Cognição, Atenção e Funções Executivas
Cognição, Atenção e Funções Executivas
Cognição, Atenção e Funções Executivas
COGNIÇÃO, ATENÇÃO E
FUNÇÕES EXECUTIVAS
TEMA 1 – CONCEITOS
2
focalizar alguns estímulos, de inibir outros e de modificar o foco quando
necessário (Malloy-Diniz et al., 2008).
4
O tônico diz respeito a um mecanismo mais fisiológico, relacionado à
capacidade do organismo em responder a um estímulo. Refere-se a um
mecanismo de controle interno, o qual regula a resposta aos estímulos
ambientais, incluindo o ciclo de sono e vigília, o nível de vigilância e o potencial
para focalizar. Relaciona-se com a intensidade com que um indivíduo pode
manter-se alerta, acordado e preparado para emitir uma resposta a algum
estímulo. Já a ativação fásica refere-se à capacidade do meio em produzir
alterações nos níveis de atenção.
Pensando nesses aspectos de ordem mais fisiológica ou não, outros dois
tipos de atenção devem ser considerados: a atenção voluntária e a atenção
reflexa.
5
Já o processo de orientação endógeno ocorre quando há um esforço consciente
e intencional para a busca de estímulos, sendo então um processo de atenção
voluntária e, portanto um mecanismo “de cima para baixo”.
6
sistemas sensoriais, como quando privilegiamos um estímulo auditivo ou visual
(Cosenza; Guerra, 2011; Coutinho; Mattos; Abreu, 2018). Por isso é nomeado
como “orientador”, pois é o circuito que permite a mudança do foco atencional.
7
que realmente existe e que pode trazer sofrimento importante para o portador e
para as pessoas próximas. É importante falar isso, pois muitas pessoas acreditam
que é um transtorno inventado pela indústria farmacêutica, que hoje em dia todo
mundo está sendo diagnosticado com TDAH, etc.
Certamente vemos muitas pessoas diagnosticadas erroneamente e
fazendo uso de medicações sem a necessidade, porém, ao se deparar com
pessoas TDAH e que recebem o tratamento adequado, seja farmacológico ou
não, percebemos os benefícios da intervenção. Dessa forma, é preciso entender
que o TDAH é um transtorno neurobiológico, que apresenta alteração de
neurotransmissores e que precisa ser tratado.
O TDAH é um transtorno do neurodesenvolvimento, ou seja, que tem início
no período do desenvolvimento, que em geral surge antes de a criança ingressar
na escola e é caracterizado por déficits que acarretam “prejuízo no funcionamento
pessoal, social, acadêmico ou profissional” (APA, 2013).
Caracteriza-se pela presença de sintomas de desatenção, hiperatividade e
impulsividade. Mas vale ressaltar que esses sintomas não precisam aparecer
juntos. Existem três formas de classificação do transtorno:
Sintomas de desatenção
a. Frequentemente não presta atenção em detalhes ou comete erros por
descuido em tarefas escolares ou durante outras atividades;
b. Frequentemente tem dificuldade em manter a atenção em tarefas ou
atividades lúdicas;
c. Frequentemente parece não escutar quando alguém lhe dirige a
palavra diretamente;
d. Frequentemente não segue instruções até o fim e não consegue
terminar trabalhos escolares ou tarefas;
e. Frequentemente tem dificuldades para organizar tarefas e atividades;
f. Frequentemente evita, não gosta ou reluta em se envolver em tarefas
que exijam esforço mental prolongado;
g. Frequentemente perde coisas necessárias para tarefas ou atividades;
h. Com frequência é facilmente distraído por estímulos externos;
i. Com frequência é esquecido em relação a atividades. (Mattos et al,
2006)
Sintomas de hiperatividade/impulsividade:
9
automobilísticos, maiores taxas de comportamento sexual de risco e maior
probabilidade de uso de substâncias”.
Os adultos TDAH costumam apresentar menos sinais de hiperatividade,
quando comparados com as crianças, entretanto podem apresentar queixas
relacionadas à dificuldade para relaxar, para se organizar, para alcançar metas e
para estabelecer prioridades (Costa et al., 2014).
A etiologia (causa) do TDAH é complexa, mas sabe-se que há uma relação
com fatores genéticos e ambientais. Pesquisas na área das neurociências
evidenciam alterações no sistema nervoso central, o que fortalece a ideia de
transtorno neurobiológico.
Em relação às dificuldades atencionais decorrentes de condições
secundárias, podemos pensar em alterações de nível de atenção em função de
quadros psiquiátricos, por exemplo, a depressão e a ansiedade. Há fortes
evidências de que o humor deprimido, assim como altos níveis de ansiedade
interferem na nossa capacidade atencional, na presença ou não de um transtorno.
Basta pensarmos em diferentes situações em que nos sentimos muito tristes, sem
motivação ou extremamente ansiosos e preocupados. Ler um livro ou estudar
quando estamos em uma situação de luto ou frente a uma ocasião de extremo
estresse é praticamente impossível, visto que o foco atencional e a concentração
ficam muito prejudicados.
