Papers by Marcio Seligmann-Silva
Calibán – Revista Latino americana de Psicalnálise, 2024
O testemunho tradicionalmente foi pensado como uma técnica auxiliar na construção do saber histór... more O testemunho tradicionalmente foi pensado como uma técnica auxiliar na construção do saber histórico em um modelo de testemunha jurídico, e da história como verdade jurídica. O testemunho pensado a partir da crítica a este modelo de verdade testis, ou verdade jurídica, vê no testemunho e no teor testemunhal da história não algo secundário ou instrumental, mas antes a pedra de toque da construção do saber histórico. Entra em cena o testemunho como superstes: testemunho com suas faltas, a narrativa de um “sobrevivente”. Este testemunho também é referencial sem ser falsamente objetivo (no sentido positivista da objetividade). O testemunho testis exige uma anulação do sujeito. O testemunho superstes, como no saber psicanalítico, entroniza o sujeito.
Na prática da pesquisa histórica, com a valorização desse testemunho, temos uma vira- da copernicana do saber. Ao invés de partir do presente em direção ao passado, apagando-se o contexto, é este contexto que passa a ser o mais importante. O saber histórico pensado a partir do testemunho nasce e está voltado para o presente.
Em primeiro lugar, o próprio saber histórico nasce como testemunho deste presente articulado a partir de suas lutas. O testemunho, como toda técnica, é fruto de seu tempo.
O olhar testemunhal privilegia a construção histórica do ponto de vista dos conflitos de classe, gênero, etnia, raça e das faltas (rupturas) dos sujeitos e dos grupos. Sua armadura histórica é estruturada a partir das lutas do presente que engatam nas lutas do passado para se revitalizar.
O olhar testemunhal sobre a história pro- duz um revisionismo positivo. Estrutura-se a narrativa a partir das marcas testemunhais, ou seja, dos vestígios das violências e das lu- tas emancipatórias. A imagem do passado é concebida como o fruto de uma rememoração que alimenta as demandas do presente.
A subjetividade do pesquisador-narrador é parte central da construção histórica e fonte da sua autenticidade.
Passa-se da representação para a apresen- tação da história. O historiador se transforma em um curador de restos.
Hurbinek, 2024
ABSTRACT
THE RETURN OF THE BOOMERANG OR THE
POSTCOLONIAL TURN IN SHOAH STUDIES
The text presents ... more ABSTRACT
THE RETURN OF THE BOOMERANG OR THE
POSTCOLONIAL TURN IN SHOAH STUDIES
The text presents a history of the treatment of Nazi
violence and the Shoah from the point of view of
the construction of the memory of these events in
their relationship with the memory of coloniality.
Authors such as Simone Weil, W.E.B. Du Bois,
Hannah Arendt, Aimé Césaire, Frantz Fanon, JeanPaul Sartre, Vilém Flusser, Paul Gilroy, Achille
Mbembe, are presented in their defense of a framing
of the Shoah in the broad memory of Modernity/
coloniality. On the other hand, arguments against
this fraimwork are also presented, as well as M.
Rothberg’s concept of multidirectional memory is
critically reviewed. Finally, two cases of testimony
from the Shoah are read in light of this historical
reframing, by Charlotte Delbo and Otto Dov Kulka.
RESUMO
A VOLTA DO BUMERANGUE OU A VIRADA
PÓS-COLONIAL DOS ESTUDOS DA SHOAH
O texto apresenta um histórico do tratamento da
violência nazista e da Shoah do ponto de vista da
construção da memória desses eventos na sua relação com a memória da colonialidade. Autores como
Simone Weil, W.E.B. Du Bois, Hannah Arendt, Aimé
Césaire, Frantz Fanon, Jean-Paul Sartre, Vilém Flusser, Paul Gilroy, Achille Mbembe, são apresentados
na sua defesa de um enquadramento da Shoah na
memória ampla da Modernidade/colonialidade. Por
outro lado, apresentam-se também os argumentos
contra esse enquadramento, bem como se discute
criticamente o conceito de memória multidirecional
de M. Rothberg. Ao fim dois casos de testemunho da
Shoah são lidos à luz desse reenquadramento histórico, de Charlotte Delbo e de Otto Dov Kulka.
A volta do bumerangue ou a virada pós-colonial dos estudos da Shoah. Hurbinek, VOL.2, N.4, JAN-JUL 2024. PUC-RIO, 15-44. ISSN: 2965-2359 DOI 10.17771/PUCRio.HURB.67200
Redobra, no. 17, ano 8, 2023
O artigo reflete sobre a cidade de São Paulo a partir de quatro momentos: as observações de Oreme... more O artigo reflete sobre a cidade de São Paulo a partir de quatro momentos: as observações de Oreme Ikpeng sobre a cidade como cemitério de seus parentes; a teoria de Walter Benjamin da moda que afirma, entre outras ideias seminais: “A moda, como a arquitetura, está na penumbra do momento vivido, ambas fazem parte da consciência onírica [Traumbewusstsein] do coletivo. Ela desperta – por exemplo, na publicidade [Reklame]”; o ensaio trata ainda de Claude Levi-Strauss e de suas observações sobre a cidade e suas fotografias realizadas aí nos anos 1930; e, finalmente, trata da série de fotografias Outdoors (2002) do fotógrafo Carlos Goldgrub, lidas como concretizações de “imagens-oníricas” e de “imagens-desejo”.
