Sete Contra Tebas 1

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Evandro Luis Salvador

Os Sete contra Tebas de Ésquilo:

introdução, tradução e comentários

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Lingüística do Instituto de Estudos
da Linguagem da Universidade Estadual de
Campinas (UNICAMP) como um dos requisitos
para a obtenção do título de Mestre em
Lingüística, na área de Letras Clássicas.

Orientador: Prof. Dr. Flávio Ribeiro de Oliveira

Instituto de Estudos da Linguagem


UNICAMP
2006
Nome (autor):Evandro Luis Salvador

Título do trabalho: Os Sete contra Tebas de Ésquilo: introdução, tradução e comentários

Título do trabalho (em inglês):Aeschylus’s Seventh Against Thebes: introduction, transla


tion and commentaries

Orientador: Prof. Dr. Flávio Ribeiro de Oliveira

Co-orientador (se houver)

Titulação: Mestrado

Palavras-chave em português (até 5): Tragédia, Ésquilo.

Palavras-chave (termos correlatos) em inglês: Tragedy, Aeschylus.

Área de concentração: Letras Clássicas

Descrição dos participantes da banca: Prof. Dr. José Antonio Alves Torrano (USP)
Prof. Dr. Fernando Brandão dos Santos (Unesp)

Data de defesa: 20/03/2006

Ano do trabalho (que será impresso na página de rosto)2006

Resumo eletrônico (Microsoft Word) do trabalho: esta dissertação de mestrado apresenta o resultado
da tradução da tragédia Os Sete contra Tebas de Ésquilo, acompanhada de comentários e de um estudo introdutório

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Componentes da banca de defesa

_________________________________________________________

Prof. Dr. Flávio Ribeiro de Oliveira – orientador

_________________________________________________________

Prof. Dr. José Antonio Alves Torrano

_________________________________________________________

Prof. Dr. Fernando Brandão dos Santos

_________________________________________________________

Prof. Dr. Marcos Aurélio Pereira (suplente)

_________________________________________________________

Prof. Dr. Paulo Sérgio de Vasconcellos (suplente)

3
AGRADECIMENTOS

Ao Prof. Dr. Flávio Ribeiro de Oliveira, amigo e orientador, pelos esclarecimentos


fundamentais e pela paciência que sempre marcou nossos encontros de pesquisa.
Ao Prof. Dr.Trajano Augusto Ricca Vieira, um gigante, pelas excelentes aulas de
língua e literatura gregas e pelas valiosíssimas contribuições na qualificação.
Ao Prof. Dr. Lucas Angioni, pelas sugestões importantes na qualificação.
À Profa. Dra. Isabella Tardin Cardoso, por toda a atenção, incentivo e delicadeza
com que me indicou caminhos.
Aos Profs. José Antonio Alves Torrano e Fernando Brandão dos Santos, pela
participação na banca de defesa desta dissertação.
À Profa. Dra. Suzi Frankl Sperber, minha primeira orientadora na graduação, a
quem muito devo pelo espírito crítico.
À Priscilla Simone Dias, pelo apoio sempre incondicional, às vezes às custas do auto-
sacrifício para que eu pudesse cumprir os meus cronogramas de pesquisa.
Aos meus amigos das Letras Clássicas Mariana Musa de Paula e Silva, Charlene
Martins Miotti, Sidney Calheiros de Lima, Daniel Rossi Nunes Lopes e Bianca Fanelli
Morganti, pelas conversas sempre edificantes no Bar do Jair e, principalmente, ao
Júlio Maria do Carmo Neto, grande irmão e companheiro (lá-ele) de biblioteca, pelas
valiosas conversas nos intervalos de estudos e nas mesas de bar.
Aos meus pais, João Odemir Salvador e Luiza Joceli Chiarinelli Salvador, pelo apoio
sempre presente. Aos funcionários da biblioteca e da secretaria de pós-graduação.
À dona Sebastiana (Tiana), figura simpaticíssima, que me proveu de cafés e de
divertidas conversas sobre a vida.
Agradeço ainda ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq)), pelo financiamento deste trabalho.

5
Ao meu amado filho Francisco Dias Salvador, razão de tudo.

7
Resumo

A proposta da nossa dissertação de mestrado é a tradução da tragédia Os Sete


Contra Tebas, de Ésquilo, acompanhada de comentários e de um estudo
introdutório.

Abstract

The proposal of our master´s dissertation is the translation of the tragedy The Seven
Against Thebes by Aeschylus, followed of commentaries and an introductory study.

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SUMÁRIO

RESUMO/ABSTRACT...........................................................................................................9

1. Apresentação............................................................................................................15

2. Antecedentes d’Os Sete contra Tebas……………………………………......17

3. O conflito entre o espaço externo e o espaço interno……………………..21

4. Etéocles: fe/riste Kadmei/wn a1nac e Oi0di/pou

te/koj.....................................27

5. Ésquilo: Os Sete contra Tebas.................................................................... 33

6. Comentários...................................................................................................71

7. Referências bibliográficas..........................................................................115

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1. Apresentação

Apresentamos a tradução da tragédia esquiliana Os Sete contra Tebas,


acompanhada de comentários sintáticos, semânticos, morfológicos, estilísticos e
culturais, e de um estudo introdutório.
Optamos pelo texto grego editado e comentado pelo professor G. O.
Hutchinson (1994) seguindo, inclusive, a formatação do texto no que diz respeito à
disposição dos caracteres dos personagens.
Falando da tradução, observamos que o texto traduzido procura estar o mais
próximo possível do sentido do texto grego, trabalhando com sua legibilidade de
forma a promover uma leitura fluente. Sendo um drama em versos, mantive não só
número de versos da edição estabelecida por Hutchinson como também a ordem e
posição de palavras-chaves e os padrões de interrupção e continuidade entre
versos. Confrontamos a nossa tradução com as traduções do texto grego
elaboradas por Centanni (1995), Paul Mazon (2000), Smith (1996) e Vílchez (1999).
A idéia principal dos comentários é anotar e comentar passagens que
julgamos relevantes para a compreensão do texto grego e que se originaram,
sobretudo, de nossa leitura particular da tragédia. Utilizamos como bibliografia de
apoio os comentários do próprio Hutchinson, de Centanni e de Lupas e Petre
(1981).
Quanto ao estudo introdutório, obviamente ele ficou muito aquém daquilo
que representa a grandiosidade desta tragédia de Ésquilo, até porque o tempo do
mestrado nos impede de fazer um estudo crítico-literário mais profundo e muito da
vasta bibliografia produzida sobre a tragédia se encontra distante de nós. Por isso
optamos por analisar alguns grandes temas que julgamos relevantes e reunir livros
e textos que nos fornecessem elementos importantes para a nossa análise.

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2. Antecedentes d’Os Sete contra Tebas

Pensar numa sentença que defina a complexidade da tragédia esquiliana


Os Sete contra Tebas não é uma tarefa fácil. Por mais que o convívio seja
diariamente intenso no que diz respeito à sua tradução e exegese, o que faria de
seu estudioso uma pessoa habilitada para defini-la, é preciso de muita cautela para
fazê-lo sem titubear, sob o risco de não tê-la compreendido direito.
Uma das definições mais correntes é usar uma passagem que aparece na
comédia As rãs, de Aristófanes. Nela, Ésquilo é desafiado por Eurípides a explicar o
motivo pelo qual ele conseguira tornar os expectadores mais valentes. E Ésquilo
respondeu da seguinte maneira: drama poh/saj 1Arewj mesto/n1
(DOVER, 1994: 168). O drama em questão é a tragédia Os Sete contra Tebas.
De fato, é uma tragédia que cultiva Ares, deus patrono da guerra, do início
ao fim, através de uma atmosfera rica em elementos marciais, como o ranger das
rodas das carruagens, o barulho ocasionado pelo choque de lanças e escudos, o
relinchar dos corcéis, os brados retumbantes e as jactâncias. Tudo isso representa
a aproximação do exército sitiador, ou seja, o exército argivo.
Pensar a tragédia nesses termos não é um erro. Essa visão é insuficiente e
simplista diante da grandiosidade do drama revelada, basicamente, por dois motivos
centrais.
Em primeiro lugar, porque a articulação entre o mundo dos deuses e o
mundo dos homens não passa, nesta tragédia, somente pela figura de Ares, quer
dizer, “mesmo relativamente àquilo que diz respeito à guerra, os deuses2 têm o seu
lugar e a sua influência” (ROMILLY, 1999: 55). Na prece de Etéocles, no verso 69,
temos uma tripla invocação a Zeus, Terra e deuses da cidade, sem contar a
invocação às Erínias de Édipo, deusas vingadoras. Na prece do coro, no primeiro
estásimo, temos um exército olímpico que é chamado para auxiliar na defesa de
Tebas: Zeus, Palas-Atena, Ares, Posídon, Apolo, Ártemis, Onca, etc..
Em segundo lugar, porque a guerra esconde um drama de dimensão
humana. Quando Etéocles fica sabendo pelo espião que seu irmão Polinices estará
diante da sétima porta à espera do confronto, disposto a matar ou morrer, o diálogo
que ele trava com o coro das donzelas tebanas evidencia um homem dominado
1
Fiz um drama pleno de Ares. A tradução é nossa.
2
Grifo nosso.

16
pela maldição que pesa sobre sua família, uma maldição que o alcança e o impele a
aceitar o duelo com seu irmão. Arraigado ao modelo de conduta típico dos heróis,
ele aceita o combate pelo simples motivo de que há uma maldição em curso. Mas
de qual maldição estamos falando?
Os Sete contra Tebas é o último elo de uma trilogia que abordou a história
trágica de uma linhagem real que governou Tebas durante três gerações. Antes
dela, foram encenadas as tragédias Laio e Édipo. Fechando a trilogia, veio o drama
satírico A Esfinge que, conforme escreveu Herington, “must have relaxed the
audience’s tensions by guying one of Oedipus’ still most famous heroic
achievements” (HERINGTON, 1986: 79). Com a trilogia e o drama satírico –
portanto uma tetralogia – Ésquilo venceu o concurso trágico em 467 a. C..
Das duas primeiras tragédias pouco conhecemos. O prólogo d’Os Sete
contra Tebas não revela nada sobre o passado. Apenas apresenta-nos uma
situação imediata, que é a aproximação do exército sitiador. Se o prólogo não nos
fornece elementos capazes de nos fazer entender o porquê da querela entre Tebas
e Argos, ou melhor, entre Etéocles e Polinices, devemos buscá-los no canto coral,
pois também poderemos entender a versão de Ésquilo sobre a linhagem
amaldiçoada dos Labdácidas.
De acordo com o canto coral, a maldição originou-se com Laio. O oráculo de
Apolo proferiu a ele a seguinte advertência nos versos 747-8: qna/iskonta

ge/nnaj a1ter sw/izein po/lin. .Winnington-Ingram notou a


ambigüidade do oráculo ao dizer que:

“this oracle might mean that the city would certainly be destroyed, if Laius
had offspring: it was not excluded, however, that, if the family that should never have
come into being were to perish, the city would be saved” (WINNINGTON-INGRAM,
1983: 20).

Por sua vez, Thalman levanta um outro aspecto na sentença oracular:

“if sw/izein here meant ‘to save’, one would expect its tense to be aorist
(indicating simple occurrence). I suggest that the present infinitive, implying

17
continued action, means ‘preserve’, and that Apollo’s response to Laius was ‘that by
dying without issue he would keep the city safe’” (THALMAN, 1978: 11).

Entretanto, não sabemos em que circunstância de seu reinado em Tebas


Laio foi consultar o oráculo. Talvez na tragédia que leva o seu nome o motivo de tal
consulta tivesse aparecido. Mas é difícil crer que a desobediência ao oráculo tenha
se constituído num crime suficientemente capaz de atrair para Laio as Erínias, pois,
de acordo com Untersteiner, “tale figura divina si risolve nella Terra irata, quando
l’ordine familiare e intimo viene comunque violato” (UNTERSTEINER, 1984: 384).
Talvez o substantivo parbasi/an no verso 743 lance uma luz sobre o
problema, pois a palavra “implies a violation of divinely sanctioned limits on human
conduct” (THALMAN, 1978: 15).
Laio, em certa ocasião, refugiou-se no palácio de Pélops e raptou seu filho
Crisipo que, envergonhado, acabou se matando. O suicídio de Crisipo aliado ao
rapto fizeram com que Pélops amaldiçoasse não só a Laio como também a todas as
suas gerações. Temos, assim, dois aspectos a considerar: o rapto de Crisipo que
configura a palavra parbasi/an, pois Laio violou as leis da hospitalidade; e o
suicídio de Crisipo que, se entendido como de responsabiliadade de Laio, configura
a violação da ordem familiar e, portanto, justifica o trabalho das Erínias.
Isso explica o sentido da advertência do oráculo. Quando Laio desobedeceu
a Apolo, ele não só atraiu para Tebas o perigo (daí o sentido de sw/izein
po/lin –“preservar a cidade”), porque Tebas tornar-se-ia, mais adiante, o
epicentro de desgraças como o parricídio e o incesto, como abriu as portas para a
passagem das Erínias, deflagrando o início do cumprimento da maldição de Pélops
(Qual a melhor punição do que ser morto por seu próprio filho?). O nascimento de
Édipo significa, para Laio e Tebas, um enorme perigo.
A segunda geração da família real, representada por Édipo, também é
abordada no canto coral. Tudo indica que entre o casamento com Jocasta e a
descoberta da verdade, Édipo experimentara intensamente a felicidade e a
prosperidade, conforme expressam os versos 772-77, que explicam o sentido do
termo o1lboj do verso 771.
Após descobrir o verdadeiro sentido de suas ações, relata o coro, Édipo se
puniu perfurando os olhos e amaldiçoou seus filhos (pikroglw/ssouj

18
a0ra/j no verso 787). Entre os dois eventos transcorreu um lapso temporal e não
sabemos o que aconteceu com Édipo nesse ínterim, a não ser uma coisa: ele não
continuou a reinar em Tebas. Imaginamos que ficou entregue aos cuidados dos
filhos. Mas porque, então, ele os amaldiçoou?
O termo trofa~j no verso 786 refere-se, basicamente, à alimentação,
provisão, cuidados, etc. Dois acontecimentos podem estar no cerne da questão:

“one, that Polynices served a meal to Oedipus using a silver table and a
gold cup which were family heirlooms; the other, that the brothers sent him a thigh
piece from a sacrifice rather than the customary shoulder (...)Both reasons given by
the epic fragments involve the sons’ care of their father and would be appropriate to
the situation in the Seven. In one version the cause of trouble is inherited family
property, in the other an unjust division” (THALMAN, 1978: 19).

A maldição3, portanto, é passada de pai para filho como uma forma de


patrimônio familiar e o trabalho das Erínias sobre Etéocles e Polinices é o resultado
acumulado do antigo crime de Laio e da recente desgraça de Édipo, conforme visão
expressa pelo mensageiro por ocasião dos versos 800-02. A terceira geração,
então, deve disputar a herança de Édipo, mas não há indicação sobre a origem da
disputa.
A versão mais corrente dá conta de que Etéocles e Polinices concordaram
em dividir o trono de Tebas de tal forma que cada um deles reinasse durante um
ano e, no final desse, o trono passaria para as mãos do outro. Quando chegou a
vez de Polinices, Etéocles não cedeu o trono a ele e não se sabe se Polinices foi
expulso de Tebas ou se ele se exilou voluntariamente. Os versos 637-8 do discurso
do mensageiro, no segundo episódio, revelam que um dos desejos de Polinices é
fazer o irmão pagar na mesma moeda por causa das humilhações que ele teria
passado: o desterro e a desonra.
Fato é que, de acordo com Herington, “by the time The Seven against
Thebes opens, a mysterious and terrible potential of evil has accumulated,
threatening both the city and its Royal house” (HERINGTON, 1986: 80).

3
Nos versos 788-90, o coro relata que Édipo condenou seus filhos a partilharem a sua herança através da espada.

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3. O conflito entre o espaço externo e o espaço interno

Comecemos a caracterizar o cenário a partir do qual se delineia e se


desenvolve o conflito entre o espaço externo, representado pelo avanço impetuoso
do exército argivo e seu comandante Polinices, e o espaço interno, representado
pelos cidadãos tebanos e seu comandante Etéocles, rei de Tebas. Diríamos que a
oposição entre o que está no interior da cidade e o que está do lado de fora dela é a
maior preocupação da tragédia. Uma indicação disso é a grande freqüência no uso
de palavras para se referir a estes dois lugares físicos: (e1ndoqen) dentro e
(qu/raqen) fora da cidade.

A linha que divide estes dois lugares é representada metaforicamente, por


um lado, pelo costado da nau, uma referência à imagem náutica relacionada à
cidade de Tebas, e, por outro, literalmente, pelas fortificações tebanas. Seja em
imagem ou não, esta linha isola e protege os cidadãos tebanos contra a ameaça
externa representada pelo exército argivo. Aparentemente. Pois veremos que, longe
de isolar e proteger os cidadãos tebanos, tanto o costado da nau como as
fortificações tebanas recriam em seu interior duas zonas conflituosas: o mundo
doméstico e feminino das mulheres do coro e o mundo político e masculino de
Etéocles.

O tema da cidade percorre toda a primeira parte da tragédia, de maneira


que até o verso 652, um pouco mais da metade da peça, o cerco à cidade de Tebas
pelo exército argivo é o seu eixo temático. Este tema é delineado pela imagem da
cidade enquanto uma nau, imagem que aparece logo nos primeiros versos do
prólogo, no qual Etéocles discursa sobre o momento oportuno (ta kai/ria) –
uma das habilidades de um bom piloto - para se fazer uma manobra. Assim é dito
nos versos 2 e 3:

Ao observador que acompanha a situação na popa da cidade,


Com o leme na mão, não é permitido adormecer.

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Essa equação cidade-nau é construída e mantida durante o percurso da
tragédia por operadores semânticos ambivalentes, quer dizer, Etéocles manipula
termos que podem ser acomodados tanto no domínio marítimo quanto no domínio
geográfico. Quando o comandante encoraja seus soldados a ocuparem as
fortificações tebanas para combater os argivos, por exemplo, ele recorre ao
vocabulário náutico, conforme termos expressos nos versos 32-3:

“La qwra/kion ou qwrakeion, derive de qw/rac, est, à proprement


parler, le parapet de hune, formant une cage où étaient postes des hommes armes
de traits (...) Le se/lma signifie le pont d’un château gaillard, ou si l’on veut, la
dunette, car les navires de guerre ne sont point pontes” (DUMORTIER, 1975: 35).

Ainda de acordo com Dumortier:

“Les principales parties du navire dont fait mention Eschyle sont la proue,
munie d’um éperon de bronze pour briser les rames de l’adversaire ou éventrer as
coque; la poupe, qui possédait um petit pont e portait une cabine pour le
commandant. A la poupe étaient attachées deux grandes rames servant de
gouvernail et qu’on manoeuvrait par um timon ou une barre, oi1ac” (DUMORTIER,
1975: 34)

Tebas tem uma popa, uma proa, um leme. Daí é uma nau. O seu rei é o
comandante e a população é a tripulação.
Há um importante detalhe na progressão dessa imagem: “the ship is in the
midst of no easy Voyage; it is being tossed by a storm which threatens to swamp it.
The turbulent sea is the Argive army rushing fully armed to the attack” (THALMAN,
1978: 33), pois numa assembléia noturna, os argivos decidiram:

Ou transformar Tebas em ruínas,


devastando a cidade dos Cadmeus pela força;
ou manchar esta terra com o sangue de seus corpos.

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E o avanço impetuoso desse exército é descrito pelo espião ao comandante
da nau nos versos 59 a 61:

Pois, munidos de todas as armas, levantando poeira,


Os argivos se aproximam, e uma espuma branca,
da baba expelida dos pulmões dos corcéis, toma o campo.

A imagem, então, é a seguinte: o horizonte fora da cidade é a superfície do


mar e a espuma resultante da agitação marítima é representada literalmente pela
espuma que sai dos pulmões dos corcéis. Nesse sentido, o exército argivo, em seu
conjunto, é a onda que avança sob solo firme, sendo conduzida pelo sopro de Ares,
conforme anunciou o espião nos versos 63 e 64.
Interessante notar que as donzelas que compõem o coro, completamente
aterrorizadas pela iminência do cerco à cidade, apropriam-se dessa mesma
linguagem náutica para descrever de uma outra maneira a aproximação dessa onda
argiva. A descrição é a seguinte nos versos 114-5:

A tormenta de guerreiros de elmos ao vento


inflama-se ao redor da cidade, conduzida pelo sopro de Ares.

A onda está quebrando em torno do costado da nau, só que agora a sua


espuma é representada pela agitação das plumas dos capacetes dos invasores.
Esta metáfora marítima resume precisamente os contornos da ameaça externa e de
seus desdobramentos para a cidade.
A contrapartida dessa metáfora são as muralhas, as torres e os portões que
constituem as fortificações de Tebas. Assim como o costado da nau, somente a
extensão das muralhas pode oferecer uma suposta segurança, pois representa a
fronteira que separa aqueles que estão em seu interior daquela horda furiosa que
está do lado de fora. É como se as torres e as muralhas fossem convocadas para
manter a cidade protegida do perigo externo. Mas a realidade é mais complexa.
Logo após sua litania, em que procura atrair os olhos divinos para a causa
tebana, Etéocles deixa a cena. As mulheres componentes do coro adentram a cena
na direção dos altares dos deuses tutelares da cidade, motivadas por uma espécie
de epifania, conforme os versos 122 a 126:

22
Certamente, entre os maxilares dos corcéis,
os freios comprimidos anunciam a carnificina.
Sete varões, distinguindo-se do exército,
suas lanças brandindo, na direção das sete portas,
dirigem-se após serem escolhidos por sorteio.

Esse comportamento do coro instaura no interior das muralhas tebanas uma


atmosfera de pânico e de terror. As donzelas correm de um lado a outro da cidade
suplicando aos deuses olímpicos pela preservação da cidade. A agitação do coro
verifica-se, textualmente, pela ausência de conectivos, como a0lla, gar, de,
responsáveis pela progressão do discurso. Etéocles, que no prólogo havia
convocado os cidadãos para ocuparem seus lugares nas fortificações tebanas, deixa
o palácio com o objetivo de controlar a exagerada manifestação emotiva do coro e
restabelecer a ordem no interior da cidade. É muito significativa a intervenção de
Etéocles nos versos 187 a 194:

Nem nas desgraças, nem na prosperidade tenha eu,


como companheira de teto, alguém da estirpe feminina.
Pois, podendo, não temhabilidade no comércio;
temendo, seja em casa ou na cidade, a desgraça é plena.
Neste momento os cidadãos fogem pelas vielas estreitas,
acovardados pelos vossos clamores desmedidos.
Assim, a situação dos forasteiros sobeja de bravura,
enquanto que nós, aqui dentro4, estamos nos destruindo.

Não bastasse a ameaça externa, Etéocles tem um outro problema e não é


uma discórdia civil na cidade, ou uma espécie de contenda entre facções rivais que
polarizam em torno dele ou de Polinices, seu irmão e chefe do exército inimigo, mas
a verdade é que o pânico das mulheres do coro ameaça criar uma confusão
generalizada que pode minar as defesas tebanas e a estratégia do comandante na

4
Grifo nosso.

23
condução do seu exército. Interessante o retorno da imagem marítima para
caracterizar a posição de Etéocles diante do momento crítico:

(...) É correndo da popa até a proa


que o comandante encontra a manobra de salvação
de uma nau que está sendo castigada pelas ondas?

