TGDCII Sebenta Mota Pinto

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 52

[Escrever texto]

TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL II- MOTA PINTO

I – TEORIA GERAL DO OBJECTO DA RELAÇÃO JURÍDICA


 CAPÍTULO I – GENERALIDADES

1. OBJECTO DA RELAÇÃO JURÍDICA. CONCEITO. OBJECTO E CONTEÚDO

O objecto é aquilo sobre que recaem os poderes do titular do direito (do sujeito activo da RJ). Logo, o
objecto da relação jurídica é o objecto de direitos subjectivos, é todo o quid, todo o ente, todo o bem sobre
que podem recair direitos subjectivos.
O objecto de um direito e o conteúdo de um direito são conceitos distintos.
O conteúdo é o conjunto dos poderes ou faculdades que o direito subjectivo comporta.

Ex.: Direito de propriedade sobre o carro A. Objecto: carro A. Conteúdo: poderes de usar, dispor, fruir.

Questão discutida na doutrina: Os direitos potestativos têm objecto?


Opinião do curso: Não, embora tenham necessariamente conteúdo. Estes são direitos a uma modificação
jurídica – constituição, modificação ou extinção de RJ. No máximo poderíamos pretender que para os
direitos potestativos, modificativos ou extintivos o objecto fosse a própria RJ modificada ou extinta, mas e
para os constitutivos? (…) Há autores que dizem que o objecto dos direitos potestativos seria o
comportamento do sujeito activo destinado a produzir efeitos na esfera de outrem (Santoro-Passareli),
outros que dizem ser o próprio efeito jurídico (J. Castro Mendes).

2. OBJECTO IMEDIATO E OBJECTO MEDIATO

Objecto imediato – está directamente submetido aos poderes que integram um direito subjectivo.

Objecto mediato – é aquilo que só através de um elemento mediador está submetido aos poderes que
integram um direito subjectivo. (só de uma forma mediata ou indirecta)

Ex.: Nos direitos reais não há intermediário entre o titular do direito e a coisa. (a coisa é o objecto
imediato). Nos direitos de crédito (nas obrigações), o credor só tem direito à coisa através da prestação do
devedor. Objecto imediato: prestação do devedor. Objecto mediato: a coisa.
3. OS POSSÍVEIS OBJECTOS DE RELAÇÕES JURÍDICAS

São possíveis objectos de RJ: as pessoas; certas manifestações ou modos de ser físicos ou morais das
pessoas; prestações; os direitos subjectivos e as coisas (corpóreas ou incorpóreas).

a)Pessoas: os direitos sobre pessoas tratam-se de poderes-deveres ou poderes funcionais, estabelecidos


no interesse da pessoa sobre a qual incidem os mesmos direitos, pois o ser humano só pode «fazer parte
de uma RJ conforme a sua condição de pessoa». Ex.: artigos: poder paternal {1878º; 1881º; 1886º; 1887;
poder tutelar {1935º. Nestes exemplos o objecto da RJ é a própria pessoa do filho ou do pupilo, sujeita à
potestas pátria ou tutelar.
[Escrever texto]

b) Certas manifestações ou modos de ser físicos ou morais das pessoas: trata-se de direitos sobre a
própria pessoa, sobre bens da personalidade. São irrenunciáveis e insusceptíveis de limitação voluntária
quando esta for contrária à ordem pública (art. 81º).

c) Prestações: resultam de uma obrigação e traduzem-se num comportamento do devedor. Pode haver:
obrigações de prestação de facto positivo (uma actividade), de facto negativo (uma abstenção – ver art.
829º) ou de coisas (nestes casos a coisa (res) é o objecto mediato, pois só através da prestação – objecto
imediato – é que o credor tem direito à res.

e) Direitos subjectivos: algumas soluções legais ajustam-se à figura dos direitos sobre direitos, pelo que
dizemos que um direito subjectivo pode constituir o objecto de outro direito subjectivo. Exs.: 679º e ss;
1439º; 1446º; 1463; 1464º; 1467º; 688º nº1 e); etc

d) Coisas (ver 202º e ss)


- Corpóreas ou materiais: são realidades físicas, carecidas de personalidade, com existência autónoma,
utilidade e susceptíveis de apropriação.

- Incorpóreas ou bens imateriais: este objecto prende-se com as criações espirituais do homem, através
do qual surgem obras, invenções industriais, etc. Como são bens com valor patrimonial autónomo e
intimamente ligados à personalidade do seu autor o Direito tutela-os, atribuindo direitos ao(s) seu(s)
criador(es). Exemplos: direitos de autor e propriedade industrial (ver 1303º). Nota: o objecto do direito de
autor não é o livro, CD, filme, quadro… é a obra na sua forma ideal, por isso é que é uma coisa incorpórea.

 CAPÍTULO II – AS COISAS E O PATRIMÓNIO


4. NOÇÃO JURÍDICA DE COISA

Sentido corrente: tudo o que pode ser pensado; sentido físico: tudo o que tem existência corpórea.

Sentido jurídico: Ver art. 202º CC. Nota: Sendo certo que as coisas são a espécie mais corrente de
objectos de relações jurídicas, nem tudo o que é susceptível de ser objecto de relações jurídicas é uma
coisa em sentido jurídico. A definição correcta seria: coisa – bem de carácter estático (assim se excluem do
conceito as pretações) desprovido de personalidade jurídica (artigo 66º), susceptível de constituir objecto
de relações jurídicas. E para que as coisas possam ser objecto de RJ têm de apresentar as ss características:
- existência autónoma ou separada
- possibilidade de apropriação exclusiva por alguém (ao contrário da luz solar, atmosfera, etc)
- aptidão para satisfazer necessidades humanas (um grão de areia não é uma coisa)

Não é necessário:
- serem bens de natureza corpórea
- serem bens permutáveis (c/ valor de troca – podem ter apenas valor sentimental)
- serem bens efectivamente apropriados (os peixes não apropriados são res nullius)
Há várias categorias de coisas e, por vezes, a lei faz corresponder regimes jurídicos específicos a certas
categorias. (ver art. 204º e ss)
Vejam-se também as noções de frutos (cfr. arts.212º, 1270º e 1271º) e de benfeitorias (cfr. arts. 216º e
1273º - 1275º). As benfeitorias podem ser necessárias, úteis e voluptuárias.

5. NOÇÃO DE PATRIMÓNIO
[Escrever texto]

As qualidades do sujeito, tais como a força de trabalho, a competência técnica, etc não são património.
Todavia, a sua lesão ilícita e culposa, por terceiro, gera danos patrimoniais indemnizáveis (dever de cobrir
os lucros cessantes). A palavra património conhece várias acepções:

Património global: conj. de RJ activas e passivas (direitos + obrigações) avaliáveis em dinheiro (pelo valor
de troca qd o direito é alienável mediante contraprestação ou pelo valor de uso qd o gozo do bem só se
obtém mediante uma despesa) de que uma pessoa é titular.
Nota: trata-se de um conj. de RJ, não de um conj. de imóveis, móveis… o património é integrado por
direitos sobre as coisas – propriedade, usufruto, etc. (ver art. 2075º).

-» Património bruto ou ilíquido: conj. de direitos avaliáveis em dinheiro pertencentes a uma pessoa,
abstraindo, portanto, das obrigações. É neste sentido que o art. 817º fala no direito do credor de executar
o património do devedor (obviamente que não irá executar obrigações, mas apenas direitos). É este o
conceito relevante para efeitos de responsabilidade civil.

Património líquido: é, no fundo, o saldo patrimonial = RJ activas ou direitos – obrigações ou RJ passivas. É


um conceito meramente económico.

Património ≠ Esfera jurídica a totalidade de RJ de que uma pessoa é sujeito, abrangendo os dtos
e as obrigações não avaliáveis em dinheiro.

6. O FENÓMENO DA AUTONOMIA PATRIMONIAL OU SEPARAÇÃO DE PATRIMÓNIOS

Normalmente, na esfera jurídica de uma pessoa só existe um património, porém, há situações em que
existe uma massa de relações patrimoniais, pertencentes ao mesmo sujeito do património geral com um
tratamento jurídico particular. Dá-se a este fenómeno o nome de património separado ou património
autónomo (embora a designação de património autónomo seja utilizada tb para os patrimónios
transitoriamente sem sujeito – ex.: herança jacente). Reconhece-se a existência de um património
separado pelo critério da responsabilidade por dívidas, pois o património tem como principal função
responder pelas dívidas do seu titular. Assim, o património separado responde por dívidas próprias – só
responde e responde só ele por certas dívidas.
Ex.: a herança é um património separado se os bens hereditários responderem apenas pelas dívidas do de
cujus, e não pelas dívidas pessoais do herdeiro, e se pelas dívidas do de cujus responder só o activo da
herança e não o património pessoal do herdeiro.

7. A FIGURA DO PATRIMÓNIO COLECTIVO

Património colectivo ≠ Compropriedade ou propriedade em comum

Património colectivo - Existe quando um património tem vários sujeitos e pertence no seu todo ao conj.
de pessoas correspondente. O direito sobre toda a massa patrimonial cabe ao grupo no seu conj. Nenhum
dos titulares pode alienar uma quota [parte] desse património nem requerer a sua divisão, enqt não
terminar a causa geradora do surgimento do património colectivo. Ex.: comunhão conjugal – ver artgs
1695º e 1696º.
[Escrever texto]

Compropriedade ou propriedade em comum – estamos perante uma comunhão por quotas ideais, cada
comproprietário ou consorte tem direito a uma quota ideal ou fracção do objecto comum. Ver arts. 1408º e
1412º.

II – TEORIA GERAL DO FACTO JURÍDICO


TITULO I – DOS FACTOS JURÍDICOS EM GERAL

Voluntários ou Actos jurídicos Involuntários ou Naturais

 CAPÍTULO I – CONCEITOS E CLASSIFICAÇÃO


8. NOÇÃO DE FACTO JURÍDICO

Facto jurídico é todo o acto humano ou acontecimento natural juridicamente relevante (dado que produz
efeitos jurídicos). [Um convite para um passeio não é um facto jurídico, pois não produz efeitos jurídicos.]

9. CLASSIFICAÇÃO DOS FACTOS JURÍDICOS

Factos
Jurídicos

Lícitos Ilícitos Negócios Simples


Jurídicos actos
jurídicos

Quase negócios jurídicos


ou Actos jurídicos quase Operações jurídicas
negociais

Factos Jurídicos Voluntários ou Actos jurídicos: são acções humanas tratadas pelo Direito como
manifestações de vontade.

Factos Jurídicos Involuntários ou Naturais: não resultam da vontade mas de causas de ordem natural
(ex.: decurso do tempo, nascimento, morte, a vizinhança). A sua eventual voluntariedade não tem
relevância jurídica.

Actos jurídicos Lícitos: são conformes à ordem jurídica e por ela consentidos.

Actos jurídicos Ilícitos: são contrários à ordem jurídica e por ela reprovados, pelo que importam uma
sanção para o infractor.
[Escrever texto]

Negócios Jurídicos: são actos jurídicos compostos por uma ou mais declarações de vontade com a
intenção de alcançar efeitos práticos sob a tutela da ordem jurídica que determina a produção de efeitos
jurídicos concordantes com a intenção dos sujeitos, i. e., com o conteúdo da vontade das partes, tal como o
conteúdo é objectivamente apercebido (de fora) Os efeitos dos negócios jurídicos produzem-se ex
voluntate e ex lege. (ex.: testamentos, contratos…)

Simples actos jurídicos ou actos jurídicos stricto sensu: (ver art. 295º) são factos voluntários cujos efeitos
se produzem ex lege (por força da lei) e não ex voluntate (por força da vontade), embora mtas vezes haja
concordância entre a vontade destes e os respectivos efeitos. (ex.: interpelação do devedor – art. 805º,
fixação de domicílio voluntário – art. 82º, descoberta de um tesouro – art. 1324º, homicídio voluntário…)

Quase negócios jurídicos ou Actos jurídicos quase negociais: traduzem-se na manifestação exterior de
uma vontade (exs.: 805º, fixação do prazo referido no 808º, gestão de negócios – 464º e ss,etc)

Operações jurídicas, acto material ou real: realização de um resultado material ou factual a que a lei liga
certos efeitos jurídicos (ex.: invenções industriais, criação artística, descoberta de um tesouro…)

 CAPÍTULO II – AQUISIÇÃO, MODIFICAÇÃO E EXTINÇÃO DE RELAÇÕES JURÍDICAS


10. PRELIMINARES

Os factos jurídicos desencadeiam determinados efeitos, que consistem numa aquisição, modificação ou
extinção de RJ e, portanto, de direitos (considerando o lado activo da RJ).

11. CONCEITO E MODALIDADE DE AQUISIÇÃO DE DIREITOS. AQUISIÇÃO ORIGINÁRIA E AQUISIÇÃO DERIVADA. MODALIDADES
DESTA ÚLTIMA

I - Aquisição de direitos ≠ constituição de direitos

II - Aquisição: Aquisição originária


Aquisição derivada:
Aquisição derivada translativa
Aquisição derivada constitutiva
Aquisição derivada restitutiva
III - Aquisição derivada ≠ sucessão
_____________________________________________________________________________________
I – Aquisição de direitos: ligação de um direito a uma pessoa. Um direito é adquirido qd alguém se torna
titular dele.
Constituição de direitos: é o seu surgimento, é a criação de um direito que não existia antes. Se há
constituição, há aquisição de direitos, pois não existem direitos sem sujeito. Mas pode haver aquisição de
direitos sem haver constituição de direitos, por exemplo, qd um direito preexistente na titularidade de
outra pessoa muda de sujeito.

II – Aquisição originária: neste caso o direito adquirido não depende da existência ou da extensão de um
direito anterior. Ou seja, pode haver aquisição de direitos originária quando se origina um direito devido a
[Escrever texto]

um qualquer acto jurídico (ver ex. 1) ou quando, apesar de [e não por causa de] existir um direito anterior,
se adquire um novo direito (ver ex. 2).
Ex. 1: Se eu crio uma obra literária adquiro direitos de autor. Neste exemplo não há direito anterior.
Ex. 2: Apesar da preexistência de um direito de propriedade, se eu faço uso de um terreno há mais de 20
anos, adquiro-o por usucapião (1287º e ss). Outro exemplo é o do art. 1318º e ss – ocupação de coisas
móveis.

Aquisição derivada: o direito adquirido funda-se ou filia-se na existência de um direito na titularidade de


outra pessoa. É por causa da existência anterior desse direito e a sua extinção ou limitação que se gera a
aquisição do direito por um novo titular. (Ex.: aquisição de dto de propriedade através de contrato de
compra e venda).

Aquisição derivada translativa: é a forma + vulgar de aquisição derivada. O direito adquirido é o mesmo
que pertencia ao anterior titular. (ex.: Compra e venda, doação, sucessão, herança…)

Aquisição derivada constitutiva: o direito adquirido filia-se num direito (mais amplo) do anterior titular.
Não há uma perda completa, há uma limitação do direito preexistente. (ex.: o proprietário de um prédio
constitui [por venda, etc] uma servidão de passagem.)

Aquisição derivada restitutiva: Existe qd o titular de um dto real limitado se demite dele unilateral ou
contratualmente. (ex.: o titular de uma servidão de passagem renuncia a esse direito e o titular do direito
de propriedade recupera a plenitude dos seus poderes).
Nota: seria + rigoroso chamar de aquisição originária restitutiva a demissão de um direito por acto
unilateral (renúncia verdadeira).

III - Aquisição derivada ≠ sucessão a sucessão é o subingresso de uma pessoa na titularidade de


todas as RJ (ou só de uma RJ em particular, ou de determinadas RJ) de outrem. [pense-se na sucessão de
reis]
Parece haver uma coincidência com o conceito de aquisição derivada translativa, porém a sucessão não é
apenas de direitos, é de RJ, pelo que também pode implicar a sucessão de obrigações, tais como as dívidas.
O conceito transmissão de direitos não é rigoroso, pode-se referir a um ou outro conceito.

12. E 13. (MATÉRIA IMPORTANTE):

Na aquisição originária a extensão do direito adquirido depende do facto ou título aquisitivo (por exemplo
a criação de uma obra musical que origina direitos de autor).
Na aquisição derivada, além de depender do facto aquisitivo, a extensão do direito depende da
amplitude do direito do transmitente e não pode, em regra, ser maior que esse direito: nemo plus juris
ad alium transferre potest quam ipse haberet.(tradução: Ninguém pode transmitir para outrem dtos q não
tem ou mais direitos do que aqueles que possui).

Nota: O princípio nemo plus juris tem, contudo, excepções: por vezes o adquirente obtém um direito que
não pertencia ao transmitente ou que é mais amplo do que aqueles que pertenciam ao transmitente.

As excepções à regra nemo plus juris funcionam como protecção do terceiro adquirente a non domino.
Excepções:
[Escrever texto]

I – Institutos de registo predial, do registo de automóveis e registos similares (aeronaves, navios…);


II – Eventual inoponibilidade das nulidades e anulabilidades a terceiro de boa fé (291ºCC);
III – Inoponibilidade da simulação a terceiros de boa fé (243º CC).

I – INSTITUTOS DE REGISTO PREDIAL, DO REGISTO DE AUTOMÓVEIS E REGISTOS SIMILARES (AERONAVES, NAVIOS…);

Devem ser registados os actos inerentes a bens imóveis e a alguns bens móveis (ou por escritura pública
ou por documento particular autenticado). (O decreto-lei 116/2008 de 4 de Julho torna o registo
obrigatório, para dar publicidade a estes actos.)
O registo não é um meio de aquisição de direitos, nem precisa de o ser pois o acto é plenamente eficaz
inter partes, o que quer dizer que mesmo na falta de registo há aquisição de direitos.
A consequência da falta de registo é a ineficácia do acto em relação a terceiros.
O que são terceiros [adquirentes] para efeitos de registo?
Segundo Manuel de Andrade são as “pessoas que do mesmo autor ou transmitente adquiriram direitos
incompatíveis (total ou parcialmente) sobre o mesmo objecto”.
Vejamos alguns casos práticos:
A c/v de y (2005) B não registou.

c/v de y (2006) C registou.

Neste caso A celebra um contrato de compra e venda com B de um bem imóvel “y”, porém B não faz o
devido registo. Mais tarde, A que já não é proprietário (pois o negócio é válido e eficaz inter partes), e por
essa razão, violando o princípio nemo plus juris, vende o mesmo bem a C e C faz o registo do imóvel. Quid
juris?

R.: Apesar de o negócio celebrado entre A e B ter validade e eficácia inter partes (art. 4º Cód. Reg.
Predial) e de segundo o princípio nemo plus juris não se poder adquirir um direito se ele não existe na
titularidade do transmitente, não há eficácia em relação a terceiros se não houver registo (excepção ao
princípio nemo plus juris), pelo que prevalece a venda a C.
Contudo, A cometeu um acto ilícito – não tem legitimidade para vender o bem “y”, vendeu um bem
alheio – e pode ser condenado, nomeadamente através de uma indemnização a B – ver art. 892º CC. Como
vemos do art. 892º, a falta de legitimidade é um vício que tem como consequência a nulidade, porém, o
facto de C ter registado cobre esse vício.
Ratio: B teve hipótese de registar e era o que deveria ter feito, pois apesar de o registo não dar direitos,
conserva-os. A falta de legitimidade é o único vício que o registo cobre. Assim, C que é terceiro para efeitos
de registo (ver definição), beneficia desta excepção ao princípio nemo plus juris.
Nota importante: segundo o curso, que tem opinião contrária à escola de Lisboa, isto seria assim ainda
que C estivesse de má fé e tivesse adquirido a título gratuito, pois: 1 – “o Direito não protege os
preguiçosos”; 2 – com o registo pretende-se assegurar a segurança jurídica e a protecção contra a má fé de
terceiro seria um desincentivo ao registo; 3 – a lei não faz distinção entre haver ou não boa fé por parte de
terceiro; 4 – o que adquire a título gratuito tem tantas expectativas dignas de tutela como o adquirente a
título oneroso.

Outro caso:

A vende y a B.
C vende y a D e este regista primeiro que B. Quid juris?
[Escrever texto]

R.: Prevalece a primeira venda – ver 892º CC. D poderia ter verificado se o bem estava registado em nome
de C, se o tivesse feito veria que não estava, quando muito estaria em nome de A, visto que B ainda não
tinha registado.

II – EVENTUAL INOPONIBILIDADE DAS NULIDADES E ANULABILIDADES A TERCEIRO DE BOA FÉ:

A X B
C está de boa fé

A vende um prédio a B que regista e pouco depois vende a C que também regista. A venda de A a B é
declarada nula ou então é anulada. Quid juris?

R.: Dado o efeito retroactivo da invalidade da primeira compra (art. 892ºCC), provoca-se uma
invalidade derivada ou consequencial da segunda. Apesar de C ter registado, o registo estabelece apenas
uma presunção tantum iuris (que é elidível, que admite prova em contrário – está no art. 7º Cód. Reg.
Predial) da existência de propriedade da pessoa a favor de quem o prédio está registado e, tendo sido
declarado nulo ou anulada, provou-se que B não era proprietário apesar de ter o registo do bem em seu
nome, logo não pode vender a C e C não tem direito ao prédio.
Mas não há uma protecção da confiança de C, que é terceiro adquirente de boa fé?
O ordenamento jurídico premeia a boa fé de C, mas para que C tivesse direito teriam de se verificar os 5
requisitos (cumulativamente) previstos no art. 291º do CC (1- tratar-se de bens imóveis ou móveis
sujeitos a registo; 2- boa fé sem culpa; 3- onerosidade da aquisição por C; 4- registo da aquisição por C; 5-
decurso de um prazo de três anos sobre o negócio), o que implicaria outra excepção ao princípio nemo
plus juris – ver definição acima. Nota bem que o 291º surge para tutelar terceiros de boa fé, mas este
terceiro não é terceiro para efeitos de registo (ver o sublinhado da definição acima mencionada).

Estes terceiros (de um esquema linear e não triangular) são aqueles que estando inseridos na mesma
cadeia de transmissões vêm a sua posição jurídica posta em causa por uma invalidade que atinge o
negócio anterior.

III – INOPONIBILIDADE DA SIMULAÇÃO A TERCEIROS DE BOA FÉ:

A X B
C está de boa fé

A vende um prédio a B que regista e pouco depois o doa a C que também regista.
A pretende arguir a nulidade do primeiro negócio, por motivo de simulação. Quid juris?

