ACV Como Ferramenta de Gestao PDF
ACV Como Ferramenta de Gestao PDF
ACV Como Ferramenta de Gestao PDF
Ciclo de
Vida como
Instrumento de Gestão
Organizado por
Leda Coltro
25 anos
Avaliação do Ciclo de Vida
como Instrumento de Gestão
Organizado por
LEDA COLTRO
2007
Agradecimentos
Ficha Técnica
75 p.: il.
Bibliografia
ISBN 978-85-7029-083-0
Esta publicação não pode ser reproduzida total ou parcialmente e sob qualquer forma para fins lucrativos ou
não lucrativos sem a permissão por escrito dos proprietários dos direitos autorais.
Os Autores
Anna Lúcia Mourad. Mestre em Físico Química pelo Instituto de Química da UNICAMP e Especialista em
Gestão Ambiental pela Faculdade de Engenharia Mecânica da UNICAMP/ CETESB. Pesquisadora do
Centro de Tecnologia de Embalagem – CETEA, do Instituto de Tecnologia de Alimentos – ITAL desde
1995, com atuação em linhas de pesquisa envolvendo avaliação do desempenho e do transporte de
embalagens de papel, cartão, papelão ondulado e estudos de ACV de embalagens celulósicas,
produtos agrícolas e biocombustíveis.
Eloísa Elena Corrêa Garcia. Mestre em Tecnologia de Alimentos, na área de concentração de Embalagem
e Engenheira de Alimentos pela Faculdade de Engenharia de Alimentos da UNICAMP. Pesquisadora do
Centro de Tecnologia de Embalagem – CETEA, do Instituto de Tecnologia de Alimentos – ITAL desde
1983. Gerente Técnico dos Grupos de Embalagens Plásticas e de Meio Ambiente do CETEA desde
1993. Especialista em avaliação do potencial de interação embalagem plástica / produto e em
legislação de embalagem e segurança de alimentos. Há dez anos coordena o desenvolvimento da linha
de pesquisa sobre estudos de ACV de embalagens e produtos.
Guilherme de Castilho Queiroz. Doutor em Planejamento de Sistemas Energéticos pela UNICAMP, Mestre
em Economia, Energia e Meio Ambiente pela Scuola Superiore Enrico Mattei (Grupo ENI, Itália) e
Engenheiro Mecânico pela UNESP. Professor e Diretor de Pesquisa da UNESC de 1994 a 2001.
Pesquisador do Centro de Tecnologia de Embalagem – CETEA, do Instituto de Tecnologia de
Alimentos – ITAL desde 2001, com atuação em linhas de pesquisa envolvendo estudos de ACV de
embalagens, energia e produtos, ACCV, rotulagem ambiental, design for environment e avaliação do
desempenho mecânico de embalagens e materiais plásticos.
Jozeti Barbutti Gatti. Mestre em Engenharia Mecânica pela Faculdade de Engenharia Mecânica da
UNICAMP e Engenheira Química pela Faculdade de Engenharia Química da UNICAMP. Pesquisadora do
Centro de Tecnologia de Embalagem – CETEA, do Instituto de Tecnologia de Alimentos – ITAL desde
1995, com atuação em linhas de pesquisa envolvendo caracterização de materiais e avaliação do
desempenho quanto à corrosão de embalagens metálicas e estudos de ACV de embalagens e
produtos.
Leda Coltro, Doutora e Mestre em Físico Química, com especialização na área de polímeros e Bacharel em
Química pelo Instituto de Química da UNICAMP. Pesquisadora do Centro de Tecnologia de Embalagem
– CETEA, do Instituto de Tecnologia de Alimentos – ITAL desde 1994, com atuação em linhas de
pesquisa envolvendo estudos de ACV de embalagens, energia, produtos agrícolas e derivados de
petróleo e identificação e quantificação de aditivos em embalagens e materiais plásticos.
Sandra Balan Mendoza Jaime. Mestre em Ciência e Engenharia de Materiais e Engenheira de Materiais
pela UFSCar. Pesquisadora do Centro de Tecnologia de Embalagem – CETEA, do Instituto de
Tecnologia de Alimentos – ITAL desde 1993, com atuação em linhas de pesquisa envolvendo avaliação
do desempenho físico, mecânico, térmico e químico de embalagens e artigos de vidro, diagnóstico de
fratura e estudos de ACV de embalagens e produtos.
Conteúdo
Os Autores .....................................................................................................................................................2
Prefácio ...........................................................................................................................................................5
1. Avaliação do Ciclo de Vida - ACV ............................................................................................................7
Leda Coltro
1.1 Introdução .........................................................................................................................................7
1.2 Normalização ....................................................................................................................................7
1.3 Metodologia de ACV .........................................................................................................................8
1.4 Elementos Fundamentais da ACV ....................................................................................................11
1.4.1 Unidade Funcional .....................................................................................................................11
1.4.2 Fronteiras do Sistema ...............................................................................................................11
1.4.3 Alocação ....................................................................................................................................11
1.4.4 Qualidade dos Dados e Coleta de Dados .................................................................................12
1.5 Aplicações da ACV ...........................................................................................................................12
Referências Bibliográficas ......................................................................................................................13
6. Análise de Custo do Ciclo de Vida (ACCV): Metodologia e Aplicação em Eficiência Energética ....47
Guilherme de Castilho Queiroz
Eloísa Elena Corrêa Garcia
6.1 Introdução .........................................................................................................................................47
6.2 Análise de Custo do Ciclo de Vida - ACCV ......................................................................................48
6.3 Metodologia de ACCV ......................................................................................................................52
6.4 Aplicações da ACCV na Área de Eficiência Energética no Mundo ..................................................53
6.4.1 Eficiência Energética na Europa ...............................................................................................53
6.4.2 Eficiência Energética nos Estados Unidos (EUA) .....................................................................56
6.4.3 Eficiência Energética no Brasil ..................................................................................................58
6.5 Comentários e Sugestões.................................................................................................................59
Referências Bibliográficas ......................................................................................................................59
Dentre esses estudos destaca-se o projeto “Avaliação do Ciclo de Vida como Instrumento
de Gestão de Processos e Produtos” realizado com financiamento da FINEP/MCT –
Financiadora de Estudos e Projetos/Ministério da Ciência e Tecnologia, com o objetivo de
qualificar e quantificar os principais impactos ambientais da produção de café e
de suco de laranja no Brasil.
1.1 Introdução
A Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) é uma ferramenta que permite avaliar o impacto ambiental potencial
associado a um produto ou atividade durante seu ciclo de vida. A ACV também permite identificar quais
estágios do ciclo de vida têm contribuição mais significativa para o impacto ambiental do processo ou
produto estudado. Empregando a ACV é possível avaliar a implementação de melhorias ou alternativas para
produtos, processos ou serviços. Declarações ambientais sobre o produto podem se basear em estudos de
ACV, bem como a integração de aspectos ambientais no projeto e desenvolvimento de produtos (design for
environment).
Os estudos de ACV tiveram início na década de 60, com a crise do petróleo, que levou a sociedade a se
questionar sobre o limite da extração dos recursos naturais, especialmente de combustíveis fósseis e de
recursos minerais. Os primeiros estudos tinham por objetivo calcular o consumo de energia e, por isso,
eram conhecidos como “análise de energia” (energy analysis). Estes estudos envolviam a elaboração de um
fluxograma de processo com balanço de massa e de energia. Logo, dados sobre consumo de matérias-
primas e de combustíveis e sobre os resíduos sólidos gerados eram contabilizados automaticamente. Por
esta razão, alguns analistas se referiam a estes estudos como “análise de recursos” (resource analysis) ou
“análise do perfil ambiental” (environmental profile analysis).
O interesse por estudos de ACV enfraqueceu após a crise do petróleo. Porém, a ACV ressurgiu na década
de 80 em decorrência do crescente interesse pelo meio ambiente. A partir de 1990, os estudos de ACV se
expandiram muito e foram impulsionados pela normalização proporcionada pela série de normas ISO
14040, com conseqüente aumento do número de estudos, publicações, conferências e congressos, os
quais ainda continuam aumentando.
1.2 Normalização
Muitos estudos de ACV, aparentemente iguais, chegavam a conclusões diferentes devido às considerações
feitas, fronteiras adotadas, idade dos dados, tecnologias, logística de abastecimento de matérias-primas e
matriz energética, que são fatores críticos para os parâmetros inventariados. Estes estudos diferiam
inclusive na interpretação do que seria um sistema mais adequado para o meio ambiente. Apesar de todas
estas restrições, estudos comparativos foram divulgados e causaram impacto no mercado de produtos
concorrentes.
Assim, ficou evidente a necessidade de padronização da metodologia de ACV. A Instituição que mais
contribuiu neste sentido foi a SETAC – Society of Environmental Toxicology and Chemistry que reuniu
pesquisadores líderes na área para discutir o tema ACV em cerca de nove conferências internacionais
organizadas entre os anos de 1990 e 1993. Deste esforço resultou a publicação SETAC Guidelines for Life
Cycle Assessment – a Code of Practice (CONSOLI et al., 1993), que foi o primeiro documento voltado à
padronização da metodologia de ACV e que, mais tarde, orientou os trabalhos de normalização
internacional da ISO – International Organization for Standardization.
Os trabalhos de normalização internacional da ACV pela ISO envolveram mais de 300 especialistas em
ACV de cerca de 29 países, que atuaram direta ou indiretamente na padronização, e que geraram a série
de normas ISO 14040 relativas à ACV:
ISO 14040 – Environmental management – Life cycle assessment – Principles and framework (1997);
ISO 14041 – Environmental management – Life cycle assessment – Goal and scope definition and
inventory analysis (1998);
ISO 14042 – Environmental management – Life cycle assessment – Life cycle impact assessment
(2000);
ISO 14043 – Environmental management – Life cycle assessment – Life cycle interpretation (2000).
Esta série de normas está sendo revisada e a junção das mesmas em apenas duas normas está em
discussão no âmbito da ISO:
ISO/FDIS 14040 – Environmental management – Life cycle assessment – Principles and framework
(2006);
ISO/FDIS 14044 – Environmental management – Life cycle assessment – Requirements and Guidelines
(2006).
A série de normas também contém dois relatórios técnicos, com exemplos de aplicação das normas
relativas à ACV e uma especificação técnica sobre o formato da documentação dos dados:
ISO/TR 14047 – Environmental management - Life cycle impact assessment – Examples of application
of ISO 14042 - (2003);
ISO/TS 14048 – Environmental management - Life cycle assessment – Data documentation format
(2002);
ISO/TR 14049 – Environmental management - Life cycle assessment – Examples of application of ISO
14041 to goal and scope definition and inventory analysis (2000).
A norma NBR ISO 14040 (2001) foi internalizada no Brasil pela Associação Brasileira de Normas Técnicas -
ABNT, mediante trabalho desenvolvido pelo Sub-Comitê de Avaliação do Ciclo de Vida - SC-05 do Comitê
Brasileiro de Gestão Ambiental - ABNT/CB-38.
Em função das novas edições de 2006 das normas ISO 14040 e ISO 14044, a norma NBR ISO 14040 está
sendo revisada pelo ABNT/CB-38, enquanto as normas NBR ISO 14041 (2004), NBR ISO 14042 (2004) e
NBR ISO 14043 (2005) serão canceladas e substituídas pelas novas edições.
Um estudo de ACV é dividido em quatro fases, conforme apresentado na figura 1.2. Na primeira fase,
Definição do Objetivo e Escopo, o propósito do estudo e sua amplitude são definidos, envolvendo decisões
importantes sobre as fronteiras e a unidade funcional. Na fase de Análise de Inventário, informações sobre o
sistema do produto são levantadas e as entradas e as saídas consideradas relevantes para o sistema são
quantificadas. Na fase de Avaliação de Impacto, os dados e as informações gerados da Análise de
Inventário são associados a impactos ambientais específicos, de modo que o significado destes impactos
potenciais possa ser avaliado. E, na fase de Interpretação, os resultados obtidos nas fases de Análise de
Inventário e de Avaliação de Impacto são combinados e interpretados de acordo com os objetivos definidos
previamente no estudo.
Portanto, um estudo de ACV inicia-se com a Definição do Objetivo e Escopo do estudo, bem como são bem
definidos nesta fase a unidade funcional adotada, as fronteiras do sistema, as estimativas e limitações e os
métodos de alocação que serão usados, bem como as categorias de impacto que serão consideradas no
estudo. O objetivo e escopo incluem a definição do contexto do estudo ao qual estão associados, a quem e
como os resultados serão comunicados. A unidade funcional é a unidade de referência quantitativa à qual
todos os fluxos de entradas e saídas na ACV estão relacionados, por exemplo, 1 kg de café torrado e moído
pronto para a distribuição. A alocação é o método utilizado para dividir a carga ambiental de um processo
entre os diversos produtos nele gerados (co-produtos).
Definição do
Objetivo
e Escopo
Aplicações diretas:
- Desenvolvimento e melhoria
de produto
Análise de - Planejamento estratégico
Inventário Interpretação - Elaboração de políticas públicas
- Marketing
- Outros
Avaliação de
Impacto
Conforme representado na figura 1.2, o estudo de ACV é iterativo e, portanto, informações obtidas na última
fase podem afetar as fases anteriores. Quando isso ocorre, as fases iniciais devem ser re-trabalhadas
considerando esta nova informação. Portanto, em estudos de ACV é comum o trabalho das várias fases
paralelamente.
1.4.3 Alocação
Situações que requerem critérios de alocação ocorrem em estudos de ACV quando o ciclo de vida de
produtos diferentes são interligados. Pode-se citar como exemplos de ciclos de vida interligados a produção
de queijo e leite, suco de laranja e ração para gado, óleo diesel e gasolina, etc. Quando estas situações
ocorrem, a norma ISO 14041 (1998) recomenda que a fronteira do sistema seja expandida de modo que os
co-produtos sejam incluídos no estudo ou o nível de detalhes do ciclo de vida seja ampliado, o que ajuda na
identificação de dados relevantes que são específicos do produto.
Se nenhum dos procedimentos for aplicável, deve-se empregar um método de alocação para dividir as
cargas ambientais entre os diversos co-produtos. Esta divisão pode ser feita com base em:
alocação física, ou seja, todas as alterações quantitativas nos produtos ou em suas funções são
correlacionadas com mudanças nos fluxos de entrada e saída do sistema;
alocação econômica, isto é, divisão baseada no valor econômico dos produtos obtidos como reflexo de
seus preços relativos.
A alocação econômica tem sido adotada preferencialmente, uma vez que a produção de um produto com
alto valor agregado é a motivação principal da sua produção.
a produção e as atividades do ciclo de vida. Projetar os produtos levando em conta seu ciclo de vida é um
dos desafios enfrentados atualmente pelos fabricantes. Assim, os esforços feitos para aumentar a eficiência
dos processos ao longo do ciclo de vida não implicam somente em estender a responsabilidade entre as
partes envolvidas.
