Acórdão Do Tribunal Da Relação Do Porto
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I. RELATÓRIO:
7. Realizada a audiência final, foi proferida sentença pela qual se decretou o seguinte:
Termos em que se decide:
i.- julgar o presente procedimento cautelar de suspensão de deliberação social
procedente e, consequentemente, ordenar a imediata suspensão da deliberação social
tomada em assembleia geral de acionistas da sociedade requerida a 11-04-2022;
ii. – não apreciar o pedido de inversão do contencioso;
Custas a cargo da Requerente, a atender na ação principal (art.º 539.º, n.ºs 1 e 2 do
CPC).
Registe.
Notifique.
Comunique à Conservatória do Registo Civil, para efeitos de averbamento da presente
decisão no registo da sociedade Requerida.”
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VII- A assembleia pode ser convocada pelo presidente da mesa da assembleia geral
sempre que a lei o determine, a pedido do administrador, ou qualquer acionista que
represente 5% do capital social
VIII- A assembleia geral foi convocada pelo presidente da mesa da assembleia geral no
uso de competência própria e a pedido do acionista CC, titular de 50% do capital social,
do qual é pai e representante legal.
IX- A convocatória é clara, suficiente e elucidativa, contendo os elementos mínimos de
informação que permitam aos interessados tomar conhecimento dos assuntos que iam
ser debatidos e prepará-los para uma decisão tendencialmente situada dentro desse
objecto decisório.
X- O prazo para requerer a suspensão é de 10 dias, a contar da data da assembleia em
que foi tomada a deliberação objecto de impugnação ou, se o requerente não tiver sido
regularmente convocado para a assembleia, da data em que ele teve conhecimento da
deliberação.
XI- O procedimento cautelar foi intentado muito para além de tal prazo, pelo que caducou
o direito de tal requerer
XII- Uma deliberação não causa dano apreciável apenas por ser ilegal, havendo que
demonstrar em concreto um dano com aquelas caraterísticas.
XIII- Exige-se um juízo de forte probabilidade de dano iminente, bem como da medida e
extensão do mesmo, que permitam julgá-lo considerável, não sendo suficiente a alegação
de mera possibilidade de prejuízo cujo volume não seja quantificado.
XIV- Exige-se um juízo de forte probabilidade de dano iminente, bem como da medida e
extensão do mesmo, que permitam tomá-lo por considerável, não sendo suficiente a
alegação de mera possibilidade de prejuízo cujo volume não possa quantificar-se ou
aquilatar-se.
XV- Qualquer perigo ou dano já estaria consumado atento o período de tempo decorrido
entre a realização da assembleia e a instauração do procedimento.
XVI- O douto despacho em crise violou, além do mais, os artigos 374.º, 377.º e 391.º do
cscomerciais e artigos 380.º n.º 1 e 3 do cpcivil.
Concluiu, pedindo que seja concedido provimento ao presente recurso, e
consequentemente seja revogada a douta sentença e substituída por acórdão que
considere como improcedente o pedido de suspensão da deliberação social
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residente na Rua ..., ... ..., em decorrência da escritura de doação que lhes foi feita.
3.- Por deliberação tomada no dia 01/09/2020, foi designada para o exercício das funções
de Administradora Única da sociedade e para o triénio de 2019/2020/2021 EE, mãe dos
dois únicos acionistas, AA e CC.
4.-Em assembleia geral de acionistas da Requerida ocorrida em 11/04/2022, foi
deliberado, entre outros assuntos, a eleição dos novos órgãos sociais da Requerida,
tendo para o efeito sido designado Administrador Único DD, contribuinte fiscal nº ...00,
residente na Avenida ..., ... ..., ... e ....
5.- A convocatória para a assembleia referida em 4.) foi assinada por BB, na qualidade de
Presidente da Mesa da Assembleia Geral e publicitada no portal em 08/03/2022.
6.-Em nenhuma das deliberações tomadas em sede de assembleia geral de acionistas
foi deliberado nomear BB para o exercício do cargo de Presidente da Mesa da
Assembleia Geral.
7.- A convocatória referida em 5.) não foi precedida de solicitação nesse sentido do
Conselho de Administração, da Comissão de Auditoria, do Conselho de Administração
executivo, do Conselho Fiscal ou do Conselho Geral e de Supervisão ou por um ou mais
acionistas que possuam ações correspondentes a, pelo menos, 5% do capital social.
8.- O acionista da Requerida CC nasceu em .../.../2005, sendo os seus pais o referido BB
e EE.
9.- Na data da realização da assembleia geral não se encontrava regulado o exercício
das responsabilidades parentais de CC.
10.- BB interveio na assembleia geral de 11/04/2022 em representação do acionista
menor e seu filho CC, sem a presença e representação da progenitora deste, EE.
11.- Os acionistas da sociedade Requerida desconhecem as aptidões do Administrador
Único DD, para o exercício das funções para as quais se encontra nomeado.
12.- As últimas contas prestadas pela sociedade reportam-se ao ano de 2015.
13.- O administrador nomeado acedeu à conta bancária titulada em nome da Requerida.
14.- A Requerida detém fundos na referida conta bancária que facilmente podem dali ser
retirados pelo Administrador Único nomeado.
15.-Na assembleia geral extraordinária de 07.06.2019, a Presidência da MAG foi
assumida pelo Sr. BB.
16.- Na assembleia geral de 01.11.2020, a Presidência da MAG foi assumida pelo Sr. BB.
https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/8e0789dafad59bd680258aca0056cf32?OpenDocument&Highlight=0,suspens… 4/13
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IV. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA.