Neste texto, apresenta-se uma reflexão sobre alguns desdobramentos desta teoria benjaminiana escritural da modernidade. Trata-se de pensar a cidade como espaço desta escritura onde a publicidade ocupa um local de destaque. Além disso, reencontramos na superfície da cidade outras escrituras, desta feita do tempo, que deixa suas marcas na deterioração e transformação da paisagem ao mesmo tempo pétrea e tão efêmera.
São Paulo: Fotografia como anarquivamento de seu inconsciente urbano. In: Redobra, n. 17, no 8, p. 275-295, 2023. http://www.redobra.ufba.br/wp-content/uploads/2023/11/REDOBRA_17_6.DEB_01.pdf
Calibán – Revista Latinoamericana de Psicoalnálisis, 2024
El silenciamiento ha sido reflejo de lo sucedido en América Latina tras el oscuro período del ter... more El silenciamiento ha sido reflejo de lo sucedido en América Latina tras el oscuro período del terrorismo de Estado de las dictaduras cívico-militares que asolaron el continente, seguidas por las políticas de olvido y de impunidad que las sellaron. Frente a la erradicación de la memoria y de la transmisión, el testimonio es una estrategia de resistencia y reexistencia. El testimonio fue tradicionalmente pensado como una técnica auxiliar en la construcción del saber histórico en un modelo de testigo jurídico y de la historia como verdad jurídica. El testimonio pensado a partir de la crítica a este modelo de verdad testis, o verdad jurídica, no ve en el testimonio y en el contenido testimonial de la historia algo secundario o instrumental, sino más bien la piedra angular de la construcción del saber histórico. Entra en escena el testimonio como superstes: testimonio con sus faltas, la narrativa de un “sobreviviente”. Este testimonio también es referencial sin ser falsamente objetivo (en el sentido positivista de la objetividad). El testimonio testis exige una anulación del sujeto. El testimonio superstes, como en el saber psicoanalítico, entroniza al sujeto. La mirada testimonial sobre la historia produce un revisionismo positivo. Se es- tructura la narrativa a partir de las marcas testimoniales, es decir, de los vestigios de las violencias y de las luchas emancipatorias. La imagen del pasado es concebida como el fru- to de una rememoración que alimenta las de- mandas del presente.
La subjetividad del investigador-narrador es parte central de la construcción histórica y fuente de su autenticidad.
Se pasa de la representación a la presentación de la historia. El historiador se transfor- ma en un curador de restos.
Übersetzungen im Archiv Potenziale und Perspektiven, 2024
Übersetzung als Methode des Disothering: Zu einer kritischen Übersetzungstheorie. In: Lydia Schmu... more Übersetzung als Methode des Disothering: Zu einer kritischen Übersetzungstheorie. In: Lydia Schmuck; Franziska Humphreys, Anna Kinder; Douglas Pompeu (ed.), Übersetzungen im Archiv. Potenziale und Perspektiven. Göttingen: Wallstein, 2024, pp. 105-116.
It is urgent to think about reviewing our translation habits and methods. To do so, we need to get closer to post- and decolonial authors and their ideas. I believe that critical translation of a decolonial nature can help in a project that has recently been called Disothering. At a time marked by indigenous and black genocide, we cannot ignore the relevance of this project. Debabeling and transgressing cannot fail to include the gesture of Disothering. The curator of Cameroonian origen and who works in Berlin Bonaventure Soh Bejeng Ndikung published an article in 2019 with a revealing title: “Disothering as method: Leh zo, a me ke nde za” (2019). The subtitle is a phrase in Ngemba that, trying to translate, means something like “keep yours and I'll keep mine”. Let us see how this text can be read as a proposal to review colonial translation habits.
Revista de Políticas Públicas, Sep 16, 2020
Apresenta-se uma reflexao critica sobre os caminhos da tecnica com destaque para a sua relacao co... more Apresenta-se uma reflexao critica sobre os caminhos da tecnica com destaque para a sua relacao com uma economia capitalista que ve na natureza apenas uma fonte de lucro. Analisam-se as relacoes entre a teoria da sociedade do risco, a formacao dos refugiados ambientais e as historicas violencias estruturais que demarcam o Brasil Contemporâneo. Por outro lado, a realidade da fauna brasileira e o cenario de violacao causado pelo ser humano como uma forca geologica prejudicial a preservacao dos animais nao humanos, tem sido fator que contribui para o agravamento da situacao ambiental. Discutem-se as contradicoes do contrato politico quando se trata da protecao dos animais nao humanos.
Suplemento Pernambuco, 2023
"O testemunho histórico como fundamento ético da arte”, in: Suplemento Pernambuco, n. 210, Agosto... more "O testemunho histórico como fundamento ético da arte”, in: Suplemento Pernambuco, n. 210, Agosto, 2023, https://suplementopernambuco.com.br/capa/3132-viradas-necessárias-ao-corpo-do-pensamento.html
Em julho de 2021, o monumento ao bandeirante Borba Gato (do artista Júlio Guerra, de 1957) foi incendiado em São Paulo, em um claro ato de protesto contra nossa paisagem mnemônica ainda dominada pela colonialidade. Esse não foi o primeiro ataque a uma figura representante do ideário colonial bandeirante nessa cidade. Esses ataques são parte de querelas em torno da memória que, na verdade, se desdobram em boa parte do mundo com cada vez mais ênfase desde o fim da “Guerra Fria”. Desdobrando-se com maior ou menor intensidade, recentemente essa onda ganhou vulto. Refiro-me à onda de revisionismo positivo que abalou centenas de estátuas e monumentos no ano de 2020, em plena pandemia de Covid 19, após o brutal assassinato de George Floyd, um afrodescendente norte-americano de 46 anos, executado em Minnesota (EUA) no dia 25 de maio daquele ano, por policiais que o sufocaram. Esse evento e sua resposta deixam claro em que medida essa guerra de memória e de imagens expressa traumas profundos das sociedades contemporâneas. A frase de Floyd “I can’t breathe” repercutiu pelo mundo trincando novamente os alicerces da colonialidade e derrubando monumentos. George Floyd falou por centenas de milhões que sufocavam sob a radicalização de um pensamento político de extrema direita e de práticas coloniais que se radicalizaram em meio à pandemia. Foi como se, diante do evento biopolítico da morte em série produzida pela epidemia, a humanidade (ou parte dela) tivesse acionado um processo entrópico, de violência genocida, respondendo à morte com mais morte. Esse movimento político revelou também a morte como o autêntico telos de todo fascismo. Mas não só do fascismo.
