Segredos Do Sacy Pererê - Rod Tigre
Segredos Do Sacy Pererê - Rod Tigre
Segredos Do Sacy Pererê - Rod Tigre
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Antes de se tornar ―dono‖ do dia de ―combate‖ ao Halloween, ou
uma alternativa a cargo de ―entregador de presentes‖ no Natal
brasileiro, o Sacy é a junção de muitas lendas das 3 raças que compõe
o caldo da Nação brasileira: branco (europeu), negro (africano) e
indígena (nativo). O nome vem de Iaci Pererê, simplesmente um
menino que mora na mata, para Olívio Jekupé, índio guarani e autor
do livro ―O Saci Verdadeiro‖ (2001), que mostra que a origem nativa
do Sacy é bem diferente da que hoje conhecemos: ―Tem duas pernas
e não usa carapuça. O que lhe dá poderes é um colar chamado
Baêta. É uma entidade da floresta que ajuda os homens e, ao
contrário do que diz Monteiro Lobato – que ele morre de sete em
sete anos para que um novo saci nasça do taquaral –, ele não morre
nunca. Na África existe um personagem negrinho de uma perna só
que se chama Ossaim. Para se defender dos castigos dos brancos, os
escravos misturaram a história de Ossaim com a do Iaci Pererê‖.
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Monteiro Lobato foi o maior estudioso do Saci, e seu primeiro livro
é o resultado de uma grande pesquisa que fêz, "O Sacy-Pererê:
Resultado de um Inquérito", publicado em 1918, obra que lhe deu
enorme prestígio logo na sua estréia, mostrando que o Sacy só lhe
deu sorte! Trata-se de uma coletânea de relatos mostrando a riqueza
das influências do Sacy por todo o Brasil, seus nomes diferentes e
variantes, inclusive suas diversas etnias, ora negro, ora branco, ora
índio, ora com duas pernas, outra com uma só... As lendas do Sacy
são vastas confirmando que nunca ouve um único Sacy, mas o Brasil
antigo era infestado por uma verdadeira praga de Sacys, aprontando
mil travessuras e assustando as crianças e as pessoas!
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Para Gustavo Barroso, o Sacy é uma lenda recorrente em diversos
povos atuais e da antiguidade: ―O Sacy Pererê do nosso interior é um
molequinho cabeçudo, quase pelado, que anda pelo mato e pelos
caminhos pulando numa perna só.
Como o caipora ou corrupira do Norte, é uma espécie de senhor da
mata e das rochas, dono dos lugares ermos e pistolão para os
caçadores. A não ser na cor, lembra completamente os sciápodos,
povo fabuloso de que nos fala Plínio.
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Cícero Valadares (do Tico Tico), a lenda do Sacy Pererê sem perna
tem origem africana, trata-se da lenda de Ossonhe, um tipo de
demônio que se disfarça de perneta que seqüestra moças com sua
Kora (uma harpa-cítara africana) e que também teria algo próximo do
mito europeu do ―Flautista de Hamelin‖!
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Porém, para alguns estudiosos das tradições africanas, não seria
Ossain o Sacy, mas Àròni, um companheiro de Ossaim, um
anãozinho de uma perna que fuma em um cachimbo feito de casca
de caracol.
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Monteiro Lobato não foi o primeiro a escrever sobre o Saci, antes
dele em 03/12/1882 no jornal O Vassourense, de Vassouras/RJ,
começou a ser publicado um folhetim de Augusto Emílio Zaluar,
mais conhecido por ser o escritor de Dr. Benignus, considerado o
primeiro herói da ficção cientifica criado no Brasil. E ele que foi
provavelmente o primeiro a escrever sobre o Sacy. Mas Lobato
realmente foi o primeiro a transpô-lo para o universo dos livros
infantis ilustrados, que tornaram a lenda mais amistosa,
popularizarando o personagem entre as crianças, que ao invés de
fugir passaram a caçá-lo!
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— Foi o Sacy, que andava de noite cavalgando os animais.
As pessoas que tem visto este gênero de diabretes não estão de
perfeito acordo em suas narrações acerca da forma em que aparecem
estas travessas criaturas.
Uns dizem que o viram sob a figura de um negrinho de barrete
vermelho, fazendo caretas aos transeuntes, e escarranchado em cima
de uma porteira velha, ou no cimo da roda do engenho, quando está
parada a moagem.
Outros, porém, afirmam que o Sacy é uma ave de muitas penas, que
larga fogo das asas, se encontra nas estradas e que esvoaça de noite
com os giros incertos do morcego, soltando uns pios lastimosos e
pousando de vez em quando nas torres silenciosas das igrejas em
ruínas.
As tradições, como se vê, são tão variadas, que, por melhor que seja a
nossa boa vontade, não podemos dar ao leitor uma definição clara e
precisa do que seja um verdadeiro Sacy.
Uma noite, estando eu sentado à beira de um lago tranquilo e em
frente de uma soberba floresta virgem, apreciava silencioso este
admirável espetáculo, vendo os raios da lua infiltrarem-se por entre as
ramagens do arvoredo e brincar na superfície ligeiramente ondeada
das águas.
Reinava um silêncio profundo em toda a natureza! Os troncos eretos
de jequitibá, os leques debruçados das palmeiras, as copas das
figueiras bravas e as coroas melindrosas dos palmitos não faziam o
mais pequeno movimento, porque nem uma só brisa passava por
entre seus festões de folhagem e suas cortinas de verdura.
De vez em quando, porém, espalhava-se no ambiente um aroma
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suave de perfumes balsâmicos. Era um cheiro embriagador que se
não respira senão no seio agreste dos matos e nas solidões encantadas
do novo mundo.
Eu estava embebido nesta contemplação em um enleio tão delicioso
que nem lembrava que existia.
De repente toda a floresta se agitou, como se houvessem roçado por
seus ramos as asas de um furacão! Um som ouço e cavernoso ressoou
por toda a montanha! Um clarão singular passou de súbito ante meus
olhos e senti-me momentaneamente tomado de indescritível terror!…
Tudo caiu, porém de novo, no mais profundo silêncio; e quando
voltei à pousada, que ficava dali a pouca distância, e contei aos
tropeiros o que me havia acontecido, responderam-me com voz mal
distinta e pondo o dedo significativamente na boca com ar de
espanto:
―Patrão, foi o Sacy!‖
É o que acabo de narrar tudo quanto posso dizer aos leitores acerca
desta aparição sobrenatural, que no primeiro momento, não devo
ocultá-lo, me causou um efeito pouco de acordo com a segurança do
lugar‖.
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Nos estados do norte do país, Matinta Pereira não é um Sacy, mas
outra lenda, a de uma bruxa que à noite se transforma em um pássaro
agourento que pousa sobre os muros e telhados das casas e se põe a
assobiar e só para quando o morador, já muito enfurecido pelo
estridente assobio, lhe promete algo para que pare (geralmente
tabaco, mas também pode ser café, cachaça ou peixe) assim a matinta
para e voa, no dia seguinte a velha vai até a casa do morador
perturbado para cobrar o combinado, caso o prometido seja negado
uma desgraça acontece na casa do que fez a promessa não cumprida.
Muitos dizem que se trata de uma feiticeira que usa da magia para se
transformar em matinta. Os mais velhos diziam que a sina de
transformação seria hereditária, ou seja passaria de mãe para filha.
No caso de não haver herdeira para a sina matinta, a dona da
maldição se esconde na floresta e espera que uma mulher passe por
lá. Quando uma mulher finalmente passa, então ela pergunta: "quem
quer?". Se a moça responder: "eu quero!" então ela se torna ainda
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naquela noite a Matinta Perera. Tal qual o Sacy existem armadilhas
pra prender a Matinta, que pra alguns ainda seria a mulher do Boto,
outra lenda amazônica. Mas teriam se separado, Boto não gostava do
bafo de cachaça da Matinta e esta não agüentava suas saídas atrás de
donzelas!