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contrato, qualquer sócio pode requerer, no prazo de 10 dias, que a execução dessa
deliberação seja suspensa, justificando a qualidade de sócio e mostrando que essa
execução pode causar dano apreciável.
Os requisitos cumulativos de que a lei faz depender o decretamento da providência, são
os seguintes, como decorre dos arts. 380º e 381º do CPC:
- Que o requerente assuma a qualidade de sócio ou titular de capital social da sociedade
que tomou a deliberação (questão atinente à legitimidade do requerente);
- A invalidade da deliberação- nulidade ou anulabilidade- ou a ineficácia stricto sensu
(contrariedade à lei, aos estatutos ou ao contrato);
- A forte probabilidade de dano apreciável resultante da execução da deliberação;
- Que o prejuízo da suspensão da deliberação social seja inferior ao prejuízo da
execução.
É inquestionável que a requerente assume legitimidade para requerer a suspensão da
deliberação social sob apreciação porquanto é titular de 50% do capital social da
requerida, não estando tal requisito questionado em sede deste recurso.
Também resulta inegável que para a verificação do requisito da invalidade da deliberação
social exigido pelos referidos preceitos legais basta a comprovação sumária de um dos
vícios apontados pela requerente à referida deliberação social, o que tornará
desnecessária a apreciação dos demais.
Resulta da sentença recorrida, relativamente ao requisito da invalidade da deliberação
social o seguinte:
“No caso em apreço, está em causa a deliberação tomada na assembleia geral da
sociedade Requerida realizada no dia 11 de abril de 2022, por via da qual foi designado,
como seu Administrador Único, DD.
Segundo a Requerente, tal deliberação é inválida, desde logo, por ter sido tomada em
assembleia geral precedida de convocatória assinada por BB, na qualidade de Presidente
da Mesa da Assembleia Geral, sem que o mesmo tenha alguma vez sido nomeado para
tal cargo; depois, pelo facto de tal convocatória não ter sido precedida de pedido de
qualquer dos restantes Órgãos sociais da Sociedade Requerida.
A este propósito, resulta do disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 56.º do CSC que são
nulas as deliberações dos sócios tomadas em assembleia geral não convocada, salvo
se todos os sócios tiverem estado presentes ou representados.
Por seu turno, de acordo com o disposto no n.º 2 do mesmo preceito, não se consideram
convocadas as assembleias quando, além do mais, o respetivo aviso convocatório seja
assinado por quem não tenha essa competência.
Depreende-se da factualidade apurada que o aviso convocatório para a assembleia geral
em causa nos autos foi assinado por BB, na qualidade de Presidente da Mesa da
Assembleia-Geral da sociedade Requerida.
Este, contudo, não detinha a qualidade de que se arrogou de Presidente da Mesa da
Assembleia-Geral da Requerida, à luz daquilo que decorre do regime previsto no art.º
374.º do CSC.
Com efeito, o pacto social da Requerida, não contém qualquer determinação sobre a
possibilidade de eleição do mesmo para a assunção de tal cargo. Por outro lado, a
pessoa em causa não se assume como presidente do conselho fiscal, da comissão de
auditoria ou do conselho geral e de supervisão da Requerida. Finalmente, também não é
acionista da Requerida.
Falham, por conseguinte, os pressupostos para que o mesmo, à luz daquilo que dispõem
os n.ºs 2, 3 e 4 do referido preceito, possa assumir ou ter assumido na assembleia geral
em causa a qualidade de Presidente da Mesa da Assembleia-Geral.
Assim, tendo o mesmo assinado a convocatória para a dita assembleia geral sem
assumir a qualidade necessária para tanto, forçoso é concluir, considerando o
disposto no citado art.º 56.º do CSC, que tal assembleia não foi validamente
convocada, sendo, pois, nulas as deliberações nela tomadas.
Acresce que, de acordo com o disposto no art.º 375.º, n.º 1 do CSC, as assembleias
gerais de acionistas devem ser convocadas sempre que a lei o determine ou o conselho
de administração, a comissão de auditoria, o conselho de administração executivo, o
conselho fiscal ou o conselho geral e de supervisão entenda conveniente.
Por seu turno, de acordo com o n.º 2 do mesmo normativo, a assembleia geral deve ser
convocada quando o requererem um ou mais acionistas que possuam ações
correspondentes a, pelo menos, 5% do capital social.
Ora, flui dos factos provados que a assembleia geral da sociedade Requerida
realizada no dia 11 de abril de 2022 não foi precedida de decisão ou de pedido no
sentido da sua realização por parte de alguma das entidades que acabam de ser
referidas.
Assim, e uma vez que se tratou de assembleia não imposta por outro dispositivo legal,
forçoso é concluir que a diligência em causa violou o regime estatuído nos normativos
vindos de citar, estando as deliberações nela tomadas, por conseguinte, feridas do
vício da anulabilidade, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 58.º do
CSC.”
https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/8e0789dafad59bd680258aca0056cf32?OpenDocument&Highlight=0,suspens… 6/13
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Concluiu-se, pois, na sentença recorrida pela verificação dos dois vícios invocados pela
requerente para requerer a suspensão da deliberação social:
- nulidade, por violação do disposto no art. 56º nº 1 al. a) do CSC;
- anulabilidade, por violação do disposto no art. 58º nº 1 al. a) do CSC.
