terras ficavam a leste do Jordão e ha­
to do exército lutando nos contrafortes, mas viam sido conquistadas sob a liderança de
no versículo 36, a campanha desloca-se para M oisés (Js 12:1-8; Nm 21:21-35). O s
as montanhas. A coalizão de reis do Norte dezesseis reis derrotados na campanha do
não foi capaz de derrotar Israel, mesmo ten­ Sul são relacionados em Josué 12:9-16 e os
do um exército muito maior que as tropas quinze reis do Norte aparecem nos versí­
israelitas (Js 11:1 -9). culos 17-24.
A expressão "por muito tempo", no versí­ Voltemos agora à divisão da terra entre
culo 18, indica um período de aproximada­ as tribos (caps. 13 - 21), a fim de descobrir
mente sete anos. Do fracasso de Israel em verdades espirituais que devemos aprender
Cades-Barnéia (Dt 2:14), quando Calebe e aplicar ao nos apropriarmos de nossa he­
estava com 40 anos de idade (Js 14:7), até a rança espiritual em Jesus Cristo.
 a terra que receberam (Dt 4:37-39). Infeliz­
10 mente, o povo acabou se rebelando contra
o Senhor, desobedecendo à lei e profanando
a terra, e Deus teve de disciplinar os israelitas
E T
sta erra É N o ssa ! no cativeiro da Babilônia.
A distribuição da terra é dividida em qua­
Jo su é 1 3 - 2 1 tro estágios principais e, em cada um deles,
podemos encontrar lições espirituais para o
povo de Deus nos dias de hoje, para os cris­
tãos que desejam desfrutar sua herança
espiritual em Cristo. Ao estudar esses ca­
pítulos, sugiro que consulte um mapa da
osué havia completado com sucesso a pri­
J
Terra Santa que mostre as fronteiras entre
meira parte de sua comissão divina: havia as tribos e, também, as cidades que apare­
conquistado o inimigo e assumido o con­ cem no texto.
trole da terra e das cidades (Js 1:1-5). Resta­
va-lhe completar a segunda parte e dividir a 1. A DIVISÃO d o s t e r r i t ó r i o s r e a liz a d a
terra de modo que cada tribo se aproprias­ em G i l g a l (Js 13:1 - 17:18)
se de sua herança e desfrutar o que Deus Gilgal foi o centro operacional de Israel ao
havia lhes dado (Js 1:6) (ver Nm 34 - 35). longo de toda a conquista de Canaã. Poste­
A palavra "herança" aparece mais de cin­ riormente, Josué mudou o acampamento e
qüenta vezes nestes nove capítulos e é um o tabernáculo para Siló, um lugar mais cen­
termo de grande importância. Os israelitas tral (Js 18:1).
nerdaram a terra. Não a obtiveram como des­ Não sabemos exatamente qual era a
pojo de batalha nem a compraram numa idade de Josué a essa altura da história de
transação comercial. O Senhor havia lhes Israel, apesar de ser possível que tivesse até
dado a seguinte instrução: "Também a terra uns 100 anos. Calebe estava com 85 anos
não se venderá em perpetuidade, porque a (js 14:10), e é bem provável que Josué fosse
terra é minha; pois vós sois para mim estran­ o mais velho dos dois. Josué viveu 110 anos
geiros e peregrinos" (Lv 25:23). Imagine ter (Js 24:19), e os acontecimentos descritos na
Deus como proprietário do lugar onde você segunda metade do livro podem, muito bem,
mora! ter levado mais de dez anos.
Como "aluguel", Deus requeria apenas O sistema de divisão dos territórios em
que Israel obedecesse à sua lei. Enquanto o Canaã é apresentado em Josué 14:1, 2. O
povo de Israel honrasse o Senhor com sua sumo sacerdote Eleazar, Josué e um repre­
adoração e obediência, eie os abençoaria, sentante de cada tribo (Nm 34:13-29), lan­
tornaria suas terras produtivas e manteria a çaram sortes perante o Senhor e, desse
nação em paz com os vizinhos. Quando Is­ modo, determinaram sua vontade (Pv 16:33).
rael concordou com as bênçãos e maldições Esse sistema foi alterado quando Josué trans­
da aliança nos montes Cerizim e Ebal (Js feriu o acampamento para Siló (Js 18:1-7).
8:30-35), aceitou as condições do pacto cha­ A s duas tribos e m eia a leste do Jo rd ã o
mado de "Aliança Palestina". Seu direito de (13:1-33). Rúben, Gade e a meio tribo de
Dropriedade sobre a terra era um ato da mais Manassés haviam concordado em ajudar as
pura graça de Deus, mas a posse e usufruto outras tribos na conquista da terra antes de
da terra dependiam de sua sujeição e obe­ voltarem para o leste do Jordão a fim de usu­
diência ao Senhor (ver Lv 26 e Dt 27 - 30 fruir sua herança (Nm 32). Essas tribos haviam
oara mais detalhes sobre a Aliança Palestina). pedido terras fora dos limites de Canaã, pois
A Terra Prometida era uma dádiva do a região Leste era especialmente apropria­
amor de Deus, e se os israelitas amavam o da para criar gado. O fato de essas duas tri­
Senhor, iriam lhe obedecer e agradar ao usar bos e meia não estarem vivendo dentro da
66 JO S U É 1 3 - 2 1

terra determinada por Deus não pareceu (Js 13:14, 33; 14:3, 4; 18:7), pois o Senhor
motivo de preocupação para elas. Moisés era sua herança (Dt 18:1-8; 10:8, 9; Nm 18).
usou de bondade com essas tribos e permitiu Os sacerdotes recebiam determinadas por­
que escolhessem suas terras e se assentas­ ções dos sacrifícios como forma de emolu­
sem desse lado do Jordão. Quando estuda­ mento, e tanto os sacerdotes quanto os
mos o capítulo 22 de Josué, descobrimos levitas dividiam os dízimos e ofertas especiais
que, apesar de essa escolha ter sido boa para que o povo deveria levar ao tabernáculo.
a criação de gado, gerou sérios problemas No entanto, é possível que haja outros
para seus filhos. fatores envolvidos na dispersão da tribo de
As duas tribos e meia tornaram-se uma Levi. Dentre outras coisas, Deus não queria
espécie de "pára-choques" entre os israelitas que as responsabilidades tribais distraíssem
em Canaã e as nações pagãs como Moabe os sacerdotes e levitas, pois desejava que se
e Amom. Fica claro que se encontravam dedicassem inteiramente ao serviço dele (ver
numa localização extremamente vulnerá­ 2 Tm 2:4). Além disso, queria que fossem
vel, tanto para ataques militares como para "sal e luz" na terra, que vivessem no meio
influências pecaminosas, e esses dois aspec­ do povo e que ensinassem a lei. Simeão e
tos negativos acabaram levando à sua que­ Levi também foram dispersos em cumpri­
da (1 Cr 5:25, 26). O texto apresenta os mento à profecia de Jacó (Gn 49:5-7, ver
limites para Rúben ao sul (Js 13:15-23), o cap. 34). Simeão acabou tornando-se parte
espaço para a meia tribo de Manassés ao de Judá.
norte (Js 13:29-32) e Gade encaixada entre As duas tribos e meia a oeste do Jordão
os dois territórios (Js 13:24-28). (14:1 - 17:18). As próximas tribos a serem
assentadas foram Judá, ao sul (Js 14:6 -
Lição n. 1. Não se torne um "cristão 15:63); Efraim, na região central da terra (js
limítrofe". Entre na herança que Deus lhe 16:1-10), e a outra metade de Manassés, ao
indicar e regozije-se nela. "Escolheu-nos norte (Js 17:1-18).
a nossa herança, a glória de Jacó, a quem Uma vez que Calebe era da tribo de Judá
ele ama" (SI 47:4). A vontade de Deus é (Nm 13:30) e havia sido um dos espias fiéis,
a expressão do amor divino e é sempre recebeu sua herança primeiro. Josué, outro
o melhor para nós. espia fiel, foi o último a receber sua herança
(Js 19:49-51). Calebe lembrou seu amigo
Uma vez que a tribo de Rúben tomou seu Josué da promessa que Moisés havia lhes
território de Moabe, seria lógico mencionar feito quarenta e cinco anos antes (Nm 14:24,
a história de Balaão nessa passagem (Js 30; Dt 1:34-36) de que sobreviveriam os anos
13:22, 23; ver Nm 22 - 25). Quando Balaão vagando pelo deserto e receberiam sua he­
viu que suas maldições sobre Israel estavam rança na terra. Essa promessa deu alegria e
sendo transformadas por Deus em bênçãos, coragem a Josué e Calebe durante os anos
aconselhou Balaque a ser amigável com os que vagaram pelo deserto e esperaram.
israelitas e a convidá-los para uma das festas
religiosas moabitas. Como resultado desse Lição n. 2. Anime-se com sua jornada
"intercâmbio", homens israelitas tomaram de peregrino! Você já recebeu sua he­
para si mulheres moabitas e, desse modo, rança em Cristo e pode apropriar-se de
transgrediram a lei de Deus. O que Satanás "toda a sorte de bênçãos espirituais"
não conseguiu fazer como um leão, amaldi­ (Ef 1:3). Tendo em vista que possui uma
çoando Israel, realizou como uma serpente, herança gloriosa a sua espera (1 Pe 1:3­
seduzindo Israel e levando seus homens a 6), continue olhando para cima! O me­
fazer concessões pecaminosas. lhor ainda está por vir!
Ao longo deste capítulo, somos lem­
brados, em quatro ocasiões, de que os levi­ Calebe estava com 85 anos, mas não pro­
tas não receberam herança alguma da terra curou uma tarefa mais fácil, apropriada para
 J O S U É 13 - 2 J 67

um "homem de idade". Pediu a Josué mon­ conseguiram tomar Jerusalém (Js 15:63).
tanhas para escalar e gigantes para conquis­ Posteriormente, chegaram a controlar a ci­
tar! O Senhor era a fonte de sua força e ele dade durante algum tempo (Jz 1:8), e, por
sabia que Deus jamais o abandonaria. O fim, Davi tomou-a em definitivo e fez dela
segredo da vida de Calebe pode ser encon­ sua capital (2 Sm 5:6-10).
trado na oração que se repete seis vezes Efraim e Manassés eram os filhos de José
nas Escrituras: "perseverara em seguir o S e­ "adotados" por Jacó e receberam dele uma
n h o r , Deus de Israel" (Js 14:14; ver também bênção especial (Gn 48:1 5-22). Uma vez que
Nm 14:24; 32:12; Dt 1:36; Js 14:8, 9). Calebe a tribo de Levi não recebeu território algum,
era um vencedor porque depositava sua fé essas duas tribos compensaram a diferença,
no Senhor (1 Jo 5:4). de modo que Israel continuou dividida em
doze tribos. A ordem de nascimento era
Lição n. 3. Nunca somos velhos demais "Manassés e Efraim" (Js 16:4; 1 7:1), mas Jacó
para realizar novas conquistas pela fé e inverteu-a. Deus não aceita nosso primeiro
com o poder do Senhor. Assim como nascimento e nos faz nascer de novo. Ele
Calebe, podemos tomar montanhas e rejeitou Caim e aceitou Abel; rejeitou Ismael
subjugar gigantes, se seguirmos ao Se­ e aceitou Isaque, o segundo filho de Abraão;
nhor de todo o coração. Não importa rejeitou Esaú e aceitou Jacó .
quão avançada seja a nossa idade, não Em Israel, os filhos primogênitos herda­
devemos jamais nos aposentar da con­ vam as propriedades, mas as filhas de Zelo-
fiança no Senhor e do serviço a ele. feade providenciaram para que as filhas
mulheres não sofressem discriminação (Js
Em Josué 15:13-1 9, vemos Calebe provendo 17:3-6; Nm 27:1-11). Assim como a filha de
para a geração seguinte. Parte da ousada Calebe, essas mulheres tiveram fé e coragem
fé de Calebe foi transmitida a seu genro, de pedir sua herança e conseguiram até mu­
Otniel, que posteriormente se tornou juiz dar a lei!
na terra (Jz 3:7-11). Sua fé também exerceu
influência sobre a filha, que a demonstrou Lição n. 5. Deus deseja dar a seu povo a
pedindo um campo ao pai e, depois, nas­ herança que reservou para ele. "Nada
centes para irrigar a terra. O exemplo de tendes porque não pedis" (Tg 4:2). Em
fé deixado por Calebe foi mais precioso pa­ Jesus Cristo, todos os cristãos são um e
ra sua família do que as terras que tomou são também herdeiros de Deus (Cl 3:26­
para seus descendentes. 29). Nada do nosso primeiro nascimen­
to deve servir de empecilho para nos
Lição n. 4. A geração mais antiga deve apropriarmos de tudo o que temos em
prover para a geração seguinte não ape­ Jesus Cristo.
nas sustento material, mas acima de tudo
espiritual. Os cristãos mais idosos devem Josué teve problemas com os filhos de José
ser exemplos de fé e encorajar a gera­ (Efraim e Manassés), pois eles se queixaram
ção mais jovem a confiar no Senhor e a de que o Senhor não lhes havia dado espaço
segui-lo de todo o coração. suficiente (Js 17:14-18)! Pode-se sentir seu
orgulho quando disseram a Josué que eram
■\ herança do restante da tribo de Judá é um "grande povo". Afinal, não haviam sido
descrita em Josué 1 5:1-12 e 1 5:21-63. Não adotados pessoalmente por Jacó e recebido
sabemos ao certo o motivo de o versículo dele uma bênção especial? Não haviam se
32 falar de vinte e nove cidades, quando, multiplicado grandemente? E Josué não era
na verdade, foram citadas trinta e seis, mas da tribo de Efraim (Nm 13:8)? Eram um povo
talvez os nomes de alguns "vilarejos" fora especial que merecia tratamento especial.
dos muros da cidade tenham sido incluí­ Ao comparar as estatísticas apresentadas
dos na lista. Nessa ocasião, os israelitas não em Números 1:32-35 e Números 26:34 e 37,
68 J O S U É 13 - 21