Foi graças a Lobato que o Sacy chegou aos cinemas pela primeira
vez em 1951, baseado em sua obra e um dos grandes sucessos do
cinema brasileiro em todos os tempos. Depois ainda aparecia na
televisão nos seriados do Sitio do Pica-Pau Amarelo, na sua própria
série Pererê, e interpretado por Jorge Ben, no especial
―Perlimpimpim‖ de 1982.
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Inspirado na série Turma do Pererê, dos quadrinhos de Ziraldo, no
dia 12 de outubro de 1983, foi exibido um programa especial na TV
Globo. Exibida entre 2002 e 2004 na TVE Brasil, foi exibida a 1a
série em 20 episódios de 20 minutos cada um, na cidade mineira de
Tiradentes. O Pererê foi interpretado pelo ator Silvio Guindane. Em
2010, a TV Brasil estreou a segunda temporada, composta por 26
episódios, que foram exibidos até 2012!
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Conheça a carreira dos atores que já deram vida ao Saci:
Paulo Matozinho (1951)
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O ator fez história ao interpretar o personagem de 1977 a 1986.
Nascido no Rio de Janeiro, ele atuou em várias novelas da Globo,
como ―Araponga’ (1990), ―Quatro por Quatro‖ (1994) e ―Xica da
Silva‖ (1996), da TV Manchete. No cinema fez ao menos nove
filmes, entre eles ―Garrincha – Estrela Solitária‖ (2003) e ―Elvis &
Madona‖ (2010). Como o personagem Angolano, criou alguns
bordões no humorístico Zorra Total, como ―Hum… exixgente‖.
Genivaldo dos Santos (Anos 70/80/2000)
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série Castelo Rá-tim-bum, da TV Cultura, em 1994. O ator faleceu
em 2016, com 62 anos.
Silvio Guindane (1998)
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Izak Dahora (2001 – 2006)
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Em 2007, foi a vez de outro ator baiano encarnar o Saci. Fabrício
também trabalhou nas novelas na ―A Favorita‖ (2008), ―Viver a
Vida‖ (2009), ―Subúrbia‖ (2012) e o ―Boogie Oogie‖ (2014). Cheio
de trabalhos marcantes no currículo, Boliveira marcou presença
ainda no cinema em ―Tropa de Elite 2‖ (2010) e ―Faroeste
Caboclo‖(2013). Brilhou também como o ator de rádio Péricles
em ―Nada Será Como Antes‖ (2016).
Raphael Logam (2010 – 2012)
O ator, que fez seu primeiro papel nas telonas no filme Última
Parada 174, do diretor Bruno Barreto, foi o segundo Pererê da
segunda temporada da adaptação para a TV das histórias de Ziraldo,
de 2010.
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Fernanda Bock (2012 – Voz)
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Na Revista da Semana, no começo do século XX, apareçam diversas
variações de Sacys, todos mais parecidos com duendes que o Sacy
brasileiro tradicional! Infelizmente não informam os autores. Na
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edição de 08/11/1941, Segisnando Martins ilustrou um sacy mais
próximo da versão conhecida atualmente, mas ainda mantinha um
―q‖ de demônio, com o seguinte texto: "O interessante trabalho de
Segisnando que ―Revista da Semana‖ traz à capa deste número é
ilustração a uma das mais divulgadas lendas do folclore nacional – a
do Sací. Sací, na imaginação do povo, é geralmente representado no
tipo de um negrinho de uma perna só, barrigudinho, olhos de fogo,
carapuça vermelha na cabeça e na boca um pito – que ora é de barro,
ora é de uma combuca de coco – sempre apagado, mero pretexto
para pedir fogo aos viandantes que ele tocaia nas encruzilhadas.
Entretanto, sofre variações. Dão-lhe, às vezes, pé bi-partido de cabra,
ou igual ao de pato, outras vezes dizem-lhe presente de um par de
chifres ou de uma barbicha de vassourinha. Mesmo o seu nome varia:
―Sací-pererê‖, ―Martin Taperê‖, ―Sací Saterê‖, ―Saci Saperê‖, etc. É
parente do ―Jacy Jateré‖ do Paraguai, de que nos dá notícia o
folclorista Eloy Fariña Nunez.‖
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A partir de 1926, Córnelio Pires edita o primeiro gibi próprio do
Sacy, principalmente com desenhos de Voltolino, o mesmo que
ilustrou pela primeira vez a obra do Monteiro Lobato, o Sacy, em
quadrinhos. Não haviam HQs, mas exposições de uma página
(cartuns)
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Na revista do Sacy surgiram diversas versões dele diferentes,
algumas que foram aproveitadas depois muitas vezes. O Sacy com
uma perna mecânica, por exemplo aparece pela primeira vez na
revista do Sacy, e essa idéia sempre ressurge, principalmente quando
querem inserir o Sacy no gênero super-herói. Na primeira revista do
Sacy também apareceu Menina, uma versão feminina do Sacy, mas
que tinha as duas pernas, e também o Sacy Elegante e o Sacy Italiano,
que é branco!
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Na revista do Sacy surgem Menina, e diversas versões alternativas
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No Tico Tico, foi onde o personagem adquiriu as características
mais próximas da sua versão atual nos quadrinhos. Mas isso foi aos
poucos, no começo o Sacy era mais um ser mágico e aparecia em
HQs de contos de fadas!
Sua primeira aparição na revista não foi diretamente, mas sim foram
dois brigões que confundiram ele ao derrubar café no avô que estava
passando, na edição 603 (25 de abril de 1917), numa HQ desenhada
por Renatinho. Na edição 1501 (11 de julho de 1934), foi a
Lamparina (personagem de J. Carlos) que foi confundida com o sacy.
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O sacy apareceu mais próximo do mundo das fadas na edição 1265
(1 de janeiro de 1930), e também um sacy meio-termo entre o
tradicional brasileiro e o duende, na HQ do personagem Nip, de Lou
Franco. Não localizei a edição porque essa não está na Hemeroteca
Digital, eu consegui uma xerox com o coronel Athos Eichler.
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Tiveram pelo menos dois artigos sobre o sacy na revista O Tico-
Tico, um na edição 1342 (24 de junho de 1931) , de autoria de E,
Wanderley:
―Seu Nicolau, mais conhecido abreviadamente por Seu Nico, era um
homem que não acreditava em nada e nem tinha medo de coisa
alguma.
Quando se falava em fantasma, assombração, almas do outro mundo
ou lobishomem na frente delle, Seu Nico sorria e caçoava da gente.
Nem do sacy-pererê elle tinha medo!
Sempre destemido, facão na cintura, espingarda ao hombro, charuto
na bocca, Seu Nico passava, ás vezes, dias e noites no meio do matto
caçando.
Era o divertimento delle.
A distracção era o charuto. Só tirava o charuto da bocca para commer
e para dormir.
A’s vezes dormia até com elle nos dentes, e não foi uma vez nem
duas que acordou com o peito da camisa queimado pelo charuto
acceso que lhe cahira do queixo quando elle pegara no somno.
Aquilo havia de lhe fazer mal um dia.
Não demorou muito que não lhe apparecesse uma azia no estomago
e um calor de fogo nas guéllas, tudo devido á seccura do fumo.
O doutor recommendou que elle parasse com aquillo. Partisse o
charuto em dois ou três pedacinhos e só fumasse um por dia, cada
pedacinho depois do almoço ou do jantar.
Com grande sacrifício Seu Nico fez isso. Mas vivia desolado. Não
achava graça em nada. A comida para elle não tinha mais gosto.
Ficou doente da mesma maneira. Não tinha mais a azia nem o calor
de fogo na garganta, mas andava banzando como cobra que perdeu a
peçonha.
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Sua vingança era caçar. Ia para o matto cedinho e voltava noite
fechada, trazendo pacas, raposas, tatús, cachinguelês.
Todo bicho que passasse ao alcance do seu tiro via a queda. Era um
bicho morto.
Certo dia elle amanheceu com cara de mais doente.
