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Capítulo I - Noções Gerais 4. Carateres Do Direito Processual Civil 4.1. D

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Raquel Cardoso 2015/2016

CAPÍTULO I – NOÇÕES GERAIS

4. CARATERES DO DIREITO PROCESSUAL CIVIL


4.1. DIREITO PROCESSUAL CIVIL COMO DIREITO INSTRUMENTAL OU ADJETIVO
O DPC limita-se a organizar os mecanismos de declaração do direito em situações carecidas de tutela
judicial. Trata-se, portanto, de um direito instrumental, que se destina à realização do direito material,
não estabelecendo os critérios de resolução dos litígios, mas apenas dizendo o caminho a seguir nos
tribunais para obter a solução dos litígios.

4.2. DIREITO PROCESSUAL CIVIL COMO DIREITO PÚBLICO


Como se trata de disciplinar a atuação de órgãos do Estado no exercício de uma função de soberania,
um dos intervenientes na relação processual aparece numa posição de soberania, havendo assim um
desequilíbrio entre os intervenientes – trata-se, então, de Direito público.

 Presença de normas processuais derrogáveis:O facto de o DPC ser direito público não significa que
as normas processuais sejam inderrogáveis. Pelo contrário, o interesse público será melhor
realizado se forem as partes a decidir qual o sistema a aplicar e, portanto, existe um predomínio das
partes.

 Existem setores na disciplina jurídica dos pressupostos processuais que podem sofrer a
interferência de acordos das partes destinados a alterar o respetivo regime legal.
Ex: permite-se que as partes criem, mediante «negócio», situações de legitimidade plural, onde seria
observada a regra da legitimidade singular na ausência de tal acordo.
Ex: dá-se espaço às partes para, dentro de certos limites e atendendo aos seus interesses, alterarem as
regras que fixam a competência interna, mediante pactos de competência ou de aforamento (art.95º),
ou a competência internacional celebrando pactos de jurisdição (art.94º).

Assim, apesar de se estar no campo do Direito público, podem existir estas modificações em questões
fundamentais.
Veja-se o art.280º, que mostra que, no próprio campo do Direito público, pode haver interferência da
autonomia privada, através de acordos que interferem com o funcionamento do processo.
A confissão, a desistência e a transação são atos de vontade unilaterais nos quais as partes
influenciam a decisão do tribunal, limitando-se o juiz a condenar ou a absolver nos precisos termos em
que essa vontade se manifestou (art.290º/3).

 Renúncia à invocação de meios de defesa.


 Contratos probatórios.
 Renúncia prévia à utilização de meios de impugnação de decisões desfavoráveis.
 Acordo sobre a eliminação do 2º grau de jurisdição, no caso de recurso «per saltum» (art.678º).
 Negócios de auto-disposição do objeto do processo.

5. IMPORTÂNCIA PRÁTICA DO PROCESSO CIVIL


A dimensão da instrumentalidade do direito processual civil acaba por condicionar a correta aplicação
do direito substantivo.
 Referência a alguns instrumentos técnicos de que o legislador se serve para assegurar o
funcionamento do processo (ónus, prazos, preclusões, nulidades processuais, limites objetivos,
subjetivos e temporais das decisões) e que podem interferir com o sentido final do julgamento
dado o automatismo dos efeitos que alguns deles produzem.
O processo civil está ao serviço da realização do direito substantivo e, por isso, a má qualidade
legislativa do DPC e o mau funcionamento dos tribunais comprometem as melhores soluções do Direito
material. Portanto, há que ter em conta que o bom funcionamento do processo civil é indispensável à
qualidade da concretização do Direito material nas situações em que é aplicado.
O processo civil tem também, pelo seu próprio mau funcionamento, necessidade de recorrer a
determinados mecanismos que podem, em alguma medida, comprometer o resultado da decisão. Como
as partes conhecem de antemão estas regras de funcionamento do processo, procurarão gerir a sua
intervenção no processo tendo em conta o funcionamento destes mecanismos internos que o processo
apresenta.

