As Regras para Namorar - Penelope Ward e Vi Keeland
As Regras para Namorar - Penelope Ward e Vi Keeland
As Regras para Namorar - Penelope Ward e Vi Keeland
qualquer forma ou por qualquer meio, incluindo fotocópias, gravação ou outros métodos
mecânicos ou eletrônicos, sem a permissão prévia por escrito da editora, exceto no caso de
Crash!
Merda. Billie e eu olhamos um para o outro. Um sorriso diabólico se
espalhou em seu rosto… e então, ela se virou e saiu correndo.
Olhei em volta. A barra parecia estar limpa, então corri o mais rápido que
pude, empurrando um carrinho transbordando de coisas. Billie passou a última
hora e meia escolhendo coisas e mostrando-as para mim. Se eu concordasse, ela
as lançava para trás por cima do ombro para que eu tentasse capturar com o
carrinho. Eu ziguezagueava, tentando aparar todas as mercadorias que ela
jogava enquanto a seguia pelos corredores, rindo como duas crianças o tempo
todo. Isso até eu errar seu último lançamento e deixar uma tigela de vidro se
estilhaçar no chão.
A IKEA era um labirinto gigantesco, e nós dois continuamos correndo,
virando à esquerda e à direita, até finalmente chegarmos à seção de produtos de
armazém da loja, que ficava logo antes da fila do caixa. Billie curvou-se para
frente, apoiando as mãos nos joelhos, ofegando.
— Acho que nos livramos — ela disse.
— Tenho quase certeza de que preferiria pagar pela tigela de doze dólares a
sair correndo assim. Esse carrinho está tão cheio que quase virou tipo umas dez
vezes.
Ela riu.
— Já pegamos tudo que precisamos?
— Não sei. Mas com certeza pegamos um monte de merda que não
precisamos. Por exemplo, acho que poderíamos ter deixado as casquinhas de
sorvete motorizadas que giram sozinhas. O inquilino pode muito bem lamber
seu próprio sorvete.
Billie abriu um sorriso largo.
— São para mim e Saylor. E elas também acendem luzinhas!
Soltei uma risada pelo nariz.
— Venha, vamos passar logo no caixa antes que eu fique completamente
falido.
Enquanto colocávamos tudo na esteira do caixa, acenei com o queixo em
direção ao restaurante de dentro da loja, localizado logo depois dos caixas.
— Ainda está a fim de comer almôndegas?
— Hã… dã! Foi só por isso que vim.
Coloquei uma mão sobre o peito.
— Ai, essa doeu. E eu aqui pensando que você tinha vindo pela companhia.
Após passarmos e pagarmos tudo, empurrei o carrinho até uma mesa para
dois em um canto do restaurante.
— Que tal você ficar aqui com as coisas? Vou pegar almôndegas para nós.
— Ok. Mas você pode me trazer uma bebida também? Estou morrendo de
sede.
Quando voltei, coloquei dois pratos grandes de almôndegas sobre a mesa.
— Você esqueceu as bebidas? — Billie perguntou.
Sorri e ergui um dedo.
— Na verdade, não. Eu as trouxe. — A mochila que eu havia levado para a
academia mais cedo esteve na parte de baixo do carrinho desde que entramos na
loja. Pegando-a, abri o zíper e comecei a retirar coisas de dentro. — Vinho,
madame? — Segurei a garrafa de merlot sobre um braço, mostrando o rótulo
como um maître.
Billie deu risada.
— Você trouxe vinho? Estranhei mesmo quando você trouxe a mochila para
dentro da loja. Mas imaginei que fosse porque a sua carteira estava nela e tal.
Dei de ombros.
— Que escolha eu tinha? Você não quer sair comigo, então tenho que
aproveitar ao máximo o nosso não-namoro na IKEA.
Retirei duas taças de vinho de plástico da mochila, guardanapos brancos de
tecido e um candelabro com uma vela vermelha.
Billie pegou a vela e a examinou antes de erguer uma sobrancelha.
— Vela com cenário de vilarejo no inverno?
Dei de ombros.
— São velas de Natal. Eu só tinha uma hora para sair de casa com uma
criança de quatro anos. Não me julgue.
Os olhares que recebemos das pessoas à nossa volta enquanto comíamos
almôndegas à luz de vela foram bem cômicos. Eu também tinha quase certeza
de que era contra as regras acender uma chama assim na IKEA, assim como
abrir uma garrafa de vinho, mas, evidentemente, as pessoas atrás dos balcões
não haviam lido o livro de regras para ter certeza. De qualquer forma, o sorriso
de Billie fez tudo valer a pena. Após terminarmos de comer, apaguei a vela e
comecei a guardar as coisas.
— Sabe… — Billie balançou a cabeça. — Eu acho que você fez esse
encontro de não-namoro virar um encontro de namoro.
Coloquei a rolha de volta na garrafa de vinho e fechei o zíper da mochila.
— Não fiz, não.
Ela estreitou os olhos para mim.
— Tenho quase certeza de que fez, sim. Qual é a diferença entre o que
acabamos de fazer e um encontro de namoro? Nós comemos à luz de vela com
vinho e guardanapos de pano.
Inclinei-me e sussurrei em seu ouvido:
— A diferença é que você não vai gozar no final.
Quando me afastei, Billie estava de queixo caído. Adorei vê-la tão afetada.
Ela engoliu em seco.
— É assim que todos os seus encontros de namoro terminam?
Balancei a cabeça lentamente.
— Não, mas pode apostar que o nosso terminaria.
Após sair da casa de Deek, decidi descer pelas escadas, para que assim eu
tivesse que passar em frente ao apartamento de um certo alguém no caminho.
Meu cérebro me disse que eu precisava fugir do local, mas, aparentemente,
meus pés estavam dando ouvidos a outra parte minha, porque, em vez de
fazerem o que deveriam e continuarem a seguir para a saída, eles me fizeram
parar em frente ao apartamento de Colby.
Devo bater?
Havia tantos motivos pelos quais bater seria uma má ideia. Para começar, já
estava um pouco tarde. Saylor provavelmente estava dormindo, e eu poderia
acordá-la. Mas seria bom vê-lo. Dar um oi. Aff. Por que eu não conseguia
simplesmente erguer a droga da minha mão e bater à porta? Ergui a cabeça e
olhei para o teto, soltando uma respiração profunda. Em seguida, comecei a
andar de um lado para o outro, ainda ponderando se batia ou ia embora. Uma
mulher saindo de seu apartamento sorriu para mim, e eu acenei para ela
desconfortavelmente.
Devia fazer uns dez minutos que eu estava rondando feito uma idiota,
falando sozinha e continuando a andar de um lado para o outro, quando a porta
de Colby se abriu. Ele coçou a cabeça.
— Billie?
— Oh! — Fingi uma risada e ignorei meu coração acelerado. — Oi, Colby.
Ele estava vestido casualmente, com uma calça jeans e um moletom preto
com capuz. Estava um gato. Mas quando ele não estava um gato?
Sua expressão estava preocupada.
— Está tudo bem?
Passando uma das mãos pelo cabelo, expirei.
— Sim. Claro, por que não estaria?
— Bem, para começar, minha vizinha me ligou e disse que tinha uma mulher
estranha do lado de fora da minha porta falando sozinha. Então, espiei pelo
olho-mágico, e aqui estava você. Isso foi há vários minutos. Eu não queria
interromper o que quer que você estivesse ruminando. Mas então, chegou a um
ponto em que eu não aguentei mais. — Ele inclinou a cabeça. — O que você
está fazendo?
Minha boca se abriu e fechou algumas vezes.
— Honestamente… eu estava debatendo se batia ou não.
— Imaginei. Mas por quê?
Expirei.
— Você acreditaria se eu dissesse que não queria acordar Saylor?
— Provavelmente não. — Ele sorriu. — Mas, quer saber? Fico feliz que
esteja aqui, e depois de todo o tempo que investiu aqui fora, acho que você
deveria entrar. — Ele olhou para trás por cima do ombro. — Além disso, você
vai ficar muito feliz em saber que estou fazendo uma coisa nada sexy e muito
apropriada para um encontro de não-namoro, então você não tem que se
preocupar com a possibilidade de as coisas ficarem animadas demais por aqui.
Ao entrar no apartamento, notei imediatamente a montanha de roupas limpas
no meio da sala. Tinha praticamente um metro e meio de altura, uma explosão
de tons pastel misturados com cores masculinas, vestidos misturados com
camisas de colarinho, toalhas cor-de-rosa misturadas com pretas.
— Eu interrompi a sua noite de lavar roupa. É melhor eu ir…
— Está brincando? Foi a melhor interrupção de todas, acredite.
Sentei-me no chão ao lado da pilha e comecei a dobrar. Ele ergueu a mão.
— Ei. O que está fazendo? Você não precisa fazer isso.
Olhei para cima.
— Na verdade, eu adoro dobrar roupas. Acho tão relaxante sentir os tecidos
quentinhos contra meu rosto, parar para sentir o cheiro fresquinho, focar em
dobrar da maneira certa. É como uma meditação sensorial. — Peguei um item
aleatório e, levando ao nariz, inspirei profundamente.
— Você sabe que isso aí é a minha cueca, não é?
Congelei. Merda.
— Mas não se intimide, pode continuar. É sexy. E pode mandar ver
relaxando, se gosta mesmo de dobrar e cheirar roupas. Ter uma sessão de
meditação de última hora com você é algo que nunca vou recusar.
Senti meu rosto esquentar.
— De qualquer forma, ela está com um cheiro muito bom. — Dobrei a cueca
boxer e a coloquei de lado.
Ele deu risada, juntando-se a mim no chão diante da pilha.
— Essa é uma mudança de ritmo muito agradável. Normalmente, ligo a TV
e deixo em um volume baixinho para passar o tempo, mas claro que prefiro
olhar para você.
— Com que frequência você lava roupas, exatamente? Porque isso é…
muita coisa.
— Uma vez por mês, talvez?
— É, dá para ver.
Ele podia ser pai, mas também era um solteirão típico em muitos aspectos.
Ficamos dobrando roupas juntos por vários minutos e, então, percebi que ele
estava olhando para a parte interna do meu antebraço direito. Enquanto meu
braço esquerdo era completamente coberto de tatuagens, o outro tinha apenas
uma. Era uma chave vitoriana.
— Essa tem um significado especial? — ele perguntou. — Notei que está
completamente sozinha.
Sorri e estendi o braço.
— Tem, sim. A minha avó usou essa chave pendurada no pescoço depois
que o meu avô morreu. Ele era do exército, e eles se conheceram enquanto ele
estava de licença uma vez. Essa chave abria o baú dele, onde ele guardava tudo
que lhe era importante. No final do primeiro encontro, ele disse a ela que não
precisava mais do baú, porque a coisa mais importante que poderia ter estava
bem diante dele. Eles eram casados há 51 anos quando ele morreu. E quando
minha avó faleceu, há dois anos, nós a enterramos com a chave.
— Uau. Isso parece algo que Rose, do filme Titanic, faria.
Dei risada.
— Estou surpresa por você saber quem é Rose de Titanic. Mas, sim, parece
mesmo.
Colby ficou quieto por alguns minutos. Parecia perdido em pensamentos.
Então, fiz uma bola com um par de meias e atirei nele.
— No que você está pensando aí?
— Nada.
— Mentiroso.
Ele sorriu.
— Acho que só estava pensando em como a presidente do Clube Nenhum
Homem Presta tem, na verdade, um coração romântico.
— Não tenho. É só uma tatuagem.
Ele sustentou meu olhar e sorriu.
— Aham, sei.
Então, ele me surpreendeu ao mudar de assunto.
— Você já comeu? — perguntou.
Coloquei uma calça perfeitamente dobrada à minha direita.
— Na verdade, jantei com Deek há algumas horas.
— Há algumas horas? Bem, você deve estar ficando com fome de novo. Vou
pegar um lanche para você.
— Não sou uma criança de três anos. Isso não é necessário.
— Você é uma convidada na minha casa. — Ele se levantou. — É, sim,
necessário eu te oferecer alguma coisa. Quer vinho?
— Não, obrigada. Bebi um pouco no jantar.
Colby foi para a cozinha antes de retornar com algumas coisas que me
fizeram sorrir.
— Por essas bandas, o que não faltam são lanches infantis. Imaginei que, já
que você gosta de biscoitos Goldfish, podia gostar disso também.
Ele colocou um pequeno pacote de biscoitos Lunchables diante de mim,
junto com uma caixinha de suco de uva.
— Você me conhece tão bem. Isso é perfeito. — Dei risada. — Vou aceitar,
sim. — Abri o pacote, coloquei uma das pequenas fatias de queijo sobre uma
bolacha e pus na boca. — Pensei que você fosse me trazer um brownie de
espinafre.
Ele se levantou novamente.
— Tenho também. Quer?
Dei risada.
— Não. Sente-se. Isso é mais do que suficiente.
Colby voltou a se sentar no chão e ficou me observando atentamente devorar
o lanche, como se me assistir comendo fosse algum tipo de esporte que ele
curtia ver.
— O que foi? — finalmente perguntei, com a boca cheia.
— Desculpe. Eu gosto de olhar para você, observar o jeito como lambe o
canto da boca de vez em quando. Até o jeito que você come é único. É fofo.
— Bom, você ainda não me viu comer costeletas. Porque não há nada de
fofo nisso. — Tomei um gole de suco.
— Nota: descobrir um jeito de levar Billie a uma churrascaria, só para que
eu possa testemunhar isso.
— Não deixe de levar lencinhos, então.
Depois que terminei o lanche, me levantei e descartei o lixo. Em seguida,
voltei a dobrar roupas. Estávamos finalmente começando a diminuir a pilha.
— Não vou encontrar a calcinha de uma mulher aleatória nessa pilha, vou?
Ele balançou a cabeça.
— Não vai encontrar calcinhas aqui a menos que tenham personagens da
Disney estampados nelas em tamanho infantil. — Ele abriu um sorriso largo ao
separar pares de meias. — Ah, por falar em roupas íntimas, tenho que te fazer
uma pergunta séria.
— Ok… — eu disse, sacudindo uma das camisas de Colby para desamassá-
la.
— Qual é a dos espartilhos? — ele indagou, descendo o olhar para meu
peito.
Olhei para a minha camisa xadrez aberta.
— Por que eu os uso o tempo todo?
— Sim.
— Eu os acho favoráveis. Eles empurram tudo para dentro nos lugares certos
e enfatizam as coisas certas. É o estilo que escolhi para ser a minha marca
registrada, eu acho. — Ergui as sobrancelhas. — Por quê? Você tem algum
problema com eles?
Ele mordeu o lábio inferior e assentiu.
— Tenho.
— É mesmo?
— O problema é que eles fazem ser muito difícil não encarar. Os seus
espartilhos estão se tornando meu ponto fraco. Assim como você está se
tornando meu ponto fraco. — Ele baixou o tom de voz. — Mas finja que não
ouviu isso, porque isso deveria ser apenas um encontro de não-namoro tedioso
dobrando roupas e nada mais.
Até mesmo fazer a coisas mais mundanas com Colby parecia… mais. Não
era nada tedioso. E agora eu estava pensando no que ele tinha acabado de dizer
sobre os meus espartilhos. Balancei a cabeça para focar novamente na tarefa.
— Tem algo muito prazeroso em dobrar as roupas de outra pessoa.
— Sendo assim, você é sempre bem-vinda para dobrar as nossas quando
quiser. Só não fique do lado de fora por quinze minutos antes disso.
Dei risada.
— Você não vai me deixar esquecer disso, não é?
— Sabe quantos bebês nasceram nesse mundo durante o tempo em que você
ficou do lado de fora da minha porta debatendo se entrava ou não?
— Sua vizinha deve ter pensado que eu era uma investigadora ou algo assim.
— Ela não soube o que pensar.
— Acho que é legal ter vizinhos que tomam conta de você. Sabe, caso uma
maluca qualquer apareça à sua porta. — Sacudi uma toalha. — O que você disse
a ela?
— Bom, assim que espiei pelo olho-mágico e vi que era você, fui para o
outro lado do apartamento para que você não me ouvisse e disse a ela que a
garota que estava à minha porta era, na verdade, uma pessoa pela qual tenho
uma queda enorme e que você estava longe de ser louca. Disse a ela que você
provavelmente só estava apreensiva quanto a bater à porta por causa do rumo
que isso poderia tomar… porque seria muito mais do que somente bater a uma
porta. Seria uma batida figurativa, como bater a uma porta que se abriria para
um mundo de possibilidades que são, ao mesmo tempo, assustadoras e
empolgantes.
— Você disse mesmo tudo isso à sua vizinha?
— Não. — Ele me lançou uma piscadela. — Eu disse “Obrigado por me
avisar. Vou cuidar disso”.
Joguei uma cueca na cabeça dele. E então, olhei com mais atenção. Essa
cueca em particular parecia muito… pequena.
— Essa não é um pouco pequena para você? — Dei risadinhas.
Ele gargalhou.
— É muito pequena para mim.
— Então, por que você a usa?
Ele a ergueu com as duas mãos.
— Minha mãe me trouxe uma coleção de cuecas do Brasil. Ela fez uma
viagem para lá no verão passado. Trouxe um tamanho médio masculino, mas
elas encolheram depois que as lavei e sequei. Então, são basicamente
descartáveis. Não consigo usá-las mais de uma vez. Depois de lavá-las, eu as
doo ou algo assim. Acho que essa aí devia ser a última do pacote.
— Fiquei um pouco assustada, por um momento — provoquei.
Ele arregalou os olhos.
— Acredite, não há nada de minúsculo em relação a mim. Sinto a
necessidade de esclarecer isso, já que, de acordo com seus limites, não é algo
que poderei provar.
O sorriso perverso que ele abriu me fez estremecer por dentro. Esse homem
tinha um efeito enervante sobre mim. E a cada momento que passava, ficava
mais difícil fingir que isso não significava nada.
— Brincadeiras à parte sobre a minha cueca encolhida, Billie, eu não te
culpo pela sua hesitação comigo. Espero que saiba disso. Acho que, se eu
estivesse no seu lugar, ficaria hesitante também. — Ele deixou a cueca de lado.
— E, sabe de uma coisa? Não há nada de errado em se ter cautela.
Especialmente quando há mais de duas pessoas envolvidas nesse cenário. Eu
entendo. De verdade. — Seus olhos se demoraram nos meus, sua expressão
séria. Ele pigarreou. — Enfim, essa deve ser a noite mais chata que você já teve
com um cara, não é?
— Na verdade… esse é o melhor encontro de não-namoro que já tive.
Seus olhos cintilaram.
— Eu também. Gosto dos nossos encontros de não-namoro.
Após mais meia hora, finalmente chegamos ao final da pilha. Agora, tudo
estava perfeitamente dobrado, e colocamos as pilhas de roupas separadas nas
cestas que ele tinha ali. Enchemos quatro delas.
Olhei em volta da sala.
— Isso é tudo? Não tem mais nada para dobrar?
— Quem me dera. — Ele deu risada. — Como eu disse, costumo
procrastinar a lavagem de roupas até o último minuto. Na verdade, um dos
motivos pelos quais minha filha tem calcinhas de todas as princesas da Disney
que existem é eu ser conhecido por simplesmente comprar mais calcinhas para
ela só para não ter que lavar roupas. Não ajuda o fato de que Saylor vive
derramando coisas tanto nela quanto em mim, então trocamos de roupas várias
vezes em um dia, de vez em quando. Ainda tenho outra leva de roupas na
secadora e mais uma leva que ainda precisa secar.
— Bem, me mostre o caminho. Vamos cuidar logo de tudo esta noite. Não
sou de desistir.
Me levantei e o segui até a lavanderia, que era uma área minúscula e estreita
logo depois da cozinha. Após nos espremermos no espaço apertado, nossos
corpos ficaram tão próximos que eu podia praticamente senti-lo sem nem ao
menos tocá-lo. Minha respiração acelerou, e eu sabia por quê. Eu queria que ele
me beijasse. Seus olhos desceram para meus lábios, e parecia que não havia
mais volta.
Um segundo depois, um zumbido alto me arrancou do transe. A secadora
tinha desligado.
— Merda. — Ele fechou os olhos. — Eu geralmente tento desligá-la antes
que isso aconteça.
— Saylor vai acordar? — perguntei, levemente sem fôlego.
— Ela tem o sono bem pesado, então acho que não.
Sentindo-me um pouco desconcertada, não somente pelo som da secadora,
mas pelo fato de que eu havia vacilado na minha determinação, tomei uma
decisão impulsiva.
— Quer saber? Eu não tinha me dado conta do horário. Está ficando tarde, e
tenho um cliente amanhã bem cedo. É melhor eu ir para casa. Você acha que dá
conta do restante sozinho?
— Com certeza. — Ele assentiu, provavelmente lendo nas entrelinhas. —
Vou chamar um carro de aplicativo para você.
— Não precisa fazer isso.
Ele pegou o celular.
— Eu insisto.
O carro chegou em dois minutos, menos do que a quantidade de tempo que
levamos para levar as roupas limpas da secadora para a sala de estar.
Colby me deu um abraço de despedida e senti os músculos rígidos de seu
peito pressionando meus seios, lembrando-me exatamente de por que eu tinha
decidido ir embora mais cedo.
No entanto, o caminho para casa foi qualquer coisa, menos monótono.
Porque, cinco minutos depois de eu entrar no carro, meu celular apitou com uma
notificação. Colby tinha me enviado uma foto, junto com a mensagem:
Caso você ainda tenha alguma dúvida em relação ao meu tamanho de
cueca.
Meu queixo caiu. Aquilo poderia ser um anúncio da Calvin Klein. Colby
estava de frente para um espelho de corpo inteiro usando só uma cueca boxer
cinza. Seu peito lindo e torneado e abdômen sarado estavam totalmente à
mostra, assim como a linha fina de pelos que desaparecia dentro da cueca. E
vamos apenas dizer que o volume proeminente diante de mim naquele momento
não caberia mesmo naquela cuequinha vermelha. Meu Jesus Cristinho. Ele era
muito mais gostoso do que eu havia imaginado.
E agora, eu estava novamente pensando que talvez ele não fosse mesmo um
cara tão bonzinho, afinal… porque estava claramente tentando me matar.
— Muito bem, estamos todos de acordo? — Owen olhou para todos à mesa.
— Vamos aprimorar o sistema de climatização com o dinheiro que temos na
conta e adiar as reformas do telhado até o ano que vem?
Ergui minha cerveja.
— De acordo.
Owen virou-se para Holden e Brayden.
— E vocês, rapazes?
Os dois deram de ombros, como de costume. Eles tendiam a concordar com
o consenso do grupo.
— Tudo bem, por mim — Holden disse.
— Também — Brayden opinou.
Owen inclinou-se para frente e ergueu sua cerveja no meio da mesa em um
brinde.
— Então, a reunião da diretoria desse mês está oficialmente encerrada.
Agora, é hora de beber.
Batemos nossas garrafas de cerveja umas nas outras.
Toda segunda sexta-feira do mês, nós quatro nos reuníamos para discutir os
assuntos do prédio e tomar decisões. Tecnicamente, nossas reuniões eram
consideradas reuniões de acionistas por sermos uma corporação, mas
considerando que sempre as fazíamos em um bar e tínhamos que gritar por cima
do som de bandas tocando, estavam mais para uma noitada com os caras.
Holden ficou de pé. Ele colocou as mãos em concha em volta da boca para
falar por cima da música.
— O que vai ser esta noite, garotos? Tequila ou uísque?
Eu preferia cerveja, mas a implicância que eu receberia se não participasse
não valia a pena. Os outros caras disseram tequila, então dei de ombros.
— Tequila, então.
Como de costume, revezamos para ir ao bar buscar uma rodada de shots e
pegar a conta. Na quarta rodada, fiquei feliz por sermos apenas quatro, porque já
estava sem sentir dor alguma.
Holden apontou para a banda.
— Sou amigo desses caras. Quando falei com eles mais cedo, me
convidaram para ir tocar uma música com eles. Acho que vou aceitar o convite.
— Ele gesticulou para uma mesa com quatro mulheres que haviam chegado
havia pouco tempo e estavam perto do palco. — Vou fazer algumas amigas para
nós também.
Fazer amizade com mulheres nunca foi um problema para Holden. A
caminho de se juntar à banda, ele parou diante da mesa das mulheres e, em um
minuto, conseguiu fazê-las rirem e sorrirem.
Quando finalmente saiu da mesa delas, ele falou com a banda, e o baterista
se levantou. Holden sentou-se diante da bateria e pegou o microfone. Ele girou
uma baqueta na outra mão antes de apontá-la para as mulheres com quem tinha
acabado de conversar e abriu seu sorriso preguiçoso de sempre.
— A próxima música é dedicada à minha nova amiga, Nikki.
Dei risada quando eles começaram a tocar a música antiga de Van Halen,
Hot For Teacher, e inclinei-me para Owen.
— Acho que sabemos qual é a profissão da Nikki.
— Não brinca. — Ele balançou a cabeça. — O cara sempre tem uma música
para conseguir qualquer mulher.
Um minuto depois, o celular de Owen vibrou. Ele olhou para a tela e franziu
a testa.
— É do escritório. Vou atender lá fora para poder ouvir melhor.
— Tudo bem. — Assenti.
Owen voltou dez minutos depois, no mesmo instante em que Holden
retornou à mesa.
— Desculpe, pessoal, mas preciso ir. Tenho uma emergência no escritório —
Owen disse.
— O quê? Nós acabamos de chegar. — Holden apontou para a mesa de
quatro mulheres. — Aquelas moças acabaram de nos convidar para nos
juntarmos a elas e nos compraram uma rodada de shots. Elas são quatro. Você
não pode ir embora, cara.
Owen deu tapinhas no ombro de Holden.
— Tenho fé de que você consegue dar conta de duas, amigão.
Eu não estava muito a fim de me juntar a elas, mas não queria ser chato,
então fui com os caras. Ia somente tomar uma cerveja e encerrar a noite.
Mas, no fim das contas, as mulheres eram todas muito legais ― alguns anos
mais novas que nós, mas bonitas e extrovertidas. Estranhamente, as quatro eram
amigas desde criança, assim como nós, o que era bem maneiro. Nikki, a loira
com a qual Holden estava se dando bem, era professora e tinha acabado de ser
efetivada, então elas estavam comemorando. Após cerca de meia hora, Brayden
disse que tinha que ir, assim como uma das mulheres, então deduzi que era o
momento perfeito para ir embora também. Mas assim que eu estava prestes a
fazer isso, Nikki sugeriu que nós cinco que restamos fôssemos para sua casa.
— Acho que vou encerrar a noite por aqui — eu disse. — Eu tenho uma
filha. Ela está na casa dos meus pais esta noite, mas tenho que levantar cedo
amanhã e ir buscá-la.
— Você disse aos seus pais que ia buscá-la às dez horas. Eu estava lá quando
eles a buscaram, lembra? — Holden falou. — E eles te disseram que não havia
pressa. Qual é… não seja bundão.
— Meu apartamento fica virando a esquina — Nikki revelou. Ela inclinou a
cabeça. — Venha tomar ao menos uma bebida.
Quatro anos atrás, quem estaria implorando ao meu parceiro para não furar
era eu. E o único motivo pelo qual eu não estava a fim de ir era por uma
lealdade a Billie… uma mulher que não queria namorar comigo. Contudo,
ultimamente, eu vinha sentindo que ela estava começando a mudar de ideia, e
não queria estragar isso.
Holden colocou um braço em volta dos meus ombros.
— Uma bebida. Ela mora virando a esquina.
Cedi.
— Tudo bem. Só uma bebida.
Aff. A luz que entrava pela janela formava um feixe que pousou diretamente
em meus olhos. Ergui a cabeça e tentei juntar um pouco de saliva na boca para
poder engolir, mas tudo que minha língua encontrou foi um gosto horrível.
Alguma coisa tinha morrido na minha boca na noite anterior? Olhei em volta. E
onde diabos eu estava?
Esse com certeza não era o meu banheiro.
Fitei a porta fechada, até que comecei a me lembrar de algumas coisas.
As mulheres de ontem à noite.
Sim, foi isso… nós fomos para o apartamento de alguém depois do bar. O
combinado era apenas uma bebida, mas acabamos tomando várias outras
rodadas de shots. O que aconteceu depois disso estava um pouco confuso e
enevoado na minha cabeça. Enquanto dava uma chance ao meu cérebro de
voltar a funcionar, peguei meu celular do bolso para conferir a hora. Merda. Já
eram oito e meia, e eu tinha perdido um monte de mensagens. Rolei até a
primeira não lida, que tinha chegado à uma da manhã.
Holden: Cara, o que você tá fazendo aí dentro? Venha se juntar à
festa.
A seguinte tinha chegado alguns minutos antes das oito esta manhã.
Billie: Oi. Tenho um cliente às dez horas hoje. Se tiver tempo, dê uma
passada no estúdio. Devo passar um tempinho por lá. Quero falar com
você sobre uma coisa.
Fechei os olhos e balancei a cabeça. Merda.
A mensagem seguinte tinha chegado havia dez minutos e era da minha mãe.
Quando a abri, surgiu uma foto na tela. Minha filha estava sentada à mesa da
cozinha dos meus pais, com a pontinha da língua para fora na lateral de sua boca
como se estivesse se concentrando. Na bandeja diante dela, ela havia formado a
letra P com flocos de cereais Cheerios.
Mamãe: Ela me disse que P era de Papai e fez isso sozinha!
Sorri, mas movimentar meu rosto doeu. Naquele momento, aquele P era de
panaca. Eu precisava de duas aspirinas, uma escova de dentes e um banho,
imediatamente. E precisava que alguém me trouxesse tudo isso enquanto eu
ficava largado no chão. Não sentia a menor vontade de me mover naquele
momento, mas não tinha muita escolha, já que não podia ir buscar minha filha
naquela situação. Ela tinha apenas quatro anos, mas era observadora e com
certeza perceberia que eu estava usando as mesmas roupas da noite anterior.
Então, forcei-me a levantar e vasculhei o armário em busca de uma pasta de
dentes, usando o dedo para escovar os dentes rapidamente antes de me curvar e
beber um monte de água direto da torneira.
Isso me seguraria até eu chegar em casa. Olhei rapidamente no espelho.
Meus cabelos estavam bagunçados com mechas apontando para todos os lados,
e havia baba seca na minha bochecha.
Foda-se. Dou um jeito nisso depois.
Eu não fazia ideia do que estava esperando por mim do outro lado da porta.
Até onde sabia, as mulheres podiam sequer se lembrar de que eu estava no
banheiro, e eu as acordaria e lhes daria um baita susto. Então, entreabri a porta o
mais silenciosamente possível e saí nas pontas dos pés.
O lugar estava quieto, sem corpos à vista, então segui para a porta. Mas,
quando cheguei ao corredor, cometi o erro de olhar para dentro do quarto.
Holden estava dormindo de barriga para cima, todo esparramado na cama,
com o pau e as bolas completamente à mostra. E ele não estava sozinho. Todas
as três mulheres também estavam ali nuas. Uma delas estava aconchegada ao
lado direito dele e com a cabeça repousada em seu peito, e as outras duas
estavam do lado esquerdo dele, fazendo conchinha uma na outra e aconchegadas
nele também. Balancei a cabeça antes de sair.
Porra, só o Holden mesmo.
Do lado de fora, na rua, o sol estava brilhante demais. Estreitei os olhos ao
começar a caminhar. Por sorte, o nosso prédio ficava a apenas alguns
quarteirões de distância. As pessoas iam e vinham pela calçada, todas limpinhas
e prontas para o dia, enquanto eu mantive a cabeça baixa durante minha
caminhada da vergonha.
E era nessa exata posição que eu estava quando virei a esquina e esbarrei em
cheio em alguém.
— Merda, descul… — Minhas palavras ficaram presas na garganta quando
ergui o olhar para ver a pessoa na qual havia trombado.
— Colby?
— Billie, o que você está fazendo aqui?
Ela sorriu.
— Hã… eu trabalho aqui, lembra? A alguns prédios de distância. Estava
indo à lanchonete pegar um café.
— Sim, hã, claro. Desculpe. Não sei o que estava pensando.
Seu sorriso murchou conforme ela me olhou de cima a baixo.
— Você… está indo para casa agora de ontem à noite?
Minha primeira vontade foi mentir e dizer que não, que tinha saído para
fazer alguma coisa. Mas ela estava olhando em meus olhos, esperando uma
resposta, e não pude fazer isso.
— Sim, eu… hã, saí com os caras ontem à noite. Acabei bebendo demais e,
hã, caí no sono, eu acho.
— No apartamento de um dos seus amigos?
Franzi a testa, e a expressão de decepção de Billie foi como um soco no
estômago. Ela balançou a cabeça e ergueu as duas mãos.
— Desculpe. Não quero saber dos detalhes. Tenho que ir, de qualquer forma.
Ela começou a passar por mim, mas eu a detive.
— Billie, espere…
Ela nem ao menos olhava para mim.
— Tudo bem, Colby. Você não me deve explicação alguma. Você é um
homem solteiro. Eu entendo.
Balancei a cabeça.
— Não é o que parece.
— Não? Então, você não acabou de sair do apartamento de uma mulher
depois de passar a noite lá?
— Sim, mas não aconteceu nada.
Ela apertou os lábios.
— Não é da minha conta. E eu preciso mesmo ir pegar logo o meu café antes
que o cliente chegue.
— Me dê apenas um minuto para que eu possa explicar.
Ela inspirou fundo e expirou sem dizer nada. Mas não estava mais tentando
se afastar, então deduzi que deveria começar a falar.
— Os caras e eu saímos para a nossa reunião mensal para discutir sobre os
assuntos de prédio, e depois começamos a beber. Tinham quatro mulheres no
bar que Holden conheceu, e ele queria que fôssemos para o apartamento de uma
delas. Ele ficou me enchendo o saco para ser seu parceiro, então eu fui.
Ela assentiu.
— Ah, entendi. Isso explica tudo.
— Sério?
— Sim. Você passou a noite lá para fazer o seu amigo feliz.
— Exatamente.
— Bem, espero que tenha ao menos usado camisinha.
Ela tentou ir embora novamente, mas a impedi.
— Eu não precisei.
Ela revirou os olhos.
— Que ótimo.
— Quis dizer que não precisei porque não dormi com ninguém. Na verdade,
eu dormi no banheiro sozinho, mesmo com a chance de fazer sexo a três.
No instante em que as palavras sexo a três saíram da minha boca, eu soube
que tinha sido burrice.
As bochechas de Billie ruborizaram.
— Você deveria ter parado de falar enquanto ainda estava com vantagem,
Colby. — Ela começou a andar novamente.
Dessa vez, segurei seu braço.
— Espere. Não quero te deixar chateada.
Ela franziu a testa e olhou para o chão.
— Não estou.
— Billie, olhe para mim.
Respirando fundo, ela ergueu o olhar para encontrar o meu. O que vi me
deixou com um aperto no peito. Ela parecia tão magoada.
— Nada aconteceu. Eu juro.
Ela olhou para minha mão em seu braço e, em seguida, novamente para meu
rosto. Seus olhos marejaram.
— Me solte, por favor.
Eu a soltei imediatamente e dei um passo para trás, erguendo as mãos.
— Desculpe. Posso te ligar mais tarde?
— Claro.
Ela saiu andando e não olhou para trás.
Merda. Isso não é nada bom.
— Então, Colby, me conte sobre você. — Minha mãe levou sua taça de
vinho aos lábios perfeitamente pintados de vermelho e tomou um gole. — Com
o que você trabalha?
— Sou arquiteto.
— Oh, é uma profissão maravilhosa. Ela oferece um espaço para a sua
criatividade e, ao mesmo tempo, provê estabilidade. Eu queria tanto ter
conseguido convencer Billie a seguir por esse caminho.
— Meu estúdio de tatuagem é muito bem-sucedido, mãe — falei entre
dentes.
Ela balançou a cabeça.
— Sim, mas a clientela que você atende…
— É muito mais divertida do que a clientela que você atende.
Minha mãe sorriu e virou sua atenção novamente para Colby.
— Como vocês se conheceram? É tão raro a minha filha trazer alguém para
me conhecer. Espero que não se importe com tantas perguntas.
Colby foi simpático.
