Plano de Ensino
Plano de Ensino
Plano de Ensino
DE EDUCAÇÃO PNE
QUESTÕES DESAFIADORAS
E EMBATES EMBLEMÁTICOS
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
<
SECRETARIA EXECUTIVA
<
Brasília-DF
Inep
2013
© Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep)
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CDU 37.014.5
Apresentação .................................................................................................................. 7
Anexo
CD - Emendas do Cedes ao Projeto de Lei nº 8035/10
APRESENTAÇÃO
7
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Esta publicação que agora Inep e Cedes apresentam aos leitores, é composta
por textos resultantes das apresentações de treze dos pesquisadores que atuaram
como conferencistas ou como expositores nos simpósios do 3º SEB. Esses artigos
abordam de forma crítica e consistente diferentes temáticas que permeiam o debate e
a produção do plano. Destacamos a relevância e a presença marcante dos autores no
cenário nacional, como referência de pesquisadores em suas diferentes áreas.
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APRESENTAÇÃO
O texto que abre esta obra é de autoria de Carlos Augusto Abicalil e promove uma
retomada histórica sobre a forma como a articulação do Sistema Nacional da Educação
tem sido compreendida desde a Conferência Nacional de Educação (Conae) até o
projeto de Lei n. 8.035/2010, relativo ao Plano Nacional de Educação. O artigo aponta as
características peculiares do federalismo brasileiro, a insuficiente regulamentação da
cooperação federativa, as fragilidades das competências concorrentes entre os sistemas
de ensino e a dispersão da colaboração entre os sistemas. Destaca a oportunidade que
vivemos de construir um Plano Nacional de Educação em condições de atingirmos um
novo patamar da educação brasileira.
No texto seguinte, Nelson Cardoso Amaral parte de estudo realizado pelo IBGE
e pelo Ministério da Fazenda no que se refere à projeção do crescimento populacional
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
e do PIB brasileiros. Com base nesses estudos, o autor realiza projeções, estima os
recursos a serem aplicados em educação no Brasil – em todos os níveis educacionais
– fazendo comparações com outros países, tanto aqueles considerados desenvolvidos
como os em desenvolvimento.
Sobre o tema do Ensino Superior, Paulo Speller apresenta, com base nos
indicadores nacionais referentes ao ensino superior brasileiro na última década, alguns
elementos para fomentar o debate acerca das prioridades desse nível de ensino para
os próximos dez anos, tomando como referência as metas e estratégias contidas no
Projeto de Lei 8.035/2010, especialmente no que diz respeito à expansão qualificada.
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APRESENTAÇÃO
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reflexões de pesquisadores que foram apresentadas no 3º SEB. Portanto, essa é uma
obra importante no sentido de aproximar a produção científica na área do debate e
movimento de elaboração da política educacional.
Boa leitura!
DA CONAE AO NOVO PNE:
A ARTICULAÇÃO DO SISTEMA
NACIONAL DE EDUCAÇÃO
* Mestre em Educação (Gestão de Políticas Públicas) pela Universidade de Brasília (UnB). Secretário de
Articulação com os Sistemas de Ensino do Ministério da Educação (MEC).
E-mail: carlos.abicalil@mec.gov.br.
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
expressiva em torno do verbo conferir: inferir, interferir, aferir, auferir, diferir, deferir,
preferir, proferir, referir. A Conferência constituiu-se, assim, como um fato social e
político que aglutinou, catalisou, amalgamou a realização de todas essas expressões da
sensibilidade humana motivada pelo mesmo fenômeno: a educação escolar brasileira.
Por que temos a organização da educação que temos? Por que há tanta discrepância,
conforme já denunciava Anísio Teixeira, entre o Brasil real e o Brasil oficial? Por que
as leis pouco “pegam” entre nós? Por que o princípio constitucional do regime de
colaboração entre os sistemas de ensino não se efetivou ainda?
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DA CONAE AO NOVO PNE: A ARTICULAÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO
A nova oportunidade realizada pela Conae não foi a única nem a primeira e não
será a última, entretanto não terá cumprido sua tarefa se for apenas a mais recente, se
não cumprir a ousadia inovadora!
Por outro lado, o debate em torno do PNE terá matizes importantes originadas na
própria Conae, no recente embate das eleições nacionais majoritárias e proporcionais
e nas exigências de novos ordenamentos jurídico-constitucionais especialmente
derivados da Emenda Constitucional nº 59/2009. A intrínseca relação entre o PNE e a
articulação do sistema nacional de educação ganhou estatura constitucional inédita,
exigindo a necessária regulação atualizada da cooperação federativa e da colaboração
entre os sistemas, assim como uma nova interação intersetorial e interinstitucional
das políticas públicas em cada esfera de governo.
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
[...] garantir esse direito é hoje o mais importante desafio estratégico do País.
A educação é uma das condições para o desenvolvimento sustentável, a distribuição
de riquezas e a soberania da Nação e se constitui, a um só tempo, em meio e objetivo
do desenvolvimento e diminuição das desigualdades. A educação, sozinha, não pode
promover a transformação necessária. Sem ela, essa transformação será impossível.
(Plano de Governo 2007/2010, p. 64).
[...] Sem dúvida, esta concepção implica que a escola, sempre influenciada pelas
dinâmicas e relações sociais, seja um espaço de investigação e polo de construção e
organização da cultura, que interaja e valorize as várias experiências sociais e culturais
de seus alunos e comunidades. (Plano de Governo 2007/2010, p. 64).
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DA CONAE AO NOVO PNE: A ARTICULAÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO
Como se vê, o PDE está sustentado em seis pilares: i) visão sistêmica da educação, ii)
territorialidade, iii) desenvolvimento, iv) regime de colaboração, v) responsabilização e
vi) mobilização social – que são desdobramentos consequentes de princípios e objetivos
constitucionais, com a finalidade de expressar o enlace necessário entre educação,
território e desenvolvimento, por um lado, e o enlace entre qualidade, equidade e
potencialidade, de outro. [...] ordenado segundo a lógica do arranjo educativo – local,
regional ou nacional.
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Para o 5º Coned, a gestão democrática da educação brasileira deve ter como preceito
básico a radicalização da democracia, que se traduz no caráter público e gratuito da
educação, na inserção social, nas práticas participativas, na descentralização do poder,
no direito à representação e organização diante do poder, na eleição direta de dirigentes,
na socialização dos conhecimentos e das decisões colegiadas e, muito especialmente, na
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DA CONAE AO NOVO PNE: A ARTICULAÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO
Para viabilizar essa concepção de gestão democrática, o 5º Coned reafirma que devem
ser constituídos órgãos colegiados, com ampla participação de setores organizados da
sociedade civil e dos governos, em cada uma das esferas administrativas – o Fórum
Nacional de Educação e os Fóruns Estaduais e Municipais de Educação; o Conselho
Nacional de Educação e os Conselhos Estaduais e Municipais de Educação. No nível
institucional, os Conselhos Escolares e os Conselhos Universitários ou Diretores, que
também devem ser constituídos com representação paritária dos vários segmentos das
comunidades escolares. Cada um desses colegiados tem atribuições específicas, de
natureza deliberativa, envolvendo elaboração, acompanhamento, avaliação e reorientação
de políticas educacionais. Deve ser considerada, também, a necessária articulação de
tais conselhos com os conselhos sociais de controle de políticas, como os Conselhos
Tutelares, os Conselhos da Criança e do Adolescente, os Conselhos de Desenvolvimento
Sustentável, entre outros. (Manifesto do 5º Coned – Congresso Nacional de Educação,
2005).
[...] Embora a Constituição não escreva em seu texto a expressão Sistema Nacional de
Educação, já vimos que ele pode ser facilmente inferido, sobretudo do lugar e do modo
onde se assinala a competência privativa da União em legislar sobre diretrizes e bases
da educação nacional.
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Ainda que possa restar uma controvérsia jurídica sobre o município como unidade mais
administrativa que político-administrativa ou vice-versa, é imprescindível lembrar a
realidade multifacetada dos municípios, a sua experiência histórica e sua inserção na
questão federativa.
Há hoje uma tendência claramente definida pela descentralização. Mas não se pode
esquecer que, hoje, a idéia de descentralização se reforçou e se potencializou com a idéia
de mercado e de estado-mínimo.
[...] Por outro lado, não se pode deixar de apontar as experiências inovadoras que
municípios, de grande e médio portes, conduzidos por prefeitos mais compromissados
com a função pública do poder, vêm trazendo à nossa consideração.
Embora a sociedade capitalista não possa fugir à contradição entre um regime privado de
economia e um regime político que pode incorporar a maioria como sujeito de decisões,
o direito à educação foi sendo incorporado como um direito de todos. Neste sentido,
sua realização universal só pode se efetivar se os sujeitos nele interessados cobrarem do
estado o exercício concreto de sua face pública.
O Brasil ainda não efetivou o seu Sistema Nacional de Educação, o que tem contribuído
para as altas taxas de analfabetismo e a para a frágil escolarização formal de sua
população [...]. Vários foram os obstáculos que impediram [...], sobretudo aqueles que,
reiteradamente, negaram um mesmo sistema público de educação de qualidade para
todos os cidadãos, ao contrário do que aconteceu nos países que viabilizaram um sistema
nacional próprio.
[...] é preciso ter presente que o sistema não é um dado natural, mas é, sempre, um produto
da criação humana. [...] é possível ao homem sistematizar porque ele é capaz de assumir
perante a realidade uma postura tematizadamente consciente. Portanto, a condição da
possibilidade da atividade sistematizadora é a consciência refletida. É ela que permite o
agir sistematizado, cujas características básicas podem assim ser enunciadas:
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DA CONAE AO NOVO PNE: A ARTICULAÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Embora boa parte das considerações listadas aqui não tenha sido incorporada
à LDB, sancionada em 1996, ocorreram inúmeras tentativas posteriores em resgatá-
las e atualizá-las, muitas das quais de autoria inspirada nas demandas das entidades
nacionais constitutivas do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública. O fato de
a LDB já computar mais de 50 alterações nesses 12 anos não é produto do acaso;
para quem tiver a oportunidade de aprofundá-las, vale a pena reler a publicação LDB
interpretada: diversos olhares se entrecruzam, organizada por Iria Brzezinski. Tanto
em propostas de alteração da LDB, de iniciativas legislativas autônomas, de emendas
constitucionais, quanto do próprio PNE, do Fundeb, do Conselho Nacional de Educação
(CNE), das Diretrizes Nacionais de Carreira ou do Piso Salarial Profissional Nacional,
foram 12 anos de resistência. Entramos no tempo de mudança; a oportunidade da
Conae agilizou a batalha contra o tempo.
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DA CONAE AO NOVO PNE: A ARTICULAÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
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DA CONAE AO NOVO PNE: A ARTICULAÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Art. 23 É competência comum da União, dos Estados do Distrito Federal e dos Municípios:
[...]
[...]
[...]
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DA CONAE AO NOVO PNE: A ARTICULAÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO
A proposta embrionária
III – participação da sociedade civil, dos agentes da educação e dos seus destinatários;
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
VII – integração entre a educação escolar formal e as ações educativas produzidas pelo
movimento social;
Art. O sistema nacional articulado de educação tem como órgão normativo o Conselho
Nacional de Educação e como órgão executivo e coordenador o Ministério da Educação.
III – participação da sociedade civil, dos agentes da educação e dos seus destinatários;
VII – integração entre a educação escolar formal e as ações educativas produzidas pelo
movimento social;
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DA CONAE AO NOVO PNE: A ARTICULAÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO
[...]
[...]
(pode-se ter por referência a composição dos segmentos estratificados para a Coordenação
Nacional da Conae, conforme a Portaria nº 1.407/2010 MEC).
[...]
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Mãos à obra
Esta fase, de intensa articulação, tem tarefas imediatas para qualificar a nova
oportunidade.
No cenário mais próximo, é preciso ter em conta que existem projetos de lei
em tramitação com forte incidência sobre a organização de sistemas de ensino e
cooperação federativa. Notadamente, chamam a atenção os Projetos de Lei 7.666/2006
e 1.680/2007. Além de enfrentarem a difícil tarefa de regulamentação em lei federal,
estão muito distantes de considerar a concepção de educação validada pelo Documento
Referência, a partir de seu lastro no movimento social.
O próximo período será muito exigente para esta disputa de projeto de nação.
Desafia para o amadurecimento da proposta, a articulação de alianças estratégicas, a
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DA CONAE AO NOVO PNE: A ARTICULAÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO
elaboração minuciosa da tática política para alcançá-lo, seja na forma do novo PNE,
seja na atualização do ordenamento legal infraconstitucional decorrente. Não será um
processo linear.
Deste modo, quer se realize no poder público municipal, estadual ou federal, o encontro
da universalidade do direito com a totalidade do sistema só se dará quando os sujeitos
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Deste modo, o impacto do sistema nacional de educação pode ser lido a partir de dois
polos mutuamente inclusivos, o da legislação que adota princípios e o dos grupos
sociais interessados em não ficar à margem das conquistas democráticas, entre as quais
a educação pública como direito de cidadania.
Mãos à obra!
Referências bibliográficas
______. PNE, limites e desafios: uma avaliação necessária. Brasília: Câmara dos
Deputados, 2007.
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DA CONAE AO NOVO PNE: A ARTICULAÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
CURY, Carlos Roberto Jamil. A nova lei de diretrizes e bases e suas implicações nos
Estados e município: o sistema nacional de educação. Revista de Educação da CNTE,
Brasília, v. 1, n. 1, jan. 1993.
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PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO:
QUESTÕES EMBLEMÁTICAS
* Doutor em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), professor adjunto da
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG) e professor emérito da Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG). E-mail: crjcury@pucminas.br.
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
1
Essa tendência se apoia em uma das vertentes do princípio de subsidiariedade, pelo qual, no caso de tensionamento
entre família e Estado, cabe à família, como unidade originária, uma prevalência em relação ao Estado. Tal defesa fez
convergir aspectos da doutrina católica com a do positivismo.
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PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO: QUESTÕES EMBLEMÁTICAS
Entre estas últimas esteve sempre o anseio pela elaboração de um plano nacional
de educação que fosse vinculante para todos os entes federados; um plano que fizesse
jus à educação escolar em termos de sua democratização mais ampla e que desse
consequência aos ditames do direito do cidadão e do dever do Estado e aos termos
plano e nacional; um plano que supere a dispersão de iniciativas e que dê conta,
por meio de suas estratégias, metas e recursos, de nossas mazelas e deficiências; um
plano que constitua uma escola comum para todos, gratuita, obrigatória, pública,
laica, inclusiva, qualificada e equidistante de particularismos. Afinal, se finalidades
e princípios são valores comuns constitucionalizados, metas e estratégias devem ser
comuns, ressalvada a aclimatação federativa. Ao lado das competências privativas
e concorrentes dos entes federativos, não temos as competências comuns? Sabe-se
que a proposição de tal plano remonta pelo menos aos anos 30, por iniciativa formal
de militares positivistas presentes no “velho” Conselho Nacional de Educação (1931-
1961), sequiosos do erguimento de uma nação progressista e ordeira, regada pelo
conhecimento científico, anseio posto na Constituição de 1934 com apoio e incentivo
dos reformadores “pioneiros”.
De lá para cá, não foram poucas as iniciativas nessa matéria que enfrentaram
a dura tarefa de dar à educação um significado de nacional e de dar sua contribuição
para transpor a barreira da desigualdade.
2
A ação civil pública é o instrumento que, no projeto de lei de responsabilidade educacional enviado ao Congresso em
2010, pune os gestores que faltem com seus compromissos vinculantes com o direito à educação.
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
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PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO: QUESTÕES EMBLEMÁTICAS
3
A função supletiva da União quanto à educação básica, subentendida na Constituição de 1891, será defendida pelos
reformadores da Educação nos anos 30 e posta na Constituição de 1934, consolidando uma larga tradição. Para os refor-
madores, o papel dos Conselhos teria o condão de garantir a unidade nacional do ensino.
4
&I&85<&DUORV5REHUWR-DPLO6LVWHPD1DFLRQDOGH(GXFDomRGHVD¿RSDUDXPDHGXFDomRLJXDOLWiULDHIHGHUDWLYD
Educação & Sociedade, Campinas, v. 29, n. 105, p. 1187-1210, 2008.
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
III – No Brasil, trata-se de uma situação que remonta a mais de 160 anos
sedimentando uma cultura relativa à descentralização provincial e à autonomia
dos Estados-membros. Tal tradição se apoia não só na maior proximidade entre as
fases de vida próprias da educação básica e os gestores das administrações estaduais
e municipais, mas também nas relações de poder que os vastos sistemas de ensino
propiciam em face dos cargos e funções de confiança, entre os quais os da direção dos
estabelecimentos.
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PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO: QUESTÕES EMBLEMÁTICAS
Por outro lado, não se pode deixar de apontar para a existência de indicadores de
um sistema nacional no interior do desenho constitucional e legal formal ao postular
um regime de colaboração recíproca.
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
O Congresso, até a presente data, não elaborou ainda esta lei nuclear do
pacto federativo. Trata-se de matéria da mais alta importância e significado para o
conjunto das ações públicas e, em especial, para a manutenção e desenvolvimento do
ensino. A feitura de uma lei complementar relativa à educação, em âmbito nacional,
tornada possível com a nova redação do parágrafo, propiciaria o aprimoramento
na sistematização das competências comuns, a fim de coordená-las de modo claro
na forma, cooperativo na articulação e eficaz no desenvolvimento e bem-estar dos
cidadãos brasileiros. E não resta dúvida de ser este um componente essencial de um
sistema nacional da educação em regime de colaboração no qual a União deixasse de
ser apenas um ente coordenador e supletivo para assumir o que diz o termo “União”.
Se se podem distinguir leis federais de leis nacionais, por que não distingui-las
claramente entre leis nacionais vinculantes para toda a União e leis federais relativas
ao sistema federal no que toca à educação?
Enfim, embates e desafios não faltam e não faltaram ao longo de nossa história
para os prós e contras em relação a um Sistema Nacional de Educação que garantisse
uma educação escolar de qualidade, comum e para todos.
