Moody - Penelope Ward
Moody - Penelope Ward
Moody - Penelope Ward
tempo, fitando seu lindo rosto. Os cabelos curtos de Wren combinavam com
ela. Ela certamente possuía a estrutura óssea perfeita para usá-lo assim. No
vídeo, seu cabelo estava preso atrás de uma das orelhas, e ela usava uma
camisa branca com colarinho, com todos os botões fechados. Era um visual
mais formal do que a calça jeans rasgada e a camiseta que ela usara na
última vez em que estivera na minha casa. Contudo, mais proeminente do
que sua beleza era seu talento. Fiquei embasbacado.
Não sei dizer quantas vezes assisti ao vídeo, afogando-me na tristeza
hipnotizante de sua música, uma expressão das emoções presas dentro de
mim.
Quando finalmente o fechei, fui ao site da Elite Massagens e agendei
outro horário para a sexta-feira.
No sábado seguinte, arrastei Rafe para fora de casa. Sair seria bom não
somente para ele, mas para mim também. Nós dois passávamos tempo
demais em nossos dispositivos eletrônicos, desperdiçando fins de semana
porque não sabíamos bem como interagir um com o outro. Eu precisava
melhorar esse aspecto, e isso começaria hoje. Mesmo que ele ainda não
quisesse falar comigo, eu forçaria um tempinho juntos.
Decidi que iríamos ao centro da cidade para almoçar, e escolhi um
restaurante de ramen. Ele tomou o seu bem rápido, então eu pelo menos
soube que ele gostou.
Em seguida, fomos a uma livraria. Rafe gostava de revistas em
quadrinhos japonesas, então eu disse a ele que escolhesse algumas. Ele se
separou de mim para explorar as prateleiras, e fiquei de olho nele de longe
enquanto examinava a seção de livros de ficção.
Em determinado momento, ergui o olhar e encontrei alguém ao lado dele.
Estreitei os olhos para ver melhor.
Não pode ser.
Mas era.
Era ela.
Senti como se meu coração fosse saltar do peito.
Wren disse algo para ele. Quando me aproximei, ela olhou para mim.
Sua pele ruborizou imediatamente.
— Oi, Dax. — Ela colocou um livro de volta na prateleira. — Eu…
reconheci Rafe. Não sabia que ele gostava de mangás. Eu estava contando a
ele sobre a vez em que fui a uma convenção de animes que aconteceu em
Boston há alguns anos.
Rafe sorriu.
Porra, ele sorriu.
Era o primeiro sorriso genuíno que eu via em seu rosto em… bem, uma
eternidade.
— Sério? — Engoli em seco. — Que legal.
— Como você está? — ela perguntou.
— Bem. Nós, hã, decidimos vir dar uma volta no centro da cidade hoje.
— Então, tivemos a mesma ideia. Eu amo essa livraria. Acho que Rafe
ficou surpreso ao ver que sei tudo sobre Death Note. — Ela virou-se para
ele. — Foi muito bom ver você, Rafe. Espero que escolha um dos bons.
Meu corpo voltou à vida ao vê-la. Eu tinha quase me esquecido do
quanto ela era linda pessoalmente. Seus cabelos curtos tinham crescido um
pouco. Seu joelho delicado estava aparecendo pelo buraco da calça jeans
rasgada. Sua camiseta listrada em preto e branco caía por um de seus ombros
e tinha um nó amarrado logo acima de sua cintura. Podia fazer apenas um
mês, mas parecia uma eternidade.
Rafe ergueu a mão e acenou para se despedir dela antes de voltar sua
atenção para os livros.
Ela expirou.
— Bem… é melhor eu ir.
“Não a deixe ir”, uma voz dentro de mim disse.
— Você precisa ir a algum lugar? — Apontei com o polegar para a
cafeteria que havia atrás de mim. — Podemos tomar um café ali?
— Na verdade, eu preciso ir a um lugar. — Ela mordeu o lábio inferior,
parecendo tensa. Tive a impressão de que era somente uma desculpa, mas
não ia forçar. Ela tinha todo direito de fugir de mim depois do jeito como
lidei com as coisas.
— Ok. Bem, foi muito bom te encontrar — eu disse.
— Igualmente. — Ela forçou um último sorriso antes de passar por mim.
Inspirando os resquícios de seu cheiro floral, fiquei olhando-a até
desaparecer de vista.
Durante o resto do nosso tempo na livraria, não consegui parar de pensar
nela, olhando para a entrada de vez em quando, como se ela fosse voltar.
Mas o que realmente me impressionou foi a conexão que ela pareceu ter com
Rafe. Fazia quase dois anos que ninguém conseguia fazê-lo sorrir daquele
jeito. Eu já estava questionando minha decisão de não tê-la contatado
durante todo esse tempo. E o que mais me perturbava era quão revigorado eu
me senti durante aqueles poucos minutos em sua presença novamente.
Rafe e eu voltamos para casa não muito tempo depois que ela foi
embora. Passei a noite toda em um tipo de transe. Após o jantar, Rafe foi
para seu quarto com os três livros que comprei para ele, deixando-me
novamente sozinho com meus pensamentos.
Mais tarde, naquela noite, eu estava deitado na cama quando recebi uma
mensagem.
Meu coração acelerou quando vi que era de Wren.
Eu tinha esquecido que havia mandado meu número para ela por
mensagem antes da última sessão de massagem, para que ela o tivesse caso
precisasse me contatar.
Oi, Dax. É a Wren. Desculpe se agi estranho durante o nosso
encontro hoje. Foi bom ver você. E Rafe é maravilhoso. Eu estava
pensando no quanto ele prestou atenção quando eu estava contando
sobre a convenção de animes. Percebi que, às vezes, nos esforçamos
demais para fazer as pessoas se identificarem com a nossa versão de
mundo. Descubra do que ele gosta, o que desperta seu interesse, e use
isso para se conectar com ele. Enfim, pensei em compartilhar isso
com você.
Meu peito apertou. Eu queria ouvir sua voz.
Dax: Posso te ligar?
Os pontinhos saltaram conforme ela digitou.
Wren: Claro.
Pressionei a tecla de ligar em seu nome nos meus contatos. Ela atendeu
após dois toques.
— Oi.
— Oi. — Expirei, agarrando meus lençóis. — Como você está?
— Bem.
Após um momento de silêncio, eu disse:
— Tive a impressão de que te espantei hoje mais cedo. O jeito como
você saiu de lá com pressa…
— Acho que ver você mexeu comigo.
Fechei os olhos.
— Estou me sentindo um merda desde que você foi embora da minha
casa naquele dia, Wren. Tenho pensado muito em você.
— Bom, poderia ter ligado. Você tem o meu número. E escolheu não me
ligar.
Ela tinha razão.
— Não foi por não querer. Por favor, saiba disso.
— Essa é a questão. De algum jeito, eu sei que você gostou de conversar
comigo, que gostou de passar um tempo comigo. E também suspeitei que,
quando me contatou naquele dia para marcar mais uma massagem, não foi
somente pela massagem. Acho que é por isso que estou confusa. Você
nunca… gostou de mim dessa forma? Eu interpretei tudo errado? Porque
você definitivamente me passou a vibe de que estava interessado em mim,
Dax.
Como diabos eu deveria me explicar?
— Wren… eu gosto de você, sim. Muito. Mas não há nada que eu possa
fazer a respeito.
— Você não se sente pronto?
Era uma pergunta justa.
— Não é isso…
— O que é, então?
— Eu não sou… certo para você. E eu gosto demais de você para não
levar as coisas a sério. Então, isso significa que tenho que controlar as
minhas ações.
— Você acha que é velho demais para mim? Porque eu já estive com
homens mais velhos do que você.
Bem, que merda.
— Não, também não é isso.
— Você não se sente atraído por mim?
Se ao menos fosse assim…
— Acho que você sabe, diante da maneira como meu corpo reagiu, que
me sinto muito atraído. Você é absolutamente linda. Em todos os sentidos.
Nunca duvide disso.
— Então, o que é?
Meu estômago se contorceu.
— É… complicado.
Ela fez uma pausa.
— Você já transou com alguém desde que a sua esposa morreu?
Hesitei, mas lhe disse a verdade.
— Sim.
— Uau, ok. Então, não é uma necessidade de se manter fiel. Não tinha
certeza sobre isso.
— Só estive com uma pessoa. E não significa nada. É só alguém que eu
sei que não espera nada além disso de mim.
— Então, é algo que está rolando atualmente?
Puxei meus cabelos.
— Não sei se vai acontecer de novo. Não sou eu que costumo procurá-la.
Como eu disse, não significa nada. Não estou em um momento que me
permita ter nada sério.
— Hum… — Ela pausou. — Pensei que, talvez, diante do quanto você
foi… reativo a mim, fizesse algum tempo desde que esteve com alguém.
Presumi erroneamente que fui a primeira mulher a te tocar em muito tempo.
Ela foi a primeira mulher que me fez sentir qualquer coisa. Eu queria
dizer isso a ela, mas precisava ser cuidadoso com minhas palavras.
— Minha resistência não teve nada a ver com meus sentimentos ou a
falta deles em relação a você, fisicamente… ou em outro sentido.
A frustração em seu tom era aparente.
— Você não me deve uma explicação. Mas por que pediu para me ligar
agora? Eu só mandei mensagem para te falar aquilo sobre Rafe, porque
passei o dia todo pensando nele. Você não quer algo a mais comigo, então
talvez tivesse sido melhor deixar as coisas como estavam, se acha que tudo é
tão complicado. Essa conversa só está bagunçando ainda mais a minha
cabeça.
Ela estava furiosa. E estava certa. Eu não deveria ter ligado.
Ficamos apena respirando ao telefone por alguns instantes.
— Me desculpe — ela disse finalmente. — É só que… eu nunca fui tão
ousada daquela maneira antes, como fiz naquele dia no seu escritório. E eu
certamente nunca fiz algo assim enquanto estava trabalhando. É que, com
você, não parecia ser trabalho. Parecia ser algo completamente diferente,
como se estivéssemos realmente nos conectando. Eu interpretei errado o
rumo das coisas entre nós, o que você queria. Foi um erro da minha parte.
Preciso melhorar em como interpretar as pessoas para não me constranger
novamente no futuro.
Suspirei.
— Você me interpretou corretamente. Nós temos, sim, uma conexão. Isso
é inegável. E eu queria muito que as coisas continuassem naquele dia. Eu…
— Minhas palavras sumiram enquanto eu esfregava minha têmpora.
Cuidado com o que vai dizer, Dax. Eu queria explicar mais, mas não podia.
— Vou me despedir de você, Dax. Ok? Espero que tenha uma boa vida.
De coração. Nunca vou me esquecer de você, ou de Rafe… nem mesmo da
bola de pelos do Winston, que me odeia. Rezarei para que tudo dê certo para
vocês. Fique bem.
Meu pulso acelerou.
— Wren…
Antes que eu pudesse colocar qualquer outra palavra para fora, ela
desligou.
Eu tinha finalmente conseguido um novo emprego em uma empresa de
massagens que ficava em Wellesley. Até então, estava indo tudo bem,
embora o pagamento fosse um pouco menor que o da Elite. Na verdade, as
coisas estavam indo muito bem na minha vida, no geral. Além do novo
emprego, eu tinha começado a sair com um cara que conheci através de uma
amiga.
Sam Benson trabalhava para a rede de restaurantes de sua família e havia
crescido na mesma área que eu, mas nossos caminhos nunca tinham se
cruzado quando éramos mais novos. Ele agora morava na parte norte da
cidade. Nosso relacionamento era casual, mas eu gostava de passar tempo
com ele.
Por fora, eu parecia ter superado a minha obsessão pelo temperamental
Dax Moody. Fazia um mês desde que havíamos nos falado por telefone pela
última vez. Então, por que eu ainda pensava nele o tempo todo? Isso, eu não
sabia dizer. Mas, apesar de ele surgir na minha mente quase todos os dias, eu
estava começando a me conformar com esse pequeno capítulo da minha vida
― e com o desejo não satisfeito e a confusão que provavelmente existiriam
para sempre.
Dessa vez, acreditei realmente que nunca mais veria Dax, especialmente
depois da maneira como desligara na cara dele. Mas sabe o que dizem sobre
presumir coisas, não é? Descobri isso da maneira mais difícil certa noite,
após o trabalho.
Eu tinha acabado de sair do banho quando meu pai bateu à porta do meu
quarto.
— Wren, tem um homem aqui querendo falar com você. Tem algo que
queira me contar?
Um homem?
— Quem é?
— O nome dele é Dax Moody. Ele está esperando lá embaixo.
Meu coração quase saltou do peito.
— O quê? Dax está aqui?
— Sim. Quem é ele?
Falei através da porta.
— Ele é… um ex-cliente.
— Ele parece ser rico… tem um carro chique, pelo que pude ver lá fora.
Está acontecendo algo entre você e esse cara? Pensei que estivesse saindo
com aquele Sam.
— Dax e eu não estamos saindo. Faz mais de um mês que não o vejo.
Não faço ideia do que ele quer.
— Quer que eu o mande embora?
Meu pulso acelerou enquanto eu procurava freneticamente minhas
roupas.
— Não! Eu só preciso terminar de me vestir. Diga a ele que descerei em
um minuto.
— Ok… como quiser.
Vesti uma calça jeans e uma camiseta e passei o secador em meus
cabelos algumas vezes antes de aplicar um pouquinho de maquiagem.
Um bolo formou-se em minha garganta conforme desci as escadas. Ao
vê-lo, senti meus joelhos enfraquecerem. Eu sempre soube que Dax era alto
― devia ter quase um metro e noventa ―, mas comparado ao meu pai, que
tinha apenas um e setenta e dois, ele parecia ainda mais alto. Ele estava
usando um casaco preto de lã com um cachecol no pescoço.
— Oi, Wren.
— O que você está fazendo aqui?
— Eu sei que você deve estar chocada por me ver agora. Peço desculpas
por não ter ligado primeiro. Mas queria saber se podemos conversar.
— Oh… ok. — Engoli em seco, lançando um olhar rápido para o meu
pai.
Senti meu cérebro inundar com as teorias sobre o que ele teria a dizer.
Ele tinha mudado de ideia quanto a querer namorar comigo? Tinha passado
todo esse tempo pensando em mim e se sentia mal pelo modo como as coisas
terminaram entre nós? Até mesmo me perguntei se ele estaria com pena de
mim e me ofereceria um emprego.
Ele me despertou dos pensamentos.
— Será que podemos ir dar uma volta? Ou podemos conversar aqui, se
preferir. — Dax ficou mexendo em seu relógio. Ele definitivamente estava
nervoso de uma maneira que eu nunca vira antes.
Olhei para o meu pai novamente, que parecia tão confuso quanto eu.
Provavelmente faria mais sentido se fôssemos a algum outro lugar para
termos privacidade. A casa era pequena, então meu pai poderia ouvir tudo,
não importava em qual cômodo estivéssemos.
— Vou pegar meu casaco — eu disse. — Podemos ir dar uma volta.
Meu pai me seguiu até o armário de casacos nos fundos da casa.
— Tem certeza de que esse cara não é perigoso? — ele sussurrou.
— Sim. Ele é uma boa pessoa. Não estou correndo perigo algum. Você
não precisa se preocupar.
Acredite, eu poderia me jogar nele e, ainda assim, nada aconteceria.
— Tudo bem. — Ele suspirou. — Me mande uma mensagem em meia
hora, se ainda não tiver voltado.
— Pode deixar.
Estremeci diante do ar frio da noite de fevereiro conforme Dax e eu
seguimos para seu Porsche, que estava estacionado em frente à minha casa.
Não havia muitas vagas na rua montanhosa onde morávamos na parte de
Boston chamada Roslindale, então fiquei surpresa por ele ter conseguido um
espaço a essa hora da noite, quando todo mundo estava em casa após o
trabalho.
Ele destravou o carro e eu entrei. O couro sob mim era frio.
Dax ligou o aquecedor ao se acomodar no banco do motorista.
— Se você quiser ligar o aquecedor de assento, o botão fica à sua
esquerda.
— O que está acontecendo, Dax? — perguntei, ignorando sua sugestão.
— Por que não me ligou antes?
— Foi uma decisão impulsiva. Eu não queria me dar tempo para mudar
de ideia, porque essa conversa é necessária.
— Como você conseguiu meu endereço?
Ele deu partida no carro e saímos.
— Apareceu rapidinho no Google.
— Aonde vamos? — indaguei ao seguirmos pela minha rua.
— Me diga você. Não podemos ir para minha casa, porque Rafe está lá, e
não teremos privacidade.
— Vamos apenas estacionar em algum lugar — eu disse. — Há um
campo a cerca de um quilômetro daqui. Siga até o fim da rua e vire à direita.
Cinco minutos depois, Dax estacionou em um local com vista para um
campo de beisebol. Ele deixou o motor ligado para manter o aquecedor.
Ele fitou o campo por um breve momento antes de virar para mim.
— Wren, você merece muito mais do que esse tratamento morde e
assopra que venho te dando durante o curto tempo em que nos conhecemos.
