Termos Importantes Ligados À Produção Cultural
Termos Importantes Ligados À Produção Cultural
Termos Importantes Ligados À Produção Cultural
Agente cultural: Aquele que, sem ser necessariamente um produtor cultural ele mesmo, envolve-se
com a administração das artes e da cultura, criando as condições para que outros criem ou inventem
seus próprios fins culturais. Atua, mais frequentemente embora não exclusivamente, na área da difusão,
portanto mais junto ao público do que do produtor cultural. Organiza exposições, mostras e palestras,
prepara catálogos e folhetos, realiza pesquisas de tendências, estimula indivíduos e grupos para a auto-
expressão, faz enfim a ponte entre a produção cultural e seus possíveis públicos.
Aparelho de base: Expressão recorrente no campo dos estudos cinematográficos, onde designa o
conjunto dos recursos técnicos e das operações necessários à exibição de um filme: uma sala de
exibição, projetor, etc. Num sentido ampliado, o aparelho de base do cinema inclui os recursos e
operações necessários à produção e exibição de um filme. Por extensão, pode-se falar num aparelho de
base do teatro, da ópera, da dança, etc.
Aculturação: Mistura, fusão, impacto individual ou simultâneo entre duas ou mais culturas distintas.
Artes comunitárias: Artes comunitárias é uma expressão - de origem especificamente inglesa - que
designa um programa de ação cujo propósito é criar as condições para que tanto os artistas quanto os
diferentes públicos de uma comunidade se utilizem das formas apropriadas de arte como meio de
comunicação e expressão. Estes programas não procuram prioritariamente estimular a reprodução (seja
no nível da produção, seja no nível do consumo) de formas artísticas e culturais consagradas. Não se
trata, neste caso, de levar as pessoas à ópera ou de mostrar lhes filmes, mas de usar e desenvolver
criticamente essas formas de modo a adaptá-las às novas necessidades - além de estimular o
desenvolvimento de novas formas adequadas aos desejos e exigências locais.
Biblioteca: Naudé apresenta a biblioteca como uma instituição necessariamente pública e universal.
Pública no sentido de aberta a todos e universal por conter todos os autores (ele não escreveu "livros"
mas "autores") que tivessem escrito sobre a diversidade dos assuntos Interessantes ao ser humano, em
particular as artes e ciências. Sua concepção se opõe aos três modelos principais que, na primeira
metade do século XVII, ordenavam as relações entre os indivíduos e os livros. O primeiro deles, ilustrado
pela descrição dada por Montaigne de sua "livraria", apresenta a biblioteca como um retiro, lugar de
lazer solitário à margem dos afazeres domésticos ou dos deveres públicos. O segundo modelo fazia da
biblioteca uma espécie de gabinete de curiosidades ou de obras seletas que satisfaziam as paixões
bibliófilas. Para participar desse gabinete, os livros deveriam satisfazer duas exigências: a raridade e o
luxo, propriedades que os tornavam dignos de serem colecionados. O terceiro formato era dado pelos
jesuítas e influenciou amplamente a constituição da biblioteconomia moderna. Este modelo assentava-
se sobre um sistema de dupla articulação: a seleção e o expurgo, acionadas pelo bibliotecário que, na
prática, assumia o papel de um diretor de leituras
Cânon: Um dos modos de enfrentar o problema é levantar listas de obras básicas em cada área
(literatura, história, etc.) por meio da consulta a especialistas, geralmente professores e pesquisadores
universitários. Sob certo aspecto, essa operação consiste em constituir o cânon de uma área - em outras
palavras, o conjunto de livros ou filmes, etc. que uma pessoa deve ler ou ver para situar-se como
indivíduo culto ou para saber avaliar a produção na área correspondente.
Capital Cultural: Num sentido estrito, capital cultural aponta para o conjunto dos instrumentos de
apropriação dos bens simbólicos. Do lado da produção cultural, fazem parte do capital cultural os
produtos intermediários e equipamentos necessários à geração do bem simbólico final, como o
celulóide para o cinema ou o mármore para a escultura, a sala de teatro onde será montada uma peça,
o piano, etc. Num sentido mais amplo, constituem o capital cultural de um indivíduo ou comunidade a
soma de todos esses instrumentos que permitem o consumo e a produção dos bens simbólicos (bem
como sua distribuição e troca) e o conjunto dos próprios bens simbólicos produzidos, como as coleções
nas bibliotecas, pinacotecas, museus, galerias, cinematecas, videotecas, o assim por diante. Os
programas de política cultural tratam, sob certos aspectos, de viabilizar a integração de parcelas mais
amplas de uma comunidade ao seu capital cultural (ou outros capitais culturais), do ponto de vista da
produção (política cultural propriamente dita) e do consumo (de modo específico, ação cultural).
Carente cultural:
A cidade de São Paulo viu promulgada em 1993 a lei municipal 11.357, tornando obrigatório que todos
os espetáculos realizados nos teatros e anfiteatros municipais reservem 20% dos lugares disponíveis a
cada sessão para a população de baixa renda, que paga, a título de ingresso, O,5% do salário mínimo
vigente. Para gozar este direito, o interessado, carente cultural (termo de ressonâncias sem dúvida
irônicas .... ) deve credenciar-se preliminarmente em órgão da Secretaria Municipal de Cultura, que
expede a "carteirinha" correspondente. O credenciamento é de grande interesse, uma vez que, em São
Paulo, a temporada lírica acontece no Teatro Municipal, casa que abriga, ainda, boa parte dos melhores
espetáculos da temporada em todos os gêneros; com o preço dos ingressos nesse teatro variando de 10
a 100 reais (10,50 a 105 dólares, em novembro de 1995), compreende-se a vantagem do credenciado
que paga, na mesma data, O,50 centavos por espetáculo (0,52 centavos de dólar).