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PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO: QUESTÕES EMBLEMÁTICAS
Também o artigo 214, ora emendado em seu inciso VI, estabelece que a
meta de aplicação de recursos públicos em educação deverá ter o Produto Interno
Bruto (PIB) como referência proporcional. Tal medida confere com a ampliação de
responsabilidades por parte dos entes federativos, seja por incremento do acesso,
seja pela ampliação da escolaridade. Ora, em função disso tudo, a universalização do
ensino obrigatório deverá contar necessariamente com formas de colaboração entre
todos os sistemas de ensino dos entes federativos. Mais do que isso, essa obrigação
associada a outras metas deverão ter em si um padrão de qualidade e de equidade
dentro de um Plano Nacional de Educação. Finalmente, diz o caput do artigo 214
emendado:
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
No caso da educação, cabe refletir sobre esse assunto de modo que se ofereçam
subsídios para a sua compreensão.
Assim, sua articulação mútua será organizada por meio de uma engenharia
consociativa e articulada com normas e finalidades gerais, por meio do sistema nacional
de educação em regime de colaboração. É desta concepção articulada entre o sistema
nacional e os sistemas específicos dos entes federativos que decorre a exigência de um
Plano Nacional de Educação (artigo 214 da Constituição Federal) que seja, ao mesmo
tempo, racional nas metas, assegurado nos meios e efetivo nos seus fins.
Pelo fato de sermos uma União, há que haver uma finalidade comum, um sentido
geral, com regras e normas, de modo que se evite a dispersão e se efetive a formação
de um todo uno e múltiplo. Para tanto é necessário um polo de articulação mútua, a
fim de se obter uma harmonia interna. Para ser consequente e efetivo, esse sistema
nacional de educação deverá trazer uma presença mais ativa da União no campo
educacional, sobretudo normativo, ensejando uma maior integração de iniciativas,
evitando-se polissemias e dispersões, máxime no âmbito de um Plano Nacional de
Educação formalizado em lei nacional.
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PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO: QUESTÕES EMBLEMÁTICAS
Nesse sentido, há que se esperar que a educação tenha um perfil que atenda
a uma coesão social, a uma unidade nacional, respeitadas as diferenças regionais e
peculiaridades locais.
Assim, esse sistema nacional de educação não é uma adesão voluntária dos
sistemas de ensino, inclusive do federal. O que está em jogo é o direito do cidadão
e o dever do Estado em vista de um acesso universal à educação de qualidade e de
um regime de igualdade de oportunidades e de condições para o prosseguimento de
estudos no ensino superior ou opção por educação profissional. O que está em jogo são
as finalidades e os princípios da educação, suas diretrizes e bases em vista de direitos
juridicamente protegidos por um pacto e por um consenso cuja expressão advém da
Lei Maior. Essa lei é ao mesmo tempo a união de todos os cidadãos e o código pelo
qual todos se submetem a ele. Trata-se de um pacto pela vida em comum, na qual a
constituição de um poder comum visa ao asseguramento e à garantia de direitos da
cidadania e de direitos humanos. Tais direitos são condição para uma autonomia, uma
igualdade e uma liberdade maiores para todos. Desse modo, as decisões que tiverem
de ser aplicadas em âmbito nacional gozarão do mais alto consenso.
45
RESPONSABILIZAÇÃO,
MERITOCRACIA E PRIVATIZAÇÃO:
CONSEGUIREMOS ESCAPAR
AO NEOTECNICISMO?*
A partir dos anos de 1990, o impacto dessas teorias no campo das políticas
públicas educacionais tem sido enorme. O “guru” que antecipou a formulação dessas
propostas foi o livro de Chubb e Moe chamado “Políticas, mercados e as escolas da
América” (CHUBB; MOE, 1990).
* Esta pesquisa contou com financiamento do Programa Capes – Observatório da Educação. Texto apre-
sentado no 3º Seminário de Educação Brasileira promovido pelo Cedes no Simpósio PNE: Diretrizes para
Avaliação e Regulação da Educação Nacional, fevereiro de 2011. E-mail: fretas.lc@uol.com.br
** Doutor em Ciências (Psicologia Experimental) pela Universidade de São Paulo (USP), onde também con-
cluiu tese de livre-docência e pós-doutorado. Professor titular da Faculdade de Educação da Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp). Coordenador do Movimento contra Testes de Alto Impacto. freitas.lc@
uol.com.br
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
E conclui:
1
Ver (FREITAS, 1992a, 1992b, 1995).
48
RESPONSABILIZAÇÃO, MERITOCRACIA E PRIVATIZAÇÃO: CONSEGUIREMOS ESCAPAR AO NEOTECNICISMO?
Isso não significa que áreas dentro do Ministério da Educação, mesmo sob o
governo Lula, não evoluíram nessa direção, embora sempre de forma contida pela
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Antes do No Child Left Behind [lei aprovada em 2002, no governo Bush, que visa à
melhoria da qualidade da educação por meio de um sistema de prestação de contas
baseado em resultados], a maioria dos Estados já tinha sistema de avaliação. Nos que
primeiro criaram um sistema, a evolução do desempenho dos alunos foi mais acentuada.
Esses sistemas fazem com que as escolas e os dirigentes dos sistemas (secretários,
prefeitos e governadores) se sintam responsáveis pelo desempenho. É a ideia da
responsabilização, de accountability (FERNANDES, 2007).
2
Economista da USP – Ribeirão Preto, hoje membro do Conselho Nacional de Educação.
3
Paige era secretário da Educação no Texas quando Bush era governador. Conduziu o processo. Uma vez presidente,
Bush fez de Paige seu ministro da Educação.
4
Economista da USP – Ribeirão Preto. Ficou no cargo até 2008. Hoje também é consultor do Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID), além de membro do Conselho Consultivo da empresa de avaliação “Avalia”.
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RESPONSABILIZAÇÃO, MERITOCRACIA E PRIVATIZAÇÃO: CONSEGUIREMOS ESCAPAR AO NEOTECNICISMO?
Impedida de avançar via esfera federal no ritmo que desejava, restou a essa
formulação caminhar via Estados e municípios, por um lado,5 e organizar-se
na forma de “movimentos”, por outro, cujo núcleo articulador, no Brasil, é o
Movimento Todos pela Educação e sua ligação com ONGs, institutos e toda sorte de
organizações fartamente financiadas por empresas e corporações privadas, que agem
para convencer lideranças políticas e educacionais a seguir essas teses – como se pode
verificar em Gall e Guedes (s/d) e em Parceiros da Educação (2010).
5
O Estado de São Paulo abrigou essa política nos últimos 15 anos. Em geral onde o Estado ou município é administrado
pelo PSDB e pelo DEM, essa política é tentada – ainda que tenha encontrado adeptos em outros partidos também, p.
ex., no PDT.
6
O termo é uma abreviatura de &KLHIH[HFXWLYHRI¿FHU, origem da sigla CEO, em inglês. Pode ser traduzido por Diretor-
-executivo ou Diretor-geral de uma empresa ou corporação.
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PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Esse movimento das corporações tem por função lidar com a configuração
da força de trabalho brasileira, a qual tem problemas de quantidade e de qualidade.
Segundo o atual ministro da Fazenda, Guido Mantega:
O Brasil é hoje um país de 4,5%, 5% de crescimento – 7,5% [em 2010] foi um crescimento
excepcional que sucedeu um ano com [crescimento] zero. O Brasil ainda não tem
condições de crescer a 7,5%, ele terá. Porque você tem pontos de estrangulamento.
Se continuar crescendo exageradamente tem falta de mão de obra, de infraestrutura
(MANTEGA, 2011).
52
RESPONSABILIZAÇÃO, MERITOCRACIA E PRIVATIZAÇÃO: CONSEGUIREMOS ESCAPAR AO NEOTECNICISMO?
Um excelente artigo de Jorge Arbache (2011) com o título “Brasil precisa elevar
produtividade” mostra por que as corporações empresariais vão pressionar o governo
Dilma por uma “revolução na educação”.
A análise do autor diz que “o Brasil está passando por profunda transformação
demográfica”. A taxa de fecundidade (ou seja, reprodução da força de trabalho)
caiu de 2,8 filhos por mulher para 1,9. A taxa de crescimento populacional caiu de
1,8% em 1990 para 0,9% em 2010. “De fato, a taxa de fertilidade caiu de 3 para 2
filhos por mulher em apenas 18 anos (1988 a 2005)”. Segundo o autor, essa mudança
demográfica terá grandes repercussões econômicas, “como o aumento dos custos
das aposentadorias, serviços de saúde e a pressão sobre taxa de poupança e sobre o
mercado de trabalho”. Mas os dados revelam que “a taxa de crescimento da população
ativa já é negativa – embora a população que chega ao mercado continue crescendo,
ela cresce e crescerá a um ritmo menor. Não por acaso a taxa de desemprego vem
caindo e os salários reais aumentando”, diz o autor.
[...] implica que teremos que nos apoiar no avanço da produtividade do trabalho. [...]
O crescimento da produtividade é, no entanto, historicamente baixo e vem crescendo
moderadamente, a taxas bem menores que as dos países dos Brics.7 Entre 2000 e 2009
a produtividade no Brasil cresceu em média 0,4% ao ano, enquanto que na China e na
7
Países emergentes.
53
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Índia ela cresceu 5,2% e 2,8%. Logo, o aumento da produtividade vai requerer redobrados
esforços do governo e da sociedade.
Depois de citar várias ações necessárias para tal, o autor chega ao ponto:
Segundo Emery (2005, 2002), nos Estados Unidos essa questão ficou clara na
passagem de uma economia industrial para uma economia de serviço. Com o susto
dos anos 80 dado pelos japoneses, as corporações americanas resolveram interferir
decididamente e configurar uma agenda educacional que conseguisse dar cobertura
aos problemas que apareceriam nessa passagem. Em uma economia industrial era
suficiente orientar os estudantes das classes trabalhadoras para os vocacionais e
orientar a classe média para as faculdades (os “colleges” americanos). Mas, em uma
economia baseada em serviços, a agenda educacional tinha que mudar, pois seria
necessário aumentar o número de trabalhadores formados nas faculdades, já que era
necessária uma maior base de trabalhadores com um pouco mais de conhecimento
para determinados ramos da economia de serviços.
54
RESPONSABILIZAÇÃO, MERITOCRACIA E PRIVATIZAÇÃO: CONSEGUIREMOS ESCAPAR AO NEOTECNICISMO?
Aqui, a questão não é ser contra a ampliação da educação para a classe média
e para os trabalhadores, mas sim de se ter clareza do porquê desses movimentos e,
no interior dessa contradição, tirar proveito dela em função dos interesses da maioria
da população e não deixá-los restritos aos interesses imediatistas das corporações.
Entretanto, se não podemos esquecer a contradição, também não podemos achar que
seu desenvolvimento será automático. Olhar esse processo na ótica dos trabalhadores
só será possível se entendermos os mecanismos ideológicos que tais ações estão
servindo, de forma que se possa questioná-los. E é isso que se espera do governo
Dilma.
Scher e Burchard (2009, p. 1), com base em uma série de reportagens sobre a
era Bush e a implantação do No Child Left Behind (MANDEVILLA, 2007), afirmam:
55
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
8
Ver também o livro de Burch (2009).
9
O PNE – Plano Nacional de Educação – proposto pelo governo contempla amplamente nos seus itens 3.2; 5.3; 5.4;
6.4;7.6; 7,7; 8.1 e 10.5 a indústria educacional da tutoria, avaliação e assessoria.
56
RESPONSABILIZAÇÃO, MERITOCRACIA E PRIVATIZAÇÃO: CONSEGUIREMOS ESCAPAR AO NEOTECNICISMO?
Os testes, por outro lado, demandam uma complexa cadeia tecnológica que
Estados e municípios não têm como dominar, o que abre espaço para o crescimento
da indústria da avaliação e da tutoria. Se para as corporações interessa o recurso à
fixação de “standards” como forma de triar a força de trabalho e monitorar os fluxos
de qualificação de mão de obra, além do óbvio controle ideológico da educação, para
a indústria educacional os objetivos são mais imediatos e referem-se à conversão da
educação em mais espaço mercadológico.
Essas forças hoje falam, no Brasil, através do Movimento Todos pela Educação
e através de uma gama de ONGs, institutos e organizações sociais sem fins lucrativos.
A essas cabe criar as condições políticas e ideológicas de implementação de práticas
que demandem a cadeia tecnológica que garantam os objetivos dessa coalizão de
interesses – alguns bem intencionados, outros nem tanto.
Um dos efeitos dos testes de alto impacto que estou segura que agradou os CEOs, é que
o debate histórico público sobre quais deveriam ser os objetivos da educação [...] foi
eliminado. Em seu lugar, o aumento das pontuações nos testes tornou-se um fim em si
mesmo.
Não é sem razão que, seguindo a linha de aparelhar a educação pelos interesses
corporativos empresariais, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento
57
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Econômico (OCDE) tenha ficado com a tarefa de avaliar a educação no mundo com
base em padrões que ela desenvolveu na forma de habilidades medidas em um teste
padronizado chamado Pisa, em português, Programa Internacional de Avaliação de
Estudantes10.
Podemos entender que essa preocupação faça parte dos objetivos educacionais,
mas não podemos concordar em reduzir a educação a essas necessidades corporativas
e nem delegar a elas a avaliação da qualidade da educação das nações. Embasada em
um parâmetro próprio, a OCDE põe todos os Ministérios da Educação na perspectiva
de um alinhamento da qualidade de sua educação a esses parâmetros que orientam o
Pisa.
7.25). Confrontar os resultados obtidos no Ideb com a média dos resultados em matemática,
leitura e ciências obtidos nas provas do Programa Internacional de Avaliação de Alunos
– Pisa, como forma de controle externo da convergência entre os processos de avaliação
do ensino conduzidos pelo Inep e processos de avaliação do ensino internacionalmente
reconhecidos. (BRASIL, 2010).
A definição dos objetivos educacionais, portanto, está sendo feita de fora para
dentro, por cima das especificidades culturais locais e acima de um projeto nacional
10
23LVDpXPSURJUDPDLQWHUQDFLRQDOGHDYDOLDomRFRPSDUDGDFXMDSULQFLSDO¿QDOLGDGHpSURGX]LULQGLFDGRUHVVREUHD
efetividade dos sistemas educacionais, avaliando o desempenho de alunos na faixa dos 15 anos, idade em que se pres-
supõe o término da escolaridade básica obrigatória na maioria dos países. As avaliações do Pisa incluem cadernos de
prova e questionários e acontecem a cada três anos, com ênfases distintas em três áreas: Leitura, Matemática e Ciências.
58
RESPONSABILIZAÇÃO, MERITOCRACIA E PRIVATIZAÇÃO: CONSEGUIREMOS ESCAPAR AO NEOTECNICISMO?
para a sua juventude. Assume-se que o que é valorizado pelo Pisa é bom para todos
já que é o básico. Mas, o que não está sendo dito é que a “focalização no básico”
restringe o currículo de formação da juventude e deixa muita coisa relevante de fora,
exatamente o que se poderia chamar de “boa educação”.
A argumentação de que o básico é bom porque tem que vir em primeiro lugar é
tautológica e nos leva a acreditar que “o básico é bom porque é básico”. O efeito é que,
com base nesse estereótipo, não pensamos mais. Com esta lógica de senso comum,
são definidos os objetivos da “boa educação” para todos os povos, via OCDE. Mas o
básico exclui o que não é considerado básico – essa é a questão. O problema não é
o que ele contém como “básico”, é o que ele exclui sem dizer, pelo fato de ser “básico”.
Esse é o “estreitamento curricular” produzido pelos “standards” centrados em Leitura
e Matemática. Eles deixam de fora a boa educação que sempre será mais do que o
básico.
É verdade que muito se avançou nessas áreas, permitindo que tenhamos hoje
técnicas que isolam por um lado e relacionam por outro, fatores que conseguem
explicar muito mais a variabilidade dos fenômenos educacionais do que na década
de 70. Entretanto, nada justifica que as advertências clássicas sobre o uso de testes
sejam desconsideradas. Os modelos matemáticos e seus processamentos não podem
eliminar os problemas classicamente apontados para o uso dos testes e medidas e que
são propriedade de uma ciência diferente, a psicometria.
59
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Basicamente, a discussão sobre os limites dos testes tem sua origem na falta
de entendimento sobre as suas bases: testes não dão uma medida direta e completa
do desempenho educacional de um aluno – diz Koretz (2008, p. 9). As duas razões
principais são: a) os testes podem medir apenas uma parte dos objetivos educacionais
e não todos os objetivos educacionais; e b) mesmo aqueles objetivos que são passíveis
de serem medidos são apenas pequenas amostras que são usadas para estimar o
desempenho de grandes domínios de conhecimentos e habilidades.
A TRI trata exatamente de como fazer essa estimação por meio de pequenas
amostras, usando técnicas matemáticas de estimação da proficiência do aluno. Embora
esses processos estejam, hoje, muito mais sensíveis do que quanto tínhamos apenas
a teoria clássica de medição, o fato é que este aumento de qualidade preditiva está
sempre associado com a outra limitação inerente aos testes: eles não medem todos
os objetivos educacionais. Seus resultados não podem ser considerados, portanto,
sinônimo de boa educação, em sentido geral.
Mas o que os estudiosos clássicos dos testes alertam é exatamente isso: nem
todos os objetivos educacionais podem ser medidos na forma de competências ou
habilidades e, se não bastasse, apenas uma pequena parte de um domínio muito grande,
por exemplo, o conhecimento que o aluno adquiriu durante o quarto ano do ensino
fundamental, pode ser medido por questões de tempo e de custo. A primeira redução
é feita quando nos concentramos em uma ou duas disciplinas (geralmente Português
e Matemática) e depois, uma segunda redução é aplicada quando “escolhemos”
dentro do conhecimento de português quais competências e habilidades devem ser
submetidas a testes. “As pontuações nos testes refletem uma pequena amostra do
60
RESPONSABILIZAÇÃO, MERITOCRACIA E PRIVATIZAÇÃO: CONSEGUIREMOS ESCAPAR AO NEOTECNICISMO?
Todo esse processo inicial não tem nada a ver com a qualidade e o poder da
TRI, mas sim com decisões tipicamente educacionais que são tomadas por equipes de
assessorias junto ao poder público. Essas escolhas são inevitavelmente feitas segundo
as matrizes teóricas assumidas por essas equipes, do ponto de vista de sua concepção
de educação, de suas opções epistemológicas, psicológicas, sociológicas e filosóficas.