Efectivamente, o art. 56º, n.º 1, alínea a), do CSC dispõe que são nulas as deliberações
dos sócios tomadas em assembleia geral não convocada (salvo se todos os sócios
tiverem estado presentes ou representados), acrescentando o n.º 2 da mesma norma que
não se consideram convocadas as assembleias cujo aviso convocatório seja assinado
por quem não tenha essa competência, aquelas de cujo aviso convocatório não constem
o dia, hora e local da reunião e as que reúnam em dia, hora ou local diversos dos
constantes do aviso.
Discorda a aqui apelante do segmento decisório que considerou que a assembleia não
tinha sido regularmente convocada, sustentando que quem assinou o aviso tinha
competência para tal- o Presidente da Mesa da Assembleia Geral-porque como já havia
sido nomeado para assumir tal posição nas duas assembleias anteriores, reportadas aos
anos de 2019 e 2020, não tendo ocorrido qualquer motivo de cessação dessas funções,
manteve-se no cargo porque não houve nova designação.
Para o efeito defende a interpretação extensiva do art. 391º nº 4 do CSC aos cargos de
Presidente da Mesa da Assembleia Geral, concluindo que o presidente da mesa da
Assembleia Geral de uma sociedade anónima mantém-se em funções até que seja
designado/eleito um novo presidente, apesar da cessação das suas funções pelo decurso
do prazo.
A Apelante socorre-se dos pontos 15 e 16 dos factos provados nos quais ficou provado
que na assembleia geral extraordinária de 07.06.2019 e na assembleia geral de
01.11.2020, a presidência da MAG foi assumida pelo Sr BB.
Afigura-se-nos que apesar das considerações tecidas pela Apelante não serem erróneas
partem de um pressuposto que não está demonstrado nos autos, isto é, que BB (que foi
quem assinou o aviso da convocatória da deliberação impugnada) algum dia tenha sido
nomeado como presidente permanente da mesa da assembleia geral, realidade distinta
do mero facto dado como provado de ter assumido nas assembleias gerais dos anos de
2019 e 2020 a presidência da mesa da assembleia.
E sobre isso é referido na sentença recorrida que no pacto social aquela pessoa não foi
nomeada como presidente da mesa da assembleia geral (como podia ter ocorrido), tendo
ainda sido dado como provado no ponto 6 dos factos provados que em nenhuma das
deliberações tomadas em sede de assembleia geral de acionistas foi deliberado nomear
BB para o exercício do cargo de Presidente da Mesa da Assembleia Geral.
Se anteriormente BB assumiu (não estando provado que para tal tenha sido nomeado) as
funções de presidente da mesa de qualquer outra assembleia geral (mal ou bem não se
cuida de apreciar nesta instância), pode bem ter assumido tais funções enquanto
presidente ad hoc e, nesse caso as suas funções de presidente da mesa da assembleia
esgotaram-se naquelas especificas e concretas assembleias, não podendo arrogar-se
titular desse cargo para as assembleias futuras.
Nas sociedades anónimas, como é o caso da requerida, a assembleia geral assume um
papel relevante, assumindo competências específicas e subsidiárias (arts. 373º nº 2, 376º
e 85º nº 1 do CSC), assim como competências extraordinárias( art. 373º nº 3 do CSC),
tendo “competências específicas (…)- que justificam, aliás, a sua existência e autonomia-
uma vez que é o órgão com competência exclusiva para deliberar em matéria de
alteração do contrato de sociedade, exceto nos casos raros em que, cumulativamente, tal
poder seja legal ou contratualmente atribuído ao órgão de administração(…) e para
anualmente, deliberar sobre a aprovação do relatório de gestão, balanço e contas do
exercício e sobre a aplicação dos resultados (designadamente sobre a sua afetação aos
sócios, sob a forma de lucros distribuídos)(cfr. Art. 376º)(…) e sobre a eleição dos
titulares dos órgãos sociais que não sejam designados sem prazo”[6] - tendo sido esses
os assuntos vertidos na convocatória da assembleia geral aqui sob apreciação.
Tal como ensina Paulo Olavo Cunha, “a mesa da assembleia geral é, na sociedade
anónima, constituída por determinação da lei societária (cfr. art. 374º), embora não conste
da lista de menções obrigatórias do contrato de sociedade anónima (cfr. arts. 9º e 272º).
O Código das Sociedades Comerciais assume que este subórgão existe e estabelece
imperativamente a sua composição, no art. 374º.
Diferentemente do que sucedia no passado, a mesa- desde a entrada em vigor do Código
das Sociedades Comerciais- pode ser, total ou parcialmente composta por pessoas que
não são acionistas (cfr. art. 374º nº 2 in fine).
A designação dos membros da mesa da assembleia geral- para um mandato máximo
de quatro anos, renovável (cfr. art. 374º, nº 2)-, ainda que possam estar sujeitos a
requisitos especiais, máxime de independência cfr. art. 374º-A) não é registável (na
Conservatória do Registo Comercial), sendo do conhecimento exclusivo da
sociedade. Por isso, e salvo nos casos em que ocorra no próprio instrumento
constitutivo da sociedade (…) a composição da mesa da assembleia geral apenas é
cognoscível pela consulta do livro de atas da assembleia geral de que conste a
https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/8e0789dafad59bd680258aca0056cf32?OpenDocument&Highlight=0,suspens… 7/13
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eleição dos titulares dos órgãos sociais.
