Ficha 01 Definição Recursiva

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 5

Calisto Guambe, DMI, UEM – 2021. MDII I.

Recursividade geral -1-


Ficha 1
Conceito Geral de Definição Recursiva
1. Introdução
As sucessões dos números não são os únicos objectos que podem ser definidos recursivamente.
Podemos obter conjuntos, funções, palavras, etc, definidos de forma recursiva. Esta secção é dedicada
às definições recursivas de conjuntos. Estas definições têm duas formas. A primeira, permite construir
os elementos de um conjunto a partir dos conhecidos, e a segunda permite verificar se um objecto
pertence ao conjunto definido ou não. A segunda chama-se forma inversa ou forma de verificação.

2. Definições
Definição do conjunto N.
O método de indução matemática baseia-se na seguinte propriedade do conjunto N ={0; 1; 2; 3;...} dos
números naturais
(B) 0  N
(R) Se n  N então n + 1  N.
As condições (básica (B) e recursiva (R) (ou indutiva)) formam uma propriedade característica do
conjunto N, isto é, estas condições completamente descrevem o conjunto N e podem servir como uma
definição do conjunto N de todos os números naturais. Essa ideia sugere um método geral para definir
os conjuntos e chama-se definição recursiva de um conjunto.
Notemos que a definição acima do conjunto N pode ser descrita como se segue:
(B) 0  N
(R’) n  N se n  0  n – 1  N .
Uma diferença entre as duas definições é que a primeira usa-se para construir os novos elementos do
conjunto a partir de um ou de alguns elementos conhecidos, enquanto a segunda é usada para verificar
se algum objecto dado pertence ao conjunto definido. Portanto, a primeira definição chama-se a forma
de construção e a segunda chama-se forma inversa ou forma de verificação.

Definição recursiva de um conjunto e a sua forma inversa

A definição recursiva de um conjunto S consiste de duas partes:


(B) uma base da forma
X  S, (1.1)
onde o subconjunto X é definido directamente.
(R) outra parte recursiva que consiste de uma ou várias regras r1, . . . , rm
da forma: sendo si  S, i = 1;2;…;k, r = {r1;r2; …;rm},
s1, s2, . . . , sk → s ou s = r(s1, s2, . . . , sk). (1.2)
Notemos que, às vezes, os elementos s1, . . . , sk  S obrigam a obedecer condições suplementares que
são parte das regras, isto é, as condições formam um domínio das regras (veja o Exemplo 3).

Forma inversa:
A parte recursiva (1.2) pode ser invertida e apresentada numa forma inversa que permita verificar se
um elemento pertence ou não ao conjunto considerado. Para obter uma forma inversa é preciso inverter
cada uma das regras de (R), isto é, achar o bloco
(s1, . . . , sk)
a partir do elemento s = r(s1, s2, . . . , sk), isto é, (R’): s → (s1, . . . , sk) mantendo a parte (B).
________________________________________________________________________________
Calisto Guambe, DMI, UEM – 2021. MDII I. Recursividade geral -2-
1)
Nota: Aqui utilizamos a denotação N ={0; 1; 2; 3; ...}. Neste caso, Z+ = {1; 2; 3; ... }, Z - = {-1; -2; -3; ... }.
As vezes denota-se N* ={1; 2; 3; ...} = Z+, então N ={0; 1; 2; 3; ...}= N*  {0}. Z = Z -  {0}  Z + .

Exemplo 1. Consideremos o subconjunto S  N de todos os números naturais que consiste dos


números naturais satisfazendo as duas condições:
(B) 1  S
(R) Se n  S então 2n  S.
a) Ache o conjunto S;
b) Escreva uma forma inversa da definição recursiva de S;
c) Mostre que 16  S e 20  S.
Resolução.
a) Conforme a regra (R) o conjunto S contém os números 1, 2, 4, 8, . . ., ou seja 2m, m=0, 1, 2, ....
(Prove por indução matemática). Todos os números naturais que podem ser derivados (construídos)
desta maneira são elementos do conjunto S. Mas se um número natural x não é possível derivar desta
maneira, então x  S.
A condição (R) contém uma regra de construção que serve para construir elementos do conjunto S a
partir dos elementos já construídos. Mas esta regra não permite verificar se um número natural dado
pertence ao conjunto S uma vez que S é infinito.
b) Consideremos uma forma (R’) inversa da (R) que se pode usar para verificar isso:
(B) 1  S
(R’) n  S se n  N  n/2  S .
É claro que esta condição vale a pena aplicar só para os números n pares. Então, temos a forma
alternativa (inversa) da definição do conjunto S:
Um número natural n  S num dos dois casos:
(B) n = 1 ou
(R’) n  S se n é par e n/2  S.
É evidente que se n for ímpar e n  1 então n  S.
c) Para verificar se n  S aplicando a regra (R’) fazer uma sucessão de n e seus subsequentes. Por
exemplo, para o número n = 16 segundo (R’), precisamos provar o número n1 = 8  S; depois n2 =
4  S, n3 = 2  S, n4 = 1  S .
Enquanto, n = 20  S porque n1 = 20/2=10; n2 =10/5= 5  S, e portanto n=20  S. □