Mas nada de tais opções é revelado ou registrado. O produto é resumido secamente em
um instrumento técnico chamado “matrizes de referência”. Tais matrizes servem para
que se produzam os itens que comporão a avaliação do aluno.11
É verdade que “a qualidade do nosso ensino [USA] de matemática e ciência está atrás
de outras nações? “Depende – diz ele – de como se mede a qualidade. Se medida em
termos de resultados de testes em avaliações internacionais, sim, mas esses resultados
de testes não indicam necessariamente a qualidade do ensino de matemática e ciências e,
certamente, não preveem a prosperidade econômica de uma nação ou a sua capacidade
de inovação.
Estas “reformas” não são susceptíveis de melhorar a educação dos EUA. [...] Ao enfatizar
os testes de conhecimentos básicos, este programa garante que os estudantes terão menos
tempo para a ciência, a história, as artes ou de línguas estrangeiras e, portanto, será
11
Note-se, por exemplo, no caso do Plano Nacional de Educação, as estratégias previstas para a meta 2 (universalizar a
HGXFDomRIXQGDPHQWDOGHQRYHDQRVLQFOXLQDGH¿QLUDWpGH]HPEURGHH[SHFWDWLYDVGHDSUHQGL]DJHPSDUD
todos os anos do ensino fundamental. Combinado com o item 7.4 da meta 7, tem-se que o foco da avaliação serão habi-
lidades em Leitura, Matemática e Ciências. O estreitamento curricular que isso produziu em outros países, ocorrerá aqui.
Todas as demais disciplinas passam a ser acessórias.
61
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
A utilização dos testes de alto impacto não vai parar no nível do ensino
fundamental e vai chegar à educação infantil. O próprio Plano Nacional de Educação
do governo Dilma já estabelece: “5.2) Aplicar exame periódico específico para aferir a
alfabetização das crianças” (BRASIL, 2010) para garantir a alfabetização aos oito anos
de idade.
62
RESPONSABILIZAÇÃO, MERITOCRACIA E PRIVATIZAÇÃO: CONSEGUIREMOS ESCAPAR AO NEOTECNICISMO?
Um estudo conduzido por Baker e Ferris (2011) revela que os orçamentos das
escolas privatizadas sob contrato (“charters schools”) variam e que as mais bem dotadas
da cidade de Nova Iorque recebem fundos privados (doações) adicionais superiores a
10.000 dólares por aluno a mais do que recebem as escolas públicas tradicionais e até
mesmo outras charters. Seria de se supor que tivessem uma educação com qualidade
muito superior às escolas públicas, entretanto os autores concluem que “elas não
têm”. O caso de Nova Iorque ilustra porque se deseja a privatização da educação. Não
é só transformar a educação em um negócio para obter recursos públicos. De fato, os
homens de negócio também estão de olho na complementação privada que chega via
doações das fundações.
12
Accountability em inglês.
63
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Portanto, temos que olhar para o conjunto da proposta e não apenas para uma
ou outra técnica de medição ou controle. Responsabilização e privatização caminham
juntas. Não é uma questão meramente acadêmica ou técnica de aprimoramento de
formas de medição ou cálculo de valor agregado. Há uma ideologia, uma concepção
de como se organizar e promover a educação pública.
Em primeiro lugar, cabe lembrar de onde vem esta ideia de que o comportamento
humano é passível de ser controlado pelas suas consequências. Além de ter origem
no próprio senso comum, ela foi sistematizada em laboratório nos anos de 1960 pela
psicologia comportamentalista. Todos os que temos alguns anos de atuação no campo
da educação nos lembramos das teses do behaviorismo, na figura proeminente de
B. F. Skinner. Skinner (1967) propôs que a maior parte do comportamento humano
se enquadra em uma categoria chamada “comportamento operante”, que tem sua
64
RESPONSABILIZAÇÃO, MERITOCRACIA E PRIVATIZAÇÃO: CONSEGUIREMOS ESCAPAR AO NEOTECNICISMO?
Por outro caminho, Campbell faz um alerta que considero igualmente relevante
e que, de certa forma, comprovam as constatações de Skinner: “Quanto mais um
indicador social quantitativo é utilizado para fins sociais de tomada de decisão, mais
sujeito ele estará à pressão de corrupção e mais apto ele estará a distorcer e corromper
os processos sociais que se pretende monitorar” (CAMPBELL, 1976, p. 49).
Note-se que esse não é um problema meramente técnico, mas perceptivo. Trata-
se da interação entre os sujeitos e as consequências dos indicadores – não importando
quais sejam os métodos de elaboração de tais indicadores. Não se trata de refinamento
metodológico. Trata-se de uma reação psicossocial dos próprios informantes que
afeta a construção dos próprios indicadores.14 Não é sem razão que os sistemas
meritocráticos estão sempre às voltas com as fraudes (MADAUS; RUSSELL; HIGGINS,
2009; NICHOLS; BERLINER, 2007).
13
Vide nas últimas semanas a situação no Egito.
14
Sobre como este princípio impacta os testes de alto impacto em voga nos Estados Unidos, ver Nichols e Berliner
(2007).
65
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
66
RESPONSABILIZAÇÃO, MERITOCRACIA E PRIVATIZAÇÃO: CONSEGUIREMOS ESCAPAR AO NEOTECNICISMO?
Desde que todos os testes contêm algum grau de erro, falsos positivos e falsos negativos
vão sempre ocorrer quando notas de corte são usadas para classificar estudantes em
grupos discretos. [...] Al Beaton, um renomado psicometrista, mostrou que o problema
da classificação errada aumenta à medida que um teste torna-se menos confiável. Para
um teste em que se tenta colocar os estudantes dentro de quatro níveis de performance,
19% dos estudantes são mal classificados se a confiabilidade do teste é .95 – um grau
de confiabilidade muito alto. As classificações erradas aumentam para 29% quando
a confiabilidade é .90 – a confiabilidade usada em muitos testes estatais. Para uma
confiabilidade de .80, 38% dos estudantes são mal classificados.
Ante esses problemas, qual a preocupação do PNE com o Enem? Que ele tenha
técnicas que permitam comparabilidade dos resultados do exame – enfatiza-se isso
porque como ele terá várias edições ao ano, elas têm que ser comparáveis. Esta é uma
questão técnica já equacionada dentro da TRI, conhecida como equalização: colocação
de itens comuns às várias provas. Mas o problema mais grave de todas as avaliações
que o Inep usa, menos a Provinha Brasil, pois não há consequências duras associadas
a ela, é a validade dos testes e não a comparabilidade. Há vários tipos de validade a
serem calculadas e, como vimos acima, elas afetam a probabilidade de falsos positivos
e negativos. Todos os testes do Inep precisam revelar seus cálculos de validade e as
probabilidades de falso positivo e negativo. É um direito do consumidor.
Ao prestarem contas ao Ministério da Educação (MEC) sobre o uso das verbas federais as
secretarias passariam a ser punidas nos casos em que se flagrar o mau uso do dinheiro.
Caberia ao ministério, antes de fazer o repasse, estabelecer um conjunto de metas bastante
claras sobre a aplicação dos recursos, por estado e município. A ideia é combater desvios
de toda ordem, como merendas jamais servidas e licitações fraudulentas – modalidades
de corrupção tão comuns no Brasil.
15
Nos Estados Unidos a lei se chama No Child Left Behind e é de 2001.
67
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
9 É pouco provável que as políticas que nós estamos seguindo hoje melhorem nossas
escolas. Ao contrário, muito do que os formuladores de política demandam hoje
muito provavelmente tornarão as escolas menos eficazes e podem futuramente
rebaixar a capacidade intelectual de nossos cidadãos.
9 Nossos problemas educacionais são função de nossa falta de visão educacional, não
um problema de gestão que requer o recrutamento de uma armada de consultores de
negócios.
16
Diane Ravitch foi subsecretária da Educação de Bush e abandonou a abordagem da responsabilização e meritocracia
depois de vivenciar as consequências dessa política, que ela ajudou a implementar nos Estados Unidos. Hoje é uma das
maiores ativistas contra esse tipo de enfoque para a educação.
68
RESPONSABILIZAÇÃO, MERITOCRACIA E PRIVATIZAÇÃO: CONSEGUIREMOS ESCAPAR AO NEOTECNICISMO?
9 Nossas escolas não melhorarão se nós focarmos exclusivamente nos testes para como
meio para decidir o destino de estudantes, professores, diretores e escolas.
9 Nossas escolas não melhorarão se nós continuarmos a fechar escolas nas comunidades
em nome da reforma.
9 Nossas escolas não melhorarão se as escolas charter continuarem a sugar das escolas
públicas regulares os alunos mais motivados e suas famílias nas comunidades mais
pobres.
9 Nossas escolas não melhorarão se esperamos delas que atuem como empresas
privadas, lucrativas. Escolas não são negócios, elas são um bem público. O objetivo
da educação não é produzir altas pontuações, mas educar as crianças para serem
pessoas responsáveis com pensamento bem desenvolvido e bom caráter. Não se deve
esperar que as escolas produzam lucro na forma de pontuações de valor agregado.
9 Nossas escolas não vão melhorar se nós a usarmos para todo e qualquer propósito [...]
As escolas devem trabalhar com outras instituições e não substituí-las.
9 Se nos queremos melhorar a educação, nós antes de tudo temos que ter uma visão do
que é uma boa educação.
9 O objetivo da avaliação não é identificar escolas que devem ser fechadas, mas
identificar escolas que precisam de ajuda.
Por essas e outras razões, a comunidade científica tem alertado contra a forte dependência
dos resultados dos testes, mesmo quando métodos sofisticados de valor agregado
(VAM) são utilizados, para decisões de alto impacto como remuneração, avaliação ou
estabilidade. Por exemplo, o Board on Testing and Assessment of the National Research
Council of the National Academy of Sciences afirma: “[...] estimativas da eficácia de
professores baseadas em métodos de valor agregado (VAM) não devem ser usadas para
tomar decisões operacionais, pois essas estimativas são muito instáveis para serem
consideradas justas ou de confiança. Uma revisão da pesquisa baseada em valor agregado
da política do Educational Testing Service concluiu que os métodos de valor agregado
69
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
não devem servir como base única ou principal para a tomada de decisões sobre os
professores. Há muitas armadilhas para fazer atribuições causais da eficácia do professor
com base nos tipos de dados tipicamente disponíveis nos distritos escolares. Ainda nos
falta um conhecimento adequado da seriedade com que os diferentes problemas ameaçam
a validade de tais interpretações. E os pesquisadores da Rand Corporation informam
que: as estimativas baseadas na modelagem de desempenho VAM são frequentemente
muito imprecisas para apoiar algumas das inferências desejadas [...]” e que a base da
investigação é insuficiente para suportar o uso de VAM para as decisões de alto impacto
sobre os professores individualmente ou sobre as escolas (p. 2-3).
E conclui:
70
RESPONSABILIZAÇÃO, MERITOCRACIA E PRIVATIZAÇÃO: CONSEGUIREMOS ESCAPAR AO NEOTECNICISMO?
Há muitos tipos diferentes de modelos de valor agregado, e até agora, não há nenhum
método dominante. Não existe uma abordagem de valor agregado (ou qualquer outro
indicador baseado em testes, nesta matéria) que resolva todos os desafios de identificar
professores e escolas eficazes ou ineficazes (p. 57).
Em suma, a maioria dos participantes do workshop foi bastante positiva sobre a utilidade
potencial dos modelos de valor agregado para fins de decisões de baixo impacto (low-
stakes), mas muito mais cautelosa quanto ao seu uso para decisões de alto impacto (high-
stakes) (p. 66).
Com este estado da arte, como podemos fazer uso de tais métodos para tomar
decisões que afetam a vida de milhares de professores e alunos, mesmo admitindo-se
que tais técnicas estejam em desenvolvimento?
Para ilustrar essa questão, citamos o recente caso de Los Angeles (FELCH;
SONG; SMITH, 2010). Cerca de 6 mil professores de 470 escolas de Los Angeles foram
ranqueados por cálculo de valor agregado tomando-se por base dados de seus alunos
entre 2004 a 2009.
A questão ética que esses estudos levantam é grave. O novo estudo mostra que
em Leitura, há 516 professores sub-ranqueados (falso negativo) e 612 professores
sobrerranqueados (falso positivo). Ou seja, 516 deveriam estar em uma melhor
posição do que estão no ranking (falso negativo) e 612 estão acima do que deveriam
estar de fato (falso positivo). Para Matemática, o estudo mostra que existem 257 falsos
negativos e 454 falsos positivos.
71
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
A última revisão sobre avaliação por valor agregado foi escrita pelo economista Sean
Corcoran (2010) da Universidade de Nova York. Ele examina as avaliações por valor
agregado de Houston e Nova York. Ele descreve margens de erro tão grandes que um
professor no 43º percentil (na média) poderia na verdade estar no 15º percentil (abaixo
da média) ou no 71º percentil (acima da média).
Também uma recente tentativa da Fundação Bill and Melinda Gates de validar o
uso de valor agregado na avaliação de professores foi contestada por Rothstein (2011).
Não obstante todas essas evidências, uma recente reportagem no Brasil feita
pelo Jornal Valor Econômico (MÁXIMO, 2011) mostra que sua popularidade no Brasil
tende a crescer:
Assim como nas empresas, a adoção de bônus salariais para educadores que se destacam
no trabalho e superam metas está associada a avanços de gestão. Praticamente todos os
secretários e secretárias estaduais de Educação ouvidos pelo Valor vão dedicar grande
esforço na geração e no monitoramento extensivo de estatísticas e informações e na
criação de sistemas de avaliação próprios – inclusive com o auxílio de consultorias
externas.
72
RESPONSABILIZAÇÃO, MERITOCRACIA E PRIVATIZAÇÃO: CONSEGUIREMOS ESCAPAR AO NEOTECNICISMO?
Pelos estudos aqui reunidos – e são apenas uma pequena parte, pode-se ver
que as tentativas de avaliar o professor pelo desempenho do aluno são no mínimo
controversas. Diane Ravitch (2010) diz:
Além disso, continua a autora, a qualidade de ser um bom professor não é uma
habilidade necessariamente permanente. Alguns são excelentes ano após ano. Outros
são eficientes um ano, mas não no outro, medido com os mesmos instrumentos.
Aparentemente, as pontuações dos testes de seus estudantes refletem algo mais do que
aquilo que os professores fizeram, tal como a habilidade do estudante e sua motivação,
ou as características de sua classe ou condições da escola. Talvez o professor tenha
uma grande interação com uma classe em um ano, mas não no ano seguinte. Ou os
estudantes não são similares de ano para ano.
As charters são escolas privatizadas que funcionam sob contrato anual que
especifica metas para serem atingidas. Na visão de seus proponentes, ela deveria
ser melhor que as escolas públicas já que para estes um dos graves problemas da
educação se deve ao fato de ela estar predominantemente nas mãos do poder público,
em especial a educação básica.
73
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
[...] a simples existência dessas escolas promoverá uma saudável concorrência com
as demais escolas da rede pública e proporcionará mais uma alternativa de educação
gratuita à população, e agrega “vide recente exemplo da cidade de Nova Iorque, que
decidiu ampliar ainda mais a abertura de novas “charters schools”, apesar da resistência
do sindicato dos docentes.
A eficácia das escolas “charter” variou amplamente nos estados. Em cinco estados
– Arkansas, Colorado (Denver), Illinois (Chicago), Louisiana, e Missouri – alunos de
escolas charter experimentaram um crescimento significativamente maior – variando
de 0,02 a 0,07 desvios-padrão – em relação às tradicionais escolas públicas. Em seis
estados – Arizona, Flórida, Minnesota, New México, Ohio e Texas – alunos de escolas
“charter” experienciaram menores ganhos de aprendizagem – variando de .01 a .06 – do
que às escolas públicas. Em quatro estados – Califórnia, distrito de Columbia, Geórgia
e Carolina do Norte- os resultados foram mistos ou não diferentes dos ganhos da escola
pública (p. 45).
74
RESPONSABILIZAÇÃO, MERITOCRACIA E PRIVATIZAÇÃO: CONSEGUIREMOS ESCAPAR AO NEOTECNICISMO?
Mais de 20 anos dessas políticas nos Estados Unidos não contribuíram para a
melhoria do sistema educacional americano. Ao contrário, destruíram seu sistema
público de ensino. A diferença entre o desempenho de brancos e negros nos EUA,
entre 1999 e 2004, caiu de 28 para 23 pontos. Trinta anos antes, em 1973, era de 35
pontos sendo, portanto pouco afetada, como mostra a análise de Rothstein (2008).
Qual a situação dos Estados Unidos nos testes internacionais do Pisa: está
na média há dez anos e não melhora. Está empacado. Estava antes de adotar essas
medidas e continua a estar depois delas (OCDE, 2010).
17
Um excelente livro de Sharon L. Nichols e David C. Berliner chamado (IHLWR&RODWHUDOFRPRRVWHVWHVGHDOWRLPSDFWR
FRUURPSHPDVHVFRODVGD$PpULFD mostra as variadas formas de destruição do sistema público de educação americano
(NICHOLS; BERLINER, 2007).
75
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Considerações finais
Trata-se, agora, de criar uma segunda geração mais exigente. Que aprenda
com os problemas gerados pelo sequestro da avaliação pela área dos negócios em
outros países. Que seja exigente quanto aos critérios de validade dos testes e seus
limites e que exija do poder público garantias de que tais critérios e limites estejam
sendo observados.
Essa nova fase deverá ser orientada por um código de ética que regule a ação
dos vários sujeitos que participam dessa atividade. Não podemos entregar nossos
diretores, professores e alunos à ação desregulamentada, seja de governos, seja da
indústria de avaliação educacional que se constitui no Brasil.
Será necessário que o Inep retome sua vocação de pesquisa deixada de lado e que
se converta em um órgão que monitore não somente a qualidade da educação via Ideb,
Prova Brasil ou Pisa, mas que construa um entendimento do que nós consideramos,
autonomamente como país soberano, o que seja uma boa educação. Um Inep que
pesquise como essa qualidade se distribui no interior da sociedade brasileira levando
em conta raça, gênero, nível socioeconômico, distâncias de desempenho entre grupos
étnicos e sociais, entre outras variáveis, usando tecnologia de medição avançada que
implique o monitoramento dos fluxos de alunos, a obtenção de dados fidedignos do
contexto econômico e social da educação brasileira, seu desempenho longitudinal,
com estudos de painel que registrem o desenvolvimento dos alunos na sua entrada no
sistema e ao longo de sua trajetória. Ou seja, um Inep mais investigativo e apoiador
do que um Inep que comodamente se senta para elaborar testes e divulgar estatísticas
destinadas a responsabilizar gestores, diretores, professores e alunos.