R.: Neste caso já não se verifica o pressuposto no art. 291º previsto para a generalidade dos casos, mas
sim o artigo 243º, previsto especialmente para as situações de simulação. Estamos pois, perante um regime
especial.
O art. 243º é muito menos rigoroso do que o artigo 291º, desde logo porque apenas exige a boa fé do
terceiro, mesmo que seja uma boa fé negligente (há boa fé negligente se C não conhecia a existência do
vício, mas devia conhecer dadas as circunstâncias). [Manuel de Andrade diz mesmo que não basta para
haver má fé, a cognoscibilidade da simulação ou a suspeita da sua existência (contrariando em parte o nº 2
do 243º) por considerar que estas são «pecados veniais» em face da má fé dos simuladores]. Essa boa fé de
[Escrever texto]

C deve ser tutelada. Lembremos Orlando de Carvalho, que nos ensina que são terceiros para fins de tutela
da boa fé aqueles que “integrando-se numa e mesma cadeia de transmissões, vêem a sua posição afectada
por uma ou várias causas de invalidade anteriores ao acto em que foram intervenientes.” É o caso. Além
disso, a expressão quaisquer terceiros de boa fé, permite-nos concluir que as disposições do art. 243º são
válidas quer os seus direitos derivem de um acto gratuito ou oneroso. Já as anulabilidades ou as nulidades
provenientes de causa diversa de simulação, são, como já vimos, inoponíveis a terceiros de boa fé mas só
se estiverem verificados certos requisitos, não só o da onerosidade do negócio, como outros (art. 291º) e
que este art. 243º não exige.

Nota bem: Neste caso foi um simulador a arguir a nulidade do negócio (ver 243º/1). Segundo a posição do
curso, aconteceria o mesmo se fosse arguida por alguém a ocupar a sua posição (os herdeiros, salvo se
intervirem para proteger as suas “legítimas” – a herança). Mas se for um credor de A a arguir a nulidade do
negócio simulado, tem toda a legitimidade para pedir a declaração de nulidade visto que o seu património
está a ser ameaçado e sendo assim pode não haver inoponibilidade da simulação em relação a terceiros de
boa fé (ver tb 605º), aplicando-se o regime geral do artigo 291º CC.

14. MODIFICAÇÃO DE DIREITOS

Ocorre uma modificação de direitos sempre que há uma alteração de um elemento de um direito,
embora o direito seja o mesmo e não um direito novo, pois não se altera o seu núcleo. O direito muda mas
não se extingue.

Modificação subjectiva: qd tem lugar uma substituição do titular do direito, ou uma multiplicação dos
sujeitos por adjunção. Ex.: cessão de créditos (art. 577º); assunção da dívida (art. 595º) ou co-assunção da
dívida.
Modificação objectiva: qd há uma modificação do conteúdo ou do objecto do direito.
Ex.: modificação do conteúdo: o credor concede ao devedor uma prorrogação do prazo para o
cumprimento. Ex.: modificação do objecto: o devedor não cumpre culposamente a obrigação. O dever de
prestar muda para um dever de indemnizar.

15. EXTINÇÃO DE DIREITOS

Tem lugar qd um direito deixa de existir na esfera jurídica de uma pessoa.


Extinção subjectiva ou perda de direitos: o direito sobrevive em si, apenas muda a pessoa do seu titular.
Na extinção subjectiva verifica-se sempre uma sucessão na titularidade dos direitos.
Extinção objectiva: o direito desaparece quer para o seu titular quer para qualquer outra pessoa (ex.:
consumo do objecto do direito de propriedade).
Nota: Estas considerações tb são válidas, com as devidas alterações, para a extinção de deveres jurídicos.

Uma forma particular de extinção é a correspondente à prescrição extintiva ou negativa (≠ prescrição


aquisitiva ou positiva através da qual se adquirem direitos) (arts. 300º e ss) e à caducidade (arts. 328º e ss)
Prescrição ≠ Caducidade – a primeira aplica-se aos dtos subjectivos stricto sensu e a segunda visa os dtos
potestativos. Há diferenças no seu regime jurídico. (Ver artgs.: 330º e 300º| 333º e 303º| 328º e 318º e ss
e 323º e ss| 331º e 323º).
Ao contrário da caducidade, a prescrição faz presumir uma renúncia, pois há uma inércia do titular do
direito que se conjuga com o interesse de adaptar a situação de direito à situação de facto. Na caducidade,
só o aspecto objectivo da certeza e segurança jurídica é tomado em conta.
[Escrever texto]

TÍTULO II – DO NEGÓCIO JURÍDICO E DO SIMPLES ACTO JURÍDICO


 CAPÍTULO I – CONCEITO E ELEMENTOS E CLASSIFICAÇÕES
16. CONCEITO E IMPORTÂNCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO

Como já sabemos, os negócios jurídicos são actos jurídicos compostos por uma ou mais declarações de
vontade com a intenção de alcançar efeitos práticos sob a tutela da ordem jurídica que determina a
produção de efeitos jurídicos concordantes com a intenção dos sujeitos, i. e., com o conteúdo da vontade
das partes, tal como o conteúdo é objectivamente apercebido (de fora). O comportamento que,
exteriormente observado, aparece como manifestação de uma vontade chama-se comportamento
declarativo e é esse comportamento que é verdadeiramente constitutivo do negócio. Nem sempre, mas
por norma, esta aparência corresponde a uma vontade real, daí que o negócio jurídico seja o instrumento
principal de realização do princípio da autonomia privada. E por isso se diz que os efeitos dos negócios
jurídicos produzem-se ex voluntate e ex lege.

17. RELAÇÃO ENTRE A VONTADE EXTERIORIZADA NA DECLARAÇÃO NEGOCIAL E OS EFEITOS JURÍDICOS DO NEGÓCIO

I – TEORIA DOS EFEITOS JURÍDICOS

Para esta doutrina os efeitos jurídicos produzidos, tal como a lei os determina, são totalmente
correspondentes ao conteúdo da vontade das partes. Logo, afirma-se que a vontade das partes se dirige à
produção de certos e precisos efeitos jurídicos. E mesmo os efeitos que derivam de normas supletivas (que
podem ser afastadas pela vontade das partes, mas que vigoram se as partes nada disserem a esse respeito)
resultam de uma vontade tácita das partes.
Crítica: se assim fosse, só os juristas completamente informados sobre o ordenamento poderiam celebrar
negócios, visto que as restantes pessoas não têm uma noção exacta de todos os efeitos que o
ordenamento jurídico atribui às suas declarações de vontade e quanto às normas supletivas, nem todas
correspondem à vontade normal das partes, embora isso possa acontecer.

II – TEORIA DOS EFEITOS PRÁTICOS

Segundo esta teoria, as partes apenas querem ver realizados certos efeitos práticos, em via de regra de
carácter económico ou social, sem carácter ilícito.
Crítica: Os negócio jurídicos distinguem-se de outros acordos de vontade sem enquadramento jurídico,
tais como de cortesia, praxes sociais, moral, etc)

--» III – TEORIA DOS EFEITOS PRÁTICO - JURÍDICOS

É o ponto de vista correcto: as partes, ou seja, os autores dos neg. jur., visam certos resultados práticos,
mas também há uma vontade de efeitos jurídicos, na medida em que se pretende alcançar efeitos práticos
sob a alçada da ordem jurídica, de forma a poderem fazer valer os seus direitos caso não vejam satisfeitas
as suas legítimas exigências.

 CAPÍTULO II – CLASSIFICAÇÕES DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS


18. NEGÓCIOS JURÍDICOS UNILATERAIS E CONTRATOS OU NEGÓCIOS JURÍDICOS BILATERAIS
[Escrever texto]

Negócios unilaterais: há uma declaração de vontade ou várias declarações, mas paralelas formando um
só grupo. (ex.: testamento, procuração)
Contratos ou NJ bilaterais: há duas ou mais declarações de vontade, de conteúdo oposto, mas
convergentes, ajustando-se na sua comum pretensão de produzir um resultado jurídico unitário, embora
com um significado para cada parte. (ex.: compra e venda)

Acerca dos negócios unilaterais:


a) É desnecessária a anuência (consentimento) do adversário.
b) Vigora, quanto aos negócios unilaterais, o princípio da tipicidade. (ver art. 457º);

Negócios unilaterais receptícios: a declaração só é eficaz, se for e quando for dirigida e levada ao
conhecimento de certa pessoa (ex.: renúncia à hipoteca – 731ºCC);
Negócios unilaterais não receptícios: basta a emissão da declaração, sem ser necessário comunicá-la a
quem quer que seja (testamento, acto de instituição das fundações).

Acerca dos contratos:


a) Não são integrados por dois negócios unilaterais, cada uma das declarações (proposta e aceitação)
é emitida em vista do acordo.
b) Há contratos unilaterais, ou seja negócios jurídicos bilaterais unilaterais: são os que geram
obrigações apenas para uma das partes (doação – dar a res, mútuo – entrega da quantia mutuada) Os
contratos bilaterais ou sinalagmáticos geram obrigações para ambas as partes. Podem ser perfeitos ou
imperfeitos (nestes há inicialmente apenas obrigações para uma das partes)
A importância destas distinções reside no facto de haver regras que só se aplicam a certos tipos de
contratos:
- Excepção de não cumprimento: segundo esta excepção, a falta de cumprimento de uma das obrigações,
sendo comum o tempo de cumprimento, justifica o não cumprimento pela parte contrária (art. 428º CC) –
só para contratos bilaterais;
- Já a condição resolutiva tácita não é privativa (exclusiva) dos bilaterais: é um instituto que confere a
uma das partes a faculdade de resolver o negócio, com fundamento na falta de cumprimento da outra
parte (art. 801º e 808º CC). Porém, nem a condição resolutiva tácita, nem a condição resolutiva tácita têm
lugar nos contratos bilaterais imperfeitos.

19. NEGÓCIOS ENTRE VIVOS E NEGÓCIOS «MORTIS CAUSA»

Os negócios entre vivos, destinam-se a produzir efeitos em vida das partes.


Os negócios mortis causa, destinam-se a só produzir efeitos depois da morte da respectiva parte ou de
alguma delas. Os negócios desta categoria, são negócios “fora do comércio jurídico” - os interesses do
declarante devem prevalecer sobre as expectativas do destinatário.

20. NEGÓCIOS CONSENSUAIS OU NÃO SOLENES E NEGÓCIOS FORMAIS OU SOLENES

Os negócios formais ou solenes, são aqueles para os quais a lei prescreve a necessidade da observância
de determinada forma, o acatamento de determinado formalismo ou de determinadas solenidades
(imposto por lei).
Os negócios não solenes (consensuais, tratando-se de contratos), são os que podem ser celebrados por
quaisquer meios declarativos aptos a exteriorizar a vontade negocial.

Nota: o princípio geral do Código Civil em matéria de formalismo negocial é o princípio da liberdade
declarativa ou liberdade de forma ou consensualidade (art. 219º CC).
Quando, nos casos excepcionas em que a lei prescrever uma certa forma, esta não for observada, a
declaração negocial é nula.

21. NEGÓCIOS REAIS


[Escrever texto]

Os negócios reais são aqueles negócios em que se exige, além das declarações de vontade das partes,
formalizadas ou não, a prática anterior ou simultânea de um certo acto material.

22. NEGÓCIOS OBRIGACIONAIS, REAIS, FAMILIARES E SUCESSÓRIOS

O negócio é real, obrigacional, familiar ou sucessório, consoante dele resulte a constituição, a modificação
ou a extinção de uma RJ real, obrigacional, familiar ou sucessória. A importância desta classificação resulta
da diversa extensão que o princípio da liberdade contratual (art. 405º ) reveste em cada uma das
categorias:
Negócios sucessórios: o princípio da liberdade contratual sofre várias restrições neste domínio – sucessão
legitimaria, proibição dos pactos sucessórios, etc.
Negócios familiares pessoais: a liberdade contratual está praticamente excluída, podendo apenas os
interessados celebrar ou deixar de celebrar o negócio, mas não podendo fixar-lhe livremente o conteúdo,
nem podendo celebrar contratos diferentes dos previstos na lei.
Negócios familiares patrimoniais: existe, com alguma largueza, a liberdade de convenção (art. 1698º CC),
sofrendo embora restrições (arts. 1699º 1714º CC).
Negócios reais: o princípio da liberdade contratual sofre considerável limitação derivada do princípio da
tipicidade ou do “numerus clausus”, visto que “não é permitida a constituição, com carácter real, de
restrições ao direito de propriedade ou de figuras parcelares deste direito senão nos casos previstos na lei”
(art. 1306º). Só podem constituir-se direitos reais típicos, embora essa constituição possa resultar de um
negócio inominado ou atípico.
Negócios obrigacionais: vigora o princípio da liberdade negocial, todavia quanto aos negócios unilaterais
vigora o princípio da tipicidade (art. 457º CC).

23. NEGÓCIOS PATRIMONIAIS E NEGÓCIOS PESSOAIS

Também aqui temos um contrato patrimonial ou pessoal consoante dele resulte a constituição, a
modificação ou a extinção de uma RJ patrimonial ou pessoal.
É de salientar que os negócios pessoais tb são “fora do comércio jurídico”, pelo que quanto a problemas
como o da interpretação do negócio jurídico e o da falta da vontade ou vícios da vontade, não têm que
atender às expectativas dos declaratários nem aos interesses gerais da contratação, mas apenas à
vontade real, psicológica do declarante. Ou seja, há uma prevalência da vontade real sobre a sua
manifestação exterior.
Na disciplina dos negócios patrimoniais, por exigência da tutela da confiança do declaratário e dos
interesses do tráfico jurídico, a vontade manifestada ou declarada triunfa sobre a vontade real.

24. NEGÓCIOS CAUSAIS E NEGÓCIOS ABSTRACTOS

Negócios concretos: o seu conteúdo relaciona-se com a função económica ou social ou a RJ que
constituiu a sua causa (é a regra).
Negócios abstractos: negócios cujos efeitos estão separados da sua causa ou que podem preencher
várias funções.

25. NEGÓCIOS ONEROSOS E NEGÓCIOS GRATUITOS

Esta distinção tem como critério o conteúdo e a finalidade do negócio.


Negócios onerosos ou a título oneroso: pressupõem atribuições patrimoniais de ambas as partes,
existindo, segundo a perspectiva destas, um nexo ou relação de correspectividade, pois as partes estão de
acordo em considerar as duas atribuições patrimoniais como correspectivo uma da outra. As partes
consideram as duas prestações ligadas reciprocamente pelo vínculo da casualidade jurídica.
[Escrever texto]

Negócios gratuitos ou a título gratuito: caracterizam-se ao invés, pela intervenção de uma intenção
liberal, por um espírito de liberalidade. Uma parte tem a intenção devidamente manifestada, de efectuar
uma atribuição patrimonial a favor de outra, sem contrapartida ou correspectivo. A outra parte procede
com a consequência e vontade de receber essa vantagem sem um sacrifício correspondente.
(Nota: tb há contratos unilaterais onerosos: ex.: mútuo oneroso art. 1145º.)

26. CONTRATOS COMUTATIVOS E CONTRATOS ALEATÓRIOS (VER PG. 403 DO MANUAL)

27. NEGÓCIOS PARCIÁRIOS

São uma subespécie dos negócios onerosos. Caracterizam-se pelo facto de uma pessoa prometer certa
prestação em troca de uma qualquer participação nos proventos que a contraparte obtenha por força
daquela prestação (ex. art. 1121º CC).

28. NEGÓCIOS DE MERA ADMINISTRAÇÃO E NEGÓCIOS DE DISPOSIÇÃO

A utilidade da distinção está relacionada com a restrição por força da lei ou sentença, dos poderes de
gestão patrimonial, seja de bens alheios, de bens próprios e alheios (casos de prodigalidade), ou apenas de
bens próprios (inabilitação).
Negócios de mera administração ou de ordinária administração: são os correspondentes a uma gestão
comedida e limitada, donde estão afastados os actos arriscados, susceptíveis de proporcionar grandes
lucros, mas também de causar prejuízos elevados. São os actos correspondentes a uma actuação prudente,
dirigida a manter o património e aproveitar as suas virtualidades normais de desenvolvimento, “mas alheia
à tentação dos grandes voos que comportam risco de grandes quedas”.
Negócios de disposição: são os que, dizendo respeito à gestão do património administrado, afectam a sua
substância, alteram a forma ou a composição do capital administrados, atingem o fundo, a raiz, o casco dos
bens. São actos que ultrapassam aqueles parâmetros de actuação correspondente a uma gestão de
prudência e comedimento sem riscos.
_______________________________________________________________________________
(É nos arts. 217º a 333º do Código que se encontra o fundamento do regime dos negócios jurídicos.)

29. ELEMENTOS DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS: ESSENCIAIS, NATURAIS E ACIDENTAIS.

I – ESSENCIAIS: estes elementos são os requisitos ou condições gerais de validade de qualquer negócio.

 CAPACIDADE DAS PARTES (ou legitimidade, quando a sua falta implica invalidade)
 DECLARAÇÃO DE VONTADE SEM ANOMALIAS
 IDONEIDADE DO OBJECTO (os requisitos de idoneidade do objecto negocial são três e estão formulados
no art. 280º CC: Licitude; Possibilidade física; Determinabilidade.

(De notar que há elementos essenciais dos NJ em geral e elementos essenciais de um certo tipo de NJ.)

II – NATURAIS: são os efeitos negociais que derivam de normas supletivas (qd as partes nada decidem
acerca de certo aspecto, como local, etc), embora possam ser excluídos por estipulação expressamente
formulada pelas partes.

III – ACIDENTAIS: o NJ é válido sem estes elementos, mas existem para a realização plena da autonomia
privada das partes. São as cláusulas acessórias dos NJ.

SUBTÍTULO II – ELEMENTOS ESSENCIAIS DO NEGÓCIO JURÍDICO


[Escrever texto]

 CAPÍTULO I – CAPACIDADE E LEGITIMIDADE


30. REMISSÃO

Capacidade: traduz-se num modo de ser ou qualidade do sujeito em si. No domínio dos negócios jurídicos
fala-se de capacidade negocial de gozo e da capacidade negocial de exercício.

Capacidade negocial de gozo: é a susceptibilidade de ser titular de direitos e obrigações derivados do


negócio jurídico. Contrapõe-se-lhe a incapacidade negocial de gozo, que representa um absoluto
impedimento ou proibição da titularidade de tais relações e, como tal, é insuprível.
Capacidade negocial de exercício, é a idoneidade para actuar juridicamente, exercendo ou adquirindo
direitos, cumprindo ou assumindo obrigações, por actividade própria ou através de um representante
voluntário. Contrapõe-se-lhe a incapacidade negocial de exercício, que representa um impedimento ou
proibição não absoluta da realização de negócios e, como tal, é suprível pelos institutos da representação
ou da assistência.
Legitimidade: é uma relação entre o sujeito e o conteúdo do acto. Contrapõe-se-lhe a ilegitimidade, ou
seja, a falta dessa relação entre sujeito e conteúdo – o sujeito não pode com a sua vontade afectar esse
direito ou essa obrigação.
[No regime da venda de coisa alheia como própria (art. 892º CC) o acto é nulo. Podem tb considerar-se
ilegitimidades, o autor do negócio exceder os poderes que lhe tinham sido conferidos ou as situações dos
que actuam sem as autorizações requeridas por lei – sem requisitos de legitimidade. Em situações como
esta, a sanação é a anulabilidade. Ex.: arts. 1893º e 1940º.]

 CAPÍTULO II – A DECLARAÇÃO NEGOCIAL


o DIVISÃO I – NOÇÕES GERAIS
31. A DECLARAÇÃO NEGOCIAL COMO VERDADEIRO ELEMENTO DO NEGÓCIO JURÍDICO

O Código Civil regula a declaração negocial nos arts. 217º e ss. Trata-se de uma realidade componente ou
constitutiva da estrutura do negócio.
A capacidade de gozo ou de exercício e a legitimidade são requisitos de validade, importando a sua falta
uma invalidade. A idoneidade do objecto negocial também, pois a sua falta implica a nulidade do negócio.
Diversamente, a declaração negocial é um elemento verdadeiramente integrante do negócio jurídico,
conduzindo a sua falta à inexistência material do negócio.

32. CONCEITO DE DECLARAÇÃO NEGOCIAL

Declaração negocial: comportamento que exteriormente observado cria a aparência de exteriorização de


um certo conteúdo de vontade negocial – que é a intenção de realizar certos efeitos práticos com o ânimo
de que sejam juridicamente tutelados ou vinculantes.
A sua nota essencial é um elemento exterior – o comportamento declarativo – e não um elemento
interior – a vontade real, efectiva, psicológica. Contudo, a declaração pretende ser o instrumento de
exteriorização da vontade psicológica do declarante.
Facilmente percebemos que há situações em que existe uma divergência entre a vontade e a declaração,
vícios de vontade (240º e ss) ou de interpretação da declaração negocial (arts. 236º e ss). Estes são em
regra conflitos de interesse: de um lado os interesses do declarante e do outro os do declaratário e do
comércio jurídico. Na maioria dos casos o Direito protege as expectativas do declaratário e do comércio
jurídico (236 nº1), dando mais relevância à aparência (corrente objectivista) do que à vontade real e
psicológica (corrente subjectivista). Mas para certos problemas é excessivo o sacrifício da situação do
declarante, por ex. 245º, 246º.
Só as acções ou omissões controláveis pela vontade são susceptíveis de ser declarações negociais (não é
DN uma manifestação feita durante o sono, em narcose ou sob coacção absoluta/física).
[Escrever texto]

33. BREVE REFERÊNCIA AOS ACTOS JURÍDICOS DE NATUREZA NÃO NEGOCIAL

O Código Civil é muito vago a este respeito.


O art. 295º CC, manda aplicar aos actos negociais as disposições da doutrina geral do NJ, “na medida em
que a analogia das situações o justifique”. Daí que se infere que não se aplicarão aquelas normas, sempre
que não haja uma verdadeira analogia de situações.
Aos actos pessoais (perfilhação, adopção…) não se aplicam, portanto, as disposições inspiradas pela tutela
da confiança dos declaratários e da segurança e celeridade do comércio jurídico.
Aos quase-negócios jurídicos ou actos jurídicos quase-negociais aplicar-se-lhe-ão, em regra, as normas
sobre capacidade, recepção da declaração pelo destinatário, interpretação, vícios da vontade e
representação.
Às operações jurídicas, actos materiais ou actos reais não se exige para a produção de efeitos capacidade
nem se aplicam, em geral, os preceitos sobre recepção da declaração pelo destinatário, interpretação,
vícios da vontade e representação (porém a fixação do domicílio voluntário que é um acto material ou real
exige capacidade – art. 85º).