(…) O presidente da mesa da assembleia geral é habitualmente eleito com os demais
titulares dos órgãos sociais para períodos de um a quatro anos ( um a quatro exercícios
sociais), se tal for compatível com a previsão estatutária relativa ao seu mandato; (…) no
entanto, pode ser designado no próprio contrato de sociedade anónima (em sentido
amplo), celebrado para a sua criação(…) a lei não exige que o presidente da mesa
seja acionista, como acontecia no passado( no quadro do Código Veiga Beirão), não
necessitando de ser titular de qualquer participação para o efeito e podendo, até, ser o
único “não-acionista” presente na assembleia geral.
(…) As funções do presidente da mesa cessam com o decurso do tempo previsto
para o seu mandato- o qual se reporta ao fim de um determinado exercício-, logo
que ocorrer a sua substituição, que se verifica, habitualmente, na primeira assembleia
anual após o termo do mandato; a qual tem necessariamente carácter eleitoral.
Enquanto não for substituído, o presidente da mesa mantém-se em funções,
qualquer que seja a (sub) espécie de sociedade anónima em causa, até que seja eleito
o seu sucessor, pelo que as suas funções se prolongam até que tal aconteça ou
seja reconduzido.”[7]
Não obstante, para se poder assim afirmar há que atender ao carácter permanente e/ou
ad hoc das funções da mesa da assembleia geral e, mais especificamente do seu
presidente.
Sobre tal problemática recomenda-se a leitura de Paulo de Tarso Domingues (em
anotação ao art. 374º do CSC)[8] e de Pedro Maia[9], que embora divirjam nalguns
aspectos sobre a figura do presidente da mesa da assembleia geral (mormente quanto ao
poder do presidente da mesa da assembleia geral por sua própria iniciativa convocar uma
assembleia geral- questão relacionada com o segundo vício assacado à deliberação sob
apreciação) esclarecem de forma lapidar como deve ser nomeado o presidente da mesa
e quem deve assumir essas funções quando assume carácter permanente ou temporário,
trazendo importantes contribuições para a apreciação do objecto deste recurso.
Parafraseando Paulo de Tarso Domingues, “atenta a importância atribuída, nas SA, à
mesa da assembleia geral- e, sobretudo, ao respetivo presidente, a quem são atribuídas
competências próprias e permanentes no funcionamento interno da sociedade- a lei
prevê que os respetivos elementos, e em especial o seu presidente, exerçam as suas
funções com carácter permanente. Assim, a coletividade dos sócios poderá eleger os
membros da mesa da assembleia para o exercício de funções por um determinado
período de tempo, que não deverá exceder o prazo de quatro anos (cfr. artigo 374º, 2). Se
tal não suceder, a lei estabelece um regime supletivo para a designação do cargo de
presidente. Ele será, neste caso, exercido- também aqui, com caráter permanente- pelo
presidente do órgão de fiscalização da sociedade: o presidente do conselho fiscal, da
comissão de auditoria ou do conselho geral e de supervisão, consoante o modelo de
governação adotado pela sociedade (cfr. artigo 374º, 3).
Se apesar do disposto na lei, numa dada AG o presidente (permanente) da mesa não se
encontrar presente- porque não existe ou não compareceu- assumirá a presidência ad
hoc ( apenas para aquela reunião) um sócio, de acordo com os critérios estabelecidos no
art. 374º, 4.
(…) Nas SA- já não assim nas SQ-, a lei manifesta preferência pela existência de um
presidente da mesa permanente, o qual deverá, em princípio, ser eleito pelos
sócios. Esta designação poderá ocorrer- e assim sucede frequentemente na nossa
prática societária, sobretudo nas pequenas SA- no ato constitutivo. Quando assim não
suceda, a assembleia geral poderá deliberar sobre esta matéria(…)
(…) O presidente da mesa deve ser eleito para o exercício de funções por um
período de tempo determinado, o qual não poderá ser superior a quatro anos (artigo
374º,2). Por isso, em princípio, as suas funções terminarão pelo decurso do tempo e
concluído que seja o prazo do respetivo mandato. Tal, porém, apenas sucederá quando,
entretanto, tenha sido eleito pelos sócios um novo presidente que substituirá aquele cujo
mandato termina. Se tal não ocorrer, o presidente só cessará as suas funções, quando se
verifique a designação de um novo presidente da mesa.
De forma esclarecida, contribui Pedro Maia que “nas sociedades anónimas, o presidente
da mesa da assembleia geral não tem os seus poderes circunscritos ao período de tempo
da reunião dos sócios e que, por isso mesmo, o presidente da mesa da assembleia geral
da sociedade anónima não constitui um simples coordenador ou orientador dos trabalhos
da reunião de accionistas: as suas funções iniciam-se antes dessa reunião- desde logo
porque lhe cabe convocar, até por sua própria iniciativa, a assembleia geral- e terminam
depois dessa mesma reunião- porque é a ele que, juntamente com o secretário da mesa,
compete redigir e assinar a acta da reunião ( art. 388º, nº 2). Aliás, uma vez que, por um
lado, é ao presidente da assembleia geral que os accionistas, bem como o conselho de
administração, a direcção, o conselho fiscal ou o conselho geral, devem requerer a
convocação de assembleias gerais ( art. 375º, nº 1, 2 e 3 ) e que, por outro lado, tais
requerimentos podem ser efectuados em qualquer momento, torna-se forçoso concluir
que as presidente da mesa da assembleia geral da sociedade anónima incumbem
https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/8e0789dafad59bd680258aca0056cf32?OpenDocument&Highlight=0,suspens… 8/13
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funções permanentes.
(…) O legislador principia por, no art. 374º, nº2, prever a possibilidade de o contrato de
sociedade atribuir à assembleia geral competência para eleger o seu próprio presidente,
que tanto poderá ser um sócio como não.