— Nem um pouco, pode perguntar. Billie e eu nos conhecemos no estúdio
de tatuagem dela. Sou o senhorio do prédio onde ele fica, na verdade, e fui até lá
para me apresentar. — Ele olhou para mim com uma faísca nos olhos. — Ela
estava dando uma pequena festa quando cheguei.
Ergui minha taça de champanhe para cobrir meu sorrisinho.
— Sim, e eu dei um presente especial ao convidado de honra.
Minha mãe pareceu alheia à nossa troca. Estava ocupada demais focando em
uma palavra que Colby havia dito.
— Senhorio! — Seus olhos se iluminaram. — Um imóvel em Manhattan na
sua idade? Que impressionante.
— Não é tão empolgante quanto parece — Colby disse. — Tenho três
sócios.
— Me parece que você está sendo modesto. Colocar a vida nos trilhos é
metade da batalha. — Ela olhou para mim. — Talvez você possa passar um
pouco da sua sensatez para a minha filha, e ela pare de se rebelar contra mim
mutilando seu corpo com tinta e andando com gente ordinária.
O músculo da mandíbula de Colby flexionou, e pude ver seu rosto ficando
vermelho.
— Duvido disso. Porque eu acredito em encorajar as pessoas a fazerem o
que amam. Também conheci algumas das pessoas com quem ela anda, e não há
nada de ordinário nelas. Elas são leais e protetoras com a sua filha, exatamente o
tipo de pessoas que eu gostaria que estivessem perto de quem eu amo.
Minha mãe suspirou.
— Ela leva um estilo de vida abaixo de seu nível.
Colby balançou a cabeça.
— Espero que me perdoe por dizer isso, mas estamos aqui há cinco minutos
e você insultou a Billie quatro vezes. Na minha experiência, quando alguém
julga os outros pela aparência ou pelo trabalho, o problema raramente está na
pessoa alvo do julgamento. Está nas inseguranças da pessoa que julga.
Minha mãe piscou algumas vezes, claramente chocada por alguém ter tido a
coragem de falar assim com ela. Mas então, se recuperou e exibiu seu melhor
sorriso falso.
— Aproveitem a exibição. Foi um prazer conhecê-lo, Carter.
Fiquei de queixo caído enquanto ela se afastava.
Colby balançou a cabeça.
— Me desculpe. Eu não deveria ter dito aquilo.
— Está brincando? Aquilo foi sensacional pra caralho!
— Você não está brava?
— Brava? Eu poderia te beijar agora.
Ele abriu um sorriso enorme.
— Você deveria ouvir os seus instintos.
Dei risada.
— Sério, aquilo foi perfeito, Colby. Ela não estava esperando por isso, e
você disse tudo sem aumentar o tom de voz ou causar uma cena.
— Honestamente, achei que você tinha exagerado nas poucas vezes em que
mencionou a sua mãe antes.
— Quem me dera. — Prendi meu braço ao de Colby. — Mas vamos tentar
esquecê-la. Vamos, estou vendo o Devin, meu mentor. Ele acabou de chegar. Eu
te contei sobre ele. Foi a pessoa que fez eu me interessar pela arte de tatuar e de
quem fui aprendiz. Quero apresentá-lo a você.
Depois que passamos um pouco de tempo conversando com Devin, levei
Colby pelo salão para ver as obras de arte. Caminhamos pelo lugar, parando
diante de cada obra. Ao nos aproximarmos da minha seção, me senti um pouco
nervosa. Colby tinha visto minhas tatuagens, mas não o tipo de arte que eu
estava exibindo ali. Respirei fundo quando paramos na frente da primeira
pintura: uma mulher nua deitada com as costas arqueadas. Seu rosto estava
tenso e os músculos, retesados. A pintura inteira foi feita em preto e branco,
exceto por um pedaço de tecido de seda vermelho brilhante espalhado sobre
seus seios.
— Esta é uma das minhas — eu disse. — Minha mãe me fez renomeá-la
para a exibição.
— Uau. É incrível. — Colby olhou para a pequena placa pendurada abaixo
do quadro. — Perante Eva — ele leu. — O que isso significa?
Dei risada.
— Não faço ideia. Acho que deve ser alguma referência bíblica a Eva, de
Adão e Eva.
— Qual era o nome original?
— Eu me refiro a ela como O Ápice Antes do Prazer. Na minha cabeça, a
pose encapsula o momento antes do orgasmo.
Colby olhou novamente para a pintura. Ele analisou a mulher por um longo
tempo e, então, engoliu em seco.
— É muito linda, Billie. Sinto uma agitação por dentro quando olho para ela.
Bati meu ombro no dele e baixei meu tom de voz.
— Uma agitação, hein? Quer saber um segredo?
— Com certeza.
— Eu tirei uma foto minha nua nessa posição para usar como referência para
as costas arqueadas da mulher. Usei o temporizador do meu celular.
Os olhos de Colby desceram para meus lábios.
— Você ainda tem essa foto no seu celular?
Abri um sorriso perverso.
— Talvez…
Ele gemeu.
— Você está me matando, mulher.
Levamos uma hora para ver todas as obras de arte. Quando terminamos,
precisei usar o banheiro, então pedi licença.
Encontrei Colby analisando Perante Eva novamente quando retornei. Ele
segurava duas taças de champanhe e um pedaço de papel de alta gramatura.
— Uma mulher passou e perguntou se eu queria outra taça de champanhe —
ele disse. — Então, peguei uma para cada.
— Ah, ótimo. Obrigada.
Ele ergueu o cartão.
— Ela também me deu isso. O que é? Os números de identificação das
pinturas, ou algo assim?
Sorri.
— É a lista de preços.
Ele tinha acabado de tomar um gole de champanhe e começou a tossir.
— A lista de preços? — Ele ergueu o cartão, segurando-o mais próximo do
rosto para examiná-lo. — Esqueceram de colocar a vírgula que separa os dólares
dos centavos?
Dei risada.
— Não. Minha mãe nunca colocaria centavos no preço. Ela acha que usar
um cifrão é brega e feio. Por isso, há somente números impressos.
Colby apontou para a pintura diante de nós.
— Então, se eu quiser comprar essa arte, me custará 11.500 dólares?
Balancei a cabeça.
— Na verdade, você não pode comprá-la. — Apontei para o pequeno
adesivo colorido na plaquinha. — Parece que já foi vendida.
— Por onze mil dólares?
Ele olhou para as minhas outras artes ali perto. A maioria delas também já
tinha adesivos.
— Puta merda. Você fez metade do meu salário anual em uma hora.
Sorri, sentindo-me um pouco constrangida.
— Não é sempre assim. Mas agora você deve estar pensando que sou uma
idiota por não seguir o caminho que a minha mãe gostaria.
— Não estou pensando nada disso. — Ele olhou em volta. — Só estava me
perguntando se o cara que comprou esse quadro ainda está aqui. Quero dar uma
surra nele, porque ele terá uma pintura na parede que foi baseada no seu corpo
nu. E a outra coisa que pensei foi… — Ele sorriu. — Descolei uma sugar
mama.
Soltei uma risada pelo nariz.
— Você é maluco, Lennon.
Depois que a exibição terminou, Colby perguntou se eu queria dar uma
volta. A galeria da minha mãe ficava no centro, e a noite estava agradável, então
ele sugeriu que fôssemos à entrada para pedestres da Ponte do Brooklyn.
Olhei para cima ao começarmos a atravessá-la.
— Sabe, eu moro aqui desde que nasci e nunca andei nessa ponte.
— Sério? Por quê?
Dei de ombros.
— Não sei. Acho que nunca prestei muita atenção em pontes antes. Elas
sempre foram apenas um meio para sair da ilha de Manhattan.
Colby colocou a mão no peito e apertou.
— Nossa, essa doeu. Pontes são obras de arte.
Olhei para os fios de suspensão e as luzes cintilantes no topo.
— É muito linda.
Colby aproximou sua mão da minha e casualmente entrelaçou nossos dedos.
Quando olhei para seu rosto, ele ergueu a outra mão.
— Eu seguro a mão de Saylor o tempo todo quando andamos. Então, não
interprete errado. Estou bem ciente de que isso não é um encontro.
Dei risada.
— Tudo bem.
— Ótimo, porque me pareceu errado andar ao seu lado agora sem segurar a
sua mão.
Sorri. Segurar a mão dele parecia mesmo certo. E tentei não deixar esse
pensamento me fazer surtar ao mudar de assunto.
— Então, que curiosidades aleatórias você tem para mim sobre esse
esplendor arquitetônico, sr. Fissurado em Pontes?
Ele ergueu um dedo.
— Ah. Achei que nunca perguntaria.
Durante a hora seguinte, enquanto caminhávamos de um bairro para outro e
voltávamos, Colby me contou história após história sobre a Ponte do Brooklyn
― como PT Barnum uma vez caminhou com 21 elefantes para mostrar ao povo
de Nova York que era segura, e todos os nomes que a ponte tivera desde sua
construção. Se alguém tivesse perguntado há um mês se eu achava fatos sobre
pontes interessantes, eu teria pensado que a pessoa era maluca. Contudo, me
concentrei em cada palavra de Colby. Se bem que acho que isso teve menos a
ver com as pontes e mais a ver com o homem que falava sobre elas.
Era quase meia-noite quando voltamos para o meu apartamento. Estávamos
juntos há quase seis horas, mas eu ainda não estava pronta para encerrar a noite.
Ao seguirmos para o elevador, ponderei se convidá-lo para subir enviaria a
mensagem errada. No fim das contas, decidi que estava sendo boba. Eu já tinha
passado tempo suficiente em seu apartamento; isso não pareceria algo fora dos
limites.
— Você… quer subir comigo por um tempinho?
Ele pensou um pouco.
— Acho que não devo. Não quero forçar a minha sorte e quebrar as regras
dos encontros de não-namoro. Além disso, a babá precisa trabalhar amanhã de
manhã, então é melhor eu não demorar muito.
Tentei esconder minha decepção.
— Oh… sim, claro. Desculpe. Eu nem estava pensando.
Ele segurou minha mão novamente.
— Eu me diverti muito esta noite.
Sorri.
— Eu também.
— Sabe quando fazemos certas coisas que parecem erradas ou nada
naturais? Tipo dar as costas depois de jogar uma bola de boliche na pista e não
ver o que vai acontecer?
Dei risada.
— Sim…
Colby olhou para seus pés.
— É essa a sensação de ir embora sem te beijar.
Senti-me quente e derretida por dentro.
— Acho que vou pular o ritual do final dos encontros de não-namoro. Nada
de fungadas hoje. Não confio em mim o suficiente para ficar tão perto assim
agora.
Abri um sorriso triste.
— Tudo bem.
Colby apertou o botão para chamar o elevador. Ele devia estar no térreo,
porque as portas se abriram imediatamente. Tive que me forçar a entrar nele e
deixar Colby para trás. Ele tinha cem por cento de razão. Parecia errado me
afastar assim. Quando entrei no elevador, coloquei a mão para impedir que as
portas se fechassem.
— Obrigada por me defender para a minha mãe hoje. Foi muito importante
para mim.
Ele sorriu.
— Você é muito importante para mim.
Soltei a porta e dei um passo para trás.
— Boa noite, Colby.
— Boa noite, linda.
No instante em que as portas começaram a se fechar, senti um pavor me
atingir. Meu coração acelerou, minhas palmas suaram, e senti como se estivesse
tendo um ataque de pânico. Foi tão forte que enfiei a mão entre as portas no
último segundo, e o elevador a esmagou antes de abrir novamente a contragosto.
— Merda! — gritei.
Colby voltou correndo.
— O que aconteceu? Você está bem?
— Nada… — Sacudi meu pulso. — Eu prendi a mão entre as portas para
impedir que fechassem, mas estou bem. Foi mais pelo susto do que pela dor.
Ele pegou minha mão e a examinou. Nem vermelha estava.
— Tem certeza?
Assenti.
— Sim, absoluta.
— Abra e feche os dedos.
Fiz o que ele pediu e não senti dor.
— Eles estão bem.
— Por que você enfiou a mão entre as portas, afinal?
— Eu, hã… só senti que precisava sair do elevador.
Os olhos de Colby fitaram os meus atentamente e, então, um sorriso
presunçoso se espalhou em seu rosto.
— Você também está achando estranho ir embora sem me beijar, não é?
— Não — respondi rápido demais.
— Admita. Você quer me beijar.
— Não quero, não.
Seu sorriso ficou ainda maior.
— Mentirosa.
Colby segurou meu rosto entre as mãos e me guiou para que eu desse alguns
passos para trás, até encostar nas portas do elevador. Ele baixou a cabeça, de
forma que nossos narizes ficaram quase se tocando.
— Vamos ficar aqui por um bom tempo se você estiver esperando que eu
tome a iniciativa. Não vou quebrar as regras.
Meu coração acelerou ainda mais por senti-lo tão perto. Ele precisava
mesmo ter o cheiro tão bom? Quem continua com o cheiro delicioso depois de
seis horas passeando por Nova York? Senti uma vontade urgente de me
pressionar a ele, sentir seu corpo quente e firme contra o meu.
Colby passou o nariz pelo meu pescoço, deixando uma trilha de arrepios em
minha pele com sua respiração quente. Minha determinação estava
desmoronando rapidamente. Como não poderia, com meu corpo faiscando como
se eu tivesse sido eletrocutada? Ele levou a boca até minha orelha, e sua voz era
rouca e cheia de desejo.
— Você sabe que me quer tanto quanto eu te quero.
Ele estava certo. O desejo que eu estava sentindo por ele era insuportável.
Quando ele ergueu o rosto novamente e eu vi o desejo transbordando em seus
olhos, não pude mais me conter.
Já era.
— Foda-se — eu disse ao me jogar nele.
Envolvi seu pescoço com os braços e joguei-me nos seus, pressionando
meus lábios nos dele. Nossas bocas se abriram, e nossas línguas colidiram. Eu
podia ter começado o beijo, mas Colby indiscutivelmente tomou o controle.
Suas mãos se infiltraram em meus cabelos, agarrando um punhado na parte de
trás e puxando minha cabeça para o ângulo que queria. Ele pressionou o corpo
contra o meu, e pude sentir sua ereção cutucando minha barriga. Meus olhos
reviraram. Ficamos assim por um longo tempo, nos agarrando e apalpando,
puxando e pressionando. Quando finalmente interrompemos o beijo, estávamos
ofegando.
— Puta merda. — Balancei a cabeça. — Isso foi… — Não pude encontrar a
palavra perfeita para descrever.
Mas Colby, sim.
— Só o começo, linda. Foi só o começo.
Meu celular tocou na tarde de sábado, e sorri ao ver que era Billie. Ela iria
nos encontrar aqui em cerca de uma hora para nosso próximo encontro de não-
namoro.
— O Colby está indisponível no momento — eu disse ao atender. — Ele
ainda está se recuperando do melhor beijo de sua vida.
Ela deu risada.
— É, foi muito bom, tenho que admitir.
Apenas ouvir sua voz já me deixou todo animado. Caí de costas na cama e
balancei no colchão, ainda cheio de tesão da noite anterior.
— Como é que eu vou conseguir me ater às nossas regras agora que sei
como é te beijar?
— Acho que você vai ter que esquecer.
— Você quer que eu esqueça, Billie? Porque você com certeza não parecia
querer continuar seguindo as regras quando se jogou em mim.
— Eu perdi o controle. Acontece com as melhores pessoas. O que posso
dizer?
— Sinta-se livre para perder o controle sempre que quiser. Estarei pronto e
esperando.
— Enfim… — Ela pigarreou. — Qual é o plano para hoje?
Por mais que eu a estivesse provocando, precisava me acalmar um pouco
antes de ficar sozinho com ela novamente. Do jeito que estava me sentindo, era
provável que ultrapassasse o limite, acelerasse demais as coisas e ferrasse com
tudo. Então, decidi que já que estava encarregado do encontro de não-namoro,
desta vez, tomaria a liberdade de colocar um amortecedor enorme entre nós. O
maior amortecedor que eu conhecia.
— Então, tenho uma notícia boa e uma ruim — eu disse.
— Ok…
— A notícia ruim é que não consegui encontrar uma babá hoje. Mas a boa é
que poderemos passar o dia com uma garotinha que adora a sua presença quase
tanto quanto o pai dela. Espero que não tenha problema.
— Awn… é claro que não tem. Vai ser divertido passar um tempo com ela.
— E com a minha filha por perto, ficarei comportado. Então, é uma vitória
para você, certo?
Ela riu.
— Aonde vamos levá-la?
— Faz um tempo que ela me pede para levá-la ao carrossel. Achei que
poderíamos ir lá e, em seguida, almoçar em algum lugar legal. O que acha?
— Parece ótimo. Eu sou fácil.
Puxei meus cabelos.
— Minha querida, você está longe de ser fácil.
— Então, a sua mãe disse que, recentemente, você fez uma exibição aqui na
galeria, certo? — o policial perguntou. Ele tinha um pequeno bloco de
anotações com capa de couro na mão.
Assenti.
— Sim.
Fazia quinze minutos que Colby e eu estávamos na galeria. Minha mãe
parecia já ter mudado de assustada para insuportável, o que me trouxe um pouco
de conforto. O ladrão mascarado tinha levado sua carteira, que continha pouco
menos de cem dólares em dinheiro. No momento, ela estava ao telefone
cancelando todos os cartões de crédito.
O policial assentiu.
— E algumas das pessoas que vieram à exibição eram suspeitas?
Torci o nariz.
— O quê? Não. Por que está perguntando isso?
Ele apontou para trás por cima do ombro com seu lápis.
— A sua mãe disse que, naquela noite, em particular, atraiu a presença de
um tipo diferente da clientela que ela costuma ter. Ela parecia ter quase certeza
de que o homem que a assaltou hoje esteve aqui naquela noite.
Arregalei os olhos.
— Sério? Pensei que ela não tinha conseguido ver o cara.
— Ela não conseguiu. Mas mencionou que havia algumas pessoas presentes
que tinham ligações com gangues. — Ele virou uma página em seu bloco de
anotações. — E um deles se chamava Devin, ou algo assim?
Fiquei boquiaberta.
— Está brincando comigo?
— Não, por quê?
Senti a raiva queimar em mim e subir até meu rosto.
— Devin não tem ligações com gangues. Ele é um tatuador muito conhecido
e foi meu mentor por anos. Tenho certeza de que as pessoas no Bowery Mission,
em Tribeca, testemunharão a favor dele, já que ele faz trabalhos voluntários lá
três vezes por semana cozinhando para os sem-teto.
A testa do policial franziu enquanto ele olhava novamente para seu bloco de
anotações.
— E uma pessoa chamada Lenny Prince?
Senti como se tivesse fogo em minhas veias.
— Lenny é um artista de rua que estava exibindo sua arte aqui na mesma
noite que Devin. Na mesma noite em que eu também exibi peças minhas. A
esposa dele é juíza de trânsito no Brooklyn. Tenho certeza de que ela o impede
de invadir galerias para roubar carteiras. Odeio te dizer isso, mas o único crime
que esses dois homens cometeram foi achar que minha mãe apoiava o trabalho
deles. Sabe, minha querida mãezinha acha que qualquer um que tenha tatuagens
ou um estilo de vida que não seja igual ao dela é um marginal. — Respirei
fundo. — Se quiser mesmo saber quem pode ter tido a intenção de fazer mal à
minha mãe, acho que vai ter que entrevistar metade da cidade de Nova York,
porque ela insulta quase todo ser humano que encontra.
O policial e eu olhamos para minha mãe. Ela estava falando ao celular
enquanto mexia no colar de pérolas em volta do pescoço. Ele se virou
novamente para mim e fechou seu bloco de notas.
— Obrigado pelas informações.
— Precisa de mim para mais alguma coisa? — perguntei.
Ele balançou a cabeça.
— Acho que não.
— Então, estou indo embora. Boa sorte com ela…
Colby ficou o tempo todo esperando na porta, mexendo no celular. Ele se
endireitou quando me aproximei. Coloquei as mãos nos quadris.
— Quero voltar para o seu apartamento e me esfregar no seu pau duro até
gozar sem ao menos tirar a roupa. Topa ou não?
Ele ergueu as sobrancelhas de uma vez, mas superou o choque bem rápido.
— Porra, com certeza.
— Ótimo. Vamos.
Naquela noite, convidei Billie para vir jantar comigo e com Saylor. Billie
sugeriu comprarmos coisas para fazermos pizza caseira, porque achou que
Saylor se divertiria com isso. E insistiu em comprar todos os ingredientes depois
de terminar seu trabalho e fechar o estúdio.
Ela me mandou mensagem do mercado.
Billie: Do que Saylor gosta na pizza?
Colby: Ela gosta de abacaxi. Pode comprar aqueles de lata. E bacon.
Ela curte essa combinação.
Billie: Combinação interessante para uma garota interessante. Ok. Do
que você gosta?
Colby: Do que eu gosto? É uma pergunta capciosa.
Billie: Hahaha. Não precisa se conter.
Colby: Rapidinhas na lavanderia com você depois que Saylor vai
dormir. Meu pau na sua boca. Meu pau enterrado bem fundo em você
em qualquer lugar, sempre que tenho a chance. Meu gozo nos seus
peitos. A lista é infinita.
Billie: Você só pensa em uma coisa.
Colby: Pode crer. Estou viciado. Para responder à sua pergunta inicial,
eu como qualquer coisa… mas tem uma coisa que eu mais gosto de
comer. Será que você consegue adivinhar?
Ela respondeu com uma foto segurando uma lata de abacaxi contra o peito.
Seu espartilho do dia era de uma cor laranja-queimado do qual não me lembrava
de ter visto antes. Contudo, como sempre, eu estava prestando mais atenção no
que tinha dentro dele.
Billie: Pode ser essa lata de abacaxi?
Não pude evitar brincar com ela, porque quem está olhando para a porcaria
da lata de abacaxi quando está bem diante de seus peitos?
Colby: Abacaxi ou melões? Os melões são perfeitos pra caralho. Ande
logo, venha logo para casa, para que eu possa beijar o seu pescoço
quando Saylor não estiver olhando. (Sim, pode ser essa lata.)
Não deixei passar despercebida a forma como usei a palavra casa. Não
estávamos nem perto de morar juntos, mas eu ainda sentia que o lugar dela era
ao meu lado, que, de alguma forma, minha casa também era dela agora, mesmo
que ela não dormisse lá. Já mencionei que essa mulher me faz delirantemente
feliz?
Billie: Não terminei! Ainda tenho que encontrar a linguiça. E não
OUSE fazer uma insinuação com linguiça.
Colby: Por que você está cortando o meu barato?
Billie: Tá, acabe logo com isso.
Dei risada ao digitar.
Colby: Eu tenho uma linguiça para você. ;-)
Billie: Se sente melhor agora?
Colby: Muito.
Billie: Ok, falando sério agora: linguiça e pepperoni para nós. Abacaxi
e bacon para a minha garotinha. Vou pegar manjericão fresco para
colocar por cima também. Estou tão animada!
Colby: Também estou animado.
Billie: Por que será que eu acho que você não está falando sobre a
pizza?
Colby: Eu definitivamente não estou falando sobre a pizza. Traga logo
essa sua bunda para cá, linda.
Após chegar ao meu apartamento, Billie foi direto ao trabalho,
descarregando as sacolas de compras e colocando todos os ingredientes para as
pizzas sobre a bancada. Saylor sentou-se em um dos bancos ali e ficou
assistindo Billie deixar tudo pronto.
Infelizmente, eu não tinha um rolo de madeira, então Billie improvisou com
uma garrafa de vinho para abrir a massa.
Encostei-me à bancada.
— Estou impressionado com a sua criatividade.
— Ora, muito obrigada. — Ela piscou para mim.
Eu queria poder me aproximar e beijá-la, mas não fazíamos isso na frente de
Saylor.
Havia farinha voando pelo ar enquanto as duas amassavam e abriam a
massa. Não demorou até que suas roupas estivessem completamente cobertas de
pó branco. Eu adorava o fato de que Billie não tinha medo de fazer bagunça ―
especialmente quando transávamos.
Assim que a massa ficou pronta, estava na hora de montar as pizzas. Billie
fritou a linguiça com cebola em uma frigideira e reservou. Ela abriu todos os
outros pacotes e colocou tudo em tigelas separadas. Ia ser um saco limpar a
cozinha depois, mas valeu demais a pena ver o sorriso inabalável da minha
filha.
Fiquei observando o quão Billie era paciente enquanto elas faziam as pizzas
juntas. Para alguém que dizia ter pouca experiência com crianças, Billie estava
se saindo bastante profissional.
Quando as pizzas foram para o forno, como esperado, a cozinha estava um
caos completo: calda de abacaxi derramada, queijo ralado espalhado, gordura de
bacon respingada. Mas era um lindo caos. Aquilo era vida. Um exemplo da vida
que surgiu dentro dessa casa desde que Billie se juntou a nós.
Após o jantar, Billie surpreendeu Saylor com um cupcake de princesa que
comprara na confeitaria do supermercado. Minha filha claramente gostou muito,
porque, quando terminou de comê-lo, estava com cobertura nos cabelos e, de
alguma jeito, até nos olhos.
Billie levou Saylor para o banheiro para ajudá-la a se limpar e eu comecei a
limpar a cozinha, para que não parecesse mais como se um monstro de massa
tivesse explodido ali. Eu parava o que estava fazendo de vez em quando para
ouvir os sons das risadas vindas do corredor.
Eu quero isso. Toda noite. Mas sabia que seria burro presumir que Billie iria
querer a responsabilidade em tempo integral que vinha junto com isso. Somente
o tempo diria, e eu tinha que ser paciente.
Antes de ir para a cama, Saylor pediu a Billie que lhe contasse uma história
para dormir.
— Sem livro! — ela guinchou.
Billie olhou para mim, buscando entender.
— Isso significa que ela quer que você invente alguma historinha na hora —
eu disse a ela. — Ela gosta de me desafiar o tempo todo.
Ela fez cócegas em Saylor.
— Você é tão espertinha. Não vai facilitar para mim, não é?
Saylor deu risadinhas.
Billie sentou-se na beira da cama e pensou por um momento enquanto
Saylor se acomodava debaixo das cobertas.
— Muito bem, essa história se chama A Bruxa Tatuada — ela disse.
Minha filha se aconchegou perto dela enquanto eu estava na porta, ouvindo.
— Era uma vez, uma bruxa tatuada. Ela morava em Nova York e tinha seu
próprio estúdio de tatuagem, onde passava o dia todo desenhando tatuagens nas
pessoas. — Ela fez uma pausa. — Um dia, um príncipe entrou lá e pediu uma
tatuagem. Mas a bruxa tatuada estava tendo um dia bem ruim, então ela o
mandou embora.
— Essa história me parece familiar — eu falei.
— Talvez seja um pouco autobiográfica. — Billie me deu uma piscadela.
— O que aconteceu para deixar a bruxa de mau humor? — provoquei.
— Ela encontrou o malvado sr. Tinder, e ele fez mal a ela.
— Ah, ok. Continue a história. — Dei risada.
Ela virou-se para Saylor e continuou.
— A bruxa se sentiu muito mal por ter sido grosseira. Na próxima vez que
viu o príncipe, ela jogou um feitiço nele com a esperança de poder ter uma
segunda chance.
Saylor olhou para ela.
— Mágico?
— Aham. Um feitiço mágico.
— O que aconteceu? — Saylor perguntou.
— Funcionou! O príncipe continuou voltando. E até mesmo a levou a um
encontro uma vez na ilha mágica de IKEA.
Dei risada.
Saylor abriu um sorriso enorme.
— O que mais aconteceu?
— O coração frio da bruxa começou a derreter. Após um tempo, a bruxa
tatuada não se sentia mais uma bruxa. Ela se sentia uma princesa. Não porque
era realmente uma princesa, mas porque o príncipe a fazia se sentir como uma.
A bruxa jogou o feitiço no príncipe, mas, no final, foi ela que se transformou. —
Billie olhou para mim e sorriu. — Fim.
Saylor arregalou os olhos.
— Eles viveram felizes para sempre?
Ela hesitou.
— Gosto de pensar que sim.
Boa resposta. Eu com certeza esperava que a bruxa e o príncipe acabassem
juntos para sempre, e fizessem muito sexo gostoso pelo caminho.
Depois de colocarmos Saylor na cama, Billie parecia estar perdida em
pensamentos ao se sentar ao meu lado na sala de estar.
— Saylor fica muito feliz quando você está por perto — eu disse,
interrompendo o que quer que ela estivesse ruminando.
— É, eu também fico surpresa com o quanto amo estar perto dela.
Tracejei as tatuagens em seu braço e decidi me abrir.
— Provavelmente, a única coisa que me preocupa quando se trata de você e
eu é se essa é uma vida que você gostaria de ter a longo prazo. Nunca quero te
pressionar a pensar sobre isso, mas também sinto que estamos em um ponto no
qual eu gostaria de saber se você vê a possibilidade de um futuro… para nós
dois.
Ela não disse nada imediatamente. Senti-me muito apreensivo enquanto a
esperava responder.
— Não vou mentir… — ela finalmente falou. — No começo, fiquei
preocupada com a minha habilidade de me encaixar nessa equação, de cuidar de
uma criança da maneira que precisaria. Mas quero que você saiba que não vejo
mais as coisas dessa forma. Se as coisas não derem certo entre nós dois, não
será por causa dos meus medos em relação a Saylor. Qualquer pessoa seria
sortuda por tê-la em sua vida.
— Nossa. — Beijei a lateral de sua cabeça. — Obrigado. Sinto que posso
respirar um pouco melhor agora.
— Você estava pensando nisso esta noite?
— Sim. É difícil não pensar sobre isso quando te vejo com ela.
— Mas ainda acho que precisamos ir devagar — ela disse.
— Concordo… mas…
Ela ergueu as sobrancelhas.
— O quê?
— Isso significa que eu posso te convencer a passar a noite aqui?
Billie apertou meu joelho e suspirou.
— Não sei…
— A Saylor sempre dorme a noite inteira. Podemos acordar cedo e tirar você
daqui. Embora eu tenha falado sobre aquela fantasia de te comer na lavanderia,
eu prefiro mil vezes te levar para a minha cama e não ter pressa. Só temos que
ficar quietos. Nada de buracos na parede esta noite. — Não tive vergonha de
implorar. — Por favor… — pedi, soando como Saylor quando me pedia para
comer sobremesa pela segunda vez. A diferença era que eu queria comer Billie
bem mais que duas vezes.
— E se ela acordar e me vir? — Billie sussurrou.
— Vou trancar minha porta. Ainda tenho uma babá eletrônica, e posso ligá-
la para podermos ouvir se ela acordar. Mesmo que o pior cenário acontecesse e
ela te visse aqui, ela ainda é muito novinha e não entende o que é sexo. Então,
acho que não vai ter problema. Ela vai apenas achar que você está dormindo
aqui. Aposto que vai achar o máximo.
A expressão de Billie suavizou, e ela abriu um sorriso travesso.
— Posso pensar no assunto enquanto você me serve uma taça de vinho?
Fiz uma dancinha da vitória internamente e me levantei para ir buscar o
vinho da minha garota.
— Seria um prazer.
No instante em que comecei a abrir a garrafa, houve uma batida na porta. As
únicas pessoas que bateriam à minha porta àquela hora da noite no meio da
semana eram os meus amigos.
— Você está esperando alguém? — Billie perguntou.
Soltei a garrafa de vinho e segui para a porta.
— Não. Deve ser Brayden ou Holden.
Eu deveria ter conferido pelo olho-mágico. Porque assim, talvez, eu não
tivesse quase sofrido um infarto no momento em que a vi. Levei alguns
segundos, porque fazia muito tempo. Seus cabelos escuros estavam um pouco
mais compridos, e ela estava mais magra do que eu me lembrava. Mas os olhos
frios eram exatamente os mesmos.
Não consegui formular palavra alguma, então fiquei ali aturdido por vários
segundos, sentindo o pânico começar a me invadir.
O que diabos ela quer?
A mulher que eu conhecia apenas como Raven foi a primeira a falar.
— Oi, Colby.
Nada ainda. Eu não sabia o que dizer. Tudo que eu conseguia pensar era:
Que porra ela está fazendo aqui e como posso fazê-la desaparecer magicamente
antes que Billie perceba?
— Quem é ela? — Ouvi Billie perguntar. Meus olhos ainda estavam presos à
mulher diante de mim.
Lembra de quando eu estava falando que uma bomba sempre explode
quando tudo está indo bem? Bom, a porra da bomba estava bem ali na minha
porta.
Finalmente consegui formular as palavras para responder à pergunta de
Billie.
— Esta é a doadora de óvulo da Saylor.
Bam.
— Colby, por que você fez isso? — Billie olhou para a porta da frente,
horrorizada.
— Seja lá o que ela queira, não quero ouvir. — Voltei para a sala de estar,
enchi minha taça de vinho e bebi a metade de uma vez.
— Então prefere simplesmente bater a porta na cara da mãe da Saylor? O
que será que ela quer?
— Primeiro: ela não é a mãe da Saylor. Biologia não faz alguém ser pai ou
mãe. Segundo, não dou a mínima para o que ela quer. Terceiro… — Meu
desabafo foi interrompido.
Toc. Toc. Toc.
Billie e eu viramos e olhamos para a porta.
— Você precisa abrir — ela disse.
Balancei a cabeça.
— Não preciso, não.
Meus olhos se prenderam aos de Billie e ficamos nos encarando. Pensei que
não era mais capaz de dizer não a essa mulher, até esse momento.
Quinze segundos depois, as batidas na porta ficaram mais altas.
Bang. Bang. Bang.
Billie suspirou.
— Colby…
Fiquei plantado no lugar, trazendo minha taça de vinho aos lábios e virando
o restante do líquido.
— Abra a porta, Colby! Preciso falar com você!
Senti a raiva subir pelo meu corpo. Começou pelos meus dedos dos pés,
percorreu minhas pernas e meu torso e se instalou no calor do meu rosto.
— Colby, ela vai acabar acordando Saylor. O que faremos se isso acontecer?
Continuei sem me mexer. Mas somente até minha filha aparecer, vinda de
seu quarto, esfregando os olhos.
— Billie, você estava gritando?
Billie se aproximou dela imediatamente e abaixou-se à sua frente.
— Não, querida. Tem uma pessoa lá fora. Hã… uma mulher ficou presa para
fora de seu apartamento, então o papai está indo lá fora ajudá-la. — Ela se virou
para mim, lançando-me um olhar. — Não é, Colby?
Não respondi. Billie balançou a cabeça para mim e franziu as sobrancelhas,
levantando-se e pegando Saylor no colo.
— Que tal eu te contar outra história enquanto o papai vai ajudar a mulher?
— Ela olhou novamente para mim. — Tenho outra sobre uma bruxa que vai
embora voando em sua vassoura porque o lindo príncipe, no fim das contas, era
um sapo…
Minha filha sorriu, alheia à situação.
— Quero ouvir sobre o sapo!
— Ok. Vamos lá, amiguinha.
Ela carregou Saylor para o quarto, parando mais uma vez para olhar para
mim e gesticular com a mão em direção à porta, dizendo-me silenciosamente
para ir lidar com isso.
No instante em que a porta do quarto de Saylor se fechou, Maya começou
novamente.
Bang. Bang. Bang.
— Eu não vou embora, Colby! Então é melhor você abrir a droga dessa
porta antes que eu acorde todos os inquilinos desse prédio!
Fechei os olhos e respirei fundo. Isso não ajudou a acalmar meus nervos ou
subjugar minha raiva nem um pouco, mas que escolha eu tinha? Não queria que
Saylor fizesse perguntas. Não queria que ela visse o rosto ou ouvisse a voz
daquela mulher.
Maya endireitou sua postura quando saí para o corredor. Essa mulher tinha
colhões. Fechei a porta atrás de mim e cruzei os braços contra o peito.
— O que você quer, porra?
— Preciso da sua ajuda.
Joguei minha cabeça para trás, soltando uma risada maníaca.
— Você precisa da minha ajuda? Essa é boa. E a sua filha, porra? Não acha
que talvez ela tenha precisado da sua ajuda nos últimos quatro anos? É muita
coragem sua aparecer à minha porta e dizer que precisa da minha ajuda.
Maya desviou o olhar.
— Eu nunca planejei ter filhos. Quando descobri que estava grávida, achei
que saberia lidar. Mas não soube. A menina está melhor sem mim.
