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PERSPECTIVAS E DESAFIOS DO ENVELHECIMENTO

INCLUSIVO DIANTE DE UMA SOCIEDADE LÍQUIDA

PERSPECTIVES AND CHALLENGES OF INCLUSIVE AGING BEFORE A LIQUID


MODERNITY

Recebido: 06.07.2019 Aprovado: 04.09.2019

Patrícia Verônica N. Carvalho Sobral De Souza Lucas Gonçalves da Silva


Pós-doutoranda e Doutora em Direito pela Pós-doutor em Direito pela Università Degli Studi
Universidade Federal de Bahia (UFBA). Professora G. d'Annunzio (Italia) e pela Universidade Federal
de Graduação e Pós-graduação da Universidade da Bahia (UFBA). Professor Associado da
Tiradentes (UNIT). Líder do grupo de pesquisa Graduação em Direito e do Programa de Mestrado
Direito Público, Educação Jurídica e Direitos em Direito na Universidade Federal de Sergipe-
Humanos. UFS.
E-mail: patncss@gmail.com. Email: lucasgs@uol.com.br
ORCID: http://orcid.org/0000-0002-3725-6339 ORCID:
LATTES: http://lattes.cnpq.br/7502386530836336 LATTES: http://lattes.cnpq.br/1696968535834577

RESUMO: Os direitos fundamentais têm um laço estreito de proteção às pessoas idosas. O


envelhecimento é um processo biológico no qual o lapso temporal determina as mudanças
estruturais no corpo e, em decorrência, modifica suas funções. Neste sentido, o presente
estudo tem como tema as perspectivas de um envelhecimento mais inclusivo, cujo objetivo é
buscar compreender o novo contexto social que envolve a sociedade atual, analisando os
desafios enfrentados e que suscitam a elaboração de planos, programas e políticas públicas
que atendam às necessidades da população mais velha. Para tanto, se utilizou da pesquisa
bibliográfica, cujo método foi qualitativo, de caráter exploratório, através de lições
doutrinárias e pesquisas eletrônicas com o fito de elucidar o tema em debate. A partir disso,
permitiu-se concluir que implementar, de forma legal, planos, programas e serviços promove
a inserção social, privilegiando a dignidade da pessoa humana dos idosos frente à era
moderna de relações interpessoais.

PALAVRAS-CHAVE: Dignidade da pessoa humana. Direitos fundamentais. Proteção aos


idosos. Sociedade líquida.

ABSTRACT: Fundamental rights have a close tie to the protection of the elderly. Aging is a
biological process in which time lag determines the structural changes in the body and, as a
result, modify its functions. In this sense, the present study has as its theme the perspectives
of a more inclusive aging, whose objective is to seek to understand the new social context that
involves the current society, analyzing the challenges faced and that lead to the elaboration of
plans, programs and public policies that meet needs of the older population. To do so, we
used bibliographic research, whose method was qualitative, of an exploratory nature, through
doctrinal lessons and electronic researches with the purpose of elucidating the subject under
debate. From this, it was possible to conclude that the legal implementation of plans,
programs and services promotes social insertion, privileging the dignity of the human person
of the elderly in the face of the modern era of interpersonal relations.

109 | Revista do Programa de Pós-Graduação em Direito da UFBA,e-issn 2358-4777, v. 29, n. 02, p.109-127, Jul-Dez 2019
Patrícia Verônica N. Carvalho Sobral De Souza e Lucas Gonçalves da Silva

KEYWORDS: Dignity of human person. Fundamental rights. Protection for the elderly.
Liquid Modernity.

SUMÁRIO: Introdução. 1 A questão social do envelhecimento numa sociedade líquida. 2 O


envelhecimento na perspectiva dos direitos fundamentais e da dignidade da pessoa humana.
3 O envelhecimento inclusivo. Conclusão. Referências

INTRODUÇÃO
O envelhecimento é um processo biológico cujas alterações determinam mudanças
estruturais no corpo e, em decorrência, modificam suas funções. A velhice passa a ser
interpretada como algo de improdutivo e incapacitante. Compreende-se que a inclusão e a
mobilização dos idosos nas entidades sociais em diversos setores e o aumento do conhecimento
científico, facilitarão sua convivência no meio em que vivem, apesar das condições precárias
sociais e econômicas por que passa a maior parte da população brasileira.
É necessário antes de qualquer intervenção conhecer não só as condições físicas do
indivíduo, mas também sua situação social, seu envolvimento emocional com os que o rodeiam,
seus anseios, medos, expectativas, desejos. Essa visão global do idoso devolve ao indivíduo o
status de cidadão e, portanto, a sua dignidade como ser humano.
Entre as principais características psicológicas do envelhecimento encontra-se a
tendência à depressão, frequentemente desencadeada pela conscientização das perdas
funcionais e sociais que a senectude carrega consigo. A aposentadoria é, por vezes, o estopim de
grave crise existencial, frequentemente agravada, e muito, por uma situação familiar complexa e
não preparada para receber, em tempo integral, aquele membro outrora profissionalmente
ativo. Dada a importância da família como órgão de apoio e de saúde, a impossibilidade de o
idoso poder dispor destes recursos poderá levá-lo a situações de morbidade significativa, seja
sob o prisma físico, psíquico ou social.
O Brasil é um país em processo de envelhecimento. A pirâmide populacional começou a
transformar-se significativamente com a presente ascensão da parcela da população de idosos.
A população brasileira, estimada em 209,3 milhões de pessoas, está vendo diminuir o número de
crianças e aumentar o de idosos. O número de pessoas no Brasil acima de 60 anos (definição de
"idosos") continua crescendo. Em 2017, segundo a Pesquisa Nacional por Mostra de Domicílios
Contínua (Pnad) já são 30 milhões de idosos no país O que ocorreu foi u aumento de 4,8 milhões
de idosos comparado ao ano de 2012 (BRASIL, 2018).
A demanda é cada vez mais emergente no que tange às necessidades dos sistemas de
saúde e assistência social dos países em desenvolvimento, pois junto a este crescimento está o
aumento das doenças associadas ao envelhecimento, como as crônico-degenerativas e
demenciais, é onde gira a problemática do estudo em questão.
Portanto, a ideia de direitos fundamentais se articula com o envelhecimento. Contudo,
não se pode perder de vista quando se cuida dos direitos dos idosos, o respeito à dignidade da
pessoa humana e a proteção do poder estatal para assegurar minimamente políticas públicas
específicas para as pessoas da terceira idade1.
Dessa forma, o presente estudo justifica-se pela necessidade de se dar mais atenção ao
fenômeno de envelhecimento no Brasil, e tem como objetivo apreender o novo contexto social
representado pelo dos seus desafios enfrentados ante a elaboração de planos, programas e
políticas públicas aptas a absorver e atender às suas necessidades. Para tanto, é utilizada a

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metodologia qualitativa e bibliográfica, de caráter exploratório, através do levantamento de
fontes doutrinárias, e por meio de pesquisas eletrônicas.
Diante isso, questiona-se: como se dá as relações interpessoais na sociedade moderna?
O que se entende por sociedade líquida? Como driblar a cultura de massa e promover a inclusão
de pessoas idosas no contexto social atual?
A expectativa de vida da população está aumentando e vários fatores podem ter
contribuído para este avanço, como por exemplo, a utilização da tecnologia de ponta na
descoberta e no tratamento de diversas doenças. Um elemento tecnológico que pode contribuir
para a melhoria do processo de envelhecimento das pessoas, fornecendo subsídios para uma
melhor qualidade de vida são os jogos digitais.
Eles podem ser uma importante ferramenta para amenizar as restrições decorrentes da
idade, que atingem principalmente aspectos motores, perceptivos, cognitivos e psicossociais das
pessoas. O envelhecimento normal é um processo gradual que traz algumas mudanças, como
reflexos mais lentos, visão e audição mais frágeis e menor força física.