Só espero que você possa me perdoar por tudo isso.
— O que está acontecendo, Dax?
Ele fechou as mãos em punhos, inspirando profundamente.
— Quando decidi encontrá-la, nunca imaginei que me conectaria com
você dessa forma, a ponto de sentir como se eu fosse uma pessoa
completamente diferente quando estou com você, uma versão melhor de
mim mesmo. Isso foi muito inesperado.
Meu estômago gelou enquanto eu absorvia suas palavras.
— Como assim… você decidiu me encontrar?
— Quando te chamei pela primeira vez para ir à minha casa me fazer
uma massagem, tive um motivo por trás disso. Não foi pela massagem. Foi
por você, Wren.
Senti uma onda de adrenalina me percorrer.
— Você precisa falar mais rápido, Dax. Porque está me assustando.
— Desculpe. Por favor, não se assuste. Tudo fará sentido. — Ele expirou
e reposicionou-se para ficar de frente para mim. — Ok… — Ele respirou
fundo. — Você sabe como venho me sentindo completamente perdido
quando se trata de Rafe. Nunca senti como se ele pertencesse aos meus
cuidados, mas ainda assim me comprometi a dar o meu melhor… em nome
de Maren. — Ele pausou. — Ele não tem mais ninguém além de mim. A
mãe de Maren é muito idosa e nunca para em apenas um lugar. Era minha
responsabilidade, como marido de Maren, cuidar de seu filho.
Engoli o caroço na garganta.
— Fale mais rápido, por favor…
— Há um ano, cheguei à conclusão de que ele precisava de mais do que
somente eu. Senti que devia a ele descobrir se havia mais alguém que
poderia amá-lo como Maren fez, da maneira que ele merece. Não parecia
justo essa mulher que o amou com todo seu coração e alma ter sido
arrancada desse mundo tão repentinamente e ele sobrar comigo. Alguém que
nem ao menos queria ter filhos.
Balancei minha cabeça lentamente e sussurrei:
— Não estou entendendo…
— Eu contratei um investigador particular para encontrar os parentes
biológicos de Rafe. Não para aliviar minha responsabilidade, mas na
esperança de encontrar alguém que pudesse trazer luz para a vida dele,
alguém que o amaria naturalmente. Minha intenção não foi me livrar dele.
Pretendo realmente cuidar dele.
Meu coração martelou no peito.
— O que isso tem a ver comigo?
— O investigador localizou a mãe biológica dele, que revelou ter
entregado uma filha para adoção mais de uma década antes do nascimento de
Rafe. — Ele olhou em meus olhos. — Wren, você é irmã biológica dele.
Minha visão ficou borrada, e tudo começou a girar.
Dax continuou falando, mas tudo parecia confuso agora.
— Foi verificado e confirmado várias vezes. Vou te mostrar todas as
evidências que tenho. Eu nunca te diria isso sem ter absoluta certeza.
Minhas mãos tremiam, e uma lágrima desceu conforme a ficha caía.
— Eu não entendo… — Enxuguei meus olhos. — Por que você não me
contou isso desde o início?
— Esta é uma pergunta muito justa, e espero que me deixe explicar. —
Ele engoliu em seco. — Foi por inúmeras razões. No começo, senti que eu
precisava conhecer você melhor. Quando nos encontramos pela primeira
vez, eu queria analisá-la, ver se havia qualquer razão pela qual eu poderia
não querê-la perto dele. Obviamente, me dei conta rapidamente de que você
era um ser humano lindo que ele seria sortudo por ter em sua vida. Ainda
assim, eu não sabia se seria justo jogar isso em cima de você, perturbar a sua
vida. Eu sequer sabia se você iria querer saber. Então, debatia
constantemente se te contar seria a coisa certa. Mas então, vi a maneira
como você interagiu com Rafe naquele dia na livraria, e a minha culpa só
cresceu a partir de então.
Massageei minhas têmporas.
— Volte a fita, Dax. Então, a massagem nunca foi pela massagem…
— Exato. Eu não tinha outra forma de me conectar com você além de
pedir uma massagem. Quando descobri onde você trabalhava, foi o que fez
sentido.
Soltei uma longa respiração pela boca e fechei os olhos.
— O que eu não estava esperando… — ele continuou. — Era
desenvolver sentimentos por você. Apesar das minhas razões para procurar
você, a conexão que você sentiu entre nós foi real. Não teve nada a ver com
qualquer outra coisa. — Dax fez uma pausa. — Eu te procurei por causa de
Rafe, mas comecei a querê-la por perto… por mim. Porque você me fez
sentir coisas que eu não sentia há muito tempo. E isso não é justo. Eu estava
brincando com fogo, porque nada pode acontecer entre nós.
Virei o rosto para ele de uma vez.
— Por que não pode acontecer?
— Porque eu estava escondendo algo extremamente importante de você,
e mesmo que eu tivesse te contado a verdade antes, sabia que não poderia
me envolver com a irmã de Rafe. Essa é a dura verdade. Não seria justo com
nenhum de vocês. Se as coisas dessem errado entre nós, isso o afetaria.
Então, está fora de questão nós dois sermos mais que amigos, apesar dos
meus fortes sentimentos por você. Meus sentimentos não podem importar.
Apoiei a cabeça nas mãos.
— Desculpe. Eu preciso de um momento.
— Leve o tempo que quiser — ele sussurrou. — Entendo o choque que
isso deve ser.
Pensei nos olhos tristes de Rafe. Tentei me lembrar de todos os seus
traços, agora que eu sabia que ele era meu irmão. Desde o momento em que
o conheci, senti-me inexplicavelmente cativada por ele. Talvez tivesse sido
uma sensação inata.
— Você também conheceu a minha mãe? — perguntei.
— Só o investigador. Pelo que ele disse, ela parecia não estar em
condições muito boas. Não quis se envolver de maneira alguma. Mas ela
disse que os dois bebês aos quais deu à luz tinham pais diferentes.
Isso foi meio decepcionante. Mas eu não podia focar na minha mãe
biológica no momento, especialmente se ela não queria me conhecer. O que
importava agora era Rafe.
Finalmente virei-me para Dax.
— Você quer que eu faça parte da vida dele?
— Contanto que isso seja o que você quer. Não há obrigação. Mas eu
precisava te contar a verdade, porque estava me corroendo. Comecei a
debater se te contar a verdade seria a melhor decisão, tanto para você quanto
para ele, desde o instante em que nos conhecemos. Percebi que você é o tipo
de pessoa que gostaria de saber que tem um irmão. — Ele olhou em meus
olhos. — Desculpe por colocá-la nessa situação. Eu realmente tinha a
melhor das intenções.
Balancei a cabeça, ainda incrédula.
— Eu só queria que você tivesse me contado desde o início. Assim, eu
não teria interpretado as suas intenções erroneamente e desenvolvido
sentimentos por você.
Ele fechou os olhos e assentiu.
— Em retrospecto, eu também queria ter contado do começo. Mas eu
precisava de tempo para decidir, e no processo, acabei gostando de você de
uma maneira que não esperava. É o maior dilema da minha vida. E, porra, eu
lamento tanto por ter lidado com tudo de uma péssima maneira.
Pensei em tudo que havia acontecido, como a retrospectiva de um filme.
— Isso explica tantas coisas… como por que passar tempo com você, às
vezes, parecia uma entrevista de emprego.
Sua voz estava tensa.
— Você me odeia?
Eu sabia, bem no fundo do meu coração, que ele nunca tivera a intenção
de me magoar. E agora eu acreditava que ele tinha sentimentos verdadeiros
por mim. Só não iria agir de acordo.
— Eu quero te odiar. Mas não consigo. Não mesmo. Entendo por que fez
isso.
Ele estendeu a mão para segurar a minha e soltou um longo suspiro.
— Obrigado.
Ficamos de mãos dadas em silêncio por vários segundos.
— O que vamos fazer agora?
Ele apertou minha mão e a soltou em seguida.
— A decisão é toda sua. Você não tem que fazer nada com essa
informação, Wren. Ele nunca terá que saber, se você não quiser que ele
saiba. Você tem direito à sua privacidade, que eu violei.
— Eu não posso simplesmente… ignorar essa informação.
Dax assentiu e olhou para o campo.
— Acho que, de um jeito ou de outro, agora não é um bom momento
para ele descobrir. Ele está muito instável, ainda não fala nem se abre com
ninguém. Acredito que ele não saberia lidar.
— Acho que você tem razão — concordei.
Ele tornou a olhar para mim.
— Mas se você quiser estar na vida dele, podemos pensar em alguma
coisa. Você pode ir a nossa casa sob outro pretexto, conhecê-lo naturalmente.
Então, poderemos descobrir como contar a ele quando chegar o momento
certo. Mas, mais uma vez, você não tem obrigação alguma, Wren. Faço
questão de enfatizar isso.
— Ele é meu irmão! — Isso saiu mais alto do que eu pretendia. Dizer
essas palavras me levou às lágrimas. Minha voz tremia. — Não posso só
fazer de conta de não sei disso. Não há dúvidas sobre o que eu quero.
— Tudo bem — ele sussurrou. Dax estendeu a mão para limpar minhas
lágrimas. Fechei os olhos, deleitando-me na sensação de seus dedos quentes
em meu rosto.
Por fim, abri os olhos e dei um pequeno sorriso.
— Puta merda… eu tenho um irmão.
— Sim. — Ele sorriu.
Fungando, limpei o restante das minhas lágrimas.
— Você pode me levar para casa? Preciso falar com o meu pai.
— Claro.
O caminho de volta para minha casa foi quieto. Eu ainda estava em
choque, e provavelmente ficaria assim por um tempo. Antes de entrar, Dax e
eu concordamos em nos encontrarmos para tomar um café em algum
momento da semana seguinte para discutirmos os próximos passos.
Minha vida nunca mais seria a mesma.
Enquanto tomávamos um café, mostrei a Wren a pasta onde eu guardava
todas as informações que o investigador me fornecera sobre as duas adoções.
Eu não queria que ela tivesse dúvida alguma sobre a situação. Também
decidimos que ela passaria tempo na minha casa sob o disfarce de ser minha
amiga. Como Rafe já a tinha visto antes, essa história funcionava bem. Ele
provavelmente já havia deduzido que ela era uma amiga minha. Fazia
sentido continuar com esse pretexto.
Ela visitara duas vezes nas duas semanas após a conversa que tivemos
em meu carro. Em cada vez, tentou se conectar com Rafe falando sobre
animes e mangás, trazendo algumas novas revistas em quadrinhos que eu
confirmara que ele ainda não tinha. Ela também mostrou a ele fotos da vez
em que fora à convenção de animes quando estava na faculdade. Fiquei
aliviado por vê-la lidando tão bem com tudo, e ainda mais aliviado por não
ter mais que esconder algo tão importante assim dela.
Mesmo que ainda se recusasse a falar, Rafe parecia estar com um humor
melhor, aparentemente mais engajado e passando mais tempo à mesa de
jantar antes de voltar com pressa para seu quarto.
Decidi contar a Shannon a verdade sobre tudo, sabendo que ela veria
Wren em casa e poderia tirar uma conclusão errada sobre nós mais uma vez.
Ela ficou chocada, para dizer o mínimo, mas apoiou a ideia de Wren
conhecer Rafe melhor antes de darmos a notícia a ele.
Em uma noite de sexta-feira, Wren juntou-se a nós para o jantar, sua
terceira visita desde que soube da verdade. Shannon havia feito frango e
couve-de-bruxelas assada. Insisti que ela se sentasse conosco, o que ela fazia
ocasionalmente quando não tinha planos com Bob. Eu sabia que ela aceitaria
a minha oferta naquela noite, porque estava muito curiosa sobre Wren desde
que descobrira quem ela era.
Shannon e Wren conduziram a conversa durante a maior parte do jantar,
enquanto Rafe e eu permanecemos quietos, embora eu tenha notado que ele
estava prestando atenção ao que elas estavam dizendo. Shannon falou sobre
sua última viagem a Nova Orleans, e Wren parecia particularmente
interessada em suas histórias sobre os locais que visitara.
Então, de alguma maneira, a conversa mudou para um novo assunto,
sobre traços físicos incomuns. Shannon percebeu que ela tinha os olhos de
cores diferentes, coisa que eu não havia notado. Era uma diferença bem sutil,
mas, quando ela apontou, pude ver bem.
— Ganhei de você, eu acho — Wren disse. — Tenho dedos siameses no
pé.
— O que são dedos siameses? — perguntei.
— É quando dois dos seus dedos dos pés são grudados um no outro. Me
incomodava quando eu era mais nova, mas aprendi a gostar.
— Acho que o termo para isso é sindactilia — Shannon disse.
Sorri.
— Eu tenho que ver isso.
— Bem, eu tiraria o meu sapato, mas não é algo exatamente apropriado
para se fazer à mesa de jantar — Wren falou.
— Eu tenho dedos siameses.
Soltei meu garfo. Quem disse isso?
Nós três viramos para Rafe ao mesmo tempo.
Foi como se o próprio Deus tivesse falado conosco.
Wren olhou para mim, depois de volta para ele.
— É mesmo? Nunca conheci mais ninguém que tivesse.
Ele assentiu.
— Isso é tão legal — ela respondeu, parecendo tão agitada quanto eu me
sentia.
Ficamos ali, paralisados. Eu sabia que, se comentasse, Rafe poderia
recuar, então tentei agir indiferente. Mas, por dentro, eu estava em êxtase.
— Eu não sabia disso sobre você, Rafe — eu disse. — Acho que não
olhei com muita atenção para os seus pés.
— Eu estava pensando a mesma coisa. — Shannon olhou para mim e
sorriu.
Esperamos em silêncio, mas ele não disse mais nada.
Rafe não proferiu mais palavra alguma durante o restante do jantar,
mesmo quando nos dirigíamos a ele. Mas tudo bem, porque tínhamos
ouvido. Eu tenho dedos siameses. As melhores quatro palavras já ditas. Elas
nos deram esperança.
Após o jantar, Rafe foi para seu quarto. Shannon começou a limpar a
mesa, mas eu a impedi.
— Vá para casa ficar com Bob. Eu cuido disso.
Wren levou alguns pratos para a pia e disse:
— Aham. Pode deixar com a gente.
— Tem certeza, Dax? — Shannon perguntou.
— Sim. Dê logo o fora daqui.
Shannon abriu um sorriso enorme.
— Foi uma boa noite, não foi?
— Com certeza — eu falei. — Não consigo superar.
— Acho que Wren o está fazendo sair de sua casca — ela declarou.
Wren balançou a cabeça.
— Eu não fiz nada.
Shannon pendurou sua bolsa no ombro.
— Bom, você claramente deu a ele algo com que se identificar o
suficiente para falar. Nenhum de nós conseguiu fazer isso.
Depois que Shannon foi embora, eu disse a Wren que cuidaria da
limpeza, mas ela insistiu em ajudar. Ela terminou de retirar a mesa enquanto
comecei a lavar os pratos.
— No que está pensando? — ela me perguntou.
— Estou em choque — respondi, colocando uma bandeja no escorredor
de louças.
— Eu também, mas de um jeito bom — ela falou.
Desliguei a torneira e enxuguei minhas mãos.
— Esse tempo todo, tudo que tínhamos que fazer era falar sobre dedos
siameses?
Wren riu.
— Aparentemente.
— Mas não foi exatamente sobre os dedos. Foi o fato de que ele se sente
confortável perto de você. E você acabou conseguindo tocar em um assunto
que importava para ele, assim como fez com os animes. Talvez o problema
esse tempo todo tenha sido Shannon e eu não termos nada com que ele
pudesse se identificar em um nível pessoal. Tentei implementar o conselho
que você me deu sobre encontrar coisas pelas quais ele se interessa, mas
nada que eu faça parece ressoar com ele. Com a sua energia vibrante por
perto, a ansiedade dele diminuiu o suficiente para fazê-lo querer falar alguma
coisa.
As bochechas de Wren ficaram rosadas.
— Seja qual tenha sido a causa, é maravilhoso. E um bom sinal.
Quando não havia mais pratos para lavar, Wren e eu ficamos na cozinha,
de frente um para o outro. Apesar da minha declaração de que ser irmã de
Rafe a fazia proibida para mim, a tensão sexual entre nós nunca desvaneceu,
nem um pouco. Dava para cortá-la com uma faca. Em momentos tranquilos
como aquele, eu realmente percebia. Eu sabia que Wren estava saindo com
alguém agora, e isso tanto facilitava quanto dificultava a situação. Contanto
que ele a fizesse feliz, eu estava conformado. Não tinha que adorar essa
ideia. Mas era uma parte da nossa dinâmica que eu tinha que aceitar.
— Você vai sair esta noite? — perguntei.
— Sam tem que trabalhar, então eu pretendo ir para casa assistir alguma
coisa na Netflix.
— Que empolgante — brinquei.
— Você tem alguma ideia melhor?
— Estou brincando. Assistir TV pode não ser empolgante, mas, às vezes,
é o que você precisa. Tenho certeza de que você teve uma semana longa. —
Inclinei a cabeça para o lado. — Está tudo bem no trabalho?