34.A DECLARAÇÃO NEGOCIAL É COMPOSTA POR:

- Declaração propriamente dita (elemento externo, objectivo) – consiste no comportamento


declarativo;
- Vontade (elemento interno, subjectivo) – consiste no querer, na realidade volitiva que
normalmente existirá e coincidirá com o sentido objectivo da declaração.

 Vontade de acção – consiste na voluntariedade (consciência e intenção) do comportamento


declarativo.
Ex. de falta de vontade de acção: sem se aperceber do facto ou por acto reflexo A faz um gesto e
este aparece como declaração negocial, ou no caso de coacção física em que a pessoa é forçada a fazer
aquele gesto contra a sua vontade.

 Vontade da declaração – consiste em o declarante atribuir ao comportamento querido o significado


de uma declaração negocial; o declarante tem consciência de que o seu comportamento tem significado
negocial vinculativo.
Ex. de falta de vontade da declaração: num leilão A levanta o braço para cumprimentar um amigo e
esse gesto é entendido como sendo para subir a oferta do leilão, ou qd B assina um contrato, pensando que
assinava uma carta de felicitações.

 Vontade negocial – consiste na vontade de celebrar um negócio jurídico de conteúdo coincidente


com o significado exterior da declaração. É a vontade efectiva correspondente ao negócio concreto que
apareceu exteriormente declarado.
Ex. de desvio na vontade negocial: o declarante atribui aos termos da declaração um sentido que
exteriormente observado é diferente: A quer comprar a quinta F e declara querer comprar a quinta G por
pensar que essa é que é a F (se escrever ou disser mal o nome por engano é um desvio na vontade de
acção).

35. DECLARAÇÃO NEGOCIAL EXPRESSA E DECLARAÇÃO NEGOCIAL TÁCITA

Quanto ao conteúdo dos NJ, vigora o princípio da liberdade negocial (art. 405º CC). Quanto à forma (“lato
sensu”) é igualmente reconhecido pelo ordenamento jurídico um critério de liberdade: o princípio da
liberdade declarativa (arts. 217º e 219º CC).
Declaração expressa: quando feita por palavras, escrito ou quaisquer outros meios directos, frontais e
imediatos de expressão da vontade. (por vezes a lei estabelece que a declaração negocial seja expressa –
413º nº1, 587º nº 2)
[Escrever texto]

Tácita: quando do seu conteúdo directo se infere um outro, “quando se deduz de factos que, com toda a
probabilidade, a revelam” – bastando que conforme os usos do ambiente social a dedução tenha lugar com
toda a probabilidade. (por vezes a lei frisa a possibilidade de declaração tácita: ver artgs. 288º nº3, 302º
nº2).
Em conformidade com o critério de interpretação dos negócios jurídicos consagrado no Código Civil (art.
236º), deve entender-se que a concludência dum comportamento, no sentido de permitir concluir um certo
sentido negocial, não exige a consciência subjectiva por parte do seu autor desse significado implícito,
bastando que, objectivamente, de fora, ele possa ser deduzido do comportamento do declarante.

36. O VALOR DO SILÊNCIO COMO MEIO DECLARATIVO

Trata-se, principalmente de saber se o silêncio (nada dizer ou nada fazer) pode considerar-se um facto
concludente (declaração tácita) no sentido da aceitação de propostas negociais.
O CC diz no art. 218º que o silêncio não vale como declaração negocial, a não ser que esse valor lhe seja
atribuído por lei, convenção ou uso.
O silêncio é, em si mesmo, insignificativo pelo que deve considerar-se irrelevante um comportamento
omissivo. De outro modo, ao enviar a outrem uma proposta de contrato estaria a criar-se-lhe o ónus de
responder, a fim de evitar a conclusão do negócio, o que viola a ideia de autonomia das pessoas.
Afasta-se igualmente a ideia de que o silêncio vale como declaração quando o silenciante podia e devia
falar.
Não seria isento de dúvidas quando é que alguém podia e devia falar.
É necessário que resulte da lei, de convenção ou de uso que a ausência de resposta tem um certo sentido.

37. DECLARAÇÃO NEGOCIAL PRESUMIDA. DECLARAÇÃO NEGOCIAL FICTA

A declaração negocial presumida (presunção tantum juris) tem lugar quando a lei liga a determinado
comportamento o significado de exprimir uma vontade negocial, podendo ilidir-se tal presunção mediante
prova em contrário (art. 350º/1/2 CC).
A declaração negocial ficta tem lugar sempre que a um comportamento seja atribuído um significado
legal tipicizado, sem admissão de prova em contrário (presunção absoluta ou irredutível, art. 350º/2 CC).
O regime regra é o de as presunções legais poderem ser ilididas mediante prova em contrário, só
deixando de ser assim quando a lei o proibir (art. 350º/2 CC). Quer dizer: salvo os casos excepcionais
consagrados na lei, as presunções legais são presunções “tantum juris”.

38. PROTESTO E RESERVA

Emitido certo comportamento declarativo, pode o seu autor recear que lhe seja imputado, por
interpretação, um certo sentido. Para o impedir, o declarante afirma abertamente não ser esse o seu
intuito.
A esta contradeclaração dá-se o nome de protesto. O protesto tem o nome de reserva, quando consiste
na declaração de que um certo comportamento não significa renúncia a um direito próprio, ou
reconhecimento de um direito alheio (uma vítima de um acidente recebe do causador uma soma
pecuniária mas afirma que não renuncia ao pagamento total dos danos).

39. FORMA DA DECLARAÇÃO NEGOCIAL

Vantagens do formalismo negocial:


a) Assegura uma maior reflexão das partes. Nos negócios formais, o tempo que medeia entre a
decisão de concluir o negócio e a sua celebração, permite repensar o negócio e defende as partes contra a
sua ligeireza ou precipitação.
b) Separa os termos definitivos do negócio da fase pré-contratual (negociação).
c) Permite uma formulação mais precisa e completa da vontade das partes.
[Escrever texto]

d) Proporciona um maior grau de certeza sobre a celebração do negócio, evitando-se os perigos


ligados à falível prova por testemunhas.
e) Possibilita uma certa publicidade do acto, o que interessa ao esclarecimento de terceiros.

Inconvenientes:
a) Redução da fluência e celeridade do comércio jurídico;
b) Eventuais injustiças, derivadas de uma desvinculação posterior de uma parte do negócio, com
fundamento em nulidade por vício de forma, apesar de essa parte ter querido efectivamente o acto jurídico
negociável.

O Código: sancionou o Código Civil (art. 219º) o princípio da liberdade de forma ou da


consensualidade. Considerando porém, que quanto a certos negócios, são mais as vantagens do que os
inconvenientes, admitiu várias excepções a esse princípio.
Assim, o formalismo exigível para um certo negócio pode ser imposto por normas imperativas (forma
legal) ou resultar de uma estipulação ou negócio jurídico das partes (forma convencional).
O negócio dirigido à fixação de uma forma especial para um ulterior negócio não está sujeito a
formalidades (art. 223º CC). O Código Civil consagrou a regra dos pactos abolitivos ou extintivos, na
medida em que estatui, em princípio, que as estipulações acessórias ulteriores ou contemporâneas ao
negócio devem revestir a forma exigida pela lei para o acto, sob pena de nulidade (art. 221º). Admite-se
contudo, restrições a este princípio: reconhece-se a validade de estipulações verbais anteriores ou
contemporâneas ao documento exigido para a declaração negocial, desde que se verifiquem,
cumulativamente, as condições:
a) Trata-se de cláusulas acessórias e não de cláusulas essenciais;
b) Não são abrangidas pela razão de ser da exigência do documento;
c) Prova-se que correspondem à vontade das partes.
Porém há que ter em atenção que na dúvida sobre a existência de uma estipulação acessória que não
consta do documento, decide-se contra a sua existência e a possibilidade de as estipulações acessórias não
formalizadas produzirem efeitos é pouca, dado o disposto no art. 394º que declara inadmissível a prova por
testemunhas, se tiver por objecto convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documentos
autênticos ou particulares.

Consequências da inobservância da forma no nosso direito:

Inobservância da forma legal: em conformidade com a orientação da generalidade das


legislações e com os motivos de interesse público que determinam as exigências legais de forma, o CC liga à
inobservância da forma legal a nulidade, e não a mera anulabilidade (ver arts. 289º, 473º, 482º…). A
nulidade deixará de ser a sanção para a inobservância da forma legal, sempre que, em casos particulares, a
lei define outra consequência (art. 220º CC).
(ver sobre este assunto reflexão das pgs 435 a 439 do manual)
Inobservância da forma convencional: Trata-se aqui de averiguar quais as consequências da falta de
requisitos formais que a lei não exige, mas que as partes livremente convencionaram. (ver art. 223º). A
resposta a este problema deve ser pedida, antes de tudo, à vontade das partes. Em caso de conflito o art.
223º limita-se a estabelecer presunções. Essas presunções são duas, variando com o facto que é da
presunção, assim:
1. Se a forma especial foi estipulada antes da conclusão do negócio, consagra-se uma presunção de
essencialidade, isto é, presume-se que a forma é essencial, tem carácter constitutivo, por isso sem a
observância da forma, o negócio é ineficaz;
2. Se a forma foi convencionada após o negócio ou simultaneamente com ele, há fundamento para
presumir que as partes quiseram substituir o negócio, suprimindo-o e concluindo-o de novo, mas apenas
visaram consolidá-lo por qualquer outro efeito (o negócio produz os seus efeitos normalmente).

40. PERFEIÇÃO DA DECLARAÇÃO NEGOCIAL


[Escrever texto]

As declarações receptícias ganham eficácia logo que são conhecidas do destinatário, as restantes tornam-
se eficazes logo que a vontade se manifesta na forma adequada.
(Ver artgs. 224º e ss) Vigora a doutrina da recepção qt ao momento da sua conclusão: o contrato está
perfeito quando a resposta, contendo a aceitação, chega à esfera de acção do proponente (destinatário),
isto é, quando o proponente passa a estar em condição de a conhecer (local de negócios, casa…). O risco de
uma enfermidade, ausência transitória de casa, etc corre por conta do destinatário. Ver tb 224º nº2; 225º.

o DIVISÃO II – INTERPRETAÇÃO E INTEGRAÇÃO DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS


§ 1.º – INTERPRETAÇÃO

Os problemas a que a hermenêutica (interpretação) dos NJ deve dar resposta, surgem em paralelo com o
problema da interpretação da lei (art. 9º CC) e são principalmente dois:

1 – Quais os subsídios (meios) que o intérprete deve tomar em consideração na busca do sentido negocial
relevante?

A finalidade do negócio, as informações a que o declaratário teve acesso, etc.

2 - Se a DN é um acto determinante e um acto social de comunicação, é preciso saber: deve ser


interpretada de acordo com o sentido que o destinatário apreendeu (posição objectiva) ou de acordo com
a vontade real do declarante, aquilo que ele efectivamente quis (posição subjectiva)?

Há várias concepções opostas que se baseiam nas seguintes posições:


– Posição subjectiva: o intérprete deve buscar, através de todos os meios adequados, a vontade real do
declarante. O negócio vale com o sentido subjectivo (aquele que o autor da declaração quis).
Argumentos: o interesse do autor da declaração surge em nome da autonomia da vontade, pelo que se a
DN não está de acordo com a vontade real deve haver possibilidade de anulação do negócio. Podem
concorrer tb interesses privados de terceiros.(ex.: credores do declaratário)
– Posição objectiva: o intérprete deve pesquisar um sentido exteriorizado ou cognoscível através de
certos elementos objectivos. É uma interpretação normativa e não psicológica. Merece destaque a doutrina
da impressão do destinatário (posição adoptada): a declaração deve valer com o sentido que um
declaratário normal (razoavelmente zeloso, sagaz e inteligente) interpretaria a declaração negocial, tendo
em conta o contexto e a informação que o declaratário recebeu. (ver 236º nº1 CC)
Argumentos: o interesse da contraparte reclama a tutela da confiança (das suas legítimas expectativas),
assente no sentido objectivo da declaração e no desconhecimento da vontade real, que por ventura até
podem ter levado o declaratário a edificar um dado programa de vida. Podem concorrer tb interesses
privados de terceiros (ex.: subadquirentes). Além disto relevam os interesses gerais do comércio jurídico, a
segurança, a fluência, e a celeridade da contratação, pelo que apesar da divergência o NJ deve ser válido.

Notas:
 Se o declaratário estava em condições de saber que a vontade real do declarante era outra (seja
qual for a causa da descoberta da real intenção do declarante), e isso é provado, o sentido da declaração
negocial que vale é o correspondente à vontade real, de forma a proteger as expectativas do declaratário
(236º nº 2).
 O sentido querido realmente pelo declarante releva mesmo qd a formulação é ambígua ou inexacta
se o declaratário conhecer esse sentido. Para os negócios formais ver o art. 238º nº 1 e nº 2. [Caso prático:
A faz um testamento em que escreve: deixo a minha biblioteca ao meu amigo João Cruz. Na verdade
[Escrever texto]

referia-se à garrafeira e os amigos e família sabem que ele se referia assim à garrafeira. Segundo o 2187º
nº1/2 e o 238º, o intérprete deve preocupar-se em saber o que quis o testador]
 Quando a interpretação leva a um resultado duvidoso, o juiz socorre-se do art. 237º, mas se a
dúvida resultar de um contrato de adesão interpreta-se a cláusula contra o pré-disponente, a parte mais
forte, a empresa (in dubio contra stipulatorem).
 No caso de haver lacunas devem ser integradas, aplicando o art. 239º. Recorre-se: 1º – disposições
supletivas da lei; 2º – vontade hipotética das partes; 3º – boa fé - sendo que nem as disposições supletivas
da lei nem a vontade hipotética das partes pode contrariar os ditames da boa fé). Contudo, a integração
não pode ter lugar se o resultado conduz a uma ampliação do objecto negocial que foi pretendido pelas
partes (ex.. A vende a B 100 pastilhas por um preço unitário, não se pode pretender a entrega de 150 ao
mesmo preço p/ unidade, ainda que se prove que no momento do contrato A teria vendido e B teria
comprado mais 50, se o ponto tem sido tratado).

o DIVISÃO III – A DIVERGÊNCIA ENTRE A VONTADE E A DECLARAÇÃO


§ 1.º – O PROBLEMA EM GERAL
45. FORMAS POSSÍVEIS DE DIVERGÊNCIA

Normalmente o elemento interno (vontade) e o elemento externo da declaração negocial (declaração


propriamente dita) coincidirão. Mas como já foi supra referido podem verificar-se, por causas diversas,
uma divergência entre esses dois elementos da declaração negocial. Está-se perante um vício na
formulação da vontade.
A divergência entre a vontade real e a declaração, entre aquilo que se quer e aquilo que se declara, pode
ser:
Uma divergência intencional – se o declarante emite, consciente e livremente uma declaração com um
sentido objectivo diverso da sua vontade real.
Uma divergência não intencional – se a divergência é involuntária (seja porque o declarante não se
apercebe da divergência ou seja porque é forçado irresistivelmente a emitir uma declaração divergente do
seu real intento).

Há divergência intencional:

 Na simulação: o declarante emite uma declaração não coincidente com a sua vontade real, por
força de um conluio com o declaratário, com a intenção de enganar terceiros. (ex: venda fantástica - A
finge vender um prédio a B para criar uma aparência danosa para os seus credores)

 Na reserva mental: o declarante emite uma declaração não coincidente com a sua vontade real,
sem qualquer conluio com o declaratário, visando precisamente enganar este. (ex: A declara fazer uma
doação a B que está cheio de dívidas, sem que tenha essa intenção, é somente para que B não se suicide)

 Nas declarações não sérias: o declarante emite uma declaração não coincidente com a sua vontade
real, mas sem intuito de enganar qualquer pessoa (declaratário ou terceiro). O autor da declaração está
convencido que o declaratário se apercebe do carácter não sério da declaração. (ex: declarações jocosas,
didácticas, cénicas, publicitárias…)

A divergência não intencional pode consistir:

 Erro-obstáculo ou erro na declaração: o declarante emite a declaração divergente da vontade, sem


ter consciência dessa falta de coincidência (um lapso, um engano)
[Escrever texto]

 Na falta de consciência da declaração: o declarante emite uma declaração sem sequer ter
consciência (a vontade) de fazer uma declaração negocial, podendo até faltar completamente a vontade de
agir.

 Coacção física ou violência absoluta: o declarante é transformado num autómato, sendo forçado a
fazer, dizer ou escrever o que não quer, não através de uma mera ameaça (coacção moral ou psicológica)
mas por força do emprego de uma força física irresistível que o instrumentaliza e leva a adoptar o
comportamento.

46. TEORIAS QUE VISAM RESOLVER O PROBLEMA DA DIVERGÊNCIA ENTRE A VONTADE E A DECLARAÇÃO

São expostas por ordem cronológica, segundo a progressiva atenção dada ao lado do declaratário e do
comércio jurídico:
a) Teoria da vontade: defende a invalidade do negócio (não vale nem a vontade real nem a
declarada), desde que se verifique uma divergência entre a vontade e a declaração e sem necessidade de
mais requisitos.

b) Teoria da culpa “in cotrahendo”: parte da teoria da vontade, mas acrescenta-lhe a obrigação de
indemnizar a cargo do declarante, uma vez anulado o negócio com fundamento na divergência, se houve
dolo ou culpa deste no dissídio entre a vontade e a declaração e houve boa fé por parte do declaratário; a
indemnização visa cobrar o interesse da confiança, isto é, visa repor o declaratário, lesado com a
invalidade, na situação em que estaria se não tivesse chegado a concluir o negócio.

c) Teoria da responsabilidade: dá-se mais atenção à protecção da confiança: e houve dolo ou culpa
do declaratário e houve boa fé por parte do declaratário o negócio é válido.

d) Teoria da declaração: dá relevo fundamental à declaração, ou seja, ao que foi exteriormente


manifestado. Comporta diversas modalidades:

1) Modalidade primitiva e externa: característica dos direitos formalistas – se a forma ritual foi
observada, produzem-se certos efeitos, mesmo que não tenham sido queridos.
2) Modalidades modernas e atenuadas: doutrina da confiança – a divergência entre a vontade real e
o sentido objectivo da declaração, isto é, só produz a invalidade do negócio se for conhecida ou cognoscível
do declaratário (razoável). Doutrina da aparência eficaz – subscreve a anterior, acrescentando que se o
declaratário não tiver percebido a vontade real do declarante nem o sentido objectivo, mas antes confiado
num terceiro sentido, deve o negócio ser inválido.

48. DISCUSSÃO DAS TEORIAS PROPOSTAS

Não é possível adoptar uma opção rígida por um dos lados da dicotomia (teoria da vontade, teoria da
declaração), isso seria um regresso ao conceitualismo. Deve-se apenas formular uma directriz, uma
tendência, que permita excepções de forma a possibilitar soluções razoáveis e adequadas. Posto isto,
damos preferência à teoria da confiança com a limitação da doutrina da aparência eficaz. Vejam-se as
soluções dadas pelo CC a cada uma das formas que esta divergência reveste – arts. 244º a 247º.
§ 2.º – A SIMULAÇÃO

50. CONCEITO, ELEMENTOS E IMPORTÂNCIA PRÁTICA

Conceito: ver art. 240º/1 CC. É frequente.


Na simulação as partes tem uma única vontade, a vontade simulada, diferente da que é objectivamente
observada. No art. 240º, pede-se três requisitos:
[Escrever texto]

1. Intencionalidade da divergência entre a declaração e a vontade das partes;


2. Acordo simulatório entre declarante e declaratário;
3. Intuito de enganar terceiros (não confundir com intenção de prejudicar terceiros, porque o que se
passa é a criação de uma aparência).

51. MODALIDADES DA SIMULAÇÃO

Simulação inocente: há o mero intuito de enganar terceiros, sem os prejudicar. Ex: doação simulada com
fim de ostentação.
Simulação fraudulenta: há o intuito de prejudicar terceiros ilicitamente ou de contornar qualquer norma
da lei. Esta distinção é aludida no art. 242º/1. É a mais frequente. Exs.: venda fantástica, venda que disfarça
uma doação (por ex. para contornar o 953º)

Simulação absoluta: as partes fingem celebrar um negócio jurídico e na realidade não querem nenhum
negócio jurídico, há apenas o negócio simulado e, por detrás dele, nada mais
Simulação relativa: as partes fingem celebrar um certo negócio jurídico e na realidade querem um outro
negócio jurídico de tipo ou conteúdo diverso. – problema solucionado pelo art. 241º/2 CC - enquanto que o
negócio simulado é nulo, na simulação relativa surge o problema do tratamento a dar ao negócio
dissimulado ou real que fica a descoberto com a nulidade do negócio simulado.

52. EFEITOS DA SIMULAÇÃO ABSOLUTA

A simulação importa a nulidade do negócio simulado (art. 240º/2 CC).


De acordo com o respectivo regime negocial, pode qualquer interessado invocar a nulidade (incluindo um
simulador) e o Tribunal declará-la oficiosamente (art. 286º que remete para o 242º CC).
A simulação pode ser arguida tanto por via de acção como por via de excepção. (art. 287º/2 CC).
Como para todas as nulidades, a invalidade dos negócios simulados pode ser arguida a todo o tempo (art.
286º CC), quer o negócio não esteja cumprido quer tenha tido lugar o seu cumprimento.

53. MODALIDADES DA SIMULAÇÃO RELATIVA

A simulação relativa manifesta-se em, espécies diversas consoante o elemento do negócio dissimulado a
que se refere: simulação dos sujeitos ou do conteúdo do negócio.

 Simulação dos sujeitos:


Interposição fictícia de pessoas: A pretende dar um prédio a B, mas está impedido por lei de o fazer,
como sucede com os arts. 953º e 2196º, então doa o prédio a C para este posteriormente doar a B. Há 2
sujeitos reais (A e B) e um interposto (C).
Supressão de um sujeito real: Fizeram-se duas vendas – de A a B e de B a C, mas para pagar apenas uma
sisa (imposto de transmissão), os 3 concordam em documentar apenas uma venda, de A a C.