2 A QUESTÃO SOCIAL DO ENVELHECIMENTO NUMA SOCIEDADE LÍQUIDA


A cultura torna-se um meio de produção de comportamentos de consumo. Além da
venda de mercadorias de natureza cultural, há a utilização da própria imagem como um
instrumento de produção do comportamento consumista. Qualquer processo psíquico pode
tornar-se uma ferramenta eficaz de produção – sejam os apelos eróticos, os estímulos
sensoriais, identidades, ideais estéticos, os valores morais ou as visões de mundo (SILVA JUNIOR,
2005).
Explicando a formação do comportamento depressivo, Silva Junior alerta que a
depressão pode ser vista, nos dias de hoje, como uma doença de origem meramente orgânica,
originada pelo próprio indivíduo, e que, compreendendo isso, ele pode exercer seu novo papel
social – o de consumidor. Sentimentos como insatisfação, inconformismo e tristeza passam a
significar distúrbios neuroquímicos, que podem ser curados com medicamentos (SILVA JUNIOR,
2005).
Esta recodificação – em que o indivíduo deprimido é levado a crer que passa a ter
responsabilidade sobre sua doença – faz também com que ele compreenda, através do
marketing, que pode ter em mãos a cura para seus problemas, bastando adquirir os produtos
apresentados pelas incessantes propagandas (SILVA JUNIOR, 2005).
O sofrimento psíquico desemboca na questão da fidelização do novo consumidor,
exigindo uma tecnologia especificamente voltada ao campo psicológico, que garanta a eficácia
da produção do consumo.
Embora o consumo tenha sempre sido prática comum às sociedades em qualquer
tempo, no final do século XX, ele assume uma dimensão paradigmática da
organização do trabalho. O consumidor, na sociedade de consumo, é diferente dos
consumidores de quaisquer outras sociedades, pois, diferente de outros tempos,
nenhuma necessidade é vista como inteiramente satisfeita e nenhum desejo como
o último (BAUMAN, 1999, p. 88).

A temporalidade, inclusive, é considerada o princípio que determina os ditames da


produção no contexto atual. Os produtos e serviços são direcionados para a satisfação imediata,
com o compromisso de não ultrapassar um determinado tempo previsto, abrindo espaço para

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um novo produto/serviço, que realimenta e mobiliza o ciclo. A sociedade de consumo envolve,


sobretudo, o esquecimento em lugar da aprendizagem, tornando os consumidores
“acumuladores de sensações” (BAUMAN, p. 91).
Na sociedade pós-moderna, cada indivíduo torna-se responsável pelo que faz de sua
vida. Ele é totalmente responsabilizado a se inventar, criar e recriar, sem ter um grande modelo
de referência, porém, sofrendo constantemente uma comparação global. A subjetividade
sempre se construiu a partir de outro, quer seja ele uma divindade, uma autoridade, o próprio
povo ou algo equivalente, cuja identidade pode ser comprada nos supermercados. As
configurações, os padrões subjetivos multiplicam-se, porém, não persistem por muito tempo. Há
a necessidade de o sujeito pós-moderno ser uma “metamorfose ambulante”, isto é, ele deve
fazer-se sujeito, construir-se, desconstruir-se, flexibilizar-se. (BAUMAN, 1998).
Neste contexto, ocorre a transição da sociedade tradicional para a sociedade do
rendimento, no qual o indivíduo, peça central desse tema por compor seja essa ou aquela
sociedade, está inserto numa jornada de render mais e ganhar mais (MOURA, 2018).
Ao lado do discurso médico-científico das neurociências, a sociedade de massa e de
consumo veicula seu próprio discurso que reduz a subjetividade à exterioridade corporal e
intensidade e transitoriedade das sensações e relações afetivas, com sua inevitável constelação
de frustração e solidão. Se nos tempos de Freud o sujeito sofria por falta de liberdade, no Pós-
Modernismo, ele sofre por seu excesso (BAUMAN, 1998).
Para Bauman (2001), as principais transformações ocorridas no mundo pós-moderno
puderam ser observadas nos campos da economia, sociocultural e político.
No campo da economia houve o surgimento de uma economia informacional global,
caracterizada por uma estrutura permanente, capaz de dispersar-se pelo mundo em enorme
velocidade, assim como abrir e fechar fábricas e investimentos com rapidez, tornando a
mobilidade e a insegurança uma característica do mundo contemporâneo. Toda a cultura
corporativa é encharcada de arte: como rebeldia, novidade e atitude radical e não como meio de
expressão de utopias.
No campo sociocultural (na era da micropolítica e do “politicamente correto”, do
ecologismo, do pacifismo, do feminismo, do direito dos negros e homossexuais, assim como da
mídia e publicidade massiva, funcionando em escala global, criando uma expectativa pelo novo,
pelo sensacional, pela rapidez de comunicação e formato da mensagem), a própria arte se
mescla com defesas de minorias, radicalismo da política da imagem.
No campo da política, uma democracia de massa mostra sua dificuldade em representar
a população. As questões da imagem tomam o primeiro plano da cena política, sendo que as
características de marketing se tornam o diferencial da escolha dos candidatos e de sua figura
política.
Nas últimas décadas, o mundo conheceu muitas mudanças político-econômico-culturais
que desaguaram na globalização. Junto com a produção e circulação de bens materiais e
simbólicos sem precedentes, gerou uma sociedade de consumidores e excluídos, de “arrivistas e
párias”, “turistas e vagabundos” com suas manifestações maníacas, depressivas ou agressivas,
conforme o sentimento de sucesso, impotência ou de revolta vivenciados por cada um. O
sociólogo argumenta que a causa da permanente angústia do ser humano, apesar dos avanços
científicos e tecnológicos, corresponde à característica da pós-modernidade, marcada pelo
capitalismo pós-industrial, de consumo exacerbado, de constante movimento, onde os laços
afetivos entre as pessoas são muito frágeis. O impacto desses fenômenos nos relacionamentos
afetivos interfere nas relações, transformando-os, segundo ele, em “amores líquidos”. Ocorre
uma substituição do investimento no amor e no próximo, sendo que as pessoas começam a