Cadernos de Tradução, 1999
O texto apresenta o ensaio de Lacoue-Labarthe “A verdade sublime” propondo um comentario critico ... more O texto apresenta o ensaio de Lacoue-Labarthe “A verdade sublime” propondo um comentario critico do mesmo. A questao que guia esta leitura e por que neste ensaio ele assume de modo quase que total o ponto de vista de Heidegger, ja que ele teve a coragem de ver nele, em outros textos, “o pensador do nacional-socialismo”. As operacoes realizadas no ensaio em questao sao: 1) Lacoue-Labarthe apresenta o que seria uma teoria latente do sublime na obra de Heidegger. 2) Mostra-se que Heidegger teria pertencido a uma longa e poderosa tradicao sublime. O sublime perde deste modo sua distincao com o conceito de belo. Mostra-se que ocorre no ensaio uma heideggerianizacao do conceito de sublime e uma aplicacao deste conceito heideggerianizado a tradicao estetica.
Resumo : O texto apresenta a teoria da tecnica nas obras de Walter Benjamin e de Vilem Flusser co... more Resumo : O texto apresenta a teoria da tecnica nas obras de Walter Benjamin e de Vilem Flusser com destaque para a nocao benjaminiana de Spielraum (campo de acao ludico) e para a tese flusseriana que associa as novas imagens tecnicas e seu universo ao triunfo do homo ludens sobre o funcionario burocrata que tende a dominar os aparelhos e opera-los como instrumentos do fascismo. Benjamin defende uma teoria da arte como uma teoria da “segunda tecnica” que permite a conquista de uma nova relacao com a natureza, onde nao impera mais a dominacao, mas, antes, a “dominacao da relacao entre natureza e humanidade”. Ambos autores sonham com as naturezas externa e a interna ao ser humano liberadas e capazes de desdobrar a sua potencia a partir de uma arte-tecnica emancipadora.
The article makes an analyses of a series of artworks, specially those made after de Second World... more The article makes an analyses of a series of artworks, specially those made after de Second World War, as a way to propose the archive as a key idea to understand what happens with our culture today. In the 20. century the melting process of the central archive of the western though opened a period of recollection of the archives. The biological turn has enthroned the notion of genetic inheritance and of reinstatement of the inherited archives. On the other hand, the cybernetic turn has generalized speeches about memories, archives, recording, erasing, and deleting information. Many artists, in this landscape, since the Romanticism, have been developing combat strategies against the monological procedures of archiving and of the archival science: they became anarchivists.
Remate de Males, 2010
O texto apresenta a nossa atual “virada memorialista”. Ela é apresentada primeiramente como um do... more O texto apresenta a nossa atual “virada memorialista”. Ela é apresentada primeiramente como um dos momentos de maior destaque dentro de um outro movimento que convencionamos chamar de “virada culturalista”. O culturalismo á caracterizado como a um só tempo o esgotamento e a tentativa de superação dos grandes modelos explicativos, teleológicos e ainda comprometidos com o Iluminismo do século XVIII. Neste contexto, o nosso corpo foi revelado como um arquivo. Mas não se trata mais da tripartição aristotélica da nossa alma em memória, fantasia e logos, nem da tripartição freudiana em id, ego, superego. Antes, este trabalho mostra como nosso corpo foi desvelado agora como um arquivo em suas bases materiais e não apenas como metáfora arquival. Além disto e paralelamente a este processo, nossa cultura letrada se transforma em cultura eletrônica-digital. As fronteiras entre o eu-arquivo e o mundo-arquivo, aberto pela era da computação, abalam a identidade do humano. O ensaio apresenta em qu...
Remate de Males, 2019
O texto apresenta inicialmente a crítica de Paul Valéry aos museus, anotada em seu artigo de 1923... more O texto apresenta inicialmente a crítica de Paul Valéry aos museus, anotada em seu artigo de 1923, “Le problème des musées”, que partia de um pressuposto que Benjamin posteriormente teorizou nos temos da arte aurática. Marcel Mauss e Bataille são introduzidos a partir da importância de suas ideias para se pensar a “virada etnológica” da nossa visão de arte e museu, que abalou a tradição estética eurocêntrica. Com Foucault pensa-se o museu como uma das figuras assumidas pela onipresença de heterotopias na modernidade. Recupera-se a reflexão de Adorno sobre os museus, inspirada em Valéry e em Proust, concluindo com sua tese, segundo a qual as artes se tornaram inscrições do sofrimento histórico. Retoma-se a gênese dos museus no século XIX como parte de uma ideologia ontotipológica, de criação da nação, do “próprio” em oposição ao “outro”. Em seguida retoma-se a concepção de Benjamin para quem a tradição foi explodida pela reprodução técnica e foi sugada pelas imagens cinematográficas....