Centro cultural independente: Centro cultural desvinculado da administração pública e que tampouco
se encontra sob o guarda-chuva fixo de alguma empresa ou fundação privada. Estes centros formaram-
se em edificações em desuso, ocupadas extralegalmente por grupos de início não organizados
(squatters), em zonas deterioradas das grandes cidades, numa dinâmica que não tardou a marcar o
começo da recuperação urbana de muitas delas. A orientação desses centros é a mais variada possível
mas sempre marcada por sinais de contestação.
Cisão cultural: Processo inerente a toda situação colonial em que a sociedade colonizadora afirma sua
superioridade em todos os domínios (cultural, econômico, político, religioso, étnico) e racionaliza, a
partir desse procedimento dogmático, a subordinação a que submete os povos colonizados. Sua
primeira conseqüência é a negação das culturas populares autóctones...
Competência artística: Conhecimento, por parte de um indivíduo ou grupo (no limite, de um público),
que lhe permite situar uma obra qualquer (filme, peça de teatro, ópera, etc.) em seu contexto próprio.
Esse conhecimento é constituído por informações sobre elementos estilísticos, históricos, biográficos e
outros que possibilitam a esse indivíduo ou grupo identificar uma obra no interior do universo artístico
em que se encaixa.
Comunidade interpretativa: Designa o grupo de indivíduos que, tendo todos uma competência artística
mais ou menos equivalente, compartilham dos mesmos códigos que instruem uma obra singular ou
conjunto de obras e têm a mesma possibilidade de acesso ao conjunto de sentidos, significados e
significações implicados.
Cultura: [...] o termo cultura continua apontando para atividades determinadas do ser humano que, no
entanto, não se restringem às tradicionais (literatura, pintura, cinema - em suma, as que se apresentam
sob uma forma estética) mas se abrem para uma rede de significações ou linguagens incluindo tanto a
cultura popular (carnaval) como a publicidade, a moda, o comportamento (ou a atitude), a festa, o
consumo, o estar-junto, etc.
Cultura Autônoma: A cultura autônoma distingue-se da apropriada na medida em que, em seu âmbito,
o indivíduo ou grupo tem pleno controle sobre os componentes culturais envolvidos e, portanto,
capacidade para produzir ou reproduzir o produto ou forma cultural correspondente; no âmbito da
cultura apropriada, o indivíduo ou grupo pode apenas usar - mais freqüentemente, consumir (v. sistema
de produção cultural) - o componente pronto ou produto cultural acabado, sem conseguir reproduzi-lo
ou sem conseguir reproduzi-lo em grau equivalente ao do original. De seu lado, a cultura alienada, por
implicar a perda da capacidade de controle sobre seus próprios componentes, é na verdade uma cultura
congelada, morta, sem poder sobre a realidade; antes de configurar-se como alienada, essa cultura
pode ter sido uma cultura de resistência cujo poder material e simbólico foi gradativamente corroído.
De igual modo, uma cultura é autônoma quando seu poder de resistência é elevado.
Cultura Dominada: o termo aponta não tanto, ou não apenas, para a cultura que tem poucas
possibilidades de emergir, em virtude do poderio econômico ou político de outra, como, de modo mais
específico, para uma cultura que não dispõe de uma acumulação suficiente, em todos os sentidos, capaz
de permitir a constituição de um capital cultural próprio e a existência continuada e profissional de
criadores especializados habilitados a levar adiante suas formas de expressão, multiplicando-as e
renovando-as.
Cultura dominante: Distingue-se entre uma cultura dominante por imposição violenta - exemplo: a
imposição às populações indígenas, pelas armas, do português, espanhol, inglês ou francês junto com a
doutrina cristã e a civilização européia - e uma cultura que resultou dominante por ter-se tornado, por
variados motivos, ponto de referência central e fonte inspiradora (exemplo: uma cultura nacional
preponderando sobre culturas regionais).
Cultura instituída: Cultura das organizações e instituições, entendida em contraste com cultura
instituinte, dos grupos em sentido estrito, das vivências, da afetividade e do afetual.
Cultura oficial: Cultura ordenadora, institucional, compiladora, que alegadamente expressa o espírito de
um lugar ou de uma época. Não sufoca modos culturais alternativos mas tende a colocá-los em guetos -
com os quais de qualquer forma acaba por entrar em relações de reconversão cultural. Cultura oficial,
dominante, hegemônica e macrocultura dominante são expressões freqüentemente utilizadas como
sinônimos. Na realidade, nem sempre a cultura oficial é a cultura dominante. Durante a ditadura militar
no Brasil entre os anos 60 e 80, a cultura oficial era uma, de direita, ditada pelo estamento e pela classe
no poder, mas a cultura dominante nos circuitos culturais mais significativos era de esquerda.
Cultura política: Em sentido amplo, e para o que interessa a este Dicionário, conjunto de idéias,
crenças (efeitos de discurso) e práticas (efeitos de mundo) que organizam o relacionamento entre as
pessoas no interior de um grupo. Nesta orientação, entende-se por política não apenas a prática
institucional de atividades voltadas para o trato da coisa pública - exercício de cargos de representação,
vida partidária - como, de modo geral, as práticas de relacionamento humano no interior de um grupo
(socialidade, ou vida em comum na pólis; participação nos assuntos da comunidade; preocupação com
os problemas e destinos do grupo, etc.) que visam de algum modo a constituição de elos duradouros
entre as pessoas.