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fazer parte de uma ou várias redes de relações, divididas em tribos, que juntas formam uma
colcha de retalhos (BAUMAN, 2001).
Na vida pós-moderna, as pessoas se unem em grupos que possuem algo em comum,
experiências vividas em comum. O viver social é permeado por imagens e simbolismos que
constituem a vida em uma grande ou banal aventura, coexistindo emoção e razão. As pessoas
sentem uma necessidade (quase obrigação) de pertencer a grupos, o que sustenta a vida social.
Os elementos que compõem este viver social são os grandes eventos culturais, ações de
caridade, voluntariado, moda. Os cenários ajudam a compor a forma que caracteriza a vida
social, sendo eles os palcos em que se desenrolam as cenas da vida cotidiana – shoppings,
eventos esportivos e culturais, megaeventos religiosos, relações de vizinhança (BAUMAN, 1998).
Bauman (2001) apontou o caráter imperativo do gozo na moderna sociedade de
consumo enquanto um elemento pertencente à uma transformação global, cuja nova concepção
de libido exige que a saciedade erótica se realize no prazer de consumir. A concretização da
satisfação erótica no ato de comprar, deve ser realizada de forma que possa ser repetida
sempre. Forma-se assim um círculo vicioso, do qual o sujeito dificilmente se libertará.
As culturas de massa são produtos da indústria cultural, em que os produtos são
reformulados e apresentados à sociedade com um novo formato, padronizados e produzidos em
série, oferecendo lixo às massas sedentas de algo que satisfaça suas necessidades, que são
criadas por esta mesma indústria.
A cultura de massa é uma moderna religião de salvação terrena que contém em si
as potencialidades e os limites do seu próprio desenvolvimento: por um lado,
aponta o caminho que, necessariamente, toda a sociedade de consumo seguirá,
mas, por outro lado, é vulnerável a todos os movimentos coletivos que são
portadores de exigências metaindividuais e espirituais.' (WOLF, 1987, p.93)

O sujeito pós-moderno abandona os seus referenciais de tradição e cultura para estar


inserido no mercado global. Ele faz isso inconscientemente, atendendo às condições impostas
pela sociedade para a sua subsistência como um membro do grupo, ao qual ele procura se
identificar.
Em vez de falarmos em identidades nacionais globais, o que não deixaria de ser
também um viés ideológico, hoje procuramos, dentro da vida popular, a sua
pluralidade, a sua riqueza. Estão aí os movimentos religiosos, movimentos de
cultura ecológica, movimentos femininos - o que a gente sente é que há um
despertar de consciência que propõe formas especiais de suas experiências
particulares, que não querem se submeter a essa rotina de cultura de massas. O
conceito de identidade nacional está há tempos em crise e foi substituído por duas
forças opostas e contemporâneas: pela globalização, que não tem pátria (esse é o
lado que eu chamaria de negativo do processo) e, positivamente, pelo
aprofundamento das vivências populares (BOSI, 2003, p. 87).

A globalização é o paradigma que compreende economia, ideologia e cultura, e rompe


fronteiras nacionais, integrando e conectando comunidades, transformando o mundo numa
verdadeira aldeia global, num mundo de iguais. Ela contribui para o deslocamento das
identidades culturais, sendo capaz de desintegrá-las e homogeneizá-las, e assim, enfraquecendo-
as.
A crise da cultura de massa ocorre quando o homem percebe a necessidade de sentir-se
representado; buscando nos produtos oferecidos o fortalecimento de sua identidade, como
forma de ser representado. A cultura de massa busca nas necessidades individuais do sujeito
forças para conseguir se integrar nas culturas tradicionais.

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Ela não tende a destruir todo o folclore: substitui os folclores antigos por um novo
folclore cosmopolita. [...] esse novo folclore cosmopolita carrega em si fragmentos
de folclore regionais, nacionais ou étnicos: é, num certo sentido, um agregado de
folclores que se unem para formar um tronco universalizado (MORIN, 2000, p.
159).

De certa forma, a cultura de massa supre as necessidades do homem, dando a ele o bem-
estar e felicidade, servindo como um entorpecente para que ele possa esquecer de suas
verdadeiras necessidades, pois ao mesmo tempo em que lhe são ofertadas novas formas de
representação, são retirados dele seus anseios e angústias. Ela produz um vício que cria anseios
que o indivíduo não tinha, e coloca nele a necessidade de consumir certos produtos que não lhe
agregam valor a não ser uma satisfação momentânea, e em troca, ele entrega sua consciência
para que seja moldada de acordo com as diretrizes impostas pela indústria cultural.
Canclini (1999, p. 90) caracteriza o consumo:
Não como a mera possessão individual de objetos isolados, mas como a
apropriação coletiva, em relações de solidariedade e distinção com outros, de bens
que proporcionam satisfações biológicas e simbólicas, que servem para enviar e
receber mensagens e reconhecendo a especificidade da produção, circulação e
apropriação dos bens classificados coletivamente como patrimônio histórico e
artístico, artes plásticas, cultura popular tradicional, indústrias audiovisuais
tradicionais e novos sistemas de informação e comunicação viabilizados pelas
novas tecnologias audiovisuais, indústria editorial, etc., buscando interpretar as
interseções entre as diferentes modalidades e lógicas de expressão simbólica
comunicacional criadas pelos agentes sociais em seu cotidiano de
invenção/reprodução social, no final do século XX e início do XXI, mudando o eixo
da discussão sobre cultura, consumo e identidade.

No mundo contemporâneo, existem empresas que prestam serviços a empresas que


produzem bens, que têm o poder de criar necessidades de uso de novos produtos, através dos
meios de comunicação de massa (jornais, televisão, revistas, rádio). As pessoas se sentem
satisfeitas pelo simples fato de ter mais que as outras. Nessa sociedade de consumo, ter dinheiro
significa poder consumir e é sinônimo de busca de felicidade e status. A compra de um produto
tido como importante pelo grupo social ao qual o consumidor pertence gera uma imediata
sensação de prazer e realização, conferindo a ele status e reconhecimento, e logo ele pensa em
adquirir uma nova posse, para que esta satisfação seja mais duradoura e significativa.
Destarte, verifica-se que ocorreram transformações muito importantes no Modernismo,
como por exemplo, a que houve no campo da tecnologia. No entanto, a difusão da informação
acabou por criar novas necessidades nas pessoas, apoiadas pela mídia, tanto que a principal
característica sociológica do Pós-Modernismo é o crescimento de uma sociedade voltada ao
consumo, em que cada um age do modo que acredita ser o correto e supre suas diversas
necessidades e desejos consumindo o que a mídia lhe apresenta, colocando sua felicidade no ato
de possuir coisas.