Me aproximei um pouco, deixando meu rosto bem diante do seu.
— Saylor. A menina tem nome. E é melhor mesmo que você saiba que ela
está melhor sem uma mulher que não pensa duas vezes antes de entregar seu
próprio bebê a um cara que só encontrou uma vez. Você nunca ao menos ligou
para saber como ela estava, pelo amor de Deus. Onde você esteve nesses quatro
anos, porra? Contratei até um investigador particular para te procurar.
— Você é o pai dela. Não um estranho.
— E daí? O serial killer de Green River matou 49 mulheres. Ele também era
pai. — Balancei a cabeça. — Se bem que, nesse momento, estou começando a
entender como alguém pode ser pai e matar uma mulher.
Maya franziu a testa.
— Eu pretendia voltar. Só precisava de um tempo, e não tinha ninguém com
quem contar. A bebê não parava de chorar, e achei que uma noite longe ajudaria.
Mas um dia se tornou dois, e dois dia se tornaram uma semana. E então comecei
a recuperar a minha vida.
— Que legal da sua parte…
Ela balançou a cabeça.
— Olha, Colby. Há muitas coisas sobre mim que você não sabe. Para
começar, o meu nome não é Raven. Esse era somente o meu nome de trabalho.
— Sim, eu sei. O nome Raven não ajudou muito quando o investigador
particular tentou te encontrar, Maya Moreno.
— Oh. Bem, você sabia que não estou no país legalmente? Vim do Equador
com um visto temporário de verão quando tinha dezessete anos e nunca mais
voltei.
— Eu sabia disso também. Mais alguma coisa que queira me contar sobre a
sua vida? — Dei de ombros, sem lhe dar tempo para responder antes de
continuar. — Não? Que bom. Foi ótimo colocar o papo em dia, mas que tal você
voltar para o lugar de onde veio e esquecer que eu existo? Aproveite o resto da
sua vida como fez durante os últimos quatro anos. — Virei-me e peguei a
maçaneta da porta, mas Maya colocou uma mão em meu braço.
— Espere!
Lancei um olhar enfurecido para ela.
— Não encoste em mim, caralho.
Maya ergue as duas mãos.
— Tudo bem. Não vou. Mas preciso de um favor seu. Posso ver que você
está chateado agora. Então, que tal nos encontrarmos para tomar um café
amanhã de manhã para conversarmos, depois de você ter esfriado a cabeça?
Então, poderei explicar tudo.
Meu rosto se contorceu.
— Eu não vou tomar café com você.
Maya aumentou o tom de voz.
— Ouça, Colby. Você vai ter que superar esse seu problema comigo pelo
bem da nossa filha.
— Minha filha — falei entre dentes.
Maya suspirou.
— Eu não queria ter que fazer isso. — Ela abriu sua bolsa e retirou de lá um
envelope de papel pardo grosso, estendendo-o para mim em seguida.
Continuei a encará-la com os braços cruzados, sem fazer menção alguma de
pegá-lo. Ela revirou os olhos.
— Estarei na cafeteria da esquina amanhã de manhã a partir das oito. Se
você não aparecer… — Ela jogou o envelope no chão entre nós. — Preencherei
esses papéis às nove.
Eu andava de um lado para outro, sem parar. Depois que Colby me contou a
história completa, tudo que consegui fazer foi caminhar para lá e para cá. Se não
fizesse isso, talvez recorresse a algo imprudente, como atirar uma cadeira pela
janela. Nunca senti tanta raiva na minha vida.
Enquanto eu continuava a andar, Colby permaneceu sentado com a cabeça
apoiada nas mãos.
— Não acredito na coragem da porra daquela mulher — esbravejei.
Ele ergueu o olhar para mim.
— Eu não vou me casar com ela.
Se ao menos fosse simples assim e essa sentença pudesse fazê-la
desaparecer…
— Mas ela disse que, se você entrar nesse casamento forjado, te entregaria a
custódia total, Colby. Isso é algo para ao menos considerar, por mais difícil que
seja.
Ele cerrou os dentes.
— Porra, eu não posso me casar com ela.
— Você prefere ter que brigar com ela pela custódia de Saylor?
— Você está tentando me convencer a ceder às chantagens dela?
— Eu não sei. — Puxei meus cabelos. — Não sei o que estou fazendo. Sinto
que estou no meio de um pesadelo. — Parei de andar por um momento. —
Olha, sou a última pessoa a querer que você sequer chegue perto daquela
mulher. Essa ideia me enoja de uma maneira que você nem imagina. E é por
isso que nos livrarmos dela permanentemente é tão atraente. Um pouco de dor
para uma grande vitória, que será nunca mais termos que nos preocupar com
ameaças dela.
As mãos de Colby tremeram. Corri até ele, segurei-as e as aproximei da
minha boca, enchendo-as de beijos. Nunca o vira assim. Fiquei preocupada com
sua saúde mental pelas próximas semanas. Não importava por qual direção
seguíssemos, essa não seria uma jornada fácil.
— Nós vamos resolver isso — sussurrei. — Ela disse que você tem uma
semana para decidir, não foi?
— Sim. — Sua voz mal foi audível.
— Ok… — Ergui seu queixo. — Olhe para mim, Colby. Nós vamos decidir
isso juntos, ok? Não temos que tomar decisão alguma nesse exato momento.
Não faz sentido se desesperar antes de ter a chance de falar com um advogado
de família, não é? Talvez haja algo que não sabemos que possa ser usado a
nosso favor.
Colby ficou apenas assentindo. Era como se me ouvisse, mas não absorvesse
nada. Eu tinha que entrar em ação, ser ainda mais forte por nós dois.
Basicamente, precisava fingir muito bem, já que estava me sentindo tudo,
menos forte naquele momento.
Me levantei e juntei minhas mãos.
— Ok! Nós vamos fazer o seguinte, sr. Lennon.
Ele olhou para mim.
— Nós dois vamos subir, liberar a babá, abraçar a srta. Saylor e começar o
processo de descompressão desse dia horrível. Você vai ficar com a sua filha e
eu vou cuidar do jantar.
— Você não tem que…
— Shh… — Coloquei um dedo sobre sua boca. — Tenho, sim. Quero que
você relaxe esta noite e, então, nós três teremos um jantar agradável juntos. E
depois que Saylor for dormir, vou deixar você me levar para o seu quarto e fazer
o que quiser comigo.
Seus olhos se encheram de vida pela primeira vez.
— Eu tive o pior dia da minha vida, e você está me dizendo que sexo anal
vai resolver isso? — Sua boca curvou-se em um sorriso. — Talvez você esteja
certa.
— Esse é o meu garoto. — Dei risada. — Esse é o sorriso que eu amo.
Eu sabia que nada resolveria esse dilema esta noite, mas, se eu pudesse fazê-
lo sorrir por ao menos um momento, estaria cumprindo minha função.
Eu não era tão boa cozinheira, mas não queria estragar esse jantar. Era
importante para mim que a nossa refeição fosse caseira para compensar a frieza
desse dia. Havia algo inerentemente reconfortante em uma refeição caseira.
Então, para garantir, optei por algo mais simples: espaguete, salada e alcachofra
grelhada, uma combinação que eu costumava fazer para mim quando ficava em
casa sozinha e queria comida reconfortante.
Eu estava de pé diante da bancada, mexendo o molho de tomate, e Saylor
estava colorindo à mesa quando Colby se aproximou por trás de mim, passando
os braços em volta da minha cintura.
— Obrigado por isso. — Ele aproximou a boca da minha orelha. — Eu
queria te dizer uma coisa agora, mas não quero que seja maculado pelo dia de
hoje. Não quero que hoje seja a primeira vez.
Arrepios percorreram meu corpo. Eu também te amo, Colby. Nunca soube
realmente o quanto até toda essa merda acontecer.
Ele voltou para a mesa para desenhar animais com sua filha. Eles tiveram
uns cinco minutos antes que eu os fizesse guardar os papéis e giz de cera para
nos prepararmos para o jantar.
Depois que Colby me ajudou a pôr a mesa, todos nos sentamos para um
jantar tranquilo. Colby e eu ficamos encarando Saylor um pouco mais do que de
costume enquanto ela sorvia seu espaguete, como se esse simples ato fosse a
coisa mais fascinante que já tínhamos visto. Não demorou até o rosto dela estar
coberto de molho de tomate. Notei os olhos dele brilhando com lágrimas não
derramadas, e aquilo me partiu o coração. Nada poderia diminuir o peso do meu
coração naquela noite.
O jantar foi interrompido por uma batida na porta.
Meu estômago gelou.
— Quem é?
— Não sei. Mas pode apostar que vou conferir pelo olho-mágico, dessa vez
— Colby disse ao se levantar.
Senti uma onda de alívio ao ver os amigos de Colby do outro lado. Jesus, era
como se eu estivesse com transtorno de estresse pós-traumático da noite
anterior. Será que algum dia ouviria uma batida na porta e não me lembraria
disso?
— Holden nos contou — Owen anunciou ao entrar no apartamento.
Ele segurava uma embalagem de asinhas de frango. Dei risada. Como se
asinhas de frango pudessem fazer essa confusão desaparecer.
— Não podemos falar sobre isso agora — Colby avisou, acenando com a
cabeça para Saylor. — Se entendem o que quero dizer.
— Vamos falar em código — Holden prometeu.
— Como você está, Billie? — Brayden perguntou.
Dando de ombros, suspirei.
— Você sabe…
— É, eu sei — ele murmurou com um olhar compreensivo.
— Trouxe a sua cerveja favorita — Holden disse, entregando para Colby.
— Valeu, cara. Fico muito grato por isso. — Colby levou a cerveja para a
geladeira antes de voltar para a mesa.
— E donuts para a Saylor! — Brayden ergueu a caixa que estava segurando.
Ela quicou em sua cadeira.
— Oba! Donuts!
Apesar dos esforços deles para nos animar, o clima ainda parecia sombrio.
Holden puxou uma cadeira e pigarreou.
— Então, né, nós temos que fazer alguma coisa em relação ao problema de
lixo por aqui.
Brayden cruzou os braços.
— Sim, nós precisamos nos livrar do lixo.
Acho que a conversa em código havia começado.
— Nós decidimos não discutir essa noite se iremos deixar o lixo dentro de
casa ou jogá-lo fora — Colby respondeu. — Estamos tentando deixar a poeira
baixar um pouco.
Owen, que ainda estava vestido em suas roupas de trabalho, como sempre,
se manifestou.
— Ok. Mas quero dizer uma coisa. Às vezes, quando você deixa o lixo
dentro de casa, começa a feder muito. Minha opinião é não deixar o lixo dentro
de casa de jeito nenhum. Acenda um fósforo, jogue no lixo e lute com tudo que
tiver. Deixe queimar. Também temos um dinheiro guardado para emergências
sanitárias como essa.
— Entendi — Colby disse. — E agradeço por isso. Muito mesmo. Mas
também é arriscado lutar contra o lixo com fogo. — Ele respirou fundo. — Pode
explodir.
— Isso é verdade. — Holden assentiu. — E, só para você saber, se precisar
de alguém para seduzir e manipular o lixo, é só dizer.
Brayden riu.
— Você acha que pode resolver tudo com o seu…
— Sorriso! — Colby interrompeu antes de lançar um olhar irritado para ele.
— Brayden, tome cuidado com o seu linguajar.
Brayden deu risada.
— Eu ia dizer compactador de lixo.
Colby riu também, o que foi bom de ver. Ele era sortudo por ter esses caras
em sua vida. Por mais difícil que isso fosse, seria muito pior se Colby não
tivesse um sistema de apoio.
— Eu adoro caminhões de lixo! — Saylor anunciou, claramente tentando
compreender do que seus tios malucos estavam falando.
Holden cutucou a lateral de seu corpo.
— É mesmo?
Ela girou o garfo para pegar o restante de seu espaguete e assentiu.
— Aham.
Colby olhou para ela com adoração.
— Saylor gosta de ver os caminhões de lixo passando e levando o lixo
embora, não é, amor?
Ela assentiu.
— Dá pra ver pela janela!
Owen fingiu empolgação.
— Que legal, Saylor. Lembro-me de gostar de ver isso também quando tinha
a sua idade.
Holden deu um tapa na mesa.
— Ok, chega de falar de lixo. Vamos abrir as cervejas.
Eles ficaram por meia hora antes de irem embora juntos. Insisti em limpar
tudo enquanto Colby levava Saylor para tomar banho. Pude ouvir os sons de
água respingando e risadinhas ao longe. Ah, a ignorância abençoada, não fazer
ideia de que a sua suposta mãe estava tentando destruir a vida do seu pai. Eu
esperava que Saylor nunca tivesse que descobrir o que estava acontecendo.
Depois que eles saíram do banheiro, observei Colby se juntar à filha no chão
com suas bonecas Barbie. Ele estava segurando o Ken e, a pedido de Saylor,
estava fingindo ser o chefe da Barbie no zoológico. A Barbie dela era
funcionária de um zoológico de Marte.
Em determinado momento, Colby soltou o Ken de repente e puxou Saylor
para um abraço apertado. Essa garotinha não fazia ideia de quantas emoções
diferentes deviam estar rodeando seu pai naquela noite. Pensamentos
assustadores preencheram minha mente. Havia tantas perguntas sem resposta.
Maya conseguiria levar Saylor embora do país? Isso com certeza o mataria.
Colby fechou os olhos, e, de algum jeito, eu sabia que ele estava fazendo
uma oração silenciosa. Fiz a mesma coisa, mas era mais como uma promessa.
Billie, você vai fazer o que for preciso para garantir que esse homem nunca
perca sua filha. O que for preciso.
Era uma verdade difícil de engolir. Porque, naquele momento, eu soube que
não ficaria em seu caminho se ele não tivesse outra escolha a não ser se casar
com aquela cretina, mesmo que isso acabasse comigo.
Phillip Dikeman, o advogado da minha família, franziu a testa e balançou a
cabeça.
— Queria que você tivesse vindo antes, Colby.
— Maya apareceu somente há quatro dias, e esse foi o primeiro horário que
consegui marcar com você.
Ele jogou a petição que ela havia me dado sobre sua mesa.
— Eu quis dizer antes que a mãe de Saylor voltasse à sua vida.
— Por que eu teria vindo antes de ela reaparecer?
— Porque poderíamos ter encerrado os direitos parentais dela por abandono.
Nova York exige apenas seis meses de ausência para apresentar uma alegação
de rescisão involuntária de direitos.
Arrastei uma das mãos pelos cabelos.
— Porra. Eu não fazia ideia. Quando tudo aconteceu, eu me encontrei com o
advogado dos meus pais. Ele me disse que eu deveria fazer o pedido de custódia
legal imediatamente, mas acho que fiquei esperando que a mãe de Saylor
voltasse. Quando finalmente ficou claro que isso não ia acontecer, nossa vida
meio que se encaixou. Ninguém nunca me pediu para provar que eu tinha a
custódia da minha filha e, não sei… um dia se passou, depois uma semana e, de
repente, minha filha já tinha quatro anos.
Phillip sorriu e apontou para um porta-retratos em uma prateleira atrás de
sua mesa.
— Nem me fale. A minha foi ao cinema com um garoto ontem à noite.
Parece que ainda ontem ela tinha quatro anos.
Balancei a cabeça.
— O quão ferrado eu estou?
— Vou ser direto com você. Se ela for capaz de provar tudo o que está nesta
petição, o que vou presumir, por um momento, que ela pode, há uma boa chance
de que o tribunal lhe conceda direito de visita. Será limitado e supervisionado,
pelo menos no início. Mas qualquer juiz que pegar o processo pesará o que é do
melhor interesse da criança versus penalizar uma mãe pelos erros que cometeu.
E impedir uma mãe de ver sua filha por ter procurado tratamento para
problemas de saúde mental, especialmente uma que ficou longe da criança por
medo de não ser apta para ser mãe, não é algo que um juiz queira fazer, a menos
que seja absolutamente necessário.
— Mas é tudo mentira! Ela não se afastou de Saylor por problemas de saúde
mental! Ela admitiu isso para mim. Ela se manteve afastada porque gostava
mais de sua vida sem filhos. A única maldita razão pela qual ela voltou é porque
precisa de algo. Isso não tem nada a ver com minha filha ficar melhor com a
mãe em sua vida. Honestamente, por mais que eu despreze Maya, se ela tivesse
voltado com um desejo verdadeiro de ver a filha, se realmente tivesse problemas
de saúde mental e se arrependido de deixá-la como deixou, acho que não
tentaria mantê-las separadas. Saylor merece uma mãe. Mas essa mulher… ela
não merece Saylor. Ela está fazendo isso pelos motivos errados, e eu preciso
fazer tudo que estiver ao meu alcance para proteger minha filha desse mal.
Phillip assentiu.
— Eu entendo. Entendo mesmo. E concordo plenamente com lutar contra
isso até o fim. Não quero que pense o contrário, Colby. Mas os papéis que ela
tem contam uma história diferente da que você está me contando. Ela tem
profissionais jurando que ela sofria de uma condição mental e se esforçou muito
para melhorar pelo bem da filha. O que você tem para provar que a sua história
é a que o juiz deve acreditar? Infelizmente, na maior parte dos casos, o que vale
é o que você pode provar que é verdade, não o que realmente é verdade.
Senti vontade de vomitar.
— Então, você está dizendo que eu deveria ter gravado o que Maya me
disse? Diferente dela, minha mente não funciona assim. A última coisa na qual
pensei quando ela bateu à minha porta foi em conseguir provas.
Ele balançou a cabeça.
— Claro. E não estou dizendo que você precisava gravá-la. Na verdade,
mesmo que Nova York seja um estado que requer o consentimento de apenas
uma das partes, ou seja, somente uma das pessoas envolvidas precisa consentir a
gravação, ainda é inadmissível usar isso no tribunal, a menos que possamos
encontrar em exceção. Pouca coisa é preto no branco no meio jurídico,
infelizmente. Estou apenas explicando como um juiz irá ver as coisas. Podemos
conseguir com que você declare que Maya tem segundas intenções, mas pode
acabar se tornando a nossa palavra contra a dela.
Apoiei a cabeça nas mãos e puxei meus cabelos.
— Jesus Cristo. Isso é uma loucura. O que eu devo fazer? Casar com ela?
— Não seria ético da minha parte aconselhá-lo a entrar em um casamento
forjado com o único propósito de garantir um green card. Mas como o assunto
do casamento foi levantado e a imigração não é uma área com a qual estou
muito familiarizado, tomei a liberdade de entrar em contato com um advogado
de imigração neste prédio. Adam é um amigo meu, e ele vai te dar uma consulta
grátis. Pelo menos assim, você terá todas as informações necessárias para tomar
uma decisão sobre como deseja proceder.
Uma hora e meia depois, minha cabeça girava quando saí do escritório do
segundo advogado. Eu queria ir direto para a loja de bebidas e beber até não
conseguir mais pensar, mas minha garotinha estava na casa dos meus pais, e eu
sabia que Billie também estava ansiosa para saber como tinha sido a consulta.
Então, me recompus e fui buscar minha filha.
— Oi. Como foi lá? — Minha mãe abriu a porta parecendo quase tão
estressada quanto eu me sentia. Talvez eu não devesse ter contado tudo a ela
quando deixei Saylor em sua casa mais cedo, mas foi só ela olhar para mim que
ficou convencida de que eu estava escondendo uma doença terminal.
Entrei e olhei em volta.
— Saylor está tirando uma soneca?
Minha mãe negou com a cabeça.
— O seu pai a levou ao parque.
Assenti e sentei-me à mesa da cozinha, soltando um suspiro pesado.
— Vou fazer um chá para nós — mamãe disse.
— Obrigado.
Alguns minutos depois, ela colocou duas canecas sobre a mesa e sentou-se
na cadeira de frente para mim.
— Quer falar sobre isso?
Franzi a testa.
— Quero voltar no tempo e fazer com que seja quatro dias atrás para
sempre.
— As notícias não foram boas?
Fitei meu chá.
— Eu não consigo acreditar que isso está acontecendo. Minhas opções são,
basicamente, me arriscar em uma briga por custódia ou me casar com uma
mulher que odeio e correr o risco de passar cinco anos na cadeia se for pego
tentando me casar com alguém com o único propósito de burlar as leis da
imigração.
Minha mãe pousou uma das mãos no coração.
— Minha nossa.
— Nem me fale…
— O advogado acha que você teria uma boa chance de ganhar custódia
total?
Balancei a cabeça.
— Ele acha que Maya vai conseguir algum tipo de direito de visita. O que
significa que eu teria que explicar à Saylor quem ela é e correr o risco de Maya
desaparecer mais uma vez assim que conseguir o que realmente quer com tudo
isso. Não posso confiar o coração de Saylor a essa mulher, mãe.
— Nunca pensei que diria ao meu filho que mantivesse uma mãe longe de
uma filha. Mas os motivos pelos quais Maya voltou também me assustam. Não
podemos confiar o bem-estar da nossa Saylor a qualquer pessoa que tenha a
coragem de usar uma criança como uma garantia para conseguir o que quer.
Odeio dizer para não lutar pelo que é certo, mas às vezes não importa quem
vence. A própria guerra já causa todo o dano.
Meus olhos marejaram.
— Eu não sei o que fazer. Mas não posso arriscar que Saylor se machuque
no meio disso tudo.
Minha mãe estendeu sua mão para cobrir a minha.
— Parece que você já fez uma escolha, filho.
Fechei os olhos.
— Por quanto tempo você teria que permanecer casado? — ela perguntou.
— Eu consultei um advogado de imigração e ele disse que o processo leva
em média nove meses a partir do momento em que o pedido é feito. Teríamos
que passar por entrevistas e outras coisas, e é aí que entra o risco de ser pego.
Mas o advogado não pareceu muito preocupado com isso, já que Maya e eu
temos uma filha de quatro anos. Acho que ajuda parecer que estamos juntos há
algum tempo.
Minha mãe assentiu.
— Bom, pelo menos isso não interromperia a sua vida por muito tempo. —
Ela forçou um sorriso. — Acho que o lado positivo é você ser solteiro, então
não terá uma terceira pessoa envolvida que possa se magoar.
Senti um peso se instalar em meu peito ao olhar nos olhos da minha mãe.
— Eu conheci uma pessoa, mãe. Eu ia te contar sobre ela.
— Oh, Colby…
— O nome dela é Billie, e ela é absolutamente maravilhosa. Estamos indo
aos poucos, porque ela queria ter certeza antes de se envolver com alguém que
tem uma filha. Mas acho mesmo que ela pode ser a mulher certa.
Minha mãe abriu um sorriso triste.
— Fico tão feliz por ouvir isso. Embora, obviamente, o momento não seja
ideal.
— É…
— O que a Billie acha de tudo isso?
— Ainda não falei com ela sobre o que os advogados me disseram hoje. Mas
desde o instante em que Maya bateu à minha porta, a prioridade de Billie passou
a ser cuidar de Saylor. No entanto, não sei se ela lidaria bem se eu acabasse me
casando com aquela psicopata. Espero poder falar com ela depois que Saylor
dormir hoje à noite.
Mamãe e eu ficamos quietos por um momento antes de ela apertar minha
mão.
— Parece que Billie tem as prioridades certas. Por que você não deixa
Saylor passar a noite aqui? Nós adoramos ficar com ela, e acho que seria bom
você ter um tempinho.
Aquiesci.
— Isso seria ótimo, mãe. Vou perguntar a ela quando voltar com o papai,
mas tenho certeza de que ela adoraria passar a noite aqui.
Uma hora depois, voltei para casa sem minha filha. Saylor pulou de alegria
quando perguntei se ela queria dormir na casa dos meus pais. Provavelmente
seria melhor assim, já que minha filhinha já era especialista em ler seu velho
pai. Como eu tinha a noite inteira para mim, decidi caminhar os dois
quilômetros e meio até meu apartamento. A noite estava agradável, e eu
esperava que o ar fresco ajudasse a clarear minha cabeça. No caminho, parei em
uma floricultura e comprei um buquê de flores silvestres para Billie. Depois, em
um salto de fé, comprei ravióli fresco e pão, pensando que talvez pudesse fazer
o jantar para ela e levá-la para passar a noite comigo. Quando cheguei ao
Billie’s Ink, não tinha resolvido nenhum dos meus problemas, mas decidi do que
precisava pelas próximas doze horas: uma noite tranquila em casa com a minha
garota.
Justine me cumprimentou quando entrei no estúdio. Ela olhou para o buquê
enorme nas minhas mãos e sorriu.
— Ela está com um cliente. Mas qualquer homem que entre aqui como você
está agora tem passe livre para a sala de tatuagem. — Ela acenou para a porta
com a cabeça. — Vá fazer minha patroa ganhar o dia, lindinho.
Sorri.
— Obrigado, Justine.
Mas meu sorriso murchou bem rápido quando vi o que Billie estava fazendo:
tatuando a bunda de um sujeito. Contudo, seu rosto se iluminou quando me viu
ali.
— Oi! — Ela tirou o pé do pedal e afastou a agulha da pele do cara. — Não
sabia que você ia passar aqui.
Deek piscou para mim.
— Você não precisava ter me trazido flores, garotão. Vinho e lubrificante são
mais o meu tipo de romance.
Dei risada e ergui o queixo.
— E aí, Deek?
O cara deitado de bruços na cadeira hidráulica de Billie olhou para ela.
— Posso ir ao banheiro?
— Sim, claro. Só me dê um segundo para cobrir a sua nádega com um
pedaço de plástico para que a área continue esterilizada.
Quando terminou, ela pediu ao sujeito para não subir a cueca na parte de
trás. Então, fiquei olhando a bunda cabeluda de um cara ir até o banheiro com
três quartos de uma rosa tatuada nela. Bem, a nádega esquerda era cabeluda. A
direita estava depilada.
Billie retirou suas luvas de látex e veio até mim.
— Essas flores são para mim?
Inclinei-me e rocei meus lábios nos dela.
— Há apenas duas mulheres na minha vida, e a outra prefere que eu lhe dê
bombas de banho em formato de unicórnio que defecam glitter quando são
jogados na água.
Billie sorriu.
— Defecam glitter? Eu não sabia que essa era uma opção. Acho que você
vai ter que devolver essas lindas flores.
Passei um braço em volta de sua cintura e a puxei para mais perto.
— Quer jantar comigo?
— Depende. O que você vai me dar para comer?
— É uma pergunta muito capciosa… — Sorri e ergui a sacola em minha
outra mão. — Mas vou me comportar. O que acha de ravióli fresquinho e pão de
semolina?
— Hummm… parece delicioso.
Afastei uma mecha de cabelo de seu rosto.
— Saylor vai dormir na casa dos meus pais. Queria que você passasse a
noite comigo.
— Acho que podemos providenciar isso… — Seu cliente voltou do
banheiro, então ela baixou o tom de voz. — Você quer ir lá fora por um minuto
para falar como foram as coisas no escritório do advogado?
Balancei a cabeça.
— Vamos adiar falar sobre isso até amanhã de manhã. Talvez possamos
passar a noite fingindo que nada disso aconteceu, já que é tão raro eu ter uma
noite inteira sozinho. Não quero desperdiçar sequer um minuto focando em
qualquer outra coisa além de você.
Billie sorriu.
— Parece maravilhoso.
— Ótimo. A que horas você termina?
— Tex é o meu último cliente de hoje. Devo terminar daqui a uns 45
minutos.
Olhei para trás por cima de seu ombro. Tex estava se posicionando de bunda
para cima na cadeira novamente.
— A propósito, por que ele pode tatuar uma rosa na bunda, mas você se
recusou a fazer uma no meu peito quando pedi?
— Porque eu não tenho que olhar para a bunda dele o tempo todo.
— Eu te pedi para tatuar uma rosa em mim quando nos conhecemos. Você
ainda não sabia que ia olhar para o meu peito nu o tempo todo.
Billie inclinou a cabeça para o lado com um sorriso malicioso.
— Tem certeza disso?
— Boa resposta. — Sorri. — Vá terminar de tatuar aquela bunda. Mas suba
para o meu apartamento logo em seguida.
Ela ficou nas pontas dos pés e me deu um selinho rápido.
— Sim, senhor.
Dei o máximo de mim para criar o clima da noite. Quando Billie bateu à
porta, eu estava com duas panelas no fogão, pão aquecendo no forno, música
suave tocando e a mesa posta à luz de velas.
Quando abri a porta, ela estendeu as flores que eu lhe dera no estúdio.
— Trouxe para você.
Sorri.
— Que atencioso da sua parte.
Billie deu risada.
— Eu não queria deixá-las lá embaixo, já que estarei de folga amanhã. Você
tem um vaso? Me dei conta enquanto subia de que talvez você não tenha.
Geralmente, os homens dão flores, não recebem.
— Acho que tenho. Minha mãe me manda flores no Dia dos Pais.
— Awn… que amor.
Peguei o buquê da mão de Billie, coloquei sobre a bancada da cozinha e a
envolvi em meus braços.
— Obrigado por me dar isso.
— As flores? Vou te contar um segredinho… eu meio que as consegui de
graça. — Ela sorriu.
— Eu me referi à folga de tudo que está acontecendo por uma noite. Do jeito
que estava me sentindo esta tarde, não achei que conseguiria mudar meu humor.
Mas a ideia de passar uma noite sozinho com você fez isso ser mais fácil do que
pensei.
O rosto de Billie suavizou.
— Fico feliz em poder ajudar.
Acariciei seu nariz com o meu.
— Você ajuda. Muito.
Servi uma taça de vinho para cada um de nós e Billie sentou-se na bancada
ao lado do fogão enquanto eu terminava de cozinhar.
— Eu trouxe um joguinho para nós, caso você precise de mais uma animada.
— Ah, é? Que tipo de jogo?
Ela apontou para sua bolsa na cadeira.
— Pegue a minha bolsa que eu te mostro.
Billie retirou de sua bolsa um pacote com uma pilha de cartas grandes,
mostrando-me o nome que havia na parte da frente da embalagem.
Arqueei uma sobrancelha.
— Perguntas e Respostas sobre Sexo?
— Comprei naquela bodega no fim da rua que vende bongos para fumar
ervas e revistas adultas. Esse joguinho fica atrás do balcão, e faz um tempo que
ele despertou minha curiosidade.
Sorri.
— Você compra coisas naquele lugar? Só vi as coisas que eles vendem pelo
lado de fora.
Ela me lançou um olhar.
— Pare de julgar. O café de lá é ótimo, e custa apenas um dólar.
Peguei as cartas de sua mão.
— Terei que conferir o lugar depois. Temos um tempinho antes do jantar
ficar pronto. O que acha de fazermos uma aposta com esse joguinho?
— Você nem viu a primeira pergunta ainda e quer apostar que vai ganhar?
Dei de ombros.
— Se eu perder, comerei você de sobremesa. Se você perder, comerei você
de aperitivo.
— Hum… parece que ganharei mesmo se perder.
— Temos um acordo?
Billie abriu um sorriso sugestivo.
— Não sou de fugir de uma aposta.
Sorri.
— Essa é a minha garota.
A primeira carta da pilha era bem interessante. Pigarreei e li em voz alta.
— Qual posição é a mais provável de levar a mulher ao orgasmo? A. De
quatro; B. Papai e mamãe; C. Cavalgar de costas; ou D. Mulher por cima?
Billie retorceu os lábios ao pensar na resposta.
— Hum… vou escolher a opção D, mulher por cima, porque assim ela tem
mais controle.
— Controle, hein? É disso que você gosta?
Ela confirmou com a cabeça.
— Geralmente, sim. Mas gosto muito quando você fica todo mandão. Acho
que os meus problemas de confiança me impediam de curtir quando o homem
fica no controle.
Olhei bem fundo em seus olhos.
— Isso significa muito para mim.
— Então, essa era a resposta certa?
— Sim, você acertou. Mulher por cima é a posição mais provável de levar a
mulher ao orgasmo. — Sorri de orelha a orelha. — Além disso, mal posso
esperar para você me cavalgar.
Billie deu risada e pegou a pilha de cartas das minhas mãos.
— Acho que o placar está um a zero. Vamos ver o que temos aqui. — Ela
examinou a próxima carta. — Uma mulher prefere: A. Limpar a casa; B. Comer
o jantar; C. Brincar com um joguinho de perguntas e respostas; ou D. Ser fodida
na bancada da cozinha ao lado de uma panela de ravióli.
Franzi as sobrancelhas por meio segundo antes de entender. Em seguida,
tomei a carta de sua mão e a joguei por cima do ombro.
— Vou escolher a D.
Billie envolveu meu pescoço com os braços.
— D era a resposta correta.
— Ótimo, linda. Porque é exatamente isso que vai acontecer agora.
O ravióli teria que esperar. Apaguei o fogo da panela com água que estava
começando a ferver e puxei as pernas de Billie para envolverem a minha
cintura. Era a primeira vez que tínhamos passe livre para fazer o que
quiséssemos nesse apartamento por uma noite inteira, e eu estava adorando isso.
— Vou comer você antes do jantar, ok? — murmurei.
Billie assentiu ao tirar minha camiseta enquanto eu desfazia os laços de seu
espartilho. Seus montes lindos e macios saltaram para fora simultaneamente e,
sem perder tempo, tomei um dos mamilos na boca. Chupei tão forte que ela
estremeceu. Billie enterrou as unhas compridas em minhas costas antes de
deslizar as mãos para cima e puxar meus cabelos.
Duro pra caralho, não podia esperar nem mais um segundo para estar dentro
dela. Abri sua calça jeans e ela se retorceu para se livrar da peça antes de chutá-
la no chão. Desfiz a fivela do meu cinto e abaixei minha calça apenas o
suficiente para colocar meu pau para fora. Não podia mais esperar sequer o
tempo que teria levado para retirar a calça por completo. Isso era o quanto eu
precisava dela imediatamente.
Soltando um som ininteligível, enterrei-me nela. Sua boceta era puro êxtase.
Os músculos de Billie se contraíram em torno do meu pau conforme eu a
penetrava com força. Continuei segurando-a enquanto ela impulsionava os
quadris. Eu devia estar com muito tesão acumulado, porque era como se eu não
conseguisse fodê-la rápido o suficiente. Billie não pareceu se importar ao se
contorcer sob mim, sincronizada ao ritmo das minhas estocadas.
Ela nunca esteve tão apertada, tão molhada, tão pronta para mim. Nós dois
estivemos sob um estresse intenso durante a última semana, e isso era
exatamente do que precisávamos. Estávamos tão envolvidos que demorei um
pouco a perceber que não tinha parado para colocar uma camisinha. Billie havia
mencionado que tinha começado a tomar pílula recentemente, mas eu precisava
conferir mais uma vez se ela estava pronta para isso.
— Tudo bem? — perguntei. — Não coloquei camisinha.
— Sim — ela ofegou. — Tudo bem.
Gemi.
— Achei que não tinha como ser ainda melhor estar dentro de você, mas,
puta merda.
— Eu sei. Nunca transei sem camisinha antes.
Parei de me mover dentro dela por um instante.
— Está falando sério?
Ela confirmou balançando a cabeça.
— Espere… — Pisquei algumas vezes. — Eu vou ser o primeiro cara a
gozar dentro de você.
Ela mordeu o lábio e assentiu novamente.
— Caralho. Você não faz ideia do que isso faz comigo. — Meti nela
novamente.
Ela puxou meus cabelos.
— Não pare mais, por favor.
— Sim, senhora. — Estoquei com mais força.
Dava para ouvir os sons escorregadios da nossa excitação conforme eu
entrava e saía dela. Quando senti seus músculos se contraírem, não pude segurar
mais. Rosnei, enterrando-me nela o mais fundo que pude ao gozar. Ela
continuou a se contrair ao meu redor e jogou a cabeça para trás, sua voz
ecoando pela cozinha conforme seu orgasmo a arrebatava. Continuei me
movendo, entrando e saindo, até não sobrar mais nada, e então fiquei dentro
dela por um tempinho, com sua bunda apoiada sobre a bancada.
Ela ofegou.
— É melhor limparmos essa bancada.
— Dane-se a bancada, mas é melhor eu pegar uma toalha para você. Se bem
que gosto de saber que meu gozo está dentro de você.
Ela falou contra minha pele.
— Podemos providenciar isso de novo mais tarde.