Outras dificuldades atencionais secundárias seriam alterações decorrentes
de lesões cerebrais, por exemplo, uma batida na cabeça que ocasionou um
trauma cranioencefálico, assim como eventuais dificuldades associadas a
quadros de alteração hormonal, por exemplo, problemas na tireoide. A dificuldade
de concentração está normalmente presente em pessoas com hipotireoidismo.
Por fim, os processos atencionais são importantíssimos para todos os
aspectos do funcionamento cognitivo, sendo fundamentais para o sucesso do
processo de aprendizagem e para a adequada adaptação do indivíduo em
diferentes contextos.
Assim, entende-se que a compreensão mais aprofundada desse fenômeno
torna-se relevante para qualquer profissional, não importa a área de atuação, visto
que a identificação precoce de uma dificuldade pode contribuir para um melhor
prognóstico e embasar medidas de intervenção mais eficazes.
Em tempos em que “prestar a atenção” está cada vez mais difícil, entender
um pouco mais sobre esse fenômeno pode ser um diferencial.
10
REFERÊNCIAS
11
XAVIER, G. F. Processos atencionais. In: SANTOS, F.; ANDRADE, V.; BUENO,
O. Neuropsicologia Hoje. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2015.
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AULA 2
COGNIÇÃO, ATENÇÃO E
FUNÇÕES EXECUTIVAS
TEMA 1 – CONCEITOS
2
potencial adaptativo. Assim, as funções executivas são essenciais para a
adaptação dos indivíduos em um ambiente civilizado (Malloy-Diniz et al., 2018).
Diversos autores consideram que as funções executivas englobam
inúmeros componentes, tais como, a atenção seletiva, o controle inibitório, a
memória operacional, a flexibilidade cognitiva e o planejamento, operações
necessárias para gerenciar o comportamento humano. Uma ação orientada a um
objetivo específico exige um plano de ação, o qual deve permitir alterações em
seu curso sendo, portanto flexível e adaptativo (Gazzaniga; Ivry; Mangun, 2006).
Considerando que não há um consenso na literatura acerca dos modelos
teóricos e de quais componentes ou subcomponentes formam as funções
executivas, os próximos temas desta aula abordarão essas questões de ordem
mais teórica.
3
armazenadas. Já em situações novas, é preciso que ele seja capaz de criar
respostas e planos de ação adequados, sendo estes os processos
controlados, modulados pelo Sistema Atencional Supervisor (SAS). Esse
mecanismo, o SAS, proposto por Norman e Shallice, é responsável pelo
controle das respostas aos estímulos e pela seleção de comportamentos;
Modelo de Miyake, Friedman, Emerson, Witzki e Howerter (2000) – Modelo
Fatorial: esses autores realizaram um estudo a fim de tentar responder à
relevante questão de até que ponto algumas funções podem ser
consideradas unitárias quando na verdade elas podem ser reflexo de
mecanismos ou habilidades subjacentes. Nesse estudo, Miyake et al.
(2000) “extraíram” estatisticamente o que é comum entre as tarefas
selecionadas para analisar como diferentes funções se relacionam. Para
tal, escolheram três funções consideradas importantes na literatura:
flexibilidade, atualização e inibição. Os resultados evidenciaram que as três
funções são claramente distinguíveis, mas não completamente
independentes, pois apresentam componentes subjacentes comuns.
Modelo de Lezak, Howieson e Loring (2004): composto por quatro
componentes: (1) volição, habilidade para estabelecer metas envolvendo a
motivação e a autoconsciência; (2) planejamento, elaboração de um roteiro
de ações para alcançar metas; (3) ação intencional, transição da intenção
e do plano para o comportamento; (4) desempenho efetivo,
automonitoramento da ação intencional, capacidade de avaliar se uma
ação é efetiva e, caso não seja representa a flexibilidade de modificá-la.
Modelo de Sohlberg e Mateer (2010): formado pelos seguintes
componentes: iniciativa e direção (comportamento de iniciativa), resposta
inibitória (comportamento de parada), persistência na tarefa (manutenção
do comportamento), organização de ações e pensamentos, pensamento
criativo (criatividade, fluência e flexibilidade cognitiva) e conscientização
(monitoramento e modificação do próprio comportamento). De acordo com
essas autoras, esses seis componentes estão relacionados com diversos
distúrbios cognitivos e comportamentais que podem ocorrer como parte de
uma síndrome disexecutiva.
Modelo de Adele Diamond: esSe modelo entende que existem três
habilidades principais, que são a inibição, a memória de trabalho e a
flexibilidade e que outras habilidades, como planejamento, tomada de
4
decisão e monitoramento, são resultantes da integração dessas três
funções nucleares (Seabra et al, 2014).
Modelo de Cicerone: divide as funções executivas em quatro domínios: (1)
funções executivas cognitivas: habilidades envolvidas no controle e
direcionamento do comportamento; (2) funções autorreguladoras do
comportamento: regulação comportamental em situações em que a análise
cognitiva não é suficiente para uma resposta adaptativa; (3) funções de
regulação da atividade: responsável por prover iniciativa e continuidade a
ações direcionadas a metas; (4) processos metacognitivos: relacionado à
autoconsciência, ao ajustamento e ao comportamento social adequado
(Seabra et al, 2014).