3 O ENVELHECIMENTO NA PERSPECTIVA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS E DA DIGNIDADE DA


PESSOA HUMANA
Na concepção de alguns geriatras, a idade adulta corresponde mais ou menos dos vinte
anos aos quarenta e cinco anos (idade madura), o que muitos desconhecem. Já o processo de
envelhecimento compreenderia algo entre os 40 aos 60 anos, onde se encontram os primeiros
sinais de senectude.
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O princípio da dignidade humana é um valor moral e foi adotado pela Carta Federal de
1988 que impõe observância aos direitos fundamentais, objeto do Estado Democrático de
Direito. Logo, Okuma (1998) assevera que o envelhecimento é um processo biológico no qual
determinadas alterações determinam mudanças estruturais no corpo e, em decorrência,
modificam as suas funções. Porém, se envelhecer é inerente a todo ser vivo, no caso do homem,
esse processo assume dimensões que ultrapassam o simples ciclo biológico, pois pode acarretar,
também, consequências sociais e psicológicas que devem ser albergadas como um valor
fundamental inerente à pessoa humana.
Nessa fase, ocorre uma tendência ao aparecimento de várias doenças que afetarão a
próxima fase, entre elas, hipertensão, diabetes, câncer, arteriosclerose (levando a tendência ao
infarto e derrame) e angina. Mas as pessoas que têm uma vida saudável na alimentação, tempo
de lazer, com certeza terão menos problemas de saúde e com isso um envelhecimento saudável.
Na intelecção de Moraes et. Al. (2003), o que ocorre é a diminuição das células de todos
os órgãos e o aumento da quantidade de gordura em todo organismo. Esta fase caracteriza-se
pela diminuição progressiva do desempenho nas atividades físicas, mas com o aprimoramento
da atividade cerebral e espiritual.
A aposentadoria, nesta fase, pode levar um indivíduo não preparado a deprimir-se, pois
se depara com uma situação de declínio social e econômico. De acordo com Straussburger
(1999), nesta fase, o profissional de saúde deve visar, portanto, uma intervenção sobretudo
preventiva. Senescência-gradual, dos 60 aos 70 anos, onde ocorre o aparecimento de sinais mais
declarados.
As doenças já são mais evidentes, assim como é visível a perda de força física. Hoje, mais
do que antes, os clubes e academias estão recebendo muitas pessoas dessa faixa etária, que
estão à procura de saúde e novas amizades, para espantar a solidão de estarem sozinhos. Sua
capacidade cerebral permanece, mas suas perdas sociais e físicas podem influenciar
negativamente. As doenças que afetam essa fase já são, na maioria das vezes, crônicas e tendem
a somar-se às previamente adquiridas ou prejudicá-las. A velhice conclamada inicia aos 70 anos,
e é caracterizada pelo declínio do desempenho mental. As doenças já começam a afetar as suas
atividades da vida diária, determinando uma tendência à invalidez e dependências. Somam-se às
perdas econômicas e físicas as perdas de parentes e amigos que se tornam cada vez mais
frequentes. Na longevidade – acima dos 90 anos – evidenciam-se e afloram todas as tendências
e dependências das etapas anteriores. O indivíduo, nesta fase, encontra-se em equilíbrio
instável.
Sinésio e Andrade (2002), afirmam que vivemos num momento constrangedor, em que o
velho está cada vez mais infeliz por não se sentir ajustado aos valores da sociedade. A solidão e
desespero estão dominando seu mundo interior, causando a perda do respeito que fragiliza a
consagração dos seus direitos fundamentais para uma melhor qualidade de vida. As autoras
referem-se ainda às mudanças das estruturas familiares que contribuem para o aumento do
número de idosos institucionalizados. Fala-se hoje em nos livrarmos do “nosso velho”,
principalmente quando sua presença é incômoda e insustentável. De acordo com Sinésio e
Andrade (2002), há três motivos mais incidentes da ida dos velhos para os asilos: a má saúde, a
indigência e a solidão, fatores que comprometem, sobremaneira, a dignidade da pessoa
humana.
Neste cenário, a velhice passa a ser interpretada como algo improdutivo e incapacitante.
Compreende-se que a inclusão e a mobilização dos idosos nas entidades sociais em diversos
setores e o aumento do conhecimento científico facilitarão sua convivência no meio em que
vivem apesar das condições precárias sociais e econômicas por que passa a maior parte da

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população brasileira. É essencial analisar as condições físicas do indivíduo, mas também sua
situação social e emocional com os que o rodeiam, seus anseios, medos, expectativas, desejos. É
preciso vê-lo como único, indivisível; mas também, parte de um mundo, de um grupo social e de
uma família que exercerá influência sobre sua vida e sobre a terapia a que será submetido. Essa
visão global do idoso permitirá devolver ao indivíduo idoso o status de cidadão e a sua dignidade
como pessoa.
Entre as principais características psicológicas do envelhecimento encontra-se a
tendência à depressão, freqüentemente desencadeada pela conscientização das perdas
funcionais e sociais que a senectude carrega consigo. A aposentadoria é, por vezes, o estopim de
grave crise existencial, freqüentemente agravada, e muito, por uma situação familiar complexa e
não preparada para receber, em tempo integral, aquele membro outrora profissionalmente
ativo. Dada a importância da família como órgão de apoio e de saúde, a impossibilidade de o
idoso poder dispor destes recursos poderá levá-lo a situações de morbidade significativa, seja
sob o prisma físico, psíquico ou social. (LEME & SILVA, 1996).
O aumento da proporção de pequenas famílias em detrimento dos padrões de famílias
extensas pode ser apontado como um dos responsáveis pelo abandono, ao lado da mobilidade
dessas famílias bem como dos altos níveis de divórcios e separações. A competitividade, o alto
índice de desemprego e a instabilidade econômica têm feito com que a maioria das famílias exija
dos seus uma colaboração financeira, o que tem levado muitas vezes à rejeição do idoso a não
aceitação de suas limitações, negando-lhe respeito e consideração. A união desses fatores tem
contribuído para que os idosos não possam contar com o apoio familiar durante sua velhice. O
sentimento de solidão também pode conduzir o idoso ao isolamento, de forma que
gradativamente vá deixando de se relacionar com as pessoas.
Para Gatto (1996), com o envelhecer ocorre uma série de perdas significativas: o
surgimento das doenças crônicas deteriorando a saúde, a viuvez, morte de amigos e parentes
próximos, ausência de papéis sociais valorizados, isoladamente crescentes, dificuldades
financeiras decorrentes da aposentadoria que afetam de tal forma a autoestima, culminando, na
maioria das vezes, em uma crise.
Segundo Neri (2014) equiparar velhice com doença, perdas e incompetência
comportamental, e atribuir só ao indivíduo a responsabilidade de dar conta dela, tais fatores
têm efeitos prejudiciais sobre ele, sua família e seu grupo etário. Além de privar dos recursos e
das informações que permitem uma vida digna, dessa forma a sociedade estaria obrigando as
pessoas a conviverem com as consequências, a responsabilidade e a culpa pela má qualidade de
vida que não escolheram ou não construíram sozinhos para si próprios.
O processo de envelhecimento é, geralmente, acompanhado por uma menor
participação em contextos sociais pelo idoso. A aposentadoria, aliada às limitações corporais,
tende a marginalizar o indivíduo, o que contribui para o isolamento do idoso. Mas envelhecer é
continuar a ser alguém com quem outras pessoas podem compartilhar coisas e situações, não
caindo no abismo de um esquecimento imposto pela sociedade que, depois de sugar toda a
vitalidade impõe um ostracismo forçado, um exílio forçado dentro de si.
Há concordância de que as funções cognitivas sofrem considerável declínio quando do
arrefecer da idade, o Sistema Nervoso Central (SNC) tende a se deteriorar ao passar dos anos.
No entanto, estudos clínicos apontam para a ideia de que a prática regular de atividades físicas
pode ser um valioso coadjuvante na melhoria da capacidade cognitiva do idoso. Certo é que, em
razão de experiências cotidianas no campo das idéias subjetivas, percebe-se que diversas
modalidades de atividades físicas e intelectuais tendem a trazer certa melhoria quando do
envelhecimento. Mas é certo, no entanto, que o desgaste físico natural prejudica a