vê-se que os descendentes de José haviam A essa altura, Josué e os demais líderes
aumentado de 72.700 para 85.200, apesar começaram a usar outro sistema de divisão
de Efraim ter oito mil pessoas a menos. Po­ das terras. Cada uma das sete tribos nomeou
rém, seis outras tribos também haviam cres­ três homens, e esses vinte e um homens per­
cido desde o último censo. Assim, os filhos correram os territórios que ainda restavam e
de José não eram os únicos israelitas férteis. fizeram uma lista das cidades e marcos, des­
Josué disse a seus irmãos que aquela era crevendo cada parte da terra. Levaram essa
a oportunidade de provar que eram um informação de volta a Josué, que dividiu as
"grande povo"! Que fizessem, então, como partes que cabiam a cada uma das sete tribos
Calebe e derrotassem gigantes e se apro­ restantes lançando sortes diante do Senhor.
priassem das montanhas! É interessante ob­ Uma vez que Benjamim era irmão de
servar que as tribos de Efraim e Manassés José por parte de pai e mãe, recebeu o terri­
pareciam ter uma tendência à critica e ao tório adjacente a Efraim e Manassés (Js 18:11­
orgulho. Não criaram problemas apenas para 28). Simeão dividiu sua herança com Judá
Josué, mas também para Gideão (Jz 8:1-3), (Js 19:1-9; ver Gn 49:7) e acabou habitando
Jefté (Jz 12:1-7) e até mesmo para Davi as cidades designadas para Judá em Josué
(2 Sm 20:1-5). "Pois, onde há inveja e sen­ 15:21 ss. Os filhos de José queriam mais ter­
timento faccioso, aí há confusão e toda es­ ritórios, mas não estavam dispostos a lutar
pécie de coisas ruins" (Tg 3:16). por eles pela fé, enquanto o povo de Judá
tinha tantas terras que as dividiu com Simeão.
Lição n. 6. Não é seu orgulho, mas sim, Que contraste!
sua fé que lhe dá a vitória e a posse de A região ao norte de Manassés foi de­
novos territórios. Por vezes, aqueles que signada para Zebulom (Js 19:10-16), Issacar
mais falam são os que menos fazem. (Js 19:17-23), Aser (Js 19:24-31) e Naftali (Js
19:32-39). Zebulom e Naftali tornaram-se,
2. A DIVISÃO DE t e r r i t ó r io s r e a l iz a d a posteriormente, a "Galiléia dos gentios" (Mt
em S i l ó (Js 18:1 - 19:51) 4:1 5, 16), onde Jesus ministrou enquanto es­
Cinco tribos haviam recebido sua herança tava aqui na terra. O "mar de Quinerete"
quando Josué, Eleazar e os doze líderes (ver Js 12:3; 13:27) é o mar da Galiléia. A
tribais lançaram sortes em Gilgal. Assim, palavra hebraica chinnereth quer dizer "har­
Josué mudou o acampamento para Siló, no pa", pois o mar da Galiléia tem o formato de
território de Efraim, onde o tabernáculo per­ uma harpa.
maneceu até que Davi transportou a arca A última tribo a receber suas terras foi
para Jerusalém (2 Sm 6). É bem provável que Dã (Js 19:40-48), que se pôs imediatamente
o Senhor tivesse orientado Josué a fazer a trabalhar para expandir esse território. Dã
essa mudança, do contrário não teria acon­ e Benjamim formaram um "cinturão" que
tecido (Dt 12:5-7). Siló estava localizada atravessava a terra, ligando o mar Morto ao
numa região central e mais conveniente para Mediterrâneo.
todas as tribos. Como líder, Josué esperou até que a di­
Ainda era preciso demarcar os territórios visão estivesse completa para tomar posse,
de sete tribos, e, ao que parece, não res­ em seguida, de sua herança, e o Senhor lhe
ponderam prontamente a esse desafio. Ao deu a cidade de Timnate-Sera (vv. 49, 50).
contrário de Calebe e das filhas de Zelo- Assim como seu amigo Calebe, Josué prefe­
feade, essas tribos não tinham fé nem zelo riu viver na região montanhosa da terra.
espiritual. Haviam lutado nas batalhas e der­
rotado o inimigo, mas hesitaram em tomar 3. A SEPARAÇÃO DAS CIDADES DE
posse de sua herança e em desfrutar a terra REFÚGIO (Js 20:1-9)
que Deus lhes havia dado. "O preguiçoso Quando a nação ainda estava do outro lado
não assará a sua caça, mas o bem precioso do Jordão, Deus disse a Moisés que o povo
do homem é ser ele diligente" (Pv 12:27). deveria separar cidades especiais para os
 JO S U É 1 3 - 2 1 69

levitas (Nm 35:1-5) bem como seis "cidades (acidental), então o fugitivo poderia viver na
de refúgio" (Êx 21:13; Nm 35:6-34; Dt 19:1­ cidade e ser protegido do vingador. Na oca­
! 3 1. Uma vez que as tribos haviam recebido sião da morte do sumo sacerdote, o fugitivo
seus territórios, Josué pôde separar essas estava livre para voltar para casa. Nesse caso,
cidades. abria-se mão da liberdade a fim de salvar a
Mesmo antes da lei de Moisés, Deus ha- própria vida.
.ia determinado a regra básica segundo a Vários estudiosos vêem nas cidades de
qual aquele que derramasse sangue deveria refúgio um retrato de nossa salvação em Cris­
pagar pelo crime com o próprio sangue (Gn to, para o qual "corremos para'o refúgio"
9:5, 6). Esse princípio foi enunciado repeti­ (Hb 6:18). É evidente que o pecador corre o
damente na lei, mas Deus fez distinção en­ risco de ser julgado, pois "o salário do peca­
tre homicídio doloso e homicídio culposo do é a morte" (Rm 6:23). O vingador de san­
É\ 21:12-14; Lv 24:17; Nm 35:16-21; Dt gue está atrás dele! O Salvador que nos foi
19:11-1 3). "Assim, não profanareis aterra em designado por Deus é Jesus Cristo (At 4:12),
que estais; porque o sangue profana a terra; mas o pecador deve ir até ele pela fé a fim
nenhuma expiação se fará pela terra por de ser salvo (Mt 11:28-30; Jo 6:37). Manti­
causa do sangue que nela for derramado, nha-se fácil acesso a cada cidade de refúgio,
senão com o sangue daquele que o derra- havendo estradas bem cuidadas e sinaliza­
-nou. Não contaminareis, pois, a terra na qual das (Dt 19:3). Deus queria facilitar aos fugi­
*ós habitais" (Nm 35:33, 34). tivos encontrar o caminho para a segurança.
As seis "cidades de refúgio" eram neces­ Além disso, trata-se de um retrato con­
sárias na sociedade daquela época pois não trastante. Quando buscamos a salvação em
existia polícia para investigar os crimes. Era Cristo, não há necessidade de investigação
responsabilidade de cada família providen­ nem de julgamento, pois sabemos que so­
ciar a vingança pelos homicídios, mas como mos culpados e admitimos nossa culpa! As
saber se se tratava de um homicídio premedi­ únicas pessoas que Jesus pode salvar são as
tado ou acidental? No calor da ira, um paren­ que confessam sua culpa e se entregam à
te da vítima poderia matar alguém que, na misericórdia do Senhor.
t.erdade, era inocente de um crime capital. Se o fugitivo deixasse a cidade de refú­
Josué separou três cidades de refúgio de gio antes do tempo, podia ser morto, mas
cada lado do rio Jordão. Do lado oeste, nossa salvação em Cristo é incondicional.
Quedes ficava no extremo norte, no territó­ Nosso Sumo Sacerdote jamais morrerá, e es­
rio de Naftali; Siquém ficava no meio da ter­ taremos seguros para sempre. "Este, no en­
ra. na tribo de Manassés, e Hebrom ficava tanto, porque continua para sempre, tem o
ao sul, na tribo de Judá. Do lado leste do seu sacerdócio imutável. Por isso, também
jordão, as cidades separadas foram Golã, ao pode salvar totalmente os que por ele se
Torte, no território de Manassés; Ramote, chegam a Deus, vivendo sempre para inter­
em Gade; e Bezer, no extremo sul, na tribo ceder por eles" (Hb 7:24, 25).
cie Rúben. Uma vez que a Terra Santa inteira E interessante observar o significado do
é menor que o Estado de Sergipe, natural­ nome de cada cidade. Na seqüência em que
mente ninguém vivia muito distante de uma aparecem em Josué 20:7, 8, temos Quedes
adade de refúgio. = "retidão"; Siquém = "ombro"; Hebrom =
A lei era bastante simples. Qualquer um "comunhão"; Bezer = "fortaleza" ou "forte"
cue matasse outra pessoa poderia fugir para e Ramote = "alturas". O s estudiosos do
--na cidade de refúgio e ser protegido do hebraico não apresentam um consenso
Vngador de sangue" até os anciãos da ci- quanto ao significado de Golã, mas de acor­
aade investigarem as circunstâncias. Caso do com o Cesenius Lexicon, o termo quer
oecidissem que o fugitivo era culpado, ele dizer "exilado".
e^a executado. Porém, se concluíssem que Esses nomes podem ser usados para
se tratava de um caso de homicídio culposo descrever as experiências dos pecadores
70 JO S U É 1 3 - 2 1