Nota: A interposição fictícia de pessoas não se deve confundir com a interposição real. Na interposição
fictícia há um conluio entre os dois sujeitos reais da operação e o interposto. Neste último, não há conluio
entre os três sujeitos. (ex.: A sabe que B não lhe venderia o bem “x”, então manda C comprar o bem para
depois lho dar, mesmo que B saiba que C contrata por conta de outrem, embora em nome próprio – 1180º)

 Simulação objectiva ou sobre o conteúdo do negócio:


Simulação sobre a natureza do objecto: se o negócio simulado resulta de uma alteração do tipo
negocial correspondente ao negócio dissimulado ou oculto (finge-se uma venda e quer-se uma doação).
Simulação de valor: incide sobre o “quantum” de prestações estipuladas entre as partes (simulação
de preço na compra e venda).
[Escrever texto]

54. EFEITOS DA SIMULAÇÃO RELATIVA

I – Doutrina geral: Tal como na simulação absoluta, o negócio simulado está ferido de nulidade. Mas o
negócio dissimulado terá o mesmo tratamento jurídico que lhe caberia se não tivesse sido dissimulado.
Ver art. 241º. Neste caso, pode ser válido e eficaz ou inválido.

II – Simulação em prejuízo da Fazenda Nacional: actualmente há que ter em conta o disposto no art.
38º/2 da Lei Geral Tributária segundo o qual se prevê a ineficácia no «âmbito tributário» dos actos ou
negócios jurídicos fraudulentos e o art. 39º da mesma lei segundo o qual, em caso de simulação, a
tributação recai sobre o negócio real (dissimulado).

III – Efeitos da simulação quanto aos negócios formais: ver o art. 241/2. Se não foram cumpridos os
requisitos de forma exigidos para o neg. dissimulado este será nulo por vício de forma (mesmo que se
tenham verificado as formalidades para o negócio aparente/simulado).

55. RESTRIÇÕES À ARGUIÇÃO DA SIMULAÇÃO PELOS PRÓPRIOS SIMULADORES

O art. 242º/1 atribui legitimidade aos próprios simuladores para a arguição da nulidade do negócio
simulado, ainda que a simulação seja fraudulenta, porém esta possibilidade sofre uma apreciável restrição
indirecta por força do art. 394º/2, que não permite a prova testemunhal do acordo simulatório nem do
negócio dissimulado. Em conformidade com o art. 351º tb não se admite prova por presunções. Assim, a
prova só pode ser feita ou por prova documental ou por confissão.

56. A SIMULAÇÃO E TERCEIROS.

Conforme o art. 286º ressalvado no art. 242º/1, a nulidade do negócio simulado pode, como em todas as
invalidades, ser invocada por qualquer interessado e declarada ex officio pelo tribunal.

Conceito de terceiros para efeitos de invocação da simulação: quaisquer pessoas, titulares de uma relação
(jurídica ou não) afectada pelo negócio simulado e que não sejam os próprios simuladores ou os seus
herdeiros (depois da morte do de cujus). Por ex.: a Fazenda Nacional, os credores e os preferentes.

Os simuladores tb podem invocar a nulidade do negócio, como já vimos, não como terceiros, mas como
simuladores, com as naturais restrições que daí advêm (ver ponto anterior).
Os herdeiros também o podem fazer, mas como sucessores do simulador (com as mesmas restrições que
os simuladores conhecem em vida). A não ser que seja para defender as suas legítimas (heranças), neste
caso intervêm na qualidade de terceiros.
Ver ainda 242º/2.

58. ARGUIÇÃO DA SIMULAÇÃO CONTRA TERCEIROS INTERESSADOS NA VALIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO – VER PÁGINA 8 –
“Inoponibilidade da simulação em relação a terceiros de boa fé” (IMPORTANTE)

Além do que se refere na resposta ao caso prático e que nos esclarece neste ponto, vejamos com atenção
o seguinte caso:

A na realidade vendeu a B o prédio “x” por 100 mil €, mas declarou-se simuladamente um preço de 30 mil
€ para se obterem benefícios fiscais. A vem a arrepender-se da venda e pretende arguir a nulidade por
[Escrever texto]

simulação e tem provas documentais dessa simulação (contradeclarações). Porém, porque C era
arrendatário do prédio que A vendeu, era preferente e pretende ser protegido pela inoponibilidade da
simulação em relação a terceiros, pois dessa forma irá preferir pelo preço declarado – 30 mil €. (lucrando
assim em 70 mil € com a validade do negócio). Quid juris?

R.: Defendemos que quando se lê na epígrafe do art. 243º: “inoponibilidade da simulação em relação a
terceiros de boa fé”, consideramos terceiros para este efeito aquelas pessoas cujos direitos seriam
prejudicados pela invalidação do negócio simulado, mas já não consideramos para este efeito aqueles que
apenas lucrariam com a validade do mesmo negócio. Seguindo também Orlando de Carvalho, que define
serem terceiros para fins de tutela da boa fé aqueles que “integrando-se numa e mesma cadeia de
transmissões, vêem a sua posição afectada por uma ou várias causas de invalidade anteriores ao acto em
que foram intervenientes.”, percebemos que C não é terceiro para fins de tutela da boa fé.
É irrazoável defender a desonestidade dos simuladores, mas tb o é defender a torpeza do preferente,
seria mesmo uma situação de abuso de direito (ver art. 334º).

59. CONFLITOS DE INTERESSES ENTRE TERCEIROS INTERESSADOS NA NULIDADE E TERCEIROS INTERESSADOS NA VALIDADE DO
NEGÓCIO JURÍDICO

Se não se entender que o art. 243º é aplicável apenas à arguição da nulidade pelos simuladores, tornam-
se possíveis conflitos entre terceiros que querem a validade ou a nulidade do negócio simulado:

- Credores comuns do simulado alienante vs credores comuns do simulado adquirente


Deve dar-se preferência aos interesses dos últimos, salvo se os créditos de uns e de outros são anteriores
ao negócio simulado.

- Credores comuns do simulado alienante vs subadquirentes do simulado adquirente


Prevalecem os interesses dos subadquirentes do simulado adquirente.

- Subadquirentes do simulado alienante vs subadquirentes do simulado adquirente


- Prevalece a venda mais antiga ou a que primeiro foi registada.
60. PROVA DA SIMULAÇÃO

A prova do acordo simulatório e do negócio dissimulado por terceiros é livre, podendo ser feita por
qualquer dos meios admitidos por lei: confissão, documentos, testemunhas, presunções etc., dado que lei
não estabelece quaisquer restrições.
Quanto à prova da simulação pelos próprios simuladores, a lei estabelece, quando o negócio simulado
conste de documento autêntico ou particular, a importante restrição constante do art. 394º/2: não é
admissível o recurso à prova testemunhal e, consequentemente, estão também excluídas as presunções
judiciais (art. 351º CC).

§ 3.º – ALÉM DA SIMULAÇÃO, OUTRAS FIGURAS DE DIVERGÊNCIA INTENCIONAL

61. RESERVA MENTAL

Segundo o art. 244º/1 CC, são duas as notas que definem o conceito de reserva mental:
(1) emissão de uma declaração contrária à vontade real;
(2) intuito de enganar o declaratário.
[Escrever texto]

Os efeitos desta figura são determinados pelo art. 244º/2 CC, onde se estatui a irrelevância da reserva
mental, excepto se for conhecida do declaratário. (por razões de justiça e segurança) Por consequência, a
declaração negocial emitida pelo declarante, com a reserva de não querer o que declara (ocultada ao
declaratário), não é em princípio nula, a não ser que o negócio seja nulo como na simulação, nesse caso, se
o declaratário conheceu a reserva, não há confiança que mereça tutela.
Não basta para a relevância da reserva, a sua cognoscibilidade (que seja possível ser conhecida), sendo
necessário o seu efectivo conhecimento.
Ao contrário da reserva fraudulenta, a reserva inocente tem como propósito trazer vantagem para o
declaratário (para o dissuadir do suicídio, tranquilizar um moribundo…), por isso pergunta-se se nestes
casos não bastará a sua cognoscibilidade. Cremos que a rigidez do art. pode ser atenuada, nalguns casos,
com o art. 334º, para que a intenção do declaratário no sentido da validade não exceda os limites da boa fé
ou dos bons costumes.
Não se admite a sua oponibilidade pelo declarante a terceiros de boa fé (art. 243º/1 CC).

62. DECLARAÇÃO NÃO SÉRIA

Ver art. 245º. Exs.: declarações jocosas, cénicas ou didácticas. Nelas não há o intuito de enganar e há
mesmo a expectativa do declarante de que não sejam tomadas a sério. Se faltam estes requisitos, como no
caso da graça malévola feita para enganar, com a convicção de que o destinatário se convencerá da
seriedade da declaração, a figura é a da reserva mental.
O disposto no art. 245º/2 CC é somente aplicável quando, não obstante a expectativa do declarante, o
declaratário acreditou na declaração e essa crença é justificável, dadas as circunstâncias em que o caso
ocorreu. Três condições são portanto, necessárias para que o declarante seja obrigado a indemnizar a
contraparte: 1 - que o declaratário tenha tomado a sério a declaração;
2 - que a convicção do declaratário tenha sido provocada pelas circunstâncias em que a declaração foi
emitida;
3 - que seja justificado e aceitável o erro em que o declaratário caiu.

§ 4.º – DIVERGÊNCIA NÃO INTENCIONAL

63. COACÇÃO FÍSICA OU COACÇÃO ABSOLUTA OU ABLATIVA

Na coacção física ou absoluta o coagido tem a liberdade de acção totalmente excluída, enquanto que na
coacção moral ou relativa está coibida, mas não excluída.
O Código Civil prevê, sob a epígrafe “coacção física” (art. 246º), a hipótese de o declarante ser “coagido
pela força física a emitir” a declaração. Têm-se em vista as hipóteses em que o declarante é reduzido à
condição de puro autómato (coacção absoluta) e não aquelas em que o emprego da força física não chega
aos extremos da “vis absoluta” – se há um uso de meios físicos e ameaça da sua perduração, o que gera o
negócio é o receio da persistência de um mal físico já em começo de execução, então o caso integra-se na
hipótese do art. 255º. A coacção física ou absoluta importa, nos termos do art. 246º, a ineficácia da
declaração negocial – não produz qualquer efeito. O declarante, vítima da coacção, não tem qualquer
dever de indemnização para com o declaratário.

64. FALTA DE CONSCIÊNCIA DA DECLARAÇÃO

A hipótese está referida no art. 246º: “se o declarante não tiver consciência de fazer uma declaração
negocial”. Estatui-se que o negócio não produz qualquer efeito, mesmo que a falta de consciência da
declaração não seja conhecida ou cognoscível da declaratário. Trata-se de um caso de nulidade, salvo na
hipótese de falta de vontade de acção em que parece estar-se, antes, perante um caso de verdadeira
inexistência da declaração. Com efeito, quando falta a vontade de acção não há um comportamento
consciente, voluntário, é um acto reflexo ou, na hipótese de coacção física, absolutamente forçado, embora
exteriormente pareça estar-se perante uma declaração.
[Escrever texto]

Se o declarante for, porém, culpado da falta de consciência da declaração, o declaratário tem direito a ser
indemnizado do dano coberto pela chamada responsabilidade pré-contratual ou por culpa in contrahendo.

65. ERRO NA DECLARAÇÃO OU ERRO-OBSTÁCULO (VER ARTS.: 247º A 252º)

Erro-obstáculo ≠ Declarações sob nome de outrem

No erro-obstáculo, havendo embora uma divergência inconsciente entre a vontade e a declaração, há um


comportamento declarativo do errante.
Nas declarações sob nome de outrem, [ex.: A faz-se passar por B para realizar negócio com C], não há
qualquer comportamento por parte do sujeito a quem a declaração é atribuída [B não teve um
comportamento declarativo].

Erro sobre o conteúdo da declaração - Nestas hipóteses o declarante tem a consciência de emitir uma
declaração negocial, mas, por lapso da actividade (erro mecânico) ou por “error in judicando” (atribuição às
palavras de um significado diverso do seu sentido objectivo), não se apercebe de que a declaração tem um
conteúdo divergente da sua vontade real.
O princípio geral regulador destas hipóteses consta do art. 247º, exigindo-se para a anulação do negócio
que “o declaratário conhecesse ou não devesse ignorar a essencialidade, para o declarante, do elemento
sobre que incidiu o erro”.
A lei não exige o conhecimento ou a cognoscibilidade do erro, admitindo a anulabilidade em termos
excessivamente fáceis e gravosos para a confiança do declaratário e para a segurança do tráfico jurídico.
Contenta-se com o conhecimento ou a cognoscibilidade da essencialidade do elemento sobre que incidiu o
erro, embora este conhecimento possa não ter suscitado ao declaratário qualquer suspeita ou dúvida
acerca da correspondência entre vontade real e a declarada. Nesses casos, só recorrendo ao art. 334º (há
abuso do direito de anular).
Certas hipóteses merecem tratamento especial, assim:
1. Se o declaratário se apercebeu do dissídio entre a vontade real e a declarada e conheceu a
vontade real (art. 236º/2 CC);
2. Se o declaratário conheceu ou devia ter conhecido o erro, o regime aplicável continua a ser a
anulabilidade (tal como se o declaratário conhecesse ou devesse conhecer a essencialidade do elemento
sobre que incidiu o erro) e não a nulidade.
3. Se o declaratário aceitar o negócio como o declarante queria, a anulabilidade fundada em erro
não procede (art. 248º CC).
4. O erro de cálculo e o erro de escrita, ostensivamente relevados no contexto da declaração ou nas
circunstâncias que a acompanham, não dão lugar à anulabilidade do negócio mas apenas à sua rectificação
(art. 249º CC).
5. Se o declaratário compreendeu um terceiro sentido que não coincide nem com o querido pelo
declarante, nem com o declarado o negócio deve ser anulado, pois não deve valer com um sentido em que
nenhuma das partes confiou (em coerência com a teoria da aparência eficaz que já abordamos).

66. ERRO NA TRANSMISSÃO DA DECLARAÇÃO

Ver art. 250º. O erro na transmissão da declaração não tem relevância autónoma, desencadeará o efeito
anulatório, apenas nos termos do art. 247º CC.
Excepção a este regime geral: no art. 250º/2, admite-se a anulação, sempre que o intermediário emita
intencionalmente (com dolo) uma declaração diversa da vontade do dominus negotti (“do dono do
negócio”). Compreende-se que o declarante suporte o risco de transmissão defeituosa, de uma deturpação
ocorrida enquanto a declaração não chega à esfera de declaratário, uma adulteração dolosa deve, porém,
considerar-se como extravasando o cálculo normal de risco a cargo do declarante.
Ver tb arts. 251º, 252º/2 CC);
[Escrever texto]

o DIVISÃO IV – VÍCIOS DA VONTADE


§ 1.º – NOÇÕES GERAIS
67. VÍCIOS DA VONTADE. CONCEITO

Vícios da vontade: perturbações do processo formativo da vontade, de tal modo que esta, embora
concorde com a declaração, é determinada por motivos anómalos e ilegítimos para o Direito. A vontade
não se formulou de um “modo julgado normal e são”.
A consequência destes vícios traduz-se na invalidação do negócio, tendo para isso os vícios de revestir-se
de certos requisitos. Quando esses vícios são relevantes, geram a anulabilidade do respectivo negócio.

68. ENUMERAÇÃO DOS VÍCIOS DA VONTADE A QUE O NOSSO DIREITO ATRIBUI EM GERAL RELEVÂNCIA AUTÓNOMA

Erro-vício (251º e 252º);


Dolo (254º);
Coacção moral (256º);
Incapacidade acidental (257º).
Estado de necessidade (282º)

§ 2.º – O ERRO COMO VÍCIO DA VONTADE


69. NOÇÃO

Erro-vício: traduz-se numa representação inexacta ou na ignorância de uma qualquer circunstância de


facto ou de direito que foi determinante na decisão de efectuar o negócio. Trata-se de um erro nos motivos
determinantes da vontade, pois se estivesse esclarecido acerca dessa circunstância não teria realizado o
neg. ou tê-lo-ia realizado noutros termos.
Nota: erro-vício ≠ erro-obstáculo
O primeiro é um vício da vontade (erro na formação da vontade), o segundo uma divergência entre a
vontade e a declaração (erro na formulação da vontade).

70. MODALIDADES

a) Erro sobre a pessoa do declaratário: Estão apenas em causa as pessoas do declaratário, se se referir a
outras pessoas declarantes já se aplica o art. 252º/1 CC. O erro pode referir-se à sua entidade, a qualquer
qualidade jurídica ou que ao facto de não concorrerem na pessoa do declaratário, quaisquer outras
circunstâncias.
b) Erro sobre o objecto do negócio: pode incidir sobre o objecto mediato (erro sobre a identidade ou
sobre as qualidades) ou sobre o objecto imediato (sobre a natureza do negócio).
Ex: A compra um terreno pq julga que tem água, mas não tem. – erro sobre o objecto mediato do tipo
erro sobre as qualidades) / B faz um contrato julgando que tem os efeitos da locação, mas tem os efeitos da
venda a prestações (erro sobre a natureza do negócio)
c) Erro sobre os motivos não é referente à pessoa do declaratário nem ao objecto do negócio (art. 252º
CC).

71. CONDIÇÕES GERAIS DE RELEVÂNCIA DO ERRO VÍCIO COMO MOTIVO DE ANULABILIDADE

 Essencialidade
É corrente na doutrina a afirmação de que só é relevante o erro essencial. O erro é essencial, se sem ele,
não se celebraria qualquer negócio ou se celebraria um negócio com outro objecto ou de outro tipo ou com
outra pessoa.
[Escrever texto]

Já o erro indiferente não pode relevar pois é um erro tal, que mesmo sem ele o negócio teria sido
concluído nos mesmos termos e o erro, para relevar deve atingir os motivos determinantes da vontade (art.
251º e 252º CC).
. E quanto ao erro incidental? Concordamos que também não releva. O erro incidental é aquele que
influiu apenas nos termos do negócio, pois o errante sempre contrataria embora noutras condições.

Ex. de erro essencial: A compra um objecto de prata por 1000€, pensando que é ouro branco. Se
soubesse a verdade, não o teria comprado.
Ex.: de erro incidental: A, se soubesse a verdade teria comprado o objecto de prata, mas apenas por 200€

 Propriedade
Além de essencial, exige-se propriedade, isto é, o erro tem de ser próprio. É próprio quando incide sobre
uma circunstância que não seja a verificação de qualquer elemento legal da validade do negócio. Por
exemplo, se o erro versar sobre os requisitos da forma, então o fundamento da invalidade será o requisito
legal cuja deficiência, ignorada pelo errante, vicia o negócio, daí que o tipo de invalidade e o respectivo
regime não sejam os correspondentes ao erro-vício (anulabilidade), mas antes os correspondentes ao vício
de forma.

 Escusabilidade
A doutrina tradicional portuguesa considerava a ausência de culpa da parte do errante condição sine
qua non da sua relevância no sentido da anulabilidade, apoiando-se, fundamentalmente, para tal no art.
695º. O erro indesculpável ou grosseiro não anularia o negócio.
Em face do CC actual não se formula qualquer exigência da desculpabilidade ou escusabilidade do erro,
pelo que se deve reputar consagrada a solução segundo a qual este requisito é dispensável. Deve entender-
se que no caso de erro culposo, os interesses da outra parte, não obstante a anulação, não são
desprotegidos, pois, com fundamento no art. 227º, o errante, admitido a invocar a anulabilidade, incorrerá
em responsabilidade pré-negocial, devendo indemnizar o chamado interesse contratual negativo.

74. CONDIÇÕES ESPECIAIS DE RELEVÂNCIA DO ERRO VÍCIO COMO MOTIVO DE ANULABILIDADE

Aos requisitos gerais de relevância do erro devem acrescer certos requisitos especiais, que variam com as
diversas modalidades do erro-vício.

Erro sobre os motivos – inserem-se nesta categoria os casos em que o erro não se refere à pessoa do
declaratário nem ao objecto de negócio. Uma noção que corresponde ao erro acerca da causa.
Nos casos deste tipo o art. 252º/1 permite a anulação, desde que:
- haja uma cláusula, expressa ou tácita, no sentido de a validade do negócio ficar dependente da
existência da circunstância sobre que versou o erro.
Seria irrazoável permitir a anulação, apenas porque foi provado o conhecimento pela contraparte da
essencialidade do motivo que levou o errante ao negócio, pois a estabilidade dos neg. seria atingida e isso
repercutir-se-ia na celeridade e segurança da contratação.
Ou seja, o erro sobre os motivos é irrelevante, a não ser naquela condição. No art. 252º/2 estabelece-se
um regime especial para certos casos de erro sobre os motivos: se o erro incidir sobre as circunstâncias que
constituem a chamada base negocial, haverá lugar à anulabilidade do contrato, nos mesmos termos em
que, nos art. 437º a 439º.
Afirma-se que o erro incide sobre a base negocial nos casos em que a contraparte aceitaria ou, segundo a
boa fé, deveria aceitar um condicionamento do negócio à verificação da circunstância sobre que incidiu o
erro, se esse condicionamento lhe tivesse sido proposto pelo errante.

Erro sobre o objecto do negócio – está previsto no art. 251º, quer na hipótese do erro sobre a identidade,
quer na do erro sobre as qualidades. O negócio será anulável nos mesmos termos que os previstos no art.
247º para o erro-obstáculo, isto é, “desde que o declaratário conhecesse ou não devesse ignorar a
essencialidade, para o declarante, do elemento sobre que incidiu o erro”.
[Escrever texto]

Erro sobre a pessoa do declaratário – art. 251º. Cabe-lhe o regime correspondente ao erro na declaração.