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independência e autonomia na realização das atividades. Neste período são frequentes os
problemas psicoemocionais como solidão, depressão, perdas, problemas familiares, sentimentos
de inutilidade e outros, associados ainda fatores sociais como a desvalorização, marginalização.
O crescimento da população idosa é um fenômeno mundial cujas projeções indicam que,
só no Brasil, a vida média da população alcançará o patamar de aproximado de 81 anos em 2060
(SOUZA, 2013). O fenômeno do envelhecimento da população fez com que a sociedade, nos
últimos anos, valorizasse as pesquisas e intervenções realizadas com o mesmo, refletindo a
necessidade de se aprofundar o conhecimento sobre a última fase do desenvolvimento.
No conhecimento do senso comum compartilha-se a ideia de que a chegada da velhice
traz consigo o declínio cognitivo e, com isso, uma não possibilidade de plasticidade e de novas
aprendizagens. Porém, estudos das neurociências vêm demonstrando justamente o contrário.
Sendo o desenvolvimento um processo contínuo, deve-se tratar a velhice como uma fase
envolta de mudanças e processos inerentes à sua chegada e que, apesar de ser considerada a
última, é também uma fase de possibilidades, de novas aprendizagens, que não
necessariamente carrega consigo, o significado de declínio e prejuízo cognitivo.
Atualmente um novo prisma começa a emergir, dando margem a novas formas de
significado e novas maneiras de se comportar, estudar e intervir com a população idosa. Devido
ao próprio avanço da ciência, com a descoberta de métodos para o tratamento de doenças e
métodos preventivos, a população idosa hoje vive mais. E, como mantê-la saudável, estimulante
e compensadora tanto para o indivíduo, como para a sociedade.
O envelhecimento é um processo que percorre toda a vida do ser humano, iniciando-se
com o nascimento e terminando com a morte, e que acarreta modificações biológicas,
psicológicas e sociais, trazendo ganhos e perdas a cada fase. A velhice é a última fase do
processo de envelhecer humano, onde algumas modificações biológicas que ocorrem são as
morfológicas, reveladas por aparecimento de rugas, cabelos brancos e outras; fisiológicas,
relacionadas às alterações das funções orgânicas; e bioquímicas, diretamente ligadas as
transformações das reações químicas que se processam no organismo. A velhice traz consigo,
ainda, modificações psicológicas que ocorrem quando, ao envelhecer, o ser humano precisa se
adaptar (não diferentemente das outras fases da vida) a cada situação nova do seu cotidiano,
como, por exemplo, a aposentadoria, a independência dos filhos, a aceitação das dificuldades
em se locomover sozinho e a aceitação do corpo.
O envelhecimento é um processo universal que afeta não somente o próprio ser
humano, mas a família, a comunidade e a sociedade. O envelhecimento é um fenômeno de
caráter mundial que acarreta a mudança na pirâmide etária, sua base, representada pelos
jovens, fica estreita, e o topo, que representa a população idosa, tem um aumento. Tal condição
ocorre devido à queda na taxa de mortalidade, o que leva ao aumento da expectativa de vida, e
também às baixas taxas de fecundidade, aumentando o número de idosos e diminuindo o
número de crianças e jovens (CLOSS; SCHWANKE, 2012).
No Brasil, o ritmo de crescimento da população idosa tem sido sistemático e consistente.
Segundo o Censo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2010, a
população de idosos passou a representar 10,8% do povo brasileiro, ou seja, mais de 20,5
milhões de pessoas com mais de 60 anos, isto representa incremento de 400% comparado ao
índice anterior. De acordo com Neri (2014), tal fenômeno, observado na população brasileira,
ocorre em virtude dos avanços da medicina, com novas técnicas de prevenção e promoção de
saúde, bem como a implementação de saneamento básico e avanços sociais e científicos, que
promovem significativa mudança nos hábitos de vida da população.

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Patrícia Verônica N. Carvalho Sobral De Souza e Lucas Gonçalves da Silva

Os dados sobre o envelhecimento no Brasil se apresentam da seguinte forma - de acordo


com projeções das Nações Unidas (Fundo de Populações) “uma em cada 09 pessoas no mundo
tem 60 anos ou mais, e estima-se um crescimento para 1 em cada 5 por volta de 2050” [...] Em
2050 pela primeira vez haverá mais idosos que crianças menores de 15 anos. Em 2012, 810
milhões de pessoas tem 60 anos ou mais, constituindo 11,5% da população global. Projeta-se,
portanto, que esse número alcance 1 bilhão em menos de dez anos e mais que duplique em
2050, alcançando 2 bilhões de pessoas ou 22% da população global. (BRASIL, 2014, online)
De acordo com os indicadores sociodemográficos do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) (2006), o grupo de idosos é atualmente um contingente populacional
expressivo em termos absolutos e de crescente importância na sociedade brasileira, daí
decorrendo uma série de novas exigências e demandas em termos de políticas públicas e
inserção ativa dos idosos na vida social.
O fenômeno do envelhecimento populacional promove a mudança nas estruturas etárias
em muitos países, inclusive no Brasil. O envelhecimento populacional é um dos maiores desafios
da saúde pública contemporânea. Este fenômeno ocorreu inicialmente em países desenvolvidos,
mas, mais recentemente é nos países em desenvolvimento que o envelhecimento da população
tem ocorrido de uma forma mais acentuada.
No Brasil, o número de idosos (≥ 60 anos de idade) passou de 3 milhões em 1960
para 7 milhões em 1975 e 14 milhões em 2002 (um aumento de 500% em quarenta
anos), e estima-se que alcançará 32 milhões em 2020. Mas a diferença entre esses
países está na velocidade em que a população envelhece. Em países como a
Bélgica, por exemplo, foram necessários cem anos para que a população idosa
dobrasse de tamanho (LIMA-COSTA; VERAS, 2003, p.1).

Com relação a cidade de Santos, esta possui uma população de 434.742 habitantes de
acordo com a projeção do IBGE para o ano de 2017, o município apresenta o número de 80.353
idosos. Entre eles, encontram-se os nascidos na própria cidade, bem como aqueles de outros
municípios que se mudaram para Santos após a aposentadoria, atraídos pela boa qualidade de
vida oferecida pela cidade. A Secretaria de Esportes oferece doze unidades de serviço para
prática de atividade física, sete academias ao ar livre e quatro postos de salvamento com
atividades de ginástica (VIDA PLENA, 2015).