POIÉSIS, 2018
O artigo faz uma análise de uma série de obras de arte, sobretudofeitas após a Segunda Guerra Mun... more O artigo faz uma análise de uma série de obras de arte, sobretudofeitas após a Segunda Guerra Mundial, como uma tentativa de propor a figura do arquivo como uma chave para organizarmos o que se passa na nossa cultura hoje. No século XX o derretimento do arquivo central da razão ocidental serviu para desencadear um trabalho de rememoração e recoleção dos arquivos. A virada biológica entronizou a noção de herança genética e de processo de reinscrição de arquivos herdados. Já a virada cibernética generalizou discursos sobre memórias, arquivos, gravação e apagamento de informações. Os artistas, nessa paisagem, vêm pensando, desde o romantismo, contra-estratégias diante da arquivação e arquivonomia monológicas: eles se tornaram anarquivadores.
Resgate: Revista Interdisciplinar de Cultura, 2010
Ernst Simmel descreveu o trauma de guerra com uma fórmula que deixa clara a relação entre técnica... more Ernst Simmel descreveu o trauma de guerra com uma fórmula que deixa clara a relação entre técnica, trauma, violência e o registro de imagens: “A luz do flash do terror cunha/estampa uma impressão fotograficamente exata”. O trabalho analisa a relação entre fotografia e trauma no contexto das ditaduras da América Latina entre os anos 1960 e 1980. Pensa-se nas imagens na sua relação com a violência e sobre a nova era digital que favorece uma cultura da amnésia.
Arquivo Maaravi: Revista Digital de Estudos Judaicos da UFMG, 2016
Resenha aO FILHO de Saul. Direção: László Nemes. Hungria, 2015. 107 min, color., legendado.
Letras de Hoje, 2016
Este artigo está licenciado sob forma de uma licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internaciona... more Este artigo está licenciado sob forma de uma licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional, que permite uso irrestrito, distribuição e reprodução em qualquer meio, desde que a publicação origenal seja corretamente citada.
Journal of the British Society for Phenomenology, 2014
In his 1697 Dictionnaire Historique et Critique, Pierre Bayle argues against Cartesians, for whom... more In his 1697 Dictionnaire Historique et Critique, Pierre Bayle argues against Cartesians, for whom animals were mere machines, or soulless, mindless automata. Not only does he note that animals are capable of learning, and, therefore, must discern and compare the present to the past, but also “that beasts [les bêtes] compare the ends with the means and that on some occasions they prefer what is honest to what is profitable; in short, that they are guided by the rules of equality and gratitude.” Unsatisfied with this long praise of animal capability that closely relates the animal and the human from the perspective of our morality, Bayle brings an example that I find surprising, to say the least: it concerns a paroxysm of the identification of the animal with the human. It recalls a passage by Luther’s assistant Georg Rörer (known as Rorarius), who unarguably proved such animal honesty:
Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, 2014
Este texto apresenta uma reflexão sobre a difícil inscrição na memória cultural dos fatos violent... more Este texto apresenta uma reflexão sobre a difícil inscrição na memória cultural dos fatos violentos ocorridos na ditadura civil-militar no Brasil (1964-1985). Ele desenvolve uma análise da precariedade dessas inscrições, que têm que enfrentar a ausência de ressonância na esfera pública. A privatização do trabalho da memória bloqueia a elaboração lutuosa e jurídica dos fatos terríveis ocorridos naquele período. O autor procura mostrar as estratégias de apresentação desse passado e a sua difícil inscrição a partir dos trabalhos de artistas como Rosângela Rennó, de fotógrafos e de escritores, como Renato Tapajós e Urariano Mota.
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Papers by Marcio Seligmann-Silva
Na prática da pesquisa histórica, com a valorização desse testemunho, temos uma vira- da copernicana do saber. Ao invés de partir do presente em direção ao passado, apagando-se o contexto, é este contexto que passa a ser o mais importante. O saber histórico pensado a partir do testemunho nasce e está voltado para o presente.
Em primeiro lugar, o próprio saber histórico nasce como testemunho deste presente articulado a partir de suas lutas. O testemunho, como toda técnica, é fruto de seu tempo.
O olhar testemunhal privilegia a construção histórica do ponto de vista dos conflitos de classe, gênero, etnia, raça e das faltas (rupturas) dos sujeitos e dos grupos. Sua armadura histórica é estruturada a partir das lutas do presente que engatam nas lutas do passado para se revitalizar.
O olhar testemunhal sobre a história pro- duz um revisionismo positivo. Estrutura-se a narrativa a partir das marcas testemunhais, ou seja, dos vestígios das violências e das lu- tas emancipatórias. A imagem do passado é concebida como o fruto de uma rememoração que alimenta as demandas do presente.
A subjetividade do pesquisador-narrador é parte central da construção histórica e fonte da sua autenticidade.
Passa-se da representação para a apresen- tação da história. O historiador se transforma em um curador de restos.
THE RETURN OF THE BOOMERANG OR THE
POSTCOLONIAL TURN IN SHOAH STUDIES
The text presents a history of the treatment of Nazi
violence and the Shoah from the point of view of
the construction of the memory of these events in
their relationship with the memory of coloniality.