— Sim. Eles me mantêm bem ocupada, um cliente de massagem após o
outro. Acabo ganhando mais dinheiro por causa do volume, mesmo que a
porcentagem por sessão seja menor.
— Bem, acho que isso é bom, contanto que você não se importe em ter
mais trabalho.
— Não me importo. Eu preciso me manter ocupada.
Wren estava linda naquela noite. Não que ela não fosse nada menos do
que deslumbrante normalmente, mas, naquela noite em particular, estava
usando um vestido floral curto com uma jaqueta jeans. Esforcei-me muito
para não deixar meus olhos encontrarem seu pequeno decote ou suas
pintinhas espalhadas por ali. Ela nunca havia mostrado tanta pele assim
antes. Mas o que estava me matando eram seus mamilos cutucando o tecido
fino do vestido. Eles pareciam estar duros, e isso fez meu pau querer brincar
de “siga o mestre”.
Contudo, eu gostava de estar perto dela por muitos motivos além de sua
beleza. Ela era genuinamente engraçada e sempre iluminava o ambiente no
qual estivesse presente. Eu amava ouvi-la falar. Isso me deixava de bom
humor. Apesar de saber que não poderia agir de acordo com meus
sentimentos, eu não queria que ela fosse embora tão cedo.
— Quer uma taça de vinho antes de ir? Eu ia abrir uma garrafa.
Seus olhos se moveram para o lado por um momento, e então, ela deu de
ombros.
— Claro. Por que não? Acho que temos uma boa desculpa para
comemorar esta noite.
— A maior desculpa para mim em quase dois anos.
— Fico feliz por ter feito parte disso.
— Eu também, Wren.
Nossos olhares se prenderam. Eu poderia me perder em seus olhos.
Assim que percebi que estava fitando-a por tempo demais, forcei-me a
desviar o olhar.
Ela sorriu.
— Sempre ouvi falar que sindactilia era genética. Acho que agora tenho
provas.
— Posso vê-los? — perguntei.
Ela baixou o olhar, tímida.
— Meus pés?
— Sim. Estou curioso. A menos que você não queira me mostrar.
— Não. Não tenho vergonha deles.
Ela estava usando um vestido, mas calçava um par de tênis All Star. Ela
desamarrou o cadarço e retirou sua meia, exibindo seus dedinhos fofos do pé
com as unhas pintadas de rosa-claro.
Ela ergueu os dois dedos adjacentes ao seu mindinho.
— Está vendo? É só no pé esquerdo.
Eles eram fundidos, exceto pelas pontinhas.
— Que maneiro. Agora terei que prestar bastante atenção aos de Rafe
para poder comparar.
Ela colocou a meia de volta e deslizou o pé novamente no tênis. Em
seguida, olhou para mim.
Do jeito que ela sempre olha para mim. Bem no fundo dos meus olhos.
Isso era um problema, principalmente porque eu gostava demais. Era fodido
eu sentir prazer pelo fato de saber que eu tinha um efeito sobre ela. A
química silenciosa entre nós era tão viciante quanto excitante. E eu havia
convencido a mim mesmo de que, contanto que não me animasse com isso
de nenhuma forma, era aceitável curtir quieto a sensação de querer alguém e
ter aquele sentimento retribuído.
Jesus Cristo. Eu não ia abrir um vinho? Pigarreei.
— Deixe-me pegar o vinho.
Fui até o outro lado da cozinha. Esta noite era especial, então abri uma
garrafa do cabernet caro que eu vinha guardando para o momento certo.
Após servir uma taça para cada um, levei-as até Wren.
— Obrigada. — Ela tomou um gole do seu. — A propósito, como vai
Adriana?
Congelei. Eu nunca dissera o nome da minha amiga com benefícios para
Wren, e não fazia ideia de por que ela tinha me feito aquela pergunta.
Estreitei os olhos.
— Como você sabia o nome dela?
— Tenho meus meios.
— Não há nada acontecendo entre mim e ela. É insignificante. — Meu
lábio retorceu.
Suas bochechas ruborizaram.
— Mas você está transando com ela…
Pequenas gotas de suor começaram a se formar em minha testa.
— Na verdade, faz um tempo que não.
A última vez que eu tinha me encontrado com Adriana foi logo depois de
Wren vir à minha casa pela primeira vez e tomarmos chá juntos. E, desde
então, nunca mais a vira.
Coloquei minha taça sobre a bancada e cruzei os braços.
— Mas, sério, como você sabia o nome dela?
— Relaxe. Chegou uma mensagem no seu celular enquanto você estava
pegando o vinho do outro lado da cozinha. A tela acendeu, e eu acabei
olhando. Por isso sei o nome dela. Desculpe, eu estava sendo xereta.
Meu pulso se acalmou um pouco.
— Você me assustou por um momento. Pensei que tinha mandado
alguém me seguir, ou algo assim. — Pisquei.
— Ah, como você fez comigo? — ela mandou de volta.
Dei risada.
— Essa foi boa, tenho que admitir.
Peguei meu celular e chequei a mensagem.
Adriana: Estou com saudades. O que também significa que estou
com saudades do seu pau delicioso. Já faz muito tempo.
Porra. Encolhi-me.
— Sinto muito por você ter visto isso.
— Por quê? Eu sou adulta. Por que isso importa?
Ela tinha razão. Por que importava?
— É grosseiro. — Balancei a cabeça. — É só… a personalidade dela.
— Então, esse lance com a Adriana… é bom? Quero dizer… o sexo? —
Suas bochechas ficaram ainda mais vermelhas.
— Por que estamos discutindo isso, mesmo? — perguntei.
Ela passou a pontinha do dedo pela borda de sua taça.
— Nós deveríamos ser amigos. Amigos discutem essas coisas.
— Eu não pergunto sobre a sua vida sexual.
— Eu te diria o que quisesse saber, se perguntasse. Eu te diria qualquer
coisa que quisesse saber.
Engoli em seco.
— Por que você quer saber?
— Acho que é curiosidade mórbida.
— Mórbida. Por quê?
— Porque eu não quero realmente saber. Mas ainda quero saber. — Ela
riu. — Sabe?
Eu não queria saber que porra ela andava fazendo com aquele tal de
Sam. Disso, eu tinha certeza. De repente, senti vontade de arrancar a cabeça
dele, e sequer o conhecia. Meus sentimentos eram um cruzamento entre
proteção e um ciúme latente, o que me surpreendeu um pouco. Pensei que já
tivesse aceitado o fato de que ela estava saindo com alguém, mas,
aparentemente, não tinha.
— Relaxe — ela disse. — Vou parar de me intrometer.
Um silêncio tenso preencheu o ar. Ela mudou de assunto.
— Você ainda assiste aos meus vídeos no canal?
Toda noite, porra.
— Às vezes.
— O seu favorito ainda é O Cisne?
— Sim, acho que sim.
— Sempre fico emotiva quando toco essa.
— Posso ver por quê. Sempre que ouço você tocar, sinto como se cada
vez mais emoções presas dentro de mim se libertassem.
— Uau — ela sussurrou. — Vou considerar isso um elogio. A propósito,
você ainda está escrevendo no diário?
— Escrevi algumas vezes, mas parei.
— Você deveria voltar.
— Você é mandona.
— Eu me importo com você, Moody. É só isso.
Inclinei a cabeça para o lado.
— Faz um tempo que não me chama de Moody.
— É, bem, acho que conseguimos voltar a esse ponto. — Ela sorriu.
Eu também sorri.
Eu queria beijá-la. E isso era uma droga.
Ela tomou um gole de vinho e pousou sua taça.
— Ah, tem uma coisa que eu queria te dizer. Me deparei com um artigo
que talvez possa ser útil em relação a Rafe.
— Ok…
— Eu sigo um terapeuta on-line. Ele pede que seus clientes contem suas
histórias em terceira pessoa, tipo um resumo de suas histórias de vida. Ele
não quer que eles pensem muito profundamente sobre o que vão contar.
Então, é tipo escrever em um diário, despejar tudo que está na mente. Mas
ele quer que os clientes façam isso em terceira pessoa porque acha que, se
eles ouvirem suas histórias como se fosse a vida de outra pessoa, ajuda a
construir autocompaixão. E isso é uma coisa com a qual todos temos
dificuldade. Pelo menos, eu tenho.
— Concordo que as pessoas podem ser muito rígidas consigo mesmas.
Perdoar pessoas que te fizeram mal é difícil, mas não se compara à
dificuldade que é perdoar a si mesmo. Acho que tenho bastante experiência
pessoal quando se trata desse problema.
— Pelo que você está tendo dificuldade em se perdoar?
Você tem a noite toda? Eu certamente não queria abrir essa caixa de
Pandora naquele momento. Balancei a cabeça.
— Hoje, não. Estou de muito bom humor para isso.
Ela assentiu em compreensão e não insistiu.
— Então, Wren… — eu disse, ansioso para mudar de assunto.
— Sim?
— Que tal você me contar a sua história em terceira pessoa?
— Ah. Entendi. Tudo bem você se intrometer, mas eu não. Algumas
coisas nunca mudam.
Sorri e acenei com a cabeça para a sala de estar.
— Venha. Vamos sentar.
Carreguei a garrafa de vinho para a mesinha de centro antes de acender a
lareira. Wren acomodou-se no sofá.
— Volto já — falei, querendo ir ver como Rafe estava.
Fui até seu quarto para dar uma olhada nele. Ele estava jogando
videogame e retirou os fones de ouvido quando me viu na porta.
— Você está bem? Quer sobremesa? Você saiu da mesa antes disso.
Ele negou com a cabeça.
— Quer vir ficar na sala comigo e Wren? Podemos assistir a um filme.
Ele balançou a cabeça negativamente mais uma vez.
— Tudo bem. — Suspirei.
Retornei para a sala de estar e sentei-me no sofá com Wren, certificando-
me de não ficar perto demais.
— Ele está bem? — ela perguntou.
— Sim. Está jogando videogame. Eu disse a ele que você ainda estava
aqui, caso quisesse descer e ficar conosco.
— Tenho certeza de que ele prefere o videogame, como a maioria dos
adolescentes.
Assenti.
— Mesmo que ele não se junte a nós, ainda acho que é bom para ele
sentir que essa casa tem um pouco mais de vida. Tipo, se ele descesse agora,
veria mais do que somente eu sentado naquela poltrona lendo livros de
ficção de guerra histórica.
— Guerra histórica? Não sabia que você curtia isso.
— Sim. É basicamente o que costumo fazer à noite. Ler. — E assisti-la
tocando violoncelo. — Tenho até óculos de leitura — acrescentei. — Isso
me deixa velho?
— Não, homens de óculos são sexy. — Ela deu risada. — E homens que
leem? Mais sexy ainda.
Dei de ombros.
— O que uma pessoa acha velho e tedioso, outra acha sexy. Interessante.
— Você é a prova de que alguém pode ser as três coisas: velho, tedioso e
sexy. — Ela piscou.
— Espertinha.
— Quais são seus livros favoritos? — ela perguntou.
— Está querendo recomendações?
— Não curto ficção de guerra histórica, então, não. Mas estou curiosa
sobre o que você gosta.
— Você não ficou de me contar a sua história?
Ela soltou um longo suspiro.
— Não me lembro de concordar com isso.
Parecendo hesitante, ela prendeu uma mecha de cabelo atrás da orelha.
— Posso me servir de mais vinho primeiro?
— Permita-me. — Peguei a garrafa e servi mais vinho em nossas taças.
Wren pigarreou.
— Muito bem…
Acomodei-me melhor e dei a ela minha total atenção.
Mordiscando o lábio, ela fechou os olhos. Em seguida, abriu-os e
começou.
— Wren McCallister… não fazia ideia de onde realmente veio, e não
ligava para isso. Porque onde ela estava, segura no lar de Chuck e Eileen
McCallister, era exatamente onde ela deveria estar. Até seus cinco anos, a
mãe amorosa de Wren certificou-se de que sua filha vivesse uma vida
encantada. Eileen dava a Wren sua total atenção, fosse acompanhando-a para
brincar, assar biscoitos ou fazer artesanato. A vida perfeita de Wren foi
abruptamente interrompida, certo dia, quando sua mãe, a caminho de casa do
mercado, teve o carro atingido por um motorista que vinha na contramão e
morreu. — Ela fechou os olhos por um momento.
Ah, cara. Eu sabia que sua mãe morrera em um acidente de carro, mas
não sabia que tinha sido por um motorista na contramão. De repente,
arrependi-me de pedir que me contasse sua história. Eu estava prestes a dizer
que não precisava continuar quando ela começou a falar novamente.
— A vida que Wren conhecia terminou naquele dia. Ela não confiava
mais que o Universo a apoiava. Não era mais um lugar seguro. Daquele dia
em diante, ela passou a viver apreensiva, esperando a próxima coisa a dar
errado, a próxima tragédia. Wren tornou-se particularmente paranoica,
acreditando que alguma coisa aconteceria a seu pai. Ela se recusou a dormir
em qualquer lugar além da cama dele à noite até completar dez anos de idade
e sentia uma ansiedade extrema se ele chegasse em casa tarde do trabalho.
Mesmo assim, ainda se sentia grata por ter Chuck McCallister como pai. Ele
era seu mundo inteiro.
Percebi o quanto sua situação e a de Rafe eram similares. Os dois
perderam as mães prematuramente. A diferença era que ela tinha Chuck, um
ótimo pai. Rafe tinha sobrado comigo.
Wren tomou um longo gole de vinho antes de continuar.
— Alguns anos após a morte de Eileen, Wren começou a aprender a
tocar violoncelo, e aí começou seu amor pela música. Mas nem mesmo seu
talento musical foi capaz de salvá-la da temida adolescência. Como a
maioria dos pais, Chuck só podia controlar sua filha até certo ponto. Talvez
devido a uma raiva inconsciente, Wren se rebelou, saindo escondida de casa
à noite e desafiando as regras de seu pai. Chuck não merecia a preocupação
que as ações de Wren causavam a ele, mas tudo estava fora de seu controle.
Não importava o que ele fizesse, Wren encontrava uma maneira de ir contra
ele. Um dia, quando estivesse adulta, ela iria querer voltar no tempo e
estrangular sua versão adolescente.
Ela fez uma pausa, e sua respiração ficou um pouco mais pesada.
— Você está bem? — perguntei. — É melhor parar, se estiver sendo
demais para você.
— Não — ela sussurrou. — Tudo bem.
No entanto, parecia que ela estava se preparando para a próxima parte.
Não demorei muito a entender por quê.
— Como um exemplo triste de como a história pode se repetir… assim
como a mulher que a entregou para adoção, Wren engravidou aos dezesseis
anos.
Merda. Sentindo meu coração na boca, ofereci-lhe um aceno de cabeça
para encorajá-la, incentivando-a a continuar, embora estivesse com um
pouco de medo de ouvir o que aconteceu em seguida.
— Diferente de sua mãe biológica, que escolheu abrir mão do bebê,
Wren decidiu que criaria o seu. Mas… — Wren engoliu em seco. — Ela
sofreu um aborto espontâneo aos três meses de gestação. Ela não sabia como
se sentir… devastada ou aliviada. Se sentia culpada com frequência pelo
alívio. Mas a experiência foi como um despertar, um que levou Wren a uma
vida solitária. Ela imergiu ainda mais nas aulas de violoncelo e parou de sair
escondida. Por mais que Chuck não tivesse mais que se preocupar com ela
nesse aspecto, passou a se preocupar de outra maneira. Porque Wren estava
depressiva. Tudo, a gravidez fracassada, o trauma pela morte prematura de
sua mãe, parecia tê-la bombardeado ao mesmo tempo, de uma vez.
Novamente sentindo-me péssimo por tê-la incentivado a falar sobre isso,
ofereci-lhe minha mão para lhe dar apoio. Ela a aceitou e apertou ao
continuar.
— Wren saiu de sua fase ruim aos dezoito anos, fazendo amizade com o
garoto da casa ao lado, a quem ela aprendeu a amar e confiar implicitamente.
Benjamin acabou indo embora para fazer faculdade, deixando Wren para trás
e terminando com ela quando voltou para casa naquele primeiro Natal.
Depois disso, Wren passou a sempre temer os Natais, porque a data a
lembrava de ter sido pega de surpresa. — Ela encarou o vazio por um
momento. — Wren entrou em um período de autorreflexão depois disso, um
tempo durante o qual percebeu que era mais importante amar a si mesma do
que ser amada por outra pessoa. Isso não significava que ela esperava nunca
mais amar outra pessoa, apenas que entendia que essa não era a coisa mais
importante para a sobrevivência. As fases de sua vida podiam ter sido muito
diferentes, mas seu amor por violoncelo e o apoio de seu pai permaneceram
constantes. Apesar das dificuldades, ela sempre soube o quanto era sortuda
por ter Chuck e sua música.
Ela olhou para mim, e ofereci-lhe um sorriso, sem saber se a história
tinha acabado. Mas, então, ela continuou.