76
RESPONSABILIZAÇÃO, MERITOCRACIA E PRIVATIZAÇÃO: CONSEGUIREMOS ESCAPAR AO NEOTECNICISMO?
Mas a batalha mais dura será contra a privatização da escola pública, via
responsabilização e meritocracia. Nesse campo, teremos que enfrentar o fato de que
as várias matizes ideológicas brasileiras, consubstanciadas em partidos políticos que
conduzem a formulação das políticas e fazem as leis, convergem para o centro do
espectro político, caracterizado pela indefinição ideológica.
77
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
O No Child Left Behind introduziu uma nova definição de reforma escolar que foi
aplaudida tanto por Democratas como Republicanos. Nesta nova era a reforma escolar
foi caracterizada por responsabilização, testes de alto impacto, decisões baseadas em
dados, escolha, escolas “charter”, privatização, desregulamentação, pagamento por mérito
e competição entre escolas. Qualquer coisa que não pudesse ser medida, não contava.
Foi irônico que um presidente Republicano conservador tenha sido responsável pela
maior expansão do controle federal da história da educação americana. Foi igualmente
18
O PT, pelos seus vereadores, a bem da verdade, liderou um processo de resistência que está levando a um reposicio-
namento da questão. Isso se deve à proximidade da disputa eleitoral de 2012, na qual ele pretende apresentar candidato
SUySULR H SDUD WDO WHP TXH GLIHUHQFLDUVH GR 3'7 0DV DLQGD QmR VDEHPRV QHVWH PRPHQWR R UHVXOWDGR ¿QDO GHVVH
processo.
78
RESPONSABILIZAÇÃO, MERITOCRACIA E PRIVATIZAÇÃO: CONSEGUIREMOS ESCAPAR AO NEOTECNICISMO?
Referências bibliográficas
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O NOVO PNE E O FINANCIAMENTO
DA EDUCAÇÃO NO BRASIL:
OS RECURSOS COMO UM PERCENTUAL DO PIB
Introdução
* Doutor em Educação pela Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep). Foi Diretor do Instituto de Ma-
temática e Física, Pró-Reitor de Administração e Finanças e Vice-Reitor da Universidade Federal de Goiás
(UFG). Publicou o livro Financiamento da educação superior: Estado x mercado (São Paulo: Cortez; Ed. da
Unimep, 2003), artigos e capítulos de livros. E-mail: nelsoncardosoamaral@gmail.com
85
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
[...]
86
O NOVO PNE E O FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO NO BRASIL: OS RECURSOS COMO UM PERCENTUAL DO PIB
87
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Total de
% PIB PIB/PPP em População Valor aplicado por
recursos em
País aplicado em US$ bilhões em idade pessoa em idade
educação
educação (de 2009) educacional educacional (US$)
(US$ bilhões)
Da mesma forma, se dois países têm os mesmos valores totais de PIBs e aplicam
os mesmos percentuais em educação, aplicará valor mais elevado, por pessoa em idade
educacional, aquele que tiver a menor quantidade de pessoas nas idades corretas para
estudar.
88
O NOVO PNE E O FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO NO BRASIL: OS RECURSOS COMO UM PERCENTUAL DO PIB
O Iêmen é o país, entre os considerados, que tem o maior desafio educacional, seguido
da Índia, Paraguai, Bolívia, Indonésia, China e Brasil, na 7ª posição. Examinando-se
a Tabela 2, conclui-se que o Iêmen já está fazendo um grande esforço nesse setor,
pois já aplica o equivalente a 9,6% do PIB em educação e, apesar disso, tem um valor
aplicado por pessoa em idade educacional muito pequena (US$ 493,00), em razão do
pequeno valor de seu PIB, comparado com o quantitativo da população que está na
idade correta para estudar.
89
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Valor
%PIB PIB/PPP aplicado População US$ por
País
aplicado de 2009 em em idade pessoa Ranking
em (US$ educação em idade
educação bilhões) (US$ educacional educacional
bilhões)
Iêmen 10 58 5,8 11.770.140 493 1º.
Índia 10 3.548 354,8 481.324.331 737 2º.
Paraguai 10 28 2,8 2.746.178 1.020 3º.
Bolívia 10 45 4,5 4.142.335 1.086 4º.
Indonésia 10 968 96,8 78.429.901 1.234 5º.
China 10 8.767 876,7 397.805.782 2.204 6º.
Brasil 10 2.024 202,4 84.400.000 2.398 7º.
Botsuana 10 24 2,4 947.918 2.532 8º.
África do
10 488 48,8 18.114.108 2.694 9º.
Sul
Cuba 10 110 11 3.013.571 3.650 10º.
México 10 1.473 147,3 39.404.617 3.738 11º.
Argentina 10 558 55,8 13.440.740 4.152 12º.
Chile 10 244 24,4 5.513.934 4.425 13º.
Uruguai 10 48 4,8 1.032.883 4.647 14º.
Rússia 10 2.103 210,3 30.724.722 6.845 15º.
Portugal 10 232 23,2 2.282.031 10.166 16º.
Coreia do
10 1.343 134,3 11.344.492 11.838 17º.
Sul
França 10 2.113 211,3 15.275.698 13.832 18º.
Dinamarca 10 199 19,9 1.381.003 14.410 19º.
Canadá 10 1.278 127,8 8.656.329 14.764 20º.
Espanha 10 1.367 136,7 8.864.918 15.420 21º.
Austrália 10 819 81,9 5.288.326 15.487 22º.
Alemanha 10 2.812 281,2 17.997.395 15.624 23º.
Japão 10 4.141 414,1 25.807.634 16.046 24º.
EUA 10 14.250 1425 85.668.128 16.634 25º.
Áustria 10 323 32,3 1.866.320 17.307 26º.
Noruega 10 277 27,7 1.280.237 21.637 27º.
90
O NOVO PNE E O FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO NO BRASIL: OS RECURSOS COMO UM PERCENTUAL DO PIB
País Ranking
População em
População total
% da população em
idade educacional idade educacional
Iêmen 1º. 11.770.140 22.858.238 51
Índia 2º. 481.324.331 1.156.897.766 42
Paraguai 3º. 2.746.178 6.995.665 39
Bolívia 4º. 4.142.335 9.775.246 42
Indonésia 5º. 78.429.901 240.271.522 33
China 6º. 397.805.782 1.338.612.968 30
Brasil 7º. 84.400.000 189.000.000 45
Botsuana 8º. 947.918 1.990.876 48
África do Sul 9º. 18.114.108 49.052.489 37
Cuba 10º. 3.013.571 11.451.652 26
México 11º. 39.404.617 111.211.789 35
Argentina 12º. 13.440.740 40.913.584 33
Chile 13º. 5.513.934 16.601.707 33
Uruguai 14º. 1.032.883 3.494.382 30
Rússia 15º. 30.724.722 140.041.247 22
Portugal 16º. 2.282.031 10.707.924 21
Coreia do Sul 17º. 11.344.492 45.508.972 25
França 18º. 15.275.698 64.057.792 24
Dinamarca 19º. 1.381.003 5.500.510 25
Canadá 20º. 8.656.329 33.487.208 26
Espanha 21º. 8.864.918 40.525.002 22
Austrália 22º. 5.288.326 21.262.641 25
Alemanha 23º. 17.997.395 82.329.758 22
Japão 24º. 25.807.634 127.078.679 20
Estados
25º. 85.668.128 307.212.123 28
Unidos
Áustria 26º. 1.866.320 8.210.281 23
Noruega 27º. 1.280.237 4.660.539 27
91
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Verifica-se que até o 14º país com maiores dificuldades para solucionar seus
problemas educacionais, apenas Cuba tem um percentual de 26% – abaixo de 30%
– da população em idade educacional em relação à população total do país; todos os
outros países têm esse percentual acima de 30%, sendo que o do Iêmen é 51% e o do
Brasil é 45%; da 15ª posição em diante, todos têm percentuais abaixo de 30%.
Variação %
Nível/Etapa da educação 2011 2020 2030 2040 2050
(2011-2050)
92
O NOVO PNE E O FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO NO BRASIL: OS RECURSOS COMO UM PERCENTUAL DO PIB
Verifica-se que somente no ano de 2030 é que o Brasil entrará na faixa dos
países que têm menos de 30% de sua população em idade educacional. Dessa forma,
os próximos dois PNEs precisarão ser ousados e destinar elevados recursos financeiros
ao setor da educação, sendo que a partir deste ano a própria dinâmica populacional
colaborará para que os problemas educacionais brasileiros sejam diminuídos.
Os dados que constam do The World Factbook 2010 da CIA (ver Tabela 2) nos
mostram que Iêmen (9,6%), Botsuana (8,7%), Cuba (9,1%), Dinamarca (8,3%) e
Noruega (7,2%) aplicam elevados percentuais de seus PIBs em educação, sendo que o
Brasil aplicou 4% de seu PIB. Informações do MEC registram que o Brasil aplicou um
percentual um pouco mais elevado que o registrado pela CIA em 2008, 4,7% do PIB.1
Com exceção de Cuba, que aplicou US$ 3.322,00 por pessoa em idade
educacional, todos aqueles países que têm no ranking de maiores desafios educacionais
os percentuais de pessoas em idade educacional maiores ou iguais a 30%, aplicaram
valores inferiores a US$ 2.203,00, que foi aplicado por Botsuana. A média aplicada
por esses países resultou em US$ 1.209,00.
1
Disponível em: <www.inep.gov. br>. Acesso em: 28 jan. 2011.
93
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
94
Tabela 7 – Recursos financeiros aplicados por pessoa em idade educacional
95
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
% %
Ano crescimento PIB Ano crescimento
PIB
(US$ bilhões) (US$ bilhões)
do PIB do PIB
2010 7,50 2.171,45 2031 1,96 3.911,74
2011 5,00 2.280,02 2032 1,75 3.980,19
2012 5,00 2.394,02 2033 1,67 4.046,66
2013 5,00 2.513,72 2034 1,71 4.115,86
2014 3,07 2.590,89 2035 1,84 4.191,59
2015 2,87 2.665,25 2036 1,67 4.261,59
2016 2,86 2.741,48 2037 1,53 4.326,79
2017 2,91 2.821,26 2038 1,49 4.391,26
2018 2,79 2.899,97 2039 1,32 4.449,23
2019 2,80 2.981,17 2040 1,26 4.505,29
2020 2,60 3.058,68 2041 1,15 4.557,10
2021 2,58 3.137,59 2042 1,21 4.612,24
2022 2,65 3.220,74 2043 1,02 4.659,29
2023 2,43 3.299,00 2044 1,02 4.706,81
2024 2,37 3.377,19 2045 1,02 4.754,82
2025 2,40 3.458,24 2046 1,02 4.803,32
2026 2,25 3.536,05 2047 1,02 4.852,31
2027 2,16 3.612,43 2048 1,02 4.901,81
2028 2,17 3.690,82 2049 1,02 4.951,80
2029 1,98 3.763,90 2050 1,02 5.002,31
2030 1,93 3.836,54
Fonte: UNESCO, 2010; EUA. CIA, 2010; e cálculos deste estudo.
96
O NOVO PNE E O FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO NO BRASIL: OS RECURSOS COMO UM PERCENTUAL DO PIB
US$ por
PIB/PPP Valor aplicado População em idade
% PIB em pessoa
Ano (US$ em educação educacional
educação em idade
bilhões) (US$ bilhões) (em milhões)
educacional
2011 7 2.280,02 159,60 82 1.946,36
2012 7 2.394,02 167,58 82 2.043,68
2013 7 2.513,72 175,96 81 2.172,35
2014 7 2.590,89 181,36 80 2.267,03
2015 7 2.665,25 186,57 80 2.332,09
2016 7 2.741,48 191,90 78 2.460,30
2017 7 2.821,26 197,49 78 2.531,90
2018 7 2.899,97 203,00 77 2.636,34
2019 7 2.981,17 208,68 76 2.745,81
2020 7 3.058,68 214,11 75 2.854,77
Fonte: UNESCO, 2010; EUA. CIA, 2010; e cálculos deste estudo.
As análises realizadas nos permitem afirmar que o Brasil é um dos países que
têm maiores desafios para solucionar os problemas existentes na área educacional,
uma vez que a configuração existente para a sua população em idade educacional e
a sua riqueza não permitem elevar substancial e abruptamente o volume de recursos
financeiros para essa área social.
97
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
a evolução dos indicadores em análise até o ano de 2050, quando se encerrará o 5º PNE,
considerando-se que o Brasil continuará aplicando 7% do PIB em educação.
US$ por
População % do Valor em
% da PIB/PPP pessoa
Ano em idade PIB em educação
população (US$ bi) em idade
educacional educação (US$ bi)
educacional
2011 82 42 2.280 7 160 1.946
2020
(final do 75 36 3.059 7 214 2.855
2º PNE)
2030
(final do 65 30 3.837 7 269 4.132
3º PNE)
2040
(final do 58 26 4.505 7 315 5.437
4º PNE)
2050
(final do 51 24 5.002 7 350 6.865
5º PNE)
Dessa forma, no ano de 2020 o Brasil já estaria aplicando US$ 4.079,00, valor
próximo à média de todos os países, e no ano de 2040 teria atingido a média dos
países com menores desafios educacionais e, dessa forma, no 5º PNE (2041-2050) o
percentual poderia iniciar um processo de decréscimo.
98
O NOVO PNE E O FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO NO BRASIL: OS RECURSOS COMO UM PERCENTUAL DO PIB
População % do Valor em
US$ por
Ano em idade
% da PIB/PPP
PIB em educação
pessoa
educacional
população (US$ bi)
educação (US$ bi)
em idade
educacional
2011 82 42 2.280 10 228 2.780
2020
(final do 75 36 3.059 10 306 4.079
2º PNE)
2030
(final do 65 30 3.837 10 384 5.903
3º PNE)
2040
(final do 58 26 4.505 10 451 7.767
4º PNE)
2050
(final do 51 24 5.002 10 500 9.808
5º PNE)
4) estabelecer que 50% dos recursos do Fundo Social do Pré-Sal sejam aplicados
em educação;
99
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
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100
O NOVO PNE E O FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO NO BRASIL: OS RECURSOS COMO UM PERCENTUAL DO PIB
EUA. CIA. The World Factbook 2010. Disponível em: <http s://www.cia.gov/library/
publications/the-world-factbook/region/region_soa.html>. Acesso em: 14 fev. 2010.
UNESCO. Banco de Dados do Institute for Statistics – Data Centre. Disponível em:
<http://stats.uis.unesco.org/unesco/TableViewer/document.aspx?>. Acesso em:
14 fev. 2010.
101
ENSINO MÉDIO E EDUCAÇÃO PROFISSIONAL
NOS ANOS 2000: CONTRIBUIÇÕES PARA A
ANÁLISE DA PROPOSTA DE PNE 2011-2021*
Marise Ramos**
Introdução
* Texto-base para exposição no 3º Seminário de Educação Brasileira, realizado pelo Cedes, na Unicamp, no
período de 28/2/2011 a 2/03/2011.
** Doutora em Educação pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Professora adjunta do Programa de
Pós-Graduação em Políticas Públicas e Formação Humana e da Faculdade de Educação dessa Universidade.
Professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IF-RJ), em exercício
de cooperação técnica na Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, da Fundação Oswaldo Cruz (Fio-
cruz), como coordenadora e professora do Programa de Pós-Graduação em Educação Profissional em Saúde.
103
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Ainda que nesse plano o ensino médio tenha sido contemplado com uma
única ação, especialmente voltada para as bibliotecas e para a ampliação do Programa
Nacional do Livro Didático, uma atenção foi dada ao ensino médio integrado no item
que tratou da educação profissional e científica nos Institutos Federais de Educação
Ciência e Tecnologia (IFs), apoiada na crítica precedente à reforma realizada no governo
FHC por meio do Decreto nº 2.208/97 e na medida de se fazer incorporar na LDB o
conteúdo do Decreto nº 5.154/2004, que revogou o anterior e que se constituiu na base
legal para a forma integrada de oferta do ensino médio com a educação profissional.
1
Destacamos, especialmente, o artigo de Saviani (2007). E-mail: ramosmn@gmail.com
104
ENSINO MÉDIO E EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NOS ANOS 2000: CONTRIBUIÇÕES PARA A ANÁLISE DA PROPOSTA DE PNE 2011-2021
Nesse contexto, se não seria possível preparar para o mercado de trabalho, dada
a sua instabilidade, dever-se-ia preparar para a “vida”. Essa foi a tônica adquirida pelo
ensino médio com a Lei nº 9.394/96. Sob um determinado ideário que predominou
em nossa sociedade nos anos 1990, preparar para a vida significava desenvolver
competências genéricas e flexíveis, de modo que as pessoas pudessem se adaptar
facilmente às incertezas do mundo contemporâneo.
105
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
106
ENSINO MÉDIO E EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NOS ANOS 2000: CONTRIBUIÇÕES PARA A ANÁLISE DA PROPOSTA DE PNE 2011-2021
Nos termos definidos por Lukács (1981) como o complexo social, na relação entre
trabalho, ciência e cultura existe um condicionamento no qual, ontologicamente, um
momento é o pressuposto para a existência do outro. Sendo o trabalho do ser humano
a primeira mediação do processo social de transformação da natureza para si, a ciência
2
Parte das reflexões apresentadas nesse item compõe, originalmente, artigo publicado na Revista Educação
e Realidade (RAMOS, 2010). Tais reflexões são retomadas em Ramos (2011).
107
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
3
Saviani (2007) recupera os estudos de Manacorda sobre o uso, por Marx, dos termos “educação tecnoló-
gica” e “politecnia” ou “educação politécnica”. Segundo ele, para além da questão terminológica, é impor-
tante observar que, do ponto de vista conceitual, o que está em causa é um mesmo conteúdo, isto é, a união
entre formação intelectual e trabalho produtivo. Um debate sobre o uso desses termos na obra de Marx e na
atualidade pode ser encontrado em Saviani (2007) e Nosella (2007).