Disse que tivera febre de noite e sonhou que tinha atirado numa
serpente grande com asas no meio da mata. Pegou a espingarda e foi
sahindo.
A gente aconselhou que elle não fosse. Elle era teimoso quando
estava bom, quanto mais assim doente…
Disse que não tinha nada de mais. A febre já tinha passado, elle
queria matar a serprente, e metteu-se na matta.
Passou lá o dia inteiro. Chegou a noite e elle não voltou.
A gente ficou com cuidado. Não lhe tivesse acontecido alguma
cousa…
Elle não andava lá muito bom da cabeça, não… Aquillo era scisma.
Fomos ver si o encontravamos. Bate daqui, bate dali, demos com
uma coisa cahida no meio da matta. Aecendemos o isqueiro e vimos
que era Seu Nico. Estava desacordado. Carregámos com elle para o
rancho. Demos-lhe mésinha boa para maleita e elle foi melhorando.
Quando abriu os olhos a primeira coisa que disse foi – O sacy!…
– Vosmecê viu, Seu Nico?
– Vi, sim, respondeu elle, sem poder se levantar do girau.
E explicou o ―caso‖:
– Elle veiu pulando, pulando, pulando num pé só, com um
barretinho encarnado na cabeça, carapinha, e um cachimbo na
bocca… Chegou perto de mim e pediu:
– Ocê não tem um pedacinho de fumo pra mim, Seu Nico?
– E elle sabia seu nome?
– Sabia sim… Eu procurei um pedacinho do charuto… Não tinha
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mais. Fumara os dois que me restavam. Elle ahi me atirou no chão…
Fiquei no chão…
Não sei de mais de nada…
– Está vendo? O senhor dizia que não acreditava… Ta hi… Mas o
culpado disso foi o doutor que ―improhibiu vosmecê‖ de fumar, e só
deixava umas migalhas de charuto…
– Foi mesmo… Foi o doutor o culpado… Foi elle, sim…
E o pobre Nicolau, no delírio da febre, ainda julgava ver o sacy-
pererê, pulando, pulando a lhe pedir fumo para o seu pito…‖
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―Tio Zumba, o Vovô Índio da aldeia da Serra dos Órgãos, costumava
contar lendas dos seus Tamoios. Nessa noite, um menino pediu:
— Tio Zumba, conte-nos a história que o senhor prometeu ontem.
— Ah! – disse Zumba, passando a mão pela face cor de cobre.
Tio Zumba pensou por alguns momentos, olhando para o céu,
donde a lua lançava raios argentinos.
— Há muitos anos, quando os portugueses perseguiam os Tamoios,
um saci-pererê…
— Que é saci-pererê? – perguntou o menino mais curioso do bando.
— É um bicho – respondeu Tio Zumba – que tem um rabo de cobra,
uma perna de touro, um braço de homem, uma cabeça de porco,
com um chifre na testa.
Esse saci-pererê vivia metido aos rios e, quando um homem se
aproximava do rio, devorava num minuto. Os Tamoios, cercados de
um lado pelo saci-pererê e do outro pelos portugueses, morreriam
com certeza.
Mas graças ao Grande Espírito (Tupã ou Deus), houve um menino
de nome Poty, que querendo salvar seu povo, armou-se de um
punhal e encaminhou-se para o rio. O dia findava e a noite começava
a estender seu manto negro sobre os montes e vales.
Poty acendeu uma fogueira para afugentar as onças e trepou numa
árvore para dormir. Teve um sonho em que apareceu o ―Grande
Espírito‖ e disse-lhe que o ponto mortal do saci-pererê era o olho.
Pela manhã Poty acordou, capturou uma pomba, assou-a e comeu.
Mais tarde seguiu seu destino à procura do saci-pererê, o monstro
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fluvial. Pelo meio dia Poty viu do alto de uma árvora em que subira,
às margens do rio, lá… muito no horizonte, argentino como um rio de
prata.
Pela tarde ouviu um ronco medonho que se seguiu com um sibilo
agudo e prolongado. Um rumor de folhas e galhos quebrados se
prolongou até que apareceu o saci em pessoa.
Passou, arregalou os lábios crispantes de cólera, mirando com o
único olho que tem, com uma cólera indefinida e precipitou-se sobre
Poty. Este aparou-o na ponta da faca, a qual cravou-se no olho. O
monstro caiu fulminado, inerte qual bloco de granito. O monstro foi
morto. Poty salvou seu povo que se retirou para os sertões de Minas,
opondo a mais séria resistência contra os criminosos estrangeiros que
nunca puseram os pés sobre o seu terreno.
— Pois bem, meu bravo Tio Zumba – disse um garoto. — Também já
fostes um guerreiro Tamoio?
— Não – respondeu Zumba. — Nasci no mato, mas meu povo já fizera
as pazes com os brasileiros.
— Boa noite, já vamos.
— Boa noite, meus filhos.
Todos desapareceram. A lua continuava a iluminar a aldeia‖.
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Na década de 30, o Sacy estrelou uma série em quadrinhos das
Estampas de Sabonete Eucalol, desenhadas por Percy Lau. Quem
apresenta o Sacy é Carmem Miranda, que era a garota-propaganda
das Estampas Eucalol, que foram produzidas por 40 anos! Foi nas
estampas Elcalol que o Sacy pela primeira vez enfrentou a Cuca
numa História em Quadrinhos, junto com um menino que lembra
muito o Pedrinho, sendo a história inspirada na de Monteiro Lobato.
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Na revista Fru Fru, em 1934, desenhado por Otávio, o Sacy aparece
com ―q‖ de super-herói pois voa em um morcego e anda carregado
por um caramujo veloz!
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A revista Sesinho, publicada no final da década de 40 e inicio de 50,
também publicava o Sacy, com arte de Darcy. Foi a primeira revista
que Ziraldo trabalhou. Ela também tinha uma turma de animais que
inspirou Ziraldo na sua Turma do Pererê.
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Ziraldo foi o artista quem mais importância deu ao Sacy nos
quadrinhos, criando a revista Pererê, em 1960. Ziraldo começou
desenhando na revista Sesinho, e se aproveitou do Sacy e de outros
personagens que haviam na revista, a Sá Onça, por exemplo, para
criar uma turma marcante de amigos para o seu Pererê, que estreou
na revista A Cigarra, em 1957, reaparecendo na Cruzeiro em 1959,
antes de estrear no seu próprio gibi.
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As primeiras tiras do Pererê
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Existem tiras que foram produzidas por Maurício de Souza para o
Ziraldo, nessa época, mas que nunca foram publicados! O Ziraldo diz
que a revista do Pererê acabou em 1964 "por motivos políticos". Pura
lorota dele, nunca provou essa ―teoria‖, mas o fato é que a revista,
apesar de vender bem, não cobria os custos porque era à cores, um
padrão elevado e caro para a época. Tanto que o Pererê voltou no
jornal de esquerda O Pasquim, em 1969, e teve somente oito
aventuras publicadas no tablóide, no início de 1971. Em 1975, foi
lançado novamente em uma revista em quadrinhos, pela editora
Abril, mais uma vez acabou com 10 números, e o Ziraldo sempre fica
inventando que o "personagem era perseguido porque tinha um
amigo coelho vermelho que remetia ao comunismo". Engraçado, a
Mônica usa um vestido vermelho e nunca teve esses problemas...
Esse Ziraldo mente demais!
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O Jornal do Brasil publicou algumas tiras e a Turma do Pererê é
publicada, ocasionalmente, até hoje, em álbuns com as histórias
antigas, livros infantis e também em série de televisão, fazendo o Sacy
do Ziraldo, o de maior sucesso em todos os tempos!
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O Colorado do Espaço foi uma criação de Libero Malavoglia e
Donizete Amorim. Era um saci com o corpo robótico na forma de
um redemoinho, que fazia parte de um projeto maior, de transformar
os mascotes dos principais times de futebol brasileiros em super-
heróis, e reuní-los em uma revista em quadrinhos que se chamaria
Cyberbol. A Editora Abril pretendia popularizá-los através da revista
Placar a partir de 1995 até que pudessem estrelar uma revista em
quadrinhos própria. Roger Krux, em 1997, também fez esboços para
os times de futebol a pedido da Editora Abril.