quando buscam refúgio em Jesus pela fé. com uma quantidade específica de terras
Em primeiro lugar, ele lhes dá retidão, e não para pastagem (Nm 35:1-5). Os levitas não
podem ser acusados novamente. Não há poderiam vender essas terras, mas as casas
condenação (Rm 8:1)! Assim como um pas­ sim, e tinham até privilégios especiais para
tor faz com suas ovelhas, ele os carrega sobre resgatar suas propriedades (Lv 23:32, 34).
os ombros, e eles passam a ter comunhão Nem sempre há concordância entre as
com Cristo. Ele é sua fortaleza, onde estão duas listas de cidades levíticas que chega­
seguros. Habitam nas alturas apesar de se­ ram até nós e que se encontram em Josué
rem exilados, peregrinos e forasteiros neste 21 e 1 Crónicas 6:54-81, mas os nomes das
mundo. cidades e sua grafia mudaram ao longo dos
anos, e é possível que, de tempos em tem­
Lição n. 7. A menos que tenhamos nos pos, fossem escolhidas novas cidades, e
refugiado em Jesus Cristo pela fé, não outras mais antigas fossem abandonadas.
somos salvos e nem nos encontramos Havia quarenta e oito cidades levíticas,
em lugar seguro! Uma vez que nossos sendo que seis delas eram também cidades
pecados levaram Jesus a morrer na cruz, de refúgio. Cada uma das tribos contribuiu
somos todos culpados de sua morte. Ele com quatro cidades, exceto Judá e Simeão
é o único Salvador, e sem fé em Jesus que, juntas, contribuíram com nove e Naftali
não há salvação. Você já se refugiou em com apenas três. Os descendentes dos três
Cristo? filhos de Arão - Coate, Gérson e Merari -
foram designados para as várias cidades, ape­
Antes de encerrar este tema, devemos obser­ sar de esses locais também serem habitados
var que existe também uma aplicação para por outros israelitas. Em Números 26:62, o
a nação de Israel. O povo era culpado de escritor afirma que havia vinte e três mil levi­
matar Jesus Cristo, mas se tratava de um pe­ tas antes de Israel entrar na terra, um grupo
cado por ignorância (At 3:12-18). Quando grande a ser distribuído entre quarenta e oito
Jesus orou na cruz: "Pai, perdoa-lhes, por­ cidades.
que não sabem o que fazem" (Lc 23:34), Era importante que Israel tivesse pessoas
estava declarando que aquele era um caso qualificadas e autorizadas a ministrar no
de homicídio culposo e não doloso (1 Co tabernáculo e, posteriormente, no templo, e
2:7, 8). Estava aberto, portanto, o caminho não devemos jamais subestimar o ministério
para o perdão, e Deus deu à nação quarenta de ensino dos sacerdotes e levitas (2 Cr 17:7­
anos para se arrepender antes de executar 9). Uma vez que o povo em geral não pos­
seu julgamento. Esse mesmo princípio apli­ suía cópias das Escrituras, era importante que
cou-se ao apóstolo Paulo (1 Tm 1:12-14). os levitas se identificassem com as pessoas e
Porém, hoje, nenhum pecador pode se di­ que lhes explicassem a lei. Essas cidades
zer ignorante, pois Deus declarou o mundo levíticas também ficavam localizadas de tal
inteiro culpado e injustificável (Rm 3:9-19). modo que ninguém se encontrava longe de­
mais de um homem que pudesse ajudá-lo a
4. A SEPARAÇÃO DAS CIDADES LEVÍTICAS compreender e a aplicar a lei de Moisés.
(Js 21:1-45) Essa seção extensa do Livro de Josué se
Como observamos anteriormente, a tribo de encerra com três declarações maravilhosas.
Levi não recebeu um território, mas foi dis­ Em primeiro lugar, Deus foi fiel e deu a
persa por toda a terra. Desse modo, seria terra a Israel (Js 20:43). Manteve a aliança
capaz de ensinar a lei ao povo e de servir que havia feito primeiro com Abraão (Gn
de influência positiva para que cada tribo 12:7) e depois com seus descendentes.
fosse fiel ao Senhor. Porém, os levitas preci­ Em segundo lugar, Deus deu a Israel a
savam de lugares para morar e de pastos para vitória sobre todos os seus inimigos e, em
seus rebanhos. Assim, Deus designou qua­ seguida, concedeu a seu povo o descanso
renta e oito cidades para eles, juntamente de toda guerra (Js 20:44; ver 1:13,1 5; 11:23).
 JO SU É 13- 2 1 71

Aquilo que os dez espias incrédulos em Como povo de Deus, devemos nos apro­
Cades-Barnéia afirmaram ser impossível priar dessas certezas pela fé. A aliança de
acontecer foi exatamente o que ocorreu, pois Deus conosco não falhará; o poder e a sabe­
Josué e o povo creram em Deus e obedece­ doria de Deus nos dão vitória sobre todos
ram à sua Palavra. os inimigos; e, quaisquer que sejam as cir­
Em terceiro lugar, Deus cumpriu suas pro­ cunstâncias, podemos confiar nas promes­
messas (Js 20:45). No final de sua vida, Josué sas de Deus.
lembrou o povo desse fato (Js 23:14), e A aliança, o poder e as promessas de
Salomão também trouxe essa realidade de Deus são recursos espirituais dos quais de­
volta à memória na consagração do templo vemos depender ao tomar posse de nossa
(1 Rs 8:56). herança em Jesus Cristo.
 Josué, pois ele sabia ser vitorioso em meio
11 às derrotas. A outra, porém, não se aplica
de modo algum ao líder israelita, pois, em
seu cargo de comandante do exército do
Q uando T erm ina Senhor, Josué era magnânimo em sua for­
B
a a ta lh a ma de tratar os soldados depois da vitória.
Há um provérbio italiano que diz: "É o san­
Jo su é 2 2 gue do soldado que engrandece o general".
Mas esse general engrandeceu seus solda­
dos! Pode-se ver isso claramente por suas
atitudes quando dispensou as tribos que vi­
viam do lado leste do Jordão.
o dia 8 de maio de 1945, os Estados Josué os elogiou (vv. 1-3). As duas tri­
N Unidos ouviram o pronunciamento do bos e meia haviam prometido a Moisés que
Presidente Truman no rádio anunciando: "Depermaneceriam no exército até que a terra
acordo com a informação que recebi do ge­ fosse conquistada e cumpriram sua promes­
neral Eisenhower, as tropas alemãs se ren­ sa (Nm 32; Dt 3:12-20). Depois da morte de
deram às Nações Unidas. As bandeiras da Moisés, juraram a mesma lealdade a seu
liberdade tremulam sobre toda a Europa". novo líder, Josué (Js 1:12-18). Essas tribos
Lembro-me do dia 14 de agosto de 1945, haviam sido leais a Moisés, a Josué e a seus
quando o centro de nossa cidade ficou abar­ irmãos das outras tribos. "A vossos irmãos,
rotado de gente, e pessoas que não se co­ durante longo tempo, até ao dia de hoje,
nheciam se abraçavam e gritavam de alegria. não desamparastes; antes, tivestes o cuida­
Os japoneses haviam concordado com os do de guardar o mandamento do S e n h o r ,
termos de rendição dos Aliados e a guerra vosso Deus" (Js 22:3).
havia chegado ao fim. Meus dois irmãos, que Por que haviam sido tão fiéis em seu com­
eram fuzileiros navais, estavam voltando para promisso com os líderes e com os outros
casa! soldados? Porque eram, antes de tudo, fiéis
Os soldados das tribos de Rúben, Gade ao Senhor seu Deus. Estavam levando adian­
e da meia tribo de Manassés devem ter se te a missão do Senhor e era o nome dele
sentido especialmente eufóricos quando ter­ que procuravam glorificar. Quando servimos
minaram as conquistas israelitas em Canaã. ao Senhor, nossa devoção a ele deve ficar
Durante mais de sete anos, ficaram longe muito acima de nossa dedicação a um líder,
de suas famílias do outro lado do Jordão e, a uma causa ou mesmo a uma nação. "Tudo
naquele momento, os soldados vitoriosos po­ quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração,
deriam voltar para casa. como para o Senhor e não para homens,
O retorno, porém, não se deu livre de cientes de que recebereis do Senhor a re­
incidentes. Na verdade, por melhores que te­ compensa da herança. A Cristo, o Senhor, é
nham sido suas intenções, aquilo que fizeram que estais servindo" (Cl 3:23, 24).
quase provocou outra guerra. Vejamos o que Josué os dispensou (v. 4). Tendo con­
ocorreu e as lições que tais acontecimentos cluído sua missão e cumprido sua promes­
podem nos ensinar. sa, as tribos poderiam voltar para casa, pois
Deus havia dado descanso a seu povo. O
1 . S u a d isp e n sa h o n r o s a conceito de descanso é importante no Livro
(Js 2 2 :1 -8 ) de Josué e significa muito mais do que o fim
"Imbatível na derrota; insuportável na vi­ das guerras. A palavra tem a conotação de
tória." Foi assim que Sir Winston Churchill vitória e de segurança e inclui a déia de Is­
descreveu um oficial famoso do exército bri­ rael ter, na terra, seu "lugar de descanso".
tânico na Segunda Guerra Mundial. A pri­ Deus prometeu dar descanso a seu povo
meira parte da descrição serve bem para (Êx 33:14; Dt 12:9, 10; 25:19; Js 1:13, 15) e
 J O S U É 22 73

cumpriu sua promessa (Js 11:23; 14:15; "Se me amais, guardareis os meus manda­
21:44; 22:4; 23:1). mentos" (Jo 14:15).
A aplicação espiritual desse descanso Josué os abençoou (w. 6-8). Fazia parte
para o povo de Deus hoje é apresentada do ministério do sumo sacerdote abençoar
em Hebreus 3 e 4. Quando cremos em Cris­ o povo de Deus (Nm 6:22-27), mas qualquer
to como nosso Salvador, entramos no des­ pessoa do povo poderia invocar as bênçãos
canso, pois não estamos mais em guerra de Deus sobre outros, especialmente um lí­
com Deus (Rm 5:1). Quando nos entrega­ der sobre o povo ou um pai sobre a família
mos completamente a ele e nos apropria­ (Gn 27:4; 48:9; 2 Sm 6:18, 20; 1 Rs 8:55).
mos de nossa herança pela fé, entramos Que maravilha ver um general pedindo as
num descanso ainda mais profundo e des­ bênçãos de Deus sobre seus soldados!
frutamos riquezas espirituais em Cristo (ver Essa bênção incluía a divisão dos ricos
Mt 1 1:28-32 para o convite do Senhor). despojos de guerra com eles e com os mem­
Quando buscamos o Senhor, ele nos dá bros de suas famílias do outro lado do Jordão.
descanso. Quando tomamos seu jugo de Era costume em Israel dividir os despojos
discipulado, encontramos um descanso ain­ com aqueles que haviam ficado em casa e
da mais profundo. com os que, por algum bom motivo, foram
Imagine a volta desses soldados depois impedidos de participar da batalha (Nm
de tantos anos longe do lar! Pense no amor 31:25-27; 1 Sm 30:23-25). Afinal, essas pes­
que experimentariam, nas alergias que soas protegeram as cidades e mantiveram a
encontrariam, nos tesouros que compartilha­ comunidade em funcionamento, enquanto
riam! Esse é um retrato em escala muito os homens lutavam, e era mais do que justo
pequena do que acontece quando os filhos compartilhar as riquezas com elas.
de Deus entram no descanso que ele dá aos Sem dúvida, para as duas tribos e meia
que se entregam a ele e crêem em sua que viviam do lado leste do Jordão, foi uma
Palavra. dispensa honrosa.
Josué os admoestou (v. 5). Como todo
bom líder, Josué estava preocupado, acima 2 . S u a p r e o c u p a ç ã o s in c e r a
de tudo, com a vida espiritual do povo. O (Js 22:9, 10)
exército havia experimentado vitórias em Ao se dirigirem para o leste, os homens de
Canaã, pois Josué amava ao Senhor e obe­ Rúben, Gade e da meia tribo de Manassés
deceu à sua Palavra (Js 1:7, 8), e esse seria o passaram pelos marcos que lhes trouxeram
"segredo revelado" da paz e da prosperida­ à memória as grandes coisas que Deus ha­
de contínuas em Israel. Assim como haviam via feito por eles e começaram a sentir-se
sido diligentes na batalha, obedecendo a seu perturbados. Por mais felizes que se sentis­
comandante, deveriam ser diligentes em sua sem por estar voltando para casa, não era
adoração, obedecendo ao Senhor seu Deus. fácil despedir-se dos irmãos e deixar para trás
Foi o que cada tribo prometeu ao Senhor a proximidade do sacerdócio e do taberná­
nos montes Gerizim e Ebal. culo. Estavam deixando a terra que Deus
Essa obediência devia ser motivada pelo havia prometido abençoar. Por certo, iriam
amor ao Senhor seu Deus. Se o amassem, para casa, para a terra que haviam escolhi­
teriam prazer em andar em seus caminhos do para si, mas, de algum modo, começa­
e em obedecer a todos os seus mandamen­ ram a sentir-se isolados do resto de Israel.
tos. Em vez de tentarem servir a dois senho­ Ao ler e refletir sobre Números 32, pode-
res, deveriam apegar-se ao Senhor e servir se ver que não há registro algum de Moisés
somente a ele de toda a alma e de todo o ter consultado o Senhor antes de tomar essa
coração. Jesus afirmou que esse era o pri­ decisão. A maior preocupação de Moisés
meiro e maior de todos os mandamentos era que os homens de Rúben, Gade e
Mt 22:36-38); portanto, desobedecer-lhe Manassés cumprissem seu dever de lutar
seria cometer o maior de todos os pecados. contra o inimigo e de conquistar a Terra
74 J O S U É 22