— Adoro ouvir isso.
Estiquei-me para pegar um pano da gaveta, colocando delicadamente
debaixo dela enquanto enchia seu pescoço de beijos.
— Tenho uma ideia — eu disse.
— Qual?
— Vá tomar um banho relaxante na banheira. Vou terminar de fazer o jantar.
Depois, levaremos para o meu quarto para comermos na cama pelados. O que
acha?
— Parece uma noite perfeita.
Em vez de sair correndo para o banheiro, Billie continuou ali, com seus
braços ainda em volta do meu pescoço enquanto olhava em meus olhos. Me dei
conta de que vivenciei poucos momentos em minha vida tão especiais quanto
aquele: estar ali no meio da cozinha seminu com a linda mulher com quem tinha
acabado de fazer amor, que confiou em mim o suficiente para me deixar gozar
dentro de seu corpo delicioso.
Esse podia não ser um momento classicamente romântico, mas parecia o
certo para dizer a ela.
— Estou me apaixonando por você, Billie.
Meu coração ficou preso na garganta enquanto ela me encarava por vários
segundos. E se ela não sentir o mesmo? E se ela tiver medo de me amar, diante
de tudo que vinha acontecendo ultimamente?
— Você não está sozinho, Colby — ela finalmente disse. — Eu só não
queria ser a primeira a expressar o que estou sentindo. Acho que estive hesitante
porque tinha medo de que, se caísse de amores, você não estivesse lá para me
segurar. O que é idiotice, eu sei. Deixei minhas experiências passadas
interferirem no que está acontecendo entre nós. Eu deveria ter dito isso antes de
você ir tomar café da manhã com aquela bruxa, porque aquele foi o dia em que
percebi o quanto os meus sentimentos tinham se intensificado. Eu soube, porque
somente pensar em você sofrendo me deixou doente. Enfim, desculpe por falar
tudo isso agora. Sei que a ideia era esquecermos tudo por uma noite.
Puxei-a para um beijo e sussurrei contra sua boca:
— Sempre estarei aqui para te segurar, Billie.
— Eu acredito em você, Colby.
Tinha mais uma coisa que eu queria dizer, mas refreei-me: Eu queria que
fosse você que precisasse se casar comigo.
A noite anterior foi crua em todos os sentidos da palavra. O jeito como
fizemos sexo, o jeito como expressamos nossos sentimentos um pelo outro. E
agora que eu tinha aberto os olhos, sentia a crueza da nossa realidade atual
voltando aos poucos.
A manhã tinha sido agridoce. Colby me contou como fora a reunião com o
advogado e todas as novas inseguranças e arrependimentos resultantes disso. O
advogado sentia que o caso de Maya era mais forte do que esperávamos. Aquilo
me deixou chateada, mas eu tinha que permanecer forte por Colby. Ele ainda
não tinha tomado uma decisão sobre o que fazer.
Nossa conversa sobre a situação de Maya foi a parte ruim da manhã. A parte
boa foi termos passado todo o tempo anterior a essa conversa fazendo um sexo
maravilhoso.
Colby me pediu para ir com ele à casa de seus pais para buscar Saylor. Eu
pretendia voltar ao meu apartamento depois disso.
Quando chegamos à casa de seus pais, sua mãe parecia saber exatamente
quem eu era.
— Você deve ser a Billie.
Olhei para Colby, depois novamente para ela.
— Sou.
— É uma maravilha conhecê-la.
— Igualmente.
— Ela é muito bonita. Você é um cara de sorte, Colby — a sra. Lennon disse
para o filho.
Ele apertou o braço em torno de mim.
— Eu sei.
Saylor veio correndo em nossa direção.
— Billie!
Ajoelhei-me para receber seu abraço.
— Oi! Você se divertiu?
Ela assentiu avidamente.
— Vocês gostariam de ficar um pouco? — A mãe de Colby indagou. — Fiz
aquela sopa de ervilha que você gosta, Colby. Saylor já comeu, então ela
provavelmente não vai sentir fome por um tempo.
Colby olhou para mim.
— Acho que é melhor levarmos Saylor para casa. Mas obrigado pela oferta.
Sorri.
— Talvez outro dia, sra. Lennon. Essa sopa parece deliciosa.
— Por favor, me chame de Yvonne.
Do lado de fora, na calçada, Colby segurou a mão de Saylor e me perguntou:
— Você tem que ir a algum lugar?
— Pensei em ir para casa. Vou deixar você ficar um tempinho com a Saylor.
— Está brincando? — Ele me puxou para si. — Não estou pronto para me
separar de você.
— É mesmo? — Sorri.
— Sim. Pode ficar conosco?
Sinceramente, quantos dias sem complicações ainda teríamos? De jeito
nenhum eu recusaria isso. Como não tinha clientes marcados para o dia, eu
acabaria indo para casa somente para ruminar sobre Colby. Então, podia muito
bem ficar com ele.
— Não há nada que eu queira mais do que ficar com vocês.
— Ótimo. — Ele olhou para Saylor. — Essa pequena aqui precisa de pasta
de amendoim e tenho que comprar alguns frios para a semana. Se importa se
passarmos no mercado? Posso comprar algo para o jantar também.
— Mostre o caminho. — Sorri.
Quando chegamos ao mercado, Colby seguiu por uma direção para pegar as
coisas de que precisava, enquanto nós, meninas, fomos por outra. Estávamos
nos divertindo apenas explorando as prateleiras. Coloquei Saylor em um
carrinho e posso ter corrido com ela por alguns corredores. Também posso ter
colocado cereais Cap’n Crunch, Pop-Tarts e biscoitos Goldfish no carrinho.
Aparentemente, você não pode me levar ao mercado. Sou uma criança sem
supervisão com um orçamento de adulto.
Fomos parar na seção da confeitaria ― claro, já que eu estava no comando
― para que eu pudesse mimar um pouco Saylor com um biscoito. Entramos na
fila, que tinha algumas pessoas. Em determinado momento, a mulher ao meu
lado olhou para Saylor e disse:
— Ela é adorável. Que garotinha linda.
— Obrigada. — Sorri.
Percebi que a mulher tinha, provavelmente, presumido que Saylor era minha
filha. E eu havia essencialmente recebido crédito pela beleza da garotinha.
Deixei aquele sentimento marinar por alguns segundos. Aos olhos daquela
estranha, eu era uma mãe. Saylor era minha filha, estava em segurança comigo.
A vida era simples. E eu desejava do fundo do coração que isso fosse verdade,
que pudéssemos ir para casa naquela noite e dormir tranquilamente, sem
preocupação alguma. Fui preenchida por um anseio sufocante.
O momento foi interrompido quando finalmente chegamos ao começo da
fila.
— O que vai querer? — a atendente perguntou.
Deixei Saylor escolher o que queria. Ela apontou para o último biscoito com
gotas de chocolate gigante da vitrine.
— O biscoito gigantesco, por favor — eu disse.
Ele devia ter pelo menos quinze centímetros de diâmetro. Depois que a
mulher o embrulhou e o entregou para Saylor, a menina atrás de nós começou a
chorar de repente.
— Ela está bem? — perguntei à mãe da menina.
— Desculpe. Infelizmente, não está. Ela estava esperando por esse biscoito.
Sempre compramos um quando visitamos esse mercado, o que, felizmente, não
acontece com tanta frequência. Ela o chama de “biscoitão”. Foi por isso que
viemos hoje. Prometi que, se ela se comportasse durante o corte de cabelo, eu o
compraria.
Ah, droga. Virei-me para Saylor.
— Querida, será que você pode dividir esse biscoito com essa garotinha? Ela
está triste porque ficamos com o último.
Para minha surpresa, Saylor entregou o biscoito inteiro.
— Tome. Não chore.
Meu coração apertou, não somente pela doçura de seu gesto, mas porque os
olhos de Saylor também estavam marejando. Quanta empatia para uma
garotinha. Um ser humano maravilhoso.
— É muita gentiliza sua — a mulher respondeu. — Mas você deveria ficar
com a metade.
Saylor negou com a cabeça.
— Ela pode ficar com ele todo.
— Uau. Obrigada — ela disse. A mulher sorriu para mim. — Você tem uma
filha incrível.
— Eu sei — respondi sem hesitar.
Ela virou-se para sua filha.
— Agradeça, Elena.
— Obrigada! — A garotinha fungou e sorriu, com as bochechas ainda
molhadas de lágrimas.
Saylor acenou para se despedir, e a garotinha retribuiu.
Depois que elas foram embora, voltamos para a fila para comprar um
cupcake para Saylor. Fiquei pensando no quanto ela tinha sido fofa ao insistir
que a garotinha ficasse com o biscoito inteiro. A generosidade de Saylor era
uma prova de seu espírito bondoso, e certamente resultante do fato de ter um pai
que a criava da maneira certa ao lhe dar um bom exemplo. Colby era o tipo de
homem que tiraria a própria camisa para dar a um estranho, se fosse preciso. Ele
também iria até o fim do mundo pelas pessoas que amava.
Chegamos ao começo da fila novamente, e pedi a nova guloseima de Saylor.
Ela deu uma mordida enorme no cupcake e ficou com cobertura cor-de-rosa
no nariz. Eu não me cansava de sua fofura.
Eu sabia que meu apego a Saylor estava diretamente relacionado ao fato de
estar me apaixonando por seu pai. Afinal de contas, Saylor era uma extensão de
Colby. Eu me importava verdadeiramente com os dois.
E então, meu bonitão apareceu, empurrando um carrinho cheio até o topo.
— Aí estão vocês. — Ele sorriu. — Achei que tinha te perdido.
— Nunca. — Pisquei.
Ele me deu um beijo na bochecha e olhou para meu carrinho.
— Quantas escolhas saudáveis.
— Bom, o meu namorado está encarregado de me fazer brownies de
espinafre para que eu possa me alimentar melhor. — Abracei-o pela cintura. —
Espere só até eu contar o que a sua lindinha fez.
Contei a história do biscoito para Colby ao seguimos para a fila do caixa. Ele
ficou muito orgulhoso da filha.
Voltamos para o apartamento de Colby e ficamos de bobeira juntos até a
hora do jantar. Embora tenhamos curtido as fajitas que ele preparou, o clima
havia definitivamente murchado. A sensação de que a realidade estava prestes a
recair sobre nós estava mais forte do que nunca. Colby, por sua vez, parecia
perdido em pensamentos enquanto terminávamos a refeição.
Ofereci-me para dar um banho em Saylor enquanto ele limpava tudo.
Quando Saylor foi para seu quarto para brincar um pouco antes de dormir,
encontrei Colby na cozinha e o abracei por trás.
— Fale comigo. Posso ver que você está se afundando na própria mente.
Ele apoiou os dois braços sobre a bancada e expirou. Após alguns segundos
de silêncio, ele finalmente se virou para mim.
— E se ela for deportada e puder, de alguma forma, levar Saylor embora do
país? Eu morreria, Billie.
— Isso não vai acontecer — eu o assegurei, embora estivesse me
preocupando com a mesma coisa, ultimamente. Havia muitos cenários
catastróficos possíveis.
— Como você sabe que isso não vai acontecer? — ele perguntou.
— Tudo bem, eu não sei. Não sei de nada, na verdade. Mas rezarei para que
isso nunca aconteça. E tenho fé de que o bem irá prevalecer no final.
Colby fitou o vazio.
— Tive um pesadelo sobre isso ontem. Acordei no meio da noite suando.
Você estava dormindo. Ainda bem que não me viu daquele jeito. Mas acho que
você está me vendo surtar por isso agora, de qualquer jeito.
Segurei seu rosto entre as mãos.
— Você tem todo direito de surtar, e nunca ache que precisa esconder nada
de mim. Quero tanto as partes boas quanto as ruins e feias.
Saylor entrou correndo no cômodo, interrompendo nossa conversa.
— Billie, você pode me contar uma historinha antes de dormir?
Olhei para o relógio. Sua hora de dormir era às oito e meia, e nenhum de nós
tinha se dado conta de que já eram nove da noite.
— Claro — eu disse.
— Sem livro! — ela insistiu.
— Sem livro de novo? Não sou tão criativa assim, Saylor.
— Sem livro! — Ela deu risadinhas.
— Ok, sem livro. — Eu a peguei nos braços e lhe fiz cócegas. — Vamos.
Olhei para Colby, que estava com um sorriso nos lábios, apesar do medo
insistente em seus olhos.
Saylor se aconchegou ao meu lado em sua cama. Eu adorava o quarto dela à
noite, com as luzes apagadas. Ela tinha adesivos no teto que brilhavam no
escuro, acendendo uma luz roxa. Era um lugar relaxante. Eu não fazia ideia de
qual história contar a ela, então comecei com uma frase simples.
— Era uma vez, um lindo bebê passarinho. — E então, comecei a inventar
umas merdas ao continuar. — Ele morava seguro em um ninho no topo de uma
árvore com sua família.
Os olhos de Saylor pareciam pires enquanto ela me observava, ansiosa pela
próxima frase. Ela era fofa demais.
— Um dia, um falcão enorme veio e tentou levar o bebê passarinho embora.
Jesus. Era a arte imitando a vida. Aparentemente, eu só pensava em uma
coisa.
— Por quê? — ela perguntou.
Porque ela é uma safada oportunista.
— Porque o falcão queria o ninho. Ele estava usando o bebê passarinho
como uma forma de fazer a família de pássaros dar seu lar para ele, embora ele
não tivesse direito algum de tomá-lo.
— Que maldade.
— Eu sei. Mas a história tem um final feliz. — Só não sei como eles
chegarão lá.
— O que aconteceu?
— Bem, o falcão levou o bebê passarinho, mas, quando voltou para tentar
pegar o ninho, os pássaros maiores se juntaram e bateram as asas com tanta
força e tão rápido que assustaram o falcão. O falcão percebeu que não podia
intimidar os pássaros. Então, devolveu o bebê passarinho e foi embora.
— Ele nunca mais voltou?
— Ela. Era um falcão-fêmea. — Claro que era. — Mas, não, o falcão-fêmea
nunca mais voltou, e eles viveram felizes para sempre.
Saylor bocejou e apoiou a cabeça em mim. Ela adormeceu em questão de
minutos. Isso provou o quão fascinante minha história tediosa havia sido.
Decidi ficar ali por um tempinho, olhando-a dormir. Me dei conta de que,
nesse momento, eu era a única mulher em sua vida além da mãe e da irmã de
Colby. Isso me deu um senso de responsabilidade. Senti que era minha função
protegê-la, mesmo que isso significasse protegê-la de sua própria mãe.
A ruína iminente do que eu sabia que tinha que acontecer me atingiu em uma
sensação esmagadora. Senti uma onda repentina de náusea, e me levantei da
cama o mais suavemente que pude sem acordá-la.
Fui direto para o banheiro e me curvei sobre a privada, tentando não vomitar.
Foquei na tatuagem da chave da minha avó no meu braço, pedindo
silenciosamente sua força naquele momento. Mas, alguns segundos depois,
sucumbi à sensação enjoativa em meu estômago, vomitando na privada. Bem,
esse foi certamente um dia cheio de surpresas. Pude ouvir os passo de Colby
vindo pelo corredor.
— Você está bem? — ele perguntou, parecendo assustado e segurando meus
cabelos.
Assenti, rezando para que tivesse acabado. Eu não queria vomitar de novo na
frente dele. Porque o que é mais atraente que isso?
— Acho que já coloquei tudo para fora — eu disse, ofegando.
Eu sabia que isso era a manifestação física de tudo que vinha se formando
dentro de mim o dia todo. O amor. O medo. O pavor. No fim das contas, foi a
conclusão à qual cheguei que havia me feito vomitar. Porque era literalmente
repugnante.
Virei-me para ele e verbalizei.
— Você precisa fazer isso. Precisa se casar com Maya. Quanto menos você
demorar para fazer isso, menos irá demorar para acabarmos com esse pesadelo.
— Então, amanhã será o grande dia, não é? — Holden tirou a tampa de uma
garrafa de cerveja e a deslizou por cima da mesa de sua cozinha para mim. —
Você vai ter que contar à Maya a sua decisão?
Franzi a testa.
— Nem me lembre.
— Você sabe o que vai fazer?
Durante a última semana, mudei de ideia meia dúzia de vezes. O problema
era que a minha cabeça achava que uma coisa era certa, e meu coração tinha
uma ideia diferente. Suspirei.
— Tenho quase certeza de que vou mudar de ideia umas vinte vezes de
agora até amanhã às oito.
Holden assentiu.
— Entendo. Tenho dificuldades para decidir que tênis usar na maioria dos
dias, imagine ter que lidar com essa merda que você está passando. O que a
Billie acha de tudo isso?
— Ela tem sido maravilhosa demais. Não sei se eu seria tão solidário como
ela tem sido se os papéis fossem invertidos e ela estivesse considerando se casar
com outro cara. Mas Billie tem insistido que acha que eu deveria me casar com
Maya.
Holden ergueu as sobrancelhas.
— Sério?
— Ela não quer que eu coloque Saylor em risco de forma alguma. Disse que
o que importa é protegermos a minha garotinha, não como nos sentimos em
relação a isso.
— Nossa.
Bebi um pouco da cerveja diante de mim.
— Pois é. Ela é a mulher mais incrível que já conheci. Quer ouvir uma coisa
bizarra?
Holden abriu um sorriso sugestivo.
— Bizarro é o meu nome do meio, meu amigo.
— Ontem à noite, sonhei que Billie estava grávida de um bebê nosso. Ela
estava com, tipo, seis meses de gestação e sua barriga estava grande e redonda,
e eu não conseguia tirar as mãos dela.
Meu amigo sorriu.
— Você já disse a ela que a ama?
Balancei a cabeça.
— Não com muitas palavras. Para ser honesto, eu me acovardei e disse a ela
que estava me apaixonando em vez de dizer que já sou apaixonado por ela.
— Por quê?
Dei de ombros.
— Não parece justo dizer isso a ela em meio a tudo que está acontecendo.
Não quero que seja ainda mais difícil para ela se afastar, se isso for o que
precisar fazer.
— Você está falando, mas ouviu o que disse nos últimos minutos? Vocês
dois estão colocando um ao outro em primeiro lugar, acima da própria
felicidade. Ela prefere que você se case com outra mulher para proteger Saylor,
e você não quer dizer a ela que a ama para que fique mais fácil dar um pé na sua
bunda. Você realmente acha que não dizer as palavras as torna menos
verdadeiras para qualquer um de vocês?
Passei um dedo pela condensação sobre o rótulo da garrafa de cerveja.
— Acho que não. Mas parece egoísta confessar isso agora.
Holden sustentou meu olhar.
— Já estive nesse lugar. Mas sabe qual é a consequência de deixar de falar o
que sente de verdade?
— Qual?
— Passar uma noite inteira assistindo à garota pela qual você é louco de
mãos dadas com seu noivo, anos depois. O que acaba te fazendo encher a cara e
ir para casa com uma mulher aleatória que grita o nome errado ao gozar e, em
seguida, te entrega a sua calça dizendo que precisa acordar cedo na manhã
seguinte.
Franzi as sobrancelhas.
— Você viu a Lala?
Holden assentiu.
— Fiz um show na Filadélfia outra noite. Ela estava lá com o noivo, dr.
Babaca.
— O que ele fez para ser um babaca?
Meu amigo me olhou bem nos olhos.
— Estava segurando a mão da Lala.
Era a primeira vez que Holden falava sobre Lala ― como chamamos
carinhosamente a irmã mais nova de Ryan, Laney ―, desde a semana após o
funeral de Ryan, quando ele ficou bêbado e admitiu para mim que sentia algo
por ela há muito tempo. Eu suspeitava disso, mas mantive minha boca fechada,
porque não era da minha conta. Além disso, Lala podia cuidar de si mesma. Ela
era mais esperta do que todos nós juntos.
— Como ela está?
— Bem crescidinha… — Holden desviou o olhar por um momento. —
Minha questão é: se você acha que ela é a mulher da sua vida, diga a ela. Não
fique de enrolação ou sentindo culpa pela maneira como se sente. Aprenda
comigo, existe uma razão pela qual amor e dor rimam. É muito fácil perder o
barco e acabar pegando o errado.
Caramba. E eu aqui pensando que sua paixonite por Lala tinha acabado
havia tempos. Holden era a última pessoa que eu acharia ser capaz de dar
conselhos perspicazes sobre amor, e, ainda assim, ele deixou seu ponto alto e
claro. Assenti.
— Valeu, amigo. Você tem razão. Vou criar coragem e garantir que Billie
saiba que estou mais do que me apaixonando por ela.
Ele assentiu.
— Então, como vai ser se você casar com Maya? Vocês vão morar juntos e
toda essa merda?
— Nem fodendo. Seria somente um pedaço de papel. Eu não teria nenhum
contato com ela além da entrevista necessária para a imigração. Tenho feito
algumas pesquisas. Meu advogado disse que o processo geralmente leva cerca
de nove meses, mas também li que às vezes essa merda fica mais lenta e pode
levar alguns anos. A única maneira possível de fazer isso é se eu puder esquecer
que Maya existe durante esse período. Não quero nem mesmo saber onde ela
mora.
— Não quero complicar ainda mais as coisas, mas o que acontece se Billie
engravidar durante esse período? Se algo não planejado surgir? Você poderia
sair do casamento forjado, se precisasse? Tipo, conseguir um divórcio rápido ou
uma anulação? Quero dizer, merdas assim acontecem todos os dias na vida real,
certo? Existe algum tipo de cláusula de escape?
Arrastei uma das mãos pelos cabelos.
— Não faço a menor ideia. Mas o advogado com quem me consultei disse
que, às vezes, os casos podem ser mais rápidos quando uma pessoa está
correndo o risco de ser deportada e tem um filho que seja cidadão americano.
Ele disse que poderíamos solicitar isso, mas não há garantia.
— Saylor a conheceria?
— Definitivamente não. Maya só voltou para nossas vidas para usá-la como
moeda de troca. Ela não é uma mulher que se deu conta de que cometeu um
grande erro e quer de verdade conhecer a filha. Não vejo nada além de mágoa se
Saylor a conhecesse como sua mãe biológica, ou como qualquer outra coisa,
aliás.
— Você vai colocá-la no seu plano de saúde do trabalho e contar às pessoas
e tal? E se, Deus me livre, algo acontecer com você? Isso significa que Maya
fica com a custódia? E você tem um testamento? Eu tive um tio que foi casado
por seis meses. A esposa o traiu durante toda a curta duração do casamento, mas
ele morreu de ataque cardíaco antes de se divorciarem legalmente, e ela ficou
com a casa dele e outras coisas. Existe uma maneira de contornar isso, por via
das dúvidas?
Soltei duas respirações profundas pela boca e balancei a cabeça.
— Você está fazendo a minha cabeça girar, Holden.
— Desculpe, cara. Só estou tentando ajudar.
Assenti.
— Eu sei, amigo. E fico muito grato, mais do que você imagina. Se eu
decidir ir em frente com isso, terei que sentar com o meu advogado e fazer todas
essas perguntas antes que qualquer coisa aconteça, para me certificar de que
Saylor e eu fiquemos adequadamente protegidos. Mas, nesse momento, só
preciso parar de falar sobre isso.
— Sem problemas. Que tal falarmos sobre o meu assunto favorito? —
Holden abriu um sorrisão e tomou um gole de cerveja. — Eu.
Dei risada.
— Isso parece perfeito. Me conte o que anda rolando com você,
ultimamente. Além de ter visto Lala com o noivo. Tenho certeza de que você já
tem pelo menos uma dúzia de histórias acumuladas que poderão me animar
desde a última vez em que nos falamos.
Holden bebeu o restante de sua cerveja.
— Bem, eu quase coloquei um Príncipe Albert, um dia desses.
Ergui as sobrancelhas.
— Você ia colocar um piercing no pau?
— Não de propósito. Mas quase aconteceu por acidente.
Balancei a cabeça, sorrindo. Isso era exatamente do que eu precisava
naquele momento: a vida louca de Holden.
— Ok, me conte. Como você quase colocou um piercing no pau por
acidente?
Holden balançou um dedo para mim.
— Essa é uma ótima pergunta. Mas, antes de explicar, deixe-me começar
dizendo que fiquei meio arrasado depois de ver Lala com o dr. Babaca. Agora
sei que estava tentando preencher um vazio passando muito tempo conversando
com mulheres no Tinder, então não preciso de um sermão. Já recebi um de
Owen quando contei essa história para ele. Enfim, eu conheci uma mulher que
deixou claro que estava procurando diversão e nada mais. Nos encontramos em
um bar e tomamos uma bebida, e então ela sugeriu que pegássemos um Uber
para algum lugar para que ela pudesse me fazer um boquete no banco de trás.
Ela curtia saber que o motorista estava nos vendo pelo espelho retrovisor
enquanto dirigia.
Balancei a cabeça.
— Só você mesmo, meu amigo.
— Ela era muito bonita também. Ruiva, braço tatuado. Uma vibe meio
Billie. — Ele piscou para mim. — Deve ter sido por isso que fiquei a fim dela.
— Nem brinque com isso, cara.
Ele riu.
— Só estou brincando. O nome dela era Ryland, e ela tinha um desses
piercings no nariz em forma de argola. Entramos no Uber e ela não perdeu
tempo, foi logo colocando a cabeça no meu colo. Depois, sugeri que fôssemos
para a casa dela para eu poder retribuir o favor, sabe, porque sou um cavalheiro
e tudo mais. Mas ela disse que estava naqueles dias e sugeriu que nos
encontrássemos na próxima semana em outro bar. Ela quer que eu a chupe no
banheiro feminino, sentada na pia e com a porta destrancada.
— Ela é exibicionista ou algo assim?
Holden deu de ombros.
— Acho que sim, mas tô dentro. Que cada um faça o que lhe der mais
prazer, contanto que ninguém se machuque no processo, certo? Enfim,
encerramos a noite e peguei o trem de volta para o bar onde nos encontramos. O
dia estava agradável, então eu tinha ido para lá de moto e precisava buscá-la.
Mas, quando subi nela, a maldita bateria estava descarregada. Tive que empurrar
trezentos quilos até uma colina para que eu pudesse descer com ela pela
inclinação e conseguir dar a partida. Quando fiz isso, senti um beliscão na base
do meu pau. Doeu pra caralho e não parava. Na verdade, tive que desligar a
moto e voltar ao bar para usar o banheiro masculino para ver o que diabos
estava acontecendo. Acontece que minha exibicionista ruiva tinha perdido seu
pequeno piercing de nariz enquanto me chupava. O troço era muito afiado, e, de
alguma forma, foi parar na minha cueca. Ele tinha perfurado a pele na base do
meu pau. Por isso, quase coloquei um Príncipe Albert por acidente.
— Meu Deus, você é um desastre ambulante. — Me escangalhei de rir. —
Mas obrigado, cara. Estava precisando muito disso.
— Sempre que quiser. Estou aqui para o que puder oferecer.
Maya apareceu na tarde seguinte com seu advogado. Xavier Hess parecia tão
duvidoso quanto sua cliente.
— Conheço uma pessoa que trabalha no escritório de imigração local — ele
disse. — Conseguirei que o caso seja processado o mais rápido possível assim
que a papelada for preenchida.
Meu advogado balançou a cabeça.
— Não quero participar de nada ilegal.
— Não há nada de ilegal em se ter amigos. Não me diga que nunca mandou
um papinho para a assistente de um juiz para conseguir que o seu caso fosse
processado primeiro porque está com o dia cheio?
— Contanto que seja somente isso.
— Quanto tempo vai demorar se conseguirmos acelerar o processo? —
perguntei.
— Provavelmente apenas alguns meses — Xavier respondeu.
— Ótimo. Eu gostaria de estar divorciado até o fim do ano.
Meu advogado franziu a testa.
— Colby, você vai ter que manter esse tipo de comentário para si. Não posso
representá-lo se acreditar que o seu casamento com Maya é uma farsa.
Pela primeira vez desde que aquela bruxa maldosa voltou para minha vida,
Maya pareceu um pouco nervosa. Ela segurou minha mão sobre meu colo.
— Nosso casamento não é uma farsa. O Colby só tem um senso de humor
sombrio, não é, querido?
Puxei minha mão da sua.
Meu advogado alternou olhares entre nós antes de falar.
— Vocês precisarão conhecer um ao outro muito bem. O processo de
entrevista nem sempre é simples. Às vezes, eles fazem perguntas invasivas que
marido e mulher deveriam saber um sobre o outro.
Franzi as sobrancelhas.
— Tipo o quê?
— Qualquer coisa que quiserem. O quão rápido foi a primeira vez em que
fizeram sexo? Quantos irmãos cada um tem? Como foi o pedido de casamento?
As respostas de vocês precisam estar em sincronia, ou serão encaminhados para
uma entrevista de suspeita de fraude. Como eu disse naquele dia, a pena por
tentar fraudar o governo casando-se com alguém por motivo de imigração é de
até cinco anos de prisão e multa de 250 mil dólares.
O advogado de Maya se manifestou.
— Não vamos nos precipitar. Esses dois têm uma filha de quatro anos
juntos. Essa não é uma situação de noiva por encomenda.
Eu estava prestes a dizer que era ainda pior, porque estava sendo
chantageado, porra. Mas me impedi, sabendo que meu advogado tinha
escrúpulos. Em vez disso, engoli as informações. Além do mais, não tínhamos
feito nada ilegal ainda, então eu tinha tempo para cair fora. Após meia hora, eu
disse ao meu advogado que manteria contato para informá-lo se e quando
gostaríamos de apresentar um pedido de cidadania. Mas eu ainda tinha algumas
perguntas sobre coisas que poderia fazer para me proteger antes de entrar em um
casamento, e não queria fazê-las na frente de Maya. Então, disse a ela e seu
advogado que precisava de alguns minutos a sós com Adam. Maya respondeu
que me esperaria do lado de fora.
Eu queria muito que ela tivesse ido embora ― o dia já havia sido
desgastante o suficiente ―, mas é claro que ela não foi. Ela e seu advogado
vigarista estavam esperando na rua quando saí do prédio.
— Tudo pronto? — ela perguntou.
— Nem sei se conseguiremos fazer isso de forma convincente. Não sabemos
nada um sobre o outro. Como vamos conseguir passar em uma entrevista com
perguntas intrusivas como as que meu advogado mencionou?
— Existem negócios que podem prepará-los — Xavier disse. — Passarei
para Maya alguns números para os quais ela pode ligar.
— Nos preparar? Como assim?
— Serviços de preparação para entrevista de imigração. Eles mantêm uma
base de dados com perguntas que são comumente feitas nessas entrevistas.
Vocês dois as respondem e depois trocam para poderem memorizar como
precisarão responder no momento da entrevista. Alguns deles são de alta
tecnologia hoje em dia, e podem ser feitos on-line.
Franzi a testa e balancei a cabeça.
— Pessoas ganham a vida ajudando outras a fraudar o governo. Maravilha.
Deus abençoe a América.
— Pense nisso como uma preparação para uma prova, Colby — Xavier
falou. — Quando se quer ser advogado, é preciso fazer um curso preparatório e
estudar com questões práticas de provas anteriores do exame da Ordem. Não
significa que está livre de falhar, mas, quanto mais você praticar, melhor estará
preparado e não haverá surpresas.
A situação toda era um nojo, mas que escolha eu tinha? Balancei a cabeça.
— Tanto faz. Que seja.
Os ombros de Maya relaxaram.
— Ok, ótimo. Agora que já esclarecemos tudo, que tal nos encontrarmos na
segunda-feira de manhã?
— Para quê?
— Para pegarmos a nossa licença de casamento, é claro. Assim, poderemos
fazer a cerimônia na terça-feira.
Tic-tac. Tic-tac.
Chequei meu celular pela centésima vez na manhã daquela terça-feira.
Aparentemente, eu estava contando os minutos até a hora da ruína.
A cerimônia falsa de Colby estava marcada para pouco antes das quatro da
tarde. Faltavam cinco horas para o meu namorado casar com outra pessoa. Eu
sabia que não era tão simples assim ― não era um casamento “de verdade” ―,
mas ainda doía pra caralho. Por mais que eu odiasse que as coisas tivessem
chegado a esse ponto, estava feliz por ele ter decidido acabar logo com isso.
Significava que o pesadelo estava um passo mais próximo de acabar.
Saylor.
Saylor.
Saylor.
Isso é tudo por Saylor, lembrei a mim mesma.
Fiquei tentando me afundar no trabalho, porque não tinha escolha. Mas o
meu cérebro e minhas mãos não estavam conseguindo se comunicar entre si. Já
tivera outro dia ruim no trabalho assim, e foi logo depois que Maya apareceu.
Mas o dia de hoje estava ganhando. E, para piorar, meus horários estavam
completamente reservados, então eu teria múltiplas oportunidades de estragar
alguma coisa.
Deek passou a manhã assistindo enquanto eu me atrapalhava toda:
derrubando ferramentas, esquecendo onde as coisas estavam, pedindo a clientes
que repetissem várias vezes os detalhes da tatuagem que queriam. A única coisa
que não fiz foi estragar um desenho. Essa era uma coisa que eu nunca tinha
feito, e não queria começar naquele dia.
Depois que o meu segundo cliente foi embora, Deek foi até a frente do
estúdio, mudou a placa na porta de “Aberto” para “Fechado” e fechou as
persianas das janelas.
— O que diabos você está fazendo?
— Estou encerrando o expediente — ele explicou.
— Por quê?
— Você não está com a cabeça no lugar. Pedi a Justine que ligasse para
todos os clientes de hoje para remarcar.
Olhei para Justine, que estava com o telefone na orelha. Ela acenou para
mim. Isso parecia uma emboscada.
— Os clientes estão contando comigo. — Olhei em volta freneticamente. —
Você não pode simplesmente decidir encerrar o expediente. Esse estúdio é meu!
— O que você vai fazer? Me demitir? — Ele riu ao seguir para a porta. —
Venha, dedinhos de manteiga. Vamos dar o fora daqui.
Após alguns segundos bufando de braços cruzados, cedi e peguei minha
bolsa. Acenei para Justine, que ainda estava com o telefone na orelha.
— Você tranca tudo? — perguntei a ela, que assentiu e ergueu o polegar.
— Aonde vamos? — indaguei a Deek.
— Todo e qualquer lugar, minha amiga. Vou ocupar cada segundo desse dia
para que você não fique sofrendo, pensando em você sabe o quê. Vamos arranjar
as formas menos dolorosas possíveis de fazer o tempo passar.
Saímos juntos e segui Deek pelas calçadas de Nova York, secretamente
aliviada por ele ter me livrado da luta para me manter profissional.
Para nossa primeira parada, Deek me levou a uma loja de doces, daquelas
onde você pega um saquinho e enche com o que quiser.
— Por que estamos aqui?
Ele deu de ombros.
— Porque estou improvisando? Uma vez você me disse que, quando era
mais nova, enchia um desses saquinhos e mandava ver quando estava triste por
alguma coisa. Achei que seria nostálgico. Além disso, estou morrendo de
vontade de comer chocolate.
Nunca fui de recusar doces. Peguei um saquinho e o enchi com todos os
meus favoritos: Sour Patch Kids, minhoquinhas de goma e balas SweeTARTS.
Deek encheu o seu com chocolates.
Passar dez minutos escolhendo guloseimas havia definitivamente ajudado a
distrair minha cabeça, até eu chegar a uma das últimas prateleiras.
A placa acima das balas Jordan Almonds dizia: Perfeitas para
lembrancinhas de casamento! De repente, todos os meus pensamentos sobre a
cerimônia iminente voltaram.
Deek devia ter notado que fiquei congelada em frente aos doces.
— Ah, merda — ele disse atrás de mim.
— Dia perfeito para um casamento, não é, Deek? — Revirei os olhos.
— Essas amêndoas revestidas de doce são uma porcaria. Quase quebrei um
dente com uma quando era criança. — Ele me arrastou pelo braço. — Venha.
Vamos para o caixa.
Depois que ele pagou pelos nossos doces, voltamos a vagar pelas ruas.
— Aonde vamos agora? — perguntei, mastigando uma minhoquinha de
goma azul e vermelha.
— Se eu te contar, você não vai querer ir. Então, apenas siga o fluxo.
Ele chamou um táxi e instruiu ao motorista que nos levasse para a Times
Square. Quando dei por mim, estávamos em frente ao Madame Tussauds. Meu
queixo caiu.
