FisicaEstadoSolido v4
FisicaEstadoSolido v4
FisicaEstadoSolido v4
Luís Alcácer
Draft date: 16 de Fevereiro de 2013
Página ii (propositadamente em branco).
Este texto de Física do Estado Sólido, é uma reedição das notas das aulas da disciplina
de Física do Estado Sólido ministrada aos alunos da licenciatura em Física Tecnológica
do IST nos anos 1992 a 1994, com algumas adições que se considerarem relevantes, e é
destinada, em primeiro lugar, aos colaboradores do IT da área da Electrónica Orgânica,
e amigos.
Este texto é apenas um primeiro draft. Precisa de ser revisto, completado com problemas,
e, em particular, as figuras precisam ser refeitas de acordo com especificações de uma
eventual editora, se a sua publicação em livro vier a ser considerada.
Luís Alcácer
e-mail: alcacer@lx.it.pt
Página iv (propositadamente em branco).
vi
ÍNDICE
vii
ÍNDICE
8 SEMICONDUTORES 331
8.1 INTRODUÇÃO 333
8.2 ESTRUTURAS DE BANDAS TÍPICAS DE SEMICONDUTORES 333
8.2.1 MASSAS EFECTIVAS 335
8.2.2 DENSIDADE DE PORTADORES DE CARGA (ELECTRÕES E BURA-
COS) 338
8.2.3 LEI DA ACÇÃO DE MASSA 341
8.3 SEMICONDUTORES DOPADOS 342
8.3.1 ESTADOS DOS DOPANTES NO ÂMBITO DA TEORIA DE BANDAS 342
8.3.2 ESTATÍSTICA DOS PORTADORES PARA DOPANTES 346
8.3.3 DENSIDADES EXTRÍNSECAS DE PORTADORES 349
8.3.4 SEMICONDUTORES COMPENSADOS 352
8.3.5 ESTATÍSTICA DOS PORTADORES EM SEMICONDUTORES DEGE-
NERADOS 352
8.3.6 TRANSPORTE EM SEMICONDUTORES 353
8.4 DISPOSITIVOS ELECTRÓNICOS DE SEMICONDUTORES 356
viii
ÍNDICE
ix
Página x (propositadamente em branco).
UM POUCO DE HISTÓRIA
A física do estado sólido começou nos primeiros anos do século XX. Primeiramente, para
explicar as propriedades dos metais, como uma extensão da teoria cinética dos gases e um
pouco mais tarde, como uma extensão da física atómica, com a descoberta da difracção
de raios-X e algumas previsões sobre as propriedades dos cristais.
Por seu turno, a constatação da existência de ordem no estado sólido vem de longa
data. Já em 1665, Robert Hooke2 especulara sobre a razão das formas regulares dos
cristais, e decidira que estas eram uma consequência de um empacotamento regular de
partículas esféricas. A cristalografia começou quando as relações entre as faces planas
dos cristais foram sujeitas a medição. Em 1669 Niels Stensen (Professor de Anatomia
em Copenhaga e Vigário apostólico do Norte) comparou os ângulos interfaciais numa
colecção de cristais de quartzo. Um ângulo interfacial é definido como o ângulo entre
linhas traçadas perpendicularmente a um par de faces. Stensen concluiu que os ângulos
correpondentes em cristais diferentes eram sempre iguais. Após a invenção do goniómetro
de contacto em 1780, esta conclusão foi verificada e alargada a outras substâncias. A
constância dos ângulos interfaciais tem sido considerada a primeira lei da cristalografia.
1801.
PRÓLOGO
O estudo sistemático das estruturas cristalinas começou como uma extensão da física
atómica, após a descoberta da difracção de raios-X e depois da publicação de uma série de
artigos contendo cálculos sobre propriedades dos cristais. A 8 junho 1912, foi apresentado
na Academia de Ciências de Munique, um artigo intitulado "Efeitos de interferência
com raios Rœntgen". Nesse artigo, Laue desenvolvia uma teoria elementar da difracção
dos raios-X por uma estrutura periódica de átomos e Friedrich e Knipping relatavam
as primeiras observações experimentais sobre a difracção desses raios, produzida pelos
cristais. Esse trabalho mostrou claramente que os cristais são constituídos por estruturas
periódicas de átomos.
xii
1
IDENTIFICAÇÃO DAS QUESTÕES BÁSICAS
Página 2 (propositadamente em branco).
1.1 INTRODUÇÃO
Algumas das diferenças mais marcantes dos sólidos citados são, por exemplo, a cor, o
brilho, a dureza e a ductilidade (deformabilidade plástica). A cor e o brilho são obvia-
mente propriedades que têm que ver com a absorção e reflexão da luz—são propriedades
de carácter electromagnético. Têm que ver com interacções entre a radiação electromag-
nética e a matéria. A dureza e a ductilidade são propriedades mecânicas. Têm a ver com
a estrutura atómica e molecular—questões associadas ao conceito de ligação química.
Por estranho que pareça, talvez o mais simples de explicar, sejam as diferenças marcantes
na resistência eléctrica destes sólidos. De facto, como toda a gente sabe, o cobre é um
metal típico e por isso um bom condutor. A sua resistividade1 , ρ, à temperatura ambi-
ente, é da ordem do µΩ cm. Se medirmos a resistividade eléctrica a várias temperaturas,
verifica-se que ela aumenta quando se aumenta a temperatura, i.e., dρ/dT > 0.
Por seu turno, o silício (puro), conhecido como um semicondutor, tem uma resistividade
da ordem de 105 Ω cm, à temperatura ambiente, e esta diminui quando se aumenta a
temperatura, i.e., dρ/dT < 0. Também sabemos que o quartzo é um isolador. A sua
resistividade é muito elevada. É da ordem de 1014 - 1016 Ω cm, a 25 o C.