Desse modo, o objetivo do LCM é proteger os recursos naturais e maximizar a eficiência por meio da ACV,
do gerenciamento dos dados do produto, de suporte técnico e, inclusive, da análise de custo do ciclo de
vida - ACCV. Portanto, o LCM é um conceito e não um método ou ferramenta, como por exemplo a ACV e a
ACCV, etc. Entretanto, a relação entre o conceito de LCM e as ferramentas ainda não está bem
estabelecida e vem sendo discutida em congressos e publicações (KLOPFFER; HEINRICH, 2002).
A busca por produtos e processos sustentáveis vem ganhando importância cada vez maior nas indústrias,
de modo que o sucesso econômico das empresas depende cada vez mais da extensão em que as mesmas
conseguem atender as demandas do desenvolvimento sustentável. A eco-eficiência é uma filosofia de
gerenciamento segundo a qual as empresas são encorajadas a se tornar mais competitivas e inovadoras ao
mesmo tempo em que praticam, também, uma maior responsabilidade em relação ao meio ambiente. Em
muitos casos a eco-eficiência representa uma otimização ecológica de todo o sistema ao mesmo tempo em
que considera também os fatores econômicos envolvidos.
Portanto, a ACV possibilita a visualização de todas as interfaces das diversas etapas do ciclo de vida com o
meio ambiente.
Referências Bibliográficas
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO 14040: gestão ambiental: avaliação do ciclo de vida –
princípios e estrutura. Rio de Janeiro, 2001. 10 p.
______. NBR ISO 14041: gestão ambiental: avaliação do ciclo de vida – definição de objetivo e análise de inventário .
Rio de Janeiro, 2004. 25 p.
______. NBR ISO 14042: gestão ambiental: avaliação do ciclo de vida – avaliação do impacto do ciclo de vida. Rio de
Janeiro, 2004. 17 p.
______. NBR ISO 14043: gestão ambiental: avaliação do ciclo de vida – interpretação do ciclo de vida. Rio de Janeiro,
2005. 19 p.
CONSOLI, F. et al. Guidelines for life-cycle assessment: a code of practice. Pensacola: SETAC, 1993. 73 p.
INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION. ISO 14040: environmental management – life cycle
assessment – principles and framework. Genève, 1997. 12 p.
______. ISO 14041: environmental management – life cycle assessment – goal and scope definition and inventory
analysis. Genève, 1998. 22 p.
______. ISO 14042: environmental management – life cycle assessment – life cycle impact assessment.
Genève, 2000. 16 p.
______. ISO 14043: environmental management – life cycle assessment – life cycle interpretation –Genève,
2000. 18 p.
______. ISO/FDIS 14040: environmental management – life cycle assessment – principles and framework Genève,
2006. 31 p.
______. ISO/FDIS 14044: environmental management – life cycle assessment – requirements and guidelines. Genève,
2006. 57 p.
______. ISO/TR 14047: environmental management – life cycle impact assessment – examples of application of ISO
14042. Genève, 2003. 87 p.
______. ISO/TS 14048: environmental management – life cycle assessment – data documentation format. Genève,
2002. 41 p.
______. ISO/TR 14049: environmental management – life cycle assessment – examples of application of ISO 14041 to
goal and scope definition and inventory analysis. Genève, 2000. 42 p.
KLOPFFER, W.; HEINRICH, A.B. Life cycle management (LCM). Int. J. LCA, v. 7, n. 3, 133, 2002.
MATTSSON B, SONESSON U (Ed.) Environmentally-friendly food processing. Cambridge: Woodhead Publishing
Limited, 2003. 337 p.
MOURAD, A.L., GARCIA, E.E.C.; VILHENA, A. Avaliação do ciclo de vida: princípios e aplicações. CETEA/CEMPRE,
Campinas, 2002. 92 p.
PIRA International. Life cycle impact assessment training course. Leatherhead: PIRA, 2003.
SALING, P.; MAISCH, R.; SILVANI, M.; KONIG, N. Assessing the environmental-hazard potential for life cycle
assessment, eco-efficiency and SEEbalance. Int. J. LCA, v. 10, n. 5, p. 364-371, 2005.
VON BAHR, B., STEEN, B. Reducing epistemological uncertainty in life cycle inventory. J. Cleaner Prod., v. 12, n. 4, p.
369-388, 2004.
2.1 Introdução
Este capítulo apresenta um estudo de caso, no qual quantificou-se a influência da reciclagem no Inventário
de Ciclo de Vida de determinada embalagem. O estudo completo foi desenvolvido visando a interpretação
de produtos brasileiros em alumínio pela técnica de Avaliação do Ciclo de Vida, considerando as condições
e o nível tecnológico do país no período entre 2000 e 2002.
Para construção dos Inventários do Ciclo de Vida foram utilizados os modelos de Geração de Energia
Elétrica da rede pública e de Transporte de Cargas desenvolvidos pelo CETEA, sob a modelagem de dados
aplicáveis a estudos de ACV.
A metodologia utilizada tomou como base as recomendações da SETAC - Society of Environmental
Toxicology and Chemistry e a norma ISO 14040 (SOCIETY...,1993; ISO, 1997).
As fronteiras do estudo encontram-se ilustradas na figura 2.1, sendo que cada material foi analisado a partir
da extração das matérias-primas naturais, bauxita, petróleo, gás natural, carvão mineral, etc.
As etapas relacionadas ao sistema de geração de energia elétrica nacional, transporte rodoviário de cargas
e queima de combustíveis foram incorporadas aos Inventários relacionados à ACV dos produtos estudados.
Todas as etapas de transporte foram incluídas nas fronteiras do sistema. Quando do conhecimento do
retorno vazio do caminhão em uma determinada etapa do sistema, foi considerada a distância em dobro de
transporte.
Os principais aspectos (consumos e emissões) relativos à extração e produção dos combustíveis fósseis
(pré-combustão) como óleo diesel, óleo combustível, carvão, gás natural e gás liqüefeito de petróleo – GLP,
foram incluídos nas fronteiras do sistema. Entretanto, não foi considerada a etapa de transporte do óleo
diesel até os postos de abastecimento de caminhões para o transporte rodoviário de cargas.
As tintas de impressão, vernizes, vedantes, aditivos, lubrificantes, pigmentos, vedantes etc., foram
considerados apenas quanto ao consumo de energia e emissões associados à sua aplicação/secagem.
Esses componentes foram quantificados e identificados em grupo como “outros insumos”, quando
pertinente.
A produção e os tratamentos do produto acondicionado (bebida carbonatada) ficaram fora das fronteiras do
sistema. Considerou-se apenas o transporte médio das tampas e latas vazias até o produtor de bebida,
tendo também ficado fora das fronteiras do estudo as embalagens secundárias necessárias a este
transporte.
Todos os resíduos sólidos, inertes ou não, provenientes de processos industriais foram contabilizados
conjuntamente dentro da classificação “resíduo de processo industrial”.
A água utilizada nos processos industriais e, posteriormente, devolvida aos esgotos ou rios foi quantificada,
excluindo-se a água de circuitos fechados e/ou recirculação interna. Entretanto, foi considerada água de
Centro de Tecnologia de Embalagem – CETEA / ITAL 15
2. Reciclagem de Embalagem em Termos de ACV – Estudo de Caso
reposição (make up) necessária. Nos casos em que o abastecimento de água para a indústria foi
proveniente da rede pública, o processo público de tratamento de água, modelado com dados aplicáveis a
ACV, foi incluído nas fronteiras do estudo.
Os resíduos ou sub-produtos de processos com potencial de aplicação para outras finalidades, reciclados
ou utilizados por processos excluídos da fronteira do sistema, foram contabilizados em um único grupo
denominado “reciclagem externa ao sistema” (open loop recycling).
Os resíduos de processos industriais reciclados num mesmo processo de produção, como os denominados
retalhos de processos originados principalmente nas etapas de laminação de chapas e folhas, refletiram em
economia de energia, de matéria-prima e em redução de emissões para o produto ao qual pertenciam,
receberam tratamento conhecido em ACV como reciclagem em circuito fechado (close loop recycling).
Vale enfatizar que neste estudo de ACV de produtos em alumínio não foram considerados os investimentos
capitais, ou seja, os recursos e a energia utilizados na construção e manutenção de indústrias, estradas,
usinas de energia, caminhões etc. Identificou-se e quantificou-se apenas os consumos e emissões relativos
à produção, distribuição, reciclagem e disposição final de materiais.
Fronteiras do Sistema
Extração de recursos
naturais
Transporte
Produção de alumina
PRODUÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA E COMBUSTÍVEIS
Transporte
Produção do alumínio
primário
Transporte
Produção da chapa de
alumínio
Transporte
Transporte
Reciclagem do
alumínio Acondicionamento
da bebida
Transporte
Transporte/distribuição
(bebida+lata)
Lata pós-
consumo
Disposição final da
lata (gerenciamento de
resíduo sólido urbano)
Embora a Avaliação de Impacto não tenha sido incluída no escopo do Projeto, nove categorias de impacto
consideradas relevantes para a situação brasileira foram selecionadas e encontram-se descritas a seguir,
visando direcionar o levantamento e a coleta dos dados.
Os dados de consumo e emissões coletados, portanto, encontram-se relacionados às principais categorias
de impacto utilizadas para retratar o Ciclo de Vida dos sistemas estudados. Estas categorias, normalmente,
incluem aspectos relativos ao uso de recursos naturais, à influência sobre a saúde humana ou que tenham
conseqüências ecológicas.
Algumas categorias de impacto têm importância global, como as relacionadas ao efeito estufa e ao
comprometimento da camada de ozônio; outras têm significado regional, como os efeitos toxicológicos, a
chuva ácida e a disposição final de resíduo sólido urbano.
As seguintes categorias de impacto foram selecionadas para este estudo:
Consumo de recursos naturais
Mudanças climáticas (efeito estufa)
Acidificação
Nutrificação/eutrofização
Formação de atmosfera com compostos oxidantes
Toxicidade humana
Ecotoxicidade
Uso de espaço para disposição final
Uso de terra
Essas categorias de impacto foram consideradas as mais importantes em relação ao cenário brasileiro de
produção de produtos de alumínio.
O alumínio primário é obtido por meio da redução eletrolítica da alumina, processo conhecido como Hall and
Héroult, seguida da fundição e lingotamento do metal.
No processo de redução, a alumina é misturada a um banho de sais fundidos, constituídos de fluoretos e
criolita em uma cuba de aço, também conhecida como célula de redução ou pot, cujas paredes são isoladas
por tijolos refratários, que por sua vez são recobertos com tijolos de carbono, consistindo no catodo da
célula eletrolítica. Corrente elétrica é conduzida através de barras de aço e do próprio banho até anodos de
carbono também localizados na cuba eletrolítica. A corrente elétrica permite que a alumina (Al 2O3) se
decomponha em alumínio metálico e oxigênio; o oxigênio reage com os anodos de carbono formando CO
(monóxido de carbono) e CO2 (dióxido de carbono) e o alumínio líquido deposita-se no fundo da cuba,
sendo sifonado periodicamente para as etapas de fundição e lingotamento, em processo contínuo.
O conjunto formado pelo material refratário e pelo revestimento de carbono, conhecido como potliner, é
considerado a maior fonte de resíduo sólido no processo de redução, gerando o resíduo RGC (revestimento
gasto de cubas) ou spent potliner, SPL.
Assim sendo, os dois materiais consumidos no processo são alumina e anodo de carbono. A criolita pode
ser recuperada e reciclada facilmente. Além disso, é possível a recuperação de criolita volatilizada no
processo por meio de sistemas lavadores de gases, reduzindo assim o potencial de emissão de fluoretos
para o ar.
Algumas plantas de redução empregam outros aditivos no banho para melhorar suas características, como
fluoreto de alumínio, fluoreto de cálcio e fluoreto de lítio. Os aditivos usados e as quantidades adicionadas
variam conforme a empresa.
O principal resíduo sólido nesta etapa é o RGC, conforme mencionado, e as emissões para o ar incluem
principalmente particulados, CO2, CO, fluoretos, SOx (óxidos de enxofre), NOx (óxidos de nitrogênio) e
compostos orgânicos. Sob condições desfavoráveis, como o “efeito anódico”, as células podem produzir
pequena quantidade de perfluorcarbonos, CF4 e C2F6. Entretanto, as maiores emissões são CO2 e CO e a
razão entre eles é uma função da eficiência do processo e do tipo de anodo.
O RGC pode ser empregado como combustível na fabricação de telhas e tijolos e no co-processamento da
indústria cimenteira.
A etapa de fundição inicia-se com alumínio primário líquido e termina com alumínio primário nas seguintes
formas: lingotes, placa para posterior laminação a quente, tarugos para extrusão e lâminas. As principais
emissões nessa etapa do processo são produtos de combustão (SOx, CO 2, NOx), HCl (ácido clorídrico) e
Cl2 (gás cloro) (no caso de fabricantes que utilizam cloro na fluxação) e escória de alumínio.
A figura 2.2 apresenta um fluxograma ilustrando a produção de alumínio primário, desde a extração da
bauxita.
2.3.3 Produção da Tampa de Fácil Abertura para Latas de Duas Peças em Alumínio
O processo de produção de tampa de fácil abertura para latas de duas peças em alumínio envolve o
envernizamento de ambos os lados da chapa e a cura do verniz. Da chapa envernizada são cortados discos
que são introduzidos numa prensa para estampagem da tampa em matriz e punção com desenhos
apropriados ao uso, recebem o composto selante (vedante) e, então, são colocados em uma prensa de alta
precisão para formação e fixação dos anéis. O anel da tampa de fácil abertura é produzido em paralelo,
partindo-se de folha não envernizada. Depois de prontas e inspecionadas, as tampas são embaladas para
armazenagem e transporte (ABRALATAS, 2007).
Figura 2.3 – Fluxograma simplificado dos processos de produção de chapa, lata e reciclagem de
latas de alumínio
Figura 2.4 – Relação entre sucata recuperada e consumo doméstico relativa ao ano de 2004
(ABAL, 2006)
Em 2005 foram recicladas 96,2% das latas, índice superior ao de países como Japão (91,7%) e Estados
Unidos (52%). Pelo quinto ano consecutivo, o Brasil liderou a reciclagem de latas de alumínio para bebidas,
entre os países em que a atividade não é obrigatória por lei.
Atualmente, o ciclo da lata é de 30 dias, ou seja, nesse período, uma lata de alumínio pode ser comprada
no supermercado, utilizada, coletada, reciclada e voltar às prateleiras para o consumo. Na figura 2.5 é
apresentada a evolução dos índices de reciclagem de diversos países nos últimos 10 anos (ABAL, 2007b).
Figura 2.5 – Evolução dos índices de reciclagem de diversos países nos últimos 10 anos
(ABAL, 2007c)
As figuras 2.6 a 2.10 apresentam gráficos ilustrando a redução no consumo de recursos naturais e de
energia e emissões para ar e água, bem como geração de resíduo sólido no Ciclo de Vida de latas de
alumínio de duas peças para bebidas com capacidade de 350 mL, em função da taxa de reciclagem do
alumínio.