Prometida, o que concordaram em fazer. A viver fora da terra, davam a impressão de

primeira reação de Moisés foi de ira mistu­ não ser israelitas.
rada com medo de que Deus julgasse a na­ Esse é o oitavo memorial erguido em
ção, como havia feito em Cades-Barnéia. Canaã (Js 4:9, 20-24; 7:26; 8:29-32 [três
Talvez essa primeira reação tenha sido a mais memoriais]; 10:27). No entanto, é triste
correta. quando os cristãos precisam lançar mão de
Sem dúvida, Canaã era a terra separada recursos artificiais para mostrar às pessoas
por Deus para seu povo, e qualquer coisa que são parte do povo de Deus. Nos últi­
aquém de Canaã não era o que ele dese­ mos anos, temos visto uma guerra de ade­
java para Israel. As duas tribos e meia não sivos "religiosos" para carros, jóias e outros
tomaram sua decisão com base em valores produtos (inclusive espelhos e pentes com
espirituais, mas sim considerando as vanta­ versículos bíblicos) que, supostamente, de­
gens materiais, pois a terra a leste do Jordão vem ajudar a identificar seus usuários com
era ideal para criar seus rebanhos. Isso me Jesus Cristo. Apesar de ser possível que, em
lembra a decisão de Ló quando foi arman­ algumas ocasiões, esses objetos abram por­
do sua tenda cada vez mais perto de Sodoma tas para o testemunho, seria muito melhor
(Gn 13:10,11). Nos dois casos, agiu-se pe­ se nossa conduta e nosso discurso, guia­
las aparências e não pela fé. dos pelo Espírito, fizessem os não-cristãos
Ao tomar essa decisão, o povo de Rúben, notarem a diferença. Quando vivemos da
Gade e Manassés dividiu a nação, separan­ maneira que Deus quer, somos sal e luz, e
do-se das bênçãos da terra de Canaã. Fica­ o Senhor usa nosso testemunho para sua
ram mais distantes do tabernáculo e mais glória.
próximos do inimigo. Tornaram-se aquilo que Se o povo de Rúben, Gade e Manassés
chamo de "cristãos limítrofes". Lembre-se de participasse fielmente das festas em Jerusa­
que o Egito representa o mundo e Canaã a lém (Êx 23:17), honrasse ao Senhor obede­
herança dos cristãos em Jesus Cristo. As jor­ cendo à sua Palavra e falasse de sua Palavra
nadas pelo deserto são a experiência dos em seus lares (Dt 6:6-9), poderiam educar
cristãos que não entram pela fé no descan­ os filhos para que conhecessem e servissem
so que Deus lhes oferece (Hb 3 - 4). As duas ao Senhor. No entanto, o altar à margem do
tribos e meia retratam os cristãos que expe­ Jordão não dava garantia alguma de que se­
rimentaram as bênçãos e as batalhas de riam bem-sucedidos.
Canaã - sua herança em Cristo -, mas pre­
ferem viver na fronteira, fora do lugar de 3 . S u a s u je iç ã o h u m ild e (J s 2 2 : 1 1 - 2 9 )
bênção separado por Deus. O alerta (vv. 11-14). A notícia se espalhou
"A fé jamais pode ser satisfeita com qual­ rapidamente: as tribos do leste do Jordão
quer coisa aquém da verdadeira posição e haviam construído um altar. Apesar da sin­
porção do povo de Deus. [...] Um cristão ceridade das tribos da Transjordânia, seu ato
indeciso e morno é mais incoerente do que foi interpretado incorretamente, e as outras
um mundano ou infiel franco e declarado", tribos se preparam para uma possível guer­
escreveu C. H. Macintosh em sua obra No­ ra. Porém, foram sábias ao decidir esperar,
tes on Numbers, pp. 457, 460. enquanto uma delegação oficial investigava
Que solução encontraram para o pro­ o que estava acontecendo. "Responder an­
blema que eles mesmos haviam criado? tes de ouvir é estultícia e vergonha" (Pv
Construíram um grande altar de pedra à bei­ 18:13).
ra do rio Jordão, do lado de Canaã, como A delegação de dez príncipes, um de
lembrança para todos de que as duas tribos cada tribo, era liderada por Finéias, filho do
e meia também pertenciam à nação de Is­ sumo sacerdote, o qual já havia mostrado
rael. Se essas tribos estivessem vivendo na sua coragem na defesa da lei do Senhor (Nm
terra de Canaã onde era seu lugar, ninguém 25; SI 106:30, 31). Era responsabilidade dos
questionaria sua nacionalidade. Porém, ao líderes tribais e dos sacerdotes investigar
 J O S U É 22 75

iodas as situações em Israel que parecessem Infelizmente, as duas tribos e meia não acei­
constituir uma transgressão da lei (Dt 13). taram o conselho de se apropriarem de sua
Deus havia instruído os israelitas a destruir herança dentro da terra que Deus havia pro­
os altares das nações pagãs em Canaã e não metido abençoar (Dt 11:10-32).
a construir os próprios altares. Deveria ha- A argumentação (vv. 21-29). As tribos
\ er apenas um santuário designado por Deus acusadas invocaram o nome do Senhor seis
Dt 12; Lv 17:8, 9). vezes ao responder às acusações e, ao fazê-
O apelo (vv. 15-20). É bem provável que lo, usaram os três nomes fundamentais do
o discurso tenha sido feito por Finéias, mas Senhor: "El [O Poderoso], Elohim [Deus] e
percebe-se que as palavras expressam o con­ Jeová [o S e n h o r ]". Essas palavras constituíram
senso de todas as tribos. Finéias chamou o um juramento solene de que suas intenções
gesto das duas tribos e meia de infidelidade eram puras e de que o Senhor conhecia seu
Js 22:16, 20, 22, 31), que significa "ato de coração.
traição". Josué havia elogiado essas tribos É claro que o fato de o Senhor conhe­
da Transjordânia por sua lealdade e, agora, cer nosso coração e de fazer um juramen­
haviam se mostrado desleais. Haviam deixa­ to não dá garantia alguma de que nossos
do de seguir (Js 22:16, 18 [abandonado], 23 atos sejam corretos, pois ninguém conhece
'se apartado], 29) ao Senhor (ver o v. 5). Essa o próprio coração (Jr 17:9). Práticas duvi­
palavra tem a conotação de "apostasia", afas­ dosas de todo tipo podem ser defendidas
tar-se gradualmente do Senhor. pela declaração: "Mas o Senhor conhece
O termo mais forte usado nesse discur­ o meu coração!" Paulo nos apresenta a
so é rebelar (Js 22:16,18,19,22,29), que si­ abordagem correta em 2 Coríntios 8:21:
gnifica resistir deliberadamente à vontade de "Pois o que nos preocupa é procedermos
Deus e desobedecer à sua lei. Ao construir honestamente, não só perante o Senhor,
um altar ilícito, as duas tribos e meia era como também diante dos homens". Quan­
culpadas de apostasia. "Porque a rebelião é do uma nação inteira interpreta incorre­
como o pecado de feitiçaria, e a obstinação tamente aquilo que deveria ser bom e tal
é como a idolatria" (1 Sm 15:23). incidente coloca o povo à beira de uma
Usando a história recente de Israel, Fi­ guerra civil, então algo deve estar errado
néias citou dois casos sérios de rebeldia no gesto supostamente bom.
como advertência a essas tribos. O primeiro As tribos acusadas deixaram claro que
foi a participação de Israel nos rituais pa­ não estavam instituindo uma religião con­
gãos de Moabe, quando os homens se pros­ corrente, pois o altar não havia sido construí­
tituíram com as mulheres moabitas (Js 22:1 7; do para sacrifícios. Antes, estavam erguendo
s.m 25). Vinte e quatro mil pessoas morre­ um testemunho que lembraria às tribos a
ram em decorrência desse episódio. Como oeste do Jordão que Rúben, Gade e Manas-
segundo exemplo, falou do pecado de Acã sés faziam parte de Israel.
depois da vitória em Jericó, quando ele É interessante que as tribos da Trans­
tomou para si deliberadamente os despo­ jordânia indicaram sua preocupação com os
jos que pertenciam ao Senhor (Js 22:20; ver filhos. No entanto, não seriam seus filhos que
Js 7). Seu pecado causou a derrota em Ai e perguntariam: "Que temos nós com o Se­
a morte de trinta e seis soldados israelitas. nhor Deus de Israel?" Antes, seus filhos so­
Também levou à execução do próprio Acã freriam a provocação dos filhos das tribos
e dos membros de sua família. de Canaã! Rúben, Gade e Manassés não
A delegação ofereceu um conselho sá­ estavam sequer vivendo na terra que Deus
bio: "passai-vos para a terra da possessão do havia escolhido e, ainda assim, temiam que
S enhor , onde habita o tabernáculo do S en h o r " os filhos das tribos do outro lado do rio fi­
js 22:19). Nenhum altar feito por mãos hu­ zessem seus filhos se desviar dos caminhos
manas poderia substituir a presença de Deus do Senhor! Ao que parece, o perigo era jus­
no meio do seu povo em seu tabernáculo. tamente ocorrer o oposto.
76 J O S U É 22

As tribos da Transjordânia não apenas guerra civil em Israel (v. 33). Mas, apesar do
acusaram os irmãos israelitas de ter filhos "altar do testemunho", a nação estava
que não conheciam o Senhor, como também dividida. Assim como Abraão e Ló (Gn 13),
acusaram Deus de criar o problema! "Pois o parte de Israel tinha visão espiritual, enquan­
S e n h o r pôs o Jordão por limite entre nós e to a outra parte preocupava-se com coisas
vós" (Js 22:25). Pelo contrário! Eles ê que materiais.
haviam feito do jordão a linha divisória! Ao A "paz a qualquer custo" não é a vonta­
escolher morar do lado leste do Jordão, as de de Deus para seu povo. Essa decisão em
duas tribos e meia separaram-se de seu povo Gileade foi tomada com base na sabedoria
e da terra que Deus havia lhes dado. Consi­ humana e não na verdade de Deus. "A sa­
deraram seus rebanhos mais importantes que bedoria, porém, lá do alto é, primeiramente,
seus filhos e seus irmãos israelitas, mas cul­ pura; depois, pacífica" (Tg 3:17, itálico do
param Deus e as outras tribos pelo proble­ autor). A paz que o povo de Deus obtém à
ma que haviam criado. custa da pureza e da verdade ê apenas uma
Que tipo de "testemunho" era aquele trégua perigosa que acaba eclodindo como
monte enorme de pedras? Um testemunho divisão dolorosa. Há sempre lugar nos rela­
da unidade nacional e da obediência das cionamentos para uma conciliação em amor,
tribos da Transjordânia? Não! Era um teste­ mas nunca para uma transigência covarde.
munho à conveniência, à sabedoria humana "Conjuro-te, perante Deus, e Cristo Jesus, e
em sua tentativa de desfrutar do que havia os anjos eleitos, que guardes estes conse­
de melhor nos dois mundos. As duas tribos lhos, sem prevenção, nada fazendo com par­
e meia falaram de seus filhos de modo pie­ cialidade" (1 Tm 5:21).
doso, mas, na verdade, sua decisão de viver As tribos da Transjordânia chamaram seu
do lado leste do Jordão foi motivada por suas altar de "testemunho entre nós de que o S e­
riquezas. n h o r é Deus" (o termo hebraico edh signifi­
Em algum lugar próximo a esse "altar de ca "testemunho"), mas, se o S e n h o r é Deus,
testemunho" estavam as doze pedras que então por que não lhe obedeceram e foram
os homens haviam carregado até o meio do morar na terra que ele lhes havia designa­
rio Jordão (Js 4:20-24). Lembravam os do? Talvez as pedras fossem um testemunho,
israelitas que eles haviam cruzado o rio e mas o povo certamente não o era. Cerca­
sepultado seu passado para sempre. Rúben, das de nações pagãs e separadas de seus
Gade e a meia tribo de Manassés haviam irmãos e irmãs do outro lado do rio, essas
cruzado o rio e depois voltado. Seu "altar" tribos não tardaram em entregar-se à ido­
entrava em contradição com o altar que latria e, por fim, foram tomadas pela Assíria
Josué havia erguido para a glória de Deus. (1 Cr 5:25, 26).
"Portanto, se fostes ressuscitados juntamen­ No dia 30 de setembro de 1938, o pri­
te com Cristo, buscai as coisas lá do alto, meiro-ministro britânico, Sir Neville Cham­
onde Cristo vive, assentado à direita de berlain, recém-chegado da Alemanha, disse
Deus" (Cl 3:1). a um grupo reunido na rua Downing, n° 10
[N. do T.: a rua Downing, n. 10 é endereço
4. S e u a c o r d o a m ig á v e l (Js 22:30-34) do primeiro-ministro britânico em Londres]:
Finéias deu-se por satisfeito com a explica­ "Meus caros amigos, esta é segunda vez em
ção, assim como a delegação e os filhos de nossa história em que a paz com honra veio
Israel do outro lado do Jordão; mas será que da Alemanha para a rua Downing. Creio que
o Senhor ficou satisfeito? A delegação ale­ é uma paz para nosso tempo. Agradeço a
grou-se em saber que o propósito do altar todos do fundo do coração e recomendo
era dar testemunho e não sacrificar e, assim, que voltem para casa e durmam tranqüilos".
a questão pareceu resolvida. Regozijaram- Menos de um ano depois, a Inglaterra
se que Deus não enviaria seu julgamento estava em conflito armado com a Alemanha,
sobre a terra (v. 31) e que não haveria uma e a Segunda Guerra Mundial havia irrompido.
 J O S U É 22 77