Culturas centrais: Há uma variação importante no sentido desta expressão, quer ela se
encontre na literatura especializada, quer nos textos menos informados. Nestes, ela tende a
indicar a ou as culturas predominantes, se não hegemônicas, no cenário internacional. Culturas
centrais seriam neste caso, no conjunto, a americana e a européia; setorialmente, a cultura
americana é central em termos de cinema de massa, a européia em cinema erudito (embora
estas distinções não sejam tão precisas). A música popular brasileira também comparece no
elenco das culturas centrais.
Culturas da privação: Modos culturais ligados aos graus mais intensos de pobreza,
compreendendo comportamentos cotidianos, expressões artísticas (arte bruta), apropriação e
transformação de objetos e materiais jogados no lixo. No singular, a expressão designa o
conjunto dos fenômenos próprios da vida marcada pela pobreza e pela miséria.
Dirigismo cultural: Forma de intervenção na dinâmica da cultura que se realiza de cima para baixo,
das instituições e dos agentes culturais para a coletividade ou público a que se voltam, sem que sejam
estes consultados sobre suas necessidades ou desejos.
Distinção simbólica: O que funciona como fator distintivo não é a qualidade intrínseca do fenômeno
cultural mas aspectos como sua raridade, as circunstâncias de sua produção e exibição, etc.
Enculturação: Processo pelo qual os indivíduos que compõem uma sociedade são submetidos a uma
operação cultural que organiza, codifica e canaliza seus impulsos, suas energias e necessidades
psicobiológicos. Por este processo, os diferentes domínios da vida - das maneiras à mesa às identidades
sexuais, dos juízos de valor à conduta pública são estruturados de modo a lazer com que todos e cada
um saibam o que e como fazer nas diferentes situações sociais.
Expropriação cultural: Perda de controle sobre os recursos e as decisões culturais próprios. Implica, em
grau de menor intensidade, a eliminação cultural ou proibição de exercer certos âmbitos da cultura
própria. Por exemplo, no começo do século a batucada (dos negros) era proibida pela polícia. Sua
conseqüência imediata e necessária é a imposição cultural: introdução, pela força, numa determinada
cultura, de elementos culturais alheios.
Fabricação cultural: Processo de mediação cultural com ponto de partida, etapas intermediárias, fim e
finalidade previstos. Tem por meta, alternativa ou cumulativamente, a transmissão de conhecimentos e
técnicas determinadas; a formação de uma opinião cultural específica; a conformação de um modo de
percepção ou a produção de uma obra cultural previamente estipulada. Neste processo, os objetivos
são predeterminados, cabendo ao agente ou mediador cultural orientar as atividades de seu público na
direção estabelecida. Opõe-se, neste sentido, à ação cultural, processo de invenção e construção
conjunta, entre mediadores e público, dos fins e meios culturais visados, não raro definidos apenas no
decorrer do próprio processo. Políticas culturais que respeitam os interesses dos indivíduos, públicos e
comunidades optam por programas de ação cultural.
Ganho cultural: Sumário: Aquisição, por um indivíduo ou grupo, de novos conhecimentos conceituais
ou práticos (extensão dos horizontes intelectuais ou dominação de um novo saber fazer). Resulta de um
processo, em outras palavras, pelo qual se adquirem novos códigos o se amplia a competência artística
ou disposição estética desse indivíduo ou grupo, com sua inclusão em novos circuitos culturais.
Heterocultura: Modo cultural de um grupo ou comunidade que se alimenta ao mesmo tempo em duas
ou mais matrizes culturais diferentes ou antagônicas (tradição e modernidade, continuidade e inovação,
nacional e estrangeiro, etc.).
Ideologia cultural: Orientação de valor político-filosófica seguida por uma prática ou política cultural.
Responde pelas motivações dessa prática ou política, expressa o que uma e outra entendem por cultura,
que papel atribuem ao produtor cultural e ao usuário ou consumidor cultural, como organizam o
sistema de produção cultural, que lugar atribuem à cultura na estrutura social. Assim, diz-se que um
determinado modo cultural, prática ou política cultural é libertário, autoritário ou totalitário ou, ainda,
que determinado modo cultural, prática ou política cultural marca-se pelo dirigismo cultural, pelo
liberalismo cultural ou pela adoção da democratização cultural (v. política cultural); ou, também, que
esse modo, prática ou política cultural é de inspiração marxista, trotskista, cristã, nazista, etc.
Incentivo cultural: O incentivo cultural, ou incentivo fiscal à cultura, assume freqüentemente a forma
de deduções nos impostos devidos por indivíduos (pessoas físicas) ou empresas (pessoas jurídicas) como
compensação por gastos efetuados com o apoio a práticas culturais. São três as principais modalidades
cobertas pelos incentivos: 1. doação: transferência de recursos aos produtores culturais (ou
empreendedores) para a realização de obras ou produtos culturais sem que haja, por parte do
incentivador, interesses promocionais, publicitários ou de retorno financeiro; 2. patrocínio:
transferência de recursos a produtores culturais para a realização de obras ou produtos de cultura com
finalidades promocionais, publicitárias ou de retorno institucional; 3. investimento: transferência de
recursos a produtores culturais para a realização de obras ou produtos de cultura com a intenção de
participação nos eventuais lucros financeiros.