108
ENSINO MÉDIO E EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NOS ANOS 2000: CONTRIBUIÇÕES PARA A ANÁLISE DA PROPOSTA DE PNE 2011-2021
4
Entendemos que a ressalva feita por Gramsci em relação a um “humanismo no sentido amplo” e não
apenas em “sentido tradicional” implica compreender o humanismo não na perspectiva essencialista, que
levaria a uma pedagogia escolástica (lembremos que o termo tradicional em pedagogia está vinculado ao
pensamento de Herbart, para o qual a escola cumpria a função da transmissão de valores e de formação
moral dos estudantes); mas implica compreender o humanismo na perspectiva histórico-dialética, no sen-
tido de que a produção da existência humana é uma obra do próprio ser humano em condições objetivas
enfrentadas e transformadas por ele próprio.
5
Os estudos de Claude Dubar (1997) sobre “formas identitárias” são recomendados. Duas dissertações de
mestrado (BATISTA, 2007; SIMÕES, 2007) e uma tese de doutorado recentes (ARRUDA, 2007) demonstram
como a escola e o ensino técnico se constituem em mediações fundamentais para os jovens oriundos da
classe trabalhadora na construção de seus projetos de vida e na busca de autonomia, sendo o trabalho um
meio de realização no presente e de perspectivas futuras, entre essas o prosseguimento de estudos em nível
superior.
109
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
[...] a integração do ensino médio com o ensino técnico é uma necessidade conjuntural
– social e histórica – para que a educação tecnológica se efetive para os filhos dos
trabalhadores. A possibilidade de integrar formação geral e formação técnica no ensino
médio, visando a uma formação integral do ser humano é, por essas determinações
concretas, condição necessária para a travessia em direção ao ensino médio politécnico e
à superação da dualidade educacional pela superação da dualidade de classes. (RAMOS;
FRIGOTTO; CIAVATTA; 2005, p. 45).
Não obstante, esse não é o mesmo sentido que a política educacional tem
conferido ao ensino médio integrado. Um estudo feito por Ciavatta e Ramos (2009)
em matérias publicadas em jornais no ano de 2009 sobre o ensino médio integrado
à educação profissional identifica que as notícias reproduzem não só o pensamento
hegemônico do governo e dos empresários, como também o senso comum da
sociedade, que enfatiza a importância da educação profissional para as necessidades
do mercado e dos alunos.
O mesmo estudo indica que o ensino médio, nessas fontes, é tratado como
“o principal gargalo do sistema educacional brasileiro”, um “nó” que o governo federal
tenta resolver;6 e cita uma frase emblemática do Secretário de Educação Tecnológica
do MEC, Eliezer Pacheco, reconduzido ao cargo no novo governo: “a maioria [dos
alunos] não consegue relacionar a permanência na escola com o futuro profissional”.
Talvez essa afirmação justifique a notícia nos jornais à época de que o Ministro
da Educação “está[va] anunciando uma proposta de alteração do currículo desse ciclo
de ensino para torná-lo mais técnico e voltado à realidade do mercado de trabalho”7,
a ser enviada ao Conselho Nacional de Educação. De fato, em 30 de junho de 2009,
o Conselho exara o Parecer nº 11/2009, versando sobre “proposta de experiência
curricular inovadora do Ensino Médio”, ou Programa Ensino Médio Inovador.
6
O Estado de São Paulo, SP, 22/12/2008 e 17/12/2008; Diário Catarinense, SC, 17/12/2008.
7
O Estado de São Paulo, SP, 22/12/2008.
8
A crítica aos limites dessa concepção do trabalho como contexto apresentada nas diretrizes podem ser
encontradas em Ramos (2004).
110
ENSINO MÉDIO E EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NOS ANOS 2000: CONTRIBUIÇÕES PARA A ANÁLISE DA PROPOSTA DE PNE 2011-2021
9
Notadamente o Documento-Base “Educação Profissional Técnica de Nível Médio Integrada ao Ensino
Médio”, publicado pela Setec/MEC e elaborado por Sandra Garcia, Dante Moura e Marise Ramos. Disponível
em: <http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/pdf/documento_base.pdf>.
111
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Do ponto de vista prático, convergente, por sua vez, com a análise anterior,
os educadores brasileiros do ensino médio e da educação profissional, assim como
a própria sociedade em geral, não incorporaram como sua a concepção de ensino
médio integrado na perspectiva da formação omnilateral e politécnica. Ao contrário,
predomina, ainda, uma visão retrógrada vinculada ao ensino médio profissionalizante
e compensatória; ou, ao contrário, a defesa de um ensino médio propedêutico e
da profissionalização como processo específico e independente. Os trabalhos
apresentados no colóquio sobre ensino médio integrado10 dão prova disso.
10
Referimo-nos ao Colóquio “Produção de Conhecimento sobre Ensino Médio Integrado: Dimensões epis-
temológicas e político-pedagógicas”, realizado na EPSJV/Fiocruz, nos dias 3 e 4 de setembro de 2010, sob a
coordenação de Gaudêncio Frigotto, Maria Ciavatta e Marise Ramos.
112
ENSINO MÉDIO E EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NOS ANOS 2000: CONTRIBUIÇÕES PARA A ANÁLISE DA PROPOSTA DE PNE 2011-2021
9 o desconhecimento conceitual;
11
Outras modificações na C. F. foram as seguintes: a) acrescentou ao parágrafo 3º do artigo 76 do ato das
disposições constitucionais transitórias, a redução anual, a partir do exercício de 2009, do percentual da
113
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Em outras palavras, a medida pode ser inócua para uma população com trajetória
escolar irregular, que tende a compor o grupo atendido pela educação de jovens e
adultos, mesmo que a esses a gratuidade seja assegurada. Pelo mesmo motivo, essa
medida não atende a população jovem e adulta hoje fora da escola. Em outras palavras,
a determinação da obrigatoriedade da educação por idade faz com que, ultrapassado
o limite, o direito à educação fica condicionado exclusivamente à demanda da
população e não ao preceito do direito universal com o qual se comprometem
mutuamente o Estado e a sociedade. Em síntese, sem a obrigatoriedade, não existe um
dispositivo de pressão e de constrangimento do Estado.
desvinculação das receitas da união incidente sobre os recursos destinados à manutenção e desenvolvimen-
to do ensino de que trata o artigo 212 da constituição federal (o artigo 212 da Constituição Federal afirma
que a União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os municípios
vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de
transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino); b) ampliou a abrangência dos programas
suplementares para todas as etapas da educação básica; c) remeteu a universalização do ensino obrigatório
à colaboração da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios quando da organização dos seus
sistemas de ensino; d) priorizou a distribuição dos recursos públicos para assegurar o atendimento das
necessidades do ensino obrigatório, no que se refere a universalização, garantia de padrão de qualidade e
equidade, nos termos do Plano Nacional de Educação; e) colocou o estabelecimento de meta de aplicação de
recursos públicos em educação como proporção do Produto Interno Bruto (PIB) como uma das perspectivas
do Plano Nacional de Educação.
12
Outra questão a ser debatida é a relação entre a ampliação da oferta educacional com as necessidades or-
çamentárias. Certamente o fim da DRU deve ser visto como uma conquista nesse sentido. Mas não se pode
esquecer que esses recursos reforçam o orçamento da União e não dos Estados e municípios, instâncias
responsáveis por atender à demanda educacional. Assim, é fundamental que os recursos advindos dessa
medida venham a complementar o Fundeb, de modo que beneficie a educação básica e viabilize a qualidade
na ampliação de sua oferta. Na prática, o fim da DRU sozinho não garante que os desafios sejam superados
integralmente. Por isso é fundamental a proposta do Plano Nacional de Educação, que destina pelo menos
7% do PIB à educação, considerando que hoje esse percentual não ultrapassa 5,1%.
114
ENSINO MÉDIO E EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NOS ANOS 2000: CONTRIBUIÇÕES PARA A ANÁLISE DA PROPOSTA DE PNE 2011-2021
13
“Taxa que expressa o número de crianças matriculadas em um nível de ensino, que pertencem ao grupo
etário correspondente ao nível de ensino em questão, dividido pela população total do mesmo grupo etário”
(cf. Estatísticas educacionais. Fontes em educação: guia para jornalistas. Brasília: Fórum Mídia & Educação,
2001).
14
Em certa medida, tal abstenção se manifestou na forma inicialmente pouco elaborada, pouco propositiva
e nada diretiva com que o Ministério da Educação tem atuado ante as proposições do Conselho Nacional de
Educação referentes às Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Profissional Técnica de Nível Médio
e de Ensino Médio. No primeiro caso, no ano de 2010, a sociedade tomou conhecimento de uma proposta
do Conselho altamente conservadora e retrógrada diante dos acúmulos teóricos e práticos da sociedade
sobre a concepção de ensino médio e educação profissional. A mobilização da sociedade levou à elaboração
de uma contraposição por um grupo de trabalho instituído pela Setec/MEC (2010), composto por represen-
tantes do MEC e da sociedade civil, cujo conteúdo busca expressar anseios e propósitos orientadores da
luta dos educadores por uma educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio na
perspectiva da escola unitária e da formação politécnica e omnilateral. No caso do ensino médio, um grupo
115
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
estritamente da sociedade civil, especialmente membros do GT Trabalho e Educação da Anped, com apoio
da diretoria de políticas curriculares da SEB/MEC, elaborou uma proposta que foi enviada ao Conselho, e
apropriada, em certa medida, no texto aprovado em 5 de maio de 2011. Atualmente, discute-se no âmbito
do MEC e do CNE a possibilidade de se elaborarem diretrizes curriculares nacionais únicas para o ensino
médio e a educação profissional, a fim de conferi-lhes organicidade, ao mesmo tempo em que suas especi-
ficidades poderiam ser regulamentadas por meio de distintas resoluções.
116
ENSINO MÉDIO E EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NOS ANOS 2000: CONTRIBUIÇÕES PARA A ANÁLISE DA PROPOSTA DE PNE 2011-2021
levanta suspeitas sobre o uso de recursos públicos para financiar vagas de educação
profissional em instituições privadas.
Em síntese, nessa estratégia não se fala que a expansão das matrículas de ensino
médio integrado à educação profissional venha a ser na rede pública, enquanto na
seguinte (3.5) é explícita a intenção de se fomentar a expansão da oferta de matrículas
gratuitas de educação profissional técnica de nível médio por parte das entidades
privadas de formação profissional vinculadas ao sistema sindical, sendo essas
ofertadas de forma concomitante ao ensino médio público. Se a maioria das matrículas
no ensino médio ocorre nos sistemas estaduais e essas não são integradas à educação
profissional, a associação com as redes privadas torna-se o mecanismo mais eficaz de
proporcionar a profissionalização aos jovens. Efetiva-se, aqui, o intento da reforma
FHC, de separação entre ensino médio e educação profissional.
O Proep teve esse intento, mas com fomento que tinha início, meio e fim.
Nos termos apresentados pela proposta de plano, o financiamento público de
matrículas privadas parece ser contínuo. Essa proposta já se configurou como fato
com o lançamento do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico (Pronatec),
pelo Ministro da Educação, em entrevista coletiva dada no dia 13 de abril de 2011.15
Em suas palavras, essa iniciativa utilizaria, para atender à demanda pela educação
profissional, as mesmas “soluções clássicas” adotadas na ampliação do acesso ao
ensino superior, tais como o Fies (Financiamento Estudantil) e o Prouni (Programa
Universidade para Todos). O programa incorporaria, ainda, a política de expansão da
rede federal e das redes estaduais de educação profissional.
15
Projeto de Lei nº 1209/2011, apresentado à Câmara Federal dos Deputados em 29 de abril de 2011.
117
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Considerações finais
118
ENSINO MÉDIO E EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NOS ANOS 2000: CONTRIBUIÇÕES PARA A ANÁLISE DA PROPOSTA DE PNE 2011-2021
Referências bibliográficas
119
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
LUKÁCS, George. Per una ontologia dell´essere sociale. Roma: Editori Riuniti, 1981.
120
ENSINO SUPERIOR: PRIORIDADES,
METAS, ESTRATÉGIAS E AÇÕES
Paulo Speller*
Introdução
* Doutor Government (Ciência Política) pela University of Essex. Reitor da Universidade da Integração
Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab) e presidente da Câmara de Educação Superior do
Conselho Nacional de Educação (CNE). E-mail: speller@unilab.edu.br.
121
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
IES Matrículas
Ano
Públicas Privadas Públicas Privadas
1996 211 711 735.427 1.133.102
2004 224 1.789 1.178.328 2.985.405
2007 249 2.032 1.240.968 3.639.413
2008 236 2.016 1.273.965 3.806.091
2009 245 2.069 1.351.168 3.764.728
122
ENSINO SUPERIOR: PRIORIDADES, METAS, ESTRATÉGIAS E AÇÕES
Diante desses dados, a principal questão é como cumprir a meta estipulada com
base nas estratégias previstas no novo PNE. Nesse sentido, destacamos que as ações/
estratégias previstas estão basicamente relacionadas ao incremento do setor público.
1
Dentre as medidas adotadas, desde 2004, para a expansão da ES no Brasil, destacamos: a criação de 14 novas univer-
sidades federais; o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni); a
DPSOLDomRGR¿QDQFLDPHQWRDRVHVWXGDQWHV (criação do Projeto Universidade para Todos – Prouni – e reedição do Fundo
de Financiamento ao Estudante de Ensino Superior – Fies); o fortalecimento da educação tecnológica; o estímulo à
modalidade a distância (especialmente a criação da Universidade Aberta do Brasil –UAB); o fomento às políticas e aos
3URJUDPDVGH,QFOXVmRHGH$o}HV$¿UPDWLYDVHR compromisso com a formação de professores de educação básica
(criação do Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica).
123
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
De acordo com esses dados, não parece difícil supor que as IES públicas,
especialmente as municipais2, estão “perdendo” alunos para as IES privadas (com fins
lucrativos) que oferecem cursos com custos mais baixos.
2
As IES municipais, embora de direito público, dependem do pagamento das mensalidades dos seus alunos para
manter-se funcionando por, praticamente, não receberem recursos públicos.
124
ENSINO SUPERIOR: PRIORIDADES, METAS, ESTRATÉGIAS E AÇÕES
v) inclusão social;
125
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
EaD, especialmente pelo sistema UAB. Assim, um dos desafios postos pelas novas TICs
é sua inserção qualificada nas práticas educativas. Portanto, a reflexão sobre as formas
de incorporação dessas novas tecnologias nas práticas educativas é fundamental para
os processos formativos desenvolvidos nas IES.
126
ENSINO SUPERIOR: PRIORIDADES, METAS, ESTRATÉGIAS E AÇÕES
Referências bibliográficas
127
O ANALFABETISMO E TANTOS OUTROS
DESAFIOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS
E ADULTOS NO PNE 2011-2020
* Doutora em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Professora da Facul-
dade de Educação da Universidade Federal de Goiás (UFG), onde coordena projeto de pesquisa interins-
titucional sobre o Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na
Modalidade de Educação de Jovens e Adultos (Proeja). Atua no ensino, na pesquisa e na extensão no campo
da educação de jovens e adultos. E-mail: mm2404@gmail.com
** Doutora em Educação pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Professora do Centro de Educação
da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Atua no ensino, na pesquisa e na extensão da educação
de jovens e adultos, na educação no campo e na linha de pesquisa “Diversidade e Práticas Educacionais
Inclusivas”, do Programa de Pós-Graduação em Educação da Ufes. Nessa universidade, coordena também
o projeto de pesquisa interinstitucional sobre o Programa Nacional de Integração da Educação Profissional
com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos (Proeja). Coordena o GT 18 de
Educação e Jovens e Adultos da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped).
129
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
que trata do novo Plano Nacional de Educação (PNE) para o período de 2011 a 2020.
Iniciamos nessa epígrafe com Paulo Freire por entender que ela ainda é muito atual
e oportuna para uma reflexão sobre o PL em tramitação no Congresso Nacional,
que não por acaso em seu artigo 2º, inciso I, trata como primeira diretriz do plano
a erradicação do analfabetismo. A concepção da educação de jovens e adultos se
expressa na primeira diretriz que trata do analfabetismo e segue no conjunto de metas
e estratégias presentes no anexo do PL.
O projeto não indica quem são os sujeitos que em sua maioria são demandantes
de educação no país. Isso não ocorre apenas quando se trata de jovens e adultos, mas
em todas as idades que devem ser atendidas no acesso à educação não aparecem as
reais condições da maioria dessas pessoas. A história do Brasil produziu um conjunto
de pessoas não escolarizadas que têm uma condição de pobreza, um pertencimento
étnico, racial, de gênero de localização territorial, e isso sequer é considerado no
Projeto de Lei.
130
O ANALFABETISMO E TANTOS OUTROS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO PNE 2011-2020
Passados mais de quarenta anos quando Paulo Freire, ao refletir sobre a dimensão
política das práticas de alfabetização, nos provocou a pensar sobre a concepção de
analfabetismo dominante, estamos novamente a pautar essa questão, na perspectiva
de “erradicação” do analfabetismo, como uma das diretrizes previstas no PNE. Isso
se dá em consonância com o que determina a Constituição Federal como um dos
objetivos do Plano Nacional de Educação (PNE), tal como se lê no
Art. 214 – A lei estabelecerá o PNE de duração decenal, com o objetivo de articular o
sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos,
metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento
do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas
dos poderes públicos das diferentes esferas federativas que conduzam a: Inciso I –
erradicação do analfabetismo (Emenda Constitucional 59/2009).
[...] o analfabetismo não é uma chaga, nem uma erva daninha a ser erradicada, nem
tampouco uma enfermidade, mas uma das expressões concretas de uma realidade social
injusta. Não é um problema estritamente lingüístico nem exclusivamente pedagógico,
metodológico, mas político, como a alfabetização através da qual se pretende
superá-lo. Proclamar sua neutralidade, ingênua ou astutamente, não afeta em nada a sua
politicidade intrínseca.
131
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
132
O ANALFABETISMO E TANTOS OUTROS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO PNE 2011-2020
seguintes argumentos: “de não poderem se alistar, os analfabetos, os que não sabem
ler e escrever”, e de não poderem ser elegíveis os não alistados. (Constituições Federais
de 1891, 1934, 1937 e 1946).
[...] de tanto ouvirem de si mesmos que são incapazes, que não sabem nada, que não
podem saber, que são enfermos, indolentes, que não produzem em virtude de tudo isto,
terminam por se convencer de sua incapacidade (FREIRE, 1978, p. 64).
