Decreto-Lei N.º 29 - 2008 - DR
Decreto-Lei N.º 29 - 2008 - DR
Decreto-Lei N.º 29 - 2008 - DR
º 29/2008, de 25 de fevereiro
Publicação: Diário da República n.º 39/2008, Série I de 2008-02-25, páginas 1205 - 1210
Emissor: Ministério das Finanças e da Administração Pública
Data de Publicação: 2008-02-25
REVOGADO
SUMÁRIO
TEXTO
de 25 de Fevereiro
O presente decreto-lei, na sequência da autorização legislativa conferida pelo artigo 98.º da Lei n.º 53-A/2006,
de 29 de Dezembro, visa concretizar uma orientação fundamental do Programa do XVII Governo
Constitucional respeitante ao reforço da eficácia no combate à fraude e à evasão fiscais, designadamente
mediante a adopção de medidas que estejam em linha com as melhores práticas europeias e internacionais.
Entre as medidas que têm vindo a ser desenvolvidas noutros sistemas jurídicos, designadamente nos Estados
Unidos da América, no Reino Unido e no Canadá, com vista a reforçar o combate à evasão fiscal, bem como à
própria fraude, destaca-se a consagração de obrigações de comunicação, informação e esclarecimento à
administração fiscal sobre esquemas ou actuações de planeamento fiscal agressivo que são propostos,
promovidos e comercializados por diversas entidades, genericamente apelidadas de intermediários fiscais.
Todos os sistemas fiscais modernos assentam na exigência do fornecimento de informações pelos sujeitos
passivos, avultando desde logo a obrigação básica de apresentar declarações sobre os elementos fiscalmente
relevantes. Verifica-se actualmente, porém, que as obrigações de prestação de informações sobre factos
tributários e matérias conexas devem ultrapassar o estrito campo dos contribuintes e de certos terceiros
delimitados para passarem a incidir igualmente sobre as entidades que prestam serviços de consultoria no
campo fiscal, dada a sua importância crescente na definição da actuação dos sujeitos passivos de imposto.
Ora, o fenómeno do planeamento fiscal agressivo ou abusivo, promovido por estes intermediários fiscais, gera
efeitos desfavoráveis muito significativos, pois corrói a integridade e a justiça dos sistemas fiscais, desencoraja
o cumprimento por parte da generalidade dos contribuintes e aumenta injustificadamente os custos
administrativos de fiscalização da máquina fiscal.
O exercício da consultoria no campo tributário tem, então, vindo a ser desenvolvido sem qualquer forma de
regulação, não se encontrando muitas vezes sequer uma qualquer manifestação de preocupação com as
fronteiras da actuação ilícita que podem estar a ser atravessadas ou com o princípio material fundamental da
justiça na repartição efectiva dos encargos tributários. Muitos intervenientes neste sector de actividade
concebem mesmo a sua missão, não como a promoção do cumprimento da lei fiscal e de erradicação do seu
incumprimento, mas antes como a exploração sem limites nem peias das fragilidades da lei fiscal, mesmo que
em desconformidade com o plano e o espírito legislativo.
Naturalmente, pelos proventos que assim têm obtido, estes promotores pretendem proteger ciosamente a
actual e desregrada forma de desenvolver a sua actividade, bem como o know how entretanto adquirido, não
obstante as graves repercussões económicas e sociais que para a comunidade no seu todo advêm da
respectiva actuação.
De qualquer modo, em atenção à sua novidade, a disciplina instituída é muito prudente, o que se manifesta
logo no facto de se dirigir unicamente ao conhecimento pela administração fiscal dos esquemas ou actuações
de planeamento fiscal considerados em si mesmos e de modo abstracto (artigo 8.º). Deste modo, as
obrigações instituídas não se destinam a determinar a identificação dos utilizadores de esquemas ou
actuações de planeamento fiscal (n.º 2 do artigo 8.º), o que apenas tem lugar quando o conhecimento desses
esquemas ou actuações não pode ser obtido senão junto dos próprios utilizadores (artigo 10.º).