De acordo com Bacon, a situação de Etéocles se resume nas seguintes


palavras: “there is a danger ‘outside’ which must not be let in, and a danger ‘inside’
which must not be let out” (BACON, 2001: 27).
Caracterizado o confronto entre Etéocles e o coro, importa inseri-lo na rede
de oposições que governa a tragédia: exterior e interior, masculino e feminino,
político e doméstico.
Etéocles e o coro ocupam posições simétricas e opostas ao mesmo tempo,
que são ancoradas em duas formas diferentes de religiosidade:

“(...)celle du roi, qui affirme avec une confiance touchante l’efficacité des
rites d’une religion officielle chargée d’assurer à la cite la protection divine et celle du
choeur, moins ordonnée, mais plus personnelle, s’adressant avec ferveur mystique à
des dieux inconstants” ( LUPAS et PETRE, 1981: 72)

Para o rei, a guerra pode ser vencida; para o coro, ela é implacável.
O temor das mulheres do coro justifica-se quando incorporamos à análise
deste conflito o elemento mítico que reverbera na tragédia: Etéocles é o
descendente de uma raça que carrega consigo o miasma de uma maldição familiar.
Etéocles, em Tebas, e Polinices, em Argos, são dois autóctones que nasceram de
um rasgo que é ao mesmo tempo o do parricídio e o do incesto. E os valores
pervertidos da autoctonia fraterna fazem com que recaia sobre as mulheres do coro
uma “misogenia” característica da linhagem amaldiçoada dos Labdácidas, à qual
Etéocles e Polinices são os últimos descendentes. Há quem sugere que a alusão ao
mundo doméstico das mulheres (cu/noikoj tw~i gunaikei/wi no verso
188) refere-se ao período em que Jocasta habitava o palácio.

24
A relação, agora, não é mais entre os tebanos e o exército argivo ou entre
Etéocles e o coro. Os conceitos “interior” e “exteriror” chamam a atenção para o
contraste entre a situação real e a aparente, e localizam o perigo mais precisamente:
a relação entre a família maldita e a cidade de Tebas.
Assim, o pânico excessivo das mulheres do coro é legítimo porque é uma
reação fundamentada no entendimento de que a guerra nada mais é do que o
cumprimento de uma maldição que só agora alcança seu fim. Vale ressaltar que, no
primeiro episódio, que marca o confronto entre o rei e o coro, a resposta coral à
visível explosão de Etéocles começa com a expressão Oi0di/pou te/koj
(verso203), quer dizer, o coro demonstra conhecer o histórico de maldição da
linhagem a qual o seu rei pertence e, nesse sentido, o comportamento do coro
esconde em seu bojo uma importante pergunta: a destruição dos Labdácidas
envolveria a destruição de Tebas? Por isso a importância de suplicar
fervorosamente a proteção dos deuses que, ao mesmo tempo, trabalham para que a
maldição seja cumprida.

25
4. Etéocles: fe/riste Kadmei/wn a1nac5 e
Oi0di/pou te/koj6

O verso 653 marca uma transição temática na tragédia. Até então, o cerco à
cidade de Tebas era o seu eixo principal, sobre o qual configurou-se e elevou-se a
estatura do comandante da nau. Como defensor de sua cidade contra o exército
argivo, Etéocles age e se comporta como um verdadeiro chefe de estado: com sua
visão de governante, controla rispidamente a emotividade das mulheres do coro;
como um verdadeiro estrategista, envia um espião ao território inimigo para
descobrir-lhe o plano. Na parte central da tragédia, observamos ainda os sete
grandes diálogos em que o rei, reunindo em si as qualidades políticas da
moderação, reflexão e autodomínio, destaca seus melhores soldados para enfrentar
os campeões argivos.
No entanto, bastou que o mensageiro revelasse a ele que Polinices, seu
irmão, estará na sétima porta, justamente a que havia sobrado para ele, para que
Etéocles mudasse bruscamente o seu comportamento e o tema da maldição
passasse a ser tematizado.
A mudança brusca de comportamento do herói trágico instaurou intensa
discussão a respeito da sua maior ou menor unidade de caráter, quer dizer, o
Etéocles da fim da tragédia não é compatível com sua caracterização esboçada
antes. Essa discussão, parece-nos, foi bem respondida com um artigo de Vidal-
Naquet7 em que ele demonstra que tanto o Etéocles do fim quanto do começo da
tragédia continuam tendo o mesmo caráter: o do estrategista militar e o do filho
amaldiçoado.

5
O mais bravo rei dos Cadmeus. A tradução é nossa.
6
Filho de Édipo. A tradução é nossa.
7
VIDAL-NAQUET, P. “Os escudos dos heróis. Ensaio sobre a cena central dos ‘Sete contra Tebas’”, in
VERNANT, J.-P., VIDAL-NAQUET, P. Mito e tragédia na Grécia antiga.. São Paulo: Brasiliense, 1991, pp.
123-56.

26
Vernant, por sua vez, escreve o seguinte:

“O que chamamos mudança no caráter de Etéocles, com maior correção,


deveria ser chamado passagem para um outro modelo psicológico e transição, na
tragédia, de uma psicologia política para uma psicologia mítica, implícita na lenda
dos Labdácidas pelo episódio do assassínio recíproco dos dois irmãos. Poder-se-ia
mesmo acrescentar que é a referência sucessiva a esses dois modelos, a
confrontação, no íntimo da mesma personagem, de dois tipos opostos de
comportamento, de duas formas de psicologia que implicam categorias diferentes de
ação e de agente, que constituem essencialmente, em Os Sete contra Tebas, o
efeito trágico” (VERNANT, 1991: 22).

A fúria assassina que se apodera de Etéocles quando ele ouve do


mensageiro que Polinices estará na sétima porta de Tebas insere-se, portanto, no
contexto de uma contenda intra-familiar e, nesse sentido, já não é mais a psicologia
do chefe político, o líder ideal da pólis, que baliza as suas decisões, mas a
psicologia do Labdácida. Além do componente mítico, existe um código de conduta
que pulsa no âmago do herói trágico. Quando o coro tenta dissuadir o herói de sua
intenção, ele retruca baseado no seguinte código, conforme apontam os versos
683-5:

Se algum homem deve suportar um infortúnio,


exceto a vergonha, seja! É a única vantagem dentre os mortos.
Mas dentre os males e as injúrias nenhuma reputação dirás

Invocando a honra e a glória, Etéocles justifica a sua intenção de lutar


contra seu irmão, mesmo pressentindo a morte e apesar dos apelos do coro,
amparado numa argumentação digna dos heróis homéricos. Quando ele fala de
eu0klei/an, ele está mencionando o significado de seu nome (o homem de
glória verdadeira) em contraposição ao coro, que joga com o significado do nome de
seu irmão Polinices (o homem de muitas contendas), e colocando em jogo a sua

27
reputação enquanto comandante do exército e rei de Tebas. Ele apela, também, aos
valores consagrados de uma conduta arcaico-aristocrática típica do universo
homérico, muito distante do século V a. C., mas no qual:

“(...) the hero prized his honour above everything – his honour and his
prestige. And this prestige depended upon his ability to mantain his status and
privileges; to resent, retort and retaliated a slight; to humiliate and destroy his
enemies. This was his virtue, his excellence, his arete. If he failed, his prestige was
gone; he was despised and felt the shame it was the main object of his existence to
avert. The only ‘failure’ countenanced by the code was an honourable death in battle”
(WINNINGTON-INGRAM, 1983: 38).

Quando Etéocles fala de uma única vantagem (ke/rdoj) dentre os


mortos, ele claramente identifica no encontro com seu irmão o cumprimento da
maldição paterna e, devido a isso, ele sabe que pode morrer. E qual seria a única
atitude capaz de destruir sua boa reputação aos olhos de seus concidadãos e privá-
lo daquela vantagem que confere distinção dentre os mortos? Parece-nos que a
covardia.
A questão da distinção entre os mortos está diretamente relacionada ao
conceito de glória imorredoura. De acordo com Vernant:

“(...)Archaic Greek culture is one in which everyone lives in terms of others,


under the eyes and in the esteem of others, where the basis of a personality is
confirmed by the extent to which its reputation is known; in such a context, real death
lies in amnesia, silence, demeaning obscurity, the absence of fame. By contrast, real
existence – for the living or the dead – comes from being recognized, valued, and
honored. Above all, it comes from being glorified as the central figure in a song of
praise, a story that endlessly tells and retells a destiny admired by all. In this sense,
the hero, by the fame he has acquired in pledging his life to battle, inscribes his
reality as an individual subject on the collective memory of the group; the death that
has given his biography its conclusion has also given it permanence” (VERNANT,
1992: 57)

28
No entanto, de acordo com o código moral dos heróis, ele não perderia sua
honra enquanto guerreiro e rei de Tebas somente pela covardia, mas também

“by not resenting a wrong, by not standing up for his rights, by not taking
vengeance, by not inflicting upon his enemy the ultimate harm” ( WINNINGTON-
INGRAM, 1983: 39).

Havia um termo de justiça entre Etéocles e Poliníces e este último reclamou


que fôra ferido em sua honra e forçado ao exílio por seu irmão. Então jurou vingar-
se ou pela morte ou pela retomada do trono que lhe era de direito. O retorno de
Polinices significa para Etéocles um equívoco, um ato de vingança, uma ameaça à
cidade e ao seu reinado. Por isso, rei deve lutar contra rei; irmão contra irmão e
inimigo contra inimigo.
Antes de o herói deixar a cena, o coro tenta, pela última vez, convencê-lo de
que é possível optar por um outro caminho que não a perseguição de sua glória
pessoal às custas do fratricídio. Assim é dito no verso 716:

A divindade honra a vitória ainda que sem glória.

O que o coro está sinalizando para o herói, em última instância, é a


necessidade de mudar o seu padrão de conduta. A coragem, outrora virtude do
guerreiro, deve ser substituída pela defesa da comunidade. Com o desenvolvimento
da cidade democrática, não faz sentido a defesa de um prestígio, de uma honra
particular, de uma família ou de amigos. O coro não o quer no sétimo portão e
argumenta que os deuses também valorizam a vitória, mesmo que sem glória
particular.
Supondo que Etéocles declinasse do combate no sétimo portão e Tebas
saísse vitoriosa, mesmo considerando a morte de Poliníces por um combatente
qualquer designado pelo rei, como deseja as mulheres do coro, não imaginamos que
tipo de prestígio ou distinção ele teria em sua cidade. Está claro para ele, conforme

29
expresso no prólogo, que se Tebas saísse vitoriosa, a responsabilidade não seria
dele, mas imputada a um deus (ai0ti/a qeou=).
A resposta de Etéocles ao coro continua insistindo na sua honra de soldado.
No verso 717 é dito o seguinte:

Esse preceito não é aceitável a um hoplita.

Antes disso, porém, Etéocles sente-se abandonado pelos deuses, quer


dizer, a moîra já se apossou dele. Mas, de acordo com Vernant:

“(...) Even though it is no longer in his power to conquer and survive, he


must still fulfill the demands that warrior status makes on him and his speers: he
must transform his death into eternal glory, change the fate of all creatures subject to
demise into a blessing that is his alone and whose luster will be his forever”
(VERNANT, 1992: 50).

30
Ésquilo

Os Sete contra Tebas

Etéocles

Cidadãos de Cadmo, é preciso falar sobre a manobra oportuna:


ao observador que acompanha a situação, na popa da cidade,
com o leme na mão, não é permitido adormecer.
Se, pois, a nau bem conduzirmos, a responsabilidade é divina;
do contrário - oxalá não aconteça – uma desgraça sucedesse, 5
só o nome de Etéocles, de um extremo a outro da cidade,
seria muito celebrado por seus concidadãos com hinos graves
e cantos lancinantes...dos quais Zeus, o protetor, possa ele,
pela força de seu nome, afastá-los da cidade dos Cadmeus.
Agora é necessário a vós, aos que perderam o vigor jovial 10
e aos que adentraram a idade da adolescência,
cada qual dispondo do que lhe é adequado à idade, 13
e muito nutrindo a seiva do corpo, 12
socorrer a cidade e os templos dos deuses desta terra,
para que jamais sejam manchadas as honras; 15
socorrer os filhos e a Terra mãe, nossa mais querida nutriz.
Pois em seu solo benevolente os jovens engatinharam;
sob seus cuidados, a tarefa de educação das crianças,
tendo formado os habitantes portadores de escudos,
para que se tornem dignos neste momento de necessidade. 20
Até agora, a divindade nos é favorável:
depois de longos dias em quedefendemos as torres,
pelos deuses estamos em vantagem.
Agora, como diz o profeta, o que observa o vôo dos pássaros,

32
analisando os signos proféticos não com a ajuda do fogo, 25
mas pela orelha e pelo espírito, com uma arte que não engana,
esse profeta, senhor dos augúrios,
diz ele que um imenso ataque dos argivos foi decidido,
em assembléia noturna, para hostilizar a cidade.
Então, lançai-vos todos para as ameias e portas dos fortes; 30
precipitai-vos todos com armadura completa;
ocupai os manteletes e guarnecei os terraços;
e permanecendo nas portas de saídas das torres,
com os pés firmes, tende confiança;
não temei em demasia a tropa invasora: deus nos favorece. 35
Da minha parte, mensageiros e espiões, para a linha inimiga,
enviei e estou convencido que eles caminham seguramente;
e ouvindo seus relatos, espero com isso não ser surpreendido.

Mensageiro-espião

Etéocles, o mais bravo rei dos Cadmeus,


venho da linha inimiga trazendo notícia fidedigna. 40
Pois sou, em pessoa, o observador dos acontecimentos.
sete homens, comandantes impetuosos,
degolando um touro sobre um escudo negro,
e tocando com as mãosno sangue desse touro,
juraram por Ares, Eniô e pelo sanguinário Fobos isto: 45
ou transformar Tebas em ruínas,
devastando a cidade dos Cadmeus pela força;
ou manchar esta terra com o sangue de seus corpos.
E com lembranças para os parentes que ficaram em casa,
o carro de Adrasto cingiam com suas mãos 50
vertendo lágrimas, mas nenhuma lamentação havia na boca.
Pois o ânimo de ferro, sobressaltando pela bravura,
bufava como leões faiscando Ares pelos olhos.

33
E a confirmação desse juramento não vai demorar:
parti enquanto sorteavam contra quais portas 55
cada um dos sete comandará a tropa de homens armados.
Por isso, rápido, na direção das portas de saídas das torres,
designe os melhores guerreiros escolhidos da cidade.
pois, munidos de todas as armas, levantando poeira,
os argivos se aproximam e uma espuma branca, 60
da baba expelida dos pulmões dos corcéis, toma o campo.
Tu, de tal sorte comandante prudente da nau,
protege a cidade antes que chegue o sopro violento de Ares.
Pois os gritos dos inimigos caminham sobre solo firme.
Toma, então, a ocasião que é a mais aguda. 65
Quanto a mim, fiel observador, no decorrer da jornada,
observarei os agressores das portas e, claramente,
conhecendo o que eles conversam, ficarás ileso.
Et. Ó Zeus, Terra e deuses protetores de Tebas,
Maldição, Erínias poderosas de Édipo, 70
não extirpeis da Hélade, de suas raízes,
pelo menos a cidade, completamente tomada pelos inimigos.
[ assaltando as riquezas e os altares domésticos ]
A terra livre e a cidade de Cadmo
jamais estejam sob jugos escravos, 75
tornai-vos nossa pujança – creio que o interesse é comum:
uma cidade bem sucedida honra seus deuses.

Coro

Lamento-me pelo temor e pela amargura imensos.


O exército deixou o acampamento e aproxima-se:
eis que avança, numerosa, a torrente de cavaleiros. 80
O pó brilhante, suspenso no ar, me convence,
Mensageiro seguro, verdadeiro, porém mudo.

34
†O estridor das armas, os corpos no solo de Tebas...
†Chega aos meus ouvidos o grito de dor:
arrancado e ribombado como a torrente, 85
invencível, que bate no flanco da montanha.
Oh, deuses e deusas, afastai de Tebas
o flagelo que se levanta.
Um brado < >
por sobre os muros: 90
o exército do escudo branco, glorioso,
contra Tebas se levanta apertando < o passo >.
Quem, então, dentre os deuses ou deusas,
protegerá a nós e salvará a cidade?
Devo, então, como de costume, ajoelhar-me 95
diante das estátuas dos deuses?
Oh!
Felizes os que repousam sobre tronos seguros.
Eis que chega a hora de abraçar as estátuas:
Por que, gementes, nos demoramos?
Ouvis ou não ouvis o estrépito dos escudos? 100
Se não agora, quando iremos oferecer,
De guirlandas e de peplos, a prece suplicante?
Eu temo o estrondo: não é choque de uma só lança.
O que irás fazer, Ares, autóctone de Tebas,
trairás a tua própria terra? 105
Oh! Deus do elmo de ouro, fita os olhos, mira-os para a cidade
que em outros tempos depositaste tua predileção.

Deuses protetores da cidade, vinde, vinde todos.


Contemplai a multidão de virgens suplicantes 110
que esperam fugir da escravidão.
A tormenta de guerreiros de elmos ao vento
inflama-se ao redor da cidade, conduzida pelo sopro de Ares. 115
Mas Oh, Zeus, pai de tudo o que acontece,
impede completamente a conquista da cidade pelos invasores.

35
Pois os argivos, a cidade de Cadmo, 120
estão cercando: temo as armaduras de guerra.
Certamente, entre os maxilares dos corcéis,
os freios comprimidos anunciam a carnificina.
Sete varões, distinguindo-se do exército,
suas lanças brandindo, na direção das sete portas, 125
dirigem-se após serem escolhidos por sorteio.
E tu, poder nascido de Zeus, amante da batalha,
sê a protetora de nossa cidade – Palas Atena;
e tu, senhor do mar e dos cavalos – Posídon; 130
que com o tridente fisga o peixe com engenhosidade,
livrando-nos dos terrores, dá-nos a liberdade!
E tu, Ares, Oh! 135
A cidade que leva o nome de Cadmo
claramente custodie e preocupe-te com ela;
Cípris, antiga genitora de nossa estirpe, 140
salve-nos, pois de teu sangue nascemos,
com súplicas que invocam os deuses
aproximamo-nos e acercamo-nos de ti.
E tu, senhor dos lobos – Apolo: 145
sê como um lobo contra o exército inimigo.
< > do clamor dos lamentos: e tu, jovem guerreira,
filha de Leto, tem em boa mira o teu arco. 150
[ Ártemis amiga]

Seção estrófica

Ah!Ah!Ah!Ah! estrofe a
Ouço, em torno da cidade, o estrondo das carruagens.
Oh! Venerável Hera:
Os eixos das rodas estalam de excessivo peso.
Ártemis adorada [ Ah!Ah!Ah!Ah! ]
O ar brandido pelas lanças se enfurece. 155

36
Porque nossa cidade sofre? O que acontecerá?
Até onde a divindade conduzirá seus desígnios?

Ah!Ah!Ah!Ah! antístrofe a
De longe lançadas, as pedras encontram as ameias.
Oh! Amigo Apolo:
nas portas, o estrondo dos escudos revestidos de bronze. 160
Filho de Zeus,
cujo desígnio sagrado é definir o combate numa guerra;
e tu, senhora afortunada Onca, na defesa da cidade,
ampare esta terra que tem sete portas. 165

Oh! Deuses poderosos. estrofe b


Oh! Divindades que conduzem ao fim os acontecimentos,
sejam guardiões das torres desta terra;
Não entregueis uma cidade atormentada pela lança
a um exército que fala uma outra língua. 170
Escutai as virgens, escutai com toda justiça
as preces oferecidas de mãos estendidas.

Oh! Divindades amigas, antístrofe b


que já salvastes a cidade dos perigos, 175
revelai o amor que tendes pela cidade;
assenhorai-vos dos santuários públicos,
e, depois de ocupá-los, defendei-nos.
Lembrai-vos, para mim,
das cerimônias sacrificatórias da cidade. 180

Et. Indago a vós, criaturas insuportáveis,


se estas atitudes são valentes e salvam a cidade,
animam os cidadãos na defesa de nossas torres,
estando ajoelhadas nos templos dos deuses tutelares, 185
a chorar e a gritar, causando repulsa dentre os prudentes?
Nem nas desgraças, nem nas prosperidades tenha eu,

37
como companheira de teto, alguém da estirpe feminina!
Pois podendo, não tem habilidade no comércio;
temendo, seja em casa ou na cidade, a desgraça é plena. 190
Neste momento os cidadãos fogem pelas vielas estreitas,
acovardados pelos vossos clamores desmedidos.
Assim a situação dos forasteiros sobeja de bravura,
enquanto que nós, aqui de dentro, estamos nos destruindo.
Tais coisas ganharias convivendo com as mulheres. 195
Pois bem, se alguém não ouvir as minhas ordens,
seja homem, mulher ou o ser que ficou no meio do caminho,
sentença de morte será deliberada contra ele,
e ninguém escapará do destino da lapidação popular.
Diz respeito ao homem – que a mulher não palpite – 200
os assuntos externos: esteja em casa e não atrapalhe!
Compreendeis ou não compreendeis? Ou falo a uma surda?

Co. Óh filho querido de Édipo, invadiu-me o medo estrofe a


ao ouvir o estrépito das carruagens,
quando do voltear dos eixos e das rodas, 205
e o cavaleiro retinindo as rédeas dos corcéis,
dos freios forjados a fogo.

Et. Por isso temes então? É correndo da popa até a proa


que o comandante encontra a manobra de salvação
de uma nau que está sendo castigada pelas ondas? 210

Co. Mas só fui até as antigas estátuas, antístrofe a


para professar fé nos deuses da cidade,
quando a destruidora avalanche golpeou as portas.
Por isso, amedrontada, fui suplicar aos bem-aventurados,
a fim de que assegurassem a proteção da cidade. 215

38
Et. Orai para que a lança inimiga esbarre nas fortificações!
Acaso não será isso a vontade dos deuses?
Pela tradição, eles abandonam uma cidade sitiada.

Co. Jamais, ao longo de minha existência, abandone-nos estrofe b


essa assembléia divina, tampouco possa presenciar 220
o saque e a queda de Tebas
pelo fogo devastador do exército forasteiro.

Et. Não te comporte equivocadamente ao invocar os deuses.


A Obediência é mãe da Boa-Fortuna
e companheira da Salvação: Eis a verdade! 225

Co. Sim, mas a pujança divina é ainda mais suprema: antístrofe b


com freqüência, em meio aos males insolúveis,
diante da penúria, quando uma nuvem
paira sobre seus olhos, a pujança é capaz de erguê-lo.

Et. Concerne aos homens o ritual de sacrifício, 230


em honra aos deuses, nos trabalhos de guerra;
compete a ti o calar e o permanecer em casa.

Co. Pela graça divina habitamos uma cidade indômita, estrofe c


em que as torres protegem contra a hostilidade estrangeira.
Qual nêmesis ameaça essa nossa condição? 235

Et. Em verdade não nego a ti honrar a estirpe divina.