133
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
nas pesquisas históricas que buscam captar a dinâmica da prática social focalizando
“a tendência secular do analfabetismo no Brasil com base no critério censitário, isto é,
na declaração de incapacidade de ler e escrever (de ler e escrever um bilhete simples,
a partir de 1950).” (FERRARO, 2002, p. 32). O autor ainda afirma que o critério
censitário, apesar de suas limitações, deve ser preservado, uma vez que:
Cabe ainda considerar, numa leitura mais atual, o quanto a visão preconceituosa
do analfabetismo persiste, conforme sinaliza Ferraro. Em História das idéias pedagógicas
no Brasil, de Dermeval Saviani (2007), ao focalizar discussões em torno do Instituto
Superior de Estudos Brasileiros (Iseb), nacional-desenvolvimentismo e a educação,
encontramos a ideia de que “no Brasil das primeiras décadas do século 20, em especial
nos anos de 1920, agitava-se a questão da expansão das escolas primárias tendo em
vista livrar o país da chaga do analfabetismo, considerado vergonha nacional” (p. 308).
134
O ANALFABETISMO E TANTOS OUTROS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO PNE 2011-2020
135
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
136
O ANALFABETISMO E TANTOS OUTROS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO PNE 2011-2020
Esse debate em torno da alteração das metas do PL 8.035/2010 para EJA já está
disponível no site da publicação do Centro de Estudos Educação & Sociedade (CEDES,
2011), de onde retiramos o seguinte quadro síntese:
137
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
138
O ANALFABETISMO E TANTOS OUTROS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO PNE 2011-2020
1
Os dados sobre a exclusão da população jovem e adulta no sistema educacional brasileiro foram aprofundados em artigo
publicado na revista da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) do final de 2010, sob o título
“Quando a obrigatoriedade afirma e nega o direito”. In: Revista Retratos da Escola, v. 4, n. 7, jul./dez. 2010.
139
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
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O ANALFABETISMO E TANTOS OUTROS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO PNE 2011-2020
Referências bibliográficas
141
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/
pnad2009/brasil_defaultzip_brasil.shtm>. Acesso em: 10 maio 2011.
CEDES. Emendas do CEDES ao Projeto Lei n. 8.035/10. 2011. Disponível em: http://
www.cedes.unicamp.br/EMENDAS%20COMPLETA%20-%20CAPA%20-%20
APRESENTACAO.pdf. Acesso em: 29 de maio de 2011.
142
O ANALFABETISMO E TANTOS OUTROS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO PNE 2011-2020
MARTINS, José de Souza. Exclusão social e a nova desigualdade. São Paulo: Paulus,
1997.
143
O PNE E AS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO
E COMUNICAÇÃO: MAL-ENTENDIDOS
E REDUCIONISMO
Introdução
145
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Para além das percepções sobre o como e as finalidades do uso das TIC pelas
escolas e professores, há que se considerar que a maioria dos estudos relacionados
ao tema apresenta um viés que reduz muito outros olhares sobre o uso dessas
tecnologias nos processos educativos. Em levantamento realizado no Portal Capes –
Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – em novembro de
2010 com os descritores “professores” e “TIC”, foram indicados trinta e dois trabalhos,
com prevalência na área da Saúde. Já com os descritores “internet” e “professores”,
verificou-se a ocorrência de novecentos e oitenta e quatro. Em leitura dos resumos,
observou-se que mais da metade tratava de experiências com uso de ambientes virtuais
de aprendizagem em cursos de educação a distância (EaD), enquanto os demais se
dividiram entre análises de experiências bastante fragmentadas em relação ao uso das
TIC em escolas e iniciativas de uso dessas tecnologias para portadores de necessidades
especiais, sobretudo cegos e surdos. Não é à toa que, quando da referência sobre o uso
das TIC nos processos educativos, quase sempre o campo se restringe a EaD, causando,
sem dúvida, a percepção bastante localizada e circunscrita de uma problemática mais
ampla e eivada de aspectos ainda pouco conhecidos.
Por outro lado, aqueles que utilizam mais as TIC em seu cotidiano, em
particular, os jovens1 o fazem tendo por entendimento que elas são expressão de sua
individualidade, constituindo assim processos identitários e de leitura de mundo
muito diferentes e próprios das gerações que nasceram sob o signo dessas tecnologias.
Nesse sentido escola e TIC acabam por ser esferas do viver divorciadas, uma descolada
da outra, já que até o momento não foi forjada uma identidade para as TIC e seu uso
pedagógico.
1
Estatísticas sobre o uso da LQWHUQHW, segundo dados do Ibope/Nielson de março de 2010, informam que o Brasil é o 5º
país com conexões LQWHUQHW. 73,9 milhões seriam o número de usuários, desses, 46% teriam entre 16 e 32 anos. O prin-
cipal local de acesso à rede seria nas ODQKRXVHV31%seguido pela própria casa, com 27%, e casa de parentes e amigos,
25%. Disponível em:<http://www.tobeguarany.com/internet_no_brasil.php>. Acesso em: 19 dez. 2010.
146
O PNE E AS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO: MAL-ENTENDIDOS E REDUCIONISMO
Os estudos sobre o uso das TIC nos processos do ensinar e aprender têm
basicamente três enfoques: desempenho escolar, aquisições de conteúdos e práticas
pedagógicas inovadoras (VASCONCELOS, 2010).
E o que revelam?
Além disso, por mais que se façam críticas à ideia de que as novas gerações,
principalmente as nascidas depois dos anos de 1990, quando da popularização das
TIC, estabelecem outra relação com elas, as TIC representam um advento ainda pouco
2
Disponível em: <http://www.publico.gov.br/download/texto/ci000008.pdf>. Acesso em: 12 nov. 2010.
147
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Na esteira das discussões propostas por Tezanos (2009), uma das dimensões
também presentes e importantes sobre o trabalho é a que se refere a sua precarização.
Mais e mais nas “sociedades tecnológicas” esse se precarizaria em razão de sua
intensificação, resultado da complexização em que um dos ingredientes seriam as
TIC.
148
O PNE E AS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO: MAL-ENTENDIDOS E REDUCIONISMO
Longe da ideia de impor uma forma de uso das TIC, a contradição que expõe
lógicas, finalidades, objetivos, desejos enseja pensar relações, entre elas tecnologias
e pedagógico. Uma resposta única, unificada, é, sem dúvida, pouco instigadora. Por
mais que se afirme a necessidade de fazer emergir um “novo professor”, a forma pela
qual a escola se organiza, com base ainda em modelo marcadamente “comeniano”,
provoca pouco seus atores à descoberta, ao descortinar de outros sentidos para a díade
ensinar/aprender.
No caso das TIC, e com a “extensão”, no sentido proposto por McLuham (1995),
que elas assumem nos cotidianos, o trabalhar com elas numa perspectiva de constituir
novos repertórios escolares seria “via” valiosa para se reconceitualizar o sentido
mesmo do aprender no contexto de uma sociedade tecnológica.
149
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
De algumas lições
Com base nos estudos, pesquisas, discussões sobre o uso das TIC na educação,
há alguns ensinamentos preciosos: a necessidade de que as escolas sejam dotadas de
tecnologias compatíveis com um mundo em conexão; não adianta computadores em
laboratórios sem conexão com a internet, essa com velocidade incompatível para o
compartilhamento em rede; não bastam algumas máquinas, nossos alunos precisam
ter suas próprias; apartar o uso das TIC daquilo que de fato são de sua natureza: as
redes sociais. Pô-las a serviço da escola é um desafio, sim, a ser enfrentado; permitir
experiências variadas e diversificadas, trazendo os saberes/conhecimentos que nossos
alunos têm sobre o assunto, reconhecendo que a expertise deles nessa dimensão – há
outras, sem dúvida – é muito maior que a nossa como professores.
E o PNE (2011-2020)?
3
Nas metas 2, 5, 7, e respectivamente nas estratégias 2.7, 5.4, 7.6 e 7.7, há menção difusa sobre “tecnologias educacio-
nais”. Pelo contexto e pela proposta, isso estaria mais relacionado a técnicas pedagógicas.
150
O PNE E AS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO: MAL-ENTENDIDOS E REDUCIONISMO
151
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
meta 7 e mesmo na inserção de outra meta, como proposto, que se apresente emenda
modificativa para a estratégia 7.11 – “Prover equipamentos e recursos tecnológicos
digitais para utilização pedagógica no ambiente escolar a todas as escolas de educação
básica”. Já a estratégia 7.13, com a seguinte redação: “Informatizar a gestão de todas
as escolas, secretarias de educação dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
bem como garantir políticas e programas nacionais de formação inicial e continuada
para pessoal técnico destas secretarias”.
Por outro lado, para a meta 16 – “Formar cinquenta por cento dos professores
da educação básica em nível de pós-graduação lato e stricto sensu e garantir a todos
formação continuada em sua área de atuação”; e estratégia 16.4 – “Ampliar e consolidar
portal eletrônico para subsidiar o professor na preparação de aulas, disponibilizando
gratuitamente roteiros didáticos e material suplementar”, a proposta é de supressão da
estratégia. Se a formação em nível de pós-graduação não afiançar maior competência
ao trabalho do professor, para que a consolidação de portal para a preparação de aulas?
O portal, se for o caso, poderia funcionar como “espaço” em que fossem disponibilizados,
gratuitamente, materiais didáticos e pedagógicos suplementares, cabendo às escolas,
por meio de seus Projetos Políticos Pedagógicos e do trabalho coletivo dos professores,
planejar e daí escolher, selecionar o que fosse necessário para o desenvolvimento do
trabalho pedagógico.
[...] como que a confirmar e expressar padrões novos de subjetividades. Novas relações
com sociedade em termos de aprendizagem e desaprendizagens insinuam-se e
confirmam-se. Para muitos, não se trata de apenas aprender o novo. É mais que isso. Há
de se desaprender o velho. É aí que reside uma das grandes diferenças trazidas pela era
digital. Para alguns, elas carregam um sentido de ruptura como existente e de renovação
radical. São tecnologias revolucionárias. Elas supõem esquecer antigos hábitos, enfrentar
o desafio da separação de já consagrados suportes que davam ao fazer cotidiano uma
tranquilidade aparentemente sem limites. Nessa perspectiva, e de certa forma, para
muitos, as tecnologias viram pelo avesso algumas certezas travestidas de hábitos e até
mesmo consagradas como valores. E isso custa, principalmente aos mais velhos e aos
migrantes. Aos não nativos da era digital. São outras relações com a informação, são
outros os modos de construir e buscar saberes e conhecimentos (CECÍLIO; SANTOS,
2009, p. 192-193).
152
O PNE E AS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO: MAL-ENTENDIDOS E REDUCIONISMO
Diante disso e das problemáticas que ensejam tratar as TIC na escola, cabe
“lugar” mais destacado no atual projeto, isso articulado à qualidade da educação e à
afirmação de que o trabalho docente exige, em sua consecução, cuidados no sentido
de que seja preservada a autonomia, profissionalização e identidade profissional dos
professores. Desafios que se põem na definição e estabelecimento do PNE (2011-2020).
Reflexões finais
É, pois, nesse contexto que se pretendeu mais que propor alterações, considerar
que, ao introduzir as TIC no processo do ensinar e aprender, elas não se apresentam
como coadjuvantes, nem substituem, como afirma Peixoto (2009), práticas pedagógicas
em uso. Elas permitem, na visão dessa autora, introdução de modos particulares
de comunicação na relação professor/aluno, saber e instâncias educativas. “Nem
instrumento e nem fim em si mesmas, as TIC podem ser classificadas como elementos
fundantes do processo educacional.” (PRETO; PINTO apud PEIXOTO, 2009, p. 226)
Referências bibliográficas
153
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
OBLINGER, Diane G.; OBLINGER, James. Is It Age or It: First Steps Toward
Understating the Net Generation. In: OBLINGER, D.; OBLINGER, J. Educating the Net
Generation. Educase – Ebook. Disponível em: <http://www.educause.edu/Resources/
EducatingtheNetGeneration/IsItAgeorITFirstStepsTowardUnd/6058>. Acesso em:
12 nov. 2010.
154
RELAÇÕES DE TRABALHO DOCENTE:
EMPREGO E PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO*
155
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
1
$SHVTXLVDDTXHPHUH¿URHVWiLQVHULGDHPXPDFRUGRGHFRRSHUDomRFLHQWt¿FDLQWHUQDFLRQDOHQWUH%UDVLO8QLFDPS
(Programas de Pós-Graduação em Educação e Doutorado em Ciências Sociais) e França (equipe GTM – Genre, Travail
et Mobilités – do Cresspa – Centre de Recherches Sociologique et Politiques de Paris -, Université Paris 8 e Université
3DULVYLQFXODGRVDR&156±&HQWUH1DWLRQDOGHOD5HFKHUFKH6FLHQWL¿TXH¿QDQFLDGDSHORDFRUGRHQWUH&DSHVH
Cofecub.
156
RELAÇÕES DE TRABALHO DOCENTE: EMPREGO E PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO
2
'HVUHJXODPHQWDomRQmRVLJQL¿FDQHFHVVDULDPHQWHVXSUHVVmRGHUHJUDVHOHLVSRGHSHORFRQWUiULRWUDGX]LUVHHPQR-
vas leis que visam a reconhecer diferentes tipos de contratos de trabalho. A desregulamentação pode tornar o direito do
WUDEDOKRPDLVÀH[tYHO3RUWDQWRDÀH[LELOL]DomRSRGHVHGDUSRUPHLRGHOHLVRXQHJRFLDomRFROHWLYDTXHSHUPLWHDGHTXDU
as regras às condições setoriais.
3
Os contratos atípicos “contemplam um diversidade de situações, que vai de novas formas contratuais ao simples
descumprimento legal” (GALEAZZI, 2006, p. 204).
4
Código de trabalho que regula as relações de trabalho.
157
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
2002 2004 2007
O que se deve entender por precariedade subjetiva? É o sentimento de não estar “em
casa” no trabalho, de não poder se fiar nas suas rotinas profissionais, em suas redes, nos
saberes e habilidades acumuladas graças à experiência [...] é o sentimento de não dominar
seu trabalho e de precisar permanentemente desenvolver esforços para se adaptar, para
cumprir objetivo, para não se arriscar, nem fisicamente nem moralmente [no caso dos
supervisores, nas relações com os diretores e professores ou dos professores face aos
alunos]. É o sentimento de não ter ajuda em caso de problemas graves de trabalho, nem
do lado dos superiores hierárquicos [...] nem do lado dos coletivos de trabalho que se
esgarçaram com a individualização sistemática da gestão dos assalariados e o estímulo à
concorrência entre eles. É um sentimento de isolamento e abandono. (LINHART, 2009)
158
RELAÇÕES DE TRABALHO DOCENTE: EMPREGO E PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO
O que propõe o projeto de Lei para o PNE? O ponto de partida para discutir
as múltiplas dimensões que adquirem as mudanças nas relações de trabalho e na
organização dos trabalhadores é a noção de valorização contida no projeto de lei
para o Plano Nacional de Educação para este decênio. Segundo o Artigo 2º, uma
das diretrizes do PNE – 2011/2020 (alínea IX) é a valorização dos profissionais da
educação, tomada, em geral, como “um dos requisitos para a melhoria da qualidade
do ensino”. Para isso propõe quatro metas:5 duas referentes à formação, uma sobre
salários e outra sobre carreira, metas 15, 16, 17 e 18. Assim, valorização profissional
se concretiza mediante a formação profissional, salários e carreira. Este texto analisará
somente a meta 18, que pretende: “Assegurar, no prazo de dois anos, a existência de
planos de carreira para os profissionais do magistério em todos os níveis de ensino.”
5
Termo emprestado do setor empresarial.
159
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
160
RELAÇÕES DE TRABALHO DOCENTE: EMPREGO E PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO
6
O professor iniciante é indicado, no PNE, como aquele que passou por um concurso público de provimento de cargo.
7
Novamente, assim como para os professores, os técnicos são considerados no texto como funcionários, e também não
há referência ao regime jurídico único.
161
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
entre outros. O que seriam esses novos contratos? Desde a década de 1990 nos é
apresentado o funcionário público demissível, temporário, contratado por safra ou por
obra certa, contratado por prazo determinado, aprendiz e aquele no primeiro emprego
(KREIN, 2007, p. 35). Esses são contratos que não garantem os direitos à estabilidade
provisória, como licença gestante, acidente de trabalho, doença profissional, licença
sindical; o direito ao aviso prévio e ao adicional de 50% nos casos de rescisões dos
contratos; e o direito ao salário-desemprego e, além disso, são limitados os direitos às
férias e à aposentadoria. Nesse sentido, são empregos precários.
162
RELAÇÕES DE TRABALHO DOCENTE: EMPREGO E PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO
Art 11. O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) será utilizado para
avaliar a qualidade do ensino a partir dos dados de rendimento escolar apurados pelo
censo escolar da educação básica, combinados com dados relativos ao desempenho de
estudantes apurados na avaliação nacional do rendimento escolar.
8
Segundo P. Bourdieu e J-C. Passeron. A reprodução – elementos para uma teoria do sistema de ensino. Rio de Janeiro:
)UDQFLVFR$OYHVDHVFRODpHQFDUUHJDGDGHLGHQWL¿FDUPpULWRVHGDUXPDJDUDQWLDSDUDDVFODVVL¿FDo}HVUHDOL]DGDV
163
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Considerações finais
164
RELAÇÕES DE TRABALHO DOCENTE: EMPREGO E PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO
Referências bibliográficas
165
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
BALTAR, Paulo; MORETTO, Amilton; KREIN, José Dari. O emprego formal no Brasil:
início do século XXI. In: KREIN, José Dari et al. (Org.). As transformações no mundo
do trabalho e os direitos dos trabalhadores. Campinas: Cesit, LTr e Ematra XV, 2006.
166
RELAÇÕES DE TRABALHO DOCENTE: EMPREGO E PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO
167
ANÁLISE DO PNE (MEC) E EMENDAS
AO PL Nº 8.035/10
* Licenciado em Ciências Físicas e Biológicas, com habilitação em Biologia, pela Faculdade de Formação de
Professores da Fundação de Ensino Superior de Olinda (Funeso). Presidente do Sindicato dos Trabalhadores
em Educação de Pernambuco (Sintepe) e secretário de assuntos educacionais da Confederação Nacional dos
Trabalhadores em Educação (CNTE). E-mail: heleno@cnte.org.br.