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Ao todo foram 12 super-heróis criados para os 12 principais times
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do país: Galo Vingador (Atlético Mineiro), Lança-Chamas (Botafogo),
Mega Timão (Corinthians), Fox (Cruzeiro), Power Urubu
(Flamengo), Triminator (Fluminense), Espadachim Azul (Grêmio),
Colorado do Espaço (Internacional), Cyberpork (Palmeiras),
Aquatômico (Santos), Thunder Tricolor (São Paulo) e Capitão Vasco
(Vasco). Eles só apareceram ao todo em 3 edições: setembro e
outubro de 1995 e numa HQ na edição de maio de 1997.
O Super Sacy Pererê apareceu na internet em 2010. No blogue de
seu criador, e eu adorei o personagem e tratei de espalhar pelos
fotologues! O autor Jeff Silva, o criou na infância. Ele é a capa do
nosso livro, pois é a versão que mais se assemelha a um super-herói
clássico, que é o tipo de personagem que eu mais trabalho.
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Ziraldo também transformou a Turma do seu Pererê em super-
heróis na edição 10, da 1ª série da editora Abril.
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O Saci Firmeza faz parte Liga da Vesga, do meu amigo Schiavon, é
um Sacy super-herói com vários contatos, faz o papel de "Exu" do
grupo, pois tem passe livre no céu e no inferno. Pode se transformar
no Ultra Saci Firmeza, que é uma versão sua bombado. A Vesga foi
criada em 2002 e apareceu em diversas HQs em fanzines e na
internet.
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O Saci Cibernético apareceu na Liga Tupiniquim, inicio dos anos
2000, criação de Antônio Eder, mais uma vez com a idéia da perna
mecânica, que nós vimos já é usada desde o início do século, e
remete até o robôzinho Sabbádo, criado em 1910 por Max Yantok,
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na série Kaximbow da revista O Tico-Tico, que não era um sacy, mas
é muito semelhante a um, e recentemente foi resgatado por Lancelott
Martins e transformado em um super-herói moderno!
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Sabbado, robozinho clássico do gibi O Tico-Tico. Abaixo numa versão moderna, por Lancelott
martins
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Em 2007, mais uma vez surge a ideía de um Sacy com perna
cibernética, dessa vez no gibi do super-herói Tormenta n.2, com
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roteiro de José Salles e arte de Renato Rei (arte-finalizado por Luiz
Meira).
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O Moleque Sacy, parceiro do herói do sertão, Jerônimo, foi criado
em 1953 por Moysés Weltman e levado aos quadrinhos por
Edmundo Rodrigues, considerado um dos gibis de maior sucesso do
Brasil em todos os tempo, a partir de 1957. Não é um sacy de
verdade, mas leva o nome do travesso sem pernas. Chegou a ter sua
própria revista. Na novela de televisão, que passou na TV Tupi, anos
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70, e SBT, anos 90, Moleque Sacy era interpretado pelo humorista
Canarinho, que também gravou seu próprio disco.
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No livro ―Fada Menina‖, de Lúcia Miguel de Almeida, ilustrado por
Nelson Boeira,em 1939, o Sacy mais uma vez adquire ―q‖ de super-
herói e leva a Fada Menina para voar junto com ele.
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O disco infantil ―O dia que o Sacy foi a reunião dos Super-heróis‖,
lançado em 1980, também explora a idéia de que o Sacy e o universo
dos super-heróis tem suas similaridades.
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Mas sem a menor dúvida o primeiro Sacy super-herói dos
quadrinhos foi desenhado na revista Ra Ta Plan, criada por
Integralistas, em 1939! O Sacy forma a primeira Liga dos Super-
Heróis Brasileiros dos Quadrinhos, junto com o Curupira e o
Caipora, e juntos com o Escoteiro Mário, um corajoso menino
nacionalista, expulsam o Popeye do país!
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Mas quem criou o Sacy Integralista foi o cartunista Belmonte, em
tom de piada, mas os Integralistas gostaram e se aproveitaram da
idéia. Belmonte também ilustraria o Sacy na Cartilha da Higiene,
autoria de Almeida Jr., em 1936.
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O Sacy também se faz presente nas revistas da Turma da Mônica,
principalmente nas HQs do Chico Bento, e já apareceu na revista do
Zé Carioca e na série em quadrinhos do Sítio do Pica Pau Amarelo.
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Na revista em quadrinhos dos Trapalhões, na fase da editora Abril
(anos 90), surgiu o Saci Breique, um sacy que se aproveitava do seu
ciclone pra dança.
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Na linha infantil, em 2004 saiu o livro ―Histórias do Saci‖, do
quadrinhista Antônio Cedraz (criador da Turma do Xaxado), e em
2015 foi publicado um novo gibi do Saci Pererê, de autoria de
Cristina Klein.
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Já o Saci Aíba, que surge em 1995, criado Altemar Domingos, é um
inimigo da heroína índia Jaguara, um supervilão com poderes de se
transformar praticamente em qualquer coisa!
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Tivemos recentemente alguns sacys no estilo mangá! Caçadores de
Monstros, de Paulo Gutemberg e Richardy Henrique (2015), traz a
história de Douglas, um adolescente de 16 anos que liberta terríveis
criaturas aprisionadas no nosso mundo. Ao tentar recapturá-las,
morre no processo e se torna um ser meio homem, meio fantasma.
Seus parceiros são Nathan, com quem cria uma equipe de caçadores,
e o Saci Pererê.
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Outra obra com certa influência do mangá é a HQ Folks, de Fábio
Dino, que estreou em 2011. A antagonista imediata da história é a
Kuca, ou Kety Uchoa Catheirne Arruda, uma mega-empresária e
feiticeira de sucesso, que realiza magias graças aos aplicativos de seu
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celular. Para derrotá-la, Negrinho do Pastoreio, Iara e Curupira se
unem ao Saci, um grande lutador que se fazia de mendigo nas ruas de
São Paulo.
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Em 2016, o pernambucano Odoberto Lino inicia a série
Folclorianos, também no estilo mangá, onde junto com outras lendas,
acompanha o menino João. A origem do sacy dessa série é a que
Deus tirou sua perna para fazer uma saci-mulher.
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Em Salomão Ventura, o caçador de lendas, de Giorgio Galli (2010),
o sacy foi antagonista da primeira HQ do personagem, dessa vez era
um menino morto pelo padrasto bêbado a golpes de machado que
retorna como um espírito da vingança.
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―A Bandeira do Elefante e da Arara: O Encontro Fortuito‖, é o
nome da adaptação em quadrinhos da internacionalmente premiada
fantasia heróica ―O Encontro Fortuito de Gerard van Oost e
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Oludara‖, escrita pelo norte-americano Christopher Kastensmidt e
ilustrado pela brasileira Carolina Mylius. Publicado em 2015, o Sacy
também está presente na saga, assim como outras lendas nacionais.
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Pela Borghini Editora, saiu uma versão erótica do sacy, o Saci
Safado, publicada em 1994, a HQ é assinada por Young.
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Já Daniel Paiva, iniciou a série ―Quadrinhos Canábicos‖, em 2014,
que veicula, com humor, os personagens do folclore nacional com o
tema da legalização da maconha, incluindo o Curupira e o Sacy.
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E foi em 2012 que eu criei a poesia infantil Siçá, sobre uma Saci em
forma de menina que aparece para um garoto sonhador, era pra ser
lançada em um livro infantil, ilustrado por Johnny Fonseca, mas até
hoje só apareceu na internet. Siçá é um nome que está devidamente
registrado na Biblioteca nacional desde 2006! Propriedade minha!
Porém, em 2018, apareceu Ciçá, a menina-saci, de autoria de Bruno
Prosaiko e Lucas Marques. Não pretendo abrir nenhum processo,
quanto mais autores falando, escrevendo e criando sobre o folclore
nacional, ainda que incrementando com novas interpretações,
melhor!