Sabemos que a corrente eléctrica de condução aparece quando há cargas (electrões) que
se movem quando há um campo a actuar sobre elas. Experimentalmente, num condutor
e para campos não muito intensos, é válida a lei de Ohm2 , J = σE, sendo J a densidade
de corrente, ou fluxo de carga que passa pela secção unitária do fio na unidade de tempo,
[A m−2 ]; σ, a condutividade [S m−1 ] ou [Ω−1 m−1 ] e E o campo aplicado [V m−1 ].
Podemos escrever
J = −nev (1.1)
1 Segundo a forma mais divulgada da lei (empírica) de Ohm (publicada em 1827), a resistência de um
fio condutor, de comprimento ` e secção A, é R = V /I. V é a tensão aplicada (diferença de potencial),
I, a corrente eléctrica e R, a resistência do fio, que pode ser expressa em termos da resistividade ρ:
R = ρ `/A, sendo, portanto a resistividade dada por ρ = R A/`.
2 I = V /R, e portanto J = 1 E = σ E. É importante compreender que para manter uma corrente
ρ
eléctrica é preciso gastar energia. Um condutor, por si só, evolui no sentido de formar uma superfície
equipotencial, anulando a corrente, uma vez que o campo no seu interior desaparece. Lembrando que
a intensidade da corrente, I, é o fluxo de carga que passa pela secção do fio na unidade de tempo, a
energia eléctrica consumida na unidade de tempo é IV = I 2 R. Esta energia é dissipada sob a forma de
calor (calor de Joule): os electrões orientados pelo campo transferem essa energia para os iões, através
de colisões, e aumentam assim a temperatura do fio.
3
INTRODUÇÃO
O que dá origem à corrente é o campo aplicado. Este provoca nos electrões uma ve-
locidade orientada, a qual, no modelo de Drude, que veremos a seguir, se sobrepõe à
velocidade caótica resultante das colisões com os iões positivos do sólido, cuja resultante
é nula. Note-se que, segundo a lei de Ohm, as cargas não são aceleradas. O campo
eléctrico equilibra o atrito das colisões e a velocidade média dos electrões mantém-se
constante. Será que a lei de Ohm, ao estabelecer a proporcionalidade entre a velocidade
e a força (força de Lorentz, F = −e E), i.e., J = −ne v = σ E, é compatível com a lei de
Newton?
A primeira questão implica, desde já, a escolha de um modelo. Podemos, por exemplo,
admitir que nos sólidos existem electrões livres e que n representa o número de electrões
livres por unidade de volume. Assim, o cobre teria muitos electrões livres por unidade
de volume, o silício teria muito menos e os sólidos isoladores, como o quartzo, não teriam
quase nenhuns. Mas mesmo os isoladores teriam alguns, na medida em que é sempre
possível neles medir uma condutividade não nula.
Outra questão, é que nos metais, como o cobre, dρ/dT > 0, enquanto que nos semi-
condutores, como o silício, dρ/dT < 0. Será que o número de electrões varia com a
temperatura? Ou será a velocidade que varia com a temperatura? Ou ambos? De que
modo?
4
IDENTIFICAÇÃO DAS QUESTÕES BÁSICAS
Algumas respostas a estas questões foram dadas por Drude, em 19003 . O seu modelo
consistia em admitir que, num metal, alguns dos electrões se libertam dos átomos e ficam
livres, deixando iões que ficam fixos. A resistência eléctrica seria devida a colisões desses
electrões com os iões fixos.
3 Note-se que o electrão tinha sido descoberto, três anos antes, por Joseph Thomson.
5
GÁS DE ELECTRÕES
pelo gás de electrões, de carga −eZa , sendo os electrões da camada exterior, fracamente
ligados ao núcleo, numericamente iguais a Z, chamados electrões de valência. No metal,
o conjunto dos N Z electrões de valência provenientes de um conjunto de N átomos e que
podem mover-se livremente, sobre um fundo de iões pesados e imóveis, são chamados
electrões de condução.
Um metal contém 6.022 × 1023 átomos por mole (número de Avogadro, NA ) e ρ/M moles
por cm3 (ρ=massa especifica em g/cm3 , M =massa atómica do elemento). Como cada
átomo contribui com Z electrões, o número de electrões por cm3 é
NA Z ρ
n= (1.2)
M
ou
Z
n= (1.3)
V0
sendo V0 o volume correspondente a cada átomo. Um outro parâmetro muito utilizado
é o raio da esfera cujo volume é igual a V0 , vindo portanto:
Z Z
n= = 4 3
(1.4)
V0 3 π r0
Note-se que r0 não é, de modo algum, o raio atómico ou o raio iónico. Nem deve ser
confundido com esses parâmetros. No modelo de Drude, os iões são pontuais, e 43 πr03 é
o volume disponível para os Z electrões de condução provenientes de cada átomo.
Os valores de n são tipicamente da ordem de 1022 cm−3 (1028 m−3 ). No caso do co-
bre r0 = 1.41 Å, Z = 1, existem 8.5 × 1022 átomos/cm3 sendo, portanto, n = 8.5 ×
1022 electrões/cm3 . Na Tabela 1.1 dão-se valores das densidades electrónicas de alguns
metais comuns.
Note-se que as densidades, referidas na tabela, são cerca de mil vezes mais altas do
que as de um gás perfeito a pressões e temperaturas normais (N2 a PTN tem n ≈
2.7 × 1019 moléculas/cm3 ). O modelo de Drude trata o gás de electrões denso do metal
pelos métodos da teoria cinética de um gás neutro e diluído.
6
IDENTIFICAÇÃO DAS QUESTÕES BÁSICAS
A palavra gás tem a mesma origem que caos. Um gás é visualizado como um conjunto de
partículas que se movem de um modo caótico. Cada partícula move-se, a alta velocidade,
em linha recta, até colidir com outra, ou até colidir com as paredes do recipiente onde
o gás está contido, sofrendo uma mudança de trajectória, de um modo semelhante ao
movimento de bolas de bilhar. Num gás, as distâncias entre moléculas são, em média,
muito maiores do que as dimensões das moléculas, pelo que as forças intermoleculares
são desprezáveis e só a energia cinética translacional tem valores significativos. A lei
dos gases perfeitos, P V = nRT , em que P =pressão, V =volume, n=número de moles,
R=constante dos gases perfeitos e T =temperatura absoluta, é uma relação empírica e
que pode ser explicada com base no movimento livre das moléculas, sem interacções,
para além das colisões. Este modelo é a base da teoria cinética dos gases, que é um
movimento caótico de massas pontuais.
