Furio Jesi - Mito e Lingugem
Furio Jesi - Mito e Lingugem
Furio Jesi - Mito e Lingugem
Fragmento I
Mito e linguagem
Nota dos organizadores (Giorgio Agamben e Andrea Cavalletti): Original em duas folhas
manuscritas. O fragmento, como os outros (entre os quais, três de mesmo título) que
recolhemos nesta seção, deve ser relacionado ao âmbito temático de Mito e linguaggio della
collettività, publicado pela primeira vez em Sigma, n. 7, setembro de 1965, e do primeiro
capítulo de Germania segreta, Milão: Silva, 1967. Trata-se de uma retomada dos argumentos
kérenyanos de Dal mito genuino al mito tecnicizzato, ensaio que o próprio autor enviou a Jesi
em 05 de outubro de 1964 (cf. Jesi, F.; Kerényi, K. Demone e mito. Carteggio 1964-1969,
organização de M. Kerényi e A. Cavalletti; Macerata: Quodlibet, 1999).
Fragmento II
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Mito e linguagem
Premissas: possibilidade de encontrar no mito
o fundamento da invariância das leis semânticas
Fragmento III
Imagem, mito e linguagem
1. Cognoscibilidade da imagem.
Se, por outro lado, consideramos a realidade da imagem, podemos observar que
participam dela tanto o conhecimento racional quanto o incognoscível. Além daquilo
que pode ser objeto do conhecimento racional, isto é, o conceito matemático, está
presente na imagem alguma coisa de diferente: alguma coisa que parece em
relação direta com o mecanismo da sensação, e, portanto, estranha ao âmbito do
conhecimento racional. Quando o conhecimento racional se aproxima de uma
imagem, não pode compreendê-la em sua completude, mas tal completude, pelo
contrário, é percebida pela consciência, no âmbito da qual os dados da consciência
racional se unem àqueles da percepção sensorial. Não só isso: na consciência os
elementos racionais e extra-racionais que compõem a imagem são percebidos
unitariamente, organicamente; apenas o conhecimento racional chega a dissociá-
los, intervindo sobre as percepções da consciência. Pode-se, então, supor que na
consciência exista uma espécie de “terra de ninguém” onde as características do
conhecimento racional e do incognoscível vão diluindo-se umas sobre as outras, e
que há nessa “terra de ninguém” um ponto crítico em que o incognoscível não é
mais inteiramente tal a ponto de rejeitar o conhecimento racional, e vice-versa. A
imagem seria, pois, o resultado da síntese operada na consciência entre
conhecimento racional e incognoscível: síntese verificada graças ao diluir-se das
características do conhecimento racional e do incognoscível, os quais no limite
dessa diluição atingiriam um estado diferente de seus dois estados originários e
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autênticos. A imagem, por isso, não seria jamais de todo racionalmente conhecida,
nem de todo incognoscível, mas pertenceria a um “terceiro estado”, que seria
aquele das percepções da consciência.
Fragmento IV
Mito e linguagem
Nota dos organizadores: Duas folhas datilografadas. Sobre o tema da paródia, vejam-se os
dois textos escritos por Jesi entre 1964 e 1965, Parodia e mito nella poesia di Ezra Pound e
L’esperienza religiosa di Apuleio, em F. Jesi, Letteratura e mito; Turim: Einaudi, 1968 e 1981,
pp. 187 e ss; e a carta de Jesi a Kerényi de 29 de outubro de 1964, em Demone e mito.
Carteggio 1964-1969, organização de M. Kerényi e A. Cavalletti; Macerata: Quodlibet, 1999.,
pp. 24 e ss.
É costume dizer que um mito na sua forma originária ou muito antiga se apresenta
sempre como uma verdade: verdade presumida ou efetiva, mas ainda assim
verdade, ao menos nominalmente. Os estudos sobre a mitologia partem geralmente
desse ponto de vista; eles, porém, normalmente não falam de «mito», mas sim de
«imagens míticas», e das imagens míticas mostram o progressivo “decair” e, isto é,
o seu progressivo ser incompreendidas e abandonadas em relação à mudança das
condições de vida e dos institutos econômicos e sociais. Sobre a base daqueles
estudos se poderia dizer, então, que, no curso da história, há para os mitos
instantes de genuínas epifanias, aos quais seguem períodos de esterilização de tais
fluxos míticos, dos quais sobrevivem somente mais escórias variamente alteradas.
Pode-se dizer, sem dúvida, que a forma do mito é tal a ponto de consentir-lhe
aflorar na consciência também quando a consciência se opõe explicitamente a essa
epifania. E isso é demonstrado pelo fato que mesmo em textos de paródia das
imagens míticas se podem retraçar presenças míticas que aparecem com
carregada sugestão.
Fragmento V
Mito e linguagem
Da «atitude grega» deriva a noção da poesia sagrada, que extrai sua sacralidade do
fato de ser objetivação do mito. Da “poética do inexprimível” deriva uma noção
puramente funcional da linguagem, útil apenas para suscitar no homem estados
emotivos que consentem o acesso ao silêncio e ao êxtase: à revelação do real.
Esse fluxo de verdade que brota do homem no instante em que o homem se serve
da linguagem possui um caráter objetivo também quando a vontade subjetiva
intervém em grau máximo no fenômeno lingüístico. De fato, a ação mesma de
significar alguma coisa – no modo ou com as intenções mais disparatadas – implica
exatamente um significado e, então, uma verdade – não importa se efetiva ou
ilusória. Significa que, por “verdade”, nós entendemos aqui também “realidade” e,
portanto, “essência”.
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