Sermão 2020

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sermão 2020

DEUS E A
VIOLÊNCIA
Augusto Cesar Maia
Preparado pelo Departamento do Ministério da Mulher
Divisão Sul-Americana
Direitos de tradução e publicação reservados à
CONFEDERAÇÃO DAS UNIÕES BRASILEIRAS DA IASD
Setor de Grandes Áreas Sul, Quadra 611,
Conjunto D, Parte C, Asa Sul, DF
CEP: 70200-710 - Brasília, DF
TEL: (61) 3701-1818
www.portaladventista.org

Autora: Augusto Cesar Maia


Revisão: Depto. de Tradução - Divisão Sul-Americana
Coordenação: Ministério da Mulher da Divisão Sul-Americana
Diagramação e capa: Marcos Aurélio Gularte de Castro
Impressão e acabamento: Casa Publicadora Brasileira

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DEUS E A VIOLÊNCIA
INTRODUÇÃO

“Então, disse Deus a Noé: Resolvi dar cabo de toda


carne, porque a terra está cheia da violência dos ho-
mens; eis que os farei perecer juntamente com a terra”
(Gênesis 6:13).

A violência tem estado presente em diferentes contex-


tos socioculturais ao longo da história da humanidade. E
em nosso mundo pós-moderno, vivemos momentos turbu-
lentos, ou melhor, em um estado de violência latente.
Em todo o mundo, mais de 50 mil mulheres são assas-
sinadas anualmente por companheiros atuais ou passa-
dos, por pais, irmãos, outras mulheres, e até irmãs e outros
parentes, simplesmente por causa do papel que exercem
em sua condição de mulher.
No Código Penal brasileiro, o feminicídio, crime consi-
derado hediondo, é o assassinato de uma mulher cometi-
do por razões em torno da condição de ser uma pessoa do
sexo feminino. Esse tipo de crime tem como origem a vio-
lência doméstica e familiar e/ou o menosprezo ou discrimi-
nação à condição de mulher.
No Brasil, o feminicídio ocupa o quinto lugar no ranking
mundial de mortes contra mulheres e violência domésti-
ca. As pesquisas apontam também que o aprendizado da
violência está no cerne do comportamento masculino vio-
lento: 70% dos homens que praticam atos violentos pre-
senciaram violência na infância. E esse tipo de convivência
faz com que incorporem um padrão de violência nas suas
relações afetivas.
Outras pesquisas mostram que na maioria das vezes

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o perfil do agressor é de pessoas “normais”, cidadãos “de
bem”, isto é, são brancos, negros, jovens, adultos, idosos,
ricos, pobres, desempregados, assalariados, pais de família.
Apesar de não haver um perfil único que caracterize o
agressor, algumas das características mais descritas na li-
teratura sobre esses homens são a inflexibilidade cognitiva,
a presença de pensamentos distorcidos, a impulsividade e
o fato de não assumir responsabilidade pelos próprios atos.
Quanto à idade dos agressores, os dados apontam que
desde adolescentes até idosos podem agredir. A faixa etá-
ria não é algo determinante. A maioria é sem antecedentes
criminais, e pouquíssimos possuem histórico de doença
mental.
Sobre a escolaridade, 47,6% dos homens que agridem
não completaram o ensino fundamental. Ainda segundo
a análise, o fato de o parceiro ser desempregado, ser apo-
sentado ou ter um trabalho informal aumenta em quase
duas vezes o risco de ele cometer violência. Dessa forma,
podemos constatar que os agressores de mulheres não são
monstros, nem loucos. São homens comuns.
Existe um dado novo e desconcertante em relação ao
feminicídio: as pesquisas atuais mostram que em 45% dos
casos os homens que assassinaram seu par não tinham
nenhum antecedente violento conhecido; entrariam num
amplo grupo que pode ser classificado como de agressores
“eventuais”, e, portanto, imprevisíveis.
A grande massa de agressores e assassinos de mulhe-
res leva uma vida socialmente normal. E, dessa forma, per-
cebe-se que não há um padrão único; a violência de gênero
não pode ser tratada como um fenômeno homogêneo, por-
que é heterogêneo e multicausal.
O feminicídio é um crime de ódio. Esse tipo de ódio se
espalha pelo mundo moderno, se encontra em São Paulo,
na Geórgia, em Berlim, na Síria, na Rússia, no Iraque, em
Los Angeles, e em muitas outras partes do mundo. Esse