Na legislação brasileira, incentivos fiscais à produção cultural sempre existiram de forma indireta (na
forma de abatimentos por despesas de promoção ou publicidade). A partir de 1986, uma primeira
legislação específica, conhecida como Lei Sarney, contemplou de modo particular a possibilidade de
dedução nos impostos para os casos de apoio financeiro à produção cultural. Seguiram-se outras
decisões legislativas sobre a cultura, entre as quais destacam-se: 1) uma lei municipal da cidade de São
Paulo, de 31.12.90, assinada por Luísa Erundina; 2) uma revisão da Lei Sarney, conhecida por Lei
Rouanet, de 23.12.91 (regulamentada em 26.2.92); 3) uma lei do estado de São Paulo datada de
20.6.94. O real alcance destas medidas ainda é assunto controvertido. Primeiro, não se trata
propriamente do deslocamento de quantias devidas ao tesouro público para o domínio da produção
cultural: para ter direito às deduções, os incentivadores devem de fato despender somas adicionais
consideráveis, o que implica a preexistência, da parte deles, de uma disposição específica de apoio à
cultura. Segundo, as produções iniciais feitas ao abrigo da lei deixaram muito a desejar devido à falta de
critérios claros sobre o que poderia ser considerado artístico ou cultural, ponto nodal da questão (num
primeiro momento da existência dessas leis, multiplicaram-se os livros ditos "de arte", com muita
ilustração e pouco texto e feitos para servirem de brindes institucionais de fim de ano). Aos poucos deu-
se uma reorientação das aplicações dos incentivadores, que passaram a apoiar produtos de maior valor
cultural, como filmes, espetáculos teatrais e musicais. Como contrapeso a estas avaliações
relativamente negativas, há um consenso segundo o qual o grande benefício dessas leis foi chamar a
atenção para o fato de cultura como um meio socialmente eficaz de promover i institucional mente os
incentivadores, em particular num momento em que os serviços em geral, e os serviços culturais de
modo destacado, surgem no primeiro plano do horizonte econômico. Um outro consenso não menor
aponta para o afastamento do Estado de suas funções constitucionais de apoio à cultura e sua
substituição gradativa pela iniciativa privada, movida quase exclusivamente por critérios de aceitação ou
de agradabilidade da obra financiada, o que pode promover distorções notáveis na dinâmica cultural e
minimizar as nuances entre a indústria cultural e uma outra produção até aqui dita de excelência.
Indicador cultural: Embora se registre o uso desta expressão também com o sentido de números e
dados estatísticos que traçam o quadro da atividade cultural em seu conjunto ou sob um aspecto
particular (freqüência de idas ao cinema, número de casas culturais, venda de obras de arte, etc.), em
política cultural ela serve, antes, para designar a pessoa ou grupo de pessoas que, no interior de uma
comunidade, cristalizam sua cultura específica, quer por conhecerem sua história e serem seu principal
elo de transmissão, quer por constituírem-se em seus principais produtores culturais, aqueles cujas
obras adquirem uma aura que marca a comunidade com um sinal distintivo. Em princípio, recorre-se a
esta expressão quando o universo a ser objeto de uma pesquisa ou política cultural é o de cultura
popular ainda não estudada, tal como se manifesta em pequenas coletividades das periferias, cidades e
vilas do interior, e em grupos minoritários sob qualquer aspecto. O indicador cultural pode ser um
artista popular, um artesão, um contador de histórias, o principal organizador de uma atividade
folclórica. É ele a fonte privilegiada para conhecer-se as práticas e necessidades culturais do grupo a que
pertence, servindo como consultor de eventuais programas de ação cultural. Acessoriamente, são
indicadores culturais os objetos e eventos que traduzem um conjunto definido de traços culturais. Por
extensão, usa-se a expressão, mais raramente, para designar os expoentes de campos de produção
erudita (Glauber Rocha como indicador do Cinema Novo; a igreja da Pampulha em Belo Horizonte como
indicador da arquitetura modernista brasileira).
Indústria cultural: O acordo de livre comércio estabelecido entre o Canadá e os EUA no início dos anos
90 define sob o rótulo de indústria cultural as seguintes atividades: a) a publicação, distribuição ou
venda de livros, revistas ou jornais impressos em papel ou que podem ser lidos por intermédio de uma
máquina (revistas em CD-ROM, por exemplo); b) a produção, distribuição, venda ou exibição de filmes e
vídeos; c) a produção, distribuição, venda ou exibição de gravações musicais em áudio ou vídeo; d) a
produção, distribuição ou venda de música impressa ou em forma legível por máquina; e) a
comunicação radiofônica ou televisiva em aberto (broadcast), por assinatura ou no sistema pay per view
(tv a cabo, transmissões por satélite). A expressão indústria cultural é típica de países de inspiração
cultural européiacontinental, incluindo-se aqui o Canadá. Nos EUA, prevalece o termo indústria do
entretenimento, que, além do cinema, do rádio, da televisão, dos discos, dos CDs, etc., inclui ainda a
totalidade das diversões ao vivo, todos os tipos de atividades artísticas performáticas (teatro, dança),
esportivas, espetáculos variados, cassinos, parques temáticos (Disneylândis, Universal Studios). Embora
livros, revistas, periódicos sejam eventualmente incluídos nesta lista, nos EUA eles entram melhor sob a
rubrica "indústria da informação". A adoção de um rótulo como "indústria do entretenimento" (ou "da
diversão)" nos EUA, abrangendo os modos culturais do cinema, do teatro, da dança, etc., evitou, nesse
país, uma considerável soma de discussões teóricas sobre, por exemplo, quais filmes considerar
"cultura" e quais simples "diversão". O lado de certa forma negativo desta opção é a restrição da
aplicação do termo cultura apenas para modos de circulação extremamente restrita, como os
universitários e os científicos. Um eco (ou talvez a origem) desta distinção encontra-se na insistência
com que, na Inglaterra, os centros de cultura sejam sistematicamente chamados de arts centres;
considera-se nesse país que o termo cultura tem a propriedade de repelir o chamado "homem comum",
propenso a ver nesse rótulo uma referência a atividades abstratas, ligadas ao ensino e às classes
dominantes, das quais se sente excluído.
