ROSA, Miriam D. Histórias Que Não Se Contam (Parte VII)

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RA RIA NA

stabelecida a diferença entre saber e conhecimento e suas relações


É com a realidade e a Lei, é preciso ver em que esta nos ilumina em
relação à clínica. Certas questões da clínica indicadas no decorrer do
texto nos propõem um impasse imediato e uma reflexão sobre as
alternativas de intervenção. Demonstramos anteriormente como a
psicanálise com crianças pode resvalar com a pedagogia.
A questão que a clínica nos propõe com os não-ditos dos pais
faz-nos repensar a relação psicanálise-pedagogia e perguntar: Por que
não dizer, não contar o que está ocultado, por que não ensinar? A
tentação de apenas informar o não-dito já foi demonstrada como ine-
ficaz, no decorrer deste livro, dada sua complexidade. Mas cabe-nos
desenvolver aqui algumas idéias sobre a informação, a interpretação
e a construção, assim como seus efeitos neste contexto.
Harari (1990) conta um fato esclarecedor. Freud responde a
uma senhora que pedia conselhos sobre uma criação adequada para
seu filho, de acordo com os preceitos psicanalíticos, para prevenir
alterações psíquicas. Este lhe diz que não se preocupasse; fizesse o
que fizesse, o faria mal. O autor analisa a resposta de Freud, ponde-
rando que o problema está no fato de que não seria possível impor
regras, pois ela faria o que seu desejo lhe ditasse. Além disso, a nor-
ma abstrata e geral tem por função, velada, a indução do gozo da
massa. Faz-se de superego parasita, induzindo mal-estar no sujeito
ao comprovar o inexorável não-cumprimento do mandato “salutar”.
Neste caso, por não implementar —- com respeito a seu filho - uma
educação como a psicanálise manda. Indicar preceitos faria a psica-
nálise ficar transformada em religião, ou comungar com a ilusão de
uma sociedade que pudesse ser inteiramente constituída por indiví-
duos sem qualquer embaraço. ai
Confirmando a incompatibilidade entre o processo analítico e
o educacional, Lacan (1950) radicaliza: o processo educacional atua
de maneira que a singularidade do desejo apresente-Se pa uma
ofensa à autoridade e a censura operará sobre esta verdade.
O aspecto uniformizante e generalista da informação pode masca-
rar, de forma sutil, o ocultamen to do sentido da história do sujeito e das
condições que determinam sua subjetividade. Consequentemente, a in-
formação pode ficar apenas na dimensão do intelectual, aliada ao ideal,
oprimindo, especialmente quando não houver a articulação com uma
E ADOLESCE NTES

demanda da criança. A informação conta com à força do servilismo apon-


se
tado por Freud (1921), em Psicologia das massas. Há um lugar que,
ocupado, faz com que o sujeito obedeça. O conteúdo das informações e
sua transformação em ferramenta para o pensamento somente podem ser
CRIANÇAS

efetivamente apreendidos se fizerem relação com a verdade inconsciente,


contam

Histórias da família ou da comunidade, repetidas, de forma sempre igual,


com

se por vezes apóiam a transmissão, podem também imobilizar as novas


se
Histórias que naão ISE

articulações do sujeito. Com a aparência do já-dito cristalizam uma ideo-


ÁL

logia, obturando a articulação com o que produziu os acontecimentos e o


O NÃo-DITO NA PSICAN

que estas cenas dizem do desejo do sujeito.


A idéia da eficiência da informação é derivada da dimensão do en-
gano contida na moral socrática — só faz o mal quem não conhece o bem.
Mas, adverte-se, aludir à ignorância manifesta — “Eu não sabia” — é um
modo de escamotear o registro do desejo.
Harari (1990) relaciona o engano com a transferência. O engano é
constituinte da transferência. O engano a que se refere não é o que presu-
me uma deformação da realidade consensual. Esse engano existe, não
porignorância moral, por desconhecimento dos parâmetros do bem e do
mal, mas por outra razão - o amor. Há engano no amor, este é constitutivo
do amor, pois, quando alguém diz amar, o que quer é ser amado. À trans-
ferência constitui-se em função do amor e sobrevém quando alguém
ocupa
o lugar
e do sujeito suposto saber; saber acerca do desejo, saber que antecede
o sujeito, saber faltante.
. Enganar-se significaria não con
hecer, o que determinaria a inclu-
são em uma moral social,
se nem sempre aliada à ética do sujeito.
Fundando-
ao saber do a se argumento, apela-se ao bom senso, à informação e
os Eira isando, que o levariam para o bom caminho. Conhecer
esperança d ca promete um bom procedimento. Esta é à
por Freud e Lacan.entação P
:
ã compartilhada,
psicológigica, não como se vê Vê
No entanto, outr
o as r é que ele
se apresenta como condi
n Pecto do engano próprio ao amo
do amor que p assamo 1S do para a instauração do sujeito do desejo:é
S ao desejo. A questão será poder apontar o desejo
dp analisando e liberá-lo, precisamente pela destituição do analista deste
lugar do ideal. . .

