2008 Dis Approcha
2008 Dis Approcha
2008 Dis Approcha
PROPRIEDADE INTELECTUAL
E SUAS IMPLICAÇÕES CONSTITUCIONAIS
-
Análise do perfil constitucional da propriedade intelectual e suas inter-
relações com valores constitucionais e direitos fundamentais.
FORTALEZA
2008
AFONSO DE PAULA PINHEIRO ROCHA
PROPRIEDADE INTELECTUAL
E SUAS IMPLICAÇÕES CONSTITUCIONAIS
-
Análise do perfil constitucional da propriedade intelectual e suas inter-
relações com valores constitucionais e direitos fundamentais.
Prof. Orientador:
Dr. João Luis Nogueira Matias
FORTALEZA
2008
AFONSO DE PAULA PINHEIRO ROCHA
PROPRIEDADE INTELECTUAL
E SUAS IMPLICAÇÕES CONSTITUCIONAIS
-
Análise do perfil constitucional da propriedade intelectual e suas inter-
relações com valores constitucionais e direitos fundamentais.
Prof. Orientador:
Dr. João Luis Nogueira Matias
BANCA EXAMINADORA
________________________________________________
Prof. Dr. João Luis Nogueira Matias (Orientador)
Universidade Federal do Ceará – UFC
________________________________________________
Prof. Dr. Marcos Wachowicz
Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC
________________________________________________
Prof. Dr. Emmanuel Teófilo Furtado
Universidade Federal do Ceará – UFC
Às pessoas mais importantes da minha vida:
minha esposa e meus pais.
AGRADECIMENTOS
À minha amada esposa, pelos infinitos cuidados, carinhos e ajudas ao longo do trabalho;
Ao meu orientador, Prof. Dr. João Luis, pelo apoio, confiança e motivação durante todo o
curso, além do zelo pelo meu desenvolvimento acadêmico futuro;
Aos diversos autores e professores citados, muitos dos quais tive a oportunidade de agradecer
pessoalmente a importância que tiveram na elaboração do trabalho e pela inspiração que me
proporcionaram.
If nature has made of any, one thing less susceptible than
all others of exclusive property, it is the action of the
thinking power called an idea, which an individual may
exclusively possess as long as he keeps it to himself; but
the moment it is divulged, it forces itself into the
possession of every one, and the receiver cannot
dispossess himself of it.”
Thomas Jefferson
O trabalho procura oferecer um panorama jurídico das relações que a propriedade intelectual
possui com diversos valores e direitos constitucionais, mediante a pesquisa de doutrinas e
jurisprudências especializadas nacionais e internacionais. Oferece uma noção introdutória da
propriedade intelectual e dos principais elementos de ligação entre as diversas doutrinas que
compõe esse ramo do direito. Apresentam-se os principais tipos de teorias que justificam a
existência da propriedade intelectual, destacando as ideologias subjacentes e as implicações
das mesmas sobre os contornos de proteção legal. Efetua-se a análise econômica dos bens
intelectuais. Traça a evolução histórica mundial da proteção da propriedade intelectual
relativamente às doutrinas da propriedade industrial, copyright e do direito autoral. São
indicados diversos casos que demonstram a tendência de ampliação progressiva dos direitos
de propriedade intelectual tanto em escopo como em duração. O trabalho demonstra a estreita
relação da propriedade intelectual com direitos humanos, especialmente no contexto dos
direitos econômicos, sociais e culturais. Quanto ao direito brasileiro, é apresentada a evolução
do tratamento constitucional dos direitos de propriedade intelectual, bem como a concepção
da função social da propriedade intelectual. Por fim, são identificas diversas questões que têm
como contexto os direitos de propriedade intelectual. Questões como: acesso à saúde,
alimentação, educação, cultura e livre concorrência. O trabalho apresenta como conclusão a
necessidade de repensar constantemente o equilíbrio que deve ser inerente aos direitos de
propriedade intelectual, como uma maneira de efetivar o desenvolvimento cultural e
tecnológico de forma democrática e solidária.
The work looks for to offer a legal overview of the relations that the intellectual property have
with several values and constitutional rights, trough research of specialized doctrines and
jurisprudences, both national and international. It offers an introductory notion of intellectual
property and the elements that link the related doctrines of this field of law. The main types of
theories that justify the existence of intellectual property presented with their underlying
ideologies and practical implications in the definition of the legal protection scope. It does an
economic a analysis of intellectual goods. It provides the historical evolution of intellectual
property protection in the doctrines of industrial property, copyright and author’s rights.
Several cases are show to indicate the progressive expansion of intellectual property rights
both in scope and duration. The work demonstrates the close relation of intellectual property
and human rights, especially in the context of the economic, social and cultural rights.
Regarding Brazilian law, it is shown the evolution of the constitutional treatment of
intellectual property, as well as the idea of a social function for intellectual property. Finally,
several issues that have intellectual property as an underlying theme are presented such as
access to the health, food, education, culture and antitrust. The work presents as conclusion
the necessity to rethink the balance that must be inherent to intellectual property, as a way to
promote an effective cultural and technological development in a democratic and solidary
manner.
INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 11
1 PROPRIEDADE INTELECTUAL..........................................................................16
1.1 Considerações Preliminares .................................................................................. 16
1.2 Bens imateriais/intangíveis e sua natureza jurídica ............................................ 20
1.3 Conceito de um direito exclusivo........................................................................... 25
1.4 Internacionalização do tema.................................................................................. 26
1.4.1 Períodos .................................................................................................... 26
1.4.2 Organização específica no sistema das Nações Unidas ........................29
1.4.3 Multiplicidade de tratados internacionais
sobre Propriedade Intelectual ......................................................................... 30
1.4.5 O Acordo TRIP´s ..................................................................................... 31
1.4.6 Tratados Bilaterais .................................................................................. 34
1.5 Expressividade e relevância econômica................................................................35
1.6 Instrumentalidade ao interesse público................................................................40
1.7 Confirmação da existência de uma teoria geral................................................... 41
2 JUSTIFICATIVAS DA
PROPRIEDADE INTELECTUAL............................................................................. 42
2.1 Considerações Preliminares .................................................................................. 42
2.2 Perspectiva Lockeana............................................................................................. 43
2.3 Propriedade Intelectual e Personalidade.............................................................. 48
2.4 Justificações Econômicas da Propriedade Intelectual ........................................ 51
2.5 Teorias Utilitaristas da Propriedade Intelectual .................................................54
2.6 Análise racional da justificação............................................................................. 57
3 ANÁLISE ECONÔMICA
DA PROPRIEDADE INTELECTUAL ...................................................................... 58
3.1 Considerações Preliminares .................................................................................. 58
3.2 Noções Gerais sobre Análise Econômica do Direito............................................ 59
3.3 Breve Análise Econômica da Propriedade ...........................................................62
3.3.1 O que é propriedade? ............................................................................. 62
3.3.2 Abordagens Econômicas sobre a Propriedade...................................... 68
3.3.3 Demsetz e o Modelo Evolutivo da Propriedade ................................... 71
3.3.4 Outros Modelos Evolutivos da Propriedade ......................................... 74
3.3.5 Tragedy of the Commons..........................................................................79
3.3.6 Tragedy of the Anti-Commons ................................................................. 81
3.4 Características econômicas peculiares dos bens intelectuais.............................. 87
3.4.1 Rivalidade, Exclusividade e Public Goods ............................................. 91
3.4.2 Deadweight Loss, Free Riding e Public Goods ....................................... 93
3.5 Conclusões relevantes da análise econômica........................................................ 97
5 PERFIL CONSTITUCIONAL DA
PROPRIEDADE INTELECTUAL............................................................................. 145
5.1 Breve Histórico da Propriedade Intelectual
no Ordenamento Jurídico Brasileiro ..........................................................................145
5.2 Na Constituição de 1988.........................................................................................149
5.3 Propriedade intelectual e Direitos Humanos .......................................................152
5.3.1 Direitos Humanos, Direitos Fundamentais e Fundamentalidade .......152
5.3.2 Fundamentalidade Formal
dos Direitos de Propriedade Intelectual ......................................................... 156
5.3.3 Fundamentalidade Material
dos Direitos de Propriedade Intelectual ........................................................ 156
5.3.3.1 A Declaração Universal dos Direitos Humanos ..................................... 158
5.3.3.2 A Convenção Internacional dos
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais........................................................... 161
5.3.2 Direitos de Propriedade Intelectual,
direitos humanos e direitos fundamentais......................................................162
5.3.3 Direitos de Propriedade Intelectual e
Direitos Fundamentais de Quarta e Quinta Gerações .................................. 166
5.4 Propriedade intelectual e
Colisões de Princípios Constitucionais ....................................................................... 172
5.4.1 Colisões de Direitos Fundamentais ........................................................ 173
5.4.1.1 Regras ou Princípios? ............................................................................. 173
5.4.1.2 Âmbito de Proteção e Restrições de Direitos ......................................... 175
5.4.1.3 Teoria Interna e Teoria Externa .............................................................. 178
5.4.1.4 Colisões Aparentes ................................................................................ 179
5.4.1.5 Colisões em Sentido Amplo ................................................................... 180
5.4.1.6 Colisões em Sentido Estrito.................................................................... 181
5.4.1.7 Critérios de Solução................................................................................ 182
5.4.1.8 Ponderação.............................................................................................. 184
5.4.1.9 Proporcionalidade ................................................................................... 185
5.4.1.10 Colisões dos direitos de propriedade intelectual
com outros direitos fundamentais ....................................................................... 186
5.4.2 Função Social da Propriedade Intelectual
e seus mecanismos de efetivação...................................................................... 187
5.4.2.1 Função Social no Direito de Propriedade Industrial............................... 187
5.4.2.2 Função Social no Direito Autoral/Copyright..........................................193
5.5 Impactos Constitucionais da Propriedade Intelectual ........................................ 202
5.5.1 Vida, Saúde e Biotecnologia.................................................................... 203
5.5.1.1 Patentes de Medicamentos e Direito Fundamental à Saúde ................... 205
5.5.1.2 Sementes, Transgenia, Soberania e Direito Fundamental
ao Meio Ambiente Equilibrado .......................................................................... 211
5.5.1.3 A importância de um domínio público ambiental
e a função sócio-ambiental da propriedade intelectual....................................... 217
5.5.2 Livre iniciativa e livre concorrência ......................................................222
5.5.2.1 Os Monopólios Constitucionais.............................................................. 224
5.5.2.2 Direitos de Propriedade Intelectual
como Monopólios Constitucionais ..................................................................... 226
5.5.2.3 Ponderação Constitucional entre os Princípios da Livre Iniciativa
e Concorrência e a Proteção das Criações Intelectuais....................................... 228
5.5.3 Software Livre e Princípios Constitucionais..........................................232
5.5.3.1 Considerações iniciais ............................................................................ 232
5.5.3.2 Dimensões de interação com princípios constitucionais ........................ 235
5.5.4 Ensino, Cultura e Propriedade Intelectual............................................ 238
5.5.4.1 Ensino, cópia de livros e propriedade intelectual ................................... 239
5.5.4.2 Patrimônio Cultural,
preservação cultural e propriedade intelectual ................................................... 242
5.5.4.3 Criminalização no âmbito do direito autoral .......................................... 246
5.5.5 O Princípio da Solidariedade Social e
a construção da idéia de um Meio Ambiente Cultural.................................. 249
5.5.5.1 O Princípio da Solidariedade Social
e suas implicações sobre a Propriedade Intelectual ............................................ 249
5.5.5.2 Read-Write Culture v. Read-Only Culture,
a “Brecha” Digital e Propriedade Intelectual......................................................252
5.5.5.3 A lógica capitalista atual da Propriedade Intelectual.............................. 254
5.5.5.4 A utilidade do reconhecimento de um Meio Ambiente Cultural............ 256
CONCLUSÃO............................................................................................................... 261
Foram necessários alguns bilhões de anos até que a vida surgisse na terra. Desse
marco revolucionário, foram necessários ainda alguns milhões de anos para a chegada de
mamíferos e dos primeiros primatas. Adicionem-se mais algumas centenas de milhares de
anos para o surgimento da espécie humana. Daí foi necessário mais aproximadamente uma
dezena de milhares de anos para a formação das sociedades como são conhecidas. Mais
recentemente, a revolução industrial ocorreu em mais alguma centena de anos.
Exatamente por se tratar de uma revolução que está acontecendo de forma rápida
e acelerada, é difícil perceber toda a extensão e repercussões, particularmente quanto às
mudanças culturais, sociais e econômicas.
Na medida em que a tecnologia torna-se cada vez mais inerente às relações sociais
e a vida humana, os direitos de propriedade intelectual relacionam-se cada vez mais com
outras searas jurídicas de grande importância, como direitos humanos, direitos culturais,
sociais e econômicos. O aumento do número de casos decididos por cortes supremas
envolvendo propriedade intelectual é ilustrativo.
literatura específica. Além disso, englobam a maioria das principais tensões entre valores
jurídicos e sociais com as quais a propriedade intelectual se relaciona.
comum e uma tendência contínua de ampliação, sempre voltada para aspectos comerciais e
econômicos. Ao final do capítulo, analisa-se a erosão das delimitações entre as doutrinas e
como a ampliação da tutela jurídica tem favorecido utilizações abusivas e até mesmo
patológicas por parte dos titulares desses direitos.
O termo surgiu pela primeira vez em 1845, em uma sentença dada pelo juiz
Charles Woodbury da Corte de Massachusetts, no caso Davoll et al. v. Brown, que envolvia
um pedido de patente. Em sua opinião, o magistrado destacou a importância da atribuição de
direitos sobre bens imateriais como o meio pelo qual a engenhosidade humana e a
perseverança poderiam ser utilizadas para o proveito da coletividade e que "(...) somente desta
forma podemos proteger a propriedade intelectual, o trabalho da mente, a produção e os
interesses como o fruto de sua indústria honesta, como o trigo que ele cultiva ou o rebanho
que ele cria". 1
Carol Proner ressalta que a idéia de “propriedade intelectual” deve ser entendida
como categoria, respondendo aos estímulos econômicos e políticos de cada período histórico,
envolvendo: direitos autorais, desenhos e processos industriais, marcas, patentes de invenção,
denominações de origem, contratos de transferência de tecnologia, saberes tradicionais -
folclore, costumes populares, artes reproduzidas em pintura e escultura -, enfim, temáticas
diversas e abrangentes. 2
1
MACHADO, Jorge. Desconstruindo “Propriedade Intelectual”. Revista Observatório OBS*. Vol. 2, n. 1.
2008. Disponível em: <http://obs.obercom.pt/index.php/obs/issue/view/10>. Acesso em: 08/08/08.
2
PRONER, Carol. Propriedade Intelectual: Para uma outra ordem jurídica possível. São Paulo: Cortez
Editora, 2007. p. 3.
3
BARBOSA, Denis Borges. Uma Introdução à Propriedade Intelectual. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2003. vol. 1. p. 5.
17
4
BULZICO, Bettina Augusta Amorim. Evolução da Regulamentação Internacional da Propriedade Intelectual e
os Novos Rumos Para Harmonizar a Legislação. Revista Direitos Fundamentais & Democracia. Unibrasil.
Vol 1. 2007. Disponível em: <http://revistaeletronicardfd.unibrasil.com.br>. Acesso em: 25.07.08
5
No texto do Decreto 75.541/75: “(...)Para os fins da presente Convenção, entende-se por: (...) viii “propriedade
intelectual”, os direitos relativos: às obras literárias, artísticas e científicas, às interpretações dos artistas
intérpretes e às execuções dos artistas executantes, aos fonogramas e às emissões de radiofusão; às invenções em
todos os domínios da atividade humana, às descobertas científicas, aos desenhos e modelos industriais, às marcas
industriais, comerciais e de serviço, bem como às firmas comerciais e denominações comerciais, à proteção
contra a concorrência desleal e todos os outros direitos inerentes à atividade intelectual nos domínios industrial,
científico, literário e artístico.
6
Promulgada no Brasil pelo Decreto n.º 75.572/75.
18
Convém, por oportuno, já apontar que as idéias de direito autoral e copyright são
distintas, porém muitas vezes tomadas erroneamente como sinônimos, em virtude de ambas
destinarem-se a tutela de trabalhos expressivos. O copyright origina-se nos países da common
law, com especial destaque para a Inglaterra e para os Estados Unidos. O direito autoral, por
sua vez, desponta nos países de tradição romana, sendo notadamente o direito francês uma
fonte de referência.
7
Promulgada no Brasil pelo Decreto n.º 75.699/75.
8
BASSO, Maristela. A proteção da propriedade intelectual e o direito internacional atual. Revista de
Informação Legislativa. Brasília a. 41. n. 162. p. 287-310. abr./jun. 2004. p. 288.
9
Lei 9.610/98: Art. 7º. São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou
fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro (...).
19
Outros direitos surgiram e se firmaram ao longo dos séculos XIX e XX: direitos de
imagem, desenhos industriais, marcas, obtenções vegetais, topografia de circuitos integrados,
softwares, know-how, biotecnologia, patrimônio cultural, conhecimentos tradicionais. Passou-
se a regular e definir a titularidade de conhecimentos, processos e objetos derivados das
revoluções industrial, tecnológica e informacional.
Luis Otávio Pimentel, por sua vez, apresenta posição similar, indicando “(...) entre
os elementos comuns, ou nucleares, de toda a propriedade intelectual a imaterialidade do seu
objeto (incorpóreo) e o tempo limitado da sua proteção (...)”. 12
10
Lei nº 9279/96: “Art. 2º A proteção dos direitos relativos à propriedade industrial, considerado o seu interesse
social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País, efetua-se mediante: I - concessão de patentes de
invenção e de modelo de utilidade; II - concessão de registro de desenho industrial; III - concessão de registro de
marca; IV - repressão às falsas indicações geográficas; e V - repressão à concorrência desleal”.
11
SHERWOOD, Robert M. Propriedade Intelectual e Desenvolvimento Econômico. São Paulo: EdUsp. 1992.
p. 37.
12
PIMENTEL, Luís Otávio. Propriedade Intelectual e Desenvolvimento. In: Propriedade Intelectual – Estudos
em Homenagem à Professora Maristela Basso. Curitiba: Juruá Editora. 2005. p 41-60. p. 46.
20
A idéia de que existem bens sem extensão física remonta ao direito romano, onde
se cingiam os bens de natureza corpórea e incorpórea, pelo critério da possibilidade ou não de
serem tocados.
13
EBERT, Chamoun. Instituições de Direito Romano. 4. ed. São Paulo: Forense, 1962. p. 213.
14
BARROS RODRIGUES, Maria Lúcia. Do Regime da Propriedade Intelectual e o Empregado Inventor.
Biblioteca Digital da APDI – Associação Portuguesa de Direito Intelectual. Disponível em:
<http://www.apdi.pt/>. Acesso em: 24/04/08.
15
GORDON, Wendy J. Intellectual Property. In: CANE, Peter; TUSHNET, Mark (eds.) The Oxford Handbook
of Legal Studies. Oxford,UK: Oxford University Press, 2003. cap. 28. p. 617-646. p. 618.
21
Assim, uma das notas unificadoras é que o bem imaterial que será tutelado é algo
que se agrega a um determinado substrato físico e que possui uma realidade ontológica
distinta e valor muitas vezes superior ao do componente concreto.
Apesar de tal previsão ser mais claramente aplicável no campo das artes (em
esculturas, pinturas e obras plásticas), ainda assim é forte indicativo de que a ordem jurídica
vislumbra um elemento de propriedade nessa criação do espírito, corroborando a pertinência
do aspecto de propriedade em propriedade intelectual.
A propriedade intelectual volta-se para o estudo das concepções inerentes aos bens
incorpóreos que, de modo geral, podem ser enquadrados nas categorias: artísticas,
técnicas e científicas.
[...]
A propriedade intelectual procura regular as ligações do autor, ou criador com o bem
incorpóreo. Estatui as regras de procedimento para a obtenção do privilégio, bem
como das autoridades que intervêm nessa matéria. 18
16
POSNER, Richard A.; LANDES, William M. The Economic Structure of Intellectual Property Law.
Cambridge: Harvard University Press, 2003. p. 1. Tradução livre: “Por propriedade intelectual queremos dizer
idéias, invenções, descobertas, símbolos, imagens, trabalhos expressivos (verbal, visual, musical, teatral), em
síntese qualquer produto humano que tenha potencial valor (de forma ampla, “informação”) e que tenha
existência separada de um substrato físico, queira ou não este produto tenha sido privatizado, isto é, trazido a um
sistema legal de direitos de propriedade.”
17
EBERT, Chamoun. Instituições de Direito Romano. 4. ed. São Paulo: Forense, 1962. p. 246.
18
DI BLASI, Gabriel. A propriedade industrial: os sistemas de marcas, patentes e desenhos industriais
analisados a partir da Lei n° 9.279, de 14 de maio de 1996. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 29.
22
Para Orlando Gomes, os direitos intelectuais não podem ser confundidos com a
propriedade comum, embora possuam caracteres similares. Nas palavras do autor:
Carlos Alberto Bittar também aponta para um caráter sui generis dos direitos
intelectuais ao tratar do direito autoral:
São direitos de cunho intelectual, que realizam a defesa dos vínculos, tanto pessoais,
quanto patrimoniais, do autor com sua obra, de índole especial, própria, ou sui
generis, a justificar a regência específica que recebem nos ordenamentos jurídicos
do mundo atual. 21
19
LABRUNIE, Jaques. Direito de Patentes. São Paulo: Manole, 2006. p. 8.
20
GOMES, Orlando. Direitos reais. 2. ed. São Paulo: Forense, 1962. p. 318
21
BITTAR, Carlos Alberto. Direito de Autor. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994. p. 11.
23
Essa concepção dual poderia ainda induzir a falaciosa conclusão de que os direitos
morais do autor seriam direitos de personalidade e os direitos patrimoniais seriam – de
alguma forma – direitos reais sobre o bem imaterial. É nesse sentido o posicionamento de
Maria Luiza de Saboia Campos, para quem o “(...) Direito Autoral, tendo-se como um direito
especial, é dotado de duplo caráter: moral e o patrimonial, de natureza híbrida, direito de
personalidade e direito de propriedade, respectivamente”. 24
Duas objeções são possíveis. A primeira, como bem adverte o Pe. Bruno Jorge
Hammes, é de que o direito moral não deve ser confundido com o direito de personalidade
geral do autor, pois, em verdade, se trata de uma proteção que existe para salvaguardar a
continuidade da relação entre a pessoa do autor e a obra, enquanto manifestação do espírito
daquele. 25
22
CERQUEIRA, João Gama. Tratado da propriedade industrial. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1982. vol. 1. p. 94.
23
ABRÃO, Eliane Y. Direitos de Autor e Direitos Conexos. São Paulo: Editora Brasil, 2002. p. 34.
24
SABOIA CAMPOS, Maria Luiza. O Direito de Autor na Obra Fotográfica. Revista de Direito Civil,
Imobiliário, Agrário e Empresarial. São Paulo. Vol. 47, Ano 13. p. 18-28. Jan/Mar. 1989. p. 20.
25
HAMMES, Bruno Jorge. O Direito da Propriedade Intelectual. 2. ed. São Leopoldo: Editora Unisinos,
1998. p. 70.
26
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil - Direito das coisas. 32. ed. São Paulo: Saraiva,
1995. p. 24.
27
ASCARELLI, Tullio. Panorama de direito comercial. São Paulo: Saraiva, 1947. p. 200.
24
28
LEONARDOS, Luiz. Apud. LABRUNIE, Jacques. Direito de Patentes. São Paulo: Manole, 2006. p. 11.
29
CERQUEIRA, João Gama. Tratado da propriedade industrial. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1982. vol. 1. p. 130.
30
GORDON, Wendy J. Intellectual Property. In: CANE, Peter; TUSHNET, Mark (eds.) The Oxford Handbook
of Legal Studies. Oxford,UK: Oxford University Press, 2003. cap. 28. p. 617-646. p. 618.
25
Por exemplo, duas pessoas não podem utilizar o mesmo carro em duas cidades
diferentes ao mesmo tempo. A natureza física do carro implica na exclusividade de sua
utilização. Nesse ponto, destaca-se a importância da idéia de posse, como forma de exercício
dessa exclusividade.
Os bens imateriais, por sua vez, não obedecem a esta dinâmica. Na verdade, a
regra é inversa. Diversas pessoas no mundo inteiro podem escutar a mesma música, ao
mesmo tempo, sem que isso esgote a própria música. A música, idealmente considerada, não
se exaure com a utilização ou aproveitamento de várias pessoas.
Desta natureza peculiar ainda decorrem dois elementos comuns indicados por
Sherwood: o mecanismo para a criação do direito e a duração do direito exclusivo.
Tais particularidades dos bens imateriais vão implicar em toda uma teoria
econômica própria que será abordada no capítulo terceiro.
1.4.1 Períodos
31
BASSO, Maristela. A proteção da propriedade intelectual e o direito internacional atual. Revista de
Informação Legislativa. Brasília a. 41. n. 162. p. 287-310. abr./jun. 2004. p. 290.
27
concepção de direitos intelectuais sobre inventos como privilégios feudais, a fase das idéias
liberais que inspiraram a Revolução Francesa e a Independência Americana e a fase da
internacionalização do sistema de patentes, iniciada com a Convenção da União de Paris
(CUP). 32
32
PIMENTEL, Luiz Otávio. Direito industrial: As funções do direito de patentes. Porto Alegre: Síntse, 1999.
p. 68-69.
33
CARVALHO, Nuno Tomaz Pires. O sistema brasileiro de patentes: o mito e a realidade. Revista de Direito
Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, Ano XXII, n. 52, p. 34-43,
Out/Dez. 1983. p. 37.
34
GELLER, Paul Edward. Copyright history and the future: What's culture got to do with it? Journal of the
Copyright Society of the USA. Vol. 47. p. 209-264. 2000. p. 210 et seq.
28
Na lição do autor, esses três períodos refletem que a propriedade intelectual deixa
de ser um elemento de política interna, para galgar relevância internacional, demandado
acordos entre nações, inicialmente sobre cada doutrina específica, para, posteriormente,
ocorrer uma significava uniformização ao redor do globo em torno de princípios e preceitos
comuns.
The first phase predates the major treaties and corresponds to the growth of
bilateral relations in the field of intellectual property in the nineteenth century. The
second and third phases are marked by the adoption of the major treaties in this
field, in particular the Paris Convention for the Protection of Industrial Property
(hereinafter the .Paris Convention.), the Berne Convention for the Protection of
Literary and Artistic Works (hereinafter the .Berne Convention.) and Annex 1C of
the 1994 Agreement on Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights
(hereinafter the .TRIPS Agreement.). The main difference between phases two and
three is the increasing importance of trade rules as the background to intellectual
property negotiations. The current, fourth phase is perhaps the most challenging
ever. (…)
35
DRAHOS, Peter. The Universality of Intellectual Property Rights: Origins and Development. WIPO
Papers. Disponível em: <http://www.wipo.int/>. Acesso em:08/08/08. Tradução livre: “A proteção da
propriedade intelectual em nível internacional pode ser dividida basicamente em três períodos. O primeiro
período, o período territorial, é essencialmente caracterizado por uma ausência de proteção internacional. O
segundo, o período internacional, começa na Europa ao final do século XIX com alguns países aderindo à
formação da Convenção de Paris para a Proteção da Propriedade Industrial, 1883 (a Convenção de Paris) e um
grupo similar de países aderindo à Convenção de Berna para a Proteção de Trabalhos Literários e Artísticos,
1886 (a Convenção de Berna). O terceiro período, o período global, tem suas origens na relação que os Estados
Unidos criaram entre o comércio e a propriedade intelectual nos idos de 1980, uma relação da qual emergiu em
nível multilateral na forma do acordo sobre os aspectos relacionados ao comércio da propriedade intelectual em
1994 (o Acordo TRIPs). As datas das várias convenções não representam uma divisão de épocas definitiva. Elas
marcam uma mudança significativa na direção da evolução da proteção da propriedade intelectual.”
29
36
GERVAIS, Daniel J. The Internationalization of Intellectual Property: New Challenges from the Very Old and
the Very New. Fordham Intellectual Property Media & Entertainment Law Journal. Vol. 12. Book 4. p.
929-990. 2002. p. 930-931. Tradução livre: “A primeira fase predata os maiores tratados e corresponde ao
aumento das relações bilaterais no campo da propriedade intelectual no século XIX a segunda e terceira fases são
marcadas pela adoção de grandes tratados nessa seara, em particular a Convenção de Paris, a Convenção de
Berna e o Acordo TRIPs. A grande diferença entre as fases dois e três é a crescente importância das regras
comerciais como pano de fundo das negociações envolvendo propriedade intelectual. A atual quarta fase é talvez
a mais desafiadora. As comunidades que lidam com propriedade intelectual estão a lidar com vários e
importantes desafios. Dentre os principais estão a proteção de databases; a relação entre autores e
editores/produtores; o regime legal das medidas técnicas de proteção; exaustão internacional de direitos;
proteção de patentes de biotecnologia e a interface entre propriedade intelectual e a tutela da concorrência.”
30
Em 1960, a entidade deslocou-se para Genebra de modo a ficar mais perto das
Nações Unidas. A nomenclatura atual somente surgiu com a Convenção da Organização
Mundial da Propriedade Intelectual – OMPI (Estocolmo, 14 de Julho de 1967). Quase uma
década depois, em 1974, a entidade tornou-se uma agência especializada dentro dos quadros
das Nações Unidas competente para matérias relativas à propriedade intelectual.
Além da OMPI e dos tratados por ela administrados, cumpre salientar a existência
de uma miríade de outros sistemas globais de proteção para temas específicos da propriedade
intelectual, por exemplo: Tratado de Budapeste sobre o depósito de micro-organismos para
fins de patente (Budapeste, 1977); Acordo de Madri sobre o registro internacional de marcas
(Madrid, 1981); Acordo de Lisboa sobre a proteção das indicações de origem e seu registro
internacional (Lisboa, 1958); Acordo de Haia sobre depósito internacional de designs
industriais (Haia, 1934).
37
Disponível em: <http://www.wipo.int>.
31
Feitas essas considerações iniciais, fica claro que, num cenário de descentralização
global dos pólos industriais, é de grande interesse para os países mais desenvolvidos a
existência de um sistema internacional efetivo de proteção à propriedade intelectual. Para as
nações, a existência ou não de um sistema de proteção interno à propriedade intelectual pode
ser determinante para a obtenção de investimentos estrangeiros.
38
Promulgado no Brasil pelo Decreto nº 1.355/94.