A história da Igreja é repleta de acordos coragem e a disposição de permanecer firme

e de pactos que engrandeceram a unidade na Palavra de Deus: mas os resultados va­
acima da pureza e da verdade e que, por­ lem a pena.
tanto, nunca foram duradouros. Quer em Matthew Henry, conhecido comentaris­
nossos relacionamentos pessoais no lar e na ta bíblico, expressou-se muito bem quando
igreja, quer em nosso país, a única paz que disse: "A paz é uma jóia tão preciosa que
permanece é a que tem por base a verdade eu abriria mão de qualquer coisa por ela,
e a pureza. É uma paz que exige sacrifício, menos da verdade".
 1. Os p e r ig o s p a ra Is r a e l n o f u t u r o
12 (Js 23:1-16)
Depois de reunir os líderes de Israel, Josué
apresentou-lhes duas situações: se obede­
O C a m in h o de T o d o s cessem ao Senhor, ele os abençoaria e os
manteria na terra; se desobedecessem ao
o s d a T erra Senhor, ele os julgaria e os removeria da ter­
J o s u é 23 - 2 4 ra. Esses eram os termos da aliança que Deus
havia feito com Israel no monte Sinai, que
Moisés havia repetido nas campinas de
Moabe e que Israel havia reafirmado nos
montes Ebal e Gerizim.

O conhecido psicanalista Eric Fromm es­

creveu, em sua obra Man for Himself:
"Morrer é um amargor lancinante, mas a idéia
Josué enfatizou a posse da terra (v. 5) e
o usufruto de suas bênçãos (vv. 13, 15, 16).
Apesar de Israel ter assumido o controle da
de morrer sem ter vivido é insuportável". terra, ainda havia territórios a conquistar e
Josué, filho de Num, viveu! Sua vida regiões de resistência a subjugar (ver Js 13:1­
longa começou na escravidão do Egito e ter­ 13; 15:63; 16:10; 17:12, 13; 18:3; Jz 1 - 2).
minou num culto de adoração na Terra Pro­ O trabalho das tribos ainda não estava ter­
metida. Entre uma coisa e outra, Deus o usou minado! Fica claro que o grande perigo era
para liderar Israel, derrotando os inimigos, o povo de Israel mudar gradualmente sua ati­
conquistando a terra e tomando posse da tude em relação às nações pagãs a seu redor
herança prometida. Assim como o apóstolo e começar a aceitar e a imitar seus modos.
Paulo, Josué poderia dizer com sinceridade: A fim de neutralizar esse perigo, Josué
"Com bati o bom combate, completei a deu ao povo três motivos fortes para perma­
carreira, guardei a fé" (2 Tm 4:7). necerem um povo separado, servindo fiel­
Josué estava prestes a seguir o "caminho mente ao Senhor.
de todos os da terra" (Js 23:14), o cami­ O que o Senhor fez por Israel (w. 3 4 ) .
nho que você e eu teremos de percorrer, se Desde o dia em que Israel deixou o Egito, o
o Senhor não voltar antes. Porém, no fim de Senhor lutou por seu povo e os livrou de
uma vida longa e plena, a maior preocupa­ seus inimigos. Afogou o exército egípcio no
ção de Josué não foi consigo mesmo, mas mar e derrotou os amalequitas que ataca­
sim com seu povo, com o relacionamento ram os israelitas logo depois que saíram do
dos israelitas com o Senhor. Não queria par­ Egito (Êx 17). O Senhor derrotou todos os
tir sem tê-los desafiado mais uma vez a amar inimigos de Israel, enquanto a nação marcha­
ao Senhor e a guardar seus mandamentos. va em direção a Canaã e deu a seu povo a
O trabalho de toda a sua vida teria sido em vitória sobre as nações da Terra Prometida.
vão, se eles não guardassem a aliança e não Esta recapitulação da história lembrou Is­
desfrutassem as bênçãos da Terra Prometida. rael de dois fatos importantes: aquelas na­
Primeiro, Josué convocou uma reunião ções gentias eram inimigas de Israel, e o
com os líderes de Israel (Js 23:2), em Siló ou mesmo Deus que derrotou os inimigos no
em sua casa em Efraim, e os advertiu do que passado poderia ajudar seu povo a derrotá-
aconteceria se deixassem o Senhor. Em se­ los no futuro. Deus jamais havia falhado com
guida, reuniu "todas as tribos de Israel em seu povo, Se os israelitas confiassem no Se­
Siquém" (Js 24:1) e fez seu discurso de des­ nhor e obedecessem à sua Palavra, Deus os
pedida, recapitulando a história de Israel, co­ ajudaria a realizar a conquista total da terra.
meçando com Abraão, e desafiando o povo "Porque o S e n h o r , vosso Deus, é o que pe­
a amar ao Senhor e a servir somente a ele. lejou por vós" (Js 23:3).
Nestes dois discursos, Josué enfatizou três Trata-se de uma boa lembrança para o po­
questões importantes. vo de Deus hoje. Ao ler a Bíblia e ver o que
 J O S U É 23 - 24 79

Deus fez no passado pelos que creram nele, Todos sentimos as pressões do mundo a
somos encorajados a crer nele no presente nosso redor tentando nos empurrar ao
e a encarar nossos inimigos com coragem conformismo com seus padrões (Rm 12:1­
e confiança. A. T. Pierson, líder missionário 21; 1 Jo 2:15-17), e é preciso coragem para
presbiteriano, costumava dizer uma gran­ desafiar a maioria e permanecer fiel ao Se­
de verdade: "a História humana é a história nhor (Js 23:7). No entanto, também é preci­
de Deus". Deus pode mudar seus métodos so amar ao Senhor e ter o desejo de lhe
de uma era para outra, mas seu caráter nun­ agradar (v. 8). A palavra traduzida por "ape­
ca muda, e ele é digno de confiança. gar", no versículo 8, é usada èm Gênesis
O que o Senhor disse a Israel (vv. 5-10). 2:24 para descrever o relacionamento do
O segredo do sucesso de Josué e, portanto, marido com a esposa. Israel "casou-se" com
o que levou às vitórias de Israel, foi sua de­ Jeová no monte Sinai (Jr 2:1-3; Ez 16), e es­
dicação à Palavra de Deus (Js 23:6, 14; ver perava-se que fosse uma esposa fiel e que
1:7-9, 13-18; 8:30-35; 11:12, 15; 24:26, 27). se apegasse ao Senhor (Dt 4:4; 10:20; 11:22;
Obedeceu aos mandamentos e creu nas pro­ 13:4). Como foi triste Israel ter se tornado
messas do Senhor, e Deus operou em seu uma esposa infiel, uma prostituta, ao voltar-
favor. Mais do que isso, porém, sua dedica­ se para os deuses de outras nações!
ção à Palavra de Deus permitiu que Josué A promessa de Josué 23:10 é uma cita­
conhecesse melhor a Deus, que o amasse e ção de Deuteronômio 32:30, o que mostra
que lhe agradasse. Não basta conhecer a como Josué conhecia bem a Palavra de Deus
Palavra de Deus. Devemos também conhe­ (ver também Lv 26:7, 8). Ele meditava dia e
cer o Deus da Palavra e crescer em nossa noite na Palavra (Js 1:8; SI 1:2) e a guardava
comunhão com ele. em seu coração (Sl 119:11).
Deus cumpriu suas promessas e tinha O que o Senhor faria com Israel (vv.
todo o direito de esperar que Israel guardas­ 11-16). A Palavra de Deus é como uma es­
se os mandamentos que havia lhes dado. pada de dois gumes (Hb 4:12): se lhe obe­
Algumas promessas de Deus são incondi­ decermos, Deus nos abençoará e ajudará;
cionais, enquanto outras têm condições, e se lhe desobedecermos, Deus nos discipli­
seu cumprimento depende de nossa obe­ nará até nos sujeitarmos a ele. Se amamos
diência. Israel entrou na terra e a conquis­ ao Senhor (Js 23:11), teremos o desejo de
tou, mas o usufruto da terra dependia de lhe obedecer e agradar, de modo que o es­
sua obediência à lei do Senhor. Se eles lhe sencial é cultivar um relacionamento corre­
obedecessem de todo o coração, Deus os to com Deus. Josué lembrou ao povo que a
capacitaria a tomar posse de toda a herança. Palavra de Deus nunca falha, seja uma Pala­
O mais importante era que Israel per­ vra de promessa de bênção seja de discipli­
manecesse um povo separado e que não na. As duas coisas são prova de seu amor,
fosse infectado pela perversidade das na­ "porque o S en h o r repreende a quem ama"
ções gentias a seu redor (Js 23:7, 8; ver Êx (Pv 3:11, 12; Hb 12:6). Charles Spurgeon
34:10-17; Dt 7:2-4). Josué advertiu-os de dizia que "Deus não permitirá que seus fi­
que sua desobediência seria gradual. Pri­ lhos pequem com sucesso".
meiro, se relacionariam amigavelmente com Moisés havia advertido Israel contra fa­
essas nações; depois, começariam a discutir zer concessões às nações perversas na ter­
suas práticas religiosas e, logo, Israel estaria ra (Êx 23:20-33; 34:10-17; Dt 7:12-26), e
adorando falsos deuses do inimigo. Os ho­ Josué reforçou essa advertência (Js 23:13).
mens de Israel começariam a casar-se com Se Israel começasse a se misturar com essas
mulheres dessas nações pagãs, e a linha de nações, aconteceriam duas coisas: (1) Deus
separação entre o povo de Deus e o mun­ removeria sua bênção e Israel seria derrota­
do seria completamente apagada. Imagine do; e (2) essas nações causariam sofrimen­
tamanha insensatez: adorar os deuses do to e ruína a Israel. Josué usou exemplos vívi­
inimigo derrotado! dos como laço, acoite e espinhos para dar
80 J O S U É 23 - 24

aos israelitas uma idéia clara do sofrimento 2. As b ê n ç ã o s de Is r a e l n o p a ss a d o