Redução no consumo (%)
100
80
Água
60
Bauxita
40
Calcário
20
0
0 20 40 60 80 100
Taxa de reciclagem (%)
Em geral, a diminuição do consumo de recursos naturais como bauxita, calcário e água tornam-se mais
expressivas conforme a taxa de reciclagem aumenta. A diminuição do consumo de água, no entanto, é
menor que as taxas de reciclagem praticadas porque não faz parte exclusivamente do processo de
produção de alumínio, sendo consumida praticamente em todas as etapas da cadeia de produção e nas
etapas de transporte.
0
0 20 40 60 80 100
Taxa de reciclagem (%)
Figura 2.7 – Redução no consumo de energia total e de recursos energéticos em função da taxa de
reciclagem do alumínio no Ciclo de Vida de 1.000 kg de latas de alumínio de duas peças
para bebidas
A redução do consumo de recursos naturais como petróleo, gás natural e carvão é bastante significativa, de
modo geral, conforme a taxa de reciclagem de alumínio aumenta. Verifica-se uma menor redução no
consumo de gás natural para uma mesma taxa de reciclagem comparativamente aos outros recursos
avaliados em função do amplo emprego desse gás em outras etapas da cadeia produtiva, destacando-se a
cura de vernizes no processo de produção de latas.
Redução nas emissões (%)
CH4
100
CH4 (Hidro)
80
CO
60 CO2
40 CO2 (Hidro)
20 COV
0 N2O
0 20 40 60 80 100 NOx
SO2
Taxa de reciclagem (%)
Particulados
Figura 2.8 – Redução nas emissões para o ar em função da taxa de reciclagem do alumínio no Ciclo
de Vida de 1.000 kg de latas de alumínio de duas peças para bebidas
A redução das emissões para o ar em função da taxa de reciclagem é verificada em todos os parâmetros
inventariados, sendo que, para aqueles cuja emissão é verificada principalmente no processo de produção
do alumínio primário a taxa de redução é mais significativa. No caso dos compostos orgânicos voláteis
(COV), a principal fonte de emissão é o processo de cura de vernizes e como a reciclagem do alumínio
influencia muito pouco esta etapa, a redução desta emissão em função da reciclagem é bem menor, quando
comparada às demais.
Sólidos solúveis
80
60
DBO
40 DQO
Substâncias orgânicas
20 dissolvidas
Metais
0
Com postos sulfurados
0 20 40 60 80 100
Taxa de reciclagem (%)
Figura 2.9 – Redução nas emissões para a água em função da taxa de reciclagem do alumínio no
Ciclo de Vida de 1.000 kg de latas de alumínio de duas peças para bebidas
Em relação à emissões para a água, deve-se seguir o mesmo raciocínio feito para as emissões para o ar,
ou seja, para aquelas emissões típicas do processo de produção do alumínio primário, verifica-se reduções
mais intensas em função do aumento da taxa de reciclagem. Para aquelas emissões relacionadas às etapas
posteriores do processo, incluindo até mesmo o processo de reciclagem, as reduções são menos
significativas, como por exemplo as emissões de sólidos solúveis e óleos e gorduras inventariadas
principalmente nos processos de produção de combustíveis empregados no transporte terrestre.
100
80
Redução da emissão (%)
60
40
20
0
0 20 40 60 80 100
Taxa de reciclagem (%)
Figura 2.10 – Redução nas emissões de resíduos sólidos em função da taxa de reciclagem do
alumínio no Ciclo de Vida de 1.000 kg de latas de alumínio de duas peças para bebidas
Quanto aos resíduos sólidos, verifica-se que a quantidade de lama gerada na etapa de produção da
alumina e a quantidade de resíduo gasto de cubas (RGC) gerada durante a produção do alumínio primário
são reduzidas à mesma taxa que o alumínio primário é substituído pelo alumínio reciclado durante o Ciclo
de Vida da lata de alumínio para bebida. Outros resíduos de processos industriais e o volume usado para a
disposição final têm sua taxa de redução ligeiramente inferior, uma vez que foram levantados em outras
etapas desse Ciclo de Vida, incluindo o processo de reciclagem.
24 Centro de Tecnologia de Embalagem – CETEA / ITAL
Avaliação do Ciclo de Vida como Instrumento de Gestão
De forma geral, a influência da taxa de reciclagem do alumínio nos parâmetros inventariados é similar, uma
vez que os valores aumentam conforme a taxa de reciclagem diminui porém, as proporções variam de
acordo com o parâmetro, dependendo da contribuição da etapa de produção do alumínio primário aos
valores finais do inventário. Este comportamento é esperado, uma vez que, a contribuição da etapa de
produção do alumínio primário é predominante sobre a maior parte das outras etapas do Ciclo de Vida da
lata.
De acordo com os resultados apresentados é possível concluir que o balanço da reciclagem é sempre
positivo devido à importância dos estágios que precedem à produção da embalagem e o problema do
aumento do volume do resíduo sólido municipal. A reciclagem de latas reduz parte do consumo de recursos
naturais e das emissões associadas aos estágios anteriores à produção da embalagem e os parâmetros
relacionados especificamente à produção de alumínio primário sofrem redução diretamente proporcional ao
aumento da taxa de reciclagem. Assim sendo, todos os esforços realizados no sentido de aumentar a taxa
de reciclagem terão uma contribuição positiva no inventário de Ciclo de Vida da lata de alumínio.
2.5 Agradecimentos
Os autores agradecem a colaboração da Associação Brasileira do Alumínio – ABAL e do Grupo de Meio
Ambiente do CETEA.
Referências Bibliográficas
ABAL - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DO ALUMÍNIO. Alumínio para futuras gerações. São Paulo. São Paulo: ABAL,
2000. 45p.
_____. Anuário estatístico ABAL 2005. São Paulo: ABAL, 2006. 48p.
_____. O alumínio: introdução. Disponível em: <http://www.abal.org.br/aluminio/introducao.asp)>. Acesso: 04 mai
2007a.
_____. Reciclagem: latinhas campeãs. Disponível em: <http://www.abal.org.br/reciclagem/latas.asp>. Acesso: 04 mai
2007b.
_____. Reciclagem: números da reciclagem. Disponível em:
<http://www.abal.org.br/industria/estatisticas_recicla_latas.asp?canal=8>. Acesso: 04 mai 2007c.
_____. O alumínio: processos de produção. Disponível em:
<http://www.abal.org.br/aluminio/processos_laminacao.asp>. Acesso: 09 mai 2007d.
ABRALATAS - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS FABRICANTES DE LATAS DE ALTA RECICLABILIDADE. Como se
fabrica a lata. Disponível em: <http://www.abralatas.org.br/comofab_chapalata.asp>. Acesso: 02 mai 2007>.
INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION. ISO 14040: environmental management – life cycle
assessment – principles and framework. Genève: ISO, 1997. 12p.
NOVELIS. Processo de reciclagem. Disponível em:
<http://www.novelis.com.br/NovelisBrasil/Reciclagem/ProcessoReciclagem/>. Acesso em 09 mai 2007.
SOCIETY OF ENVIRONMENTAL TOXICOLOGY AND CHEMISTRY. Guidelines for life-cycle assessment: A code of
practice. Pensacola: SETAC, 1993, 73p.
3.1 Introdução
O tema “embalagem” tornou-se o alvo principal de muitas discussões ambientais, especialmente no que diz
respeito ao resíduo sólido gerado após o consumo do produto. Uma vez que, após a utilização do produto o
que resta é a embalagem, as pressões sobre a sua participação no resíduo sólido urbano são intensas.
Entretanto, a embalagem é fundamental para a preservação dos produtos e, consequentemente, para o uso
racional dos recursos naturais e do trabalho humano.
Voltada a este cenário, em 20 de dezembro de 1994 a Comunidade Européia publicou a Directiva 94/62/CE
relativa a embalagens e resíduos de embalagens, aplicável a todas as embalagens colocadas no mercado
europeu e a todos os resíduos de embalagem, quer sejam utilizados ou rejeitados como refugo pelas
indústrias, estabelecimentos comerciais, serviços, dentre outros, independentemente dos materiais que as
constituem. Dentre os vários aspectos abordados nesta Directiva, foi prevista a realização de programas
nacionais para o desenvolvimento de sistemas de reutilização das embalagens (PARLAMENTO..., 2006).
Como conseqüência, as discussões sobre as vantagens ambientais relacionadas aos sistemas de
embalagem retornável ou não-retornável (one-way) tornaram-se ainda maiores e a técnica de Avaliação do
Ciclo de Vida – ACV vem sendo cada vez mais empregada como ferramenta para o levantamento de
informações sobre as vantagens e desvantagens dos diversos sistemas produtivos.
A principal fonte de matéria-prima para a produção do vidro é o óxido de silício ou a sílica (substância
vitrificante ou formadora do vidro), obtida geralmente por extração convencional, tanto de origem marinha
como fluvial, ou de jazidas naturais. Embora possa ser produzido um vidro à base de sílica pura, este
material isolado apresenta um ponto de fusão elevado, na faixa de 1.700°C a 1.800°C, exigindo fornos
especiais e que o torna economicamente inviável. Mesmo a essa temperatura elevada, o vidro de sílica pura
apresenta uma viscosidade muito alta, imprópria para os processos de moldagem.
Para reduzir a temperatura de fusão da sílica e permitir que o processo de fabricação do vidro seja técnico e
economicamente viável, adiciona-se à sílica o óxido de sódio (Na2O) e/ou de potássio (K2O), os quais atuam
como fundentes ou fluxos. O carbonato de sódio (Na 2CO3), fornecedor do óxido de sódio na composição do
vidro, é o componente mais significativo no custo das matérias-primas do vidro, podendo representar até
60% desse valor. O óxido de potássio é obtido do feldspato, mineral complexo constituído por
aluminosilicato duplo de sódio e potássio - KNa(AlSi3O8), também extraído de jazidas naturais. Além do
óxido de potássio, o feldspato é fonte de outros elementos do vidro, tais como o óxido de alumínio (Al 2O3)
ou alumina, o óxido de sódio (Na2O) e a sílica.
Um vidro formado exclusivamente a partir de sílica e sódio possui um baixo ponto de fusão, mas uma alta
solubilidade e, conseqüentemente, baixa resistência química, podendo favorecer um ataque preferencial do
material pela água e levar a uma perda progressiva da transparência e da superfície lisa características do
vidro. Portanto, faz-se necessária a substituição de parte do Na2O por óxido de cálcio (CaO), óxido de
magnésio (MgO) ou óxido de alumínio ou alumina (Al2O3). Essas substâncias são denominadas
estabilizantes, uma vez que a sua presença confere um significativo aumento da resistência química e
mecânica do vidro, evitando que seja solubilizado pela água. Os estabilizantes também conferem uma curva
de viscosidade mais adequada ao processo de fabricação do vidro. O óxido de cálcio é fornecido ao vidro
através do carbonato de cálcio (CaCO3) e o óxido de magnésio através da dolomita, mineral constituído de
carbonato duplo de cálcio e magnésio (CaMgCO3), ambos extraídos de jazidas naturais (pedreiras).
O vidro de embalagem é, portanto, obtido a partir desses três elementos básicos, sendo constituído
fundamentalmente pelo óxido de silício.
A incorporação de vidro reciclado às matérias-primas naturais também tem adquirido grande importância no
processo de fabricação das embalagens de vidro, devido às questões ambientais e econômicas.
Do ponto de vista ecológico, com a adição de caco de vidro reduz-se a quantidade de resíduo descartado,
além de reduzir a extração e utilização dos minerais que constituem as matérias-primas do vidro. Também é
possível reduzir o consumo de combustíveis para a geração de energia, minimizando os problemas de
poluição ambiental.
O caco de vidro recuperado e tratado, seja proveniente de rejeitos de fabricação ou de outras fontes,
constitui uma matéria-prima que apresenta vantagens tecnológicas, pois melhora sensivelmente o processo
de fusão, gerando economia no consumo de energia, além de possibilitar um aumento de produtividade
sem incrementar significativamente o consumo de energia.
O caco de vidro pode ser classificado em três grupos quanto à sua origem:
Material gerado na própria vidraria e no mesmo forno, portanto, com a mesma composição química do
vidro em produção e podendo retomar à mistura sem qualquer correção;
Material proveniente de outra fonte geradora como, por exemplo, um outro forno de fusão. Neste caso,
o caco de vidro deve ser considerado no cálculo da composição do vidro à qual será incorporado;
Material de origem desconhecida, proveniente de um processo de reciclagem. Neste caso, deve ser
considerado como uma matéria-prima qualquer, realizando-se análises químicas que assegurem a
compatibilidade com a composição na qual será agregado.
O maior problema relativo à utilização de vidro reciclado é a presença de contaminantes, mais freqüente no
caco coletado fora da vidraria. Como exemplo, tem-se metais que atacam os refratários dos fornos e
materiais que não fundem e podem constituir inclusões sólidas no produto final.
Outra questão referente ao uso de material reciclado é a necessidade de separação por cor, uma vez que
na produção do vidro incolor só é possível adicionar cacos de vidro incolor.
Para facilitar a análise de cada uma das várias etapas que integram o processo de fabricação das
embalagens de vidro, apresenta-se na figura 3.1 um diagrama esquemático simplificado indicando as
principais etapas de produção.
S IL OS
T RA T AME N TO
E P ESA GE M
C HE GA D A DE M AT ÉRI A-PR IM A P ES A GE M DO S MA T ER IA IS MI ST U RA
CA C O
F OR NE C ED OR A T R A T A ME NT O T RA T AM EN T O
1 50 0 a 1 60 0ºC A QU E NT E A F R IO
IN S PE Ç ÃO A U TO M Á TI CA
F OR N O G OT A
T Ú N E L D E R E C OZ I M E N T O
M Á QU IN A I.S .
A NA LI STA D E P RO DU ÇÃ O
LO T E
DE CO RA Ç Ã O AR M A Z ÉM CL I EN TE
Figura 3.1 – Diagrama esquemático da produção de embalagens de vidro (JAIME; DANTAS, 2005)
As matérias-primas são pesadas, misturadas e introduzidas no forno de fusão por meio de processo
contínuo, juntamente com o caco de vidro reciclado e tratado. O vidro fundido é retirado do forno em
pequenas quantidades (suficiente apenas para produzir uma unidade da embalagem) e introduzido no
equipamento de conformação.
Em geral, as embalagens são produzidas através de duas etapas sucessivas de moldagem do vidro a uma
temperatura inicial em torno de 1.100ºC. Após a moldagem e resfriamento, as embalagens são submetidas
a processos sucessivos para o aliviamento de tensões residuais presentes na massa de vidro e à
tratamentos superficiais, seguindo diretamente para os sistemas de acondicionamento (paletização).