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P. ex. o processo necessita de prazos, os prazos são instrumentos indispensáveis para assegurar uma
ordem no andamento do processo e tornar previsível os momentos em que o atos processuais irão ser
praticados. Mas o processo tem ónus i.e. para que o processo possa ser impulsionado, criam-se
situações desfavoráveis para a parte que não preencha determinados comportamentos de que o
processo necessita para poder andar. O processo necessita do impulso das partes, e para que estas se
sintam estimuladas a impulsionar o processo, criam-se determinados momentos em que se produzem
situações desfavoráveis para a parte que não toma a iniciativa de provocar o andamento do processo. P.
ex. no caso de o réu contestar i.e. tomar a iniciativa de responder às alegações do autor, a lei
(art.567º/1) sanciona o réu, como considerando confessados os factos assinalados pelo autor. Estas
consequências são gravosas e podem deformar o resultado do processo. Daí a importância prática de
conhecer os mecanismos de que o legislador se serve.

6. FINS DO PROCESSO DECLARATÓRIO


1) Tutela dos direitos subjetivos como fim primário da intervenção dos tribunais: esta tutela tanto
pode ser repressiva (já existiu a violação do direito), como pode ser uma intervenção cautelar
(prevê a violação do direito).
2) Garantia da coercibilidade do ordenamento jurídico: o objetivo é evitar que haja lesões de direitos
e transmitir confiança aos cidadãos quanto ao funcionamento do ordenamento jurídico.
3) Restauração da paz social através da legitimação da decisão judicial dada pelo procedimento
seguido na aplicação do direito: A resposta que os tribunais dão aos casos concretos que julgam,
dada a visibilidade que os rodeia, projeta para a comunidade (pelo menos, para aquela que está
mais próxima dos factos que os julgadores apreciaram) o conhecimento dos valores últimos das
normas de direito material aplicadas. O conhecimento dos resultados finais dos litígios e,
sobretudo, da fundamentação que acompanha as decisões judiciais acaba por funcionar como fator
de divulgação de mensagens comportamentais explicitadas a partir das normas que os tribunais
convocam quando decidem.

7. INTERESSE TEÓRICO DA COMPREENSÃO DO DIREITO PROCESSUAL COMO DESENVOLVIMENTO DE


UMA RELAÇÃO JURÍDICA ESPECÍFICA
 Influência de OscarBülow na teorização do processo civil como relação jurídica
OscarBülow introduziu a conceção do processo como uma relação jurídica processual, aplicando o
quadro formal de relação jurídica ao tratamento do processo civil. Importa, então, utilizar a noção de
«relação jurídica processual», noção essa que o legislador designa por «instância». Com efeito, a palavra
«instância», no processo civil, pode ter dois significados:
a) Por um lado, o significado de relação jurídica processual;
b) Por outro, um significado relativo à disposição hierárquica dos tribunais.

 Dinamismo e complexidade específicos da relação jurídica processual.


Há quem entenda que esta é uma forma de limitar a realidade complexa do processo civil. Segundo
este entendimento, o processo seria melhor explicado se o víssemos como um conjunto de situações
jurídicas que se vão encadeando ao longo da massa do processo.
Todavia, a relação processual tem a vantagem de permitir dar uma visão dinâmica do próprio
processo. Efetivamente, a figura da relação jurídica é maleável, pois admite um nascimento, uma
modificação e uma extinção, não se mantendo a mesma ao longo do tempo.
 Art.295º CPC: a própria lei refere-se ao momento do nascimento da relação processual, sendo que
ela se deve manter estável (o que não significa imutável, porque o processo tem um dinamismo
próprio), recebendo as alterações que a realidade lhe transmite.
 Arts.260º e 261º CPC: referem-se à estabilidade da relação processual.
 Art.277º CPC: a instância (relação processual) tem como destino final extinguir-se quando já não é
necessária a utilização deste mecanismo de compreensão da realidade do processo.
Vê-se, então, que o legislador utiliza o mecanismo da relação processual para mostrar que pode haver
mudanças.
Esta tentativa de explicação do processo como uma relação jurídica, que é aceite pela maioria dos
autores, mostra-se, assim, útil.