32
General Agreement on Tariffs and Trade (Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio), na
Rodada Uruguaia. O TRIP´s integrou o single undertaking da OMC, ou seja, incluía-se no
conjunto obrigatório de acordos a serem aceitos, sem a possibilidade de reservas, sob pena do não
ingresso na OMC. 39
O TRIP´s foi menos um acordo e mais uma imposição de padrões elevados de
proteção à propriedade intelectual realizada pelo grupo de países desenvolvidos aos países em
desenvolvimento. Uma dicotomia entre os interesses do “norte” em face do “sul” ficou clara
durante as negociações.
Peter Drahos esclarece que além de ser um líder dos países em desenvolvimento
nas negociações multilaterais, havia outras razões para dissolver a oposição brasileira aos
39
VARELLA, Marcelo Dias; MARINHO, Maria Edelvacy. A Propriedade Intelectual na OMC. Revista do
Programa de Mestrado em Direito do UniCEUB. Brasília, v. 2, n. 2, p.136-153, jul./dez. 2005. p. 136.
40
DRAHOS, Peter. Negotiating Intellectual Property Rights. In: Global Intellectual Property Rights:
Knowledge, Access and Development. DRAHOS, Peter; MAYNE, Ruth (ed.). New York: Palgrave Macmillan,
2006. p. 161-182. p. 170.
41
A seção 301 do Trade Act of 1974 permite ao governo americano retirar benefícios ou impor ônus sobre
produtos oriundos de outros países.
42
DRAHOS, Peter. Negotiating Intellectual Property Rights. Op. cit. p. 169.
33
objetivos americanos: “There was a second vital reason to discipline Brazil. It was a regional
leader in South America. For the US pharmaceutical and information technology sectors
there could only be one voice on intellectual property policy in the Americas”. 43
Através dessa pressão econômica sobre produtos brasileiros, bem como através de
ofertas de acesso ao mercado de produtos agrícolas para outros países em desenvolvimento,
foi-se armando uma rede de acordos bilaterais que redundaram na aceitação posterior do
TRIP´s como parte constitutiva da OMC.
O ponto central a ser observado é que o Acordo TRIP´s não surgiu de um consenso
entre países soberanos negociando em paridade de condições. De fato, para Peter Drahos, o
acordo falha no teste dos três requisitos necessários para que pudesse ser caracterizado como
uma negociação democrática e livre: a) a participação integral de todos os países em
desenvolvimento; b) informação integral dos assuntos e temas negociados; e c) a ausência de
coerção. 44
43
DRAHOS, Peter. Negotiating Intellectual Property Rights. In: Global Intellectual Property Rights:
Knowledge, Access and Development. DRAHOS, Peter; MAYNE, Ruth (ed.). New York: Palgrave Macmillan,
2006. p. 161-182. p. 171. Tradução livre: “Existia uma segunda razão vital para disciplinar o Brasil. Ele era um
líder regional na América do Sul para as indústrias farmacêutica e da tecnologia da informação americana
somente poderia haver uma única voz sobre a política de propriedade intelectual nas Américas.”
44
DRAHOS, Peter. Negotiating Intellectual Property Rights. Op. cit. p. 168-169.
45
Art. 1º, inciso I; e Art. 4º, inciso I e III, da Constituição Federal de 1988.
34
46
KNOWLTON, Brian. U.S. Plays It Tough on Copyright Rules. International Herald Tribune. Disponível
em: <http://www.iht.com/articles/2005/10/03/business/iprtrade.php>. Acesso em: 01/08/07.
47
BASSO, Maristela. Propriedade Intelectual na era Pós-OMC. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p.
48.
48
BASSO, Maristela. Op. cit. p. 48.
35
Estes são apenas alguns exemplos que bem demonstram que os direitos de
propriedade intelectual perpassam pontos importantes nas políticas internas e externas das
nações, corroborando o entendimento de que a propriedade intelectual como universal e
essencial para as agendas sociais, culturais e econômicas dos estados. Essa importância é
desfrutada pelas diversas doutrinas, inserindo-se, portanto, na teoria geral da propriedade
intelectual.
49
HELFER, Laurence. Toward a human rights framework for Intellectual Property. University of California –
UCDavis Law Review. Vol. 40. Issue 3. 2006. p. 971-1020. p. 973.
50
Promulgada no Brasil pelo Decreto nº 2.519/98.
51
SUNDER, Madhavi. Foreword. University of California – UCDavis Law Review. Vol. 40. Issue 3. 2006. p.
563-580. p. 7.
36
No mundo atual, é inegável que a tecnologia consubstanciou-se cada vez mais num
pilar da economia global. Alguns estudiosos chegam a caracterizar a tecnologia como um dos
fatores de produção ao lado do capital, trabalho e recursos naturais. Daniela Zaits assim
pondera sobre esse destaque:
52
PIMENTEL, Luiz Otávio. Direito industrial: As funções do direito de patentes. Porto Alegre: Síntese,
1999. p. 27-28.
53
ZAITS, Daniela. Direito & Know-How. Uso, Transmissão e Proteção dos Conhecimentos Técnicos ou
Comerciais de Valor econômico. Curitiba: Juruá Editora, 2005. p. 23.
54
LIMA ASSAFIM, João Marcelo. A transferência de tecnologia no Brasil. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2005. p. 13.
37
55
Lei 9.279/96: “Art. 5º Consideram-se bens móveis, para os efeitos legais, os direitos de propriedade
industrial.” Lei 9.610/98: “Art. 3º Os direitos autorais reputam-se, para os efeitos legais, bens móveis.”
56
FISHER, William W. The Growth of Intellectual Property: A History of the Ownership of Ideas.
Berkman Center for Internet and Society. Harvard University. Disponível em:
<http:cyber.law.harvard.edu/property99/history.html>. Acesso em: 08/08/08.
57
ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito intelectual, exclusivo e liberdade. Revista da ESMAFE – Escola de
Magistratura Federal da 5ª Região. Pernambuco, nº 3. 2002. p. 125-145. p. 126.
58
Decreto Presidencial nº 1.355/94.
59
PAULRE, Bernard E. Is the New Economy a Useful Concept? Paris 1 CNRS ISYS Working Paper No.
2000-5. Setembro/2000. Disponível em: <http://econpapers.repec.org/paper/halwpaper/halshs-
00226422_5Fv1.htm.> Acesso em: 08/08/08.
38
A idéia de capital intelectual pode ser abordada sob três aspectos: capital humano,
capital estrutural e capital de clientes assim definidos:
60
GASTALDI, J. Petrelli. Elementos de economia política. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 105.
61
EDVINSSON, Leif; MALONE, Michael S. Capital Intelectual: descobrindo o valor real de sua empresa
pela identificação de seus valores internos. São Paulo: Makron Books, 1998. p. 93.
62
EDVINSSON, Leif; MALONE, Michael S. Op cit. p. 31.
63
ASCENÇÃO, José de Oliveira. Prefácio. In: CRIBARI, Isabela (org.). Produção Cultural e Propriedade
Intelectual. Recife: Fundação Joaquim Nabuco – Editora Massangana, 2006. p. 14-17. p. 15.
39
Nesse sentido, (...) para as empresas, a posse do capital físico está se tornando
marginal ao processo econômico e até desnecessário e incômodo. Em contraposição, agora a
fonte da riqueza é o capital intelectual: conhecimentos estratégicos, marcas, patentes,
conceitos, enfim, propriedade intelectual. 64
“Today, land and gold have given way to knowledge as the wealth of nations.
Property in factories, minerals, real estate and gold is being rapidly replaced by
property in products of the mind or ‘intellectual property’. Patents which refer to
knowledge as ‘property’ remain an instrument of colonization. While colonial wars
of the past were fought over geographical territory, colonization today is based on
war over intellectual territory.” 66
64
ROVER, Aires J. O Direito Intelectual e seus Paradoxos. In: ADOLFO, Luis Gonzaga; WACHOWICZ,
Marcos (Orgs.). Direito da Propriedade Intelectual – Estudos em Homenagem ao Pe. Bruno Jorge
Hammes. Curitiba: Juruá, 2006. p. 33-38. p. 36.
65
WACHOWICZ, Marcos. Propriedade Intelectual do Software & Revolução da Tecnologia da
Informação. Curitiba: Juruá Editora, 2004. p. 96.
66
SHIVA, Vandana. Protect or Plunder? Understanding Intellectual Property Rights. London: Zed Books,
2001. p. 18. Tradução livre: “Hoje, terras e ouro deram lugar ao conhecimento como a riqueza das nações.
Propriedade em indústrias minerais, terrenos e ouro, está sendo rapidamente substituída por produtos da mente
ou propriedade intelectual. Patentes que referenciam o conhecimento como propriedade permanecem como um
instrumento de colonização. Enquanto as guerras coloniais do passado foram batalhas sobre territórios
geográficos, a colonização atual é baseada numa guerra sobre os territórios intelectuais.”
40
67
SHERWOOD, Robert M. Propriedade Intelectual e Desenvolvimento Econômico. São Paulo: EdUsp. 1992.
p. 46.
41
Essa estreita relação com o interesse público é sugestiva de que é possível fazer
uma inversão na lógica tradicional associada aos ao tema. É possível que o sistema exista não
para garantir os direitos individuais perante a coletividade, mas para garantir o interesse
coletivo através da atribuição desses direitos.
Trata-se de uma reconstrução que pode ser aplicada de forma geral para as
doutrinas de propriedade intelectual e, na opinião deste trabalho, parece ser mais adequada à
moldura axiológica da Constituição Federal de 1988 e aos objetivos dos tratados
internacionais.
Os pontos aqui identificados são comuns e recorrentes nas diversas doutrinas que
formam a propriedade intelectual. Desta forma, é possível falar em um fundamento, uma
teoria geral e um instrumental teórico único para a análise jurídica desses ramos sob a
perspectiva de uma teoria geral.
Essa postura não é mais adequada, pois suscita uma análise puramente descritiva
de quais são e como operam os direitos de propriedade intelectual, ao contrário da necessária
perspectiva normativa com a qual devem ser abordados.
Toda teoria que pretende explicar a propriedade deve fazer necessária referência à
clássica e ainda influente teoria liberal de John Locke, retratada no famoso “Segundo Tratado
sobre o Governo”.
Embora a terra e todos os seus frutos sejam propriedade comum a todos os homens,
cada homem tem uma propriedade particular em sua própria pessoa; a esta ninguém
tem qualquer direito senão ele mesmo. O trabalho de seus braços e a obra das suas
mãos, pode-se afirmar, são propriamente dele. Seja o que for que ele retire da
natureza no estado em que lho forneceu e no qual o deixou, mistura-se e superpõe-se
ao próprio trabalho, acrescentando-lhe algo que pertence ao homem e, por isso
mesmo, tornando-o propriedade dele. Retirando-o do estado comum que a
natureza o colocou, agregou-lhe com seu trabalho um valor que o exclui do
direito comum de outros homens. Uma vez que esse trabalho é propriedade
exclusiva do trabalhador, nenhum outro homem tem direito ao que foi agregado,
pelo menos quando houver bastante e tão bom em comum para os demais. 69
(grifado e negritado)
68
DAMSTEDT, Benjamin G. Limiting Locke: A Natural Law Justification for the Fair Use Doctrine. Yale Law
Review. Issue 5. Vol. 112. p. 1179-1221. 2003. p. 1191.
69
LOCKE, John. Segundo Tratado sobre o Governo. Trad. Alex Marins. São Paulo: Martin Claret, 2002. p.
38.
44
trabalho. Ninguém pode adquirir além da sua capacidade de consumo gerando um desperdício
dos recursos da humanidade.
Tais limitações podem ser vistas até mesmo como uma forma de pensar a função
social da propriedade.
A teoria é bastante interessante para justificar que bens imateriais devem ser
regulados através da atribuição de direitos de propriedade. De fato, se o elemento de gênese
da propriedade é a realização de trabalho sobre o bem, os bens imateriais desenvolvidos
através de esforço humano são tão apropriáveis quanto os frutos de uma plantação.
70
PALMER, Tom G. Are Patents and Copyrights Morally Justified? The Philosophy of Property Rights and
Ideal Objects. Harvard Journal of Law & Public Policy. Vol. 13. Issue 3. p. 817-865. 1990. p. 822.
71
Numa nota particular, a Constituição Federal Brasileira de 1988 expressamente proclama a igualdade do
trabalho manual, técnico ou intelectual e dos profissionais respectivos, no art. 7º, inciso “XXXII”.
45
72
Lei 9.279/96: Art. 88. A invenção e o modelo de utilidade pertencem exclusivamente ao empregador quando
decorrerem de contrato de trabalho cuja execução ocorra no Brasil e que tenha por objeto a pesquisa ou a
atividade inventiva, ou resulte esta da natureza dos serviços para os quais foi o empregado contratado. § 1º Salvo
expressa disposição contratual em contrário, a retribuição pelo trabalho a que se refere este artigo limita-se ao
salário ajustado. § 2º Salvo prova em contrário, consideram-se desenvolvidos na vigência do contrato a invenção
ou o modelo de utilidade, cuja patente seja requerida pelo empregado até 1 (um) ano após a extinção do vínculo
empregatício. Lei 9.610/98: Art. 4º Salvo estipulação em contrário, pertencerão exclusivamente ao empregador,
contratante de serviços ou órgão público, os direitos relativos ao programa de computador, desenvolvido e
elaborado durante a vigência de contrato ou de vínculo estatutário, expressamente destinado à pesquisa e
desenvolvimento, ou em que a atividade do empregado, contratado de serviço ou servidor seja prevista, ou ainda,
que decorra da própria natureza dos encargos concernentes a esses vínculos.
73
No original: A Work Made For Hire - In the case of a work made for hire, the employer or other person for
whom the work was prepared is considered the author for purposes of this title, and, unless the parties have
expressly agreed otherwise in a written instrument signed by them, owns all of the rights comprised in the
copyright. (17 U.S.C. Sec 101. § 201, b).
46
José de Oliveira Ascensão, tratando da situação atual dos direitos de autor, faz
severa crítica contra a concentração da proteção jurídica, não no autor, mas nas empresas de
mídia:
Empola-se efetivamente a proteção, mas não já para proteger o autor. O que surge
em primeiro plano é a proteção da empresa – no caso, todo o sector das chamadas
indústrias de copyright.
A proteção reclamada para o autor vai na realidade beneficiar estas empresas,
para quem os direitos afinal revertem.
Com isto o discurso legitimador vigente deixa de proceder.
O fundamento da proteção acrescida não esta na propriedade, porque esta se fundava
em direito natural originado pela criação e a criação afinal apaga-se. O
autor/criador não é o fito da proteção. Será quando muito o pretexto: aquele de
quem se fala, mas não aquele que fala ou para quem se fala. 74
(grifado e negritado)
All along, the author was deployed as a straw man in the debate. The unrewarded
authorial genius was used as a rethorical distraction that appealed to American
romantic individualism. As copyright historian Lyman Ray Patterson has
articulated, copyright has in the twentieth century really been about the rights of
publishers first, authors second, and the public a distant third. If we continue to
skewer this “straw man” of authorship with our dull scholarly bayonets, we will
miss the important issues: ownership, control, access, and use. 75
(grifado e negritado)
74
ASCENÇÃO, José de Oliveira. apud. BARBOSA, Denis Borges. Usucapião de Patentes e Outros estudos
de Propriedade Intelectual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 89.
75
VAIDHYANATHAN, Siva. Copyrights and Copywrongs. The Rise of Intellectual Property and How It
Threatens Creativity. New York: New York University Press, 2003. p. 11. Tradução livre: “Desde sempre, a
figura do autor foi usada como um coringa no debate. O gênio autoral não recompensado era usado como uma
distração retórica que apelava ao individualismo romântico norte-americano. Como um historiador Lyman Ray
Patterson articulou o copyright no século XIX relaciona-se na verdade com os direitos dos editores primeiro,
autores em segundo, e o público num distante terceiro lugar. Se continuarmos utilizando o coringa do autor
iremos perder noção das questões principais: titularidade, controle, acesso, e uso”.
47
atribuir propriedade sobre o bem antes não possuído, ao invés de ser uma simples maneira de
“perder” o trabalho realizado?
Robert Nozick apresenta como ilustração a situação de alguém que é dono de uma
garrafa com suco de tomate e a derrama no oceano. Neste caso, ao misturar as moléculas do
suco com a água, o indivíduo adquiriu o oceano ou simplesmente perdeu o suco? 76
Outra crítica possível é que a teoria tem como pressuposto que a propriedade é o
retorno pelo investimento que se faz em forma de labor. Tal premissa pode até mesmo ser
compatível com a apropriação de bens materiais, porém é particularmente problemática
quando aplicada a bens intelectuais.
Tal justificativa, porém, não estará mais centrada numa idéia de que o trabalho
misturou-se com uma criação, mas sim, num apelo moral de justa compensação para aquele
que empreendeu esforços com a criação de um determinado bem.
76
NOZICK, Robert. Anarchy, state and utopia. New York: Basic Books, 1974. p. 174.
77
HIMMA, Kenneth. The Justification of Intellectual Property: Contemporary Philosophical Disputes.
Berkeley Center for Law and Technology. Paper 21. 2006. Disponível em: <http://repositories.cdlib.org-
/bclt/lts/21>. Acesso em: 06/06/2008. p. 19.
48
Perseguindo esta idéia moral, não fica distante a associação da criação à própria
personalidade do criador. Observe-se, ainda, que os bens imateriais são usualmente
referenciados como criações do espírito humano, ou seja, em relação direta com a
personalidade.
São diversas as teorias que tentam atribuir como justificação aos direitos de
propriedade a idéia de personalidade. Autores germânicos fazem uma identificação entre os
dois aspectos.
78
PALMER, Tom G. Are Patents and Copyrights Morally Justified? The Philosophy of Property Rights and
Ideal Objects. Harvard Journal of Law & Public Policy. Vol. 13. Issue 3. p. 817-865. 1990. p. 827.
49
79
PALMER, Tom G. Are Patents and Copyrights Morally Justified? The Philosophy of Property Rights and
Ideal Objects. Harvard Journal of Law & Public Policy. Vol. 13. Issue 3. p. 817-865. 1990. p. 837.
80
BELL, Abraham; PARCHOMOVSKY, Gideon. What Property Is. University of Pennsylvania Law School
ILE – Institute for Law and Economics. Research Paper nº 04-05. 2004. Disponível em:
<http://works.bepress.com/abraham_bell/5>. Acesso em: 08/08/08.
50
Tal preocupação com o âmbito moral dos autores figura até mesmo na doutrina
americana quando, em 1990, o Congresso Americano introduziu legislação que veio alterar o
Copyright Act para incluir novos dispositivos 81 que atribuem direitos morais aos autores de
trabalhos de arte visual.
Posner e Landes afirmam que antes da entrada dos Estados Unidos na União de
Berna em 1989, já existiam legislações estaduais salvaguardando formas de direitos morais,
começando com a Califórnia em 1979. Além disso, ocasionalmente, o próprio Copyright Act,
através de hermenêutica jurídica, era interpretado judicialmente para conferir proteção
análoga a direitos morais. 82
Outra crítica possível no tocante às obras de arte, é que o valor do trabalho não
está no meio físico pelo qual ele se expressa. O valor encontra-se na experiência íntima de
cada apreciador, sendo o bem imaterial ontologicamente diferente para cada indivíduo.
Além disso, a idéia de uma relação estreita entre a criação e a obra gera
contradições entre um dos cânones básicos, tanto do direito autoral como do copyright, que é
o controle da realização de cópias. Numa ilustração ofertada pelo próprio Hegel: “artistic
reproductions are so peculiarly the property of the individual artist that a copy of a work of
art is essentially a product of the copyist´s own mental and technical ability”. 83
81
Copyright Act (17 U.S.C. § 106-A).
82
POSNER, Richard A.; LANDES, William M. The Economic Structure of Intellectual Property Law.
Cambridge: Harvard University Press, 2003. p. 270.
83
PALMER, Tom G. Are Patents and Copyrights Morally Justified? The Philosophy of Property Rights and
Ideal Objects. Harvard Journal of Law & Public Policy. Vol. 13. Issue 3. p. 817-865. 1990. p. 841. Tradução
livre: “Reproduções artísticas são tão propriedade do artista individual que a cópia de uma obra de arte é
essencialmente um produto da habilidade técnica e mental do copista”.
51
ainda mais uma idéia romântica do autor, enquanto indivíduo inspirado que através de grande
sofrimento e empenho pessoal é o único responsável pela gênese da obra de arte.
Tais teorias não foram talhadas para apreender as diversas formas de criação
colaborativa e coletiva que os novos meios de comunicação e redes digitais criaram e não
explicam o processo de criação cultural e intelectual como um esforço cumulativo e
colaborativo das sociedades humanas.
Sherwood relata que, embora a proteção dos ativos intelectuais tenha se iniciado
como algo intuitivo, surgiram teorias sobre a razão pela qual se dá esta proteção e estas têm
orientado e justificado as políticas legislativas sobre o tema. Para o autor, estas se dividem
em: “recompensa”; “recuperação”, “incentivo” e “risco”:
A teoria da recompensa, diz, na verdade, que o criador ou inventor daquilo que deve
ser protegido deveria ser recompensado por seu esforço.
[...]
A teoria da recuperação diz, talvez sem meditar muito, que o inventor ou criador,
por ter despendido esforço, tempo e dinheiro, deveria ter a oportunidade de
recuperar algo do que gastou.
[...]
A teoria do incentivo diz que é bom atrair esforço e recursos para o trabalho e
desenvolvimento da criatividade, descobrimento e inventividade.
[...]
(...) teoria do risco (...) reconhece que a propriedade intelectual é o resultado de um
trabalho desbravador, e que este trabalho possui um risco inerente. 85
Tais formas de recompensa e/ou incentivo viriam por meio de uma exclusividade
temporária sobre a idéia ou invenção, reconhecida pelo Estado. Assim, as maneiras mais
simples, baratas e efetivas para que a sociedade garantisse tais estímulos seria permitir
monopólios temporários na forma de direitos exclusivos: patentes de invenções na seara
industrial e direitos autorais/copyright na seara cultural. 87
85
SHERWOOD, Robert. Propriedade Intelectual e Desenvolvimento Econômico. São Paulo: EdUsp. 1992. p.
46-47.
86
POPP, Shane M. The Third Door Is off the Hinges: A Prospective Study on the Effects of the create Act
Against Federal Patent Policies. John Marshall Review of Intellectual Property Law. p. 597-607. Spring
2005. p. 604.
87
POPP, Shane M. Op. cit. p. 604.
53
88
ROVER, Aires J. O Direito Intelectual e seus Paradoxos. In: ADOLFO, Luis Gonzaga; WACHOWICZ,
Marcos (Orgs.). Direito da Propriedade Intelectual – Estudos em Homenagem ao Pe. Bruno Jorge
Hammes. Curitiba: Juruá, 2006. p. 33-38. p. 34.
89
ZAITS, Daniela. Direito & Know-How. Uso, Transmissão e Proteção dos Conhecimentos Técnicos ou
Comerciais de Valor econômico. Curitiba: Juruá Editora, 2005. p. 87.
54
90
PALMER, Tom G. Are Patents and Copyrights Morally Justified? The Philosophy of Property Rights and
Ideal Objects. Harvard Journal of Law & Public Policy. Vol. 13. Issue 3. p. 817-865. 1990. p. 849.
91
MOORE, Adam D. Intellectual Property, Innovation, and Social Progress: The Case Against Incentive Based
Arguments. Hamline Law Review. Vol. 26. Issue 3. p. 602-630. 2003. p. 607.
55
Nessa perspectiva, a criação e a outorga de tais direitos aos criadores não se dão
como forma de recompensa ou em razão do trabalho realizado, nem por serem as criações
intelectuais extensões da personalidade, mas, sim, por ser a forma eficiente de garantir os
incentivos necessários para a produção intelectual.
Algumas das mais comuns vão tratar dos seguintes pontos: na busca de promover
o máximo para o maior número de pessoas, aquelas não contempladas pela atuação pública
tendem a ser tratadas de forma injusta; os modelos utilitaristas normalmente são por demais
vinculados a uma visão economicista, ou seja, tratam as criações intelectuais como meras
mercadorias a serem produzidas e consumidas; a redução da análise a incentivos relega a
questão da legitimidade de direitos com fundamento moral em relação aos autores e
inventores em segundo plano. 92
Existem, por outro lado, teorias de justificação ex post, que objetivam justificar a
existência de um sistema de propriedade intelectual não como incentivos para criação de bens
92
TAVANI, Herman T. Recent Copyright Protection Schemes: Implications for Sharing Digital Information. In:
SPINELLO, Richard A.; TAVANI, Herman T. (orgs.). Intellectual Property Rights in a Networked World:
Theory and Practice. London: Information Science Publishing, 2005. p. 182-204. p. 191.
56
intelectuais, mas em razão dos efeitos sobre a gestão posterior do bem intelectual pelo titular
dos direitos. 93
Assim, as teorias utilitaristas podem ser utilizadas tanto para justificar como para
criticar a existência de direitos imateriais, a depender dos custos sociais envolvidos.
93
LEMLEY, Mark A. Ex Ante Versus Ex Post Justifications for Intellectual Property. University of
California – Berkeley. Public Law and Legal Theory Research Paper Series. Paper No. 144. Disponível em:
<http://www.ssrn.com>. Acesso em: 08/08/08.
94
PERELMAN, Michael. Steal this Idea – Intellectual Property Rights and the Corporate Confiscation of
Creativity. New York: Palgrave Macmillan, 2004. p. 13.
57
proteção legal, de modo a atender os interesses sociais, e que se operem alterações com uma
menor resistência.
Ainda seria possível dizer que o art. 5º, inc. XXIX, não indica expressamente
como propriedade os direitos relativos a inventos industriais. Fala apenas que a lei assegurará
privilégio temporário para utilização. Por outro lado, quando trata das marcas, nomes de
empresa e signos distintivos, indica que para estes a lei garantirá a propriedade.
95
BARBOSA, Denis Borges. Usucapião de Patentes e Outros estudos de Propriedade Intelectual. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 86 et seq. Citando palestra proferida por José de Oliveira Ascensão.
96
Lei 9.279/96: “Art. 6º Ao autor de invenção ou modelo de utilidade será assegurado o direito de obter a
patente que lhe garanta a propriedade, nas condições estabelecidas nesta Lei”.
59
Por fim, far-se-á uma análise crítica do sistema atual e das distorções que
prejudicam o atendimento da máxima eficácia e eficiência social desses corpos normativos.
97
STAUT JR., Sérgio Said. Cuidados metodológicos no estudo da história do direito de propriedade. Revista
da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná. Curitiba: Ed. Universitária. N. 42, p.155-170,
2005. p. 157.
98
ROWLEY, Charles K. Public Choice and the Economic Analysis of Law. In: MERCURO, Nicholas (ed.).
Law and Economics. Boston: Kluwer Academic Publishers, 1989. p. 123-173. p. 125.
60
Desde seu início, até a relevância atual, os movimentos de Law & Economics e
Análise Econômica do Direito operaram como que uma nova “Revolução Copernicana” na
relação entre o Direito e a Economia. A Economia, que antes era vista como se orbitasse ao
redor do Direito, não possuindo implicações imediatas sobre a ciência jurídica, passa agora a
ser o cernedo próprio Direito é mais bem percebido dentro de uma perspectiva econômica.
99
SZTAJN, Rachel. Law and Economics. In: ZYLBERSZTAJN, Decio; SZTAJN, Rachel (orgs.) Direito &
Economia – Análise Econômica do Direito e das Organizações. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005. p. 74-83. p.
75.
61
The two major normative paradigms to analyze intellectual property are the natural
law paradigm (which is dominant in the Continental European legal world) and the
positivist one (which is dominant in the Anglo-American legal tradition). The
natural law paradigm is outside the reach of law and economics, as it is
deontological rather than teleological; it judges whether a law, decision or action,
is right or wrong on the basis of its intrinsic moral value without regard to its
consequences. Thus, a Lockean type of natural law justification to property rights,
including intellectual property rights, is outside the scope of law and economics, as
is the Kant-Hegel self-fulfilling or self-flourishing justification for the protection of
intellectual property. 100
Fabio Ulhoa, por sua vez, aponta que a análise econômica é uma ferramenta
auxiliar da interpretação jurídica teleológica e “(...) pode ser considerada – ao lado da teoria
pura do direito, a lógica deôntica, o marxismo e o realismo – também uma tentativa de
cientificamente conhecer os padrões de comportamento socialmente produzidos”. 101
Nem mesmo uma definição legislativa direta é possível, pois o atual Código Civil,
no art. 1228, assim como fazia o Código de 1916, não define o direito, mas as faculdades que
o titular possui, descrevendo que “o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da
coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.”
Tal noção, entretanto, é muito ampla e não lida, prima facie, com diversos outros
direitos existentes dentro da seara jurídica, tais como direito de uso, direitos de enfiteuse,
direito de superfície, dentre outros. A própria pluralidade de direitos reais sobre determinados
bens já demonstra que a idéia atual de propriedade não pode ser mais adotada como a
cumulação absoluta de todas as faculdades de utilização sobre determinada coisa.
102
FORGIONI, Paula A. Análise Econômica do Direito (AED): Paranóia ou Mistificação? Revista de Direito
Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. Vol. 139. p. 242-256. jul/set 2005. p. 252.
103
COLE, Daniel H; GROSSMAN, Peter Z. The Meaning of Property Rights: Law versus Economics? Land
Economics. Vol. 78. No. 3. p. 317-330. 2002. p. 317.
63
Como poderia ser exercido o jus abutendi, de uma idéia ou de uma música que é
cantada? Como se valer da rei vindicatio de um poema que pode ser declamado ao mesmo
tempo pelo próprio autor e por um terceiro? Bens imateriais ou idealmente considerados não
se prestam a uma tutela similar à da propriedade material.
104
GOMES, Orlando. Direitos reais. 2. ed. São Paulo: Forense, 1962. p. 98.
105
SZTAJN, Rachel; ZYLBERSZTAJN, Decio. Economia dos Direitos de Propriedade. In: ZYLBERSZTAJN,
Decio; SZTAJN, Rachel (orgs.). Direito & Economia – Análise Econômica do Direito e das Organizações.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2005. p. 84-101. p. 85.
64
propriedade, então, não é mais um algo em si, mas um padrão de determinado conjunto de
direitos sobre utilizações de bens jurídicos.
Private property can be defined in terms of a bundle of rights chosen from among
the infinite relations that may exist among people with respect to a scarce resource.
Ownership of private property includes the ability, by a single person, to control all
or most of the core bundle, such that the owner´s decision on inclusion or exclusion
will be treated as final by society. 106
Adam Mossoff vai além, indicando que o próprio conceito de propriedade passa a
ser desnecessário, na medida em que, o conjunto pode ser dissociado em seus componentes
específicos:
As applied to the concept of “property,” the bundle theory maintains that there is
“no essential core of those rights that naturally constitutes ownership.” In the law,
this bundle of duties and claims could be analytically dissected by scholars and
adjudicated by the courts without any need for reference to “property” at all. 107
106
HELLER, Michael A. The Tragedy of Anticommons – Property in the Transition from Marx to Markets.