— Em seus vinte e poucos anos, após terminar a faculdade, Wren quis
um novo desafio. Então, decidiu fazer curso de massoterapia para aprender
algo que faria as pessoas se sentirem bem. Embarcou em uma nova carreira e
a amava de verdade. — Sua boca abriu-se em um sorriso. — Um dia, seu
trabalho a levou à casa de um homem misterioso: o lindo e notável Dax
Moody. Ele foi mais do que apenas um cliente. Tornou-se um amigo, e,
eventualmente, Wren se deu conta de que aquele encontro significava muito
mais. — Ela baixou o tom de voz. — Foi através de Dax que Wren
descobriu que tinha um irmão, cuja vida, sem o conhecimento dela, era
muito parecida com a sua. Rafe também perdeu a mãe adotiva que o amava.
Ele também perdeu seu mundo inteiro jovem demais. E como resultado,
perdeu sua voz da mesma maneira que Wren perdera a sua, figurativamente,
após a perda de seu bebê.
Uau. É mesmo.
— Pela primeira vez em sua vida, havia outro ser humano cujo bem-estar
era mais importante para Wren do que o seu próprio. Ela finalmente
compreendeu o que seu pai devia sentir em relação a ela ou o que sentiria em
relação ao filho que nunca teve. Tudo que ela sabia era que, de repente, um
estranho havia se tornado mais importante para ela do que qualquer coisa. —
Wren suspirou. — E ele nem sabe disso. — Ela pausou para me olhar. — O
resto ainda não foi escrito.
Com isso, ela recostou-se para trás e soltou uma forte respiração pela
boca, como se contar sua história tivesse exigido bastante de si.
— Isso foi lindo. Obrigado por compartilhar comigo.
Ela endireitou as costas.
— Obrigada por ouvir.
Embora eu não quisesse, puxei minha mão da sua.
— O melhor ainda está por vir para você. Eu sei disso.
— Esse foi realmente o resumo de toda a minha vida. Todos os pontos
importantes. — Ela enxugou os olhos. — Deus, eu não esperava ficar tão
emotiva.
— É compreensível.
Ficamos bebendo mais vinho por um tempo, e acabei abrindo uma
segunda garrafa. Ainda podia sentir emoções borbulhando em meu peito ao
tentar compreender e apreciar tudo pelo que ela havia passado. Havia muita
coisa que eu não sabia sobre ela ― coisas que ajudaram a explicar por que
ela era uma pessoa tão forte. Eu queria dizer alguma coisa, mas as palavras
não vinham.
— Estou com um problema — ela disse.
— O que houve?
— Estou alterada demais para dirigir para casa.
Dei risada.
— Eu nunca te deixaria dirigir para casa assim. Eu mesmo te levaria, mas
também não estou sóbrio. Vou chamar um carro de aplicativo para você.
Ela balançou a cabeça.
— Você não pode fazer isso.
— Por que não?
— Eu… tenho medo de entrar em carros com estranhos. Não pego Uber
ou táxis por esse motivo.
Meu corpo enrijeceu.
— Aconteceu alguma coisa que te fez sentir assim?
— Um motorista deu em cima de mim, uma vez. E me dei conta de que
eu não tinha poder algum enquanto estava dentro do veículo dele. Aquilo me
assustou pra caramba. Nunca consegui esquecer. Então, escolhi não entrar
mais no carro de ninguém sozinha, a menos que eu conheça a pessoa, é
claro. Sei que isso é estranho, já que vou à casa de pessoas que não conheço.
Mas estar no carro de um desconhecido me assusta bem mais. — Ela mordeu
o lábio inferior. — Você acha isso estranho?
— Não. Faz total sentido.
Seu rosto corou de vergonha.
— Será que eu posso passar a noite aqui?
O que eu deveria dizer?
— Claro que sim.
— Tem certeza de que não tem problema?
Não, eu não sei se não tem problema, não mesmo. Mas não posso dizer
não.
— Você é sempre bem-vinda aqui. Espaço é o que não falta.
— Obrigada. — Wren soltou um suspiro de alívio.
— Vou dormir em um dos quartos de hóspedes — eu disse a ela. — Você
pode ficar com o meu quarto, assim terá privacidade. É o único quarto que
tem banheiro.
— Não posso ficar com o seu quarto, Dax.
— Eu insisto. É o mínimo que posso fazer depois de você fazer Rafe
falar hoje.
— Eu não fiz nada.
— Sim, você fez. Você é uma luz na vida dele, mesmo que ele ainda não
saiba quem você é.
— Bem… fico feliz que você ache isso.
Já que ela não ia embora, Wren e eu escolhemos um filme. Foi bom ter
alguém com quem assistir televisão novamente. Depois que Maren morreu,
parei de assistir televisão completamente; isso sempre me lembrava de que
ela não estava mais ali para assistir comigo. Era uma das poucas coisas que
curtíamos juntos quando estava perto do fim ― uma das poucas coisas que
nos faziam parar de discutir. Por que resolver um debate quando podia
simplesmente encerrá-lo maratonando um documentário de oito episódios?
Nunca nos dávamos tão bem quanto quando assistíamos TV juntos.
Era quase uma da manhã quando levei Wren para meu quarto e dei a ela
uma das minhas camisetas para usar para dormir. Em seguida, fui até a
cozinha e peguei uma garrafa de água e um analgésico, caso ela precisasse
pela manhã. Rafe, que dormia profundamente, não fazia ideia de que ela ia
passar a noite em nossa casa. Eu teria que explicar pela manhã por que ela
estava ali.
Quando fui para o quarto onde dormiria, notei que a casa parecia
diferente só por saber que ela ia dormir ali. Diferente de um jeito bom. Viva.
Tive que, mais uma vez, me lembrar dos limites que impus.
Acordar no quarto de Dax foi como estar no paraíso. Além daquela ser a
cama mais macia em que eu já dormira, tudo tinha o cheiro dele. Cada
centímetro do meu corpo estava sensível.
Surpreendentemente, eu não estava com dor de cabeça, como costumava
acontecer quando eu bebia. Ao invés disso, sentia-me descansada,
confortável e segura.
Nem acreditava que contara tudo a ele na noite anterior. Eu não tinha
vergonha da minha gravidez ― era jovem e ingênua ―, mas ainda era algo
que havia contado a poucas pessoas. Agora, Dax era uma delas. Estava com
medo de que ele me visse com outros olhos agora, mas ele não me passou
essa impressão.
Meu celular tocou, despertando-me dos pensamentos. Era Sam.
Merda. Por que me sinto tão culpada?
Não havia acontecido nada entre mim e Dax na noite anterior. Mas acho
que meus pensamentos em relação a ele me fizeram sentir como se eu tivesse
traído o cara com o qual estava saindo, mesmo que Sam não fosse,
tecnicamente, meu namorado. Nunca concordamos em sermos exclusivos.
Minha voz estava grogue quando atendi.
— Oi.
— O que está havendo? Acabei de passar na sua casa para ver se você
queria ir tomar café da manhã comigo, e o seu pai disse que você não estava.
Sam sabia sobre o meu relacionamento com Rafe, mesmo que o pobre
Rafe não soubesse. Tive que contar a Sam para explicar por que estava
passando tempo na casa de Dax.
Passei uma mão pelos cabelos.
— É, eu, hã… acabei exagerando um pouco no vinho ontem à noite no
jantar, então decidi dormir na casa do Rafe.
— Por que não me ligou para que eu fosse te buscar?
Era uma pergunta justa. Embora Sam estivesse trabalhando no
restaurante quando tomei a decisão de ficar ali, eu poderia tê-lo esperado
terminar seu turno.
— Eu não queria incomodar você, e já tinha dormido na hora em que
você terminou o seu turno. Meu pai estava trabalhando e só poderia vir me
buscar depois da meia-noite. Então, acabei dormindo aqui.
— Quer ir tomar café da manhã? Posso passar aí e te buscar agora.
Eu não estava com muita pressa para ir embora.
— Talvez possamos ir jantar mais tarde, que tal? Ainda não tomei banho
e tenho que fazer algumas coisas hoje.
— Tudo bem, pode ser. Estarei de folga esta noite. — Ele suspirou. —
Onde você dormiu?
Hesitei, incerta sobre como responder àquela pergunta.
— Dax me deu o quarto dele, porque é uma suíte.
— Ah, ele te deu, é?
Franzi a testa.
— Por que falou desse jeito?
— Eu não confio nesse sujeito.
É em mim que você não deveria confiar.
— Eu o conheço há um tempo, Sam. Não há motivos para não confiar
nele. Ele é um cara que está fazendo o melhor que pode. E não deu em cima
de mim, se é isso que está querendo insinuar.
Acredite, eu tentei.
— É melhor mesmo que ele não faça isso.
Mesmo que eu não pudesse culpar Sam por ficar um pouco desconfiado,
sua atitude também foi irritante.
— Então… te vejo hoje à noite, ok?
— Ok — ele disse, soando ainda um pouco zangado.
Depois que desligamos, aninhei-me novamente nos lençóis de Dax e
enterrei-me em seu cheiro sob as cobertas. Nem conseguia me sentir culpada
naquele momento, porque era bom demais. Eu não sabia se teria essa
oportunidade de novo, então decidi deslizar minha mão para dentro da
calcinha e me fazer sentir ainda melhor do que já me sentia.
Por alguma razão, meus pensamentos foram para a mensagem que Dax
recebera na noite passada. Só que fiz de conta que eu a havia enviado,
dizendo a ele que “sentia saudades de seu pau”. Aquilo era tão brega, mas
foi o que me veio à mente.
Imaginei-o aparecendo no meu quarto depois de receber a mensagem.
Arranquei suas roupas antes de me ajoelhar e tomá-lo em minha boca. De
repente, houve uma batida na porta. Minha mão congelou.
— Oi, Wren. Tudo bem aí?
Pigarreei e me sentei.
— Estava, sim.
— Eu te acordei?
— Não.
— Eu queria saber se você gostaria de descer e tomar café conosco.
— Adoraria. Pode me dar, tipo, dez minutos? Só tenho que terminar…
hã, tomar um banho rápido.
E terminar o seu boquete imaginário para poder gozar.
— Sim. Sem pressa. Deixarei tudo pronto em vinte minutos.
Dei risada sozinha. Se Dax soubesse o que havia interrompido…
Após terminar o que comecei e tomar um banho, envolvi-me em umas
das toalhas luxuosas de Dax e voltei para o quarto para me vestir. No
caminho, cedi ao meu lado bisbilhoteiro e abri a gaveta da mesa de
cabeceira. Aquilo era totalmente intrusivo e errado, mas não pude evitar.
Essa podia ser minha única oportunidade de xeretar. Dentro dela, havia
algumas balas de limão, o que supus serem seus óculos de leitura de velho
dentro de uma caixinha e uma caixa de camisinhas. Que vaca sortuda aquela
Adriana. Também notei o diário preto com a flor-de-lis na frente. Eu podia
ser bisbilhoteira, mas não era uma filha da puta. Por mais que eu soubesse
que daria qualquer coisa para descobrir os pensamentos mais profundos e
sombrios desse homem misterioso, eu não ia me apossar dessa informação
roubando-a.
Naquela tarde, já em casa, meu pai tinha perguntas para mim.
— Então… por que você passou a noite na casa de Rafe, mesmo? — ele
perguntou ao mexer seu café da tarde. Meu pai sempre tinha café fresco à
mão e tomava o dia todo.
— Eu já te disse. Acabei bebendo um pouco além da conta e não queria
dirigir. Você estava trabalhando, então eu não podia te ligar.
— Deduzo que você não estava bebendo sozinha.
— É, Dax e eu dividimos um vinho.
— Imaginei. — Ele abriu um sorriso sugestivo.
Sentindo meu rosto esquentar, eu disse:
— Nós nos damos bem. Ficamos apenas conversando. Contei a ele sobre
a minha adolescência e todas as coisas que aconteceram naquele tempo, as
lições que aprendi. Foi bem terapêutico. Eu gosto muito de conversar com
ele. Sempre gostei. Mas não há nada acontecendo entre nós, se é por isso que
está sorrindo assim.
— Isso não significa que você não quer.
— Dax não tem intenção alguma comigo. Ele deixou isso muito claro.
Meu pai soltou uma risada de escárnio.
— Ele deseja você. Só acha que não deveria.
— Por que está dizendo isso?
Meu pai não sabia nada sobre a vergonhosa última massagem, nem sobre
o que Dax já havia dito reconhecendo a química entre nós.
— Senti uma energia entre vocês dois na noite em que ele veio te contar
sobre Rafe. Você estava agitada. Está claro que ele exerce um efeito sobre
você. E vi como ele te olha. Por que ele não estaria encantado?
— Bem, qualquer atração que haja entre nós não importa. Ele se recusa a
até mesmo chegar perto de mim porque sou irmã de Rafe. Ele tem muito
medo de medo de magoá-lo, ou a mim, magoando meu irmão no processo.
Dax e eu teremos que continuar somente amigos, pelo bem de Rafe. —
Baixinho, acrescentei: — Ele anda traçando outra mulher, de qualquer
forma.
Meu pai tomou um gole de café.
— Sam sabe que você passou a noite lá?
Aff.
— Sim. Ele não ficou muito animado. Não confia em Dax, o que é
ridículo porque nem foi ideia dele. Eu meio que não dei a ele outra escolha a
não ser me oferecer um quarto, porque me recusei a deixá-lo chamar um
carro de aplicativo para mim.
Meu pai deu risada.
— Seja honesta, Wren. Você sabe que não pode mentir para mim.
Ele era perceptivo demais.
— Como assim?
— Você sabia muito bem que, se bebesse, não poderia dirigir. Sabia que
eu ia fazer um segundo turno no trabalho e não poderia ir te buscar. Se bem
que você até que poderia ter me ligado mais tarde, mas escolheu não fazer
isso. Você queria passar a noite lá.
Meu pai me conhecia melhor do que ninguém.
— O que você quer que eu diga?
— Não precisa dizer nada, porque, repetindo… eu conheço você.
— Qualquer sentimento que eu tiver por Dax é inútil.
— Você está subestimando a fraqueza dos homens se acha que esse cara
não tem a capacidade de quebrar essa determinação. Quanto mais fizer
coisas tipo passar a noite na casa dele, quanto mais tempo passarem juntos,
mais provável será isso acontecer. Acho que você também precisa decidir se
quer colocá-lo nessa posição.
Belo jeito de me fazer sentir culpada. Mas ele tinha razão.
— Eu não sei o que pensar, pai. Ok? Sim, eu sinto algo por Dax. Sinto
desde o instante em que o conheci, antes de saber quem Rafe era. Mas
também concordo que nada deveria acontecer entre nós. Eu só não consigo
evitar querer ficar perto dele. — Desviei o olhar. — Ele tem um… misto de
força e vulnerabilidade. E quando estou com ele, sempre quero compartilhar
mais coisas do que de costume. E, obviamente, também me sinto atraída por
ele.
— Eu nem tinha notado. — Meu pai riu.
Nas duas semanas seguintes à noite que passei na casa de Dax, Rafe
passou a falar mais. Ele fazia somente pequenos comentários aqui e ali ou
respondia perguntas simples, mas isso era um passo enorme na direção certa.
Dax estava cautelosamente otimista quanto às coisas estarem finalmente
melhorando. Nem preciso dizer que a terapeuta de Rafe e suas professoras
estavam animadíssimas, embora continuassem sem saber a que atribuir essa
mudança. Elas falavam muito a palavra espontâneo.
Rafe passou a me ver como uma amiga da família. Certa tarde, passei na
casa deles em Brookline para buscá-lo enquanto Dax estava no trabalho. A
escola de Rafe estava fechada para reuniões, então ofereci-me para levá-lo a
uma livraria que havia acabado de abrir em Cambridge. Notei que eles
tinham uma vasta seção de histórias em quadrinhos e eu sabia que Rafe ia
adorar.
Pegamos o trem Red Line para a estação Harvard Square e caminhamos
a curta distância até a livraria. Ele escolheu dois livros, pelos quais insisti em
pagar, e comprei um livro de não-ficção para mim. Compramos dois
chocolates quentes em uma cafeteria e levamos nossos novos livros para um
parque ali perto. O tempo estava um pouco frio, mas parecia um dia perfeito
para leitura.
Eu queria aproveitar nosso tempo sozinhos para tentar fazê-lo falar
comigo, então, em determinado momento, enquanto estávamos sentados em
um banco do parque, interrompi sua leitura.
— Não sei se você sabe disso, Rafe, mas perdi minha mãe quando era
criança. Eu tinha cinco anos. Então, entendo o que você está passando.
Queria que soubesse disso. Nós temos muitos interesses em comum, mas eu
não tinha certeza se você sabia que também temos isso em comum.
Ele pareceu pensativo. No entanto, após um longo momento de silêncio,
me chocou completamente.
— Mas você a matou?
O quê? Pisquei.
— Não. Claro que não. Ela morreu em um acidente de carro. Por que
você perguntaria isso?
Ele continuou a olhar para frente.
— Porque eu matei a minha.