Mas, para que não semeies a covardia dentre os cidadãos,
tranqüilize-te e não tema em excesso.

Co. Ao mesmo tempo em que ouvi o estrondo repentino, antístrofe c


com temor excessivo, para a acrópolis, 240
venerada sede, eu comecei a correr.

39
Et. Ainda que reconhecêsseis os moribundos
ou os feridos, não vos lanceis às lamentações.
Pois Ares apazigua-se com isto: sangue humano.

Co. De fato, ouço o relinchar dos corcéis 245

Et. Ouve, mas sem ouvir em excesso.

Co. A cidade reclama de seu solo pisoteado por eles.

Et. Então não me é suficiente deliberar a respeito deles?

Co. Que medo: o estrondo nas portas amplifica-se!

Et. Tu não cessarás de falar do que acontece pela cidade? 250

Co. Óh assembléia divina, não abandoneis as fortificações tebanas!

Et. Infeliz! Não ficarás quieta e guardará isso para ti?

Co. Deuses da cidade: que o acaso não me torne escrava!

Et. Tu mesma te escravizas, a mim e a toda uma cidade.

Co. Ó Zeus poderoso, aponte teus dardos para os inimigos! 255

Et. Ó Zeus, que raça de mulheres nos deste!

Co. Infortunada...como homens quando a cidade deles é tomada.

Et. Mais uma vez apelas abraçando as estátuas dos deuses?

Co. Pois, desolada, o medo arrebata as palavras.

Et. Eis o que quero saber: darias uma ligeira trégua? 260

Co. Digas o mais depressa possível que tão logo examinarei.

Et. Fique quieta, ó miserável, e não aterrorize os nossos.

Co. Calo-me: junto às demais, resignar-me-ei perante o destino.

Et. Diante daquelas outras, é essa promessa que escolho.


E ademais: uma vez separada das estátuas dos deuses, 265
reze para que eles nos auxiliem no combate.
Depois de ouvir as minhas súplicas e, mais calmamente, então,
entoe o cântico sagrado de vitória,

40
costume grego do brado que acompanha o sacrifício
e que encoraja os guerreiros e desfaz o temor ao inimigo. 270
Da minha parte, aos deuses protetores desta terra,
que habitam a planície e velam pela Ágora,
nas fontes de Dirce e do Ismeno anuncio:
Se os acontecimentos nos favorecerem e a cidade estiver salva,
verterei sangue de animais nos altares dos deuses 275
[Imolando touros para honrá-los...assim eu prometo]
Colocarei, a título de troféu, [as vestes dos inimigos]
e os seus despojos fulminados pela lança, nos templos sagrados.
[Coroarei os templos com as vestes dos inimigos] 278a
Desta feita, não te dirija aos deuses com estes gemidos,
nem com suspiros vãos e selvagens. 280
Agindo assim não há de fugires mais do destino.
No que me diz respeito, vou às saídas das sete muralhas,
onde posicionarei seis guerreiros –comigo o sétimo–
〈 〉
para enfrentar os agressores de maneira grandiosa,
antes que nos surpreenda o rumor arrebatador 285
e inflame-nos a chama da urgente necessidade.

Co. Quero obedecer, mas o medo não adormece o coração. estrofe a


Pois aproxima-se dele, como fogo flamejante,
o pavor dos guerreiros sitiadores, 290
a consumí-lo, como a pomba trêmula,
que por suas criaturas, teme as serpentes
destruidoras de ninhos.
Nosso povo, em direção às torres, 295
como tropa compacta avança:
o que vai acontecer comigo?
Os inimigos, envolventes,
lançam contra nossos cidadãos
uma chuva de pedras pontiagudas. 300
De todo modo, filhos de Zeus,

41
a cidade de Tebas e o nosso povo,
o povo de Cadmo, salvai!

Por qual solo mais próspero antístrofe a


do que o tebano trocareis, se, aos inimigos, 305
esta gleba profunda abandonais,
e a fonte de Dirce, a mais substancial dentre as águas,
que lançam Posídon -que cuida da terra- 310
e os filhos da deusa Tétis?
Assim, ó deuses tutelares,
aos que estão do lado de fora das torres
enviando a covardia funesta aos homens,
E a insanidade que depõe as armas, 315
semeai a glória
para estes nossos cidadãos !
e <sede> os defensores da cidade,
permanecendo em vossos santuários
por nossas súplicas de agudos cantos. 320

É lamentável que uma cidade tão antiga estrofe b


seja baixada ao Hades, sendo alvo da lança,
submissa, entre cinzas friáveis, humilhada e devastada
indignamente pelos Aqueus auxiliados pelos deuses; 324/5
as mulheres sendo aprisionadas,
tanto as jovens quanto as anciãs,
arrastadas pelas melenas como se fossem éguas,
com seus peplos rasgados em redor:
e grita a cidade que se esvazia 330
enquanto que o povo cativo se desespera.
Estremeço ante o avanço de tão pesado fardo.

42
É deplorável ver as jovens donzelas, antístrofe b
antes mesmo dos ritos habituais da maturidade,
atravessarem o átrio para percorrerem caminho doloroso. 335
É melhor sucumbir do que estas desgraças
presenciar. 336/7
Pois muitos infortúnios sucedem-se
quando uma cidade é subjugada.
Um homem conduz o outro, mata; 340
depois incendeia as coisas:
e a cidade inteira se enegrece com a fumaça.
E, enlouquecido, manchando de sangue a piedade,
o domador de povos – Ares – sopra com violência.

Tumulto de guerra invade Tebas: aprisionada estrofe c


em suas próprias torres: guerreiro contra guerreiro 346
< > pela lança sucumbe.
vagidos ensangüentados
das crianças nos seios maternos, 350
que ainda mamam, ressoam.
Saques, parentes das indas e vindas:
os que possuem algo, cruzam com os que algo possuem;
os de mãos vazias, chamam os que de mãos vazias estão,
querendo ter o seu quinhão:
nem menor, nem igual. 355
† Qual † destas coisas pode imaginar † o juízo † ?

Depois de ter caído no chão o fruto de toda sorte antístrofe c


entristece a casa
que recebeu pungentes serviçais:
Muitas, em confusão, 360
dádivas da terra,
são arrastadas em ondas sem valor.

43
Jovens experimentam a dor desconhecida da escravidão;
†esperam pacientemente † o leito
do homem que tiver sorte: 365
o inimigo é superior.
A esperança é a chegada da noite
para mitigar todas as suas dores.

Coro

Certamente o espião do exército, como parece,


traz alguma notícia nova para nós, amigas, 370
conduzindo-a diligentemente a passos largos.
Eis que vem o rei em pessoa, filho de Édipo,
oportunamente saber o que ele tem a dizer:
A sua pressa † não se ajusta † a seus passos.

Mens Posso relatar as notícias dos inimigos – pois bem as conheço - 375
bem como em quais portas cada guerreiro teve sua sorte lançada.
Neste instante brama Tideu contra a porta Proitide,
mas o profeta não o permite atravessar o Ismeno,
pois os sacrifícios não se tornam propícios.
Tideu está furioso e deseja vorazmente o combate 380
como a serpente que urra sob o sol do meio-dia.
Ultraja o sábio profeta filho de Ecleu dizendo:
“o pusilânime bajula o destino e o combate”.
Vitupérios à parte, agita três penachos sombreados,
juba de seu casco, e em seu escudo, 385
os sinos feitos de bronze anunciam o terror.
Em sua superfície tem um orgulhoso emblema talhado:
um céu com estrelas resplandescentes
e um plenilúnio brilhante, o mais respeitável dos astros,
olho da noite, em seu centro fulgura. 390

44
Ensandecido a tal ponto com suas armas insolentes,
berra à margem do rio ávido de pelejar,
bufando como o corcel domado pelos freios.
E aguarda o sinal da trombeta para atacar.
Quem destacarás contra Tideu? Uma vez aberta, 395
quem tem qualidade para defender a porta Proitide?

Et. Nenhum ornato de guerreiro me é possível temer,


tampouco os emblemas que fazem feridas:
sem a ajuda da lança os penachos e os sinos não ferem.
Dizes que tal noite, na superfície do escudo, 400
encontra-se resplandescente com estrelas no céu...
Prontamente a loucura pode ser profetiza para alguém.
Se a noite cai sobre os olhos moribundos,
aquele que ostenta tal emblema portentoso
correta e justamente poderia mudar seu nome, 405
já que contra si mesmo advinha a desmesura.
O corajoso filho de Astaco, frente a Tideu,
colocarei para defender esta porta.
Muito bem nascido, respeita o trono da Honra,
como também abomina palavras orgulhosas: 410
não conhece as vilanias e detesta a covardia.
Dos homens disseminados que Ares poupou
a semente tem brotado – e está enraizada em Tebas:
Melanipo – Ares escolhe, nos dados, o combate.
A justiça impulsiona adiante a irmã de sangue 415
para desviar a lança inimiga da mãe que a criou.

Co. Que o Olimpo conduza ao êxito [estrofe a


o nosso campeão, já que ele tem justos méritos
para defender Tebas. Tremo só de imaginar
o destino sangrento daqueles que morrem 420
por seu povo.

45
Mens. Que o Olimpo, então, conduza-o à vitória.
Capaneu foi o escolhido para a porta Electra.
Esse outro gigante – excessivamente jactante –
orgulha-se de não pensar como os mortais: 425
[ que a sorte não concretize suas terríveis ameaças]
Ele disse que há de devastar a cidade,
consentindo o Olimpo ou não, nem se o raio
de Zeus cair sobre o solo o impedirá.
Os relâmpagos e os raios flamejantes 430
ele os comparou ao mormaço do meio-dia.
O brasão tem um homem nu porta-fogo,
uma tocha flameja, pronta, em suas mãos,
e com áureas letras proclama: “queimarei a cidade!”.
Contra este homem-fogo – chama – mas quem virá? 435
Quem permanece inabalável diante deste jactante?

Et. A esse jactante responde uma outra vantagem:


a linguagem espontânea denuncia
os espíritos frívolos dentre os mortais.
Capaneu preparou-se para agir só com ameaças: 440
menosprezando os deuses e exagerando na fala
com pérolas arrogantes, sendo um mortal,
para o Olimpo vocifera contra Zeus.
Tenho a confiança que, para ele, justamente,
há de vir o raio flamejante em nada parecido 445
com os raios do sol do meio-dia.
Contra ele, notadamente muito fanfarrão,
foi designado o forte Polifonte, de ímpeto ardente,
condutor das garantias de Ártemis protetora,
junto aos outros deuses benevolentes. 450
Dize o outro e em qual porta teve a sorte lançada.

46
Co. Que morra aquele que pragueja contra Tebas! [antiestrofe a
Que sobre ele caia o raio fulminante
antes que ele invada a minha morada
com sua lança arrogante 455
profane meu leito virginal.

Mens. [O sorteado que está já na próxima porta]


direi: do brônzeo elmo emborcado
o terceiro dado apontou para Etéoclo – terceiro –
para conduzir a tropa contra a porta Neista. 460
Com as rédeas ele rodopia os corcéis
relinchantes, querendo coicear a porta.
Os bocais, plenamente,
silvam um canto bárbaro e resfolegante.
A aparência de seu escudo não é modesta: 465
um hoplita, com uma escada,
galga a torre inimiga para superá-la.
E ele também vocifera silabando
que nem mesmo Ares derruba-lo-ia das torres.
Contra este guerreiro envia o que seja capaz 470
de afastar o jugo escravo desta cidade.

Et. [Poderia enviá-lo neste instante, mas por sorte]


já foi enviado, ostentando nos punhos o alarido,
Megareu, seiva de Creonte, da raça dos Espartas:
não é guerreiro de ser assustado pelos relinchos altivos 475
dos corcéis e arredar o pé de nossa porta.
Mas ou pagará, com sua morte, sua dívida com a terra nutriz,
ou dominando os dois guerreiros e a cidade sobre o escudo adornará
a casa paterna com os espólios do inimigo.
Dize a jactância do próximo, sem economizar nas palavras. 480

47
Co. Rezo para o teu triunfo, oh! [estrofe b
defensor de meu lar e, para os outros, a desgraça.
Como pronunciam bravatas contra a cidade,
ensandecidos no espírito, possa Zeus vingador
mirá-los com olhos rancorosos. 485

Mens. O quarto guerreiro, na porta Atenas Onca,


aproximando-se com seus urros,
está a forma gigantesca de Hipomedonte.
Grande disco – refiro-me à esfera do escudo –
estremeci quando ele girou – não falo em vão. 490
Pois o talhador de emblemas não era vulgar,
o que na superfície do escudo fez esta obra:
um Tifão, exalando pela boca incandescente,
fuligem negra, irmã agitada do fogo;
a concavidade deste escudo 495
está gravada com espirais de serpentes.
Ele lançou um brado de guerra – inspirado por Ares –
como as bacantes poderosas, mirando o terror.
É necessário bom guerreiro contra esse gigante:
pois Fobos já urra contra a porta Onca. 500

Et. Primeiro Palas Onca, que perto de Tebas está


e guarda nossa porta, odeia o excesso do guerreiro
e expulsa-lo-á do ninho como a uma serpente terrível.
Depois Hiperbio, filho prudente de Enopo,
é o herói escolhido para enfrentá-lo 505
e descobrir a moira pelas mãos da sorte.
Nem aparência, nem temperamento, nem expressão do escudo
será condenável. Hermes, propriamente, confrontou:
de fato inimigo lutará contra inimigo
e reunirá deuses hostis na superfície dos escudos. 510
O adversário, pois, porta o Tifão de ígneo sopro;
por sua vez, no escudo de Hiperbio, Zeus-pai,

48
em pé, ostenta o raio flamejante na mão.
[nunca ninguém soube de alguma derrota de Zeus]
Tal gentileza, de fato, pertence aos deuses: 515
estamos do lado dos vencedores e eles, dos perdedores.
[é razoável dispor os guerreiros como adversários] 519
Se Zeus, no combate, é superior ao Tifão. 517
E de acordo com o emblema sobre o escudo 518
possa agir Zeus, o salvador, para a vitória de Hiperbio. 520

Co. Persuadida estou 〈--〉 ostentando odioso adversário [antiestrofe b


de Zeus no escudo, a figura do deus ctônio,
imagem hostil não só dentre os mortais
como também dentre os deuses eternos,
há de esfacelar a cabeça diante da porta. 525

Mens. Que assim seja! Anuncio que o quinto chefe


na quinta porta – a Bóreas – foi designado
ao lado do sepulcro de Anfíon Diógenes.
Jura que tem uma lança e está persuadido
de venera-la mais do que os deuses e acima de seus olhos 530
destruirá a cidade de Cadmo a despeito de Zeus.
Ele vocifera que nasceu de mãe montanhesa,
de bela face e, por isso, é um homem-criança:
já tem em seu rosto a pelugem,
esboço da primavera, crescendo em fios espessos. 535
Mas com espírito rude, em nada parecido à virgem
que o nomeia, e com olhar severo, ele avança.
Sem modéstia alguma detém-se diante da porta Bóreas.
no escudo forjado em bronze,
circular defesa de seu corpo, está o insulto à cidade: 540
a Esfinge que come carne crua, fixada em pregos,
magnífica figura em relevo, condensada.
Tem sob suas garras um guerreiro cadmeu

49
para lançar contra ele o maior número de dardos.
Parece que veio não para barganhar na batalha, 545
mas para não desonrar seu largo caminho:
esse guerreiro é Partenopeu, o Arcádio.
meteco, pois quita com Argos a sua boa educação,
ameaça terrivelmente nossas torres, e que deus não a realize.

Et. Se os deuses realizassem o que eles 550


pensam e sentem com aquelas jactâncias ímpias,
certamente seriam aniquilados miseravelmente.
Há também contra o Arcádio que tu descreves
um guerreiro modesto, mas capaz de cumprir a tarefa:
Actor, irmão do guerreiro mencionado anteriormente. 555
Ele não permitirá que o linguajar das ações
flua por nossas portas para multiplicar os infortúnios,
tampouco que a nocividade do monstro odioso
[imagem estampada no escudo de guerra]
atravesse as muralhas: a ruína aguardará seu portador, 560
ao pé da cidade, quando a sorte produzir estrépitos pungentes.
Pelos deuses, que essa seja a verdade que sai da minha boca.

Co. Atravessa o meu peito a sua fala [estrofe c


e a trança de cabelos erige-se
quando ouço tamanhas insolências 565
de homens arrogantes:
que os deuses os façam perecer nesta terra!

Mens. Posso falar sobre o sexto guerreiro – o mais prudente –


valoroso profeta, o poderoso Anfiarau.
Colocado diante da porta Omoloide 570
malevolamente ofende muito ao forte Tideu:
que é homicida, que aterroriza sua cidade,
supremo maestro dos infortúnios de Argos,
invocador das Erínias, servo de Fobo,

50
e ministro dos atuais infortúnios de Adrasto. 575
E ainda contra † o quinhão de teu irmão,
volvendo o nome do valente Polinices,
e por fim, dividindo seu nome em duas partes †
ele o chama e as palavras que saem de sua boca são estas: 580
“que bela obra e querida pelos deuses,
digna de ouvir e contar para as gerações seguintes,
a cidade paterna e os deuses autóctones
destruir, lançando sobre eles um exército estrangeiro!
Que tipo de justiça secará a fonte materna?
A terra paterna, pelo furor da tua lança 585
conquistada, deve servir-te como causa?
Da minha parte enriquecerei este solo,
um profeta enterrado em Tebas inimiga.
lutemos: não espero destino desonroso”.
Estas coisas o adivinho, manuseando calmamente 590
o escudo todo bronze, dizia. E não havia emblema nele.
Pois não desejava parecer valoroso, mas sê-lo,
profundo sulco em sua mente carpindo
para dele germinar decisões prudentes.
Contra ele adversários prudentes e nobres 595
aconselho a enviar: temível é aquele que honra aos deuses.

Et. Maldito presságio que conseguiu associar


um homem justo com os mais ímpios mortais!
Em toda relação nada é mais funesto
do que a má-companhia: o seu fruto não deve ser colhido. 600
[a terra lavrada da Ate frutifica a morte]
Ou um homem pio que embarca na companhia
de marinheiros ávidos de † alguma † vilania
está morto junto com a raça desprezada pela divindade;
ou, embora justo, na companhia de concidadãos 605
hostis aos estrangeiros e relegados pelos deuses,
tendo injustamente encontrado a mesma cilada,

51
pela calamidade divina que fere a todos, ele está dominado.
Assim, pois, o adivinho, refiro-me ao filho de Ecleu,
homem sábio, justo, nobre e pio, 610
grande profeta, misturado contra sua vontade
a homens ímpios e de palavras arrogantes,
engajados em ir por um caminho cujo retorno é longo,
será arrastado junto com eles pelo desejo de Zeus.
Parece-me que ele, então, não vai investir contra a porta 615
não por falta de coragem nem por má-vontade,
mas porque sabe que o seu destino é morrer na batalha,
se é verdade que dá fruto o oráculo de Lóxias.
[pois ele ama o silêncio ou diz coisas oportunas]
Todavia, contra ele, a força de Lástenes 620
hostil ao estrangeiro, enviaremos como guardião da porta,
de mente experiente e corpo jovem,
a mirada tem pés ágeis, com a mão não se demora
em atingir com a lança o flanco desnudado ao lado do escudo.
É dádiva divina aos mortais ter boa fortuna. 625

Co. Que os deuses realizem nossas justas litanias [antiestrofe c


para que a cidade tenha boa fortuna,
desviando os males causados pela lança
na direção dos invasores de Tebas: para fora das torres
lançando, que Zeus os fulmine com seu raio. 630

Mens.Enfim direi o nome do sétimo guerreiro


apostado diante da porta Sétima: teu próprio irmão.
Contra Tebas lança toda sorte de imprecações e maldições,
e após escalar as muralhas será proclamado senhor de Tebas,
entoando um cântico de conquista. 635
Almeja o duelo contigo e matando-o quer morrer ao teu lado,
ou deixando vivo o homem que o baniu e o desonrou,
no desterro fa-lo-á pagar na mesma moeda.
Estas coisas ele brada e os deuses tutelares,

52
vigilantes da terra pátria, invoca para que cumpram 640
completamente as suas litanias – o valente Polinices.
Ele porta um escudo bem redondo, recentemente
forjado, onde está gravado um duplo emblema.
Vê-se um guerreiro armado, burilado a ouro,
e uma mulher o conduz de maneira prudente: 645
afirma ser a Justiça, conforme expressam
as letras: “conduzirei este homem, e a cidade
reaverá e retornará à casa paterna”.
Tal é o significado de seu escudo:
[tu já deves conhecer alguém para enviar] 650
assim jamais serás surpreendido por este homem.
Só tu deves saber como conduzir a nave da cidade.

Et. Ah! Enlouquecida e grandemente abominada pelos deuses,


Ah! raça de Édipo – a minha – multi-miserável.
Ai de mim, pois as maldições de um pai chegam a seu termo. 655
Mas convém não chorar nem lamentar-me
para que não se crie gemido intolerável.
E com nome muito justo – falo de Polinices ,
prontamente saberemos até onde o emblema se cumprirá,
se as inscrições em ouro que abundam em seu escudo 660
vão conduzi-lo junto com sua confusão mental.
Se a donzela, a Justiça, filha de Zeus o assistisse
em seus atos e no coração, até que poderia ser.
Mas nem quando saiu do sombrio ventre materno
nem quando criança, nem na puberdade, 665
tampouco quando cresceu-lhe a barba
a Justiça o contemplou ou o honrou:
seguramente nem nos infortúnios da terra paterna,
no presente momento, acho que ela está do seu lado.
Sim, a Justiça teria absolutamente um nome falso 670
ao se envolver com um homem capaz de tudo.
Com isto estou convencido e eu mesmo me engajarei:

53
existe algum outro com mais direito?
Arconte contra arconte, irmão contra irmão
e inimigo junto a inimigo me colocarei. Rápido, então, 675
Traga as cnêmidas, protetoras de lança e das pedras.

Co. Óh, mais querido dentre os homens, filho de Édipo,


não te tornes, pelo ódio, semelhante ao que infâmias profere.
Já é suficiente o número de homens Cadmeus
que vão lutar contra os argivos, pois é sangue que se purifica: 680
mas a morte de dois irmãos por recíproco homicídio
para esse miasma não existe envelhecimento.

Et. Se algum homem deve suportar um infortúnio,


exceto a vergonha, seja! É a única vantagem dentre os mortos.
Mas dentre os males e as injúrias nenhuma reputação dirás. 685

Co. O que estás dizendo, filho? [estrofe a


Que nenhuma Ate encha teu coração de fúria e voracidade
pela lança: extirpe de ti o início deste desejo ruim.

Et. Já que um deus deflagra intensamente este evento,


que seja levada pelo vento, ao sabor da sorte, para a tempestade 690
do Cocito, toda a extirpe de Laio, odiada por Febo.

Co. O desejo mordaz em demasia [antiestrofe a


Excita-te a buscar o fruto amargo do homicídio
De sangue interdito.

Et. Pois a Ará de meu amado pai, hostil a mim, cumpre-se, 695
sem lágrimas em seu olhar seco, a me rodear,
dizendo que é melhor agora do que um destino tardio.

54
Co. Mas não te entregues. Não serás taxado de covarde [estrofe b
por ter bem preservado a vida: as Erínias de égide
negra sairão de tua casa quando os deuses 700
receberem de tuas mãos um sacrifício.