Harvard Law Review. Vol. 111. nº. 3. p. 621-688. 1998. p. 665. Tradução livre: “Propriedade privada pode ser
definida em termos de um feixe de direitos escolhidos dentre as infinitas relações que podem existir entre
indivíduos e o uso de um recurso escasso. Titularidade da propriedade privada inclui a habilidade de uma única
pessoa controlar todos ou a maioria dos direitos do feixe, de maneira que a decisão do titular sobre inclusão ou
exclusão será tratada como final pela sociedade.”
107
MOSSOFF, Adam. What is Property? Putting the Pieces Back Together. Arizona Law Review. Vol. 45. p.
371-443. 2003. p. 374. Tradução livre: “Enquanto aplicado ao conceito de propriedade a teoria do feixe de
direitos mantem que não existe um núcleo essencial de direitos que constitui a titularidade sobre propriedade. Na
lei, esse conjunto de deveres e prerrogativas pode ser analiticamente dissecado pela doutrina e adjudicado pelas
cortes sem qualquer necessidade de referência a uma idéia de propriedade.”
108
BELL, Abraham; PARCHOMOVSKY, Gideon. What Property Is. University of Pennsylvania Law School
ILE – Institute for Law and Economics. Research Paper nº 04-05. 2004. Disponível em:
<http://works.bepress.com/abraham_bell/5>. Acesso em: 08/08/08. p. 15.
65
109
MOSSOFF, Adam. What is Property? Putting the Pieces Back Together. Arizona Law Review. Vol. 45. p.
371-443. 2003. p. 376. Tradução livre: “Propriedade, segundo alguns doutrinadores, não é meramente um
conjunto de direitos e obrigações. O conceito possui necessariamente uma característica essencial: o direito de
exclusão. Thomas Merrill recentemente declarou que o direito de excluir é condição sine qua non do direito de
propriedade, e J. E. Penner argumenta que o direito de propriedade deve ser concebido como o direito de uso
exclusivo”.
110
Loretto v. Teleprompter Manhattan CATV Corp., 458 U.S. 419, 433 (1982).
111
444 U.S. 164, 176 (1979).
112
ANDERSON, Jerry L. Comparative Perspectives on Property Rights: The Right to Exclude. Journal of
Legal Education. Vol. 56. No. 3. p. 1-12. 2006. p. 5.
113
FERREIRA, Simone Nunes. Direito de propriedade: nas Constituições brasileiras e do Mercosul. Revista
Jurídica. Brasília. Vol. 8. nº. 83. p.180-192. fev./mar. 2007. p. 190.
66
Dessa diversidade de aparições, fica claro que a idéia de propriedade não deve ser
tomada como uniforme e inequívoca. Consubstanciando este entendimento, consigna-se a
posição do ministro Eros Roberto Grau:
114
Constituição Federal de 1988: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXII - é garantido o direito de propriedade;
XXIII - a propriedade atenderá a sua função social”.
115
Constituição Federal de 1988: “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e
na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social,
observados os seguintes princípios: (...) II - propriedade privada; III - função social da propriedade;”.
116
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 2006.
p. 236.
67
O direito de propriedade não se reveste de caráter absoluto, eis que, sobre ele, pesa
grave hipoteca social, a significar que, descumprida a função social que lhe é
inerente (CF, art. 5º, XXIII), legitimar-se-á a intervenção estatal na esfera dominial
privada, observados, contudo, para esse efeito, os limites, as formas e os
procedimentos fixados na própria Constituição da República.
O acesso à terra, a solução dos conflitos sociais, o aproveitamento racional e
adequado do imóvel rural, a utilização apropriada dos recursos naturais disponíveis e
a preservação do meio ambiente constituem elementos de realização da função
social da propriedade. 117
Esta visão da propriedade, não como um instituto único, mas como uma
multiplicidade de institutos voltados para cada objeto parece ir ao encontro da teoria do feixe
de direitos conjugada com a teoria do direito de exclusão.
Cada dos vários institutos antevistos por Eros Grau estaria situado em um espectro
de dois extremos. O primeiro seria a ausência completa de qualquer direito sobre determinado
bem. O segundo seria a propriedade concebida nos moldes clássicos, ou seja, um condensado
de direitos absolutos sobre o bem.
Os diversos institutos da propriedade, por sua vez, variam entre os pólos e cada
feixe irá possuir um padrão específico de acordo com a natureza do bem envolvido e os
valores sociais (constitucionais) relevantes que determinam a inclusão ou não no feixe
daquela faculdade subjetiva específica, ou seja, daquele direito específico.
Com efeito, existem diversas restrições legais dos direitos de propriedade. Sejam
de direito público (desapropriação, requisição, tombamento, tributação); de direito privado
(todas as relações jurídicas de vizinhança, que seriam limitações para construir, sossego e
saúde dos imóveis vizinhos etc.) ou, especialmente, de direito social (Lei de Locação,
Estatuto da Terra, Código de Defesa do Consumidor etc.).
117
ADI 2.213-MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 4-4-02, DJ de 23-4-04.
68
118
LUECK, Dean; MICELI, Thomas J. Property Law. University of Arizona Legal Studies. Discussion Paper
nº 06-19. 2006. Disponível em: <http://www.arizona.law.edu>. Último acesso em 10/06/08.
69
Nesse ponto, convêm observar que os “(...) custos de transação são afetados pelo
sistema legal e por normas não positivadas, que recaem sobre a alocação dos direitos de
propriedade”. 119
Logo, existe uma estreita relação entre os “custos de transação”, a ordem jurídica
e a forma de alocação dos recursos – através de direitos de propriedade e das interações
econômicas.
119
SZTAJN, Rachel; ZYLBERSZTAJN, Decio. Economia dos Direitos de Propriedade. In: ZYLBERSZTAJN,
Decio; SZTAJN, Rachel (orgs.). Direito & Economia – Análise Econômica do Direito e das Organizações.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2005. p. 84-101. p.85.
120
BELL, Abraham; PARCHOMOVSKY, Gideon. What Property Is. University of Pennsylvania Law School
ILE – Institute for Law and Economics. Research Paper nº 04-05. 2004. Disponível em:
<http://works.bepress.com/abraham_bell/5>. Acesso em: 08/08/08. p. 5.
121
BARZEL, Yoram. Economic Analysis of Property Rights – Political Economy of Institutions and
Decisions. 2. ed. Cambridge: Cambridge University Press, 2003. p. 3-4. Tradução livre: “A habilidade individual
em termos esperados de consumir um produto (ou serviços), diretamente ou indiretamente através de trocas. (...)
reconhecidos e efetivados, em parte, pelo governo.”
122
BARZEL, Yoram. Op. cit. p. 4.
70
A ilustração que deixa clara a distinção é a situação em que estão os bens obtidos
por meio de furto ou roubo. O ladrão não possui “direitos legais” sobre os bens roubados,
contudo, ainda pode consumi-los, fruí-los e até aliená-los. A ausência de um direito legal, não
influencia necessariamente na utilização econômica.
Posner, assim como Barzel, define direitos de propriedade como “(...) a legally
enforceable power to exclude others from using a resource (...), and so with no need to make
contracts with would be users of the resource forbidding their use.” 123
123
POSNER, Richard A.; LANDES, William M. The Economic Structure of Intellectual Property Law.
Cambridge: Harvard University Press, 2003. p. 12. Tradução livre: “...um poder legalmente tutelado de excluir
outros da utilização de um recurso (...) e então sem necessidade de fazer contratos com outros potenciais
usuários para proibir o uso destes.”
124
POSNER, Richard A.; LANDES, William M. Op. cit. p. 13.
125
DEMSETZ, Harold. Towards a Theory of Property Rights. American Economic Review. Vol. 52. Issue nº 2.
P. 347-359. 1967. p. 347.
72
Basicamente, ele decorre do fato de, numa atividade econômica, nem sempre, ou
raramente, todos os custos os respectivos benefícios recaírem sobre a unidade
responsável pela sua condução, como seria pressuposto. [...] As externalidades
correspondem, pois, a custos ou benefícios circulando externamente ao mercado,
vale dizer, que se quedam incompensados, pois para eles, o mercado, por limitações
institucionais, não consegue imputar um preço.127
Num exemplo prático, uma fábrica química despeja os resíduos de seu processo
industrial em um rio próximo. Possíveis externalidades do processo produtivo são a perda de
peixes por parte dos pescadores do rio bem como a depreciação de valor dos imóveis
ribeirinhos.
126
MERGES, Robert P.; GINSBURG, Jane C. Foundations of Intellectual Property. New York: Foundation
Press, 2004. p. 11.
127
NUSDEO, Fábio. Curso de Economia – Introdução ao Direito Econômico. 4. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005. p. 154/155.
128
NUSDEO, Fábio. Op. cit. p. 157.
73
Com o advento de um mercado de peles, estas, que antes eram utilizadas para as
vestimentas nos núcleos familiares, tiveram uma valorização considerável. Como
conseqüência, ocorreu um expressivo aumento no volume da caça, pelo que a cumulação das
externalidades negativas individualmente causadas passou a impactar de forma significativa
na própria subsistência do recurso natural.
De fato, o sistema de caça livre cria um incentivo para que o indivíduo cace o
máximo possível, pois está a internalizar todos os benefícios – alimentação e venda da pele do
animal – sem, contudo, internalizar os custos – externalidades.
Surgiram direitos exclusivos sobre áreas e territórios para, de modo que os índios
não mais podiam caçar livremente em todas as terras da tribo. Tais direitos surgiram em
resposta às alterações econômicas – valorização das peles e escassez dos animais.
Demsetz aponta que a evidência empírica demonstra que os arranjos mais bem
definidos de territórios exclusivos estavam direitamente relacionados com a proximidade e
influência dos mercados de peles.
Sem a delimitação dos territórios, o custo social a ser incorrido é muito elevado, a
saber, a própria exaustão do recurso (animais). Os direitos de propriedade sobre os territórios
embora diminuam a área de caça, impõe a cada caçador a preocupação com a continuidade do
recurso explorado no seu espaço exclusivo.
129
MERGES, Robert P.; GINSBURG, Jane C. Foundations of Intellectual Property. New York: Foundation
Press, 2004. p. 8.
74
Porém, mesmo no estado de natureza, os indivíduos não estão livres dos “custos
de exclusão”, estes entendidos como os custos relacionados com a manutenção e guarda dos
recursos obtidos. Assim, são custos de exclusão, por exemplo, uma cerca para proteger um
130
COOTER, Robert D.; ULEN, Thomas. Law and Economics. 3. ed. Massachusetts: Addison Wesley
Longman, Inc., 2000. p. 78-79.
131
COOTER, Robert D.; ULEN, Thomas. Op. cit. p. 78.
132
FALCÃO, Raimundo Bezerra. Tributação e Mudança Social. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1981. p 236-237.
75
People must decide how many resources to devote to defending their property
claims. Rational people allocate their limited resources so that, (…), the marginal
cost of defending the land is just equal to the marginal benefit. This means that at
the margin, the value of the resources used for military ends (the marginal benefit)
equals their value when used for productive ends, such as raising crops and
livestock (marginal [opportunity] cost). For example, the occupants are rational if
allocating a little more time to patrolling the perimeter of the property preserves as
much additional wealth for the defenders as they would enjoy by allocating a little
more time to raising crops. The same statement could be made about allocating land
between crops and fortifications, or about beating metal into swords or
plowshares. 133
133
COOTER, Robert D.; ULEN, Thomas. Law and Economics. 3. ed. Massachusetts: Addison Wesley
Longman, Inc., 2000. p. 77-78. Tradução livre: “As pessoas devem decidir quanto de recursos utilizar para
defender sua propriedade. Pessoas racionais alocariam seus recursos limitados de maneira que o custo marginal
de defender a terra é igual ao custo marginal do benefício. Isto significa que na margem, a quantidade de
recursos utilizados para fins militares (o benefício marginal) equivale ao valor quando usado para fins
produtivos, como utilizado em plantações e criações de animais (custo marginal na oportunidade). Por exemplo,
os ocupantes são racionais se alocando um pouco mais de tempo para patrulhar o perímetro da propriedade
preservam tanta riqueza adicional quanto seria produzida se o mesmo tempo fosse alocado para o cultivo da
lavoura. A mesma afirmação pode ser feita sobre a alocação de terrenos entre plantações e fortificações ou sobre
uso de metal para espadas ou enxadas”.
76
Historically, the state has had an important role in protecting private property.
Indeed the government probably came about soon after the emergence of property
rights in the full, modern sense of the word in the “neolithic revolution” some
10,000 years ago. Humans then engaged in agriculture and domestication of
animals. This revolution occurred in a number of different regions, such as the
Middle East, northern Thailand and the Americas. It is not imaginable without the
discovery of respected property rights. Who would dig the soil and sow crops,
capture and care for animals, if possession was constantly threatened and the fruit
of these efforts could not be appropriated? Without respected property rights, the
exclusion costs could have been so high that agriculture would have been impossible
and people would have remained paleolithic hunter-gatherers. 135
134
COOTER, Robert D.; ULEN, Thomas. Law and Economics. 3. ed. Massachusetts: Addison Wesley
Longman, Inc., 2000. p. 79.
135
KASPER, Wolfgang. Economic Freedom & Development - An essay about property rights, competition,
and prosperity. New Delhi: Centre for Civil Society, 2002. p. 56. Tradução livre: “Historicamente, o Estado
tem tido um importante papel na proteção da propriedade privada. Realmente, o governo provavelmente veio
logo após a emergência dos direitos de propriedade em sua concepção completa, com a “revolução neolítica”,
por volta de 10,000 anos atrás. Os humanos se engajaram na agricultura e domesticação de animais. (...) Esta
revolução é inimaginável sem o respeito aos direitos de propriedade. Quem cavaria o solo e semearia colheitas,
77
Por fim, de forma a ilustrar como os sistemas de propriedade permitem uma maior
eficiência e melhor alocação dos recursos, apresentam-se quatro casos. 138
capturaria e criaria animais, se a posse estava constantemente ameaçada e os frutos destes esforços não pudessem
ser obtidos. Sem direitos de propriedade efetivos, os custos de exclusão teriam sido tão altos que a agricultura
teria sido impossível e as pessoas teriam permanecido caçadores e coletores paleolíticos.”
136
SHAVELL, Steven. Economic Analysis of Property Law. Discussion paper nº 329. Harvard John M. Olin
Center for Law, Economics and Business. 2002. Disponível em:
<http://www.law.harvard.edu/programs/olin_center>. Acesso em: 10/06/2008.
137
SHAVELL, Steven. Op. cit.
138
SHAVELL, Steven. Op. cit.
78
139
HARDIN, Garret. The Tragedy of the Commons. Science Magazine. nº 162. p. 1243-1248. 1968.
80
Por esta razão, a idéia de tragedy of the commons torna-se um dos argumentos
mais fortes daqueles que acreditam e defendem a privatização de todos os recursos
tradicionalmente possuídos em comum, sejam eles recursos ambientais, culturais ou
econômicos.
140
HARDIN, Garret. The Tragedy of the Commons. Science Magazine. nº 162. p. 1243-1248. 1968. p. 1145.
Tradução livre: “Ruína é a destinação a qual todos os homens correm, cada um perseguindo o seu interesse
particular em uma sociedade que acredita na liberdade sobre os commons. Liberdade nos commons acarreta a
ruína de todos”.
81
Heller apresenta sua definição sobre anti-commons como: “... a property regime
in which multiple owners hold formal or informal rights of exclusion in a scarce resource.” 143
A tragédia, por sua vez, “(...) ocorre quando vários indivíduos agindo
separadamente, porém num contexto coletivo, desperdiçam um recurso natural não o sobre-
utilizando, mas sim o sub-utilizando”. 144
141
MICHELMAN, Frank I. Property, Utility and Fairness: Comments on the Ethical Foundations of Just
Compensation Law. Harvard Law Review. Vol. 80. nº 6. p. 1165-1258. 1982.
142
MICHELMAN, Frank I. apud HELLER, Michael A. The Tragedy of Anticommons – Property in the
Transition from Marx to Markets. Harvard Law Review. Vol. 111. nº. 3. p. 621-688. 1998. p. 668. Tradução
livre: “Um tipo de propriedade onde todos sempre têm direitos sobre os objetos do regime e conseqüentemente
ninguém é privilegiado quanto ao uso à exceção da autorização de todos os outros.”
143
HELLER, Michael A. Op. cit. p. 668. Tradução livre: “Um regime de propriedade no qual titulares múltiplos
possuem formalmente ou informalmente direitos de exclusão sobre um recurso escasso.”
144
ROCHA, Afonso P. P.; MATIAS, João Luis Nogueira. Repensando o Direito de Propriedade. XV
Congresso Nacional do CONPEDI, 2006, Manaus. Anais do XV Encontro Nacional do CONPEDI - Manaus.
Florianópolis : Fundação José Arthur Boiteux. 2006.
82
recurso, não está a internalizar efetivamente todos os custos que a ausência do uso do recurso
impõe sobre o grupo social.
Essa tragédia evoca o problema dos custos de transação relativos ao consenso que
é diretamente proporcional a dimensão do grupo de agentes econômicos.
Para Francesco Parisi, Norbert Schulz e Ben Depoorter, a tragédia pode ser assim
definida:
145
PARISI, Francesco; SCHULZ, Norbert; DEPOORTER, Ben. Duality in Property: Commons and
Anticommons. Würzburg Economic Papers. Universität Würzburg. 2000. Disponível em: <www.wifak.uni-
wuerzburg.de>. Acesso em: 16/06/08. Tradução livre: “Na tragédia dos anticommons a coexistência de direitos
múltiplos de exclusão cria condições para o uso não ótimo de um recurso tido em comum. Se o recurso é
submetido a múltiplos direitos de exclusão por dois ou mais indivíduos cada um dos titulares terá incentivos para
reter recursos da utilização pelos outros a um nível de ineficiência. Na presença de sistemas de controle
concorrentes, os co-titulares atuando em competição individual determinarão que o recurso não será utilizado até
mesmo quando traria benefícios positivos ao grupo. Colocando de forma diferente alguns recursos não serão
utilizados ainda que numa região de produtividade marginal positiva. Isto acontece porque os múltiplos titulares
do direito de exclusão não internalizam integralmente os custos criados pelo exercício do direito de excluir
outros.”
83
Logo, qualquer empresa que deseje entrar no ramo com uma nova linha de
pesquisa pode ter sua pretensão frustrada, pois, antes mesmo de iniciar suas atividades,
dependerá de negociação com outras, já presentes no mercado, e titulares de processos e
conhecimentos básicos em suas carteiras de ativos intelectuais.
Já se adianta aqui um ponto que será abordado por reiteradas vezes ao longo do
trabalho. Não obstante o sistema de propriedade intelectual ter por objetivo a criação de
incentivos para a inovação e o desenvolvimento, o excesso do sistema pode acabar se
tornando um entrave ao progresso cultural, científico e tecnológico. Nesse sentido, Giuseppe
Colangelo formula a tragédia dos anticommons em relação a patentes:
The transition from commons to privatization, while greatly beneficial for the
creation of private incentives for research, generates a spiral of overlapping IPRs in
the hands of different owners, with the unintended consequence to obstacle future
research: the tragedy of the anticommons refers, indeed, to the obstacles arisen
from the proliferation of exclusion rights and to their effects when a user needs
access to multiple patented inputs to create a single product. The tragedy of the
anticommons is a result of property fragmentation. 148
148
COLANGELO, Giuseppe. Avoiding the Tragedy of the Anticommons: Collective Rights Organizations,
Patent Pools and the Role of Antitrust. LUISS Law and Economics Lab Working Paper No. IP-01-2004.
Roma. 2004. Disponível em: <http://www.law-economics.net/public/patent%20pool.pdf>. Acesso em: 16/06/08.
Tradução livre: “A transição de commons para privatização enquanto grande benefício para a criação de
incentivos privados para pesquisa cria um espiral de direitos de propriedade intelectual sobrepostos nas mãos de
diferentes titulares com a conseqüência não desejada de obstaculizar a pesquisa futura: a tragédia dos
anticommons refere-se então aos obstáculos criados pela proliferação de direitos de exclusão e os efeitos destes
sobre os usuários que necessitam de acesso a múltiplos conhecimentos patenteados para produzir um só produto.
A tragédia dos anticommons é um resultado da fragmentação da propriedade”.
85
Com efeito, a privatização dos recursos econômicos tidos em comum é uma das
formas de contornar a tragedy of the commons, contudo, a teoria econômica também
demonstra que se esta lógica for exagerada causará outra tragédia: the tragedy of the
aticommons.
É possível inferir que o direito de propriedade atribuído pela ordem jurídica, seja
sobre bens materiais ou imateriais, deve prestar-se a um equilíbrio dinâmico que leve em
consideração as características de cada recurso natural que se pretende apropriável.
Tal situação foi determinante para o reconhecimento por parte dessas empresas da
necessidade da existência de um domínio público – public domain – em relação a dados e
informações genéticas, de modo a permitir que tais informações possam ser utilizadas
livremente na pesquisa e desenvolvimento sem os elevados custos de transação que um
86
Kembrew McLeod relata que até mesmo os gigantes da biotecnologia, que são os
maiores defensores da privatização de informações e seqüenciamentos genéticos através da
propriedade intelectual, sentiram a necessidade da existência de um domínio público sem o
qual suas atividades seriam impossíveis:
The point was highlighted in 1999 when ten of the world´s largest drug companies
created an alliance with five of the leading gene laboratories. The alliance invested
in a two-year plan to uncover and publish three hundred thousand common genetic
variations to prevent upstart biotechnology companies from patenting and locking
up important genetic information. The companies (including Bayer AG and Bristol-
Myers Squibb) wanted the data released into the public domain to ensure that
genetic information could be freely accessed and used for research. It´s mission
undermined the assertion that a genetic commons inevitably leads to commercial
suicide and the end of research incentives. 149
A tragédia antevista por Hardin tinha como substrato de análise recursos naturais
onde a utilização de um indivíduo impede a utilização por outro. Em contrate, foi possível
identificar uma tragédia oposta ao tratar-se de propriedade sobre informações biotecnológicas.
149
MCLEOD, Kembrew. Freedom of Expression – Resistance and Repression in the Age of Intellectual
Property. Minneapolis: University of Minessota Press, 2007. p. 46. Tradução livre: “O ponto foi destacado em
1990 quando dez das maiores companhias farmacêuticas do mundo criaram uma aliança conjuntamente com
cinco dos maiores laboratórios de pesquisa genética. A aliança investiu em um plano de dois anos para descobrir
e publicar trezentas mil variações genéticas para prevenir que empresas de biotecnologia recém criadas as
pudessem patentear e assim “prender” importantes informações genéticas. As companhias (incluindo Bayer, AG
e Bristol-Myers Squibb) desejavam as informações divulgadas no domínio público para assegurar que estas
informações pudessem ser livremente acessadas para pesquisas futuras. Esta missão descaracteriza a afirmativa
de que um commons genético inevitavelmente ocasiona um suicídio comercial e uma ausência de incentivos para
pesquisa”.
87
novas aplicações e conseqüências para a mesma. Esta é a diferença essencial entre recursos
econômicos tangíveis e intangíveis.
Um feixe muito esguio pode desinteressar aqueles que deverão investir recursos
no desenvolvimento de um novo conhecimento ou tecnologia. Um feixe muito robusto, por
sua vez, pode sufocar a possibilidade do surgimento e desenvolvimento de novas aplicações.
Línguas como o inglês e o espanhol, por sua vez, são extremamente úteis,
exatamente por serem largamente utilizadas. São “convenções” que permitem uma interação
entre vários indivíduos com alto grau de estabilidade (os sentidos das palavras são
88
conhecidos, o que gera confiança das partes sobre a existência de entendimento mútuo).
Necessárias, portanto, para a realização das atividades inerentes à vida em sociedade.
Logo, faz sentido que, para determinados tipos de recursos imateriais, as “cercas”
preconizadas por Hardin redundem por impedir a máxima utilização. Tais recursos talvez
sejam mais bem manejados através de um sistema jurídico que garanta um maior nível de
acesso à coletividade.
The very idea that noneclusive rights might be more efficient than exclusive rights
rarely enters the debate. The assumption is control, and public policy is dedicated to
maximizing control. But there is another view: not that property is evil, or that
markets are corrupt, or that the government is the best regime for allocating
resources, but that free resources, or resources held in common, sometimes create
more wealth and opportunity for society than those same resources held privately. 150
Existem, portanto, razões econômicas pelas quais alguns recursos devem ser
colocados sob o controle individual exclusivo e outras pelas quais não se necessita de tal
exclusividade, sendo, os bens, passíveis de serem disseminados de uma forma mais livre. 151
It has been pretended by some, (and in England especially,) that inventors have a
natural and exclusive right to their inventions, and not merely for their own lives,
but inheritable to their heirs.
[…]
150
LESSIG, Lawrence. The Future of Ideas – The Fate of the Commons in a Connected World. New York:
Vintage Books, 2002. p. 86. Tradução livre: “A própria idéia de que direitos não exclusivos podem ser mais
eficientes que direitos exclusivos raramente aparece no debate. A pressuposição é controle, e a política pública é
dedicada a maximizar este controle. Mas existe uma outra perspectiva: não que propriedade seja ruim, ou que
mercados sejam corruptos, ou que o governo é o melhor regime para alocar recursos, mas que recursos livres ou
recursos tidos em comum algumas vezes criam mais riqueza e oportunidade para a sociedade que se os mesmos
recursos fossem tidos de forma privada”.
151
LESSIG, Lawrence. Op cit. p. 94.
89
Stable ownership is the gift of social law, and is given late in the progress of
society. It would be curious then, if an idea, the fugitive fermentation of an
individual brain, could, of natural right, be claimed in exclusive and stable
property.
If nature has made any one thing less susceptible than all others of exclusive
property, it is the action of the thinking power called an idea, which an individual
may exclusively possess as long as he keeps it to himself; but the moment it is
divulged, it forces itself into the possession of every one, and the receiver cannot
dispossess himself of it. Its peculiar character, too, is that no one possesses the less,
because every other possesses the whole of it. He who receives an idea from me,
receives instruction himself without lessening mine; as he who lights his taper at
mine, receives light without darkening me.
That ideas should freely spread from one to another over the globe, for the moral
and mutual instruction of man, and improvement of his condition, seems to have
been peculiarly and benevolently designed by nature, when she made them, like fire,
expansible over all space, without lessening their density in any point, and like the
air in which we breathe, move, and have our physical being, incapable of
confinement or exclusive appropriation. Inventions then cannot, in nature, be a
subject of property.
Society may give an exclusive right to the profits arising from them, as an
encouragement to men to pursue ideas which may produce utility, but this may or
may not be done, according to the will and convenience of the society, without
claim or complaint from anybody.
[…]
(…) it may be observed that the nations which refuse monopolies of invention, are
as fruitful as England in new and useful devices. 152 (negritado)
Não obstante o texto possuir quase duzentos anos, as ponderações são atuais e os
argumentos apresentados são possivelmente até mais lúcidos que os produzidos
hodiernamente. Tratando originalmente de patentes de invenção, as razões podem ser
facilmente estendidas aos demais campos da propriedade intelectual.
152
Carta de Thomas Jefferson à Isaac McPherson em 13 de agosto de 1813. MERGES, Robert P.; GINSBURG,
Jane C. Foundations of Intellectual Property. New York: Foundation Press, 2004. p. 17-21. Tradução livre:
“Tem sido pretendido por alguns, (especialmente na Inglaterra) que inventores possuem um direito natural e
exclusivo sobre suas invenções, não só por suas vidas, mas integrando a herança dos herdeiros. (...) A
titularidade estável é um presente da lei social, e é dado tarde no progresso da sociedade. Seria então curioso se
uma idéia, o fermento fugaz do cérebro de um indivíduo pudesse, por direito natural, ser objeto de propriedade
exclusiva. Se a natureza fez alguma coisa menos suscetível do que todas as outras de propriedade exclusiva, é o
poder mental denominado idéia, que qualquer indivíduo pode possuir exclusivamente, enquanto reserva para si
mesmo; mas no momento em que é divulgada ela se força na posse de todos e aquele que a recebe não pode mais
abandoná-la. Sua característica peculiar é que ninguém possui menos, pois todos a possuem por inteiro. Aquele
que recebe uma idéia de mim recebe instrução para si mesmo sem diminuir a minha; tal qual aquele que acende
uma vela com a minha, recebe luz sem me escurecer. Que idéias devam espalhar-se livremente de um para o
outro ao redor do globo, para a mútua instrução moral da humanidade e melhora da sua condição parece ter sido
assim designado de forma benevolente pela natureza quando fez idéia tal qual o fogo, expansível sobre todo o
espaço sem perder densidade em qualquer dos pontos, e como o ar que respiramos incapaz de ser confinado ou
apropriado de forma exclusiva. Assim as invenções não podem em natureza ser objeto de propriedade. A
sociedade pode assegurar um direito exclusivo sobre os lucros que derivam dela, como forma de encorajamento
para que os indivíduos persigam idéias que se podem provar úteis, mas isto pode ou não ser feito, de acordo com
a vontade e conveniência da sociedade sem qualquer contestação ou reclamação de ninguém. [...] (...) pode ser
observado que nações que recusam monopólio sobre invenções são tão frutíferas quanto à Inglaterra em novos e
úteis inventos”.
90
Ficam ainda claras, na metáfora da vela, duas características essenciais dos bens
intangíveis: a não-rivalidade e não-exclusividade dos mesmos.
153
LESSIG, Lawrence. The Future of Ideas – The Fate of the Commons in a Connected World. New York:
Vintage Books, 2002. p. 206/317. Tradução livre: “Um princípio que sempre teve grande peso comigo é que, da
mesma forma que nós aproveitamos grandes vantagens das invenções de outros, nós deveríamos ter satisfação
com a oportunidade de servir outros através de uma invenção nossa; e isto deveria ser feito de forma livre e
generosa”.
91
A rivalidade e a exclusividade são dois critérios que podem ser utilizados nas
classificações dos recursos econômicos.
Os bens intelectuais, por sua vez, não são capazes de exclusão. São tidos, nos
termos econômicos como “imperfeitamente exclusivos”155, pois é possível excluir terceiros de
determinada informação ou conhecimento enquanto estes forem mantidos em segredo. Uma
vez comunicados, não podem mais ser removidos daquele indivíduo.
154
COLANGELO, Giuseppe. Avoiding the Tragedy of the Anticommons: Collective Rights Organizations,
Patent Pools and the Role of Antitrust. LUISS Law and Economics Lab Working Paper No. IP-01-2004.