Notemos que usando a indução matemática pode-se demonstrar que


S={2m: m  N }.
Para demonstrar isto considere a proposição P(m) = {2m  S, m = 0; 1; 2;...}. Por outro lado é possível
demonstrar que S não contém outros números.

No exemplo seguinte, define-se um subconjunto do conjunto de todas as sucessões finitas de símbolos


(vamos chamar palavras ou anagramas).

Exemplo 2. Sejam Σ = {a, b} e Σ* o conjunto de todas as sucessões finitas compostas por símbolos a e
b (palavras compostas das letras a e b). Consideremos o subconjunto M  Σ* definido pelas seguintes
regras:
(B) a  M
(R) Se s  M então as concatenações as  M, regra (r1) e
asb  M, regra (r2).
Aqui, s é uma variável cujos valores são as palavras que contêm os símbolos a e b.
Usando a definição, podemos concluir que
aab  M, aaabb  M, aaab  M etc.
Calisto Guambe, DMI, UEM – 2021. MDII I. Recursividade geral -3-
É claro que não é possível construir desta maneira nenhuma palavra que começa com letra b.
Agora consideremos uma forma inversa para verificar se uma palavra de Σ* pertence ao conjunto M :
uma palavra s  M num dos casos seguintes
(B) s = a
(R’) s = as’ e s’  M (r’1)
s = as’b e s’  M (r’2)
É evidente que se s começa com a letra b, então s  M.

Exemplo 3. Determinemos um subconjunto A de números naturais positivos por


(B) 1  A;
(R) Se n  A então 3n  A (r1)
se (2n + 1)  A então n  A (r2).
A segunda regra pressupõe que quando um elemento n’  A pode ser representado na forma n’ = 2n +
1, quer dizer, se n’  A e n’ é um número ímpar então n = (n’ − 1)/2  A .
Investiguemos a definição. Aplicando duas vezes a regra 1 vamos ter os números 3 e 9. Usando a regra
2 para os números 3 e 9 obteremos 1 (que já existe em A) e 4 . Vejamos mais um processo da produção
de números:
1 ⎯⎯→
1
3 ⎯⎯→1
9 ⎯
⎯→1
27 ⎯ ⎯→
1
81 ⎯ ⎯→
1
243
2 2 2 2

1 4 13 40
1 2
2
12 6
Uma pergunta interessante é que de quais números consiste o conjunto A?
Uma hipótese diz que
A = {1, 3, 4, 6, 7, 9, 10, 12, 13, . . .} = {n  N* : n 2 (mod 3)}.
(Exemplo, a sequência 1-3-9-27-13-39-19-57-171-85-255-127-63-31-15 -> 7)
Demonstre esta hipótese! (Sugestão: Considere só 2 casos: n ≡ 0(mod3) ou n ≡ 1(mod3))

Nota. Neste exemplo e no exemplo 2, um elemento do conjunto A ou de M pode ser produzido a partir
de elementos diferentes. Por exemplo, o número 12 pode ser derivado a partir dos números 4 ou 25 .
Existem diferentes caminhos para formar o 12, por exemplo,
1 → 3 → 9 → 4 → 12
e
1 → 3 → 9 → 27 → 13 → 39 → 117 → 351 → 175 → · · · → 51 → 25 → 12.
Verifique este facto!
Quando acontece esta situação, diz-se que a definição dada não é definida unicamente.