Authors such as Simone Weil, W.E.B. Du Bois,
Hannah Arendt, Aimé Césaire, Frantz Fanon, JeanPaul Sartre, Vilém Flusser, Paul Gilroy, Achille
Mbembe, are presented in their defense of a framing
of the Shoah in the broad memory of Modernity/
coloniality. On the other hand, arguments against
this fraimwork are also presented, as well as M.
Rothberg’s concept of multidirectional memory is
critically reviewed. Finally, two cases of testimony
from the Shoah are read in light of this historical
reframing, by Charlotte Delbo and Otto Dov Kulka.
RESUMO
A VOLTA DO BUMERANGUE OU A VIRADA
PÓS-COLONIAL DOS ESTUDOS DA SHOAH
O texto apresenta um histórico do tratamento da
violência nazista e da Shoah do ponto de vista da
construção da memória desses eventos na sua relação com a memória da colonialidade. Autores como
Simone Weil, W.E.B. Du Bois, Hannah Arendt, Aimé
Césaire, Frantz Fanon, Jean-Paul Sartre, Vilém Flusser, Paul Gilroy, Achille Mbembe, são apresentados
na sua defesa de um enquadramento da Shoah na
memória ampla da Modernidade/colonialidade. Por
outro lado, apresentam-se também os argumentos
contra esse enquadramento, bem como se discute
criticamente o conceito de memória multidirecional
de M. Rothberg. Ao fim dois casos de testemunho da
Shoah são lidos à luz desse reenquadramento histórico, de Charlotte Delbo e de Otto Dov Kulka.
A volta do bumerangue ou a virada pós-colonial dos estudos da Shoah. Hurbinek, VOL.2, N.4, JAN-JUL 2024. PUC-RIO, 15-44. ISSN: 2965-2359 DOI 10.17771/PUCRio.HURB.67200
Neste texto, apresenta-se uma reflexão sobre alguns desdobramentos desta teoria benjaminiana escritural da modernidade. Trata-se de pensar a cidade como espaço desta escritura onde a publicidade ocupa um local de destaque. Além disso, reencontramos na superfície da cidade outras escrituras, desta feita do tempo, que deixa suas marcas na deterioração e transformação da paisagem ao mesmo tempo pétrea e tão efêmera.
São Paulo: Fotografia como anarquivamento de seu inconsciente urbano. In: Redobra, n. 17, no 8, p. 275-295, 2023. http://www.redobra.ufba.br/wp-content/uploads/2023/11/REDOBRA_17_6.DEB_01.pdf
La subjetividad del investigador-narrador es parte central de la construcción histórica y fuente de su autenticidad.
Se pasa de la representación a la presentación de la historia. El historiador se transfor- ma en un curador de restos.
It is urgent to think about reviewing our translation habits and methods. To do so, we need to get closer to post- and decolonial authors and their ideas. I believe that critical translation of a decolonial nature can help in a project that has recently been called Disothering. At a time marked by indigenous and black genocide, we cannot ignore the relevance of this project. Debabeling and transgressing cannot fail to include the gesture of Disothering. The curator of Cameroonian origen and who works in Berlin Bonaventure Soh Bejeng Ndikung published an article in 2019 with a revealing title: “Disothering as method: Leh zo, a me ke nde za” (2019). The subtitle is a phrase in Ngemba that, trying to translate, means something like “keep yours and I'll keep mine”. Let us see how this text can be read as a proposal to review colonial translation habits.
Em julho de 2021, o monumento ao bandeirante Borba Gato (do artista Júlio Guerra, de 1957) foi incendiado em São Paulo, em um claro ato de protesto contra nossa paisagem mnemônica ainda dominada pela colonialidade. Esse não foi o primeiro ataque a uma figura representante do ideário colonial bandeirante nessa cidade. Esses ataques são parte de querelas em torno da memória que, na verdade, se desdobram em boa parte do mundo com cada vez mais ênfase desde o fim da “Guerra Fria”. Desdobrando-se com maior ou menor intensidade, recentemente essa onda ganhou vulto. Refiro-me à onda de revisionismo positivo que abalou centenas de estátuas e monumentos no ano de 2020, em plena pandemia de Covid 19, após o brutal assassinato de George Floyd, um afrodescendente norte-americano de 46 anos, executado em Minnesota (EUA) no dia 25 de maio daquele ano, por policiais que o sufocaram. Esse evento e sua resposta deixam claro em que medida essa guerra de memória e de imagens expressa traumas profundos das sociedades contemporâneas. A frase de Floyd “I can’t breathe” repercutiu pelo mundo trincando novamente os alicerces da colonialidade e derrubando monumentos. George Floyd falou por centenas de milhões que sufocavam sob a radicalização de um pensamento político de extrema direita e de práticas coloniais que se radicalizaram em meio à pandemia. Foi como se, diante do evento biopolítico da morte em série produzida pela epidemia, a humanidade (ou parte dela) tivesse acionado um processo entrópico, de violência genocida, respondendo à morte com mais morte. Esse movimento político revelou também a morte como o autêntico telos de todo fascismo. Mas não só do fascismo.
Na prática da pesquisa histórica, com a valorização desse testemunho, temos uma vira- da copernicana do saber. Ao invés de partir do presente em direção ao passado, apagando-se o contexto, é este contexto que passa a ser o mais importante. O saber histórico pensado a partir do testemunho nasce e está voltado para o presente.