Roma. 2004. Disponível em: <http://www.law-economics.net/public/patent%20pool.pdf>. Acesso em: 16/06/08.
155
LESSIG, Lawrence. The Future of Ideas – The Fate of the Commons in a Connected World. New York:
Vintage Books, 2002. p. 94.
92
Tendo um pescador aprendido uma nova canção, ainda que o mesmo fique mudo
ou venha a ser proibido de cantar, não é possível apagar o conhecimento transmitido. 156
1. If the resource is rivalrous, then a system of control is needed to assure that the
resource is not depleted which means the system must assure the resource is both
produced and not overused;
2. If the resource is nonrivalrous, then a system of control is needed simply to assure
the resource is created – a provisioning problem, (…). Once it is created, there is no
danger that the resource will be depleted. By definition, a nonrivalrous resource
cannot be used up. 157
What follows then is critical: The system of control that we erect for rivalrous
resources (land, cars, computers) is not necessarily appropriate for nonrivalrous
resources (ideas, music, expression). Indeed, the same system for both kinds of
156
Curioso observar que a capacidade de exclusão também é influenciada pelas disponibilidades tecnológicas.
Antes uma situação apenas imaginada em ficção científica, atualmente no campo da neurobiologia já existem
tecnologias que permitem acessar centros de memória e informação no cérebro. Logo, em teoria, é até mesmo
possível apagar um conhecimento ou segredo.
157
LESSIG, Lawrence. The Future of Ideas – The Fate of the Commons in a Connected World. New York:
Vintage Books, 2002. p. 95. Tradução livre: “1. se o recurso é rival, então o sistema de controle é necessário para
assegurar que o recurso não será esgotado, o que significa que o sistema deve assegurar que o recurso será tanto
produzido como não sobre-utilizado; 2. se o recurso é não rival, então o sistema de controle é necessário
simplesmente criado – um problema de provisionamento. Uma vez criado não há qualquer perigo de que o
recurso seja esgotado. Por definição um recurso não rival não pode ser exaurido.”
93
resources may do real harm. Thus a legal system, or a society generally, must be
careful to tailor the kind of control to the kind of resource. One size won´t fit all. 158
158
LESSIG, Lawrence. The Future of Ideas – The Fate of the Commons in a Connected World. New York:
Vintage Books, 2002. p. 95. Tradução livre: “O que se segue é crucial: O sistema de controle criado para
recursos rivais (terra, carros, computadores) não é necessariamente apropriado para recursos não rivais (idéias,
música, expressões). De fato, o mesmo regime para os dois tipos de recursos pode ocasionar um dano real.
Portanto, o sistema legal ou a sociedade em geral, deve cuidadosamente delinear o tipo de controle ao tipo de
recurso. Um só tipo não serve para todos.”
159
LÉVÊQUE, François; MÉNIÈRE, Yann. The Economics of Patents and Copyright. Paris: Berkley
Eletronic Press, 2004. p. 5. Tradução livre: “O custo marginal de servir um consumidor adicional é zero.
Conseqüentemente, quando um produtor cobra por seu serviço, o consumo do bem é racionada de forma
desnecessária. (...) O bem estar social não é maximizado”.
94
Em virtude da discriminação de preço que pode ser realizada pelo titular dos
direitos de propriedade intelectual, há como resultado uma massa de consumo não atendido,
comumente referenciada m linguagem econômica como deadweight loss. Essa dinâmica é
assim sintetizada por David Lindsey:
As information goods have relatively high fixed costs of production, to recover the
costs of production an information producer, such as a copyright owner, must
charge more than the marginal cost of reproduction. If a single price is set above
marginal cost, consumers who value the good at more than marginal cost but less
than the price will not be able to purchase the product. According to conventional
micro-economic theory, a good should be supplied to all consumers prepared to pay
more than marginal cost. Thus to the extent that the price for an information good is
set above marginal cost there is said to be a net social cost, which is known as the
deadweight loss. 160
Além do exemplo dos bens intelectuais, existem outros recursos que são tidos por
não rivais e não exclusivos e são parte essencial da convivência em sociedade. São
normalmente os bens identificados na ordem jurídica como bens públicos ou bens de uso
comum do povo.
Observe-se que bens físicos como as estradas, praias, praças possuem as distintas
características de serem capazes de atender um número razoavelmente grande pessoas sem
discriminar ou impor exclusões predeterminadas. 161 Além desses, é possível imaginar
exemplos ainda mais marcantes, como a defesa nacional, a infra-estrutura do país, além de
160
LINDSAY, David. The law and economics of copyright, contract and mass market licences. Sydney:
Centre for Copyright Studies – Australian Copyright Council, 2002. p. 24. Tradução livre: “Como os bens de
informação possuem custos de produção relativamente altos, para recuperar o investimento o produtor, a
exemplo de um titular de copyrights, deve cobrar acima do custo marginal de reprodução. Se um preço é
colocado acima do custo marginal, consumidores que valorizam o bem além do custo marginal, porém aquém do
preço, não poderão comprar o produto. De acordo com a teoria micro-econômica, um produto deveria ser
produzido a todos os consumidores dispostos a pagar mais que o custo marginal. Assim, no que se relaciona com
o estabelecimento de um preço de um produto informacional além do preço marginal, diz-se que há um custo
social, identificado como “peso morto”.”
161
NUSDEO, Fábio. Curso de Economia – Introdução ao Direito Econômico. 4. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005. p. 41.
95
serviços como educação, saúde e segurança ofertados ao público, mesmo para aqueles que
não contribuem direitamente para seu custeio.
Com efeito, os bens tidos por não rivais e não exclusivos são caracterizados
economicamente como Public Goods. De acordo com Adão Carvalho:
Para os bens intelectuais são possíveis várias formas de free-riding. Por exemplo,
é inegável que os custos com pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias são muito
expressivos em relação ao valor necessário para a simples reprodução da mesma.
162
CARVALHO, Adão. Racionalidade econômica dos direitos de propriedade intelectual. Documento de
Trabalho nº 2004/10. Universidade de Évora - Departamento de Economia. Disponível em:
<http://www.decon.uevora.pt>. Acesso em: 17/06/08.
96
Há, portanto, necessidade de uma lógica diferenciada ex ante, que deverá tratar de
incentivos para a criação inicial do produto intelectual. Reiterando a análise de Lessig, trata-se
de um problema de provisionamento e não de esgotamento.
163
LÉVÊQUE, François; MÉNIÈRE, Yann. The Economics of Patents and Copyright. Paris: Berkley
Eletronic Press, 2004. p. 5. Tradução livre: “Através da oferta de direitos exclusivos por um período de tempo
limitado, a propriedade intelectual trata desses dois problemas de forma seqüencial. Inicialmente, o mecanismo
legal de proteção torna o produto exclusivo. Usuários devem pagar pelos serviços oferecidos, através de
royalties. Seqüencialmente, quando o trabalho passa para o domínio público, todos os consumidores podem
acessá-lo de forma gratuita. Propriedade Intelectual procura encontrar um equilíbrio entre incentivos para a
criação e inovação e usos, traduzindo-se em linguagem econômica como uma troca entre eficiências dinâmica e
estática.”
97
Que tipos de exceção devem ser conferidos a essa exclusividade em razão do interesse social?
Qual o tempo de duração ótimo? Deve existir algum sistema paralelo de promoção de
incentivos para criações intelectuais? Existem outros incentivos além da exclusividade
econômica? Quais conhecimentos devem ser colocados no domínio público para a utilização
irrestrita?
Tais indagações ainda servem para demonstrar que o ponto mais crítico do debate
é como atingir o equilíbrio econômico entre o estímulo ao interesse privado para a produção e
o interesse social na ampla distribuição de conhecimento, informação e cultura. Fora desse
equilíbrio ideal, estar-se-á ou perdendo novas idéias ou se privando desnecessariamente a
sociedade de um conhecimento útil.
O domínio público, portanto, tem um papel tão relevante (possivelmente até mais)
para a sociedade do que a idéia de proteção exclusiva e recompensa aos criadores, argumento
este alardeado pelos que advogam um modelo proprietário absoluto para os bens intelectuais.
Those who reap most benefits from the patent system are not those who incur most
costs, and while benefits are finely focused, costs are much more widely distributed.
The greatest cost of all would seem to be borne by society as a whole in terms of
damage done to innovation, which is curios given that the fundamental purpose of
the patent system is to encourage innovation for the benefit of society as a whole.
[…]
Discussion of the costs and benefits of the patent system tends to emphasize the
benefits. The costs of the patent system are usually ignored altogether, or are
presented as trivial Those most commonly acknowledge are fees paid to the patent
office and patent attorneys. But there are other costs. There are serious costs. 164
164
MACDONALD, Stuart. Exploring the Hidden Costs of Patents. In: DRAHOS, Peter; MAYNE, Ruth (ed.).
Global Intellectual Property Rights: Knowledge, Access and Development. New York: Palgrave Macmillan,
2006. p. 13 et seq. Tradução livre: “Aqueles que recebem mais benefícios do sistema de patentes não são aqueles
que incorrem nos maiores custos, e enquanto os benefícios são bem focados, custos são muito mais distribuídos.
O maior dos custos parece ser arcado pela sociedade como um todo em termo de danos à inovação, o que é
curioso, levando em consideração que o propósito fundamental do sistema de patentes é encorajar a inovação
para o benefício da sociedade. [...] Discussão sobre custos e benefícios do sistema de patentes tende a enfatizar
os benefícios. Os custos do sistema de patentes são usualmente ignorados ou apresentados como triviais. Os
comumente reconhecidos são as taxas dos escritórios de patente e os advogados. Mas existem outros custos.
Existem custos sérios”.
165
LESSIG, Lawrence. Free Culture – The Nature and Future of Creativity. New York: Penguin Books,
2005. p. 95-97.
100
Apesar da doutrina jurídica americana de fair use 166 vislumbrar tal utilização
como uma exceção à exclusividade de copyright, o custo e o desgaste com um litígio judicial,
especialmente em face de uma grande companhia, desencorajou a utilização da cena.
Para uma compreensão ainda maior dessas distorções, uma investigação histórica
se faz relevante. Através da análise histórica da evolução das principais doutrinas da
propriedade intelectual, será possível vislumbrar quais os valores animaram a inserção na
ordem jurídica de tais direitos, seus objetivos originários e os fatores propiciam o
desequilíbrio em favor de determinados grupos de interesses.
166
Numa simplificação, o fair use é o nome da doutrina jurídica americana que trata das exceções aos direitos de
copyright, onde indivíduos podem reproduzir ou utilizar um trabalho criativo para fins considerados legítimos,
tais como: citação, crítica, paródia, fins didáticos, dentre outros. Trata-se de figura similar às limitações dos
direitos autorais existentes na lei autoral brasileira.
4 EVOLUÇÃO HISTÓRICA
Tais doutrinas são as mais antigas e têm um corpo de normas mais desenvolvido
entre as nações. Além disso, seus respectivos tratados internacionais serviram de base para a
atual Organização Mundial da Propriedade Intelectual.
Tais constatações são relevantes para descaracterizar tais direitos como ilimitados
ou absolutos, colocando em destaque seu compromisso histórico com privilégios econômicos,
em contraste com o papel social que deveriam desempenhar.
Para os propósitos deste trabalho, opta-se por uma investigação histórica comum.
Percebe-se, assim, que o sistema de proteção autoral não é condição sine qua non
para a produção cultural. A idéia de um sistema de proteção focado no indivíduo pode
eventualmente até ser contrária ao ethos cultural de determinado grupo, onde outros
incentivos, além dos econômicos ou de reconhecimento moral, são relevantes na criação e
reformulação da cultura.
Na Roma antiga não havia forma de proteção jurídica específica, embora existam
registros históricos de que autores assinavam contratos para a publicação de livros. 170 A
proteção não residia especificamente em controle das cópias, mas na opinião pública e na
repreensão moral em razão do plágio.
Outra possível explicação pela qual não existia um regime específico de tutela de
direitos dos autores era a dificuldade prática de se reproduzir um trabalho literário. Aliada à
censura moral e à opinião pública, o alto custo com a elaboração da própria cópia servia de
um desestímulo natural para a prática. 173
169
GELLER, Paul Edward. Copyright history and the future: What's culture got to do with it? Journal of the
Copyright Society of the USA. Vol. 47. p. 209-264. 2000. p. 213.
170
BETTIG, Ronald V. Copyrighting Culture – The Political Economy of Intellectual Property. Oxford:
Westview Press, 1996. p. 12.
171
CABRAL, Plínio. A nova lei de direitos autorais: comentários. 4. ed. São Paulo: Harbra, 2003. p. 13.
172
CHAVES, Antônio. Criador da obra intelectual. São Paulo: LTr, 1995. p. 41.
173
GELLER, Paul Edward. Op. cit. p. 213.
104
efetivamente impressos. Logo, não havia um direito dos autores tanto quanto uma regulação
da própria atividade de impressão. 174
Veneza foi palco do surgimento tanto das patentes como do que é possível
conceber como primeiros copyrights. Embora o Satute of Anne, adotado da Inglaterra seja
considerada como a primeira legislação de proteção autoral, na Veneza clássica já eram
conhecidos direitos de exclusividade sobre a reprodução de trabalhos literários.
O primeiro direito exclusivo que pode ser comparável ao copyright moderno foi o
privilégio atribuído a Marco Antonio Sabellico, em setembro de 1486. Foi-lhe atribuído o
controle exclusivo de sua obra Decades rerum Venetarum O responsável por qualquer
publicação não autorizada seria multado em 500 ducatos. Apesar do privilégio não ser um
reconhecimento expresso de um direito de propriedade sobre a obra literária, há uma
equivalência em efeitos práticos ao sistema de tutela atual do direito de autor. 176
174
GELLER, Paul Edward. Copyright history and the future: What's culture got to do with it? Journal of the
Copyright Society of the USA. Vol. 47. p. 209-264. 2000. p. 215.
175
BUGBEE, Bruce W. Genesis of American Patent and Copyright Law. Apud MERGES, Robert P.;
GINSBURG, Jane C. Foundations of Intellectual Property. New York: Foundation Press, 2004. p. 270.
176
BUGBEE, Bruce W. Op. cit. p. 271.
105
Para Nehemias Gueiros Júnior, o autor ficava relegado ao segundo plano, sendo
recompensa suficiente a publicação e o reconhecimento público, argumento utilizado pelos
editores para justificar o modelo de negócios então vigente: “(...) os editores citavam a
considerável fama, decorrente de qualquer um que naqueles tempos publicasse um livro,
como suficiente recompensa ao seu esforço e ainda reclamavam do alto custo da operação
editorial”. 177
177
GUEIROS JUNIOR, Nehemias, O direito autoral no show business: tudo o que você precisa saber. Rio de
Janeiro: Gryphus, 2000. vol. 1. p. 30.
178
BUGBEE, Bruce W. Genesis of American Patent and Copyright Law. Apud MERGES, Robert P.;
GINSBURG, Jane C. Foundations of Intellectual Property. New York: Foundation Press, 2004. p. 272.
179
BETTIG, Ronald V. Copyrighting Culture – The Political Economy of Intellectual Property. Oxford:
Westview Press, 1996. p. 13.
106
A história de Johann Gutenberg, tido como “pai da imprensa”, por outro lado, é
ilustrativa do compromisso do sistema jurídico não com o autor ou o inventor, mas com o
detentor do capital. Gutenberg desenvolveu as primeiras tecnologias de impressão mecânica
através da assistência de um capitalista-mercante Johann Fust, que terminou por apropriar-se
do invento quando Gutenberg não foi capaz de pagar os empréstimos recebidos para o
desenvolvimento de seus trabalhos. 180
180
BETTIG, Ronald V. Copyrighting Culture – The Political Economy of Intellectual Property. Oxford:
Westview Press, 1996. p. 15-16.
181
GOLDSTEIN, Paul. Copyright’s Highway – From Gutenberg to the Celestial Jukebox. California:
Stanford University Press, 2003. p. 32.
107
publicados e distribuídos. 182 Gradualmente, através dos anos, a própria Stationers Company
substituiu a polícia da coroa, recebendo atribuições de buscar, apreender e destruir trabalhos
não autorizados. A Stationer’s Company recebia os benefícios do monopólio sobre o mercado
literário editorial e a Coroa dispunha de uma máquina eficiente de censura. 183
Essa dinâmica ilustra bem os princípios originais do copyright que até hoje ainda
estão presentes no direito autoral: primeiro, trata-se de um conjunto de direitos e prerrogativas
outorgados pela via legislativa, não por um direito natural revelado; segundo, possuem efeitos
de conferir um verdadeiro monopólio ao detentor, permitindo que o mesmo fixe o preço de
aquisição da obra ou de acesso ao conhecimento nela consubstanciado, sem considerar as
pressões do mercado. 184
Esta situação perdurou até 1694, quando não foi renovado o Licencing Act, até
então vigente, que estabelecia as prerrogativas e o monopólio dos Stationers. Observe-se que
há um contexto político de reforma, onde as premissas de um sistema baseado em privilégios
aristocráticos entravam em choque com o modelo capitalista de mercado emergente.
Locke advogava uma limitação nos direitos dos atores sobre a publicação dos
livros como forma de preservação da própria literatura, ou seja, sua preocupação centrava-se
no fato de que o monopólio perpétuo estaria a comprometer a preservação de obras clássicas,
seja pela vedação de sua distribuição, seja pelo alto custo em razão da exclusividade de
reprodução. No memorando é ainda feita uma comparação com o mercado editorial na
Holanda, onde não existia um sistema de monopólio, enfatizando que as obras clássicas eram
distribuídas com grande qualidade e baixo custo em razão da competição entre os editores e
distribuidores. 186
182
VAIDHYANATHAN, Siva. Copyrights and Copywrongs. The Rise of Intellectual Property and How It
Threatens Creativity. New York: New York University Press, 2003. p. 37.
183
GOLDSTEIN, Paul. Copyright’s Highway – From Gutenberg to the Celestial Jukebox. California:
Stanford University Press, 2003. p. 33.
184
VAIDHYANATHAN, Siva. Op. cit. p. 38.
185
HUGHS, Justin. Locke’s 1694 Memorandum (and more Incomplete copyright historiographies).
Benjamin N. Cardozo School of Law. Working Paper No. 167. 2006. Disponível em:
<http://www.law.cardozo.edu/>. Acesso em: 08/08/08.
186
BETTIG, Ronald V. Copyrighting Culture – The Political Economy of Intellectual Property. Oxford:
Westview Press, 1996. p. 21.
108
Após anos de lobby, foi promulgado o Statute of Anne em 1710, também chamado
de Copyright Act, que é usualmente considerada como a primeira legislação sobre copyright.
Tal legislação auto-denominava-se como: “An act for the encouragement of learning, by
vesting the Copies of Printed Books in the Authors or Purchasers of such copies, during the
times therein mentioned.” 189
Tal legislação possui um aspecto talvez até mais relevante do que ser a primeira
legislação a estabelecer os direitos dos autores. Foi o primeiro momento onde ocorre a
codificação dos contornos do “domínio público”, ou seja, uma universalidade de trabalhos
produzidos a tempo suficiente para não mais sujeitarem-se ao controle individual,
pertencendo ao público e à própria cultura. 191
Após a expiração do prazo de proteção, qualquer novo autor estaria livre para
elaborar sobre trabalhos anteriores e qualquer editor poderia difundir o trabalho,
republicando-o em diferentes formatos e edições.
187
VAIDHYANATHAN, Siva. Copyrights and Copywrongs. The Rise of Intellectual Property and How It
Threatens Creativity. New York: New York University Press, 2003. p. 40.
188
GOLDSTEIN, Paul. Copyright’s Highway – From Gutenberg to the Celestial Jukebox. California:
Stanford University Press, 2003. p. 33.
189
Tradução Livre: “Um ato para o encorajamento do aprendizado, através da atribuição do direito de cópias de
livros impressos aos autores ou adquirentes de tais direitos, pelo tempo aqui mencionado”.
190
GOLDSTEIN, Paul. Op. cit. p. 34.
191
VAIDHYANATHAN, Siva. Op. cit. p. 40.
109
Não obstante o Statute of Anne conferisse direitos a autores, seu objetivo foi
limitar o crescente poder dos monopólios sobre o mercado literário. O estatuto também se
tornou um marco regulatório para o comércio de livros na medida em que permitiu a criação
de um mercado literário, onde qualquer indivíduo poderia publicar um trabalho desde que
com a devida autorização do autor.
Por sua vez, o Justice Yates rejeitou tal linha de argumentação em virtude do
caráter fugitivo das idéias e expressões intelectuais, utilizando dois relevantes argumentos
para corretamente enquadrar o debate: uma vez publicadas, as idéias e expressões seriam tão
do autor quanto um pássaro voluntariamente liberado das mãos do dono para a natureza.
192
GOLDSTEIN, Paul. Copyright’s Highway – From Gutenberg to the Celestial Jukebox. California:
Stanford University Press, 2003. p. 34.
110
A decisão não unânime foi favorável aos editores firmando-se um precedente com
base na common Law de um direito exclusivo e perpétuo dos autores aos seus trabalhos
literários.
Contudo, a história de tal poema não termina com Millar v. Taylor. Os direitos
sobre o poema foram alienados pelo espólio de Millar para um grupo de editores, nos quais
figurava Thomas Beckett como editor autorizado à publicação. Alexander Donaldson, por sua
vez, era um editor escocês que também publicou o poema de forma não autorizada, apelando
para as limitações previstas no Estatuto de Anne. Formou-se, então, o célebre caso Donaldson
v. Beckett, de 1774.
193
GOLDSTEIN, Paul. Copyright’s Highway – From Gutenberg to the Celestial Jukebox. California:
Stanford University Press, 2003. p. 40.
111
Tivesse o caso sido decidido de forma diferente, a própria evolução dos direitos
de copyright e direitos autorais seria alterada. Um modelo inglês de perpetuidade de direitos
de cópia traria significativa influência para a adoção de modelos legislativos similares, não só
nas colônias inglesas, como em várias outras nações.
Contudo, também se colocou uma grande ênfase na idéia de uma esfera pública de
discussão e participação política, social e cultural. A defesa dos direitos autorais não só era
vista como uma forma de reconhecimento individual, sendo ainda uma forma de contrapor o
sistema de privilégios do ancient regime.
194
CABRAL, Plínio. A nova lei de direitos autorais: comentários. 4. ed. São Paulo: Harbra, 2003. p. 16.
112
Conforme Luiz Francisco Rebello indica: “(...) até ao advento do século XVIII,
seria impróprio falar em direito de autor, pois a protecção dispensada às obras literárias
tomava invariavelmente a forma de privilégio que beneficiavam os impressores e os editores
e só muito excepcionalmente os autores”. 195
195
REBELLO, Luiz Francisco. Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos. 3. ed. Lisboa: Âncora
Editora, 2002. p. 9.
196
CHAVES, Antônio. Criador da obra intelectual. São Paulo: LTr, 1995. p. 43.
197
GUIBAULT, Lucie. Wrapping Information in Contract: How Does it Affect the Public Domain? In:
GUIBAULT, L; HUGENHOLTZ, P.B. (eds). The Future of the Public Domain. Amsterdam: Kluwer Law
International, 2006. p. 87-104. p. 89.
198
BÉCOURT, Daniel. The French Revolution and author’s rights: words a new universalism. In: UNESCO
Copyright Bulletin. Vol. XXIV. nº 4. p. 3-12. 1990. p. 5.
113
O domínio público pode ainda ser entendido como um conjunto de bens imaterias
que se constituem em uma coisa comum de todos (res communis omnium), razão pela qual
podem ser utilizadas livremente por quem quer que seja, com ou sem intuito de lucro. 200
Um domínio público pago, onde o Estado pode cobrar um efetivo tributo sobre a
utilização das obras não protegidas, evoca a idéia de que se estaria devolvendo um valor à
sociedade pela utilização da universalidade cultural comum como base para a criação de
novas obras.
Todas estas constatações servem para demonstrar que na gênese histórica dos
direitos autorais na França, os interesses e direitos da comunidade desempenhavam um papel
essencial na justificação da proteção jurídica aos trabalhos intelectuais.
199
BÉCOURT, Daniel. The French Revolution and author’s rights: words a new universalism. In: UNESCO
Copyright Bulletin. Vol. XXIV. nº 4. p. 3-12. 1990. p. 7.
200
SOUZA, Carlos Fernando M.. Direito autoral: legislação básica. Brasília: Livraria e Editora Brasília
Jurídica, 1998. p. 35.
201
GUIBAULT, Lucie. Wrapping Information in Contract: How Does it Affect the Public Domain? In:
GUIBAULT, L; HUGENHOLTZ, P.B. (eds). The Future of the Public Domain. Amsterdam: Kluwer Law
International, 2006. p. 87-104. p. 89.
202
ABRÃO, Eliane Y. Direitos de Autor e Direitos Conexos. São Paulo: Editora Brasil, 2002. p. 142.
203
GINSBURG, Jane. A Tale of Two Copyrights: Literary Property in Revolutionary France and America. In:
SHERMAN, B.; STROWEL, A. (Eds). Of Authors and Origins: Essays on Copyright Law. Oxford: Oxford
University Press, 1994. P. 131-159. p. 143.
114
O copyright e o direito autoral tentam dar conta desses avanços para regular a
interação social e adequadamente balancear os interesses e valores relevantes. José Carlos
Costa Netto aponta como se deram as respostas legislativas internacionais frente aos avanços
tecnológicos:
A concepção atual de direito prescreve que a ordem jurídica deve ser erigida em
torno da proteção ao autor e ao seu direito de propriedade sobre sua criação imaterial.
Tal retórica esquece-se de destacar que tão relevante quanto o gênio individual é a
existência de um horizonte cultural comum e rico, que é o verdadeiro interesse da sociedade.
Francisco Rabelo bem identifica o problema, referenciando a declaração de Laboulaye:
204
BITTAR, Carlos Alberto. Contornos atuais do direito de autor. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1999. p. 93.
115
A propriedade industrial, por sua vez, possuiu gênese e evolução paralela aos
direitos de copyright e direitos autorais, impactando em valores similares e acarretando
problemas análogos de igual relevância para a tutela jurídica do conhecimento.
205
REBELLO, Luiz Francisco. Introdução ao Direito de Autor. Lisboa: Dom Quixote, 1994. p. 32.
206
DINIZ, Davi Monteiro. Propriedade industrial e segredo em comércio. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p.
26.
207
CERQUEIRA, João Gama. Tratado da propriedade industrial. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1982. vol. 1. p. 55.
116
Uma gênese, ainda que incipiente, de um direito marcário pode ser identificada
em Roma e Grécia Antigas. Mesmo na antiguidade, já havia a preocupação com a distinção de
produtos e procedências para uma correta individualização dos mesmos, através de gravuras,
letras ou símbolos sobre os produtos.
208
BASSO, Maristela. O direito internacional da propriedade intelectual. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2000. p. 65.
209
DI BLASI, Gabriel. A propriedade industrial: os sistemas de marcas, patentes e desenhos industriais
analisados a partir da Lei n° 9.279, de 14 de maio de 1996. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 3.
210
DAVID, Paul A. The Evolution of Intellectual Property Institutions and the Panda’s Thumb. Meetings
of the International Economic Association in Moscow. Agosto/1992. Disponível em:
<http://www.compilerpress.atfreeweb.com/Anno%20David%20Evolution%20of%20IP%20Institutions%201992
.htm>. Acesso em: 03.07.08.
117
“We have among us men of great genius, apt to invent and discover ingenious
devices (...) Now, if provisions were made for the works and devices discovered by
such persons, so that others who may see them could not build them and take the
inventor’s honor away, more men would then apply their genius, would discover,
and would build devices of great utility to our commonwealth” 213
211
DI BLASI, Gabriel. A propriedade industrial: os sistemas de marcas, patentes e desenhos industriais
analisados a partir da Lei n° 9.279, de 14 de maio de 1996. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 4.
212
COOK, Curtis. Patents, Profits & Intellectual Property – How intellectual property rules the global
economy. London: Kogan Page, 2004. p. 14.
213
DAVID, Paul A. The Evolution of Intellectual Property Institutions and the Panda’s Thumb. Meetings
of the International Economic Association in Moscow. Agosto/1992. Disponível em:
<http://www.compilerpress.atfreeweb.com/Anno%20David%20Evolution%20of%20IP%20Institutions%201992
.htm>. Acesso em: 03.07.08. Tradução livre: “Temos entre nós homens de grande gênio, aptos a inventar e
descobrir inventos engenhosos (...) Agora, se provisões serão feitas para os trabalhos e engenhos destas pessoas,
de modo que outros não possam construir sobre estes e retirar a honra do inventor, mais homens virão a aplicar
seus gênios, realizar descobertas e elaborar inventos de grande utilidade para a comunidade”.
214
DAVID, Paul A. Op. cit.
118
215
DOMINGUES, Douglas Gabriel. Direito industrial: patentes. Rio de Janeiro: Forense, 1980. p. 9.
216
DAVID, Paul A. The Evolution of Intellectual Property Institutions and the Panda’s Thumb. Meetings
of the International Economic Association in Moscow. Agosto/1992. Disponível em:
<http://www.compilerpress.atfreeweb.com/Anno%20David%20Evolution%20of%20IP%20Institutions%201992
.htm>. Acesso em: 03.07.08.
217
CARVALHO, Nuno Tomaz Pires. As origens do Sistema Brasileiro de Patentes. Revista da ABPI, São
Paulo, n. 92, 3-20, jan/fev. 2008. p. 13. No caso, tratava-se de um monopólio sobre a comercialização de cartas
de baralhos.
218
CARVALHO DE MENDONÇA, José Xavier. Tratado de Direito Comercial Brasileiro. 4. ed. São Paulo:
Freitas Bastos, 1946. Vol. V. p. 116.
119
Tal legislação serviu ainda de modelo para diversos países europeus e da América
219
do Sul. Na própria Europa, por sua vez, diversas outras legislações patentárias foram
aprovadas em sequência, com destaque para: Austria (1810); Rússia (1812); Prússia (1815);
Bélgica (1817); Holanda (1817); Espanha (1820); Bavária (1825), Vaticano (1833); Suíça
(1834); Portugal (1837), Alemanha (1877).
Patentes não só possuem valor econômico como também podem ser utilizadas
como ferramentas estratégicas na conquista e manutenção de fatias do mercado.
219
CARVALHO DE MENDONÇA, José Xavier. Tratado de Direito Comercial Brasileiro. 4. ed. São Paulo:
Freitas Bastos, 1946. Vol. V. p. 118.
220
DOMINGUES, Douglas Gabriel. Direito industrial: patentes. Rio de Janeiro: Forense, 1980. p. 78.
221
COOK. Curtis. Patents, Profits & Intellectual Property – How intellectual property rules the global
economy. London: Kogan Page, 2004. p. 28.