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 Caráter trilateral dessa relação jurídica: relação de ação, relação de contradição (ou de defesa) e
relação material controvertida.
A relação jurídica processual (a que a nossa lei chama instância) caracteriza-se por ser trilateral:
1) Temos o autor, que se dirige ao tribunal;
2) Temos o tribunal;
3) Temos o réu, que é contactado pelo tribunal para que se defenda.

→ Relação de ação: relação entre o autor e o tribunal.


→ Relação de contradição: relação entre o tribunal e o réu.
→ Relação material controvertida: relação entre as partes.

Este aspeto permite-nos compreender os vários planos das questões sobre as quais o tribunal é
chamado a pronunciar-se. O tribunal tem dois tipos de questões para apreciar:
a) Aquelas que dizem respeito à relação processual propriamente dita ou instância;
b) Aquelas que dizem respeito à relação ao nível da qual se verifica a necessidade de intervenção do
Estado.
Pode haver falhas ao nível de qualquer uma destas relações. O tribunal tem o dever de procurar
remediar essas falhas ou dar oportunidade às partes para que pratiquem os atos necessários para
remediar estas falhas que se verificam ao nível da instância.
O processo existe para resolver o litígio real ao nível da relação material controvertida, e isso não se
pode fazer se há falhas ao nível da relação processual. Por conseguinte, é de interesse público que o
tribunal tenha a iniciativa de tomar medidas no processo no sentido de suprir as falhas.
→ Absolvição da instância: Se as falhas não forem ou não puderem ser ultrapassadas, o tribunal vai
ter que tomar uma decisão, no sentido de libertar as partes da relação processual, deixando de
apreciar a relação material controvertida. Trata-se de uma decisão formal, porque deixa a real
questão entre as partes por resolver.
Esta decisão de absolvição da instância pode ser recorrível mas, se não for, consolida-se. Não sendo
possível mais recursos, produz-se um caso julgado formal, porque o tribunal apenas se pronunciou
sobre questões formais que não impedem que a questão de mérito seja apreciada.

Não se deve confundir a absolução da instância com a absolvição do pedido.


→ Absolvição do pedido: pressupõe que a instância está regular, que o tribunal está em condições de
apreciar a relação material controvertida.
Ao nível da relação material controvertida, que pressupõe que não haja nenhuma irregularidade na
instância, o tribunal vai averiguar quem tem razão, podendo-se chegar à conclusão de que o autor não
tem fundamento material, o que significa que a ação improcede (i.e. o autor não tem razão, não pode
ganhar a causa) e, então, o réu é absolvido e temos uma absolvição do pedido. O autor pode recorrer
mas, se não o fizer ou não tiver êxito, a absolvição do pedido consolida-se e torna-se um caso julgado
material.
Se o autor tiver razão, já o réu será condenado ou será reconhecido o efeito jurídico que o autor
pretende ver exercido. Se o autor obtém ganho de causa, ele obtém a condenação do réu, em todo ou
em parte, ou então o reconhecimento do efeito jurídico que pretendia, o que, consolidando-se, resolve
aquela questão concreta.

 Pluralidade das partes, que tanto pode ser originária, como resultar da intervenção de terceiros
na pendência do processo (art.320ºss).