4 O ENVELHECIMENTO INCLUSIVO
No Brasil pouco se avançou com relação a elaboração de políticas públicas voltadas aos
idosos. Um marco importante dessa trajetória foi a Constituição Federal de 1988 que trata
explicitamente dos direitos dos idosos no que tange à previdência social, o direito à concessão
de um salário mínimo aqueles idosos que comprovarem a ausência de recursos suficientes para
prover sua existência e de sua família, cuidado e proteção que devem ser assegurados pelos
filhos e a garantia do dever tríade da Família-Sociedade-Estado de defender a dignidade dos
idosos, como se vê:
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
[...]
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e
quaisquer outras formas de discriminação.
[...]
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar,
independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
[...]
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V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de
deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria
manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
[...]
Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os
filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou
enfermidade.
Art. 230. A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas
idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e
bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida.
§ 1º Os programas de amparo aos idosos serão executados preferencialmente em
seus lares.
§ 2º Aos maiores de sessenta e cinco anos é garantida a gratuidade dos transportes
coletivos urbanos (BRASIL, 1988).

Não se pode deixar de mencionar que tal assistência não se limita apenas às
necessidades de subsistência do idoso, mas também ao apoio, cuidado e participação familiar na
vida do idoso. O abandono afetivo, assim, é um dos grandes problemas enfrentados por esta
categoria. O afeto, sem dúvidas, representa um papel essencial para o desenvolvimento do ser
humano, viabilizando o dever de cuidado de pais para filhos e destes com os pais.
Com o advento da figura jurídica do abandono afetivo inverso, consubstanciado na
omissão do dever de cuidado do idoso que atualmente permite a reparação civil perante o
descumprimento deste dever filial-paterno, sendo o instituto da responsabilidade civil o
mecanismo de defesa para concretização dos direitos dos idosos, ainda que sob a forma de
indenização por dano moral (ABANDONO, 2013).
No Brasil, após a Carta Maior de 88, muito se desenvolveu acerca da criação de políticas
públicas sociais direcionadas aos idosos, com ela a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), Lei
8.742/93, e a Política Nacional do Idoso, Lei 8.842/94, em prol da proteção dos idosos. A LOAS é
uma Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada
através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o
atendimento às necessidades básicas a quem necessita (BRASIL, 1993).
Existe ainda a Política Nacional do Idoso (1994); a Política Nacional de Saúde do Idoso
(1999); o Estatuto do Idoso (2003); a Política Nacional de Assistência Social (2004) e mais
recentemente a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (2006). Portanto, no que se refere ao
campo legislativo, o idoso está assegurado constitucionalmente, mas isso não garante a
execução de tais leis.
A Política Nacional do Idoso tem por objetivo assegurar os direitos sociais do idoso,
criando condições para promover sua autonomia, integração e participação efetiva na
sociedade. (BRASIL, 1994). A Política Nacional de Saúde do Idoso tem como diretrizes a
promoção do envelhecimento saudável; manutenção da capacidade funcional; assistência às
necessidades de saúde; reabilitação da capacidade funcional comprometida; capacitação de
recursos humanos; apoio ao desenvolvimento de cuidados informais; e o apoio aos estudos e
pesquisas.
O Estatuto do Idoso por sua vez, é uma legislação contemporânea, que se refere a
proteção assistencial e regulamentação dos direitos da pessoa idosa (SOUSA, 2004), tem por
objetivo consolidar direitos já assegurados na Constituição Federal de 1988, protegendo,
principalmente, o idoso em situação de risco assegurando o direito à vida; à liberdade, ao
respeito, à dignidade; ao alimento; à saúde; à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer; à
profissionalização, ao trabalho; à previdência social; à assistência social; à habitação, ao
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transporte; medidas de proteção; política de atendimento ao idoso, acesso à justiça, entre


outros (BRASIL, 2003).
O Estatuto do Idoso apresenta inúmeros benefícios para a população com mais de 60
anos. Com a finalidade maior de buscar o respeito e a consideração diante da alta mudança que
ocorria no país em relação à perspectiva de vida, em seu Título II, Capítulo II da Lei 10.741/03,
elenca direitos fundamentais mais importantes, in verbis
Art. 10. É obrigação do Estado e da sociedade, assegurar à pessoa idosa a
liberdade, o respeito e a dignidade, como pessoa humana e sujeito de direitos civis,
políticos, individuais e sociais, garantidos na Constituição e nas leis.
§ 1° O direito à liberdade compreende, entre outros, os seguintes aspectos:
I – faculdade de ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários,
ressalvadas as restrições legais;
II – opinião expressão;
III – crença e culto religioso;
IV – prática de esportes e de diversões;
V- participação na vida familiar e comunitária;
VI- participação na vida política, na forma da lei;
VII- faculdade de buscar refúgio, auxílio e orientação.
§ 2° O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica
e moral, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, de
valores ideais e crenças, dos espaços e dos objetos pessoais.
§ 3° É dever de todos zelar pela dignidade do idoso, colocando-o a salvo de
qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou
constrangedor (BRASIL, 2003).