Modelo de funções executivas quentes e frias: esse modelo divide as
funções executivas em componentes quentes e frios, trazendo a ideia de
que essas habilidades também estão relacionadas à regulação das
emoções e do ambiente social. As funções executivas frias relacionam-se
ao aspecto cognitivo, sendo observadas em situações com demandas
mínimas de processos emocionais e motivacionais. Já as funções
executivas quentes referem-se ao controle exercido em condições com
significativa carga emocional e motivacional, como por exemplo em
momentos em que é necessário regular um comportamento e tomar uma
decisão.
5
3.1 Controle inibitório ou inibição
6
tempo, enquanto essa informação está sendo usada para resolver uma situação
problema ou realização de uma tarefa (Seabra et al., 2014).
Apesar de se chamar memória, a memória de trabalho é considerada um
tipo de função executiva, e não apenas um subtipo de memória, pois é entendida
como uma função muito mais complexa do que apenas o armazenamento de uma
informação. Além de armazenar um conteúdo por um período limitado de tempo,
a memória de trabalho exige a manipulação, a organização e o sequenciamento
de ideias/informações.
No dia a dia, observamos a dificuldade de memória de trabalho quando nos
deparamos com pessoas que não conseguem seguir instruções complexas.
Nesse caso, a pessoa pode até guardar comandos e passos para atingir um
objetivo, mas falham ao sequenciar e organizar as informações. O tema 5 desta
aula trará exemplos de dificuldades nos diferentes componentes de função
executiva.
Por fim, pesquisas têm revelado a importância da memória de trabalho nos
processos de aprendizagem. Há fortes evidências de que a leitura, a escrita e o
raciocínio aritmético demandam memória de trabalho.
3.4 Planejamento
7
para explicar como as pessoas tomam as decisões. A maioria desses modelos
trazia definições valorizando apenas a racionalidade, entendendo que tomar uma
decisão dependia apenas de uma análise racional de custo e benefício. Porém,
estudos posteriores ressaltaram o papel da emoção no processo de tomada de
decisão (Cardoso; Cotrena, 2013).
3.6 Automonitoramento
8
processos e operações das funções executivas, como os mecanismos de
memória de trabalho, filtragem da informação, planejamento de ações e
flexibilidade cognitiva (Gil, 2002).
Diferentes regiões do córtex pré-frontal estão implicadas no funcionamento
executivo. Além disso, uma mesma região pode desempenhar diferentes funções
em momentos distintos, dada a capacidade de flexibilidade neuronal desta região
cerebral. Dados recentes apontam a existência de uma hierarquia cognitiva
formada por meio de uma rede neuronal que controla sistemas dinâmicos.
Considerando tal hierarquia, entende-se a utilidade de dividir o funcionamento
executivo em subcomponentes relacionados entre si, que operam em diferentes
situações (Tirapu-Ustarroz et al., 2008).
Três circuitos neurais são importantes para entender a localização de
componentes executivos, assim como suas alterações (Malloy-Diniz et al., 2018):
9
Quadro 1 – Principais componentes executivos e a sua localização no córtex pré-
frontal
10
alteração. São exemplos de lesões: o traumatismo cranioencefálico, o acidente
vascular cerebral (popularmente conhecido por derrame) e os tumores cerebrais.
Quando essas lesões aparecem na região frontal do cérebro, a grosso modo, na
sede das funções executivas, podemos observar mudanças importantes nos
aspectos comportamentais.
Outra possível causa de disfunção executiva é a presença de um transtorno
do neurodesenvolvimento ou algum transtorno mental. São exemplos de
transtornos do neurodesenvolvimento o transtorno do déficit de atenção e
hiperatividade, o transtorno do espectro autista e a deficiência intelectual. Os
demais transtornos mentais podem ser o transtorno depressivo, transtornos de
ansiedade, transtorno bipolar, esquizofrenia, etc. Sabe-se que pessoas com esses
quadros clínicos apresentam, em diferentes graus, um prejuízo de função
executiva.
Por último, devemos saber que muitas pessoas sem nenhuma condição
clínica, como as citadas acima, podem apresentar algum prejuízo de função
executiva devido a uma possível falta de estimulação.
E como esse prejuízo se manifesta no dia a dia? Como podemos identificá-
lo? Após uma lesão cerebral, a identificação fica um pouco mais clara, visto que
há uma causa conhecida que apareceu de forma muitas vezes abrupta, ou seja,
decorrente da lesão, há uma sequela. Em quadros psiquiátricos ou por
dificuldades decorrentes da falta de estimulação, essa percepção pode ser mais
difícil.