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O Sacy é sem dúvidas o personagem que mais aparece em livros
infantis no país, mostrando que é um folclore de inesgotável potencial
criativo, estando interruptamente nas livraria do país desde que
Monteiro Lobato escreveu o primeiro livro infantil do Sacy, em 1921!
O livro infantil do Sacy, desenhado por Francisco Aquarone foi um
dos primeiros, em 1944!
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―Jantar com o Saci‖, foi uma interessante HQ com fotografias de
bonecos feitos de massinha e cenários de Rubens Matuck e Roseli
Nakagawa, baseado em texto de Monteiro Lobato, também não tinha
data.
Vou parar por aqui, em relação aos livros infantis com aventuras do
Sacy. É um levantamento que vale a pena ser feito, mas no momento
deixarei a tarefa para outro pesquisador...
Foi no livro de 1921 (não confundir com o de 1918, que é
jornalístico), que Lobato acrescentou a Cuca na mitologia do Sacy.
Mas foi na série da TV Globo e nos quadrinhos que a Cuca ganhou
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maior destaque, chegando inclusive a ter seu próprio gibi.
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Foi a partir da obra ―Martim Cererê‖ de Cassiano Ricardo, que teve
sua primeira edição em 1928, mas sofreu inúmeras modificações nas
edições seguintes, inclusive com uma versão em quadrinhos de
Tarsila do Amaral, em 1962 (11ª edição), que o Sacy passa a ser
sugerido como símbolo da união entre as três raças da brasileira.
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Cassiano era adepto do conceito da Raza Cósmica que surgiu com o
mexicano José de Vasconcellos em 1925. O conceito da Raza
Cósmica é profético: trata-se de uma raça superior que surgirá no
Brasil com a miscigenação das três raças. O Integralismo é um
aperfeiçoamento do conceito criando fórmulas que o favoreçam. Para
Cassiano: ―Seu nome indígena era Saci-Pererê. Devido a influência
do africano, o Pererê foi mudado para Cererê. A modificação feita
pelo branco foi pra Matinta Pereira e não era de estranhar – diz
Barbosa Rodrigues, em seu Pondaruba amazonense – que ele viesse a
chamar-se ainda ―Matinta Pereira da Silva‖. Daí Martim Cererê como
conciliação, em que colaboram as três raças de nossa formação
inicial. É o Brasil-menino. Ou melhor, o mito do Brasil-menino‖.
Segundo Plínio Salgado, Cassiano com seu Martim Cererê
―descobriu o sentido profético da lenda tupi‖!
Para Plínio Salgado, Chefe Supremo do Integralismo, a lenda
brasileira do Sacy representa a união das 3 raças: ―Se ele foi o
curumim das aldeias indígenas, e o moleque das senzalas, deve ser
também o italianinho das nossas fazendas de café e o escoteiro das
nossas escolas. É o mesmo travesso. E, como tal, a própria imagem
da Pátria.‖
Mas foi outra lenda brasileira famosa (mas nem tanto), o Curupira,
que Plínio Salgado elevou à símbolo de seu primeiro movimento
nacionalista, o verde-amarelismo, criado antes do Integralismo: ―O
Curupira é a própria alma nacional, na sua inquietude, renovando-se
cada noite. Mais do que símbolo nacional, símbolo humano que
supera a D. Quixote e a todas as outras criações – o Curupira há de
descer um dia do sertão, lá onde está a voz que chama montando a
anta, seu cavalo e o totem da raça tupi, para a invasão das Cidades e a
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grande revolução do pensamento nacional, de que somos pobres
batedores, destinados ao sacrifício. Só então, será proclamada a nossa
independência mental.‖ Curupira chegou também aos quadrinhos
com sua turminha em um gibi próprio de José Lanzelotti, publicado
em 1970. Em 2006, é publicado um álbum de Flávio Colin.
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Atualmente o legado do Sacy é bem explorado nos grafites urbanos
que o mantém vivo nas grandes metrópoles do país! O artista plástico
e publicitário Thiago Vaz acabou sendo mais conhecido por sua
criação, o Saci Urbano, que sempre manda recados em grafites pelas
ruas de São Paulo e de outras cidades por onde ele passa. O Saci
Urbano dos muros também é um caçador dos super-heróis
estrangeiros!
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O Sacy, devido ao seu cachimbo, também é comum em grafites nas
cracolândias do país. Sacy se tornou uma gíria para traficantes de
drogas e é comum que eles tatuem o Sacy na pele representando isso.
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Grafites do Saci em uma cracolândia
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fonte principal: https://colecionadordesacis.com.br/
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ANEXOS:
1- NO BRASIL, TODO DIA É DIA DE SACI
Por Maria Lucia Dahl
O deputado Aldo Rebelo propôs que se instituísse o Dia do Saci no
Brasil para substituir o Halloween, aquela festinha de bruxas
absolutamente insuportável, inventada pelos americanos. Conta o
nosso folclore que o Saci é uma entidade tipicamente brasileira que
faz desaparecer, inexplicavelmente, todo e qualquer tipo de objeto.
Sendo assim, deputado, o que eu acho que deva ser feito, com
urgência, é oficializar Um Dia do Saci, porque aqui no nosso país
todos os dias são dele.
O dinheiro dos nossos impostos desaparece sucessivamente, o
dinheiro do INSS, o aumento do salário-mínimo, as verbas da saúde,
das ambulâncias, da educação... Desaparece até o quorum da
Assembléia para que não se possa votar as leis, desaparece o nosso
pé-de-meia do banco e eu poderia enumerar mais uma série de coisas
que se desmaterializam do dia para a noite. Mas não estou aqui para
fazer um relatório do nosso desvio de verbas pelos Sacis oficiais e sim
uma crônica sobre o Dia do Saci verdadeiro.
Pois bem. Se oficializássemos o dia dele, quem sabe só se poderia
roubar nessa data estabelecida por lei? Não é o ideal, claro. Mas,
afinal de contas, seríamos assaltados só um dia no ano e ficaríamos
livres de extorsões nos outros 364. Acho que é uma, deputado,
embora admita que seja um pouco difícil essa lei colar.
Porque o senhor sabe, deputado, já tentaram transformar Papai
Noel em Vovô Índio durante a minha infância, também sob o
pretexto de se valorizar o folclore brasileiro. Mas ninguém quis saber
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do pobre vovô, que, desprezado pela garotada, deve ter voltado lá
para a sua aldeia e tentado enriquecer vendendo a Amazônia pros
gringos.
Se não for assim, como é que o pobre vovô (para não dizer,
paupérrimo) vai dar presente para as crianças brasileiras? Papai Noel
é rico, saudável, pródigo, está na cara que é estrangeiro... Chega aqui
arrasando com aquele carro de renas, botando para quebrar. E o
Vovô Índio, o que pode fazer pela gente, faminto, desdentado e
diabético com um gravadorzinho "de quinta" na mão? Para quê?
Também não sei.
Quem é que vai parar para ouvir o que um pobre índio tem a dizer?
O único problema de Papai Noel é que seja assaltado como qualquer
turista que se preze, ainda por cima ostentando aquele saco repleto
de tentações... Mas já me contaram, em sigilo, que as renas de agora
são seguranças disfarçados que só reclamam do calor daquela capa de
pele que têm que usar aqui nos trópicos. Tristes trópicos...
E olha que já foram tão inocentes e animados! Na minha casa em
Botafogo, por exemplo, tinha o Natal dos Moleques, planejado por
vovó, cheio de rabanadas e presentes escondidos pelo jardim. Hoje
em dia, vovó já seria esganada só pelo fato de chamar os meninos
pobres de moleques (o que, na época, queria dizer apenas crianças),
antes do Papai Noel chegar.