A revelação dos esquemas ou actuações de planeamento fiscal prevista no presente decreto-lei possibilita,
assim, melhorar a transparência e a justiça do sistema fiscal, assegurando-se ao mesmo tempo que os custos
administrativos relacionados com estas obrigações não assumem significado relevante dado incidirem,
fundamentalmente, apenas sobre as entidades que promovem junto de terceiros a utilização desses
esquemas e que, portanto, têm deles perfeito conhecimento.
O presente decreto-lei visa, portanto, objectivos de promoção do interesse nacional em atenção ao papel
fundamental que a liquidação e cobrança das receitas tributárias devidas nos termos da lei assume para o
desenvolvimento económico e social.
Evidentemente, é fundamental que todos, particulares e empresas, na sua qualidade de contribuintes ou fora
dela, tenham plena consciência e assumam na prática que representa um essencial dever de cidadania que
cada um pague todos os impostos que são devidos nos termos da lei. Com a disciplina agora instituída dá-se
igualmente mais um passo no sentido da plena radicação na comunidade nacional deste elementar princípio
de justiça e solidariedade.
Foram promovidas as diligências necessárias à audição da Ordem dos Advogados, da Câmara dos
Solicitadores, da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, da
Associação Portuguesa de Bancos, da Associação Portuguesa de Seguradores, do Banco de Portugal, do
Instituto de Seguros de Portugal e da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários.
Assim:
No uso da autorização legislativa concedida no artigo 98.º da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, e nos
termos das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
CAPÍTULO I
Objecto e âmbito
Artigo 1.º
Objecto
Artigo 2.º
Âmbito de aplicação
1 - O presente decreto-lei aplica-se aos esquemas ou actuações de planeamento fiscal em que estejam
implicadas vantagens fiscais respeitantes, por qualquer modo, total ou parcialmente, aos impostos sobre o
rendimento, sobre a despesa e sobre o património administrados pela Direcção-Geral dos Impostos.
2 - Nos termos do número anterior, estão abrangidos pelo disposto no presente decreto-lei o imposto sobre o
rendimento das pessoas singulares, o imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas, o imposto sobre o
valor acrescentado, o imposto municipal sobre imóveis, o imposto municipal sobre as transmissões onerosas
de imóveis e o imposto do selo.
Artigo 3.º
Planeamento fiscal
a) «Planeamento fiscal», qualquer esquema ou actuação que determine, ou se espere que determine, de
modo exclusivo ou predominante, a obtenção de uma vantagem fiscal por sujeito passivo de imposto;
Artigo 4.º
1 - Estão sujeitos ao disposto no presente decreto-lei os esquemas ou actuações de planeamento fiscal, tal
como definidos no artigo anterior, que se reconduzam a uma das situações seguintes:
a) Impliquem a participação de entidade sujeita a um regime fiscal privilegiado, considerando-se como tal a
entidade cujo território de residência conste da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças ou quando
aí não for tributada em imposto sobre o rendimento idêntico ou análogo ao IRS ou ao IRC ou ainda quando o
imposto efectivamente pago seja igual ou inferior a 60 % do imposto que seria devido se a referida entidade
fosse considerada residente em território português;
c) Envolvam operações financeiras ou sobre seguros que sejam susceptíveis de determinar a requalificação
do rendimento ou a alteração do beneficiário, designadamente locação financeira, instrumentos financeiros
híbridos, derivados ou contratos sobre instrumentos financeiros;
2 - Independentemente da correspondência com uma das situações referidas no número anterior, estão
sempre sujeitos ao disposto no presente decreto-lei os esquemas de planeamento fiscal, tal como definidos no
artigo anterior, que sejam propostos com cláusula de exclusão ou de limitação da responsabilidade em
benefício do respectivo promotor.
Artigo 5.º
Promotor
1 - Para efeitos do presente decreto-lei, considera-se promotor qualquer entidade com ou sem personalidade
jurídica, residente ou estabelecida em qualquer circunscrição do território nacional, que, no exercício da sua
actividade económica, preste, a qualquer título, com ou sem remuneração, serviços de apoio, assessoria,
aconselhamento, consultoria ou análogos no domínio tributário, relativos à determinação da situação tributária
ou ao cumprimento de obrigações tributárias de clientes ou de terceiros.