(…) À semelhança do que sucede relativamente à designação dos administradores (art.
391º, nº1), dos membros do conselho fiscal ( art. 415º, nº 1) ou do conselho geral ( art.
435º, nº1) e dos directores ( art. 425º, nº1), nada obsta a que no contrato de sociedade se
designe, de imediato, o primeiro presidente da assembleia geral.
(…) Se o contrato de sociedade não previr que o presidente da mesa da assembleia geral
seja eleito por esta, aplica-se o disposto no art. 374º, nº 3, cabendo então ao presidente
do conselho fiscal ou do conselho geral (por inerência, diríamos) o cargo de presidente da
assembleia geral. A referência ao presidente do conselho fiscal deve considerar-se feita
ao fiscal único se for esse o caso.
Mas importa sublinhar que o art. 374º, nº 3, rege sobre dois grupos de situações distintos:
aquele em que o contrato de sociedade não prevê a eleição pela assembleia, do
respectivo presidente (ou em que, apesar de prevista, essa eleição ainda não ocorreu ou
em que o sujeito eleito não aceitou o cargo ou renunciou a ele), e aquele outro grupo de
situações em que o presidente já eleito está ausente da reunião.
No primeiro grupo de casos, o presidente do conselho fiscal (ou do conselho geral)
assume o cargo de presidente da assembleia geral com carácter de permanência, o que
implica, desde logo, que lhe compita convocar a assembleia nessa mesma qualidade de
presidente da assembleia geral que efectivamente (também) tem- e não naquela outra de
presidente do conselho fiscal ou do conselho geral, ao abrigo do disposto no art. 377º,
nº7. Trata-se, portanto, da designação do presidente permanente da assembleia pela
própria lei.
Já no segundo grupo de casos referidos no ponto anterior- em que o presidente eleito ou
designado no contrato está ausente da reunião- o que está em causa é, unicamente, a
determinação da pessoa que presidirá à reunião da assembleia geral devido à ausência
(temporária) do presidente permanente. A pessoa assim designada para presidente torna-
se, portanto, um presidente ad hoc, cujas funções se esgotam com o encerramento dos
trabalhos- a que naturalmente acresce o dever de elaboração da acta- do mesmo passo
que se mantém como presidente permanente da assembleia quem tiver sido eleito ou
designado nos termos já acima referidos.”
Quanto à cessação das funções do presidente da mesa da assembleia geral, Pedro Maia
reforça que o “CSC não dispõe acerca da cessação das funções do presidente da mesa
da assembleia geral. Tais funções deverão cessar, naturalmente, pelo decurso do prazo
por que tiver sido eleito, mas, tal como sucede com os membros do conselho de
administração (art. 391º nº 4) e do conselho geral (art. 435º nº 2), e com os directores (
art. 425º, nº 2) o presidente da assembleia deve manter-se no cargo até nova
designação.
Só não será assim se, entretanto, o presidente for destituído pela assembleia ou
renunciar ao cargo.”
Transpondo estes ensinamentos, nos quais nos revemos, para o caso sob apreciação,
resulta inegável não estar demonstrado nos autos que a requerida tenha designado BB,
no contrato de constituição da sociedade, como presidente da mesa da assembleia,
desde logo porque pelo menos até cerca do ano 2019 quem sempre assumiu tais funções
na requerida foi outra pessoa (FF), nem que tenha existido qualquer eleição de BB para
tal cargo em qualquer das assembleias anteriores à assembleia de 11.04.2022 (ponto 6
dos factos provados).
Deste modo, na ausência de designação de BB para presidente permanente da mesa de
assembleia geral no contrato da sociedade, bem como na ausência de eleição em
qualquer uma das assembleias gerais anteriores, aplica-se o disposto no art. 374º, nº 3,
cabendo então, por atribuição legal, ao presidente do conselho fiscal cumulativamente o
cargo de presidente da mesa da assembleia geral.
Uma vez que aquele presidente permanente da mesa da assembleia geral da requerida-
presidente do conselho fiscal-, terá estado ausente da assembleia geral de 11.04.2022
(não constando dos presentes na acta elaborada), aplicando-se o disposto no art. 374º nº
4 do CSC, apenas poderia ter assumido a presidência ad hoc daquela assembleia geral
um acionista, qualidade que BB não assumia, quer quando assinou o aviso da
convocatória da referida assembleia, quer quando se auto atribuiu tais funções naquela
assembleia.
Se porventura assumiu a presidência ad hoc nas assembleias gerais de 2019 e 2020 tal
não lhe concede qualquer direito de permanecer a assumir a presidência nas
assembleias gerais seguintes, porquanto mesmo que alguma vez tenha assumido
regularmente as funções de presidente ad hoc elas sempre se teriam esgotado assim que
terminados os trabalhos daquelas concretas assembleias.
Tomando por indiciariamente demonstrado que BB nunca foi designado no contrato da
sociedade, nem eleito pela assembleia geral de accionistas como presidente permanente
da mesa da assembleia geral da sociedade requerida, o cargo de presidente da mesa da
https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/8e0789dafad59bd680258aca0056cf32?OpenDocument&Highlight=0,suspens… 9/13
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assembleia geral pertencia de acordo com o critério legal ao presidente do conselho
fiscal.
Não tendo sido aquele a assinar o aviso da convocatória da assembleia geral de
11.04.2022, toda e qualquer deliberação ali tomada- designadamente a eleição de novo
Administrador Único-será nula, ao abrigo do art. 56º nº 1 al. a) do CSC.