— Você está me levando ao museu de cera?
— Você disse que nunca o visitou.
— Verdade, mas existe um motivo para isso. Não tenho o mínimo interesse.
— Vamos, vai ser divertido — ele disse, ajudando-me a sair do táxi.
Honestamente? Ele tinha razão. Deek e eu nos divertimos pra caramba
posando para fotos com as estátuas de cera e batendo um papinho com elas.
Discutimos política com Barack Obama e dissemos a Britney Spears o quanto
estávamos aliviados pelo fim de sua tutela. Nos inserimos como membros
adicionais da família real britânica e das Kardashians. Eu me misturava bem
com essas últimas. Com meus cabelos pretos compridos, era como se eu fosse a
irmã tatuada perdida. Também dançamos com a Beyoncé ― essa deve ter sido a
minha parte favorita.
Entretanto, a diversão acabou quando chegamos a uma exibição dos Beatles.
Não havia nada de errado com as estátuas… somente o fato de que John Lennon
me fez pensar em Colby Lennon, o que me empurrou novamente para a toca do
coelho. Aff.
Meus olhos estavam fixos em John quando Deek se aproximou por trás de
mim.
— O que está se passando nessa sua cabecinha, Yoko?
Continuei a encarar a estátua.
— Você sabe que o sobrenome de Colby é Lennon, não sabe? Depois de
hoje, também será o sobrenome de Maya.
— Ah, puta que pariu. — Deek suspirou. — Próxima parada,
imediatamente! Vamos dar o fora daqui e ir comer alguma coisa.
Saímos do Madame Tussauds e fomos ao Kat’z Deli para comprarmos meu
sanduíche de pastrame favorito. Em seguida, pegamos o metrô e fomos ao
Central Park para comermos nosso almoço em um banco. Estávamos
terminando quando avistei um casal se aproximando. Ela usava um vestido de
noiva e segurava a cauda de seu véu para que não arrastasse no chão. Eles
estavam prestes a dizer seus votos bem no meio do parque. Em seguida, um
cavalo e uma carruagem apareceram, esperando para levá-los após o evento.
Quando Deek os viu, baixou a cabeça em derrota. O coitado tinha tentado de
tudo para me distrair, e o universo não colaborou nem um pouco.
— Tem alguém lá em cima que não quer que eu esqueça, Deek.
— Primeiro, olhe só o vestido dela. É horrendo. E ela não tem uma tatuagem
sequer. Muito sem graça. — Ele suspirou e ficou de pé. — Ok, quer saber?
Achei que seria possível passarmos por esse dia sem recorrer ao álcool, mas
parece que esse não será o caso. Vamos encontrar um bar.
— São cinco da tarde em algum lugar. — Levantei-me do banco. — Mostre
o caminho.
Voltamos a caminhar pelas ruas, e Deek procurou o bar mais próximo no
quarteirão. Assim que encontrou, entramos, pegamos uma mesa no canto e nos
acomodamos para passar o resto da tarde ali.
Eu já estava na segunda cerveja quando meu celular tocou. Colby. Eram
quase três da tarde, o que significava que o “evento” não tinha acontecido ainda.
Atendi e tentei soar alegre.
— Oi.
Ele, por outro lado, parecia estar sem fôlego.
— Onde você está? Estou no estúdio e está tudo fechado.
Ah, não.
— Merda, sério? Estou em um bar com Deek.
— Por quê?
Não quis mentir.
— Ok… eu não estava conseguindo me concentrar hoje de manhã. Então,
Deek decidiu fechar o estúdio depois dos primeiros clientes. Estamos andando
pela cidade.
— Em que bar vocês estão?
Eu nem sabia.
— Qual é o nome desse lugar? — perguntei ao Deek.
— Sammie’s.
— Sammie’s. Fica perto do Central Park.
— Merda. É longe. Eu precisava te ver, e pensei que talvez você tivesse
tempo para uma visita rápida se eu passasse no estúdio antes de ter que ir para o
tribunal.
Senti-me péssima.
— Esse não era o plano, Colby. Você disse que ia direto para lá do trabalho.
Eu não sabia.
— Eu sei. — Ele suspirou. — Eu só… precisava ver se você estava bem.
Não queria seguir em frente com isso se você não estivesse. E, admito, queria te
ver. Eu só… — Suas palavras sumiram. — Sei lá. Não estou bem agora.
Meu peito se comprimiu.
— Eu também não estou muito bem. Mas isso não importa. Porque esse seu
casamento com ela nunca vai parecer algo certo. O objetivo não é nos sentirmos
bem. Nada vai fazer com que a gente fique bem com isso, sabe? Só temos que
aceitar.
— Eu não preciso fazer isso — ele disse em um tom urgente.
— Precisa, sim. — Soltei um suspiro profundo. — Você sabe que precisa.
Houve uma longa pausa, durante a qual tudo que pude ouvir foi sua
respiração. Queria não estar alterada pelo álcool, porque isso me deixou mais
emotiva do que queria estar nesse momento. Lágrimas arderam em meus olhos.
— Me deixe falar com Deek — ele finalmente pediu.
Entreguei o celular para meu amigo.
— Colby quer falar com você.
— Fala — Deek disse ao atender à ligação. Ele ouviu e, então, assentiu. —
Ok. Sem problemas. — Ele fez uma pausa. — Se cuida, cara. Pode deixar
comigo. — Deek me devolveu o celular.
— Oi — eu falei.
— Sinto muito por não ter conseguido te ver. Mas fico feliz que você esteja
com Deek.
— Provavelmente foi melhor termos nos desencontrado. Se me visse, as
emoções ficariam à flor da pele. É melhor você não ficar emotivo nesse
momento. É somente uma transação de negócios.
— Do pior tipo. Tenho quase certeza de que preferiria estar indo me
encontrar com a máfia nesse momento.
Olhei para o relógio. Faltava menos de uma hora.
— É melhor você ir. O tribunal fica do outro lado da cidade. Você não vai
querer se atrasar.
— Sim, eu quero me atrasar. Queria me casar com ela às três e nunca.
Decidi ser madura por um momento.
— Colby, vai dar tudo certo. Você pode fazer isso. — Expirando, eu disse:
— Me ligue quando acabar, ok?
— Ok.
Então, desliguei antes que ele pudesse dizer qualquer outra coisa. Sabia que
ele não seria o primeiro a encerrar a ligação. Arrependi-me imediatamente de
fazer isso, mas não aguentaria se ele dissesse algo que me fizesse chorar. Não
queria cair aos prantos no bar. Isso não seria bom nem para ele, nem para mim.
— O que ele te disse? — perguntei ao Deek.
— Ele me agradeceu por estar cuidando de você hoje. Só isso. Ele está muito
preocupado com você.
Passei um dedo pela condensação da garrafa de cerveja e fiquei perdida em
pensamentos. Alguns minutos depois, ergui o rosto e notei uma pessoa acenando
para mim ao vir em nossa direção. Era… Owen?
— Que surpresa te encontrar aqui. — Ele sorriu.
Ele usava um terno azul-marinho. Seu relógio caro brilhava.
— O que está fazendo aqui? — perguntei.
Ele cumprimentou Deek com um aperto de mão.
— Esse bar não fica muito longe do meu escritório. Pensei em vir para um
pequeno happy hour.
Estreitei os olhos.
— Não me diga…
Owen sentou-se conosco e sinalizou para a garçonete antes de pedir uma
cerveja.
— O que há de novo com vocês? — ele indagou.
— Nada de mais. Apenas tentando esquecer o fato de que Colby vai se casar
em menos de uma hora. — Tomei um longo gole.
Owen se fez de desentendido.
— Oh, será hoje?
— Dá um tempo, Owen. Você sabia que era hoje.
Sua expressão ficou mais séria.
— É, eu sabia. Ele me mandou mensagem pedindo para passar aqui e ver
como você estava. Ele sabia que você estava com Deek, mas acho que o Colby
queria uma representação dele para se certificar de que você estava bem. Já que
ele não pode estar aqui, sou a próxima opção.
— Bem… obrigada. Mas é totalmente desnecessário — eu disse.
— Farei o que for preciso para deixar esse dia mais fácil para o Colby.
— Mas isso é uma raridade. Você saiu do escritório antes da quatro da tarde?
— provoquei.
— Eu sinceramente não sei te dizer quando foi a última vez que saí do
trabalho mais cedo.
Pouco tempo depois, Brayden surgiu vindo em direção à nossa mesa, com
um sorriso enorme.
— Você também? — questionei.
— O quê? — Ele deu de ombros. — Só vim beber alguma coisa. — Ele
piscou para mim e olhou para Deek. — E aí, cara? — Então, Brayden olhou
para mim como se lamentasse. — Como você está?
— Jesus Cristo. Ninguém morreu — gritei. — Por que todo mundo está
agindo como se alguém tivesse morrido?
Brayden deu tapinhas em meu ombro.
— Se você está bem, então também estamos.
— Fiquei sabendo que estava rolando uma festa! — gritou outra voz.
Holden. Balancei a cabeça e ri.
— Eu deveria saber que receberia o trio completo.
Holden curvou-se para me dar um beijo na bochecha.
— Oi, Billie. Deslumbrante, como sempre. — Ele deu um aceno de cabeça
para Deek. — Ei, cara. Vi o seu Instagram. O que diabos vocês estavam fazendo
com as Kardashians hoje?
— Você não está falando sério, está? — Deek deu risada.
Holden deu uma piscadela ao sentar.
— Então, o que estamos bebendo?
Ergui minha garrafa.
— Cerveja.
— Ótimo. — Ele pegou um cardápio. — Deixe-me ver o que eles têm. —
Holden acenou para chamar a garçonete.
— Como vocês três arranjaram tempo para serem meus babás hoje?
— É simples — Holden respondeu. — Quando um de nós precisa de alguma
coisa, largamos tudo. E não há nada mais importante para o Colby hoje do que
se certificar de que você esteja bem. Então, é claro que eu tinha que vir ficar
com você. Sou o melhor amigo dele.
Brayden e Owen viraram os rostos para Holden de uma vez ao mesmo
tempo.
— Quem coroou você como melhor amigo do Colby? — Owen vociferou.
— É — Brayden concordou. — Quem morreu e te designou como melhor
amigo?
— Quem morreu? Hã, o Ryan, seu imbecil — Holden disse.
A mesa ficou em silêncio.
Então, Holden apontou para eles.
— Por acaso algum de vocês se ofereceu para se casar com Maya ontem à
noite, para que Colby não precisasse?
— Não. — Brayden estreitou os olhos.
Holden abriu um sorriso convencido.
— Exatamente. Você não fez isso. Porque não é o melhor amigo. Eu sou.
Um melhor amigo teria se oferecido para se casar com ela.
Pisquei algumas vezes.
— Espera… de novo, por favor. O que você fez, Holden?
— É isso que todas as garotas dizem para mim. — Ele piscou. — De novo,
por favor.
— Sério, Holden — Deek interveio. — Você se ofereceu para casar com
Maya?
Holden tomou um longo gole de sua cerveja e deu de ombros.
— Sim. Tipo… fui ao apartamento do Colby ontem à noite e me ofereci para
fazer isso para que ele não precisasse e ela o deixasse em paz. Falei seríssimo.
Teria me casado com ela na hora.
— Foi muito legal da sua parte, Holden, mas completamente insano — eu
disse. — Porque eu sei que foi mais do que somente uma oferta. Você teria
realmente feito isso.
— Isso mesmo. Por que seria loucura? Não tenho namorada, como o Colby.
Nada me prende. Ninguém teria que sofrer. Mas ele achou que seria muito
complicado por causa de Saylor e dos advogados e tal. Queria ter pensado nisso
antes. Eu estava totalmente disposto a fingir estar apaixonado por aquela cretina
só para tirá-la do pé dele. Não há nada que eu não faria por esse cara. Se tem
uma coisa que a morte de Ryan me ensinou é que seus verdadeiros amigos são a
coisa mais importante em sua vida. Ainda mais importante que a família, às
vezes, dependendo de quem é sua família.
Deek pousou uma de suas mãos em meu ombro.
— Nem me fale. Essa garota aqui é a minha salva-vidas. Quando as coisas
estão difíceis, sei que posso contar com ela. E ela comigo. Por isso passei o dia
arrastando-a pela cidade para tentar distraí-la das merdas que estão acontecendo.
— Ele ergueu um dedo. — No entanto, não me ofereci para casar com Maya.
Então, Holden, você é um amigo melhor do que eu.
Todos deram risada.
Eu era tão sortuda por ter todos esses caras ao meu lado hoje.
— Billie, você está pronta para se escangalhar de rir? — Owen perguntou.
— Claro. Pode mandar.
Ele olhou para Holden.
— Já ouviu falar em alguém que colocou um Príncipe Albert por acidente?
Owen, então, começou a contar sua releitura dramática da história maluca de
Holden sobre o boquete que quase lhe deixou com um piercing no pau. Eles
conseguiram mesmo me fazer rir. Mas, em determinado momento, minha
atenção se desviou enquanto eles continuaram a fazer piadas. Tudo ao meu
redor ficou em segundo plano quando olhei para o relógio.
Quinze para as quatro. Colby estava se casando com Maya naquele exato
momento, ou bem perto disso. Naquele momento, saí de órbita completamente.
Então, meu celular anunciou a chegada de uma notificação. Era uma
mensagem simples. Mas muito profunda.
Colby: Eu te amo.
Meu coração se partiu. Porque eu simplesmente soube. Ele me mandou essa
mensagem porque estava prestes a acontecer. E ele me amava.
— Quantas dessas você bebeu?
Joguei a garrafinha minúscula de tequila na lata de lixo do corredor e
coloquei a mão no meu bolso para pegar mais uma.
— Aparentemente, não o suficiente, porque ainda consigo ver a sua cara
direito.
Maya fez uma carranca.
— Você age como se fosse o fim do mundo se casar com uma mulher linda.
Muitos homens agradeceriam aos céus por casarem comigo.
Soltei uma risada debochada e retirei a tampa do frasquinho de tequila.
— Primeiro, a beleza vem de dentro, então você é feia que dói. E, segundo,
se existem tantos homens que teriam sorte por casar com você, por que não está
aqui com algum deles?
Maya olhou em volta.
— Baixe o seu tom de voz. E você sabe a resposta para isso. Porque um
casamento que ocorre bem quando o governo está tentando te deportar é
questionável. É mais fácil de acreditar se eu casar com uma pessoa com quem
estou há alguns anos, e nós temos uma filha juntos.
— Nós não temos uma filha. Um filho ou uma filha são pessoas que você
coloca em primeiro lugar na sua vida, pessoas a quem você ama e protege. Eu
tenho uma filha. Você tem a porra de uma peça de xadrez.
Ela revirou os olhos.
— Tanto faz. Mas você precisa pegar mais leve com a bebida, porque se o
oficiante achar que você está bêbado, pode determinar que não tem capacidade
de se casar agora.
Soltei uma risada pelo nariz.
— A capacidade de se casar… quando você foi à faculdade de Direito?
— Só porque eu era stripper não significa que não tenho educação.
— Meu julgamento sobre você não tem nada a ver com sua profissão,
querida. Tem tudo a ver com suas ações. Somente uma cretina burra teria
coragem de abandonar sua filha sem aviso prévio. Aqui vai uma novidade: eu
sou um adulto que não foge das responsabilidades. Eu teria ficado com ela se
você estivesse passando por dificuldades, e poderíamos ter chegado a um acordo
para você visitá-la de vez em quando.
Pela primeira vez desde que voltara à minha vida, o rosto de Maya murchou.
Naquele momento, um homem abriu a porta diante da qual estávamos sentados.
— Lennon e Moreno! — ele gritou.
Virei a tequila em um gole só e ergui a mão.
— É a nossa vez de ficar frente a frente com o pelotão de fuzilamento?
— Ele está brincando — Maya disse. Ela se virou para mim e me lançou um
olhar de alerta. — Não é, querido?
O cara não pareceu dar a mínima para nós. Ele olhou para a direita, depois
para a esquerda, e falou em uma voz monótona:
— Onde está a testemunha de vocês?
— Testemunha? — Maya inquiriu. — Achei que vocês forneciam.
Ele balançou a cabeça.
— Não é assim que funciona. Está impresso claramente no folheto que vocês
receberam quando vieram solicitar a licença de casamento. Sem testemunha,
sem casamento.
— Hã… pode nos dar um minuto? — Maya perguntou.
— É tudo que posso dar. A cerimônia de vocês é a última do dia, e cortaram
nosso orçamento de novo, então não vou fazer hora extra. Fechamos às quatro
em ponto; por isso a última vaga foi marcada para às três e quarenta e cinco.
— Será apenas um minuto. Prometo.
O homem deu de ombros e voltou para o escritório.
Dei risada.
— Parece que você não pensou em tudo.
Maya estreitou os olhos.
— Espere aqui e não beba mais nada.
Minha resposta foi pegar outro frasquinho de tequila do bolso interno do
meu casaco e tirar a tampa com um sorriso. Maya balançou a cabeça antes de
sair bruscamente.
Ela voltou pelo corredor três minutos depois com um cara que parecia ser
um sem-teto. Ele não estava usando sapatos.
— Vamos — ela disse. — Frank é a nossa testemunha.
Coloquei a mão no meu bolso e ofereci uma garrafinha de tequila para
Frank.
— Quer uma?
Ele a arrancou da minha mão e olhou para Maya.
— Você ainda vai me pagar cem dólares.
Cambaleei um pouco.
— Talvez você queira receber seu pagamento agora. Ela não é de confiança.
Maya me olhou irritada, mas Frank foi esperto o suficiente para aceitar meu
alerta. Ele estendeu a mão, com a palma para cima.
— Me dê a grana ou eu vou embora.
Ela mexeu dentro da bolsa.
— É melhor que você tenha a carteira de identidade que disse ter.
Alguns minutos depois, nosso adorável trio estava no escritório do escrivão.
Pensei que íamos assinar alguns papéis antes de entrarmos em algum tipo de
sala de tribunal, mas, aparentemente, casamento de tribunal na cidade de Nova
York não acontecia exatamente em uma sessão de tribunal. O escrivão nem ao
menos saiu de detrás do balcão.
— Vocês gostariam de dar as mãos? — ele perguntou.
Maya tentou segurar minhas mãos, mas eu as afastei abruptamente.
— Isso é necessário?
O escrivão franziu a testa.
— Não.
Enfiei as mãos nos bolsos da calça.
— Então, vamos acabar logo com isso.
O escrivão olhou para nós dois.
— Algum problema?
O álcool estava começando a bater, e isso sempre trazia o meu senso de
humor à tona. Pelo menos, era o que eu achava. Dei de ombros.
— Que nada, é que a minha religião me proíbe de tocá-la antes de estarmos
casados. — Soltei uma risada pelo nariz. — Que pena não proibir de dormir
com strippers, hein, padre?
— Hã… não sou um padre. Sou funcionário público, um escrivão do
tribunal.
— Estava mesmo me perguntando por que você não está usando uma
daquelas batas com colarinho. Aquelas coisas devem ser quentes pra cacete no
verão, não é? Como usar gola alta.
Os olhos de Maya me perfuraram.
— Que tal deixar o homem fazer seu trabalho e nos casar? — Ela exibiu um
sorriso digno de concurso de beleza e olhou para o escrivão. — Ele faz piadas
quando está nervoso. Desculpe.
O escrivão deu de ombros e seguiu com a cerimônia. Sete minutos depois,
ele disse:
— Parabéns, vocês agora são marido e mulher. Pode beijar a noiva.
Uma onda de náusea me atingiu, e tive que cobrir minha boca.
— Não me sinto bem. Podemos ir agora?
Maya deu um sorriso de desculpas para o escrivão.
— Ele comeu sushi estragado no almoço.
O cara não deu a mínima. Ele só queria que déssemos o fora dali antes das
quatro. Ele carimbou alguns papéis e apontou para as linhas onde cada um de
nós deveria assinar antes de nos entregar um certificado.
— Boa sorte. Acho que vocês vão precisar.
Consegui chegar somente até a lata de lixo no corredor fora do escritório do
escrivão antes de colocar tudo para fora. Não sabia se por causa do que bebi ou
do que tinha acabado de fazer com a minha vida. Mas minha nova esposa não
parecia estar nem aí.
Ela colocou as mãos nos quadris enquanto meu rosto ainda pairava no topo
da lata de lixo.
— Esse comportamento não vai convencer o investigador, Colby. É melhor
você aprender a agir como se eu fosse a sua amada esposa.
Cuspi o gosto ruim da minha boca no lixo.
— Nem o Robert De Niro conseguiria fazer uma atuação convincente
dessas.
Maya balançou a cabeça.
— Entrarei em contato em breve para falarmos sobre a preparação para a
entrevista.
Ergui minha cabeça.
— Vá se foder.
A aula das mamães acontecia em uma casa de tijolinho no Upper West Side.
Como esperado, Saylor ficou muito entusiasmada por ir comigo. Mas sabe
quem não partilhava da empolgação? As Mamães, ou As Mulheres Perfeitas.
Todas pareciam iguais em suas roupas em tons pastel e cabelos loiros
perfeitamente penteados. Nenhuma tatuagem. Deek iria se divertir com isso. Ele
definitivamente as consideraria falsas e toscas.
Com base nos olhares estranhos que recebi ao chegar com Saylor, elas não
gostaram de ver um novo rosto se juntando ao clubinho. Isso, ou ficaram muito
desapontadas por não poderem flertar com meu namorado naquele dia. Colby
uma vez me contou quantas dessas mulheres, algumas delas casadas, deram em
cima dele. Eu não podia culpá-las, mas senti vontade de socá-las mesmo assim.
— Oh, você deve ser a nova babá de Saylor, certo? — uma biscate
perguntou.
Babá? Não, ela não fez isso.
— Não — respondi.
Não que houvesse algo errado em ser babá. Mas ela não achava possível que
eu fosse qualquer coisa além disso porque não estava toda pomposa e fresca
como o restante delas.
Ela inclinou a cabeça para o lado.
— Ah. Desculpe. Só achei que…
Eu queria continuar o meu “não” explicando que era namorada de Colby,
mas concluí que não devia explicação alguma a ela. Até que foi divertido
simplesmente deixá-la confusa.
Havia mesas dispostas onde as meninas poderiam ter seus rostos pintados
por suas mães. Fiquei aliviada, porque esse tipo de coisa era minha praia. Colby
havia mencionado que nunca sabia qual atividade estava planejada. Às vezes,
era um chá da tarde, outras vezes, todas iam juntas passear no parquinho. Mas
eu dava conta de mexer com tintas.
— Nós vamos pintar! — anunciei para Saylor. — Isso me lembra da vez em
que te transformei em um tigre. Lembra?
Ela assentiu cheia de empolgação antes de sair correndo para se juntar a
algumas de suas amiguinhas em um canto. Eu tinha que admitir, apesar do fato
de que todas as mulheres ali me irritaram de cara, suas crias eram adoráveis.
Uma das mulheres surgiu ao meu lado.
— Eu sou a Lara — ela disse.
Ainda olhando para as crianças, assenti uma vez.
— Billie.
— Onde está o Colby? — indagou.
Isso é tudo que ela tem a me dizer?
— Ele tinha algumas coisas para resolver.
Ela finalmente fez a pergunta que realmente queria.
— Ouvi você dizer que não é a babá. Qual é a sua relação com Saylor, se
não se importa que eu pergunte?
Naquele momento, Saylor veio correndo até mim. Dei um puxão leve em
uma de suas marias-chiquinhas.
— Quem eu sou para você, Saylor?
— Você é a Billie!
— Eu sei, mas além do meu nome. Quem você acha que eu sou?
Ela quicou algumas vezes.
— Você é a garota que o meu papai ama. Você é a princesa Jasmine dele!
O queixo de Lara caiu discretamente, e eu adorei isso.
— De onde você tirou essa ideia? — perguntei à Saylor.
— O papai me disse.
Uau. Por mais que Colby estivesse definitivamente se tornando mais
carinhoso comigo na frente dela, não sabia que ele tinha dito a ela que me
amava.
— Quando ele te disse isso?
— A gente estava assistindo Aladdin. Ele me disse que ama você como o
Aladdin ama a princesa Jasmine.
— Oh, que adorável — Lara comentou.
Nem me lembrava mais que Lara estava ali. Mas o modo como ela disse a
palavra adorável me pareceu muito sarcástico. Estreitei os olhos.
— É sério isso?
Ela piscou, confusa.
Deixei por isso mesmo, lembrando-me de que Saylor estava ao meu lado.
Mas o que eu queria dizer mesmo era onde aquela biscate falsa do caralho podia
enfiar o seu adorável.
Assim que todas se sentaram para pintar os rostos, imaginei que Saylor fosse
querer que eu fizesse um animal no seu, como da última vez. Contudo, ela me
fez um pedido diferente.
— Quero pintar o meu braço igual ao seu, Billie.
— Sério?
Ela assentiu.
Meu Deus, que amor.
Então, pintei o braço de Saylor inteiro, fazendo vários animais coloridos e
outros desenhos por toda sua pele. As tintas não faziam as pinturas parecerem
tatuagens, mas seu braço ficou completamente coberto igualzinho ao meu. Mas
a melhor parte? Todos os olhares cheios de julgamento que as outras mulheres
me lançaram por tentar deixá-la mais parecida comigo. Tenho certeza de que
achavam que isso era um erro terrível.
Mas ela queria ficar parecida comigo. E isso, para mim, era um grande
elogio, então elas que se fodessem.
Durante todo o caminho para casa, fiquei ansiosa para contar a Colby sobre a
minha experiência com as Mães Monstras. Contudo, provavelmente guardaria
comigo o que Saylor contara sobre o Aladdin. Era um momento particular dos
dois, mesmo que tivesse me envolvido. Então, decidi simplesmente guardá-lo
no coração.
Saylor e eu voltamos para o apartamento, e quando bati à porta, quase me
perguntei se Colby não estava em casa, já que demorou mais do que de costume
para atender.
Quando a porta finalmente se abriu, não era Colby que estava diante de mim.
Era… todo mundo. Literalmente todo mundo. Bom, todas as pessoas
importantes para nós. Deek e seu namorado, Martin. Justine e seu marido. E, é
claro, Holden, Brayden e Owen.
— Surpresa! — todos gritaram.
Então, virei para minha esquerda e vi meu lindo namorado me entregando
um balão preto gigantesco com pontinhos dourados.
— Feliz aniversário, linda.
— Oba! Uma festa! — Saylor gritou.
— Mas o que… — Minhas mãos tremeram. — Meu aniversário é só na
segunda-feira.
— Eu sei. Mas eu quis te fazer uma surpresa no fim de semana em que todos
poderiam comparecer.
Quando ele me abraçou, senti-me envolvida por amor.
— Não acredito que você conseguiu me fazer uma surpresa. Foi por isso que
você me fez levar Saylor para a aula das mamães?
— Culpado.
Saylor deu pulinhos.
— Feliz aniversário, Billie!
— Obrigada, meu amor. Você sabia disso?
Ela balançou a cabeça negativamente.
— Deixei Saylor no escuro — ele disse. — Não acho que ela conseguiria
manter segredo. Ela ficaria animada demais.
Saylor estendeu o braço.
— Olha, papai!
— Foi ela que pediu — senti-me compelida a explicar.
— Que legal, filha! Você está igual à Billie, agora.
— Eu sei!
Entreguei meu balão para ela brincar e fui abraçar todo mundo. Depois
disso, olhei em volta, admirando seus rostos sorridentes.
— Foi uma surpresa maravilhosa. Muito obrigada por estarem aqui.
— Está brincando? Não perderíamos por nada — Justine declarou com
entusiasmo.
Colby havia encomendado uma variedade enorme do meu sushi favorito.
Estava sobre a mesa em uma barca de madeira gigante. Todos nos sentamos
para um almoço incrível. Após a refeição, Holden insistiu que tomássemos shots
de tequila, com cada pessoa fazendo um brinde em minha homenagem.
Ele começou, erguendo seu copo.
— Para Billie, a melhor tatuadora do mundo.
Depois, foi a vez de Brayden.
— Para Billie, a mulher que faz o meu melhor amigo feliz.
— Para Billie, por indiretamente me fazer sair do trabalho mais cedo duas
vezes. — Owen sorriu.
Deek foi o próximo.
— Para Billie, a pessoa com quem sei que posso contar. Você faz o meu
mundo ser um lugar melhor.
— Para Billie, por aguentar as merdas de Deek metade do tempo e me
aliviar um pouco — Martin brincou.
Justine ergueu seu copo e disse:
— Para Billie, a pessoa que sempre manda a real.
— E você, Saylor? — Colby perguntou, entregando um copo de limonada
para a filha. — Pode dizer algo legal sobre a Billie?
Ela ficou um pouco vermelha, parecendo tímida, e, então, finalmente falou:
— Billie é a minha melhor amiga.
Todos emitiram um “awn!” coletivo.
Me aproximei dela e a puxei para um abraço de urso.
— Obrigada, lindinha. Isso significa muito para mim.
— Sua vez, Colby. — Deek sorriu.
Colby ergueu sua tequila.
— Para Billie… — Após uma breve pausa, ele olhou nos meus olhos e
declarou: — O amor da minha vida.
Curto.
Simples.
Tudo.
Nos beijamos, e nunca me senti tão amada.
Alguns minutos depois, quando soprei as velinhas do meu bolo, Justine me
disse para fazer um pedido. Esse ano, meu desejo era somente um: ficarmos
livres de Maya. De algum jeito, eu tinha conseguido passar o dia todo sem
pensar nela, até aquele momento. Quando ergui o olhar, a expressão de Colby
murchou um pouco. Foi como se ele soubesse qual era o meu desejo mais
profundo. Provavelmente, era o mesmo que o seu.
Depois que terminei de comer minha fatia de bolo, fui jogar meu pratinho de
papel no lixo e Deek me seguiu até a cozinha.
— Ei, só queria saber como você está — ele disse.
— Estou bem. Por que pergunta?
— Você pareceu um pouco triste depois que soprou as velinhas.
— Ficou bem óbvio, não foi? Acho que Colby também notou.
— Sim. Claro que ele notou. Porque qualquer pessoa que te ama, incluindo a
mim, tem o mesmo desejo nesse momento.
— É. — Baixei o olhar para meus pés. — Obrigada mais uma vez por me
dar cobertura hoje.
— Adorei que você não fazia ideia de porque ele armou para que você fosse
ao Upper West Side.
— Fiquei completamente surpresa.
— Ele estava todo tenso, achando que não teria tempo suficiente para
arrumar tudo antes de vocês voltarem. Ele te ama de verdade.
— Eu sei. — Sorri.
— Como foi essa aula de mamães?
— Você quer dizer As Mulheres Perfeitas? Elas me olharam como se eu
fosse a bruxa Elvira entrando ali. — Balancei a cabeça. — Um monte de
biscates. Mas valeu a pena quando Saylor me pediu para pintar seu braço igual
ao meu.
— É, eu vi isso. Que coisa mais fofa. Você pensaria que ela era minha filha,
não de Colby. — Ele piscou.
Mais tarde naquela noite, depois que todos foram embora e de colocar
Saylor na cama, eu disse a Colby que o ajudaria a limpar tudo. Mas ele recusou,
dizendo que a aniversariante não deveria ter que limpar depois da festa.
Então, fiquei relutantemente assistindo-o guardar tudo. Encostada contra a
bancada, avistei um envelope sobre ela. Assim que notei o endereço do
remetente, senti-me prestes a hiperventilar. Pegando-o, perguntei:
— O que é isso, Colby?
Ele largou o copo que estava secando e soltou o ar com força.
— Eu ia te contar. Mas não queria arruinar o dia.
Abri e encontrei uma carta anunciando a data para a primeira entrevista à
qual Colby teria que comparecer com Maya. Nosso tempo de tranquilidade
estava prestes a acabar. Em seis dias.
— A Saylor te deu isso para você dormir? — Apontei com o queixo para o
animal de pelúcia que Billie tinha acabado de colocar sobre a mesinha de centro.
— Não. — Billie se sentou no sofá ao meu lado. — Pedi emprestado a ela.
Imaginei que, se tivéssemos um elefante na sala, pararíamos de ignorá-lo.
Franzi as sobrancelhas antes de me dar conta do que ela quis dizer: um
elefante de pelúcia.
Franzi a testa.
— Acho que estamos evitando um certo assunto, não é?
— Se o elefante no ambiente ficar maior, não vai sobrar espaço para mim.
Suspirei.
— Me desculpe. Eu deveria ter falado com você antes. A verdade é que
odeio a ideia de passar ao menos um minuto do nosso tempo juntos discutindo
qualquer coisa que tenha a ver com… ela.
— Eu sei. E também odeio isso. Mas quando não sei o que está acontecendo,
meu cérebro se encarrega de preencher as lacunas, geralmente quando estou
dormindo. Outra noite, sonhei que os oficiais da imigração derrubavam a minha
porta e me deportavam para o Guam. — Billie balançou a cabeça. — Nem sei
onde o Guam fica no mapa.
Abri um sorriso triste.
— Eu entendo. O nosso subconsciente não dá uma trégua. Então, é melhor
conversarmos sobre isso. Mas, primeiro, deixe-me fazer uma coisa. — Peguei
meu celular da mesinha de centro e programei um temporizador para cinco
minutos, junto com várias sonecas. Billie me observou fazer isso.
— Vamos limitar a nossa conversa a cinco minutos? — ela perguntou.
— Não. Vamos conversar pelo tempo que precisarmos. Mas a cada cinco
minutos, vou parar e te dizer algo que amo em você. Acho que é importante nos
lembrarmos de que o que temos é real e que o assunto da nossa conversa é
completamente falso.
Billie sorriu.
— Gostei dessa ideia.
Respirei fundo e virei-me para lhe dar minha atenção total.
— Então, você sabe que a entrevista será depois de amanhã. Mas o que não
mencionei é que Maya me ligou ontem à noite.
O sorriso de Billie se desfez.
— O que ela queria?
— Nós precisamos nos preparar para a entrevista com a imigração. Você e
eu não falamos sobre o que acontece nelas, mas os agentes designados para o
nosso caso basicamente nos fazem as perguntas que quiserem para determinar se
nosso casamento é real.
— Que tipo de perguntas?
— Perguntas pessoais. Tipo: qual é a cor da escova de dentes da sua esposa?
Billie arregalou os olhos.
— Ai, meu Deus, Colby. Como você vai saber disso?
— Foi por isso que Maya ligou. Ela queria o meu endereço de e-mail para
me enviar um questionário para preencher. O troço tem trinta páginas, digitadas.
O plano é nós dois preenchermos as partes que se aplicam a nós
individualmente e que eu responda às perguntas que se aplicam ao nosso
relacionamento para então trocarmos e memorizarmos as respostas um do outro.
— Massageei a nuca. — Tenho que enviar de volta para ela amanhã de manhã, e
ainda não passei da primeira página. Toda vez que começo a responder, me sinto
enjoado.
— Posso ver as perguntas? Talvez eu possa te ajudar a responder.
Encontrei o olhar de Billie.
— Tem certeza de que quer fazer isso? Algumas delas são bastante pessoais,
e podem ser difíceis de ler.
Ela assentiu.
— Farei o que for preciso para ajudar porque o quanto antes você passar
nessa entrevista, melhor, para que ela saia logo das nossas vidas.
Não tinha certeza se essa era uma boa ideia, mas me levantei e peguei os
papéis de uma gaveta na cozinha mesmo assim. Entregando-os para Billie,
observei seu rosto atentamente enquanto ela lia. A primeira página até que era
inofensiva. Perguntava coisas como a minha cor favorita, se eu dormia de
barriga para cima ou de bruços, minhas comidas favoritas e quantas xícaras de
café eu bebia pela manhã. Mas quando ela passou para a página seguinte, eu
sabia que as perguntas ali a fariam parar. E fizeram. Billie arregalou os olhos
antes de começar a ler em voz alta.
— Você goza dentro da sua esposa ou usa camisinha? Meu Deus, Colby. São
perguntas muito pessoais. — Ela examinou a página um pouco mais. — A
posição favorita da sua esposa? — Ela balançou a cabeça, mas continuou lendo.