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ódio alcança o cidadão comum e ocorre, na maioria das ve-
zes, no contexto da relação de um casal.
A agressividade pode ser considerada uma qualidade
natural humana, uma vez que precisamos dela para nos
impulsionar, dar o start, por meio da energia que despen-
de, para diversas atividades da vida. É possível afirmar que
parte dessa energia se junta à nossa intuição para a defesa
contra predadores, ou seja, é uma porção do instinto de so-
brevivência.
Porém, o desequilíbrio dessa agressividade pode trans-
formar muitos de nós nos verdadeiros e perigosos preda-
dores, em uma sociedade já saturada de pressões psico-
lógicas e exigências morais que desafiam nosso equilíbrio
mental. O resultado da soma desses desequilíbrios com
nossa herança genética e o ambiente no qual somos ex-
postos desde a infância, cria condições favoráveis para o
surgimento de ações odiosas e danosas a nós mesmos e
à sociedade.

I – DE ONDE VEM A VIOLÊNCIA, SEGUNDO A


ESCRITURA?

1ª – A VIOLÊNCIA NÃO VEM DE DEUS


A criação é um ato de amor e poder, não de violência.
Nós que somos cristãos precisamos e devemos ter uma
compreensão mais profunda das raízes da violência.
Na mensagem de Deus a Noé, Ele deixa claro que não é
cúmplice da violência humana: “Então, disse Deus a Noé:
Resolvi dar cabo de toda carne, porque a terra está cheia
da violência dos homens; eis que os farei perecer junta-
mente com a terra” (Gênesis 6:13).
Após serem expulsos do Jardim do Éden, Adão e Eva ti-
veram seus dois primeiros filhos, Caim e Abel. “Coabitou o
homem com Eva, sua mulher. Esta concebeu e deu à luz

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a Caim; então, disse: Adquiri um varão com o auxílio do
Senhor. Depois, deu à luz a Abel, seu irmão. Abel foi pastor
de ovelhas, e Caim, lavrador” (Gênesis 4:1, 2).
Segundo Ellen White, os dois irmãos “estavam cien-
tes da providência tomada para a salvação do homem,
e compreendiam o sistema de ofertas que Deus ordena-
ra. Sabiam que nessas ofertas deveriam exprimir fé no
Salvador a quem tais ofertas tipificavam, e ao mesmo
tempo reconhecer sua total dependência dEle, para o
perdão; e sabiam que, conformando-se assim ao plano
divino para a sua redenção, estavam a dar prova de sua
obediência à vontade de Deus” (Ellen G. White, Patriar-
cas e Profetas, p. 40).

2º – A VIOLÊNCIA PROVÉM DO ÓDIO, CIÚME E


INVEJA QUE CULTIVAMOS EM NOSSO CORAÇÃO
É razoável supor que Caim imaginava que, como pri-
mogênito, seria o escolhido por seu pai para receber sua
bênção e um papel de liderança na família. Mas ele foi pre-
terido. Dessa forma, Caim, sentindo-se inferiorizado em
relação ao irmão mais novo, fechou-se e deixou-se invadir
pela inveja que criou ódio contra quem tinha o que ele de-
sejava.
Esse sentimento cultivado no coração está na raiz dos
nossos atos violentos. E segundo o relato bíblico, esse ódio
contra quem tem o que você deseja, é o verdadeiro respon-
sável pelo primeiro ato homicida da humanidade (Gênesis
4:1-16).
Caim matou Abel por uma razão que veio de dentro do
coração – seu egoísmo gerou ciúme e inveja a ponto de
transformar seu amor em ódio. Esse desequilíbrio envol-
vendo o ciúme e a inveja torna-se nítido quando Caim o ex-
pressa de forma violenta e assassina, chegando a negar o
valor e a importância do outro para afirmar a existência de
seu próprio valor.