222
COOK, Curtis. Op. cit. p. 23.
120
A própria ciência hoje desenvolvida, mesmo nas universidades, está cada vez
mais voltada para os interesses corporativos e puramente comerciais. A longa tradição de
223
LESSIG, Lawrence. The Future of Ideas – The Fate of the Commons in a Connected World. New York:
Vintage Books, 2002. p. 206. Tradução livre: “Se as pessoas tivessem entendido como as patentes seriam
conferidas quando a maioria das idéias atuais foram inventadas e tivesses elas próprias obtido patentes, a
industria estaria completamente estagnada hoje”.
224
LESSIG, Lawrence. Op. cit. p. 318. Tradução livre: “A solução (...) é a troca de patentes (...) e patentar o
máximo possível. Uma empresa iniciante sem patentes próprias será forçada a pagar qualquer preço que as
gigantes impuserem. Este preço poderá ser elevado: companhias já estabelecidas têm um interesse em excluir
futuros competidores”.
121
225
PERELMAN, Michael. Steal this Idea – Intellectual Property Rights and the Corporate Confiscation of
Creativity. New York: Palgrave Macmillan, 2004. p. 77.
226
BARBOSA, Denis Borges. Direito da Inovação – Comentários à Lei 10.973/2004, Lei Federal de
Inovação. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. xix.
227
THEOTONIO, Sérgio Barcelos. Proposta de Implementação de um Núcleo de Propriedade Intelectual e
Transferência de Tecnologia no CEFET/RJ. Dissertação de Mestrado. Mestrado em Tecnologia. Centro
Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca – CEFET/RJ. 2004. p. 56.
122
228
THEOTONIO, Sérgio Barcelos. Proposta de Implementação de um Núcleo de Propriedade Intelectual e
Transferência de Tecnologia no CEFET/RJ. Dissertação de Mestrado. Mestrado em Tecnologia. Centro
Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca – CEFET/RJ. 2004. p. 62.
229
PERELMAN, Michael. Steal this Idea – Intellectual Property Rights and the Corporate Confiscation of
Creativity. New York: Palgrave Macmillan, 2004. p. 85 et seq.
230
CORDER, Solange; SALLES-FILHO, Sérgio. Aspectos conceituais de financiamento à inovação. Revista
Brasileira de Inovação. Vol. 5, p. 33-76. jan/jul. 2006. p. 37.
231
TIGRE, Paulo Bastos. Gestão da inovação – A economia da tecnologia no Brasil. Rio de Janeiro: Elsevier,
2006. p. 41.
123
como produziu um dos primeiros trabalhos que destaca a importância das regras da proteção
da propriedade intelectual para o desenvolvimento econômico. 232
Por fim, outro paralelo importante com a evolução dos copyrights/direitos autorais
que pode ser identificado é a expansão do escopo dos direitos de exclusividade.
232
SCUDELER, Marcelo Augusto. Patentes e sua Função Social. Dissertação de Mestrado. Universidade
Metodista de Piracicaba. Piracicaba. 2007. p. 127.
233
BORTEN, George Alberto. Inovação e Educação Tecnológica: O Caso das Patentes. Dissertação de
Mestrado. Mestrado em Tecnologia. Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais – CEFET/RJ.
2006. p. 16.
124
Art. 8º Não são objeto de proteção como direitos autorais de que trata esta Lei:
I - as idéias, procedimentos normativos, sistemas, métodos, projetos ou conceitos
matemáticos como tais;
II - os esquemas, planos ou regras para realizar atos mentais, jogos ou negócios;
III - os formulários em branco para serem preenchidos por qualquer tipo de
informação, científica ou não, e suas instruções;
IV - os textos de tratados ou convenções, leis, decretos, regulamentos, decisões
judiciais e demais atos oficiais;
V - as informações de uso comum tais como calendários, agendas, cadastros ou
legendas;
VI - os nomes e títulos isolados;
VII - o aproveitamento industrial ou comercial das idéias contidas nas obras.
Tais limitações são necessárias sob pena de ser possível, através do sistema de
propriedade intelectual, um controle jurídico privado de elementos que compõe o horizonte
cultural e científico comum da humanidade.
Além disso, a noção de que devem existir limitações acompanha a história das
doutrinas de propriedade intelectual e revela um entendimento comum por parte das diversas
125
ordens jurídicas de que certos tipos de informação – fatos, idéias, fórmulas físicas e
matemáticas, alfabetos, linguagens - devem permanecer no domínio público, ou seja,
acessíveis a todos em razão de um interesse social, bem como para evitar os efeitos sociais
nocivos dos monopólios. 234
Utiliza-se a expressão de usos patológicos, pois estes podem ser vistos como usos
doentios. Vão de encontro com os valores que o sistema de propriedade intelectual deveria
promover e consubstanciando-se em verdadeiros obstáculos ao desenvolvimento.
234
BACA, Megan Ristau. Barriers to Innovation: Intellectual Property Transaction Costs in Scientific
Collaboration. Duke Law & Technology Review. Vol. 4. 2006. Disponível em:
<http://www.law.duke.edu/papers/>. Acesso em: 08/08/08.
235
HYDE, Lewis. Frames from the Framers: How America’s Revolutionaries Imagined Intellectual
Property. Berkman Center for Internet and Society. Harvard University. Disponível em:
<http:cyber.law.harvard.edu/ files/2005_LewisHyde_FramesfromtheFramers_0.>. Acesso em: 13.07.08.
Tradução livre: “Se eu observei longe é porque estava nos ombros de gigantes.” / “Em comparação com os
antigos, somos como que anões nos ombros de gigantes”.
126
236
Parke-Davis & Co. v. H.K. Mulford Co., 189 F. 95 (S.D.N.Y. 1911).
237
BACA, Megan Ristau. Barriers to Innovation: Intellectual Property Transaction Costs in Scientific
Collaboration. Duke Law & Technology Review. Vol. 4. 2006. Disponível em:
<http://www.law.duke.edu/papers/>. Acesso em: 08/08/08.
238
Diamond v. Chakrabarty, 447 U.S. 303, 310 (1980).
239
CHAKRABARTY, Ananda M.; Patenting Life Forms – From Concept to Reality. In: MAGNUS, David;
CAPLAN, Arthur e MCGEE, Glenn (eds.). Who Owns Life? New York: Prometheus Books, 2002. p. 17-24.
p.22.
240
BOLLIER, David. Brand Name Bullies – The Quest to Own and Control Culture. New Jersey: John
Wiley & Sons, Inc., 2005. p. 230.
127
96/9/EC sobre a proteção legal de databases, estabelecendo formas sui generes de proteção
que vão além da simples compilação, estendendo-se aos próprios fatos que compõe o
trabalho. 241
Com efeito, é salutar o estudo de casos em que ocorreram distorções para que a
política legislativa a ser adotada no Brasil e a própria praxe interpretativa das diversas
doutrinas da propriedade intelectual sejam adequadas aos valores e objetivos
constitucionalmente preconizados.
241
BACA, Megan Ristau. Barriers to Innovation: Intellectual Property Transaction Costs in Scientific
Collaboration. Duke Law & Technology Review. Vol. 4. 2006. Disponível em:
<http://www.law.duke.edu/papers/>. Acesso em: 08/08/08.
128
Nacional das Escoteiras direitos autorais pelas canções tradicionalmente cantadas em volta
das fogueiras nos acampamentos. 242
Somente após fortes críticas da opinião pública, a ASCAP voltou atrás em sua
posição, permitindo que as escoteiras voltassem a cantar as composições em volta das
fogueiras. Contudo, não se tratou do reconhecimento de um direito legítimo das escoteiras
frente ao direito autoral /copyright. Na visão da ASCAP tratou-se de uma liberalidade, uma
indulgência que se mantém até os dias atuais.
Em 1999, a Mattel Inc, empresa que produz a boneca Barbie, processou o artista
Tom Forsythe, pela produção de uma série de fotografias onde colocava bonecas Barbie em
situações inusitadas – dentro de garrafas de champanhe, no forno do fogão, dentro de
alimentos, em posições sexuais, etc.
Não obstante a clara utilização legítima como crítica cultural, a empresa Mattel
promoveu demanda em face do artista - Mattel Inc. v. Walking Moutain Produtions 244 –
alegando pretensas violações em direitos de copyright e trademark.
242
BOLLIER, David. Brand Name Bullies – The Quest to Own and Control Culture. New Jersey: John
Wiley & Sons, Inc., 2005. p. 14.
243
BOLLIER, David. Op. cit. p. 89.
244
353 F.3d 792 (9th Cir. 2003)
129
2003, foi dado um veredicto final pela Corte do Nono Circuito Federal, que reconheceu a
utilização artística como fair use.
O ponto a se destacar é que, não obstante ser uma ação perdida do ponto de vista
técnico, a empresa Mattel não hesitou em gastar milhões de dólares para proteger uma marca
que lhe garante retornos anuais na ordem de bilhões de dólares.
Além disso, essa postura agressiva e litigiosa serve, claramente, para desencorajar
novos artistas a contribuir para o debate cultural utilizando toda a carga de sentido que gravita
em torno da boneca. O sistema jurídico torna-se uma potente arma a ser utilizada por grandes
corporações com ativos intelectuais para desencorajar o discurso artístico eventualmente
depreciativo de seus produtos.
O caso chegou à Suprema Corte Americana 245 e num julgamento de sete contra
dois votos, foi decidido que a exclusividade de utilização da palavra refletia uma restrição à
liberdade de expressão. A corte ainda afirmou que dada a natureza não governamental do
Comitê Olímpico, os direitos civis de não-discriminação por parte dos órgãos e agências
governamentais não seriam aplicáveis.
O ponto a ser destacado é que, não obstante o termo Olimpíada evocar valores de
aceitação e fraternidade entre povos e grupos, o termo encontra-se sob controle legal
245
San Francisco Arts & Athletics, Inc. v. United States Olympic Committee - S.F. Arts & Athletics, Inc. v.
USOC, 483 U.S. 522 (1987).
130
Sendo o repositório principal dos Estados Unidos, por diversas vezes utilizou seu
poderio econômico e de demandas evolvendo argumentos de copyright para limitar o acesso
de novas empresas que desejavam publicar ou oferecer informações sobre os casos.
decisões jurisdicionais de toda a história de uma nação seria legalmente controlado por uma
corporação em detrimento do livre acesso dos cidadãos ao próprio direito.
A erosão das barreiras dos direitos de propriedade intelectual também se faz sentir
de forma intensa na seara da biotecnologia. Para McLeod, “ (...) much of what we hear from
the mainstream media is a coded neoliberalist message that says everything should be up for
sale, including our genetic heritage: our bodies, our selves.” 248
248
MCLEOD, Kembrew. Freedom of Expression – Resistance and Repression in the Age of Intellectual
Property. Minneapolis: University of Minessota Press, 2007. p. 36.Tradução livre: ““(…) muito do que ouvimos
da mídia é uma mensagem neoliberalista codificada que diz que tudo está a venda, incluindo nossa herança
genética: nossos corpos, nos mesmos”.
249
1990. 51 Cal.3d 120, 793 P.2d 479, 271 Cal.Rptr. 146.
250
MCLEOD, Kembrew. Op. cit. p. 5.
132
Observe-se que no processo reprodutivo das plantas, o pólen é carregado pelo ar,
ocorrendo uma polinização cruzada na lavoura de Schmeiser. Com efeito, progressivamente,
o fazendeiro descobriu que parte de sua lavoura também apresentava características tais quais
as sementes comercializadas pela Monsanto.
A empresa, então, moveu uma ação judicial argüindo a violação de patente, tendo
em vista que Percy Schmeiser não adquiriu a licença de utilização de sementes com o gene
patenteado da Monsanto.
251
[2004] 1 S.C.R. 902, 2004 SCC 34.
252
MCLEOD, Kembrew. Freedom of Expression – Resistance and Repression in the Age of Intellectual
Property. Minneapolis: University of Minessota Press, 2007. p. 51.
133
já é uma realidade, tais elementos orgânicos poderiam, em tese, ser de titularidade diversa do
próprio indivíduo.
4.3.7 Gottschalk v. Benson; Diamond v. Diehr; State Street Bank & Trust Co. v.
Signature Financial Group, Inc.,.
O caso Diamond v. Diehr 254 foi levado a apreciação da Suprema Corte Americana
em virtude do pedido de uma patente para software. O programa em questão viabilizava o
controle da abertura de uma câmara de tratamento de borracha artificial, repetindo
incessantemente o cálculo de um algoritmo orientado por dados de sensores de pressão e
temperatura.
253
409 U.S. 63 (1972).
254
450 U.S. 175 (1981).
134
Por fim, no caso State Street Bank & Trust Co. v. Signature Financial Group,
255
Inc. , decidido pela Corte de Apelações do Circuito Federal, originou-se a possibilidade de
se patentear business methods, ou seja, modelos de negócios implementados por softwares.
Obteve-se o direito de patentear um sistema computadorizado de contabilidade a ser utilizado
no controle da estrutura de um fundo mútuo de investimentos.
4.3.8 Sony Corp. of America v. Universal City Studios, Inc.; A&M Records, Inc. v.
Napster, Inc. e MGM Studios, Inc. v. Grokster, Ltd.
No caso Sony Corp. of America v. Universal City Studios, Inc. 257, conhecido como
“Caso Betamax”, foi um importante julgado da Suprema Corte Americana.
Num julgamento polêmico, com uma decisão de cinco contra quatro votos em
favor da Sony, foi determinando que a venda de gravadores de vídeo não gerava
responsabilização do fabricante pelas utilizações violadoras de copyrights por parte dos
usuários finais.
255
149 F.3d 1368.
256
WACHOWICZ, Marcos. Propriedade Intelectual do Software & Revolução da Tecnologia da
Informação. Curitiba: Juruá Editora, 2004. p. 134.
257
464 U.S. 417 (1984).
258
BETTIG, Ronald V. Copyrighting Culture – The Political Economy of Intellectual Property. Oxford:
Westview Press, 1996. p. 159.
135
Dois casos paradigmáticos ampliam a proteção dos bens intelectuais em favor dos
titulares corporativos. Os casos A&M Records, Inc. v. Napster, Inc 260. e MGM Studios, Inc. v.
Grokster, Ltd. 261, tratam da responsabilidade de desenvolvedores de tecnologias peer-to-peer,
que permitem a troca descentralizada de arquivos pela Internet diretamente entre usuários.
Não obstante o destaque que tais casos receberam da mídia ter gravitado em torno
de questões como pirataria, troca de músicas e filmes pela internet, outras questões que não
receberam a devida atenção na opinião pública são possivelmente mais importantes.
259
BETTIG, Ronald V. Copyrighting Culture – The Political Economy of Intellectual Property. Oxford:
Westview Press, 1996. p. 176.
260
239 F.3d 1004 (9th Cir. 2001).
261
545 U.S. 913 (2005).
136
Ronaldo Lemos situa o DMCA como uma antítese aos preceitos de liberdade que
vigoravam na expansão da internet durante a década de noventa:
Um dos primeiros produtos dessa antítese à liberdade inicial quase absoluta foi o
Digital Millennium Copyright Act (DMCA), um texto normativo adotado nos
Estados Unidos em 1998, com o objetivo de modificar o regime de proteção à
propriedade intelectual, mais especificamente os direitos autorais, no sentido de
combater a facilidade de cópia, de circulação e, conseqüentemente, de violação de
direitos autorais, trazida pela conjugação da tecnologia digital com a Internet.
As disposições do DMCA ampliaram de forma significativa os tradicionais limites
do direito autoral, tais como forjados no século XIX. Como exemplo dessa
ampliação, o DMCA criminalizou quaisquer iniciativas que tivessem por objetivo
violar mecanismos técnicos de proteção à propriedade intelectual, isto é, bens
intelectuais, na forma digital porventura implantados. 262
A utilização patológica pode ser identificada com os excessos que tal legislação
permite aos titulares de propriedade intelectual.
262
LEMOS, Ronaldo. Direito, Tecnologia e Cultura. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2005. p. 32.
137
informação sobre o sistema de segurança ou sobre os estudos realizados deveria ser removida
do seminário e destruída sob pena de responsabilização nos termos do DMCA. 263
O que esta legislação faz é inverter o juízo do que seja um uso legítimo – fair use
– de informações e trabalhos protegidos para os titulares dos mesmos. O problema com essa
inversão é que o DMCA se torna uma ferramenta para prevenir críticas.
Note-se ainda que, na maioria das vezes, os titulares de direitos intelectuais são
grandes corporações e a simples ameaça de um litígio judicial é suficiente para que os
provedores retirem da rede os sites de usuários que fazem uso de referências a conteúdos
protegidos, ainda que com finalidades lícitas ou legítimas, usos acadêmicos, críticas, paródias,
etc. 265
263
PERELMAN, Michael. Steal this Idea – Intellectual Property Rights and the Corporate Confiscation of
Creativity. New York: Palgrave Macmillan, 2004. p. 196.
264
MCLEOD, Kembrew. Freedom of Expression – Resistance and Repression in the Age of Intellectual
Property. Minneapolis: University of Minessota Press, 2007. p. 216.
265
MCLEOD, Kembrew. Op. cit. p. 217.
138
“contornar” medidas de segurança digital, também previne que empresas possam usar
engenharia reversa para fazer produtos genéricos compatíveis. 266
266
BOLLIER, David. Brand Name Bullies – The Quest to Own and Control Culture. New Jersey: John
Wiley & Sons, Inc., 2005. p. 188.
267
387 F.3d 522 (6th Cir. 2004).
268
BOLLIER, David. Op. cit. p. 189.
269
CHRISTIE, Andrew; WALLER, Sophie; WEATHERALL, Kimberlee. Exportando os dispositivos da “US
Digital Millennium Copyright Act” por meio de acordos de livre-comércio. In: RODRIGUES JR, Edson Beas;
POLIDO, Fabrício. (Orgs.). Propriedade Intelectual – Novos Paradigmas Internacionais, Conflitos e
Desafios. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007. p. 185-200. p. 198.
139
novas patentes cumulativas sobre diversos aspectos da invenção original. 270 Para Gustavo
Fávaro Arruda e Pablo de Camargo Cerdeira:
para as empresas, pois se traduz na manutenção de uma reserva de mercado por um tempo
superior ao que, segundo a legislação, seria o adequado para garantir o interesse privado na
exploração da patente, do interesse público no produto e na divulgação do conhecimento
correlacionado.
Em 1998, foi proposta uma nova extensão, o Sonny Bono Copyright Extension
Act, também conhecido como Mickey Mouse Protection Act, em virtude da Disney
Corporation ter sido a responsável por um agressivo lobby junto ao Congresso Americano 277.
Na Câmara dos Deputados Americana, dez dos treze, e no Senado Americano, oito dos doze
sponsors originais do projeto de lei receberam contribuições de campanha da Disney
Corporation. 278
Nesse contexto, surge o landmark case Eldred v. Ashcroft 280, onde foi questionada
a constitucionalidade do Sonny Bono Copyright Extension Act.
275
17 U.S.C. sec 101. § 201, b. No original: A Work Made For Hire - In the case of a work made for hire, the
employer or other person for whom the work was prepared is considered the author for purposes of this title,
and, unless the parties have expressly agreed otherwise in a written instrument signed by them, owns all of the
rights comprised in the copyright.
276
ROCHA, Afonso P. P. A Relação de Trabalho e a Tutela da Propriedade Intelectual em Tempos de
Teletrabalho e de Parassubordinação. XV Congresso Nacional do CONPEDI, 2006, Manaus. Anais do XV
Encontro Nacional do CONPEDI - Manaus. Florianópolis: Fundação José Arthur Boiteux. 2006.
277
Caso não fosse aprovada a extensão, o personagem Mickey Mouse viria a ingressar no domínio público.
278
LESSIG, Lawrence. Free Culture – The Nature and Future of Creativity. New York: Penguin Books,
2005. p. 218.
279
LESSIG, Lawrence. Op. cit. p. 218.
280
537 U.S. 186 (2003).
142
o domínio público, ao passo que naquele mesmo ano, mais de um milhão de patentes iriam
expirar. 281
281
LESSIG, Lawrence. Free Culture – The Nature and Future of Creativity. New York: Penguin Books,
2005. p. 214.
282
No original: "The Congress shall have Power (...) To promote the Progress of Science and useful Arts, by
securing for limited Times to Authors and Inventors the exclusive Right to their respective Writings and
Discoveries;”
143
Toda uma universalidade de outros trabalhos como livros, filmes e músicas cuja
vida comercial útil dura apenas alguns anos após sua criação ficam “presos”, impossibilitados
de utilização por parte de novos criadores em virtude da proteção legal.
283
Inteiro teor da decisão da maioria e os votos divergentes do caso estão disponíveis em:
<http://www.copyright.gov/pr/eldred.html>. Acesso em: 04/08/08.
144
284
OLIAR, Dotan. Making Sense of the Intellectual Property Clause: Promotion of Progress as a Limitation on
Congress’s Intellectual Property Power. The Georgetown Law Journal. Vol. 94. p. 1771-1845. 2006. p. 1774.
5 PERFIL CONSTITUCIONAL DA PROPRIEDADE INTELECTUAL
5.1 Breve Histórico da Propriedade Intelectual no Ordenamento
Jurídico Brasileiro
O Brasil foi uma das primeiras nações a adotar proteção patentária. Antes mesmo
da independência foi editada a primeira legislação sobre invenções industriais, por meio do
alvará de 28 de abril de 1809, através do qual o príncipe regente conferia aos inventores a
exclusividade no uso de suas criações desde que devidamente registradas junto a então
existente Junta Real do Comércio.
IV. Sendo o meio mais conveniente para promover a indústria de qualquer ramo
nascente, e que vai tomando maior aumento pela introdução de novas máquinas
dispendiosas, porém, utilíssimas, e conferir-se-lhe algum cabedal, que anime o
Capitalista que empreende promover uma semelhante fábrica, vindo a ser esta
concessão um dom gratuito que lhe faz o Estado: sou servido ordenar que da Loteria
Nacional do Estado, que anualmente quero se estabeleça, se tire em cada ano uma
soma de sessenta mil cruzados, que se consagre, ou toda junta, ou separadamente, a
favor daquelas manufaturas e artes, que mais necessitarem deste socorro,
particularmente das de lã, algodão, seda e fábricas de ferro e aço. E as que
receberem este dom gratuito não terão obrigação de o restituir, e só ficarão
obrigadas a contribuir com maior desvelo para o aumento da fábrica que assim for
socorrida por efeito da minha real consideração para o bem público. E para que estas
distribuições se façam anual e impreterivelmente, a Real Junta do Comércio, dando-
me todos os anos um fiel e exato quadro de todas as manufaturas do Reino, apontará
as que merecem mais esta providência e a soma que lhes deve aplicar.
285
Inteiro teor do Alvará de 1809 disponível em: <htpp://www.inpi.gov.br/>. Acesso em: 08/08/08.
146
adoção de um sistema estatutário de proteção por tempo limitado. Utilizava o mesmo lapso
temporal do Estatuto dos Monopólios inglês, quatorze anos.
Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros,
que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida
pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte.
(...)
XXVI. Os inventores terão a propriedade das suas descobertas, ou das suas
producções. A Lei lhes assegurará um privilegio exclusivo temporário, ou lhes
remunerará em ressarcimento da perda, que hajam de sofrer pela vulgarização.
286
CHAVES, Antônio. Criador da obra intelectual. São Paulo: LTr, 1995. p. 46.
287
SOUZA, Allan Rocha. A Função Social dos Direitos Autorais. Campos dos Goytacazes: Ed. Faculdade de
Direito de Campos, 2006. p. 46.
147
288
CARVALHO DE MENDONÇA, José Xavier. Tratado de Direito Comercial Brasileiro. 4. ed. São Paulo:
Freitas Bastos, 1946. Vol. V. p. 118.
289
ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito Autoral. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1997. p. 12.
148
18) Os inventos industriais pertencerão aos seus autores, aos quais a lei garantirá
privilégio temporário ou concederá justo prêmio, quando a sua vulgarização
convenha à coletividade.
19) É assegurada a propriedade das marcas de indústria e comércio e a exclusividade
do uso do nome comercial.
20) Aos autores de obras literárias, artísticas e científicas é assegurado o direito
exclusivo de produzi-Ias. Esse direito transmitir-se-á aos seus herdeiros pelo tempo
que a lei determinar.
O padrão foi quebrado com a Constituição de 1937 que não tratou da propriedade
intelectual, embora tenha referenciado a competência da União para legislar sobre direito
autoral.
Numa dicção mais atual, havia uma expressa previsão para uma “desapropriação”
dos direitos de propriedade industrial caso estes fossem mais eficientes ao interesse social no
domínio público.
Em 1967, essa previsão expressa cessou de existir, sendo a tutela dos bens
intelectuais exercida somente através de direitos exclusivos, o que denota uma progressiva
“patrimonialização” em detrimento de sua função social ou do interesse social.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
[...]
XXII - é garantido o direito de propriedade
XXIII – a propriedade atenderá sua função social;
150
Art. 5º (...)
[...]
XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou
reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar;
XXVIII - são assegurados, nos termos da lei:
a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da
imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas;
b) o direito de fiscalização do aproveitamento econômico das obras que criarem
ou de que participarem aos criadores, aos intérpretes e às respectivas representações
sindicais e associativas;
XXIX - a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário
para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das
marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o
interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País; (grifado e
negritado)
Relevante ainda destacar quanto à função social da propriedade, que esta funciona
como razão de ser do direito correlato. Gustavo Tepedino esclarece a derivação de existência
da propriedade de sua função social:
290
TEPEDINO, Gustavo. Contornos constitucionais da propriedade privada. In: Temas de Direito Civil. 2. Ed.
Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 287-286. p. 281-282.
151
(...) normas constitucionais através das quais o constituinte, em vez de regular, direta
e imediatamente, determinados interesses, limitou-se a traçar-lhes os princípios para
serem cumpridos pelos seus órgãos (legislativos, executivos, jurisdicionais e
administrativos), como programas das respectivas atividades, visando à realização
dos fins sociais do Estado. 293
291
SILVA, José Afonso. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 1998.
292
BERCOVICI, Gilberto. A problemática da constituição dirigente: algumas considerações sobre o caso
brasileiro. In: Revista de Informação Legislativa. Brasília a. 36 n. 142 p. 35-52. abr./jun. 1999. p. 36.
293
SILVA, José Afonso. Op. cit. p. 138.
152
algo apenas de cunho econômico não possuindo uma relevância enquanto direito
fundamental.
294
SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 17. ed. São Paulo: Melhoramentos, 2005. p.
245.
295
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. 3a ed. São Paulo:
Saraiva, 2000. Vol. 1. p. 51
296
BERCOVICI, Gilberto. O princípio da unidade da Constituição. In: Revista de Informação Legislativa.
Brasília a. 37 n. 145. p. 95-99. jan./mar. 2000. p. 97.
153
O texto constitucional brasileiro, por sua vez, adota expressões não uniformes,
como “direitos humanos” (art. 4º, inciso II), “direitos e garantias fundamentais” (Título II, e
art. 5º, §1º), “direitos e liberdades constitucionais” (art. 5º, inc. LXXI) e “direitos e garantias
individuais” (art. 60, § 4º, inciso IV).
Os direitos fundamentais seriam, por sua vez, a referência aos direitos positivados
em uma determinada ordem constitucional.300 A nota distintiva seria a positivação e a
possibilidade de efetivação processual de tais direitos, enquanto partes de um determinado
ordenamento jurídico-constitucional. 301
297
SAMPAIO, José Adércio Leite. Direitos Fundamentais. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 7.
298
PÉREZ LUÑO, Antônio-Henrique. Los Derechos Fundamentales. 9. ed. Madri: Tecnos, 2007. p. 29.
299
PECES-BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Curso de derechos fundamentales. Madri: Universidad Carlos III,
1999. p. 22.
300
SAMPAIO, José Adércio Leite. Direitos Fundamentais. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 8.
301
ROBLES, Gregório. Os direitos fundamentais e a ética na sociedade atual. São Paulo: Manole, 2005. p. 6.
154
Verifica-se certo grau de consenso quanto aos direitos que possuiriam essa
fundamentalidade, como: direito a vida, direito a liberdade, direito a igualdade, pois
gravitaram ao redor destes ideais os movimentos políticos que deram lugar às enunciações de
direitos tidos por universais e humanos.
302
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direitos Humanos Fundamentais. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 13.
303
GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo constitucional e direitos fundamentais. São Paulo: Celso
Bastos Editor, 1999. p. 38.
304
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7. ed. Coimbra:
Almedina, 2003. p. 378.
305
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Op.cit. p. 378-379.
306
SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 6. ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2005. p. 86-87.
155
Não obstante o Preâmbulo Constitucional não possua força normativa tal qual os
dispositivos constitucionais 308, funciona como uma introdução ao texto constitucional e
permite inferir quais as ideologias que animaram o poder constituinte originário.
307
OLSEN, Ana Carolina Lopes. A Eficácia dos Direitos Fundamentais Sociais frente à Reserva do Possível.
Dissertação de Mestrado. Mestrado em Direito. Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná.
Curitiba. 2006. p. 5.
308
ADI 2.076, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 15-8-02, DJ de 08/08/03.
156
Desse valor supremo decorre que a Constituição Federal de 1988 foi inspirada por
uma ideologia desenvolvimentista, correlacionada com a superação das desigualdades e
promoção do acesso de todos os indivíduos aos benefícios produzidos pelo progresso
tecnológico e cultural. 309
309
ARAÚJO, Sérgio Luiz Souza. O Preâmbulo da Constituição brasileira de 1988 e sua ideologia. In: Revista de
Informação Legislativa. Brasília a. 36 n. 143. p. 5-14. jul./set. 1999. p.10.
157
310
CAMPOS DA SILVA, Guilherme Amorim. Direito Fundamental ao Desenvolvimento Econômico
Nacional. São Paulo: Método, 2004. p.67.
311
Adotada pela Revolução n.º 41/128 da Assembléia Geral das Nações Unidas, de 4 de dezembro de 1986.
312
BARBOSA, Denis Borges. Direito ao desenvolvimento, inovação e a apropriação das tecnologias. Revista
Jurídica. Brasília, v. 8, n. 83, p.31-50, fev./mar., 2007. p. 37.
313
GARCIA, Balmes Vega. Direito e Tecnologia – Regime Jurídico da Ciência, Tecnologia e Inovação. São
Paulo: LTr, 2008. p. 115.
314
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 523.
158
possível o conjunto de direitos que deveriam ser respeitados por todos os povos, sob pena da
ocorrência de novas atrocidades. Nessa linha de raciocínio, fica claro o conteúdo da
mensagem presente no preâmbulo da declaração:
Artigo 27°
1. Toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da
comunidade, de fruir as artes e de participar no progresso científico e nos
benefícios que deste resultam.