Assim, o Estatuto vem para exigir que o Estado e a Sociedade viabilizem à população
idosa, direitos simples como de ir e vir em espaços individuais e comunitários, proporcionar a
liberdade para expressar suas opiniões, crenças e cultos religiosos, a liberdade para a realização
de esportes e diversões, além da participação na vida familiar, comunitária e política, por fim a
liberdade de auxílio e orientação.
Apesar de avanços, como a aprovação do Estatuto do Idoso, a realidade é que os direitos
e necessidades dos idosos ainda não são plenamente atendidos. Nessa perspectiva, tanto países
desenvolvidos quanto aqueles em desenvolvimento têm aprovado leis e criado estratégias de
ações que garantam um envelhecimento digno e saudável, com um diferencial: nos países em
desenvolvimento, como o Brasil, a existência dessas leis não asseguram que elas sejam
exercidas. (BENEDETTI et al, 2007). O processo de envelhecimento ocorre em um contexto de
condições insuficientes nas áreas de assistência social, saúde, esporte e lazer deste grupo etário
emergente, não sendo necessariamente acompanhado pela melhoria da qualidade de vida
(FREITAS; PY, 2011).
Além disso, com a reforma da previdência o mercado de trabalho será atingido por uma
sobrecarga em relação ao número de idosos aptos a desenvolver funções laborais, o que gerará
a necessidade de novas políticas públicas que incentivem e atendam esse novo público no
mercado de trabalho.
Neste mundo de produção e avanço acelerado, as pessoas passaram a dispor mais do
acesso à informação, e o conceito de pessoa sábia se modificou na mesma velocidade do
surgimento da nova tecnologia: a sabedoria do idoso ficou reduzida a não inclusão de
aprendizagens na área tecnológica.
Mesmo havendo a preocupação atual numa aplicação de novas práticas educacionais
voltadas para os idosos, o sentimento de exclusão ainda permanece. A própria sociedade levou
por gerações a criação do estereótipo da incapacidade de idoso em aprender, acarretando
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problemas sociais e emocionais, como a depressão e a solidão em virtude do seu afastamento
familiar e/ou social.
A inclusão Digital torna-se um instrumento para melhorar a qualidade de vida da
população idosa, visto que a informática favorece uma nova forma de interatividade, interação e
participação no convívio familiar e social. Uma grande parcela das pessoas, incluindo os próprios
idosos, ainda possui a crença, e o preconceito, de que pessoas com mais de sessenta anos têm
mais o que aprender. Essa visão sociocultural, como já foi dito, está passando por modificações
que antes eram somente preestabelecidas aos mais jovens (NASCIMENTO; CAVALCANTI, 2014).
Nesse interim, cabe destacar os jogos digitais como ferramentas de estimulação
cognitiva dos idosos, desenvolvendo nestes a melhora da capacidade de traçar mentalmente
planos antes de executá-los; aprimorando a sua atenção seletiva; aumentando a memória de
trabalho e a flexibilidade às mudanças ocorridas no meio social e o alcance do controle
inibitório, habilidade que possibilite aos idosos obstar respostas inadequadas, adquirindo novos
pensamentos e impulsos contra tentações, hábitos inadequados e maior reflexão de seus atos
(DIAMOIND, 2013; MIYAKE, 2000).
A imersão e a interação proporcionadas pelas novas condições tecnológicas conduziram
o desenvolvimento de uma dinâmica perceptiva baseada na manipulação de formas e de
informação que utilizam o tato, a visão, a audição, originando novos padrões perceptivos e de
sensibilidade. (HABERMAS, 1992).
Na medida em que se intensifica a dependência da tecnologia (eletrodomésticos,
automóveis, computadores), ocorre a dúvida sobre os benefícios trazidos por ela. Muitos não
tiveram suas expectativas atendidas, e assim surgiram a frustração, o relativismo e o nihilismo. A
partir da década de 1960, percebe-se um desencanto da cultura – perda de horizontes, sensação
de caos, incerteza e relatividade - e uma crise de conceitos fundamentais ao pensamento
moderno, como a verdade, a razão, a legitimidade, a universalidade, o sujeito, o progresso. O
efeito da desilusão dos sonhos alimentados na Modernidade se faz presente nas áreas da
estética, ética e ciência. Este desencanto pode ser visto nos diversos campos de produção
cultural, como a Literatura, a Arte, a Filosofia, a Arquitetura, a Economia, etc. (GIDDENS, 1991).
A informática, com o auxílio das ferramentas do computador, em determinados
contextos, facilita uma aprendizagem mais autônoma, no momento que é utilizado como meio
de ensino, processando-se a informação de maneira crítica e reflexiva, trabalhando-se em
grupos e proporcionando uma troca de conhecimento. Dessa forma, a inclusão digital está se
tornando um meio indispensável para que, no futuro, as pessoas não se isolem dessa sociedade
que cada vez mais está se tornando informatizada e exige novos conhecimentos (NASCIMENTO;
CAVALCANTI, 2014).
Diante do crescimento da população idosa, é importante observar como está sendo a sua
inserção e interação com as tecnologias. É importante que os idosos façam uso das tecnologias,
para uma melhor interação com outras pessoas e que não se tornem exclusos da era digital.
Adequar a tecnologia aos idosos é simplificá-la, torná-la interessante e de fácil assimilação; é
apresentá-la de uma forma que instigue a curiosidade sem causar sentimento de impotência ou
frustração.
Além de adaptações de hardware, a inclusão digital do público idoso envolve a ideia de
desenvolvimento de uma nova interface didática e autoexplicativa. O idoso, muitas vezes, não
pretende conhecer o computador e dominar a sua lógica, mas sim se tornar uma parte ativa no
panorama contemporâneo, sentir-se integrado à sociedade e à sua própria família. O fato é que,
independentemente da idade, as novas ferramentas não são uma exclusividade dos jovens.
Baudrillard (1993, p. 14) afirma que:

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O desenvolvimento tecnológico da informação transforma a economia,


caracterizando a cultura atual como sociedade de consumo. O consumo é explicado
pelo sonho que envolve cada signo-mercadoria, relacionando-o com o romantismo,
uma busca imaginária de realização. Vivemos em uma cultura na qual a televisão é
o mundo – somos submetidos a uma torrente interminável de imagens, a um
bombardeamento de signos sem profundidade ou fragmentados, que constituem
um convite ao fascínio estético e à recusa de juízos morais.

A substituição do livro pela tela de TV, a migração da palavra para a imagem, do discurso
para a representação, são fenômenos da Pós-Modernidade. A pós-modernidade é o aspecto
cultural de uma sociedade pós-industrial, massificada e em processo de globalização. Em
paralelo com a aceleração do progresso da produção, dos meios de comunicação, da medicina,
das artes, ocorreram mudanças profundas no pensamento do homem contemporâneo em
relação a si mesmo, a sociedade e a realidade a sua volta. (BAUMAN, 1999).
Na Pós-Modernidade tem-se a sensação de que os tempos se endureceram, estão
cobertos de nuvens escuras. Cresce a insegurança em relação ao que fazer, como por exemplo, a
capacidade de decidir corretamente no exercício da liberdade do livre pensar. Há uma
problematização do conhecimento, cuja dúvida, segundo Bauman (1999, p. 257), desafia o
direito de a ciência validar e invalidar, legitimar e deslegitimar, ou seja, de traçar a linha divisória
entre conhecimento e ignorância. Ele diz que “a consciência pós-moderna é de que não há
nenhuma saída certa para a incerteza; a fuga à contingência é tão contingente quanto a
condição da qual se busca fugir”. Isso causa o que Bauman chama de desconforto e fonte de
mal-estares do pós-moderno.
Para Hal Foster (2002, p. 11), haveria duas espécies de pós-modernismos.
A primeira faz uma crítica à modernidade, desde uma perspectiva
reacionária, na medida em que defende a manutenção do estado de coisas; e outra
espécie, de resistência, que toma a crítica da modernidade como uma forma de
opor-se à manutenção do estado de coisas: “Na política cultural existe hoje uma
oposição básica entre um pós-modernismo que se propõe desconstruir o
modernismo e opor-se ao status quo, e um pós-modernismo que repudia o
primeiro e elogia o segundo: um pós-modernismo de resistência e outro de
reação.”

O pós-modernismo reacionário está articulado a uma espécie de neoconservadorismo,