7
GÁS DE ELECTRÕES
No modelo de Drude, as colisões ocorrem entre os electrões e os iões fixos e são consi-
deradas responsáveis pela resistência eléctrica. Estas colisões são eventos instantâneos
que alteram abruptamente a velocidade dos electrões. No instante da colisão, o electrão
esquece-se da sua velocidade anterior, emergindo com uma velocidade média dada pela
equação 3/2 kB T = 1/2 mv02 , (kB =constante de Boltzmann). Embora esse modelo esteja
muito longe de explicar todos os factos, dá uma descrição qualitativa razoável em muitos
aspectos. A ideia básica é a de que os electrões sofrem colisões instantâneas, com uma
probabilidade 1/τ , por unidade de tempo, sendo τ o tempo médio entre colisões, e que
viajam livremente entre colisões.
A probabilidade de colisões, no tempo dt, é dt/τ , sendo τ independente, quer das posições
dos electrões, quer das suas velocidades.
O tempo τ é conhecido por tempo médio entre colisões ou tempo de relaxação. Significa
que um electrão tomado ao acaso, num dado instante, mover-se-á, em média, um tempo
τ , até à próxima colisão, e ter-se-á movido, em média, um tempo τ , desde a sua última
colisão.
Supõe-se que, após cada colisão, os electrões emergem com velocidades não correlaciona-
das com as suas velocidades anteriores, sendo as suas direcções aleatórias. As velocidades
médias dependem apenas da temperatura da região onde ocorre a colisão. Quanto mais
quente for o local da colisão, maior será a velocidade com que os electrões emergem das
colisões.
Colisões com quê? Pode perguntar-se. Drude pensava que era com os núcleos dos iões.
Hoje sabe-se que as colisões se dão com os iões, quando fora das suas posições de equilíbrio
(vibrações térmicas ou fonões como veremos). Contrariamente ao que se passa num gás
perfeito, os electrões não sofrem muitas colisões entre si, facto que iremos estudar mais
tarde. Uma compreensão qualitativa (e nalguns casos, quantitativa) da condução em
metais, é possível, assumindo simplesmente que existe um mecanismo de colisões, sem
ser necessário especificar detalhadamente esse mecanismo.
8
IDENTIFICAÇÃO DAS QUESTÕES BÁSICAS
donde se pode concluir que, à temperatura ambiente, v0 ≈ 107 cm/s, sendo τ ≈ 10−14 s,
como veremos mais tarde.
Admitamos que, por acção de um campo eléctrico, os electrões se deslocam5 num meio
viscoso, ou com uma força de atrito proporcional à velocidade de deriva, vd . A equação
do movimento para um electrão será
dvd
m = −eE − γvd (1.6)
dt
5 Notar que, neste modelo, os electrões se deslocam aleatoriamente com velocidades em todas as direcções,
de módulo v0 , apenas dependente da temperatura. Esta velocidade nada tem que ver com o campo
aplicado. A velocidade resultante do campo aplicado é a velocidade de deriva (drift) e será designada
por vd .
9
GÁS DE ELECTRÕES
eEτ t
vd = − (1 − e τ ) (1.8)
m
Após um tempo da ordem de τ , (tempo de relaxação), a velocidade atinge um estado
estacionário cuja velocidade é v = − eEτ
m .
σ = nµe (1.11)
sendo
eτ
µ= (1.12)
m
m s−1
Note-se que as unidades de µ são [µ]SI = V m−1 = m2 V−1 s−1 .
1. Quando actuados por uma força F(t), devida a campos exteriores, os electrões
adquirem um momento médio p(t).
6 dx 1
R
a+bx
= b
ln (a + bx)
10
IDENTIFICAÇÃO DAS QUESTÕES BÁSICAS
dt
2. Num intervalo de tempo dt, uma fracção τ do conjunto dos electrões do metal
sofrerá colisões.
Se admitirmos que após uma colisão, o momento médio por electrão é nulo (colisões
aleatórias), a variação média do momento por electrão num intervalo de tempo dt é dada
aproximadamente por:
dt
dp = F(t)dt − p (1.13)
τ
ou
dp p
= F(t) − (1.14)
dt τ
que é portanto portanto a equação geral do movimento de um electrão “livre” num con-
dutor sujeito a uma força exterior, F(t). O termo − pτ é equivalente a um coeficiente de
atrito.
j ne2 τ
σ= = (1.19)
E m
que é idêntica à expressão 1.10.
11
GÁS DE ELECTRÕES
temperaturas os valores das grandezas acima referidas não estão de acordo com o modelo
de Drude. Para o cobre monocristalino a T = 4 K, τ = 2 × 10−9 s, v0 = 1.57 × 108 cm s−1 ,
dando para ` um valor de cerca de 3 milímetros, ou seja cerca de 107 vezes a distância
entre átomos vizinhos. Estes valores são clara evidência de que os electrões não se
movem aleatoriamente, colidindo simplesmente com os iões, como Drude supôs. Para
compreender esses valores é necessário admitir que a rede cristalina é dinâmica e fazer
uso da mecânica quântica.
A condutividade eléctrica dos sólidos varia entre cerca de 10−20 S cm−1 (siemen por
centímetro) ou (Ω−1 cm−1 ), ou no sistema SI, 10−18 S m−1 , para os isoladores, até ∞
para os supercondutores. Na Tab.1.2, apresentam-se valores da condutividade e de τ
para alguns metais comuns, a duas temperaturas diferentes.
Dentro de certa medida, o modelo também explica a variação da resistividade dos metais
com a temperatura, na medida em que, um aumento da temperatura implica maior
número de colisões.