Tal invalidade sempre bastaria para considerar preenchido um dos requisitos da presente
providência cautelar, no entanto, sempre se mostraria também verificado o outro vício
assacado à deliberação tomada na assembleia geral sob apreciação, desde logo porque,
ainda que se pudesse perfilhar o entendimento de que o presidente da mesa da
assembleia geral pode tomar ele próprio a iniciativa de convocar a assembleia geral, sem
ser precedida de pedido pelas entidades mencionadas no art. 375º nº 1 do CSC ( neste
sentido Pedro Maia, ob. Cit, pág. 435; A. Pereira de Almeida, Sociedades Comerciais, 2ª
edição, pág. 290; Paulo Olavo Cunha, Ob. Cit, pág. 63 e 70; em sentido contrário Paulo
de tarso Domingues, Ob. Cit, pág. 69) certo é que para isso sempre necessário seria que
BB fosse o presidente da mesa da assembleia geral, quer por designação no contrato,
quer por eleição em assembleia geral ou por atribuição legal, qualidade que nunca lhe foi
atribuída.
Cumpre-nos agora apreciar o requisito cumulativo do “dano apreciável”, indispensável
para que se possa manter a sentença recorrida que suspendeu a deliberação sub judice.
Cremos que a fragilidade da sentença recorrida resulta evidente quanto a este ponto,
uma vez que a factualidade que fora alegada pela requerente a esse propósito em grande
medida foi dada como não provada pelo tribunal a quo sob os pontos a) a c), restando os
pontos 11, 13 e 14 dos factos provados, nos quais apenas consta o seguinte:
11-os accionistas da sociedade requerida desconhecem as aptidões do Administrador
Ùnico DD, para o exercício das funções para as quais se encontra nomeado;
13-o administrador nomeado acedeu à conta bancária titulada em nome da requerida;
14- a requerida detém fundos na referida conta bancária que facilmente podem dali ser
retirados pelo Administrador Único nomeado.
Desconhecendo-se se os dois accionistas (entre os quais a requerente) se interessaram
e tentaram informar junto da requerida sobre as habilitações do administrador nomeado e
tal lhes tenha sido recusado, não estando provado que aquela pessoa não seja idónea,
capaz e habilitada para exercer tal cargo, afigura-se-nos que o facto dado como provado
sob o ponto 11 é praticamente inócuo para se considerar existir uma forte probabilidade
de a demora na decisão da acção definitiva de declaração de nulidade ou anulação da
deliberação tomada- nomeação de novo administrador único- poder causar dano
apreciável à requerida.
Embora o consignado nos pontos 13 e 14 dos factos provados assuma já algum relevo,
tais factos dissociados da concreta pessoa nomeada ou até do eventual propósito
subjacente àquela nomeação também pouco nos diz sobre a imprescindível forte
probabilidade de ao perdurar por algum tempo a nomeação de novo administrador (até
que a ação definitiva seja julgada), isso cause dano apreciável à requerida.
Senão vejamos.
O mandato da anterior administradora cessara e necessário se tornava eleger novo
administrador à requerida, sendo que, quer a anterior administradora única
permanecesse até nova nomeação, quer viesse a ser eleito novo administrador (como o
foi na deliberação impugnada) é inerente ao exercício pleno daquelas funções o acesso
do administrador único às contas bancárias da sociedade e, só em casos excepcionais de
desrespeito das suas funções haverá a possibilidade de o mesmo poder dissipar os
fundos que nelas existam, contudo, estaremos sempre no mero campo das hipóteses ou
suposições não suportados no caso sub judice por factos cobcretos, porquanto a matéria
de facto provada é, a nosso ver, manifestamente insuficiente para se poder concluir pela
forte probabilidade de isso vir a acontecer, a qual se exige para se poder considerar
verificado o requisito do “dano apreciável”.
E terá sido devido a essa míngua de factos que o tribunal a quo, a nosso ver mal,
socorreu-se de considerações extraídas do julgamento a que presidiu, que
consubstanciam factos inquestionavelmente não alegados, os quais mesmo que fossem
eventualmente concretizadores ou complementares dos alegados pela requerente, para
que o tribunal deles se pudesse socorrer nos termos do art. 5º nº 2 al. b) do CPC teria de
ter previamente dado a conhecer às partes que os ia atender na decisão a proferir,
possibilitando-lhes o exercício do contraditório, vertendo-os depois no elenco dos factos
provados, o que não ocorreu.
Senão vejamos o que consta da sentença recorrida a esse propósito:
“(…) importará apreciar se se verifica o segundo dos pressupostos de natureza
substantiva de que dependerá a procedência da pretensão da Requerente, isto é, a
suscetibilidade de a execução da deliberação causar dano apreciável.
E o certo é que, em face daquilo que resulta da factualidade apurada, tal conclusão é
inevitável.
Com efeito, não são conhecidas as habilitações do administrador nomeado, este não
prestou contas da sociedade e acedeu à conta bancária titulada em nome da Requerida.
https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/8e0789dafad59bd680258aca0056cf32?OpenDocument&Highlight=0,suspen… 10/13
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Tal acesso permite-lhe depauperar a conta, até porque, como foi admitido em sede de
julgamento pelo pai da requerente, já vendeu todo os imóveis da sociedade, através de
procuração que lhe outorgou e num negócio com muito para esclarecer, certamente na
sede própria.
Na verdade, esta confissão, e ainda que os factos não tenham sido articulados nos autos,
leva o tribunal a concluir que o património ainda porventura existente poderá ser
dissipado, nomeadamente, os aldos bancários que possam porventura ainda existir.