preocupando-se em resgatar valores de origem, questionados pelo modernismo. De certa forma,
ele repudia o modernismo. Os neoconservadores culpam as práticas culturais do modernismo
pelos males sociais, que chamam de modernização. O pós-modernismo de resistência critica o
modernismo e sua falsa normatividade. Há um interesse pela desconstrução crítica da tradição,
não há nenhum desejo de se voltar às origens. A condição pós-moderna traz a consciência da
incerteza e ambivalência. (BAUMAN, 1999). Surge o fundamentalismo no mundo moderno,
exemplo de ausência crítica, ou um irracionalismo – forma de usar a liberdade para tentar fugir
dela.
No Modernismo, pode se dizer que houve uma crise na identidade, quando, após a
concepção do sujeito no Iluminismo, no qual o indivíduo é dotado de razão, totalmente centrado
e unificado, há a compreensão de que a autonomia deste sujeito não era exatamente como
estava concebida, pois ele também é formado na relação com outras pessoas, desenvolvendo
então a concepção do sujeito sociológico. O sujeito pós-moderno não possui uma identidade fixa
ou permanente; ele se transforma com as mudanças do mundo moderno. O fenômeno da
globalização interfere diretamente no conceito de identidade cultural, sendo que estas
identidades são contraditórias e se cruzam mutuamente.
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Essas tentativas de unificar identidades nacionais (como categorizar por raça e etnia)
mostram-se inválidas, sendo que as nações são culturas híbridas, diferentes, e não estão livres
do jogo de poder, de contradições e divisões internas.
Com a globalização e o deslocamento das identidades culturais nacionais, Hall entende
três possíveis consequências sobre as identidades culturais: ou as identidades nacionais se
desintegram como resultado do crescimento de uma cultura homogeneizada, ou as identidades
nacionais, locais e “particulares” serão reforçadas pela resistência à globalização; ou as
identidades nacionais entrarão em declínio e novas identidades híbridas tomarão seu lugar
(HALL, 1998).
A globalização possibilitou novas posições de identificações, mais políticas, plurais e
diversas, menos fixas e unificadas. As novas identidades ocorrem por meio da intersecção e
negociação das novas culturas, porém isto não implica na perda completa de suas identidades
ou na simples assimilação por elas, mas como resultado de várias histórias e culturas. Há fortes
tentativas de voltar à tradição, buscando fechamento e coesão de identidades.
Dois exemplos podem ser verificados, como o ressurgimento do Nacionalismo na Europa
Oriental e o crescimento do fundamentalismo, que buscou ressurgir o sentimento de etnia
através de uma distintiva pronunciada (xenofobia). No cenário das psicopatologias da vida pós-
moderna, ocorre um conjunto de fenômenos que chama a atenção: esportes radicais, body art,
sadomasoquismo, comportamentos que possuem como denominadores comuns uma
inquietante aproximação da morte e uma perturbadora destruição do corpo. Há uma compulsão
pela repetição e a presença do prazer masoquista.
Silva Junior (2005) procura explicar esse comportamento fazendo uma ligação com os
efeitos da hegemonia da economia sobre o psiquismo no mundo contemporâneo. Ele percebe
que, no mundo pós-moderno, há uma preocupante subordinação da cultura e da subjetividade
ao registro econômico. Nas análises freudianas da cultura, a realidade econômica era outra – ele
atribuía à economia um lugar ao lado das forças do recalcamento da sexualidade, como uma
administração precária de recursos oposta à satisfação de prazeres. A economia de hoje está
ligada ao psiquismo de forma que é vista como uma administração instrumental dos desejos e
prazeres para gerar novas riquezas.
Cabe pontuar que a aprendizagem entre as gerações possui, neste viés, marcante
relevância na inclusão social dos mais velhos. Isto é, o enfoque intergeracional e o fomento da
literacia mediática para as gerações auxilia na promoção do combate ao isolamento social dos
idosos (PATRÍCIO, 2018).
Dessa forma, no contexto atual brasileiro, na elaboração de políticas públicas voltadas ao
idoso, se percebe a adoção de uma ótica neoliberal, na qual o Estado e o setor privado agem
como corresponsáveis pela operacionalização dessas políticas e pela proteção aos idosos,
devendo atuar na redistribuição de ações de proteção e assistência à saúde e social, bem como o
incentivo à participação das esferas pública e privada na promoção dessas políticas em prol do
idoso.

CONCLUSÃO
Inexiste dúvida quanto a urgência em enfrentar os desafios impostos pelo
envelhecimento, por ser um fenômeno inexorável, que exige a consciência da sociedade
brasileira não apenas por sua iminente existência, mas, especialmente, em decorrência dos
resultados que acarreta no desenvolvimento econômico e social futuro do país.

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O crescimento da população idosa no Brasil, além de ser um alerta ao sistema político-


econômico e social, é também um alerta aos gestores das políticas públicas que devem
implementar novas estratégias que viabilizem uma reinserção da população idosa na sociedade.
Decerto, o convívio social deve viabilizar a troca de afeto, experiência, ideias, bem como
estimula o pensar, agir, trocar, etc. As relações interpessoais modernas ocorrem tanto dentro de
uma sociedade quanto de uma cultura, sendo afetadas pela colocação de cada indivíduo na
sociedade e pelos distintos papeis sociais que cada um assume. Dessa forma, o que existe é a
ocupação de cada pessoa, com influência da cultura, em diferentes posições na família, no
mercado de trabalho, em organizações religiosas, etc., possibilitando diferentes interações
interpessoais.
Todavia, estas relações interpessoais, com o avanço tecnológico, se tornam mais
complexas, devido ao uso dos mecanismos de comunicação, em especial, a utilização da
internet, que cria a ampla disseminação de interações e relacionamentos.
Por conta do aumento da expectativa de vida, tem-se tornado cada vez mais importante
a preocupação quanto a este grupo seleto da população. Dessa forma, diante de uma sociedade
líquida, na qual a receptividade dá espaço à crítica, questionando-se e refletindo-se sobre os
atos e porquês das coisas, surge um maior enfoque em estudos referentes ao bem-estar físico,
psicológico e social dos idosos que devem ser garantidos não apenas pelo Estado, mas por toda a
sociedade e a família daquele.
Os fundamentos do Estado Democrático de Direito não se limitam apenas à proteção e
efetivação dos direitos dos idosos a transporte público gratuito e a preferência de atendimento,
vai mais além. O idoso deve ser estimulado a desenvolver sua participação social, não somente
nas relações entre si, mas também nas relações intergeracionais, a fim de proteger,
principalmente, a sua valorização como indivíduo, pleno de dignidade humana que se
consubstancia como um direito fundamental.
Todavia, apesar do tratamento pela legislação brasileira acerca dos cuidados à pessoa
idosa tenha evoluído, ainda resta insuficiente. As políticas públicas direcionadas ao
envelhecimento com dependência e ao cuidado familiar são ainda ineficazes, mormente quanto
ao setor público no exercício de suas funções de proteção e assistência. Tal situação transfere o
papel da seguridade social apenas para as famílias, beneficiando a tendência da reprivatização
da velhice.
As políticas públicas, nesse viés, imputam uma descentralização em relação as
responsabilidades e à participação social no cumprimento das necessidades ocasionadas pelo
envelhecimento, resultando em uma redistribuição de papéis, tornando a família, a sociedade, a
comunidade e o Estado responsáveis pela assistência à pessoa idosa, incentivando, ainda, a
participação dos setores público e privado na atuação dessas políticas.
Ademais, além de políticas voltadas aos idosos, o amparo emocional e afetivo é de suma
relevância para seu desenvolvimento. Dessa forma, diante da necessidade de cuidado dos filhos
para com seus pais e do seu descumprimento, estes podem ser condenados a indenizá-los pelo
Abandono Afetivo Inverso.
Diante do quanto exposto, é de grande importância à valorização do papel social do
idoso, reconhecendo nele, um sujeito capaz de exercer sua cidadania, garantindo-lhe o respeito
à sua integridade física e psicológica. Para tanto, a inclusão desta significativa parcela
populacional no convívio social, através de políticas públicas específicas se torna uma função
indispensável para a sociedade em processo de envelhecimento de seus cidadãos.

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NOTAS

1
Corresponde a pessoas da faixa etária a partir dos 60 anos consoante a Organização Mundial da Saúde (OMS).

127 | Revista do Programa de Pós-Graduação em Direito da UFBA,e-issn 2358-4777, v. 29, n. 02, p.109-127, Jul-Dez 2019

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