12
IDENTIFICAÇÃO DAS QUESTÕES BÁSICAS
13
GÁS DE ELECTRÕES
A experiência de Hall está esquematizada na Fig. 1.3. Se fizermos passar uma corrente
eléctrica na direcção do eixo dos xx e aplicarmos um campo magnético (cujo valor da
indução8 é B) na direcção dos eixo dos yy, cada electrão estará sujeito a uma força de
Lorentz que o obriga a desviar-se na direcção do eixo dos zz.
8 As equações seguintes estão escritas no sistema internacional, SI,—Ver apêndice. No sistema de Gauss
(cgs), B deve ser substituído por B/c. É, no entanto, habitual usar H (em gauss) em vez de B, uma
vez que em sólidos não magnéticos (ou pouco magnéticos) B ≈ H. Note-se, no entanto, que a unidade
de H é o oersted e a unidade de B, o gauss.
9 Usaremos a notação × para o produto externo entre dois vectores.
14
IDENTIFICAÇÃO DAS QUESTÕES BÁSICAS
Do sistema (1.21), pode também ver-se que a resistência (medida segundo x) não depende
do campo (magnetorresistência nula neste modelo). De facto, da 1a equação, no estado
estacionário, jz = 0 (pz = 0 — os electrões não podem sair do condutor) e jx = σEx ,
que dá, portanto, para a resistência, o mesmo valor que na ausência de campo.
ne2 τ EH
Se atendermos a que jx = σEx = m Ex , vem para o coeficiente de Hall, RH = jx B
1
RH = − (1.23)
ne
Note-se que o sinal do coeficiente de Hall é o mesmo dos transportadores de carga, −e.
Veremos mais tarde que se podem considerar transportadores de carga positivos a que
chamaremos buracos, cuja densidade designaremos por p. Nesse caso o coeficiente de
Hall será positivo.
1 1
RH = − para electres; RH = + para buracos (1.24)
ne pe
15
GÁS DE ELECTRÕES
∇ × H = σE + iωε E (1.25)
ou
∇ × H = (σ + iωε) E (1.26)
donde se pode inferir uma condutividade complexa da forma
16
IDENTIFICAÇÃO DAS QUESTÕES BÁSICAS
ou σ
∇ × H = iω ε − i E (1.28)
ω
donde se pode inferir uma permitividade complexa da forma
σ
εcomplexa = ε − i (1.29)
ω
conclui-se assim que a parte real da condutividade complexa é a condutividade, e a parte
imaginária é a permitividade. A parte real da permitividade complexa é a permitividade
e a parte imaginária é a condutividade:
Re(σ) = σ Re(ε) = ε
σ
Im(σ) = ω ε Im(ε) = −
ω
Quando um material é sujeito a um campo eléctrico, cada um dos seus electrões vai
deslocar-se por acção do campo, dando origem a um momento dipolar não permanente
ou induzido, proporcional ao campo
µi = −e r = ε0 α E (1.30)
em que r é o desvio relativamente à posição de equilíbrio do electrão, que varia por acção
do campo e α é a polarizabilidade.
Por outro lado, a equação de movimento a que obedece o vector posição do electrão r,
quando sujeito a um campo, é
2
d r 1 dr
m + = F = −eE (1.31)
dt2 τ dt
sendo o primeiro termo a aceleração, o segundo, a força de atrito com o coeficiente 1/τ
e F = −eE, a força de Lorenz.
17
GÁS DE ELECTRÕES
No modelo de Drude, há n electrões livres com tempo de relaxação τ , donde resulta uma
polarização (que é o momento dipolar por unidade de volume) da forma P = n µi = −n e r,
ou seja
n e2 1
P= E
m −ω 2 + i ωτ
Mas, atendendo a 1.30, P = n µi = ε0 n α E, donde
n e2 1
nα =
ε0 m −ω + i ωτ
2
ne2
1
ε = ε0 1 + (1.32)
ε0 m −ω 2 + i ωτ
1
Para frequências elevadas ω os n electrões dão uma permitividade
τ
ne2
ε = ε0 1 −
ε0 mω 2
ou
ωp2
ε = ε0 1 − 2 (1.34)
ω
n e2
ωp2 = (1.35)
ε0 m
18
IDENTIFICAÇÃO DAS QUESTÕES BÁSICAS
E = E0 e−α r e−i ω t
Para ε complexo11
r r
√ √ σ0 ωµ0 σ0 1
k = ω µ0 ε ≈ ω µ0 i = (1 + i) = (1 + i)
ε0 ω 2 ε0 δ
10 Note-se que k = |k| = 2π/λ, λ = c/ν e ν = 2π/ω, dondeq k = ω/c, sendo c é a velocidade da luz no
ε
vácuo. Num material de índice de refracção nr com nr = ε0
, a velocidade de propagação da radiação
√
electromagnética é v = c/nr . Mas c = 1/ µ0 ε0 (ver apêndice A3), pelo que, num meio não magnético
√
k = |k| = ω µ0 ε.
(µ = µ0 ), √
11 Fazendo 1
i = √ (1 + i).
2
19
GÁS DE ELECTRÕES
Isto significa que a onda é atenuada (há absorção de radiação) e que se propaga (oscila)
mas decai exponencialmente no interior do material. A este fenómeno chama-se efeito de
pele. Para o cobre a ω = 60 Hz, δ ≈ 1 cm.
Há perda de energia quando J e E estão em fase, i.e., para σ real (resistivo). A compo-
nente imaginária de σ, Im(σ) está fora de fase relativamente ao campo, não há perda de
energia e o meio é reactivo.
σ real implica ε imaginário e σ imaginário implica ε real. Portanto Im(ε) implica perda
de energia interna, o campo interno fica fora de fase relativamente ao campo externo E.