169
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Contudo, tal como debatido na Conae 2010, o SNE requer uma estrutura
organizativa (infraconstitucional e constitucional) diferente da atual, a qual o PNE,
por si só, não consegue instituir. Faz-se necessário, assim, um conjunto de leis
federais e, até, de emendas constitucionais – como nos casos da gestão democrática
e da expansão da base de incidência do financiamento da educação –, que precisaria
tramitar concomitantemente ao Projeto de Lei (PL) nº 8.035/10, a fim de comprometer,
de fato e de direito, o Estado brasileiro com as metas e estratégias definidas no PNE.
170
ANÁLISE DO PNE (MEC) E EMENDAS AO PL Nº 8.035/10
Mais: se, mesmo através de leis – como no caso do piso do magistério –, há rebelião
de governos estaduais e municipais contra dispositivos aprovados unanimemente pelo
171
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Congresso Nacional, que dizer de um Plano de Educação sem amarras que garantam
minimamente seus propósitos? Daí a necessidade de institucionalizar diversas
políticas concernentes às metas do PNE – em especial, as ligadas ao financiamento,
à gestão democrática, à valorização profissional e à avaliação da educação, inclusive
prevendo medidas repressivas por meio de Lei de Responsabilidade Educacional –
como forma de garantir sua eficiência em todo o território brasileiro.
Gestão democrática
172
ANÁLISE DO PNE (MEC) E EMENDAS AO PL Nº 8.035/10
Além disso, ao longo dos últimos anos, a Campanha Nacional pelo Direito
à Educação desenvolveu sistemática de cálculo para o CAQ das diversas etapas e
modalidades da educação básica, a qual o CNE considerou pertinente para ser adotada
nos sistemas de ensino. O mais plausível, dada a necessidade de implantação desse
dispositivo capaz de orientar o investimento público em educação, seria o MEC
estipular um período para debate do tema com a sociedade, que já dispõe de proposta
para ser discutida com os gestores públicos.
Financiamento
173
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
em educação. Aliás, a estratégia 20.3 do PNE cita a destinação desse recurso para
a rubrica educacional, mas não define percentuais, apesar de recente estudo do
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)/Ministério do Planejamento ter
revelado que a educação é o investimento de maior retorno no PIB – para cada R$ 1,00
investido, o retorno é de R$ 1,85. Além disso, a educação tem papel imprescindível na
formação dos trabalhadores e na distribuição da renda no país, configurando-se uma
das principais bases para o desenvolvimento sustentável de longo prazo. Eis as razões
para se assegurar o mencionado percentual de investimento na educação.
174
ANÁLISE DO PNE (MEC) E EMENDAS AO PL Nº 8.035/10
175
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
No que tange à oferta de creche (0 a 3 anos de idade), o PNE não deve priorizar
a oferta na rede assistencial, mas sim na esfera pública e, considerando que as
escolas privadas, comunitárias, filantrópicas e confessionais continuarão a exercer
papel significativo no atendimento à demanda por creche, tendo em vista o poder de
escolha dos pais, poder-se-ia, tranquilamente, prever a universalização das matrículas
manifestas até 2016 – como propõe a Conae 2010 – e, mesmo de forma conservadora,
estabelecer a meta de pleno atendimento público até o final da década. Além disso, a
meta proposta pelo MEC repete o PNE 2001/2010, ratificando o atraso de uma década
na execução do compromisso do Estado, que insiste em condenar milhões de crianças
das gerações anteriores, atual e, quiçá, das próximas.
Embora seja mais que salutar a meta de duplicação das matrículas na educação
profissional técnica de nível médio, a estratégia 11.6 não pode constituir uma espécie
de Programa Universidade para Todos (ProUni) do ensino técnico, pois isso iria de
encontro ao compromisso público de ofertar, em instituições públicas e gratuitas, as
etapas e modalidades da educação básica, também abarcadas pela obrigatoriedade do
texto constitucional.
176
ANÁLISE DO PNE (MEC) E EMENDAS AO PL Nº 8.035/10
O grande imbróglio sobre esse tema ainda refere-se à ADI nº 4.167, em trâmite,
desde outubro de 2008, no Supremo Tribunal Federal (STF). Nesse sentido, o PNE
precisa reafirmar a importância dos conceitos que nortearam a constituição do piso
salarial do magistério como política pública de valorização dos profissionais e da
própria educação, a fim de pressionar o STF a julgar improcedente a referida ação
movida pelos governadores contra artigos da Lei nº 11.738/08 (BRASIL, 2008). No
entanto, em momento algum, o projeto do MEC faz menção à importância da hora-
aula atividade para a consecução do trabalho pedagógico do(a) professor(a) e seu
consequente impacto na qualidade equitativa da educação.
177
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Como pontos positivos desse tema, destacamos, além das questões já suscitadas,
a constituição de comissão para o acompanhamento da atualização progressiva do
PSPN (magistério); a delimitação do percentual de 90% para a composição dos cargos
de provimento efetivo do magistério na rede pública (devendo a regra estender-se aos
demais profissionais); as estratégias que preveem o estímulo à formação e à realização
do censo dos funcionários da educação – embora estejam deslocadas na meta 18 e na
estratégia 15.5, que tratam sobre a carreira do magistério –; a indicação para que os
planos de carreira prevejam licenças para a qualificação profissional em nível de pós-
graduação, uma vez que se pretende pós-graduar 50% dos professores da educação
básica; além de várias outras estratégias que integram as metas 15 a 18.
178
ANÁLISE DO PNE (MEC) E EMENDAS AO PL Nº 8.035/10
179
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
9 Art. 7º, § 2º. Os sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios deverão prever mecanismos democráticos para o acompanhamento
local da consecução das metas do PNE – 2011/2020 e dos planos previstos no
art. 8º;
9 Art. 10. [...] Parágrafo Único. No primeiro ano de vigência desta Lei,
o Ministério da Educação promoverá amplo debate nacional para definir os
parâmetros do Custo Aluno-Qualidade para os níveis, etapas, modalidades
e tempos pedagógicos, os quais servirão de referência para as subsequentes
dotações orçamentárias previstas no caput deste artigo;
1
Em relação às emendas ao PL nº 8.035/10, os textos sublinhados referem-se a sugestões de adendos ao
texto original; por sua vez, os textos tachados indicam supressões.
180
ANÁLISE DO PNE (MEC) E EMENDAS AO PL Nº 8.035/10
181
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
182
ANÁLISE DO PNE (MEC) E EMENDAS AO PL Nº 8.035/10
183
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Referências bibliográficas
184
ANÁLISE DO PNE (MEC) E EMENDAS AO PL Nº 8.035/10
______. Projeto de Lei nº 8.035. Aprova o Plano Nacional de Educação para o decênio
2011-2020 e dá outras providências. Brasília, DF: Câmara dos Deputados, 2010.
185
EDUCAÇÃO INFANTIL E O PNE:
QUESTÕES E TENSÕES
* Doutora em Educação pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Professora adjunta e vice-coorde-
nadora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Proped/
Uerj). É bolsista de Prociência da Uerj/Faperj e Jovem Cientista de Nosso Estado, da Faperj. Membro do
Comitê Científico da ANPEd. E-mail: ligiaaquino@yahoo.com.br
187
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
188
EDUCAÇÃO INFANTIL E O PNE: QUESTÕES E TENSÕES
Diagnóstico e cobertura
1
A EC 59/2009, entre várias medidas, dá nova redação aos incisos I e VII do artigo 208, de forma a prever a
obrigatoriedade do ensino de quatro a dezessete anos e ampliar a abrangência dos programas suplementares
para todas as etapas da educação básica.
189
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
anos2, já em 2009 foi de 74,8% das crianças de 4 ou 5 anos de idade3, quando as metas
definidas pelo PNE/2001 foram de 60% da população de 4 a 6 anos em 2006 e de 80%
até o final da década do plano.
2
Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 1995-2008. Microdados.
3
Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Síntese de Indicadores 2009.
190
EDUCAÇÃO INFANTIL E O PNE: QUESTÕES E TENSÕES
atendimento em creche em relação à renda familiar: dados apontam que apenas 11,8%
dos mais pobres estavam matriculados em 2009, contra 34,9% dos mais ricos. Com o
objetivo de acelerar a inclusão das camadas mais pobres ao atendimento em creches,
a emenda aditiva para a meta nº 1 ficou assim formulada:
Formação de professoras/es
191
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
192
EDUCAÇÃO INFANTIL E O PNE: QUESTÕES E TENSÕES
193
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Público-privado
194
EDUCAÇÃO INFANTIL E O PNE: QUESTÕES E TENSÕES
Na mesma direção foi formulada mais uma emenda aditiva para a meta nº1
que estabelece “extinguir progressivamente, até o final da Década da Educação, o
atendimento por meio de instituições conveniadas”. As políticas de conveniamento,
práticas históricas na educação infantil, além de contrariar o princípio de verba
pública para a rede pública, têm estado associadas a modelos “alternativos” para
baratear custos, marcados por ações de descontinuidades impedindo a consolidação
de política efetiva de educação infantil.
Avaliação
Realizar Censo Nacional da Educação Infantil, atualizado a cada cinco anos, e desenvolver
processos de monitoramento das políticas públicas a fim de aferir a infraestrutura física,
o quadro de pessoal e os recursos pedagógicos e de acessibilidade empregados na creche
e na pré-escola, impedindo a realização de testes de larga escala nacionais bem como sua
realização em nível local no âmbito da educação infantil.” [grifos nossos].
195
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
A justificativa apresentada para tal emenda faz uma dura crítica à “antecipação
da escolarização e consequentemente das avaliações para a fase da educação infantil”,
sendo
Conclusões
4
Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil (http://www.mieib.org.br/pagina.php).
5
Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (http://www.anped.org.br/).
6
Centro de Estudos Educação e Sociedade (http://www.cedes.unicamp.br/).
196
EDUCAÇÃO INFANTIL E O PNE: QUESTÕES E TENSÕES
proposta para a integração das políticas e programas voltados para a primeira infância,
com vistas à construção de protocolo básico para o atendimento a esse segmento da
população, bem como a divulgação e o exame das inovações já introduzidas nessa área
pelas três esferas de governo (trecho da carta convite).
197
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Referências bibliográficas
BRASIL. Plano Nacional de Educação. Apresentado por Ivan Valente. Rio de Janeiro:
DP&A, 2001.
198
ENTRE OS PLANOS E A REALIDADE:
DESIGUALDADES NO ACESSO AO INÍCIO
DA EDUCAÇÃO BÁSICA*
Apresentação
199
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Nacional de Educação (Conae) para a educação infantil para o próximo PNE. Naquele
artigo, ela questionava se essas metas haviam considerado as tendências de cobertura
observadas nos últimos dez anos. Ora, o projeto de lei enviado ao Congresso não
parte de um diagnóstico sobre cada etapa educacional, como fazia o plano anterior1.
Assim, resta-nos tentar realizar o caminho inverso, ou seja, consideradas as metas
fixadas, contrapor esses objetivos aos dados disponíveis sobre a realidade atual desse
atendimento e nos perguntar não só sobre a desejabilidade de alguns desses objetivos,
mas também sobre sua viabilidade nos prazos previstos.
1
O Documento preparado pelo CNE (2009, p.57) para subsidiar o PNE recomenda que este deverá conter
“para cada nível e modalidade de ensino apresentados, um diagnóstico próprio, desafios, metas e respectivos
indicadores”.
200
ENTRE OS PLANOS E A REALIDADE: DESIGUALDADES NO ACESSO AO INÍCIO DA EDUCAÇÃO BÁSICA
etária de quatro a seis anos e de 18,1% para a de zero a três anos (Tabela 1). Como
mostra a evolução dessas taxas, a expansão do acesso à educação infantil, a partir de
1998, cresceu consistente e significativamente.
Faixas Ano
etárias 1998 1999 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008
0 a 3 anos 8,7 9,2 10,6 11,7 11,7 13,4 13,0 15,4 17,1 18,1
4 a 6 anos 57,9 60,2 65,6 67,0 68,5 70,6 72,0 76,1 77,6 79,8
201
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
202
ENTRE OS PLANOS E A REALIDADE: DESIGUALDADES NO ACESSO AO INÍCIO DA EDUCAÇÃO BÁSICA
100%
80%
60%
40%
20%
0%
< 1 ano 1ano 2 anos 3 anos
Gráfico 1 – Percentual de crianças que frequentavam creche, segundo a idade – Brasil – 2008
Fonte: PNAD 2008, microdados, apud Campos et al., 2010, p. 29.
Para a faixa etária de quatro a cinco anos, os dados da PNAD 2008 revelam que
a taxa de escolarização das crianças de quatro anos era menor do que a observada para
o grupo de cinco anos, situando-se bem abaixo da meta de universalização prevista
para 2016. É importante notar que um quarto das crianças de cinco anos constava
como matriculado na modalidade “classes de alfabetização”. Esse fato pode explicar
o motivo de o percentual de crianças dessa idade na pré-escola ser mais baixo do que
aquele para a idade de quatro anos. É importante assinalar que, no total, ainda resta
19% da população de cinco anos fora da escola, o que corresponde a mais de meio
milhão de crianças no país (Tabela 3).
203
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
204
ENTRE OS PLANOS E A REALIDADE: DESIGUALDADES NO ACESSO AO INÍCIO DA EDUCAÇÃO BÁSICA
100,0%
90,0%
80,0%
70,0%
60,0%
50,0%
40,0%
30,0%
20,0%
10,0%
0,0%
< 1 ano 1 ano 2 anos 3 anos 4 anos 5 anos
2008 0,1% 0,7% 4,1% 11,7% 27,3% 42,4%
2009 0,0% 0,6% 4,0% 15,5% 31,5% 44,4%
2
Os dados a seguir foram obtidos das seguintes fontes: Sistema de Estatísticas Educacionais Edudatabrasil;
microdados dos Censos Escolares de 2007, 2008 e 2009 e estimativas da população, segundo os grupos de
idade, via consulta ao Datasus (BRASIL; SUS; IBGE, 2009).
205
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
100,0%
90,0%
80,0%
70,0%
60,0%
50,0%
40,0%
30,0%
20,0%
10,0%
0,0%
< 1 ano 1 ano 2 anos 3 anos 4 anos 5 anos
2008 0,1% 1,7% 11,6% 30,8% 53,6% 67,6%
2009 0,1% 1,9% 13,6% 34,3% 56,6% 70,3%
100,0%
90,0%
80,0%
70,0%
60,0%
50,0%
40,0%
30,0%
20,0%
10,0%
0,0%
< 1 ano 1 ano 2 anos 3 anos 4 anos 5 anos
2008 0,1% 0,2% 2,8% 38,8% 69,4% 74,5%
2009 0,0% 0,2% 3,3% 43,1% 73,0% 77,3%
206
ENTRE OS PLANOS E A REALIDADE: DESIGUALDADES NO ACESSO AO INÍCIO DA EDUCAÇÃO BÁSICA
100,0%
90,0%
80,0%
70,0%
60,0%
50,0%
40,0%
30,0%
20,0%
10,0%
0,0%
< 1 ano 1 ano 2 anos 3 anos 4 anos 5 anos
2008 0,5% 12,9% 28,0% 42,7% 55,0% 71,3%
2009 0,3% 15,0% 31,9% 46,3% 58,1% 79,4%
Entre 2008 e 2009, com exceção dos bebês (idade inferior a um ano), houve nessa
capital um aumento nas taxas de escolarização em todas as idades, com destaque para
207
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
100,0%
90,0%
80,0%
70,0%
60,0%
50,0%
40,0%
30,0%
20,0%
10,0%
0,0%
< 1 ano 1 ano 2 anos 3 anos 4 anos 5 anos
2008 0,6% 9,3% 19,8% 35,2% 46,0% 69,6%
2009 0,4% 9,4% 20,2% 36,0% 46,5% 70,2%
Florianópolis destaca-se por oferecer uma cobertura um pouco mais alta para
as crianças de um ano de idade (Gráfico 7). Outra particularidade nessa capital é
208
ENTRE OS PLANOS E A REALIDADE: DESIGUALDADES NO ACESSO AO INÍCIO DA EDUCAÇÃO BÁSICA
100,0%
90,0%
80,0%
70,0%
60,0%
50,0%
40,0%
30,0%
20,0%
10,0%
0,0%
< 1 ano 1 ano 2 anos 3 anos 4 anos 5 anos
2008 1,0% 20,5% 35,8% 52,6% 63,0% 63,7%
2009 0,5% 17,5% 38,5% 57,2% 69,4% 72,7%
209
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Ferraro (2002) pelo exame dos dados da contagem de população de 1996, as faixas
etárias abrangentes escondem diferenças por idade que é preciso analisar3. O que
aqui nos interessa mais de perto é examinar como estão se refletindo, nas taxas de
escolarização por idade, uma importante mudança introduzida recentemente em
nossa organização escolar: a antecipação da idade de ingresso na primeira série do
ensino fundamental.
3
“Quanto maior o número de séries abrangidas pelo indicador, menor o refinamento da informação que ele
fornece, pois é maior a probabilidade de incorporação de altas taxas de distorção série-idade (ANDRADE;
TELLES, 2008, p. 5).
210
ENTRE OS PLANOS E A REALIDADE: DESIGUALDADES NO ACESSO AO INÍCIO DA EDUCAÇÃO BÁSICA
não são nada desprezíveis: oscilam de quase 40% em Belém para os sete anos, até
7,5%, para os oito anos, a porcentagem de exclusão mais baixa, verificada em Campo
Grande.
Os dados analisados por Ferraro foram colhidos pelo IBGE em 1996, enquanto
nossos cálculos basearam-se em dados de matrícula colhidos pelos sistemas escolares
em 2009. Assim mesmo, comparando-se as diferenças por Estado encontradas para
1996 com as apresentadas na Tabela 4, verificam-se tendências semelhantes em relação
ao Estado do Pará – onde as porcentagens de crianças fora da escola eram as mais altas,
entre os seis Estados considerados –, sendo que o Estado do Piauí aparecia com taxas
de exclusão comparativamente mais altas do que sua capital, Teresina, apresentava
em 2009. Por sua vez, Mato Grosso do Sul demonstrava uma situação muito pior em
relação ao acesso do que sua capital ostenta no presente.