A indústria cultural, cujo início simbólico é a invenção dos tipos móveis de imprensa por Gutemberg, no
século XV, caracteriza-se, sugere seu nome, como fenômeno da industrialização tal como esta começou
a desenvolver-se a partir só século XVIII. Seus princípios são os mesmos da produção econômica geral:
uso crescente da máquina, submissão do ritmo humano ao ritmo da máquina, divisão do trabalho,
alienação do trabalho. Sua matéria-prima, a cultura, não é mais vista como instrumento da livre
expressão e do conhecimento mas como produto permutável por dinheiro e consumível como qualquer
outro produto (processo de reificação da cultura ou, como se diz hoje, de commodification da cultura,
i.e., sua transformação em commodity, mercadoria com cotação individualizável e quantificável).
Num primeiro momento dos estudos de comunicação, marcado pelas análises da chamada Escola de
Frankfurt, a indústria cultural sofreu cerrada carga da crítica universitária ou erudita, sendo
menosprezada ou inteiramente marginalizada por sua alegada natureza de fenômeno de corrupção das
estruturas culturais existentes. Entendia-se a indústria cultural, nesse aspecto, como instrumento de
tradução e desbastamento dos modos culturais eruditos, num processo cujo objetivo era alcançar um
mercado passivo de consumidores ao qual não se oferecia nada além de um entretenimento facilmente
digerível. Dizia-se que a expressão "cultura de massa", usada para caracterizar a produção oriunda da
indústria cultural, era inadequada: por ser feita fora do território das massas, ela se apresentava antes
como um modo de cultura para as massas. Norberto Bobbio lista, entre os paradoxos da democracia,
aquele que se constitui pela incompatibilidade entre democracia e indústria cultural. O pensador
italiano registra que o uso feito da informação pela indústria cultural produz doutrinação, que tende a
reduzir ou eliminar o sentido da responsabilidade individual, considerada fundamento da democracia.
Nessa linha de argumentação, a indústria cultural é vista não como veículo de difusão da cultura, mas,
pelo contrário, como modo de impedir o acesso à cultura por destruir formas culturais populares e
filtrar a produção passível de entrar em seu mecanismo, impedindo a crítica aos modos culturais
predominantes. A indústria cultural é vista, assim, como fator de apatia e conformismo. A partir dos
anos 80, de modo particular, admitiu-se com mais facilidade que os produtos dessa indústria
transmitem mensagens - ralas ou não, desprezíveis ou não - que correspondem a sistemas específicos
de significação, refletem hierarquias de valores e surgem de (tanto quanto propõem) modos de vida e
de entendimento do mundo expressos de maneira particular e definida, o que os toma objetos de
estudo e compreensão de pleno direito. De outro lado, os veículos da indústria cultural ocasionalmente
proporcionam às artes plásticas, à música erudita, à literatura de primeira linha, uma penetração de
outro modo impossível. É verdade que não raro, como no Brasil, essa divulgação da cultura erudita se
faz apenas nos horários mortos (final de noite, início da madrugada, quando a esmagadora maioria dos
aparelhos receptores já está desligada). E discute-se, também, sobre os efeitos duradouros dessa
divulgação e sua capacidade para promover práticas culturais perenes. De um modo ou de outro, a
negação pura e simples do valor cultural dessa indústria não é mais uma unanimidade.
Instituição cultural: Estrutura relativamente estável voltada para a regulação das relações de produção,
circulação, troca e uso ou consumo da cultura (ministérios e secretarias da cultura, museus, bibliotecas,
centros de cultura, etc.). Essa regulação, nas instituições, se faz por meio de códigos de conduta ou de
normas jurídicas. Instituições culturais são diferentes de formações culturais, as primeiras geralmente
não são constituídas por pessoas que operam o sistema cultural (os artistas), enquanto as segundas são
formadas por esses indivíduos. Embora essas instituições se cruzem, não influenciam a identidades uma
da outra.
Integração cultural: Intercâmbio de produtos e serviços culturais entre localidades de uma mesma
região, regiões de um mesmo país ou de países e territórios distintos, de tal modo que populações ou
comunidades diferentes passem a fazer parte de um mesmo sistema de produção cultural, isto é, de
modo que seus produtos culturais penetrem num mesmo circuito e sejam passíveis de uso e consumo
por todos que fazem parte desse sistema. Instrumentos de integração cultural têm sido as feiras, festas
religiosas e, mais recentemente, os meios de comunicação de massa, em particular a televisão e o rádio.
Irracionalismo cultural: Manifesta-se na forma de rejeição à cultura, vista como provedora de atitudes
críticas. Para os irracionalistas, a reflexão é modo de emasculação da vontade e da ação, entendida
como bela em si mesma e que, portanto, deve ser exercitada antes de qualquer reflexão.