Et. Já não somos, de certo modo, objeto de atenção dos deuses.


A oferenda de nossa morte é objeto de veneração?
Então porque ainda adularíamos o destino funesto?

Co. Agora que está disposto para ti, já que o daimon [antiestrofe b
transformador do espírito, com mudanças tardias, 706
talvez venha com o vento mais fecundo:
pois ainda está em ebulição!

Et. A imprecação de Édipo deflagrou a ebulição:


demasiadamente verdadeiras são as visões, nos sonhos, 710
dos fantasmas que repartiam os bens paternos.

Co. Obedeça às mulheres, mesmo não suportando...


Et. Pode falar desde que seja algo realizável: não se alongue.
Co. Não te encaminhes para a sétima porta.
Et. Não enfraquecerás com teu conselho um homem afiado. 715
Co. A divindade honra a vitória ainda que sem glória.
Et. Esse preceito não é aceitável a um hoplita.
Co. Mas queres colher o sangue de teu próprio irmão?
Et. Não se pode fugir dos males que os deuses enviam.

Co. Estou espantada que a destruidora de lares, [estrofe a


essa deusa não semelhante aos deuses, 721
a profetisa mui verídica da desgraça,
Erínia legada pelo pai,
venha cumprir as imprecações violentas
de um Édipo ensandecido: 725
pois esta discórdia que mata os filhos a excita.

55
Um estrangeiro distribui os lotes, [antiestrofe a
Calibo emigrante da Cítia,
que reparte as riquezas,
severo, o ferro cruel, 730
a sortear o tanto de terra
que os mortos devem ocupar,
excluídos dos vastos campos.

Uma vez consumado o fratricídio, [estrofe b


um ao outro dilacerados na morte, a poeira, 735
a terra, que beba o sangue negro e coagulado.
Quem poderia realizar os ritos de purificação?
Quem poderia dissolvê-los? Oh!
pesares recentes da casa 740
misturados a males antigos.

Menciono, pois, a linhagem antiga [antiestrofe b


a transgressão rapidamente vingada, até a terceira
geração perdura, quando Laio rebelde a 745
Apolo, que o fez saber por três vezes
pelo oráculo Pítico, centro do mundo,
que deveria morrer sem descendência
para salvar a cidade,

Mas foi dominado pela insensatez amorosa, [estrofe c


engendrou seu próprio destino, 751
o Édipo parricida,
aquele que no sagrado
solo materno – onde foi nutrido –
ousou semear uma raiz sangrenta : 755
um desvario que arruína o espírito
conjugou os jovens noivos.

56
Tal qual o mar que traz uma onda de desgraças, [antiestrofe c
uma cai, mas outra se levanta
três vezes mais forte, justamente a que
em torno da popa da cidade rebenta. 760
Entre ela e nós, esta proteção, o muro
que se estende pouco em largura.
Temo que, junto com seus reis,
a cidade sucumba. 765

Pois concluem-se as antigas maldições, [estrofe d


dolorosas reconciliações: os aconteceres
que trazem a aniquilação não desviam.
A prosperidade acrescida em demasia
alija a carga da proa do navio 770
Para os mortais.

Pois quem dentre os homens tanto admiraram [antiestrofe d


os deuses habitantes dos santuários de Tebas
e 〈 que 〉 dentre os mortais muito freqüentou a assembléia,
tanto quanto naquela época honravam Édipo 775
quando a devoradora de homens,
a Esfinge, ele alijou desta terra?

Mas quando a consciência aflorou, [estrofe e


infeliz de tristes bodas,
suportando a dor, 780
o coração enlouquecendo,
dupla desgraça executou:
com as mãos que assassinara a Laio
turvou os olhos mais caros do que os filhos,

57
E contra os filhos proferiu [antiestrofe e
com rancor do miserável alimento, ai, ai 786
Palavras amargas de maldições,
E, um dia, os dois com ferro
em punho partilharão pela sorte
os seus bens. Agora tremo de medo 790
que as Erínias velozes cumprirão isso tudo.

Mensageiro

Coragem filhas criadas por mães

Tebas, enfim, escapou do jugo escravo.


As jactâncias dos inimigos violentos sucumbiram.
A cidade está em paz e não deixou 795
o mar entrar, apesar das múltiplas investidas da onda.
As fortificações tebanas protegem e defendemos as portas
com guerreiros aptos ao combate singular.
Tudo perfeito temos nas seis portas.
Mas o senhor do Sete, o soberano Apolo, a sétima porta 800
reservou para si, a fim de cobrar da raça de Édipo
os antigos desvarios de Laio.

Co. Que novo acontecimento interessa à cidade?


[Mens.A cidade está salva: mas os reis consangüíneos
Mens. Homens mortos de mãos recíprocas. 805
Co. Quais? O que dizes? Deliro pelo medo de tua fala.
Mens. Recupera-te e agora ouve: os filhos de Édipo.
Co. Ai de mim, infeliz, sou profetisa das desgraças.
Mens. Fato é que estão estendidos no solo.
Co. Ali jazem? É duro de suportar, mas explica. 810
Mens. Mataram-se, ao mesmo tempo, com mãos fraternas.
O daimon comum a ambos pertencia demasiadamente

58
e ele vai fazer perecer a extirpe amaldiçoada.
Chora-se e alegra-se pelo mesmo fato:
enquanto que a cidade prospera, os soberanos, 815
os dois comandantes, repartiram pelo ferro compacto
a plena propriedade herdada do pai:
esta terra desfrutarão no sepulcro,
precipitados pelas imprecações malditas de um pai.
[ A cidade está salva: mas dos dois reis consangüíneos 820
a terra bebeu o sangue na morte.

Co. Oh, grande Zeus e daimones protetores


da cidade, que estas muralhas
de Cadmo 〈 〉 defendeis,
devo alegrar-me e cantar em louvor 825
ao salvador de minha cidade,
ou aos desgraçados e infortunados
† sem descendentes † comandantes devo chorar,
os que corretamente segundo seus nomes
〈 〉 e Polinices 830
pereceram pela demência ímpia?

Oh! Ará sombria e destruidora [estrofe a


da estirpe de Édipo.
Um calafrio terrível me envolve o coração.
Compus uma melodia no sepulcro, 835
de um delírio báquico, quando ouvi
os cadáveres ensangüentados,
mortos miseravelmente: é funesto
esse concerto de lança.

Cumpriu-se sem falta [antiestrofe a


o dito de imprecação de um pai: 841
os ímpios desejos de Laio subsistiram.
Uma angústia envolve a cidade.

59
Os vaticínios não se extinguem.
Oh! Infortunados, cumpriu-se 845
tal incredulidade, pois as desgraças
lamentáveis chegam não através de palavras.
Estas coisas se auto revelam: eis o que relatou o mensageiro.
Duas angústias † dois guerreiros † infortunados:
fratricidas, duplo destino, dores consumadas. Que dizer? 850
Que outra coisa que as “dores [das dores] domésticas”?
Mas dos gemidos – oh amigas – pelo sopro do vento
batei as duas mãos ao redor da cabeça 855
no ritmo do remo, que sempre pelo Aqueronte
faz passar o pesado e negro véu da nau,
não pisada por [ Apolo ] 〈 〉 [ não exposta ao sol ]
até a terra que acolhe a todos e não se deixa ver. 860

[ Mas já chegam para o amargo


dever Antígona e Ismene:
o canto fúnebre dos dois irmãos – creio –
da profundidade do peito que o amor
desperta elas farão brotar a justa dor. 865
A nós é justo, como ouvimos a notícia primeiro,
fazer ressonar o hino das Erínias
e de Hades
entoar o cântico hostil. 870
Ah!
As mais desgraçadas de todas as irmãs
que rodeiam com o cinto as vestes.
Choro, gemo, e sem fingimentos
brota do meu peito um clamor justo.]

60
Semi coro A

Oh, oh, insanos [estrofe a


descrentes dos amigos e impiedosos ante os males, 876
os que se apropriaram da casa paterna,
Infelizes com armas nas mãos.

Semi coro B

Certamente são infelizes os que infelizes mortes


Encontraram junto com a ruína da casa. 880

semi a oh, oh, da própria casa [antiestrofe a


derrubaram as muralhas e uma realeza amarga
contemplaram: neste momento estão
dilacerados pelo ferro.

semi b Muito verdadeiras as maldições de Édipo 885


a soberana Erínia cumpriu.

semi a Dos flancos esquerdos feridos, [estrofe b


sim, feridos dos mesmos
flancos fraternais, 890
Ai, Ai, miseráveis
Ai, Ai, maldições que vingam a morte com a morte.

semi b Referes ao que de parte a parte [falas de uma ferida] 895


a casa [e] os corpos golpeia simultaneamente,
indizível permanece
pela maldição de um pai
[não] pela morte predestinado.

61
semi a Um gemido atravessa a cidade: [antiestrofe b
as torres gemem, geme 901
o solo que amava os guerreiros. Restam
[as riquezas para as gerações futuras]
por causa dos malfadados,
por causa da querela e do seu fim letal. 905

semi b Repartiram com violência no coração


as propriedades de igual maneira.
Ao mediador não falta
censura aos queridos,
nem o agradável Ares. 910

semi a Por um lado se encontram feridos pelo ferro, [estrofe c


por outro, feridos pelo ferro eles permanecem –
até que prontamente alguém pergunte “quem são?”
Lotes do sepulcro paternal.

semi b † Rápido do palácio um clamor para eles † 915


É enviado, um gemido
desgarrador, que por si mesmo geme e sofre,
que aflige o ânimo, não simpático à alegria,
verdadeiramente lágrimas
do coração, que me debilitam 920
por causa destes dois reis.

semi a É lícito dizer sobre os infortunados [antiestrofe c


que ambos causaram muitas coisas aos cidadãos
e dizimaram muitas fileiras
inimigas no combate. 925

62
semi b Infeliz é aquela que pariu os dois,
entre todas as mulheres
que recebem o nome de mãe:
a seu filho como seu próprio esposo
aceitou a eles dois, e eles hoje
alcançaram o fim pelos golpes recíprocos 930
de seus braços consangüíneos.

semi a De fato consangüíneos e completamente aniquilados [estrofe d


por um quinhão odioso
por uma disputa enlouquecida, no final da luta. 935/6

semi b A hostilidade está quieta, pois na terra


inundada de sangue,
a vida está misturada: sim, os mesmos sangues, 940
juiz cruel das desavenças é Pontios,
o estrangeiro saído do fogo,
o agudo ferro; também cruel
é o partilhador de bens, Ares, 945
já que realizou a Ará paterna.

semi a Obtiveram pela sorte a Moira, oh desgraçados, [antiestrofe d


os sofrimentos enviados por Zeus:
debaixo dos corpos, o tesouro sem fundo de terra. 949/50

semi b Oh! Os que entremearam com


numerosos sofrimentos a raça.
Por fim 〈 - 〉 entoaram
as maldições o canto cortante,
totalmente arruinada a raça posta em fuga: 955
o troféu da Ate foi erigido na porta
em que eles se feriram, e na vitória
de ambos o daimon se deteve. 960

63
Semicoro a
Feriste e foste ferido.

Semicoro b
Matando tu morrestes.

a) Com a lança matastes. b) Com a lança morreste.


a) Dores causastes. b) Dores sofrestes.
a) Jazes. b) Após ter matado. 965
a) Flua, meu gemido! b) Fluam, minhas lágrimas! 964
a) Eê! b) Eê! [estrofe a
a) Minh’alma está enlouquecida pelo gemido.
b) Meu coração geme por dentro.
a) Oh! Oh! Tu totalmente lamentável.
b) Tu também todo infortunado. 970
a) Sucumbiu por um irmão. b) E um irmão matastes.
a) Falar dos dois. b) Contemplar os dois.
a) † de tais aflições estas se acercam.
b) As irmãs dos irmãos ao lado estão†

Co. Oh! Moira distribuidora de desgraças, 975


soberana sombra de Édipo,
tu, negra Erínia, de fato poderosíssima.

a) Ee! b) Ee! [antiestrofe a


a) pesares difíceis de contemplar
b) voltou do exílio para mim
a) apenas chegou e morreu 980
b) quando se precipitou o sopro vital, se foi.
a) De fato ele se foi 〈 - 〉 b) † e matou o outro †
a) família desgraçada b) padecer desgraçado
a) † sentimentos lamentáveis de igual nome b) lacrimosos de triplas dores † 985

64
[a desolador de dizer b) desolador de olhar ] 985a

Co. Oh! Moira distribuidora de desgraças,


soberana sombra de Édipo,
tu, negra Erínia, de fato poderosíssima.

a) Tu a conheces, de certo, uma vez que a experimentou. [epodo


b) E tu não tardastes em conhecê-la. 990
a) Depois que regressastes à cidade.
b) Da lança contra o adversário.
a) Desolador de dizer b) desolador de olhar
a) Oh! Sofrimentos b) oh! males
a) para a casa b) para a cidade 995
[a) sobretudo para mim
b) e para mim também ]
a) oh! Senhor dos infortúnios
[ Etéocles rei ]
〈 〉
a) Oh! Multipesarosos dentre todos. 1000
b) Oh! Extraviados pelos daimones.
a) Oh! Onde enterraremos os dois?
b) Oh! Onde recebam mais honra.
a) Oh! Pesar que jaz ao lado do pai.

[ Heraldo

Devo anunciar o que foi julgado e decidido 1005


pelos conselheiros do povo desta cidade cadméia.
Foi decidido que Etéocles, por seu desvelo à cidade,
terá sepultura com amorosas terras.
Pois combatendo os inimigos escolheu morrer aqui.
E por ser devoto dos santuários paternos, sem censura, 1010

65
está morto onde é belo morrer pelos jovens.
Assim, em relação a ele, digo o que me comunicaram.
Já seu irmão, o cadáver de Polinices, para além das muralhas
deve ser levado, insepulto, para servir de alimento aos cães,
já que teria devastado a terra de Cadmo 1015
se algum deus não tivesse se colocado frente
à sua lança. Mesmo morto será conservado seu crime
diante dos deuses pátrios, os quais ultrajou
quando lançou um exército contra a cidade para destruí-la.
A decisão é: este homem, por obra dos pássaros alados, 1020
terá sua sepultura desonrosa como castigo,
e nenhuma mão deve derramar libações à sua tumba,
nem reverenciarem-no com lamentações e gemidos.
Será privado do cortejo de seus parentes.
Essas são as decisões dos conselheiros Cadmeus. 1025

Antígona

E eu digo isto aos conselheiros Cadmeus:


ainda que alguém não queira ajudar-me a sepultá-lo,
eu o sepultarei, e estou disposta a enfrentar o perigo
por haver dado sepultura a meu irmão. Não me envergonho
por esta infiel insubordinação contra a cidade. 1030
Terrível o que saiu da entranha comum
de uma mãe sofredora e de um pai desgraçado;
pois quis participar das desgraças, involuntariamente,
a alma, ao viver por um morto, de entranhas consangüíneas.
Da carne dele 〈 1035
〉 nem os lobos esfomeados
degustarão: que ninguém se atreva a isso.
Pois sepultura † para ele † e funerais eu,
mesmo sendo mulher, para ele planejarei,
levando-o na prega do peplo de linho fino,

66
e eu mesma o encobrirei: que ninguém duvide disso. 1040
Com audácia a eficácia do plano é possível.

Her. Invoco-te a não violentar a cidade fazendo isso.


Ant. Invoco-te a não prescrever o supérfluo para mim.
Her. O povo é implacável depois de ter escapado dos infortúnios.
Ant. † Que seja † mas meu irmão não ficará insepulto. 1045
Her. Mas tu honrarás com sepultura aquele que a cidade execra?
Ant. As ações de Polinices não foram julgadas pelos deuses.
Her. Não antes de ter lançado esta terra aos perigos.
Ant. Respondeu com ultrajes porque sofreu ultrajes.
Her. A sua expedição foi contra todos e não contra um só. 1050
Ant. A discórdia é a última que cumpre a palavra dos deuses:
eu o sepultarei e não insista.
Her. Pode ser essa a tua vontade. Eu te proíbo.

Co. Ai, Ai!


Oh! Orgulhosas e de raças destruidoras
Erínias funestas, que assim a linhagem de 1055
Édipo arruinasteis desde a sua popa.

[ - ] O que sofrerei? O que farei? O que inventarei?


Como suportarei não chorar-te
nem acompanhá-lo até a sepultura?
Mas temo e quero repelir 1060
A ira dos cidadãos.

[ - ] Tu muitos lamentos
produzirás, mas este outro desgraçado,
não chorado, só terá o único canto
de uma irmã. Quem, então, aceitaria isso? 1065

67
semi a Que a cidade puna ou não
os que choram Polinices.
Pois nós iremos e o enterraremos,
os que seguem o cortejo fúnebre. Com efeito
esta dor é comum à raça, e a cidade 1070
celebra o justo às vezes de uma maneira ou de outra.

semi b Nós também vamos com ele, pois a cidade


e a lei juntamente aprovam,
junto dos afortunados e do poder de Zeus,
o qual impediu que a cidade dos Cadmeus 1075
fosse exterminada e pela onda
de guerreiros estrangeiros
fosse submersa implacavelmente. ]

68
Comentários à tragédia Os Sete contra Tebas de Ésquilo

Prólogo (v. 1 – 77)

Discurso de Etéocles (v. 1 – 38)

Utilizando um recurso comum da oratória – a exposição das dificuldades do


orador – o discurso de Etéocles seria, de acordo com Hutchinson (1994: 41), uma
encenação planejada na sua condição de solidão. Nem a platéia, nem os cidadãos
são invocados neste primeiro discurso, embora o vocativo que abre o discurso
automaticamente nos conduza pelo caminho contrário. De acordo com os críticos,
Etéocles estaria separado de seu povo para enfatizar sua posição de filho de Édipo
e evidenciar sua conexão especial com as Erínias.
Sustentam o discurso algumas repetições de palavras e idéias: v. 1
K/a/dmou politai e v. 9 Kadmei/wn po/lei; v.1 xrh e v.10 u9ma=j
de xrh; v. 20 proj xre/oj to/de, v. 21 eu[ r9e/pei qeo/j e v. 35
eu[ telei qeo/j.
1 – 3: O vocativo Ka/dmou poli~tai abre uma fenda no tempo e desloca a
ação do drama para a época mítica da lenda dos Labdácidas, indissociada da
fundação de Tebas, cujo primeiro rei foi Cadmo. Fórmulas similares podemos
encontrar ao longo da tragédia; le/gein ta xai/ria é uma fórmula muito
usada e está relacionada à condução de coches e de embarcações, pois designam o
instante propício para se fazer uma manobra. Nesta passagem, o que está em jogo é
a relação entre o discurso e a ação; o discurso que precede a ação é de particular
valor nesta tragédia que explora a profundidade destes dois planos distintos, já que o
duelo que determina o destino dos Labdácidas é precedido pelo confronto verificado
na cena central dos sete discursos paralelos. Ainda nestes versos temos a primeira
aparição do tema da nave da cidade que atravessa toda a tragédia pela amplitude de
seu desenvolvimento e pela coerência que confere ao sistema de suas metáforas
(rei=piloto; cidadãos=tripulação; revolta=tempestade). A história dessa imagem
remonta a Homero (Ilíada 15, 624-29, 381-84) e passa por Arquíloco (Frag. 56, 56a) e

70
Alceu (Frag. 326, 6), que a empregam num contexto político. Ble/fara mh
koimw~n u3pnwi : além de reunir a atitude do piloto e do rei, revela o contraste
entre o rei que se vangloria de cuidar do bem-estar da cidade e o descendente
maldito dos Labdácidas, possuído pelas visões que pressagiam o aniquilamento de
sua raça.
4 – 9: Etéocles não nega que os deuses podem interferir na esfera humana. Na
verdade, o que está em jogo é a atitude de Etéocles perante os deuses e o
desenrolar do drama que revelará se sua posição cívica é um comportamento
legítimo e se ela recobre de maneira satisfatória as afinidades que ligam o mundo
dos mortais à esfera divina. É incontestável que suas palavras pressagiam, sem ele o
saber, o desfecho do drama: a cidade se salva, mas os hinos e as lamentações
honram, de fato, a morte do rei.
4. ai0ti/a pode ser traduzida, neste contexto, por “causa”, “responsabilidade”.
6. eij poluj: a oposição sublinha o caráter solitário do herói. Como observa
Hutchinson (1994: 43), poluj denota freqüência e não intensidade. Caso contrário,
o paradoxo seria arruinado.
10 – 16: Animado pelo sentido de urgência, Etéocles convoca todas as forças para
defender a cidade. Kai\ ton...kai\ ton denota dois grupos ou classes de
idade: os que não estão à altura da idade militar e os que já passaram dela, ou seja,
ou muito jovens ou muito velhos. Estranha é a omissão dos adultos aos quais se
delega a defesa da cidade. A ordem natural dos versos 12 e 13 nos obriga a supor
que a convocação de Etéocles alcança apenas um dos grupos. Invertendo a ordem
(13 e 12), o verso 13 parece acomodar os dois grupos etários aos quais Etéocles se
referiu nos versos 10 e 11. No entanto, parece difícil fugir da linguagem do
crescimento físico do corpo e de sua vitalidade mencionado no verso 12, mesmo com
a ordem invertida, já que o termo blasthmon recobre a imagem do desabrochar
de um gérmen. Nesse sentido, a exclusão de um grupo permanece. O que há para
desabrochar no grupo etário dos muito velhos?
Algumas palavras são metáforas relacionadas ao domínio da vegetação
(a0kmai/aj, blasthmon e a0ldai/nw),sublinhando os estreitos laços que
ligam os combatentes ao solo da terra maternal.