Dependendo do tipo de embalagem e da especificação do projeto, a embalagem de vidro poderá ainda ser
submetida à processos de decoração dentro da própria vidraria, anteriormente ao seu envio ao cliente.
Quanto maior a distância de distribuição do produto acondicionado, maior o custo ambiental associado ao
transporte (consumo de combustíveis e emissões para o ar), devendo ser considerado o tipo de transporte e
a capacidade de carga dos meios de transporte empregados na distribuição do produto e no retorno das
embalagens vazias para um novo ciclo de uso. Deve ser contabilizado ainda o gasto energético e de água
para a higienização das embalagens de retorno anteriormente ao acondicionamento do novo produto.
A energia envolvida num determinado sistema ou produto, de forma geral, é caracterizada como um
importante parâmetro quando aplicado em estudos envolvendo Avaliação do Ciclo de Vida ou em estudos
envolvendo Análise de Impacto Ambiental, pois podem ser associados ao consumo de recursos naturais e a
emissões de poluentes para o ar, como o gás carbônico (CO 2), monóxido de carbono (CO), particulados,
compostos orgânicos voláteis (COV), óxidos de nitrogênio (NOx) e de enxofre (SOx), etc.
Um exemplo teórico, apresentado na figura 3.2, ilustra a interpretação dos resultados de aplicação de ACV
para um sistema de embalagem retornável, por meio de um modelo que considera a energia total requerida
no ciclo de vida em função do número de retornos (GARCIA, 2002).
Energia total do sistema (MJ)
20000
18000
16000
14000
12000
10000
8000
6000
4000
2000
0
1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23 25 27 29
Número de retornos
Figura 3.2 – Relação entre a energia total associada a um sistema de embalagem e o número de
retornos para a unidade funcional de 1.000 kg de produto comercializado/consumido (GARCIA, 2002)
De acordo com a figura 3.2, pode-se observar que, para uma mesma distância ou raio de distribuição, a
energia total diminui à medida que aumenta o número de retornos (viagens), tendendo a um valor mínimo
que expressa o gasto energético associado à etapa de lavagem, higienização, transporte do produto,
embalagens secundárias, retorno das embalagens vazias e reposição de embalagens que deixam o sistema
(devido à quebra). Desta forma pelo exemplo apresentado, a partir de cerca de 20 retornos, o aumento do
número de viagens da embalagem retornável não interfere significativamente na energia total requerida pelo
sistema.
Comparando-se as curvas obtidas para os cenários de 200 e de 1.000 km de raio de distribuição, observa-
se que o aumento da distância de distribuição requer maior consumo de energia, reduzindo a vantagem do
sistema retornável.
Encontram-se ainda ilustrados na figura 3.2, dois exemplos de embalagem descartável de mesmo material,
considerando duas situações:
sem reciclagem
com alta taxa de reciclagem pós-consumo
Neste exemplo, é possível observar que, para uma distância de distribuição de 200 km, a partir de 6
retornos o sistema retornável passa a consumir menos energia do que o sistema descartável (com alta taxa
de reciclagem). Entretanto, no cenário de 1.000 km, o sistema descartável com alta taxa de reciclagem pós-
consumo revela-se uma melhor opção que o sistema retornável.
É importante ressaltar que as embalagens descartáveis, normalmente, são mais leves (possuem menor
massa comparativamente às embalagens retornáveis) e, portanto, encontram-se associadas a um menor
consumo de energia por unidade funcional de produto acondicionado do que a embalagem retornável em
seu primeiro uso.
Outro estudo de ACV de embalagens de vidro retornáveis versus embalagens de vidro não-retornáveis ou
descartáveis (one-way) foi desenvolvido no Instituto de Embalagem de Bruxelas, na Bélgica (VAN
DOORSSELAER; LOX, 1999), visando o levantamento de dados sobre a energia envolvida em ambos os
sistemas de embalagem (retornável e descartável) para cerveja.
Em geral, os estudos sobre embalagem de vidro iniciam-se com a estimativa da taxa de quebra da
embalagem, uma taxa média de retorno da embalagem e consideram ainda o sistema de distribuição em
um estado de equilíbrio. Assim, todos os trabalhos tendem à conclusão que o sistema retornável possui
menor carga ambiental do que o sistema de embalagem não-retornável (descartável), quando o sistema de
distribuição permanece dentro de um raio de 100 a 150 km.
No estudo desenvolvido por Van Doorsselaer e Lox (1999), os sistemas de distribuição de cerveja em
embalagens de vidro retornáveis e não-retornáveis tiveram seu início na produção da embalagem de vidro,
levando-se em consideração uma taxa de reciclagem de 15%.
Outros aspectos importantes para estudos envolvendo ACV que fizeram parte do escopo do estudo são:
Transporte: foi considerado o transporte associado à distribuição das embalagens de vidro a partir da
unidade produtiva até as empresas envasadoras;
Embalagem secundária e terciária: foi considerada a produção das embalagens secundária e terciária
utilizadas no sistema de embalagem retornável e seu o transporte até os centros distribuidores;
Energia: a energia associada à re-utilização das embalagens retornáveis, incluindo a
lavagem/higienização, transporte e a colocação de novas embalagens e seu transporte, além do
transporte associado à reciclagem de embalagens que são retiradas do mercado foram considerados
neste estudo;
Unidade funcional: a unidade funcional adotada foi de 1.000 L de cerveja comercializada em garrafas de
vidro de 250 mL. A energia envolvida no sistema foi expressa em Joules (J) e encontra-se relacionada
às fontes de energia primária do país, sendo considerado um fator de eficiência de 33% para a
produção de eletricidade.
A energia envolvida na distribuição de 1.000 litros de cerveja em embalagens de 250 mL para uma distância
de 155 km utilizando caminhões de 30 e 10 toneladas foi apresentada como sendo:
E0 (energia necessária para a produção de embalagens não-retornáveis (one-way) = 9.321 MJ
E1 (energia independente do retorno da embalagem, ou seja, a energia necessária para a distribuição
do produto) = 1.269 MJ
E2 (energia dependente do retorno da embalagem) = 12.668 MJ
As embalagens não-retornáveis avaliadas no estudo foram produzidas com menor massa de vidro (142 g)
comparativamente à garrafa retornável (242 g), sendo também considerada uma menor energia associada a
distribuição do produto descartável. A influência da distância do transporte (do acondicionamento do
produto ao centro distribuidor e retorno) sobre a energia necessária para a distribuição do produto, com
base na unidade funcional avaliada é apresentada na tabela 3.2. A energia associada ao transporte foi
calculada tomando-se por base o consumo médio de um caminhão de 30 toneladas (0,44 MJ/km.ton)
multiplicado pela carga e pela distância de transporte, estando relacionada à unidade funcional adotada no
estudo.
A relação entre o consumo de energia associada ao uso da embalagem para a unidade funcional estudada,
considerando-se uma taxa de quebra de 3% da embalagem, encontra-se apresentada graficamente na
figura 3.3. O número mínimo de retornos equivalente a uma mesma quantidade de energia consumida, seja
para um sistema retornável ou não-retornável (one-way) foi calculado graficamente pela interseção das
linhas E0 (considerada constante para a embalagem one-way) e a energia associada ao sistema retornável
(E1+E2), sendo considerado pelo autor como um ponto de equilíbrio entre os sistemas. Entretanto, este
ponto de equilíbrio é alterado em função da taxa de quebra das embalagens de retorno.
14000
Energia necessária em
12000
Ponto de equilíbrio
10000
E0
8000
6000
4000
E1 + E 2
2000
E1
0
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Número de retornos
Figura 3.3 – Avaliação comparativa entre o consumo de energia por 1000 litros de cerveja em função
do número de retornos da embalagem (VAN DOORSSELAER; LOX, 1999)
Embora o consumo de energia associado ao transporte represente 57% (para uma distância de distribuição
de 155 km) ou 75% (para 500 km) da energia total associada à distribuição do produto (E1), o número de
retornos da embalagem não interfere significativamente neste ponto de equilíbrio. Isso decorre do fato de
que tanto E0 quanto E1, aumentam com a distância de distribuição, tornando desprezível a influência
relativa do número de retornos sobre o ponto de equilíbrio.
Por meio de diversas equações desenvolvidas no estudo, os autores estimaram um número mínimo de
retornos de garrafas considerado como viável para o sistema retornável, tendo sido considerado ainda um
determinado índice de quebra da embalagem de vidro que, neste caso, deve ser reposta por novas
embalagens. Assim, por meio desses cálculos e baseando-se na unidade funcional estudada, foi estimado
que o sistema retornável somente é viável quando o índice de quebra das embalagens é inferior a 35%.
Acima deste percentual de quebra, o sistema descartável passa a ser mais favorável ecologicamente.
Na figura 3.4 é representada esquematicamente a dependência do ponto de equilíbrio do sistema
retornável/descartável em função da distância de distribuição do produto e do índice de quebra da
embalagem.
10
9
a determinado ponto
Número de retornos
8
C
do equilíbrio
7
6
5
4 A
3
2
1 B
0
0 10 20 30 40 50 60 70
Índice de quebra (%)
155km
250km
500km
750km
1000km
Taxa de retorno médio da embalagem
Como resultado deste estudo, o sistema retornável somente passa a ser vantajoso quando para um
determinado número de retornos está associado um baixo índice de quebra da embalagem (inferior a 5%),
especialmente quando a distribuição envolver grandes distâncias de transporte. Em outras palavras pode-
se dizer que, quando o índice de quebra das embalagens de vidro e as distâncias de transporte forem muito
grandes, a utilização de embalagens descartáveis passa a ser ambientalmente mais favorável, desde que
associada a um processo de reciclagem efetivo.
Por meio de estudos de ACV, portanto, é possível evidenciar as vantagens e desvantagens associadas à
um determinado sistema de comercialização de produtos, a exemplo de embalagens retornáveis ou
descartáveis, podendo-se inclusive evidenciar os pontos críticos associados a um ou outro sistema ou, até
mesmo, estimar o raio de distribuição mais favorável a cada sistema de produto analisado.
Referências Bibliográficas
GARCIA, E.E.C. A ACV e as Embalagens. In: AVALIAÇÃO do ciclo de vida: princípios e aplicações. Campinas:
CETEA/CEMPRE, 2002. cap. 12, p. 78-83.
INDIANA INSTITUTE ON RECYCLING. Glass bottles, milk, refillable. Case study nº 9613. Disponível em:
<http://web.indstate.edu/recycle/9613.html>. Acesso em: 20 junho 2006.
JAIME, S.B.M.; DANTAS, F.B.H. Embalagens de vidro para alimentos e bebidas: propriedades e requisitos de
qualidade. Campinas: CETEA/ITAL, 2005. 180 p.
PARLAMENTO EUROPEU E CONSELHO DA UNIÃO EUROPEIA. Directiva 94/62/CE, de 20 de dezembro de 1994.
Embalagens e resíduos de embalagens. JO L 365 de 31 dez.1994. p. 10-23. Disponível em:
<http://europa.eu/scadplus/leg/pt/lvb/l21207.htm>. Acesso em: 20 junho 2006.
TOOLEY, F.V. The handbook of glass manufacture. 3rd. ed., New York: Ashlee Publishing Co. Inc., 1984. 1243 p.
VAN DOORSSELAER, K.; LOX, F. Estimation of the energy needs in life cycle analysis of one-way and returnable glass
packaging. Packaging Technology and Science, West Sussex, v. 12, n. 5, p. 235-239, 1999.
4.1 Introdução
Os primeiros estudos de ACV de produtos alimentícios foram realizados no início da década de 90 e a partir
daí o número de estudos de ACV destes produtos tem crescido constantemente. Paralelamente a este
crescimento, fez-se necessário o desenvolvimento de novas metodologias para expressar estes produtos
em termos de ACV (DIERS et al., 1999; MATTSSOM; SONESSOM, 2003; MOURAD et al., 2006;
HALBERG, 2003; SALOMONE, 2003; WEIDEMA, 2000).
O pensamento sobre todo o ciclo de vida (life cycle thinking) na indústria australiana de grãos vem
crescendo em resposta ao anseio dos consumidores sobre os aspectos ambientais dos alimentos que eles
compram e consomem. Por este motivo, Narayanaswamy et al. (2004) desenvolveram três estudos de caso
de ACV para produtos à base de grãos cultivados, processados e consumidos na Austrália. Estes estudos
de caso incluíram o crescimento e processamento de trigo para produção de pão, cevada para cerveja e
canola para óleo comestível. Como resultado deste estudo, os autores identificaram os pontos de melhoria
para os três produtos estudados (tabela 4.1). As etapas do processo que representam mais de 10% das
principais categorias de impacto ambiental foram identificadas como “pontos de melhoria” potenciais. Os
resultados deste estudo mostraram que o impacto da produção agrícola no ciclo de vida do produto
depende do tipo de produto agrícola avaliado, podendo ter maior ou menor contribuição para o impacto
ambiental total.
Tabela 4.1 – Pontos de melhoria ambiental para as cadeias de suprimento de pão, cerveja e
óleo comestível (NARAYANASWAMY et al., 2004)
Pão* Cerveja* Óleo comestível*
Categoria de impacto ambiental
1 2 3 4 1 2 3 4 1 2 3 4
Consumo de energia X X X X X X X
Mudança climática X X X X X X X X
Acidificação X X X X X X
Toxicidade humana X X X X X X X
Ecotoxicidade terrestre X X X
Eutrofização X X X X
* Etapas do ciclo de vida: 1 = produção dos insumos e cultivo agrícola; 2 = estocagem e processamento; 3 = distribuição
e consumo; 4 = transporte.
Vale ressaltar que existem algumas diferenças entre os estudos de ACV de sistemas industriais e de
sistemas agrícolas que tiveram de ser consideradas nestes estudos. A figura 4.1 exemplifica um fluxograma
de ACV de sistemas agrícolas - produção de pão: neste caso o estudo pode envolver a comparação de
diferentes tipos de produção de pão (por exemplo, pão feito de trigo de produção agrícola convencional
versus orgânico) (COWELL; CLIFT, 1997).
Outros
Fertilizantes Pesticidas Embalagem
ingredientes
Semeadura, Secagem e
crescimento moagem do Embalagem
Produção da
do trigo e grão e e distribuição Consumo
semente
colheita do produção do pão
grão do pão
Figura 4.1 - Fluxograma simplificado da ACV de produtos alimentícios (COWELL; CLIFT, 1997)
Como em todo estudo de ACV, o delineamento das cadeias produtivas em estudo é de fundamental
importância, pois norteia a definição das fronteiras do sistema em estudo e o dimensionamento da extensão
da amostragem para o levantamento de dados. Diferentemente dos ACVs de sistemas industriais, muitas
“entradas” têm origem na natureza como a energia solar ou o uso de terra.