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Isso acontece porque o ciúme agrega consigo um com-
plexo de vários sentimentos como raiva, inveja, ódio, posse
e baixa-autoestima, gerando insegurança e desenvolvendo
um desequilíbrio entre o desejo e a posse.

3º – A INDEPENDÊNCIA DE DEUS TAMBÉM


PROVOCA ATOS VIOLENTOS
Segundo Ellen G. White, Caim “preferiu a conduta de
dependência própria. Viria com seus próprios méritos.
Não traria o cordeiro, nem misturaria seu sangue com a
oferta, mas apresentaria seus frutos, produtos de seu tra-
balho. Apresentou sua oferta como um favor feito a Deus,
pelo qual esperava obter a aprovação divina” (Patriarcas e
Profetas, p. 40).
Caim se tornou um idólatra, e essa idolatria provocou
uma cisão interna e uma separação de Deus, geradoras de
angústia e infelicidade,as quais o fizeram ter sentimentos
hostis e violentos em relação ao outro.
O outro era culpado pelo seu atual estado de infelicida-
de, e por isso deveria ser eliminado ou punido de alguma
forma. Para ser bem-sucedido nessa sua jornada de vin-
gança, Caim se tornou desumano, agiu como animal in-
domável. Sua racionalidade se transformou em violência e
despotismo.
Existiu uma falta de Deus absurda. Mas Deus insistiu em
estar presente na vida de Caim e fez uma advertência a Caim
ao perguntar: “Por que andas irado, e por que descaiu o teu
semblante? Se procederes bem, não é certo que serás acei-
to? Se, todavia, procederes mal, eis que o pecado jaz à por-
ta; o seu desejo será contra ti, mas a ti cumpre dominá-lo”
(Gênesis 4:6, 7).
Essa orientação divina buscou fazer com que Caim re-
fletisse sobre si mesmo, levando-o a se responsabilizar
pela frustação que experimentava, parando assim de jogar
a culpa no outro para olhar a real causa de seus sofrimen-

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tos, pois negar essa realidade não é o caminho para resol-
vê-los.
Deus estava promovendo essa reflexão como uma
oportunidade para que Caim pudesse olhar para si mesmo,
ficar quieto, a sós, para se conhecer, autoanalisar e assim
buscar do alto a força para ter o domínio próprio.
A decisão de Caim foi de não fazer essa reflexão pro-
posta por Deus. Em sua arrogância, ele começou a escu-
tar seus próprios desejos contaminados pelo pecado. Caim
não aceitou a soberania de Deus, recusou-se a obedecê-Lo,
e fez de si mesmo um deus.
Com uma ação egoísta em sua forma mais perversa,
convertido em inveja, em ressentimento, e finalmente em
ódio, concretizou o que sentia com ações de violência.
O pecado é predatório, traiçoeiro e fica escondido atrás
da porta, de tocaia, à espreita para alimentar esse desejo
de violência assassina.

II – O QUE PODEMOS FAZER PARA CONTROLAR


ESSA VIOLÊNCIA?
1º – É NECESSÁRIO NASCER DE NOVO
Se quiser ver-se realmente livre do domínio do pecado,
é necessário nascer de novo para ganhar um novo coração
e um novo espírito (Salmo 51:10,; Ezequiel 36:25-27,; Isaías
57:15). Somente o sacrifício de Jesus pode purificar o ser
humano de sua imundície, tornando-o capaz de oferecer
um sacrifício que expresse a vontade de Deus, puro e do
agrado do Senhor.
Para Ellen G. White, “é unicamente pelos méritos de
Jesus que nossas transgressões podem ser perdoadas.
Aqueles que não sentem necessidade do sangue de Cris-
to, que acham que sem a graça divina podem pelas suas
próprias obras conseguir a aprovação de Deus, estão co-
metendo o mesmo erro de Caim. Se não aceitam o sangue