71
14. qewn e0gxwri/wn: a relação entre os deuses e a terra que eles protegem é
um tema recorrente nas orações de Etéocles e do coro.
17 – 20: o tema da terra mãe alude a um aspecto político enquanto mãe dos
soldados cidadãos, dos leais habitantes armados de escudos, e um aspecto mítico
enquanto referência mítica da autoctonia tebana, paradigma do conflito trágico dos
dois filhos de Édipo. De acordo com Lupas e Petre (1981: 17)Etéocles e Poliníces
são dois autóctones que ofuscam o papel das mulheres da geração. Os dois
nasceram de um rasgo que é ao mesmo tempo o do parricídio e do incesto e morrem
por causa de uma excessiva fraternidade guerreira. Os valores pervertidos da
autoctonia fraterna, a relação fatal dos dois irmãos com o mundo das mulheres e da
geração começam desde o prólogo do drama.
21 – 23: estes versos são marcados pela prudência que deve orientar o discurso do
rei. Há duas menções aos deuses e pela primeira vez aparece a menção às
fortificações da cidade que anunciam a oposição entre o espaço interno e o externo.
Esta posição tem um papel central num drama cuja ação se desenvolve às sete
portas da cidade, onde o interior se comunica com e pode ser agredida pelo exterior.
Num primeiro momento, esta oposição é bem delineada: os defensores se encontram
no interior dos muros e os agressores do lado de fora deles; uma mesma linha
separa os civilizados dos bárbaros agressores. Mas, gradualmente, os contornos
precisos desta oposição se confundem: do lado de dentro as mulheres, ligadas ao
espaço interior, formam um corpo estranho; do lado de fora existe o duplo Etéocles –
Etéoclos, o argivo – e Poliníces, a réplica impiedosa de seu irmão. Nun em 21
contrasta o presente cerco com o tempo da infância; nun em 24 contrasta o ataque
iminente com a guerra de outrora. Purghroume/noij, no contexto geral, e pela
posição da palavra po/lemoj no verso 23, sugere a noção de “defendendo as
torres” ao invés de “sendo sitiada”, conforme aponta Hutchinson (1994: 46)
24 – 29: Conforme Lupas e Petre (1981: 20),o tema da adivinhação compreendido
nestes versos ocupa um lugar intermediário entre as predições racionais de Etéocles
(4-9) e a mântica infalível de Apolo. Seu caráter técnico (26) e interpretativo são um
instrumento humano de prospecção; seu caráter infalível (a0yeudei) se
assemelha à mântica oracular. Difere dela apenas pela adivinhação indutiva,
repousada sobre a interpretação de signos objetivos, não se confundindo com a
profecia inspirada. Menciona-se na tragédia a maior parte das técnicas

72
adivinhatórias conhecidas pelos deuses: ornitomancia, piromancia, oniromancia, etc.
Por outro lado, esta tragédia menciona dois “profissionais” da adivinhação: Etéocles,
profissional da previsão política, e o coro, profeta ocasional das desgraças.
O profeta destes versos foi identificado como sendo Tirésias. Esta identificação
repousa, às vezes, sobre a tradição, que fez dele o adivinho tebano por excelência. É
possível que ele tenha aparecido já nas outras tragédias da trilogia (Laio e Édipo). O
verso 25 diz que o profeta é cego e esta descrição sugere que este cego é Tirésias.
30 – 35: O estilo na oratória muda bruscamente com a série de imperativos. O tema
das fortificações que separam o interior da cidade do exterior reencontra o tema da
nave da cidade, pois a terminologia usada a propósito das fortificações também se
aplica aos navios: plhro/w (equipar/encher um navio); qwrakei/on
(encouraçar); se/lma (barco de um navio).
36 – 38: Etéocles termina o discurso mostrando as suas qualidades de comandante
do exército tebano: usou a estratégia da antecipação.

Discurso do espião (v. 39 – 68)

O mensageiro-espião aparece no exato momento em que ele era assunto no


final do discurso de Etéocles. Esse “procedimento” ocorre com maior freqüência na
comédia, em que os desejos dos personagens acontecem como que por milagre.
Perguntamos se este mensageiro-espião é o mesmo personagem que aparece
dialogando com Etéocles na cena central dos grandes discursos paralelos.

Do ponto de vista de sua estrutura, o discurso está organizado da seguinte


forma: os três primeiros versos (39-41) constituem o início padrão de narrativas
(h3kw....fe/rwn); dos versos 42 ao 56 ele descreve a cena dos preparativos e
juramento do ataque argivo; dos versos 57 ao 65 ele anuncia a chegada dos
inimigos; e, finalmente, dos versos 66 ao 68 ele prepara a sua saída.
42 – 48: além de já aparecer a menção ao fatídico número 7, nestes versos
encontramos a descrição da cena do juramento, célebre na antiguidade. A atmosfera
do sacrifício noturno e o pacto de morte feito pelos inimigos de Tebas – cuja ênfase
está no derramamento de sangue, na destruição – não é somente heróica, mas

73
também sinistra, e acentua o contraste entre o excesso dos propósitos inimigos e a
estratégia que Etéocles adotará para defender a cidade.
Os versos 44-8 introduzem o mote do sangue, muito importante na tragédia, e o
nome de Ares. Os dois carregam uma certa ambigüidade. O primeiro porque, no
sangue derramado por ocasião do sacrifício do touro ou sobre o campo de batalha, a
tragédia aborda a consangüinidade fatal de Etéocles e Polinices e o crime fratricida
(cf. v. 415, 681, 940; 418-20, 694, 730-37, 755). O segundo porque, nesta tragédia
carregada de Ares, deus da guerra e, às vezes, deus do duelo em que um deve
morrer, é um deus benevolente, pai de harmonia e ancestral da linhagem real de
Tebas (v. 104-07 e 115).
A invocação de uma trindade guerreira como garantia do pacto era muito corrente na
Grécia. 0Enuw, cujo epíteto homérico era 0Enua/lioj, é uma divindade
guerreira que fez parte da tropa seguidora de Ares. Está relacionado aos juramentos
dos efebos atenienses. Fo/boj, um outro seguidor de Ares, é o deus do pânico, da
irracionalidade que precipita a desgraça. (cf. Lupas e Petre, 1981: 27-8))
49 – 53: o tom dos preparativos para a partida dos chefes inimigos muda brutalmente
em relação ao tom dos preparativos que culminaram no juramento. Parece que a
hipótese de “manchar Tebas com o sangue de seus corpos” toma força e eles
acreditam que vão morrer.
Adrasto, o herói argivo por excelência, não é nesta tragédia um dos sete guerreiros
que participam da expedição a Tebas. O papel central é reservado a Polinices, seu
genro. Em uma das versões antigas da lenda, Adrasto, líder da expedição,
sobreviveu à tentativa de cerco a Tebas devido à astúcia de seu cavalo Areion.
54 – 56: Estes versos já antecipam um dos temas mais importantes da tragédia: a
tirada da sorte. O verbo lagxa/nw não significa pura e simplesmente “obter pela
sorte”, mas evoca três instâncias: o procedimento concreto do sorteio; o método
tradicional de dividir, pela sorte, o saque, partes de um alimento ou uma herança; e a
sorte fatal reservada pelos deuses aos mortais. Estes três valores da raiz lax
aparecem na tragédia no momento em que a sorte determina a distribuição dos
chefes argivos diante das portas de Tebas, a divisão da herança do saque e a morte
dos dois irmãos. A importância deste tema é atestada pela freqüência das palavras
lagxa/nw, pa/loj, kle/roj, etc no drama.

74
57 – 61: A seleção dos tebanos também é aqui adiantada devido à precipitação dos
eventos. A imagem da aproximação do exército argivo contra as portas tebanas,
descrita pelo mensageiro-espião, ao mesmo tempo em que é aterradora e exige
medidas urgentes, opera uma sutil transição para a imagem da nave da cidade e do
rei piloto. Palavras como pedi/a, a0froj e stalagmoi~j também se
aplicam à metáfora marítima. Por outro lado, os dois últimos termos, associados ao
verbo xrai/nw, remetem ao tema do sangue impuro e da polução.
Os versos 60-61 introduzem o tema dos cavalos, anunciado no verso 50 por ocasião
da carruagem de Adrasto. A natureza indomável e demoníaca destes animais é
constantemente explorada ao longo da tragédia (a partir do verso 462 este tema é
realçado quando a justiça de Etéocles passa a ser questionada) e é o símbolo da
fúria dos inimigos.
61. i9ppikw~n e0k pleumo/nwn: Ésquilo parece partilhar da opinião comum
à época segundo a qual o pulmão era reservatório da saliva e receptáculo de líquidos
em geral.
62 – 64: o tema da imagem náutica encontra o obstáculo metaforizado pela
tempestade com sua dupla ameaça: o vento e as ondas. A noção da cidade como
navio e o governante como piloto é unida com a noção de um exército inimigo como
ondas e o sopro de Ares como o vento atormentador. Todas estas noções que
constituem a metáfora náutica aparecem juntas nestes versos.
63. fra/ssw é também um termo técnico usado para fortalecer um navio contra
ondas violentas. Ésquilo parece jogar com os dois sentidos do verbo.
65 – 68: os últimos versos do mensageiro-espião insistem novamente na exatidão de
suas informações.

75
Prece de Etéocles (v. 69 – 77)

A invocação de Etéocles termina o prólogo da tragédia. Os oito versos que a


compõem são por demais riquíssimos na medida em que revelam alguns temas
interessantes para o gênero trágico.

Do ponto de vista formal, a invocação antecipa já a oração dos versos 271-8,


articula a transição da ação divina citada nos versos 3, 21, 23 e 35 para as orações
do párodo e, principalmente, situa a tragédia na fronteira da relação entre o mundo
dos mortais e o mundo dos deuses olímpicos.
A tripla proteção invocada no verso 69 (Zeus, Terra e deuses pátrios)
contrapõe-se à tripla invocação dos argivos no verso 45 (Ares, Eniô e Fobos). Essa
invocação pretende fortalecer a articulação entre o domínio olímpico e o domínio
político, não fosse a justaposição dos versos 69 e 70 que irradiam grande perigo na
invocação. Ao mesmo tempo em que Etéocles invoca Zeus, pai de Diké (v. 662), as
ambigüidades de uma terra que sugere, às vezes, a autoctonia masculina e
assassina e a polução feminina da geração e do incesto, os deuses pátrios que
protegem a cidade, mas podem destruí-la, ele invoca as divindades pessoais de sua
raça, as Erínias, divindades vingadoras, e a maldição de Édipo. Estas duas
invocações, conflitantes em certo sentido, revelam a dualidade do personagem
central do drama: ele é o rei-piloto da nau da cidade, mas, também, o filho maldito de
Édipo.
No que diz respeito ao verso 70, a maldição de Édipo, importa-nos discutir a
relação que a maldição mantém com o orador e com a cidade. A resposta, ao que
parece, encontra-se no verso 71.
Logo após a menção à maldição, a partícula ge do verso 71, partícula
restritiva, enfática, que chama a atenção para a palavra que a antecede (no caso
po/lin), exclui a cidade do destino reservado ao seu rei. Etéocles estaria pedindo
aos deuses para pouparem, pelo menos, a cidade. É um argumento a favor da tese
tradicional do sacrifício voluntário de Etéocles. Mas, até este momento, não há
nenhuma evidência que comprove o desejo consciente do rei de se envolver
ativamente na guerra que se aproxima. Etéocles sabe que ele e seu irmão estão
amaldiçoados e presume que as Erínias irão agir no contexto da guerra.

76
Por outro lado, havia uma crença familiar de que cidades poderiam estar
envolvidas na punição a seus governantes. Nesse caso, a partícula ge na linha 71
deveria ser tomada não só com po/lin, mas com a sentença como um todo.
Assim, a maldição envolveria o rei e sua cidade.
De qualquer forma, a inovação da versão esquiliana do mito dos Labdácidas
reside no fato de que ele se representa na e para a cidade. O plano político da
tragédia tem o seu reverso no destino particular dos últimos reis da linhagem de
Cadmo.
Os dois últimos versos da prece de Etéocles aludem a uma espécie de
contrato real que rege a relação dos gregos, da cidade, enfim, do mundo humano
com os seus deuses.
73. Kw1lbon: kai + o1lbon.
77. eu pra/ssousa: não o oposto de “impróspera”, pois cidades imprósperas
também honram aos deuses. No contexto: “não destruída pelo inimigo”.

Párodo (v. 78 – 180)

O párodo deixa clara a intenção de Ésquilo de confrontar o mundo político


dos homens e o mundo doméstico das mulheres. Vítimas de uma investida
estrangeira, elas delineiam a oposição entre o mundo brutal e sanguinário dos
agressores e o espaço interno, familiar e indefeso da cidade sitiada. Do ponto de
vista de Etéocles, a guerra pode ser vencida; do ponto de vista do coro, a guerra é
implacável.
80 – 82: o coro apropria-se da mesma metáfora marítima que Etéocles e o
mensageiro se basearam para falar de temas delicados para o momento. A metáfora
começa a ser usada a partir do verso 80. Nela, observamos que do mar revolto,
representado pelo exército argivo, precipita-se uma onda volumosa e fluente,
representada pelos cavaleiros, e que chega até o navio, representado pela cidade de
Tebas. No verso 82, a imagem do mensageiro mudo é um oxímoro e a sua função
não é secundária, mas presta-se a se inscrever na exata zona de oposição entre o

77
ver e o entender, o dizer e o compreender. Vale lembrar que a aproximação dos
cavaleiros e o rasgo que os cavalos deixavam pela planície foram descritos pelo
mensageiro na cena em que ele conversava com Etéocles na ausência do coro.
83 – 84: texto corrompido. A solução para os versos requer uma reconstituição que,
por um lado, considere a acomodação de palavras à métrica peculiar ao canto coral
e, por outro, esteja atenta para a coerência dos versos em questão na sua relação
com os versos precedentes e com os versos seguintes. Diante do problema,
renovamos nossa profissão de fé na edição estabelecida por Hutchinson. Mesmo
assim, a tradução não deixa de ser um problema. O que fica claro, entretanto, é que
estes dois versos tocam no âmago do drama vivido pelas mulheres do coro: a terrível
sonoridade de uma batalha que se aproxima trazendo as suas conseqüências
funestas.
85 – 86: estes dois versos aludem ao tema da torrente violenta e impetuosa
encontrada em Homero ( Ilíada: IV, 450-56; V, 87-88; XI, 492-95; XIII, 137-39).

93 – 94:os verbos r0u/omai e e0parkew demandam complemento. Como é o

corifeu que pergunta, deduzimos que os objetos deveriam ser tanto o próprio coro

quanto a cidade; Qew~n e Qea~n são genitivos partitivos que acompanham a

partícula interrogativa ti/j. Estes versos também servem para marcar a angústia

do coro e a intensidade de suas súplicas, que serão cada vez mais freqüentes daqui
por diante.
95 – 96: de acordo com Hutchinson (1994: 62) e Lupas e Petre (1981: 50), o verso 95
tem uma lacuna e a maior parte dos editores, para suprir uma necessidade métrica,

adicionou o adjetivo pa/tria antes do verbo potipe/sw, um subjuntivo aoristo

do verbo prospi/ptw.

101 –102: pe/plwn kai\ stefe/wn: genitivos de matéria que acompanham o

substantivo lita/na para especificá-lo. As estátuas dos deuses podiam ser

adornadas com guirlandas e peplos.

104 – 105: palai/xqwn 1Arhj é um apelo à autoctonia de Ares que, segundo a

mitologia, é o antigo patrono de Tebas. Ele gerou Harmonia e ajudou a Cadmo. Por
ser o motivador do cerco a Tebas, o coro lembra a Ares o seu vínculo com a cidade.

78
A oração do coro é toda ela reservada à invocação dos deuses olímpicos capazes
de ajudar a cidade neste momento e que mantêm uma profunda relação para com
ela. Em primeiro lugar, Zeus, o soberano do Olimpo e, com ele, dois motivos

importantes da dinâmica desta tragédia: o path/r e o te/loj. Em seguida,

três pares divinos são invocados. O primeiro, Atena e Posídon, forma um casal
funcional na lenda tebana. Foi Atena que ensinou a Cadmo a maneira correta de
semear os dentes do dragão por ele vencido. A semeadura representa a construção
dos alicerces políticos de Tebas. Posídon porque é o senhor dos cavalos e do mar.
O segundo, Ares e Cípris, é parente de Harmonia, esposa de Cadmo, e ancestral da
raça real de Tebas. Os dois deuses são chamados a agir em nome de um
parentesco verdadeiro, em um conflito que traz à tona a maldição que surgiu de um
parentesco excessivamente verdadeiro. O último par é formado pelos Latônidas.
Apolo, deus dos oráculos, diretamente relacionado à maldição dos Labdácidas,
carrega consigo o epíteto Lu/keioj, uma alusão ao mundo selvagem dos lobos.
O epíteto pode sugerir, também, a ameaça argiva, na medida em que é em Argos
que ele é assim chamado. Na esteira de seu irmão, Ártemis, a caçadora, representa
a mesma hostilidade selvagem. Protegia o caçador Parthenopeu, inimigo de Tebas.
Por fim, as deusas que representam igual perigo para Tebas: Hera, protetora do
casamento legítimo e Onca, que traz consigo a lembrança das portas da cidade
onde o destino dela e de seu rei está em jogo. A prece do coro se opõe, assim, à
prece de Etéocles no prólogo e esboça as estruturas profundas da cena central dos
escudos, onde os deuses da cidade são confrontados às divindades da destruição.

109 – 111: polia/oxoi é a forma dórica de poliou=xoj; doulosu/naj

é a forma dórica de doulosu/nh; u3per, acompanhado de verbos que implicam

aquilo que se quer obter ou evitar, significa “por causa de”.


114 – 115: estes versos continuam o desenvolvimento da imagem das ondas hostis
trazidas pelo vento de Ares, conforme anunciada nos versos 63 e 64. Conforme
comentários anteriores, esta imagem alude constantemente à maneira homérica de
descrever combates. Na Ilíada, canto 15, versos 381-3, Homero compara a descida
dos troianos contra o acampamento dos Aqueus como ondas atacando um navio,
com particular ênfase sobre a força do vento que empurrava estas ondas.

79
Doxmolo/fwn: tipo de elmo com uma crista ou penacho transversal. Omitimos na
tradução este detalhe por uma questão de comodidade do verso. Obviamente não é
o capacete que sofre a ação do vento, mas a crista transversal sobre ele.

116 – 121: as partículas a9lla, ga\r, de reencontram a sua função habitual

na estrutura sintática do discurso. Até então, o coro fora tomado de uma agitação que
pode ser verificada pela construção de frases entrecortadas. Agora, mais “calmo”, o
coro desenvolve a sua oração a passos mais largos.

119. kuklountai introduz o tema dos objetos circulares (escudos redondos, olhos

maléficos, etc.) que serão desenvolvidos mais adiante nos versos 389 e 390.
122 – 126: reaparece o tema dos barulhos sinistros produzidos pelos cavalos. A
descrição da aproximação do exército argivo termina com a ênfase no número sete

na tirada da sorte. Nesse caso, e9bdo/maij não está correto porque implica

numa confusão entre o numeral cardinal e o ordinal. Evidentemente, trata-se de um


sorteio para definir a porta em que cada varão deverá se apostar e não a reunião de
todos eles numa única porta, no caso a sétima.

128 – 132: Diogene\j é o epíteto dos reis em Homero e, na tragédia, aplica-se

freqüentemente à deusa Palas Atena; o3 q 0 i3ppioj pontome/dwn

a1nac são nominativos religados pela partícula te a um vocativo, no caso


Poseida\n. Observa-se que os dois epítetos tradicionais de Posídon são os dois
elementos que, para Tebas, simbolizam o perigo: o mar e os cavalos. A respeito de
seu tridente, foi com ele que Posídon afugentou os argivos. Ainda sobre Posídon, um
de seus emblemas era um peixe.
132 – 144: kh/desai/ t 0 e0nargwj: o poeta trabalha com uma outra
noção de khdomai. Ares deve demonstrar interesse pela cidade por causa de seu

parentesco com Cadmo, isto é, Ares era sogro de Cadmo; se/qen é genitivo iônico

de su/ e indica procedência.


151 – 153: a referência ao barulho das rodas das carruagens aparece na Ilíada,
canto V, versos 838-39: me/ga d 0e1braxe...a1cwn/ briqosu/nhi.
155 – 157: o coro revela a progressão e a aproximação do ataque argivo e, de certa
forma, toca num tema que reencontraremos nos versos 343 e 967: a loucura, a fúria.

80
156: po/lij a1mmi: “minha (nossa) cidade”.
165: e9pta/pulon qualifica a cidade de Tebas na poesia épica, lírica e trágica.
166 – 170: as preces do coro, outrora endereçadas a deuses específicos, são
endereçadas às divindades de caráter geral.
167: gaj: “terra ou cidade”; morfologicamente, há duas possibilidades: ou tomá-la
como sendo um acusativo plural ou um genitivo dórico. A posição do pronome

demonstrativo ta=sde no genitivo inviabilizaria a primeira possibilidade isolando o

acusativo plural, que não se aplicaria no contexto do verso.


169: mh\ prodwq 0: esta expressão veemente já apareceu, de outra forma, no
verso 104 e aparecerá, de outra, no verso 251.

170: e9terofw/nwi stratwi: o dialeto dórico de Argos difere do falar eólico

de Tebas, mas não constituía uma oposição entre duas línguas. O coro
superdimensiona esta diferença dialetal ao alinhar os argivos aos bárbaros. De fato, a
conquista de um território implica numa imposição lingüística aos derrotados. A
preocupação do coro parece ser essa.
171 – 180: klu/ete parqe/nwn...: a linguagem usada pelo coro para
invocar os deuses no final da litania relembra a linguagem usada no início da
invocação no verso 110.
172. xeiroto/nouj: o adjetivo descreve um dos gestos característicos da
suplicação.

Primeiro episódio (v. 182 – 286)

Construído com uma arte notável, o primeiro episódio é fundamental para a


tragédia porque, além de opor diretamente Etéocles ao coro das mulheres, executa
múltiplas funções na dinâmica do drama: coloca em evidência o perigo iminente que
ameaça a cidade e a firme resolução de seu rei; realça a importância da cena dos
sete discursos paralelos que compreende os versos 369 – 65; e contém, mesmo que
embrionariamente, a notável reversão dos papéis atuais por ocasião dos versos 653
a 719.

81
Neste episódio, poderíamos classificar o comportamento de Etéocles sob
dois ângulos de análise: no primeiro, ele é o rei-comandante pragmático, cônscio da
necessidade de reprimir a desordem que toma conta do interior de uma cidade já
ameaçada pelos forasteiros; no segundo, ele é o descendente de uma linhagem
amaldiçoada, o que faz com que recaia sobre o coro uma misogenia que pertence à
história de sua família.
Entretanto, há um conflito que se esconde por detrás desta controvérsia e
que aponta para duas formas distintas de religiosidade, de acordo com Lupas e
Petre (1981: 71-2): aquela do rei, cujos contornos cívico e oficial encarregam de
certificar à cidade a proteção divina; e aquela outra do coro, menos cívica, mas mais
pessoal, que se dirige com fervor místico às estátuas dos deuses. Este conflito
insere-se na rede de oposição que governa a tragédia: masculino e feminino; público
e privado; interior e exterior.
Nesse sentido, Etéocles e o coro ocupam posições simétricas e opostas. À
imaginária subversão feminina de que receia Etéocles, a tragédia verbaliza a
demasiada ameaça real encarnada pelos irmãos inimigos, ameaça esta que está no
bojo do comportamento coral sob a forma de uma importante pergunta: a destruição
dos Labdácidas envolveria a destruição de Tebas? O rei, que coloca em xeque a
existência da raça feminina será ele mesmo aniquilado pelas Erínias de sua raça.
Etéocles, que aparentemente está enraizado no contexto político, prova, pelo
excesso de suas atitudes, que ele está tão afastado da justa medida cívica quanto
as mulheres do coro também estavam com seu pânico excessivo.
181-186. A primeira seção do discurso de Etéocles é marcada pelas observações
mais gerais sobre os caracteres femininos. A condição feminina, qualificada pela
pejorativa qre/mmata, e o mundo dos homens regido pela convenção política,
anuncia o tema do episódio.
183. a1rista kai\ po/lei swth/ria alude, com uma ligeira modificação,
às fórmulas a1rista kai/ dikaio/tata e a1rista kai\
ka/llista, correntes nos discursos políticos na Atenas do século V a. C. (Lupas
e Petre, 1981: 73)
184. stratwi: “cidadãos”, conforme sugere o contexto.
187-190. Observações indelicadas e invectivas a respeito das mulheres são comuns
na poesia grega, cuja tradição remonta a Hesíodo e percorre Arquíloco, Simônides e

82
Hiponnax, até chegar a Eurípides. No entanto, a invectiva virulenta de Etéocles
pareceria desmedida se não fosse a dupla referência à casa ( cu/noikoj,

oi1kwi) e a presença de kratou=sa referindo-se a uma situação


administrativa incomum ao sexo feminino, que sugerem o crime de Jocasta.
Interessante notar o desenvolvimento argumentativo das situações opostas a que se
referem os dois dativos do verso 187. O verso 190 corresponde, assim, ao dativo
e0n kakoisi e o verso 189 ao dativo e0n eu0estoi. Os versos sugerem
que na memória de Etéocles ainda está viva a lembrança da queda de sua casa, da
desgraça familiar e da decadência política, eventos relacionados à linhagem dos
Labdácidas, cujo pivô teria sido Jocasta. po/lei, no verso 190, demonstra que
tanto a cidade quanto a família são os focos do problema.
188. twi gunaikei/wi ge/nei: “a raça feminina” ou “o sexo feminino”.
191-195. O perigo externo que ameaça a cidade tende a se tornar interno, de acordo
com a situação mostrada pelo uso de kai nun, quer dizer, os versos 191 a 194
tematizarão o conflito entre os forasteiros e os sitiados. As palavras qu/raqen e
e1ndoqen demarcam a fronteira de que estamos falando. Mas o perigo não está
somente do outro lado das fortificações tebanas. Etéocles representa uma
autoctonia caótica e problemática para a cidade.
191-192. diadro/mouj: os passeios pela cidade são uma característica das

mulheres em pânico; fuga\j qei=sai equivale ao simples fu/gein.