Liberalismo cultural: Modo de política cultural assentado na idéia da defesa da liberdade de criação, de
expressão e de manifestação do pensamento. Para o liberalismo cultural, derivado dos escritos de John
Stuart Mill e John Dewey, o principal perigo para uma cultura é a marginalização do emergente, do
novo, das manifestações progressistas.
Libertarismo cultural: Modo de política cultural cuja pedra de toque é a defesa da mais ampla liberdade
de expressão. O libertário cultural é contrário a toda forma de censura ou auto-censura. No debate
cultural contemporâneo marcado por uma acirrada discussão sobre o conteúdo dos meios de
comunicação de massa, o partidário do libertarismo cultural defende o direito dos artistas de
recorrerem a todos os temas polêmicos mesmo que isso signifique uma porta aberta àqueles produtos
culturais que fazem desses temas (em especial a violência e o sexo) uma exploração comercial sem
nenhum alcance estético. Este modo de política cultural considera que não há recurso legal contra os
exploradores culturais que não possa eventualmente ser utilizado contra a criação artística, razão pela
qual nenhum freio legal deve conter a livre expressão do pensamento. O único recurso para separar a
exploração comercial da criação artística e cultural está, para o libertário cultural, na educação e na
crítica cultural.
Mecenato: Apoio econômico, por parte de um indivíduo, de uma organização particular ou do Estado,
ao produtor cultural, de modo genérico, ou à produção de uma obra cultural em particular. Este
financiamento pode ser total ou parcial, apresentar-se sob a forma de um custeio de todas as
necessidades vitais do artista ou produtor cultural ou mostrar-se voltado para a realização de uma única
obra. Embora seja difícil distinguir claramente entre o mecenas e o comprador de arte, o mecenato não
implica necessariamente a aquisição da obra pelo financiador.
Mediação cultural: Processos de diferente natureza cuja meta é promover a aproximação entre
indivíduos ou coletividades e obras de cultura e arte. Essa aproximação é feita com o objetivo de facilitar
a compreensão da obra, seu conhecimento sensível e intelectual - com o que se desenvolvem
apreciadores ou espectadores, na busca da formação de públicos para a cultura - ou de iniciar esses
indivíduos e coletividades na prática efetiva de uma determinada atividade cultural. Entre as atividades
de mediação cultural estão as de orientador de oficinas culturais, monitores de exposições de arte,
animadores culturais, museólogos, curadores, profissionais das diversas áreas que constituem um
centro cultural, bibliotecários de bibliotecas públicas, arquivistas e guias turísticos. Os diferentes níveis
em que essas atividades podem ser desenvolvidas caracterizam modos diversos da mediação cultural,
como a ação cultural, a animação cultural e a fabricação cultural.
Mediador cultural: Todo aquele que exerce atividades de aproximação entre indivíduos ou grupos de
indivíduos e as obras de cultura. Seu uso generalizou-se ao longo da década de 80, ao apresentar-se
como versão contemporânea atualizada dos anteriores animador cultural e agente cultural. Na
realidade, estes são espécies do gênero mediador, com o qual não se confundem inteiramente (o
agente cultural, por exemplo, é aquele que exerce a ação cultural propriamente dita).
Modo cultural: Forma particular de manifestação de uma cultura. Modo designa o tipo de uma
manifestação cultural: o cinema é um modo cultural, assim como o teatro, a pintura, a dança, uma
manifestação folclórica, o livro, a arquitetura, etc. Em outras palavras, modo é a disposição particular da
expressão cultural num meio determinado. Um caso específico de um modo, uma ocorrência concreta
de um modo, é uma versão desse modo: um filme em particular, uma peça teatral, um espetáculo de
dança, etc
Mudança cultural: Expressão que se aplica tanto a uma sociedade específica numa época determinada
quanto a uma linguagem ou movimento cultural Fala-se, assim, que uma certa sociedade está passando
ou passou por uma mudança cultural e que uma determinada linguagem, movimento ou escola cultural
gerou ou sofreu mudanças. Para os estudos de política cultural, a expressão interessa em seu primeiro
sentido. Ressaltando que o processo cultural é dinâmico e está portanto sempre em mutação, aponta-se
para a necessidade de distinguir, ao tratar de uma mudança cultural, entre o residual, o dominante e o
emergente.
Oficina cultural: Designa não tanto um lugar quanto um tipo de atividade, desenvolvida em diferentes
modalidades de espaço cultural (centros de cultura, museus, bibliotecas ou edifícios especialmente
construídos ou adaptados para essa finalidade) e de diversificada natureza: cursos, palestras,
conferências, seminários, etc. De uma oficina cultural não sai necessariamente um produto ou obra
cultural (uma peça de teatro, um filme, um livro); seu objetivo é disseminar informações, para um
público profissional ou amador, que levem à realização de obras culturais.
Paradigma holonômico: Modo de pensamento que trata de maneira complexa as questões complexas.
Em sua análise, o modelo holonômico aborda fenômenos ao mesmo tempo complementares,
concorrentes e antagonistas, respeitando as diversas coerências de cada um, que se unem em dialógicas
e polilógicas. Apóia-se numa ontologia pluralista, na lógica polivalente e na causalidade probabilística. É
o paradigma por excelência dos estudos contemporâneos sobre o imaginário e a culturanálise,
adequado à abordagem das culturas emergentes, híbridas ou de fronteira.