2. Todos têm direito à protecção dos interesses morais e materiais ligados a
qualquer produção científica, literária ou artística da sua autoria. 317
316
Universal Declaration of Human Rights. Aprovada e adotada pela Resolução 217 A (III) de 10 de dezembro
de 1948. No original: Whereas recognition of the inherent dignity and of the equal and inalienable rights of all
members of the human family is the foundation of freedom, justice and peace in the world, Whereas disregard
and contempt for human rights have resulted in barbarous acts which have outraged the conscience of mankind,
and the advent of a world in which human beings shall enjoy freedom of speech and belief and freedom from
fear and want has been proclaimed as the highest aspiration of the common people,
317
Universal Declaration of Human Rights. No original: Article 27.(1) Everyone has the right freely to
participate in the cultural life of the community, to enjoy the arts and to share in scientific advancement and its
benefits. (2) Everyone has the right to the protection of the moral and material interests resulting from any
scientific, literary or artistic production of which he is the author.
160
Nesse ponto, constata-se que o artigo 27 não foge da tensão e contraponto básico
que permeiam os direitos de propriedade intelectual, o perfil duplo de tais direitos – público e
privado. Faz-se necessária à proteção dos interesses individuais, porém como forma de
benefício da sociedade como um todo.
O segundo item do artigo 27, por sua vez, foi objeto de intensos debates,
especialmente pelo fato do sistema anglo-americano de proteção aos direitos literários – o
copyright – enfatizar a proteção no caráter econômico de tais direitos, em contraponto ao
regime continental europeu – o droit d’auter.
318
YU, Peter K. Reconceptualizing Intellectual Property Interests in a Human Rights Framework. In: UC Davis
Law Review Symposium – Intellectual Property & Social Justice. Vol. 40. p. 1039-1149. 2006. p. 1052.
319
YU, Peter K. Op.cit. 2006. p. 1054.
161
naquele momento histórico, os Estados Unidos ainda não eram signatários da Convenção de
Berna, que preconizava uma proteção ao autor também num viés de cunho moral. 320
A declaração dos direitos humanos é, portanto, outro forte argumento para que os
direitos de propriedade intelectual sejam repensados sob uma ótica de direitos humanos e com
todas as implicações que esta possui.
Artigo 15 –
1. Os Estados-Partes no presente Pacto reconhecem a cada indivíduo o direito de:
a) Participar da vida cultural;
b) Desfrutar o progresso científico e suas aplicações;
c) Beneficiar-se da proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de toda a
produção científica, literária ou artística de que seja autor.
2. As medidas que os Estados-Partes no presente Pacto deverão adotar com a
finalidade de assegurar o pleno exercício desse direito incluirão aquelas
necessárias à conservação, ao desenvolvimento e à difusão da ciência e da
cultura.
3. Os Estados-Partes no presente Pacto comprometem-se a respeitar a liberdade
indispensável à pesquisa e à atividade criadora.
4. Os Estados-Partes no presente Pacto reconhecem os benefícios que derivam do
fomento e do desenvolvimento da cooperação e das relações internacionais no
domínio da ciência e da cultura.
(grifado e negritado)
320
AVANCINI, Helenara Braga. Direitos Humanos Fundamentais na Sociedade da Informação. Grupo de
Pesquisa Prismas do Direito Civil-Constitucional da PUCRS. Disponível em:
<http://bdjur.stj.gov.br/dspace/bitstream/2011/1937/1/Direitos_Humanos_Fundamentais.pdf>. Último acesso em
13.07.08.
162
itens subseqüentes são complementares e visam a garantir uma efetividade mínima perante as
nações signatárias.
Somente na terceira alínea é que se faz referência aos direitos de desfrutar dos
benefícios de ordem moral e patrimonial sobre as criações particulares. Esse sistema de
proteção de interesses morais e patrimoniais é, exatamente, o sistema de propriedade
intelectual.
Saliente-se que os tratados não delimitam a forma como se fará essa tutela
jurídica, ou seja, no âmbito internacional, em tese, sequer é necessária a atribuição de direitos
exclusivos ou de propriedade.
(...) ressalta-se que não há direitos humanos sem que os direitos econômicos,
sociais e culturais estejam garantidos.
Isto é, em face da indivisibilidade dos direitos humanos, há de ser definitivamente
afastada a equivocada noção de que uma classe de direitos (a dos direitos civis e
políticos) merece inteiro reconhecimento e respeito, enquanto outra classe de
163
321
PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Propriedade Intelectual. 2007. Disponível em:
<http://www.culturalivre.org.br>. Acesso em: 08/08/08. p. 10-11.
322
General Comment No. 17 de 12/01/2006. Documento E/C.12/GC/17. Disponível em:
<http://www.unhchr.ch/tbs/doc.nsf/(Symbol)/E.C.12.GC.17.En?OpenDocument>. Acesso em: 08/08/08.
164
The right of authors to benefit from the protection of the moral and material
interests resulting from their scientific, literary and artistic productions cannot be
isolated from the other rights recognized in the Covenant. States parties are
therefore obliged to strike an adequate balance between their obligations under
article 15, paragraph 1 (c), on one hand, and under the other provisions of the
Covenant, on the other hand, with a view to promoting and protecting the full range
of rights guaranteed in the Covenant.
In striking this balance, the private interests of authors should not be unduly
favoured and the public interest in enjoying broad access to their productions
should be given due consideration. States parties should therefore ensure that
their legal or other regimes for the protection of the moral and material interests
resulting from one’s scientific, literary or artistic productions constitute no
impediment to their ability to comply with their core obligations in relation to the
rights to food, health and education, as well as to take part in cultural life and to
enjoy the benefits of scientific progress and its applications, or any other right
enshrined in the Covenant. Ultimately, intellectual property is a social product
and has a social function. States parties thus have a duty to prevent
unreasonably high costs for access to essential medicines, plant seeds or other
means of food production, or for schoolbooks and learning materials, from
undermining the rights of large segments of the population to health, food and
education. Moreover, States parties should prevent the use of scientific and
technical progress for purposes contrary to human rights and dignity,
including the rights to life, health and privacy, e.g. by excluding inventions from
patentability whenever their commercialization would jeopardize the full
realization of these rights
States parties should also consider undertaking human rights impact assessments
prior to the adoption and after a period of implementation of legislation for the
protection of the moral and material interests resulting from one’s scientific,
literary or artistic productions. 323 (grifado e negritado)
323
General Comment No. 17 de 12/01/2006. Documento E/C.12/GC/17. Disponível em:
<http://www.unhchr.ch/tbs/doc.nsf/(Symbol)/E.C.12.GC.17.En?OpenDocument>. Acesso em: 08/08/08. Na
versão original da Resolução em Espanhol: “El derecho de los autores e inventores a beneficiarse de la
protección de los intereses morales y materiales que les correspondan por razón de sus producciones científicas,
literarias y artísticas no puede considerarse independientemente de los demás derechos reconocidos en El Pacto.
Por consiguiente, los Estados Partes tienen la obligación de lograr un equilibrio entre lãs obligaciones que les
incumben en el marco del apartado c) del párrafo 1 del artículo 15, por um lado, y las que les incumben en el
marco de otras disposiciones del Pacto, por el otro, a fin de promover y proteger toda la serie de derechos
reconocidos en el Pacto. Al tratar de lograr esse equilibrio, no deberían privilegiarse indebidamente los intereses
privados de los autores y debería prestarse la debida consideración al interés público en el disfrute de un acceso
generalizado a SUS producciones26. Por consiguiente, los Estados Partes deberían cerciorarse de que sus
regímenes legales o de otra índole para la protección de los intereses morales o materiales que correspondan a las
personas por razón de sus producciones científicas, literarias o artísticas no menoscaben su capacidad para
cumplir sus obligaciones fundamentales en relación con los derechos a la alimentación, la salud y la educación,
así como a participar en la vida cultural y a gozar de los beneficios del progreso científico y de sus aplicaciones,
o de cualquier otro derecho reconocido en el Pacto. En definitiva, la propiedad intelectual es un producto social y
tiene una función social. Así pues, los Estados tienen el deber de impedir que se impongan costos
165
Assim, não seria de todo descabido imaginar que o duplo perfil da propriedade
intelectual encontra sua síntese na idéia de “um sistema equilibrado”, sendo ainda possível
afirmar que existiria um direito difuso da coletividade a esse equilíbrio. Faz-se necessária,
portanto, não só uma legislação que assegure esse equilíbrio, como toda uma atuação estatal
voltada a esta finalidade.
Denis Borges Barbosa ressalta que a harmonização desse duplo perfil se faz
através da aplicação do princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade, relevante tanto
para a elaboração como para a interpretação das normas jurídicas:
Flávia Piovesan coloca em destaque que o real conflito muitas vezes não é a
proteção ao autor (ou inventor) frente os interesses da coletividade, mas sim a exploração
comercial abusiva dos bens intelectuais:
irrazonablemente elevados para el acceso a medicamentos esenciales, semillas u otros medios de producción de
alimentos, o a libros de texto y material educativo, que menoscaben el derecho de grandes segmentos de la
población a la salud, la alimentación y La educación. Además, los Estados deben impedir el uso de los avances
científicos y técnicos para fines contrarios a la dignidad y los derechos humanos, incluidos los derechos a la
vida, la salud y la vida privada, por ejemplo excluyendo de la patentabilidad los inventos cuya comercialización
pueda poner en peligro el pleno ejercicio de esos derechos29. En particular, los Estados Partes deberían estudiar
en qué medida la comercialización del cuerpo humano o de sus partes puede afectar las obligaciones que han
contraído en virtud del Pacto o de otros instrumentos internacionales pertinentes de derechos humanos30. Los
Estados deberían considerar asimismo la posibilidad de realizar evaluaciones del impacto en los derechos
humanos antes de aprobar leyes para proteger los intereses morales y materiales que correspondan por razón de
lãs producciones científicas, literarias o artísticas, así como tras un determinado período de aplicación”.
324
BARBOSA, Denis Borges. Bases constitucionais da propriedade intelectual. Revista da ABPI. Rio de
Janeiro, n. 59, p. 16-39, jul/ago. 2002. p. 27.
166
(...) à luz dos direitos humanos, o direito à propriedade intelectual cumpre uma
função social, que não pode ser obstada em virtude de uma concepção privatista
deste direito que eleja a preponderância incondicional dos direitos do autor em
detrimento da implementação dos direitos sociais, como o são, por exemplo, à
saúde, à educação e à alimentação. Observe-se ainda que, via de regra, o conflito
não envolve os direitos do autor versus os direitos sociais de toda uma coletividade;
mas, sim, o conflito entre os direitos de exploração comercial (por vezes abusiva) e
os direitos sociais da coletividade.
Reitere-se que, muitas vezes, quem exerce esse direito não é propriamente o
autor/inventor, mas as grandes empresas a preços abusivos ou como reserva de
mercado via estratégias de patenteamento. 325
“(...) a primeira geração dos direitos humanos seria a dos direitos civis e políticos,
fundamentados na liberdade (liberté), que tiveram origem com a Revolução
Francesa e as demais revoluções burguesas. A segunda geração, por sua vez, seria a
dos direitos econômicos, sociais e culturais, baseados na igualdade (égalité),
ocasionada pela Revolução Industrial e com os problemas sociais por ela causados.
Por fim, a última geração seria a dos direitos de solidariedade, em especial o direito
ao desenvolvimento, à paz e ao meio ambiente, coroando a tríade com a
fraternidade (fraternité), que ganhou força após a Segunda Guerra Mundial,
especialmente após a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948.” 326
325
PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Propriedade Intelectual. 2007. Disponível em:
<http://www.culturalivre.org.br>. Acesso em: 08/08/08. p. 22.
326
LIMA, George Marmelstein. Efetivação Judicial dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.
Dissertação de Mestrado. Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará. Fortaleza. 2005. p. 60.
167
O autor prossegue criticando a teoria das gerações por criar a ilusão de que há
uma progressividade linear na evolução dos direitos fundamentais, quando na verdade a
mesma é pautada por avanços, retrocessos e contradições.
Fica patente a direta vinculação dos direitos de propriedade intelectual aos direitos
fundamentais de terceira geração, especialmente se vislumbrados dentro da proposta de
327
LIMA, George Marmelstein. Efetivação Judicial dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.
Dissertação de Mestrado. Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará. Fortaleza. 2005. p. 60 et seq.
328
PRADO, Safira Orçatto Merelles; O Controle Judicial dos Serviços Públicos sob a Perspectiva de
Concretização de Direitos Fundamentais. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Direito da Universidade
Federal do Paraná. Curitiba. 2007. p. 8.
329
SAMPAIO, José Adércio Leite. Direitos Fundamentais. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 293.
168
O exemplo citado por José Adércio aborda a questão do acesso à saúde pública
em face dos direitos de patentes. Tal exemplo, porém, é mero corolário de uma formulação
mais abrangente, o direito humano de beneficiar-se da evolução cultural e tecnológica da
humanidade.
330
Disponível em: <http://www.wipo.int/>.
169
331
SAMPAIO, José Adércio Leite. Direitos Fundamentais. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 298 et seq.
332
MCLEOD, Kembrew. Freedom of Expression – Resistance and Repression in the Age of Intellectual
Property. Minneapolis: University of Minessota Press, 2007. p. 108.
170
Uma área onde fica clara essa mudança de paradigma na aferição dos elementos
constitutivos da dignidade humana é a seara da informação. Há um consenso que a
humanidade está vivenciando uma “Revolução Digital”, que determinou a mudança da
“Sociedade Industrial” para a “Sociedade da Informação. 334
333
FURTADO, Emmanuel Teófilo. Direitos Humanos e o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Revista
do Instituto Brasileiro de Direitos Humanos. Fortaleza. Ano 6, Vol. 6, n. 6, p. 103-120, 2005. p. 112.
334
FERREIRA DE MELO, Marco Antônio Machado. A tecnologia, direito e solidariedade. In: ROVER, Aires
José (org.). Direito, Sociedade e Informática: limites e perspectivas da vida digital. Florianópolis: Fundação
Boiteux. 2000. p. 22.
335
A liberdade de expressão e informação é considerada um direito humano em vários documentos
internacionais: a Declaração dos Direitos Humanos de 1948, aprovada pela ONU (art. 19); o Convênio Europeu
para a proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais, aprovado em Roma no ano de 1950 (1 e
2); mais recentemente, a Convenção Americana de Direitos Humanos -Pacto San de José da Costa Rica.
336
WACHOWICZ, Marcos; WINTER, Luis Alexandre Carta. Os paradoxos da sociedade informacional e os
limites da propriedade intelectual. In: Anais do XVI Congresso Nacional do CONPEDI, 2007, Belo Horizonte:
Fundação . Anais do XVI Congresso Nacional do CONPEDI. Florianópolis: Fundação José Arthur Boiteux.
2007. p. 2489-2509.
171
337
WACHOWICZ, Marcos. Os Direitos da Informação na Declaração Universal dos Direitos Humanos. In:
WACHOWICZ, Marcos (coord.). Propriedade Intelectual & Internet. Curitiba: Juruá Editora, 2002. p. 37-49.
p. 38.
338
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 525.
339
PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Propriedade Intelectual. 2007. Disponível em:
<http://www.culturalivre.org.br>. Acesso em: 08/08/08. p. 38.
172
340
WACHOWICZ, Marcos. Os Direitos da Informação na Declaração Universal dos Direitos Humanos. In:
WACHOWICZ, Marcos (coord.). Propriedade Intelectual & Internet. Curitiba: Juruá Editora, 2002. p. 37-49.
p. 41.
173
O estudo das colisões entre direitos fundamentais guarda importância tanto para a
interpretação como para a aplicação do direito. Tal estudo, em verdade, acaba por determinar
como o jurista deve proceder diante de um caso em que o sistema jurídico parece indicar duas
ou mais formas de solução eventualmente conflitantes.
Assim, para que se possam aplicar critérios de solução para casos de conflitos e
colisões, é necessário averiguar alguns questionamentos preliminares, tais como: a) É possível
haver colisão entre normas de direitos fundamentais?; b) Em que ocasiões tais colisões são
possíveis? e c) Havendo tais colisões, quais os critérios de superação a serem utilizados?.
341
Para uma definição sintética de regras e princípios, sugere-se: “Regras são, normalmente, relatos objetivos,
descritivos de determinadas condutas e aplicáveis a um conjunto delimitado de situações. (...) Princípios, por sua
vez, contêm relatos com maior grau de abstração, não especificam a conduta a ser seguida e se aplicam a um
conjunto amplo, por vezes indeterminado, de situações”. (BARROSO, Luis Roberto.; BARCELLOS, Ana Paula
de. O começo da história. A nova interpretação constitucional e o papel dos princípios no direito brasileiro.
Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 232, 2003. p. 11.)
174
Há uma primeira reflexão em Ronald Dworkin 342, para quem a diferença entre
regras e princípios seria a forma de aplicação. As regras são aplicáveis segundo uma lógica de
tudo-ou-nada, centrado num juízo de validade. Se o juízo for positivo e a norma válida,
deverá ser aplicada; caso contrário, se inválida, não poderá ser utilizada. Os princípios, por
sua vez, são aplicados mediante uma dimensão de peso ou importância, guardando diferentes
graus de influência e aplicação ao caso concreto.
342
DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 43.
343
ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Trad. Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de
Estudios Constitucionales, 1997. p. 92.
175
Dessa forma, exatamente por serem normas que veiculam direitos fundamentais,
estas estarão sempre relacionadas com os valores fundamentais da sociedade.
344
ALEXY, Robert. Op. cit. p. 133.
345
STEINMETZ, Wilson. Colisão de Direitos Fundamentais e o princípio da proporcionalidade. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 136.
346
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 253.
176
fundamental refere-se aos bens ou realidades (vida, liberdade, religião etc.) assegurados pela
disposição normativa que prevê o direito fundamental”. 347
347
FARIAS, Edilsom. Liberdade de Expressão e Comunicação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p.34.
348
DIAS, Eduardo Rocha. Os Limites às Restrições de Direitos Fundamentais na Constituição Brasileira de
1988. Revista AGU. Ano V. Nov/2005. p. 6.
349
NOVAIS, Jorge Reis. apud. OLSEN, Ana Carolina Lopes. A Eficácia dos Direitos Fundamentais Sociais
frente à Reserva do Possível. Dissertação de Mestrado. Mestrado em Direito. Faculdade de Direito da
Universidade Federal do Paraná. Curitiba. 2006. p. 135.
177
350
LOPES, Ana Maria D’Ávila. A garantia do conteúdo essencial dos direitos fundamentais. Revista de
Informação Legislativa, Brasília, ano 41, n. 164, p. 7-15. out-dez. 2004. p. 7.
351
ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976.
Coimbra: Livraria Almedina, 1998. p. 233.
178
352
ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Trad. Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de
Estudios Constitucionales, 1997. p. 268.
179
Assim, para a teoria interna, não há que se falar de colisões entre direitos, tendo
em vista que o que deve ocorrer é uma investigação sobre o correto âmbito de proteção do
direito em questão. Há uma proximidade com o modelo de regras, tendo em vista que para a
teoria interna se realiza um juízo de validade sobre a pertinência ou não de determinado
conteúdo fático para com o âmbito normativo do direito fundamental.
353
MENDES, Gilmar Ferreira. Os Direitos Individuais e suas Limitações: Breves Reflexões. In: MENDES,
Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Hermenêutica
Constitucional e Direitos Fundamentais. Brasília: Brasília Jurídica, 2002. p. 197-322. p.212.
180
Ganha destaque na doutrina moderna este tipo de colisão em sentido amplo, muito
devido ao fato de que a garantia de eficácia dos direitos fundamentais pode exigir uma
determinada política pública ou atuação do administrador.
354
Exemplos na Constituição Federal: Art. 5º, incisos: XXVI; XXVII; XXVIII; XXXVIII; LXXVI; LXXVII.
181
355
SARMENTO, Daniel. Colisões entre Direitos Fundamentais e Interesses Públicos. In: GALDINO, Flavio;
SARMENTO, Daniel. (orgs.). Direitos Fundamentais: Estudo em Homenagem ao Professor Ricardo Lobo
Torres. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 267-324. p. 306-307.
356
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7. ed. Coimbra:
Almedina, 2003. p. 643.
182
defensiva, de uma parte, e na dimensão de proteção, de outra parte – como, por exemplo, na
hipótese de desferirem-se tiros contra um seqüestrador, para salvar a vida de um refém; iii)
colisão da dimensão negativa de um direito, com a dimensão positiva desse mesmo direito –
um exemplo desse tipo de colisão é a discussão sobre se o Estado pode ou não colocar
crucifixos em salas de aula de escolas públicas; nesse caso, há um conflito entre o aspecto
negativo da liberdade religiosa dos que não são cristãos, com o direito dos adeptos do
cristianismo a manifestar sua fé no âmbito das instituições estatais; e iv) colisão entre a
dimensão formal e material de um mesmo direito – que, ocorre, especificamente, em relação
ao princípio da igualdade. 357
Clèmerson Merlin Clève e Alexandre Reis Siqueira Freire adotam como método
de resolução das colisões o método hermenêutico constitucional concretista aliado ao
princípio da proporcionalidade e ao método da ponderação de bens. 358
357
PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. Interpretação Constitucional e Direitos Fundamentais. Rio de Janeiro:
Renovar, 2006. p.230.
358
CLÈVE, C. M.; FREIRE, Alexandre Reis Siqueira. Algumas Notas sobre a Colisão de Direitos
Fundamentais. Caderno da Escola de Direito e Relações Internacionais das Faculdades do Brasil, Curitiba,
v. 1, n. 1, p. 20-42, 2002. p. 32.
183
Por sua vez, Jane Reis Pereira indica que para a solução das colisões, existem os
critérios interpretativos que se subdividem em categorização, hierarquização e ponderação. 359
Em linhas gerais, o primeiro critério se relaciona com a progressiva fixação mais precisa do
âmbito de proteção de um determinado direito até estar superado o conflito. O segundo se
reporta a uma hierarquização prévia e em abstrato de bens tutelados constitucionalmente.
Quanto à ponderação adverte para o fato de que ponderar razões é uma expressão que pode
ser identificada com interpretação de forma geral, já a ponderação de interesses e bens é uma
técnica interpretativa com peculiaridades próprias.
Apesar de existirem diversos critérios, para os fins desse estudo convêm tecer
maiores considerações sobre a técnica da ponderação e sobre o princípio da
proporcionalidade.
359
PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. Op. cit. p. 224 et seq.
360
LIMA, Francisco Gérson Marques de. Fundamentos constitucionais do processo. São Paulo: Malheiros,
2002. p. 22.
184
5.4.1.8 Ponderação
Ana Carolina Olsen, citando Karl Larenz, indica que “a ponderação de bens em
cada caso é um método de complementação do direito, que visa a solucionar as colisões de
normas”. 361 Por sua vez, Ana Maria D’ Ávila Lopes indica que a ponderação pode se
desenvolver a partir de dois sistemas: ponderação em abstrato e ponderação em concreto. No
primeiro, a ponderação se dá de forma abstrata e ficta perante bens de mesma hierarquia
constitucional, para a escolha da precedência correta. No segundo caso, a ponderação concreta
se relaciona com a impossibilidade de uma identificação abstrata do bem constitucional a ser
tutelado, sendo necessário encontrar a solução através do princípio da proporcionalidade. 362
361
LARENZ, Karl. Apud. OLSEN, Ana Carolina Lopes. A Eficácia dos Direitos Fundamentais Sociais frente
à Reserva do Possível. Dissertação de Mestrado. Mestrado em Direito. Faculdade de Direito da Universidade
Federal do Paraná. Curitiba. 2006. p. 78.
362
LOPES, Ana Maria D’Ávila. Os limites ao poder de legislar em matéria de direitos fundamentais. Nomos -
Revista do Curso de Mestrado em Direito da UFC, Fortaleza, v. 22, n. jan/dez, p. 55-70, 2003. p. 63-64.
363
Sobre o método hermenêutico concretizador, convêm destacar que: “Konrad Hesse incorpora a concepção de
F. Müller da norma constitucional na que se integram por igual, em uma relação de mútua influência, o programa
normativo (o mandato contido basicamente no texto da norma) e o âmbito normativo (setor concreto da realidade
presente na norma, sobre o qual o programa normativo pretende incidir). Tanto o programa normativo como o
âmbito normativo deve ser submetido a um esforço de concretização: as regras tradicionais de interpretação
encontraram sua função na interpretação do programa normativo; normalmente, ainda que não se exclua o
contrário, a concretização do texto deverá ser completada pela do âmbito normativo”. (GUERRA, Sidney.;
EMERIQUE, Lília M. B.. Hermenêutica dos Direitos Fundamentais. Revista da Faculdade de Direito de
Campos, Ano VI, n. 7, p. 295-331.dez/2005, p. 314.)
364
SARMENTO, Daniel. apud. OLSEN, Ana Carolina Lopes. A Eficácia dos Direitos Fundamentais Sociais
frente à Reserva do Possível. Dissertação de Mestrado. Mestrado em Direito. Faculdade de Direito da
Universidade Federal do Paraná. Curitiba. 2006. p. 68.
185
fundamentais em conflito. Num segundo momento, investiga a situação fática e sua possível
implicação sobre as próprias normas. Por fim, na decisão, deve ocorrer uma avaliação
conjunta das normas e dos fatos, atribuindo-se pesos e valores adequados aos elementos
conflitantes. Através do sopesamento, verificam-se quais os direitos ou bens de maior
intensidade que devem prevalecer. 365
5.4.1.9 Proporcionalidade
365
BARROSO, Luis Roberto.; BARCELLOS, Ana Paula de. O começo da história. A nova interpretação
constitucional e o papel dos princípios no direito brasileiro. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro,
v. 232, p. 141-176. 2003. p. 18.
366
ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. São Paulo:
Malheiros, 2003. p. 148 et seq.
367
LOPES, Ana Maria D’Ávila. Os limites ao poder de legislar em matéria de direitos fundamentais. Nomos -
Revista do Curso de Mestrado em Direito da UFC, Fortaleza, v. 22, n. jan/dez, p. 55-70, 2003. p. 67-68.
186
conteúdo essencial dos direitos fundamentais, sendo desproporcional uma violação desse
núcleo mínimo que está indissociavelmente ligado à dignidade da pessoa humana. 368
Dessa forma, é possível uma vasta gama de colisões, seja em sentido amplo ou em
sentido estrito. Para a resolução das mesmas, a doutrina apresenta diversos critérios, porém,
todos vão ter a marca da subjetividade do julgador em maior ou menor grau.
368
GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo Constitucional e Direitos Fundamentais. São Paulo: Celso
Bastos Editor, 1999. p. 68.
187
369
Lei nº 9.279/96: “Art. 24. O relatório deverá descrever clara e suficientemente o objeto, de modo a
possibilitar sua realização por técnico no assunto e indicar, quando for o caso, a melhor forma de execução”.
188
Por licença, deve-se entender “(...) precisamente uma autorização, dada por quem
tem o direito sobre a patente, para que uma pessoa faça uso do objeto do privilégio”. 370
Tal instituto nada mais é do que um mecanismo legal que garante a possibilidade
de acesso a uma determinada tecnologia ou conhecimento com aplicações industriais
independentemente da autorização do titular. Trata-se de uma limitação que funciona como
elemento de controle de eventuais abusividades realizadas pelo do detentor da patente.
370
BARBOSA, Denis Borges. Uma Introdução à Propriedade Intelectual. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2003. vol. 1. p. 1041.
371
SCUDELER, Marcelo Augusto. Patentes e sua Função Social. Dissertação de Mestrado. Universidade
Metodista de Piracicaba. Piracicaba. 2007. p. 165.
189
O instituto da caducidade também é outro instrumento que pode ser utilizado para
a efetivação da função social. Previsto no art. 80 da Lei de Propriedade, pode ser decretado a
requerimento de qualquer pessoa com legítimo interesse ou de ofício pelo INPI.
Trata-se de um último recurso para garantir que este tipo de propriedade atenda
sua função social, seja através da efetiva exploração do objeto, seja da extinção da patente e
conseqüente “queda” do objeto em domínio público, nos termos do parágrafo único do art. 78.
Uma vez no domínio público, o conhecimento ou tecnologia poderá ser explorado por
qualquer interessado, independentemente de autorização ou pagamento de royalties.
372
CRUZ, Adriana Alves dos Santos. A Licença Compulsória como Instrumento de Adequação da Patente a sua
Função Social. Revista da ABPI, Rio de Janiero. n 80. p. 45-55. jan/fev 2006. p. 51.
190
Essa idéia de que a função social da propriedade intelectual pode ser efetivada
com uma maior limitação dos direitos exclusivos serviu de fundamento para o Projeto de Lei
6199/2005 373, de autoria do deputado Nazareno Fonteles, que prevê a alteração do artigo 40,
caput e parágrafo único da Lei nº 9.279/96, reduzindo o prazo de vigência da patente de
invenção para 10 (dez) anos e a de modelo de utilidade para 7 (sete) anos.
373
Projeto de lei disponível em: <http://www.camara.gov.br>.
191
Em relação aos usos das obras e conteúdos intelectuais, é possível indicar três
zonas distintas: uma zona onde os usos são do domínio do titular de direitos autorais, outra
zona onde os usos são legalmente permitidos, apesar da obra ainda residir na propriedade do
titular, e uma terceira zona onde os usos são livres, pois o trabalho encontra-se no domínio
público.
Lawrence Lessig analisa a existência dessas zonas de usos para indicar que, na
atualidade, se faz necessário repensar a extensão e os limites do copyright, especialmente
frente às novas tecnologias digitais e a internet. 374
374
LESSIG, Lawrence. Free Culture – The Nature and Future of Creativity. New York: Penguin Books,
2005. p. 140.
194
Existem outros usos que seriam regulados, mas a própria lei retira do titular a
possibilidade de objetar a utilização. Para o direito americano essas limitações encontram-se
na doutrina do fair use, usos protegidos pela legislação por resguardarem interesses ou valores
socialmente relevantes. Como exemplo, o direito de citação e utilizações para fins acadêmicos
e culturais de parte das obras intelectuais.
Porém, na visão do autor, são os usos não regulados – unregulated uses – onde se
encontra o maior valor social dos direitos de copyright. Seriam aqueles usos que estão fora do
disciplinamento legal e, portanto, convidam a comunidade a utilizar livremente os conteúdos
e sentidos culturais daqueles bens imateriais, produzindo e difundindo cultura. Essa zona não
regulada evoca a figura do domínio público.