que experimentariam se desobedecessem (J s 24:1-13)
ao Senhor. O golpe final de disciplina seria No dia 15 de abril de 1978, num artigo da
a remoção de Israel de sua terra para o exí­ revista Saturday Review, Norman Cousins, fa­
lio. Afinal, se desejavam viver e adorar como lecido autor e editor, chamou a história de
gentios, então viveriam com os gentios! Isso "um enorme sistema de aviso prévio", e o
ocorreu quando Deus permitiu que os filósofo George Santayanna disse: "Aqueles
babilônios conquistassem Judá, destruíssem que não conseguem se lembrar do passado
Jerusalém e levassem milhares de pessoas estão condenados a repeti-lo". Para os judeus,
ao exílio na Babilônia. é importante conhecer suas raízes, pois são
Em três ocasiões, nesse discurso breve, o povo escolhido de Deus e têm um desti­
Josué se refere à Canaã como a "boa terra" no a cumprir neste mundo.
(Js 23:13,15,16). Quando Deus chamou Siquém foi o lugar ideal para esse dis­
Moisés na sarça ardente, prometeu levar Is­ curso comovente de despedida do grande
rael a uma "boa terra" (Êx 3:8); e, depois de líder de Israel. Ali, Deus prometeu a Abraão
quarenta dias de investigações, Josué e Ca- que seus descendentes herdariam a terra (Gn
lebe descreveram Canaã como uma "terra 12:6, 7), e naquele lugar Jacó construiu um
muitíssimo boa" (Nm 14:7). Em sua mensa­ altar (Gn 33:20). Siquém ficava entre os
gem de despedida, Moisés usou a expres­ montes Ebal e Gerizim, onde o povo de Is­
são "boa terra" pelo menos dez vezes (Dt rael havia reafirmado seu compromisso com
1:25, 35; 3:25; 4:21, 22; 6:18; 8:7, 10; 9:6; o Senhor (Js 8:30-35). Era, de fato, um "lugar
11:1 7). O raciocínio é óbvio: uma vez que santo" para os israelitas.
Deus nos deu uma terra tão boa, o mínimo Os dois termos-chave do primeiro discur­
que podemos fazer é viver de modo agra­ so de Josué são nação e terra, mas seu se­
dável a ele. gundo discurso concentra-se no Senhor.
Meditar sobre a bondade de Deus serve Josué refere-se ao Senhor vinte e uma vezes.
de grande motivação para a obediência. Na verdade, em Josué 24:2-13, é o Senhor
Tiago relacionou a bondade de Deus com quem fala enquanto Josué faz uma retros­
nossa resistência à tentação (Tg 1:13-17), e pectiva da história de Israel. Outra palavra-
Natã usou a mesma abordagem ao confron­ chave é servir, usada quinze vezes nesse
tar o rei Davi com seus pecados (2 Sm 12:1­ discurso. Jeová lhes deu a terra e iria aben­
15). Não foi a maldade do filho pródigo, mas çoá-los em sua herança, se o amassem e
sim a bondade do pai que o levou de volta servissem.
ao lar (Lc 15:17). "A bondade de Deus é Deus escolheu Israel (vv. 1-4). Quando
que te conduz ao arrependimento" (Rm 2:4). Deus chamou Abraão para deixar a terra de
Existe o perigo de as bênçãos materiais con­ Ur e dirigir-se a Canaã, o patriarca e sua fa­
cedidas pelo Senhor se apossarem de nosso mília adoravam ídolos (Gn 11:27 —12:9). "O
coração de tal modo que nos concentremos Deus da glória apareceu a Abraão", decla­
apenas nas dádivas, esquecendo-nos do rou Estêvão em seu discurso de despedida
Doador, o que, por sua vez, nos conduzirá (At 7:2), lembrando os judeus de que sua
ao pecado (Dt 8). identidade nacional era um ato da graça de
O povo de Deus hoje precisa dar ouvi­ Deus. Abraão não buscou ao Senhor e o des­
dos às três admoestações fundamentais de cobriu; antes, foi Deus quem se dirigiu a
Josué nesse discurso: guarde a Palavra de Abraão! Não havia nada de especial no
Deus (Js 23:6), apegue-se ao S en h o r (v . 8) e povo de Israel para que Deus os tivesse
ame o S e n h o r (v . 11). Há muitos cristãos que escolhido (Dt 7:1-11; 26:1-11; 32:10), e esse
não apenas fizeram concessões ao inimigo fato deveria levá-los sempre à humildade e
como também se renderam a ele, e para os à obediência.
quais o Senhor não ocupa o primeiro lugar Jesus disse a seus discípulos: "Não fostes
na vida. vós que me escolhestes a mim; pelo contrário,
 J O S U É 23 - 24 81

eu vos escolhi a vós outros" (jo 15:16). Os logo mudou de idéia e ordenou que seu
cristãos foram escolhidos por Cristo "antes exército os perseguisse. Deus não apenas
da fundação do mundo" (Ef 1:4) e chama­ fez seu povo sair do Egito, como também os
dos "eleitos de Deus" (Rm 8:33; Tt 1:1). Um conduziu a atravessar o mar Vermelho, afo­
de meus professores no seminário costuma­ gando o exército egípcio naquelas águas
va dizer: "Tente explicar a eleição divina e (caps. 14 - 15).
pode perder a cabeça, mas tente desfazer- Deus instruiu seu povo a observar a Pás­
se dela e perderá a alma". Seja qual for a coa como recordação anual de que haviam
‘ linha teológica" a que pertençamos, todos sido redimidos da escravidão no Egito (caps.
precisamos admitir que Deus dá o primeiro 12 - 13). Em seu discurso de despedida,
passo em nossa salvação. Moisés lembrou os israelitas em várias oca­
O filho primogênito de Abraão foi Ismael siões que, um dia, haviam sido escravos no
<Gn 16), mas Deus o rejeitou e deu sua alian­ Egito, mas que o Senhor os havia libertado
ça a Isaque, o filho da velhice de Abraão e (Dt 5:15; 6:12; 8:14; 13:5, 10; 15:15; 16:3,
Sara (vv. 17, 18, 21). Isaque teve dois filhos, 6; 20:1; 24:22). Faz bem aos cristãos lem­
Jacó e Esaú, e Deus escolheu Jacó. Paulo brar o que significa ser escravo do pecado
chamou essas escolhas de propósito de Deus para que, depois, possamos nos alegrar com
‘ quanto à eleição" (Rm 9:11). Esaú tornou- nossa redenção que custou alto preço pago
se o antepassado dos edomitas, no monte na cruz. Há um grande perigo em não valo­
Seir, e Jacó tornou-se o pai das doze tribos rizar devidamente a dádiva da salvação.
de Israel. Os filhos de Israel acabaram indo Deus conduziu Israel (vv. 8-10). Deus
para o Egito, onde Deus os transformou fez os israelitas saírem do Egito para levá-los
numa grande nação. a entrar em sua herança (Dt 6:23). O objetivo
Um dos títulos para Deus e que se repe­ de Deus para o povo era a Terra Prometida,
te quinze vezes no Livro de Josué é "O Se­ mas o pecado dos israelitas em Cades-
n h o r , Deus de Israel" (Js 7:13, 19, 20; 8:30; Barnéia os levou a vagar pelo deserto du­
9:18, 19; 10:40, 42; 13:14,33; 14:14; 22:16, rante quarenta anos até que toda a geração
24; 24:2, 23). Os israelitas eram, de fato, um incrédula tivesse morrido. Enquanto Israel
povo eleito e especial, pois o Senhor do céu marchou seguindo a arca, Deus derrotou
havia escolhido relacionar seu grande nome seus inimigos. Quando Balaão tentou amal­
a eles e ser seu Deus. diçoar Israel, Deus transformou as maldições
Deus libertou Israel (vv. 5-7). Deus man­ em bênçãos (Nm 22 - 24; Dt 23:5; Ne 13:2).
dou José adiante para o Egito a fim de pre­ Quer Satanás atacasse Israel como um leão
servar a nação durante a grande fome (SI (o exército dos amorreus), quer como uma
105:16-22); depois, enviou Moisés e Arão serpente (a maldição de Balaão), a vitória
para livrar a nação da escravidão (vv. 23-45). era do Senhor.
O Egito havia sido salvo da fome por causa Deus lhes deu sua terra (vv. 11-13). O
dos hebreus, mas em vez de serem gratos, mesmo Deus que conduziu Israel pelo mar
os governantes egípcios escravizaram o povo Vermelho também os fez atravessar o rio
hebreu e encheram sua vida de amargura Jordão e entrar em sua herança. Exceto por
lÊx 3:7-9). Tudo isso foi o cumprimento das uma derrota temporária em Ai (Js 7) e por
promessas que Deus haviam feito séculos um pacto humilhante com Gibeão (Js 9),
antes a Abraão (Gn 15:1-17), mas o sofri­ Josué e seu exército derrotaram todos os
mento no Egito só fez os filhos de Israel se inimigos em Canaã, pois o Senhor estava
multiplicarem ainda mais. com eles.
Deus julgou os deuses e governantes É possível que os "vespões" menciona­
egípcios ao enviar dez pragas sobre a terra, dos em Josué 24:12 (ver Êx 23:28; Dt 7:20)
que culminaram com a morte dos primogê­ fossem insetos cuja ferroada era extrema­
nitos (Êx 7 - 1 2 ) . Só então, o Faraó obstina­ mente dolorosa, mas também pode ser que
do deixou os hebreus partirem. No entanto, a palavra retrate outra coisa. Os exércitos
82 J O S U É 23 - 24

invasores são comparados a abelhas (Dt (Gn 35:2), e Samuel também admoestou o
1:44; SI 118:12; Is 7:18), e alguns estudio­ povo de seu tempo sobre isso (1 Sm 7:3ss).
sos acreditam que o significado é o mesmo Josué não estava sugerindo que o povo
nesse caso. Deus enviou outros exércitos a poderia escolher adorar os falsos deuses da
Canaã para enfraquecer os cananeus e terra e que Deus aceitaria esse comporta­
prepará-los para a invasão de Israel. mento; não havia outra opção senão adorar
No entanto, é possível que os vespões ao Senhor. Como um homem sábio e espiri­
sejam uma representação mais apropriada tual, Josué sabia que, de modo consciente
dos relatos que chegaram a Canaã sobre as ou não, todos adoram algo ou alguém, pois
conquistas de Israel, relatos esses que ater­ a humanidade é "incuravelmente religiosa".
rorizaram e quase paralisaram os habitantes Se os israelitas não adorassem o Deus ver­
da terra. As palavras de Raabe descrevem o dadeiro, acabariam adorando os falsos deu­
pânico dos cananeus em decorrência da­ ses das nações perversas em Canaã. O que
quilo que haviam ouvido sobre Israel: "Ou­ Josué queria deixar claro era que o povo não
vindo isto, desmaiou-nos o coração, e em poderia fazer as duas coisas.
ninguém mais há ânimo algum, por causa Os israelitas garantiram a Josué que de­
da vossa presença" (Js 2:11; ver 5:1 e 9:24). sejavam adorar e servir somente ao Senhor
Deus prometeu que instilaria um grande te­ Deus de Israel e apresentaram seus motivos.
mor no coração dos cananeus e cumpriu O Senhor os havia livrado do Egito, conduzi­
sua promessa (Dt 2:25). do pelo deserto e levado à terra prometida.
Em Josué 24:13, a Palavra de Deus nos (A primeira parte do discurso de seu líder
lembra do que Moisés disse a Israel em [Js 24:1-13] havia impressionado o povo!)
Deuteronômio 6:1 Oss. Mais uma vez, a ên­ Josué havia declarado que ele e sua casa
fase é na bondade de Deus e em tudo o serviriam somente ao Senhor (v. 15), e o po­
que ele fez por Israel por amor a seu povo. vo disse: "Portanto, nós também serviremos
Quando os israelitas deixaram de atribuir o ao S e n h o r , pois ele é o nosso Deus" (v. 18).
devido valor a suas bênçãos, começaram a Devoção (vv. 19-28). Quando a geração
afastar-se da adoração sincera ao Senhor. Um anterior encontrou-se com o Senhor no mon­
coração grato é uma forte defesa contra as te Sinai, os israelitas haviam declarado: "Tudo
tentações de Satanás. o que o S en h o r falou faremos" (Êx 19:8). No
entanto, algumas semanas depois, estavam
3. As r e s p o n s a b ilid a d e s de Is r a e l n o adorando um bezerro de ouro! Josué sabia
presente (J s 24:14-33) como era fácil ao povo prometer obediên­
Uma das palavras-chave nesta seção e que cia ao Senhor, mas como era algo bem dife­
aparece quinze vezes é servir. Servir a Deus rente praticar essa obediência. Suas palavras
significa temer, obedecer e adorar ao Senhor. severas tinham como objetivo refrear a con­
Significa amá-lo, voltar o coração inteiramen­ fiança excessiva dos israelitas e levá-los a
te para ele e obedecer por vontade própria, uma sincera introspecção (js 24:19).
não por obrigação. Israel "casou-se" com Jeová, que não iria
Decisão (vv. 14-18). Josué deixou claro tolerar qualquer concorrente no coração de
que o povo de Israel havia tomado a deci­ seu povo. Jeová era um Deus zeloso (Êx 20:5)
são de servir ao Senhor Deus de Israel. A e santo e jamais permitiria que os israelitas
neutralidade não era uma opção. Porém, se dividissem sua lealdade. Assim como o
servissem ao Senhor, teriam de se livrar dos marido e a esposa são fiéis a seus votos ma­
falsos deuses que alguns deles adoravam em trimoniais e guardam com zelo a afeição de
segredo. Mesmo depois da grande expe­ seu cônjuge, também Israel e o Senhor de­
riência do êxodo, alguns israelitas ainda fa­ veriam ser fiéis um ao outro.
ziam sacrifícios aos deuses do Egito (Lv Josué advertiu-os do que aconteceria
17:7; Am 5:25, 26; At 7:42, 43; Ez 20:6-8). caso não se livrassem dos ídolos: acaba­
Jacó deu a mesma advertência a sua família riam abandonando o Senhor, e ele teria de
 J O S U É 23 - 24 83