A seguir, alguns exemplos de comprometimento executivo:
Um rapaz de 25 anos teve um traumatismo cranioencefálico. Após a alta
hospitalar e alguns meses de recuperação em casa, retornou às suas atividades
ocupacionais. Trabalhava como auxiliar administrativo em uma empresa e suas
atividades diárias envolviam responder e-mails, atender telefone, fazer pequenos
serviços para a sua chefe e organizar documentos. Após poucos dias de seu
retorno, sua chefe o chamou para apontar alguns comportamentos que não
existiam antes do acidente. Segundo o relato da chefia, o funcionário finalizava o
seu dia de trabalho praticamente sem concluir nenhuma tarefa. Iniciava uma
atividade, mas logo se dispersava e fazia outra coisa. Ao observar mais de perto
a sua rotina, percebeu que havia uma dificuldade em estabelecer prioridades,
além do prejuízo em seguir passos para alcançar metas. De forma mais simples,
o funcionário até tinha a intenção de concluir algumas tarefas específicas naquele
11
dia, mas quando algo fora do esperado acontecia, ele se perdia e não conseguia
retornar ao foco. Esse exemplo é clássico para visualizar dificuldades de
planejamento. Esse caso está relacionado a uma lesão adquirida, mas podemos
encontrar muitas pessoas sem histórico de lesão e/ou alguma patologia com
prejuízo na habilidade de concluir tarefas e de alcançar metas definidas.
Outro exemplo de disfunção executiva pode ser uma mãe que reclama que
seu filho é muito distraído e que é preciso pedir uma coisa de cada vez, pois ele
nunca consegue concluir as solicitações feitas. Nesse caso, a dificuldade pode
não refletir um prejuízo de atenção por si só, mas sim de memória de trabalho,
quando é preciso guardar as informações (pedidos feitos pela mãe), manipulá-las,
organizá-las e gerenciá-las. Esta segunda etapa, mais complexa, exige a
capacidade de sequenciar as ações.
Um último exemplo refere-se à função de flexibilidade cognitiva. Podemos
pensar em uma situação em que uma pessoa, João, com diagnóstico de espectro
autista grau leve, apresenta rígidas rotinas. Certo dia, como de costume, dirigiu-
se ao ponto de ônibus, no mesmo horário de sempre. O ônibus costumava passar
as 7:20 da manhã. Naquele dia, especialmente, João estava mais apreensivo,
pois teria uma prova importante na faculdade. Às 7:25, outro ônibus passou e
avisou as pessoas que o transporte que João esperava havia quebrado algumas
quadras antes. Diante dessa situação, as pessoas do ponto de ônibus começaram
a se movimentar. Uns ligaram para parentes, outros chamaram um transporte
alternativo e alguns foram embora caminhando. Ao contrário, João permaneceu
imóvel no ponto de ônibus. Esperou por quase uma hora até que outro ônibus da
mesma linha substituísse o quebrado. Ao chegar à faculdade, dirigiu-se até a sala
de aula, onde encontrou o professor saindo da sala. Contou o ocorrido e, ao ser
questionado de por que não buscou uma forma alternativa para chegar antes à
universidade, João, sem compreender, apenas respondeu que ele se locomove
todos os dias da mesma forma, com o ônibus da linha x. Esse exemplo reflete
uma situação em que há uma dificuldade importante em mudar o foco de
processamento de uma ação ou pensamento à outra. É difícil para essas pessoas,
com dificuldade de flexibilizar, encontrar alternativas mais eficientes de acordo
com a demanda inesperada do ambiente. Essas pessoas costumam ter grandes
dificuldades em se adaptar frente a situações inusitadas, comuns ao cotidiano.
12
REFERÊNCIAS
MIYAKE, A. et al. The unity and diversity of executive functions and their
contributions to complex “Frontal Lobe” tasks: a latent variable analysis. Cognitive
Psychology, v. 41, n. 1, p. 49-100, 2000,
14
AULA 3
COGNIÇÃO, ATENÇÃO E
FUNÇÕES EXECUTIVAS
Nesta aula iremos falar de dois aspectos importantes na cognição, que são
essenciais para as nossas ações cotidianas e para o monitoramento de nosso
comportamento: a atenção e a autoconsciência. Esses dois aspectos cognitivos
são normalmente associados, entendendo que a autoconsciência é dependente
da atenção. Entretanto, ao longo deste encontro, entenderemos que nem sempre
esta associação é verdadeira.
Inicialmente, vamos abordar aspectos do desenvolvimento da atenção e
questões relacionadas à sua estimulação. Posteriormente, abordaremos um tema
muitas vezes polêmico nas neurociências, a consciência, para então aprofundar
o conceito de autoconsciência, sua importância e repercussão no comportamento
humano.
2
acordo com Luria (1979), a atenção reflexa funciona de forma rápida, visto que,
ao aparecer um novo estímulo, o foco de atenção muda em função do reflexo
orientado.
Com o passar do tempo, os bebês se tornam capazes de dirigir a atenção,
até conseguir atingir os níveis atencionais de um adulto. Esse processo depende
da maturação neurológica e está relacionado à atenção voluntária.
O quadro a seguir apresenta a descrição de Luria (1979) acerca do
desenvolvimento da atenção voluntária em crianças.
3
No envelhecimento, observamos uma perda da capacidade atencional,
principalmente relacionada à dificuldade de inibir estímulos distratores. Ou seja,
com o envelhecimento, fica cada vez mais difícil prestar atenção quando outras
coisas nos distraem (Cosenza; Guerra, 2011). Exemplo: ler um livro com a
televisão ligada, prestar atenção a uma conversa com uma música tocando ou
dirigir em horários de muito movimento.
Atualmente, nos deparamos cada vez mais com propostas de estimulação
da atenção, seja na infância ou na idade adulta e terceira idade.