75. APLICAÇÃO DA COISA A FIM DIFERENTE DO DECLARADO, ERRO E VINCULAÇÃO NEGOCIAL.

Uma hipótese muito interessante a considerar ocorre quando, num contrato de compra e venda, se
declara o destino a dar à coisa vendida mas o comprador vem mais tarde a dar-lhe um destino diferente do
declarado.
O destino que o comprador disse que daria à coisa pode ter sido decisivo para o vendedor, pode ter sido
determinante da decisão de contratar. O vendedor, contudo, não incorreu em erro – o comprador é que
não agiu de acordo com aquilo que o vendedor esperava dele. Ora, como as coisas se passaram, poderá
dizer-se que se erra, sim, quanto ao futuro, mas isso não é um erro em sentido próprio, é uma falha na
previsão, é uma falsa ou deficiente previsão, cujo enquadramento adequado é o art. 437º.
O erro-vício consiste no desconhecimento ou numa falsa representação da realidade, mas se, pelo
contrário, a falsa representação se reportar ao futuro, é a previsão que falha ou o quadro de
acontecimentos pressuposto que não se verifica ou evolui em termos diferentes do previsto, caso em que
será de recorrer ao instituto da alteração das circunstâncias. Domina a opinião segundo a qual o erro se
reporta ao presente ou ao passado enquanto a pressuposição ao futuro.

O problema da aplicação do bem a fim diferente do declarado é um problema complexo. Pode dizer-se
que se o comprador, após a celebração do negócio, der ao prédio um destino diferente do que se declarara
e correspondia à sua intenção, o problema não será de erro do vendedor. Poderá, isso sim, haver dolo do
comprador se este procedeu com intenção de enganar a outra parte quando emitiu aquela declaração.
A situação poderá ser de enquadrar no âmbito do não cumprimento do contrato se o destino declarado
constituir uma obrigação do comprador, o que, no entanto, além de provavelmente ser raro, retirará ao
problema a sua especificidade, pois deixará de ser um problema respeitante ao fim do contrato para passar
a ser, pura e simplesmente, uma questão relativa ao não cumprimento.
Naturalmente que a via mais adequada para proteger o interesse do vendedor será a inclusão de uma
condição ou de uma cláusula resolutiva, que lhe permitam rever o prédio caso o comprador não lhe dê o
destino acordado.
As partes estão vinculadas não apenas às obrigações que expressa ou tacitamente hajam assumido, mas
também a todas aquelas que sejam de incluir na relação obrigacional emergente do concreto contrato
celebrado, à luz da boa fé e do fim contratual. Revestem-se de particular importância os deveres laterais ou
deveres acessórios de conduta. É é de grande importância o sentido da declaração sobre o destino do bem,
o que assume relevo em sede de interpretação e integração do negócio (art. 236º e 239º).

§ 3.º – O DOLO
76. CONCEITO

A noção de dolo consta do art. 253º/1. Trata-se de um erro determinado por um certo comportamento da
outra parte. Só existe dolo quando se verifique o emprego de qualquer sugestão ou artifício com a intenção
ou consciência de induzir ou manter um erro o autor da declaração (dolo positivo) ou quando tenha lugar a
dissimulação, pelo declaratário ou por terceiro, do erro do declarante (dolo negativo).

77. MODALIDADES

a) Dolo positivo e dolo negativo: ver art. 253º/1 CC; A omissão de esclarecimento só constituirá
dolo ilícito quando existia um dever de elucidar, por força da lei, de estipulação negocial ou das concepções
dominantes no comércio jurídico.

b) “Dolus bonus” e “dolus malus”: só é relevante, como fundamento da anulabilidade, o “dolus


malus”. A lei tolera a simples astúcia, reputada legítima pelas concepções imperantes num certo sector
[Escrever texto]

negocial. A lei declara não constituírem dolo ilícito sendo, portanto, “dolus bonus”, as sugestões ou
artifícios usuais, considerandos legítimos, segundo as concepções dominantes no comércio jurídico (art.
253º/2 CC);
c) Dolo inocente: há mero intuito enganatório. Dolo fraudulento: há o intuito ou a consciência de
prejudicar.
d) Dolo proveniente do declaratário e dolo proveniente de terceiro: para a relevância do dolo de
terceiro, são exigidas certas condições suplementares que devem acrescer às do dolo do declaratário e o
seu efeito é mais restrito. Existirá, não apenas dolo de terceiro, mas também dolo do declaratário, se este
for cúmplice daquele, conhecer ou dever conhecer a actuação de terceiros (art. 254º/2 CC).
e) Dolo essencial ou determinante: o enganado (“deceptus”) foi induzido pelo dolo a concluir o
negócio em si mesmo e não apenas nos termos em que foi concluído, sem dolo não se teria concluído
qualquer negócio; Dolo incidental: o “deceptus” apenas foi influenciado, quanto aos termos do negócio,
pois sempre, contrataria, embora noutras condições. A importância da distinção estará em que o dolo
incidental não conduz, desde logo, necessariamente, à anulação, nos termos já indicados a propósito do
erro.

78. CONDIÇÕES DE RELEVÂNCIA DO DOLO COMO MOTIVO DE ANULAÇÃO

O principal efeito do dolo é a anulabilidade do negócio (art. 254º/1), mas acresce a responsabilidade pré-
negocial do autor do dolo, por ter dado origem à invalidade, com o seu comportamento contrário às regras
da boa fé, durante os preliminares e a formação do negócio (art. 227º). Não há, no dolo, responsabilidade
do declarante, pois este é vítima. O enganado tem o direito de repristinação da situação anterior ao
negócio e a cobertura dos danos que sofreu por ter confiado no negócio e que não teria sofrido sem essa
confiança. Ao invés, não pode pretender ser colocado na situação em que estaria se fossem verdadeiros os
factos fingidos perante ele.

Condições de relevância do dolo do declaratário como motivo de anulação


 Deve tratar-se de um dolus malus (art. 253º/2)
 Deve ser essencial ou determinante, embora o dolo incidental também possa vir a conduzir à anulação
(art. 254º/1).
 Existência no declarante da intenção ou consciência de induzir ou manter em erro. Segundo o art.
253º/1 basta a consciência de criar ou manter uma situação de erro, mesmo que esse não seja o propósito
de quem a cria ou mantém.
 Não é necessário que o dolo seja unilateral. O próprio dolo bilateral ou recíproco pode ser invocado
como fundamento de anulação (art. 254º/1).

Condições de relevância do dolo de terceiro como motivo de anulação (art. 254º/2)


 Se o declaratário conheceu ou lhe foi cognoscível o dolo de terceiro, o negócio será totalmente anulável.
Neste caso, haverá dolo negativo do próprio declaratário, se ele conheceu efectivamente os artifícios de
terceiro; a lei, todavia, estabelece a sanção da anulabilidade, mesmo para a hipótese da simples
cognoscibilidade do declaratário.
 Se o declaratário não conheceu nem devia conhecer o dolo de terceiro, o negócio só será anulável, se ao
terceiro declarante adveio, por força do negócio, directamente algum direito e a anulação será limitada a
cláusula a favor do terceiro. Já será, porém, anulável todo o negócio, se o declaratário conheceu ou devia
ter conhecido o dolo de terceiro.

79. FUNDAMENTO JURÍDICO DA ANULABILIDADE POR DOLO

O fundamento da anulabilidade por dolo não consiste numa ideia de reparação do prejuízo sofrido pelo
enganado mas na adulteração da vontade do declarante, tal como sucede com o erro simples. A reparação
do prejuízo causado é visada com a responsabilidade civil que impende sobre o declarante, e não com a
anulabilidade.
[Escrever texto]

80. CONFRONTO ENTRE AS CONDIÇÕES DE RELEVÂNCIA DO DOLO E AS DO ERRO

As condições de relevância do dolo são menos apertadas que as do erro sobre os motivos, visto não se
exigir para o dolo o estreito condicionamento importo pelo art. 252º.
O dolo é um facto ilícito que origina uma responsabilidade pré-negocial do declarante a favor do
enganado, enquanto que o errante, pelo menos se o erro não é causado culposamente pela outra parte
(art. 227º), não pode senão anular o negócio, verificados os respectivos requisitos de relevância. Pode até
verificar-se uma responsabilidade pela lesão do dano da confiança, não a favor, mas a cargo do errante,
admitido a invocar a anulabilidade, em caso de erro indesculpável.
A anulabilidade por erro pode estar sanada, subsistindo todavia a anulabilidade por dolo, por se ter tido
conhecimento, em primeiro lugar, do erro e só posteriormente da sua provocação dolosa.
Do exposto se infere que o errante está mais protegido no caso do dolo do que no do erro simples.

81. NEGÓCIO EM QUE O DOLO NÃO TEM RELEVÂNCIA ESPECÍFICA

(art. 1631º e 1636º) – no casamento, o dolo não tem relevância específica em relação ao erro.

§ 4.º – A COACÇÃO
82. CONCEITO

Consta do art. 255º/1, e consiste no “receio de um mal de que o declarante foi ilicitamente ameaçado com
o fim de obter dele a declaração”. É, portanto, a perturbação da vontade, traduzida no medo resultante de
ameaça ilícita de um dano (de um mal), cominada com o intuito de extorquir a declaração negocial.
Só há vício da vontade, quando a liberdade do coacto não foi totalmente excluída, quando lhe foram
deixadas possibilidade de escolha, embora a submissão á ameaça fosse a única escolha normal.
Só se cairá no âmbito da coacção física (absoluta ou ablativa), quando a liberdade exterior do coacto é
totalmente excluída e este é utilizado como puro autómato ou instrumento.
Não basta um simples medo ou receio; a lei exclui, desde logo, o chamado temor reverencial (art.
255º/2). Torna-se necessário que o receio provenha de uma ameaça ilícita.

83. MODALIDADES

 Coacção física e coacção moral – a coacção física reduz o coagido à situação de mero instrumento ou
autómato; a coacção moral ou relativa ou compulsiva reduz a liberdade do coagido mas não a elimina,
sendo o coagido ameaçado de um mal se não emitir a declaração; a liberdade do coacto é cerceada, mas
não excluída, na coacção moral, pois existe sempre uma opção entre padecer o mal cominado ou expor-se
à sua consumação e celebrar o negócio.
 Coacção essencial ou principal e coacção incidental – se sem ela não se realizaria o negócio ou se apenas
não se concretizaria o negócio naqueles termos.
 Coacção dirigida à pessoa ou à honra ou à fazenda do declarante ou de terceiro –A ameaça pode dizer
respeito à pessoa como à honra ou fazenda do declarante ou de terceiro (art. 255º/2).
 Coacção exercida pelo declaratário e coacção exercida por terceiro (art. 256º/2).

84. CONDIÇÕES DE RELEVÂNCIA DA COACÇÃO COMO MOTIVO DE ANULABILIDADE

A coacção moral origina a anulabilidade do negócio (art. 256º CC) e dá lugar igualmente á
responsabilidade pré-negocial do coactor (art. 227º CC). Verifica-se a anulabilidade, e não a nulidade,
mesmo que o coacto tenha procedido com reserva mental, ao emitir a declaração.

I - Coacção exercida pelo outro contraente – só produz anulabilidade qd:


[Escrever texto]

 se trate de uma coacção essencial ou principal; (mas a coacção incidental pode, igualmente, conduzir à
anulação nos mesmos termos do dolus incidens).
 Intenção de extorquir a declaração.
 Ilicitude da ameaça, que pode resultar:
o Da ilegitimidade dos meios empregues
o Da ilegitimidade da prossecução daquele fim com aquele meio.

Nota: Não há coacção, se há apenas a ameaça do uso de um direito para conseguir a satisfação ou
garantia de um direito existente.

II - Coacção exercida por terceiro:


Provoca a anulabilidade do negócio e põe a cargo do coactor uma obrigação de indemnizar o declarante
(coagido) e o declaratário. Ao contrário do dolo de terceiro, o negócio será anulável na sua totalidade,
quer o coactor seja beneficiado por cláusula a seu favor, existente no contrato, quer não seja, e haja ou não
conhecimento ou cognoscibilidade do vício por parte do declaratário (art. 256º/1).
O CC exige os dois requisitos seguintes (art. 256º):
 Gravidade do mal cominado
 Justificado receio de consumação do mal: deve ser uma ameaça de viável execução.

85. A COACÇÃO MORAL E O SIMPLES TEMOR REVERENCIAL

Temor reverencial consiste no receito de desagradar a certa pessoa de quem se é psicológica, social ou
economicamente dependente. O art. 255º/3 consagra expressamente o princípio, segundo o qual, o temor
reverencial não constitui coacção, sendo, assim, irrelevante como motivo determinante da vontade.

§ 5.º – O ESTADO DE NECESSIDADE E OUTRAS SITUAÇÕES COMO VÍCIOS DA VONTADE NEGOCIAL


86. CONCEITO

Estado de necessidade: situação de receio ou temor gerada por um grave perigo que determinará o
necessitado a celebrar um negócio para superar o perigo em que se encontra.

87. CONFRONTO COM A COACÇÃO

A confusão só pode surgir quando o estado de necessidade for ocasionado por um facto humano. Neste
caso, estaremos perante a figura do estado de necessidade quando a situação de perigo não for criada com
o desígnio de extorquir um negócio.
Se o contraente não presta o auxílio a que estava obrigado, a não ser depois de exigir uma retribuição a
que não tinha direito, não há dúvida de que a situação de perigo em que se encontra o necessitado é
casualmente imputável à recusa de actuação daquele, e pode, assim, dizer-se provocada a partir da
omissão do agir, com o intuito de extorquir o negócio. À coacção moral corresponde a anulabilidade (art.
256º) e os negócios referidos devem ter-se por nulos, com fundamento em contrariedade à lei ou ofensa
dos bons costumes (art. 280º).

88. VALOR DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS REALIZADOS EM ESTADO DE NECESSIDADE

A hipótese dos negócios em estado de necessitado deve subsumir-se na previsão do art. 282º, onde se
estatui a anulabilidade dos chamados negócios usurários.
Devem, portanto, verificar-se requisitos objectivos: benefícios excessivos ou injustificados. Tem de haver
uma desproporção clara entre as prestações. Só haverá benefícios excessivos ou injustificados quando,
segundo todas as circunstâncias, a desproporção ultrapassa os limites do que pode ter alguma justificação.
Devem igualmente verificar-se certos requisitos subjectivos:
[Escrever texto]

 A exploração de situações tipificadas, que não é excluída pelo facto de a iniciativa do negócio provir do
lesado;
 Uma situação de necessidade, inexperiência, ligeireza, dependência, estado mental ou fraqueza
carácter.
Nota: A anulabilidade, prescrita no art. 282º pode, porém, a requerimento do necessitado ou da parte
contrária, ser substituída (art. 283º) pela modificação do negócio, segundo juízos de equidade. O prazo
para requerer a anulabilidade começa a contar desde a cessação da situação de inferioridade (art. 284º).

O regime dos art. 282º e 283º não se aplicará, havendo antes lugar à nulidade quando a pessoa que se
aproveita conscientemente da situação de necessidade tinha o dever de auxiliar o necessitado. (ex. 1: Um
nadador salvador vê alguém a afogar-se – dever de auxílio. Ex.2: Um médico, o único numa certa zona
capaz de curar um indivíduo é chamado para o efeito – dever de auxílio. Nestes exs. Não se podem fazer
valer da sua posição para imporem um neg. injusto.)

§ 6.º – A INCAPACIDADE ACIDENTAL


89. A INCAPACIDADE ACIDENTAL

A hipótese está prevista no art. 257º CC, onde se prescreve a anulabilidade, desde que se verifique o
requisito (além da incapacidade acidental) destinado à tutela da confiança do declaratário: a notoriedade
ou o conhecimento da perturbação psíquica.
Não se trata de uma situação permanente do indivíduo, mas antes de um desvio no processo formativo
da sua vontade em relação às circunstâncias normais do seu processo deliberativo (art. 257º).

o DIVISÃO V – A REPRESENTAÇÃO NOS NEGÓCIOS JURÍDICOS – 258º E SS


90. CONCEITO

Representação: traduz-se na prática de um acto jurídico em nome de outrem, para na esfera desse
outrem se produzirem os respectivos efeitos. Para que a representação seja eficaz torna-se necessário que
o representante actue nos limites dos poderes que lhe competem (art. 258º) ou que o representado
realize, supervenientemente, uma ratificação.
Os poderes de representação podem ser atribuídos, por um acto voluntário, pelo representado ao
representante: fala-se, então, de representação voluntária e o acto voluntário que atribui poderes
representativos chama-se procuração.

Para existir a representação basta que o negócio seja concluído em nome do representado, não sendo já
necessário, contrariamente ao que por vezes se supõe, que o seja no interesse do representado.
A representação legal tem lugar sempre no interesse do representado, mas a representação voluntária
não, mas no caso da chamada procuração in rem suam, os poderes representativos são conferidos no
interesse do próprio procurador.

94. CONFRONTO COM INSTITUTOS AFINS

Representação ≠ mandato.
O mandato é um contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por
conta da outra (art. 1157º), trata-se de uma modalidade particular do contrato de prestação de serviço.
 Pode haver mandato sem haver representação, quando o mandatário não recebeu poderes para agir em
nome do mandante; age por conta do mandante, mas em nome próprio.
 Pode haver representação sem haver mandato, não só hipótese da representação legal, mas também no
que toca à representação voluntária.

Representante ≠ simples núncio – o representante, ao contrário do núncio, nunca recebe, nem mesmo
quando a procuração é especialíssima, um mandato absolutamente especificado e imperativo. Decide, pelo
[Escrever texto]

mesmo, o se do negócio e, frequentemente, o conteúdo. O representante emite uma declaração em nome


de outrem; o núncio transmite uma declaração de outrem. O representante consuma; o núncio transmite o
já consumado.
Diversidade de tratamento jurídico:
 O representante voluntário não precisa de ter plena capacidade legal (pode ser menor), mas carece da
capacidade natural de entender e querer, exigida pela natureza do negócio que haja de efectuar (ver art.
263º); quanto ao núncio, bastará a capacidade natural para transmitir a declaração de vontade, podendo
uma criança actuar como núncio. A plena capacidade legal do representante é desnecessária, o que se
justifica por o negócio ser indiferente para o representante;
 Se o representante excede os seus poderes de representação, o negócio é ineficaz em relação ao
representado (art. 268º), se este não atribuir àquele legitimidade representativa ex post facto – por
ratificação; se o núncio transmitir a sua declaração inexactamente, o dominus poderá ficar vinculado nos
termos da declaração emitida, se não se verificarem os requisitos, exigidos no art. 250º, para a relevância,
no sentido da anulabilidade, do erro na transmissão da declaração.

A representação própria ≠ representação imprópria – na última não existe a chamada actuação em nome
de outrem, embora se actue no interesse ou por conta de outrem; na representação própria existe a
actuação em nome de outrem. A representação imprópria é uma forma de mera representação de
interesses, que não torna o dono do negócio parte ou sujeito do acto jurídico praticado pelo representante.

Representação ≠ diversas formas de colaboração material ou técnica nos negócios de outrem – a


distinção assenta na contraposição negócio jurídico/acto material; ex.: o representante realiza negócios
jurídicos, e os dactilógrafos actos materiais.

Representação ≠ contratos para a pessoa a nomear


 Na representação própria o negócio representativo produz efeitos na esfera do representado, é ineficaz
se faltar a legitimação representativa; no contrato para pessoa a nomear, os direitos e obrigações
provenientes do contrato são apropriados, a partir da celebração do negócio, pela pessoa nomeada e, não
sendo feita a declaração de nomeação nos termos legais, o contrato produz os seus efeitos relativamente
ao contraente originário (art. 455º).
 Na representação imprópria o mandatário age em nome próprio, adquirindo os direitos e obrigações
decorrentes dos actos que celebra, e é obrigado a transferir para o mandante os direitos adquiridos, sendo
este obrigado a assumir as obrigações contraídas pelo mandatário (art. 1180º, 1181º e 1182º); no contrato
para pessoa a nomear, um dos contraentes declara contratar para um terceiro, reservando-se apenas o
direito de o nomear e, uma vez feita a declaração de nomeação nos termos do art. 453º, os efeitos do
negócio são encabeçados pela pessoa nomeada, retroactivamente, sem necessidade de um acto especial
de transmissão dos direitos e das dívidas.

Quem contrata com pessoa a nomear assume os riscos da incerteza sobre a pessoa de sua contraparte.

Representação ≠ simples autorização ou consentimento para actos de outrem – (art. 153º) o


representante actua e na simples autorização inibe-se ou aprova-se uma iniciativa e uma actuação de
outrem.

Representação ≠ contratos a favor de terceiros – (art. 443º) na representação, o representante não se


torna titular de quaisquer direitos ou obrigações em face da contraparte do negócio representativo, sendo
sujeitos das relações emergentes do referido negócio o representado e a outra parte; nos contratos a favor
de terceiro estabelecem-se vínculos jurídicos entre o promissário e o promitente além do direito adquirido
pelo terceiro a favor de quem foi convencionada a promessa ou dos outros efeitos favoráveis a este (art.
443º).
[Escrever texto]

Representação ≠ declarações sob o nome de outrem – na primeira, o representante actua em nome de


outra pessoa, que se não confunde com ele; na actuação sob o nome de outrem, o declarante assume o
nome de outrem, fazendo-se passar por essa pessoa.
A declaração não produzirá efeitos em relação ao verdadeiro titular do nome por aplicação analógica, ou
do art. 246º, ou do art. 268º/1. Deve, porém, admitir-se que o negócio se torne eficaz relativamente ao
declarante aparente se este o quiser aprovar (nunca em relação ao declaratário aparente).

95. ADMISSIBILIDADE DA REPRESENTAÇÃO

Representação legal – art. 124º, 139º e 154º.


Representação voluntária – art. 262º.

96. PRESSUPOSTOS DA REPRESENTAÇÃO

Pressupostos de existência da representação:


 Realização do negócio em nome do representado, para que a contraparte saiba ou possa saber com
quem negoceia. Na dúvida, negoceia-se em nome próprio.
 Declaração, em maior ou menor escala, de uma vontade própria do representante, e não, pura e
simplesmente, de uma vontade do representado. Através deste requisito distingue-se afigura do
representante da figura do núncio.

Pressuposto de eficácia da representação: o acto deve estar integrado nos limites dos poderes que
competem ao representante. O negócio vale em relação ao representado. Não vale em relação ao
representante; este não é parte negocial.
Deve existir, por parte do representante, legitimação representativa, que pode ser originária, isto é, já
existente ao tempo do negócio representativo, ou conferida, posteriormente, através de uma ratificação do
negócio.