Esse nível de atraso no acesso à escola representa um desafio que está sendo
pouco considerado na discussão do PNE: a universalização do ensino dos quatro aos
dezessete anos ainda está longe de ser realidade, não só nas novas idades incluídas
nessa obrigatoriedade, mas também naquelas idades que já correspondiam à anterior
definição de ensino obrigatório no país, há 40 anos4. Por outro lado, a preocupação
disseminada na área de educação infantil sobre o ingresso precoce de crianças no
ensino fundamental deve ser acompanhada de uma atenção redobrada ao contingente
de crianças que continuam excluídas do acesso às primeiras séries na idade esperada.
Como se verá a seguir, o atraso escolar parece começar antes mesmo do ingresso ao
ensino fundamental.
4
Os primeiros dados divulgados pelo IBGE sobre o Censo de 2010 revelam que a taxa de crescimento da
população teve um decréscimo maior do que calculavam as projeções da população. Assim, é possível que
as projeções do Datasus tenham superestimado as populações por idade nos municípios considerados, o
que pode ser um fator de erro nos índices de escolarização calculados pela pesquisa. No entanto, é pouco
provável que esse erro seja tão significativo que anule as nada desprezíveis defasagens no acesso constata-
das neste estudo.
211
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Defasagem (%)
Etapa de ensino
Campo Rio de
Belém Florianópolis Fortaleza Teresina
Grande Janeiro
Ano inicial – EF 9
10,1 4,4 2,2 10,6 13,0 4,5
anos
1ª série e 2º ano
23,4 9,0 6,2 21,1 8,5 13,3
do EF
2ª série e 3º ano
32,2 13,5 19,9 26,2 17,7 17,6
do EF
3ª série e 4º ano
33,3 22,1 3,5 26,8 19,9 16,8
do EF
4ª série e 5º ano
35,5 17,2 13,1 27,1 14,6 20,7
do EF
Comentários finais
[...] a universalização pode ser considerada efetiva em relação ao acesso, mas essa
conquista é acompanhada pelo fenômeno do atraso escolar que ocorre logo a partir
das primeiras séries e pelo fenômeno do abandono que vai se acentuando fortemente
conforme avança a idade das crianças (ANDRADE; TELLES, 2008, p. 5).
212
ENTRE OS PLANOS E A REALIDADE: DESIGUALDADES NO ACESSO AO INÍCIO DA EDUCAÇÃO BÁSICA
Quando estendemos essas análises à faixa etária anterior, vimos que ainda
restam expressivos contingentes da população excluídos da educação. O estudo citado
do Ipea revela quem são essas crianças sem acesso à educação infantil: pertencem aos
grupos de renda mais baixos, moram predominantemente na zona rural, são pretos e
pardos, vivem nas regiões menos desenvolvidas.
A pesquisa sobre as seis capitais mostra que, mesmo nessas cidades, o problema
do acesso continua a existir para segmentos expressivos da população e que, desde
muito cedo, o atraso escolar afeta as crianças na fase em que deveriam estar se
alfabetizando.
Por outro lado, a pesquisa também chama a atenção para o fato de que é muito
pequeno o contingente de crianças com até um e dois anos de idade matriculadas
em creche. O acesso à pré-escola é mais significativo, mas encontra-se longe da
universalização prevista na Emenda Constitucional 59 que fixou a obrigatoriedade
escolar para a faixa etária de quatro a dezessete anos (BRASIL, 2009).
Parece, então, que mesmo sem tocar nos problemas de qualidade, que sabemos
graves, as metas do novo PNE são extremamente ambiciosas e vão exigir um enorme
esforço, especialmente por parte das prefeituras, para serem cumpridas. Além disso,
a realidade constatada pela pesquisa nas administrações municipais não se aproxima
nem de longe do ideal de um sistema nacional de educação do qual parte o novo
PNE. Não só é quase inexistente o regime de colaboração, salvo algumas iniciativas
tomadas pelo MEC nos últimos anos, como também foram registradas medidas que
denotam total desconsideração à população, como decisões unilaterais de algumas
redes estaduais, que sem mais nem menos descarregam todas as suas matrículas de
pré-escola nas costas dos municípios, sem prever processos de transição e prazos de
acomodação de forma responsável.
213
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Referências bibliográficas
ANPED. Parecer da ANPEd sobre a proposta elaborada pelo MEC para o Plano
Nacional de Educação. São Paulo: Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa
em Educação, dez. 1997.
5
Uma revisita a este documento, elaborado pelos grupos de trabalho da Anped, revela que as posições de-
fendidas em 1997 para a educação infantil continuam sendo válidas hoje (ANPED, 1997, p. 12-14).
214
ENTRE OS PLANOS E A REALIDADE: DESIGUALDADES NO ACESSO AO INÍCIO DA EDUCAÇÃO BÁSICA
IPEA. PNAD 2008: primeiras análises. Educação, Gênero, Migração. Brasília: IPEA,
2009. (Comunicado da Presidência, n. 32).
215
PRIORIDADES, METAS, ESTRATÉGIAS E AÇÕES
PARA A VALORIZAÇÃO E A FORMAÇÃO
DO PROFISSIONAL DA EDUCAÇÃO*
Introdução
* Este texto subsidiou a participação do autor em simpósio de mesmo título durante o 3º Seminário de Edu-
cação Brasileira (3º SEB), no dia 2 de março de 2011, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
** Doutor em Educação pela Universidade do Estado de Wisconsin, em Madison, Estados Unidos, e pro-
fessor do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais
(FaE/UFMG). E-mail: juliodiniz@ufmg.br
217
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Orientada pelo título deste simpósio, a minha fala está dividida em três
partes: em primeiro lugar, farei alguns comentários sobre a premência e urgência da
discussão sobre a valorização e formação do profissional da educação; em segundo
lugar, apresentarei uma análise sobre as metas e estratégias do Plano Nacional de
Educação (PNE 2011-2021) que tratam da temática em questão e, por fim, discutirei
algumas prioridades e ações em relação ao tema do simpósio.
Antes, é preciso esclarecer que, apesar do título deste simpósio, volto minhas
reflexões apenas para o que se convencionou chamar de “profissionais do magistério”
– sujeitos que trabalham diretamente na sala de aula (ou em demais espaços educativos
formais) e são responsáveis pela mediação da relação ensino-aprendizagem nesses
espaços – em vez de me direcionar a todos os “profissionais da educação”.
218
PRIORIDADES, METAS, ESTRATÉGIAS E AÇÕES PARA A VALORIZAÇÃO E A FORMAÇÃO DO PROFISSIONAL DA EDUCAÇÃO
Está claro que un buen profesor realiza un aporte valioso a la formación de un niño o
joven en diversas dimensiones. En algunos lugares se há estimado el valor económico de
ese profesor. Por ejemplo, un estúdio reciente para EE.UU. de Eric Hanushek há estimado
que un buen profesor genera anualmente ganancias adicionales para la economía por
equivalente a 400 mil dólares.
Isto acontece porque, no Brasil, como sabemos, temos vivido, já há algum tempo,
uma profunda crise da profissão docente (ver GATTI; BARRETO, 2009; GATTI, 2010;
DINIZ-PEREIRA, 2011). Os dados fornecidos pelo governo federal indicam que, por
219
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
1
Uso o termo “impressões” em vez de “análises” porque não tenho a pretensão de apresentar aqui uma
discussão mais aprofundada sobre as metas e estratégias do PNE (2011-2021) que tratam da valorização e
formação dos profissionais da educação. Passo a discutir, então, o que me pareceu o Plano após uma pri-
meira avaliação desse documento.
2
Neste texto, restringir-me-ei à avaliação das metas 15 e 16.
220
PRIORIDADES, METAS, ESTRATÉGIAS E AÇÕES PARA A VALORIZAÇÃO E A FORMAÇÃO DO PROFISSIONAL DA EDUCAÇÃO
Por envolver-me por muitos anos com a EJA, as perguntas que imediatamente
vêm à minha cabeça são as seguintes: por que fomentar apenas a formação continuada
(e não também a inicial) para docentes que atuam (atuarão) na educação de jovens
221
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
e adultos? Esta tem que ser necessariamente integrada à educação profissional? Por
quê? Com qual concepção de EJA (e de educação como um todo) o PNE trabalha?
222
PRIORIDADES, METAS, ESTRATÉGIAS E AÇÕES PARA A VALORIZAÇÃO E A FORMAÇÃO DO PROFISSIONAL DA EDUCAÇÃO
223
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
habilitar aqueles que, hoje, no País, estão em sala de aula, exercendo o magistério, corre-
se o risco de o PNE (2011-2021) favorecer a improvisação no preparo dos profissionais
da educação. Dessa maneira, profissionais de diferentes áreas são transformados
em professores mediante uma complementação pedagógica mínima. Ou seja, o PNE
(2011-2021) incentivará que profissionais egressos de outras áreas, em exercício no
magistério, se tornem professores valendo-se de um curso ou programa de formação
docente de poucas horas! O que parece inconcebível em outros campos profissionais
– como, por exemplo, direito, medicina e engenharia – é possível para o magistério.
Esse esquema é uma infeliz legitimação do “bico” na profissão docente, uma vez que
profissionais egressos de outras áreas, que não optaram, de início, pela carreira de
magistério, provavelmente, permanecerão na profissão enquanto não conseguirem
“algo melhor para se fazer”.
Prioridades e ações
224
PRIORIDADES, METAS, ESTRATÉGIAS E AÇÕES PARA A VALORIZAÇÃO E A FORMAÇÃO DO PROFISSIONAL DA EDUCAÇÃO
(conclusão)
De: Para:
Cursos de licenciatura com entradas
Apêndices dos cursos de Bacharelado separadas (identidades e terminalidades
próprias)
Papel central das faculdades e centros de
Uma “dispersão” institucional
educação
Formação básica nos objetos específicos Formação básica em conhecimentos
de ensino pedagógicos (“base comum nacional”)
Sólida base teórica (em conhecimentos
pedagógicos, incluindo sobre os sujeitos
Formação “apostilada”
da educação, sobre os objetos específicos
de ensino...)
Forte articulação teoria e prática (pressupõe
Formação distante da realidade concreta uma forte articulação das universidades
com os sistemas de ensino)
225
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
tudo de ruim que existe na educação escolar acontece por causa dos professores e da
sua “má formação” (tese da culpabilização) ou, de outro, a postura de que os docentes
não têm nada a ver com os problemas atuais da escola, sendo, portanto, apenas vítimas
de um sistema social e educacional perverso e excludente (tese da vitimização). Tais
posições – a primeira, em geral, adotada pelas secretarias de educação e a segunda,
pelos sindicatos dos professores – são pouco produtivas e pouco contribuem para o
avanço desse debate.
Gostaria de destacar, entre vários outros, dois grandes desafios que temos hoje
em termos da valorização e formação dos profissionais da educação básica:
9 autonomia profissional;
9 dedicação exclusiva a uma única escola que ofereça boas condições em termos
de infraestrutura e facilidades;
9 adotar mais horas para estudos e planejamentos e menos horas em sala de aula;
226
PRIORIDADES, METAS, ESTRATÉGIAS E AÇÕES PARA A VALORIZAÇÃO E A FORMAÇÃO DO PROFISSIONAL DA EDUCAÇÃO
Por fim, gostaria de destacar algumas ações que têm sido desenvolvidas pelo
governo federal e que representam avanços e conquistas. Uma delas foi a aprovação
do piso salarial dos professores da educação básica. O desafio agora é fazer que ele seja
realmente implementado e respeitado em todos os Estados e municípios. Além disso,
é importante garantir a progressiva atualização de seus valores e assegurar que sejam
realmente tratados como piso e não como teto, como muitos já o fazem. A ampliação
do número de vagas em cursos de licenciatura nas IES públicas, tanto por meio do
Reuni como por intermédio da transformação dos Ifets em instituições formadoras de
professores da educação básica e profissional, me parece uma ação acertada. Como já
mencionei anteriormente, a criação e ampliação do Programa de Iniciação à Docência
(Pibid) também representa, a meu ver, uma iniciativa que abre um leque de novas
possibilidades para a formação inicial e continuada de professores no País.
Considerações finais
Referências bibliográficas
227
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
228
A CONSTRUÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE FORMAÇÃO
E VALORIZAÇÃO DOS EDUCADORES:
UNITÁRIO, ORGANICAMENTE ARTICULADO E PLURAL
229
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
de 30 anos travado pelos educadores em sua luta por uma política nacional global
de formação e valorização dos profissionais da educação. Os enfrentamentos que
emergiram no debate evidenciaram os limites e potencialidades da política nacional
de formação formulada pelo decreto a qual, pela sua amplitude e complexidade, não
logrou contemplar as múltiplas dimensões das políticas docentes, como a valorização
profissional, carreira e elevação da condição docente, partes inerentes à luta dos
professores e suas entidades de classe desde a década de 70.
230
A CONSTRUÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE FORMAÇÃO E VALORIZAÇÃO DOS EDUCADORES
Mas, a própria ideia de sistema necessita ser qualificada, de modo que supere a
atual concepção mecânica de justaposição em vigor nas políticas públicas.
231
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
232
A CONSTRUÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE FORMAÇÃO E VALORIZAÇÃO DOS EDUCADORES
históricas das classes populares e não pode prescindir de assumir, como referência
e princípios norteadores de suas ações, os princípios basilares que definem o
compromisso de políticas públicas com o caráter emancipador dos sujeitos históricos
e de nosso povo.
233
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Ao mesmo tempo, como parte intrínseca dessa política global de caráter nacional,
as ações no âmbito das universidades públicas devem desenvolver-se de maneira
que fortaleçam as licenciaturas e o campo pedagógico e das ciências da educação,
incorporando a concepção de base comum nacional, construída pela Associação
Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (Anfope), buscando novas e
criativas formas de organização institucional e acadêmica dos cursos de formação, como
fonte privilegiada de formação e renovação permanente dos quadros do magistério.
No âmbito de um sistema nacional de educação e de formação, entendemos ser esse
o compromisso maior do MEC e da Capes, como instâncias indutoras de políticas, e
que assumem em nível nacional a responsabilidade pela definição e pela execução da
política nacional de formação de profissionais do magistério da educação básica, em
estreita colaboração com Estados e municípios.
234
A CONSTRUÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE FORMAÇÃO E VALORIZAÇÃO DOS EDUCADORES
235
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
os movimentos sociais. Igualmente temos hoje uma nova qualidade nos cursos de
licenciatura, massivamente frequentados pelos jovens das classes populares, filhos
de trabalhadores que logram ascender ao ensino superior público e privado. As
novas formas do trabalho pedagógico universitário demandam, portanto, processos
democráticos e participativos de organização curricular, consolidação da base comum
nacional, permanente avaliação dos percursos formativos e maior acompanhamento
do desenvolvimento da juventude que trilha os caminhos para ingresso na carreira
do magistério. A 1ª Conae sinalizou de forma objetiva para a implementação de
processos e instrumentos de gestão democrática da formação, com a criação de fóruns
especificamente criados para fins de construção de Referencial Curricular Nacional,
após a sanção do PNE, ao aprovar que
236
A CONSTRUÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE FORMAÇÃO E VALORIZAÇÃO DOS EDUCADORES
A realidade de hoje vai nos indicando que é preciso avançar em proposições que
superem essas condições atuais, fator que acentua e aprofunda a desigualdade social
pela desigualdade educacional, comprometendo a qualidade social da escola pública.
A crítica da educação exige que examinemos como o Projeto do Plano Nacional
de Educação 2011-2020 trata temas como: a implementação efetiva da carreira do
magistério, jornada única e integral e dedicação exclusiva dos professores a uma
escola, além da indução de formas de alteração no caráter da organização da escola,
com a implementação da educação integral, a superação da seriação, novas formas
de organização do coletivo de educadores e do trabalho docente e dos profissionais
da educação. O incentivo a grupos de estudo e pesquisa de professores, em redes
de formação, pesquisa, produção e desenvolvimento da educação organicamente
articulados aos sistemas de ensino é meta a ser perseguida de modo que superemos a
concepção tutorial de trabalho que permeia em especial as metas 15 e 16 do Projeto
do Plano Nacional de Educação. Igualmente ainda temos uma dívida histórica para
com a formação integral e omnilateral dos professores, construindo políticas, ações
e programas que garantam pleno acesso à leitura, à literatura, às artes, ao esporte,
à organização nas entidades científicas e acadêmicas de sua área de ensino, e sua
organização sindical e política.
237
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
238
A CONSTRUÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE FORMAÇÃO E VALORIZAÇÃO DOS EDUCADORES
239
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
240
A CONSTRUÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE FORMAÇÃO E VALORIZAÇÃO DOS EDUCADORES
Para cumprir esses desafios, destacam-se as seguintes ações que vêm sendo
demandadas historicamente pelo movimento dos educadores e que deverão compor a
política nacional de formação de professores, parte intrínseca do sistema nacional de
formação de professores.
241
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
III – discutir diretrizes de longo prazo para a formação inicial e continuada dos
profissionais do magistério da educação básica em serviço;
VIII – opinar sobre a programação anual da Capes, na área específica da Educação Básica;
242
A CONSTRUÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE FORMAÇÃO E VALORIZAÇÃO DOS EDUCADORES
243
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
da educação, que tem no conceito de Base Comum Nacional formulado pela Associação
Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (Anfope) sua expressão mais
bem elaborada.
244
A CONSTRUÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE FORMAÇÃO E VALORIZAÇÃO DOS EDUCADORES
245
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
246
A CONSTRUÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE FORMAÇÃO E VALORIZAÇÃO DOS EDUCADORES
O confronto dos dados oriundos de cada um desses estudos não nos deixa
em situação confortável. Em cada uma das práticas e concepções analisadas por
distintas investigações, encontramos distanciamentos e aproximações entre os
diagnósticos elaborados pelos sistemas de ensino e os consequentes impactos na vida
dos profissionais do magistério da educação básica e de seus alunos, que raras vezes
logram ser identificados pelos processos de avaliação de política pública pelos quais
essas ações passaram.
247
PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (PNE): QUESTÕES DESAFIADORAS E EMBATES EMBLEMÁTICOS
Referências bibliográficas
OLIVEIRA, Dalila Andrade de; VIEIRA, Lívia Fraga. Trabalho Docente na Educação
Básica no Brasil. Minas Gerais: Gestrado/FaE/UFMG e SEB, 2010.
248
A CONSTRUÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE FORMAÇÃO E VALORIZAÇÃO DOS EDUCADORES
249