Por exemplo, para um metal com ω ωp e ω 1/τ ,
Se ω > ωp , então ε > 0 e real, sendo o metal transparente. É o caso dos metais alcalinos
que são transparentes no ultravioleta. Na Fig.1.4, representa-se a variação de ε em
toda a gama de frequências Usando as relações ω = 2πν e λ = c/ν, pode-calcular-se o
ε
Transparente
ε0
12 13 14 15 16
10 10 10 10 10
1/ τ ωp ω
R(ω )
Reflecte toda a luz Transparente
1
ωp ω
20
IDENTIFICAÇÃO DAS QUESTÕES BÁSICAS
valores da ordem de 1016 rad/s, ou λp ≈ 100 nm, e uma vez que o espectro luz visível se
situa na gama dos 380 nm (3.2 eV) a 750 nm (1.6 eV), os metais típicos reflectem a luz
visível, sendo transparentes no UV. Este resultado indica que os electrões s desses metais
se comportam essencialmente como electrões livres. Melhorar
o por-
Os polímeros conjugados, com densidades electrónicas muito menores do que os metais tuguês
típicos, mais concretamente com valores de n entre 2 × 1021 e 4 × 1021 electrões por
cm3 , como se pode prever se notarmos que numa cadeia de polímero há dois electrões
"livres" por ligação conjugada, a situação é completamente diferente. Os valores da
frequência do plasma, (tomando o valor n = 2 × 1021 /cm3 ) são da ordem de ωp =
2.5 × 1015 rad s−1 e λp = 747 nm, o que implica que o comprimento de onda do plasma
é, na quase totalidade do espectro, maior do que o comprimento de onda da luz visível,
sendo portanto praticamente transparentes no visível.
CONDUTIVIDADE TÉRMICA
Tal como definimos uma densidade de corrente eléctrica, como o fluxo de carga por
acção de um campo eléctrico exterior, que actua sobre o gás de electrões, podemos
também definir uma densidade de corrente térmica, jq , como um fluxo de energia, (energia
transportada através de uma unidade de área, por unidade de tempo). Neste caso, a força
que actua sobre o gás de electrões será um gradiente térmico, ∇T , que constitui a lei
empírica de Fourier.
jq = −κ∇T (1.38)
κ é a conduvidade térmica e tem dimensões, no sistema SI, [κ] = W m−1 K−1 (watt por
metro e por kelvin). jq tem dimensões [jq ] = W m−2 (watt por metro quadrado—é um
fluxo de energia).
21
GÁS DE ELECTRÕES
lado frio, i.e., v0 2 quente > v0 2 f rio . O fenómeno pode visualizar-se como se dos electrões
que estão no meio, metade fosse para o lado quente, arrefecendo essa extremidade, indo
a outra metade para a extremidade fria, aquecendo-a. Para fazer uma estimativa da
condutividade térmica, consideremos que ε (T [x0 ]) é a energia térmica média por electrão,
cuja colisão ocorreu no ponto x0 . Os electrões que chegam ao ponto x vindos do lado
mais quente terão tido a sua última colisão no ponto x − vτ , e transportarão portanto
uma energia térmica ε (T [x − vτ ]) e os electrões que chegam ao ponto x vindos do lado
mais frio terão tido a sua última colisão no ponto x + vτ , e transportarão uma energia
térmica ε (T [x + vτ ]). A densidade de corrente térmica segundo a direcção x (ver Fig.
1.5), será, assim, dada por
1 h i
jq = nv ε (T [x − vτ ]) − ε (T [x + vτ ]) (1.39)
2
Supondo que a variação de temperatura ao longo de um livre percurso médio, `, é muito
pequena, e que v não depende de ε(T ), podemos expandir ε[T (x)] em série de Taylor12
e obter
dε dT
jq = nv 2 τ − (1.40)
dT dx
Para passar a três dimensões basta substituir v pela componente vx da velocidade elec-
trónica v, e fazer a média sobre as três direcções do espaço. Uma vez que, no equilíbrio,
a velocidade é aproximadamente isotrópica, hvx2 i = hvy2 i = hvz2 i = 31 v 2 , e uma vez que
n dε/dT = (N/V )dε/dT = (dE/dT )/V = cv , o calor específico electrónico, temos
1 2
jq = v τ cv (−∇T ) (1.41)
3
ou
1 2 1
κ= v τ cv = `vcv (1.42)
3 3
12 ε[T (x)] dε dT
=ε[T (x0 )] + dT dx
(x − x0 ) + . . ..
x0
22
IDENTIFICAÇÃO DAS QUESTÕES BÁSICAS
Uma vez que no modelo de Drude, cv = 32 nkB e que 12 mv02 = 32 nkB T , podemos escrever
2
κ 3 kB
= T (1.44)
σ 2 e
que é portanto uma relação independente de τ e do metal. Esta lei de Wiedermann-Franz
tem a dependência correcta com a temperatura, bem como o valor correcto, o constituiu
uma boa defesa da teoria de Drude.
PODER TERMOELÉCTRICO
E = S ∇T (1.45)
23
GÁS DE ELECTRÕES
Podemos também generalizar para três dimensões substituindo v 2 → vx2 , e notando que
hvx2 i = hvy2 i = hvz2 i = 31 v 2 , de modo que
τ dv 2
vS = − (∇T ) (1.47)
6 dT
vS é a velocidade média devida ao gradiente térmico. Atendendo a que a velocidade
média devida ao campo E, vE = − eτ
m E e a que vq + vE = 0, vem
3
1 d mv 2 cv n kB kB
S=− =− = 2 =− = −0.43 × 10−4 V K−1 (1.48)
3e dT 2 3ne 3ne 2e
Notar que as unidades de S são volt por kelvin. Este valor é cerca de 100 vezes maior do
que o observado nos metais simples.
Note-se que, tal como no caso do efeito de Hall, o sinal do poder termoeléctrico é, em
princípio, o sinal da carga, mas também aparecem valores com o sinal aparentemente
errado.