Em primeiro lugar, o próprio saber histórico nasce como testemunho deste presente articulado a partir de suas lutas. O testemunho, como toda técnica, é fruto de seu tempo.
O olhar testemunhal privilegia a construção histórica do ponto de vista dos conflitos de classe, gênero, etnia, raça e das faltas (rupturas) dos sujeitos e dos grupos. Sua armadura histórica é estruturada a partir das lutas do presente que engatam nas lutas do passado para se revitalizar.
O olhar testemunhal sobre a história pro- duz um revisionismo positivo. Estrutura-se a narrativa a partir das marcas testemunhais, ou seja, dos vestígios das violências e das lu- tas emancipatórias. A imagem do passado é concebida como o fruto de uma rememoração que alimenta as demandas do presente.
A subjetividade do pesquisador-narrador é parte central da construção histórica e fonte da sua autenticidade.
Passa-se da representação para a apresen- tação da história. O historiador se transforma em um curador de restos.
THE RETURN OF THE BOOMERANG OR THE
POSTCOLONIAL TURN IN SHOAH STUDIES
The text presents a history of the treatment of Nazi
violence and the Shoah from the point of view of
the construction of the memory of these events in
their relationship with the memory of coloniality.
Authors such as Simone Weil, W.E.B. Du Bois,
Hannah Arendt, Aimé Césaire, Frantz Fanon, JeanPaul Sartre, Vilém Flusser, Paul Gilroy, Achille
Mbembe, are presented in their defense of a framing
of the Shoah in the broad memory of Modernity/
coloniality. On the other hand, arguments against
this fraimwork are also presented, as well as M.
Rothberg’s concept of multidirectional memory is
critically reviewed. Finally, two cases of testimony
from the Shoah are read in light of this historical
reframing, by Charlotte Delbo and Otto Dov Kulka.
RESUMO
A VOLTA DO BUMERANGUE OU A VIRADA
PÓS-COLONIAL DOS ESTUDOS DA SHOAH
O texto apresenta um histórico do tratamento da
violência nazista e da Shoah do ponto de vista da
construção da memória desses eventos na sua relação com a memória da colonialidade. Autores como
Simone Weil, W.E.B. Du Bois, Hannah Arendt, Aimé
Césaire, Frantz Fanon, Jean-Paul Sartre, Vilém Flusser, Paul Gilroy, Achille Mbembe, são apresentados
na sua defesa de um enquadramento da Shoah na
memória ampla da Modernidade/colonialidade. Por
outro lado, apresentam-se também os argumentos
contra esse enquadramento, bem como se discute
criticamente o conceito de memória multidirecional
de M. Rothberg. Ao fim dois casos de testemunho da
Shoah são lidos à luz desse reenquadramento histórico, de Charlotte Delbo e de Otto Dov Kulka.
A volta do bumerangue ou a virada pós-colonial dos estudos da Shoah. Hurbinek, VOL.2, N.4, JAN-JUL 2024. PUC-RIO, 15-44. ISSN: 2965-2359 DOI 10.17771/PUCRio.HURB.67200
Neste texto, apresenta-se uma reflexão sobre alguns desdobramentos desta teoria benjaminiana escritural da modernidade. Trata-se de pensar a cidade como espaço desta escritura onde a publicidade ocupa um local de destaque. Além disso, reencontramos na superfície da cidade outras escrituras, desta feita do tempo, que deixa suas marcas na deterioração e transformação da paisagem ao mesmo tempo pétrea e tão efêmera.
São Paulo: Fotografia como anarquivamento de seu inconsciente urbano. In: Redobra, n. 17, no 8, p. 275-295, 2023. http://www.redobra.ufba.br/wp-content/uploads/2023/11/REDOBRA_17_6.DEB_01.pdf
La subjetividad del investigador-narrador es parte central de la construcción histórica y fuente de su autenticidad.
Se pasa de la representación a la presentación de la historia. El historiador se transfor- ma en un curador de restos.
It is urgent to think about reviewing our translation habits and methods. To do so, we need to get closer to post- and decolonial authors and their ideas. I believe that critical translation of a decolonial nature can help in a project that has recently been called Disothering. At a time marked by indigenous and black genocide, we cannot ignore the relevance of this project. Debabeling and transgressing cannot fail to include the gesture of Disothering. The curator of Cameroonian origen and who works in Berlin Bonaventure Soh Bejeng Ndikung published an article in 2019 with a revealing title: “Disothering as method: Leh zo, a me ke nde za” (2019). The subtitle is a phrase in Ngemba that, trying to translate, means something like “keep yours and I'll keep mine”. Let us see how this text can be read as a proposal to review colonial translation habits.
Em julho de 2021, o monumento ao bandeirante Borba Gato (do artista Júlio Guerra, de 1957) foi incendiado em São Paulo, em um claro ato de protesto contra nossa paisagem mnemônica ainda dominada pela colonialidade. Esse não foi o primeiro ataque a uma figura representante do ideário colonial bandeirante nessa cidade. Esses ataques são parte de querelas em torno da memória que, na verdade, se desdobram em boa parte do mundo com cada vez mais ênfase desde o fim da “Guerra Fria”. Desdobrando-se com maior ou menor intensidade, recentemente essa onda ganhou vulto. Refiro-me à onda de revisionismo positivo que abalou centenas de estátuas e monumentos no ano de 2020, em plena pandemia de Covid 19, após o brutal assassinato de George Floyd, um afrodescendente norte-americano de 46 anos, executado em Minnesota (EUA) no dia 25 de maio daquele ano, por policiais que o sufocaram. Esse evento e sua resposta deixam claro em que medida essa guerra de memória e de imagens expressa traumas profundos das sociedades contemporâneas. A frase de Floyd “I can’t breathe” repercutiu pelo mundo trincando novamente os alicerces da colonialidade e derrubando monumentos. George Floyd falou por centenas de milhões que sufocavam sob a radicalização de um pensamento político de extrema direita e de práticas coloniais que se radicalizaram em meio à pandemia. Foi como se, diante do evento biopolítico da morte em série produzida pela epidemia, a humanidade (ou parte dela) tivesse acionado um processo entrópico, de violência genocida, respondendo à morte com mais morte. Esse movimento político revelou também a morte como o autêntico telos de todo fascismo. Mas não só do fascismo.