Saci era uma entidade da floresta que não roubava, apenas brincava
com as pessoas escondendo suas coisas ou trocando-as de lugar. Só
tinha uma perna, meu Deus, não podia nem fugir da polícia... O Saci
era um brincalhão, um gozador que atualmente seria preso pelo fato
de fumar cachimbo, ameaçando os seus próprios pulmões...
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Naquele tempo, Saci algum morria desse tipo de problema. Eles
ficavam muito vivos para nos fazer rir ao ler os livros de Monteiro
Lobato, agregando-se a Pedrinho, Narizinho e Emília em suas
aventuras, escondendo os óculos de Dona Benta no Sítio do Pica-Pau
Amarelo. Como eram educados os Sacis daqueles tempos...
Queriam nos fazer rir e não chorar com o desvio sistemático de
nossas verbas escondidas em cuecas e contas na Suíça. Mas não
descarto a possibilidade de ter sido um dos antigos o que escondeu o
tal do dossiê Freud. Tá quente, tá frio, tá pelando, esfriou... Isso, para
mim, é coisa de Saci dos antigos...
Pior é que, depois de uma certa idade, a gente tem que enfrentar
dois tipos de Saci: o material, aquele armado, roubando por toda
parte, e o virtual, que some com agendas, óculos, chaves, guarda-
chuva, troçando da gente... Por isso sou francamente a favor de se
oficializar um dia nacional para o Saci. Assim nos outros dias ele nos
deixará em paz. Isso se o Saci da Amazônia não tiver sido vendido
para os americanos junto com a floresta...
Jornal do Brasil, em 2003
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2- O Saci
Por Ligia Cabús
O Saci-Pererê é uma assombração das matas e áreas rurais.
Pertence, originalmente, ao folclore do sul do Brasil. Sua figura,
muito pequenina, é a de um negrinho perneta. Usa um gorro
vermelho, fuma um cachimbo rudimentar, o pito, e tem as mãos
furadas. O mito do saci é o resultado da convergência e mistura das
crenças das três etnias que, historicamente, entre a colonização e o
Império, formaram o povo brasileiro: índios, portugueses e negros.
Entre os tupi-guarani, relaciona-se a uma ave chamada Matinta-Perê
[ou Matinta-Pereira] que, postada sobre uma só perna, emite um
canto sombrio considerado de mau-agouro. Até hoje, uma das
características e sinal da presença do saci é o seu assovio. A tradição,
nascida no extremo sul, migrou com os índios para o centro-oeste e
sudeste chegando, eventualmente ao norte-nordeste do país. É de
origem indígena a denominação popular da ave: Saci, também
chamada de "Peito-ferido".
Os portugueses fundiram a idéia da ave com as também pequenas
criaturas dos bosques europeus, anõezinhos, alguns malvados, outros,
apenas travessos que aparecem nos contos de fadas, como no clássico
de Grimm Rumpelstiltskin: "um anãozinho muito feio dançando em
uma roda de fogo com uma perna só". A idéia do pássaro foi, então,
antropomorfizada. Mais tarde, os negros forneceram sua contribuição
concebendo os sacis como almas penadas de crianças mestiças,
bastardas, fruto das relações entre escravas e senhores, rejeitadas e
freqüentemente abandonadas nas matas.
Finalmente, quando o mito se consolidava, entre os séculos XVIII e
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XIX, surgiu uma versão sobre o nascimento dos sacis, descrita por
Monteiro Lobato [que também era pesquisador do folclore nacional]
em sua obra infanto-juvenil O Saci: eles nasceriam nos seguimentos
do bambu gigante chamado Taquaruçu onde se desenvolveriam até
que, estando plenamente e magicamente formados, incluindo o gorro
e o pito, rompiam as hastes e ganhavam o mundo passando a
freqüentar fazendas e vilarejos onde praticam suas "artes": gorar ovos,
chupar o sangue das vacas e cavalos, destes, também se ocupando em
trançar-lhes as crinas, rezando o milho nas panelas para frustrar o
desabrochar das pipocas, azedando o leite, gorando ovos, roubando
fumo, que tanto apreciam, fazendo sumir pequenos objetos para
perturbar a ordem doméstica, confundindo o caminho dos tropeiros
e viajantes, assustando os animais com seu peculiar assovio. Essas
travessuras, o saci faz somente para se divertir.
Como assombração que é, o saci tem o poder de aparecer e
desaparecer por encanto e capturá-lo é é um procedimento
relativamente difícil Segundo a tradição, relatada por Monteiro
Lobato, a circunstância ideal para pegar um saci é em dias de
ventania, quando aparecem redemoinhos de poeira e folhas secas.
Produzir esses redemoinhos é uma das diversões dos sacis que,
girando sobre a perna única, posicionam-se no centro da formação.
O "caçador", munido com uma peneira "cruzeta" [que tem duas faixas
em cruz como reforço no bojo], uma garrafa de vidro bem escuro e
uma rolha também marcada com uma cruz na parte superior,
aproxima-se do redemoinho e lançando a peneira bem no meio,
aprisiona o duende.
Em seguida, introduz a boca da garrafa levantando minimamente a
peneira: o saci, buscando a escuridão, refugia-se dentro da garrafa
que, então, deve ser rapidamente arrolhada. Lá permanecerá
122
invisível, mais um truque para fazer com que pensem que conseguiu
escapar. No entanto, em um dia de muito calor, quando o captor
estiver imerso em profunda sonolência, ele se mostrará. Quem, além
de capturar, conseguir se apossar do gorro do duende, adquire poder
sobre ele, que se torna um escravo de quem realizar a proeza.
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3- Saci, o Papai Noel brasileiro
Postado por Diário de um Aprendiz em 7 de dezembro de 2008
Não sei se é trauma, quando criança acreditava em Papai Noel, mas
quando vi meu pai trazer minha primeira bicicleta eu comecei a
desacreditar em tudo, eu até achava que o coelhinho da páscoa
botava ovos, mas também por ser maduro demais pra minha idade
sempre contestei um coelho que botasse ovo e afirmava que o papai
Noel de verdade era o saci, pois era impossível um velho gordo em
pleno verão andar com roupas tão pesadas, o saci não, era negro,
magrinho ( provavelmente era um homem consciente, fazia a
caridade de dar presentes pois deveria ter passado fome em sua
infância) e também usava o gorro vermelho. Hoje penso que sim ele
é o papai Noel brasileiro, na verdade eu acho que ele é um ex
bandido que vive foragido e perdeu a perna após uma tentativa de
assalto a bancos onde estava fantasiado de papai Noel, e que na
verdade ele fuma crack e maconha, vive na floresta como um gerente
de logística do trafico de drogas, tem contatos com Beira Mar e o
comando vermelho e PCC, também atua na extração ilegal de
madeira na Amazônia e dizem as más línguas que pra se divertir usa
uma bazuca pra derrubar aviões nas florestas, investigações apontam
ele como suposto responsável pela queda do avião da gol.
Mudando de gato pra lebre, no natal como o nosso pais para, o saci
não pode ser preso, deixam a ele uma tal ―liberdade condicional‖
uma espécie de ―saidinha de natal‖ pra que ele visite a família e doe
brinquedos a instituições de caridade e a crianças faveladas
desprovidas de condições de consumo ( pretos pobres), o que na
verdade se for bem observado é uma festa a todos os parentes de seus
comparsas e as comunidades que tanto os apóiam, sem contar que
124
toda essa patifaria de entrega de presentes é abatida em dobro do
imposto de renda.
Passada a época de festas já se preparam novas festas um tal de
carnaval onde se é permitido andar pelado e beber até cair, é uma
festa típica tupiniquim, mulheres esculturais mostram em rede
nacional, isso pela TV globo, a que vieram a esse mundo ( A FESTA
DA BUNDA), e lembra do saci? Pois é nas festas de natal de tanto
encher o rabo de peru ele engorda e ainda curte a festa como rei
momo onde usa sua prótese e desfila ao lado de mulatas lindas e sem
nada na cabeça!
Passada toda essa putaria o país retoma suas atividades ―normais‖.