Para medir o poder termoeléctrico teria que ser imposto um gradiente de temperatura
a uma amostra (uma ponta a uma temperatura e outra ponta a outra temperatura), e
medir a tensão gerada. Isso implica um circuito que tem necessariamente um caminho
de volta, que se for do mesmo metal, anula o gradiente de temperatura e se for de outro
metal, gera uma nova tensão termoeléctrica, a menos que o retorno seja feito através de
um supercondutor, cujo poder termoeléctrico absoluto é nulo. O modo usual para medir
o poder termoeléctrico consiste em usar um circuito com dois metais diferentes ligados
como mostra a Fig. 1.7. Deste modo, mede-se o poder termoeléctrico de um dos metais
relativamente ao outro. Se o valor absoluto de um deles for conhecido, pode calcular-se o
outro. Normalmente utiliza-se o ouro, como referência, por ter um poder termoeléctrico
muito pequeno e muito bem conhecido. O conhecimento do poder termoeléctrico (tam-
bém conhecido por efeito de Seebeck) dá-nos informações importantes sobre a natureza,
o número e interacções dos transportadores de corrente. O sinal dá-nos informação sobre
24
IDENTIFICAÇÃO DAS QUESTÕES BÁSICAS
Não é possível continuar a desenvolver uma teoria do electrão livre sem recorrer ao uso de
estatística quântica. Fazendo do gás de electrões clássico de Drude um gás de electrões de
Fermi permite resolver algumas das discrepâncias observadas nas propriedades térmicas.
Este é o assunto que vamos tratar a seguir. Outras anomalias terão de esperar por
modificações à aproximação do electrão livre.
25
GÁS DE ELECTRÕES
Figura 1.8: Gráfico do tipo do obtido por Kamerlingh Onnes, para uma amostra de
mercúrio.
σ = n µe e + p µp e (1.49)
Esta ideia está de acordo com o facto de que a condutividade dos semicondutores é
termicamente activada, seguindo uma lei de Arrhenius, da forma
σ = σ0 e−∆E/kB T (1.50)
E que dizer à cerca de τ , o tempo de relaxação? É evidente que o movimento dos electrões
no sólido é afectado por vários tipos de interacções com outras entidades presentes (outros
26
IDENTIFICAÇÃO DAS QUESTÕES BÁSICAS
Muitas outras questões se podem pôr. Interessa, no entanto, reduzir o maior número
de interrogações a um conjunto de questões básicas que possam conduzir a uma visão
unificada, ou seja a uma compreensão, das propriedades da matéria no estado sólido.
1.3.1 INTRODUÇÃO
A física do estado sólido visa a previsão e a compreensão das propriedades físicas colec-
tivas desses arranjos atómicos.
As propriedades dos átomos livres determinam a natureza dos sólidos de que são feitos,
mas, quando no sólido, essas propriedades são influenciadas pelas correlações entre os
átomos. A condutividade eléctrica, o ferromagnetismo, o calor específico e as transições
de fase são exemplos de conceitos que podem ser definidos para um sólido mas não para
um átomo individual.
Os cristais reais não são perfeitos ou ideais. Todos os sólidos têm dimensões finitas
e consequentemente, são delimitados por superfícies ou limites de grão. Embora este
facto seja trivial, ele é importante em relação a muitos fenómenos. Os defeitos da rede
cristalina, a presença de impurezas (átomos estranhos) e outras perturbações locais da
periodicidade da rede, jamais podem ser completamente eliminados num cristal real.
27
AS QUESTÕES BÁSICAS
Mesmo a agitação térmica dos átomos em torno das suas posições de equilíbrio constitui
um desvio à periodicidade ideal. A rede periódica é formada, não pelos próprios átomos,
mas sim pelas suas posições de equilíbrio. Os átomos só permanecem nas suas posições
de equilíbrio ao zero absoluto, isto é, quando o cristal está no seu estado fundamental. No
entanto, mesmo a temperaturas próximas da ambiente, os desvios são em geral pequenos,
de modo que a ordem continua a ser a principal característica do estado sólido.
Os problemas da física do estado sólido podem ser postos em termos de duas questões
básicas:
O primeiro grupo de questões está relacionado com conceitos como os de estrutura crista-
lina, ligação química, coesão, e energia de ligação. Note-se, no entanto, que estas questões
só podem ser respondidas através das respostas à segunda questão. De facto, só exami-
nando as consequências de influências externas, como por exemplo o efeito de campos
eléctricos, exposição à luz, etc., se podem determinar as propriedades do estado fun-
damental. Qualquer experiência (ou medida) significa intervenção e consequentemente
perturbação do estado fundamental.
3. Gradientes de temperatura.
4. Fenómenos ópticos.
Não é possível descrever todos estes fenómenos recorrendo a um único modelo teórico. O
sistema de muitos corpos é demasiado complexo. É no entanto possível utilizar modelos
simplificados para áreas de interesse particulares e unificar alguns conceitos em teorias
mais ou menos sofisticadas. Em princípio, quanto mais sofisticada for a teoria, maior
número de fenómenos poderá unificar.
28
IDENTIFICAÇÃO DAS QUESTÕES BÁSICAS
O que se entende então por estado fundamental de um sólido? Para podermos compre-
ender as propriedades gerais do estado sólido temos que conceber modelos abrangentes
que relacionem entre si as observáveis ou seja as propriedades e os fenómenos que se
observam.
O que é que é comum a todos os sólidos? Já vimos que é a coesão, devida á ligação
química entre os átomos ou moléculas que os constituem, e sobretudo a ordem a curto ou
longo alcance. A existência de ordem a longo alcance permite usar modelos relativamente
simples a partir dos quais é possível compreender e fazer previsões sobre o comportamento
dos sólidos.
Em primeiro lugar temos que conceber um sólido ideal. Uma ideia de sólido que seja
representativa de todos os sólidos. Podemos talvez começar por tentar separar os proble-
mas. Uma coisa é o interior do sólido, em que existe ordem tridimensional, i.e., existem
configurações atómicas ou moleculares que se repetem, no espaço. Que têm simetria
translacional. Outra coisa são as superfícies delimitativas do sólido. É mais fácil abordar
estes dois aspectos separadamente. Vamos em primeiro lugar debruçar-nos sobre o inte-
rior dos sólidos, o ”bulk”. Para evitar o problemas dos limites, podemos conceber o sólido
ideal como um cristal infinito, sem defeitos ou imperfeições. Sabemos intuitivamente o
que isso significa. O estado fundamental será o estado de mais baixa energia. É o estado
em que se encontra o sólido ideal para T = 0 K.