— Puta merda. A sua esposa engole? Eles podem mesmo perguntar coisas desse
tipo? Parece que o idiota do agente está planejando bater uma ouvindo vocês
responderem isso. Como vocês vão saber disso tudo se só passaram uma noite
juntos anos atrás?
Balancei a cabeça.
— Pois é. Por isso não consegui avançar muito.
Billie ainda estava passando as páginas do questionário quando o alarme que
programei despertou. Ativei a soneca e esperei que ela olhasse para mim antes
de segurar sua mão.
— Eu amo o fato de você tratar a minha garotinha como se fosse sua filha.
Seu rosto suavizou.
— Você não faz ideia do quanto eu queria que ela realmente fosse minha
nesse momento, Colby.
Inclinei-me e rocei meus lábios nos seus.
— Eu te amo, Billie.
— Eu também te amo.
Quando me afastei, ela endireitou as costas.
— Ok, temos que terminar de responder isso. Pode pegar uma caneta para
começarmos?
— Tem certeza?
— Tenho.
Peguei uma caneta na cozinha, e Billie abriu na página dois.
— Vamos fazer o seguinte — disse. — Vamos responder a todas essas
perguntas como se fossem relacionadas a nós dois.
Balancei a cabeça veementemente.
— Porra, de jeito nenhum. Não vou falar sobre a nossa vida para aquela
mulher, nem para ninguém.
— Ninguém vai saber que as respostas se aplicam a nós. E vai ser mais fácil
você se lembrar das respostas, se forem verdadeiras. Além do mais, eu até gosto
de saber que você estará pensando em nós durante a entrevista, e Maya não vai
fazer a menor ideia de que estará fingindo ser eu.
Sorri.
— Isso é meio bizarro, mas eu adorei.
Billie deu risada.
— Ok, então vamos começar. Vou fazer as perguntas, você responde como
se aplica a nós e eu escrevo as respostas.
— Tudo bem, se você diz…
— Você goza dentro da sua esposa ou usa camisinha?
— Gozo dentro dela, porque ela me dá tanto tesão que uma camisinha não
aguenta toda a minha porra. Além disso, ela confia em mim e toma pílula.
Billie sorriu.
— Acho que vou deixar de fora a parte da porra.
Após terminar de anotar, ela ergueu o olhar novamente.
— Qual é a posição favorita da sua esposa?
— Fácil. Por cima.
— Eu gosto mesmo de cavalgar você. — Ela mordeu o lábio. — Na verdade,
estava pensando que talvez na próxima vez eu fique de costas para que você
veja a minha bunda subindo e descendo.
Fechei os olhos, visualizando a cena e gemendo.
— Você ainda me mata, mulher.
Ela deu risadinhas.
— Próxima pergunta: a sua esposa engole?
Já era. Pensar em Billie de joelhos com meu pau em sua garganta era demais
para aguentar. Teríamos que fazer um pequeno intervalo. Peguei a pilha de
papéis e a caneta das mãos de Billie e joguei por cima do meu ombro antes de
pegá-la em meus braços.
— O que está fazendo?
— Procurando responder às perguntas corretamente. Como vou responder
qual é a sua posição favorita se você ainda não me cavalgou de costas? Você não
quer que eu corra o risco de não passar nesse teste, quer?
Billie abriu um sorriso de orelha a orelha.
— Definitivamente não.
Depois que isso tudo acabar, nunca mais me contate. Vou fingir que
esse casamento forjado nunca aconteceu.
Aquela desgraçada devia ter me gravado na segunda vez em que nos
encontramos na cafeteria. Antes que eu pudesse desvendar o que diabos ela
estava tentando provar ao me enviar aquilo, outra mensagem chegou.
Maya: Estarei no seu apartamento com as minhas coisas no sábado de
manhã. Se não me deixar entrar, enviarei essa gravação para o
investigador.
— Ah, não. — Billie franziu a testa ao olhar para mim, mesmo que eu tenha
forçado um sorriso.
Balancei a cabeça ao me afastar para o lado para deixá-la entrar.
— Como você sempre sabe que tive um dia de merda antes que eu diga uma
palavra?
Billie parou diante de mim ao passar e ficou nas pontas dos pés. Ela
pressionou seus lábios nos meus e mexeu em meu cabelo.
— Isso aqui. Sempre te entrega.
— Meu cabelo?
Ela sorriu e assentiu.
— Você o puxa quando está estressado, então ele fica bagunçado e
apontando para várias direções.
Fechei a porta.
— Não me admira eu estar correndo o risco de ir para a cadeia; não consigo
esconder nada. Nem sabia que fazia isso.
Billie apontou para a garrafa de vinho pela metade sobre a mesa da cozinha.
— Sinto que vou precisar de um pouco daquilo.
Assenti e gesticulei para a sala de estar.
— Vá se sentar. Vou servir uma taça para você e encher a minha novamente.
Ou talvez eu simplesmente beba na boca da garrafa.
Após servir uma taça para cada um, nos acomodamos no sofá.
— O que aconteceu? — ela perguntou.
— O investigador viu o desenho que Saylor fez de nós dois de mãos dadas.
— Aquele que está na porta da geladeira? Não achei que ele tinha ido à
cozinha. — Ela curvou os ombros. — Acho que deve ter sido quando levei
Saylor para seu quarto. Me desculpe por não ter escondido aquilo, Colby.
— Não precisa se desculpar. Você lidou com aquela visita surpresa de uma
maneira espetacular. Tenho certeza de que eu teria estragado tudo se tivesse
atendido à porta.
Billie tomou um gole de vinho.
— Então, o que vai acontecer agora?
— Supostamente devemos ir à entrevista daqui a duas semanas. Se não
passarmos, o investigador pretende decidir pela prisão.
Billie arregalou os olhos.
— Você disse supostamente devemos ir à entrevista. Isso significa que você
está planejando não comparecer?
— Estou pensando em ir até o investigador e contar a verdade a ele, que o
casamento foi uma fraude, mas que fui chantageado a fazer isso. — Dei de
ombros. — Ele comentou que tem um filho. Talvez tenha compaixão quando eu
contar a ele o que fiz e me deixe pagar só uma multa exorbitante.
Billie balançou a cabeça.
— Não sei, Colby. E se ele não ligar para o fato de que você é o único
responsável pela sua filha e fez isso para protegê-la? Você só vai admitir que
cometeu fraude a um investigador da imigração. Talvez deva arriscar fazer a
entrevista e ver no que dá.
Balancei a cabeça.
— Nunca vamos passar naquela entrevista. Ele já sabe que esse casamento é
uma fraude não vai pegar leve com as perguntas.
— Mas, pelo menos, você tem uma chance. Se procurá-lo e admitir o que
fez, as chances se reduzirão a zero.
Tomei um gole de vinho.
— Minhas chances já estão zeradas, de qualquer forma. Maya me gravou
dizendo que só ia me casar com ela para que ela pudesse ficar no país e que isso
era tudo uma farsa. Ela disse que, se eu não fizer exatamente o que ela quer, vai
entregar a gravação para o investigador.
Billie franziu a testa.
— Não entendo. Você já está fazendo exatamente o que ela quer.
Sacudi a cabeça.
— Com ela, nunca é suficiente. Agora, ela está exigindo que moremos
juntos até a entrevista. Meu advogado sugeriu isso para podermos conhecer um
ao outro e termos mais chance de dar as respostas certas.
Billie piscou algumas vezes.
— Oh… nossa. Acho que, se vocês morassem juntos como casados, teriam a
chance de se conhecerem em um nível mais profundo.
— Não importa. Não vou fazer isso.
— Bem, então vamos falar sobre o seu plano. Digamos que você vá ao
investigador, admita o que fez, ele se solidarize e te dê apenas uma multa, sem
te prender. O que acontece depois? Mesmo que isso funcione, a única outra
maneira de Maya permanecer no país é se apresentar como mãe da sua filha,
que é cidadã americana, certo? Então, voltará à estaca zero.
Balancei a cabeça.
— Não se ela for presa por fraude na imigração.
— Ok, então digamos que ela vá para a cadeia por um tempo. Temos que
presumir que, quando ela for solta, vai querer permanecer nos EUA. Você estará
somente adiando o inevitável, não acha? E se ela também for multada e então
pedir a custódia imediatamente?
— Jesus, Billie. De que lado você está?
— Estou do seu lado, Colby, é claro. Por isso não quero que você tome
nenhuma decisão precipitada. Você precisa pensar bem sobre isso, analisar por
todos os ângulos e imaginar todas as consequências possíveis.
Senti minha cabeça girar.
— Não me sinto muito bem. Você se importa se falarmos sobre isso depois?
Agora, só preciso te abraçar.
O rosto de Billie suavizou.
— Claro.
Durante a meia hora seguinte, acomodei-me com os braços em volta da
minha garota. Ela apoiou as costas em meu peito, e descansei meu queixo no
topo de sua cabeça. Foi bom, mas nem mesmo isso foi suficiente para me livrar
da sensação de destruição iminente. Já que ela tinha vindo depois de trabalhar
até mais tarde, já eram quase dez horas.
— Quer assistir a um pouco de TV antes de irmos para a cama? —
perguntei.
Billie se virou para mim e colocou uma mão em meu peito.
— Na verdade, acho que vou para casa.
— O quê? Por quê?
— Você precisa de um tempo para pensar, e eu também.
Não gostei nem um pouco daquilo, mas não podia discutir se Billie estava
precisando de espaço. Então, assenti e tentei não fazer beicinho.
— Tudo bem. Como quiser. Mas vou chamar um Uber para você.
Infelizmente, quando cliquei em confirmar no aplicativo, o carro estava a
apenas três minutos de distância, e ela ainda tinha que descer pelo elevador
lento.
— O carro chegará assim que você descer.
Billie assentiu, e eu a levei até a porta. Antes de abrir, segurei seu rosto entre
as mãos.
— Eu te amo. Sinto tanto por te fazer passar por toda essa merda.
— Eu também te amo.
— Posso te ver amanhã à noite?
— Terei uma tarde cheia no estúdio. Posso te avisar depois?
Um peso se instalou em meu peito, mas, ainda assim, assenti.
— Claro. Durma um pouco.
— Você também.
No dia seguinte, precisei de toda a minha força de vontade para não mandar
mensagem para Billie pela manhã. Consegui aguentar até as três da tarde.
Colby: Oi, linda. Posso fazer o jantar para você hoje?
Ela demorou quase uma hora para responder.
Billie: Meu último cliente será às cinco. Podemos conversar um pouco
depois que eu terminar, antes da babá ir embora?
Tive a sensação de que isso significava que ela não estava pretendendo
passar a noite comigo de novo, mas eu estava desesperado e aceitaria o que
fosse possível.
Colby: Claro. Verei se ela pode ficar até um pouco mais tarde.
Billie: Te vejo em breve.
Quando entrei no estúdio depois do trabalho, o rosto de Deek me disse que
não fui o único a passar o dia sem conseguir parar de pensar nas coisas. Ele
pousou uma das mãos em meu ombro.
— Mantenha-se firme, cara.
Assenti e caminhei até Billie, que estava na sala de tatuagem enchendo seu
carrinho portátil.
— Oi. — Toquei seus lábios com os meus.
Ela abriu um sorriso triste.
— Terminarei em alguns minutos.
— Sem pressa. A babá pode ficar enquanto eu precisar.
— Ok.
Ficamos em silêncio até ela terminar e pegar a bolsa.
— Quer ir dar uma volta?
— Claro. — Dei de ombros. — O que você quiser.
Caminhamos até um parque que ficava a alguns quarteirões do estúdio e
compramos cachorros-quentes em um food truck que sempre estacionava na
entrada. Depois, sentamos em um banco e puxamos conversa fiada e
desconfortável enquanto comíamos. Depois, limpei minha boca e coloquei um
joelho no banco ao me virar para ela antes de falar.
— Eu daria qualquer coisa por uma solução fácil para tudo isso, para que as
coisas pudessem voltar a serem como deveriam, Billie.
Ela tocou minha bochecha.
— Eu sei que sim, Colby, e isso é parte do que te faz uma pessoa especial.
Você está disposto a sacrificar o que for preciso pelas pessoas que ama,
incluindo a sua própria felicidade. — Ela pausou e respirou fundo. — E é por
isso que também sei que, quando eu te pedir que faça algo por mim, você fará.
Franzi as sobrancelhas.
— Claro. O que você precisar.
Billie sustentou meu olhar.
— Preciso que deixe Maya ir morar com você.
— Está brincando, não está?
Ela balançou a cabeça.
— Estou falando muito sério, Colby. Passei a noite em claro pensando em
tudo. É a única solução real que temos. Vocês precisam se apresentar como um
casal durante esta segunda entrevista, e o único jeito de fazer isso acontecer é
passando tempo um com o outro. Vocês precisam saber coisas sobre as quais
não podem estudar, como suas rotinas e hábitos matinais, e têm apenas duas
semanas para aprenderem tudo.
Balancei a cabeça.
— Não posso fazer isso, Billie. Não posso fazer isso conosco.
— Você não estaria fazendo isso conosco. Estaria fazendo por nós. Eu vejo
você, Saylor e eu como um time, e esse time precisa fazer o que é melhor para
Saylor, independente de como nos sentimos pessoalmente. — Os olhos de Billie
se encheram de lágrimas. — Eu também amo Saylor. Nunca poderei viver
comigo mesma se o meu egoísmo, que não quer que você more com outra
mulher por algumas semanas, a prejudique. Então, não aceito não como
resposta. Maya vai morar com você, e vocês dois passarão cada momento
acordados juntos conhecendo um ao outro.
Tive que engolir o bolo enorme que se formou em minha garganta para
conseguir falar.
— O quanto você se importa com Saylor significa tudo para mim.
Ela fungou.
— Bem, que bom, porque é nisso que nós dois precisamos focar durante as
próximas duas semanas.
Apoiei minha testa na de Billie e perdi a batalha contra as lágrimas.
— Você é a melhor coisa que já aconteceu na minha vida.
As lágrimas começaram a escorrer por seu rosto também.
— Então, está combinado. Maya vai morar com você.
Meu coração sentia que isso era errado, mas minha cabeça não podia negar
que provavelmente era a melhor chance que eu tinha para passar na entrevista.
Então, assenti.
Billie respirou fundo.
— Tem só mais uma coisa que eu preciso que você faça por mim.
— Qualquer coisa.
— Não podemos nos ver por um tempo.
Congelei.
— O que quer dizer?
— Meu coração estará com você, mas será doloroso demais ter que te ver
quando terá que ir para casa com outra mulher. E você precisa passar todo o seu
tempo livre conhecendo Maya, não comigo.
— Mas…
Billie pousou um dedo em meus lábios e balançou a cabeça.
— Preciso que você faça isso por mim, Colby. Por favor.
Alguns dias depois, minha vida tinha virado de cabeça para baixo. Maya
havia se mudado para o meu apartamento, mas, felizmente, até então, ela não
passava muito tempo por perto. Esse era o lado bom. O lado ruim era que a
minha separação de Billie havia começado, e não poder vê-la ou falar com ela
todos os dias era uma droga. O que também era uma droga era ter que mentir
para a minha filha e dizer a ela que Maya era uma amiga que precisava de um
lugar para ficar.
Maya não estava em casa na segunda-feira de manhã cedo quando convidei
Holden para me ajudar com um pequeno projeto antes de ter que ir para o
trabalho.
Ele enfiou a cabeça no quarto de hóspedes.
— Essas são as coisas dela?
Havia uma jaqueta de couro e algumas outras peças de roupa empilhadas na
cama.
— Sim.
Ele olhou em volta.
— Ela não está aqui agora, está?
— Não. Ela trouxe as coisas e passou a noite aqui, mas vive sumida na
maior parte do tempo. Eu a ouvi se levantar e sair lá pelas cinco da manhã. Não
sei aonde diabos ela foi tão cedo, e não dou a mínima.
— Ela ainda trabalha como stripper?
— Não faço ideia.
— Você quer que eu investigue? — Ele piscou um olho para mim. — Faz
um tempo que não vou a clubes de strip.
— Faça o que quiser, cara. — Dei risada.
— Mas, sério, você nem ao menos sabe se ela ainda trabalha como stripper?
Tem alguma coisa que saiba sobre a vida dela?
— Eu não preciso conhecer a Maya de verdade, somente a falsa com quem
me casei.
— É justo — ele disse, pegando sua caixa de ferramentas. — Então, onde
você quer que eu coloque uma tranca?
— No meu quarto. Preciso poder trancá-lo por fora, para que ela não possa
entrar enquanto eu estiver no trabalho.
Ele arqueou uma sobrancelha.
— Você acha que ela pode roubar alguma coisa ou algo assim?
— Ela já roubou minha vida, por que não meu relógio e o dinheiro que deixo
por aí? Não confio nela.
— Como Billie está lidando com tudo isso?
Suspirei.
— Gostaria de saber.
— Como assim?
— Nós concordamos em não nos vermos enquanto Maya estiver morando
aqui. Isso inclui não nos falarmos.
Holden ficou boquiaberto.
— Caralho… vocês terminaram?
— Não! — respondi inflexivelmente. — Estamos apenas dando um tempo,
porque isso é difícil demais para ela. Um tempo. Não um término.
— Mas por que ficar sem se falar?
— Porque Billie e eu não podemos ficar na vida um do outro de um jeito
meia-boca. É tudo ou nada. Mas estamos conseguindo lidar com isso porque
sabemos que é temporário. É o único jeito de ser possível. Não é o que eu quero,
é pela saúde mental de Billie. Sei que ficarmos sem nos falarmos parece
extremo. Mas eu entendo. A situação toda é dolorosa. E estou disposto a fazer
qualquer coisa que for preciso para me certificar de que ela continue por perto
quando tudo acabar.
— Caramba. Queria que você tivesse deixado eu me casar com aquela
cretina.
Revirei os olhos.
Talvez eu estivesse me fazendo passar por mais confiante sobre a situação
com Billie do que realmente estava. Só Deus sabia por quanto tempo Maya
moraria na minha casa. Até onde eu sabia, ela poderia me extorquir novamente
para ganhar mais tempo e morar ali sem pagar aluguel. Se esse pequeno arranjo
de moradia excedesse algumas semanas, seria muito difícil manter meu acordo
de não ver Billie. Outra coisa que me preocupava era se Billie iria cair em si
enquanto estivéssemos separados e perceber que não precisava aguentar mais
essa merda. Ela poderia facilmente encontrar um homem que não viesse com
uma tonelada de bagagem e uma “esposa” ilegal. Não podia nem pensar nisso
naquele momento.
— Prontinho — Holden disse um tempo depois, testando a tranca que havia
acabado de instalar.
— Valeu, cara. Queria poder te pedir para trocar a fechadura da porta da
frente também, para que ela não pudesse mais entrar.
Ah, como eu queria.
Naquela noite, após ler uma história para Saylor dormir, ela tinha perguntas.
Eu sabia que isso aconteceria.
— Por que Maya está morando com a gente mesmo?
Eu já tinha mentido para minha filha uma vez, coisa que odiava, mas ela
claramente não tinha entendido. Nem deveria, já que nada fazia um sentido
racional, mesmo.
— Ela precisava de um lugar para morar por um tempo… — expliquei
novamente. — Então, já que ela é minha… amiga… concordei em deixá-la ficar
conosco.
— Quando a Billie vai voltar?
Billie havia conversado com Saylor para dizer que se afastaria por um
tempo, mas que voltaria. Ela não queria que a minha filha se preocupasse ou
pensasse que havia algo de errado. Mas isso não impedia Saylor de me pedir
atualizações. Quem podia culpá-la?
— Espero que em breve, querida.
Ela hesitou e, então, perguntou:
— Você ama Maya?
Por que ela perguntaria isso? Minha filha era esperta demais. Ela estava
começando a juntar dois mais dois ― que a partida de Billie coincidiu
exatamente com Maya ter vindo morar conosco.
— Não. Eu não amo Maya. Preciso que você entenda isso, ok? Maya é
apenas uma amiga. — Eu a abracei. — Eu amo Billie. E você, é claro.
Saylor fez beicinho.
— Quero que a Billie venha. Estou com saudades dela.
Aquilo me partiu o coração.
— Eu sei que sim, querida. Acredite, também sinto saudades dela. Mais do
que tudo.
De dentro do quarto, pude ouvir que Maya tinha chegado em casa, baseado
em alguns tilintares vindos da cozinha. Sem vontade de sair e encará-la, contei
outra historinha para Saylor. E depois outra. Mas antes de partir para uma
terceira, me dei conta de que evitar Maya cancelava totalmente o propósito
dessa situação torturante. Se eu tinha que morar com ela, podia muito bem
estudar as informações das quais precisava para tirar essa entrevista de letra.
Então, acomodei minha filha e lhe dei um beijo de boa-noite. Quando saí do
quarto de Saylor, encontrei Maya diante do fogão, fritando alguma coisa.
Ela se virou para mim.
— Oi.
Resmunguei e puxei uma cadeira.
Antes que eu tivesse a chance de piscar, chamas voaram por toda parte.
Maya se alarmou, agitando as mãos.
Levantei-me em um pulo.
— Que porra é essa?
Imediatamente, peguei uma assadeira de uma gaveta e cobri as chamas. De
algum jeito, um saco marrom de papel havia pegado fogo. Consegui apagá-lo
antes que saísse de controle e incendiasse todo o meu apartamento. Seria um
simbolismo apropriado, não? Tudo virar um inferno, assim como a minha vida
no momento…
Maya continuou a se tremer incontrolavelmente.
— Relaxe. Já apagou.
Ela cobriu a boca com as mãos trêmulas.
— Me desculpe, Colby.
— Você precisa tomar mais cuidado. — Examinei melhor o que ela estava
cozinhando. — Por que raios você estava com um saco de papel perto da chama
do fogão?
— Eu estava fazendo batatas fritas e colocando-as no saco para absorver a
gordura.
— Por que não compra batatas fritas prontas como todo mundo?
— Não é a mesma coisa. — Ela ficou sacudindo a cabeça e, então, encostou-
se à bancada e começou a chorar.
Não tinha tempo para lágrimas de crocodilo. Mas, com o passar dos
segundos, percebi que ela estava abalada de verdade. Então, tomei a iniciativa
de descartar as batatas queimadas que estavam no óleo e limpar a bagunça que
ela havia feito. Olhei rapidamente para ela ao jogar papéis-toalha ensopados de
gordura no lixo.
— Você tinha um plano B?
— Hã?
— Para o jantar.
Ela balançou a cabeça.
— Não tenho mais nada para fazer. Só comprei batatas.
Revirei os olhos.
— Sente-se. Tente se acalmar. — A contragosto, ofereci: — Tem sobras de
um cozido na geladeira, se estiver com fome.
Ela arregalou os olhos.
— Sério? Seria ótimo. Estou com tanta fome, e já está tarde.
Servi e esquentei um prato, coloquei diante dela e sentei-me do outro lado da
mesa. Cruzei os braços e fiquei observando-a comer. De vez em quando, ela
colocava uma garfada na boca e enxugava mais lágrimas. Ainda parecia
perturbada por causa do fogo, e eu não estava entendendo.
Forcei-me a perguntar:
— Por que você ainda está tão chateada? Já acabou.
Maya fungou.
— Você não quer saber por que estou chorando. Não precisa fingir que se
importa.
Ela estava tentando fazer parecer que eu era o sem coração ali?
— Por mais que eu não ligue para os seus sentimentos, porque você com
toda certeza não liga para os meus, eu me importo em conseguir aguentar esses
dias com você. Precisamos nos recompor e descobrir como nos relacionarmos,
se quisermos que isso dê certo. Sentar aqui na minha frente chorando e sem me
dizer o que diabos há de errado com você não está ajudando.
Ela enxugou os olhos.
— Não me orgulho do modo como lidei com toda essa situação. Fui longe
demais devido ao meu desespero para ficar, mas agora é tarde. Eu sabia que te
forçar seria a única forma de conseguir que você me ajudasse. Não espero que
você um dia me perdoe ou me compreenda. Mas tenho meus motivos para
precisar ficar aqui. — Ela assoou o nariz em um guardanapo. — Não posso
voltar para o Equador, Colby. É um pesadelo.
Estreitei os olhos.
— Por que é um pesadelo? A sua família não está toda lá?
Ela baixou o olhar para seu prato.
— É uma história muito longa.
Inclinei-me para frente.
— Bem, se ainda não reparou, eu suspendi toda a minha vida por você. Acho
que, no mínimo, mereço saber por que o seu pesadelo se tornou o meu pesadelo.
Ela expirou e assentiu.
— Tem razão. — Ela enxugou os olhos. — Você merece saber.
Recostei-me na cadeira e cruzei os braços.
— Então… o que aconteceu?
Maya escondeu o rosto nas mãos.
— Eu não deveria estar aqui, Colby.
— Bom, isso com certeza. Estou contando os dias até esse arranjo acabar.
Ela ergueu o olhar para mim.
— Não… eu quis dizer que deveria estar morta.
Meu queixo caiu. Do que diabos ela estava falando?
— Tentei me matar quando estava no Equador. — Ela balançou a cabeça
devagar. — Mas sou tão fracassada que nem isso consegui fazer direito. Então,
ainda estou aqui. Mas não deveria.
Fiquei boquiaberto. Eu podia odiá-la, mas não lhe desejava a morte.
— O que aconteceu? — finalmente perguntei.
Ela fitou o vazio por um momento.
— Seis anos atrás, eu estava trabalhando de babá no Equador. Ironicamente,
estava tomando conta de uma garotinha mais ou menos da mesma idade de
Saylor. — Ela pausou. — Um dia, enquanto eu estava cuidando dela, fiquei
envolvida com alguma coisa no celular. Não devo ter passado mais que um
minuto checando o Facebook. Rocio estava em seu quarto, então imaginei que
seria seguro tirar um intervalo. Eu não fazia ideia de que ela havia saído de
fininho. Ela saiu pela porta dos fundos que dava para a piscina.
Engoli em seco. Tive a sensação de saber o rumo que essa história estava
tomando, e como pai de uma garotinha, fiquei completamente enjoado.
Com lágrimas nos olhos, Maya continuou.
— Ela caiu na piscina, e eu nem sabia. Quando fui ao seu quarto dar uma
olhada nela, vi que tinha desaparecido. Enlouqueci, procurando por toda a casa,
mas enquanto eu estava vasculhando todos os cantos lá dentro, ela estava lá fora
na piscina, se afogando. Finalmente, percebi que a porta dos fundos estava
aberta e me dei conta de que ela tinha caído na piscina. Eu a encontrei boiando
na água, virada para baixo. Tentei salvá-la, mas ela já estava morta quando a
alcancei. Chamei ajuda, mas era tarde demais.
Ah, cara.
— Merda. — Então, murmurei as palavras que nunca pensei que ela ouviria
de mim. — Eu sinto muito.
— Os pais dela disseram à minha família que era melhor que nunca mais me
vissem. Eles fizeram questão de espalhar por toda a cidade o que havia
acontecido. Minha família não soube lidar com todas as fofocas e maldades que
as pessoas diziam. Meu pai perdeu o emprego por causa disso, e a minha família
me afastou. — Ela olhou para o teto, começando a chorar novamente. — Todos
me odiavam. Mas não mais do que eu odiava a mim mesma. Certa noite, tentei
tomar pílulas para acabar com tudo, mas não tomei o suficiente. Alguém me
encontrou largada na rua e me levou para o hospital, onde fizeram uma lavagem
no meu estômago.
Isso é tão triste e sinistro.
— Deus… — sussurrei.
Ela continuou.
— No hospital, conheci uma enfermeira muito gentil, a primeira pessoa a me
perguntar o que havia de errado e realmente ouvir o meu lado da história. Ela
encontrou um médico para mim. Me ofereceram ajuda. Comecei a acreditar que,
talvez, eu merecesse perdão e uma segunda chance. Mas sabia que precisava
ficar longe da minha família e das pessoas da minha cidade, porque eles só me
fariam acreditar que eu deveria estar morta. Então, comecei a economizar para
comprar uma passagem e vim embora para os EUA, determinada a deixar minha
família e nunca mais olhar para trás. Quando meu visto expirou, continuei aqui
irregularmente. Não tenho nada no Equador além de vergonha. Sinto que vou
morrer se tiver que voltar para lá.
— Então, você chegou aqui e começou a trabalhar como stripper
imediatamente?
Ela balançou a cabeça, confirmando.
— Sim. Foi o único emprego que consegui. E os donos daquele clube não
ligavam para o fato de que eu estava aqui irregularmente, só queriam que eu
tirasse a roupa e os fizesse ganhar dinheiro.
— Você ainda faz isso?
— Sim. Em outro clube. — Ela sorriu suavemente. — Nunca me esquecerei
da noite em que te conheci. Nunca tive um cliente tão lindo, alguém que
realmente me deixou nervosa. Os seus amigos pagaram uma dança exclusiva
para você e fomos para o quarto privativo juntos. Você provavelmente deduziu
que, pelo que fiz com você, eu dormia com todo mundo. Mas isso não era
verdade. Você foi o primeiro cliente com quem transei. Não precisa acreditar em
mim, mas é a verdade, Colby. Você estava bêbado. Eu também estava um
pouco, mas sabia o que estava fazendo. Eu queria me sentir bem por uma noite,
esquecer todas as memórias infelizes. Nunca imaginei que engravidaria. Nós
usamos camisinha. E eu tomava pílula. Mas, pensando bem, eu não era muito
boa em sempre me lembrar de tomar. Desde o instante em que descobri que
estava grávida, eu soube que o bebê era seu. Porque não houve mais ninguém.
Mas também sabia que não podia ficar com o bebê. Eu nunca me permitiria
cuidar de outra criança depois do que aconteceu com Rocio. Eu não tinha
capacidade para ser mãe. E não merecia trazer uma vida a esse mundo quando
tinha sido responsável pela perda de outra. — Ela respirou fundo. — Mas eu
não queria fazer um aborto. Não sabia o que fazer, e não sabia como te contar.
Fiquei adiando isso até que, finalmente… ela nasceu. Ela era tão perfeita. Tive
ainda mais certeza de que precisava abrir mão dela para não arruiná-la. — Ela
olhou para mim. — Ela era a sua cara. Eu soube que esse era o sinal de que eu
precisava para entregá-la a você. Ela era sua. Sempre sua. E foi por isso que a
deixei com você. Me odiei por abrir mão dela, mas sabia que seria o melhor
para ela. Claramente, eu estava certa.
Puxei meus cabelos. Nunca tive a menor ideia do que ela estava pensando
naquele tempo.
— Sinto muito pelo que aconteceu com você no Equador — eu disse após
um momento. — E que bom que você não conseguiu tirar a própria vida.
— Acho que Saylor não estaria aqui se tivesse dado certo, não é?
Ela tinha meio que lido a minha mente. Por mais que eu desprezasse Maya,
sem ela, Saylor não existiria. Mas mesmo que eu lamentasse seu passado
trágico, não era suficiente para me solidarizar com suas ações em relação a
mim. Ainda não existia desculpa para o que ela tinha aprontado.
— Olha… — falei. — Vamos apenas passar por mais essa, ok? Já chegamos
até aqui. Vamos aprender mais um sobre o outro para não desperdiçarmos nosso
tempo. — Levantei-me. — Vou pegar papel e caneta para fazermos anotações.
Precisamos tirar essa entrevista de letra.
Ela limpou as lágrimas e sorriu.
— Ok.
No dia seguinte, não conseguia focar em mais nada além do quanto sentia
falta de Billie. Fazia vários dias desde a última vez em que vira seu rosto. Eu
sabia que o acordo era não nos vermos, mas estar separado dela estava me
matando.
Após o trabalho, decidi passar em frente ao seu estúdio. Meu plano era
somente dar uma espiadinha lá dentro, olhar para ela rapidamente e subir para o
meu apartamento sem que ela me visse.
Mas, por alguma razão, eu não tinha me dado conta do quão tarde já era
quando cheguei lá. Ultimamente, eu mal tinha noção de tempo; todos os dias
eram miseráveis da mesma forma. Esperei olhar pela janela do estúdio de Billie
e vê-la em ação, ocupada com o trabalho. Mas não foi isso que vi.
Ela estava sozinha.
Não estava esperando por isso.
Também não estava esperando vê-la tão triste enquanto varria o chão depois
de fechar o estúdio. Sua expressão estava desanimada, e parecia perdida em
pensamentos. Como eu poderia simplesmente ir embora dali? Meu coração
martelou no peito enquanto eu ponderava se batia e chamava sua atenção.
Antes que eu tivesse a chance de decidir, Billie ergueu o rosto e percebeu
minha presença. Eu devia estar parecendo um cachorrinho triste olhando pela
janela. Ela veio correndo abrir a porta para me deixar entrar.
— Há quanto tempo você está aí fora?
Simplesmente balancei a cabeça.
Ela expirou.
— Colby…
Eu a interrompi.
— Eu só… preciso te abraçar. Sei que é contra as regras.
— Nunca fomos muito bons em seguir regras, não é? — ela disse.
Puxei-a para meus braços e a abracei com firmeza, afundando-me em seu
aroma de baunilha. Meu coração esmurrava meu peito conforme nossos corpos
se embalavam de um lado para o outro. Eu estava ansiando tanto por isso.
Quando finalmente nos afastamos e olhamos um para o outro, não pude
evitar e pressionei meus lábios nos dela, em um beijo lento e doloroso.
— É melhor você ir — ela sussurrou contra minha boca antes de se afastar.
Foi difícil demais parar, mas parei.
— Obrigado — eu disse.
Billie ficou na porta, me observando ir embora. Eu sabia que ela não queria
que eu fosse, mas também sabia por que tinha me dito para ir embora. Minha
presença ali era uma violação do nosso acordo. Mas valeu a pena.
Ao chegar ao meu apartamento, fiquei surpreso ao encontrar Maya na sala
de estar colorindo com Saylor enquanto a babá vigiava. Não sabia se ficava
bravo com aquilo, mas acho que, se ela ia morar debaixo do meu teto, eu tinha
que esperar que houvesse alguma interação dela com a minha filha em algum
momento.
— O que está acontecendo aqui? — perguntei ao entrar.
Saylor correu para mim.
— Papai! Você chegou!
— O que está fazendo, linda?
— Colorindo com a Maya.
— Que… divertido.
Saylor apontou para mim.
— Tem vermelho nos seus lábios!
O batom de Billie.
Esfreguei o canto da minha boca.
— Tem?
Nem fodendo eu vou limpar isso.
— Acho que sabemos por que você chegou tarde — Maya repreendeu.
Lancei um olhar irritado para ela.
Naquela noite, Maya juntou-se a nós para o jantar. As coisas ainda não
estavam muito bem entre nós, mas me sentia um pouco mais tolerante com ela
agora. Passamos um tempinho conversando depois, combinando nossas histórias
falsas em preparação para a entrevista Stokes.
Quando fui para a cama, não conseguia parar de pensar em Billie. Abraçá-la
e beijá-la mais cedo tinha me deixado ainda mais apreensivo. Aquilo me fez
perceber que eu não podia mais viver sem ela.
Ao lado da minha cama, tinha uma caneta e um papel com anotações que fiz
sobre Maya. Eu arranquei uma folha nova e comecei a derramar meus
pensamentos e meu coração ali para Billie, todas as coisas que eu gostaria de
poder dizer a ela naquela noite. Eu provavelmente nunca lhe mostraria isso, mas
precisava colocar esses sentimentos em algum lugar.
Era a terceira vez que eu pegava Maya me observando naquela noite. Saylor
e eu estávamos sentados no chão da sala jogando Candy Land, e Maya estava
limpando a cozinha depois do jantar. Eu poderia ter ignorado ou atribuído isso à
possibilidade de ela estar me estudando para se preparar para a entrevista do dia
seguinte, mas, depois de quase duas semanas morando juntos, aprendi a
interpretá-la. Esta noite, sua expressão me fazia pensar que ela queria algo.
Ela sorriu quando nos encaramos, e eu imediatamente forcei meu olhar de
volta para o tabuleiro sem retribuir sua reação. A última coisa que eu queria era
dar a ela a impressão de que eu estava interessado em algo além de nos tirar
dessa confusão. Acho que ela entendeu a dica, porque foi para o quarto de
hóspedes e só saiu depois de eu colocar Saylor na cama.
— Ela dormiu? — Maya veio para a sala de estar, onde eu estava assistindo
TV. Não exatamente, mas a televisão estava ligada e eu estava olhando em
direção à tela.