194. au0toi\ d 0u9p 0au0tw=n: esta expressão equivale ao pronome
a0llh/lwn; a justaposição de duas formas diferentes de uma mesma palavra é
um procedimento comum em poesia.
195. ta2n: resulta da crase de toi/ + a2n.
196-199. À força de ameaças, Etéocles tenta impor às mulheres do coro uma atitude
mais adequada ao lugar social que elas ocupam. Ele deixa escapar uma frase
curiosa (a0nhr gunh/ te xw1 ti tw=n metai/xmion) que pode
aludir ao crime de Laio contra Crisipo e a uma Jocasta viril, que anunciaria o
comportamento de Clitemnestra.
197. xw1: crase de kai\ + o9 ; tw=n : exerce função de pronome
demonstrativo.

83
198.yh=foj: provavelmente a decisão do rei.
199. leusth=ra...mo/ron: a lapidação mencionada por Etéocles é uma
punição exagerada. Está culturalmente relacionada à punição de transgressões
religiosas e sexuais
200-202. Os três últimos versos terminam com as considerações a respeito dos
papéis sociais e políticos adequados a cada gênero humano. Depois de Homero
(Ilíada, VI, 490-93), os autores gregos não se cansam de afirmar que o lugar da
mulher é dentro de casa.

Cena epirremática (v. 203 – 244)

Nesta cena, estabelece-se um diálogo entre o coro, que canta três pares de
estrofes que são diminuídos gradualmente em uma linha de par a par (cinco versos
para o primeiro par, quatro para o segundo e três para o terceiro) e o rei, que
responde por três trímetros invariavelmente. Esta construção singular pode sugerir
que o rei está tentando acalmar as mulheres do coro.
203-207. O vocativo w fi/lon Oi0di/pou te/koj tem duas particularidades
interessantes: a primeira é que estabelece um contraponto afetivo ao discurso de
Etéocles, marcado pela extrema agressividade com que tratou as mulheres do coro;
a segunda é que elas parecem responder ao rei, mas se endereçam ao filho de
Édipo revelando, ao mesmo tempo, a natureza do herói e do conflito do drama.
203-4. a0kou/sasa: ironicamente, as mulheres do coro parecem não ter prestado
atenção ao discurso de Etéocles, uma vez que elas estão preocupadas com o
barulho das carruagens e dos corcéis. Nesse sentido, a anadiplose o1tobon
o1tobon funciona como um sinal de que as mulheres do coro estão envolvidas
por sentimentos primários, o que explicaria também a redundância da expressão
a9rmato/ktupon o1tobon.
205. su/ric é uma palavra pertencente ao vocabulário musical.
208-210. A comparação refere-se mais às mulheres do que propriamente a
Etéocles, como podemos observar pelo desenvolvimento da metáfora náutica: diante
do terror que se apoderou das mulheres, Etéocles objeta que esse não deveria fazê-

84
las fugir através da cidade (cf. v. 191); ao invés disso, deveriam permanecer em
seus devidos lugares (cf. v. 200 e s.); a conseqüência é que elas expuseram a
cidade ainda mais diante do medo (ara mh\...hure mhxanh\n
swteri/aj; cf. v. 193 e s.). A imagem náutica, portanto, reforça que o piloto é a
mais importante figura da nau e que as mulheres devem permanecer somente em
seus lares.
208. ti/ oun: em Ésquilo geralmente serve para fazer a passagem de um estágio
de exposição para o próximo.
211-215. O coro enfatiza, agora, que seu desespero continha uma direção e um
propósito: daimo/nwn está colocado em uma posição estratégica e qeoi=si
reforça esta posição. Etéocles sabia disso no verso 185. Ademais, a imagem da
neve não é estranha porque ela formava a flecha de Zeus (cf. Ilíada 12, 280).
221. ka0k: crase de kai\ + e0k.
223. qeou\j kalou=sa não se refere à última expressão de medo do coro, pois
naquele momento não se tratava de invocação, mas sim de augúrios maléficos. O
que está em questão é a noção de bouleu/ou kakw=j que pode redundar
num perigo ainda maior para a cidade.
224-5. A interpretação destes versos também é confusa.O problema não estaria
numa hipotética linha genealógica mãe-filha-irmã, mas na justaposição de mh/thr
e de gunh\. Os versos 224-5 dizem que a “Obediência é mãe da Boa Fortuna e
companheira da Salvação”. Esta salvação poderia vir de Zeu/j Swth/r, ou de
alguma divindade independente, ou um artifício para substituir o feminino
Swthri/a por um nome masculino. Esta frase enigmática comporta múltiplas
interpretações e todas elas repousam sobre a mesma questão: o nominativo gunh\
figuraria realmente no texto de Ésquilo?
226. e1sti: “sim”, “de fato”.
230. xrhsth/ria é sinônimo de sfa/gia.
233-5. O coro continua professando a sua devoção fervorosa aos deuses e dia\
qew=n enfatiza que é somente por causa deles que a cidade continuará
preservada. Essa é a principal linha de argumentação do coro. Os termos
daimo/nwn, qew=n e qeou= aparecem logo no primeiro verso da antístrofe a,

85
da estrofe b e da antístrofe b, respectivamente. No entanto, parece que o coro tenta
conciliar sua devoção com a fé mais pragmática de Etéocles quando realça o papel
importante que exercem as torres na defesa da cidade.
236-8. Etéocles está definindo o objeto de sua censura conforme já havia parecido,
em linhas gerais, no discurso de abertura desta seção.
236. ou1toi é um advérbio; daimo/nwn...ge/noj não é uma expressão
pejorativa.
237. a partícula w9j, junto com a negação mh\ e o subjuntivo presente tiqh=ij
resultam numa oração subordinada final.
238. mhd 0 a1gan é uma locução adverbial.
242-4. Pela segunda vez (cf. v. 6-8), Etéocles toca no tema das premonições
sinistras que antecipam sua própria sorte: as lamentações que ele interdita ao coro,
mais tarde, serão usadas para honrar o seu cadáver.
242. nu=n transporta a ação do drama para um tempo futuro, marcando a
progressão dos acontecimentos.
244. bo/skw coloca Ares no nível dos seres inferiores e sugere a monstruosidade
relativa à guerra.

Esticomitia (v. 245-263)

Se na seção epirremática tivemos a impressão de que havia um


descompasso entre o discurso do rei e das mulheres do coro, esta impressão se
acentuará na seção esticomítica. Aqui, o rei e as mulheres expõem, cada qual, os
seus próprios sentimentos. O choque das frases que não se organizam de forma a
estabelecer uma verdadeira comunicação é causado pela ausência de partículas
que deveriam organizar e fazer a transição de um verso para outro. Aos barulhos
que o coro insiste em ouvir (v. 245, 247 e 249) Etéocles reitera o benefício do
silêncio (v. 250 e 252). Os dois interlocutores confirmam a necessidade de se evitar
a palavra (v. 262-3). A seção central da esticomitia (v. 251-7) evoca o tema da
escravidão.

245. kai\ mh\n...g 0 é uma expressão usada para enfatizar afirmações.


246. mh\ nu=n marca o estreito laço que liga a esticomitia e a seção precedente.

86
250. ou0 si=ga mhde\n...e0rei=j: o futuro precedido de ou0 e de mh\
é traduzido com força imperativa. A aproximação de si=ga e e0rei=j produz o
efeito de um oxímoro.
251-7. A escravidão surge como uma ameaça cada vez mais próxima de se realizar,
segundo a visão do coro. Atestam esta interpretação os vocativos usados que
sugerem uma certa hierarquia, partindo dos deuses gerais até chegar no deus
supremo: cunte/leia, qeoi\ poli=tai, pagkrate\j Zeu=. Para
Etéocles, o verdadeiro perigo vem do ge/noj gunai/kwn. E é exatamente
neste momento em que houve uma comunicação real entre ele e o coro.
252. e0j fqo/ron é uma fórmula de imprecação que corresponde ao ei0j
kora/kaj usado pelos cômicos gregos; sigw=sa é particípio presente de
siga/w, por contração.
253. mh\ me...tuxei=n: o acusativo com o infinitivo é uma forma comum
usada em litanias (Lupas e Petre, 1981: 92).
258-63. A última parte da esticomitia é marcada pela tentativa de entendimento que
se fundamenta num acordo frágil. Notar que o verbo a0kou/w abriu a seção e o
verbo siga/w, ironicamente, a fechou.
258. pa/lin e au têm o mesmo valor semântico.
260. ai0toume/nwi moi é um particípio absoluto; ei0 doi/hj, nos poetas
áticos, expressa um desejo ou uma súplica. Estranhamos esta construção
subordinada porque claramente é uma espécie de comando polido, revestido de um
caráter irônico.
261. le/goij a2n não é incomum e revela a ânsia do coro para obedecer.

Segundo discurso de Etéocles (v. 264-286)

Depois de ter conseguido o silêncio das mulheres do coro, Etéocles passa a


versar sobre os pontos fundamentais ligados à sua posição de comandante e que
são importantes para a defesa da cidade: as preces, os sacrifícios e a decisão
estratégico-militar.

87
Quanto ao primeiro ponto, ele aborda um tipo de oração mais conveniente
ao momento e, por isso, mais cívica na medida em que se ampara não no
desespero outrora demonstrado pelo coro, mas na confiança da vitória, o que é
suficiente para infundir ânimo nos cidadãos guerreiros. É uma maneira, também, de
reforçar os limites da atuação das mulheres.
O segundo ponto é uma promessa em caso de vitória que abrange o
sacrifício de animais e a oferta dos despojos inimigos aos deuses. Quanto ao
sacrifício que nos remete ao tema do sangue, não podemos nos esquecer que ele já
apareceu nos versos 43-5, só que relacionado ao exército argivo. Etéocles estaria
tentando angariar a simpatia divina para a causa tebana.
Quanto ao terceiro ponto, o seu discurso termina com uma decisão de
ordem militar, marcada não só pela antecipação aos fatos como também pelo desejo
pessoal do comandante de participar do combate. Há que se notar a insistência no
número sete (e9bdo/mwi e e9ptateixei=j) sugerindo o local em que
haverá o desenlace do conflito.
264. Etéocles ameniza o tom hostil e incentiva o coro a orar de maneira mais
positiva. Assim, é necessário ao coro permanecer no cenário e não retornar ao lar,
conforme o rei havia sugerido.
265. kai\ pro/j ge tou/toij: inicia um outro assunto.
266. cumma/couj einai qeou/j: o coro estava orando exatamente por
isso, como o demonstra os versos 130-4 e 145-50. O problema estava no conjunto
ritualístico e em suas conseqüências negativas para a cidade, conforme o
demonstra os diálogos que se iniciaram a partir do verso 182.
268-9. O problema que os comentadores observam nestes versos é a tensão entre
o0lolugmo\n e paiw/nison. Ambos os termos são usados para caracterizar
uma espécie de concerto de vozes, gritos, lamentos, todos relacionados ás práticas
ritualísticas. No entanto, haveria uma distinção: o peã (canto de guerra) seria o
equivalente masculino de ololu/gh e, nesse sentido, as mulheres não teriam
condição de entoá-lo. Este suposto equívoco se acentuaria pela reunião destas
práticas distintas em torno da noção de costume grego ( 9Ellhniko\n
no/misma), quer dizer, uma vez que não compete às mulheres este tipo de canto,
fica difícil falar em costume.

88
271. xw/raj...polissou/xoij: a distinção entre “terra” e “cidade” não é
precisa. Por isso a redundância.
273. A menção aos mananciais de Dirce e Ismeno ajuda-nos a situar a ação do
drama em um plano geográfico preciso.
274. eu cuntuxo/ntwn...seswme/nhj. Este verso é composto de
genitivos absolutos separados pela partícula kai\. O primeiro termo não requer um
substantivo porque a raiz tux nos dá o valor exato do evento que ela recobre.
275-278a. A interpretação destes versos é muito difícil devido ao alto grau de
corrupção do texto, colocando a autenticidade de algumas passagens sob suspeição
e a sintaxe indefensável do ponto de vista de alguns filólogos. Citamos uma
passagem da edição crítica de Hutchinson (1994: 87-8) “pro/ naw=n is
redundant after a9gnoi=j do/moij; ste/yw is implausible after
ai9ma/ssontaj ...qh/sein. polemi/wn e0sqh/mata is not
possible in either place (...) qeoi=sin is not wanted with the participle after
qew=n in 275; and it is certainly not wanted with the resumptive parenthesis w]d
0 e0peu/xomai, wich without it is implausible, with it, intolerable”.
275. ai9ma/ssontaj não requer, necessariamente, um complemento.
279-81. A palavra que encerra as últimas considerações de Etéocles é a mesma
usada pelo coro no fim da seção esticomítica.
282-6. De maneira geral, os versos abordam a participação do comandante do
exército tebano na batalha que se aproxima. É natural que Etéocles coloque-se
entre os sete campeões e comande o seu exército, até porque os heróis homéricos
– paradigma de comportamento para ele (cf. v. 683-85) – conduzem os guerreiros no
combate. No entanto, a metáfora do piloto da nau encontraria, neste ponto, o seu
limite de atuação e o paralelo entre o piloto e o chefe militar fica comprometido, já
que o que seria fortemente recomendado a um não seria conveniente ao outro. O
verso 282 do texto original (283 na tradução) guarda um enigma: Etéocles estaria
dizendo, somente, que ele fará parte de um grupo de sete guerreiros e, nesse caso,
não há ordem pré-estabelecida, ou que ele será o sétimo guerreiro, isto é, a ordem
dos seis guerreiros será definida posteriormente, mas o sétimo posto já foi reservado
para si mesmo? A interpretação deste verso repercutirá na compreensão do maior
ou do menor papel do destino na conjunção dos dois irmãos na sétima porta.

89
283. to\n me/gan tro/pon é uma locução adverbial cujo núcleo é a palavra
tro/poj.
284. epta- aproxima-se mais de e0co/douj.

Primeiro Estásimo (V. 287 – 368)

O primeiro estásimo é marcado pelo pânico coral expresso sob a forma de


uma meditação de caráter impessoal, quer dizer, no párodo o pânico era externado
por manifestações religiosas de maneira fervorosa e, do ponto de vista do rei,
inconveniente; agora, a manifestação é mais contida do ponto-de-vista
comportamental, mas não menos desesperadora.
Três temas abordados retratam a selvageria de uma guerra: a morte dos
homens e a violência contra as mulheres cativas; as crianças violentadas no seio
materno e a metáfora do fruto da terra que despenca ao chão.
O primeiro estásimo, por outro lado, marca um visível uso de expressões
homéricas nos versos 300, 316 e 322 (cf. Hutchinson, 1994:89). No verso 322,
quando imaginamos a queda de Tebas pela narrativa coral, automaticamente nos
lembramos da queda de Tróia.
287-294. O uso do símile de origem homérica (cf. Ilíada II, 308-16), ao mesmo tempo
em que eleva o estilo, aproxima o domínio cultural do domínio natural: coro=pomba e
sitiadores=serpente.
287. me/lei: o uso do verbo com sentido impessoal confunde a expectativa do
leitor;
ou0x u9pnw/ssei: é estranho esse verbo relacionado ao órgão cardíaco, mas
antigamente o coração, pensava-se, era a sede de pensamentos e emoções.
288. gei/tonej é feminino em Ésquilo e kardi/aj recupera ke/ar da linha
precedente.
291. w1j introduz o símile.

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295. toi\ me\n...toi\ de\: nominativos plurais dos artigos definidos
acompanhados do t-, configurando a conservação das antigas formas faladas pelos
dialetos eólio e dórico e pela língua épica.
296. pandhmei\ panomilei\ são sinônimos.
297. ti/ ge/nwmai é subjuntivo aoristo de gi/gnomai, usado em sentenças
independentes para caracterizar deliberação, incerteza.
300. confira Ilíada, IV, 518: xermadi/wi...o0krio/enti.
301. panti\ tro/pwi:são dativos que funcionam como uma locução adverbial
para enfatizar um apelo.
302. strato\n: o primeiro sentido é exército, mas o contexto sugere o uso de
“povo”.
304-311. O argumento do coro é concreto: qual o interesse dos deuses em
abandonar um solo tão próspero? Ademais, aparece, pela primeira vez, menção à
deusa Tétis, mulher de Oceano e mãe de todas as divindades que encarnam os
cursos de água.
304. gai/aj pe/don, baqu/xqon 0 aian: estas palavras aludem ao
tema da terra nutriz, que apareceu por ocasião da oração de Etéocles (cf. v. 15-6).
312. pro\j ta/d 0: aparece, normalmente, com imperativos ou equivalentes
semânticos.
315. a1tan=a1th: aparição, pela primeira vez, do tema da loucura.
316. a1roisqe é optativo do verbo a1row. O verso alude à fórmula homérica
encontrada na Ilíada, IX, 303 e na Odisséia, XXII, 253.
318-320. Nos versos 304-6, o coro está preocupado com a possível deserção dos
deuses de Tebas. O sentido da expressão eu1edroi/ te sta/qht 0, do
verso 319, embora seja desconfortável, pois eu1edroi/ não parece denotar uma
posição a partir da qual alguém possa defender uma cidade, trazida à luz do contexto
dos versos 304-6, é resolvida satisfatoriamente. O coro quer que os deuses
permaneçam em seus assentos, em suas sedes, em seus santuários.
321-332. O coro passa, rapidamente, das súplicas para o retrato das desgraças que
a cidade será submetida se for invadida pelos argivos, retrato este marcado por
descrições violentas. O tema dos cavalos, outrora relacionado aos inimigos (v. 50,
60-4, 80), agora é associado às mulheres tebanas (v.328).

91
321-325. Duas observações sintáticas: notar a oração infinitiva, cujo núcleo é o
infinitivo aoristo do verbo proia/ptw, declinando o nominativo em acusativo
(po/lin, w0gugi/an) e o agente da passiva (u9p 0 a0ndro\j
0Axaiou=) que modifica a voz do verbo perqome/nan.
322. doro\j é genitivo poético de doru. O verso alude à Ilíada, I, 3.
324/5. qeo/qen: os argivos são o instrumento dos deuses na destruição de Tebas.
326. ta\j está se referindo aos substantivos femininos ne/aj e palaia/j do
verso seguinte.
333-335. “É um fato lamentável ver as jovens donzelas serem apanhadas de suas
casas, prematuramente, e obrigadas a percorrerem até o fim uma odiosa jornada
antes mesmo do tempo reservado aos ritos habituais do matrimônio”. Essa é a idéia
geral dos versos. A procissão que ia da casa da noiva para a casa do noivo era o
ápice do ritual de casamento. O verbo diamei=yai joga com os dois sentidos:
atravessar o átrio da casa da noiva para ir até a casa do noivo e atravessar o átrio
como espólio de guerra para cair nas mãos dos argivos.
340. a1lloj a1llon: justaposição similar à encontrada no verso 194.
342. xrai/netai: a fumaça, como outros eventos descritos nos versos 340-2, era
vista como um sinal de conquista de uma cidade.
343-344. Os versos apresentam com violência os caracteres de Ares: a sua natureza
furiosa e a sua indiferença quanto à moralidade.
346. pro\j a0ndro\j a0nh\r é a justaposição de duas formas diferentes da
mesma palavra.
348. Os gregos do período clássico não matavam as crianças indiscriminadamente, a
não ser que uma delas representasse a continuidade de uma genealogia de
guerreiros nobres.
348. blaxai\ ai9mato/essai é uma hipálage.
351-356. Ésquilo concentra-se em descrever o comportamento dos agentes mais do
que a repercussão de suas ações.
356. Verso de difícil interpretação devido à corrupção do texto. Qualquer solução
para este verso não poderia ser considerada definitiva.

92
358-362. Reaparecem nestes versos, discretamente, as metáforas da terra e de seus
frutos (v. 358 e 361) e do mar hostil (v. 362). Os produtos da terra são jorrados em
confusão, formando ondas (cf. fore/w).
363-68. Passagem altamente condensada, em que há o contraste entre a infelicidade
de uma união forçada e a suposta felicidade de uma união consentida
sentimentalmente. 0Andro\j pode ser “homem” e “marido”, te/loj é “rito” e
“consumação” e e0lpi/j é “expectativa” de dor ou de alegria.
367. nu/kteron te/loj, que alude ao sexo e não à morte, é sujeito do infinitivo
aoristo molei=n.

Segundo Episódio (V. 369- 719)

Ao fim do primeiro estásimo, seis trímetros anunciam a chegada do espião e


a entrada de Etéocles. A maior parte dos editores julga que o coro divide-se em
corifeu e coreuta e, assim, cada qual recitaria três versos. Os dois grupos de versos
seguem simetrias de linhas e entradas. A simetria verbal ocorre nos versos 371
(spoudhi...podwn) e 374 (spoudh...po/da).
375-6. O mensageiro retoma seus relatos de onde tinha interrompido, ou seja, nos
versos 55-6. O que importa destacar é a sintaxe precisa da construção verbal da
língua grega. O advérbio a2n, ligado ao optativo le/goimi, denota que a ação
verbal, para se concretizar, depende de circunstâncias ou condições, implícitas ou
não. No caso, o particípio perfeito de ei1dw e seu complemento, que também foi
utilizado precisamente. Ele denota o estado presente – o conhecimento do
mensageiro – de uma atividade que começou ainda no prólogo quando ele retornou
ao acampamento argivo para de lá colher as informações do exército.
378-9. pó/ron d 0 9Ismenon...peran :trata-se do rio Ismeno que corria
ao longo do lado oeste de Tebas até que novos muros foram construídos por volta
do século VI a. C.. De acordo com a tradição, os sacrifícios deveriam ser feitos antes
de cruzar um rio. Sacrifícios desfavoráveis impediam a travessia do mesmo.