Representação sem poderes e abuso de representação: os actos praticados por um representante sem
poderes ou falsus procurator são ineficazes em relação à pessoa em nome da qual se celebrou o negócio,
salvo se tiver lugar a ratificação (art. 268º/1). O falso procurador responde pelo interesse contratual
negativo, ou interesse da confiança, se desconhecia, com culpa, a falta de poderes. Se o representante sem
poderes desconhecia a falta de legitimidade representativa a contraparte pode optar pela indemnização
pelo não cumprimento do contrato.
Verificada uma situação de responsabilidade pré-negocial, por culpa in contrahendo, responde o
representado, seja na representação legal, seja na representação voluntária (art. 800º/1).
Haverá abuso de representação quando o representante actuar dentro dos limites formais dos poderes
conferidos, mas de modo substancialmente contrário aos fins da representação (art. 269º, 268º/2 e
262º/2).

Aparência de poderes de representação: nos casos em que o representante actuou sem poderes de
representação, há que perguntar se o terceiro que contratou com ele é protegido pela atribuição de efeitos
ao negócio em relação ao representado. Em princípio, a resposta a dar à questão posta é negativa, sendo
antes ao terceiro que incumbe exigir ao representante a justificação dos seus poderes representativos (art.
260º).
Mas a protecção do terceiro pode justificar-se nalguns casos. Assim, pode existir uma “procuração
tolerada”, porque o representado “tolera a conduta do representante, e essa tolerância, segundo a boa fé e
considerando os usos do tráfico, pode ser interpretada pela contraparte no negócio no sentido de que o
representante recebeu procuração do representado para agir por ele”. Já é mais difícil aceitar a vinculação
do representado em casos de mera procuração aparente, em que o representado de facto não conhecia a
conduta do representante, mas com o devido cuidado teria podido conhecer e impedir, e a contraparte
podia de acordo com a boa fé compreender a conduta do representante no sentido de que ela não teria
podido ficar escondida do representado com a diligência devida, e que este, portanto, a tolera. O negócio
[Escrever texto]

celebrado por um agente sem poderes de representação é eficaz perante o principal se tiverem existido
razões ponderosas, objectivamente apreciadas, tendo em conta as circunstâncias do caso, que justifiquem
a confiança do terceiro de boa fé na legitimidade do agente, desde que o principal tenha igualmente
contribuído para fundar a confiança do terceiro.

O negócio consigo mesmo – ex: A, procurador (representante) de B, compra em nome próprio um objecto
que vende em nome de B. É uma manifestação particular da representação sem poderes, o negócio está
ferido de anulabilidade (art. 261º) e não de ineficácia, como, prima facie, se poderia pensar e se teria de
concluir se o caso não estive expressamente previsto em norma especial. A razão de ser é impedir, dada a
colisão de interesses, um prejuízo para o representado ou para um dos representados.

 CAPÍTULO III O OBJECTO NEGOCIAL.


97. NOÇÃO DE OBJECTO DO NEGÓCIO JURÍDICO

O objecto distingue-se em:


 Objecto imediato ou conteúdo – efeitos jurídicos a que o negócio tende.
 Objecto mediado ou objecto stricto sensu – consiste naquilo sobre que incidem os efeitos do negócio.

O art. 280º utiliza a expressão objecto negocial neste sentido complexivo, abrangendo quer o conteúdo
ou efeitos jurídicos do negócio, quer o objecto propriamente dito ou em sentido estrito.

98. EXIGÊNCIAS LEGAIS RELATIVAS AO OBJECTO DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS

Determinabilidade – o objecto negocial deve estar individualmente concretizado no momento do


negócio, ou poder vir a ser individualmente determinado, segundo um critério estabelecido no contrato ou
na lei. Esta exigência refere-se, sobretudo, ao objecto mediato do negócio (art. 400º). Devem considerar-se
nulos por falta deste requisito, os negócios cujo objecto não foi determinado nem é determinável, por nem
as partes nem a lei terem estabelecido o critério de harmonia com o qual se deva fazer a individualização
do objecto.

Possibilidade física – significa que há qualquer impossibilidade material ou natural do objecto do negócio.
O art. 401º/3 permite concluir que só a impossibilidade objectiva (para toda a gente) invalida o negócio e
não já a simples impossibilidade subjectiva, isto é, a que se verifica apenas em relação à pessoa do devedor.

Possibilidade legal e não contrariedade à lei – será impossível legalmente o objecto de um negócio,
quando a lei ergue a esse objecto um obstáculo tão insuperável como o que as leis da natureza põem aos
fenómenos fisicamente impossíveis. Podem, portanto, ter um objecto legalmente impossível, negócios
jurídicos cujo objecto seja constituído por um outro negócio jurídico. Será contrário à lei o objecto de um
negócio, quando viola uma disposição da lei, isto é, quando a lei não permite uma combinação negocial
com aqueles efeitos ou sobre aquele objecto mediato. Note-se que devem ser considerados contrários à
lei, não só os negócios que frontalmente a ofendem, mas também, quando se constate, por interpretação,
que a lei quis impedir de todo em todo, um certo resultado, os negócios que procuram contornar uma
proibição legal, tentando chegar ao mesmo resultado por caminhos diversos dos que a lei expressamente
previu e proibiu.

Não contrariedade à ordem pública e ausência de ofensa aos bons costumes – o objecto dos negócios
jurídicos deve ainda ser conforme à ordem pública e aos bons costumes. A ordem pública para estes efeitos
é o conjunto dos princípios fundamentais, subjacentes ao sistema jurídico, que o estado e a sociedade
estão substancialmente interessados em que prevaleçam e que têm uma acuidade tão forte que devem
prevalecer sobre as convenções privadas. Quando é que se pode considerar um acto como ofensivo dos
bons costumes? Os bons costumes são uma noção variável, com os tempos e os lugares, abrangendo o
[Escrever texto]

conjunto de regras éticas aceites pelas pessoas honestas, correctas, de boa fé, num dado ambiente e num
certo momento.

99. CONSEQUÊNCIAS DA INOBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS A QUE DEVE OBEDECER O OBJECTO NEGOCIAL

Implica a nulidade do negócio jurídico. Esta consequência terá lugar, independentemente de as partes
conhecerem ou deverem conhecer o vício de que padece o objecto negocial. Também poderá ter lugar,
verificados os requisitos do art. 227º a responsabilidade civil pré-negocial da parte culpada.

SUBTÍTULO III – ELEMENTOS ACIDENTAIS DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS (CLÁUSULAS ACESSÓRIAS TÍPICAS GERAIS)
 CAPÍTULO I – CONDIÇÃO
100. CONCEITO, NATUREZA E IMPORTÂNCIA DA ESTIPULAÇÃO CONDICIONAL

As noções de condição suspensiva e condição resolutiva constam do art. 270º: subordinação pelas partes
a um acontecimento futuro e incerto, ou da produção dos efeitos do negócio jurídico (suspensiva) ou da
resolução dos mesmos efeitos (resolutiva).

Natureza da estipulação condicional – trata-se de uma vontade hipotética, embora actual e efectiva,
exteriorizada numa declaração única e incidível.

Razão de ser e importância prática – superação da incerteza objectiva do futuro, através de um


regulamento de interesses apto a, em qualquer hipótese, realizar a representação que os sujeitos têm do
seu interesse

101. AS CHAMADAS CONDIÇÕES IMPRÓPRIAS

Condições impróprias: Não reúnem todas as qualidades que caracterizam a condição verdadeira e
própria: 1º - evento futuro, ao qual está subordinada a eficácia do negócio; 2º - carácter incerto do evento;
3º - subordinação resultante da vontade das partes e não directamente ex lege.

Diversas figuras de condições impróprias:


 Condições referidas ao passado ou ao presente
 Condições necessárias, visto que o evento não é incerto, ex. condição de um declarante ou um terceiro
morrerem.
 Condições impossíveis, visto que a não verificação do evento é, desde logo, certa.
 Condições legais.
 A anteriormente chamada condição resolutiva tácita ou resolução por inadimplemento. A condição
resolutiva tácita tem um regime diverso do da condição resolutiva verdadeira e própria, quanto aos
aspectos seguintes:
o É facultada pela lei e não convencionada pelas partes
o Não opera automaticamente, pois apenas dá direito a que, em caso de inadimplemento de uma
parte, a outra parte a invoque.
o Não tem efeito retroactivo em relação a terceiros (art. 435º), ao contrário do que sucede com a
condição resolutiva verdadeira e própria (art. 274º).

102. A APONIBILIDADE DA CONDIÇÃO

Princípio geral
A cláusula condicional é um elemento acidental, susceptível de ser inserido na generalidade dos negócios,
por força do princípio da liberdade negocial. Certos negócios são, porém, incondicionáveis, por razões
ligadas ao teor qualitativo dos interesses respectivos ou por motivos de certeza e segurança jurídica.
[Escrever texto]

Devem ter-se por incondicionáveis os negócios unilaterais, resultantes do exercício de um direito


potestativo que atinge a esfera de outrem com uma eficácia não vantajosa.

Valor de condição aposta a um negócio incondicionável (sem condições)


Em conformidade com o princípio da incindibilidade do negócio condicional, a consequência da aposição
de uma condição a um negócio incondicionável é a nulidade do negócio. Tal solução resultará da aplicação
analógica do art. 271º e até genericamente do art. 294º. A lei sanciona, por vezes, uma solução diversa.
Assim, quanto ao casamento, dado o art. 1618º/2 é válido o negócio, sendo nula apenas a condição
estipulada.

103. CLASSIFICAÇÃO DAS CONDIÇÕES

Condições suspensivas e condições resolutivas (art. 270º)


O critério da distinção é o da influência que a verificação do evento condicionante tem sobre a eficácia do
negócio: se a verificação da condição importa a produção dos efeitos do negócio, não tendo estes lugar
doutro modo, trata-se duma condição suspensiva; se a verificação da condição importa a destruição dos
efeitos negociais, aquela diz-se resolutiva. Excepcionalmente, a lei estabelece uma presunção (art. 2234º).

Condição potestativas, casuais e mistas


Ex: condição potestativa (A faz uma doação a B, se este o visitar no Brasil), condição casual (se não
chover; se um terceiro for ao Brasil…); condições mistas (se B casar, visto que casar não depende só da sua
vontade).
A condição potestativa pode ser arbitrária ou não arbitrária. É arbitrária se o evento condicionante é um
puro querer ou um facto completamente insignificante ou frívolo. É não arbitrária se o evento
condicionante não é um puro querer, mas um facto de certa seriedade ou gravidade em face dos interesses
em causa.
Nos contratos bilaterais, a condição potestativa nunca será, verdadeiramente, arbitrária, pois o
contraente cujo acto funciona como evento condicionante terá ou não direito à contraprestação consoante
a sua atitude, pelo que esta nunca consistirá num puro querer ou num facto que é indiferente praticar ou
omitir, e antes põe em jogo um interesse sério.

Condições possíveis e impossíveis. As chamadas condições ilícitas


Sempre que o evento condicionante não possa realizar-se por impossibilidade física ou legal, ou seja
contrário à lei, à ordem pública ou ofensivo dos bons costumes, a condição respectiva terá a qualificação
correspondente. A condição que consiste num facto ilícito pode ser lícita, se a cláusula condicional
representar um contra-estímulo à prática desse acto; só deixará de ser assim, nesta hipótese, sendo,
portanto, nula a condição, se repugnar à lei ou aos bons costumes a ideia de que se pratique tal acto
mediante retribuição. Sendo embora o evento condicionante lícito, pode a condição ser ilícita, por força do
seu nexo com o restante conteúdo do negócio. É o caso das condições restritivas da liberdade (art. 2232º e
2233º). A ideia que está na base do art. 2233º/2 legitima a conclusão de que as condições contrárias à lei,
referidas no art. 2232º não serão nulas quando não houver efectivo intuito de cercear a liberdade, nem a
restrição se torne em si mesma escandalosa.
Quanto ao regime das condições impossíveis e ilícitas, haverá que distinguir um regime geral e um regime
especial para as liberdades.

 Regime geral – (art. 271º) o negócio subordinado a uma condição ilícita é nulo, a nulidade inquina todo
o negócio e não somente a cláusula condicional ilícita. Quanto à condição impossível, física ou legalmente,
quid iuris? A aposição de uma condição suspensiva impossível produz a nulidade total do negócio e a
aposição de uma condição resolutiva impossível produz apenas a nulidade da cláusula condicional.

 Regime especial para as doações e testamentos – (testamentos – art. 2230º; doações – 967º) a condição
impossível ou ilícita considera-se não escrita, mantendo-se válida e eficaz a liberalidade testamentária ou
[Escrever texto]

inter vivos a que estava aposta. A validade do testamento ou da doação, sem a condição, pode ser excluída
pelo disponente, se a condição for impossível, tendo lugar então a nulidade.
Porquê essa diferença e porque razão não é totalmente idêntico o regime das condições impossíveis e o
das ilícitas nas liberalidades?
 Para o comum dos negócios deve ter-se entendido que a solução da nulidade corresponde à vontade
presumível das partes, e, quando assim não tenha acontecido, estas podem fazer um novo negócio;
 Para as liberalidades;
 Quanto às condições impossíveis, deve ter-se considerado que, talvez, a vontade presumível do
disponente, nas doações e testamentos, seja no sentido da manutenção do negócio sem a condição e, daí,
ter-se estabelecido esse regime com carácter supletivo.
 Quanto às condições ilícitas sancionou-se o mesmo regime com carácter imperativo, para, deste
modo, afastar a possibilidade de o beneficiário do negócio ser impelido à prática de um acto em si ilícito ou
que, embora lícito, se entende dever ser deliberado no foro da consciência livre dos indivíduos, pelo desejo
de beneficiar da liberalidade.

Condições positivas e negativas


Na condição positiva, o evento condicionante traduz-se na alteração de um estado de coisas anterior. Na
condição negativa, o facto condicionante consiste na não alteração de uma situação existente.

Condições perplexas e não perplexas – as primeiras são as condições contraditórias, em que o evento
condicionante é incompatível com o efeito jurídico querido (A doa o prédio x a B, sob condição suspensiva
de o ter vendido primeiro a C): o negócio é nulo.

104. VERIFICAÇÃO E NÃO VERIFICAÇÃO DA CONDIÇÃO

Determinado, por interpretação da vontade das partes, qual seja o facto condicionante, verificar-se-á a
condição se tal acontecimento tiver lugar; nos termos do art. 275º/1, a certeza de que a condição se não
pode verificar equivale à sua não verificação.
O CC estabelece uma limitação a esta doutrina geral, nos casos de sabotagem da condição, isto é, quando
a parte a quem a condição prejudicaria impede a sua verificação contra as regras da boa fé, ou quando a
parte a quem ela beneficiaria a faz produzir contra as referidas regras. Comporta-se contra a boa fé quem
não se comporta como se pode esperar, segundo o sentido do contrato, de um contraente que pense com
lealdade.

105. EFEITOS DA CONDIÇÃO SUSPENSIVA

Na pendência da condição – enquanto o evento condicionante não se verificou, nem deixou de se poder
verificar. Neste período, o credor condicional não tem ainda um direito exercitável em relação ao devedor,
embora as parte estejam já vinculadas, de tal modo que estão sujeitas à produção dos efeitos do negócio,
uma vez verificado o evento condicionante. A aquisição de um direito à custa de outrem não pode ser já
impedida por esse outrem. A posição subjectiva do credor sub conditione consiste numa mera expectativa
de aquisição eventual de um direito, com a correspondente obrigação da outra parte. Daí que, se o devedor
cumpriu, durante o período da pendência da condição, por supor que o negócio é puro e simples, ou que a
condição já se verificou, possa repetir o indevidamente prestado (art. 476º).
Quanto aos requisitos pessoais de eficácia do negócio é relevante apenas o momento da celebração do
negócio e não o da verificação da condição. Assim, a coisa comprada sob condição suspensiva poderá ser
alienada pelo comprador, mas a alienação só surtirá efeito se se verificar o evento condicionante. O credor
condicional pode igualmente praticar actos conservatórios, pendente conditione (art. 273º).
Igualmente se obriga o devedor sob condição suspensiva a abster-se de quaisquer comportamentos que
prejudiquem a integridade do direito que o credor virá a adquirir se se verificar a condição (art. 272º).
[Escrever texto]

Constata-se, portanto, que, pendente conditione, os efeitos do negócio sob condição suspensiva estão em
suspenso, não tendo existência actual. O negócio produz, todavia, dados efeitos provisórios e
preparatórios, na expectativa da produção dos efeitos definitivos.

Verificada a condição – os efeitos do negócio que estavam suspensos tornam-se efectivos ipso jure e
desde a data da conclusão do negócio, sem mais requisitos. O princípio da retroactividade da condição é
afirmado no art. 276º e considerado como efeito natural da cláusula condicional, pois os efeitos do
preenchimento da condição podem ser, pela vontade das partes ou pela natureza do acto, reportados a
outro momento. Há excepções ao efeito retroactivo da condição suspensiva (art. 277º).

Não verificada a condição – neste caso não se produzem os efeitos definitivos a que o negócio tendia e
desaparecem os próprios efeitos provisórios ou preparatórios que tiveram lugar médio tempore.

106. EFEITOS DA CONDIÇÃO RESOLUTIVA

A situação do devedor no negócio sob condição resolutiva é idêntica à do credor no negócio sob condição
suspensiva, pois a condição resolutiva é suspensiva da dissolução do negócio condicionado.

Condição pendente– o negócio produz os seus efeitos normais, mas está suspensa sobre a sua eficácia a
possibilidade de verificação do evento condicionante. O dever condicional é titular de uma expectativa com
certa tutela jurídica. Por esse motivo, o credor condicional deve proceder segundo a boa fé (art. 272º), o
devedor ou alienante condicional pode praticar actos conservatórios (art. 273º) e pode até praticar actos
de disposição, cuja eficácia fica sujeita à verificação da condição resolutiva.

Verificada a condição – o preenchimento da condição importa a destruição automática e retroactiva dos


efeitos do negócio, o que fará perder a eficácia aos actos dispositivos do credor condicional. Há contudo
excepções ao principio supletivo da retroactividade (art. 277º).

Não verificada a condição – os efeitos do negócio consolidam-se, radicando-se, definitivamente, a


posição do credor sub conditione.

 CAPÍTULO II – TERMO
107. CONCEITO

Cláusula acessória típica pela qual a existência ou a exercitabilidade dos efeitos de um negócio são postas
na dependência de um acontecimento futuro mas certo, de tal modo que os efeitos só começam ou se
tornam exercitáveis a partir de certo momento (termo suspensivo ou inicial) ou começam desde logo, mas
cessam a partir de certo momento (termo resolutivo ou final).

108. EFEITOS

Não se verifica qualquer retroactividade. Haverá, também aqui, uma obrigação de proceder segundo a
boa fé, a cargo de uma das partes, a fim de não comprometer a integridade do direito da outra, bem como
poderá a parte interessada praticar actos conservatórios do seu direito tal como sucedia na pendência da
condição (art. 278º).

109. APONIBILIDADE DO TERMO

Em obediência ao princípio da liberdade contratual, as partes gozam da faculdade de inserir esta cláusula
na generalidade dos negócios. O termo pode ser aposto, em princípio, a qualquer negócio jurídico. Esta
regra tem excepções visto que há negócios que não admitem termo, os negócios inaprazáveis, os quais
coincidem com os negócios incondicionáveis. As disposições legais que excluem a aponibilidade da
[Escrever texto]

condição excluem também a aponibilidade do termo. Se a lei for omissa quanto à sanção a aplicar, parece
impor-se a nulidade de todo o negócio, com base no art. 294º.

110. MODALIDADES

Termo inicial, suspensivo ou dilatório e termo final, resolutivo ou peremptório – assenta a distinção num
critério baseado na influência que a verificação do facto futuro (mas certo) tem sobre a existência ou a
exercibilidade dos efeitos do negócio. Se os efeitos do negócio só começam ou só se tornam exercitáveis a
partir de certo momento, o termo diz-se suspensivo ou inicial; se começam desde logo, mas cessam a partir
de certo momento, o temo diz-se resolutivo ou final.

Termo certo e termo incerto – o termo refere-se a um acontecimento futuro mas certo, pelo que o
critério da distinção entre termo certo e incerto não tem a ver com a verificação do facto, mas com o
momento da sua verificação. O termo é certo quando se sabe antecipadamente o momento exacto em que
se verificará e incerto quando esse momento é desconhecido. Chama-se prazo ao período de tempo que
decorre entre a realização do negócio e a ocorrência do termo, embora se possam atribuir outros sentidos
àquela expressão.

Termo expresso e termo tácito – o termo, cláusula acessória do negócio jurídico, existe por vontade das
partes. Quando assim sucede, estamos perante o termo expresso ou próprio. Pode acontecer, porém, que
o termo exista, não por vontade das partes, mas por imposição da li – termo tácito ou impróprio.

Termo essencial e termo não essencial – o termo é essencial quando a prestação deve ser efectuada até à
data estipulada pelas partes ou até um certo momento, tendo em conta a natureza do negócio e/ou a lei.
Ultrapassada essa data o não cumprimento é equiparado à impossibilidade da prestação (art. 801º e ss).
Diz-se não essencial o termo que depois de ultrapassado, não acarreta logo a impossibilidade da prestação,
apenas gerando uma situação de mora do devedor (art. 804º e ss). O credor pode então, nos termos da lei
(art. 808º), fixar um termo essencial. O termo essencial resultante de vontade das partes, da lei ou da
natureza do negócio, determina, pois, que a prestação, não sendo cumprida no momento devido, já se não
pode cumprir, importando o atraso da prestação desde lgo a impossibilidade definitiva.

111. CÔMPUTO DO TERMO

Consistindo o termo, normalmente, na indicação de um momento a partir do qual, ou até ao qual, se


produzem os eleitos do negócio jurídico, podem surgir dúvidas e dificuldades sobre a respectiva contagem.
Quando começa a contar-se o termo? Naturalmente que as partes, ou a lei, podem definir regras próprias
destinadas a solucionar questões desta ordem (art. 279º).

 CAPÍTULO III – MODO, ENCARGO OU CLÁUSULA MODAL


112. CONCEITO

Cláusula acessória típica, pela qual, nas doações e liberalidades testamentárias, o disponente impõe ao
beneficiário da liberalidade um encargo, isto é, a obrigação de adoptar um certo comportamento no
interesse do disponente, de terceiro ou do próprio beneficiário (art. 963º e 2244º).