O grande passo que deu origem à física do estado sólido moderna foi a introdução da
mecânica quântica, nomeadamente a aplicação da equação de Schrödinger ao estudo do
movimento das partículas constituintes dos sólidos — os electrões e os iões.
Para abordar o problema das propriedades gerais dos sólidos, no âmbito da mecânica
quântica, a primeira coisa a fazer é estabelecer o hamiltoniano para o problema global.
29
AS QUESTÕES BÁSICAS
O segundo termo deve conter os operadores da energia cinética de todos os iões e os das
interacções ião-ião,
Hiões = Hies,cin + Hiões−iões (1.53)
É útil introduzir desde já uma subdivisão nos hamiltonianos Hies−ies e He−ies . O nosso
sólido ideal tem uma simetria resultante do arranjo periódico dos iões na rede cristalina.
No entanto, essa periodicidade refere-se às posições de equilíbrio dos iões e não às suas
posições reais instantâneas. Podemos então dividir as interacções ião-ião em duas partes:
uma que descreve as interacções nas posições de equilíbrio e outra que constitui a cor-
recção devida aos desvios às posições de equilíbrio, i. e., às vibrações da rede cristalina
(fonões).
0
Hiões−iões = Hiões,cin + Hf onões (1.54)
e também
0
He−ião = He−ião + He−f onão (1.55)
O termo fonão refere-se, como veremos, às excitações elementares que descrevem os
modos normais de vibração da rede cristalina.
Não é possível resolver rigorosamente o problema, como sabemos. Temos que recorrer a
aproximações. Em física do estado sólido fazem-se normalmente duas grandes simplifi-
cações:
30
IDENTIFICAÇÃO DAS QUESTÕES BÁSICAS
He refere-se, assim aos electrões inseridos num fundo de carga positiva uniforme. É
o modelo da geleia (”jellium”). A rede cristalina como que fica escondida no fundo,
enquanto que as propriedades do gás de electrões sobressaem. Muitas das propriedades
dos metais podem ser explicadas no âmbito desta aproximação. O problema do gás de
electrões quântico sem interacções será o primeiro a ser abordado, e sê-lo-á no início do
capítulo 2.
O modelo pode ser melhorado substituindo a distribuição uniforme de carga por uma
distribuição dos iões, supostos fixos, pelas suas posições de equilíbrio, R0i . A interacção
0
electrão-ião é então descrita pelo termo do hamiltoniano, He−ião . A simetria da rede
cristalina permite simplificar o problema que é de si complicado pela introdução dos iões.
O movimento dos iões pode ser descrito por um hamiltoniano que contenha também um
termo H− , que represente o fundo de carga negativa e a sua interacção com os iões.
podendo o segundo termo ser dividido de acordo com as equações 1.54 e 1.55. Este
hamiltoniano constitui a base do estudo da dinâmica da rede cristalina.
31
AS QUESTÕES BÁSICAS
dos movimentos dos electrões com os dos iões. Se separarmos esse termo, de acordo com
0
(1.55), e associarmos o termo He−ião ao termo He , o único acoplamento entre electrões
e iões é descrito pelo termo de interacção electrão-fonão, He−f onão , que pode, em geral,
ser abordado no âmbito da teoria das perturbações.
2. o movimento dos iões num fundo de carga negativa uniforme (devida aos electrões).
na qual as coordenadas dos iões se consideram fixas. A função de onda depende apenas
das coordenadas dos electrões. As coordenadas dos iões aparecem na função de onda
como parâmetros.
Se o último termo não existisse, esta seria a forma do hamiltoniano que desacoplava o
movimento dos electrões do movimento dos iões.
(Hiões + Ee ) φ = Eφ (1.61)
32
IDENTIFICAÇÃO DAS QUESTÕES BÁSICAS
na qual Ee depende das posições dos iões e portanto fornece uma contribuição dos elec-
trões para a energia potencial dos iões.
A equação (1.61) envolve apenas as coordenadas dos iões. Descreve, portanto, o movi-
mento dos iões.
O último termo da equação (2.3) faz o acoplamento dos electrões com os iões. Pode
demonstrar-se que dá origem apenas a uma pequena contribuição para a energia total
do sistema no estado Ψ.
Estas considerações pretendem apenas mostrar que esta aproximação básica envolve pro-
blemas que requerem uma análise bastante profunda. Não o faremos, no entanto, neste
curso introdutório.
De acordo com o exposto anteriormente, optámos então por fazer a nossa introdução
à física do estado sólido, depois deste capítulo introdutório, de acordo com a seguinte
sequência:
— As excitações elementares
— As interacções
— Estados localizados(?)
— ...
33
Página 34 (propositadamente em branco).
2.1 INTRODUÇÃO
m/~)3 1
f (E) = 3 [(E−k T )/kB T ] + 1
(2.1)
4π e B 0
em que ~ = h/2π.
37
IDEIAS BÁSICAS
~2 2
− ∇ ψ(r) = E ψ(r) (2.2)
2m
∂2 ∂2 ∂2
em que ∇2 = ∂x2 + ∂y 2 + ∂z 2 é o laplaciano.