Paternalismo cultural: Proteção excessiva, oferecida pelo Estado, à produção cultural de maneira
indiferenciada ou a um ou alguns modos culturais escolhidos.
Patrimônio cultural: "Patrimônio [cultural] é o conjunto de bens móveis e imóveis existentes no país
cuja conservação seja de interesse público quer por sua vinculação a fatos memoráveis quer pelo seu
excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico." Esta é a definição dada a
patrimônio pelo Decreto-lei n. 25 promulgado durante o Estado Novo no Brasil.
Patronato cultural: Proteção ou amparo ao artista para que possa produzir sua obra. Esse apoio
apresenta-se historicamente sob a forma de hospitalidade e sustento ou na modalidade de uma
transferência de recursos econômicos. São seis tipos. O patronato confunde-se com o mecenato, sendo
este uma versão terminológica atualizada daquele (os textos de política cultural contemporâneos
optam, em grande maioria, pela expressão mecenato, seguindo provavelmente a opção feita pela
França, país de grande influência no campo da política cultural e que optou por mecenato na medida em
que, ali, a palavra patron tem fortes ressonâncias comerciais: patron indica o dono de um bar, de uma
empresa, enquanto mecenas evoca aspirações ditas mais nobres).
Política cultural: Constituindo, antes de mais nada, como neste dicionário se propõe, uma ciência da
organização das estruturas culturais, a política cultural é entendida habitualmente como programa de
intervenções realizadas pelo Estado, instituições civis, entidades privadas ou grupos comunitários com o
objetivo de satisfazer as necessidades culturais da população e promover o desenvolvimento de suas
representações simbólicas. Sob este entendimento imediato, a política cultural apresenta-se assim
como o conjunto de iniciativas, tomadas por esses agentes, visando promover a produção, a distribuição
e o uso da cultura, a preservação e divulgação do patrimônio histórico e o ordenamento do aparelho
burocrático por elas responsável.
Política de eventos: Esta expressão é ainda usada para designar o exato oposto de uma política cultural:
designa um conjunto de programas isolados - que não configuram um sistema, não se ligam
necessariamente a programas anteriores nem lançam pontes necessárias Para programas futuros -
constituídos por eventos soltos uns em relação aos outros.
Populismo cultural: Em sua dimensão cultural, o populismo, segundo Marilena Chauí, é um fenômeno
ambíguo: critica o elitismo da cultura dominante, a ser abolida pelo povo, mas define a cultura popular
como a única verdadeira, embora primitiva. Esta condição, "pecado original" da cultura popular, seria
alterada por uma vanguarda intelectual esclarecida que recolheria a matéria popular bruta e a
devolveria sob formas que o grupo executor entende adequadas ao processo dito de liberação ou
conscientização popular.
Prática cultural: Em sentido amplo, dá-se o nome de prática cultural a toda atividade de produção e
recepção cultural: escrever, compor, pintar e dançar são, sob este ângulo, práticas culturais tanto
quanto freqüentar teatro, cinema, concertos, etc.
Produto cultural: Tratados regionais de integração econômica e cultural definem os produtos culturais
como aqueles que expressam idéias, valores, atitudes e criatividade artística e que oferecem
entretenimento, informação ou análise sobre o presente , o passado (historiografia) ou o futuro
(prospectiva, cálculo de probabilidade, intuição), quer tenham origem popular (artesanato), quer se
tratem de produtos massivos (discos de música popular, jornais, histórias em quadrinhos), quer circulem
por público mais limitado (livros de poesia, discos e CDs de música erudita, pinturas). Embora desta
definição participem conceitos vagos, como Idéias" e "criatividade artística", ela exprime um consenso
sobre a natureza dos produtos culturais.
Serviço cultural: Por analogia com o uso de serviço na economia, entende-se por serviço cultural a
atividade que, sem assumir a forma de um bem material, atende a um desejo ou necessidade de cultura.
No cotidiano, a expressão designa o conjunto de práticas culturais que o Estado e instituições privadas
ou de direito semipúblico colocam à disposição da comunidade ou de segmentos da comunidade e que
incluem a promoção de espetáculos, a informação cultural, a formação para a produção cultural e o
apoio, sob diversas formas, à produção cultural, entre outros. Como, no Brasil, órgãos públicos voltados
para a cultura (secretarias de cultura e centros culturais) não podem, em princípio, promover a venda de
objetos e bens materiais eventualmente por eles produzidos, estes acabam sendo distribuídos
gratuitamente, o que dá ao termo serviço um sentido peculiar, diverso do constatado nos estudos
econômicos.
Sincretismo cultural: O sincretismo cultural, como combinação de diferentes crenças e práticas, tem
sido considerado em si um valor positivo. No entanto, essa positividade só pode subsistir na medida em
que o sincretismo se mostra tolerante às contradições e aos contrários. O sincretismo totalizante, que
procura integrar, num único corpo, componentes de variada extração com a finalidade de conseguir
uma unanimidade, é manifestação de autoritarismo e, como tal, pode ser encontrado sob regimes como
o fascismo e o nazismo. Neste sentido, o sincretismo totalizante é o oposto da modernidade cultural
que privilegia a diversidade e a discordância tolerante de crenças, práticas e pontos de vista como forma
de desenvolvimento do conhecimento e da expressão.