Tais afirmações não recomendam, como pode parecer, o fim da es-


cola, das campanhas educativas, da orientação e, nem mesmo, a eliminação
total da informação no contexto analítico. No entanto, cabe notar, com
Kupfer (1990), que o discurso pedagógico segue a estrutura do discurso
da universidade. Vislumbra uma perspectiva para o professor: o profes-
sor que permite a aprendizagem é o que ocupa lugar equivalente ao lugar
do analisando. Trata-se do professor que ensina a si próprio, que, ao falar,
responde às próprias perguntas. Tal professor ocupa, para o aluno, o lu-
gar de ideal do eu. Segundo Kupfer, não se pode motivar ninguém a
aprender. E mais, é seguindo o desejo que o levou a ensinar, que o profes-
sor ensina. Pode-se perguntar: seria esta uma estratégia para lidar com
certos impasses da análise?
O procedimento de que o analista dispõe para articular o saber com a
verdade do sujeito é a interpretação. Miller, no texto Acerca de las
interpretaciones, afirma que o gozo que o sujeito pode ter em sua palavra,
inclusive em seu sintoma, é atacado pelo saber interpretativo. A interpreta-
ção não deve ter sentido próprio; deve operar como significante, como oráculo,
um significante sem referência ao qual o sujeito dará sentido. Miller diferen-
cia interpretação de comunicação, caracterizando os termos sentido e
significação. O sentido, afirma, está entre o simbólico e o real e o significado
está entre o simbólico e o imaginário. Para que apareça o sentido produzem-
se metáforas; quando há interpretação, surge a significação fálica, a falta,
relacionada com o objeto ausente, com o desejado. É possível uma análise de
crianças que trabalhe só com sentidos, fora da dimensão imaginária?
O trabalho com Miguel, 7 anos, incitou esta discussão. Seus pais con-
sultam pela dificuldade de o menino alfabetizar-se. É agitado, ansioso,
teve atraso na aquisição da linguagem, há suspeita de problema de audi-
ção. Os pais relutam em trazê-lo à consulta; querem conversar. No relato,
à mãe conta a sua história como algo já superado. Perdeu a mãe aos 8
anos, quando esta se suicidou, logo após o nascimento do terceiro filho,
Provavelmente por depressão pós-parto. O pai casou-se novamente, um
ano depois e essa esposa é tida como a avó de Miguel. A mãe acha que
superou o fato. Não comenta com os filhos, não sabe se Miguel sabe da
Morte da avó materna. a por-
Miguel relata, na primeira entrevista, que repetiu a primeira série o
que faltou à aula e porque jogaram um bicho morto nele e ele se assusO"
Durante a conversa conta que sua mãe não tem mãe, desde
os oito ano
pois sua avó morrera. Ele acha que a causa foi atrop
elamento. Os seus dese
nhos e brinquedos estão repletos de hipóteses —repe
te, repete a morte: faca,
revólver, veneno, fogo, tombo e parece prenunciar uma grand
e tragédia.
O NÃo-pITO NA PSICANÁLISE COM CRIANÇAS E ADOLESCENTES

Fala bastante, mas, apenas espontaneamente, pois não


responde ao que
digo, apenas inclui a resposta no seu relato. Pergunto por que
ele faz como
se não escutasse o que eu digo. Ele olha surpreso e continua a desenhar.
Em sessões com os pais retomo as questões do suicídio, o medo da
loucura, os motivos que levam à omissão desta história para os filhos.
à se con tam