Então o saci volta a ser o gerente de logística do trafico, fuma seu
crack e maconha e derruba aviões que virarão noticias na
retrospectiva de fim de ano!
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4- Natal Brasileiro e Sustentável
Por Arigoela Bastos
Narrador: Diante de uma imensa TV dois olhos vidrados mal
piscavam. É um menino com cara redonda, olhos grandes, boca
pequena, dentes miúdos. Mas com potencial de demolir a casa com o
seu grito ardido, ensurdecedor;
Menino: - Pai! Mãe! Paaaai! Mamããããe!
(Responde uma voz aguda e aborrecida)
- O que é? O que é, moleque?
Menino:- Já escolhi o meu presente de natal! Quero o brinquedo
novo que eu vi na tevê.
(Troca de cenário. Retiram-se a TV e o menino. O segundo cenário
consiste em uma área de floresta e perdura até o encerramento da
peça)
Narrador:- Mais ágil que um gavião, mais arisco e desconfiado que
um lobo-guará, o Saci Pererê surge no ressonar de um assovio.
Saci:- Alguém falou em brinquedos? Quem quer brinquedos novos?
Eu quero! Eu quero novos brinquedos para quebrar! Adoro fazer
travessuras com os outros! Eia!
Narrador: Ao ouvir as maléficas intenções do Saci, aproxima-se o
Vovô Índio, representante das escassas tribos da Mata Atlântica do
nosso país, confiando alguns poucos fios de barba branca.
Vovô Índio:- Saci, meu filho, não é esse o espírito de Natal.
Saci:- Espírito de Natal! Cruz credo! Aí, que eu morro de medo de
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espírito e assombração!
Vovô Índio: - Não Saci, meu filho. Não é esse o espírito natalino. Eu
me refiro a um bom espírito que deve estar presente em cada um de
nós, repleto de paz, de amor ao próximo, respeito à natureza e
amizade. Esse espírito foi a melhor coisa que o homem branco já
criou. Por isso, não podemos quebrar brinquedos só para chatear os
outros. (Vovô Índio responde calmamente);
Saci:- Já seeeei! Já que eu não posso quebrar, quebrar, quebrar o
certo é comprar, comprar, comprar como fazem todas as outras
crianças! Eia!
Vovô Índio: - Mas Saci, só comprar, comprar e comprar brinquedos
e presentes novos não é o espírito de natal!
Saci:- Eitaespiritozinho complicado, hein? (Diz, olhando para a
platéia).
Vovô Índio:- Na minha tribo, por exemplo, os pais não compram
nada para os filhos. Ensinamos as crianças a construírem os
instrumentos que elas precisam para sobreviver. Assim como tiro o
sustento da terra, uso essas mesmas mãos (exibe as duas mãos para a
platéia) para confeccionar bolas, petecas e tantas outras coisas. (Nesse
momento o cenário pode ser invadido por petecas e afins, os quais
poderão ser arremessados contra o Saci que deverá esquivar-se de
maneira cômica, gritando ―ui, ui‖).
Saci:- Então o senhor é o que? Não vai me dizer que é o Papai
Noel...
Vovô Índio:- É... (Vovô Índio tenta dizer algo mas é interrompido
pelo Saci).
128
Saci:- Mas o senhor não tem cara de Papai Noel. Cadê o gorro
vermelho? E desde quando Papai Noel anda quase pelado? (E dá
uma gargalhada).
Vovô Índio:- Ora, ora menino... (diz o Vovô um pouco tímido).
Saci:- Não caio nessa não, amigo! E essa barbicha branca? É tão
pequena que mal dá para se fazer uma trança...
Vovô Índio:- É por conta do calor, menino. É por conta do calor que
faz no Brasil que quase não tenho barba! Agora deixe e travessura
pois já lhe disse: aborrecer os outros não é ter espírito de natal. Mas
você parece não ter jeito! Não entende nada mesmo sobre o natal.
Enquanto Vovô Índio dava as costas para o Saci, ele acaba
surpreendido por um velho mulato, de porte atlético e abdome
musculoso, camiseta regata amarela, calção de praia e um gorro
verdes. No rosto bronzeado um sorriso largo e um tufo de barba
branca. Nos pés, um par de tradicionais havaianas.
-Ho,ho,ho! Alguém falou de natal? Eu adoro o espírito de natal!
Saci:- Pronto! Lá vem outro dizer que é o Papai Noel. Aí, meu Deus,
só tem doido nessa floresta!
- E na cidade também. Na floresta ou na cidade ninguém acredita que
eu seja o Papai Noel! Vocês é que são doidos (aponta para o saci e
para o público) por não verem que eu tenho as cores do Brasil: o
verde da nossa mata, o amarelo das nossas riquezas... sem falar que
aquela roupa vermelha quase me mata de tanto calor. Ufa! Doido eu
seria se me vestisse como os Papais Noéis do Pólo Norte...
(Pausa)
Papai Noel chega mais perto do Saci Pererê.
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Papai Noel:- Eu não duvide, criança! Eu sou o Papai Noel (responde
com entusiasmo o velho mulato). Você tem que concordar, Saci,
onde eu arrumaria quatro renas pra me ajudar a puxar o trenó aqui
no Brasil? Como eu entraria pela chaminé das casas se ninguém aqui
tem chaminé na casa? Acaso, as crianças da platéia vivem na neve?
Ou alguém aqui já ficou cara a cara com um urso polar? Ho, ho, ho!
Saci:- Até que faz sentido...
Papai Noel:- É claro que faz sentido. A criançada pode nunca ter visto
um urso-polar, mas com certeza já viu um pica-pau, um beija-flor,
uma garça ou até mesmo um teiú ou uma capivara. Agora se ninguém
nada disso tiver visto, eu até sugiro uma visita aos parques ecológicos,
que tal o Varvito? (O Papai Noel diz olhando para a platéia).
Saci:- O senhor realmente conhece muita coisa do Brasil, seu Papai
Noel! Ui que eu estou pasmo!
Papai Noel:- Não só conheço o Brasil como amo as maravilhas do
nosso país! Passo tanto calor no natal que todo ano faço torta de
cupuaçu e sorvete e açaí com as frutas que eu trago lá da Amazônia.
Vovô Índio:- Sem falar das frutas aqui da Mata Atlântica que cada um
pode plantar e colher pertinho de casa. Que tal um suco de uvaia, de
goiaba ou de pitanga bem gelado? He! He!
Saci:- Uau! Não é que esse cara parece ser mesmo o Papai Noel?
Papai Noel:- Sim, sim, sim! Ho, ho, ho! Além disso aprendi o
verdadeiro significado do espírito natalino.
Saci:- Já sei, já sei! Espírito de natal não é só comprar presente nem
arrumar confusão.
Papai Noel:- Isso mesmo, Saci. Mas agora encontrei um nome
130
incrível para o espírito de natal.
Saci e Vovô Índio:- Qual é? Qual é, Papai Noel?
Papai Noel:- Tan, nan, nan, nan... (tom de mistério). O nome da
palavra é SUSTENTABILIDADE.
Saci:- Eita, que palavra difícil!
Papai Noel: Calma, calma pessoal, pois eu explico. Vocês verão que
não é tão difícil de entender assim. SUSTENTABILIDADE é cuidar
da natureza como o Vovô Índio faz e fazer o que o Saci disse. Pois
quem ama a natureza não pensa só em comprar presente e muito
menos em arrumar confusão com os amiguinhos.
Vovô Índio:- Mas você ainda não explicou para a garotada o que é
SUS... SUS... (O Vovô gagueja um pouquinho para pronunciar).
Papai Noel:- SUSTENTABILIDADE! Como eu ia dizendo,
sustentabilidade significa usar os recursos da natureza como a água, a
madeira, os minerais até mesmo para confeccionar brinquedos, mas
sem deixar de pensar no bem-estar dos outros. Temos que nos
preocupar com as crianças que ainda vão nascer, com os filhos de
vocês (aponta para a platéia). Quem é solidário cuida do meio
ambiente e da saúde daqueles que ama.