Senti-me perdendo o fôlego.
— Do que você está falando?
Maren tinha morrido devido a um aneurisma cerebral, então eu não
conseguia nem ao menos imaginar por que Rafe diria uma coisa daquelas.
Ele começou a tremer.
Pousei a mão em seu joelho.
— Rafe, você pode me contar qualquer coisa. Por que disse isso?
Ele virou para me olhar.
— Na manhã em que ela morreu, eu disse que a odiava. Eu estava sendo
bem cruel porque estava bravo por ela ter me colocado de castigo por uma
coisa que fiz. A última coisa que eu disse para ela foi “Eu te odeio”. Depois,
ela foi para o trabalho e morreu. — Ele escondeu o rosto nas mãos. — Não
falei de coração. Mas quando eu disse que a odiava, isso causou alguma
coisa. Eu sei que sim.
Ele começou a chorar copiosamente. Senti uma tristeza profunda ao
abraçá-lo. Como eu poderia fazê-lo entender que estava errado? No fim das
contas, eu sabia que seria preciso mais do que somente eu para fazer isso
acontecer.
— Rafe, não é assim que funciona. Você não pode matar alguém com
palavras. Nem ao menos disse aquilo de coração.
Ele afastou-se de mim.
— Mas e se ela tiver acreditado?
— As pessoas dizem coisas o tempo todo quando estão bravas. Adultos
sabem que crianças não falam de coração quando dizem essas coisas. Nós
sabemos disso.
Ficamos em silêncio por um momento.
— Foi por isso que você ficou calado esse tempo todo? — perguntei. —
Porque acreditava que as suas palavras poderiam fazer mal às pessoas?
Ele enxugou os olhos ao assentir. Meu coração doeu por ele.
— Compreendo por que chegou a essa conclusão, Rafe. Foi uma péssima
coincidência. Mas não é verdade.
— Como vou saber se você tem razão?
— Não tem como saber. Mas precisa ter fé. E talvez leve um tempo até
que você aprenda a acreditar. Já conversou com a sua terapeuta sobre isso?
Ele negou com a cabeça.
— Não. Só contei a você.
Suspirei.
— Obrigada por se abrir comigo. Mas você também precisa contar à sua
terapeuta, ok? Precisa ouvir a verdade de mais pessoas, além de mim. Eu
juro que você não fez nada de errado. Além disso, a sua mãe não ia querer
que você se sentisse culpado por isso pelo resto da vida. A sua terapeuta vai
poder te explicar isso melhor do que eu.
Seus olhos cor de avelã cintilaram à luz do sol conforme ele passou uma
das mãos por seus cabelos cacheados.
— E se eu nunca conseguir acreditar no que você está dizendo? E se eu
sempre acreditar que a culpa foi minha? Não importa o que você ou a minha
terapeuta digam?
— Acreditar é uma escolha. Você pode escolher acreditar que não fez
mal à sua mãe. Você pode construir a confiança nessa escolha, até que
acreditar se torne saber. É com isso que a sua terapeuta pode ajudar. Mas ela
não vai poder te ajudar se não souber dessa informação vital.
Ele ficou assentindo.
— Ok. Eu vou contar a ela.
Pousei a mão delicadamente em seu braço.
— Posso contar ao Dax sobre isso? Eu sei que você não se abre muito
com ele. Seria mais fácil se eu contasse isso a ele, para que ele possa se
certificar de que você receba a ajuda de que precisa.
Rafe fez uma pausa.
— É. Seria mais fácil. Eu não quero repetir isso, não para ele.
— Ok. — Baguncei seus cabelos. — Você vai ficar bem. Prometo.
Respirei fundo, sentindo-me grata por ele ter se sentido confortável o
suficiente para admitir aquilo.
Cada vez mais, eu sentia que estava chegando a hora de contar a ele a
verdade sobre mim. Mas ainda faltava um pouco.
Uma semana após aquele encontro, Wren ainda não havia entrado em
contato. E eu também não havia tomado essa iniciativa. Eu sabia que ela
viria em algum momento, já que iria querer ver Rafe. Mas, por enquanto,
apreciei o espaço que sua ausência me trouxe.
Pela primeira vez em um bom tempo, eu tinha planos para sair esta noite.
Minha missão era fazer o meu melhor para esquecer Wren e esse dilema por
uma noite. Todo ano, Shannon dava uma enorme festa com o tema Nova
Orleans para comemorar seu aniversário. Era o lugar perfeito para levar
Keely, uma mulher que eu tinha conhecido em um aplicativo de
relacionamentos. Decidi que precisava me forçar a começar a sair com
alguém novamente. Foi a única coisa em que consegui pensar para me
distrair do que havia acontecido com Wren.
Embora meio que parecesse uma penitência, sair com alguém parecia
uma ideia lógica. Assim como convidar Keely para me encontrar na festa de
Shannon na sexta-feira à noite, para que as coisas permanecessem casuais,
caso eu não curtisse. O lugar estaria cheio de pessoas, então parecia
perfeitamente sem compromisso.
Ao encontrar Keely, fiquei o tempo todo na dúvida. Ela era atraente,
simpática. Mas, como eu já estava esperando, tudo parecia forçado. Apesar
de estar naquela festa, eu não conseguia tirar Wren da cabeça. Pelo menos,
Keely e eu nos divertiríamos na festa de Shannon, não importava o que
acontecesse, mesmo que a química entre nós não existisse. Rafe também
estava ali, na sala de TV de Shannon, jogando videogame com o filho dela,
Bobby Jr., que viera da faculdade para a ocasião.
A ruiva Keely e eu nos conhecemos um pouco melhor perto da mesa de
bufê, que continha gumbo1, carolinas e um misto de outras comidas típicas
de Nova Orleans.
Enquanto comíamos, Keely me contou sobre seu trabalho como terapeuta
ocupacional em escolas de Boston, enquanto falei um pouco sobre o meu
trabalho e minha apreciação por Shannon e tudo que ela fez por mim e Rafe.
Em determinado momento, meus olhos percorreram o ambiente, e pensei
que estava vendo coisas. Infelizmente, esse não era o caso.
Ela está aqui?
Logo depois dos olhos de Wren encontrarem os meus, perceberam Keely
ao meu lado.
— O que diabos Wren está fazendo aqui?
Eu não havia percebido que tinha dito aquilo em voz alta até Shannon
responder atrás de mim.
— Eu a convidei.
— Por que não me disse que ela viria?
Compreensivelmente confusa, Shannon deu de ombros.
— Não achei que você teria problema com isso.
— Desculpe. — Balancei a cabeça. — Você está certa. Eu não tenho.
— Quem é Wren? — Keely perguntou.
— Ela… — Está bem na minha frente.
A expressão de Wren estava séria quando ela parou diante de mim.
Forçando um sorriso que provavelmente me fez parecer ter sido forçado
a chupar um limão, eu disse:
— Oi.
Ela soltou uma respiração tensa.
— Que surpresa te encontrar aqui.
— É. Eu não sabia que você viria. — Engoli em seco.
— Onde está aquele rapaz com quem você está saindo? — Shannon
indagou. — Eu te disse que podia ficar à vontade para trazer um convidado.
— Sam e eu não estamos mais saindo.
— Sério? — perguntei.
— Sim. — Ela se virou para mim. — Comecei a gostar de outra pessoa.
E não achei que seria justo desperdiçar o tempo dele.
Engoli em seco com dificuldade.
Ela virou-se para Keely.
— Você está com o Dax?
— Sim.
Wren assentiu.
— Você deve ser a Adriana.
Porra.
— Não, sou a Keely. — Ela olhou para mim. — Quem é Adriana?
— Desculpe. Acho que não consigo acompanhar — Wren disse.
Abruptamente, ela se afastou.
Merda. O que foi que eu fiz?
— Quem é aquela garota? — Keely perguntou.
— É uma amiga — respondi, meus olhos ainda fixos nas costas de Wren
conforme ela seguia para a cozinha. — Pode me dar licença por um
momento?
Quando entrei na cozinha, Wren estava encostada na bancada com a mão
no peito, como se precisasse conter seu coração. Senti-me um merda.
— Wren…
— Não diga nada. — Ela caminhou até o cooler de água e pegou um
copo descartável. — Você não me deve explicação.
— Devo, sim. Eu nunca teria trazido uma pessoa se soubesse que você
estaria aqui.
— Você está saindo com outras mulheres agora? Pensei que só as
fodesse. Bom, qualquer mulher além de mim, aparentemente… Quando sou
eu, você só me fode com a sua língua — ela disse, fervendo. — Agora, uma
semana depois, está saindo com uma nova pessoa? Você parece ter superado
rapidinho o que aconteceu entre nós.
— Eu a trouxe justamente por causa do que aconteceu entre nós.
Ela balançou a cabeça devagar.
— Eu estava ansiosa para te ver aqui esta noite. Porra, me sinto uma
idiota.
Meu estômago estava cheio de nós.
— Não tenho orgulho da decisão que tomei com você naquela noite.
Então, me forcei a encontrar uma distração porque precisava demais de uma.
Eu não… — Tomei um momento para recuperar o fôlego. — Não quero te
magoar.
— Bem, você acabou de fazer isso.
Nós dois viramos os rostos para encontrar Shannon na cozinha. Ela
provavelmente tinha ouvido tudo.
— Desculpe, Shannon — Wren pediu. — Tenho que ir embora.
— Sem problemas, querida. — Shannon me lançou um olhar irritado,
parecendo tanto confusa quanto decepcionada.
Ficamos olhando Wren sair bruscamente da cozinha. Shannon me seguiu
de volta para a sala de estar. Keely havia desaparecido de onde estava perto
da mesa do bufê.
— Onde está Keely? — perguntei, embora não estivesse realmente
preocupado com isso.
— Ela foi embora. Por isso fui atrás de você, para te dizer isso. Quer me
contar o que raios está acontecendo?
Graças a Deus, Rafe ainda estava na sala de TV e não havia
testemunhado esse desconforto. Isso poderia ter sido desastroso.
— Você não deduziu ainda? — questionei.
— Já, sim. Só quero que você saiba que pode conversar comigo. E sinto
muito se causei algum problema ao convidar Wren.
— Você não causou problema algum. — Olhei para a porta. — Preciso ir
encontrá-la.
— Acredito que não esteja se referindo a Keely.
— Não.
— Vá. — Ela me incentivou. — Rafe está bem aqui conosco.
— Tem certeza?
— Sim, tenho certeza.
— Eu te devo uma — eu disse ao seguir para a porta.
— Depois eu mando a conta — Shannon brincou.
Saí com pressa e, assim que cheguei ao ar frio do lado de fora, peguei
meu celular e mandei uma mensagem para Wren.
Dax: Onde você está? Precisamos conversar.
Alguns minutos se passaram, e comecei a duvidar de que ela ia
responder. Mas, então, uma mensagem finalmente chegou.
Wren: Estou indo para casa.
Dax: Você pode me encontrar na minha casa? Ou eu posso ir aonde
você estiver. O que preferir.
Quando ela não respondeu após um longo minuto, digitei novamente.
Dax: Você não me deve nada, mas eu realmente agradeceria a
oportunidade de explicar melhor as minhas ações.
Os pontinhos saltaram por um tempinho antes de ela finalmente
responder.
Wren: Ok.
Seu carro estava estacionado em frente à minha casa quando cheguei. Ela
desceu do veículo e esfregou as mãos nos braços.
— Está frio — eu disse. — Vamos entrar. — Contudo, meu coração
quase parou quando notei que ela estava fungando. — Você está chorando?
— Estou muito emotiva esta noite, e antes que comece a se achar, não é
pelo motivo que você pensa.
Apressando-me até a porta, eu a abri.
— O que está havendo, Wren?
Ela me seguiu para dentro de casa.
— Eu fui à festa para te contar uma coisa importante. E ver você lá com
aquela mulher me desestabilizou.
Fiquei tão chocado mais cedo que não havia apreciado de verdade quão
absolutamente deslumbrante Wren estava no vestido verde-esmeralda que
usava. Tinha alguns brilhos sutis e delineava seu corpo perfeito como uma
luva. Seus olhos azuis cintilavam diante das luzes na minha antessala. Ela
me tirava o fôlego.
— Venha cá. — Puxei-a para meus braços, a única coisa que parecia
certa naquele momento. Inspirando profundamente seu cheiro, falei contra
seus cabelos: — Me desculpe. Tenho feito todo o possível para esquecer o
que aconteceu entre nós. Não consigo me perdoar por minha fraqueza.
Pensei que, se eu me forçasse a levar aquela mulher para sair esta noite,
talvez eu pudesse mudar a direção da minha vida e fingir que não tinha
fodido tudo com você. Nunca imaginei que você estaria lá. — Eu queria
ficar ali, segurando-a em meus braços, mas ela se afastou.
— Não foi como se você tivesse olhado para mim e feito as minhas
pernas se abrirem magicamente, Dax. Eu também quis. Eu queria mais…
mas você me mandou embora antes que isso pudesse acontecer. Então, pare
de se culpar pelo que fizemos. Está feito e pronto.
Suas palavras me fizeram sentir um pouco melhor, mas eu não merecia
um pingo da paz de espírito que ela havia oferecido.
— O que você precisa me contar? — perguntei.
Seu peito subiu e desceu com a respiração pesada.
— Descobri hoje que consegui o cargo para dar aulas de música na
França.
Talvez animação devesse ter sido a minha primeira reação. Em vez disso,
meu estômago gelou.
— O quê? — Forcei felicidade. — Conseguiu? Isso… isso é ótimo, não
é?
— É um contrato de dois anos.
Dois anos?
— Você é obrigada a se comprometer com isso?
— Bom, ninguém vai me mandar para a cadeia se eu me sentir infeliz e
quiser vir embora. Mas, ao aceitar, vou assinar um contrato por um período
de dois anos, durante o qual não devo sair ou ir trabalhar em outra escola.
Isso está mesmo acontecendo. Ela vai embora. Um misto de pânico e
alívio me bombardeou. Abri e fechei a boca algumas vezes.
— Eu nem sei o que dizer. Acho que sabíamos que isso poderia
acontecer, mas ainda parece um pouco surreal. É isso que você quer, não é?
Ela limpou o canto do olho.
— É engraçado… eu pensei que sim. Até realmente conseguir. Agora,
estou meio que surtando.
— Por quê?
— Estou empolgada com a possibilidade de viajar, mas não quero deixar
o meu pai. Não quero deixar Rafe — ela sussurrou. — Ou você.
Meu peito doeu.
— Mas você vai aceitar, não é?
Ela olhou para os pés por um momento.
— É, acho que sim.
Que bom. Isso era bom, certo? Eu deveria estar aliviado por saber que ela
não ia deixar nada entre nós influenciar sua decisão. Contudo, o sentimento
em meu peito certamente não era alívio. Senti como se tivesse sido
eviscerado.
Mas eu não ia impedi-la de fazer algo que sempre sonhou ― viajar para
a Europa. E agora ela teria a chance de morar lá por um tempo, algo que eu
mesmo não havia feito. Essa não somente era uma oportunidade que surgia
uma vez na vida, como também lhe concederia um espaço muito necessário
longe de mim. Aquilo parecia mais imperativo do que nunca.
— Estou me sentindo perdida, dividida entre dois sentimentos
diferentes… felicidade e tristeza — ela disse.
É, eu me identifico.
— Bom, fico feliz que você saiba que recusar não é uma opção. Você vai
sentir medo. Deixar o que conhece vai ser estranho. Mas você não vai se
arrepender.
O que ela disse em seguida me surpreendeu.
— Eu quero contar a ele, Dax.
Levei um segundo para entender.
— Você quer contar a verdade ao Rafe?
Ela confirmou com a cabeça.
— Não nesse exato momento, mas antes de ir. Tenho pensado bastante
sobre isso. Quando eu voltar, ele vai ter quase dezesseis anos. Não quero que
passe todo esse tempo sem saber. Isso dará mais contexto a ele quanto à
minha vontade de manter contato enquanto estiver longe. Sinto que ele está
melhor agora e poderá lidar com isso. O que você acha?
Esfreguei a barba em meu queixo ao processar aquilo. Não pude pensar
em um motivo para não contar a ele, especialmente diante do fato de que ele
estava muito melhor desde o último mês.
— Acho que você tem razão. Se a sua intuição está te dizendo que esse é
o momento certo, acho que devemos contar a ele.
— Que bom que você concorda.
Assenti. Eu não fazia ideia de como ele reagiria. Inspirei um pouco de ar.
— Quando você vai?
— Querem que eu esteja lá no dia 1º de junho. Provavelmente irei no
final de maio, para começar a me adaptar. Vou dar aulas em um programa de
verão, inicialmente, e, logo em seguida, começarei a lecionar no semestre
regular que inicia no outono.
Menos de três meses. Aquilo me atingiu como um soco no estômago.
— Vou deixar você decidir quando sentir que está na hora de ter essa
conversa — eu disse.
— Eu pretendia contar a ele algumas semanas antes de viajar. Assim,
ainda estarei por aqui durante um tempinho, caso ele tenha perguntas.