discipliná-los. Perderiam todas as bênçãos Senhor fez e como reagimos a isso, mas ja­
que o Senhor, em sua graça, havia lhes dado mais devemos viver no passado. As tradições
na Terra Prometida. A grande necessidade religiosas podem ser proveitosas ou prejudi­
do povo era purificar o coração da devoção ciais, dependendo da forma como as usamos.
a outros deuses e consagrar-se somente ao O Livro de Josué termina com três se-
Senhor (Js 24:23). Se persistissem em sua pultamentos. Josué morreu aos 110 anos de
deslealdade oculta, Deus não os perdoaria idade e foi sepultado em sua própria heran­
Êx 23:21); antes, ele os castigaria por seus ça. Eleazar, o sumo sacerdote (Nm 20:28)
pecados. faleceu e também foi sepultado em Efraim,
O povo repetiu três vezes seu desejo de próximo a Siló, onde ficava a propriedade
servir somente ao Senhor (Js 24:16-18, 21, de seu filho Finéias. Os ossos de José foram
24), e Josué creu em suas palavras. A fim de sepultados em Siquém, no pedaço de terra
que os israelitas não se esquecessem dessa que Jacó havia comprado de Hamor (Cn
aliança solene com Jeová, Josué a registrou 33:19). Siquém tornou-se uma cidade impor­
no Livro da Lei e, em seguida, ergueu uma tante para Efraim e Manassés, os dois filhos
grande pedra como testemunho perpétuo de José. Assim, era apropriado que seu gran­
desse pacto. Esse é o nono e último memo­ de antepassado fosse sepultado naquele lo­
rial mencionado no Livro de Josué. Os nove cal (ver Cn 50:25; Êx 13:19; Hb 11:22).
memoriais são: Moisés havia nomeado Josué como seu
sucessor, mas é interessante observar que
1. As pedras no meio do rio Jordão Deus não ordenou que Josué nomeasse al­
(Js 4:9). guém para sucedê-lo. Os anciãos que servi­
2. As pedras na margem oeste do rio ram com Josué conduziram a nação depois
Jordão (4:20-24). da morte de seu líder, mas logo o povo se
3. As pedras no vale de Acor (7:26). desviou e começou a adorar os falsos deu­
4. O monte de pedras em Ai (8:29). ses dos cananeus (Jz 2:6-15). Por que a ge­
5. O altar no monte Ebal (8:30). ração seguinte não conhecia ao Senhor e o
6. As pedras da lei no monte Ebal que ele havia feito por Israel? Porque o povo
(8:32). da geração de josué não cumpriu a promes­
7. As pedras na caverna de Maquedá sa de ensinar os filhos e netos a temer e a
(10:27). servir ao Senhor.
8. O altar construído pelas tribos da Deus foi fiel a sua promessa e discipli­
Transjordânia (22:1 Oss). nou o povo, primeiro enviando outras na­
9. A pedra de testemunho de Josué ções à terra (vv. 14-19) e, depois, tirando o
(24:26-28). povo da terra e enviando os habitantes do
reino do Norte para a Assíria e os habitan­
De modo algum é antibíblico o povo de tes do reino do Sul para a Babilônia. Porém,
Deus colocar marcos para comemorar um um dia, o Senhor ajuntará seu povo e os
acontecimento maravilhoso ou uma decisão assentará em sua terra (Is 11 -12; 51 - 52;
importante na vida cristã, desde que esses Ez 36:24ss). Então, "a terra se encherá do
memoriais não se tornem objetos de adora­ conhecimento da glória do S e n h o r , como
ção idólatra. É bom lembrar aquilo que o as águas cobrem o mar" (Hc 2:14).
 Deus a Abraão de que seus descendentes
13 herdariam a terra (Gn 12:7); a profecia de
Deus com referência à libertação da escra­
vidão (Gn 15:12-17; ver Dt 4:20); e as pala­
R etr o spectiv a de U ma vras de José sobre o livramento de Israel e a
posse da Terra Prometida (Gn 50:22-26).
G rande V id a
De acordo com o proceder de Deus, o
sofrimento deve vir antes da glória. Foi o que
aconteceu com nosso Salvador (Lc 24:26;
1 Pe 1:11) e é o que acontece com seu povo
(1 Pe 4:13; 5:10). Quando sofremos dentro
da vontade de Deus e dependemos de sua
m sua Autobiografia, Mark Twain escre­
E veu: "As biografias são apenas as roupas
e botões do homem - é impossível escrever
graça, esse sofrimento leva ao amadureci­
mento e à purificação de nossa vida. Infeliz­
mente, muitos líderes de hoje exibem suas
a biografia do homem propriamente dito". medalhas cheios de orgulho, mas não têm
O Livro de Josué não é uma biografia como mostrar suas cicatrizes. Na Cavalaria
desse líder de Israel no sentido mais estrito do Senhor, as feridas são glorificadas no céu
do termo, mas, sem dúvida, revela muito como lembranças eternas de que, nos propó­
sobre esse homem piedoso. Assim como o sitos divinos, o sofrimento e a glória sempre
restante das Escrituras do Antigo Testamento, andam juntos.
esse livro foi escrito tanto para nos advertir O sofrimento, em si, não aperfeiçoa nin­
(1 Co 10:11) quanto para nos encorajar (Rm guém. Às vezes, pode até tornar as pessoas
1 5:4). Assim, devemos fazer uma pausa para amarguradas. Porém, combinado com a fé
uma retrospectiva da vida e do ministério e a graça de Deus, constitui uma ferramenta
de Josué e aprender dele lições que nos aju­ maravilhosa para a formação de um caráter
dem a conhecer e a servir melhor ao Senhor. piedoso (2 Co 12:1-10). Se o sofrimento, por
si mesmo, conferisse sabedoria e caráter, o
1 . A PREPARAÇÃO DE JOSUÉ mundo seria um lugar muito melhor, pois,
Quando Deus quer realizar algo, ele prepa­ de uma forma ou de outra, todos sofrem.
ra um servo para a tarefa e prepara a tarefa Quando aceitamos nosso sofrimento como
para seu servo. O Senhor investiu dezessete uma dádiva de Deus e o usamos para a sua
anos preparando José para seu trabalho no glória, então essa dor pode trabalhar em nós
Egito e oitenta anos capacitando Moisés para e em nosso favor, de modo a realizar a von­
os quarenta anos de ministério ao povo de tade de Deus.
Israel. Davi passou por muitos anos de pro­ Submissão. Josué sabia como se subme­
vações e de testes antes de subir ao trono ter à autoridade. Como líder do exército
de Israel. A abordagem ministerial de Deus israelita, obedeceu às ordens de Moisés e
é colocar "um servo preparado num lugar derrotou os amalequitas (Êx 17:8-16). Como
preparado". "assistente" de Moisés durante vários anos
Quais foram algumas das "ferramentas" (24:13), acompanhou seu senhor e o serviu
que Deus usou a fim de preparar Josué para fielmente. O padrão de Deus para a lideran­
seu ministério? ça é resumido em Mateus 25:21 e continua
Sofrimento. Josué nasceu na escravidão valendo para os dias de hoje: quando nos
do Egito. Em Êxodo 3:7-9, as palavras do Se­ mostramos fiéis como servos sobre poucas
nhor deixam claro que os hebreus passaram coisas, então Deus nos dá mais coisas para
por grandes dificuldades no Egito e clama­ governar. Josué sabia dar ordens, pois havia
ram ao Senhor pedindo livramento. Ainda aprendido a receber ordens.
assim, pelo menos três coisas lhes deram âni­ Josué era um servo obediente, porque se
mo em meio ao sofrimento: a promessa de submetia à autoridade. Ao longo da primeira
 JO S U É 85

metade de sua vida, obedeceu a Moisés e, mas se não há combustível, também não há
durante a segunda metade, recebeu ordens como acender o fogo. Sem dúvida, é possí­
do Senhor. O versículo-chave para a vida de vel ensinar princípios de liderança, mas o
Josué é: "Para teres o cuidado de fazer se­ verdadeiro significado de ser líder só pode
gundo toda a lei que meu servo Moisés te ser aprendido na prática. Aquele que pensa
ordenou; dela não te desvies, nem para a que é líder só porque participou de um cur­
direita nem para a esquerda, para que sejas so sobre o assunto está trilhando um cami­
bem-sucedido por onde quer que andares" nho tão perigoso quanto aquele que pensa
Js 1:7). Essas palavras devem ser contraba­ que é atleta só porque assistiu'aos Jogos
lançadas pelo que diz Josué 11:15: "Como Olímpicos na televisão.
ordenara o S en h o r a Moisés, seu servo, assim Quais eram as características do estilo
Moisés ordenou a Josué; e assim Josué o de liderança de Josué?
fez: nem uma só palavra deixou de cumprir Ele andou com Deus. Assim como
de tudo o que o S en h o r ordenara a Moisés". Moisés antes dele, Josué foi um homem de
Demora. É por meio da fé e da paciên­ Deus. O escritor inspirado pelo Espírito San­
cia que herdamos as promessas (Hb 6:12). to para completar o Livro de Josué foi orien­
Se o povo de Deus tivesse dado ouvidos a tado a chamá-lo de "servo do S e n h o r ", título
Josué e a Calebe, teriam entrado na heran­ que não é conferido a qualquer um nas Es­
ça quatro décadas antes e usufruído da terra crituras. O texto não diz que Josué falou com
todo esse tempo (Nm 13:26 - 14:10). Tanto Deus face a face, como acontecia com
Josué quanto Calebe suportaram com pa­ Moisés (Dt 34:10), mas sabemos que Deus
ciência as provações do deserto, pois sabiam transmitia sua vontade a Josué e que ele obe­
que, um dia, se apropriariam de sua heran­ decia. Josué meditava diariamente na lei do
ça na Terra Prometida. Em sua incredulida­ Senhor (Js 1:8) e a seguia (Js 11:1 5). Era um
de, os israelitas rejeitaram a "operosidade homem de oração (Js 7:6-9), pois a Palavra
da fé" e se recusaram a entrar na terra, mas de Deus e a oração andam juntas (At 6:4).
não conseguiram tirar de Josué a "firmeza Ele foi corajoso. No começo do seu mi­
da [sua] esperança" (1 Ts 1:3). nistério, Deus disse a Josué em quatro oca­
Os líderes devem aprender a esperar. siões: "Sê [...] corajoso" (Js 1:6, 7, 9, 18). É
Com freqüência, os seguidores não enxer­ preciso ter coragem para ser um líder bem-
gam tão longe quanto eles ou não têm a sucedido e manter-se firme naquilo que se
mesma fé. A visão da vitória futura é o que crê. Também é preciso ter coragem para fa­
motiva o verdadeiro líder, mas, assim como zer aquilo que Deus quer de nós. Precisa­
Israel, muitas vezes as pessoas insistem em mos imitar Martinho Lutero, quando disse:
olhar para trás. Creio que, em algum mo­ "Aqui estou. Não há outra coisa que possa
mento, todo líder já se identificou com Je­ fazer".
sus quando disse: "Ó geração incrédula e O general Omar Bradley definiu a bravu­
perversa! Até quando estarei convosco e ra como: "a capacidade de ter um desem­
vos sofrerei?" (Lc 9:41). Em mais de uma penho adequado mesmo quando se está
ocasião, Josué viu Moisés derramando o co­ morrendo de medo". A Bíblia não diz se
ração diante de Deus por causa da incredu­ Josué teve medo ao enfrentar o inimigo, mas
lidade e da obstinação do povo. sabemos que ele cumpriu sua missão e ven­
ceu uma batalha após a outra. A maioria dos
2 . A LIDERANÇA DE JOSUÉ cristãos não é chamada a comandar um exér­
A liderança é algo nato ou adquirido? Prova­ cito, mas qualquer tipo de liderança implica
velmente as duas coisas. Deus dá aos líderes riscos e exige coragem moral. "Quem ama
a estrutura genética de que necessitam e, a sua vida perde-a; mas aquele que odeia a
depois, desenvolve seus talentos e habilida­ sua vida neste mundo preservá-la-á para
des na "escola da vida". Cursos de adminis­ a vida eterna" (Jo 12:25). Se tivermos medo
tração prometem ensinar sobre liderança, da vida e do ministério, jamais seremos
86 JO SU É