Saci:- Ora, eu também quero pensar nos outros, Papai Noel. Quero
ver a minha cria aprontando por aí, mas sem quebrar o brinquedo
dos outros, é claro. Eia, que eu gostei desse negócio de
SUSTENTABILIDADE. Afinal, comprar e quebrar brinquedos sem
necessidade só gera desperdício e mais lixo para o Meio Ambiente.
Vovô Índio:- Você está certo, Saci. Será que a criançada da platéia já
se perguntou para onde vão as embalagens e os presentes quando
131
ficam velhos?
Pausa para o Vovô tossir um pouco.
Vovô Índio:- Os presentes velhos ou quebrados, crianças, acabam
reduzindo a vida útil dos aterros da cidade ou poluindo calçadas, ruas
e rios. Vejam só o Rio Tiete! Que judiação! Quanto lixo jogaram no
nosso rio!
Papai Noel:- Sem falar no petróleo que o homem usa para fazer os
brinquedos de plástico. As pessoas se esquecem eu grande parte dos
recursos naturais podem se esgotar. Portanto, o primeiro passo para
ser sustentável e ser solidário e aprender a economizar.
Saci:- Está bem, está bem! Não vou mais quebrar os presentes de
ninguém. Quero reduzir a quantidade de lixo que jogamos no Meio
Ambiente. Também não vou comprar presente nenhum nesse natal.
Por favor, por favor Papai Noel, me deixa ser sustentável como
vocês? (O Saci parte pra cima do Papai Noel e tenta agarrá-lo).
Papai Noel:- Ora, é claro que você pode ser sustentável, Saci. E tem
mais, você não precisa ficar sem presente de natal. Afinal, toda
criança tem o direito de brincar. Então, eu trouxe um brinquedo
sustentável pra você (opção livre para qualquer brinquedo eito de
recicláveis).
Saci:- Oba! Oba! Adorei o presente, Papai Noel!
Papai Noel:- Que bom! Que bom! Você acredita que esse material ia
para o lixo? Então resolvi reutilizá-lo, ou seja, usá-lo de novo. Esses
materiais que podem ser utilizados várias vezes chamam-se
recicláveis. São eles o papelão, os vidros, as garrafas de plástico, e
tantos outros. Com esses materiais recicláveis e um pouco de
criatividade criei um brinquedo novo.
132
Vovô Índio:- Então que tal fazermos uma feira de brinquedos? Assim
economizamos os recursos da natureza e ninguém fica sem presentes
novos!
Saci:- Boa idéia, Vovô!
Vovô Índio:- Quem dia que até o Saci poderia ajudar a salvar o
planeta! He! He!
Papai Noel:- E ajudar o planeta não significa deixar de ter brinquedos
nem passar necessidades. O povo brasileiro é amigável, solidário, mas
gosta de aproveitar a vida. Nós podemos curtia praia, carnaval,
futebol e até música clássica, só não podemos esquecer que
sustentabilidade é também cuidar da vida dos outros (mas sem fazer
fofoca hehe) é cuidar das plantas, dos animais e pensar no presente
que sempre ruma para o futuro! Pensem nisso e tenham um natal
consciente! Feliz Natal! Ho! Ho! Ho!‖
Em 27 de outubro de 1936, no Correio Paulista, Christovam
Camargo escreveu o seu último artigo sobre o Vovô Índio. Podemos
ver um tom de despedida, Christovam clama para que Vovô Índio se
torne o que tanto sem empenhou: uma lenda eterna no coração dos
brasileiros, um símbolo do nacionalismo, e, sem xenofobia, deseja
que o Vovô Índio conquiste todos os países da América! Christovam
ainda revela que acredita que o mundo se tornará melhor, mais
tolerante e sem guerras, se mais estrangeiros se mudarem pra cá pra
depois espalharem pelo mundo o espírito brasileiro da tolerância:
―Vovô Índio reivindica para o Brasil o direito de viver por si, de
dirigir ele mesmo as suas coisas, de se libertar do estrangeiro que o
tiraniza pela força ou queira dominá-lo pela astúcia, que se imponha
pela brutalidade das armas ou se insinue pela sugestão do dinheiro.
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Independencia ou morte não é para o Vovô índio uma pagina da
história que leu e deixou pra trás: é a síntese de um evangelho de luz
em que ele vai diariamente haurir forças para manter-se erecto e
sobranceiro.
Por isso Vovô Índio, que é a alma da terra brasileira, proclama a
necessidade de uma política desanuviada e varonil, estimuladora das
energias nacionais, fomentadora de iniciativas úteis, criadora de
riqueza – uma política que relacione as competências, combata os
displicentes, destrua os exploradores e faça do Brasil o que ele deve
ser – uma pátria imensa.
Mas Vovô Índio não é xenófobo. Como ama sua terra e sente o
fetichismo de tudo que é seu, acha que os outros têm direito de
pensar e sentir da mesma maneira e, tudo fazendo pela sua pátria,
respeita as pátrias alheias. Sabe que não pode viver isolado, que o
mundo é uma grande comunhão de pátrias, que se devem ajudar e
estimar entre si. Vovô Índio procura contribuir, no que lhe é possível,
para que as outras nações sejam felizes e exige que as outras nações
não impeçam a sua felicidade, antes, forneçam, para tanto, o seu
contingente de boa vontade. Vovô índio é tão patriota e nacionalista
que se insurge energicamente contra esse funesto espírito de
imigração que nos faz caudatários de outros povos.
Repelle, pois, com todas as suas forças, os regimes extremistas, que
estão arrastando o mundo a um tragico destino, regimes que aqui não
se aclimatam, que são contrários a nossa índole... Que nos deixem
tranqüilos, e acabaremos sahindo, por nos mesmos, do cipoal em que
vivemos emaranhados por nossa falta de juízo.
Vovô Índio fecha o mapa melancolicamente e conclue: ―Essa
rapaziada que anda por ahi com fumos de racista não sabe onde tem
o nariz; pensar em ser mais nacionalista do que eu. É querer ensinar
o padre-nosso ao vigário; eu, que sou o legitimo dono da terra, não
me encarniço contra o branco que daqui me expulsou. Vejo como
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tinha razão em expoliar-me do que era meu, que eu não tinha
capacidade para valorizar. Si faço questão de viver, não é para afastar
o estrangeiro ou combate-lo é apenas para lembrar aos meus netos
que devem professar pelo solo generoso em que nasceram um
entranhado amor.
Que eu seja conservado simplesmente como um symbolo romântico
da terra americana. Que vejam apenas em mim, não só Brasil, como
todos os povos do novo mundo, a sombra protectora, guarda vigilante
da sua independência. Que eu seja, si quizerem um elemento de
differenciação dos velhos costumes carcomidos, um como que de
santo e senha para que entre si se identifiquem os jovem nações
colombianas, que não conhecem ódios e estão vendo nascer de seu
seio uma humanidade melhor.
Só assim poderemos realizar aqui, no Brasil, obra nossa, formar
uma nação pujante na sua originalidade. Evitemos imitar obtusamente
o alienígena, sobretudo no que elle tem de mau, mas procuremos
attrahi-lo para que venha ajudar-nos a construir uma pátria radiosa.
Sem elle nada poderemos fazer. Chamemol-o não para que se
apresente a impor-nos a sua mentalidade, –que somos e queremos
ser sempre essencialmente americanos, mas apenas para que se aliste
para trabalhar – dentro das diretrizes soberanas.
Si formos fortes, absorv-o-emo... Incorporados à nossa vida,
adaptados ao nosso meio, longe de desnacionalizar-mos, soffrerá o
influxo de nossa brasilidade victoriosa, ilhe-er-mos pouco a pouco
cortando as amarras que o prendem espiritualmente no seu berço de
origem ou aos seus exclusivimosraciaes, e elle acabará por ser um
bom brasileiro, empregando todas as suas energias para maior
grandeza de um torrão que passará a ser o seu torrão: ubi bene,
ibipatria...‖
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