Aponto que Miguel vai fazer oito anos, idade em que sua mãe ficou órfãe
que ele se pergunta se a história se repetirá. Na semana seguinte, a mãe
relata que ele perguntou sobre a morte da avó.
Este caso exemplifica como o não-dito é elemento para discussão
Hist orias que nao

sobre a vida fantasmática, realidade psíquica que diz respeito ao vivido


pelo sujeito. Além disso, discute a forma de organizar a vivência. O fan-
tasma organiza a vivência. Mais do que um significado, oferece um lugar
ao sujeito, a partir do qual extrai os seus significados e vivências. Estes, os
Z

significados, retiram do significante sua característica de mero sinal, tor-


nando-se porta-vozes de certo regime desejante familiar. Dessa forma, se
perpetuam sob a forma de mitos que se convertem em mandatos. E
6 introduzida a questão da história da criança e o problema da necessidade
da reconstrução material da história familiar. Cabe ao sujeito analisar em
que lugar está na história-mito, que o faz conceber a realidade de certa
forma, uma das possíveis. Mas isto ele só perceberá se aceder ao
significante e seu caráter de incógnita.
A interpretação pretende propiciar ao sujeito a capacidade de sim-
bolizar com palavras aquilo que o prende a uma representação de si
mesmo. Pretende devolver aquilo que é dele — a palavra. A palavra des-
venda o que não pode ser dito, toca o significante que determina a posição
do sujeito. .
O significante não é próprio de ninguém, atravessa geraç ões, tres-
passa o individual, o grupal e o social. Tem efeitos imponderáveis, pos
gera várias significações. Algo se torna significante pela me -
pelo desejo implicado. Pode ser um dito ou um procedimento fami e
repetido e conduz a outro significante. A única oportunidade queo as
to tem de ser incluído na ordem humana é prender-se a um esa
No entanto, é a partir da significação, imaginária por excelência, qu
sujeito tem acesso aos seus elementos significantes.

1
enstTSE A
DO mm E
Se o signific ante está retido no discurso do Outro, a história d
vos do Gen nascimento. Rudolfo afirma que os dados do acriança
desenvol-
a e fantasia São insuficientes, principalmente quando há patologia
vime
ave, que obstrui o desenvolvimento. Einsuficiente levar em conta apenas o
ntrapsíquico. Ressalta que há algo marcado a fogo como repetição -uma
esa com o peso do significante — que não é uma fantasia de seu incons-
açá Trata-se da reconstrução material de outras gerações.
Tais análises exigem a participação do analista numa construção da
história do sujeito, que ele não pode reescrever sozinho. Em certos casos,
o prosseguimento da análise depende de conhecer as provas que balizaram
ahistória infantil do sujeito e sublinho a vantagem que há em apoiar as
interpretações sobre os eventos de sua realidade histórica cada vez que se
faz possível reencontrá-los, como confirma Aulagnier (1990, p.278). Per-
gunta-se pelo acontecido não como um fim em si mesmo, mas como os
sinais do que deve ser compreendido e representado.
Suspenso o enquadre tradicional da psicanálise, trabalha-se nas bre-
chas, nas fendas. Ao analista que visa o saber do sujeito cabe também
abrir tais fendas, operando sobre o discurso na busca de significantes in-
sistentes que, se articulados pelo sujeito, produzem novos sentidos. A
presença dos pais no atendimento remete à castração da criança e dos
pais e trabalha-se com a separação. O exemplo de Miguel mostra que o
significante que não articula retorna, sob a forma de acting out. Quando a
interdição é suspensa e a mãe enfrenta a questão, a angústia organiza-se
como investigação. E Miguel pergunta.
Pensar em mito, mandato e em história familiar leva a pensar no
lugar dos pais na análise da criança, discussão levanta no item “Eles não
deixam dizer”, do capítulo 5. Deve-se estar atento ao movimento de aber-
tura e fechamento do inconsciente e quando a criança não faz associações
deve-se indagar onde está o discurso que não pode ser processado pela
criança, onde se fala sobre ela. Pode-se atuar pelo discurso parental que,
pelo peso intersubjetivo, tem efeito na formação do sintoma na criança. O
manejo da transferência inclui uma resposta analítica à presença dos pais.
Tais reflexões levam à discussão das estratégias de intervenção, da inter-
Pretação transferencial até a construção da história fantasmática.
Eqo so alhos o aos erros lógicos, àincongruência da história e à a spo
levaaumo : assim como quanto aos atuais tropeços da fala. Ca aca
iscussão relativa ao procedimento possível na análise.
ação, a
Examinemos, agora, como, entre a interpretação €à orientanálise
trabalho. Em Construções em ,
construção pode ser; uma formleloa deentre Arqueologiaia e Psicanál
y ise, , a apon-
Freud (1937) efetua um parale tivas. Até então, ele trabalhara
iênciias como recons tru à A
tando ambas as ciênc
ei Ena
com o conceito de interpretação, nos moldes da e
O não-pito NA PSICANÁLISE COM CRIANÇAS E ADOLESCENTES

o de uma produção do
(1900). Ou seja, demonstrou como à interpretaçã
inconsciente tem três planos possíveis, que se engendraram para fa! pro-
dução. São eles: os aspectos desencadeantes, que dizem respeito acon itos
ou acontecimentos atuais; os conflitos infantis; e a dimensão transferencial,
que sinaliza que o inconsciente emerge na relação com o Outro. o
Histórias que não se contam