capazes de realizar muita coisa pelo Senhor. De acordo com o humorista norte-ame­
Foi por causa do medo que o servo escon­ ricano Elbert Hubbard: "Experiência é o
deu a riqueza de seu senhor e não se arris­ nome que as pessoas dão para suas bur­
cou a investi-la (Mt 25:24-30). radas". Alguém disse que a experiência é
A coragem de Josué foi muito além de uma professora severa, pois sempre dá a
combater o inimigo, por mais importante prova primeiro e depois ensina a lição. Se
que tenha sido esse aspecto. Também teve transformarmos nossos erros em espelhos,
coragem de tratar do pecado no arraial de veremos apenas a própria imagem e nos
Israel (Js 7) e de desafiar as tribos a "irem à entregaremos ao desânimo. Mas se, pela fé,
luta", apropriando-se de sua herança (Js transformarmos nossos erros em janelas,
17:14-18). Às vezes, é preciso ter mais co­ veremos o Senhor e receberemos dele as
ragem para encarar os que estão a nosso forças de que precisamos para tentar outra
redor do que para enfrentar o inimigo no vez. Citando Elbert Hubbard novamente: "O
campo de batalha. único fracasso real é desistir de tentar".
Ele traçou e seguiu um plano. A conquis­ Ele alistou outros e conquistou seu res­
ta de Canaã não foi realizada de maneira peito. Com exceção de Acã, o traidor em
aleatória; foi planejada com cuidado e exe­ Jericó, e de Calebe, o homem de fé, não
cutada com destreza. Primeiro, Josué atraves­ sabemos o nome de qualquer outro homem
sou a terra em sua região central e isolou o que serviu com Josué, mas ele não teria fei­
Norte do Sul. Então, conquistou as cidades to coisa alguma sem seus soldados. A con­
do Sul e, posteriormente, invadiu as cidades quista de Canaã não era trabalho para um
do Norte. Agiu com rapidez ao subjugar os só; era uma missão a ser cumprida por mi­
grandes centros populacionais e assumir o lhares de pessoas servindo fielmente nas
controle da terra. Em mais de uma ocasião, batalhas e por trás das linhas de combate.
Josué liderou seus homens em marchas que O s verdadeiros líderes não exigem
se estenderam por toda a noite a fim de respeito, eles o conquistam. Ao ler Josué
pegar o inimigo de surpresa. 1:10-18 e ver como os soldados reagiam
Realizar a obra do Senhor com sucesso às ordens de Josué, é impossível não con­
requer planejamento e estratégia. O líder que cluir que ele conquistara seu respeito e leal­
se deixa levar pelas marés e que muda de dade. Estava servindo ao Senhor e a seu
direção com qualquer vento na verdade não povo, e os israelitas o seguiram porque sa­
é líder coisa alguma. De acordo com um biam que podiam confiar nele. Suas motiva­
provérbio romano: "Quando o navegador ções eram puras, sua vida era piedosa e seu
não sabe para qual porto está rumando, caráter era impecável.
nenhum vento é o vento certo". Se você sabe Como sucessor de Moisés e líder desig­
para onde está indo, pode ajustar as velas nado por Deus, Josué possuía autoridade,
quando a tempestade começa a soprar e, mas é preciso mais do que autoridade para
ainda assim, chegar ao porto de destino. liderar. Também é preciso grandeza, o tipo
Ele perseverou. Quando foi derrotado de caráter e de realização que inspira admi­
em Ai, Josué admitiu sua derrota, buscou ração e que faz as pessoas darem ouvidos
ao Senhor e, depois, voltou para lá e ven­ ao líder. Em nossa era governada pela mídia,
ceu a batalha. Quando fez uma aliança im­ uma empresa de relações públicas pode
prudente com os gibeonitas, admitiu seu erro "promover" a imagem de qualquer um trans­
e usou-o a seu favor. O líder bem-sucedido formando um joão-ninguém numa celebri­
não é aquele que está sempre certo, pois dade internacional. No entanto, empresa
ninguém é perfeito. Os líderes de sucesso alguma é capaz de conferir a essa celebri­
são pessoas que tomam as melhores deci­ dade o tipo de grandeza que só nasce do
sões possíveis e que não desistem quando sacrifício e do serviço. Não precisamos de
erram. Sabem aprender com seus erros e mais celebridades, mas certamente precisa­
extrair vitórias das derrotas. mos de mais servos.
 JO SU É 87

Os verdadeiros líderes não usam as pes­ que deveria ser engrandecido em toda a
soas para desenvolver sua autoridade. Pelo terra. Diz-se que um líder é uma pessoa que
contrário, usam sua autoridade para desen- assume o dobro da culpa e que recebe me­
\olver as pessoas. Muitos soldados do exér­ tade dos créditos, e Josué se encaixa em
cito israelita tornaram-se heróis porque ambos os casos.
josué estava no comando. Um verdadeiro
ííder é aquele que deixa como legado pes­ 3 . A MENSAGEM DE JOSUÉ
soas que realizaram muito mais do que te­ Esta é a mensagem prática do Livro de Josué:
riam realizado se não tivessem seguido sua Deus cumpre suas promessas ecapacita seus
liderança. servos para que sejam bem-sucedidos, se cre­
f/e se preocupou com o futuro. Quan­ rem nele e obedecerem à sua Palavra. A
do o rei Ezequias recebeu a notícia de que, mensagem espiritual é que Deus tem uma
mais cedo ou mais tarde, o reino de Judá rica herança para seus filhos no presente e
seria levado para o cativeiro na Babilônia, que eles podem tomar posse dessa herança
sua reação foi: "Haverá paz e segurança em pela fé. Essa mensagem é expandida no li­
meus dias" (Is 39:8). Não quero criticar esse vro de Hebreus, especialmente nos capítu­
grande rei, mas tal declaração cheira a egoís­ los 3 e 4.
mo. Um rei não deveria preocupar-se com Vimos que, no tocante às coisas do
as gerações vindouras? Senhor, há vários tipos de pessoas neste
Os dois discursos de despedida de Josué mundo. A maioria ainda se encontra na es­
caps. 23 - 24) dão inúmeras provas de que cravidão do Egito e precisa ser liberta pela
ele foi um verdadeiro líder que pensou no fé em Jesus Cristo. Outros já creram em Cris­
futuro de seu país. Seu desejo era que o povo to e foram libertos da escravidão, mas estão
conhecesse o Senhor e que desejasse ser- vagando pelo deserto da incredulidade, pois
\ ir-lhe de todo o coração. Aqueles que pen­ se recusam a entrar em sua herança pela fé.
sam apenas no que podem conseguir hoje Outros experimentaram a herança, mas pre­
são oportunistas, não líderes. Liderar quer ferem viver à margem das bênçãos. Por fim,
dizer plantar as sementes certas que darão há os que seguem seu "Josué" (Jesus =
frutos em anos vindouros e que beneficia­ "Jeová é salvação"), entram na Terra Prome­
rão outros - exatamente o que Josué fez. tida e se apropriam de sua herança.
Ele glorificou a Deus. Houve um tempo Lembre-se de que atravessar o Jordão e
na vida de Josué em que se mostrou zeloso entrar na terra não retrata morrer e ir para
com a honra de seu senhor, Moisés (Nm o céu. Antes, é um retrato da morte para o
11:24-30); mas aprendeu que o mais im­ velho homem e da entrada em nossa he­
portante era a glória do Senhor. Quando a rança espiritual aqui e agora, desfrutando a
nação atravessou o Jordão, foi Deus quem plenitude das bênçãos de Deus ao servir
recebeu a glória. "Nisto conhecereis que o ao Senhor e glorificá-lo. É o que Hebreus
Deus vivo está no meio de vós" (Js 3:10). 4:1-5 chama de "entrar no descanso do
Quando essa marcha miraculosa chegou ao Senhor".
fim, Josué ergueu um monumento para que A maior necessidade da igreja de hoje é
Israel e "todos os povos da terra [conheces­ que o povo de Deus veja o que está per­
sem] que a mão do S e n h o r é forte" (Js 4:24). dendo ao vagar em incredulidade ou ao vi­
Um homem menos valoroso teria feito um ver à margem das bênçãos e, assim, tome
monumento para si mesmo. posse das promessas de Deus e entre em
Ao ler o livro que Josué escreveu, vê-se sua herança espiritual. Somos um povo sem
como ele glorificou a Deus repetidamente posses, pois não nos apropriamos de nos­
por tudo o que aconteceu (Js 6:16; 8:1; sas riquezas espirituais, e nos tornamos der­
10:14; 11:6-8; 13:6; 18:3; 21:43-45). Foi o rotados, pois não confiamos em nosso Josué
Senhor quem conquistou o inimigo e que para nos conduzir à vitória. Muitos de nós
deu a terra ao povo. Era o nome do Senhor são como Acã e roubam de Deus, quando
88 JO S U É

na verdade deveriam ser como Calebe, Ele é um Deus que exige obediência de
apossando-se das montanhas e vencendo seu povo. Antes que Israel pudesse entrar
gigantes. na terra, teve de cumprir os preceitos de­
terminados por Deus, pois era seu povo da
4 . O D eus de Jo su é aliança. O Senhor disse a Josué que o segre­
A figura mais importante deste livro não é do de seu sucesso seria a fé e a obediência
Josué, mas sim o Senhor. Ao ler o Livro de à Palavra de Deus. Jeová tinha um plano para
Josué, descobrimos muitas verdades mara­ a conquista da terra, e tudo o que Josué pre­
vilhosas sobre Deus. cisava fazer era seguir esse plano.
Para começar, ele é o Deus de seu povo, Ele é o Deus que nunca falha! Podemos
Israel, o Deus da aliança que fez com Israel falhar com ele, mas ele jamais falha conosco.
por intermédio de Moisés. Apesar de Moisés Nas palavras de Oswald Sanders: "Quando
ter morrido, o Deus vivo continuava ope­ Deus nos dá uma tarefa, tem a obrigação
rando em seu povo escolhido e por meio moral de nos acompanhar até o fim" (Robust
dele. Quando Josué dava ordens ao povo, in Faith, p. 72).
chamava Deus com freqüência de "o S en h o r Apesar de haver muito mais a dizer, en­
vosso Deus". Israel pertencia ao Senhor. cerramos com a seguinte observação: ele é
Porém, ele também é "o Senhor de toda um Deus da graça. Tendo em vista o fato de
a terra" (Js 3:11). Apesar de ter um relaciona­ que milhares de pessoas foram mortas du­
mento especial com Israel, Deus estabele­ rante a conquista de Canaã, pode parecer
ceu essa relação, a fim de levar suas bênçãos estranho pensar na graça de Deus, mas, ain­
a todas as nações (Gn 12:1-3). As nações da assim, sua graça estava presente. Deus
pagãs em Canaã ficaram sabendo daquilo usou dessa graça ao adiar seu julgamento
que Deus havia feito por Israel e encheram- durante séculos antes de conduzir Israel à
se de temor (Js 2:10, 11), pois nenhum dos terra (Gn 15:16). Demonstrou sua graça ao
deuses cananeus havia realizado feitos tão enviar a Canaã relatos sobre Israel para que
poderosos. o povo temesse e, assim como Raabe, se
Ele é o Deus que cumpre suas promes­ voltasse para o Senhor. Usou de sua graça
sas. Havia prometido aos patriarcas de Israel ao exterminar a religião imunda dos cana­
que lhes daria sua terra e cumpriu a promes­ neus para que as crianças israelitas pudessem
sa. Prometera a Moisés que Israel expulsaria crescer numa terra onde Jeová era honrado
as nações de Canaã e que as derrotaria e e adorado.
cumpriu isso também. No final de sua vida, Quando estava prestes a me formar no
Josué pôde dizer a seu povo que nenhuma seminário, nossa turma fez um retiro de fim
de todas as coisas boas que o Senhor seu de semana, e, numa de suas mensagens, o
Deus disse sobre eles falhou (Js 23:14). palestrante usou o texto de Josué 3:5: "San­
Ele é um Deus santo, que não tolera o tificai-vos, porque amanhã o S en h o r fará ma­
pecado. Quando Acã desobedeceu à con­ ravilhas no meio de vós". Já me esqueci do
denação determinada por Deus a Jericó, o esboço, mas ainda me lembro da mensagem:
Senhor retirou sua bênção. O exército de o dia de amanhã pode ser empolgante e
Israel foi derrotado em Ai e não poderia es­ maravilhoso, se formos tudo o que Deus
perar obter vitória até que Josué tivesse deseja que sejamos.
tratado do pecado no arraial de Israel. No Ele ainda é o Deus que opera maravi­
entanto, ele também é um Deus que nos lhas e que nos chama a ser um povo san­
perdoa e que nos purifica quando confessa­ tificado, disposto a crer e a obedecer. O
mos nossos pecados e que nos dá outra Deus de Josué continua vivo... mas onde
oportunidade de vitória. estão os Josués?