Poema Sujo
Poema Sujo
Poema Sujo
Ferreira Gullar
O AUTOR
Ferreira Gullar, pseudônimo de José Ribamar Ferreira, maranhense de São Luís, foi poeta,
crítico de arte, biógrafo, tradutor, memorialista e ensaísta brasileiro. Sua produção poética
representa um dos pontos altos da Poesia brasileira de todos os tempos.
Envolvido com seu tempo, participou direta ou indiretamente de todos as tendências a partir
dos anos 1950, do Concretismo à Poesia Marginal. Poeta maior, dialogou com todos os ritmos, do
formalismo rigoroso, da poesia de Cordel, ao verso livre, cultuando a poesia visual, sensorial, a
linguagem rebuscada e a oralidade. Todas essas experiências estão condensadas na obra Poema
Sujo.
pp. 10, 11
pp. 13, 14
POEMA SUJO
Há muitas noites na noite.
Quero que minha poesia seja uma coisa que as pessoas leiam e apreendam o que está sendo
dito. Não quero hermetismo, mas, ao mesmo tempo, não quero que a poesia seja uma coisa
superficial, que, em função dessa clareza, dessa possiblidade de comunicação, eu sacrifique a beleza,
tudo aquilo que é o cerne da poesia. Esse é o grande problema que se coloca para mim/o problema
da expressão.
turvo turvo
a turva
mão do sopro
contra o muro
escuro
menos menos
menos que escuro
menos que mole e duro menos que fosso e muro: [menos que furo
escuro
mais que escuro:
claro
como água? Como pluma? Claro mais que claro claro: coisa alguma
e tudo
(ou quase)
um bicho que o universo fabrica e vem sonhando [desde as entranhas
azul
era o gato
azul
era o galo
azul
o cavalo
azul
teu
cu
tua gengiva igual a tua bocetinha que parecia sorrir entre [as folhas de banana
entre os cheiros de flor e bosta de porco aberta [como uma bocado corpo (não
como a tua boca de palavras) como uma entrada para
eu não sabia tu
não sabias
fazer girar a vida
com seu montão de estrelas e oceano
entrando-nos em ti
pp. 1, 2
Poema Sujo é a encarnação da saudade daquele que está infelizmente longe de
nós, geograficamente, e tão perto de nós como estamos perto dele, na imaginação do
poeta, o Brasil que lhe inspirou esses versos. Poema Sujo merecia ser chamado
Poema nacional, porque encarna todas as experiências, vitórias, vitórias, derrotas e
esperanças da vida do homem brasileiro. É o Brasil mesmo em versos sujos e,
portanto, sinceros
pp. 7, 8
Poema Sujo incorpora impressões várias de um eu poético sobre as descobertas
da infância, da juventude, as questões sociais e a alienação da sociedade, tendo, desde
o princípio, como pano de fundo a cidade de São Luís do Maranhão. Mas o caminho
percorrido pelos versos do Poema é o dos questionamentos universais dos grandes
conflitos humanos.
pp. 3, 4
p. 39
pp. 44, 45
p.17
pp. 18, 19
TRENZINHO CAIPIRA – UM DOS PONTOS ALTOS DA OBRA
Sei é que, certa tarde, sozinho no apartamento (na antiga rua Montenegro, hoje Vinícius
de Moraes, em Ipanema), pus na vitrola um disco com as "Bachianas" e ouvi, pela primeira
vez, a do trenzinho do caipira.
Entrei em transe. É que, quando menino, meu pai, que fazia comércio ambulante, me
levava nas viagens de trem entre São Luís e Teresina. O trem saía de madrugada e, ao
amanhecer, cortava o Campo dos Perizes, um vasto pantanal, povoado de garças, marrecos,
nhambus, pássaros de todo tamanho e cor. Eu ficava deslumbrado, a cada viagem.
Deslumbramento esse que voltou quando ouvi a "Tocata" da "Bachiana nº 2". Tive o ímpeto
naquele instante, de pôr letra na música, mas não consegui. E não tentei uma vez só, não, mas
várias, ao longo dos anos, sem resultado.
Pois bem, em 1975, ao escrever o "Poema Sujo", em Buenos Aires, evoco aquelas viagens que
fazia com meu pai e, então, enquanto, antes, era a música de Villa-Lobos que me fazia lembrar
das viagens, agora elas é que me fizeram lembrar da "Bachiana nº 2" e, assim, a letra que não
conseguira escrever em 20 anos, escrevi em 20 minutos.
Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq0612200923.htm
Trenzinho Caipira
Para ser cantado com a música da Bachiana Nº 2, da Tocata de Heitor Villa-Lobos
pp. 50, 52
pp. 56, 57
p. 58
pp. 58, 59
Ferreira Gullar deixa uma obra-prima: 'Poema Sujo'
Escritor morreu neste domingo, 4, aos 86 anos
Ubiratan Brasil, O Estado de S.Paulo – 04 de dezembro de 2016 | 15h10
p. 75
pp. 91, 92
Buenos Aires, maio/outubro de 1975
pp. 92, 93
(...)
pp. 60, 67
pp.
p. 72
pp. 73, 74
pp. 74, 75
pp. 80, 81
pp. 86, 87
pp. 87, 88