93
381. A oração comparativa é engraçada, pois as serpentes têm um comportamento
notável ao meio-dia: como são criaturas de sangue quente, descansam na sombra.
Mas a cobra era considerada um réptil temível.
384-6. Os três penachos parecem ter um significado importante, pois agitando-os no
campo de batalha, serve para instigar a tropa, assim como os sinos.
387. Tideu é preeminente entre os guerreiros argivos tanto quanto a lua entre as
estrelas, conforme expresso no verso 390. Por isso ela é cheia (v. 389) e não
crescente, como era comum nos escudos. O símile é perfeito nesse sentido.
391-94. Os últimos versos que caracterizam o comportamento de Tideu recuperam
temas já abordados: o som peculiar (392 boai: 378 bre/mei, 384 a0ute/w), o
ímpeto bélico (392 ma/xhj e0rwn: 380 ma/xhj lelimme/noj) e a
imagem animalesca (393 i3ppoj...w4j : 381 w9j dra/kwn). Sobre o
símile dos versos 393-4, à impaciência do cavalo antes do sinal da trombeta
corresponde os sentimentos de Tideu propriamente ditos.
391. u9perko/mpoij: a raiz komp é freqüentemente associada aos argivos.
Conferir os versos 404, 425, 436, 473, 480, 500, 538, 551, 554 e 794.
395. Ppoi/tou foi avô de Locrus e ajudou Anfíon e Zeto a construir Tebas.
396. fere/gguoj pertence à esfera do comércio e da justiça e está ligada às
noções de xre/oj (v.20) e ke_rdoj (v. 437).
397-99. Etéocles não responde a pergunta do mensageiro imediatamente. Ele
comenta o que foi descrito a respeito de Tideu e opõe aos seus acessórios bárbaros
a lança, arma clássica do hoplita. Quando, no verso 397, Etéocles emprega o
pronome e0gw/, pareceu que ele próprio – momentaneamente – enfrentaria Tideu.
Mas o pronome serve para realçar a decisão de Etéocles.
400-06. Etéocles relê a significação do emblema pintado no escudo de Tideu: a noite
descerá do céu para cobrir os olhos do herói e revelar o sentido verdadeiro das
palavras e das coisas, desmascarando o falso profeta que é Tideu.
402. tini/ não se refere a Tideu, mas a algum beneficiário qualquer.
406. th/nd 0 u3brin refere-se ao conteúdo do emblema de Tideu.
407-16. Estes versos são consagrados à caracterização e nomeação do guerreiro
tebano que enfrentará Tideu na primeira porta. São vários os motivos que
recomendam Melanipo: suas qualidades (v. 407-11), sua autoctonia (v. 412-13) e

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seu próprio nome, pois evoca a escuridão da noite pintada na superfície do escudo
de Tideu e o cavalo que figura na margem do Ismeno. Consciente ou casual, a
nomeação de Melanipo é bastante significativa para contexto na medida em que
pretende neutralizar os caracteres de Tideu.
407. A referência à procedência familiar é comum e reaparece no verso 504.
412. O mito dos Espartas é o mito de fundação de Tebas, que conta como Cadmo
matou o dragão habitante da região do Ismeno e semeou seus dentes em um
campo. Dos dentes semeados nasceram homens que começaram a se matar.
Somente cinco sobreviveram: Equíon, Pélor, Oudaios, Ctonios e Hyperenor.
414. e0n ku/boij...krinei sugere que as decisões de Ares são arbitrárias
(Hutchinson: 1994, 112).
415. o9mai/mwn ressurgirá nos versos 681 e 938-41 para marcar o fratricídio

enquanto que Di/kh –mh/thr sugere o fim trágico dos filhos do incesto.
417. a0nti/palon significa “adversário”, “inimigo”, mas é usado aqui no sentido
de “campeão”.
422-26. Capaneu, o segundo herói argivo, é descendente da raça dos gigantes,
maiores e mais fortes do que os mortais. Enquanto que Tideu foi descrito como um
bárbaro bem próximo da bestialidade, que insultava o profeta, o gigante Capaneu,
como toda a sua raça procedeu, cultiva a ambição e o orgulho a ponto de desafiar
os deuses. Mais precisamente, Capaneu queria imitar a Zeus. Em represália, Zeus o
fulminou com um raio.
426. Este verso reaparece em 549.
427-31. A descrição da arrogância de Capaneu é feita mediante a introdução do
discurso indireto (fhsin) no interior do discurso do espião.
431. Optamos por verter qa/lpesin, que a rigor significa “calor do sol”, por
“mormaço”, uma palavra mais coloquial para acentuar ainda mais o desprezo de
Capaneu pelas manifestações do poder de Zeus.
432-34. Interessante notar mais uma diferença entre Tideu e Capaneu. Enquanto
que Tideu pertence ao universo cosmogônico, Capaneu pertence ao mundo em que
a palavra (gra/mmasin) ocupa já um lugar. A sua única arma é a tocha
incendiária que substitui o calor do meio-dia (v. 431, 380) e que nos remete ao tema

95
do fogo dos versos 341-2 e restitui aos verbos fle/gw e zwpure/w seus
verdadeiros sentidos.
434. O verso é de pura sinestesia.
435. fwti/ pode ser dativo de fw~j(luz) e fw/j, que está no mesmo campo
semântico de a0nh/r. Optamos pela junção dos dois significados uma vez que o
contexto permite o jogo verbal.
437-39. Sob a aparência “terrível” do inimigo argivo, Etéocles descobriu a inutilidade
de sua jactância e um presságio de vitória em suas palavras ímpias, pois a jactância
de Capaneu provocará a fúria de Zeus.
439. kath/goroj pertence ao vocabulário jurídico.
440. Etéocles separa as palavras da ação.
441. Ésquilo dá ao verbo a0pogumna/zw a noção de a0pogumno/w.
447-50. Etéocles anuncia, enfim, o nome do herói tebano: Polifonte, aquele que
destrói muitos inimigos. Ao fogo de Capaneu ele responde com seu ânimo ardente
(ai1qwn). Polifonte difere do segundo herói tebano por sua retaguarda Olímpica.
448. te/taktai: à primeira vista, este perfeito sugere, pelo menos nesse caso, que
a escolha de Etéocles foi feita antes do segundo episódio.
452-56. O coro muda o tom do discurso com o uso de optativos no modo potencial,
os quais assumem contornos funestos. Os três últimos versos aludem aos perigos
da guerra relatados pelo coro no primeiro estásimo.
457-60. O nome do terceiro guerreiro argivo – Etéoclo – alude ao nome de Etéocles
e sugere, por um lado, a ambigüidade que marca a figura do rei-maldito, e, por outro,
que o lugar de Etéocles pode ser a terceira porta. Muitos comentadores
desconhecem a sua procedência e chegam a afirmar que Ésquilo o inventou
propositadamente para dublar um Etéocles extra-muro. Mas sabe-se que ele era
representado no monumento dos sete heróis argivos em Delfos (cf. Pausânias,
10.10.03.).
457. Interpolação para preparar a transição do leg 0 do verso 451 com o le/cw
do verso 458.
459. Pela primeira vez aparece a descrição da dinâmica do sorteio.
461-64. Os versos 461 e 463 do texto original estão se referindo ao mesmo
comportamento do animal. e0mbrimwme/naj corresponde a

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mukthroko/mpoij da mesma maneira que fi/moi e a0mpukthrej. Isso
se explica pelo fato de que cada parte do equipamento que serve para comandar o
cavalo se relaciona com a outra intima e mecanicamente. Assim, as rédeas de freio
estão relacionadas à focinheira e à região da boca e das narinas do cavalo.
461. i3ppouj, nesse contexto, é usado no gênero feminino.É uma questão de
gênero gramatical e não do sexo do animal.
465-69. Até agora, a descrição dos três heróis argivos segue uma linha de evolução
de caracteres gradativamente. Se entre Capaneu e Tideu havia uma diferença
significativa, entre Capaneu e Etéoclo também o há. Etéoclo é um hoplita, isto é,
pertence à esfera militar. Além disso, a linguagem escrita do mundo de Etéoclo
(gramma/twn) é um pouco mais elaborada do que no mundo de Capaneu. As
imagens dos escudos também acompanham a evolução da caracterização dos
guerreiros: o escudo de Capaneu portava um homem nu e a sua imagem falava; o
escudo de Etéoclo apresenta um hoplita e a sua imagem grita como fazia Tideu no
verso 392. A única semelhança é que ambos excedem nos termos referidos aos
deuses.
472-80. O terceiro discurso de Etéocles é o mais curto da cena central e é também
marcado pela confusão e pela incerteza. Desde o início, os versos 472 e 473
“brigam” entre si ao tentar o registro do momento da ação. Etéocles titubeou por um
instante. Ao anunciar o nome de Megareu, ele o faz mais pelas qualidades do herói
que podem neutralizar a postura do inimigo do que pelo presságio de sua vitória. O
verso 478 admite que, no confronto, Megareu pode morrer.
Dois temas gerais são abordados: o primeiro refere-se à autoctonia que parece
favorecer os tebanos, mas que pode surgir como um perigo quando observamos
que, em última instância, o cerco à cidade de Tebas é fruto de um desentendimento
entre os dois últimos descendentes da linhagem Labdácida; o segundo refere-se ao
contraste entre a aparência e a ação, pois diante da jactância de Etéoclo e das
palavras gravadas em seu escudo, Megareu evoca o símbolo da ação na medida em
que ele tem como arma os próprios punhos (v. 473). Na terceira porta, então, contra
Etéoclo, o dublê de Etéocles, estará Megareu, seu primo.
475. Este verso refere-se ao 461; eles integram o tema dos corcéis que perpassou a
tragédia. É a última aparição do tema.

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477-79. Ao contrário do juramento dos argivos por ocasião dos versos 46-8, a morte
de Megareu significaria um patriotismo bastante familiar na medida em que quitaria
uma dívida com a terra mãe (cf. v. 16).
480. O verso parece identificar o mensageiro aos inimigos argivos pelo uso do
imperativo ko/mpaze.
486-500. A descrição do quarto guerreiro argivo retoma, pontualmente, os temas
mais significativos das descrições dos três primeiros. Assim, Hipomedonte recupera
o delírio de Tideu e as ameaças incendiárias de Capaneu; seu nome refere-se aos
cavalos de Tideu e de Etéoclo; as serpentes de seu escudo recuperam a serpente
de Tideu.
488. 9Ippome/dontoj...tu/poj é uma perífrase do mesmo tipo da
expressão Polufo/ntou bi/a do verso 448.
489. a3lw: a rigor, a circunferência do sol ou da lua; aqui ela é usada se referindo à
circularidade do escudo.
491-96. O escudo de Hipomedonte é descrito com uma precisão de detalhes
superior aos dos escudos precedentes. O Tifão é um monstro pertencente à esfera
do caos e tornou-se um dos mais ferrenhos adversários de Zeus.
501-20. A réplica de Etéocles é articulada pontualmente sobre as precedentes
informações do inimigo argivo relatadas pelo mensageiro. Como a primeira
referência é a porta Athena Onca, Etéocles responde que a deusa, que mantém
estreita relação com a cidade (a0gxi/ptolij no verso 501 e gei/twn no
verso seguinte), considerado fator diferencial no combate.
Hiperbio é identificado com o adjetivo u9pe/rbioj e sugere a vitória da cidade,
enquanto que o nome de seu pai – Enopo –parece remeter à imagem das bacantes
do verso 498. O herói tebano é o único que tem em sua mão um escudo com
emblema: a imagem de Zeus, em pé, com um raio flamejante nas mãos. O confronto
entre Tifão e Zeus é figurativo, simbólico e mítico e, pela primeira vez, Etéocles não
recorre à interpretação dos signos nem à retórica para neutralizar o ataque argivo,
pois a vitória de Hiperbio estaria garantida já que, no mito, Zeus derrota Tifão.
Há que se ressaltar que Etéocles “vê” a intervenção de Hermes no conflito, o que
sugere que a previsão humana não é o único meio para a nomeação dos guerreiros
tebanos. Nesse sentido, a interferência de Hermes e as presenças de moiran e
tu/xhj no v. 506 e tuxw/n no v. 520 fornecem indícios decisivos para a

98
interpretação do episódio no que toca ao problema do momento da “decisão” de
Etéocles e da disposição dos guerreiros tebanos. Conhecemos o método de
disposição dos argivos diante das portas (o sorteio no elmo), mas não conhecemos
o método de Etéocles para escolher os tebanos, pois o texto não o explicita. Os
nomes podem ser pré-ordenados pelo rei, mas, a julgar por essa passagem, a
escolha, em última instância, sofre intervenção divina.
506. e0n xrei/ai tu/xhj permite a Hiperbio conhecer sua própria sorte.
513. stadaioj hstai: Zeus é colocado sentado na maioria das representações
artísticas, mas para acertar Tifão com seu raio, ele se levanta (Hutchinson: 1994,
125).
515. toia/de é um pronome demonstrativo que refere-se ao período seguinte.
521. O perfeito pe/poiqa é usado com precisão na medida em que demonstra
que a ação já concluída começou quando do discurso de Etéocles. Pela primeira vez
o coro demonstra plena confiança na vitória. Ao menos nesse duelo.
526-49. Depois de uma curta fórmula (ou3twj ge/noito), que marca sua
solidariedade com o canto coral, o mensageiro menciona o nome da quinta porta no
início do seu discurso, mas o nome do quinto guerreiro só será mencionado após
uma seqüência de detalhes que somam 10 versos. A descrição do guerreiro argivo
segue as linhas gerais das anteriores. No entanto, a tensão dramática cresce devido
à singularidade de Partenopeu e ao emblema de seu escudo.
Um detalhe interessante a se frisar no que diz respeito à porta de Bóreas é que
próximo dela há o sepulcro de Anfione, filho de Zeus e, junto dele, o sepulcro do
irmão Zeto, ambos partícipes da construção das muralhas de Tebas. A proximidade
da tumba fraterna com a sétima porta sugere um desfecho trágico tanto para
Etéocles quanto para Polinices.
Quanto a Partenopeu, nota-se que ele não é designado pelo nome do pai, mas por
uma alusão ao nome de sua mãe. Ele é filho de Atalanta, da mesma casta de
Ártemis e, como filho de mãe montanhesa, sua descrição física está repleta de
metáforas presas ao domínio da natureza. Além disso, é descrito como um efebo
(a0ndro/paij a0nh/r), uma idade marcada pela transitoriedade e pela
inquietação que, no fundo, é estranha à conduta de um guerreiro. Jogando com a
relação entre aparência e realidade, o mensageiro revela que o significado de seu

99
nome (parqe/nwn e0pw/numon) não corresponde ao seu ânimo (fro/nhma
w0mo/n) e ao seu olhar (o1mma gorgo/n).
O contraste entre a natureza híbrida de Partenopeu está na descrição do emblema
de seu escudo: a esfinge, monstro composto de caracteres diversos. A sua aparição
representa uma provocação e uma ameaça muito mais grave do que as outras, pois
a esfinge castigou Tebas durante tempos até que Édipo a destruísse. Nesse sentido,
o retorno da esfinge e o fato de ela estar agarrando um tebano podem significar uma
vitória sobre a estirpe de Édipo.
550-62. Etéocles recupera o desejo do mensageiro, singular em sua imprecação,
pois ele incide somente sobre o quinto argivo, e estende para o conjunto dos sete
guerreiros inimigos. Composto de 13 versos, o discurso do comandante tebano
abandona, pela primeira vez, a estratégia de neutralização do emblema do escudo
inimigo e deposita confiança de certa maneira exagerada em Actor que, embora seja
irmão de Hiperbio e cujo nome significa chefe, o que por si só sugere superioridade,
não contém caracteres à altura da ameaça argiva representada pela temível esfinge.
554. xei_r d 0 o9rai é uma sinestesia e um paradoxo.
556. glwssan e0rgma/twn a1ter sublinha o contraste entre o discurso vão
dos inimigos e a ação dos tebanos.
557. e1sw recupera o tema do confronto entre o exterior e o interior de Tebas,
enquanto que r0e/ousan evoca a imagem da torrente nos versos 85-6 e o verbo
a0ldai/nei nos remete ao domínio vegetativo.
558. A esfinge é denominada pela perífrase e0xqi/stou da/kouj.
560. e1cwqen ei1sw sugerem a confusão dos limites que separam o que está
dentro do que está fora; twi fe/ronti...pto/lin reduz a imagem temível
da esfinge a um mero ornamento gravado no metal do escudo argivo. Assim,
Etéocles afirma que o guerreiro argivo fracassará quando começar o choque das
lanças e dos escudos.
563-67. O coro abandona a habitual confiança para demonstrar preocupação,
situação já ocorrida no primeiro estásimo. No entanto, o verso 657 recupera a
imprecação do comandante com a partícula tou/sd 0, que se refere ao conjunto
dos sete guerreiros argivos.

100
568-596. A apresentação do sexto guerreiro argivo revela uma riqueza de detalhes
significativos para o andamento da ação, que vão desde a sua extensão (são 29
versos de descrição que superam os 24 versos do quinto guerreiro) e estrutura (o
esquema de apresentação rompe com a estrutura dos outros cinco discursos do
mensageiro, pois serve para estabelecer responsabilidades e designar os culpados,
algo até então oculto aos nossos olhos), passando por sua posição estratégica (é a
penúltima porta) até chegar na figura excepcional de Anfiarau.
Logo no início do discurso do mensageiro, Anfiarau é apresentado como um
guerreiro superior aos outros que o antecederam em qualidades morais: é
governado pela prudência (swfrone/staton) e pelo espírito profético
(a1ristov ma/ntin), enquanto que os outros são marcados pela arrogância,
pelo excesso e pela impiedade. Outro fator que o difere dos demais é que ele não
impreca contra Tebas em si mesma; ele não tem nenhum emblema em seu escudo
(cf. v. 591) e, portanto, não é inimigo da cidade.
Após uma breve menção às qualidades de Anfiarau, o mensageiro relata os alvos
das invectivas do adivinho. Ésquilo parece ter jogado com o significado de seu
nome: 0Amfi-a9raoj (o homem de dupla maldição). De fato, ao invés de atacar
Tebas, ele dirige suas maldições a dois dos maiores capitães do exército argivo:
Tideu e Polinices.
O primeiro ataque verbal, relatado pelo mensageiro em discurso indireto, é
endereçado a Tideu e pode ser tomado como uma resposta ao insulto que Tideu
endereçou a ele por ocasião do verso 383. Tideu é, segundo Anfiarau, um homicida
que se refugiou em Argos após ter assassinado um membro de sua família; um
agenciador e maestro das desgraças de Argos (tara/ktora no verso 572 e
me/giston dida/skalon twn kakwn no verso seguinte); um
provocador (klhthra) das Erínias e ministro (pro/spolon) da carnificina; e,
pro fim, é o grande responsável pelos males de Adrasto, pois teve participação ativa
na decisão do rei na organização da expedição contra Tebas.
O segundo ataque, relatado pelo mensageiro na forma de discurso direto, é
endereçado a Polinices, cuja menção é muito rica de significações, além de ser a
primeira vez que seu nome aparece na tragédia, o que pressagia a identidade do
sétimo guerreiro argivo. Anfiarau glosa sobre a etimologia de Polinices e o seu
discurso é coerente e articulado, diferentemente dos sons inarticulados e das

101
ameaças monstruosas de seus antecessores. O adivinho reprova a Polinices por
lutar contra a terra paterna, de se comportar como um estrangeiro hostil ao dirigir
uma expedição que assume um aspecto injusto na medida em que é caracterizada
pela impiedade e pelo matricídio. Nesse ponto, a ambigüidade da expressão
referente ao matricídio realça ainda mais a riqueza do verso já que alude ao
elemento mítico do drama: a fonte materna pode ser os mananciais de Dirce e do
Ismeno (cf. v. 307) e também o ventre de Jocasta, que secaria com a morte de
Etéocles e Polinices.
A condenação de Anfiarau à expedição comandada por Polinices é grandiloquente,
pois alia a visão de profeta com o seu conhecimento da verdade e a virtude do bom
homem com seu conhecimento da moralidade. Além disso, revela que a expedição,
por ser profundamente funesta, está fadada ao fracasso, conforme expressam os
versos 587-89. Com sua visão clara dos acontecimentos, ele sabe que irá morrer e
sua honra de guerreiro está justamente na aceitação de seu destino.
Nesse sentido, é evidente o contraste entre o profeta que tem a visão aguda dos
acontecimentos e a previsão da catástrofe, e a cegueira de Etéocles, que se
pretende senhor das palavras adequadas, que examina o verdadeiro significado dos
escudos argivos, mas que é incapaz de prever e se prevenir de seu destino. O
discurso do mensageiro poderia alertar a Etéocles em dois pontos: a aproximação
das Erínias quando da alusão a Tideu e a identidade do sétimo guerreiro argivo
quando da menção do nome de seu irmão Polinices, os dois contidos no discurso do
profeta Anfiarau.
568. swfrone/staton inicia o contraste entre Anfiarau e seus antecessores.
576. auqij marca o início do segundo alvo do ódio de Anfiarau.
577-8. Os verbos e0cuptia/zwn e e0ndatou/menoj são de difícil
interpretação, até porque na edição de Hutchinson os versos em que eles se
localizam são colocados sob suspeita. O nome de Polinices é glosado para
estabelecer um jogo de significados partindo de sua etimologia.
581. Os grandes feitos eram transmitidos e celebrados pelas gerações seguintes.
Por ser um feito sacrílego, a expedição chefiada por Polinices não tem mérito e nem
glória.
585. patri/j gaia: é a primeira vez que a terra é associada a Édipo.

102
589. É uma clara resposta de Anfiarau a Tideu que o acusou de ser bajulador do
destino e do combate por ocasião do verso 383.
597-625. O discurso de Etéocles difere de seus outros discursos não por não ter
“atacado” as características de Anfiarau – em linhas gerais, Anfiarau é “elogiado” por
Etéocles -, mas, sobretudo, pelo que ele não disse. Anfiarau citou claramente Tideu
e Polinices em seu discurso como personagens centrais na expedição contra Tebas.
Que Etéocles já havia atacado Tideu, isso ficou demonstrado nos versos 397-416,
pois foi o primeiro argivo descrito pelo mensageiro. No entanto, ele perde a chance
de atacar o seu irmão Polinices diante do que expôs a ele o mensageiro, preferindo
o desenvolvimento de imagens para ilustrar um cenário otimista para o desfecho da
batalha. Fato é que Anfiarau antecipou o nome do guerreiro argivo que estará na
sétima porta. Se Polinices compõe o grupo dos sete guerreiros argivos e o nome dos
seis primeiros foi revelado pelo mensageiro, sobrou a sétima porta para ele atacar e
soa estranho o fato de Etéocles não ter se dado conta disso.
O discurso de Etéocles começa com a recuperação da metáfora vegetativa que
apareceu no discurso do mensageiro (593-4) e a associa ao domínio das relações
comerciais (cunalla/ssontoj no v. 597 e e0n panti_ pra/gei no v.
599) para sublinhar a condição de Anfiarau. A essa metáfora, elaborada em termos
vagos e, até em certo ponto, ambíguos, articulam-se duas outras metáforas
extraídas, de um lado, da navegação, já usada por Etéocles no prólogo e no primeiro
estásimo, e de outro, da política, para ilustrar as conseqüências nefastas da
associação de um homem justo com homens ímpios.
A primeira metáfora se explica pela crença de que um navio composto de
marinheiros fascínoras, mesmo contendo um homem justo, está fadado ao
naufrágio. A segunda caminha no mesmo sentido: um homem justo, associado aos
concidadãos que têm hostilidade aos estrangeiros, também é alcançado pelo castigo
divino. Essas metáforas, portanto, refletem a condição de Anfiarau e, nesse sentido,
soa como um elogio.
Nos versos 609-14, Etéocles explica as metáforas aplicando-as num contexto mais
real. Listando as quatro virtudes de Anfiarau (sw/frwn, di/kaioj,
a0gaqo/j e eu0sebh_j) e associando-o à expedição a despeito de seu
próprio julgamento (bi/ai frenwn), Etéocles conclui que ele partilhará do
mesmo destino dos seus comparsas.