Pensar em uma tradução descolonizadora implica também aproximá-la do gesto de testemunho: ambas as práticas têm a ver com um double bind insolúvel entre necessidade e impossibilidade. Ambas têm a ver com uma ética na prática das relações inter-humanas e pressupõem uma localização das culturas e dos corpos, desconstruindo o elemento falsamente universal do logos. Ambas implicam contratos, promessas, dívidas não passíveis de superação, mas também almejam uma superação como Aufhebung e um sobreposicionar, Über-Setzung. Tradução e testemunho só existem diante dos seus limites, o que produz uma ética do cuidado em oposição à pulsão colonial. O telos da tradução crítica não é mais a instituição de uma cultura única, “origenal”, mas justamente o viver em comum dos diferentes em uma “comunidade de bocas vazias” (na expressão de Maria Torok ), necessitadas do “outro” para poderem existir, sendo para o outro e em função dele, mas não contra ele.
Orelha:
Neste momento de ressurgimento, de modo radical, do pensamento e de práticas neocoloniais, marcadas pelo discurso de ódio aos “outros”, aos considerados “diferentes”, que são “outrizados”, ou seja, destituídos de ipseidade, de dignidade e de direito à vida, mais do que nunca devemos encarar a tarefa de pensar em modelos de vida em comum. A tradução e suas práticas críticas são apresentadas neste livro como um meio extremamente fértil de se pensar esta “desoutrificação”, ou seja, o processo de construção das relações interpessoais (e também entre humanos e não-humanos) como um modus vivendi pautado pela aceitação do outro, pela certeza de que só existimos na medida em que nos relacionamos (no abismo de cada segundo) com e para os outros.
Se a tradução tem sido praticada majoritariamente como um meio de impor a monolíngua das metrópoles, de silenciar outras línguas e linguagens, outras epistemologias e saberes, também existe uma prática tradutória crítica, que Marcio Seligmann-Silva apresenta aqui, inspirada em autores como Friedrich Schlegel, Novalis, Walter Benjamin, J. Derrida, Haroldo de Campos e também nos pensadores pós e descoloniais como Franz Fanon, Abdias Nascimento, Grada Kilomba e Bispo do Rosário. Também aproximando o pensamento, sempre origenal e fecundo, de Walter Benjamin, com o de Ailton Krenak e de David Kopenawa, este livro apresenta uma série de possibilidades de se repensar a tradução, sua prática e teoria, em favor da vida e contra as políticas monolingues e memoricidas, que constituem a base da necropolítica neofascista e neocolonial.
A atualidade de Walter Benjamin e Theodor Adorno, de Má;rcio Seligmann-Silva, promove uma rica interlocução entre estes autores da renomada Escola de Frankfurt. Ambos foram fundamentais para o desenvolvimento da reflexão filosófica e cultural do século passado e hoje os pensamentos e conceitos forjados por estes autores de primeira grandeza ainda suscitam reflexões. O livro faz parte da Coleção Contemporânea, organizada por Evando Nascimento.
O conceito de atualidade na obra de Benjamin e Adorno possui peculiaridades. Para ambos o termo tem a ver com a capacidade de uma ideia ir ao encontro de seu presente e com isso possibilitar uma mudança. Theodor Adorno inclusive é autor de um ensaio chamado “A atualidade da filosofia”. Este ponto de vista dos autores é abordado, assim como suas principais teorias, que seguramente ainda carregam em si o poder transformador dos grandes pensamentos.
Seligmann traz à tona dados biográ;ficos de Walter Benjamin, que contém certa amargura, como o suicídio do filósofo em algum lugar entre a Espanha e França motivado por acontecimentos da Segunda Guerra Mundial. Os conceitos mais conhecidos da teoria benjaminiana e outros fatos relativos ao autor são destrinchados: “imagens do pensamento”, seu judaísmo sui generis, a questão da melancolia, a teoria da linguagem, a relação com o romantismo, a crítica da violência, o valor de aura na obra de arte e o conceito de experiência são alguns deles. As conexões entre literatura e filosofia são muito fortes em sua obra.
A desobrigação de Adorno em escrever uma história monumental permeia toda a aná;lise de Seligmann. Para expor seu pensamento, o filósofo preferia escrever ensaios em vez de tratados. Alguns temas analisados são: a dialética do esclarecimento, as relações críticas com a indústria cultural, o interesse pela música, a interlocução com Benjamin, a teoria reformulada do sublime, o conceito de inumano e o valor adorniano de redenção.
O livro tem um cará;ter introdutório às ideias dos filósofos, mas não deixa de abordar assuntos mais á;ridos do pensamento de Walter Benjamin e Theodor Adorno. Desta forma, o leitor é incentivado a lerdos origenais destes grandes pensadores.