3 - Um promotor, tal como definido no n.º 1, fica vinculado às obrigações previstas no presente decreto-lei em
relação a um esquema ou actuação de planeamento fiscal quando, por qualquer forma e em qualquer medida,
tenha participado ou colaborado na respectiva concepção ou proposta ou acompanhado a sua preparação,
adopção ou implementação.
Artigo 6.º
Delimitação
1 - Não envolve actuação como promotor, não se aplicando as obrigações previstas no presente decreto-lei, o
aconselhamento sobre esquema ou actuação de planeamento fiscal por advogado ou solicitador ou por
sociedade de advogados ou de solicitadores no contexto da avaliação da situação jurídica do cliente, no
âmbito da consulta jurídica, no exercício da sua missão de defesa ou representação do cliente num processo
judicial, ou a respeito de um processo judicial, incluindo o aconselhamento relativo à maneira de propor ou
evitar um processo, quer as informações sejam obtidas antes, durante ou depois do processo, bem como no
âmbito dos demais actos próprios dos advogados e solicitadores, tal como definidos na Lei n.º 49/2004, de 24
de Agosto.
2 - Não envolve, igualmente, actuação como promotor as recomendações sobre esquema ou actuação de
planeamento fiscal feitas por revisor oficial de contas ou sociedade de revisores oficiais de contas no âmbito e
para os efeitos das respectivas funções de interesse público de revisão legal das contas.
CAPÍTULO II
Deveres
Artigo 7.º
Comunicação
1 - Qualquer entidade que constitua um promotor, tal como definido no artigo 5.º, deve comunicar ao director-
geral dos Impostos os esquemas ou actuações de planeamento fiscal propostos a clientes ou outros
interessados.
2 - A comunicação deve ter lugar nos 20 dias subsequentes ao termo do mês em que o esquema ou actuação
de planeamento fiscal tenha sido proposto pela primeira vez.
3 - Sempre que o esquema ou actuação de planeamento fiscal tenha sido proposto por outra entidade, o
promotor que participe ou colabore na respectiva implementação deve comunicar o esquema ou actuação ao
director-geral dos Impostos nos vinte dias subsequentes ao termo do mês em que o esquema ou actuação
tenha passado a ser acompanhado pelo promotor, excepto quando o proponente lhe comprove já ter
efectuado a comunicação prevista no presente artigo.
Artigo 8.º
Informações
b) Indicação da base legal relativamente à qual se afere, se repercute ou respeita a vantagem fiscal
pretendida;
2 - Não está compreendido no dever de comunicação previsto pelo presente decreto-lei a cargo dos
promotores qualquer indicação nominativa ou identificativa dos clientes ou interessados relativamente aos
quais tenha sido proposto o esquema de planeamento fiscal ou que o tenham adoptado.
Artigo 9.º
Dever de esclarecimento
1 - O director-geral dos Impostos pode solicitar aos promotores, apenas relativamente à informação referida na
alínea a) do n.º 1 do artigo 8.º, os esclarecimentos sobre quaisquer aspectos ou elementos da descrição
efectuada do esquema ou da actuação de planeamento fiscal, bem como a indicação do número de vezes em
que foi proposto ou adoptado e do número de clientes abrangidos.
2 - Os esclarecimentos são prestados no prazo de 30 dias após notificação para o efeito, aplicando-se o
disposto no artigo 38.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Artigo 10.º
Utilizadores
1 - Sempre que o esquema ou actuação de planeamento fiscal não tenha sido objecto de proposta ou
acompanhamento por um promotor, ou o promotor não seja residente ou não esteja estabelecido em território
português, compete ao próprio utilizador proceder à sua comunicação ao director-geral dos Impostos, o que
deve ser realizado até ao fim do mês seguinte ao da respectiva adopção.
2 - No caso do número anterior, para além do nome ou denominação, endereço e número de identificação
fiscal do utilizador, são objecto de comunicação as informações referidas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo
8.º
b) Pessoas singulares quando esteja em causa um dos esquemas incluídos nas alíneas a) ou b) do n.º 1 do
artigo 4.º
Artigo 11.º
O dever de sigilo a que estejam legal ou contratualmente sujeitas as entidades abrangidas por este decreto-lei
não as desobriga do cumprimento das obrigações nele previstas.