103
No entanto, o comandante é incapaz de perceber a similitude profunda que une o
seu destino ao destino de Anfiarau: se o adivinho é um homem justo que embarca
no navio de marinheiros nefastos, o que dizer de um navio de marinheiros justos
conduzidos por um capitão amaldiçoado? No caso específico, o que dizer de uma
cidade de cidadãos pios governados por um rei maldito? Todas as metáforas que
Etéocles aplicou a Anfiarão, inversamente, servem para si próprio.
A apresentação de Lastene (v. 620-25) reúne a sabedoria própria de um ancião com
o vigor da juventude, o que fazem dele um guerreiro tebano um adversário à altura
de Anfiarau. No entanto, o sucesso do guerreiro tebano parece, mais uma vez,
depender de auxílio divino.
601. O verso explica karpo_j no verso 600 e sugere o crime de Laio e suas
terríveis conseqüências pela presença da palavra a1th.
606. e0xqroce/noij designará um crime particularmente grave para os gregos,
que é a violação das leis da hospitalidade prescritas por Zeus protetor dos
estrangeiros. A passagem alude ao motivo da guerra de Tróia e ao crime de Laio.
609. ui9o_n Oi0kle/ouj: é a primeira vez que Etéocles cita a descendência
de um inimigo.
613. Etéocles pode ter se referido ao caminho do Hades.
620. Lasqe/nouj bi/an: Etéocles responde com a mesma perífrase que
apareceu por três vezes no discurso do mensageiro.
631-52. Se Etéocles não havia percebido, através das informações de Anfiarau
relatadas a ele pelo mensageiro, por ocasião da definição do guerreiro argivo na
sexta porta, que Polinices faria parte do grupo dos sete guerreiros argivos, agora o
mensageiro confirmou a ele a identidade do sétimo guerreiro: é Poliníces, seu irmão.
Sendo assim, o encontro entre os dois irmãos na sétima porta já vinha sendo
desenhado anteriormente. Primeiramente pelo fato de Etéocles, no fim do primeiro
episódio (v. 282-6), ter anunciado a sua participação no combate, restando saber em
qual porta ele combateria. Como ele não se precipitou para lutar em nenhuma das
seis primeiras portas e, na sexta, ele soube que Polinices estaria entre os sete
argivos, naturalmente o encontro entre eles se daria na sétima porta, a não ser que
ele declinasse do combate. Soa estranha a “cegueira” do comandante da nau diante
das evidências fornecidas a ele pelo mensageiro. Vale ressaltar que é muito
significativa a invocação das Erínias e da Ará no prólogo do drama (v. 70), o que

104
quer dizer que Etéocles sabia dos termos da maldição, uma vez que o momento
bélico vivido entre Tebas e Argos está inserido num contexto mítico do qual Etéocles
já demonstrara saber as suas conseqüências. Do contrário, não faria sentido a sua
invocação.
Ademais, a apresentação de Polinices que, de certa forma, começa no discurso de
Anfiarau condenando a sua integridade moral, continua no relato do mensageiro e é
importante para se formar um quadro psicológico do herói argivo. Diferentemente
d’As Fenícias, de Eurípides, em que ambos travam um agón, de modo que cada um
se apresenta conforme o caráter e o pensamento, de acordo com Aristóteles, temos
apenas alguns versos que nos permitem caracterizar Polinices e, mesmo assim, em
relato de terceiros.
Na apresentação de Polinices encontramos alguns dos caracteres que fazem parte
da conduta dos seis primeiros argivos. Ele não se contenta em ameaçar a cidade
como Capaneu e Partenopeu (cf. a0peilei dei/na nos versos 426 e 549),
mas maldizê-la (cf. a0ratai no v. 633). Seu objetivo não é só escalar as muralhas
como Etéoclo (cf. verso 566 e seguintes), mas entoar, do alto, um cântico de
conquista (cf. e0peciakxa/saj no v. 635) que está no cerne do êxtase
dionisíaco (cf. 1Iakxe, nome místico de Dioniso), semelhante àquele que
arrebatou Hipomedonte no verso 498. Por último, ele deseja, vivo ou morto,
participar do destino de seu irmão.
O seu escudo é diferente dos outros por um detalhe único: ostenta um guerreiro
armado, representando ele mesmo, um tebano de nascimento, conduzido por uma
mulher, a Justiça, que conduz o herói de volta ao lar paterno e à terra de seus
ancestrais.
631-41. Há três pontos a destacar nesse conjunto de versos. Em primeiro lugar, a
insistência sobre o fatídico número sete e o anonimato da sétima porta. Em segundo
lugar, o trabalho com as preposições: kateu/xetai no verso 633; e0pemba/j
e ka0pikhruxqei_j no verso 634; e0peciakxa/saj no verso 635 e
cumfe/resqai no verso 636. Em terceiro lugar, entre o verso 632, que contém a
primeira alusão a Polinices e a menção explícita a seu nome no verso 641, há uma
crescente tensão dramática.

105
634. ka0pikhruxqei/j: um heraldo anunciará Polinices como vencedor e rei
legítimo do trono de Tebas.
636. ktanw/n qanein pe/laj: Polinices ficaria satisfeito se morresse desde
que pudesse matar seu irmão.
649-52. Os quatro versos que marcam a saída do mensageiro são, formalmente, o
desfecho de seus relatos iniciados nos versos 375-6. A dupla repetição de
su/ d 0au0to_j gnwqi como “convite” para que Etéocles reflita antes de
tomar uma importante decisão sugere, por um lado, o estado de isolamento no qual
se encontra o rei e, por outro, através do uso do pronome au0to_j, que o
guerreiro ideal para enfrentar Polinices é o próprio Etéocles, devido à sua dupla
responsabilidade: a política, por ser comandante da nau da cidade, e familiar, por
ser ele mesmo o motivo do retorno de Polinices.
653-76. A réplica de Etéocles segue o modelo estrutural dos outros discursos
precedentes, principalmente pelo procedimento de reinterpretar o emblema contido
no escudo do inimigo e refutá-lo para depois designar o guerreiro tebano capaz de
superar o inimigo. O discurso é organizado formalmente, articula-se com outras
passagens do drama e projeta os eventos futuros.
A réplica é aberta com uma tripla lamentação (v. 653-55) que traz à tona a Ará e a
maldição de Édipo que foram evocadas no início do drama (cf. v. 70) e, daqui em
diante, dominarão o restante do drama. O nome de Édipo, que fora mencionado pela
primeira vez no prólogo e por duas vezes pelo coro através da expressão “filho de
Édipo” (cf. v. 203 e 372) será nome recorrente junto com as Erínias.
Os versos 656 e 657 finalizam a lamentação em tom solene e ambíguo. Etéocles já
havia demonstrado no primeiro episódio repulsa às manifestações de medo e
lamentações das mulheres do coro. As palavras do comandante são coerentes com
sua conduta anterior. O emprego de teknwqhi está preso ao domínio das
relações comerciais, mas sugere o incesto que gerou os filhos de Édipo. A partir do
verso 658, Etéocles ataca ironicamente as pretensões de Polinices, continuando o
jogo etimológico sobre a eponimia anunciado por Anfiarau (cf. v 577 e seguintes), e
revelando, com profundo rancor, as diversas fases da vida de seu irmão (v. 664-66)
para culminar no ataque à imagem da Diké sobre seu escudo.
Etéocles afirma que a Justiça nunca esteve ao lado do irmão em nenhum momento
de sua vida (cf. as seqüências de ou1te nos versos 664, 665, 668 e ou0de no

106
verso 667) e ela não poderia estar junto dele no momento em que ele atacará sua
terra natal, voltando-se contra seus familiares e os deuses tutelares da cidade, sob
pena de portar um nome falso (yeudw/numoj no v. 670). No entanto, esse jogo
etimológico pode ser muito perigoso: se o nome da Justiça é falso, todos os nomes
são falsos, inclusive o nome de Etéocles.
Depois de “demonstrar” que a Justiça não pode estar do lado de Polinices, Etéocles
não prova de que maneira ele poderia estar ao seu lado, apenas se convence
(pepoiqw_j no v. 672) do seu silogismo e ampara a sua decisão estratégico-
militar no universo da Di/kh usando o comparativo e0ndikw_teroj.
Os versos 674-5 recobrem todos os aspectos do confronto entre os dois irmãos: o
político, o pessoal e passa pelo centro do problema, que é o parentesco.
653. qeomane/j e qewn...stu/goj realçam a participação dos deuses nos
eventos.
655. O verso significa que o fratricídio ocorrerá porque Etéocles já se resolveu pelo
confronto.
663. e0kei/nou é pejorativo no contexto; substitui o nome de Polinices.
664. fugo/nta alude, talvez, ao exílio de Polinices.
672. tou/toij pepoiqw_j, quer dizer, porque a Justiça não pode estar do
lado de Polinices diante daquilo que foi demonstrado anteriormente.
673. au0to_j é enfático, pois o verbo na voz média já indica interesse do sujeito
na ação.
677-82. A réplica do coro rompe com o pacto formal e estratégico que começara no
fim do primeiro episódio e se mantivera na cena central. O tom emotivo das
donzelas tebanas retorna nessa cena.
Em resposta ao Oi0di/pou ge/noj do verso 654, que salienta o tema da
maldição dos últimos descendentes da linhagem dos Labdácidas, o coro ameniza o
tom dos eventos ao se referir a Etéocles como o fi/ltat 0a0ndrwn e
Oi0di/pou no verso 677. O conselho do coro incide sobre um tema que Etéocles
fazia questão de ressaltar: o limite entre os que estão fora e os que estão dentro de
Tebas. Ao decidir enfrentar seu irmão, ele confunde esse limite através de
o9moioj o0rgh_n no verso 678.

107
Ainda no verso 678, o coro continua o jogo etimológico em torno do nome de
Polinices, começado por Anfiarau e adotado por Etéocles, através da perífrase twi
ka/kist 0au0dwme/nwi, que pode ser interpretada de duas maneiras:
interpretando como voz passiva obteremos “com aquele que é chamado
pessimamente” ou como voz média obteremos “com aquele que diz infâmias”. Na
tradução, adotamos a segunda possibilidade.
O coro termina a sua réplica argumentando que já há sangue o bastante a ser
purificado entre argivos e tebanos , mas que a consangüinidade dos heróis, uma vez
derramada em solo tebano, jamais poderá ser purificada.

Cena Epirremática (V. 683-719)

683-85. Etéocles se ampara numa argumentação digna dos heróis homéricos ao


trabalhar com noções fundamentais da cultura da vergonha (ai0sxu/nhj no
verso 683 e kakwn de/ ka0isxrwn no verso 685) aliada à noção de
eu0klei/an no verso 685, que compõem o jogo etimológico em torno de seu
nome.
686-88. O coro rejeita os valores heróicos propostos por Etéocles: não é o desejo de
glória que o precipita ao combate, mas um e1rwj kako/j. O verso 687, que
contém dori/margoj, um produto da Ate, recorda o verso 380 em que Tideu
demonstra margwn kai ma/xhj lelimme/noj. Por outro lado,
qumoplhqhj e dori/margoj aludem ao verso 661 do discurso de Etéocles.
689-91. Etéocles contra-argumenta baseado na metáfora marinha, bastante usada
anteriormente, mas que agora sofre um ajuste: o piloto prudente, observador e
avisado do prólogo, abandona o barco que é levado pelo vento, ao sabor da sorte,
até o Hades, através do rio Cocito. No entanto, a turbulência externa que se abate
sobre a nau tem um responsável: qe/oj (v. 689) que, na verdade, é identificado
como sendo Apolo, conforme aponta o verso 690.

108
689. Etéocles identifica a mão de um deus não na sua insanidade interior, como o
coro insistiu, mas na conjunção entre ele e seu irmão na sétima porta. Confira,
adiante, qewn dido/ntwn no verso 719.
692-94. A antístrofe desenvolve as mesmas idéias contidas na estrofe quando
aborda o desejo incontido (w0modakh/j) de Etéocles de verter sangue impuro
(ou0 qemistou). Ressalte-se também o retorno da metáfora vegetativa aplicada
ao tema do sangue impuro (pikro/karpoj).
695-97. O conjunto dos versos tem dois aspectos interessantes: o primeiro, é o
alinhamento de fi/lou e e0xqra/, noções contraditórias, o que significa dizer
que Etéocles não odeia a seu pai, embora pese sobre ele a sua maldição; o
segundo, é a personificação da Ará, cujo olhar é impressionante e, pelo seu assédio,
sugere que Etéocles está sendo governado por forças superiores, até porque a Ará
o aconselha (le/gousa). Sobre o significado desse conselho, o ke/rdoj tem a
mesma noção do verso 684: se ele retroceder, retardará a sua morte, mas não terá
honra nenhuma.
698-701. O coro argumenta que Etéocles não será chamado de covarde se ele não
aceitar o duelo com Polinices para preservar a sua vida e que as Erínias sairão de
sua casa através da oferenda de sacrifício aos deuses.
702-4. Etéocles sente-se abandonado pelos deuses.
705-8. O coro retoma o0le/qrion mo/ron do verso 704 para transformá-lo
em sujeito de pare/staken do verso 705. Do verso 706 até o 708, a imagem á a
do vento que chega para modificar os eventos. Note-se que o advérbio i1swj e o
optativo no verso 707 colocam o evento como realizável no futuro.
709-11. Etéocles aceita a ação do daí/mwn e retruca que a maldição de Édipo está
agindo nos eventos. A aparição do fantasma em seu sonho transforma esse evento
numa fatalidade mais natural e, nesse sentido, verdadeira (cf. a0lhqeij no v.
710).
712-19. A esticomitia marca o ponto culminante da ação, pois é o momento em que
o rei deixa definitivamente o cenário para lutar contra seu irmão. O verso 712
começa com um apelo do coro que toca no sentimento misógeno externado por
Etéocles no primeiro episódio. Ao conselho do coro (v. 714), argumentando que a
vitória de Tebas ainda que sem glória de seu comandante também honra aos

109
deuses (v. 716), Etéocles mostra-se inabalável e resoluto (v. 715), invocando a sua
honra de hoplita (v. 717) e concluindo com a máxima segundo a qual não se pode
fugir do destino se ele foi enviado pelos deuses (v. 719).
720-26. A estrofe que abre o segundo estásimo (720-91) é construída com
perífrases articuladas em torno do substantivo 0Erinu_n(v. 723), uma tentativa
difícil de descrever, do ponto-de-vista coral, uma divindade ou0 qeoij
o9moi/an (v. 721). O epíteto panalhqh kako/mantin contrasta com os
“bons profetas” Tirésias e Anfiarau, revelando que a profetisa central da tragédia são
as Erínias.
727-33. Na primeira estrofe as Erínias estavam relacionadas à esfera estritamente
doméstica, enquanto que a antístrofe é responsável por introduzir a figura do
estrangeiro Calibo, recuperando, assim, a oposição interior/exterior que reverberam
em toda a tragédia. Nota-se que 0Erinu_n e si/daroj ocupam lugares
correspondentes na estrutura da estrofe e da antiestrofe, respectivamente. O
estrangeiro Calibo é o liquidador da herança e pergunta-se se há uma relação entre
a sua aparição no canto coral e as visões fantasmagóricas do sonho de Etéocles
nos versos 710-11.
734-41. A segunda estrofe marca a preocupação do coro em relação ao fratricídio e
ao sangue vertido e que não se pode purificar, tema do miasma já antecipado no
verso 682.
742-49. Os dois últimos versos da segunda estrofe conjugam os males presentes
com os males antigos e a antiestrofe desenvolve o passado da linhagem real de
Tebas tematizado pelo coro, que aborda a condição imposta pelo Oráculo de Apolo
a Laio (cf. qna/iskonta...po/lin) e a sua desobediência como fator
originário da parbasi/an w0ku/poinon do verso 744 e que alcança a
terceira geração.
750-57. O sujeito do particípio krathdeij é Laio e pergunta-se se o agente que
forçou a transgressão por vias amorosas foi Jocasta, pois no verso 200 Etéocles
destila todo seu ódio contra as mulheres do coro, revelando uma misogenia que
pode ter tido origem no interior do palácio real. A respeito da descrição da
fecundação de Jocasta (v. 753-55), toda ela é construída com base na metáfora

110
vegetal. Pergunta-se, por outro lado, a quem se refere numfi/ouj no verso 757:
a Édipo e Jocasta ou a Laio e Jocasta?
758-65. Retorna do mar agitado a onda que castiga a nave da cidade. No entanto, a
onda não é representada, agora, pelo exército argivo, mas pela estirpe dos
Labdácidas, como se pode notar pelo genitivo kakwn que recupera os relatos dos
versos 740 a 757 e pelo número três (tri/xalon no verso 759) que recupera
ai0wna e0j tri/ton no verso 744. No verso 764 o sintagma su_n
basileusi refere-se à linhagem real de Tebas, com exceção de Polinices, que
não é rei.
766-71. O conjunto dos versos anuncia a queda da linhagem real de Tebas, pois
bare/iai katallagai/ do verso 767 deve se referir ao encontro dos dois
irmãos que culminará no fratricídio como componente primordial da a0ran
palaifa/twn do verso 766.
772-77. Os versos descrevem a excepcional admiração que Édipo tinha entre os
deuses e os homens, configurando o verdadeiro sentido de o1lboj no verso 771.
778-84. Os versos descrevem superficialmente as circunstâncias vividas por Édipo
quando de seu casamento com Jocasta e que culminaram no auto-cegamento e na
maldição que será abordada nos versos seguintes.
785-91. Os motivos da maldição de Édipo não são claros: a que evento se refere
precisamente a0qli/aj trofaj? Sabe-se que Édipo foi privado de uma honra
a que ele tinha direito e que os filhos não assumiram após ficarem sabendo da
desditosa vida do pai. No verso 791, encontramos como epíteto das Erínias o hapax
kamyi/pouj, um paralelismo morfológico do nome de Édipo (Oi0di/pouj)
que sugere uma correlação entre o pé inchado de Édipo e os pés tortos das Erínias.
792-99. O mensageiro retorna para comunicar às mulheres do coro que a cidade
está salva. No verso 795, a cidade aparece, pela última vez, metaforizada na
imagem da nau.
803-10. Breve esticomitia marcada pela tentativa do coro de entender as
informações anunciadas pelo mensageiro. Notar que entre os versos 807 e 810 o
coro atravessa a narrativa do mensageiro com lamentos e perguntas.
811-21. Os versos acentuam o tema da consangüinidade iniciada no episódio
precedente. Notar a insistência lexical, quase obsessiva, que delimita o tema da

111
identidade: au9tou_j e a3ma no verso 811; a0mfoin no verso 812; dissw_
no verso 816; basile/oin no verso 820 e a0llh/lwn no verso 821.
822-31. O canto coral recupera os versos 814-16 e formula, através do adjetivo
interrogativo pó/teron, uma pergunta de duas vias (xai/rw
ka0pololu/cw...ou klau/sw), o que demonstra um estado de indecisão. O
verso 829 exige que o verso seguinte apresente dois nomes próprios: Etéocles e
Polinices. Mas há uma lacuna onde deveria constar o nome do comandante de
Tebas.
834. Notar que o segundo acusativo (kardi/an) é uma parte da pessoa denotada
pelo primeiro (me).
836-7. O coro ainda não viu o cadáver dos dois irmãos. Apenas confiaram na
palavra do mensageiro.
841-2. A maldição de Édipo e a desobediência de Laio aparecem imbricadas na
conseqüência fatal que envolveu os dois irmãos.
843. O uso do verbo no presente sugere que ainda há mais eventos para acontecer,
o que explica o sentido do verso 842.
848-50. A manifestação do coro dá a entender que os cadáveres agora estão
expostos aos olhares da cidade: ta/de nos versos 848 e 850 e prouptoj no
verso 848.
853-60. O coro sugere haver uma procissão que acompanha os cadáveres e
metaforiza o evento através da imagem da nau de véu negro que atravessa o
Aqueronte e vai em direção ao Hades.

Nota sobre o êxodo (vv. 861-1078)

O êxodo da tragédia Os Sete contra Tebas é um campo de batalha da


crítica – principalmente filológica – que reúne argumentos que tentam comprovar a
interferência de um interpolador nos últimos217 versos, o que significa dizer que
eles não teriam sido escritos por Ésquilo. O interpolador, provavelmente, quis fazer
uma ligação entre o final d’ Os Sete e o começo da Antígona, de Sófocles.

112
Não entraremos no mérito da questão porque exigiria um conhecimento de
que não dispomos no momento para analisar detalhes métricos – no caso anapestos
– que podem fornecer indícios da interpolação. A proposta é organizar a disposição
do texto de modo a facilitar a orientação do leitor e levantar alguns temas
importantes para a compreensão do final trágico.
A entrada de Antígona e Ismene é preparada pelo coro em 15 versos (vv.
861-74) e daí em diante o êxodo divide-se em semi-coro A e semi-coro B. À partir do
verso 861 até o verso 1004 a estrofe é dirigida a Etéocles e a antiestrofe a Polinices,
que também é “lembrado” na primeira parte do Epodo (vv. 989-97). A segunda parte
(vv. 998-1004) refere-se a ambos.
De modo geral, o êxodo é marcado fortemente por um canto fúnebre
destinado às lamentações em torno dos últimos descendentes da linhagem dos
Labdácidas, mas, sobretudo, por trazer à tona os elementos míticos que estavam
por detrás do trágico desfecho de Etéocles e Polinices.
Assim, no verso 885, a maldição de Édipo é invocada como antecedente
imediato da queda da casa real, elemento que reaparece nos versos 892

(a0rai /), 898 (a0rai/wi), 946 (a0ra_n) e 954 ( 0Arai_). Como

executores da maldição de Édipo estão a Moira e as Erínias, que aparecem


separadas nos versos 886( 0Erinu_j) e 947 (Moiran), mas que são invocadas
conjuntamente nos versos 975-77 e 986-88.

Entrecorta o canto fúnebre a entrada do Heraldo no verso 1005 para


informar que a decisão do conselho (probou_loij) é reservar a Etéocles todas
as honras fúnebres decorrentes de sua posição como comandante do exército
tebano. Ao contrário, Polinices, por sua investida contra a cidade paterna, será
privado de sepultura. Antígona, imediatamente, contesta as decisões do conselho e
resolve, por si mesma, enterrá-lo. O coro, mais uma vez, reforça a responsabilidade
das Erínias na destruição da linhagem Labdácida nos versos 1054-56.

113
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VERNANT, J.-P. VIDAL-NAQUET, P. Mito e tragédia na Grécia antiga. São


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115

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