113. DISTINÇÃO DO MODO E DA CONDIÇÃO

O modo só pode ser aposto às liberalidades, enquanto a cláusula condicional é aponível, salvas as
excepções constantes da lei, a todos os negócios. Enquanto a cláusula modal se traduz na imposição, ao
beneficiário da liberalidade, do dever de adoptar uma certa conduta, a condição pode ter como evento
condicionante um facto de qualquer das partes, um facto natural ou de terceiro ou um evento de carácter
misto.
[Escrever texto]

A possibilidade de confusão entre as duas figuras circunscreve-se assim à cláusula modal e à condição
potestativa em que o evento condicionante é um acto do credor condicional.
Se a condição é suspensiva não se produzem imediatamente os efeitos do negócio, mantendo-se o
período da pendência até à verificação ou não verificação do evento condicionante. Por outro lado,
enquanto o beneficiário, onerado com o encargo modal, pode ser obrigado ao seu cumprimento, nenhuma
obrigação resulta da cláusula condicional. Daí que se possa dizer que a condição suspensiva suspende mas
não se obriga e o modo obriga mas não suspende.
A cláusula condicional, cujo evento se traduz em o credor condicional não dar ou não fazer alguma coisa,
é, porém, normalmente uma condição resolutiva (art. 2234º). Nesta os efeitos do negócio produzem-se
imediatamente, tal como no negócio a que foi aposta uma cláusula modal. Por outra via, enquanto o
preenchimento da condição resolutiva produz a automática resolução do negócio jurídico com eficácia
retroactiva, mesmo em relação a terceiros, salvas as regras do registo, o não cumprimento culposo do
modo dá, e só em certas circunstâncias adiante explicitadas, ao disponente ou aos seus herdeiros a
possibilidade de pedir a resolução da liberalidade e sem eficácia retroactiva para com terceiros. Quer dizer:
a condição resolutiva resolver automaticamente, mas não obriga e o modo obriga, mas dá apenas o direito
de pedir a resolução.
Saber se, num caso concreto, estamos perante uma cláusula modal ou uma cláusula condicional é um
problema de interpretação dos negócios jurídicos. Em nome do princípio da conservação dos negócios
jurídicos, é sustentada pela doutrina a solução segundo a qual, em caso de dúvida, a estipulação deve ser
qualificada antes como modo do que como condição.

114. VALOR DO MODO IMPOSSÍVEL OU ILÍCITO

No CC o art. 967º manda aplicar aos encargos modais, física ou legalmente impossíveis, contrários à lei ou
à ordem pública, ou ofensivos dos bons costumes, apostos às doações, as regras estabelecidas em matéria
testamentária.
Qual é esse regime? O art. 2245º manda aplicar aos encargos impossíveis ou ilícitos o regime estatuído,
para as condições com as mesmas características, no art. 2230º. Assim, a cláusula modal impossível tem-se
por não escrita e não prejudica o donatário, herdeiro ou legatário, salvo declaração do doador ou do
testador em contrário. Os encargos ilícitos têm-se igualmente por não escritos, ainda que o disponente
disponha o contrário. A nulidade é, portanto, parcial, isto é, mantêm-se o restante conteúdo da
liberalidade, que assim resulta ampliada, sendo tal regime supletivo no que toca ao modo impossível, e
imperativo para o modo ilícito.

115. INADIMPLEMENTO DO MODO

A doação com encargos é um contrato em que por força da sua declaração negocial de aceitação, o
donatário assume a obrigação de adoptar o comportamento a que se refere a cláusula modal.
Quid juris em caso de inadimplemento imputável ao onerado? Neste caso, pode ser judicialmente
reclamado o cumprimento dos encargos pelo doador, pelos seus herdeiros ou por quaisquer interessados.
Quanto à doação modal, do art. 965º e quanto aos encargos impostos a herdeiros ou legatários, do art.
2247º. A obrigação de cumprir os encargos é, quanto ao donatário, limitada pelo valor do objecto doado
(art. 963º); para o testamento, a mesma solução parece fundamentar-se, quanto ao herdeiro onerado, no
art. 2071º, e resulta claramente, no que toca a encargos impostos aos legatários, do art. 2276º.
Estabelecerá o actual CC outras consequências, quando o encargo modal não seja cumprido
culposamente?
Para as doações, tenha o encargo valor patrimonial ou moral, parece interferir-se do art. 966º, que o
doador ou os seus herdeiros poderão pedir a resolução de toda a doação, apenas quando, por
interpretação do contrato, esse direito lhes seja conferido. É necessário que o direito de resolução lhe seja
conferido pelo contrato e, portanto, corresponda a uma vontade real susceptível de destranhar a sua
eficácia em sede interpretativa. Para os testamentos, resulta do art. 2248º. O direito de resolução não pode
[Escrever texto]

ser exercido a todo o tempo, pois caduca passados cinco anos sobre a mora no cumprimento do encargo
ou vinte sobre a abertura da sucessão.

 CAPÍTULO IV – CLÁUSULA PENAL


116. CONCEITO E IMPORTÂNCIA PRÁTICA

É a estipulação em que as partes convencional antecipadamente uma determinada prestação,


normalmente uma quantia em dinheiro, que o devedor terá de satisfazer ao credor em caso de não
cumprimento perfeito da obrigação. Pode, assim, revestir duas modalidades: cláusula penal compensatória
ou moratória, conforme tenha sido estipulada para o não cumprimento da obrigação ou para a simples
mora do devedor. Mas pode referir-se a qualquer hipótese de cumprimento defeituoso da prestação.
Aparece normalmente como cláusula do contrato, dele fazendo parte desde a sua celebração, mas nada
impede que seja convencionada posteriormente, desde que antes da verificação do facto constitutivo de
responsabilidade.
A cláusula penal é acessória da obrigação principal, pelo que as vicissitudes destas se reflectirão na pena
convencional. Assim se a obrigação principal for nula, nula é a cláusula penal (art. 810º).
A cláusula penal pode desempenhar duas funções:
 Função indemnizatória ou de liquidação prévia – superam-se assim dificuldades e incertezas várias,
mormente de prova do dano e da sua extensão. Em circunstâncias normais, e na ausência de qualquer
cláusula penal, o credor que pretenda ser indemnizado dos prejuízos resultantes da violação do contrato
terá de fazer prova, através da acção judicial competente, dos prejuízos sofridos. Existindo uma cláusula
penal, contudo, o credor deixa de ter de fazer essa prova, sendo o montante da indemnização aquele em
que as partes tiverem previamente acordado.
 Função sancionatória ou compulsória – de pressão sobre o devedor em ordem à execução correcta do
contrato, sobretudo quando a pena é de montante elevado.

117. ESPÉCIES DE CLÁUSULAS PENAIS E RESPECTIVO REGIME

Cláusula de fixação antecipada da indemnização – é aquela em que as partes, ao estipulá-la, visam, tão-
só, liquidar antecipadamente, de modo ne varietur, o dano futuro. Pretendem as partes, desta forma,
evitar os litígios, as despesas e demoras. Acordando-se num montante indemnizatório pré-determinado, as
vantagens e os inconvenientes que daí poderão advir são partilhados pelos dois contraentes: ambos
conhecem, de antemão, as consequências de um eventual inadimplemento, e um e outro se submetem ao
risco de o prejuízo efectivo ser consideravelmente menor ou maior do que a soma prevista. Daí que o
credor não possa, em princípio, optar pela indemnização nos termos gerais (art. 811º), em vez da soma
prefixada, pois isso implicaria violar o acordo anterior, onde se estabeleceu a indemnização. A pena é
estipulada como substituto da indemnização, pelo que o acordo vincula ambas as partes ao montante
predeterminado, sendo este o único exigível a título de indemnização. Uma vez que esta cláusula se destina
a liquidar o dano, o devedor só terá de pagar a soma preestabelecida caso seja responsável, o que não
sucederá provando ele a sua falta de culpa. Assim como a mesma também não será devida provando o
devedor a inexistência de qualquer dano.

Cláusula penal exclusivamente compulsivo-sancionatória – traduz-se no facto de ela ser acordada como
um plus, como algo que acresce à execução específica da prestação ou à indemnização pelo não
cumprimento. A pena estritamente compulsória não visa reparar o credor, o dano do incumprimento não é
considerado pelas partes ao ser estabelecido o seu montante. A finalidade da mesma é de ordem
exclusivamente compulsória: destina-se, tão-só, a pressionar o devedor ao cumprimento, não a substituir a
indemnização a que houver direito, nos termos gerais. Não cabendo na hipótese do art. 810º, a sua
legitimidade decorre do princípio da liberdade contratual, funda-se no acordo das partes e destina-se a
tutelar a própria confiança de que cada contraente honrará os seus compromissos.
[Escrever texto]

Cláusula penal em sentido estrito – a pena visa compelir o devedor ao cumprimento. Substitui a
indemnização, quer dizer, não acresce a esta nem à execução específica da prestação. Ao ser celebrado o
acordo, a fim de pressionar o devedor a cumprir, o credor estipula uma sanção, que o primeiro aceita, nos
termos da qual fica legitimado a exigir uma prestação mais gravosa, em alternativa à prestação inicialmente
uma vez não satisfeita esta. Trata-se de uma ameaça exercida através de uma forma de satisfação
alternativa do interesse do credor, sem que a mesma passe pela via indemnizatória. Em vez de continuar a
reclamar a prestação devida, uma vez que esta não esteja prontamente satisfeita, o credor passa a poder
exigir outra prestação, que substitui a primeira.

O art. 811º pressupõe a cláusula de fixação antecipada da indemnização. E só neste caso é que a pena,
objecto da cláusula, será uma indemnização predeterminada. Nos restantes casos, a pena é uma sanção de
índole compulsória, podendo acrescer à indemnização ou, ao invés, substituí-la, em conformidade com o
escopo visado. O que não impedirá, em todo o caso, uma vez verificados os respectivos pressupostos, o
recurso ao art. 812º, ainda que por analogia. Este art. pressupõe que a possibilidade de reduzir a pena
depende de o seu montante se mostrar manifestamente excessivo, e não apenas de ser superior ao dano.
Por outro lado, este artigo enquanto expressão de um princípio geral, é de aplicar a todas as espécies de
penas convencionais, directamente ou por analogia.

E se o montante fixado pelas partes se revelar muito inferior aos danos efectivamente sofridos pelo
credor? Na falta de convenção sobre a ressarcibilidade do dano excedente, a lei impede o credor de obter a
reparação desses prejuízos, não permitindo ao tribunal o reforço de cláusula penal manifestamente baixa,
diversamente do que dispõe a respeito de cláusulas penais manifestamente excessivas. Solução que não
parece a melhor, pois em ambos os casos se justificaria, por razões de equidade, uma intervenção judicial
fiscalizadora de cláusula penal.

O credor não fica, no caso de o devedor se recusar a cumprir, estritamente vinculado à pena estabelecida,
podendo optar pelo cumprimento forçado da obrigação, através da execução específica. Não podendo o
credor exigir cumulativamente o cumprimento coercivo da obrigação principal e o pagamento da cláusula
penal, excepto se a mesma se reportar ao atraso da prestação.
O art. 811º/3 impede em caso algum o credor de exigir uma indemnização que exceda o valor do prejuízo
resultante do incumprimento da obrigação principal.

 CAPÍTULO V – CLÁUSULAS LIMITATIVAS E DE EXCLUSÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL


118. CONCEITO E IMPORTÂNCIA PRÁTICA

Cláusulas limitativas de responsabilidade são estipulações através das quais os contraentes, no


momento da celebração do contrato – ou posteriormente, desde que antes da verificação do facto gerador
da responsabilidade – acordem em limitar, de alguma forma, a responsabilidade do devedor pelo não
cumprimento, cumprimento defeituoso ou mora das obrigações assumidas. A limitação da
responsabilidade verificar-se-á, quer condicionando-a a determinado grau de culpa, quer limitando-a no
seu montante.
A cláusula limitativa do montante da indemnização consiste num valor máximo acordado pelos
contraentes como limite que a indemnização não poderá ultrapassar.
Mas o acordo das partes poderá ir mais longe, visando não apenas a limitação da responsabilidade, mas a
sua exclusão, e, consequentemente, o afastamento, em certos termos, da própria obrigação de
indemnização.

119. REGIME

O CC não trata da disciplina das cláusulas limitativas e de exclusão de responsabilidade em termos claros
e sistemáticos referindo-se a elas apenas no art. 800º/2. Aí se permite que a responsabilidade do devedor
por actos dos representantes legais ou auxiliares possa ser convencionalmente excluída ou limitada,
[Escrever texto]

mediante acordo prévio, desde que a exclusão ou limitação não compreenda actos que representem a
violação de deveres impostos por normas de ordem pública.
Quanto à cláusula limitativa de responsabilidade, pensamos não ser abrangida pela proibição constante
do art. 809º, norma que impede o credor de renunciar antecipadamente a certos direitos, entre eles, o de
indemnização. Admite a lei no art. 810º a possibilidade de as partes fixarem por acordo o montante da
indemnização exigível.
Mais duvidoso e problemático é saber se serão admitidas, no sistema jurídico português, cláusulas de
exclusão de responsabilidade, fora do quadro do art. 800º/2, respeitante à responsabilidade do devedor
por actos dos representantes legais e dos auxiliares.
Nos termos do actual art. 809º é nula a cláusula pela qual o credor renuncia antecipadamente a qualquer
dos direitos que lhe são facultados nas divisões anteriores nos casos de não cumprimento ou mora do
devedor, salvo o disposto no art. 800º/2. Justificando-se uma interpretação restritiva do art. 809º, por
forma a subtrair do seu alcance uma cláusula que condicione a responsabilidade do devedor ao dolo e
culpa grave, exonerando-o assim por comportamentos que só lhe podem ser imputados por mera culpa
leve.
Uma solução diferente, impedindo radicalmente, os contraentes de estipular cláusulas deste tipo, não se
figura realista, compreendendo-se a inadmissibilidade pura e simples de cláusulas exoneratórias apenas
quando razões de ordem pública ou de protecção do consumidor, sobretudo quando inseridas em contrato
de adesão.

Quanto à exclusão da responsabilidade do devedor por actos dos seus auxiliares (art. 800º/2) cremos que
a mesma só poderá valer, em princípio, nos mesmo termos em que é de admitir a cláusula de
irresponsabilidade por actos directamente praticados pelo devedor, ou seja, apenas em caso de
incumprimentos imputáveis a título de simples culpa leve. Porém, se os auxiliares de que o devedor se
serve, na circunstância concreta, forem pessoas autónomas e independentes da sua organização, poderá
admitir-se uma exclusão da responsabilidade do devedor em termos mais amplos, desde que haja acordo
prévio do credor nesse sentido.

A cláusula de exclusão de responsabilidade, se for válida, afasta apenas um dos direitos do credor, o
direito à indemnização.
Tratando-se de uma situação geradora de um concurso de responsabilidades, a cláusula de exclusão
afastará em princípio a obrigação de indemnização seja qual for o fundamento invocado, desde que se
apure que se trata de um facto ilícito coberto pela mesma cláusula de exclusão. Mas obviamente que isso
não leva a que o devedor/lesante fique isento da responsabilidade extracontratual em que incorra perante
terceiros, aos quais essa cláusula, a que não deram o seu consentimento, é inoponível.
Sendo a cláusula nula, impor-se-á a redução obrigatória do contrato e até da própria cláusula.

 CAPÍTULO VI – O PROBLEMA DA PRESSUPOSIÇÃO OU DA ALTERAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS QUE FUNDARAM A


DECISÃO DE CONTRATAR
120. CONCEITO

A alteração das circunstâncias do negócio implica a não verificação de uma circunstância pressuposta ou
de uma pressuposição, sempre que a evolução do circunstancialismo não foi considerada pelo declarante.
A noção de pressuposição consiste na convicção, consciente ou subconsciente, da verificação no futuro de
uma dada circunstância ou estado de coisas, convicção determinante da realização de um contrato, pois, de
outro modo, não se teria celebrado o negócio ou só teria tido lugar a sua realização noutros termos. (A
arrenda uma casa numa praia para o mês de Agosto, pensando ter férias nesse mês, o que afinal se não
vem a verificar)

121. CRITÉRIOS DE RELEVÂNCIA DA ALTERAÇÃO DA BASE DO NEGÓCIO


[Escrever texto]

Parece que é de inteira justiça abandonar o rígido principio da estabilidade dos contratos, quando dentro
de certos limites, caiu a base, constituída pelas representações das partes, sobre que assentava o negócio.
A tutela das expectativas e a protecção exigem que se assegure o cumprimento do que tiver sido
previamente acordado.

Quais serão então os requisitos a exigir, em nome da estabilidade contratual, para que a alteração
anormal das circunstâncias que fundaram a decisão de contratar por um ou ambos os contratantes possa
levar à resolubilidade ou à modificação do negócio e, assim, o possa reconduzir à justiça contratual?
O art. 437º/1 concede como remédio para obviar a uma situação injusta a possibilidade de resolução ou
modificação do contrato. Os pressupostos de aplicação desse remédio são definidos através das seguintes
exigências, destinadas a limitar o arbítrio do julgador e a servir de critério auxiliar da sua apreciação
valorativa.
 Alteração anormal das circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar;
 Manutenção do conteúdo contratual afectando gravemente os princípios da boa fé e não estando
abrangida pela álea própria do contrato.

O fundamento da resolução ou modificação do contrato não se limita à excessiva onerosidade


superveniente da prestação. Também não se pode considerar acolhida no art. 437º a doutrina da
pressuposição que levaria à revogação do negócio sempre que a pressuposição fosse reconhecível para a
outra parte.

Segundo Manuel de Andrade a pressuposição deficiente só é relevante quando for conhecida ou


cognoscível para a outra parte no momento da conclusão do negócio e desde que esta, se lhe tivesse sido
proposto o condicionamento do negócio à verificação da circunstância pressuposta, teria aceitado tal
pretensão ou a deveria ter aceitado segundo a boa fé. Este autor ia todavia, mais longe e tinha por
justificada a resolução ou a modificação do negócio, ainda que se não verifiquem os requisitos da teoria da
base negocial, desde que a boa fé justifique agora aquele resultado, embora não exigisse a aceitação da
cláusula de condicionamento na data do negócio.

122. CONSEQUÊNCIAS.

Verificados os requisitos do art. 437º a parte lesada tem direito à resolução do contrato ou à sua
modificação segundo juízos de equidade. A parte contrária pode também, requerida a resolução, opor-se
ao pedido, desde que aceite a recondução do conteúdo contratual aos termos correspondentes àqueles
juízos de equidade.
O art. 437º não limita a resolução dos contratos por alteração das circunstâncias aos contratos bilaterais,
podendo lançar-se mão dessa providência, desde que se verifiquem os requisitos respectivos, nos contratos
unilaterais ou bilaterais imperfeitos.
A não verificação da pressuposição só deverá afectar os contratos ainda não completamente cumpridos?
A resposta afirmativa é a corrente na doutrina. Mas, excepcionalmente pode ser de atender depois do
cumprimento das prestações quando o fim contratual só no futuro deve realizar-se e doravante se torna
inatingível.

SUBTÍTULO IV – INEFICÁCIA E INVALIDADE DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS (IMPORTANTE)


123. INEFICÁCIA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS (LATO SENSU). NOÇÃO. INEFICÁCIA STRICTO SENSU E INVALIDADE. OUTRAS
FORMAS DE INEFICÁCIA EM SENTIDO LATO

A ineficácia em sentido amplo tem lugar sempre que um negócio não produz, por impedimento
decorrente do ordenamento jurídico, no todo ou em parte, os efeitos que tenderia a produzir, segundo o
teor das declarações respectivas.
A invalidade é uma espécie do género da ineficácia: enquanto a ineficácia lato sensu compreende todas
as hipóteses em que, por causas intrínsecas ou extrínsecas, o negócio não deve produzir os efeitos a que
[Escrever texto]

tendia, a invalidade é apenas a ineficácia que provém de uma falta ou irregularidades dos elementos
internos do negócio.
A ineficácia em sentido estrito é definida pela cirscunstância de depender, não de uma falta ou
irregularidade dos elementos internos do negócio, integra a situação complexa produtiva de efeitos
jurídicos.
Na invalidade, a ausência de produção dos efeitos negociais resulta de vícios ou de deficiências do
negócio, contemporâneos da sua formação.
Há, porém, casos de cessação dos efeitos negociais por força de eventos posteriores ao momento da sua
celebração.

124. MODALIDADES DE INEFICÁCIA EM SENTIDO ESTRITO

Ineficácia absoluta e ineficácia relativa – a ineficácia é absoluta quando actua automaticamente, erga
omnes, podendo ser invocada por qualquer interessado (art. 274º). A ineficácia será relativa se se verificar
apenas em relação a certas pessoas, só por elas podendo ser invocada.
Os negócios feridos de ineficácia relativa produzem, pois, efeitos, mas não estão dotados de eficácia
relativamente a certas pessoas. Daí que sejam, por vezes, apelidados de negócios bifrontes ou negócios
com cabeça de Jano.
A ineficácia relativa surge-nos em situações caracterizadas pela existência de um direito, de uma
expectativa ou de um interesse legítimo de um terceiro, que seriam prejudicados pelo negócio de
disposição ou de vinculação em causa. O negócio é relativamente ineficaz, por força do impedimento,
resultante daquela posição legítima do terceiro acerca do conteúdo do acto. É necessário proteger o
terceiro na medida apropriada à não frustação do seu direito, mas não se deve limitar o poder de
disposição do titular mais do que for necessário a essa protecção. Logo, o negócio só é ineficaz em face do
terceiro, mas não é entre as partes ou em face de outras pessoas.

Ineficácia total e ineficácia parcial – a distinção refere-se à circunstância de o vício impedir a produção de
quaisquer efeitos ou só afectar parte dos efeitos negociais.

125. INEXISTÊNCIA E INVALIDADE (NULIDADE E ANULABILIDADE) DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS

Estamos perante a inexistência quando nem sequer aparentemente se verifica o corpus de certo negócio
jurídico, ou, existindo embora essa aparência material, a realidade não corresponde a tal noção. A
valoração de um negócio como nulo ou anulável pressupõe, pelo menos, que o negócio exista.
Manuel de Andrade admitia a autonomia da figura da inexistência jurídica, assinalando-lhe, como
interesse prático, a possibilidade de os negócios nulos poderem produzir certos efeitos laterais ou
secundários, como que seus filhos ilegítimos apenas, mas filhos em todo o caso.
O CC de 1966 consagrou a figura de inexistência jurídica dentro das invalidades do casamento (art. 1628º
e 1630º).