Sistema de produção cultural: Esquema de representação baseado nos estudos de economia política e
que propõe a análise da dinâmica cultural a partir de quatro estágios ou fases: 1. a fase da produção
propriamente dita do objeto cultural (preparação do roteiro, filmagem, montagem de um filme;
impressão de um livro; montagem de uma peça teatral; realização de um desfile de carnaval); 2. a
distribuição desse produto a seus consumidores finais ou aos intermediários que, num segundo
momento, permitirão o acesso ao produto por parte dos consumidores interessados (distribuição do
filme pronto às salas de exibição; distribuição do livro às livrarias e pontos de venda); 3. a troca ou
permuta do direito de acesso ao produto cultural por um valor em moeda; 4. o uso: momento da
exposição direta do produto cultural àqueles a quem se destina e de sua apropriação por parte do
público. Em economia política, a palavra que consagradamente sintetiza a quarta fase é consumo e não
uso; em política cultural, e na dinâmica da cultura, a preferência é por uso dado que a meta final é
evidenciar o valor de uso do produto cultural e não seu valor de troca. Por valor de uso de um produto
entende-se a significação final por ele adquirida e que implica a apreensão mais ampla possível pelo
receptor e a transformação deste (se não também do bem cultural em si) por aquele. Já o valor de troca
aponta para um aspecto superficial ou exterior do produto e implica que, sob esse ângulo, esse produto
não é inteiramente aproveitado pelo indivíduo , que não sofre nenhuma transformação provocada pelo
produto nem sobre este age. Um par de sapatos tem seu valor de uso traduzido pelo conforto e pela
proteção que pode efetivamente fornecer a seu utilizador e pelo objetivo final ao qual efetivamente se
presta. De outro lado, um par de sapatos tem por valor de troca seus aspectos exteriores, como sua
capacidade de significar a classe social a que pertence seu utilizador, a moda a que se filia, o material
que o constitui, etc. Quando o que predomina num par de sapatos é seu valor de troca, diz-se que ele é
consumido por seu utilizador; quando se destaca seu valor de uso, diz-se que e usado. Tal como se
mostra o cenário da atual etapa das sociedades mais ou menos desenvolvidas e industrializadas, o valor
de troca habitualmente prevalece sobre o valor de uso e se esgota antes, bem antes, de esgotar-se o
valor de uso, o que exige a substituição do produto por outro mais "atualizado". Por situação análoga
passam muitos produtos culturais, se não sua totalidade.
Valor cultural: Em sentido estrito, o valor cultural é o responsável, em política cultural, pelas decisões
sobre o que incentivar, em termos de produção e uso ou consumo, o que difundir e o que preservar.
Sob esse aspecto, o patrimonialismo é um valor tanto quanto o criacionismo (v. política cultural e arte-
ação). Em sentido amplo, valores culturais são todos aqueles que orientam um indivíduo, grupo ou
coletividade, conformando suas visões de mundo e manifestando-se em todas suas representações: a
igualdade de todos perante a lei ou a discriminação, o respeito ou a violência, a dignidade da mulher ou
o machismo, etc. As fontes de valor cultural têm as mais diversas localizações: um modo cultural em
particular (cultura popular, cultura erudita, cultura nacional-popular, cultura oficial), uma classe social
ou profissional, um segmento religioso, um ideal político, uma luta histórica contra inimigo externo ou
entre grupos internos, etc. Os valores culturais são passíveis 1) de duas abordagens distintas: a
fundamentalista, para a qual existem apenas alguns valores a considerar como guias da produção
cultural, evidentes por si só e inquestionáveis (sejam os valores de uma classe social, crença religiosa,
etc.), e a relativista, que entende terem, as culturas, diferentes percepções responsáveis por diferentes
visões de mundo, não sendo possível defender a ascendência de umas sobre as outras.
Fundamentalistas e relativistas, com suas diferenças de opinião, parecem concordar porém em dois
pontos: 1) cultura significa uma luta contra o caos; e 2) cultura significa luta contra outras culturas...
Este segundo ponto deriva do entendimento de que os valores de predileção de uma cultura só podem
ser afirmados mediante a derrota de outros valores e não por um processo de diálogo com eles (v.
globalização). Isto implica a impossibilidade de compreensão verdadeira entre culturas diferentes no
que diz respeito a seus núcleos de valores essenciais. Essa impossibilidade não elimina as tentativas de
contato entre culturas diferentes (tentativas de comunicação entre culturas, entendida, se não como o
oposto da compreensão, pelo menos como versão eufêmica desta), mas está na base das "falhas de
comunicação" inevitáveis e, acaso, insuperáveis. Esta é uma posição que fundamentalistas e relativistas
reivindicam como realista em contraste com o voluntarismo típico de toda política cultural, que consiste
em acreditar ser possível estabelecer pontes entre culturas diferentes. Esta divergência entre
voluntaristas (que dificilmente se reconhecem como tais) realistas recobre uma outra: a possibilidade de
travarem-se batalhas simbólicas das quais resulte a imposição concreta de um valor sobre outro. Para
alguns autores, é inútil tentar combater um símbolo com outro (opor a foice e o martelo à suástica)
quando se quer derrotar um conjunto de valores: para consegui-lo, seria necessário atuar num nível de
concretude indiscutível, que incluem medidas econômicas, esforços diplomáticos e, no limite, a guerra.
Contracapa: [...] uma política cultural deve ser capaz de identificar o que está em jogo na dinâmica
cultural que lhe serve de objeto. E isso apenas conseguirá fazer se assumir, tanto quanto possível, a
forma de uma ciência: a ciência da organização das estruturas culturais.