4
A partir da compreensão da plasticidade cerebral, e de que o estímulo
recebido por um indivíduo contribui para o desenvolvimento e para a
reorganização do cérebro, a área da estimulação cognitiva tem ganhado muita
atenção nos últimos anos.
Em tempos de correria e excesso de informação, a busca por uma melhora
na capacidade atencional tem sido frequente, seja no ambiente acadêmico ou
ocupacional, seja em casos de transtornos diagnosticados ou de lesões cerebrais
adquiridas. Independentemente da situação, sabe-se que a estimulação cognitiva
pode ser benéfica, com vista a garantir uma melhor qualidade de vida.
A estimulação da atenção pode ser feita através da realização de atividades
com lápis e papel, através do uso de computadores, aplicativos e softwares,
criados para esse fim, ou a partir de tarefas verbais.
Antes de escolher os recursos ou atividades para estimulação, é importante
ter um objetivo claro. O sucesso de um programa de estimulação cognitiva está
intimamente relacionado ao seu planejamento. O quadro a seguir apresenta
alguns aspectos importantes de um planejamento de estimulação.
5
Atenção seletiva (capacidade de prestar a atenção em um estímulo e de
inibir estímulos distratores): procurar imagens específicas em uma revista;
encontrar produtos em promoção em um encarte de supermercado.
Atenção concentrada/sustentada (habilidade de permanecer
concentrado em um estímulo por um período prolongado de tempo):
apresentar letras separadamente e solicitar que a pessoa forme palavras.
De forma similar, pode-se apresentar palavras isoladas para a construção
de frases. As letras ou palavras podem ser apresentadas de forma visual,
como por exemplo escritas em papel ou cartolina, podem ser digitadas em
slides, ou faladas (neste caso, estimulando a atenção auditiva).
Atenção alternada (relacionada à capacidade de alternar o foco
atencional, ora em um estímulo, ora em outro): realizar cópias, como por
exemplo copiar um texto de um livro no computador; alternar a realização
de atividades monitorando o tempo, como por exemplo intercalar a
execução de tarefas a cada 5 minutos
Atenção dividida (habilidade de prestar atenção em mais de um estímulo
ao mesmo tempo): ler um texto com a televisão ligada. Nesta situação,
solicita-se que a pessoa responda perguntas sobre um texto para verificar
se ela conseguiu prestar atenção. Recomenda-se dar um tempo limite para
a leitura, para garantir que a pessoa não esteja desviando o foco atencional
para a atividade concorrente. Se a estimulação ocorrer em ambiente de
consultório, por exemplo, pode-se optar por passar um vídeo ou até mesmo
colocar uma música como estímulo distrator.
TEMA 3 – CONSCIÊNCIA
6
Desde a época de Hipócrates, diferentes teorias foram criadas com o intuito
de responder questões acerca da origem e do armazenamento das ideias, do
pensamento e das emoções, do modo como a percepção é processada e como
influencia o nosso comportamento (Gazzaniga; Heatherton, 2005).
Um grande estudioso sobre os aspectos da consciência é o neurocientista
português Antonio Damásio. Para ele, nenhum aspecto da mente humana é de
fácil investigação, mas o entendimento da consciência, a partir da compreensão
dos alicerces biológicos da mente, é um problema supremo (Damasio, 2015).
Existem diferentes modelos teóricos relacionados à consciência e à sua
ausência. Langer e Padrone (1992, citados por Sohlberg; Mateer, 2010)
propuseram um modelo tripartido e descreveram três origens para os problemas
de consciência:
7
O terceiro nível pode ser visto em diferentes situações relacionadas ao
contexto da saúde, como por exemplo quando uma pessoa recebe um diagnóstico
de uma doença terminal. É comum o paciente receber todas as informações com
muita clareza, e inclusive ter conhecimento de suas implicações. Mas, por um
mecanismo de defesa, nega a dura realidade, evitando entrar em contato com ela.
8
TEMA 5 – AUTOCONSCIÊNCIA
9
percepção, atenção e funções executivas (Ownsworth; Clare, citados por Adda,
2012).
A alteração de autoconsciência observada em pacientes neurológicos
culmina em um quadro clínico chamado anosognosia, que pode ser definido como
a dificuldade ou incapacidade de perceber e reconhecer em si os prejuízos
cognitivos e comportamentais relacionados ao desenvolvimento de uma doença
ou após uma lesão cerebral, como acidente vascular ou traumatismo
cranioencefálico.
Considerando a importância de identificar a presença de déficits de
autoconsciência, diferentes autores publicaram instrumentos precisos para avaliar
tal dificuldade. Um recurso técnico adaptado para a população brasileira e
disponível para o uso clínico é a escala PCRS – Patient Competency Rating Scale
(Zimmermann; Pereira; Fonseca, 2014).
A PCRS é uma escala de autorrelato que foi desenvolvida por Prigatano e
colaboradores em 1986, para avaliar a autoconsciência de déficits em quatro
domínios: emoção, cognição, comportamento e atividades da vida diária. É um
instrumento que visa comparar as classificações das habilidades de pacientes
com a percepção dos familiares ou cuidadores. Ao responder a escala, o paciente
e/ou cuidador faz julgamentos acerca do desempenho do paciente em 30 tarefas
propostas. A classificação do nível de dificuldade do paciente na realização das
tarefas é avaliada através de uma escala Likert de cinco pontos (Kolakowsky-
Hayner; Wright; Bellon, 2012). O escore varia de 1 ponto (não consegue fazer) a
5 pontos (faz com facilidade ou não se aplica); o escore total pode variar de 30 a
150 pontos. Quanto maior for a pontuação, maior a competência do paciente nas
habilidades citadas.
