Resenha Do Ffilme A Primeira Vista
Resenha Do Ffilme A Primeira Vista
Resenha Do Ffilme A Primeira Vista
aprendizagem; desenvolvimento.
acadmicos acerca dos mais variados temas. O presente trabalho parte dessa
perspectiva, propondo exemplificar, a partir de aspectos selecionados em uma obra
cinematogrfica, os pontos relevantes acerca da aquisio de conhecimento pelo
deficiente visual, tal como compreendida pela Psicologia Histrico-Cultural.
Nesse sentido, com o intuito de promover essa discusso, o filme selecionado foi
primeira vista (At First Sight, 1999, Irwin Winkler, Fox Home Entertainment), que
tem como contexto a deficincia visual e as dificuldades pelas quais passa o indivduo
quando, adaptado s suas condies, volta a enxergar. A histria retratada no filme
baseia-se em um conto da obra Um Antroplogo em Marte, de Oliver Sacks (2006),
neurologista que aborda casos clnicos a partir de explicaes biolgicas que no se
encerram em si mesmas, mas tambm consideram as vivncias e o desenvolvimento do
homem na sua insero social.
Um dos protagonistas, Virgil Adamsom (representado por Val Kilmer),
deficiente visual total, cujo diagnstico catarata congnita com retinite pigmentosa,
uma doena hereditria que compromete as retinas de forma lenta, mas
implacavelmente. A cegueira acompanha-o desde a mais tenra infncia, no entanto
Virgil no a considera como problema, uma vez que demonstra ser um homem feliz,
bem humorado e bastante adaptado a sua rotina. Mora com a irm Jennie Adamsom
(Kelly McGillis) e trabalha como massagista num SPA de um hotel, onde conhece Amy
Benic (Mira Sorvino), uma arquiteta de Nova York, que se percebe incapaz de lidar com
a cegueira do massagista por se tratar de uma realidade diferente da sua. Ambos se
apaixonam e Virgil muda-se para Nova York, onde, influenciado por Amy, aceita fazer
uma cirurgia que restabelece sua viso. O mundo da escurido passa a ganhar cores e
muitas consequncias comeam a surgir para Virgil.
O que antes era considerado uma soluo, tornou-se um problema e trouxe
muitas dificuldades, principalmente para Virgil e para Amy. Ao ter a possibilidade de se
apropriar do mundo pela primeira vez a partir do sentido da viso, Virgil experienciou
diversas sensaes, ao demonstrar encantamento com tantas descobertas, ao mesmo
tempo em que mostra-se assustado quando lanado no mundo de objetos, das imagens e
dos sentimentos que no tm significados em relao maneira que ele os apropriou
enquanto cego.
Essas consequncias e a maneira pela qual o protagonista lida com elas,
comparada a seu modo de ser antes da cirurgia, nos permitem analisar o processo de
apropriao de conhecimento vivenciado pelo deficiente visual, bem como refletir
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acerca das implicaes prticas desse processo. Foram elencados alguns aspectos
relevantes para essa anlise, que compreendem: o modo como o homem se relaciona
com o mundo por meio da utilizao dos rgos dos sentidos; a formao de conceitos e
a compensao cultural da deficincia visual, todos eles passando pelo desenvolvimento
das funes psicolgicas superiores na constituio do psiquismo humano.
De acordo com Sacks (2006), Virgil era mentalmente cego, uma vez que o
crebro no aprendeu a enxergar, mas significava o mundo a partir do sentido do tato.
Em muitas situaes, seus olhos no lhe diziam nada a respeito de determinado objeto,
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mas ao toc-los, por exemplo, o objeto tinha seu significado, apropriado ao longo de seu
desenvolvimento enquanto cego. Dessa forma, aps a cirurgia, passou a ser capaz de
ver, mas no de decifrar o que via, estava agnsico. Nesse momento, deveria se
reapropriar do mundo e se recompor da identidade de cego para a de algum que
enxerga, como se fosse um beb aprendendo a ver. Virgil, ao se tornar uma pessoa que
enxerga, precisava apropriar-se dos signos e instrumentos e aprender a usar a viso,
desenvolvendo este sentido culturalmente. Nesse sentido,
As aquisies do desenvolvimento histrico das aptides humanas no
so simplesmente dadas aos homens nos fenmenos objetivos da
cultura material e espiritual que os encarnam, mas so a apenas
postas. Para se apropriar destes resultados, para fazer deles as suas
aptides, os rgos da sua individualidade, a criana, o ser humano,
deve entrar em relao com os fenmenos do mundo circundante
atravs doutros homens, isto , num processo de comunicao com
eles (LEONTIEV, 1978, p. 272).
Dessa maneira, possvel afirmar, assim como assinala Leontiev (1978), que o
homem no nasce homem e, portanto, os sentidos so humanizados. Em outras palavras,
na constituio histrica e social do psiquismo, o modo como o homem se relaciona
com o mundo por meio dos rgos de sua individualidade (ver, ouvir, cheirar, degustar,
pensar, amar, querer etc.) existe em sua forma especificamente humana porque so
sociais, provenientes das relaes mediadas dos homens com outros homens. Tal fato
comprova-se na cirurgia feita por Virgil, na qual todos esperavam que de imediato ele
passaria a enxergar e reconhecer o mundo, como se o sentido da viso fosse
biologicamente dado.
se v com a viso e com o tato. Um desses aspectos, ressaltados por Ventorini (2007)
diz respeito esttica ttil. Segundo a autora, o tato no contempla a beleza dos objetos
da mesma forma que a viso. Neste sentido, o objeto que possui uma beleza esttica ttil
aquele que tem textura, forma e tamanho adequados explorao ttil (p. 38). Assim,
quando Virgil toca em Amy o que ele sente so as formas do seu rosto, do seu corpo e a
textura de sua pele, sendo que quando a v pela primeira vez depois da cirurgia exclama
ento isso que a beleza?, expressando a diferenciao entre a beleza explicitada
pelos olhos e pelas mos.