Quando Freud começa a trabalhar em casos como Moisés e o


Monoteísmo (1934), Leonardo da Vinci (1910) eMoisés de Miguel Angelo (1914a)
é que começa a revelar sua preocupação histórica. Ele assinala que para
decifrar um sentido é preciso reconstruir o acontecido, ou melhor, é pre-
ciso produzir o conceito do acontecido, construindo uma passagem e,
portanto, uma história.
Enquanto a interpretação recorta o discurso instituído para fazer
surgir novos significantes, a construção tem a finalidade de materializar a
reorganização simbólica das distorções imaginárias. O risco -motivo pelo
qual as construções são criticadas é de fornecer modelos de identificação
138 como uma nova versão imaginária, e dar elementos para futuras raciona-
lizações estéreis. A forma de evitar tal distorção é procurar guardar a
dimensão do “só depois”, que deve estar na base de qualquer construção
elaborada pelo sujeito. A construção revela os efeitos do inconsciente
no
objeto a analisar. A historização do sujeito independe da grandiosidade
ou do fracasso dos acontecimentos, ou mesmo dese saber os motivos do
que ocorreu. Neste aspecto, trata-se de admitir um não-s aber.

das estratégias Enio p de Princípios básicos e, para mantê-los, são cria-


so qO princípi
em si mesmas. Lpodem ser priorizadas, tomadas como importantes
o fundamental de propici
PR
de escuta, deve dirig a direção imprimida« deao prop
ir E dimento lugar de fal ae
iasicia
CONSIDERAÇÕES FINAIS
efletir sobre a clínica psicanalítica, especialmente com crianças e ado-
lescentes, supõe estar atento não só à teoria psicanalítica, como aos
reflexos agudos promovidos pelos avanços científicos nas mais va-
riadas áreas e pelas mudanças sociais. Tais questões são importantes,
por um lado, pela radicalidade do questionamento que provocam e,
por outro, porque vários dos sintomas mais frequentes trazem uma
interface na relação com o mundo social, como os atos de indisciplina,
arecusa ao conhecimento escolar ou atrasos no desenvolvimento. O
psicanalista pergunta-se sobre os efeitos destas modificações sociais
na construção da subjetividade, particularmente sobre as repercus-
sões na função paterna e sobre novas formas do sintoma, tomado
como estrangeiro porque o sujeito percebe-o como algo que não lhe
pertence, uma vez que não se formou segundo sua vontade. Ou seja,
ao se perguntar de quem é o sintoma, comparece o discurso do Ou-
tro, lugar dos significantes, que atropelam, via esintoma, o sujeito.
Apontamos neste trabalho como esses sintomas dizem respei-
to a uma das facetas da relação do sujeito com o Outro, atingindo
aspectos como a pretensão do sujeito se pensar um indivíduo,
indiviso e independente dos outros e discutindo a relação intrínseca
entre desejo, Outro e subjetividade.
O discurso do Outro, lugar dos significantes, remete ao imagi-
nário social, visto que contém elementos dos fantasmas dos grupos
Sociais, fantasmas estes que atribuem lugares específicos sobre a
criança e 0 jovem no imaginário parental: é a partir de certa fantasia
sobre paternidade, família, sexualidade e domínio que alguns são
percebidos como criança ou filho, alguns têm, ou não, acesso à escu-
ta, à palavra, ao gozo...
Tais lugares interferem tanto na constituição do sujeito como
no trabalho analítico. O que determina as questões, o procedimento
cora DOS dos clínicos é o olhar que lançam sobre a E aica
ii rd têm do desenvolvimento da criança e o lugar do adu
ição da criança. Ariês (1981) demonstra no livro História
DO mam
social da criança e da família que a ascensão da burguesia dos séculos XVI e
XVII trouxe na preocupação educativa o ideal da nova classe social. À
promoção do significante “educação” trouxe consigo uma nova concep-
ção de criança, além de contribuir para a constituição da ordem familias
moderna. Esse novo lugar possibilitou que ela pudesse ser pensada como
E ADOLESCENTES

objeto de conhecimento e práticas específicas.