É manifesto, assim, que a manutenção do mesmo em funções durante um longo período
de tempo, como seria certamente aquele que decorreria entre o início e o termo da ação
judicial destinada a resolver em definitivo o litígio subjacente aos autos, seria suscetível
de causar à Requerente um dano apreciável.”
Ora o próprio tribunal a quo, no início da sua fundamentação jurídica tecera
considerações gerais sobre o requisito do “dano apreciável” que não se compadecem
com a pouca exigência com que avaliou tal requisito à luz da factualidade apurada nos
autos.
Dissera então que, “o requisito do dano, porém, pressupõe que se trate de um dano
“apreciável”, pelo que a sua constatação exige, pelo menos, “uma probabilidade muito
forte da sua verificação”.
Temos, assim, que “a exigência legal de demonstração de que a execução da providência
pode causar dano apreciável reclama a alegação de factos concretos que permitam aferir
da existência dos prejuízos e da correspondente gravidade”.
O dano relevante não será “toda ou qualquer possibilidade de prejuízo que a deliberação
ou a execução em si mesmas comportam, mas sim a possibilidade de prejuízos
imputáveis à demora da acção de anulação, pois a providência cautelar visa prevenir o
‘periculum in mora’, ou seja, acautelar a utilidade prática da sentença de anulação da
deliberação social, contra o risco da duração dos respectivo processo”.
Ou seja, e em suma, como se afirmou no acórdão da Relação do Porto de 23-05-1989 (in
C.J., T. III, p. 206), o dano justificativo da suspensão de deliberações sociais é matéria
de facto que tem de ser alegada e provada, só relevando se derivar da própria execução
da deliberação, se for certo ou muito provável e, além disso, apreciável”.
Como atrás já aludimos, não vemos que a matéria de facto alegada e dada como provada
na sentença recorrida- e só com base nos factos provados pode o tribunal alicerçar a sua
decisão-permita concluir que com a continuidade da execução da deliberação durante o
tempo que demorar a ser decidida a acção principal (deliberação que foi tomada muitos
meses antes desta providência cautelar, estando o administrador em funções há já vários
meses) seja certo ou muito provável que a requerida sofra um dano apreciável, não um
qualquer dano eventual, mas um dano grave com forte consistência e probabilidade de
acontecer, prejuízos que decorram da referida demora e cuja possibilidade de ocorrerem
estejam densificados em factos concretos consistentes, o que não ocorre no caso sub
judice, não encontrando tal requisito respaldo na factualidade apurada.
A propósito deste requisito, acompanhamos o recente Ac RP de 30.05.2023, onde ficou
decidido que “O requisito do dano apreciável carece de densificação através da alegação
e prova de factos dos quais possa extrair-se que a execução do deliberado no seio da
pessoa coletiva carretará um prejuízo significativo.”[10]
Do mesmo modo se decidiu no Ac RP de 7.10.2021, que “O risco de dano apreciável é o
risco de prejuízos significativos, para cuja demonstração não bastam meras hipóteses,
possibilidades, previsões ou suposições, e são necessários factos que, analisados com
objectividade, revelem ou indiciem o perigo das consequências que se querem evitar.”[11]
Também outros arestos se pronunciaram sobre esse mesmo requisito, acentuando a
necessidade de prova concreta sobre o dano apreciável e qual a expressão que tem sido
assumida pela jurisprudência sobre tal conceito, como é o caso designadamente do Ac
RL de 21.06.2007, de cujo sumário se pode ler que, “dano apreciável, para efeitos do
disposto no art. 396º nº 1, não é toda e qualquer possibilidade de prejuízo que a
deliberação, ou a sua execução, em si mesmas comportem, mas sim a possibilidade de
prejuízos imputáveis à demora no processo de anulação.
O dano a evitar com a providência é o decorrente da demora do processo de anulação da
deliberação e não o resultante directamente desta, o que exige a alegação de factos
concretos que permitam aferir da existência dos prejuízos e da correspondente
gravidade, em termos de acarretar a certeza ou, pelo menos, a probabilidade muito forte
e séria de que a execução da deliberação possa causar prejuízo apreciável.
Cabe ao requerente a demonstração da certeza ou probabilidade muito forte do dano,
bem como da medida e extensão que permitam avaliá-lo como apreciável, não bastando
a alegação de uma mera possibilidade de prejuízo cujo montante não possa aquilatar.”
Nesse mesmo aresto é dado conta de outra jurisprudência que se debruçou sobre tal
problemática, podendo ler-se que “Como nos dá conta o acórdão da Relação do Porto de
25.10.2004, publicado em www.dgsi.pt/jtrp, para Vasco Xavier «Conteúdo da providência
de suspensão de deliberações sociais», Revista de Direito e de Estudos Sociais, ano
XXII, pág. 215 aquele dano “não é toda e qualquer possibilidade de prejuízo que a
deliberação, ou a sua execução, em si mesmas comportem, mas sim a possibilidade de
https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/8e0789dafad59bd680258aca0056cf32?OpenDocument&Highlight=0,suspens… 11/13
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prejuízos imputáveis à demora no processo de anulação. Não faria sentido que o
legislador desse relevo, para efeitos de concessão de providência à eventualidade de
danos diferentes dos originados pelo retardamento da sentença naquela acção preferida”.