Todos os dados do estudo de ACV estão relacionados a uma unidade funcional. Os estudos de ACV de
produtos alimentícios normalmente adotam a massa do produto em estudo como a unidade funcional, por
exemplo 1 kg de pão disponível para venda na padaria, 1 kg de atum acondicionado pronto para
distribuição, 1.000 kg de café disponível para venda na fazenda, etc. No entanto, a seleção da unidade
funcional dos produtos alimentícios não é óbvia uma vez que estes produtos têm diversas funções como,
por exemplo, valor nutricional (conteúdo nutritivo ou de fibras ou valor calórico), vida de prateleira, qualidade
sensorial, etc. Como o estudo de ACV é relacionado a apenas uma unidade funcional, as demais funções
são melhor descritas em termos qualitativos na fase de interpretação do estudo (MATTSSOM; SONESSOM,
2003).
A definição das fronteiras do sistema, ou seja, separar o sistema em estudo do meio ambiente natural, não
é uma tarefa muito clara quando está sendo considerada a agricultura, uma vez que o sistema produtivo
está inserido no meio ambiente natural. Uma das decisões a ser tomada diz respeito à inclusão ou não do
solo na fronteira do sistema. A fronteira temporal é outra escolha não muito clara: considerações sobre a
inclusão ou não da rotação de culturas no estudo ou mesmo se a avaliação deve abranger uma ou duas
safras são questões que precisam ser consideradas e estar bem definidas.
A alocação é uma questão bastante complexa em estudos de ACV de um modo geral. E no caso do ciclo de
vida de produtos alimentícios podem haver diversos processos multifuncionais, tais como a etapa agrícola, o
processo industrial, a etapa de distribuição e a etapa de consumo. Como exemplos, pode-se citar o gado
leiteiro que produz tanto o leite quanto a carne ou a cultura do trigo que produz o trigo e a palha, etc. Por
este motivo, é difícil dividir o sistema agrícola em sub-sistemas. Muitos produtos são obtidos
concomitantemente, como a produção do suco de laranja concentrado congelado que além do suco de
laranja também produz a ração animal e os óleos essenciais durante o processamento da laranja. Além
disso, se o produto é armazenado sob refrigeração, ele divide este impacto ambiental com os demais
produtos refrigerados. Existem diversos métodos de alocação, porém os mais utilizados baseiam-se na
massa, volume ou valor econômico do produto. Vale ressaltar que existe uma tendência em se adotar este
último critério nos estudos de ACV.
Quanto ao impacto ambiental da atividade agrícola relacionado com o uso de terra ainda não há uma
metodologia amplamente aceita. Uma vez que a ACV é uma metodologia que se baseia em fluxos de
material e de energia, é difícil vinculá-la ao impacto sobre a biodiversidade. Muitos estudos de ACV de
produtos alimentícios incluem como uso de terra somente a área necessária para a produção agrícola do
produto em estudo sem nenhuma correlação com a biodiversidade. Entretanto, o uso de terra é uma
questão vital nos estudos de ACV de produtos alimentícios, especialmente quando a agricultura é
considerada. Assim, segundo Milà i Canals et al. (2007) os futuros métodos de avaliação de impacto do uso
de terra deverão vincular o fluxo elementar do uso de terra e os aspectos ambientais registrados no ICV aos
aspectos de impacto na biodiversidade, no potencial de produção biótica e na qualidade ecológica do solo,
os quais eventualmente poderão ser associados aos danos causados ao meio ambiente e recursos
naturais.
2.000 Brasil MG ES SP
Exportações (1.000 t)
1.500
1.000
500
0
2000 2001 2002 2003 2004 2005
Figura 4.2 – Exportações de café em grão pelo Brasil (MDIC, 2006)
A Coffea canephora Pierre ex-Froehner, conhecida pelo nome geral de café robusta, é, com certeza, a
variedade mais amplamente distribuída em termos geográficos, sendo por isso, conhecida por vários
nomes. Tem forma bem diferente da variedade típica da Coffea arabica: é multicaule, ou seja, muitos ramos
partem do solo, no estado espontâneo, e atingem de 2 a 5 metros de altura. Em algumas regiões de clima
quente, o Coffea canephora foi muito plantado. É o caso do Vale do Rio Doce, no Espírito Santo, onde
foram instaladas grandes lavouras de cafeeiros kouillou – uma variedade originária da Costa do Marfim,
também conhecida como café conilon.
A semente de café (figura 4.3) é na verdade o mesmo grão que dá origem ao café torrado. A diferença
reside no modo de colheita e dos cuidados posteriores. A coleta das sementes é realizada anualmente, de
abril à junho. Colhem-se apenas frutos maduros (cereja), para em seguida serem lavados, despolpados
(retirada da casca e da polpa) e, finalmente, secos até atingir 15 a 20% de umidade quando, então, estão
aptos para o semeio.
Para construção do ICV foram utilizados os modelos de Transporte de Cargas e de Geração de Energia
Elétrica da Rede Pública desenvolvidos pelo CETEA para ACV de produtos brasileiros (COLTRO et al,
2003).
Além das diferenças regionais e de variedades na produção de café, existem as diferenças decorrentes dos
processos de beneficiamento praticados. Existem duas rotas tecnológicas básicas atualmente praticadas: a
rota úmida e a rota seca. As etapas comuns às duas rotas são: limpeza, separação, secagem, estocagem,
processamento e classificação. Na via úmida, ocorre adicionalmente a separação do café cereja, a remoção
da polpa e da mucilagem. Na via seca, o café é seco em terreiros, sem a adição de água (figura 4.4).
Entretanto, na via úmida, o uso de água é essencial para obtenção dos cafés lavados e/ou despolpados
(ALVES, 1999; FILHO et al., 2002; ANDRADE et al., 1999; NANNETTI, 1999a-c; THOMAZIELLO, 2000a-b;
ZAMBOLIN, 2000).
Colheita
Lavagem e separação
Café cereja
Remoção da polpa
Café bóia
Remoção da mucilagem
Lavagem do café
Secagem
(ao sol ou mecânica)
Estocagem
Beneficiamento e classificação
Embalagem
Figura 4.4 – Principais etapas de beneficiamento do café pelas vias úmida e seca
900
800
Fertilizantes (kg/ton café)
700
600
500
400
300
200
100
0
10 15 20 25 30 35 40 45
Produtividade (sacas/ha)
20
18
16
12
10
0
10 15 20 25 30 35 40 45
Produtividade (sacas/ha)
Figura 4.6 – Consumo de defensivos agrícolas (massa de ativos) em relação a produtividade do café
grão verde para as safras de 2001/02 e 2002/03. O ponto em negrito refere-se a
média aritmética da amostra (COLTRO et al., 2006a)
Por outro lado, foram identificadas propriedades com elevado consumo de insumos e baixa produtividade.
Uma reavaliação de seus procedimentos agrícolas poderá melhorar seu desempenho ambiental e
econômico.
Neste estudo, 39% dos produtores de café apresentaram um bom desempenho ambiental, isto é, consumo
de pesticidas, fertilizantes e corretivos inferiores às respectivas médias regionais, com exceção do uso de
terra de aproximadamente metade destas fazendas que apresentaram valores ligeiramente superiores às
médias regionais (COLTRO et al., 2006b).
Portanto, a análise dos resultados da ACV do cultivo de café em função da especificidade de cada região
geográfica, junto ao setor produtivo proporciona uma base científica para a implementação de um futuro
rótulo ambiental para este produto, de forma a melhorar a sustentabilidade do setor.
4.3 Agradecimentos
As autoras agradecem à FINEP, ao CNPq e ao MCT pelo apoio financeiro e pelas bolsas de estudo. As
autoras também agradecem à todos aqueles que contribuíram com este estudo.
Referências Bibliográficas
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5 Rotulagem Ambiental
Leda Coltro
5.1 Introdução
A rotulagem ambiental é um método voluntário de certificação de desempenho ambiental que é praticada
em todo o mundo. O rótulo ambiental identifica a preferência ambiental de um produto ou serviço dentro de
uma categoria específica de produto e/ou serviço baseando-se em considerações sobre o ciclo de vida,
sendo concedido por programas de rotulagem ambiental de terceira parte, imparciais (tabela 5.1).
Os rótulos ambientais têm por objetivo aperfeiçoar os produtos de modo a torná-los menos agressivos ao
meio ambiente do que os produtos tradicionais, além de desempenhar suas funções com alta qualidade,
consumindo o mínimo possível de recursos naturais. Estes produtos também não podem conter nenhuma
substância que possa ser perigosa ao meio ambiente ou à saúde humana quando utilizados de acordo com
suas funções (BLUE ANGEL, 2004).
Em 1977, a Alemanha foi o primeiro país a implementar um Programa de Rotulagem Ambiental nacional
para produtos – Blue Angel, que serviu de modelo para muitos outros países.
No entanto, os critérios para rotulagem ambiental foram normalizados pela ISO somente no final da década
de 90 por meio da série de normas ISO 14020 relativas à rotulagem ambiental:
ISO 14020 – Environmental labels and declarations – General principles (1998);
ISO 14021 – Environmental labels and declarations – Type II Self-declared environmental claims (1999);
ISO 14024 – Environmental labels and declarations – Type I environmental labelling – Principles and
procedures (1999);
ISO/TR 14025 – Environmental labels and declarations – Type III environmental declarations (2000).
As normas NBR ISO 14020 (2002), NBR ISO 14021 (2004) e NBR ISO 14024 (2004) foram internalizadas
no Brasil pela Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT, mediante trabalho desenvolvido pelo Sub-
Comitê de Rotulagem Ambiental - SC-03 do Comitê Brasileiro de Gestão Ambiental - ABNT/CB-38. A norma
NBR ISO 14025 está sendo internalizada no Brasil pelo mesmo Sub-Comitê.
Portanto, os três tipos de rótulos ambientais que foram normalizados pela ISO são:
1. Rótulo Ambiental Tipo I: conhecido como “Selo Verde”, baseia-se em critérios múltiplos obtidos de
estudos de ACV setoriais e tem por objetivo reduzir os impactos ambientais da categoria de produto
selecionada. O “Selo Verde” consiste em um símbolo impresso no rótulo da embalagem e é concedido
por um programa de terceira parte (normalmente um Órgão de Certificação nacional, que no caso do
Brasil é a ABNT) que fornece uma licença autorizando o uso do rótulo ambiental. Os dados das ACVs
setoriais são utilizados como orientação na definição dos parâmetros de controle das categorias de
produtos;
2. Rótulo Ambiental Tipo II: declarações de cunho ambiental que a empresa divulga no rótulo das
embalagens de seus produtos e que fazem referência ao desempenho ambiental do produto, como por
exemplo “reciclável”, “consumo de energia reduzido”, etc. As autodeclarações foram normalizadas pela
ISO com o objetivo de evitar o uso de expressões indefinidas, tal como “produto verde”.
3. Rótulo Ambiental Tipo III: contém uma série de dados ambientais quantitativos baseados em estudos de
ACV desenvolvidos por terceira parte especificamente para o produto em questão, devendo ser
submetido a uma revisão crítica. Por ser complexo, este rótulo tende a ser mais aplicado em relações
comerciais ao invés de ser divulgado ao público em geral.
Nordic Swan – Países Nórdicos Eco Mark - Japão Green Mark - Taiwan
Tabela 5.2 – Organizações membro do Global Ecolabelling Network e seus respectivos programas de
rotulagem ambiental Tipo I (GEN, 2004b)
Critérios de Produtos
País Organização membro Programa de Rotulagem
certificação certificados
5 Países
Nordic Ecolabelling Board Nordic Swan Label 59 > 3.000
Nórdicos
Federal Environmental Agency
Alemanha Ecolabel Blue Angel 86 3.359
(FEA)
The Australian Environmental
Australian Ecolabel
Austrália Labelling Association Inc 24 280
Program
(AELA)
Associacao Brasileira de Rótulo Ecológico ABNT –
Brasil ---- ----
Normas Tecnicas (ABNT) Qualidade Ambiental
Terra Choice Environmental Environmental Choice
Canadá 160 > 3.000
Service Inc. - TESI Program
Singapore Environment Singapore Green Labeling
Cingapura 35 130
Council - SEC Scheme – SGLS
Korea Environmental Labelling Environmental Labelling
Coréia 102 1.765
Association - KELA Program
Asociacion Espanola de
Espanha Normalizacion y Certificacion AENOR Medio Ambiente 13 275
(AENOR)
EUA Green Seal, Inc. Green Seal 43 493
Clean & Green Foundation,
Filipinas Green Choice Philippines 7 2
Inc.
Supreme Council for Awarding Incluso na
Grécia ASAOS / The Flower ----
the Ecolabel U.E.
Hong Kong Green Council Hong Kong Green Label 41 20
Hong Kong Federation of
Hong Kong Environmental Label
Environmental Protection 16 16
(HKFEP) Certification
(HKFEP) Limited
Central Pollution Control
Índia Ecomark Scheme of India 16 9
Board (CPCB)
Japan Environment
Japão Eco Mark Program 45 > 5.074
Association (JEA)
Ecolabel Commission, Ministry European Ecolabel / The Incluso na
Luxemburgo ----
of Environment Flower U.E.
The New Zealand Ecolabelling Environmental Choice
Nova Zelândia 23 207
Trust - NZET New Zealand
Department for Environment,
European Ecolabel / The Incluso na
Reino Unido Food and Rural ----
Flower U.E.
Affairs(DEFRA)
National Program of
República Ministry of the Environment &
Labelling Environmentally 39 176
Checa Czech Environment Agency
Products
Ministry of Environmental
República da Environmental Label of the
Protection and Physical 40 18
Croácia Republic of Croatia
Planning
Swedish Society for Nature Good Environmental
Suécia 13 786
Conservation (SSNC) Choice
Suécia (base Quality and Ecolabelling
TCO Development 10 2.302
internac.) Program
Thailand Environment Institute
Tailândia Thai Green Label Program 39 162
(TEI)
Environment and Development
Taiwan (R.O.C.) Green Mark 88 2.556
Foundation (EDF)
Program for Development
Ucrânia Living Planet of Ecological Marking in 13 63
Ukraine
União Européia European Commission - DG European Ecolabel / The
23 ----
U.E. ENVIRONMENT (DG3) Flower
Centro de Tecnologia de Embalagem – CETEA / ITAL 43
5. Rotulagem Ambiental
Estes programas pertencem a organizações membro do Global Ecolabelling Network – GEN, que foi
estabelecido com o objetivo de ser um fórum para troca de informações e cooperação entre as
organizações que operam os programas de rotulagem ambiental.
Mais recentemente, o GEN desenvolveu um procedimento para reconhecimento mútuo específico para a
rotulagem ambiental, o qual foi baseado em acordos de reconhecimento mútuo com base bilateral e/ou
regional; uma base comum de critérios de desempenho ambiental para certos produtos; iniciou o
desenvolvimento de critérios harmonizados, etc. (GEN, 2004b; GEN, 2006).
Os programas de rotulagem ambiental consideram critérios ambientais do produto estabelecidos a partir de
indicadores oriundos de considerações sobre o ciclo de vida do produto. A razão para este fato é que há
uma necessidade crescente de assegurar os consumidores, os produtores e os prestadores de serviço, de
que todos os aspectos do desenvolvimento do produto, suprimento, uso e disposição final foram
considerados durante a rotulagem ambiental deste produto (GEN, 2004a).