Confirmei balançando a cabeça.
— A babá a levou ao parque depois da escola. Ela está obcecada em ficar se
pendurando nas barras, e isso sempre a deixa esgotada.
Maya sorriu.
— Acho que vou tomar uma taça de vinho. Estou um pouco nervosa por
causa de amanhã. Você gostaria de uma?
— Não, obrigado.
Embora as coisas entre mim e Maya tenham se tornado cordiais no decorrer
da última semana, eu não ia fazer nada que parecesse remotamente algo de
casal. Seria muito desrespeito com Billie.
Maya serviu-se com uma taça de merlot e sentou-se na outra extremidade do
sofá.
— Uso um implante no braço como método contraceptivo. — Ela apontou
para seu tríceps. — No direito.
Talvez tivesse sido a maneira como ela estava me olhando mais cedo, ou o
fato de que estava usando apenas um short minúsculo e uma blusa de alças no
momento, mas fui logo tirando uma conclusão precipitada.
— Nem a pau eu vou dormir com você.
Maya suspirou.
— Estou te contando porque me dei conta hoje que um marido saberia desse
tipo de coisa sobre a esposa. O investigador pode perguntar que tipo de proteção
usamos.
— Oh. Ok.
— Ah, e eu costumo dormir nua. E você?
— Eu tenho uma filha, então não, não costumo dormir nu. Às vezes, ela
acorda primeiro que eu, e não quero traumatizá-la pelo resto da vida.
Maya franziu a testa.
— Sim, claro. Isso faz sentido. Acho que eu deveria dizer a mesma coisa se
me perguntarem, não é?
Dei de ombros.
— Se quiser.
Ela assentiu.
— Que tal dizermos que durmo de blusa de alças e short, como estou agora?
Sem sutiã, é claro.
— Ok.
— E você? O que devo dizer que você usa para dormir?
— Só cueca mesmo.
— Nós trancamos a porta do quarto quando transamos?
— Claro.
— Talvez devamos dizer que geralmente trancamos, mas houve algumas
vezes em que as coisas esquentaram tão rápido que não tivemos a chance.
Parece mais convincente, já que supostamente somos recém-casados.
Essa conversa estava me deixando muito desconfortável.
— Ok.
Maya tomou um gole de vinho.
— Você se lembra da noite em que nos conhecemos? Não conseguíamos
tirar as mãos um do outro. Mal aguentamos chegar ao seu apartamento e
transamos de novo contra a parede. Eu imaginaria que, se fôssemos um casal de
verdade, a nossa paixão ainda seria assim. Não acha?
Minha mandíbula tensionou.
— Eu não penso sobre isso. Mas se quiser dizer que esquecemos de trancar a
porta algumas vezes, direi algo similar, se a pergunta surgir. — Apontei o
controle remoto para a TV e apertei o botão de desligar. — Vou para a cama.
Temos que sair às oito e meia para o nosso compromisso. Você estará aqui ou
vai me encontrar lá?
— Estarei aqui. Não duvido que o investigador possa nos observar quando
chegarmos novamente. Então, acho que é melhor chegarmos juntos.
Assenti e me levantei.
— Voltarei depois de deixar Saylor na escola.
— Ou… poderíamos ir deixá-la juntos?
Balancei a cabeça.
— Não, eu volto depois.
No meu quarto, me troquei e estava prestes a entrar no banheiro para escovar
os dentes quando ouvi uma batida leve na porta. Abri e me deparei com Maya.
Ela apontou para trás com o polegar.
— Eu estava me aprontando para ir dormir e me dei conta de que não
sabemos a rotina noturna um do outro.
Apoiei uma das mãos no topo da porta, recusando-me a deixá-la entrar.
— Eu escovo os dentes e lavo o rosto.
Maya ergueu seu celular.
— Toda noite, leio um artigo diferente sobre quais perguntas foram feitas a
algumas pessoas durante uma entrevista Stokes. O que li esta noite dizia que o
investigador focou em pequenos detalhes da rotina noturna do casal. Perguntou
se eles guardavam a pasta de dentes ou simplesmente a deixavam na pia, e se
eles usavam enxaguante bucal, fio dental e essas coisas.
Olhei para a tela de seu celular, que exibia um site com um monte de
perguntas, depois voltei minha atenção para ela.
— Eu quero muito passar nessa entrevista para poder sair da sua vida — ela
disse. — Prometo que não vai demorar. Vou apenas ficar olhando de longe
quieta você fazer a sua rotina, para o caso de nos perguntarem.
Respirei fundo antes de me afastar para o lado e deixá-la entrar.
— Ok.
Maya encostou-se ao batente da porta do banheiro enquanto eu escovava os
dentes e, em seguida, pegava o fio dental.
— Ah, você usa fio dental normal? — ela perguntou. — Eu uso aqueles
negocinhos de plástico com um pedaço de fio na extremidade.
Olhei para ela pelo reflexo do espelho enquanto passava o fio dental entre os
dentes. Eu já tinha tirado a camisa para ir dormir, e vi os olhos de Maya
descerem para o meu peito. Aquilo me deixou desconfortável pra caralho.
Então, fiz um trabalho meia-boca nos dentes e terminei o mais rápido possível
antes de me virar para ela.
— Feliz?
— Você quer ir ver como eu faço agora?
Neguei com a cabeça.
— Que tal você dizer que a sua rotina é exatamente como a que acabou de
me ver fazendo, se perguntarem?
— Oh. Ok. Acho que posso fazer isso.
Gesticulei em direção ao meu quarto.
— Acha que posso ir para a cama agora?
Maya afastou-se para o lado para me deixar sair do banheiro e, em seguida,
caminhou lentamente em direção à porta. Ao passar pela cama, ela correu um
dedo por cima do edredom até chegar ao final, parando e olhando para mim por
cima do ombro.
— Talvez devêssemos passar a noite juntos. Sabe, para pegarmos alguns
detalhes de última hora. Eu nem sei se você gosta de dormir abraçadinho ou de
bruços. — Ela olhou para mim por baixo dos cílios e mordeu o lábio inferior de
maneira tímida. — Poderia ser o nosso segredinho. Eu não contaria a Billie,
nem nada.
Cerrei a mandíbula com tanta força que fiquei surpreso por não ter quebrado
um dente.
— Saia da porra do meu quarto.
Maya piscou algumas vezes. Acho que não estava acostumada com homens
declinando de uma oferta de se juntar a ela na cama. Ela teve a coragem de fazer
beicinho.
— Não precisa ser tão grosseiro.
Apontei para a porta.
— Grosseiro eu seria se te mandasse sair da porra do meu apartamento e ir
dormir na rua. O que estou a dois segundos de fazer se você não sair agora.
Ela bufou e saiu pisando duro até a porta, fechando-a com uma batida.
Horas mais tarde, eu estava sentado sozinho à mesa da cozinha com uma
garrafa vazia de tequila quando Maya entrou no apartamento. Eu não a via
desde o incidente com Billie à tarde.
— Onde você estava? — perguntei com a fala arrastada.
— Vi Billie ficar chateada, então pensei em dar uma desaparecida por um
tempinho. Está tudo bem?
Bebi o restante do álcool em meu copo e gargalhei.
— Claro. Por que não estaria? A mulher que eu amo não quer me ver porque
estou morando com outra mulher, que, por acaso, é minha esposa, e então hoje
ela viu o que interpretou ser um momento durante o qual eu estava me
divertindo à beça com a dita cuja. — Dei de ombros. — Está tudo perfeito pra
caralho.
Maya suspirou e sentou-se de frente para mim.
— Sinto muito por todos os problemas que te causei, Colby. Sinto muito
mesmo.
Se eu não soubesse que ela não tinha coração, talvez tivesse acreditado
naquilo e achado que ela se sentia mal por mim. Levantei-me da cadeira.
— Vou para a cama.
Depois que escovei os dentes e me troquei, minha mente voltou para onde
tinha estado a tarde toda. Queria mandar uma mensagem para Billie, mas não
queria aborrecê-la mais do que já tinha aborrecido, então me contive. Contudo,
no meu atual estado de embriaguez, me convenci a acreditar que seria
irresponsável da minha parte não ver como ela estava depois de deixá-la
visivelmente chateada. Peguei meu celular e me deitei na cama para digitar.
Colby: Oi. Desculpe por hoje. Eu tinha tropeçado e rasgado a calça. A
entrevista foi hoje, e senti que estava prestes a perder a cabeça. Juro
que não foi o que pareceu. As coisas não têm sido nada divertidas.
Queria me certificar de que você estava bem e dizer que te amo.
Vi a mensagem mudar de Enviada para Entregue e, um minuto depois,
finalmente mudou para Lida. Fiquei olhando para a tela do celular,
esperando sua resposta.
E esperei.
E esperei.
E esperei…
Desgraça pouca é bobagem.
Além de já estar de péssimo humor, acordei no domingo de manhã com um
cano vazando embaixo da pia da cozinha que exigia atenção imediata. A
primeira pessoa que pensei em chamar foi Holden, já que ele era pau para toda
obra e lidava com coisas assim o tempo todo. Mesmo que eu não morasse no
prédio, sabia que ele viria até minha casa com suas ferramentas e me ajudaria,
se eu precisasse dele. Mas isso não era uma opção agora. Holden era uma
extensão de Colby. Ele voltaria correndo para Colby e lhe contaria tudo. Então
Colby pensaria que as coisas estavam bem novamente entre nós, quando não
estavam. As coisas não estavam nada bem, pelo menos não na minha cabeça, há
alguns dias. Não desde que encontrei Colby na estação de trem.
Eu conhecia outro encanador: Eddie Stark, também conhecido como “Eddie
Musculoso”, meu cliente com quem fui a um encontro, uma vez. Decidi engolir
meu orgulho e chamá-lo para me ajudar.
Ele concordou em vir com uma condição: que eu fosse almoçar com ele
depois ― como amigos. Ele já sabia que eu não estava interessada nele
romanticamente, então confiei em suas intenções. Concordei em sairmos para
almoçar, desde que eu pudesse interpretar isso como uma forma de agradecer
por me ajudar.
Eddie demorou uma hora na minha cozinha até finalmente descobrir o que
havia de errado com os canos. Enquanto eu o observava trabalhar e ouvia todo o
barulho debaixo da pia, minha mente estava em La La Land, repetindo a cena na
estação de metrô pela enésima vez e alternando entre me sentir furiosa e triste.
A essa altura, nem tinha mais certeza de que minha memória não havia
distorcido tudo, exagerando o que eu tinha visto e ouvido. Eu não tinha mais
uma imagem clara do que tinha acontecido. Ainda assim, continuei a ruminar.
Do que eles estavam rindo?
O que mudou entre eles?
Ele agora gosta dela ou algo assim?
Devo responder à sua mensagem?
Eu deveria responder à sua mensagem.
Não vou mandar mensagem para ele coisa nenhuma!
Eu estava errada em ficar tão brava?
Como está Saylor? Está rindo com eles agora também?
Ela ainda sente a minha falta?
Ela e Maya estão ficando mais próximas?
Senti que estava enlouquecendo.
Sim, eu sabia que poderia ter simplesmente contatado Colby para conseguir
as respostas para essas perguntas, mas o meu ego não queria me deixar. Em vez
disso, me fez permanecer paralisada, sem tomar ação alguma.
Eddie finalmente saiu de debaixo da pia e me informou que acreditava ter
consertado o problema. Abrimos a torneira várias vezes para testar, e não havia
mais nenhum vazamento. Ele estava guardando suas coisas quando seus olhos
pousaram em algo que estava na minha tigela de frutas.
— Mas que droga é essa?
Aff. Eu ia jogar fora.
— Não era para você ter visto isso — eu disse.
— Gostaria de me explicar?
— Não exatamente.
— Billie… — Ele pegou o objeto. — Tem a porra de uma boneca Barbie
com os cabelos arrancados deitada no meio de um cacho de bananas. Preciso de
uma explicação; senão, vou deduzir que você curte algum lance esquisito de
Barbie vudu com frutas.
Dei risada.
— Não é nada disso.
Ele arqueou uma sobrancelha.
— Então, o que é?
— É um velho hábito de infância. — Suspirei. — O cabelo da Barbie foi
sacrificado para o meu bem-estar mental.
— Uhhh. Ok. Isso faz total sentido. — Ele arregalou os olhos como se
dissesse “essa garota é louca”.
— Ok, deixe-me explicar. — Peguei a boneca de sua mão e olhei para ela.
— Quando eu era mais nova e ficava chateada, pegava uma das minhas Barbies
mais antigas e arrancava os cabelos dela, fio por fio, até não sobrar mais nada.
Esse processo era terapêutico para mim. Como apertar aquelas bolinhas quando
está estressado. Ou estourar plástico-bolha.
Ele cruzou os braços e riu.
— É, tipo isso… mas de um jeito bem mais doido. Entendo.
Eu não podia culpá-lo por achar que aquilo era maluquice, mas ele pediu que
eu explicasse.
— Aconteceu uma coisa há alguns dias — eu disse a ele. — Naquela noite,
eu estava tão frustrada que fui à lojinha de 4,99 para comprar doces e descontar
meu estresse neles, e comprei uma Barbie barata e genérica também. Não fazia
isso há anos.
Ele me encarou.
— Billie…
— Hum?
— Quer falar sobre o que raios te levou a fazer isso?
Meu estômago roncou.
— Estou faminta. Vamos ao restaurante, e te explicarei tudo lá.
Era um dia limpo e perfeito para uma caminhada na cidade de Nova York.
Embora a caminhonete de Eddie estivesse estacionada na rua, fomos andando
até um bistrô que ficava a alguns quarteirões de distância.
Depois que pedimos nossa comida, ele apoiou os antebraços sobre a mesa e
disse:
— Muito bem, me conte o que está acontecendo. Fiquei sabendo que você
estava namorando aquele cara que é dono do seu prédio. Foi por causa dele que
a Barbie ficou careca?
Suspirando, confirmei com a cabeça.
— Não estávamos somente namorando, Eddie. Eu me apaixonei
perdidamente por ele e sua filhinha. — Meu coração apertou. — E sinto falta
deles.
— Sente falta? — Seus olhos se arregalaram. — Vocês terminaram?
— Não exatamente.
Ele estreitou os olhos.
— Parece complicado.
— Você não faz ideia.
— Preciso dar uma surra nele?
— Não é nele que quero dar uma surra — respondi.
— O que está acontecendo? Converse comigo.
— Quanto tempo você tem? — Tomei um gole da minha água. — Sério,
essa história é longa pra cacete.
— Quanto tempo eu tenho? Mais tempo do que o necessário para arrancar os
cabelos de uma Barbie fio por fio. Que tal?
Acabei contando a Eddie tudo sobre a situação, terminando no dia em que
encontrei Colby rindo com Maya na estação de metrô e o quanto aquilo me
incomodou. Brincando com meu canudo, olhei para meu copo.
— Eu estava com tanta saudade dele naquele dia, e foi simplesmente…
chocante vê-lo rindo com ela. Ele supostamente a odeia, e agora eles estão rindo
juntos como dois melhores amigos? Tipo, que porra é essa?
Eddie coçou o queixo.
— Bom, vamos dissecar isso para chegarmos à raiz desse aborrecimento.
Porque algo me diz que o problema foi mais do que somente as risadas. O que
realmente te incomodou ao vê-lo rindo?
— Tudo? — Dei de ombros. — Como vou dissecar isso?
— É para isso que o Eddie está aqui. — Ele sorriu. — Vou te ajudar.
Eu aceitaria qualquer ajuda que pudesse, a essa altura.
— Ok…
Nosso almoço chegou, interrompendo momentaneamente a conversa.
Eddie colocou uma batata frita na boca.
— Então, primeiro, pergunte a si mesma: você preferiria que ele ficasse
infeliz durante todo o tempo pelo qual tem que morar com aquela mulher?
Colocando um pouco de ketchup no meu prato, balancei a cabeça.
— Não, de jeito nenhum. Não é isso. Eu quero que ele seja feliz.
— Ok, então felicidade pode envolver risadas, correto?
— Parece que estou sendo interrogada no tribunal. — Dei risada. — Sim,
acho que sim.
— Então, sabemos que não foi o fato de que ele estava alegre que te
incomodou. — Ele deu uma mordida em seu hambúrguer e falou com a boca
cheia. — Próxima pergunta. Você sentiu como se o fato de ele estar rindo com
ela podia significar que estava desenvolvendo sentimentos por ela?
Por mais que as minhas inseguranças quisessem se apegar a isso, eu não
podia.
— Isso também não faz sentido, sabendo o quanto ele a detesta e o rancor
que tem por ela. Então, não achei isso.
Ele pousou seu hambúrguer e limpou as mãos.
— Sabe o que eu acho?
— O quê?
— Acho que cheguei ao um veredito.
— Qual é?
— Acho que você ficou chateada por vê-lo rindo porque, de alguma forma,
relacionou isso aos sentimentos dele por você. Tipo, como ele poderia estar feliz
quando deveria estar na merda, sentindo a sua falta… Estou certo? De certa
forma, a risada dele demonstrou que, na verdade, o mundo não havia acabado
para ele sem você nele.
Nossa. Arregalei os olhos. Acho que Eddie acertou na mosca.
— É isso, Eddie. Foi isso que me incomodou. Foi como um reflexo dos
sentimentos dele por mim, mesmo que ele nunca tenha me dado um motivo para
duvidar deles. Acho que ando ultrassensível ultimamente por causa do estresse
da situação. Isso deve estar deturpando o meu senso de realidade.
Respirei fundo. Ter resolvido isso me fez sentir um pouco melhor.
— Caramba, você é bom, Eddie Musculoso. Quer trocar tatuagens por
terapia?
— Gostei dessa ideia. — Ele deu uma mordida no hambúrguer. — Pense só,
a Barbie poderia ter se livrado daquele corte de cabelo maluco se você
simplesmente tivesse conversado comigo sobre isso antes.
Dei risada.
— Acho que você nunca vai me deixar esquecer desse lance da Barbie, não
é?
— Provavelmente não. — Ele piscou.
— Ótimo.
Eddie salpicou um pouco de sal em suas batatas fritas.
— Muitas coisas fazem as pessoas rirem, Billie. Você não deveria ficar
ruminando isso. Às vezes, precisamos dar risada por questão de sobrevivência.
Você deve ter encontrado o cara em um desses momentos, só isso. — Ele
apontou uma batata frita para mim. — Vou te dar um exemplo por experiência
própria. Você sabe sobre o meu divórcio, certo?
— Sim, claro.
— Não foi nada bonito. Cheio de amargura. Muito ressentimento. Te contei
essa história toda, uma vez.
— Sim… — Tomei um gole de água.
— Ela e eu não nos falávamos há um bom tempo. No dia em que fomos
finalmente assinar os papéis do divórcio, estávamos na sala de reuniões com
dois advogados. Estava tudo quieto. E, sem brincadeira, o advogado dela soltou
um peido no meio da reunião.
— O quê? — Caí na risada.
— Não acho que tenha sido intencional, obviamente, mas ainda assim. Ele
espirrou e acabou soltando um peido bem alto. Nicole e eu olhamos um para o
outro como se disséssemos: você ouviu o que eu ouvi? — Ele sorriu com a
lembrança. — E então, nós dois nos descontrolamos. Perdemos totalmente o
controle, duas pessoas que mal trocaram uma palavra uma com a outra nos
últimos dois anos. Ali estávamos, ainda odiando um ao outro, mas curtindo
aquele momento de risadas, mesmo assim. Sabe por quê? Porque somos
humanos. É isso que seres humanos fazem. Nós rimos de coisas doentias, rimos
com nossos inimigos e, às vezes, rimos quando provavelmente deveríamos estar
chorando.
Limpei meus olhos, sem saber se estava rindo ou chorando.
— Obrigada pela perspectiva, Eddie. Você me ajudou a ver tudo de uma
forma diferente.
— Que bom.
— É egoísta da minha parte ainda querer que ele saiba que aquilo me
aborreceu e estar fazendo isso me recusando a responder sua mensagem há três
dias? — perguntei.
— Não há nada de errado em fazê-lo suar um pouco, porque ele precisa
saber o quanto tudo isso tem sido difícil para você.
O pobre Eddie me deixou desabafar durante todo o almoço. Em seguida, me
deu uma carona até o estúdio, já que eu havia me oferecido para acrescentar
uma coisa rapidinho à sua tatuagem mais recente ― por conta da casa, é claro.
Depois que terminamos, ficamos do lado de fora do estúdio. Como
costumava fazer sempre que estava na rua em frente ao prédio ultimamente,
olhei em volta procurando Colby, caso estivesse saindo ou passando por ali. Eu
nunca sabia bem se queria esbarrar com ele ou se estava torcendo para que isso
não acontecesse, mas a adrenalina sempre pulsava em mim até voltar para o
interior do estúdio.
— Nem sei como te agradecer por ter me distraído hoje e pelo seu conselho
sábio — eu disse a Eddie.
— Bom, você fez muito por mim no decorrer dos anos, Billie. — Ele ergueu
o braço. — Cada uma dessas lindas artes que você tatuou em mim me traz
alegria todos os dias. O mínimo que eu poderia fazer era retribuir.
— Você é um cara muito legal, Eddie. Vai fazer alguém muito feliz, algum
dia.
— Espero que não tão feliz quanto fiz à minha ex. — Ele gargalhou.
— Você encontrará a pessoa certa. Ela está por aí. Eu sei disso.
— Falando como uma verdadeira amiga. — Ele piscou para mim. — Por
mais que eu tenha tentado te convencer a sair comigo durante esses anos, fico
feliz por tê-la como amiga, Billie. Mas, se algum dia mudar de ideia e estiver a
fim de algo a mais, eu topo na hora.
Algo a mais. Com certeza, ele se referia a sexo.
— Brincadeira — ele acrescentou. — Sei que esse barco já zarpou. — Ele
piscou para mim de novo. — A menos que você o traga novamente para o porto.
Dei risada, despedindo-me de Eddie com um abraço. Ele me deu um beijo
rápido na bochecha. Quando me afastei, meu estômago gelou. Brayden estava se
aproximando do prédio. Ele me deu um sorriso pequeno e acenou antes de
entrar. Deduzi que ele tinha me visto abraçar Eddie. Minha primeira inclinação
foi correr atrás dele e tentar explicar, mas então concluí que isso provavelmente
me faria parecer ainda mais culpada. Afinal, Eddie e eu éramos somente dois
amigos trocando um abraço; não havia o que explicar.
Contudo, eu suspeitava de que Brayden contaria a Colby que me viu. Talvez
agora fosse o momento certo para contatar Colby e finalmente responder à sua
mensagem. Mas, então, me detive. Eu estava ficando envolvida demais em
meus medos e emoções. Colby e eu deveríamos estar dando um tempo. Então,
decidi deixar por isso mesmo.
Depois que fechei o estúdio, decidi ir para casa andando para clarear a
mente. No caminho, a culpa por não ter respondido à mensagem de Colby e por
Brayden ter me visto com Eddie começou a se instalar em mim. Eu não queria
fazer Colby sofrer mais do que já estava sofrendo. Decidi que, quando chegasse
em casa, tomaria um banho quente e pensaria no que queria falar antes de
mandar uma mensagem para ele.
Quando cheguei em casa, havia um envelope grande do lado de fora da
minha porta. Estava endereçado a mim. O endereço do remetente era o de
Colby.
Levei-o para dentro e o abri, encontrando uma pilha de cartas escritas em
papel amarelo de um bloco de anotações. E um bilhete de Colby.
Eu deveria estar fazendo anotações todos os dias sobre a mulher com
quem estou morando, mas, quando estou sozinho à noite, tudo o que
quero fazer é escrever para a pessoa por quem estou apaixonado. Eu não
pretendia te mostrar nada disso. Elas foram escritas para meu próprio
benefício terapêutico, para minha sanidade, um lugar em que eu pudesse
colocar todos esses sentimentos enquanto não posso dizer diretamente a
você. Escrevi para você quase todas as noites desde que você
desapareceu do meu dia a dia. Se quer a verdade sobre o que está
acontecendo dentro da minha cabeça, poderá encontrá-la aqui. No
entanto, sabe onde não pode encontrar a verdade? Em um mal-entendido
bobo, como naquele dia na estação de trem.
A primeira carta atingiu em cheio as minhas emoções:
Billie,
Ok. Nem faz tanto tempo assim, e já estou perdendo a cabeça. Não
vou aguentar ficar sem te ver. Isso é pior do que qualquer coisa que já
vivenciei. Sinto falta da sua risada. Sinto falta da sensação da sua bunda
quente contra meu pau quando durmo de conchinha com você à noite.
Sinto falta de como Saylor se anima sempre que você chega. Sinto falta
da sua escova de dentes. Sei que é uma coisa estranha para se sentir
falta, mas, na primeira vez em que você deixou a sua escova de dentes no
suporte do meu banheiro, significou algo para mim… que você planejava
voltar várias e várias vezes. E agora, não está mais lá.
Li todas as cartas até chegar à última, escrita no dia em que o vi na estação
de metrô.
Billie,
Sinto que estou te perdendo, e não vou mentir: isso está me deixando
apavorado. Nunca senti tanto medo na vida. Ao mesmo tempo, tenho
medo de te forçar. Concordei com o seu pedido de não nos contatarmos
por um tempo, então acho que escrever para você ao invés de pegar o
celular é a minha forma de cumprir minha parte nesse acordo.
Toda noite, antes de dormir, Saylor pergunta se você ainda voltará.
Eu sempre prometo que sim. Minha resposta para ela esta noite não foi
diferente. Mas uma pequena parte de mim temeu que, pela primeira vez,
eu estivesse mentindo para ela sobre você.
Por mais doloroso que tenha sido encontrar com você hoje mais
cedo, foi TÃO bom ver você. Eu estava com o humor um pouco melhor
porque tínhamos acabado de sair da entrevista Stokes. Eu estava tão
aliviado por sair daquela tortura. E foi melhor do que pensei. Quando
estávamos subindo as escadas da estação de metrô, eu tropecei em um
sapato, caí de bunda e rasguei a calça. Rasguei a porra da minha calça,
Billie. Foi ridículo e hilário. Então, caí na risada. Eu não gargalhava
daquele jeito há tanto tempo. Acho que estava precisando desse alívio.
Foi aí que te vi. E você sabe o que aconteceu.
O que você não viu foi todo o resto do que aconteceu desde que você
foi embora, como eu ficava deitado na cama à noite ansiando por você,
rezando para que o dia seguinte não fosse aquele em que você cairia em
si e perceberia que tudo isso é demais para aguentar. Você merece algo
muito melhor que isso, mas sou muito egoísta para abrir mão de você,
Billie. Eu te amo demais. Então, vou lutar por você. Não vou desistir de
nós, mesmo que, nesse momento, você me odeie. Me odeie, se quiser. Só
não me deixe.
Todo o meu amor,
Colby
Vulgo Sem Calça Pela Cidade
Sorri diante daquela última parte. Demorei bastante para decidir meu
próximo passo. Eu estava mentalmente exausta de todas as emoções que suas
palavras me despertaram.
Finalmente, mandei uma mensagem para ele.
Billie: E pensar que fiquei tão confusa na estação de metrô que nem
pude dar uma espiadinha na sua bunda gostosa para fora da calça.
Ao sair do elevador, encontrei Maya esperando do lado de fora do meu
apartamento. Ela sorriu. Franzi a testa. Duas semanas e meia haviam se passado
desde a entrevista Stokes, e ainda assim eu continuava a ficar surpreso sempre
que chegava em casa e via seu rosto, não o de Billie. Peguei minhas chaves no
bolso.
— Está esperando por mim?
— Sim, queria saber se podemos conversar por alguns minutos.
— Está tudo bem com Saylor?
Ela confirmou com a cabeça.
— Eu não quis entrar porque estava esperando por você, mas pude ouvi-la
rindo com a babá.
— Tudo bem. — Dei de ombros. — Sobre o que quer falar?
Ela apontou com a cabeça em direção à porta da escada de emergência que
ficava em diagonal com o meu apartamento.
— Você se importa se conversarmos ali? Não quero que elas nos ouçam.
— Claro.
Maya e eu entramos na área da escada. Ela sentou em um degrau e deu
tapinhas no espaço vazio ao seu lado. Relutante, sentei-me também.
— Meu advogado me contatou há uma hora…
Congelei.
— E?
Ela suspirou.
— Ele não sabia o resultado, mas, aparentemente, uma decisão foi tomada
no nosso caso. A amiga que ele tem no escritório viu um envelope endereçado a
nós nas correspondências a serem entregues. Ela procurou nossos nomes no
banco de dados, e o status tinha mudado de Em Revisão para Fechado. Mas o
sistema registra cada usuário que visita arquivos eletrônicos, então ela não quis
abrir o caso.
— Ok… bem, acho que falta apenas um dia ou dois para descobrimos, pelo
menos.
Maya assentiu e baixou o olhar. Ela ficou em silêncio por um bom tempo
antes de falar novamente.
— Meu advogado disse que, assim que um caso recebe uma determinação
final, não há mais risco de recebermos uma visita de um investigador. É contra o
protocolo eles fazerem visita domiciliar ou qualquer coisa desse tipo depois que
um caso se encerra. Então, vou me mudar amanhã de manhã, se estiver tudo
bem.
— Ah… sim. Tudo bem.
Ela virou o corpo para ficar de frente para mim.
— Olha, Colby, eu sei que já disse isso antes, mas sinto muito mesmo por
tudo que te fiz passar. Não há desculpas para as coisas que fiz, mas era
definitivamente mais fácil quando eu não conhecia você e Saylor. Na minha
cabeça, foi assim que justifiquei minhas ações: você era apenas um cara que
anda por clubes de strip por aí e leva para casa qualquer mulher vulnerável que
esteja disposta a ir… uma pessoa que usa outras. Então, por que não te usar
também? — Ela suspirou. — Mas você não é nada parecido com a pessoa que
inventei na minha cabeça.
Passei uma mão pelo cabelo.
— Talvez uma parte de mim fosse essa pessoa quando nos conhecemos. Mas
quem quer que eu fosse mudou no instante em que minha filha entrou na minha
vida. — Balancei a cabeça. — Você já se desculpou mais de uma vez, mas eu
nunca pedi. Não foi como se eu tivesse voltado ao clube onde você trabalhou
depois que ficamos para ver se você queria sair para jantar. Então, talvez eu
fosse uma pessoa que apenas te usou. E por isso, peço desculpas. Eu nunca iria
querer que um homem tratasse Saylor dessa maneira.
Os olhos de Maya se encheram de lágrimas.
— O fato de que você conseguiu me pedir desculpas depois de tudo que fiz
diz muito sobre quem você é. Saylor é tão sortuda por tê-lo como pai.
— Obrigado. Isso significa muito para mim.
— Ela é uma garotinha especial, Colby. Não preciso te dizer isso. E isso tem
muito a ver com o exemplo que você dá todos os dias. Tantos pais dizem aos
filhos que sejam bondosos e, depois, mostram a eles algo muito diferente com
seus próprios comportamentos. Mas você não diz palavras vazias. Você mostra à
sua filha o modo certo de se viver. Ela nem está aqui para saber como você está
agindo agora mesmo, e, ainda assim, você me pediu desculpas e demonstrou
mais bondade do que mereço. — Uma lágrima rolou pela bochecha de Maya. —
Queria ter conseguido ser uma mãe para ela. Queria muito. Mas eu não podia
confiar em mim mesma.
Sempre achei que Maya tinha ido embora por ser egoísta, mas talvez tivesse
interpretado errado.
— No decorrer dos anos, sempre pensei no que diria quando Saylor acabasse
perguntando sobre sua mãe. Nunca pude formular uma resposta que não a
magoasse. Mas acho que agora tenho uma.
Maya limpou suas lágrimas.
— Qual?
— Quando ela perguntar, explicarei que, às vezes, ir embora não é um ato
egoísta, mas sim altruísta. Que sua mãe a amava o suficiente para querer uma
vida melhor para ela do que a que poderia lhe dar.
— Obrigada. — Ela fungou. — Obrigada, do fundo do meu coração.
Acenei em direção à porta com a cabeça.
— É melhor eu ir liberar a babá.
— Será que posso… te pedir um grande favor?
Ergui uma sobrancelha com um sorriso irônico.
— Você quer dizer outro grande favor?
Maya deu risada.
— Sim, isso.
Levantei-me e ofereci-lhe uma mão para ajudá-la a ficar de pé.
— Do que você precisa?
— Posso levar Saylor para tomar um sorvete hoje? Só nós duas?
Eu podia ter encontrado uma maneira de aceitar o que Maya havia feito, mas
não tinha muita certeza se estava pronto para confiar nela tanto assim…
Diante da minha falta de resposta imediata, ela assentiu.
— Eu sei que é pedir demais, mas não levaria mais que uma hora. Quando
eu era pequena, minha mãe trabalhava em dois empregos. Éramos quatro
irmãos, e não a víamos com muita frequência, mas, todo domingo à tarde, ela
levava um de nós para tomar sorvete. Você não imagina o quanto eu esperava
ansiosamente por esses passeios uma vez por mês com ela. Sempre imaginei
que teria meus próprios filhos, um dia, e gostaria de manter essa tradição de
levar um de cada vez para tomar sorvete.
Porra, com essa explicação, estava ficando difícil dizer não.
— Aonde você vai levá-la?
— Tem uma sorveteria muito bonitinha descendo o quarteirão. Passo por ela
o tempo todo. Acho que se chama Coyle’s.
A Coyle’s ficava a uns cinco ou seis prédios de distância. Ela nem precisaria
atravessar a rua…
— E não vai dizer nada a ela sobre quem você é?
— Meu Deus, claro que não. Eu não faria nada para confundi-la ou magoá-
la.
— Voltará em uma hora?
— Prometo.
Mesmo que aquilo me assustasse um pouco, concordei.
— Ok. Mas, por favor, volte em uma hora.
Maya quis esperar alguns minutos para que o inchaço em seu rosto
diminuísse, então entrei no apartamento primeiro. A babá já havia ido embora
quando Maya entrou, e quando ela apareceu, Saylor correu até ela.
— Oi, Maya! Estou aprendendo a dançar em fila na escola. Você quer ver?
— Eu adoraria. Nunca aprendi a dançar assim.
— Eu posso te ensinar!
Durante os dez minutos seguintes, Saylor contou passos ao se mover de um
lado para o outro, para frente e para trás. Maya seguiu suas instruções como
uma boa aluna. Aquela era a segunda vez que eu me questionava se esconder a
verdadeira identidade de Maya da minha filha era a coisa certa a fazer. Mas
então, lembrei-me de que Maya nem ao menos havia pedido para manter
contato comigo depois de ir embora no dia seguinte. Ela não estava interessada
em ter notícias de Saylor. Tivesse uma boa razão ou não, ela não pretendia fazer
parte da vida da minha filha.
Quando elas terminaram de dançar, Maya se ajoelhou.
— Isso foi muito divertido. Mas essa dança me deixou com calor. Sabe o que
deveríamos fazer para refrescar?
— O quê?
— Tomar um sorvete depois do jantar.
Saylor começou a dar pulinhos.
— Podemos, papai? Podemos ir tomar sorvete com a Maya?
— Eu tenho que trabalhar um pouco, querida. Mas que tal Maya te levar?
— Ok!
Quarenta e cinco minutos depois, eu estava completamente tenso vendo as
duas saindo pela porta de mãos dadas. Fui para o corredor quando elas estavam
entrando no elevador.
— Só vai levar uma hora, não é?
Maya virou-se e sorriu.
— Sim. Voltaremos em uma hora.
Esperei até elas desaparecerem de vista antes de voltar para o apartamento.
Decidi tomar um banho quente, quem sabe colocar o chuveiro no modo
massagem e ver se conseguiria desfazer o nó de tensão em minha nuca.
Ajudou um pouco. Mas estive tão preocupado por deixar Saylor sair com
Maya que esqueci que não reabasteci o banheiro com toalhas depois de lavar
roupa. Então, entreabri a porta, respingando água por todo o chão.
— Saylor? Está aí?
Sem resposta.
— Maya?
Silêncio.
Com a camisa que havia usado no trabalho, cobri ao menos meu pau antes
de sair correndo até a lavanderia. Peguei uma toalha na secadora e enrolei em
volta da cintura. Mas ao sair do pequeno cômodo, percebi que algo estava
diferente. Levei um minuto para descobrir o que era.