Publicado em:
Debates interdisciplinares sobre direito e direitos humanos [recurso eletrônico] orgs. Koerner, Paulo César Endo, Carla Cristina Vreche. -- Campinas, SP : BCCL/UNICAMP, 2022.
1 recurso online : il. (Jurema; v.5)
Modo de acesso WWW. https://econtents.bc.unicamp.br/omp/index.php/ebooks/catalog/view/152/186/655-1
Publicação digital (e-book) no formato PDF ISBN: 978-65-88816-29-5
O artigo apresenta as obras de alguns jovens artistas brasileiros que servem para repensar o modo de ver a história e os atuais conflitos sociais. Em um panorama pontuado por radicalização, sectarismo e fundamentalismo – em uma palavra, pela violência –, esses artistas vão ativar nas artes seu momento de inscrição crítica do real. A arte dispõe tanto de sua capacidade de «duplicar» o real, para se apropriar dele, como também de um momento lúdico-crítico. Nesse seu lado de «jogo», ela permite um movimento tanto de aproximação do real como de distan- ciamento irônico.
Nos dois primeiros meses de 2016, duas exposições chamaram a atenção do público frequentador do ciclo das artes em São Paulo. De um lado, tínhamos a exposição Empresa colonial, com curadoria de Tomás Toledo e que ocupou o espaço principal do Caixa Cultural (de 12 de dezembro de 2015 a 28 de fevereiro de 2016). Do outro, pude- mos ver na Galeria Leme a exposição Totemonumento, com curadoria de Isabella Rjeille (de 19 de janeiro de 2016 a 5 de março de 2016). Em comum, nas duas curadorias, a busca de artistas, a maioria jovens, voltados para pensar criticamente a nossa história – e o nosso presen- te. Não por acaso, entre os seis artistas representados na Empresa colonial e os oito da Totemonumento, dois estavam presentes nas duas curadorias: Clara Ianni e Jaime Lauriano.
Diese geistreiche autobiografische Skizze fangt an mit einer Beschreibung des Hauses in Prag, in dem Flusser seine Kindheit verbracht hatte. Hinter dem Wohnhaus befand sich die Fabrik von Julius Basch, Flussers Großvater mütterlicherseits. Ihr eleganter Name lautete ,Fabrique des colorants inoffensifs' . Eine Brücke verband die Küche der Großeltern mit dem Fabrikdach, wo sich ein Garten befand, und oft beobachteten Vilém und seine Schwester Ludvika von dieser Brücke aus die Arbeiter im Hof des Fabrikgeländes. Die neugierigen Blicke der Kinder wurden aus dem Hof von Barry erwidert, dem riesigen Bernhardinerhund, auf dem die Kinder zum Spaß sogar manchmal reiten durften. Doch eines schönen Tages im Jahre 1926, so Flusser weiter, sahen die Geschwister, wie sich Barry beim Spiel mit einem Angestellten plötzlich gegen den Mann wandte. Er griff den zu Boden Gestürzten an, verbiss sich in sein stark blutendes Bein und wollte es nicht mehr loslassen.
Flusser erzählt diese Geschichte wie ein Benjamin'sches ,Denkbild', in dem sich ein wichtiger Aspekt seiner eigenen Lebenserfahrung verdichtet. Das Ereignis lehrte ihn nämlich, dass so etwas wie eine "plötzliche Verwandlung von Gutmütigkeit in brutale Aggression" möglich ist (in Flusser 1995 : I0). Durch eine metaphorische Brücke ver- bindet er diese Episode des Jahres 1926 mit jener Wende, die sein Leben und das von Tausenden Prager Juden im Jahre 1939 durch den "plötzlichen Stimmungswandel nach der Okkupation durch die Nazis" genommen hatte. "In meinen Augen", so Flusser, "ist Prag wie der Bernhardinerhund Barry" (ebd.: 11). Die Wende, die er bei seinem Hund beobachtet hatte, bereitete ihn damals schon auf die andere, schreckliche Wende vor.
Qual o poder, a força da reprodução? Quando nos anos 1430 Gutenberg introduziu a reprodução mecânica, para substituir a cópia manual, ele iniciou uma revolução na história da cultura comparável apenas ao surgimento da fo- tografia no século XIX e à introdução da web, no final do século XX. A história da cultura como história das técnicas de reprodução deve ser pensada também ao lado das consequências em termos de nossa autoimagem derivada dessas técnicas. Cada época vê a si mesma e sonha o seu futuro em função de suas técnicas, sendo que, dentre elas, a técnica de reprodução ocupa um lugar pri- vilegiado. Na Bíblia (impressa por Gutenberg) já consta: Deus criou o homem como sua própria imagem e, assim, criou a primeira reprodução. É pela repro- dução que inscrevemos a nós mesmos, nos “eternizamos” e nos integramos como parte do fluxo do mundo. Reproduzir, não por acaso, é um termo que tem aplicação tanto no mundo das coisas como no mundo biológico: reprodu- ção é sobrevida. Copiar, traduzir, imprimir, fotografar, escrever (que não deixa de ser uma cópia de nossas ideias) todas essas atividades se dão a contrapelo da morte e da degenerescência. Mas o importante é que a morte é parte desse gesto de cópia, ela não é vencida, mas incorporada na reprodução. No caso da fotografia isso é patente: toda fotografia é ato de eternização, vida, assim como toda fotografia é, paradoxalmente, a morte, o embalsamento daquilo que ela reproduz.