Artigo 12.º
Exclusão de responsabilidade
As informações prestadas no cumprimento dos deveres previstos neste decreto-lei não constituem violação de
qualquer dever de confidencialidade, nem implicam para quem as preste responsabilidade de qualquer tipo.
CAPÍTULO III
Gestão
Artigo 13.º
Competência
1 - Compete ao director-geral dos Impostos receber e tratar todas as comunicações relativas a esquemas ou
actuações de planeamento fiscal efectuadas ao abrigo do presente decreto-lei.
Artigo 14.º
Base de dados
É organizada, sob a responsabilidade do director-geral dos Impostos, uma base nacional de dados de
esquemas de planeamento fiscal por imposto, a qual será disponibilizada aos serviços competentes para
efeito do exercício da acção de inspecção tributária.
Artigo 15.º
Divulgação
O director-geral dos Impostos, para efeitos de prevenção da fraude e evasão fiscais, procede à divulgação
pública, através da página electrónica desta instituição na Internet, do entendimento da Direcção-Geral dos
Impostos de que certo esquema ou actuação de planeamento fiscal, descrito em termos gerais e abstractos, é
reputado abusivo e pode ser requalificado, objecto de correcções ou determinar a instauração de
procedimento legalmente previsto de aplicação de disposições anti-abuso.
Artigo 16.º
Confidencialidade
Sem prejuízo do estabelecido no artigo anterior, os elementos comunicados ao abrigo do presente decreto-lei
estão sujeitos ao dever de sigilo fiscal, aplicando-se o disposto no artigo 64.º da lei geral tributária.
CAPÍTULO IV
Artigo 17.º
Ilícitos em especial
1 - É punível com coima de (euro) 5000 a (euro) 100 000 ou de (euro) 1000 a (euro) 50 000, consoante seja
aplicada a ente colectivo ou a pessoa singular, a falta de comunicação ou a comunicação fora do prazo legal
exigida nos artigos 7.º e 8.º
2 - São puníveis com coima de (euro) 1000 a (euro) 50 000 ou de (euro) 500 a (euro) 25 000, consoante seja
aplicada a ente colectivo ou a pessoa singular, a não prestação ou a prestação fora do prazo legal dos
esclarecimentos a que se refere o artigo 9.º
3 - São puníveis com coima de (euro) 500 a (euro) 80 000 ou de (euro) 250 a (euro) 40 000, consoante seja
aplicada a ente colectivo ou a pessoa singular, a falta de comunicação ou a comunicação fora do prazo legal,
bem como omissões ou inexactidões relativas às informações exigidas, devidas pelos utilizadores nos termos
do artigo 10.º
4 - A negligência é punível.
Artigo 18.º
Sempre que a infracção resulte da omissão de um dever, o pagamento da coima ou o cumprimento da sanção
acessória não dispensam o infractor do cumprimento do dever, se este ainda for possível.
Artigo 19.º
Artigo 20.º
Às infracções previstas no presente decreto-lei é aplicável o regime geral das infracções tributárias, aprovado
pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, podendo haver lugar a sanções acessórias de acordo com o previsto no
artigo 28.º do mesmo diploma.
CAPÍTULO V
Disposições finais
Artigo 21.º
2 - O cumprimento do disposto no número anterior é efectuado no prazo de dois meses a contar da data da
entrada em vigor da portaria referida no artigo 22.º
Artigo 22.º
Declarações
São aprovados por portaria do Ministro das Finanças os modelos de declarações para o cumprimento dos
deveres de comunicação previstos no presente decreto-lei, a qual define ainda as especificações dos modelos
e os procedimentos para a respectiva entrega.
Artigo 23.º
Revisão
O presente decreto-lei é revisto no prazo de três anos a contar da data da sua entrada em vigor, devendo ser
recolhidos os elementos úteis resultantes da sua aplicação para introdução das alterações que se mostrem
necessárias.
Artigo 24.º
Entrada em vigor
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 27 de Dezembro de 2007. - José Sócrates Carvalho Pinto de
Sousa - Fernando Teixeira dos Santos - Alberto Bernardes Costa.
Publique-se.