— Apoiarei qualquer decisão que você tomar. E Shannon e eu estaremos
ao lado dele, caso ele demore um pouco a processar.
Wren me fitou nos olhos.
— Também precisamos conversar sobre nós.
Senti uma rocha se alojar em meu estômago.
— Faz uma semana e meia que não consigo pensar em outra coisa além
de você — ela confessou.
Em vez de admitir que eu estava com o mesmo problema, perguntei:
— Quando você terminou com o Sam?
— Nem sei se existia algo para terminar, porque não éramos exclusivos.
Mas fui vê-lo logo depois de sair do seu escritório naquela noite.
Assenti, odiando-me pelo rastro de orgulho doentio que senti ao ouvir
aquilo ― como se eu fosse o Rei da Chupada, arruinando-a para todos os
outros homens.
— Depois do que experienciei com você, eu soube que precisava agir —
ela continuou. — Não fazia sentido continuar enrolando-o. Se teve uma
coisa que aprendi depois do que aconteceu entre nós foi que mereço sentir
aquele tipo de fogo ardente com alguém. Mesmo que você e eu não
possamos ficar juntos, você me mostrou como é. E eu definitivamente não
tive uma experiência dessas com Sam. — Ela olhou em meus olhos. — Não
foi somente o que você fez comigo na sua mesa. É como me sinto cada
minuto que passo com você, Dax. Mesmo quando estamos apenas
conversando. Eu…
Suas palavras sumiram, mas ela não precisou explicar mais. Eu sabia
exatamente o que ela queria dizer. Dei alguns passos em sua direção, ficando
mais perto.
— Eu sei que, por ter me visto com uma mulher esta noite, você acha que
não ligo para o que aconteceu entre nós. Mas é totalmente o contrário. Sinto
exatamente tudo que você sente, se não mais.
— Então, transar com outra pessoa seria a solução para saber lidar?
— Eu juro que não tinha a menor intenção de dormir com ela. Não foi
por isso. Foi para fugir feito louco do que vem acontecendo entre nós. —
Passei os dedos pelos cabelos. — Eu sou errado para você por tantas razões,
Wren. Mesmo que não fosse irmã de Rafe, eu não seria certo para você. É
importante que também saiba disso. Tenho muitas merdas mal resolvidas.
Você merece alguém que possa abrir o coração para você sem bagagens e
problemas que precisam ser trabalhados e superados. — Suspirei. — Minha
atração sexual e minha admiração por você não são uma desculpa para fazer
vista grossa para a dura verdade. Eu sou o homem errado para você. Acho
que você precisa muito dessa sua nova aventura, e isso colocará um espaço
entre nós.
— Você acha que estou tão viciada em você que a única coisa que pode
me impedir é um oceano entre nós?
— Não. Sou eu que preciso de um oceano entre nós, porque sou eu que
estou viciado em você. — Dizer aquelas palavras foi como retirar um peso
do meu peito. — Estou viciado pra caralho em você — repeti. — Não
consigo parar de sentir o seu sabor na minha língua. Mas se esse fosse o
único problema, talvez eu pudesse aguentar. Não é somente físico. Não
consigo parar de ver os seus vídeos de música; faço isso desde o momento
em que os descobri. Quase todas as noites. Você sabia disso? E não consigo
parar de pensar nas nossas conversas, porque elas me fazem refletir sobre a
vida. Elas me fazem querer escrever na porra daquele diário e fazer coisas
que nunca me imaginei fazendo. Você tem um jeito de me fazer sentir
melhor comigo mesmo, até quando não mereço. Não consigo parar de pensar
em você. — Baixei o tom da minha voz. — E isso realmente precisa parar.
Porque eu não quero arruinar a sua vida… ou a de Rafe. O garoto já está
traumatizado o suficiente. É isso que faço. Eu magoo as pessoas. —
Sentindo minhas barreiras cederem, senti um caroço na garganta. — Eu fui
um marido terrível, Wren.
— Como assim? — Ela piscou. — Você foi infiel?
— Não. Mas não dei à minha esposa o tipo de afeição que ela merecia.
Eu amava Maren, mas… — Pausei. Isso era muito difícil de admitir. — Não
acho que estava apaixonado quando tomei a decisão de me casar com ela. O
maior pecado da minha existência sempre será o fato de tê-la feito
desperdiçar os dois anos de sua vida em que esteve casada comigo. Ela
poderia ter ficado com alguém que realmente a merecia. Pensei que eu
poderia me tornar esse homem. Eu queria amá-la daquele jeito profundo, de
sufocar a alma.
Eu pensava que não era capaz disso, até esse sentimento surgir em mim
por Wren. Mas eu não ia admitir isso para ela esta noite.
— Então, por isso… — eu disse. — Eu com certeza não mereço uma
segunda chance, se ela não poderá ter uma. Isso seria fodido demais até para
colocar em palavras. Eu sou fodido demais para colocar em palavras. E isso
me faria perigoso para você.
Ela balançou a cabeça.
— Você não me assusta, Moody.
Soltei uma longa e frustrada respiração pela boca.
— Você está me chamando de Moody de novo. Acho que não me odeia
mais.
— Eu queria te odiar. Queria não… — Ela hesitou.
Eu também, Wren. Eu também. Eu senti o resto daquela sentença. Havia
infinitas maneiras de terminar aquela frase.
Eu queria não…
Eu queria não querer te prender contra a parede agora mesmo.
Queria não gostar tanto assim de você.
Meu celular apitou.
Shannon: Rafe é mais que bem-vindo para passar a noite aqui. Ele
pode dormir no quarto antigo de Mikey. Também temos várias
roupas que servirão nele. Ele ainda está se divertindo jogando
videogame. Devo levá-lo de volta somente pela manhã?
Merda. Rafe voltar para casa esta noite teria sido a única coisa capaz de
evitar que eu me enfiasse em encrenca. No entanto, eu não ia impedi-lo de se
divertir só porque não podia confiar em mim mesmo com Wren.
Dax: Seria ótimo. Obrigado. Que bom que ele está se divertindo. Te
devo mais uma.
Shannon: Não vou perguntar o que você vai fazer com esse tempo
livre.
Suspirei. Era melhor nem comentar isso.
— É a Keely? — Wren revirou os olhos.
— Não. É Shannon. Rafe vai passar a noite na casa dela. Ele está se
divertindo jogando videogame.
Nossos olhares se prenderam.
— Você quer que eu vá embora?
— Se eu acho que você deveria ir embora? Sim. Se eu quero que você vá
embora? — Balancei a cabeça. — Não.
Sua boca curvou-se em um sorriso.
— Posso te pedir um favor?
— Sim.
— Você pode me dar esta noite?
Meu coração acelerou.
— Te dar o quê, exatamente?
— Uma noite inteira com você. Apenas passar tempo juntos. Nada mais.
Agora que sei que vou embora, tempo com você é muito importante para
mim.
— Você acha mesmo que passarmos uma noite juntos é uma ideia
inteligente?
— Isso não tem a ver com sexo. Porque, acredite ou não, e especialmente
agora que vou embora, acho que seria uma má ideia. Não quero que se sinta
culpado. Você já tem coisas o suficiente para se preocupar. — Ela suspirou.
— Mas esta é provavelmente a única vez em que Rafe não estará em casa até
eu ir embora. Não quero te deixar esta noite.
— Tempo sozinho com você nessa casa me soa perigoso pra caralho.
Wren deu de ombros.
— Então, talvez eu queira flertar um pouco com o perigo. Mas não vou
nos deixar ultrapassar esse limite. — Ela abriu um sorriso perverso. —
Talvez chegar bem perto dele, mas não ultrapassá-lo.
O sorriso iluminou seu rosto e aqueceu minha alma fria.
Deixando minhas inibições um pouco de lado, estendi a mão e entrelacei
meus dedos aos dela.
— Eu quero você aqui comigo esta noite.
— Vou ficar no quarto de hóspedes, desta vez. Eu insisto. Mas faremos
uma festa do pijama primeiro. — Ela riu. — Ah, e tenho um pedido estranho
para te fazer.
Ergui as sobrancelhas.
— Tudo bem…
— Quero te ver lendo um livro na sua poltrona com os seus óculos de
velho.
Joguei a cabeça para trás com uma risada.
— Por quê?
— Porque já imaginei isso, e quero ver só uma vez. Quero ver você
lendo.
— O que você vai fazer enquanto eu estiver lendo?
— Apenas observar você. — Ela começou a se afastar.
— Aonde vai?
— Ao seu quarto, para vestir algo mais confortável.
Enquanto ela estava no andar de cima, encostei-me contra a bancada,
puxando os cabelos. Eu precisava ir ao psiquiatra por concordar com essa
festinha do pijama. Tinha quase certeza de que estava me enganando se
acreditava mesmo que nada ia acontecer esta noite. Mas também me sentia
revigorado. Eu amava tê-la ali.
Ela voltou para o andar de baixo usando uma das minhas camisetas azul
e laranja da Universidade de Syracuse, cujo comprimento quase chegava aos
seus joelhos. Meu pau ficou atento diante da visão de seus seios
pressionando o tecido. Vê-la usando a minha camiseta era tão sexy.
— Eu não sabia que você tinha feito faculdade em Syracuse — ela disse.
— Fiz. — Sorri. — Você fica muito melhor do que eu nessa camiseta.
— Sua vez — ela falou. — Vá colocar as suas roupas confortáveis para a
noite. Vou fazer chá e alguns lanches para nós.
Eu precisava não pensar demais esta noite e aproveitá-la em sua essência:
uma noite com uma das minhas pessoas favoritas. Autocuidado e tal.
Após me trocar, voltei para a cozinha e encontrei Wren explorando os
armários, pegando algumas coisas e fazendo o tipo de bagunça que essa casa
precisava desesperadamente. Isso era vida. Ela era vida. Eu amava seu caos,
e, por um breve momento, desejei que essa fosse a minha realidade, que eu
pudesse tê-la ali todos os dias assim. Esse pensamento foi imediatamente
seguido pelo alívio de saber que ela ia embora do país, então eu não teria a
chance de estragá-la.
— Cadê os seus fundos de garrafa? — ela perguntou.
— Como assim? De vinho?
— Não. Os seus óculos, coroa.
Dei risada.
— Não se preocupe. Eles estão na minha pasta, que está na mesa da
cozinha.
Ela me olhou de cima a baixo.
— Gostei do seu traje.
Baixei a cabeça e olhei para minha roupa. Eu havia vestido uma camiseta
branca e uma calça de moletom cinza.
— Você me disse para ficar confortável. É isso que costumo usar quando
estou em casa.
— Viu? Eu nunca saberia disso se não passássemos a noite juntos. — Ela
piscou para mim. — Estou juntando algumas besteiras para comermos. Não
sei cozinhar. Já falamos sobre isso?
— Não. Mas eu também não sei. Acho que podemos descobrir como
esquentar as coisas no forno juntos.
Wren preparou um misto de coisas, a maioria retirada do freezer: mini
pizzas, nuggets de frango e batata doce frita. Ela fez dois pratos.
Levamos a comida para a sala de estar e comemos juntos no chão perto
da lareira. Era incrível como essa noite, que começara como um primeiro
encontro desajeitado com uma estranha, havia se transformado em uma
surpresa agradável.
Colocamos música para tocar, e Wren me contou algumas histórias sobre
sua infância em Boston. Ela ouviu com muito interesse quando falei sobre o
meu negócio, e expliquei como investia milhões de dólares do dinheiro de
outras pessoas todos os dias, como um constante jogo de Monopoly.
Deleitei-me com cada risada, cada sorriso. Senti como se tivesse vinte anos
novamente, como se estar perto dela tivesse feito com que eu me conectasse
com o meu eu mais jovem e despreocupado ― a pessoa que eu era antes de
perder a minha família, perder a minha esposa, perder a mim mesmo. Pela
primeira vez em muito tempo, mesmo que somente por uma noite, meus
problemas pareceram estar a anos-luz de distância.
1 É um guisado ou uma sopa grossa, geralmente com vários tipos de carne ou mariscos, que se come
com arroz branco. (N.T.)
Ver Dax usando seus óculos era ainda melhor do que eu esperava.
Enquanto ele estava em sua poltrona, fazendo a minha vontade, lendo seu
livro, eu estava no chão próximo a seus pés com as pernas cruzadas. Peguei
uma manta enquanto o fogo crepitava e abri um livro que tinha escolhido em
sua estante: As Coisas Que Não Podemos Dizer. Embora ficção histórica não
fosse a minha praia, eu queria passar esse tempo tranquilo com ele,
juntando-me a ele em um de seus hobbies favoritos. Sempre fantasiei sobre
esse momento.
Estava ficando tarde. Eu sabia que essa noite acabaria rapidinho, mas
queria aproveitar cada segundo dela.
— Você pode me contar a sua história, Dax?
Ele retirou os óculos.
— Minha história…
— Sim. Lembra que te contei a minha? Você pode me contar a sua em
terceira pessoa?
Eu sabia que era um pedido difícil. Mas, se não fosse esta noite, quando
eu teria a chance de ouvi-la? Meu peito apertou diante daquele pensamento.
Ele fechou seu livro.
— Pensei que esta noite deveria ser divertida…
Balancei a cabeça.
— Você não precisa contar, se não quiser. Não quero te chatear nem
estragar o seu humor. Mas eu adoraria saber mais sobre o Moody. Você só
me contou alguns pedaços, e eu quero saber de tudo.
Para minha surpresa, ele deixou o livro de lado e se levantou da poltrona.
— Acho que vou precisar de vinho, então.
Minhas esperanças aumentaram. Ele acabou de concordar?
— Francamente, estou surpresa por termos chegado até aqui sem vinho
— provoquei.
Ele foi até a cozinha, retornando com uma garrafa de vinho tinto e duas
taças.
— Você é a única pessoa capaz de me convencer a isso, sabia? — Ele
suspirou. — Vai ter que me dar um desconto, porque não sei se consigo
contar a minha história com a mesma desenvoltura que você contou a sua.
Talvez eu faça muito mais pausas.
— Por mim, está perfeitamente bem. — Sorri. — Não há regras.
Ele acomodou-se na poltrona, e, mais uma vez, sentei-me aos seus pés.
— Ok… — Ele tomou um longo gole de vinho antes de começar. —
Então… Dax Moody era o filho mais velho de três meninos, nascidos de
Alexander e Mona Moody. Sua infância foi bem tranquila. Não houve nada
particularmente ruim ou traumático, coisa pela qual ele é grato. Sua vida em
Catskills (New Paltz, Nova York, para ser exato) foi bem privilegiada. Sua
família era rica, e Dax nunca precisou pedir por mais nada. Mas seu pai não
era amoroso e trabalhava constantemente. E mesmo que sua mãe tenha feito
o melhor que pôde para manter a família unida, ela parecia viver com medo
de seu marido. Mona sempre fazia tudo que Alexander queria, mesmo algo
que fosse contra seu bom senso. Ela não parecia ter uma mente própria ou
força de vontade. Dax era próximo de seus irmãos, Mitch e Stephen. Os três
sempre se apoiavam, ou, pelo menos, era o que Dax pensava na época.
Ele pausou por um momento, parecendo ponderar o que dizer em
seguida. Esperei até ele finalmente continuar.
— Dax teve uma namorada durante o ensino médio, mas ele partiu seu
coração ao terminar o relacionamento pouco tempo antes dos dois irem para
faculdades diferentes. Ele queria um novo começo em Syracuse e não queria
que nenhum dos dois se sentisse preso. Foi provavelmente a decisão mais
madura que ele já havia tomado na vida, embora ela nunca o tenha perdoado
por isso. Kayla entrou em depressão e, eventualmente, começou a tomar
remédios. Ela ligava para Dax de sua faculdade na Pensilvânia em um transe
induzido por drogas, xingando bastante e culpando-o por sua depressão.
Graças a Deus, ela acabou se recuperando após a faculdade. Mas Dax
sempre se culparia pelos anos em que ela ficou viciada em drogas. Se algo
tivesse acontecido com ela, ele nunca teria se perdoado.
Ele virou-se para mim, e vi a vergonha estampada em seu rosto. Estendi
minha mão para segurar a sua, oferecendo-lhe apoio.
— Parecia que sempre que Dax tomava uma decisão que lhe favorecia,
acontecia algo que o fazia se sentir culpado. Depois de Syracuse, seu pai
esperou que ele voltasse para casa para trabalhar no negócio da família. A
Moody Cimentos era a maior empresa de cimento de toda Catskills. Mas, em
vez disso, Dax decidiu ir para a Universidade de Boston fazer seu MBA.
Buscou por qualquer coisa que pudesse fazer para adiar a inevitabilidade de
ficar cimentado, por falta de uma palavra melhor, no negócio da família. O
pai de Dax sempre presumiu que seus três filhos administrariam a empresa
juntos. Enquanto estava na pós-graduação, Dax informou que não queria
administrar a Moody Cimentos com os irmãos, então seu pai o deserdou. —
Dax balançou a cabeça lentamente, parecendo perdido em suas lembranças.
Então, seus olhos escureceram.