Os critérios de certificação adotados por estes programas são desenvolvidos de modo a distinguir o
segmento líder de uma categoria de produto do restante da mesma categoria, o que não é nada fácil, mas é
essencial para evitar arbitrariedade e adoção de critérios irrelevantes. Por este motivo, existe uma tendência
em se considerar uma revisão do ciclo de vida total dos produtos na maioria dos programas. Os programas
operam de maneira consistente com as forças e requerimentos do mercado, respondendo às mudanças
tecnológicas e de mercado. Por este motivo, é feita uma revisão periódica (normalmente a cada três anos)
e, quando necessário, atualização das categorias e critérios ambientais com a finalidade de garantir que os
mesmos estão de acordo com os novos desenvolvimentos.
A maioria dos programas de rotulagem ambiental demonstram consistência com os princípios estabelecidos
nas normas ISO 14020 e ISO 14024, o que confere maior legitimidade e solidez a estes programas, uma
vez que consideram, entre outras diretrizes, o ciclo de vida completo do produto para o estabelecimento dos
critérios, os quais visam distinguir produtos preferíveis ambientalmente a partir de diferenças mensuráveis
em termos de impacto ambiental (ISO 14020, 2000; ISO 14024, 1999; GEN, 2004a).
Grupo de trabalho: formado por membros de organizações setoriais para as categorias de produtos,
organizações de consumidores e especialistas de instituições neutras que deliberam sobre o ciclo de
vida dos produtos e decidem sobre a proposta para certificação.
Para avaliar o impacto ambiental destes produtos, o programa Eco Mark considera o ciclo de vida completo
do produto para decidir sobre uma proposta de certificação. Na tabela 5.3 são apresentados os impactos
ambientais que normalmente são considerados neste programa para os diversos produtos. A revisão dos
critérios de certificação é feita a cada 3-5 anos. O período de contrato é válido por um ano, com renovação
automática anual mediante o pagamento de taxa específica.
Portanto, a ACV utilizada como base para os rótulos ambientais tem por objetivo melhorar a rotulagem
ambiental, tornando-a mais transparente e científica.
Tabela 5.3 – Seleção de categorias de impacto ambiental para cada estágio do ciclo de vida do
produto (JAPAN ENVIRONMENT ASSOCIATION, 2006)
Estágio do ciclo de vida do produto
Categoria de impacto Extração de
ambiental Uso / Disposição
recursos Produção Distribuição Reciclagem
consumo final
naturais
Consumo de recursos
naturais
Emissão de gases de
efeito estufa
Emissão de substâncias
que reduzem a camada
de ozônio
Deterioração do
ecossistema
Emissão de poluentes
atmosféricos
Emissão de poluentes
para a água
Emissões para o solo
Uso / emissão de
materiais perigosos
Outros impactos
ambientais
Referências Bibliográficas
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JAPAN ENVIRONMENT ASSOCIATION - JEA. Guidelines for Eco Mark program implementation. Tokyo: Eco Mark
Office, 2006. Disponível em: <http://www.ecomark.jp/english/youkou.html>. Acesso em: 14 set. 2006.
6.1 Introdução
Após 1992, quando ocorreu a ECO-92 no Rio de Janeiro, iniciou-se a construção da Agenda 21 Global com
1
a formatação de ferramentas práticas para se buscar o Desenvolvimento Sustentável . As normas da série
ISO 14000 focadas em produtos, que têm como base o Ciclo de Vida do produto (bens e serviços), são
algumas destas ferramentas práticas para se atingir o desenvolvimento sustentável. São metodologias
transparentes, compreensíveis, operacionais e aplicáveis em rotinas de tomada de decisão envolvendo os
pilares da AGENDA 21 (2002): ecológico (desempenho ambiental do produto – Avaliação do Ciclo de Vida,
Rotulagem Ambiental, etc.), econômico (Análise de Custo do Ciclo de Vida – ACCV, etc.), social (múltiplos
grupos interdisciplinares tomadores de decisão, etc.), entre outros.
2
Independente das críticas que possa haver sobre o tema desenvolvimento sustentável , ferramentas como
as normas da série ISO 14000 têm facilitado a implantação de políticas para incentivo da melhoria da
qualidade de produto com menores impactos ambientais na sua produção e consumo.
A implantação e o desenvolvimento das normas ISO 9000 está estreitamente ligada à globalização e ao
aumento das transações internacionais, como se pode verificar pelas definições de qualidade apresentadas
no quadro 6.1.
1 Desenvolvimento Sustentável é o desenvolvimento que satisfaz as necessidades e aspirações da geração atual, sem comprometer a
capacidade das gerações futuras de satisfazer suas próprias necessidades e aspirações (WORLD COMMISSION ENVIRONMENT
AND DEVELOPMENT, 1987).
2 Numa discussão bastante compreensível de que se deve aprofundar o conceito dentro de uma visão holística em que realmente
fazemos parte da natureza e devemos preservá-la, etc.
Centro de Tecnologia de Embalagem – CETEA / ITAL 47
6. Análise de Custo do Ciclo de Vida (ACCV): Metodologia e Aplicação em Eficiência Energética
A ABNT, entre tantas outras atividades, tem trabalhado ativamente nas normas ISO 14000 relacionadas ao
produto, que se referem à Avaliação do Ciclo de Vida (ACV – série de normas NBR ISO 14040: 2001),
Rotulagem Ambiental (série de normas NBR ISO 14020: 2002) e Design for Environment (desenvolvimento
de produto com menor impacto ambiental – relatório técnico ISO/TR 14062: 2002). Estas normas dão
suporte para a avaliação da relação do produto com o meio ambiente desde a extração dos recursos
naturais consumidos até a disposição final dos resíduos gerados.
A ABNT tem um programa, conhecido como Programa Brasileiro de Qualidade Ambiental, que já tem um
selo básico (figura 6.1a) que pretende apoiar os diversos produtos/setores que apresentarem interesse na
certificação deste programa de qualidade ambiental brasileiro, como o programa de certificação florestal
(figura 6.1b).
CERFLOR
(a) “selo verde” - básico (b) selo CERFLOR
Programas de Rotulagem Ambiental são fundamentais para o desenvolvimento sustentável, pois com eles
se consegue difundir aos consumidores informações resumidas e confiáveis de como se pode contribuir
para o crescimento econômico com menor agressão ao meio ambiente.
O objetivo deste capítulo é discutir a metodologia de Análise de Custo do Ciclo de Vida – ACCV e sua
aplicação, como ferramenta para o estabelecimento de padrões de eficiência energética, complementares
aos rótulos atualmente voluntários já existentes para refrigeradores populares brasileiros.
3 Um exemplo de externalidade poderia ser “emissões de dióxido de carbono (CO 2)” que poderia ser contabilizada como “taxas
antecipadas de CO2” e daí “internalizadas na ACCV.
48 Centro de Tecnologia de Embalagem – CETEA / ITAL
Avaliação do Ciclo de Vida como Instrumento de Gestão
A fronteira do sistema econômico do ciclo de vida de um produto engloba desde a extração das matérias-
primas (recursos como, por exemplo, petróleo, madeira, cana-de-açúcar etc.) até o destino final do produto
após seu uso. Avalia-se, inclusive, a contribuição em termos de gestão de resíduos, de todas as etapas da
cadeia de suprimentos, do consumo e do aproveitamento no fim-da-vida do produto, com os denominados
atores de fim-da-vida como, por exemplo, processos de reciclagem pós-consumo (mecânica, energética,
etc.), reutilização, entre outros.
Uma vez que a metodologia de ACCV exige uma praticidade, passa-se a “internalizar” algumas
externalidades (possíveis e importantes) como, por exemplo, subsídios ao uso de energia renovável, que
poderiam ser “antecipados” nos processos de cálculos econômicos para apoiar as tomadas de decisão.
Estas deixam, então, de ser externalidades, uma vez que passam a ser custos “contabilizados” (figura 6.3),
sempre seguindo os critérios científicos da ISO 14000.
Além desta “internalização” das externalidades de possível “contabilização” (Ci e Bi das figuras 6.4, 6.5 e
6.6), é possível fazer uma análise de ACCV a partir de diferentes perspectivas, como, por exemplo,
perspectiva do fabricante de determinado equipamento/máquina (figura 6.4), perspectiva do fabricante e
seus fornecedores (cadeia de suprimentos - figura 6.5), perspectiva do consumidor (figura 6.6), etc.
Figura 6.3 – Seleção (a) e Internalização (b) das externalidades (QUEIROZ, 2004)
O suporte aos órgãos governamentais (figura 6.7) passa a ser uma das maiores aplicações da ACCV, uma
vez que possibilitam analisar os diversos atores envolvidos e/ou as diversas cadeias/setores, como, por
exemplo, o uso de resíduos de alguns clusters industriais (por exemplo, cinzas das termelétricas) por outros
setores (por exemplo, construção civil), etc.
O governo deve, então, estar preparado, com pessoal capacitado nas mais diversas áreas de aplicação
destes conceitos de ciclo de vida (como, por exemplo, eletrodomésticos, construção civil, produtos para
exportação e substituição de importações, etc.), pois, este será um fator cada vez mais importante num
mundo globalizado.
Além desta importância como ferramenta de suporte às tomadas de decisões de investimentos e postura
política internacional, o conceito de ciclo de vida possibilita um maior conhecimento sobre os produtos,
evitando, por exemplo, que se criem leis isoladas sem se conhecer o impacto total ao longo do ciclo de vida
dos diversos produtos, que em muitos casos têm seus maiores impactos durante o uso de combustíveis
como pode ser exemplificado pelo setor automobilístico, de eletrodomésticos, etc., ao invés de, por
exemplo, no destino dos seus resíduos.
Quadro 6.2 – Cálculo do CCV e do período de retorno do investimento (WIEL; MCMAHON, 2001)
CCV:
N
Ot
CCV = P +
t=1 (1+r) t
P = preço de venda ao consumidor ($);
O = custos operacionais (eletricidade, etc.);
r = taxa de desconto real para o consumidor;
N = tempo de vida útil (anos);
t = tempo (anos) desde a aquisição do equipamento (eletrodoméstico).
Se, os custos operacionais são constantes no tempo:
CCV = P + PWF * O
Sendo que o PWF (fator de atualização presente) é:
PWF =
N
1
=
1
1 -
1 L
M O
P
t=1 (1+r) t
r N
(1+r)N Q
Payback period (PAY):
PAY
P + O
1
t = 0
e PAY é o momento onde se encontra a inversão do sinal da equação, ou seja, é onde o investimento (no
preço de compra) se iguala às economias operacionais (conta de energia elétrica):
P
PAY = -
O
Figura 6.8 – Estudo do GEA utilizando metodologia estatística e ACCV (WIEL; MCMAHON, 2001)
Tomando como exemplo um volume ajustado de aproximadamente 300 litros e 430 kWh/ano, os resultados
mostrados na figura 6.8 indicam que para a metodologia de ACCV (padrão de longo período) resulta em um
consumo anual de aproximadamente 260 kWh/ano, ao passo que para o procedimento estatístico este valor
é de cerca de 390 kWh/ano, para a curva de 10% de economia e de 350 kWh/ano, para a curva de 15% de
aconomia. Esta diferença deve-se ao melhor conhecimento do setor proporcionado pela metodologia de
ACCV em comparação à metodologia estatística, uma vez que a ACCV deverá envolver as indústrias
produtoras (inclusive com o apoio de outras legislações que proporcionem o acesso a dados técnicos, de
custos, etc.) permitindo uma maior competição pela qualidade, inclusive ambiental.
Estes padrões de eficiência energética mínima são complementados por programas de etiquetagem
energética, com selos de eficiência energética (figura 6.9.a) e de rotulagem ambiental, com “selo verde”
(figura 6.9.b).
Os “selos verdes” (figura 6.9b) são logos para produtos que o programa de rotulagem ambiental julga ser
menos agressivo ao meio ambiente que os produtos comparáveis, baseado num conjunto específico de
critérios (ACV setorial, não necessariamente completa). Estes programas de rotulagem ambiental
geralmente seguem 3 passos: definição da categoria do produto, desenvolvimento do critério do prêmio e
avaliação do produto. Os “selos verdes” são complexos e requerem a consideração de muitos fatores,
incluindo metas de políticas ambientais, atenção do consumidor com as questões ambientais (educação e
cultura do consumo sustentável), posição no comércio, efeitos na importação e exportação e efeitos
econômicos na indústria doméstica. Na figura 6.10 tem-se uma ilustração dos 14 grupos de produtos com
rótulo ambiental para equipar uma casa da Comunidade Européia (EU, 2002).
Calçado
Tintas e vernizes
Têxteis
Lâmpadas
Papel
absorvente
Colchões
Computadores
pessoais
Refrigeradores
Corretivos
agrícolas
Detergentes
para louça
Detergentes
para roupa
Figura 6.10 – Os 14 grupos de produtos com rótulo ambiental para uma casa européia (EU, 2002)
Verifica-se que na Comunidade Européia o conceito de ciclo de vida está incorporado na metodologia de
padrões de eficiência energética e na metodologia de rotulagem ambiental, conforme ilustra a figura 6.11
para geladeiras lá comercializadas.
Um rótulo ambiental vai além do selo de eficiência energética, pois além do produto, por exemplo geladeira,
ter que ser mais eficiente energeticamente – rótulo de eficiência energética “A” – e não fazer muito “barulho”
este ainda tem que ter outros atributos, tais como melhor eficiência ambiental na etapa de fabricação e na
disposição final dos resíduos no fim da vida do produto (figura 6.11).
O gráfico da figura 6.12 ilustra como a ACCV é uma ferramenta de auxílio à tomada de decisão e um ponto
base para a negociação entre os diversos setores. Por exemplo, no estudo de ACCV norte-americano,
desenvolvido em 1989 para estipular um padrão para 1993, mesmo com uma proposta de eficiência
56 Centro de Tecnologia de Embalagem – CETEA / ITAL
Avaliação do Ciclo de Vida como Instrumento de Gestão
energética mínima “MEPS” (minimum energy performance standards – ponto 8 da figura 6.12) bastante
interessante para os consumidores residenciais que teriam o menor custo do ciclo de vida, o governo,
negociando com o setor industrial e entendendo suas dificuldades, propôs um “padrão em 1993” um pouco
menos restritivo para o ano projetado. Desta forma, em 1989 o governo norte-americano fez um estudo de
ACCV que mostrou que os refrigeradores poderiam ser melhorados a tal ponto que o consumo de
aproximadamente 950 kWh/ano poderia passar para cerca de 580 kWh/ano (MEPS). A figura 6.12 ilustra,
através da curva superior, que o MEPS foi obtido quando oito alterações técnicas (inovações tecnológicas
indicadas por números e pontos sobre a curva) foram embutidas no refrigerador.