Nulidade e anulabilidade. Invalidades mistas


O negócio nulo não produz, desde o início, por força da falta ou vício de um elemento interno ou
formativo, os efeitos a que tendia. O negócio anulável, não obstante a falta ou vício de um elemento
interno ou formativo, produz os seus efeitos e é tratado como válido, enquanto não for julgada procedente
uma acção de anulação; exercido, mediante esta acção, o direito potestativo de anular pertencente a uma
das partes, os efeitos do negócio são retroactivamente destruídos.
O regime e os efeitos mais severos da nulidade encontram o seu fundamento teleológico em motivos de
interesse público predominante.

126. REGIME DAS NULIDADES

art. 286º, 288º


[Escrever texto]

 Operam ipso iure ou ipsa legis.


 São invocáveis por qualquer pessoa interessada
 São insanáveis pelo decurso do tempo
 São insanáveis mediante confirmação. Pode todavia, ter lugar aqui um sucedâneo da confirmação: a
renovação do negócio nulo. Enquanto que a confirmação é um negócio unilateral, a renovação, nos
contratos nulos é um novo contrato. A confirmação tem efeito retroactivo, mesmo em relação a terceiros;
a renovação opera ex nunc, mesmo que o fundamento da nulidade tenha desaparecido. Se as partes
renovam o negócio nulo, não se verificando já, obviamente, o motivo de nulidade, a retroactividade é
meramente obrigacional, isto é, vincula só as partes sem ser oponível a terceiros.

127. REGIME DAS ANULABILIDADES

art. 287º, 288º

O negócio anulável é, em princípio, apesar do vício, tratado como válido. Se não for anulado, no prazo
legal e pelas pessoas com legitimidade, passa a ser definitivamente válido. Se for anulado, no tempo e
forma devidos, considera-se que os efeitos visados não se produziram desde o inicio, como nunca tendo
tido lugar.
 Têm de ser invocadas pela pessoa dotada de legitimidade. Não podem ser declaradas ex officio pelo juiz.
 Só podem ser invocadas por determinadas pessoas e não por quaisquer interessados.
 São sanáveis pelo decurso do tempo (art. 125º, 1687º/2). Quanto ao momento a partir do qual se conta
o prazo, a lei fixa-o, a expressamente, para certas hipóteses (art. 125º, 1687º, 287º). A arguição da
anulabilidade não está sujeita a qualquer prazo se o negócio não está cumprido.
São sanáveis mediante confirmação. Sé é eficaz se for posterior á cessação do vício que fundamenta a
anulabilidade. (Ex: se A vende a B um objecto, por negócio anulável e, antes da confirmação, vende o
mesmo objecto a C, a confirmação da primeira venda torna a segunda viciada por ilegitimidade do
vendedor).

128. INTEGRAÇÃO DAS DIVERSAS INVALIDADES EM CADA UMA DAS CATEGORIAS

São nulos os negócios celebrados contra disposição legal de carácter imperativo, salvo nos casos em que
outra solução resulte da lei (art. 294º).
A regra catoniana (a invalidade não deixa de existir, se posteriormente desaparecer o motivo que a
originou), por força da qual se admite a chamada revalidação formal dos negócios jurídicos, parece não
estar expressamente consagrada na lei, mas deve ter-se por implícita.

129. EFEITOS DA DECLARAÇÃO DE NULIDADE E DA ANULAÇÃO

 Operam retroactivamente (art. 289º).


 Não obstante a retroactividade, há lugar à aplicação das normas sobre a situação do possuidor de boa
fé, em matéria de frutos, benfeitorias, encargos, etc.
 Em consonância com a retroactividade, haverá lugar à repristinação das coisas no estado anterior ao
negócio, restituindo-se tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o
valor correspondente.
 A nulidade e a anulabilidade são oponíveis a terceiros, salvo o caso especial da simulação, que é
inoponível a terceiros de boa fé (art. 243º). Em nome da protecção dos legítimos interesses de terceiros e
dos interesses do tráfico jurídico estabeleceu-se, contudo, que a declaração de nulidade ou a anulação do
negócio respeitante a bens sujeitos a registo, se não for proposta e registada nos três anos posteriores à
conclusão do negócio, é inoponível a terceiros de boa fé, adquirentes, a título oneroso, de direitos sobre os
mesmos bens (art. 291º).
[Escrever texto]

130. INVALIDADE E SIMPLES IRREGULARIDADE

Enquanto a invalidade importa a destruição dos efeitos negociais, a irregularidade, embora provenha de
um vício interno negocial, tem consequências menos graves, não afectando a eficácia do negócio, mas
dando apenas lugar a sanções especiais.

131. A INVALIDADE E OUTRAS FORMAS DE CESSAÇÃO DOS EFEITOS NEGOCIAIS (RESOLUÇÃO, REVOGAÇÃO, CADUCIDADE E
DENÚNCIA)

Resolução – (art. 270º, 437º, 801º, 966º, 1150º, 1140º, 432º) não resulta de um vício da formação do
contrato, mas de um facto posterior à sua celebração, normalmente um facto que vem iludir a legítima
expectativa de uma parte contratante, seja um facto da contraparte, seja um facto natural ou social. Os
seus efeitos estão regulados nos art. 433º e ss., onde determina a equiparação da resolução à nulidade ou a
anulabilidade do negócio. Porém a resolução distingue-se da invalidade:
 A resolução pode fazer-se mediante declaração à outra parte (art. 436º), a invalidade, ou actua
automaticamente (nulidade), ou implica uma acção judicial.
 A resolução tem, em princípio, efeito retroactivo entre as partes, mas tal efeito não se verifica se
contrariar a vontade das partes ou a finalidade da resolução, bem como, em princípio, nos contratos de
execução continuada ou periódica; a invalidade tem efeito retroactivo inter partes, sem estas limitações.
 A resolução nunca prejudica os direitos adquiridos por terceiro (art. 435º), salvo se o terceiro adquiriu o
seu direito posteriormente ao registo da acção de resolução; a invalidade opera os seus efeitos em relação
a terceiros, ressalvada a hipótese contemplada no art. 291º.

Revogação – tem apenas a consequência de extinguir os efeitos do negócio para o futuro (ex nunc). Pode
ter lugar, igualmente, uma revogação dos contratos por comum acordo, eventualmente com eficácia
retroactiva inter partes – contrato extintivo ou abolitivo (art. 406º).

Caducidade – este conceito abrange uma série numerosa de situações em que as relações jurídicas
duradouras de tipo obrigacional criadas pelo contrato ou pelo negócio se extinguem para futuro por força
do decurso do prazo estipulado, da consecução do fim visado ou de qualquer outro facto ou evento
superveniente a que a lei atribui o efeito extintivo ex nunc, da relação contratual.
 A sua causa é algo de objectivo.
 Actua automaticamente ou de pleno direito.
 Não tem carácter retroactivo.
 Pode verificar-se em actos de eficácia duradoura já em execução e actos de eficácia suspensa.

Denúncia – faculdade existente na titularidade de um contratante de, em diante mera declaração, fazer
cessar uma relação contratual ou obrigacional em sentido amplo, a que está vinculado, emergente de um
contrato bilateral ou plurilateral.

132. O PROBLEMA DA REDUÇÃO DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS

Posição do problema – trata-se de saber se, no caso de um fundamento de invalidade ser relativo apenas
a uma parte do conteúdo negocial, o negócio deve valer na parte restante ou deve ser nulo ou anulável na
sua totalidade. (Ex: A vende a B um terreno, verifica-se mais tarde que o terreno vendido não pertencia a A
na sua totalidade, pois compreende uma faixa determinada, correspondente a um terço da superfície total,
pertencente a C, a venda desta faixa é nula, por se tratar nesta parte, de uma venda de bens alheias; será
nulo o negócio ou permanecerá válida a venda do terreno efectivamente pertencente a A com a redução
proporcional do preço?)
Solução do problema – na doutrina propõe-se o critério da vontade hipotética ou conjectural das partes,
não uma vontade real, mas uma vontade como que fingida ou construída pelo juiz. Trata-se de averiguar
[Escrever texto]

aquilo que as partes teriam querido provavelmente, se soubessem que o negócio se opunha parcialmente a
alguma disposição legal e não pudessem realizá-lo em termos de ser válido na sua integridade. Se é de
admitir que as partes, nessa hipótese, prefeririam não realizar qualquer negócio, deve concluir-se pela
invalidade total. Se se concluir que as partes, provavelmente, sempre o teriam realizado na parte não
directamente atingida pela invalidade, deve ter lugar a redução do negócio.
O problema em face do CC – art. 292º determina-se em princípio, a redução dos negócios jurídicos
parcialmente nulos ou anuláveis. A invalidade total só poderá ter lugar, se se provar que o negócio não
teria sido concluído sem a parte viciada. Tal solução corresponde à ideia de proporcionalidade entre o vício
e a sanção: sendo a nulidade parcial, deve igualmente a sanção, em princípio, afectar apenas a parte
viciada. O contraente que pretender a declaração da invalidade total tem o ónus de provar que a vontade
hipotética das partes ou de uma delas, no momento do negócio, era nesse sentido.

Porém, por vezes, a redução deve ter lugar, mesmo que a vontade hipotética fosse no sentido da
invalidade total.
 Quando a invalidade parcial resultar da infracção de uma norma destinada a proteger uma parte contra
a outra, haverá redução, mesmo que haja vontade, hipotética ou real, em contrário.
 Quando, verificada a invalidade parcial, seja conforme à boa fé, numa apreciação actual, que o restante
conteúdo do negócio se mantenha, ainda que a vontade hipotética, reportada ao momento da conclusão
do negócio, fosse diversa. Trata-se de apurar se é justo que, uma vez concluído o negócio, se mantenha o
seu restante conteúdo, independentemente se der nesse sentido a vontade hipotética das partes.
 Nos contratos de adesão verificada a nulidade de certas clásulas por violarem proibições legais existe
um regime especial que visa proteger o interesse do aderente: este pode optar pela manutenção dos
contratos singulares, mesmo que algumas das suas cláusulas sejam nulas, vigorando, na parte afectada, as
normas supletivas aplicáveis.
 O consumidor por optar pela manutenção do contrato que celebrou quando algumas das cláusulas
sejam nulas por excluir ou restringir direitos reconhecidos pela lei do consumidor.

133. O PROBLEMA DA CONVERSÃO DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS

Os termos do problema – trata-se de saber se, declarado nulo ou anulado totalmente um negócio, este
não produzirá quaisquer efeitos negociais ou se, dados certos requisitos, não poderá reconstituir-se, com
os materiais do negócio totalmente inválido, um outro negócio, cujo resultado final económico-jurídico,
embora mais precário, se aproxime do tido em vista pelas partes com a celebração do contrato totalmente
inválido. (Ex: será possível a conversão de uma venda de imóveis feita por escrito particular, portanto nula
por vício de forma, numa promessa de compra e venda, com o resultado prático de levar à perda ou à
restituição em dobro do preço pago?)

Requisitos de admissibilidade – a doutrina nacional e estrangeira é largamente favorável à conversão dos


negócios jurídicos, exigindo todavia, certos requisitos de admissibilidade:
 É necessário que o negócio inválido contenha os requisitos essenciais de forma e substância, necessários
para a validade do negócio sucedâneo.
 Exige-se que a vontade hipotética ou conjectural das partes seja no sentido da conversão.
 É frequentemente exigido pela doutrina que o negócio sucedâneo diga respeito ao mesmo objecto
material a que respeitava o negócio principal. É preferível dizer-se que a conversão deve manter-se dentro
do domínio negocial traçado pelas partes.

Admissibilidade da conversão no nosso direito – (art. 293º) a conversão exige a prova da vontade
hipotética ou conjectural das partes, não tendo lugar em caso de dúvida. Com fundamento nsoart. 239º e
334º a conversão poderá ter lugar, independentemente da vontade hipotética das partes, se a voa fé assim
o exigir.

A conversão e certas figuras próximas


[Escrever texto]

 A conversão e a validade do negócio dissimulado na simulação relativa: o negócio dissimulado é


realmente querido, enquanto o negócio sucedâneo, na conversão corresponde apenas a vontade hipotética
das partes.
 A conversão dos negócios nulos ou anuláveis e a chamada conversão formal dos negócios jurídicos:
nesta última hipótese, não se trata, verdadeiramente, de conversão de negócios jurídicos, mas do simples
aproveitamento de um documento, nulo enquanto documento de certo tipo, como documento menos
solene.
 A conversão e os negócios jurídicos com vontade alternativa: os negócios jurídicos com vontade
alternativa são negócios em que as partes prevêem, desde logo, a hipótese de o negócio visado, em
primeira linha, ser nulo ou ineficaz e manifestam a vontade de, nessa hipótese, valer um negócio de
conteúdo diverso, que, de algum modo, satisfaz em segunda linha, o seu interesse; o negócio sucedâneo
assenta aqui na vontade real das partes, enquanto na conversão se baseia na vontade hipotética.

TÍTULO III – DO CONTRATO

135. NOÇÃO E REGIME GERAL DO CONTRATO

O contrato é formado por duas ou mais declarações de vontade, de conteúdo oposto mas convergente,
que se ajustam na sua comum pretensão de produzir resultado jurídico unitário, embora com um
significado para cada parte.
Para o contrato estar concluído, este consenso tem de incluir todas as cláusulas sobre as quais qualquer
delas tenha julgado necessário o acordo (art. 227º a 235º).
Na formação do contrato podem discernir-se duas declarações negociais: proposta e aceitação, que se
conciliam num consenso. Sendo o contrato integrado por duas declarações, põe-se o problema de saber
qual o momento da sua perfeição.
 Doutrina da aceitação – o contrato está perfeito quando o destinatário da proposta declarou aceitar a
oferta que lhe foi feita, admitindo-se, portanto, que o contrato estivesse formado ainda antes de o
proponente ter sequer a possibilidade de conhecimento da aceitação.
 Doutrina da percepção – situa-se no extremo temporal oposto à anterior, pois o contrato só está
perfeito quando o proponente tomou conhecimento efectivo da aceitação.
 Doutrina da expedição – o contrato está perfeito quando o destinatário expediu, por qualquer meio,
como telegrama, carta, etc., a sua aceitação.
 Doutrina da recepção – o contrato está perfeito quando a resposta contendo a aceitação chega à esfera
de acção do proponente passa a estar em condições de a conhecer.
O legislador de 1966 adoptou a última posição no art. 224º, do qual resulta consagrar o nosso direito a
doutrina da recepção, que parece, aliás, a preferível de jure condendo. Não será todavia necessário que a
declaração chegue ao poder ou à esfera de acção do proponente, se, por qualquer meio, foi dele
conhecida. Quer dizer: o contrato está perfeito quando a resposta, contendo a aceitação, chega à esfera de
acção do proponente, isto é, quando o proponente passa a estar em condições de a conhecer, ou quando a
conhecer efectivamente, se este momento foi anterior.
Quanto à proposta de contrato, é irrevogável depois de recebida pelo destinatário ou de ser dele
conhecida (art. 230º). A proposta só fica sem efeito se o destinatário receber uma retractação do
proponente ou dela tiver conhecimento antes de receber a proposta ou ao mesmo tempo que esta.
E coerência com a irrevogabilidade, a morte ou a incapacidade do proponente não obstam à conclusão do
contrato, salvo se outra tivesse sido a sua vontade presumível (art. 231º).
A aceitação tardia não leva à formação do contrato. Em caso de aceitação chegada tardiamente, mas
aparentemente enviada a tempo, a falta de aviso ao aceitante, por parte do proponente, da chegada tardia
da aceitação, apenas leva à responsabilidade do aceitante pelo prejuízo causado por tal falta de aviso (art.
229º), mas não à formação do contrato. O proponente pode, todavia, considerar eficaz a resposta tardia,
desde que ela tenha sido expedida em tempo oportuno.
Uma proposta contratual só existirá se for suficientemente precisa, dela resultar a vontade de o seu autor
se vincular e houver consciência de se estar a emitir uma verdadeira declaração negocial.
[Escrever texto]

As informações concretas e objectivas contidas nas mensagens publicitárias de determinado bem, serviço
ou direito se consideram integradas no conteúdo dos contratos que se venham a celebrar após a sua
emissão, tendo-se por não escrita as cláusulas contratuais em contrário.

A responsabilidade pré-contratual tanto vale no caso de ruptura de negociações, como no caso de o


contrato se concluir e vir a ser nulo ou ineficaz, ou ainda, se, por causa da violação dos ditames da boa fé
por uma parte, vier a ser concluído com um conteúdo diferente. O dano a ser ressarcido pela
responsabilidade pré-contratual é, em princípio, o chamado dano da confiança resultante de lesão do
interesse contratual negativo. Deve colocar-se o lesado na situação em que estaria, se não tem chegado a
depositar uma confiança afinal frustrada, ma celebração de um contrato válido e eficaz.

136. AS CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS E OS CONTRATOS DE OU POR ADESÃO

Os contratos de adesão são celebrados através da aceitação das condições gerais da empresa, prévia e
unilateralmente formuladas, com generalidade e indeterminação.
Os problemas que os contratos de adesão levantam são de três ordens:
 No plano de formação do contrato, aumentam consideravelmente o risco de o aderente desconhecer
cláusulas que vão fazer parte do contrato;
 No plano do conteúdo, favorecem a inserção de cláusulas abusivas;
 No plano processual, mostram a inadequação e insuficiência do normal controlo judiciário, que actua a
posteriori, depende da iniciativa processual do lesado e tem os seus efeitos circunscritos ao caso concreto.
Um controlo eficaz terá de actuar em três direcções:
 Pela consagração de medidas destinadas a obter, em cada contrato que se venha a concluir, um efectivo
e real acordo sobre todos os aspectos da regulamentação contratual.
 Pela proibição de cláusulas abusivas.
 Pela atribuição de legitimidade processual activa a certas instituições para desencadearem um controlo
preventivo, isto é, um controlo sobre as condições gerais antes e independentemente de já haver sido
celebrado um qualquer contrato.
-» Ver DL n.º 446/85, de 25 de Outubro.
A fim de combater o risco de desconhecimento de aspectos significativos do contrato impõe-se o dever
de comunicação prévia e a prestação de todos os esclarecimentos razoáveis que tenham sido solicitados.
Não se consideram integradas no contrato as cláusulas contratuais gerais que não respeitaram os requisitos
da sua inclusão.
O legislador teve consciência de que havia que fiscalizar directamente o conteúdo das próprias cláusulas
contratuais gerais. Fê-lo de duas formas: por um lado, impondo a sanção da nulidade para certo tipo de
cláusulas, que expressamente proíbe, nulidade essa invocável nos termos gerais; e por outro lado,
consagrando uma acção inibitória, com finalidades preventivas.
As cláusulas contratuais gerais, elaboradas para utilização futura, desde que interditas por lei, podem,
desde logo, ser proibidas por decisão judicial.

TÍTULO IV – EFICÁCIA DO DECURSO DO TEMPO NAS RELAÇÕES JURÍDICAS

O tempo é um facto jurídico não negocial, susceptível de influir, em muitos domínios do direito civil, em
relações jurídicas do mais diverso tipo.

138. OBRIGAÇÕES DURADOURAS E OBRIGAÇÕES DE EXECUÇÃO INSTANTÂNEA

As obrigações que se esgotam num momento determinado extinguem-se pelo cumprimento através de
um só acto do devedor e são designadas obrigações de execução instantânea. As obrigações que se
prolonga no tempo e que este não influi no montante da prestação são as obrigações duradouras.
[Escrever texto]

As obrigações de prestação fraccionada, apesar de o seu cumprimento se prolongar no tempo, não


podem ser consideradas obrigações duradouras. A obrigação de pagar o preço a prestações cumpre-se em
fracções sucessivas durante um certo período de tempo, mas o tempo não exerce influência no seu
montante.
As obrigações não duradouras existem em função de um fim; têm por objecto uma só prestação, a
realizar de uma só vez ou em fracções. As obrigações duradouras não são criadas em vista da sua extinção,
mas em vista da sua duração, da sua existência no tempo (art. 781º, 434º/2, 1058º).

IV – TEORIA GERAL DA GARANTIA DA RELAÇÃO JURÍDICA. REMISSÃO


139. A GARANTIA DA RELAÇÃO JURÍDICA. REMISSÃO.

A garantia é o conjunto de providências coercitivas, postas à disposição do titular activo dessa relação, em
ordem a obter satisfação do seu direito, lesado por um obrigado que o infringiu ou ameaça infringir.
Consiste na possibilidade, própria das relações jurídicas, de o seu titular activo pôr em movimento o
aparelho estadual, sancionatório e preventivo, para, em caso de infracção, repor a situação correspondente
ao seu direito, ou para impedir uma violação receada.
A forma mais frequente de garantia é a indemnização dos danos, patrimoniais ou não patrimoniais,
causados ao titular do direito (ver providências cautelares no art. 70º/2).
A garantia não protege o titular do direito apenas na hipótese de violação já consumada do seu direito.
Protege-o também contra ameaças de violação ou receios legítimos de infracção do dever jurídico. A
garantia dá igualmente ao titular de uma relação jurídica a possibilidade de, mediante acção de simples
apreciação pôr termo em juízo à situação de dúvida sobre a existência do seu direito, dúvida que poderia
acarretar prejuízos para ele.
A sanção civil, na forma de reconstituição natural ou de indemnização por equivalente, processa-se
mediante a apreensão pelo estado, no património do obrigado, e a entrega dos bens necessários à
satisfação do lesado. O que está excluído é o recurso à força própria para obter satisfação.
O art. 336º permite o recurso à acção directa, com o fim de realizar ou assegurar o próprio direito, desde
que seja impossível recorrer em tempo útil aos meios coercivos normais e desde que a actuação directa
não exceda o necessário para evitar o prejuízo. A acção directa distingue-se da legítima defesa (art. 337º), a
qual é um meio preventivo dirigido a afastar uma agressão actual, quer dizer, iminente ou em inicio de
execução, mas não consumada.

Você também pode gostar

pFad - Phonifier reborn

Pfad - The Proxy pFad of © 2024 Garber Painting. All rights reserved.

Note: This service is not intended for secure transactions such as banking, social media, email, or purchasing. Use at your own risk. We assume no liability whatsoever for broken pages.


Alternative Proxies:

Alternative Proxy

pFad Proxy

pFad v3 Proxy

pFad v4 Proxy