— Surpreendentemente, Alexander também conseguiu colocar seus
outros dois filhos contra Dax. Essa foi a parte que Dax não previra. De certa
forma, ele sabia que perderia seu pai, e sua mãe, por tabela, se escolhesse
seguir seus sonhos. Mas nunca pensou que também perderia seus irmãos. —
Ele fez uma pausa. — Enquanto Dax lutava para ser excelente na pós-
graduação e poder, um dia, fazer seu nome no setor financeiro, entrou em
uma depressão profunda, e provavelmente pela primeira vez, pôde se
identificar com a traição que Kayla sentira depois que ele terminou o
relacionamento com ela. — Ele apoiou a cabeça nas mãos. — A pressão foi
demais para Dax, e ele começou a experimentar drogas recreativas. — Ele
olhou para mim. — Mas, pela graça de Deus, ele se recompôs antes de ir
parar no fundo do poço. Na verdade, seu colega de quarto, um cara incrível
chamado Tyler Brinkman, teve uma imensa participação ao ajudá-lo a
enxergar que as coisas estavam saindo do controle. Dax pediu uma licença
da faculdade e entrou em uma clínica de reabilitação, conseguindo se
reconstruir antes que se destruísse por completo.
Soltei a respiração que estava prendendo.
— Dax voltou para a pós-graduação com força total, conseguiu um ótimo
emprego após se formar, e, aos quase trinta anos, tornou-se um dos melhores
capitalistas de risco da cidade, trabalhando, em determinando momento, sob
a supervisão de Maren Wade, na Stryker Investimentos. — Dax sorriu. —
Sua chefe era uma mulher notável. Além de administrar uma empresa, era
mãe de um garoto que adotou quando ele tinha oito anos. Quando,
eventualmente, Dax saiu daquele emprego para assumir um cargo em outra
firma, ele e Maren tornaram-se próximos em um nível pessoal. Ela parecia
apaixonada por ele, e ele sentiu-se sortudo por receber essa admiração. —
Seu olhar se desviou para a lareira. — Maren lhe deu o tipo de amor que ele
não recebia mais de sua família. Ela respeitava suas ambições, o fazia se
sentir querido e protegido. Lá no fundo, Dax sabia que não estava
apaixonado por Maren da maneira que é preciso estar para se comprometer a
passar o resto da vida com alguém. Mas ele queria tanto retribuir aqueles
sentimentos. Ele não queria perdê-la. Então, quando ela sugeriu que eles
fossem para Las Vegas em um fim de semana e se casassem lá, Dax
concordou. Afinal, ele não podia mais imaginar sua vida sem ela. Contudo,
na época, ele ainda não havia se dado conta de que um casamento era feito
de mais do que somente respeito mútuo e admiração ou uma sensação de
segurança. Para que realmente desse certo, teria que existir paixão. — Ele
expirou. — Dax nunca se perdoará por não ter percebido isso antes, por não
ter dado o tipo de amor que ela merecia, e por desperdiçar seu precioso
tempo. Ele passará o resto da vida tentando se redimir por esse erro trágico,
garantindo que Rafe, o filho que ela tanto amava, sempre tenha tudo que
precisar.
Dax fechou os olhos, e senti que talvez isso estivesse ficando pesado
demais para ele.
— Você pode parar — eu o assegurei.
— Não. Tudo bem — ele murmurou antes de respirar fundo e continuar.
— Após a morte repentina de sua esposa, Dax sentiu-se perdido, totalmente
consumido pela culpa e sentindo um vazio que nunca havia sentido antes.
Nada se comparava àqueles sentimentos, nem mesmo o abandono de sua
própria família. Um dia, ele decidiu investigar o passado de Rafe, para assim
ver se poderia encontrar alguém que pudesse amar o garoto da maneira que
Dax se sentia quebrado demais para ser capaz. Essa busca o levou a
descobrir que Rafe tinha uma irmã biológica mais velha. — Ele sorriu. —
Dax bolou um plano para conhecê-la, fingindo ser um de seus clientes,
fazendo-a acreditar que ele queria apenas uma massagem. Mas Wren não foi
a única enganada. O maior enganado em toda essa história foi o próprio Dax.
Porque, desde praticamente o instante em que ela olhou em seus olhos, ele se
sentiu diferente. Sentiu algo que nunca havia sentido antes: uma atração
magnética em direção a outro ser humano. Estivesse ele ouvindo-a tocar seu
violoncelo de forma hipnotizante ou tendo uma conversa honesta com ela,
Wren o fazia se sentir humano novamente. Mas a grande ironia disso tudo?
Wren era a única mulher que Dax não podia conquistar. Ele havia prometido
nunca magoar o filho de Maren. E pretendia cumprir essa promessa. E, de
qualquer forma, havia muitas outras razões pelas quais ele não era certo para
ela. Mas entender isso não o impedia de sonhar com ela à noite. Portanto,
sua vida seguia em um dilema. — Ele virou para mim. — O resto ainda não
foi escrito — ele sussurrou, repetindo a frase que eu usara quando terminei
de contar a minha história.
Dominada pela emoção, levantei-me e sentei-me na poltrona com ele,
segurando seu rosto entre as mãos e olhando em seus olhos.
— Obrigada por compartilhar tudo isso comigo. Ninguém jamais me fez
sentir o que você me faz. É assustador, e, ao mesmo tempo, compreendo
tudo que você disse. Mas todos nós merecemos uma segunda chance, Dax. E
não é diferente com você apenas porque cometeu erros. E você é tão pouco
responsável pelo que aconteceu com Maren quanto Rafe. Você está fazendo
o melhor que pode todos os dias, e eu te respeito muito por isso. — Meus
olhos marejaram. — Obrigada por cuidar do meu irmão. Obrigada por me
encontrar e me conceder o presente de conhecê-lo. E o presente de conhecer
você. Pode até sentir que a sua vida não foi nada perfeita, mas você é uma
das pessoas mais influentes na minha vida.
Seus olhos queimaram nos meus.
— Você merece o mundo, linda garota. Espero que os próximos dois
anos sejam os mais incríveis da sua vida.
Dax puxou-me para ele, juntando minha boca à sua. Eu não estava
esperando que ele fosse me beijar esta noite, mas também fiquei feliz por ele
tê-lo feito. Isso parecia ser tão natural entre nós. Como um ímã. Esse beijo
foi diferente do primeiro. Não foi urgente e frenético. Foi firme e
apaixonado. Por ser mais lento, senti aquele contato em todas as fibras do
meu ser, como se, a cada segundo, ele estivesse juntando sua alma à minha.
Sua calça de moletom não ajudava em nada a conter sua ereção, e sem
poder evitar, movi-me para seu colo, friccionando-me contra o calor sob
mim, mesmo que somente por um minuto. Eu queria senti-lo dentro de mim
mais do que já quisera qualquer coisa na vida, mas sabia que tinha que parar
de incitá-lo. Como meu pai dissera, homens só conseguem se controlar até
certo ponto. E algo me dizia que, se nós dois perdêssemos o controle esta
noite, eu ficaria ainda mais viciada do que já estava. Não conseguiria entrar
em um avião e deixá-lo. Do jeito que as coisas estavam, já seria difícil o
suficiente. Mas também me dei conta de que a noite era uma criança. Não
confiava em mim mesma.
Ao nos afastarmos para recuperarmos o fôlego, forcei-me a sair de cima
dele e voltei para meu lugar no chão.
— Posso te pedir um favor? — ele perguntou, passando os dedos sobre
os lábios, ainda inchados do nosso beijo.
— Claro.
— Você pode tocar violoncelo para mim uma vez, antes de ir embora?
— Tipo um show particular?
— Sim. Ao vivo e em cores.
— Claro que sim. Não faço isso para qualquer pessoa, mas farei para
você.
Eu faria qualquer coisa que você me pedisse, e esse é o problema.
Ficamos acordados conversando até não podermos mais negar que já era,
de fato, madrugada. Queria que essa noite nunca acabasse.
— Posso ficar em um dos quartos de hóspedes — insisti.
— Você não gostou do meu quarto?
— Eu amei o seu quarto. Mas não é necessário. Posso ficar em um dos
outros quartos, dessa vez.
Dax e eu subimos as escadas, e ele acendeu as luzes de um de seus dois
quartos de hóspedes. A decoração tinha uma vibe feminina, e eu soube que
Maren devia tê-lo decorado.
Olhei em volta.
— Tenho tudo de que preciso aqui. — Exceto você.
Dax pareceu em conflito. Como se, talvez, não quisesse mais que eu
passasse a noite ali? Ele ainda estava com dúvidas?
— O que foi? — perguntei.
Ele mordeu o lábio.
— Eu quero você na minha cama.
— Vou ficar bem nesse quarto, é sério — insisti.
— Comigo, Wren — ele esclareceu.
Arrepios percorreram minha espinha. Era o que eu queria, é claro, mas
não entendi a mudança repentina de sua postura.
— Você não acha que é uma má ideia?
— Acho. Acho que é uma ideia péssima pra caralho. Mas quero deitar ao
seu lado mesmo assim, te abraçar por apenas uma noite. Estou sentindo que
essa é a minha única chance.
Me aproximei dele.
— Não há nada que eu queira mais do que deitar ao seu lado esta noite.
Ele me ofereceu sua mão.
— Vamos, então.
Conforme Dax me conduzia pelo corredor até seu quarto, parecia surreal.
Eu não fazia ideia do que esperar, mas estava grata por poder abraçá-lo, pelo
menos.
Assim que entramos em seu quarto, que estava com as luzes fracas, Dax
retirou seu relógio e o colocou sobre a mesa de cabeceira. Sentei-me na beira
da cama, inesperadamente nervosa.
— Não se preocupe. Não vou te morder enquanto você estiver dormindo
— ele disse.
— Droga. Estava contando com isso — brinquei, apesar do meu
nervosismo.
Quando os papéis haviam se invertido, deixando-o confiante, e eu, uma
pilha de nervos? Ele puxou o edredom e os lençóis e eu deitei na cama. Ele
veio logo em seguida e ficou de frente para mim.
Pousando a cabeça no travesseiro, confessei:
— Eu sei que você disse que podia sentir o meu cheiro nos seus lençóis,
mas tudo que pude sentir foi o seu cheiro na última vez em que dormi aqui.
Isso me manteve acordada, de uma maneira dolorosamente boa. Mas nada se
compara a isso… deitar ao se lado.
Ele baixou o tom de voz.
— No que você estava pensando quando sentiu o meu cheiro nos
lençóis?
Acariciei sua bochecha.
— Fiquei fingindo que você estava aqui.
— Como se faz isso? Fingir que estou com você? Pegou o travesseiro ou
algo assim e o chamou de Moody?
Corri a ponta do dedo por seu queixo.
— Você quer mesmo saber o que fiz?
— Sim, quero — ele disse sedutoramente.
— Eu me toquei pensando em você. Quando você bateu à porta para me
avisar sobre o café da manhã, interrompeu o meu momento.
— Porra, não me diga isso. — Ele enterrou o rosto no travesseiro. — Eu
deveria ter entrado.
— Me toquei bastante pensando em você nesses últimos meses —
confessei.
— Você não é a única. Quase arranquei meu pau pensando em você.
Aconchegando-me em meu travesseiro, eu falei:
— Tenho outra confissão.
Ele pousou uma de suas mãos na minha bochecha e roçou o polegar em
minha pele.
— Bem, parece que esta é a noite das confissões. Me conte.
— Na primeira vez em que fiz massagem em você, minha calcinha estava
molhada.
Ele fechou os olhos.
— Jesus.
— Isso nunca tinha acontecido comigo antes.
— Acho que nunca vou me recuperar depois de ouvir você dizer isso.
Dei risada.
— Foi aí que eu soube que estava encrencada com você.
— Eu bati uma no chuveiro antes de voltar lá para baixo e te encarar de
novo naquele dia. Mas nunca imaginei que você tinha se sentido assim na
primeira vez.
— Como não me sentiria? Você é o homem mais lindo que já vi.
Ele acariciou meus cabelos.
— Me sinto atraído pra caralho por você. Fico abismado toda vez que te
olho. — Ele desceu a mão e puxou o tecido da camiseta que eu estava
vestindo. — E eu amo você usando a minha camiseta.
Eu amo você usando a minha camiseta. Ouvir as palavras eu amo você
saírem de sua boca me deu arrepios por um segundo antes do meu cérebro
registrar o contexto. Eu sabia, em algum nível, que eu podia estar me
apaixonando por Dax. Não conseguia imaginá-lo dizendo aquelas três
palavras para mim. Mas eu amo você usando a minha camiseta era melhor
do que nada.
Eu tinha prometido a mim mesma que não ia fazer nada para atiçá-lo,
mas era incrivelmente difícil estar deitada tão perto dele, sentir seu hálito em
minha pele, e não querer senti-lo em toda parte. Não pude evitar. Me
aproximei e pressionei meus lábios nos seus, deleitando-me com o gemido
baixinho que ele emitiu. Eu amava seu sabor. E queria muito mais do que
isso. Meu corpo doía de desejo.
Deslizei a mão para baixo e envolvi seu pau inchado, sentindo-o se
mover instantaneamente através da calça.
Seu corpo enrijeceu.
— Não acho que você deva fazer isso — ele sussurrou sobre meus
lábios.
Retirei a mão.
— Você já me chupou, e eu não posso sequer te tocar?
— Eu quero que você me toque. Quero demais. — Ele recuou um
centímetro. — Mas tenho essa ideia fodida de que tudo bem eu te tocar,
contanto que você não me toque.
— O que é irônico, porque isso tudo começou comigo te tocando.
— Acho que sim.
Soltei um suspiro frustrado.
— Posso te beijar de novo, se não posso te tocar?
— Sim. É claro. — Ele me puxou para si, tomando meus lábios com os
seus novamente e deslizando a língua para dentro da minha boca.
Nos beijamos por vários minutos, e minha calcinha estava ensopada.
— Se eu soubesse que ia passar a noite aqui, teria trazido uma calcinha
extra. Ou três.
A respiração dele acelerou.
— Posso sentir o quanto você está molhada?
Assenti, desesperada por seu toque.
Dax desceu a mão por meu corpo e a enfiou em minha calcinha. Ele
fechou os olhos e começou a mover dois de seus dedos em mim, entrando e
saindo devagar. Meu clitóris pulsava enquanto ele me fodia delicadamente
com a mão. Ele parecia inebriado, quase em transe, boquiaberto, como se
estivesse tentando imaginar que seus dedos eram seu pau e estávamos
transando.
Por mais que eu estivesse amando olhar para seu rosto, fechei os olhos e
fiz o mesmo, imaginando que ele estava me penetrando fundo. Mas eu sabia
que seu pau me preencheria muito melhor do que seus dedos. Abri os olhos
quando senti-o retirar a mão de mim.
Não pare. Ofegando, perguntei:
— Está tudo bem?
Ele assentiu e colocou os dedos na boca, para lamber minha excitação.
Foi a coisa mais sensual que eu já vira.
Ele lambeu os lábios.
— Me desculpe por ser tão fraco.
— Você é fraco? Eu te deixaria fazer o que quisesse comigo agora
mesmo.
— Porra. — Ele cerrou os dentes. — Não diga isso.
— Se não vai me deixar te tocar, então me deixe ver você se tocando,
Dax… enquanto me toca.
Seu peito subiu e desceu enquanto ele considerava minha proposta. Ele
inspirou profundamente. Observei-o com atenção descer a mão até o cós da
calça de moletom. Ele empurrou o tecido para baixo, e seu pau delicioso e
enorme saltou para fora. Mesmo que eu tivesse imaginado como seria, a
realidade definitivamente superava todas as expectativas. Parecia que esse
homem perfeito tinha um pau perfeito para combinar, com a grossura tão
impressionante quanto o comprimento, e uma pele linda e cheia de veias.
Fiquei com água na boca. Não ter permissão para saboreá-lo ou tocá-lo era
pura tortura.
Ele envolveu seu comprimento com uma das mãos com firmeza e
começou a bombeá-lo. Sua outra mão infiltrou-se por baixo da minha
camiseta e começou a massagear meu seio. Retirei minha calcinha e a joguei
para o lado antes de levar meus dedos até o clitóris e circulá-los pela carne
sensível.
Dax acelerou os movimentos em seu pau, com os olhos vidrados em mim
enquanto eu me dava prazer. Não cansávamos de observar um ao outro.
— Isso é sexy pra caralho — ele disse com a voz rouca. — Preciso sentir
o seu gosto de novo.
Ele posicionou-se entre minhas pernas e começou a me devorar. Ah, isso.
Obrigada. Embora eu não conseguisse mais enxergar direito, senti seu braço
me movendo e soube que ele ainda estava se masturbando. Pensar nisso,
combinado à sensação incrível de sua língua me fodendo, era demais para
aguentar. Enfiando meus dedos por seus cabelos, gozei intensamente em sua
boca, emitindo um grito agudo de prazer que ecoou por todo o quarto.