Outro ponto realçado do trabalho analítico com crianças e jovens é
que a psicanálise não comparece como teoria da criança, mas do sujeito
do inconsciente, que não tem idade. Relativiza a dimensão cronológica,
IANÇAS
o se contam

retomando a questão da história e de sua transmissão; retoma o desen-


CR

volvimento, demonstrando sua submissão a uma ordenação lógica -


com

auto-erotismo, constituição do ego, complexo de Édipo, dissolução do


NA PSICANÁLISE

complexo.
ma

Em psicanálise, a história não é causa do desenvolvimento, mas está


Histórias que na

lá para um efeito de reação, de criação. As referências cronológicas


correspondem a remanejamentos estruturais. Embora se possa dizer que
NÃo-DITO

o sujeito não tem idade e não se desenvolve, pode-se afirmar também que
o sujeito não existe desde o princípio, mas forma-se, constitui-se graças às
cruzadas estruturais do estágio do espelho e complexo de Édipo, opera-
O

dor dessa relação. Dessa forma, não existe continuidade linear entre os
estágios, que se organizam em torno de encontros singularizados. Os es-
a

O
B

tágios são os avatares sobre os quais o eu e o sujeito são fundados,


ancorados no desejo do Outro e na constituição narcísica.
A história comparece como as marcas que possibilitarão à
historização do desejo. A transmissão dos significantes fundamentais
da sexualidade e da filiação é fundamental para a inserção simbólica na
genealogia. O não-dito, quando suprime esses significantes, tem efeitos
no sujeito — pode ficar aderido à sua dimensão imaginária quando passa
a produzir sintoma ou repetições desatualizadas e fora do contexto. O
que foi descartado retorna deslocado no sintoma, por várias gerações,
para que a verdade fale. Só então o acontecimento pode desvincular-Se
de um imaginário individualizado para tornar-se um emblema cultural,
articulando sujeito e história.
pelo desejo.
Os pais são encarregados dessa sustentação, pautada
Supõe levar em conta os significantes de sua história, os sucessos € fracas”
sos do grupo de pertencimento, dos pais, da etnia, que fazem da história
de cada sujeito um passo na história dos homens. Não se superam as or-
gens, mas podem-se detectar suas ilusões e descaminhos e, ao dizer sobre
ador das perdas, pode-se descolar delas a condição de sofrimento. O luto
do passado não se supera pese esquecimento e segredo. Não se trata de
expor os filhos à dor ou ao acasso, mas de apresentar a superação desta
ou daquele: apesar dos acontecimentos, o sujeito faz presença, não na dor,
mas na atualização do desejo. Na articulação desejo-transmissão-castra-
ção, OS pais sustentam em nome de quê vale superar a dor. A Lei opera
com a condição do desejo presentificado em uma relação, endereçado a
alguém ou algo que não o filho. Desta forma se estabelece a Lei, a diferen-
ça entre gerações e a castração, pautadas pela possibilidade de, em outro
141
lugar, encontrar gozo e realização. Se esta articulação é desejável, inúme-
ras situações a impossibilitam e, na falta da transmissão, pode-se servir-se
da pesquisa histórica de um povo, oferecendo significantes a partir dos

Considerações finais
quais o sujeito possa se referenciar.
Finalizando, reiteramos a posição de que a psicanálise da criança e
do adolescente deve servir-se do significante que exprimem e que os
posicionam no mito familiar, constituído do desejo de seus pais e das
marcas da história da família na inserção social. A transmissão destas
marcas permite a historização do desejo, independente da grandiosidade
ou do fracasso dos acontecimentos. Menos do que de motivos, o sujeito
precisa de um lugar no desejo do Outro para existir, dos significantes da
sexualidade e da filiação, a partir dos quais possa diferir.
Essa dupla entrada, trabalhada no livro, o sujeito do inconsciente
constituído pela articulação significante e atravessado pelo imaginário
social, o eu da história e do desenvolvimento, supõe, mais do que elegera
primazia dos aspectos simbólicos sobre os imaginários, trabalhar sua ar-
ticulação em torno do desejo, da lei e da ética. o.
A ética da psicanálise questiona a identificação do bem do sujeito
com seu bem-estar e separa o desejo de sua conformidade com os o
do ressentimento de não ter garantias de realização, ou pela culpa ou e
bito em relação à ascendência. A ética que rege O sujeito ema de e js
agido pelo Outro e, sim, sustentado por e implicado no desejo que TES
la a cadeia intergeracional que envolve a história social pa a
no discurs
relação com a Lei, o ideal e a cidade; desejo expresso
condições do laço social.

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