Em 1995 foi desenvolvido um novo projeto de ACCV nos EUA que já partiu de um consumo médio anual (da
classe de refrigerador analisada) de aproximadamente 700 kWh/ano (padrão definido para 1993). Esta nova
etapa do processo de ACCV e padronização da eficiência energética dos refrigeradores norte-americanos
sugeria, então, um MEPS para 2001 de aproximadamente 450 kWh/ano. Entretanto, em nova negociação
com os setores envolvidos (fabricantes, consumidores, etc.) estipulou-se um padrão para 2001 de cerca de
480 kWh/ano para aquela classe de refrigeradores analisados.
A figura 6.12 ilustra o gráfico final de ACCV com os CCVs de cada alternativa analisada. A ACCV pode ser
definida como uma análise sistemática do processo de avaliação de várias alternativas em andamento
(várias inovações dando origem a vários CCVs) e de ações cujo objetivo é de selecionar o melhor caminho
para empregar os recursos disponíveis (FABRYCKY; BLANCHARD, 1991). O gráfico da figura 6.12 ilustra
bem essa definição, pois, com este gráfico (CCV x consumo de energia em kWh/ano) ilustram-se todas as
inovações analisadas em um produto (por exemplo, geladeira) entendendo-se que o refrigerador de
referência (caso-base da figura 6.12) seria o do mercado norte-americano em 1989. Já no ponto 1 analisa-
se a implantação da inovação tecnológica 1 (por exemplo, um compressor padrão comum no mercado
sendo substituído por um compressor mais eficiente, conseguindo assim, um ganho de eficiência no ciclo de
refrigeração resultando em economia de energia). Mas, pode ocorrer uma pergunta: se for inserido um
componente (por exemplo, compressor mais eficiente) mais caro no refrigerador, o seu valor final irá
aumentar? Isto provavelmente é verdadeiro, contudo, fazendo a ACCV chega-se ao resultado que a
economia de energia obtida pelo consumidor com a inovação (devido à economia de energia ao longo do
ciclo de vida do refrigerador) é superior ao custo devido à inserção do compressor mais eficiente. Desta
forma, o CCV do produto reduz compensando o aumento do preço de compra da geladeira. Da mesma
forma, no ponto 2 onde poderia ocorrer, por exemplo, além da inserção da inovação tecnológica 1, também
a inserção da inovação tecnológica 2 (por exemplo, a diminuição da perda de calor pela vedação devido a
um novo material ou formato da gaxeta da porta). A junção destas duas inovações possibilitou um ganho
ainda maior de eficiência, compensando novamente o aumento de preço ocasionado por elas. Mas, quando
se analisa o ponto 9 nota-se que houve um ganho de eficiência superior ao anterior, contudo, desta vez o
CCV subiu. Isto se dá, por exemplo, porque ao se acumular algumas das inovações anteriores com a
inovação 9 (por exemplo, um aumento muito grande da espessura do isolamento nas paredes do
refrigerador) ocasionou em um custo de inovação superior à economia obtida, embora ainda inferior ao
caso-base. Mesmo que o CCV do ponto 9 tivesse sido superior ao do caso-base, dever-se-ia analisar se
esse aumento do CCV é recuperado durante a vida útil do equipamento (por exemplo, 16 anos de vida útil
do refrigerador). Se isso for verdadeiro, o projeto ainda poderia ser viabilizado. Caso isso não ocorresse,
dever-se-ia pesquisar novas alternativas (por exemplo, pesquisar novos materiais mais baratos e tão
eficientes quanto os seus antecessores) para a obtenção do nível desejado de economia de energia, etc.
Também nos EUA, os padrões de eficiência energética mínima são complementados por programas de
rotulagem, principalmente selos de eficiência energética (comparativos de consumo, conforme ilustra a
figura 6.13a) e endorsement - que, no caso das geladeiras, indicam que são no mínimo 15% mais eficientes
que a legislação/padrão obrigatória (figura 6.13b).
Figura 6.13 – Selos de eficiência energética dos EUA (WIEL; MCMAHON, 2001; ENERGYSTAR, 2005)
Observa-se que o selo de eficiência energética é por categoria, baseado no modelo europeu (figura 6.14a)
e, o selo endorsement de eficiência energética PROCEL (figura 6.14b) é dado a todos os equipamentos
(geladeiras, freezers etc.) que participam do programa brasileiro de etiquetagem (PBE), do PROCEL -
Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (2004) e atingem a categoria “A”. Observa-se
também que o PBE do PROCEL está vinculado à Eletrobrás (MME - Ministério de Minas e Energia), com
apoio do INMETRO, que apresenta uma conotação mais “econômica” do que “ambiental” (como no caso
dos EUA), ainda que isto contribua, em muito, com a diminuição dos impactos ambientais.
Referências Bibliográficas
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ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO 14020: rótulos e declarações ambientais: princípios
gerais. Rio de Janeiro, 2002. 5 p.
_____. NBR ISO 14040: gestão ambiental: avaliação do ciclo de vida, princípios e estrutura. Rio de Janeiro, 2001. 10 p.
WIEL, S.; MCMAHON, J. E. Energy-efficiency labels and standards: A Guidebook for appliances, equipment, and
lighting. E nd ed. Collaborative Labeling and Appliance Standards Program (CLASP), February 2005. 340 p. Disponível
em: http://repositories.cdlib.org/cgi/viewcontent.cgi?article=3955&context=lbnl Acesso em: 10 maio 2007.
ECOLABEL. The European Ecological Label for refrigerators. Disponível em:
http://europa.eu.int/comm/environment/ecolabel/producers/pg_refrigerators.htm, acesso em: 14 jan. 2005.
ENERGYSTAR. Energy Star. Disponível em: http://www.energystar.gov. Acesso em: 29 jun. 2005.
EU. O Rótulo Ecológico Europeu em Síntese. União Européia. Disponível em: http://europa.eu.int/ecolabel. Acesso:
ago. 2002.
FABRYCKY, W. J.; BLANCHARD, B. S. Life-cycle cost and economic analysis, New Jersey: Prentice-Hall Inc., 1991.
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GARCIA, E. E. C. ; QUEIROZ, G. C. Rotulagem e cultura ambiental. In: GERMER, S. P. M., VIALTA, A. , MOURAD A. L.
et al. A indústria de alimentos e o meio ambiente. Campinas: ITAL, 2002. p. 101-112.
INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION. ISO/TR 14062: Environmental management: integrating
environmental aspects into product design and development. Geneve, 2002. 24 p.
BRASIL. Lei 10.295 de 17 de outubro de 2001. Dispõe sobre a Política Nacional de Conservação e Uso Racional de
Energia e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 18 out. 2001.
Seção I-E.
PROCEL. Programa Nacional de Conservação de Energia (PROCEL/Eletrobrás). Disponível em:
http://www.eletrobras.gov.br/procel/1.htm, 2004, acesso em 04 mar.2004.
QUEIROZ, G.C., Análise do Custo do Ciclo de Vida (ACCV). In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL SOBRE APLICAÇÕES
DA AVALIAÇÃO DO CICLO DE VIDA. Campinas: CETEA/ITAL, 2004. CD-ROM.
QUEIROZ, G.C. Uma metodologia para tomada de decisão combinando princípios do PIR (Planejamento Integrado de
Recursos Energéticos) e critérios de estudos de impactos ambientais. 1999. 219f Tese (Doutorado em Planejamento de
Sistemas Energéticos). UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, 1999.
QUEIROZ, G. C.; JANNUZZI, G. M.; VENDRUSCULO, et.al. A life-cycle cost analysis (LCCA) for setting energy-
efficiency standards in Brazil: the case of residential refrigerators. In: ACEEE, 2003, New York. Proceedings... New
York, 2003.
WORLD COMMISSION ENVIRONMENT AND DEVELOPMENT. Our common future: the brundtland report. Oxford:
Oxford University Press, 1987.
7.1 Introdução
Políticas Públicas relacionadas com o desenvolvimento sustentável são indispensáveis para um país que
planeja um Desenvolvimento Integrado “Econômico, Social, Ambiental, Político e Institucional”. O
Gerenciamento Integrado do Resíduo Sólido - GIRS visando a revalorização do resíduo pós-consumo deve
ser apoiado em todas as suas iniciativas. A rotulagem ambiental, por exemplo, deve ser uma política pública
coordenada por uma forte Instituição Governamental para evitar, por exemplo, um rótulo de “embalagem
biodegradável” quando este não for apoiado por um programa de revalorização via “compostagem” do
resíduo de embalagem pós-consumo. Programas federais e boas políticas públicas, com metodologias
baseadas em conceitos como análise de produtos e serviços por ACV, como de gerenciamento integrado de
resíduo sólido, educação ambiental, consumo sustentável, rotulagem ambiental, integração de aspectos
ambientais no desenvolvimento de produto (Ecodesign ou Design for Environment), etc., são ferramentas
fundamentais para guiar o desenvolvimento sustentável de uma nação.
Desenvolvimento sustentável é definido como o “desenvolvimento que satisfaz as necessidades e
aspirações da geração atual, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazer suas
próprias necessidades” (WORLD COMMISSION ENVIRONMENT AND DEVELOPMENT, 1987).
Em se falando de GIRS é sempre bom relembrar a definição de embalagem: “todo produto feito de material
de qualquer natureza que é usado para conter, proteger, transportar, distribuir e apresentar os bens, desde
os bens materiais naturais até os bens processados, do produtor ao usuário ou consumidor...” Ou seja, a
embalagem tem uma função social e econômica vital! (OFFICIAL JOURNAL OF THE EUROPEAN
COMMUNITIES, 1994). Por outro lado, o resíduo pós-consumo deve ser gerenciado de forma a otimizar o
uso de recursos naturais, reduzindo o consumo e a disposição de resíduos ao mesmo tempo que
minimizando as emissões para a água e ar.
A gestão com a correta destinação do resíduo sólido interessa aos estudos de ACV, pois constitui-se em
uma das etapas do ciclo de vida de produtos de consumo. Por outro lado, a ACV é uma ferramenta
interessante para gerar informações para orientar o gerenciamento integrado do resíduo sólido (GIRS),
tanto dos resíduos orgânicos úmidos (restos de alimentos) quanto dos resíduos secos (materiais,
embalagens, etc.).
A partir destes conceitos de embalagem e desenvolvimento sustentável, a questão central que se coloca
para discussão neste capítulo é o gerenciamento integrado do resíduo de embalagem pós-consumo sob a
óptica do desenvolvimento sustentável em contraponto a alguns conceitos mono-criteriosos/orientados do
que seria uma embalagem “ambientalmente adequada”, ou ainda, preconceitos de um “marketing verde”
sem fundamento técnico, a exemplo da super-valorização de materiais biodegradáveis como alternativa de
gestão.
O aproveitamento indevido da rotulagem ambiental, através de um “marketing verde” ilusório muitas vezes
causa danos irreparáveis à educação/cultura ambiental, como é o caso da rotulagem de algumas
Centro de Tecnologia de Embalagem – CETEA / ITAL 61
7. ACV como Ferramenta do Gerenciamento Integrado do Resíduo Sólido (GIRS)
1
embalagens como “biodegradáveis” confundindo o consumidor, fazendo-o pensar que esta seria uma
solução “fácil e perfeita” para o gerenciamento do resíduo de embalagem e que esta poderia ser descartada
em qualquer lugar, pois seu resíduo desapareceria do meio ambiente “como por mágica”.
A propaganda de que o uso de materiais degradáveis e/ou biodegradáveis é uma solução para a redução
do resíduo sólido também pode ter efeito negativo sobre a educação ambiental da população, quando induz
o consumidor a pensar que pode jogar o “lixo” em qualquer lugar, pois ele desaparecerá.
É importante ter ciência de que um material biodegradável não “desaparece” do meio ambiente (o que
muitas vezes a rotulagem faz o consumidor pensar), mas é transformado em, por exemplo, dióxido de
carbono (CO2) ou metano (CH4) contribuindo para problemas como o efeito estufa. Na natureza “nada se
perde, tudo se transforma”, ou seja, o que é um resíduo sólido pode transformar-se em emissões para o ar
e/ou para a água. A “desculpa” que se coloca de que as embalagens plásticas contribuem para a maior
impermeabilização do solo também deve ser bem analisada, mesmo porque uma das grandes diferenças
entre os aterros sanitários e os “lixões” (que diga-se de passagem, não deveriam nem existir) é a contenção
do resíduo sólido para que este (e seus sub-produtos como o chorume) não contaminem o meio ambiente
(lençol freático etc.).
Existem normas e métodos de ensaio para avaliar o potencial de, por exemplo, “biodegradação em meio
2
aquoso ”, para produtos como detergente, amaciante, xampú, etc., que certamente vão ser descartados nas
nossas pias domésticas e deverão ser submetidos ao tratamento biológico de esgoto. Estes métodos de
ensaio não podem ser confundidos com os das normas de compostagem num processo de revalorização de
um resíduo sólido através da desintegração da embalagem durante o tratamento biológico, a biodegradação
(com produção de CO2, CH4) etc. até o controle da qualidade do adubo composto resultante (EN 13432,
2000). Logo, soluções para o GIRS são diferentes das soluções de emissões para a água.
A figura 7.1 exemplifica o ciclo de vida de produtos alimentícios e suas embalagens, dando uma idéia do
conceito que deve embasar o GIRS. O objetivo é a otimização constante com base na ACV dos resíduos,
ou seja, a redução da disposição de resíduos (em aterros sanitários) ao mesmo tempo da minimização de
emissões para a água e ar, buscando transformar o resíduo em produto em outros processos produtivos, ou
seja, revalorizando os resíduos através da reciclagem, etc.
1 Mesmo que um país/região possua um programa de compostagem para revalorização dos resíduos biodegradáveis, ainda é
necessário pensar na “eficiência agrícola” para o uso do adubo composto resultante (produto final da revalorização via
compostagem). Em alguns países a compostagem funciona apenas como uma inertização do resíduo biodegradável, transformando,
por exemplo, restos de alimentos em resíduos denominados bio-estáveis, para, então, destiná-los a um aterro.
2 Existem normas internacionais para esta determinação, como por exemplo, a ISO 14851 (2003) e ISO 14852 (1999). Não se pode
comparar um resíduo de embalagem pós-consumo com detergentes, amaciantes, shampoo, etc. que certamente vão ser descartados
em pias e ralos domésticos e deverão ser submetidos ao tratamento de esgoto, logo, a biodegradação em meio aquoso é bastante
importante e, por este motivo, existem ensaios normalizados que avaliam esta biodegradabilidade. Ressalta-se que, mesmo um
material biodegradável em meio aquoso, quando descartado diretamente nos rios, irá contribuir para o aumento da demanda
bioquímica de oxigênio (DBO) do meio, o que pode afetar o equilíbrio ecológico desse ambiente.