Transpondo-se essa análise para a o cenário legal brasileiro, é possível inferir que
a função social do direito de autor relaciona-se diretamente com as próprias limitações ao
direito autoral e com a existência do domínio público. Nas palavras de José de Oliveira
Ascensão: “Sempre houve a consciência dos limites no âmbito do Direito Autoral. O limite é
constitutivo do direito autoral.” 375
Essa idéia de que as limitações ao direito autoral são parte de seu núcleo
constitutivo possui implicações práticas muito relevantes, especialmente em relação à
interpretação jurídica que lhes deve ser atribuída.
375
ASCENSÃO, José de Oliveira. A Função Social do Direito de Autor e as Limitações Legais. In: ADOLFO,
Luis Gonzaga; WACHOWICZ, Marcos (Orgs.). Direito da Propriedade Intelectual – Estudos em
Homenagem ao Pe. Bruno Jorge Hammes. Curitiba: Juruá, 2006. p. 85-111. p. 91.
376
BITTAR, Carlos Alberto. Direito de Autor. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994. p. 62; CABRAL, Plínio. A
nova lei de direitos autorais: comentários. 4. ed. São Paulo: Harbra, 2003. p. 70; ABRÃO, Eliane Y. Direitos
de Autor e Direitos Conexos. São Paulo: Editora Brasil, 2002. p. 146.
195
Denis Borges Barbosa indica que numa filtragem constitucional, não se deve
adotar de forma pré-determinada uma lógica pro autorem, pois o direito autoral é um
balanceamento de interesses constitucionalmente protegidos. Nas palavras do autor:
377
BARBOSA, Denis Borges. Direito Autoral – Apresentações Gratuitas. Disponível em:
<http://denisbarbosa.addr.com/88.DOC>. Acesso em: 08/08/08.
378
ASCENSÃO, José de Oliveira. A Função Social do Direito de Autor e as Limitações Legais. In: ADOLFO,
Luis Gonzaga; WACHOWICZ, Marcos (Orgs.). Direito da Propriedade Intelectual – Estudos em
Homenagem ao Pe. Bruno Jorge Hammes. Curitiba: Juruá, 2006. p. 85-111. p. 91.
196
(...) a perspectiva hermenêutica sobre estes limites deve ser uma que permita a
incorporação de isenções outras que as especificadas em lei especial, em razão das
efervescentes e crescentes demandas por suprimento das necessidades educacionais
e culturais contemporâneas nacionais, constitucionalmente previstas e protegidas e
não comportadas na legislação ordinária atual. Deste modo, a interpretação mais
adequada e a única juridicamente sustentável parece ser a extensiva quanto aos
limites de proteção (...) 379
Dessa premissa, verifica-se que a função social dos direitos autorais é encontrada
no equilíbrio entre os interesses públicos e privados relativos à utilização das obras artísticas e
intelectuais.
Guilherme Carboni, por sua vez, destaca a necessidade de instrumentalização da
função social mediante a utilização das limitações ao direito de autor:
379
SOUZA, Allan Rocha. A Função Social dos Direitos Autorais. Campos dos Goytacazes: Ed. Faculdade de
Direito de Campos, 2006. p. 275.
380
CARBONI, Guilherme C. Conflitos entre Direito de Autor e Liberdade de Expressão, Direito de Livre
Acesso à Informação e à Cultura e Direito ao Desenvolvimento Tecnológico. Revista da ABPI, Rio de Janeiro.
nº 85. Nov/Dez 2006. p. 38-53. p. 53.
381
GERVAIS, Daniel. Em busca de uma nova norma internacional para os direitos de autor: O “Teste dos Três
Passos” Reversos. In: RODRIGUES JR, Edson Beas; POLIDO, Fabrício (Orgs.). Propriedade Intelectual –
Novos Paradigmas Internacionais, Conflitos e Desafios. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007. p. 201-232. p. 208.
197
A regra apresenta uma textura aberta, ou seja, permite uma maior flexibilidade na
construção de situações em que uma determinada utilização do bem intelectual não seja
tomada como em desacordo com a ordem jurídica. Trata-se, ainda, de uma forma mais
adequada de permitir a ponderação entre os valores envolvidos.
Com efeito, a limitação deve ter uma conotação teleológica, ou seja, a utilização
independente de autorização deve ser o meio para atender a um interesse legítimo. Além
disso, deve ser fundamentada numa manifestação governamental. Impõe-se, portanto um ônus
argumentativo ao governo, devendo a restrição ou limitação inserir-se numa política de gestão
adequada de direitos autorais. Não pode decorrer de um mero arbítrio governamental, sob
pena de se estar restringindo desnecessariamente o direito autoral no seu viés de proteção ao
indivíduo.
Por fim, o terceiro passo é o mais relevante para a idéia de que compatibilização
entre o direito de autor e os direitos sociais de acesso à informação e a cultura. A
interpretação desse passo indica o reconhecimento internacional de que são possíveis
prejuízos aos interesses legítimos ao titular de direitos autorais desde justificados.
382
GERVAIS, Daniel. Op. cit. p. 209.
198
383
CONSUMERS INTERNATIONAL. Copyright and Access to Knowledge: Policy Recommendations on
Flexibilities in Copyright Laws. Kuala Lumpur: Consumers International. 2006.
199
Outra sugestão é que as legislações adotem medidas legais para coibir condutas
anti-competitivas que possam ser realizadas mediante o uso exclusivo dos direitos autorais.
Esta medida encontra igual aplicação para a propriedade industrial.
Por fim, o estudo ainda indica que os direitos autorais e os próprios tratados
internacionais devem ser revistos para reencontrar um equilíbrio dos direitos autorais em face
das novas tecnologias de comunicação e da internet.
No mundo analógico, se eu quisesse ler um livro, não precisava fazer uma cópia
para ler aquela obra. Bastava ir lá, pegar o livro, ler e pronto. No mundo digital, se
eu quiser ler um livro, ouvir uma música, ver um filme no meu computador,
preciso copiar aquele conteúdo para o meu computador. Nem que seja uma cópia
efêmera, que vai desaparecer dali a alguns milésimos de segundo. Mas a questão é:
a cópia se tornou um passo para o acesso ao conteúdo. E aí a gente tem um
problema. Porque, como o direito autoral controla a cópia, isso significa que o
direito autoral passou a controlar também o acesso. 384
384
LEMOS, Ronaldo. Apud. MARTINI, Paula. Festival do Rio sedia acalorado debate sobre proteção de
obras audiovisuais. Disponível em: <http://www.direitodeacesso.org.br/Festival-do-Rio-sedia-acalorado>.
Acesso em: 30/07/08.
385
LESSIG, Lawrence. Free Culture – The Nature and Future of Creativity. New York: Penguin Books,
2005. p. 143.
200
A internet, por sua vez, permite aos indivíduos compartilhar sua criatividade com
o mundo de forma quase instantânea, sem necessitar de um modelo tradicional de negócio que
tinha como premissas altos custos de produção e distribuição de produtos em meios físicos de
fixação. Como exemplos desses modelos de negócio, identificam-se os mercados tradicionais
de vendas de livros, discos, cd´s e dvd´s.
Terceiro, essa cultura amadora passa a ser regulada de uma forma muito mais
relevante por parte dos sistemas de direitos de propriedade intelectual, especialmente o
copyright e o direito autoral.
Contudo, a regulação até então vigente estava voltada para promover um amplo
controle dos direitos autorais, de modo a permitir aos titulares a captura do valor do trabalho
realizado como forma de fazer frente aos elevados custos iniciais para a produção,
distribuição e efetiva comercialização dos bens imateriais fixados em substratos físicos de um
paradigma tecnológico passado.
389
LESSIG, Lawrence. Code 2.0. New York: Basic Books, 2006. p. 194.
202
Para identificar os pontos que devem ser alterados para se obter uma efetivação da
função social da propriedade intelectual é necessário entender as implicações recíprocas com
valores e direitos constitucionais.
390
PEREIRA DE SOUZA, Carlos Affonso. Considerações Introdutórias sobre Direito Autoral e Acesso ao
Conhecimento. Disponível em: <http://www.culturalivre.org.br/artigos/Carlos-Affonso-DA-A2k.pdf.>. Acesso
em: 08/08/08.
203
Não obstante existirem divergências quanto aos elementos que viriam a compor o
“conjunto mínimo essencial de direitos humanos” frente às diversas legislações mundiais, há
um relativo consenso de que o direito à saúde é um deles ou, pelo menos, o direito de ter
acesso a tratamento em caso de enfermidade. 391
O direito fundamental à saúde seria uma das dimensões do direito à vida, que
importaria o direito humano dispor dos meios apropriados de subsistência e de um padrão de
vida digna dentro de um contexto de direitos econômicos, sociais e culturais.
Art. 5º. Todos são iguais perante a Lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida(...)
A Carta Magna também estabelece no Art. 198 que as ações e serviços de saúde
devem garantir um atendimento integral (inciso II) introduzindo desta maneira o Sistema
391
PRONER, Carol. Saúde Pública E Comércio Internacional: A Legalidade Da Quebra De Patentes. Revista
Direitos Fundamentais & Democracia. Unibrasil. Vol 1. 2007. Disponível em:
<http://revistaeletronicardfd.unibrasil.com.br>. Acesso em: 25.07.08.
392
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Direitos Humanos e Meio Ambiente. Porto Alegre: Sérgio Fabris,
1993. p. 71.
204
Único de Saúde – SUS, que estabelece competência concorrente as três esferas do Poder
Executivo:
Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e
hierarquizada e constituem um sistema único organizado com as seguintes
diretrizes:
I – descentralização, com direção única em cada esfera de governo.
O art. 7º, inciso I, estabelece como princípios a serem adotados nas ações e
serviços de saúde a universalidade de acesso em todos os níveis de assistência e a igualdade
da assistência à saúde. O art. 43, de sua parte, estabelece a gratuidade das ações e serviços de
saúde.
393
RTJ 175/1212-1213, Rel. Min. Celso de Mello.
394
Documento da OMC: WT/MIN(01)/DEC/1, de 14 de novembro de 2001.
206
Essa declaração foi seguida pela “Declaração de Doha sobre o Acordo TRIP´s e
Saúde Pública” 395 aprovada também em novembro de 2001, que apresentou uma maior
instrumentalização das medidas possíveis aos países, dentre as quais: a) a possibilidade dos
países adotarem medidas de proteção à saúde pública; b) a possibilidade de utilização de
mecanismos, como licenças compulsórias e importação paralela; c) a possibilidade de
extensão até 2016 das exceções existentes para proteção de patentes a produtos farmacêuticos
para os países menos desenvolvidos.
Art. 71: Nos casos de emergência nacional ou interesse público, declarados em ato
do Poder Executivo Federal, desde que o titular da patente ou seu licenciado não
atenda a essa necessidade, poderá ser concedida, de ofício, licença compulsória,
temporária e não exclusiva, para a exploração da patente, sem prejuízo dos direitos
do respectivo titular.
395
Documento da OMC: WT/MIN(01)/DEC/2, de 14 de novembro de 2001.
396
PRONER, Carol. Saúde Pública E Comércio Internacional: A Legalidade Da Quebra De Patentes. Revista
Direitos Fundamentais & Democracia. Unibrasil. Vol 1. 2007. Disponível em:
<http://revistaeletronicardfd.unibrasil.com.br>. Acesso em: 25.07.08.
207
Contudo, talvez a utilidade mais relevante dessas previsões seja a de permitir uma
efetiva negociação dos governos com os detentores de patentes de medicamentos, via de
regra, conglomerados multinacionais. Carol Proner destaca esse efeito extrajurídico:
397
PRONER, Carol. Saúde Pública E Comércio Internacional: A Legalidade Da Quebra De Patentes. Revista
Direitos Fundamentais & Democracia. Unibrasil. Vol 1. 2007. Disponível em:
<http://revistaeletronicardfd.unibrasil.com.br>. Acesso em: 25.07.08.
398
SCUDELER, Marcelo Augusto. Patentes e sua Função Social. Dissertação de Mestrado. Universidade
Metodista de Piracicaba. Piracicaba. 2007. p. 168.
208
Saúde, ainda majorados pela existência de diversas decisões judiciais que determinam o
fornecimento de tratamentos ou medicamentos independentemente de previsão oficial nas
listagens de medicamentos e procedimentos do Ministério da Saúde ou das Secretarias
Estaduais e Municipais de Saúde.
399
BVerfGE33, 303 (333).
400
SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 6. ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado. 2005. p. 265.
401
Outros julgados que citam essa passagem: RE 267612 / RS, AI 570455/RS, AgRgRE 271286/RS, RE
198265/ RS, RE 248304/ RS, AgRgRE 273834-4 / RS.
209
Nesse particular, Maria Cecília Oswad e Luiz Leonardos apontam que, dentro de
uma filtragem constitucional, deve-se observar a convergência dos objetivos constitucionais:
402
OSWALD, Maria Cecília; LEONARDOS, Luiz. Direitos de Patentes – Uma proposta de filtragem
constitucional. Revista da ABPI, Rio de Janeiro, Vol. 86. p. 3-17. jan/fev 2007. p. 16.
210
necessidade de correção do desequilíbrio, que pode ser realizada através de mecanismos como
o licenciamento compulsório ou a importação paralela.
Além disso, o licenciamento compulsório, por si só, não impede que o detentor da
patente beneficie-se economicamente. Poderá continuar a produzir o medicamento e
comercializá-lo, porém, o fará em regime de concorrência de mercado. Poderá ainda entrar
em licenciamentos ou, até mesmo, impedir que o Estado utilize desses mecanismos legais
entrando em acordos.
Por outro lado, o direito de acesso ao produto foi ampliado, ou seja, obteve-se
uma maior efetividade do direito que assiste a cada indivíduo de participar das benesses
científicas de seu tempo, no caso, medicamentos.
atacando quase que exclusivamente pobres. Por isso, não existe interesse
econômico dos grandes laboratórios privados e públicos dos países centrais em
investir em caras imunizações e medicamentos para quem não possa pagar por eles.
O que define as prioridades não são as necessidades detectadas na realidade
concreta: é o mercado. 403
No que diz respeito às variações vegetais, esse sistema é regido pela Convenção
da União para Proteção das Obtenções Vegetais (UPOV), que sofreu algumas alterações, as
mais importantes em 1978 e 1991. 405
Art. 10. Não fere o direito de propriedade sobre a cultivar protegida aquele que:
I - reserva e planta sementes para uso próprio, em seu estabelecimento ou em
estabelecimento de terceiros cuja posse detenha;
II - usa ou vende como alimento ou matéria-prima o produto obtido do seu plantio,
exceto para fins reprodutivos;
III - utiliza a cultivar como fonte de variação no melhoramento genético ou na
pesquisa científica;
IV - sendo pequeno produtor rural, multiplica sementes, para doação ou troca,
exclusivamente para outros pequenos produtores rurais, no âmbito de programas de
financiamento ou de apoio a pequenos produtores rurais, conduzidos por órgãos
públicos ou organizações não-governamentais, autorizados pelo Poder Público.
405
Promulgada no Brasil pelo Decreto no 3.109, de 30 de junho de 1999.
213
dos países em termos de suprimentos alimentares. Bruno Gasparini faz uma síntese da
situação:
Para algumas teorias a soberania seria a não sujeição a qualquer poder estrangeiro,
seja ele de Estado ou organização internacional; para outros seria o fundamento do Estado,
sendo o elemento autorizador da elaboração de Constituição própria. 407 Nesse particular, para
Gilberto Bercovici, a “(...) soberania, inclusive, é a origem da constituição moderna, com sua
pretensão de destacar um núcleo rígido e inalterável do poder político(...)”. 408 Em torno
desse princípio de soberania, gravitam, portanto, idéias de independência ou capacidade de
auto-determinação de um povo.
406
GASPARINI, Bruno. Uma Análise Crítica dos Paradigmas Jurídicos e Econômicos no Atual Contexto
Sócio-Político Ambiental que Fundamenta a Utilização da Transgenia na Agricultura Brasileira.
Dissertação de Mestrado. Mestrado em Direito. Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná.
Curitiba. 2005. p. 193-194.
407
SILVA, Alice Rocha da. Direito internacional público e soberania na Constituição brasileira: aplicação de
decisões do Órgão de Solução de Controvérsias da Organização Mundial do Comércio (OMC) no ordenamento
jurídico brasileiro. Revista Jurídica, Brasília, v. 8, n. 80, p.72-87, ago./set., 2006. p. 74.
408
BERCOVICI, Gilberto. Soberania e Constituição: Para uma crítica do Constitucionalismo. São Paulo:
Quartier Latin, 2008. p. 19.
214
O pólen das plantas é carregado pelo ar, não respeitando jurisdições ou territórios.
Como no caso Monsanto Canada Inc. v. Schmeiser, é possível que haja uma polinização
cruzada entre plantas geneticamente modificadas e plantas naturais.
409
GASPARINI, Bruno. Uma Análise Crítica dos Paradigmas Jurídicos e Econômicos no Atual Contexto
Sócio-Político Ambiental que Fundamenta a Utilização da Transgenia na Agricultura Brasileira.
Dissertação de Mestrado. Mestrado em Direito. Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná.
Curitiba. 2005. p. 200.
410
GASPARINI, Bruno. Op. cit. p. 185.
215
Primeiro: a alteração genética, por si só, não obstante possuir efeitos positivos
para o aumento da produção ou resistência da planta a pesticidas, pode ensejar interações
nocivas com o ambiente; problemas quando do consumo humano ou, até mesmo, o
surgimento de novas superpragas agrícolas.
411
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Trad. de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992. p.
6.
412
RODRIGUES, Marcelo Abelha. Elementos de Direito Ambiental. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2005. p. 205-206.
413
SHIVA, Vandana. Protect or Plunder? Understanding Intellectual Property Rights. London: Zed Books,
2001. p. 81.
216
Tal tecnologia é protegida tanto por segredos industriais quanto por uma patente
mantida em conjunto pelos Estados Unidos e a empresa Delta & Pine Land Co., subsidiária
da gigante de biotecnologia Monsanto. Não só ilustrativa da relação simbiótica que existe
entre grandes corporações e governos, essa tecnologia tem aplicações militares e serve de
ferramenta para efetivar de direitos de propriedade intelectual sobre vegetais.
Note-se que se o pólen de plantas com este gene “suicida” misturar-se com as
lavouras, é possível que agricultores percam em uma geração, variações genéticas inteiras,
comprometendo não só a diversidade ambiental como o próprio abastecimento alimentar.
414
GOLD, E. Richard; CASTLE, David; CLOUTIER, L. Martin. Agrobiotecnologia nos tribunais: patentes,
privilégios e presunções. In: RODRIGUES JR, Edson Beas; POLIDO, Fabrício. (Orgs.). Propriedade
217
Intelectual – Novos Paradigmas Internacionais, Conflitos e Desafios. Rio de Janeiro: Elsevier. 2007. p. 275-
300. p. 290.
415
Assinada no Rio de Janeiro, em 05 de junho de 1992 e promulgada pelo Decreto nº 2.519/98.
218
A Constituição Federal brasileira, por sua vez, lhe dedicou o Capítulo VI, do
TÍTULO VIII - Da Ordem Social:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e
futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo
ecológico das espécies e ecossistemas;
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e
fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;
(...)
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a
conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
416
CARNEIRO, Ana Cláudia Mamede. Acesso a recursos genéticos, conhecimentos tradicionais associados e
repartição de benefícios. Revista da ABPI, Rio de Janeiro. Vol. 88. Mai/jun. 2007. p. 3-16. p. 7.
219
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem
em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os
animais a crueldade.
417
BOLLIER, David. Silent Theft – The private plunder o four common wealth. New York: Routledge,
2003. p. 65. Tradução livre: “A natureza proporciona, de forma silenciosa, inúmeros outros benefícios para a
economia. A biodiversidade representa uma biblioteca genética que está sendo cada vez mais utilizada para
desenvolver novos remédios e para aumentar a produtividade de trigo e milho. Os oceanos do planeta são
importantes para a filtragem biológica de água, para desintoxicar poluentes, proporcionar alimentos e encorajar o
turismo. Pesticidas naturais proporcionam um valioso serviço os agricultores ao melhorar as colheitas e diminuir
custos de produção (um benefício que fica mais aparente quando o sistema ecológico está comprometido). No
total, estima-se de forma grosseira que os serviços que a natureza proporciona estão na ordem de US$ 39 trilhões
de dólares para a economia – isto num PIB estimado em US$ 35 trilhões”.
220
418
STEFANELLO, Alaim Giovani Fortes. A função social e ambiental da propriedade intelectual: a
complementaridadede institutos jurídicos de direito público e de direito privado. In: Anais do XV
Congresso Nacional do Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito, 2006, Manaus.
Florianópolis: JOSE ARTHUR BOITEUX, 2006.
221
[...]
Art. 24. Os benefícios resultantes da exploração econômica de produto ou
processo desenvolvido a partir de amostra de componente do patrimônio genético e
de conhecimento tradicional associado, obtidos por instituição nacional ou
instituição sediada no exterior, serão repartidos, de forma justa e eqüitativa,
entre as partes contratantes, conforme dispuser o regulamento e a legislação
pertinente.
[...]
Art. 31. A concessão de direito de propriedade industrial pelos órgãos
competentes, sobre processo ou produto obtido a partir de amostra de componente
do patrimônio genético, fica condicionada à observância desta Medida
Provisória, devendo o requerente informar a origem do material genético e do
conhecimento tradicional associado, quando for o caso.
(grifado e negritado)
Além disso, a medida provisória cria uma série de obrigações quanto à divulgação
das informações e procura garantir o acesso a esse conhecimento para as instituições
nacionais. Os direitos de propriedade intelectual, por sua vez, através da noção de
transferência de tecnologia, são expostos como um meio de preservação do patrimônio
genético e dos conhecimentos tradicionais (art. 21).
O direito de propriedade dos titulares (art. 17) também pode ser limitado para
assegurar o interesse público de garantir que o patrimônio genético e os conhecimentos
tradicionais sejam preservados.
Destarte, a livre iniciativa, com esse duplo perfil, consagra-se no caput do art. 170
da Constituição Federal como um dos princípios fundamentais da ordem econômica. Sendo
um dos fundamentos dessa ordem, a mesma condicionará a interpretação dos outros nove
princípios especificados nos incisos do referido artigo. José Afonso da Silva assim o concebe:
419
SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 17. ed. São Paulo: Melhoramentos, 2005. p.
767.
420
TAVARES, André Ramos. Direito constitucional econômico. São Paulo: Método, 2003, p. 134.
223
Cumpre perceber que tais princípios incidem sobre o mercado. Este, por sua vez
deve ser entendido como um sistema de relações, constituídas através do direito, através da
circulação eficiente dos recursos econômicos. Num viés normativo, o mercado deve ser
eficiente, permitindo uma circulação fluida de bens na economia, permitindo melhor alocação
dos recursos. Nesse sentido, é elucidativa a lição de Rachel Sztajn:
Na medida em que se entenda mercado como uma instituição que vise a criar
incentivos, reduzir incertezas, facilitar operações entre pessoas, fica clara a idéia de
que mercados aumentam a prosperidade e, portanto, o bem-estar geral. Intervenções
em mercados podem ser tanto reguladoras quanto moderadoras do conjunto de
operações neles realizadas. Aquelas são intervenções disciplinadoras de certos
mercados, estas as destinadas a corrigir desvios que comprometem o
funcionamento do mercado. 421
421
SZTAIN, Rachel. Teoria Jurídica da Empresa: atividade empresária e mercados. São Paulo: Atlas,
2004. p. 36.
224
422
SZTAIN, Rachel. Op. cit. p. 47.
225
Apesar da indecisão no STF, o caso serve para mostrar que existem outros
espaços constitucionais para monopólios. Um espaço que chega, até mesmo, ao patamar de
um direito fundamental é a questão da propriedade intelectual.
(...) até 1967, as várias Constituições, desde o Império, determinavam que a lei lhes
assegurasse privilégio exclusivo e temporário, ou remuneração, como
ressarcimento da perda que hajam de sofrer por sua vulgarização (Constituição de
1824, art. 179, inc.26), ou então, na República, o privilégio seria concedido pelo
Congresso, consistindo em prêmio razoável, quando houvesse conveniência de
vulgarizá-lo (Constituição de 1934, art.113, inc. 13, e de 1946, art. 141, § 17),
determinaram os constituintes de 1934 e de 1946, omitindo-se, neste particular, a
Carta de 1937, a de 1967, a de 1969 e a 1988. Em 1967, continuando em 1969, a
Constituição “retirou a referência à salvaguarda do lado social da invenção, não
permitindo mais que o Estado a vulgarizasse mediante pagamento de justo prêmio,
ou seja, de acordo com o valor do invento e dos gastos que se ornassem
indispensáveis. Em nossos dias, caba somente o instituto da desapropriação, que,
aliás, não é privilégio algum, conservando-se apenas o privilégio temporário,
retirado o prêmio justo ao inventor. 423
Portanto, é fácil verificar que a propriedade intelectual, mesmo que se procure dar
um cunho de reconhecimento social aos inventores, pode ser interpretada como uma política
pública constitucionalmente prescrita.
Existe um comando constitucional para que se proceda ao estímulo à criação e ao
desenvolvimento. Além disso, a própria norma estabelece o mecanismo pelo qual se fará essa
promoção, através da concessão de direitos exclusivos.
423
JUNIOR, J. Cretella apud BARBOSA, Denis Borges. Bases Constitucionais da Propriedade Intelectual.
Revista da ABPI, Rio de Janeiro, n. 59, p. 16-39. jul./ago. de 2002.
226
424
SHERWOOD, Robert M. Propriedade Intelectual e Desenvolvimento Econômico. São Paulo: EdUsp.
1992. p.61.
425
POSNER, Richard A., Transaction Costs and Antitrust Concerns in the Licensing of Intellectual
Property. John Marshall Review of Intellectual Property. Vol. 4. Iss. 3. 2005. p. 329. Tradução livre: “(...) uma
patente ou um copyright conferem um “monopólio” legal para os seus detentores. Esta prática, apesar de comum,
é um tanto infeliz, pois confunde a idéia de um direito exclusivo com a idéia de um monopólio econômico. Eu
tenho o direito exclusivo ao uso de minha casa, porém não sou um monopolista, nem mesmo se a casa fosse
extremamente valiosa. Uma patente ou um copyright efetivamente cria uma área de direitos exclusivos, porém se
227
No entanto, como já foi indicado no tópico inicial, quase sem nenhuma exceção o
conjunto de direitos outorgados e a duração dos mesmos têm crescido de forma contínua,
dramática e em constante aceleração. Além disso, essa expansão, conforme identificada no
capítulo anterior propicia que a propriedade intelectual se preste a uma série de usos
patológicos. Dessa forma, sem o devido equilíbrio para a propriedade intelectual, esta está se
consubstanciando num próprio empecilho para a atividade criativa e inventiva humana.
o titular será ou não capaz de usar esses direitos para obter um monopólio depende da existência ou não de bons
substitutos para o seu produto (...)”.
228
assumidos pela sociedade duas vezes, uma pelas despesas de pesquisa suportadas
pelos Institutos de Pesquisa Públicos, incluindo as Universidades e apropriado pelas
empresas, outra assumida pelos consumidores no momento de aquisição de bens e
produtos à medida que os consumidores no momento de aquisição de bens e
produtos à medida que os custos de pesquisa serão repassados nos preços aos
mesmos. Terceiro, na afastabilidade do desenvolvimento tecnológico autônomo
brasileiro a partir da implementação do Sistema de Propriedade Industrial,
compreendendo a LPI, reconhecendo a patenteabilidade de intenções, em um
ambiente onde os depósitos de pedido de patentes de não-residentes supera e muito
o depósito em relação ao de residentes, mostrando que a patenteabilidade, única e
exclusivamente, dissociada de outras medidas, como a implementação de políticas
econômica e industrial e um Plano Nacional de Desenvolvimento, torna a
competição e a concorrência econômica com as transnacionais ainda mais difícil e
desigual 426
O inc. XXIX do Art. 5º indica que o privilégio temporário que será conferido ao
inventor deve ter em vista o desenvolvimento tecnológico e econômico do país.
426
GARCIA, Balmes Vega. Direito e Tecnologia – Regime Jurídico da Ciência, Tecnologia e Inovação. São
Paulo: LTr, 2008. p. 136.
229
outorgadas às criações imateriais sejam tantas que venham a inibir o próprio desenvolvimento
cultural e tecnológico.
Assim, apesar do dispositivo constitucional indicar que a lei ira definir o escopo e
a duração dos direitos de exclusividade existe um limite constitucional implícito que decorre
da moldura axiológica da constituição. Há como que uma condição de eficiência social
mínima, para que os privilégios dos incisos XXVII e XIX se reputem constitucionais.
Tal expressão também funciona como uma ponte interpretativa dentro da própria
constituição, pois o desenvolvimento tecnológico e, principalmente, o econômico é
determinado pelos princípios da ordem econômica.
para a observância dos direitos de propriedade intelectual não podem servir de barreiras ao
comércio legítimo. 427
Trata-se de uma limitação de ordem constitucional à lei referida nos incisos XIX e
XXVII do art. 5º da Constituição. Todo o corpo legislativo referente à propriedade intelectual
(Lei de Propriedade Industrial, Lei de Direitos Autorais, Lei do Software e demais diplomas
normativos) deve ser tal que permita a recuperação dos investimentos realizados com o
desenvolvimento de uma nova idéia, bem como estimule novas criações, sem, contudo,
estabelecer proteções tão excessivas que venham a gerar monopólios.
427
HEINEMANN, Andreas. Antitruste Internacional e Propriedade Intelectual. In: RODRIGUES JR, Edson
Beas; POLIDO, Fabrício. (Orgs.). Propriedade Intelectual – Novos Paradigmas Internacionais, Conflitos e
Desafios. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007. p. 441.
231
428
PEREIRA, Luiz Fernando C. Tutela Jurisdicional da Propriedade Intelectual: Aspectos Processuais da
Lei 9.279/96. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. p. 40.
429
FALCÃO, Joaquim. Apud BARBOSA, Denis Borges. Domínio Público e Patrimônio Cultural. In: ADOLFO,
Luis Gonzaga; WACHOWICZ, Marcos (Orgs.). Direito da Propriedade Intelectual – Estudos em
Homenagem ao Pe. Bruno Jorge Hammes. Curitiba: Juruá, 2006. p. 119.
232
O mercado, por sua vez, não impõe que a regulação da propriedade intelectual
seja necessariamente orientada de modo a conferir o máximo de proteção e apropriação
individual.
430
GRAU-KUNTZ, Karin. Direito de Patentes – Sobre a interpretação do Artigo 5º, XXIX da Constituição
brasileira. Artigos da ABPI – Associação Brasileira de Propriedade Intelectual. Disponível em:
<http://www.ibpi.org.br/d_pat.html>. Acesso em: 14.07.08.