A versão adaptada para o Brasil e disponível para o público clínico é uma
versão resumida, composta por 17 itens, que avaliam prejuízos executivos,
mnemônicos e atencionais (Zimmermann; Pereira; Fonseca, 2014).
O prejuízo de autoconsciência pode trazer impactos negativos em
diferentes esferas da vida de um indivíduo. A dificuldade de perceber e monitorar
o seu comportamento pode interferir em relações familiares, afetivas, sociais,
acadêmicas e ocupacionais. Além disso, em contexto clínico, quando um paciente
não percebe suas dificuldades, o reconhecimento e a aceitação de intervenções
ficam prejudicadas, contribuindo para baixa adesão e reduzido engajamento em
tratamentos (Adda, 2012).
10
REFERÊNCIAS
11
AULA 4
COGNIÇÃO, ATENÇÃO E
FUNÇÕES EXECUTIVAS
2
criança. Já a maturação é considerada um fenômeno qualitativo, relacionada com
o amadurecimento funcional de órgãos ou sistemas, por exemplo, a aquisição da
linguagem (Papalia; Olds, 2000; Ré, 2011).
Papalia e Olds (2000) dividem o desenvolvimento em três aspectos:
3
“O processo de crescimento, maturação e desenvolvimento humano
interfere diretamente nas relações afetivas, sociais e motoras dos indivíduos” (Ré,
2011, p. 56). Considerando a importância das funções executivas na adaptação
do indivíduo ao cotidiano, é preciso entender como tais funções se desenvolvem.
4
De acordo com a faixa etária, alguns autores também indicam o pico de
desenvolvimento de determinados componentes executivos. Dias e Seabra (2013)
citam os seguintes marcos de desenvolvimento para os subcomponentes:
5
manipular uma informação enquanto se trabalha com ela (Malloy-Diniz et al.,
2008). Outro exemplo é quando precisamos guardar informações por um curto
espaço de tempo para usá-las. É o que acontece quando recebemos um comando
e precisamos segui-lo mentalmente para executar uma ação.
2.4 Autorregulação
6
Assim, com base no exposto acerca do desenvolvimento dos principais
subcomponentes de função executiva, Dias e Seabra (2013, p. 208) afirmam que:
7
Para Dias e Seabra (2013), quanto mais desorganizado o ambiente em que
uma criança cresce, com pais que apresentam dificuldades de planejamento,
maior a probabilidade de a criança apresentar prejuízos de função executiva.
Assim, apesar de sabermos que estas funções são limitadas na infância e
que só estarão maduras por completo quase que na idade adulta, cabe aos
adultos proporcionar ambientes e situações que promovam o seu
desenvolvimento. A aquisição destas habilidades acontecerá de forma mais
efetiva com a estimulação. Proporcionar às crianças pequenas responsabilidades
e autonomia no dia a dia, de acordo com a faixa etária, já é uma forma de
estimulação (NCPI, 2016). Auxiliar no estabelecimento de estratégias e de
resolução de problemas trará resultados mais benéficos do que atitudes de
superproteção, quando, por exemplo, os pais resolvem tudo pelos filhos, tirando
deles a autonomia e a independência.
Por fim, atualmente, inúmeros programas para estimulação das funções
executivas têm sido criados e aplicados em escolas e em ambiente clínico. As
pesquisas têm enfatizado estratégias de promoção destas funções, em vez de
esperar a necessidade de intervenção e tratamento quando as funções são
consideradas deficitárias. Além da possibilidade de utilização de programas
específicos criados para este fim, a literatura também apresenta evidências da
relação entre a prática de esportes, música e artes e o melhor desenvolvimento
executivo (NCPI, 2016).
8
De acordo com Aquino e Borges-Paraná (2019, p. 4):
9
Com base nesta ideia, observa-se que as bases sólidas do adequado
desenvolvimento executivo na infância terão um reflexo positivo ao longo da vida
adulta, seja no aspecto afetivo, social ou ocupacional.
A literatura apresenta alguns estudos que relatam a relação entre o nível
de desenvolvimento executivo na infância e diferentes indicadores de qualidade
de vida na idade adulta.
10
REFERÊNCIAS
MIYAKE, A. et al. The unity and diversity of executive functions and their
contributions to complex "Frontal Lobe" tasks: a latent variable analysis. Cogn
Psychol. 2000, 41(1), 49-100.
11
ROTTA, N. T; OHLWEILER, L.; RIESGO, R. dos S. Transtornos da
aprendizagem: abordagem neurobiológica e multidisciplinar. Porto Alegre:
Artmed, 2006.
12
AULA 5
COGNIÇÃO, ATENÇÃO E
FUNÇÕES EXECUTIVAS
TEMA 1 – COGNIÇÃO
2
Kandel e colaboradores (2014, p. 357) ainda afirmam que
TEMA 2 – EMOÇÃO
3
O quadro a seguir ilustra as principais funções das estruturas que formam
o sistema límbico.