62 Centro de Tecnologia de Embalagem – CETEA / ITAL
Avaliação do Ciclo de Vida como Instrumento de Gestão
Conforme ilustra a figura 7.1, a revalorização do resíduo de embalagem (EN 13427, 2004) deve apoiar
simultaneamente todas as suas iniciativas como Redução (EN 13428, 2004), Reuso (reutilização - EN
13429, 2004), Reciclagem (EN 13430, 2004), Recuperação Energética (EN 13431, 2004) e Compostagem
(EN 13432, 2000).
A discussão que importa é a da necessidade de políticas públicas voltadas para o desenvolvimento
sustentável como, por exemplo, programas de rotulagem ambiental, de gerenciamento integrado do resíduo
sólido, de consumo sustentável, de educação ambiental, de uso racional e otimizado dos recursos naturais,
de minimização das emissões para o solo, água e ar, etc., que são ferramentas fundamentais para um país
que planeja de forma holística um desenvolvimento integrado “econômico, social, ambiental e institucional”,
re-valorizando seus resíduos e gerando tecnologia, emprego e renda na cadeia de revalorização como, por
exemplo, de reciclagem.
O GIRS voltado para a revalorização do resíduo de embalagem deve apoiar simultaneamente todas as suas
iniciativas, tais como a redução, a reutilização, a reciclagem mecânica, química e energética. Não basta
trabalhar apenas pontualmente em alternativas da disposição final dos resíduos das embalagens nos
aterros sanitários, como é o caso da “propaganda” pelo uso dos materiais biodegradáveis, pois estes podem
deixar de ser um problema de quantidade de resíduo sólido, mas sua degradação reverte em emissões para
o ar (CO2 e CH4) e para água, também importantes para o meio ambiente, contribuindo para outros
impactos ambientais como para o aquecimento global (mudanças climáticas), redução de oxigênio
disponível em rios, contaminação de lençóis freáticos, etc.
Com outros materiais, como papel, aço, alumínio, vidro, etc. o conceito é o mesmo, ou seja, por que tirar
continuamente recursos da natureza, e com muita energia transformá-los em produtos de consumo, para
depois deixá-los degradar ou enterrá-los sem reutilizá-los ou reciclá-los?
Além disso, os materiais degradáveis podem perder propriedades de proteção ao produto acondicionado
durante seu uso e mesmo que os materiais das embalagens sejam degradáveis ou biodegradáveis, ainda
Centro de Tecnologia de Embalagem – CETEA / ITAL 63
7. ACV como Ferramenta do Gerenciamento Integrado do Resíduo Sólido (GIRS)
podem deixar resíduos como tintas, pigmentos, aditivos, vernizes, oligômeros, cargas, nanopartículas, etc.,
resíduos estes de tamanho reduzido e que podem interferir no metabolismo animal e vegetal presentes no
meio ambiente onde é deixado degradar. O mais importante é ter programas como o de separação e coleta
seletiva para evitar que materiais com potencial de revalorização cheguem aos aterros para disposição final
ou que sejam simplesmente descartados no meio ambiente.
Os resíduos orgânicos biodegradáveis, a exemplo dos restos de alimentos, deveriam ser aproveitados via
compostagem, opção de gerenciamento de resíduo sólido pós-consumo, infelizmente, ainda pouco utilizada
no Brasil. Mesmo biodegradável, o resíduo requer coleta e destinação adequadas, preferencialmente via
reciclagem mecânica a exemplo das caixas de papelão ondulado, etc. Outro exemplo de resíduo
biodegradável para o qual a biodegradação não é solução é o bagaço da cana-de-açúcar, cuja grande
viabilidade econômica de aproveitamento é via recuperação energética. É importante levar em conta a
viabilidade econômica dos processos de revalorização de resíduos. Não basta ser biodegradável, as formas
de revalorização via reciclagem orgânica aceitas internacionalmente para resíduos orgânicos em geral, são
3 4
através da compostagem e biodegradação via biogaseificação ou biometanização , que é uma das formas
de aproveitamento energético do metano (CH4).
Outra iniciativa num processo de desenvolvimento de embalagem é a da “prevenção”, evitando substâncias
que dificultam o gerenciamento integrado de resíduo sólido de embalagem, uma vez que, após a
revalorização dos materiais, ainda podem restar resíduos como cinzas das tintas/pigmentos, da
recuperação energética via incineração, que requerem cuidados na disposição final.
Vale ressaltar que o uso indevido de termos de rotulagem ambiental e de “marketing verde” iludindo o
consumidor com, por exemplo, a denominação de biodegradável para alguma embalagem que ao ser
analisada num processo de compostagem não seja biodegradada pelos microorganismos naturais do solo,
deveria ser evitado, pois pode afetar todo um investimento de décadas em educação ambiental, além de
ferir o Código de Defesa do Consumidor que assegura à este o direito à informação (além da embalagem
dever ser realmente compostável, deve-se saber o real uso desta como adubo composto após o processo
industrial de revalorização). Por isto, os países devem agilizar suas normalizações para definir seus
requisitos de avaliação para sustentarem seus programas de rotulagem.
Uma rotulagem ambiental ilusória pode fazer perder todo o investimento em cultura e educação ambiental
para o consumo sustentável e os avanços conseguidos nos últimos anos com programas como o de
separação de resíduo seco e úmido nas residências brasileiras e de coleta seletiva com recuperação dos
materiais, etc.
Finalmente, é importante salientar que o fato de um material plástico ser biodegradável não deve ser
confundido com o fato de ser um “biopolímero”, que são polímeros fabricados a partir de fontes renováveis
(milho, cana-de-açúcar etc.) e têm importância estratégica para o futuro, principalmente quando utilizam
energia renovável em todo seu ciclo de vida.
Um GIRS sustentável deve ter por objetivo recuperar o valor dos materiais descartados, ocupando menos
espaço e com o menor impacto possível sobre o meio ambiente.
A sustentabilidade de um sistema de GIRS deve ser efetiva:
Ambientalmente: o princípio fundamental é a minimização da própria geração de resíduos. Todos os
parâmetros ambientais devem ser reduzidos (consumo de materiais e de energia e emissões para o ar,
água e solo);
Economicamente: o custo do sistema deve ser viável e distribuído entre todos os setores da sociedade
que se beneficiam (consumidores, comércio, indústria, instituições e governo);
Socialmente: o sistema deve atender às necessidades da comunidade local e refletir seus valores e
prioridades.
Nenhum tratamento individual pode dar conta de todos os materiais presentes no resíduo sólido. São
necessários um sistema de coleta adequada e a aplicação de uma série de opções de tratamentos incluindo
3 Reciclagem orgânica aeróbia – padrão internacional ISO 14855 (1999); padrão britânico e europeu BS EN 14045 (2003) e 14046
(2003); padrão europeu EN 13432 (2000) seguindo a Diretiva da Comunidade Européia 94/62/EC, 1994 (OFFICIAL JOURNAL OF
THE EUROPEAN COMMUNITIES, 1994); padrão norte-americano ASTM D 6400 (2004).
4 Reciclagem orgânica anaeróbia - padrão europeu EN 13432 (2000) seguindo a Diretiva da Comunidade Européia 94/62/EC
(OFFICIAL JOURNAL OF THE EUROPEAN COMMUNITIES, 1994).
64 Centro de Tecnologia de Embalagem – CETEA / ITAL
Avaliação do Ciclo de Vida como Instrumento de Gestão
reciclagem, tratamento biológico (compostagem), incineração com recuperação de energia e aterro sanitário
(que é diferente dos aterros controlados que são, até onde se diz, “lixões” cobertos por terra).
O impacto sobre o meio ambiente de todo o sistema de gestão pode ser reduzido por meio da seleção das
opções mais adequadas de destinação para cada fração do resíduo sólido. Esta abordagem é conhecida
como sistema de gerenciamento integrado, que considera a aplicação simultânea das seguintes opções,
visando a otimização do sistema:
Recuperação de materiais que possam ser reciclados mecanicamente;
Tratamento biológico da fração orgânica, ou seja, compostagem;
Incineração com recuperação de energia;
Aterro do resíduo inerte (quando não viável de destinação aos processos de revalorização).
5 A captação de gases de aterros: sua queima reduz a emissão de metano (transformando o CH 4 em CO2 que tem um potencial de
aquecimento global - GWP de aproximadamente 23 vezes menor que o do metano) e de outros compostos orgânicos voláteis e,
além disso, pode-se aproveitar o valor energético desta queima.
Centro de Tecnologia de Embalagem – CETEA / ITAL 65
7. ACV como Ferramenta do Gerenciamento Integrado do Resíduo Sólido (GIRS)
Num estudo de ACV do resíduo sólido são avaliadas as atividades de coleta, transporte, aterro, segregação,
triagem, reciclagem, tratamento biológico e incineração com recuperação de energia, que têm impactos
ambientais, bem como benefícios. A partir daí, criam-se diferentes cenários, para que, numa comparação
entre eles, seja possível escolher o conjunto de atividades que produza o menor impacto ambiental possível
e com o menor custo.
A ACV tem sido usada para auxiliar o GIRS fornecendo informações e orientando as decisões na busca de
otimização do sistema. Dada uma quantidade de resíduo coletada (unidade funcional) e sua composição
média estimada, é possível:
conhecer o perfil ambiental do sistema de gestão em prática;
simular situações de divisão dos fluxos para os diversos tratamentos e justificar investimentos;
selecionar os materiais que devem ser separados e destinados à:
reciclagem mecânica para fabricação de novos produtos;
reciclagem química para recuperação de matérias-primas;
reciclagem energética para reaproveitamento de energia: geração de calor ou de energia elétrica;
contabilizar os ganhos da aplicação da compostagem aos resíduos orgânicos: o composto orgânico
pode ser aproveitado na agricultura, reduzindo o volume de resíduo a ser disposto em aterros, etc.
Logo, a ACV é uma ferramenta de:
planejamento, pois permite avaliar uma série de cenários que podem ser investigados e comparados;
conscientização ambiental, pois gera informações que permitem esclarecer a cadeia produtiva, bem
como a sociedade quanto aos impactos potenciais dos resíduos gerados;
geração de dados numéricos que retratam as vantagens e limitações de cada opção de tratamento de
resíduo sólido.
A ACV gera dados para orientar o GIRS, listando o consumo de energia e de emissões para o ar, água e
solo e prevendo a quantidade de produtos utilizáveis que podem ser gerados a partir do resíduo sólido
como, por exemplo, composto orgânico, materiais secundários para reciclagem mecânica e energia
utilizável (figura 7.2).
TRATAMENTO RECICLAGEM
RSU BIOLÓGICO MECÂNICA
Emissões
Compostagem para o ar
Produção
Energia
de biogás
Emissões
COLETA para a água
E SELEÇÃO
Outros Queima de
materiais materiais Uso
com valor energético
dos gases do
Material
calorífico Incineração sem
recuperação de aterro residual
R$ TRATAMENTO
energia Queima para aterro
de gases ATERRO
TÉRMICO
Figura 7.2 – Visão do GIRS segundo a técnica de ACV (WHITE; FRANKE; HINDLE, 1995)
Referências Bibliográficas
ASTM INTERNATIONAL. D 6400-04: especificação padrão para plásticos compostáveis. Philadelphia, 2004. 3 p.
BRITISH STANDARD - BS EN 14045: packaging. evaluation of the disintegration of packaging materials in practical
oriented tests under defined composting conditions . United Kindon, 2003. 18 p.
_____. BS EN 14046: packaging. evaluation of the ultimate aerobic biodegradability and disintegration of packaging
materials under controlled composting conditions. Method by analysis of released carbon dioxide. United Kindon, 2003.
26p.
EUROPEAN COMMITTEE FOR STANDARDIZATION. EN 13427: packaging – requirements for the use of European
Standards in the field of packaging and packaging waste. Brussels, 2004a. 13 p.
_____. EN 13428: packaging – requirements specific to manufacturing and composition – Prevention by source
reduction. Brussels, 2004b. 43 p.
_____. EN 13429: Reuse. Brussels, 2004c. 33 p.
_____. EN 13430. packaging – requirements for packaging recoverable by material recycling. Brussels, 2004d. 35 p.
_____. EN 13431: packaging – requirements for packaging recoverable in the form of energy recovery, including
specification of minimum inferior calorific value. Brussels, 2004e. 33 p.
_____. EN 13432: packaging – requirements for packaging recoverable through composting and biodegradation – test
scheme and evaluation criteria for the final acceptance of packaging. Brussels, 2000. 37 p.
INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION – ISO 14851: determinação da biodegradabilidade
aeróbia definitiva de materiais plásticos em meio aquoso – método por meio de medição da demanda de oxigênio em
um respirômetro fechado. Genève, 2003.
_____. ISO 14852: determinação da biodegradabilidade aeróbia definitiva de materiais plásticos em meio aquoso –
método por meio de análise de dióxido de carbono emitido. Genève, 1999.
_____. ISO 14855: determinação da biodegradabilidade aeróbia definitiva e da desintegração de materiais plásticos sob
condições de compostagem controladas – método por meio de análise de dióxido de carbono emitido. Genève, 1999.
OFFICIAL JOURNAL OF THE EUROPEAN COMMUNITIES. European Parliament and Council Directive 94/62/EC of 20
December 1994 on packaging and packaging waste. Disponível em:
<http://europa.eu.int/comm/environment/docum/01729_en.htm>. Acesso em: 07 jul. 2005.
WHITE, P. R.; FRANKE, M.; HINDLE, P. Integrated solid waste management: a life cycle inventory. Glasgow: Blakie
Academic and Professional, 1995, 362 p.
WORLD COMMISSION ENVIRONMENT AND DEVELOPMENT. Our common future: the brundtland report. Oxford:
Oxford University Press, 1987.
Figura 8.1 – Etapas do planejamento do DfE: desenvolvimento do produto com base no ciclo de vida
e na busca do menor impacto ambiental
6 A estratégia organizacional deve levar em conta fatores internos como: posição do produto no mercado e na própria empresa;
conhecimento da capacitação do pessoal interno e disponibilidade de profissionais externos à organização; propriedade intelectual;
recursos financeiros; disponibilidade de ferramentas como softwares de ACV; capacidade de renovar produtos, processos
fornecedores, etc. A empresa também deve levar em conta fatores externos como: recursos disponíveis ou previstos (expectativa de
orçamento); necessidade dos consumidores (funcionalidade, desempenho, consciência ambiental, etc.); mercado (lucro, imagem,
etc.); competidores; requisitos ambientais; expectativa pública (imagem); requisitos legais; sistema do produto, etc.
Centro de Tecnologia de Embalagem – CETEA / ITAL 71
8. Integração de Aspectos Ambientais no Desenvolvimento de Produto
Referências Bibliográficas
GARCIA, E. E. C. Desenvolvimento de embalagem e meio ambiente. In: BRASIL pack trends 2005: embalagem,
distribuição e consumo. Campinas: CETEA/ITAL, 2000. p. 81-99.
INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION. ISO/TR 14062: environmental management: integrating
environmental aspects into product design and development. Geneve, 2002. 24p.