A jurisprudência também se tem manifestado neste sentido, isto é, que o dano apreciável
a evitar com a providência é o decorrente da demora do processo de anulação da
deliberação e não o resultante directamente desta, o que exige a alegação de factos
concretos que permitam aferir da existência dos prejuízos e da correspondente
gravidade, em termos de acarretar a certeza ou, pelo menos, a probabilidade muito forte
e séria de que a execução da deliberação possa causar prejuízo apreciável (v. entre
outros Ac. Relação do Porto, de 11.06.2001 e Ac. Relação de Lisboa, de 12.02.2004,
ambos publicados em www.dgsi.pt ).”[12]
Marco Carvalho Gonçalves também fez uma resenha jurisprudencial sobre o que tem
vindo a ser entendido como receio de produção de um dano apreciável, defendendo
igualmente que “a verificação do “dano apreciável” exige uma prova “consistente”,
baseada numa “probabilidade muito forte de que a execução da deliberação possa
causar o dano apreciável que, com a providência, se pretende evitar.
Na verdade, o requerente da suspensão de deliberações sociais deve alegar factos
concretos dos quais seja possível inferir a existência de prejuízos, bem como a sua
gravidade.
A providência cautelar de suspensão de deliberações sociais será igualmente
injustificada se o dano que se pretende evitar já se tiver produzido, circunstância em que
o tribunal não deve decretar a providência.
Diversamente do que sucede com o requisito da invalidade da deliberação impugnada, o
qual, para que se considere preenchido, exige apenas um juízo de mera probabilidade, já
na apreciação do requisito do receio de produção de um dano apreciável exige-se a
“prova da certeza ou de uma probabilidade muito forte” do dano, por força da execução
da deliberação”. Para tanto, o requerente deve alegar “factos concretos que permitam
aferir da existência dos prejuízos e da correspondente gravidade.”[13]
Trazemos também à colação os ensinamentos de A. Santos Abrantes Geraldes, que
afirma que embora o legislador tenha considerado desnecessário que se evidenciem
danos irreparáveis ou de difícil reparação (como sucede no procedimento cautelar
comum) a lei não prescindiu da demonstração concreta de um certo perigo de ocorrência
de consequências prejudiciais, sendo que a expressão dano apreciável “integra um
conceito indeterminado, carecido de densificação através da alegação e prova dos factos
dos quais possa extrair-se que a execução do deliberado no seio da pessoa colectiva
acarretará um prejuízo significativo, de importância relevante, muito longe dos danos
irrisórios ou insignificantes, embora sem se confundir com as situações de
irrecuperabilidade ou de grave danosidade”[14].
Já então no Ac STJ de 04.05.2000 se defendera que “a exigência legal de demonstração
de que a execução da providência pode causar dano apreciável reclama a alegação de
factos concretos que permitam aferir da existência dos prejuízos e da correspondente
gravidade. O tribunal deve exigir, a respeito desse requisito a certeza ou pelo menos uma
probabilidade muito forte e séria de que a execução da deliberação poderá causar dano
apreciável”.[15]
Caso, efectivamente, a actuação do novo administrador assumisse os contornos
alegados mas dados como não provados nos pontos a) a c) dos factos não provados, a
conclusão poderia ser diferente, pois que a certeza ou forte probabilidade quanto ao
prejuízo para a requerida da demora na acção resultaria da nefasta actuação do novo
administrador eleito, mas a requerente não logrou provar tal matéria de facto, conforme
lhe incumbia.
Deste modo, não se tendo por verificado o requisito do dano apreciável, não se considera
justificada a pretendida suspensão da deliberação em causa, não merecendo
acolhimento a decisão recorrida, que como tal terá de ser revogada.
**
V. DECISÃO
Em razão do antes exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação do Porto,
julgar procedente o recurso de apelação interposto pela Apelante/Requerida,
revogando-se a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância.
Custas pela Apelada, que ficou vencida– artigo 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC.
Notifique.
https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/8e0789dafad59bd680258aca0056cf32?OpenDocument&Highlight=0,suspen… 12/13
22/09/24, 13:03 Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
(O presente acórdão não segue na sua redação o Novo Acordo Ortográfico)
_______________________________
[1] F. Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 8ª edição, pág. 147
e A. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2ª edição,
pág. 92-93.
[2] A. Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 7ª edição, pág. 139 e 140
[3] Manual dos Recursos em Processo Civil, 8ª edição, pág. 147
[4] CPC Anotado, Vol. 2º, pág. 112
[5] A. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luis Filipe Pires de Sousa, CPC Anotado,
vol. I, pág. 470-471 e A. Abrantes Geraldes, temas da Reforma do Processo Civil,
Vol. IV, 4ª edição, pág. 86-89
[6] Paulo Olavo Cunha, Deliberações sociais, Formação e Impugnação, 2020-
Reimpressão, pág. 41-42
[7] Ob cit, pág. 41-52, 63-70, 88
[8] CSC em Comentário, IDET, Vol. VI, Jorge M. Coutinho de Abreu (Coord.), 2ª
edição, pág. 31-63
[9] Problemas do Direito das Sociedades, IDET, 2ª Reimpressão, O Presidente das
Assembleias de Sócios, Pedro Maia, pág. 421- 468
[10] Proc. Nº 8278/22.2T8VNG.P1, www.dgsi.pt
[11] Proc. Nº 517/21.3T8AMT.P1, www.dgsi.pt
[12] Proc. Nº 2647/2007-6, www.dgsi.pt
[13] Providências Cautelares, 2ª edição, pág. 275-277
[14] Temas da Reforma do Processo Civil, 3.ª edição, págs. 96
[15] Proc.00B337, www.dgsi.pt.
https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/8e0789dafad59bd680258aca0056cf32?OpenDocument&Highlight=0,suspen… 13/13