O posicionamento de Vygotsky e Luria (1996), na obra Estudos sobre a histria
do comportamento, em relao s crianas que possuem alguma deficincia vale
discusses, visto que eles atentam-se para as caractersticas positivas e potenciais que
estas crianas possuem quanto capacidade de aprender e se desenvolver. Nesse
sentido, o trabalho educativo com deficientes visuais legitimado, baseado no
desenvolvimento do psiquismo a partir da apropriao do conhecimento construdo pela
humanidade ao longo da histria, com mediaes que promovam um ambiente social no
qual a criana possa fazer uso e se apropriar das ferramentas e signos externos. Dessa
maneira, desenvolve-se para alm de suas limitaes, ao passo que se constitui como
uma personalidade social vlida, assim como o protagonista do filme primeira
vista.
Diante dessas consideraes, podemos afirmar que o desenvolvimento do
indivduo um processo dialtico complexo, no qual ocorre o desenvolvimento de
diferentes funes, a transformao qualitativa de uma forma em outra, na qual a
superior supera a funo mais elementar por incorporao e, assim, d movimento ao
desenvolvimento. Permanecer focado no que a criana j tem, ao seu comportamento
natural, prend-la em sua deficincia e desperdiar todo o potencial a ser
desenvolvido. preciso ensin-la a usar seus prprios recursos naturais de forma
racional, tal como fazem as crianas sem deficincia (VYGOTSKY E LURIA, 1996).
Diante disso, fica evidente que as capacidades inatas da pessoa configuram o
ponto de partida, cujo caminho determinado pelo desenvolvimento cultural que pode
produzir resultados dessemelhantes nos indivduos, por depender de sua interao com
o meio ambiente, das mediaes realizadas e da disponibilidade de recursos culturais
encontrados ao longo desse desenvolvimento. Tem-se a superao do determinismo
biolgico pela formao histrica e cultural do homem, tese fundante da Psicologia
Histrico-Cultural que encontra fora e base quando falamos de alunos/pessoas com
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deficincia.
Nesse sentido, Vygotsky e Luria (1996) afirmam que o percurso do
desenvolvimento das funes psicolgicas superiores decorrente da interao do
indivduo com a cultura, que, por tal fato, passa a ser um processo de aprendizagem,
muito alm do amadurecimento fisiolgico, o que implica no fato de que so funes
construdas no decorrer do desenvolvimento humano. Tal questo direciona para a
possibilidade de, por meio de atividades que as estimulem, de informaes e de um
trabalho para as crianas que as coloquem em contato com tais problemas, seja
alcanado o comportamento cultural, que permitir o uso inteligente e intencional das
funes psicolgicas superiores da melhor forma possvel.
Ao entender o processo de desenvolvimento cultural das funes psicolgicas
superiores, assim como Vygotsky e Luria (1996) afirmam, possvel que o educador
direcione sua atuao para as possibilidades de compensao e busque formas de us-
las, uma vez que a limitao pode funcionar como um estmulo, no sentido da
reorganizao cultural da personalidade. Vygotski (1997) afirma que a
supercompensao vem orientada para a formao de uma personalidade vlida, da
conquista de uma posio na vida social. Tomando como exemplo a criana cega, o
autor pontua que seu desenvolvimento segue o sentido contrrio ao da cegueira, tendo a
linguagem como a garantia de uma posio social em meio aos videntes, tal como pode
ser observado na histria de Virgil.
As formulaes tericas desenvolvidas por Vigotski, assim como por outros
autores da Psicologia Histrico-cultural, contribuem para a organizao do ensino que
prioriza o desenvolvimento de capacidades dos alunos, a partir de novas aprendizagens
realizadas por meio de mediao, que, por isso, esto alm do efetivo desenvolvimento
alcanado por ela, na zona de desenvolvimento prximo. Desse modo, a tarefa concreta
do educador e do prprio psiclogo escolar, orienta-se no sentido de desenvolver o que
falta s crianas com cegueira, contrariamente direo do defeito, assim como afirma
a teoria vigotskiana.
Quanto a isso, Laplane e Batista (2008) chamam a ateno para a importncia de
inserir os deficientes visuais em um ambiente que promova ativamente seu
desenvolvimento atravs dos canais sensoriais que a criana possui, tornando possvel
que ela participe das atividades cotidianas e aprenda como qualquer criana, impedindo
que elas tenham seu interesse diminudo pela falta de estmulos, tornando-se apticas e
quietas. Para tal, os autores sugerem atividades grupais de ensino e recreativas,
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Consideraes finais
REFERNCIAS
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SACKS, Oliver. Ver e no ver. In.: SACKS, Oliver. (2006). Um antroplogo em Marte:
sete histrias paradoxais. So Paulo: Companhia das Letras, pp. 113 154.