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purificador, acham-se sob condenação. Não há outra pro-
vidência tomada pela qual se possam libertar da escravi-
dão do pecado” (Patriarcas e Profetas, p. 41).
2º – É NECESSÁRIO MAIS DE CRISTO EM MINHA
VIDA
Existem muitos que acreditam que a espécie humana
necessita não de redenção, mas de “desenvolvimento”,
que a espécie humana pode aperfeiçoar-se, elevar-se e
regenerar-se.
Porém, a humanidade não consegue fazer isso sozinha;
ela precisa de Cristo. “A humanidade não tem poder para
regenerar-se. Ela não tende a ir para cima, para o que é
divino, mas para baixo, para o que é satânico. Cristo é a
nossa única esperança” (Patriarcas e Profetas, p. 41). O
fim da violência se resume em se aproximar cada vez mais
de Deus e buscar ter um caráter semelhante ao dEle.
Gênesis 4:9 diz: “Disse o Senhor a Caim: Onde está
Abel, teu irmão? Ele respondeu: Não sei; acaso, sou eu tu-
tor de meu irmão?” Caim se afastou da presença do Senhor
e se deixou dominar pela violência. Avançou tanto no peca-
do que perdeu a intuição da contínua presença de Deus e
de Sua grandeza e onisciência. Assim, recorreu à falsidade
para esconder sua culpa. Por não permitir que Deus cuidas-
se de suas emoções, o desejo homicida dominou, e Caim
passou a ser um fugitivo e errante sobre a face da Terra.
E, assim, a violência que ocorreu no caso de Caim
e Abel acontece hoje com muitas mulheres que cla-
mam por justiça!

CONCLUSÃO
Todos nós temos um enorme potencial para produzir
violência. A fábrica produtora da violência está dentro do
ser humano, e não fora dele!
O apóstolo Tiago vai na mesma direção ao fazer a per-

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gunta: “De onde procedem guerras e contendas que há en-
tre vós? De onde, senão dos prazeres que militam na vossa
carne? Cobiçais e nada tendes; matais, e invejais, e nada
podeis obter; viveis a lutar e a fazer guerras” (Tiago 4:1, 2).
A resposta de Tiago é direta: a violência é fruto do que
está dentro, das paixões que guerreiam dentro de cada um.
A violência não deve ser aceita, sob nenhuma forma e em
nenhuma hipótese. Deus não criou a violência, nem a quer
entre Seus filhos.
Deus deu o seguinte testemunho de Seu filho Jesus
e Sua missão: “Eis aqui o meu servo, que escolhi, o meu
amado, em quem a minha alma se compraz. Farei repou-
sar sobre ele o meu Espírito, e ele anunciará juízo aos
gentios. Não contenderá, nem gritará, nem alguém ouvi-
rá nas praças a sua voz. Não esmagará a cana quebrada,
nem apagará a torcida que fumega, até que faça vence-
dor o juízo. E, no seu nome, esperarão os gentios” (Mateus
12:18-21).
A igreja deve ser uma comunidade de paz, e essa paz
deve ser levada para todos aqueles que agem com violên-
cia em seu lar. Será que vamos notar essas pessoas? Será
que vamos ajudar essas pessoas a não se aproximarem da
borda do penhasco?
A polícia não pode e nem conseguirá supervisionar a
vida de todos. Nossas leis definem o comportamento civil,
mas não podem domar a natureza humana pecaminosa.
Atirar de volta é sempre pior do que parar o tiroteio an-
tes que ele comece. Trabalhar para barrar a violência é mui-
to melhor do que consertar seus estragos.
Jesus nos chama para amenizar e curar as feridas onde
pessoas são rejeitadas e abusadas por outros, para nos
conectarmos aos machucados antes que ataquem e firam
mais pessoas na vã tentativa de reduzir o nível de tensão
e violência ao redor, quando essa tensão e violência estão
instaladas dentro de cada coração e mente.

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