Estrutura Função
Tálamo Quase todos os impulsos sensoriais passam pelo tálamo
antes de chegar ao córtex.
Redistribui impulsos sensoriais a áreas específicas do córtex.
Hipotálamo Responsável pela homeostase (manutenção do meio
interno).
Papel regulador dos processos motivacionais: fome, sede e
comportamento sexual.
Amígdala Envolvida na produção de resposta ao medo e outras
emoções.
Fundamental para a autopreservação da espécie.
Centro identificador do perigo, gerando medo e
ansiedade/situação de alerta.
Hipocampo Principal estrutura relacionada à memória.
Lesões no hipocampo impedem a pessoa de construir novas
memórias.
Giro do cíngulo Aglomerado de substância branca.
Comunicação entre sistema límbico e córtex.
Fonte: Gazzaniga et al., 2006.
4
De acordo com Damasio (1996) e Bechara (2004), citados por Cardoso e
Cotrena (2013, p. 25):
5
mantém-se engajado e com energia para investir mesmo quando as
coisas não acontecem conforme o programado?
Dimensão da intuição social: esta terceira dimensão está relacionada
à capacidade de inferir o comportamento, à habilidade de ler a
linguagem corporal e se beneficiar de dicas provenientes do ambiente.
Perceber o outro através de estados emocionais e linguagem corporal
embasam esta dimensão.
Dimensão da autoconsciência/autopercepção: ter consciência acerca
de nossos pensamentos e sentimentos é fundamental para
entendermos e modificarmos a nossa forma de agir. Esta dimensão
refere-se a esta capacidade de nos sintonizarmos com as mensagens
que nosso corpo nos envia.
Dimensão da sensibilidade ao contexto: esta dimensão está
relacionada à compreensão e entendimento de regras sociais. A
interação social demanda que regras convencionais sejam seguidas,
moldando assim o nosso comportamento. Ou seja, é preciso agir e se
comportar de forma diferente de acordo com o contexto e com as
regras sociais estabelecidas, para evitar comportamentos
inapropriados.
Dimensão da atenção: manter-se focado exige a habilidade de inibir
distrações. Nesta dimensão, o foco é a capacidade de não se distrair
com questões de ordem emocional. Por exemplo, o quanto somos
capazes de manter o foco em uma atividade quando uma preocupação
conjugal ou financeira invade a nossa mente com frequência.
(Davidson; BEGLEY, 2013).
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o sistema nervoso autônomo, responsável pela coordenação do
funcionamento de todos os órgãos internos, é regulado pelo sistema
límbico, que por sua vez é afetado pelas experiências afetivas e
emocionais do indivíduo em seu contexto social (Cruz; Pereira Junior,
2011, p. 46)
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Considerando a interferência das emoções em nossa saúde física e mental,
nas relações sociais e no ambiente de trabalho, a autoconsciência e o manejo das
emoções pode contribuir para o sucesso em diferentes esferas de nossa vida. A
habilidade de saber lidar com as emoções, monitorá-las e usá-las a nosso favor
está relacionada a uma capacidade que tem sido cada vez mais valorizada, a
inteligência emocional.
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organizam de acordo com a complexidade dos processos psicológicos”. Estes
processos envolvem:
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REFERÊNCIAS
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SILVA, J.; MULLER, M. Uma integração teórica entre psicossomática, stress e
doenças crônicas de pele. Estudos de Psicologia, 24(2), p. 247-256, abr.-
jun./2007.
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AULA 6
COGNIÇÃO, ATENÇÃO E
FUNÇÕES EXECUTIVAS
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Quadro 1 – Níveis de análise em neurociências
Nível de Descrição
análise
É considerado o nível mais elementar.
Entende que a matéria encefálica consiste em uma variedade
Molecular
de moléculas, com diferentes funções, e busca compreendê-
las.
Enfoca o estudo de como todas as moléculas interagem para
dar ao neurônio suas propriedades particulares.
Busca explicar:
Maior complexidade
Celular
- Quantos tipos de neurônios existem?
- Quais as suas funções?
- Como se comunicam?
Entende que constelações de neurônios formam circuitos
complexos.
Estes sistemas realizam determinada função, por exemplo:
De sistemas
- visão – sistema visual;
- movimento voluntário – sistema motor;
Estuda como funcionam estes circuitos neurais.
Como os sistemas neurais trabalham juntos para produzir
Comportamental
comportamentos integrados?
Compreensão dos mecanismos neurais responsáveis pelas
atividades mentais superiores: consciência, imaginação,
Cognitivo linguagem, pensamento, raciocínio etc.
Como a atividade cerebral cria a mente?
Ainda considerado o maior desafio.
Fonte: Bear; Connors; Paradiso, 2017.
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Quadro 2 – Concepção tripartida do cérebro
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Assim como ocorre em uma grande corporação ou em uma orquestra, o
cérebro é formado por componentes distintos que executam diferentes funções.
Como em grandes organizações, o cérebro tem o seu CEO, assim como uma
orquestra é comandada por seu maestro. Desta forma, este papel de liderança no
cérebro é representado pelos lobos frontais, mais especificamente, pelo córtex
pré-frontal (Goldberg, 2009).