233
materiais de apoio relacionados. Isso tudo para que, uma vez ocorrida a
incorporação do software ao meio físico hardware, possibilite-se a execução de
inúmeras funções previamente determinadas e que estão disponíveis para serem
utilizadas e realizadas pelos usuários do computador. 431
Consoante Calos Correia, a tutela do software pelo direito autoral atende aos
interesses de grandes países detentoras de tecnologia, especialmente os Estados Unidos, que
pressionou por esse tipo de proteção:
By pushing the copyright way, the US government and industry strategically opted
for a form of protection which is cheaper to obtain than industrial property rights,
that does not require disclosure and, above all, that permits almost universal and
automatic protection without registration, since the very date of creation of the
program. 432
431
WACHOWICZ, Marcos. Propriedade Intelectual do Software & Revolução da Tecnologia da
Informação. Curitiba: Juruá Editora, 2004. p. 71.
432
CORREA, Carlos M. Intellectual property rights, the WTO and developing countries: the TRIPS
agreement and policy options. London: Zed Books, 2000. p. 129. Tradução livre: “Na busca de uma tutela
através do copyright, o Governo Americano e a indústria optaram estrategicamente por uma forma de proteção
que é mais barata de se obter que direitos de propriedade industrial, que não requer divulgação e, acima de tudo,
permite uma proteção automática quase universal, sem necessidade de registro, desde a data da própria criação
do programa.”
433
ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito Autoral. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar. 1997.p. 668.
234
Essa mesma lógica se reflete no software proprietário tradicional, que vem a ser
aquele em que o usuário não adquire a propriedade do programa, conseguindo apenas uma
licença ou permissão de utilização. Além disso, o acesso se dá somente à funcionalidade do
programa, ao conjunto de instruções e à linguagem da programação que efetivamente criam as
funcionalidades do programa protegidas, não sendo acessadas pelos usuários.
Mais precisamente, para que um software seja considerado “livre”, ele deve
permitir aos usuários um conjunto mínimo de liberdades, que são basicamente de quatro
ordens: a) liberdade de executar o programa, para qualquer propósito; b) liberdade de estudar
como o programa funciona, com acesso ao código-fonte, e adaptá-lo para as suas
necessidades; c) liberdade de redistribuir cópias de modo a ajudar os demais usuários e a
promover a divulgação do programa; e d) liberdade de aperfeiçoar o programa e liberar os
seus aperfeiçoamentos, de modo que toda a comunidade se beneficie do acesso ao código-
fonte. 434
434
WACHOWICZ, Marcos. Propriedade Intelectual do Software & Revolução da Tecnologia da
Informação. Curitiba: Juruá Editora, 2004. p. 89-90.
235
Creative Commons. Desse convênio, originou-se a CC-GNU GPL, licença oficial que tem
sido utilizada pelo Governo Federal para o licenciamento de software em regime livre. 435
São três as dimensões a partir das quais se enfoca o software livre em suas relações
com os princípios constitucionais: uma dimensão formal, como contrato privado, e
duas dimensões substantivas – como política pública e como modo de produção do
conhecimento tecnológico.
A primeira dimensão compreende a simples relação de troca entre o autor do
código fonte e seus múltiplos, inominados e sucessivos usuários. Nesta dimensão,
estamos nos domínios do direito de propriedade e, dentro deste, na seara específica
do direito de propriedade intelectual. O foco é o contrato, com os direitos e
obrigações nele estabelecidos entre o autor e os usuários em torno do usar, gozar e
dispor do software livre.
[...]
A segunda dimensão aparece quando se indaga sobre as partes da relação; uma
delas é justamente a administração pública. Neste caso, além da dimensão de
direito de propriedade intelectual, surge a dimensão do ato administrativo. O foco é
a política pública que busca atender demandas de informatização e, ao mesmo
tempo, contribuir para atingir os objetivos diretos e indiretos de curto, médio e
longo prazo, da administração pública, entre os quais a autonomia tecnológica do
país.
[...]
Finalmente, a terceira dimensão surge quando se avaliam suas conseqüências e o
software livre, que já apareceu como contrato e como política pública, aparece
agora como participante de um determinado modo de produção do conhecimento
tecnológico. Aqui, o software livre é entendido como um meio que contribui para a
435
Histórico do projeto e quadro dos órgãos federais que utilizam o software livre disponível no site:
<http://www.softwarelivre.gov.br> .
236
Com efeito, no cerne do software livre está a existência da exclusividade legal que
é atribuída aos direitos de propriedade intelectual, contudo, essa exclusividade é utilizada em
prol do grupo, pois cada novo programa elaborado será necessariamente livre, pois os termos
da licença originária assim determinam. Dessa forma, o sistema de propriedade intelectual,
voltado para conferir um máximo de poder ao titular dos mesmos, é utilizado para assegurar
um conjunto de liberdades aos usuários.
Com efeito, o software livre tende a ser mais barato, pois na medida em que tem
seu código fonte aberto, não está sujeito ao controle exclusivo de um único titular, podendo
qualquer indivíduo “customizá-lo”, ou seja, promover alterações para talhar o software as
necessidades particulares do usuário.
Nesta perspectiva, o software livre pode representar mais do que uma simples
escolha administrativa para a gestão informática dos entes públicos:
436
FALCÃO, Joaquim, PEREIRA DE SOUSA, Carlos Affonso; ARGUELHES, Diego Werneck. A Constituição
e o software livre. In: FALCÃO, Joaquim; LEMOS, Ronaldo (Coords.). DIREITO DO SOFTWARE LIVRE
E A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. Fundação Getúlio Vargas FGV- Direito Rio. Disponível em:
http://people.oii.ox.ac.uk/thompson/wp-content/uploads/2008/02/direitodosl_e_administracaopublica.pdf>.
Acesso em: 08/08/2008.
237
A referida lei explicitava claramente uma opção pela adoção do software livre no
âmbito da administração estadual. A argumentação apresentada pela parte autora consistia na
suposta violação da Constituição Federal, basicamente por ferir competência da União para
estabelecer normas gerais no tocante a licitação. Além disso, argumentou-se que a eventual
prioridade dada ao software livre estaria a violar os preceitos constitucionais da
Administração de impessoalidade, moralidade e igualdade entre os licitantes. A medida
liminar deferida pelo relator Min. Carlos Ayres Brito versou apenas sobre aspectos formais
para suspender a lei em questão. O pretório excelso não exarou nenhum juízo meritório acerca
do software livre. Ainda não houve julgamento do mérito.
Destaque-se que tal iniciativa legislativa não é isolada. Diversos projetos de lei
tramitam no Congresso Nacional: o Projeto de Lei nº. 2.269/1999, que “Dispõe sobre a
437
FALCÃO, Joaquim, PEREIRA DE SOUSA, Carlos Affonso; ARGUELHES, Diego Werneck. A Constituição
e o software livre. In: FALCÃO, Joaquim; LEMOS, Ronaldo (Coords.). DIREITO DO SOFTWARE LIVRE
E A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. Fundação Getúlio Vargas FGV- Direito Rio. Disponível em:
http://people.oii.ox.ac.uk/thompson/wp-content/uploads/2008/02/direitodosl_e_administracaopublica.pdf>.
Acesso em: 08/08/2008.
438
Lei Estadual do RS nº. 11.871, de 19 de dezembro de 2002, que "Dispõe sobre a utilização de programas de
computador no Estado do Rio Grande do Sul".
238
utilização de programas abertos pelos entes de direito público e de direito privado sob
controle acionário da administração pública”, correndo apensos os Projetos de Lei nº.
3.051/2000, nº. 4.275/2001, nº. 7.120/2002, nº. 2.152/2003, nº. 3.280/2004 e nº 3.070/2008. 439
439
Projetos de lei disponíveis em <http://www.camara.gov.br>. Último acesso em 13 de janeiro de 2006.
239
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e
o saber;
III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições
públicas e privadas de ensino;
IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;
[...]
[..]
Porém, apesar dessa prática ser necessária para a formação acadêmica e, portanto,
correlata à eficácia do direito fundamental a educação, a mesma está em descompasso com a
legislação autoral, pois tais cópias são feitas sem a autorização do titular.
A legislação não define o que seriam estes “pequenos trechos”. Ocorre, portanto,
uma situação de insegurança jurídica, pois não há como se determinar a priori se a cópia
eventualmente realizada por um aluno ou professor é, ou não, violação a direitos autorais.
Com efeito, universidades brasileiras vêm tentando suprimir esta lacuna através
de orientações próprias, como, por exemplo, a Universidade de São Paulo – USP, que em
2005 editou a Resolução nº 5213/05, que considera “pequeno trecho” a utilização de um
capítulo de livro ou de um artigo de periódico, além de permitir a cópia integral de obras que
se enquadrem nas seguintes categorias: I – esgotadas sem republicação há mais de 10 anos; II
– estrangeiras indisponíveis no mercado nacional; III – de domínio público; IV – nas quais
conste expressa autorização para reprodução.
Por outro lado, entidades que congregam editoras, como a Associação Brasileira
de Direitos Reprográficos - ABDR, defendem de forma incisiva que a cópia de capítulos
inteiros seria uma violação legal, devendo pequenos trechos ser considerados como pequenas
e pontuais citações.
Enoch Bruder, então presidente da ABDR quando das foi editada a resolução da
USP em 2005 assim se manifestou:
contexto da obra, não a essência da obra. Um capítulo, ora, é essência de obra (...). A
posição da ABDR é o que está na lei: a reprodução de qualquer coisa tem de ser
autorizada. O direito autoral, como reza na lei 9.610, é direito do autor, do criador,
do tradutor, do pesquisador, do artista, enfim, é um direito moral e patrimonial de
quem criou a obra. A reprodução é a cópia em um ou mais exemplares de uma obra
literária. Isso é contrafação, ou seja, sem autorização, fere preceitos legais. É um ato
ilícito Civil e Penal. 440
440
PORTAL UNIVERSIA. Afinal, copiar trechos de livros é certo ou errado? Notícia Publicada em
12/09/2005. Disponível em: <http://www.universia.com.br/materia/materia.jsp?id=8743> . Acesso em:
08/08/2008.
242
Por fim, além de uma legislação específica e uma tutela jurisdicional, este
trabalho reputa como essencial, para que haja um correto equilíbrio, a atuação governamental
promovendo a restauração e ampliação dos acervos das bibliotecas públicas, iniciativa que,
acredita-se, contribuiria para minorar o problema de cópias ilegais, pois existiram espaços
institucionais adequados para permitir o acesso ao conhecimento.
O paralelo que surge entre esses dois pólos constitucionais é expressivo, até
mesmo, na terminologia associada. As criações intelectuais previstas no contexto do artigo 5º
são, conforme visto no primeiro capítulo, encapsuladas pela nomenclatura de “propriedade
intelectual”. Já aos bens imateriais identificados pelo art. 216, estes são referenciados
expressamente como “patrimônio cultural”, ou seja, elementos integrantes da Cultura da
sociedade.
441
SILVA, José Afonso. Ordenação Constitucional da Cultura. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 51.
243
A cultura, segundo Ana Maria Marchesan “(...) é tudo aquilo que é criado pelo
homem. É também um conjunto de entes que, embora não sejam fruto da criação humana (ex.
as paisagens naturais) são valorados como bens culturais”. 442
442
MARCHESAN, Ana Maria Moreira. A tutela do patrimônio cultural sob o enfoque do direito ambiental,
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 17.
443
SAMPAIO CUNHA, Danilo Fontenele. Patrimônio Cultural – Proteção Legal e Constitucional. Rio de
Janeiro: Letra Legal Editora, 2004. p. 25.
444
LIMA RODRIGUES, Francisco Luciano. O Direito ao patrimônio cultural preservado – um direito e uma
garantia fundamental. Revista Pensar, Fortaleza, p. 52-61, abr. 2007. p. 60.
445
GANDELMAN, Silvia Regina Dain. Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural Imaterial. In: Anais
do Seminário Patrimônio Cultural e Propriedade Intelectual: proteção do conhecimento e das expressões
244
Esse tipo de patrimônio imaterial não contava com uma política específica de
proteção. Em novembro de 1997, por ocasião de um seminário comemorativo dos sessenta
anos de funcionamento do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN
realizado em Fortaleza/CE, foi elaborado o documento identificado como “Carta de
Fortaleza”, onde se fez constar a necessidade de regulamentação da forma de preservação
desses bens imateriais. As formas de proteção previstas no art. 216, § 1º para esses bens
imateriais foram regulamentadas através do Decreto nº 3.551/2000.
Num primeiro momento, seria possível interpretar que não há conflito, pois se
tratam de objetivos distintos. A propriedade intelectual estaria voltada para preservar usos
econômicos das obras e a proteção do patrimônio cultural para a preservação para fins de
identidade cultural. 447 Entretanto, existem situações de conflitos entre os objetos de proteção.
culturais tradicionais. Belém/PA, 13-15 de out. 2004. MOREIRA, Eliane; BELAS, Carla Arouca; BARROS,
Benedita; PINHEIRO, Antônio. (Orgs.). p. 211-222. Belém: CESUPA/MPEG. 2005. p. 216.
446
SAMPAIO CUNHA, Danilo Fontenele. Patrimônio Cultural – Proteção Legal e Constitucional. Rio de
Janeiro: Letra Legal Editora, 2004. p. 119.
447
GANDELMAN, Silvia Regina Dain. Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural Imaterial. In: Anais
do Seminário Patrimônio Cultural e Propriedade Intelectual: proteção do conhecimento e das expressões
culturais tradicionais. Belém/PA, 13-15 de out. 2004. MOREIRA, Eliane; BELAS, Carla Arouca; BARROS,
Benedita; PINHEIRO, Antônio. (Orgs.). p. 211-222. Belém: CESUPA/MPEG. 2005. p. 221.
245
No campo do direito autoral, por sua vez, o registro das expressões e formas de
viver, em tese, poderia violar direitos autorais ou de copyright das comunidades envolvidas,
pois a forma de expressão é exatamente o objeto de proteção legal.
Uma das petições de amicus curiae foi elaborada pela empresa Hal Roach
Studios, que lida com a restauração de filmes antigos. A entidade demonstrou que a extensão
prevista para o tempo de proteção do copyright seria prejudicial à preservação da herança
cultural cinematográfica americana.
Por outro lado, o tempo de proteção estende-se por um período que pode ser
superior a um século. A duração da proteção para autores é o tempo de sua vida mais 70
246
(setenta) anos (art. 41 da Lei 9.610/98). Até mesmo para trabalhos anônimos, o prazo de
proteção de 70 (setenta) anos também é aplicável a partir do ano subseqüente ao da
publicação da obra.
Trabalhos artísticos onde o próprio meio de fixação degrada-se com o tempo não
contam com uma política de proteção adequada, pois a legislação brasileira não prevê como
exceção a realização de cópia para fins de preservação, ou seja, não é previsto como uma
limitação expressa aos direitos autorais (art. 46 da Lei 9.610/98).
Para resguardar uma prática de preservação, que em última análise seria uma
forma de dar efetividade ao comando constitucional de proteção ao patrimônio cultural, é
preciso interpretar as limitações dos direitos autorais de forma ampliativa, para abranger
situações onde a prática resguarda outros valores constitucionais relevantes para a sociedade.
Observe-se que o Código Penal foi alterado pela Lei 10.695/03, para permitir uma
tutela ainda mais contundente dos direitos autorais. O art. 184 do Código Penal passou a ter a
seguinte redação:
Violação de direito autoral
Essa forma de tutela penal é passível de várias críticas, dentre elas, o caráter vago
da expressão “violar direito de autor”, remetendo a configuração do delito a um conceito civil.
Essa problemática se torna ainda mais evidente diante da constatação de que se trata de uma
questão doutrinária controvertida o caráter restritivo ou não das exceções ou limitações aos
direitos autorais como observado no início deste capítulo.
Túlio Lima Vianna indica que o caput do art. 184 viola o princípio constitucional
da taxatividade, pois os direitos de autor refletem uma gama de interesses jurídicos diversos,
sejam os direitos de ordem moral dos autores, sejam os direitos patrimoniais que ainda
residem com o autor, sejam os interesses patrimoniais que residem com as empresas de
distribuição e produção de mídia. 448
448
VIANNA, Túlio Lima. A Ideologia da Propriedade Intelectual: a inconstitucionalidade da tutela penal
dos direitos patrimoniais de autor. In: Anuario de Derecho Constitucional Latinoamericano. Montevideo:
Fundação Konrad Adenauer. 2006.Tomo II. p. 933-947. p. 943.
248
O autor ainda defende que a atual tutela penal serve não para atender a interesses
legítimos do autor ou da sociedade, mas como forma de preservar um monopólio dos
distribuidores de produtos culturais, ou seja, da indústria do entretenimento. 449
Argumenta que a tutela penal desses direitos patrimoniais nada mais é do que a
tutela penal de uma mera obrigação civil, em descompasso com os valores constitucionais
pertinentes, justificável apenas pela ideologia de “propriedade” subjacente aos direitos
autorais, sendo inadequada a comparação da cópia em meio digital com o crime de furto:
Em contraponto à essa visão doutrinária, existem projetos de lei que desejam uma
repressão ainda mais intensa a possíveis violações de direitos de propriedade intelectual,
especialmente no contexto de um ambiente digital. Trata-se do projeto de lei complementar nº
89/2003, de autoria do Deputado Eduardo Azeredo.
449
VIANNA, Túlio Lima. A Ideologia da Propriedade Intelectual: a inconstitucionalidade da tutela penal
dos direitos patrimoniais de autor. In: Anuario de Derecho Constitucional Latinoamericano. Montevideo:
Fundação Konrad Adenauer. 2006.Tomo II. p. 933-947. p. 944.
450
VIANNA, Túlio Lima. Op. cit. p. 944 et seq.
249
Tal legislação criminaliza uma série de condutas no ambiente digital. Foi alvo de
várias críticas de comunidades e grupos sociais ligados a gestão das tecnologias digitais e a
Internet. Para a organização não governamental SaferNet Brasil, o projeto de lei terá grande
impacto sobre a liberdade no ambiente digital.
A entidade critica o caráter vago das definições dos crimes, bem como a
imputação de responsabilidade aos provedores de acesso em denunciar usuários que acessem
conteúdos de obras protegidas por direitos de propriedade intelectual quando não
autorizados. 451
Fica claro que esse maior controle permitido aos detentores de direitos autorais
possui sérias implicações sobre os valores constitucionais de acesso à cultura e à informação,
sendo necessária uma maior cautela na interpretação e aplicação do direito aos casos
concretos.
451
CARPANEZ, Juliana. Entenda a polêmica sobre o impacto da lei de crimes cibernéticos. Globo Notícias.
Publicada em 21/07/2008. Disponível em: <http://g1.globo.com/Noticias/Tecnologia/>. Acesso em: 08/08/2008.
250
A propriedade intelectual, por sua vez, possui uma correlação direta com o
princípio da solidariedade, pois os dispositivos constitucionais que garantem a existência
desses direitos apresentam redação que expressamente ressalta a destinação social dos
mesmos.
452
BODIN DE MORAES, Maria Celina. O Princípio da Solidariedade. Instituto de Direito Civil. Disponível
em: <http://www.idcivil.com.br/pdf/biblioteca9.pdf>. Acesso em: 08/08/2008. p. 3.
453
BODIN DE MORAES, Maria Celina. Op. cit. p. 9.
454
SILVA, Cleber Demetrio Oliveira da. O princípio da solidariedade . Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n.
1272, 25 dez. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9315>. Acesso em: 09 ago.
2008.
251
Lawrence Lessig ressalta que a atualidade é marcada por uma produção cultural
empresarial, onde grandes conglomerados de mídia produzem conteúdos que devem ser
consumidos, sem, contudo, existir a possibilidade de utilização desses bens culturais por parte
da coletividade que lhe confere valor e sentido. 456
O Brasil sofre não só com a expansão desse controle, mas com a existência, na
lição de Marcos Wachowicz, de uma “brecha” digital, ou seja, de segmentos da sociedade que
não possuem acesso às tecnologias digitais e à informação. 458 Há não só uma exclusão digital
456
LESSIG, Lawrence. How creativity is being strangled by the law. Technology, Entertainment, Design
Conference march 2007. Disponível em: <http://www.ted.com/index.php/talks/
larry_lessig_says_the_law_is_strangling_creativity.html>. Acesso em: 08/08/08.
457
ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito da Internet e da Sociedade da Informação. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p. 135-137.
458
WACHOWICZ, Marcos. Os Direitos da Informação na Declaração Universal dos Direitos Humanos. In:
WACHOWICZ, Marcos (coord.). Propriedade Intelectual & Internet. Curitiba: Juruá Editora, 2002. p. 37-49.
p. 41.
253
Para Lessig, os desequilíbrios no sistema podem afetar até mesmo a forma como
as novas gerações irão interagir com as novas tecnologias. Cada vez mais, as tecnologias
digitais possibilitam uma captura de sons e imagens dos meios de comunicação com novas e
baratas tecnologias, como computadores mais modernos e softwares apropriados, permitem
que os indivíduos possam mixar e re-mixar tais conteúdos de modo a encontrar novas formas
de expressão. 460
Lessig chega a comparar essas novas formas de utilização de imagens e sons com
a alfabetização das novas gerações, o que viria a permitir uma Read-Write Culture, ou seja,
onde os indivíduos participam de forma ativa na construção de bens intelectuais que são
divididos e assimilados pela comunidade. 461
Essa forma de cultura parece ser a mais adequada a permitir uma efetiva aplicação
do princípio da solidariedade social e somente será atingida com uma reformulação dos
459
WACHOWICZ, Marcos. Desenvolvimento e Inclusão Digital. 2º Encontro Ibero Latinoamericano de
Governo Eletrônico e Inclusão Digital Universidad de Zaragoza Universidade Federal de Santa Catarina
Zaragoza - Jaca, Espanha 26-27 de julho de 2007. Disponível em:
<www.lefis.org/meetings/workshops/2007/jaca_2007/contenido/jaca07_marcos.ppt>. Acesso em: 08/08/08.
460
LESSIG, Lawrence. How creativity is being strangled by the law. Technology, Entertainment, Design
Conference march 2007. Disponível em: <http://www.ted.com/index.php/talks/larry_lessig_says_
the_law_is_strangling_creativity.html>. Acesso em: 08/08/08.
461
LESSIG, Lawrence. Op. cit.
254
(...) o capitalismo hiperglobalizado utiliza a tecnologia atual para criar uma ainda
maior rotatividade de bens e produtos, lançando mão de estratégias que agregam
novos bens associados à dependência contínua de novos serviços tarifados,
eventualmente, inclusive integrando-os, como o serviço de telefonia móvel e a rede
mundial de computadores (na qual a obsolescência dos produtos é alcançada em
meses) ou os transgênicos que, por via tecnológica, pulverizam a antiga vantagem
natural competitiva de alguns países relativa a seus recursos naturais como o solo, a
água e sol, enredando também seu setor primário nas teias do capitalismo
tecnológico, como já ocorrido no setor secundário pendente dos direitos patentários,
e terciário relativo aos direitos marcários e autorais. 462
(...) o Direito, por meio dos campos patrimonialistas, das Propriedades Intelectual e
Industrial (Direito Civil e Comercial), viabilizando e possibilitando, por meio de
suas Patentes, Direitos Autorais e Programas de Computador, Sinais Distintivos,
Desenhos Industriais, distintas formas de tutela dos conhecimentos culturais e
tecnológicos, assegurando ao capitalismo atual a sua expansão e sobrevivência,
através do controle da Cultura e Tecnologia de cada Sociedade. 463
462
GARCIA, Balmes Vega. Direito e Tecnologia – Regime Jurídico da Ciência, Tecnologia e Inovação. São
Paulo: LTr, 2008. p. 100.
463
GARCIA, Balmes Vega. Op. cit. p. 100.
255
A apropriação capitalista, por sua vez, volta-se aos interesses do mercado, o que
provoca distorções no tipo de ciência, tecnologia e culturas que serão produzidas, difundidas e
consumidas. Aquelas que assegurarem o melhor retorno ao capital terão primazia, em
detrimento de anseios e necessidades das coletividades, que não são necessariamente
lucrativas.
O período atual tem como uma das suas bases esse casamento entre ciência e
técnica, essa tecnociência, cujo uso é condicionado pelo mercado. Por conseguinte,
trata-se de uma técnica e de uma ciência seletivas. Como, freqüentemente, a ciência
passa a produzir aquilo que interessa ao mercado, e não à humanidade em geral, o
progresso técnico e científico não é sempre um progresso moral. Essa globalização
tem de ser encarada a partir de dois processos paralelos. De um lado, dá-se a
produção de uma materialidade, ou seja, das condições materiais que nos cercam e
que são a base da produção econômica, dos transportes e das comunicações. De
outra, há a produção de novas relações sociais entre países, classes e pessoas. A
nova situação, conforme acentuamos, vai se alicerçar em duas colunas centrais. Uma
tem como base o dinheiro e a outra funda na informação. Dentro de cada país,
sobretudo entre os mais pobres, informação e dinheiro mundializado acabam por se
impor como algo autônomo face à sociedade e, mesmo à economia, tornando-se um
elemento fundamental da produção, e ao mesmo tempo da geopolítica. 464
464
SANTOS, Milton. Por uma Outra Globalização – do pensamento único à consciência universal. 11. ed.
Rio de Janeiro: Editora Record, 2004. p. 97.
256
Com efeito, Peter Barnes destaca que para responder à crise do capitalismo
moderno, faz-se necessário revigorar a idéia de commons, estes vislumbrados como todos os
recursos que são recebidos tal qual “presentes” de gerações passadas e são de titularidade
difusa. Nessa categoria incluem-se os três principais tipos de commons: natureza, comunidade
e cultura. 467
A cultura, tal qual o meio ambiente, por exemplo, é algo que todas as gerações
humanas recebem das gerações passadas, utilizam e retornam a gerações futuras. Nessa
categoria particular de commons, Barnes inclui como exemplos: linguagem, filosofia, religião,
física, química, biologia, música, astronomia, eletrônica. 468
465
BENKLER, Yochai. The Wealth of Networks: How Social Production Transforms Markets and
Freedom. New Haven: Yale University Press, 2006. p.1.
466
SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 20.
467
BARNES, Peter. Capitalism 3.0. San Francisco: Berret-Koehler Publishers, Inc. 2006. p. 15.
468
BARNES, Peter. Op. cit.
257
consumida e recriada. Estes impactos são relevantes não só para as relações entre indivíduos,
mas para toda a coletividade.
469
BOYLE, James. The Second Enclosure Movement and the Construction of the Public Domain. In: Duke
Conference on the Public Domain. Law and Contemporary Problems. Volume 66, p. 33-74. Winter/Spring 2003.
p. 72.
470
BENKLER, Yochai. The Wealth of Networks: How Social Production Transforms Markets and
Freedom. New Haven: Yale University Press, 2006. p. 129. Tradução livre: “Como a sociedade produz seu meio
ambiente informacional relaciona-se com o próprio núcleo da liberdade. (...) Liberdade depende do meio
ambiente informacional que indivíduos e sociedades ocupam.”
258
Art. 225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e
futuras gerações.
Nesse sentido,
Essa idéia de que existe uma responsabilidade atual para com gerações futuras é
um paradigma que deve ser transplantado para o commons cultural. Com efeito, não é só o
meio ambiente físico ou natural que necessita de cuidados atuais para poder ser passado para
as gerações futuras.
471
LEITE, José Rubens. Dano Ambiental: do individual ao coletivo e extrapatrimonial. RT. São Paulo, 2003.
p.74.
472
BURKE, Edmund. Reflections on The Revolution in France. 1790. Disponível em:
<http://socserv2.mcmaster.ca/~econ/ugcm/3ll3/burke/revfrance.pdf>. Acesso em 08/08/08. Tradução livre:
“Sociedade é realmente um contrato. (...) É uma parceria em toda a ciência; uma parceria em todas as artes; uma
parceria em toda virtude e em toda a perfeição. Como os objetivos dessa parceria não podem ser obtidos em
várias gerações, fica claro que essa parceria não é somente entre aqueles que estão vivos, mas entre aqueles que
estão vivos, aqueles que estão mortos e aqueles que estão por nascer.”
259
Assim, é opinião deste trabalho que, da mesma forma que existe uma obrigação
constitucional para a preservação do meio ambiente em face das gerações futuras, também
deve existir uma obrigação constitucional em relação aos conhecimentos, práticas,
informações e tecnologias que compõem o horizonte cultural comum da humanidade.
Cada geração possui a obrigação para com as gerações futuras de repassar uma
cultura livre, onde os indivíduos possam ser ativos participantes na construção e utilização
dos objetos culturais e não meros consumidores passivos.
473
LESSIG, Lawrence. How creativity is being strangled by the law. Technology, Entertainment, Design
Conference march 2007. Disponível em: <http://www.ted.com/index.php/talks/larry_lessig_says_
the_law_is_strangling_creativity.html>. Acesso em: 08/08/08.
CONCLUSÃO
A estreita relação com o comércio internacional é outro elemento que sugere uma
concepção mais pragmática do que as alicerçadas em considerações de reconhecimento moral
de autores e inventores.
262
A idéia da dignidade dos autores e dos inventores surgiu num momento histórico
posterior e, até os dias atuais, ainda é utilizada como forma de advogar uma progressiva
expansão dos direitos exclusivos, tanto em escopo como em duração.
A perspectiva dos tratados internacionais, por sua vez, aponta para a percepção de
um dúplice direito humano. O direito de gozar de proteção dos interesses morais e
patrimoniais decorrentes de obras artísticas e científicas e o direito de participar da vida
cultural e beneficiar-se dos avanços tecnológicos da sociedade.
Esse equilíbrio tem sido comprometido pela expansão dos direitos de propriedade
intelectual em escopo e duração, bem como pela sua utilização abusiva por parte dos titulares,
escudados na retórica de proteção à propriedade dos autores e inventores.
limites, dentro do processo democrático. Essa deferência, todavia, não desobriga o respeito a
um juízo material de constitucionalidade do equilíbrio proposto.
O sistema não pode ser utilizado como uma simples maneira de preservação de
modelos de negócio ou como forma de permitir novas oportunidades para acumulações de
capital, dissociado de uma pauta informativa ética. Transpor uma ótica de direitos humanos
serve para suprir o norte moral no qual deve pautar-se a interpretações dos direitos de
propriedade intelectual, voltando-se sempre para um desenvolvimento humano e eqüitativo
dos indivíduos e das nações.
Sendo uma escolha social, além de racional, deverá ser a mais adequada para
preservar os valores fundamentais da sociedade. Enquanto escolha, da mesma forma que em
relação ao meio ambiente, deverá levar em consideração na sua formulação os interesses, e
mesmo necessidades, das gerações futuras de desfrutar de uma herança cultural – artística,
científica e tecnológica – rica, farta e acessível.
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