Exemplo 4. Na linguagem de programação, usa-se a noção de identificador (que serve para nomes de
variáveis) que é uma sucessão (ou uma palavra) de letras e algarismos começando com uma letra.
Consideremos a definição recursiva:
(B) Uma palavra de uma só letra é identificador;
(R) A concatenação Iσ de um identificador I e de um símbolo σ que é uma
letra ou um algarismo é também um identificador.
Esta definição também pode ser representada numa forma inversa que permite verificar se uma
sucessão dada é identificador:
(B) Uma palavra de uma só letra é identificador;
(R’) A palavra dada é identificador se cumprem-se as condições
(a) o último símbolo é letra ou algarismo
(b) depois de eliminar o último símbolo obtém-se o identificador.
Notemos que a palavra vazia λ não é identificador.
Calisto Guambe, DMI, UEM – 2021. MDII I. Recursividade geral -4-
Por exemplo, consideremos a sucessão ω = ab∗4d. Apliquemos a segunda definição
ab∗4d → ab∗4 → ab∗
O último símbolo ∗ não é letra nem algarismo. Então a palavra ω não é identificador.

Nota. A primeira forma da definição recursiva serve para construir (derivar) elementos do conjunto
definido, enquanto a segunda é para verificar se um objecto dado é um elemento do conjunto ou não.
No Exemplo 3, a forma inversa (R’) da parte recursiva da definição é
(R’) n  A se n/3  A ou se n é ímpar e (n − 1)/2  A .

Exercícios
1. Considere a seguinte definição recursiva de um conjunto A  N:
(B) 1  A
(R) Se x  A então x + 5  A.
(a) Mostre que 18  A; 226  A.
(b) Construa uma forma inversa da definição acima;
(c) Calcule o conjunto A.
2. Considere a definição do subconjunto F  N
(B) 2, 3  F
(R) Se x, y  F então xy  F.
(a) Mostre que 24  F
(b) Construa uma forma inversa da definição acima
(c) Demonstre que 30  F
(d) Calcule o conjunto F

3. Considere a definição de um conjunto A  Z


(B) 5, 8  A
(R) Se x, y  A então x + y  A e x − y  A .
(a) Mostre que 1  A
(b) Demonstre que A = Z
(c) Determine dois números inteiros x e y que pode escolher em vez dos números 5 e 8 em (B)
acima, para que o conjunto A coincida com o conjunto Z? Verifique a sua afirmação!
4. Considere a definição no exemplo 2.
(a) Verifique se as sucessões: ab, aaab, aabb, abab são elementos do M?
(b) Usando a forma inversa verifique que aaabb  M.
(c) Calcule o conjunto M.
5. Seja S o conjunto definido no exemplo 1. Demonstre que S = {2m : m  N}.
6. Seja A o conjunto definido no exemplo 3.
(a) Mostre que se n  A então n ≡ 0 (mod 3) ou n ≡ 1 (mod 3)
(b) Mostre que 4, 6, 10, 12  A.
7. Seja S o conjunto definido pelas regras
(B) 1  S;
(R) (regra r1) se n  S então 2n  S, (regra r2) se 3n+1  S com n ímpar então n  S .
(a) Mostre que 1, 2, 4,  S
(b) Mostre que 3, 5, 6, 7  S.
(c) A proposição S = N* é verdadeira ou não? Justifique.
8. Define-se o conjunto S de N × N recursivamente pelas regras
(B) (0, 0)  S;
Calisto Guambe, DMI, UEM – 2021. MDII I. Recursividade geral -5-
(R) Se (m, n)  S e m < n então (m + 1, n)  S (regra r1)
e se (m,m)  S então (0,m + 1)  S . (regra r2)
(a) Mostre que (1, 2)  S.
(b) Descreva o conjunto S no plano cartesiano Z  Z.
9. Define-se o conjunto S recursivamente pelas regras
(B) λ  S; (λ é o conjunto vazio)
(R) Se s  S, então bs  S (regra r1)
sb  S (regra r2)
saa  S (regra r3)
aas  S. (regra r4)
Mostre que qualquer elemento s  S contém um número par de a’s.

Você também pode gostar

pFad - Phonifier reborn

Pfad - The Proxy pFad of © 2024 Garber Painting. All rights reserved.

Note: This service is not intended for secure transactions such as banking, social media, email, or purchasing. Use at your own risk. We assume no liability whatsoever for broken pages.


Alternative Proxies:

Alternative Proxy

pFad Proxy

pFad v3 Proxy

pFad v4 Proxy