Quase imediatamente em seguida, um gemido alto escapou dele,
vibrando contra meu clitóris. Foi aí que senti uma onda de calor molhado ―
seu gozo cobrindo minha canela. Com sua boca ainda entre minhas coxas,
pude sentir sua respiração ofegante se acalmar aos poucos. Ele ficou nessa
posição por um tempo enquanto eu massageava seu couro cabeludo.
— Não se mexa — ele finalmente disse. — Vou pegar algo para limpar
isso.
Um ar frio substituiu seu calor quando ele saiu da cama por um momento
e retornou em seguida com uma toalhinha de mão e uma de banho.
Ergui o tronco para vê-lo limpando o gozo da minha panturrilha
esquerda.
— Desculpe — ele falou.
— Por que está pedindo desculpas? Eu adorei.
Ele saiu para descartar as toalhas antes de voltar para seu lugar ao meu
lado na cama.
— Está mais relaxado? — Sorri.
— Eu não esperava ir tão longe. Mas quer saber a verdade?
Passei os dedos por seus cabelos.
— Sim.
— Normalmente, eu me acalmo depois de gozar. Mas com você… eu só
quero mais. Tipo, estou pronto para mais nesse exato segundo, o que é
assustador pra caralho. É como se eu não pudesse ser domado.
Só imagino o quanto o sexo deve ser delicioso. Eu sabia que ele cederia
se eu continuasse a provocá-lo. Era o que a minha intuição estava dizendo,
ao mesmo tempo em que me disse para parar. Eu precisava proteger meu
coração, e a última coisa que ele precisava era de mais culpa. Então, em vez
de continuar a testar os limites, decidi ― para variar ― fazer a coisa certa.
— Acho que você me esgotou — menti. — Vamos dormir, ok?
Ele assentiu, não parecendo estar nem um pouco cansado. Virei de costas
para ele, que me envolveu em seu braços. Bem apertado. Agora, parecia que
a tola era eu. Deitar daquele jeito em seus braços era mais poderoso do que
sexo. Ali, naquele lugar íntimo, todos os sentimentos que eu nutria por ele
subiram para a superfície. Senti-me segura. Protegida. Senti-me amada,
mesmo que ele não me amasse, exatamente.
Dax não tinha noção de que bastava ele sussurrar em meu ouvido me
pedindo para ficar em Boston, e eu nunca iria embora.
As semanas que antecederam a partida de Wren passaram
extraordinariamente rápido. Era difícil acreditar que já estávamos no meio
de maio e ela iria embora em apenas algumas semanas. Baseado em nossas
interações desde que ela passara a noite, não daria para perceber que tudo
aquilo havia acontecido. Não ficamos sozinhos juntos em sequer um
momento desde então, e era assim que as coisas tinham que ser. Curtimos
aquela noite juntos como se fosse a nossa última na Terra; eu nunca
esqueceria. Mas a prioridade agora tinha que ser Rafe.
No decorrer dos últimos dois meses, ele continuou a melhorar. Assim que
sua terapeuta ficou ciente do motivo para o mutismo de Rafe, pôde trabalhar
com ele de uma maneira que não conseguia antes. Com a nova abordagem
cognitivo-comportamental, ele havia voltado a falar quase normalmente. Ele
ainda não iniciava muitas conversas, mas vinha conseguindo ser mais
participativo na escola e não ficava mais intencionalmente em silêncio
quando alguém falava com ele.
Wren vinha a minha casa regularmente para visitar Rafe, aproveitando
seu tempo ao máximo antes de ter que ir embora. Minha única função,
quando eu estava em casa durante suas visitas, era continuar a fingir que sua
mudança para a França não estava me matando por dentro. Apesar do fato de
que vínhamos mantendo distância, ela era presença constante em minha
mente.
Aquele dia, em particular, duas semanas antes da sua partida, era um dia
muito importante para todos nós. Wren viria à minha casa para contar a
verdade a Rafe ― sobre quem ela realmente era. Havíamos escolhido uma
tarde de sábado para essa conversa, e embora Shannon não costumasse
trabalhar aos fins de semana, ela também estaria ali para oferecer seu apoio.
A conversa não cairia exclusivamente nos ombros de Wren. Seria um
esforço de equipe.
Tínhamos alguns minutos até a hora em que Wren disse que chegaria, e
Rafe estava em seu quarto, sem a menor ideia do que estava prestes a ficar
sabendo. Shannon fez um pouco de café enquanto eu estava sentado em uma
cadeira na cozinha, balançando as pernas. Eu estava uma pilha de nervos,
sem saber no que isso resultaria.
— Você está bem? — ela perguntou.
— Sim. Só um pouco ansioso por ele, mesmo que eu saiba que é uma
coisa maravilhosa.
Ela inclinou a cabeça para o lado.
— Ansioso somente por ele?
— O que quer dizer?
— Wren vai embora em algumas semanas. Como está se sentindo com
isso?
— Não importa como me sinto — respondi.
— Nunca te perguntei o que aconteceu na noite da minha festa, porque
não é da minha conta. Mas posso ver que algo mudou em você desde então.
— Ela pausou. — Você obviamente sente algo por ela.
Não fazia sentindo negar. Shannon me conhecia bem demais. Suspirei.
— Eu realmente vou sentir falta dela. Mas não vou estragar essa
oportunidade para Wren. Ela sabe que tenho sentimentos por ela. Mas
também sabe que não vou fazer nada em relação a eles.
— Por causa de Rafe.
— Claro que é por causa de Rafe.
Essa era a absoluta verdade. Porque, se não fosse por Rafe, apesar de
todos os meus outros medos, eu me arriscaria. Eu tentaria ficar com Wren.
Seria o maior prazer do mundo explorar como as coisas funcionariam entre
nós. Mas como nada poderia acontecer, era melhor que ela fosse embora.
Shannon franziu a testa.
— Eu queria que as coisas fossem diferentes. Nunca vi você se iluminar
todo perto de alguém como faz quando está com ela. Mas entendo
totalmente esse dilema.
A campainha tocou. Salvo pelo gongo.
— É ela — eu disse ao me levantar para ir abrir a porta. Meu coração
acelerou, alimentado pela combinação de qual seria a reação de Rafe e a
expectativa de vê-la, o que sempre fazia meu coração enlouquecer.
Abri a porta e encontrei Wren parecendo tão tensa quanto eu me sentia.
Ela estava usando sua calça jeans rasgada de sempre com aquela blusa
listrada em preto e branco que caía por um dos ombros, que já me era
familiar.
— Oi. Como você está?
Ela soltou o ar.
— Estou bem. Um pouco nervosa. E você?
— Também.
Ela me seguiu para dentro da casa.
— Quer sentar e tomar um café primeiro? Shannon trouxe carolinas.
Ela ergueu a palma.
— Estou ansiosa demais para conseguir comer ou beber qualquer coisa.
Mas obrigada.
— Ok.
Ela entrou na cozinha.
— Oi, Shannon.
— Oi, querida. — Shannon salpicou açúcar de confeiteiro sobre as
carolinas. — Como você está?
— Aguentando firme. Tive uma manhã cheia. Estou tentando adiantar a
arrumação das malas. É difícil decidir o que levar para uma viagem de dois
anos, e o que deixar em casa. Eu sei que posso comprar coisas enquanto
estiver lá, mas queria poder levar tudo comigo. — Ela olhou para mim.
— Tenho certeza disso — Shannon falou ao me lançar um olhar.
— Quem vai conduzir a conversa? — Wren me perguntou.
— Eu vou começar e explicar a minha parte sobre como as coisas
aconteceram. Você não terá que fazer tudo sozinha. — Pousei a mão em seu
ombro. — Está tremendo.
— Estou mais nervosa do que pensei que ficaria. E se ele achar que o
enganei esse tempo todo, fingindo ser uma amiga?
— Venha cá. — Puxei-a e a abracei firmemente.
Não consegui olhar para Shannon, que devia ter ficado muito satisfeita
em ver aquele gesto.
— Estou aqui. Vai ficar tudo bem — sussurrei contra os cabelos de Wren.
— Ele vai entender, mesmo que não seja de imediato.
Após vários segundos, ela se afastou.
— Vamos chamá-lo agora, se você não se importar.
— Ok. Vou lá buscá-lo. — Meu próprio nervosismo veio à tona a cada
passo que eu dava em direção ao andar de cima.
A porta de Rafe estava levemente entreaberta. Bati algumas vezes antes
de abri-la. Como de costume, seu quarto parecia ter sido atingido por um
ciclone, com roupas e embalagens para todos os lados.
— Ei, cara. Quero falar com você sobre uma coisa. Wren também está
aqui. Pode vir até a cozinha?
Ele retirou os fones de ouvido.
— Estou encrencado?
— Não. Nem um pouco. Só precisamos conversar sobre uma coisa.
Ele deu de ombros.
— Ok.
Voltei para a cozinha e encontrei Shannon e Wren sentadas juntas em um
lado da mesa. Puxei uma cadeira para Rafe.
Quando ele finalmente entrou na cozinha, sentou-se ao meu lado.
— Oi, amigão. — Wren sorriu para ele do outro lado da mesa.
— Oi — Rafe disse, olhando em volta e parecendo compreensivelmente
confuso.
Circulei os polegares um no outro e forcei minha primeira frase a sair.
— Tem… uma coisa muito importante que preciso te contar. — Pausei.
— Envolve Wren.
Ele olhou para ela, em seguida de volta para mim.
— O que está rolando?
— Você sabe que ela vai embora para a França. Nós queríamos ter a
chance de conversar com você sobre uma coisa antes disso.
Ele franziu as sobrancelhas.
— Ok…
— Rafe… — Virei-me para ele em minha cadeira. — Sei que você e eu
nem sempre nos demos bem, principalmente quando me casei com a sua
mãe e vim morar com vocês. Foi um despertar um pouco abrupto para você,
e quando a perdemos, você ficou comigo, que era praticamente um estranho
ainda. Pode ter parecido por um tempo que eu era o inimigo, mas estou
orgulhoso pela evolução do nosso relacionamento desde então. Quero que
saiba que eu sempre quis somente o melhor para você, e sempre será assim.
Ele mordeu o lábio, continuando a me dar sua total atenção. O rosto de
Wren estava ficando cada vez mais vermelho.
— Depois que você perdeu a sua mãe, eu me senti impotente, porque
mesmo que eu soubesse que sempre estaria ao seu lado, nunca senti que era
suficiente. Você merecia muito mais, então pensei que seria uma boa ideia
tentar encontrar os seus… parentes biológicos.
A expressão de Rafe estava estoica.
— Quero deixar claro que minhas ações não tiveram absolutamente nada
relacionado com alguma vontade de deixá-lo aos cuidados de outra pessoa.
Esta responsabilidade é minha. Eu só queria ver se poderia iluminar um
pouco mais a sua vida, caso houvesse pessoas que não sabiam sobre você e
talvez quisessem.
— O que quer dizer? — ele me interrompeu. — Você encontrou a minha
mãe biológica?
— O investigador que contratei a encontrou. — Forcei-me a respirar
fundo. — Ela não estava em condições de conhecer você. Ela ainda tem
muitos problemas. Mas ficamos sabendo através dela que ela havia
entregado outro bebê para adoção… mais de uma década antes de você
nascer. Uma filha. — Fiz uma pausa. — E eu a localizei. — Olhei para Wren
do outro lado da mesa. — Foi o que me levou até Wren. Eu sei que você
acreditou esse tempo todo que ela era minha amiga. E ela é. — Olhei nos
olhos dele. — Mas também é sua irmã.
Ele olhou para ela imediatamente, mas sua expressão era difícil de
interpretar. Acredito que era puro choque.
Acenei com a cabeça para Wren, dando-lhe a deixa para falar.
— Eu sou sua irmã, Rafe — ela declarou, trêmula. — Nunca tivemos a
intenção de esconder isso de você por muito tempo. Dax precisava de um
tempo para saber melhor sobre mim e se certificar de que eu seria uma boa
influência para a sua vida. Ele também não me contou imediatamente,
porque queria ser cauteloso e não magoar a nenhum de nós. Então, eu não
sabia quem você era quando nos conhecemos.
Ele piscou várias vezes.
— Quando você descobriu?
— Por volta de quando comecei a visitar com mais frequência, em
fevereiro.
Rafe desviou o olhar.
— Não dá para acreditar nisso.
Os olhos de Wren marejaram.
— Eu sei que é muita coisa para assimilar. Foi assim para mim também.
Mas em um bom sentido. Nunca pensei que tivesse um irmão. Descobrir
sobre você foi a melhor notícia que já recebi.
— Espere… — ele disse. — Você ainda vai embora, não vai?
Ela assentiu lentamente.
— Sim, vou. Em parte, foi por isso que eu quis que você soubesse agora,
para que entendesse por que preciso manter contato com você enquanto
estiver fora. Não quero que sinta que estou te abandonando. Eu nunca vou te
abandonar, Rafe. Estarei a apenas um voo de distância, caso precise de mim.
E serão somente dois anos. Você vai piscar, terá quase dezesseis anos e eu
estarei de volta. Sei que o momento não é dos melhores. E, por favor, não
leve para o lado pessoal o fato de que ficarei fora por um tempo. É
simplesmente uma aventura que preciso viver agora.
Rafe finalmente voltou a olhar para mim.
— Eu não sei o que dizer.
— Você vai levar um tempo para absorver tudo isso. Não precisa dizer
nada — eu o assegurei. — Só precisávamos que você soubesse.
Shannon permaneceu calada. Eu estava prestes a abrir a boca, mas Wren
tomou as rédeas novamente.
— Também levei um tempo para processar. — Ela soltou uma respiração
trêmula. — Eu sei que os últimos anos têm sido muito difíceis para você.
Não é minha intenção complicar ainda mais a sua vida. Eu quero melhorá-la.
Espero que você me permita fazer isso. E espero que, assim que a ficha cair,
essa seja uma notícia feliz para você.
Ela começou a chorar, e eu quis tanto ir para o outro lado da mesa e
abraçá-la. Eu seria completamente responsável por qualquer coisa negativa
que pudesse resultar disso. Tudo continuava em um limbo, porque eu não
conseguia sondar como Rafe estava se sentindo.
— Eu senti mesmo uma coisa esquisita em relação a você — Rafe enfim
disse a ela.
Ela limpou o nariz com o antebraço e riu.
— Bom, eu sou uma pessoa esquisita, então…
— Não sei explicar, mas… finalmente faz sentido agora. — Ele assentiu.
— Você finalmente faz sentindo.
Wren relaxou visivelmente.
— Eu te amo, Rafe. Quero que saiba que te amo desde o momento em
que descobri que você era meu irmão. — Seu lábio tremeu. — Você está
bem? Tem alguma pergunta para mim?
Ele negou com a cabeça, parecendo atordoado.
— Agora não. Talvez eu tenha mais tarde.
Todos os olhos estavam nele. Senti meu coração pesado, mas de um jeito
bom, aliviado.
Ele finalmente se virou para mim.
— Pode me dar licença?
— Claro.
Depois que ele saiu da cozinha, nós três ficamos ali sentados em silêncio
por, provavelmente, um minuto inteiro até Shannon quebrar o gelo.
Ela sorriu.
— Bem… acho que foi… tudo bem?
Estendi a mão sobre a mesa para segurar a de Wren. Os olhos de
Shannon pousaram em nossos dedos entrelaçados.
— Acho que foi tão bem quanto poderíamos esperar — eu disse. — Ele
não pareceu chateado por termos escondido isso dele; isso é uma coisa boa.
E eu diria que o choque em sua reação já era de se esperar, de uma maneira
geral.
— É. Conheço essa sensação de choque, graças a você, Moody. — Wren
deu risada. — Brincadeira.
Relutante, soltei sua mão.
— Vai ficar tudo bem.
Shannon insistiu em nos trazer as carolinas e nos serviu café. Wren
pretendia passar no quarto de Rafe quando estivesse indo embora. Mas,
antes que ela tivesse a chance, ele desceu as escadas novamente. Viramos
para ele, que estava na entrada da cozinha.
Arregalei os olhos.
— Oi.
Ele olhou para Wren.
— Eu queria ver se ela ainda estava aqui.
Ela soltou sua carolina e limpou o açúcar de confeiteiro das mãos.
— Estou, amigão.
Rafe caminhou até Wren… e a abraçou. O ar que eu vinha segurando
desde a manhã pareceu finalmente se libertar. Vê-los se abraçando parecia
surreal. Aquilo era… tudo. Obrigado, Deus.
— Obrigada, Rafe — ela sussurrou, abraçando-o bem apertado. —
Obrigada.
— Eu não queria que você pensasse que estou zangado. Não estou. Estou
feliz — ele disse a ela.
Ela fechou os olhos com força.
— Isso significa tudo para mim.
Após um momento, eles ficaram apenas fitando um ao outro. Imaginei
que Rafe devia estar procurando sinais dele mesmo nela. O que quer que
fosse, era simplesmente incrível. O alívio que senti era esmagador. Por um
minuto, pude respirar livremente. Então, lembrei-me de que Wren iria
embora muito em breve, e voltei a sentir como se estivesse sufocando.