O topo da secadora estava vazio.
A mala enorme de Maya esteve ali em cima por semanas, desde o dia em
que ela se mudara. Uma sensação apavorante me preencheu, mas lembrei a mim
mesmo de que ela ia embora na manhã seguinte. Ela havia provavelmente
chegado cedo em casa e a levado para seu quarto para arrumar suas coisas.
Sim, por isso não estava mais ali. Ainda assim, corri até o quarto de
hóspedes para conferir.
Meu coração parou quando abri a porta. As coisas de Maya não estavam
mais ali. Ela havia passado semanas com um monte de porcarias empilhadas em
cima da cômoda, que agora estava completamente vazia. Mas eu estava em
negação, então corri para as gavetas e abri uma por uma, rezando para Deus que
ela tivesse apenas arrumado as coisas ali. Mas estavam todas vazias, assim
como as mesinhas de cabeceira e o closet. E sua mala também não estava em
lugar algum. Então, notei que havia algo no meio da cama. Era uma carta,
digitada e dobrada. Peguei o papel e meu coração afundou ao ler Serviços de
Cidadania e Imigração dos EUA no topo dele. A carta tinha data da semana
anterior.
DECISÃO
Obrigado por enviar sua Solicitação para Registro de Residência
Permanente ou Ajuste de Status para os Serviços de Cidadania e
Imigração dos EUA (USCIS) de acordo com a seção 204(c) da Lei de
Imigração e Nacionalidade (INA).
Após uma análise minuciosa do seu pedido, documentos de apoio e
testemunhos, infelizmente, devemos informá-la de que estamos negando
seu pedido pelos seguintes motivos:
1. Testemunhos inconsistentes fornecidos por entrevista;
2. Evidências insuficientes sobre a boa-fé do relacionamento;
3. Informações adversas reunidas durante investigação da USCIS,
incluindo visita domiciliar.
Minha cabeça girou tão rápido que as letras no restante da página ficaram
embaralhadas, embora meu olhos continuassem a escaneá-la ― as palavras
fraude e deportação nos últimos parágrafos claras como o dia.
Que porra é essa? Por que Maya me disse que não sabia que decisão havia
sido tomada, se havia recebido a carta? Quando me dei conta de qual era a
resposta, corri até o banheiro e despejei meu almoço na privada.
Abri a porta da porra do meu apartamento para ela sair com a minha filha e
nunca mais voltar.
Vesti as primeiras roupas que encontrei e saí correndo pela porta, voando
pelas escadas. A camisa que peguei do chão do banheiro estava pelo avesso,
meus cabelos ainda estavam pingando do banho e nem me dei ao trabalho de
calçar meias antes de enfiar os pés nos sapatos sociais. Mas nada disso
importava. Somente chegar à sorveteria.
Correr a toda velocidade pela rua de Manhattan no final da hora do rush não
era uma tarefa fácil. Bati ou empurrei pelo menos uma dúzia de pessoas
enquanto corria para a sorveteria. Puxando a porta bruscamente ao chegar,
procurei Saylor pelo ambiente.
— Mesa para um? — A hostess pegou um cardápio. — Gostaria de sentar no
balcão?
— Você viu uma garotinha de cabelos loiros… de quatro anos de idade, e
uma mulher com cabelos compridos e escuros, na casa dos vinte anos?
A mulher franziu as sobrancelhas ao olhar em volta da sorveteria. Havia
meia dúzia de mesas ocupadas, e em nenhuma delas estava a minha garotinha.
— Não vejo ninguém assim aqui.
— Você viu se alguém com essas descrições saiu daqui recentemente?
Ela balançou a cabeça.
— Estou aqui desde as três da tarde. Acho que não.
Porra.
Porra.
Pooooorra!
Voltei correndo para a rua e olhei para a direita e para a esquerda. Para onde
diabos vou agora? Essa cidade tinha oito milhões de pessoas, e a sensação que
eu tinha era que todas estavam bloqueando a minha visão no momento. Maya
poderia tê-la levado para qualquer lugar! Por onde eu começaria a procurar,
porra?
Pense.
Pense.
Pense.
Se eu precisasse sair da cidade sem deixar rastros, como faria isso?
Maya não pegaria um voo, porque estava aqui irregularmente. Ela teria
medo demais de ser pega pela segurança do aeroporto. Ela também não tinha
carteira de motorista para alugar um carro.
Então, lembrei. A estação de ônibus ficava a apenas três quarteirões de
distância. Então, corri até lá. É claro que, assim como o resto da cidade, estava
lotada. Procurei freneticamente em meio a todas as pessoas, mas não havia sinal
de nenhuma delas em lugar algum. Incerto sobre o que fazer em seguida, peguei
meu celular para pedir ajuda aos meus amigos. Poderíamos nos separar pela
cidade e procurar em mais lugares.
Holden não atendeu, então deixei um recado.
— Preciso da sua ajuda! Maya levou Saylor! Me ligue de volta!
Depois, liguei para Owen. A maldita chamada foi direto para a caixa postal.
Porra.
Meus dedos tremeram ao procurar o número de Brayden em meus contatos.
Mas antes que eu pudesse iniciar a ligação, meu celular vibrou com uma
chamada.
Billie.
Atendi.
— Não posso falar agora. Maya levou Saylor!
— Eu sei. Ela a trouxe para cá.
— O quê?
— Ela está aqui comigo no estúdio, Colby. Por isso estou ligando. Achei
estranho. Maya simplesmente apareceu aqui há dois minutos com Saylor, me
entregou uma carta para dar para você e me disse para cuidar bem dela.
Meu coração martelava no peito.
— Saylor está bem?
— Sim, Colby. Ela está bem. O que está acontecendo?
Apoiei as mãos nos joelhos para recuperar o fôlego.
— Puta merda. Graças a Deus.
— Você está me assustando. O que aconteceu?
— Não sei direito. Mas estarei aí em dois minutos. Só não perca Saylor de
vista, por favor.
— Claro.
Embora Saylor estivesse aparentemente segura, fui correndo até o estúdio de
tatuagem. Quando entrei, os olhos da minha garotinha se iluminaram.
— Papai!
Abracei-a tão forte.
— Aonde você foi, meu bem?
— Maya me levou para tomar sorvete.
— Na Coyle’s?
Ela balançou a cabeça.
— Não. O moço do sorvete estava ali fora, e eu queria um sorvete no cone
com granulados.
Afastei-me e a olhei de cima a baixo. Havia uma mancha marrom enorme
em sua blusa.
— Acho que você escolheu o sabor chocolate.
Ela assentiu.
Puxei-a para mim mais uma vez, abraçando-a com firmeza.
Saylor deu risada.
— Você está esquisito, papai.
Respirei fundo antes de soltá-la.
— Desculpe. Senti sua falta, só isso.
Deek, que eu sequer tinha notado que estava ali, aproximou-se de nós.
— Ei, garotinha. Recebemos umas tintas novas que brilham no escuro. O
que acha de eu pintar seu nome e apagarmos as luzes do banheiro para você ver
como é?
Minha filha arregalou os olhos.
— Posso, papai?
— Claro, meu amor.
Billie esperou até eles estarem longe o suficiente para não nos ouvirem.
— O que aconteceu, caramba? Você pareceu alterado ao telefone.
Respirei fundo.
— Eu estava alterado. Pensei que Maya tivesse levado Saylor embora.
— Por que você pensou isso?
Expliquei tudo ― desde minha conversa com Maya na escadaria até o
momento em que encontrei seu quarto vazio com a carta da Imigração sobre a
cama.
— Por que ela mentiu para você só para trazê-la para cá?
— Não faço a menor ideia.
Billie ergueu a mão.
— Aqui, ela me deu isso. Talvez o que tem aí dentro explique tudo.
Encarei o envelope por um instante antes de abri-lo.
Querido Colby,
No dia em que apareci à sua porta com Saylor, estava com tanto
medo de não poder dar uma boa vida à minha garotinha. Mas, no fim
das contas, você deu a ela a melhor vida que ela poderia ter, ao seu lado,
que é o lugar dela. Sou tão grata por você ser o pai dela. Se tem uma
coisa que aprendi com você nos últimos meses é que palavras não
significam nada, e sim ações. O seu exemplo me mostrou o significado de
sacrifício, família e amor, e já passou da hora de eu assumir a
responsabilidade pela bagunça que causei.
Hoje, enviei uma declaração juramentada ao agente Weber da
Imigração. Nela, detalhei todas as minhas ações, incluindo ter te
chantageado para se casar comigo e feito você correr o risco de
compartilhar a custódia de uma criança com uma mulher que não tinha
nada além de más intenções. Espero que isso livre você de qualquer pena
de prisão. Também deixei papéis de divórcio consensual assinados com o
meu advogado.
Hoje, voltarei para o Equador para aceitar a responsabilidade pelos
meus erros. Participarei da investigação do afogamento, já que fui
embora antes que pudesse ser finalizada. Se tiver sorte o suficiente de
manter minha liberdade, espero poder trabalhar para reconstruir meu
relacionamento com minha família.
Cuide da nossa garotinha.
Com amor,
Maya
Pisquei algumas vezes.
— O que diz na carta? — Billie perguntou.
Ainda chocado, entreguei-lhe o papel. Ela leu e balançou a cabeça.
— Então, é isso? Maya se foi?
Dei de ombros.
— Parece que sim.
— O que faremos agora?
Eu não fazia ideia do que aconteceria com a Imigração ou o divórcio, mas
sabia com certeza o que precisava ser feito nesse momento. Envolvi Billie em
meus braços e puxei-a para mim.
— Isso. — Pressionei meus lábios aos dela. — É isso que faremos de agora
em diante…
É impressão minha ou o sol está mais brilhante hoje?
Colby queria que eu passasse a noite na casa dele, mas insisti que ele ficasse
somente com Saylor e relaxasse. Prometi que nos encontraríamos na noite
seguinte, em vez disso. Dar-lhe espaço, mesmo que ele não quisesse, era a
decisão certa. O que ele havia passado, pensar que Saylor havia sido
sequestrada, foi traumático pra caramba. Eu queria que ele passasse um bom
tempo com ela e não se preocupasse comigo. Porque, conhecendo Colby, ele
teria passado a noite anterior tentando recuperar o tempo perdido e se
desculpando por tudo.
Fiquei grata por só ter descoberto o alarme falso depois de acontecer.
Acreditar que Saylor poderia estar em perigo teria me causado um ataque
cardíaco. Fiquei muito confusa quando Maya a deixou no meu estúdio. Ainda
não conseguia superar o fato de que Colby tivera que passar aqueles minutos
pensando que Maya tinha fugido com sua preciosa garotinha.
Mas este era um novo dia.
Com Maya de volta ao Equador ― nem tão longe assim, na minha opinião
―, o pior parecia ter acabado. Mas eu sabia que ainda havia muita coisa no ar.
Não sabíamos se a confissão de Maya livraria Colby de ser condenado. Ele
ainda era responsável por tentar enganar as autoridades, mesmo que ela tivesse
colocado uma arma imaginária contra a cabeça dele. Então, parte de mim ainda
estava tensa.
Enquanto me aprontava para sair do estúdio e subir para o apartamento de
Colby após o meu último cliente, Deek me desejou tudo de bom.
— Oi — ele disse. — Você finalmente superou aquela enorme confusão.
Então, tente desfrutar da noite, ok? Deixe as discussões pesadas para outro dia.
Vocês merecem um pouco de paz. Apenas aproveitem um ao outro.
— Obrigada. Vou tentar.
— E eu liguei para todas as pessoas que marcaram com você amanhã e disse
a elas que eu cuidarei de suas tatuagens. Curta a noite e durma até mais tarde
amanhã. Tire o dia de folga.
Ainda andando nas nuvens, concordei, o que não era nada do meu feitio.
— Nem vou discutir com você, Deek.
Ele piscou para mim.
— Você está aprendendo.
— Obrigada, meu amigo. — Dei-lhe um abraço de despedida.
Ao pegar o elevador para ir jantar com Colby e Saylor, senti-me
estranhamente nervosa. Fazia um tempo desde que estive no apartamento deles.
E Saylor ainda não sabia o verdadeiro motivo da minha ausência. Na noite
anterior, senti que ela estava um pouco cautelosa perto de mim, como se não
tivesse certeza se deveria confiar que eu não iria deixá-los novamente. Ela não
ficou tão animada em me ver como achei que ficaria. Era compreensível, mas
era uma droga ter que ganhar sua confiança de volta. Eu deveria agir como se
nada tivesse acontecido? Senti que devia a ela mais uma explicação sobre por
que eu tinha ido embora. Mas qualquer explicação seria uma mentira, e eu
também não estava confortável com isso. Talvez menos fosse mais.
Bati à porta, mas não foi Colby que abriu.
Brayden apareceu diante de mim, e minha primeira reação foi entrar em
pânico.
— Brayden, o que houve?
— Oi, Billie. — Ele sorriu. — Você parece preocupada em me ver. Não
fique.
— Está tudo bem?
Antes que ele pudesse responder, Saylor veio correndo em minha direção.
— Billie!
Ajoelhei-me e abri bem os braços, muito feliz por ela parecer estar mais
animada que no dia anterior.
— Oi, amorzinho! Como você está?
Ela me abraçou.
— Você está volta?
— Sim, querida.
Saylor apertou o abraço.
— Que bom!
— Onde está o seu papai? — perguntei a ela.
— Eu não sei. — Ela deu de ombros, mas parecia estar reprimindo um
sorriso.
Estreitei os olhos.
— Você não sabe?
Ela quicou no lugar.
— Não posso te dizer que fizemos pizza para você e o papai levou com ele!
Agora, eu estava ainda mais confusa.
— Pizza para mim?
— Valeu mesmo, Saylor. — Brayden riu.
Olhei para ele.
— Cadê o Colby?
— Ele organizou uma coisinha particular para vocês dois. Já explicamos
para Saylor que ela vai ficar com o tio Brayden esta noite enquanto você e
Colby colocam o papo em dia. — Ele deu um puxão leve em uma das marias-
chiquinhas de Saylor. — Para a sorte dela, é claro.
— Oh… Colby disse que íamos jantar com Saylor.
— É, bem. Mudança de planos. Ele achou que vocês dois precisavam de um
tempo sozinhos. — Brayden piscou para mim e me entregou um envelope.
Eu o abri e li o pedaço de papel que havia dentro.
Uma vez, você deixou implícito que gostaria de um jantar no telhado.
Achei que esta noite seria perfeita para isso. Pegue o elevador até o
último andar, depois vire à direita para acessar a escada para o telhado.
— Ai, minha nossa — murmurei.
— Bem, é melhor não deixar o meu garoto esperando. — Ele piscou.
— Obrigada, Brayden.
— Podem ficar lá pelo tempo que quiserem. — Ele me lançou um olhar.
Dei um abraço de despedida em Saylor e segui pelo corredor. Arrepios
percorreram minha espinha quando entrei novamente no elevador e subi até o
último andar. Segui as instruções de Colby para chegar ao telhado, e quando
abri a porta, deparei-me com a vista mais magnífica de todas.
Colby estava esperando por mim. Estava olhando para a paisagem da cidade,
mas virou-se quando ouviu a porta se abrir. Sua boca curvou-se em um sorriso.
Ele havia colocado lanternas, luzes brancas e aquecedores ― já que estávamos
no meio do inverno. Havia flores vermelhas e cor de vinho sobre a mesa e um
balde de champanhe. Incrivelmente romântico.
— Oi, linda. Você me encontrou.
Eu o encontrei. Parecia mesmo que tínhamos nos perdido um do outro, e
esse momento marcava o momento em que encontramos nosso caminho de
volta. Ele abriu os braços, e saí correndo para ele, que me envolveu em um
abraço, e deleitei-me na sensação de segurança e amor enquanto ele me
segurava.
Finalmente.
Trocamos um beijo quente e apaixonado. Eu não tinha me dado conta do
quanto estava faminta por isso até nossas línguas colidirem.
— Você não precisava fazer tudo isso… — sussurrei após um momento.
Ele tocou meu lábio inferior com o polegar.
— Faz muito tempo desde que pude ser o namorado que você merece. Sei
que temos muito sobre o que conversar, muitas coisas para recuperar no nosso
relacionamento. Mas, esta noite, quero te mostrar o quanto você é importante
para mim. Espero que seja o primeiro de muitos jantares que teremos nesse
telhado.
Notei que havia uma mesa de comida quente posta em um canto.
— O que você fez ali?
— Algumas das suas coisas favoritas.
Ergui uma das tampas de aço inox e encontrei pequenas almôndegas.
— São as da IKEA que você tanto ama — ele revelou.
A outra bandeja continha fatias quadriculadas de vários tipos de pizza
caseira.
— Saylor e eu fizemos pizza juntos.
— É. — Sorri. — Ela me disse.
— Ah, disse? Que tagarela.
— Ela conseguiu manter o segredo por uns três segundos. — Dei risada.
— Você se lembra do que comemos na noite em que Maya apareceu e virou
nosso mundo de cabeça para baixo? — ele perguntou.
Revirei minha mente.
— Não, acho que não.
— Foi a noite em que fizemos pizza com Saylor.
— Ah, foi mesmo! Claro. Como pude esquecer?
Ele sorriu.
— Muitas vezes, penso em como aquele jantar de pizza com você e Saylor
foi a última lembrança normal que eu tinha antes que meu mundo mudasse.
Aquele dia, aquele jantar, foi a última noite em que pude existir sem viver com
um medo constante de perder tudo o que importava para mim. Você não imagina
quantas vezes desejei poder voltar àquela noite e continuar de onde paramos,
antes daquela batida na porta. — Ele expirou. — Então, a pizza é um símbolo
que representa juntar os pedaços e voltar exatamente para onde paramos… para
aquela noite simples, quando tínhamos tanta esperança para o futuro.
Olhei em seus olhos.
— Na verdade, eu não queria voltar no tempo, Colby.
Ele arregalou os olhos.
— Sério?
— Sério… — Acariciei sua bochecha. — Aprendi muito sobre mim mesma
nas últimas semanas. Estar longe de você colocou em evidência o que mais
valorizo nessa vida: família. Não a que nasci, mas a que escolhi. O que me
incomodava mais que qualquer coisa era saber que Maya estava passando tempo
com as duas pessoas mais importantes para mim, as duas pessoas que se
tornaram meu mundo inteiro. Nunca foi por causa dela ou pelo que ela teve.
Minha frustração e raiva tinham a ver com o que eu estava perdendo.
— Entendo, amor. — Ele passou uma das mãos pelo meu cabelo. —
Entendo mesmo.
— No fim das contas, não podemos afirmar com certeza que estaríamos
melhor se nada disso tivesse acontecido. Não sabemos disso. As coisas
acontecem por razões que, às vezes, não compreendemos. Tudo que sei é que
talvez eu não estivesse aqui nesse telhado com você nesse momento se tudo não
tivesse acontecido como aconteceu. E estou muito grata por esse momento.
Os olhos de Colby marejaram.
— Esta noite está sendo diferente do que imaginei.
Inclinei a cabeça para o lado.
— Como assim? O que você imaginou?
Ele suspirou.
— Não sei. Achei que você ainda estaria um pouco brava comigo pelo dia
em que me viu gargalhando.
— Não. — Dei risada. — Um homem sábio chamado Eddie Musculoso me
ajudou a entender o que estava realmente me incomodando com tudo aquilo.
Nunca foi por causa das risadas. Eram as minhas próprias inseguranças. Você
merece ser feliz. Eu só quero sempre ser parte da sua felicidade.
— Venha cá. — Colby me puxou para um abraço apertado e falou em meu
cabelo. — Sinto que preciso te dizer tantas coisas esta noite, mas você acabou
de dizer tudo que eu poderia querer ouvir. Caralho, como tive tanta sorte?
Fiquei nas pontas dos pés para beijá-lo e dei tapinhas em seu ombro.
— Vamos comer antes que tudo esfrie.
Servimos nossa comida em pratos e sentamos sob o lindo céu noturno de
Manhattan. Devoramos a pizza e as almôndegas e estouramos o champanhe,
rindo quando explodiu e molhou a manga da camisa de Colby. Sentia-me
eufórica. E agora, um pouco alterada também.
— Vai querer sobremesa? Fiz brownies de espinafre para você. — Ele sorriu.
— Hummm… vou querer um com certeza. Mas tem uma coisa que eu quero
ainda mais nesse momento.
Os olhos dele se encheram de luxúria.
— Será que é a mesma coisa que eu quero?
Olhei para trás.
— Aquela porta tranca?
— Com certeza. E se não trancasse, eu daria um jeito de improvisar uma
tranca. — Colby pegou uma chave e foi rapidinho trancar a porta.
Ele voltou, erguendo-me, e envolvi seu corpo com minhas pernas. Nos
beijamos como se dependêssemos um do outro para ter oxigênio. O vento
soprava nossos cabelos. Parecia uma cena de filme: estávamos prestes a fazer
sexo no telhado sob as estrelas e rodeados de luzes magníficas. Era tão lindo e
íntimo.
A ereção de Colby cutucou meu abdômen.
— Parece que faz uma eternidade — ele murmurou em meus lábios.
— Eu preciso de você agora, Colby — ofeguei. — Agora mesmo, porra.
Ele abriu a calça e a abaixou apenas o suficiente para libertar seu pau. Ele
ergueu minha saia e afastou minha calcinha para o lado, entrando em mim em
um único e rápido movimento.
Fechei os olhos brevemente em êxtase, conforme ele colocava uma mão na
minha nuca. Seus olhos cintilaram sob as luzes brilhantes ao me fitar enquanto
entrava e saía de mim. Enfiei os dedos em seus cabelos cheios, adorando sua
expressão enquanto me fodia. Impulsionei meus quadris, e meu clitóris se
esfregou na parte baixa de seu abdômen. Eu poderia gozar a qualquer momento,
se me permitisse. Caramba, fazia tempo demais.
Ainda me carregando, ele me levou até um sofá de couro em uma das
extremidades do telhado e sentou-se comigo em seu colo. Comecei a cavalgá-lo
rápido e com força, quase com raiva. Não dele, mas por todo o tempo que
perdemos separados. Mesmo que tudo tenha acabado como deveria ser, o tempo
era uma coisa que nunca poderíamos recuperar.
Seus olhos estavam enevoados ao olharem para mim.
— Eu tive tanto medo de te perder — ele sussurrou.
— Eu pertenço a você, Colby — eu disse, rebolando mais intensamente em
seu pau. — Você nunca me perdeu.
Isso pareceu atiçá-lo, porque, assim que as palavras saíram, seus olhos
reviraram.
— Eu te amo pra caralho, Billie. — Ele gemeu conforme seu corpo
estremecia sob mim. E estocou mais forte, preenchendo-me com seu gozo
quente.
— Eu também te amo. — Contraí meus músculos e deixei o orgasmo tomar
conta de mim. — Estava com saudades de sentir o seu gozo dentro de mim.
— Continue dizendo coisas assim e estarei pronto para a segunda rodada em
três, dois, um… — Ele fez uma pausa. — Estou pronto de novo. — Ele deu um
tapa na minha bunda.
Ele nos envolveu em uma coberta que havia trazido e ficamos deitados por
um longo tempo, saciados depois do sexo incrível, que foi rápido e furioso ―
exatamente do que eu precisava depois de tanto tempo separados.
Enquanto olhávamos as estrelas, não sei o que me compeliu a arriscar
estragar o clima. Mas eu tinha que perguntar.
— Ela tentou alguma coisa com você?
Ele levou alguns segundos para processar minha pergunta.
— Maya? — Ele balançou a cabeça. — Não diretamente. Teve uma noite em
que ela perguntou se podia me ver escovar os dentes para entender como era a
minha rotina noturna, então colaborei. Depois, ela sugeriu passar a noite no meu
quarto… sabe, para aprender melhor sobre meus hábitos de sono.
Aff. Enrijeci.
— O que você disse?
— Mandei ela dar o fora da porra do quarto.
Sorri.
— Ela obedeceu?
— Aham. E nunca mais tentou algo parecido.
— Ela deve ter achado que todos os homens são fracos e que conseguiria
fazer você cair na dela.
— Posso ter sido um homem fraco quando ela me conheceu, mas não sou
mais nem um pouco como naquele tempo. Não existe dinheiro no mundo que
pudessem me oferecer para dormir com aquela mulher. — Ele olhou para mim.
— Já que estamos fazendo perguntas desconfortáveis, eu deveria te perguntar
sobre o seu encontro com aquele tal de Eddie.
Colby estava com um meio-sorriso, então não pude dizer se ele estava bravo
ou não.
— Não foi um encontro, juro. Eddie é apenas um amigo e sempre será. Ele
me ajudou a superar e entender minha raiva depois que te encontrei na estação
de metrô.
— Ele pode ser seu amigo… — Colby revirou os olhos. — Mas tenho
certeza de que quer muito tirar a sua roupa. Não importa o que você diga.
Dei de ombros. Ele provavelmente estava certo.
— Eu me senti mal por Brayden ter me visto me despedir dele. Tive medo
de que você entendesse errado.
— Eu sabia, lá no fundo, que você não me trairia. Mas, como você disse,
isso me lembrou do que eu estava perdendo. Quando Brayden me disse que te
viu, abri um buraco na parede do meu quarto com um soco.
Cobri minha boca.
— Ah, meu Deus.
— Pois é. Holden ficou puto. Ele disse que só tenho permissão para quebrar
a parede de novo se for durante o sexo.
— Sinto muito por você ter ficado chateado.
— Está tudo bem agora.
O celular de Colby vibrou. Ele olhou para a tela por alguns segundos.
— Jesus — ele murmurou.
— O que foi? Quem é?
— Brayden. — Ele virou a tela do celular para que eu pudesse ler.
Brayden: Sei que vocês devem estar “ocupados”, mas Saylor fica me
perguntando se vai poder dar boa-noite a Billie. Acho que ela ainda
está um pouco paranoica e com medo da Billie não voltar. Não sei se
vocês querem que eu a deixe ficar acordada ou não para que possam
desejar boa-noite a ela. Ah, e tá tudo bem, mas tivemos um pequeno
incidente no qual Saylor pegou meu celular enquanto eu estava no
banheiro e começou a fuçar minha galeria de fotos. Ela acabou se
deparando com um nude que uma garota me mandou. Então, menti e
disse a ela que estava fazendo aulas de Medicina e estudando
anatomia. Ela não questionou o fato de que não faço faculdade de
Medicina. Mas, como resultado da nossa discussão, agora estou
precisando desesperadamente de uma bebida forte, então se estiverem
a fim de me livrar do meu sofrimento, seria ótimo.
— Ai, Senhor. — Balancei a cabeça.
— Bem, poderia ter sido pior. Poderia ter sido o celular de Holden. — Colby
riu.
Suspirei.
— Isso é verdade.
— O que você acha? — ele perguntou. — É melhor irmos salvá-lo, não é?
— Sim. — Sorri. — Acho que devemos ir colocar Saylor na cama juntos.
Quero ler uma historinha para ela.
— Ela vai adorar isso. — Ele sorriu.
— Depois disso, quero levar você para a cama e te enfiar debaixo das
cobertas. — Pisquei para ele.
Ele beijou meu pescoço.
— Eu definitivamente tenho uma coisa para enfiar em você.
Fazia três semanas desde que Maya fora embora, e as coisas estavam
finalmente voltando ao normal.
Mantendo sua palavra, ela deixou papéis de divórcio assinados com seu
advogado e desapareceu sem deixar rastros, assim como fizera quatro anos
antes. Por mais que eu não lhe desejasse mal, também esperava que, dessa vez,
ela ficasse fora da minha vida para sempre.
Billie e eu passamos bastante tempo nos conectando. Estávamos bem firmes
agora, mas eu sabia de uma coisa que ajudaria muito a levarmos as coisas para o
próximo nível. Billie achava que essa coisa estava fora do nosso controle. Mas
ela não fazia ideia do poder do pau de Holden…
Saí do elevador no andar do apartamento do meu amigo e bati à sua porta.
Como sempre, ele demorou um pouco para abrir. Quando o fez, estava
completamente desgrenhado e piscou diante da luz do sol como se fosse um
intruso.
— Que horas são?
Entrei em seu apartamento.
— Nove da manhã. Desculpe te acordar no horário em que pessoas normais
acordam, mas eu não aguentava mais esperar. Você conseguiu?
Holden se arrastou até a mesa da cozinha e pegou um envelope de papel
pardo.
— E eu te deixaria na mão?
Puxei-o para um abraço de urso.
— Puta merda! Não acredito que você conseguiu fazer isso. Você é o
melhor. Esse seu pau é mágico ou algo assim? Você simplesmente o coloca para
fora da calça e as mulheres fazem qualquer coisa que você queira?
Em certa noite da semana anterior, Holden e eu estávamos tomando uma
cerveja. Ele perguntou como estavam as coisas entre mim e Billie. Eu disse que
bem, mas seria melhor se a espera para o juiz assinar os papéis do divórcio
consensual que apresentei não fosse de, no mínimo, três meses. Holden
perguntou em que tribunal eles estavam. Respondi que no Center Street, e ele
disse que costumava pegar uma funcionária que trabalhava lá. Eles não
conversavam há algum tempo, mas ele se ofereceu para entrar em contato para
ver se ela poderia fazer alguma coisa para agilizar o processamento. Concordei,
mas não achei que fosse dar em alguma coisa… até alguns dias atrás, quando
Holden me mandou uma mensagem dizendo que saiu para almoçar com a
mulher, e ela disse que talvez pudesse fazer com que o processo fosse adiantado
e assinado em poucos dias.
Puxei os papéis de dentro do envelope e li a homologação do divórcio.
— Não sei como te agradecer, cara.
Holden abriu um sorriso enorme.
— Não precisa. Tessa me agradeceu no banheiro feminino quando passei no
tribunal para buscar os papéis ontem à tarde.
Balancei a cabeça.
— Só você mesmo para conseguir uma foda e um divórcio finalizado em
uma tacada só, meu amigo.
Ele riu e colocou uma das mãos em meu ombro.
— Fico feliz em servir. Agora, dê o fora do meu apartamento para que eu
possa voltar a dormir e vá contar a boa notícia para a sua garota.
— Darei essa notícia a ela… mas só mais tarde. Então, se você por acaso
encontrá-la em algum momento hoje, não comente sobre isso, ok?
— Pode deixar, amigão.
Minha próxima parada era o estúdio de Billie. Ela não estava trabalhando de
manhã, porque tinha levado Saylor para a aula de mães e filhas, o que funcionou
perfeitamente, já que eu precisava falar com Deek sem que ela estivesse por
perto.
Justine estava ao telefone quando entrei. Ela cobriu o bocal com a mão e
sorriu.
— Ela não está aqui, gatinho.
— Eu sei. Vim falar com o Deek. Mas não conte a ela que passei aqui, por
favor.
O rosto de Justine se animou.
— Você e Deek estão aprontando alguma coisa?
— Sim, e quero que seja surpresa.
— O seu segredo está seguro comigo. — Ela acenou com a cabeça em
direção à sala de tatuagem. — Pode entrar lá. O primeiro cliente dele não
chegou ainda.
Deek estava sentado em sua estação de trabalho quando entrei. Ele ergueu o
queixo.
— E aí, cara?
— Conseguiu trabalhar naquilo que discutimos?
Ele assentiu e abriu sua gaveta, retirando de lá um decalque e uma foto.
— Encontrei essa foto dela que mostra o antebraço, então usei como
referência. Acho que vai combinar direitinho. O que você achou?
Olhei para o decalque e para a foto. Na imagem, Billie estava com as mãos
para cima, exibindo perfeitamente a chave ornamentada tatuada na parte interna
do antebraço. Ela me contara que seu avô tinha dado aquela chave para sua avó
no dia em que se conheceram para simbolizar o que ela significava para ele.
Essa história me deu esperança de que, por baixo das camadas de sua armadura,
Billie era uma mulher que acreditava no amor verdadeiro. Agora, eu ia tatuar
um cadeado vitoriano em formato de coração no mesmo lugar no meu braço.
Parecia apropriado, já que Billie tinha a chave do meu coração.
Sorri.
— Ficou perfeito, cara.
— Mil vezes melhor do que uma rosa estúpida…
Dei risada.
— Fico feliz que tenha aprovado.
— Quando vai pedir que ela faça essa tatuagem em você?
— Hoje à noite. Marquei um horário usando um nome falso.
— A que horas?
— Seis.
— Tenho um cliente marcado para as seis e meia, mas acho que posso adiar
para amanhã para que vocês possam ficar sozinhos.
— Isso seria ótimo.
Ele assentiu.
— Sem problemas.
— Valeu, Deek. — Devolvi o decalque para ele. — Tenho que ir. Pode
guardar na sua gaveta até mais tarde?
— Claro.
— Fico muito grato. — Acenei.
— A propósito — Deek gritou para mim. — Se eu encontrar a marca da sua
bunda na minha cadeira amanhã, teremos um problema.
Sorri e toquei dois dedos na testa em uma saudação.
— Entendido, chefe.
Minha próxima parada era ir encontrar Billie e Saylor depois da aula de
mães e filhas. Saylor tinha um check-up às onze, e prometi aos meus pais que
iríamos almoçar na casa deles. Minha mãe sutilmente me lembrou de que fazia
um tempo desde que me vira. Cheguei à aula alguns minutos mais cedo e
observei Saylor e Billie pela janela. As duas estavam rindo, sacudindo pandeiros
e dançando como se não tivessem nenhuma preocupação no mundo. Isso
preencheu e aqueceu meu coração. Essas mocinhas eram meu mundo inteiro. Eu
sabia que era muito cedo para pedir Billie em casamento, mas, um dia, ela seria
minha esposa. Por mais brega que soasse, eu havia encontrado minha alma
gêmea.
Provando que era minha cara-metade, Billie virou-se e seus olhos me
encontraram imediatamente através da janela. Acenei antes de entrar para
esperar perto da porta até a aula acabar.
— Oi, papai! — Saylor veio saltitando até mim. — Consertou as prateleiras?
Franzi as sobrancelhas.
— Que prateleiras?
— Billie disse que você estava consertando as prateleiras quebradas da
lavanderia.
Olhei para Billie, que curvou-se para falar com Saylor.
— Hã… querida, você pode ir buscar minha bolsa no armário, por favor?
Billie esperou Saylor se afastar.
— Duas mulheres perguntaram onde estava o meu patrão hoje, presumindo
de novo que eu era a babá. Então, eu disse a elas que ele estava em casa se
recuperando porque tinha passado a manhã toda metendo a broca em mim.
Achei que tinha dito baixo o suficiente para Saylor não ouvir. Mas,
aparentemente, ela ouviu uma parte, porque me perguntou no que você estava
metendo uma broca. As prateleiras da lavandeira foi o melhor em que pude
pensar.
Passei um braço em torno da cintura de Billie e a puxei para perto.
— Adoro quando você fica toda possessiva.
— Ah, é? — Ela sorriu. — Que bom, porque lá vem outra integrante do seu
fã-clube idiota. — Billie agarrou minha camisa em punhos e grudou seus lábios
nos meus.
Aham. Adoro quando a minha garota fica possessiva.
Depois que Billie terminou de marcar seu território, nós três seguimos pelo
quarteirão juntos. Paramos na esquina, onde Billie teria que entrar na estação de
metrô para voltar ao estúdio. Dei um beijo rápido em seus lábios.
— Posso te ver mais tarde?
— Claro. Mas acho que sairei um pouco mais tarde hoje. O meu último
cliente hoje é novo, e tenho a impressão de que ele vai ser um pouco difícil.
Difícil foi conter meu sorriso.
— Por que você acha isso?
— Bom, para começar, ele marcou o horário usando somente a inicial de seu
nome do meio. Quem marca um horário em qualquer lugar usando o primeiro
nome, inicial do nome do meio e o sobrenome? Alguém muito preciso e
exigente, isso sim. E, é claro, ele quer tatuar uma rosa. Nem é uma arte original.
Ele disse ao Deek que gostou da rosa que fica na parede de amostras.
Não pude esconder meu sorriso, dessa vez.
— Parece péssimo. Mas quem sabe ele te surpreende e é legal.
— Duvido. Enfim, tenho que ir. Te mando uma mensagem quando terminar
o expediente.