8. INTERPRETAÇÃO EM DIREITO PROCESSUAL CIVIL


8.1. INTERPRETAÇÃO E INTEGRAÇÃO DAS LEIS PROCESSUAIS. INTERFERÊNCIA DA INSTRUMENTALIDADE DO PROCESSO
SOBRE O MÉTODO DE INTERPRETAÇÃO
Costuma dizer-se que a interpretação da lei processual não levanta problemas específicos
relativamente à interpretação da lei em geral e, por isso, aplica-se o art.9º CC.
Um dos critérios convocados para a interpretação da lei em geral é o que impõe a consideração, como
elemento hermenêutico, da finalidade prosseguida através da norma interpretada.A interpretação em
direito processual civil consiste num problema de interpretação de normas jurídicas instrumentais e, por
isso, será de dar um peso mais intenso justamente ao elemento teleológico. Com efeito, estas normas
não estabelecem fins em si mesmos: trata-se de normas que permitem a aplicação do direito às

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situações concretas. O pensamento legislativo encontra-se marcado pela prossecução de determinados


objetivos, de modo que as palavras utilizadas nos textos legais devem ser entendidas como meios
adequados para se efetuar a comunicação do sentido que presidiu à sua elaboração. Este elemento
teleológico visa conseguir que a aplicação da lei seja conduzida de modo a que, entre os vários sentidos
possíveis da norma a aplicar, prevaleça aquele que melhor permite concretizar os objetivos que
estiveram presentes no momento da sua elaboração.
O direito processual civil apresenta-se no ordenamento jurídico em ligação instrumental com o direito
substantivo, uma vez que estabelece os modos de realização das normas de direito material no
momento da sua aplicação aos casos concretos submetidos a decisão judicial. Nesta perspetiva, o
intérprete deve ter a preocupação de afastar aqueles sentidos possíveis das leis de processo que
acabam por distorcer ou impedir, por via de um formalismo tomado como fim em si mesmo, a
concretização dos regimes de direito substantivo aplicáveis aos casos «subiudice». A entenderem-se as
coisas de outro modo, subvertia-se a assinalada relação de instrumentalidade e o momento da aplicação
judicial do direito impedia o julgador da obediência aos critérios da lei material que lhe cumpre respeitar
por imperativo constitucional.

8.2. INTERPRETAÇÃO DOS ATOS PROCESSUAIS DAS PARTES


Os atos processuais através dos quais as partes comunicam entre si e com o tribunal enquadram-se
nas declarações receptícias. Tomando como ponto de partida a petição inicial, o autor dá neste
articulado a sua perspetiva acerca da situação de facto que origina o litígio com o réu e, depois de fazer
a qualificação jurídica que entende caber-lhe, manifesta a vontade de que o tribunal aprecie o conflito e
conclua mediante a tomada de uma decisão que lhe seja favorável. No seu conjunto, os articulados,
para além dos aspetos formais que os envolvem, correspondem a declarações da vontade de se
produzirem determinados efeitos jurídicos no desenvolvimento da ação.
Embora o processo não deva ser tratado como um negócio jurídico, fazem parte do seu conteúdo
declarações das partes dirigidas à produção de efeitos jurídicos que suscitam problemas de
interpretação análogos aos que se levantam no domínio das declarações negociais. Daí que seja pacífico
o entendimento quanto à utilização das soluções hermenêuticas adotadas a propósito da determinação
do sentido das declarações negociais, quando está em causa fixar o alcance do conteúdo significativo
das comunicações trocadas entre as partes e o tribunal. Aplicam-se, por isso, os critérios decorrentes da
teoria da impressão do declaratário acolhidos no art.236ºss CC.

8.3. INTERPRETAÇÃO DAS SENTENÇAS


Face ao pedido de tutela judicial que lhe foi dirigido e à defesa deduzida contra esse pedido, no final,
o tribunal responde com uma sentença. A sentença necessita, também ela, de ser interpretada. Um
elemento fundamental para a determinação do sentido da decisão do tribunal são os fundamentos da
decisão. Esses fundamentos são imprescindíveis para se fixar o sentido da parte decisória, da sentença.

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