A partir das evidências de que os lobos frontais são as estruturas cerebrais
que nos tornam humanos, visto que são responsáveis pela capacidade de
intencionalidade, tomada de decisão e autorregulação das emoções (Malloy-Diniz,
et al., 2018), o que sabemos sobre as consequências decorrentes destas
alterações?
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Em determinado dia, por volta das 4 horas tarde, Gage e a equipe de funcionários
comandada por ele executavam um trabalho em que deveriam explodir rochas para abrir
caminhos. No momento em que Gage colocava a pólvora e o rastilho num buraco, alguém atrás
dele o chamou, e, por um breve instante, Gage olhou para trás. Neste momento, se distraiu e
colocou a pólvora diretamente com uma barra de ferro. Isto provocou uma faísca na rocha e a
carga explosiva foi diretamente em seu rosto.
A explosão foi tão forte que a barra de ferro entrou pela face esquerda de Gage,
atravessou a parte anterior do cérebro e saiu com alta velocidade pelo topo da cabeça. Phineas
Gage foi jogado no chão, envolto em sangue e cérebro. Para a surpresa de todos, Gage
permaneceu vivo e consciente.
Inicialmente, manchetes nos jornais noticiaram a ocorrência de um acidente horrível, mas
uma semana mais tarde, o acidente foi considerado maravilhoso. Sobreviver à explosão com
aquela ferida, ter sido capaz de falar, caminhar e permanecer coerente imediatamente após o
acidente foi inacreditável. Phineas foi considerado curado dois meses após o acidente, porém
ninguém imaginava as reais sequelas relacionadas às mudanças de personalidade.
As mudanças tornaram-se evidentes assim que passou a fase crítica da lesão cerebral.
Mostrava-se agora caprichoso, irreverente, usando por vezes a mais obscena das linguagens, o
que não era anteriormente de seu costume, manifestando pouca deferência para com os colegas,
impaciente quanto a restrições ou conselhos que entravam em conflito com seus desejos, por
vezes determinadamente obstinado, outras caprichoso e vacilante, fazendo muitos planos para
ações futuras que facilmente eram concebidos como abandonados.
Agia como uma criança nas suas manifestações e capacidades intelectuais. Sua
linguagem obscena era de tal forma degradante que as senhoras eram aconselhadas a não
permanecer durante muito tempo em sua presença, para que ele não ferisse sua sensibilidade. As
mais severas repreensões vindas do próprio médico falharam na tentativa de fazer com que o
sobrevivente voltasse a ter um bom comportamento. Esses novos traços de personalidade
estavam em nítido contraste com os “hábitos moderados” e a “considerável energia de caráter”
que Phineas Gage possuía antes do acidente. Era considerado, por aqueles que o conheciam, um
homem de negócios astuto e inteligente, muito enérgico e persistente na execução de todos os
seus planos de ação. Não existe dúvida de que, no contexto do seu trabalho e da sua época, tinha
sido bem-sucedido.
Sofreu uma mudança tão radical que seus amigos e conhecidos dificilmente o
reconheciam. Observavam entristecidos que “Gage já não era Gage”. Era agora um homem tão
diferente que os patrões tiveram de dispensá-lo pouco tempo depois de ter regressado ao trabalho,
porque “consideravam a alteração de sua mente tão acentuada que não lhe podiam conceder seu
antigo lugar”. O problema não residia na falta de capacidade física ou competência, mas seu novo
caráter.
Não sendo capaz de desempenhar as funções de capataz, Gage aceitou trabalhos em
propriedades que se dedicavam à criação de cavalos. Acabou por trabalhar em qualquer local,
desistia fácil ou era dispensado por indisciplina.
Os escassos documentos disponíveis sugerem que Gage veio a padecer de ataques
epiléticos. O fim chegou em 21 de maio de 1861, após uma doença que se prolongou por pouco
mais de um dia. Gage teve uma grande convulsão que o fez perder a consciência. Seguiu-se uma
série de outras convulsões que ocorreram sem cessar. Nunca mais recobrou os sentidos. Tinha
38 anos de idade. Não houve qualquer referência à sua morte nos jornais locais.
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TEMA 5 – INTERESSE PELO LOBO FRONTAL NO MUNDO CORPORATIVO
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ideias, dar abertura ao novo e aceitar a opinião alheia não for incentivada e
respeitada, há grandes chances de fracasso.
Outro campo que vem ganhando destaque é o estudo do comportamento
humano aplicado ao marketing. Mais especificamente, podemos nos referir ao
neuromarketing, campo interessado em entender o comportamento do
consumidor a partir da compreensão do funcionamento cerebral nos processos de
tomada de decisão e controle de impulsos. Estes estudos têm ganhado um grande
aliado, que é a tecnologia. Ferramentas de neuroimagem como a ressonância
magnética funcional têm auxiliado nesta compreensão.
Não há dúvidas da importância desta parte tão nobre do cérebro humano,
da relevância de seu funcionamento, seja ele “normal” ou patológico, e da
vantagem de sua compreensão nas diferentes áreas de atuação profissional.
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REFERÊNCIAS
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