~2 X 2
− ∇j Ψ(r1 , r2 , ...rj ...rN ) = E Ψ(r1 , r2 , ...rj ...rN ) (2.3)
2m j
em que as funções de onda Ψ(r1 , r2 , ...rj ...rN ) são produtos simples das funções de onda
monoelectrónicas ψj (rj ) ou determinantes de Slater. Uma vez que o spin não está in-
cluído neste hamiltoniano não relativista, podemos escrever as funções de onda como o
produto de funções de onda espaciais, ψj (rj ) e de uma componente de spin. Se expri-
mirmos a energia E como a soma das energias monoelectrónicas, Ej , então a equação
de Schrödinger 2.3 pode ser separada em equações monoelectrónicas nas quais só apare-
cem as funções de onda espaciais. Uma vez que foram desprezadas todas as interacções,
podemos obter o estado fundamental de N electrões livres e independentes, confinados
a um volume, V , pelo preenchimento sucessivo dos níveis de energia, que constituem a
solução da equação de Schrödinger independente do tempo 2.3, numa caixa de volume
V = Lx × Ly × Lz : A resolução desta equação conduz a funções de onda da forma:
1
ψk (r) = √ eik.r (2.4)
V
√
1/ V é o factor de normação, obtido a partir da condição V ψ ∗ ψ dr = 1.
R
38
TEORIA DE SOMMERFELD PARA OS METAIS
Os valores possíveis da energia que satisfazem a equação de Schrödinger são dados pela
expressão:
~2 k 2
Ek = (2.6)
2m
ou, separando as componentes1 ,
~2
kx2 + ky2 + kz2
Ek = (2.7)
2m
A escolha das condições fronteiras, quando pretendemos tratar de problemas que dizem
respeito às propriedades do sólido sem relação com efeitos de superfície, são escolhidas
de acordo com conveniências de ordem matemática. Pode, por exemplo, supor-se que o
metal é um cubo de aresta L = V 1/3 . Temos então, de impor à equação de Schrödinger,
condições aos limites, que confinem o electrão ao referido cubo. Uma possibilidade será
a de impor que a função de onda, ψ(r), seja nula nas superfícies do cubo, ψ(0) = 0
e ψ(x + L) = ψ(y + L) = ψ(z + L) = 0. Estas condições introduzem a quantificação
dos níveis de energia permitidos, mas não são aplicáveis à realidade física de um metal,
na medida em que estas funções de onda correspondem a ondas estacionárias (da forma
seno e co-seno) e por conseguinte não podem transportar corrente. Uma alternativa
consistiria em admitir que o cubo de metal tinha dimensões infinitas. Mais pragmático,
é porém, abolir, pura e simplesmente, as condições fronteiras. Isso consegue fazer-se,
imaginando que cada face do cubo se liga à face oposta, de tal modo que um electrão
que, caminhando no interior do metal, chegue à superfície, reentra de novo no metal, num
ponto correspondente da superfície oposta. Esta topologia não é fácil de visualizar, a não
ser a uma dimensão. A uma dimensão, estas condições fronteiras implicam simplesmente:
ψ(x + L) = ψ(x). Generalizando para três dimensões, obtêm-se as condições fronteira
cíclicas de Born-von Karmann:
ψ(x + L, y, z) = ψ(x, y, z)
ψ(x, y + L, z) = ψ(x, y, z) (2.8)
ψ(x, y, z + L) = ψ(x, y, z)
39
IDEIAS BÁSICAS
ou seja:
2π 2π 2π
kx = nx ; ky = ny ; kz = nz ; sendo nx , ny , nz inteiros (2.10)
L L L
Figura 2.1: a) Pontos num espaço dos k a duas dimensões. b) O volume no es-
paço dos k (espaço recíproco), tridimensional, ocupado por cada estado permitido é
3 3
Vk = 2πL
= (2π)
V
dN dN V
D(k) = = 3 = 3 (d3k = dk) (2.11)
dk d k (2π)
Partindo do princípio que os electrões são livres e independentes (não interactuam uns
com os outros, nem com os núcleos), podemos obter o estado fundamental (T = 0) do
gás de N electrões, preenchendo sucessivamente, os níveis de energia, começando pelo
nível definido por k = 0 e colocando 2 electrões por nível, até esgotar todos os electrões.
40
TEORIA DE SOMMERFELD PARA OS METAIS
ordem de 1022 electrões por cm3 . Atendendo ao princípio de exclusão de Pauli, e ao modo
de preenchimento dos níveis com os electrões, será necessário considerar um número de
níveis dessa mesma ordem de grandeza, implicando que as energias Ek , constituem um
quase-contínuo, podendo escrever-se, para efeitos de cálculo, Ek = E(k) como uma função
contínua de k. Não devemos, no entanto, esquecer que k é discreto. Uma vez que N
q o volume do espaço dos k, ocupado, será essencialmente uma esfera,
é muito grande,
de raio kF = 2 m~2EF , (Fig.2.2). A superfície, no espaço dos k, que separa os estados
ocupados dos estados vazios, designa-se por superfície de Fermi. A sua área é 4π kF2 .
Densidade Electrónica
1/3
kF = 3 π 2 n (2.13)
41
IDEIAS BÁSICAS
Z Z
Podemos também relacionar kF com o raio metálico, r0 , fazendo n = V0 = 4
r03
, donde
3π
vem 1/3
9πZ
r0 = /kF (2.14)
4
Neste modelo, é portanto muito simples calcular qualquer dos parâmetros, desde que
seja por exemplo, conhecida a massa específica (densidade) e o peso atómico. Os valores
de kF e r0 estão tabelados para todos os metais simples. Por ajustamento adequado
dos parâmetros, é possível ter uma descrição coerente com os valores experimentais das
observáveis bem definidas, nomeadamente n.
Densidade de estados
dN dN d3
D(E) = = 3 k (2.15)
dE dk dE
O valor de dNd3k
V
é a densidade de estados2 no espaço dos k e é igual a (2π) 3 . Para obter uma
expressão geral para D(E), é conveniente considerar o elemento de volume no espaço dos
k, d3k , como o produto de um integral de superfície, S(E) dS, ao longo da superfície de
R
energia constante, S(E), pelo diferencial dk⊥ , normal à superfície, (Fig. 2.3):
Z
3
dk = dk = dS dk⊥ (2.16)
S(E
2A dN dN dk
uma dimensão seria D(E) = dE
= dk dE
42
TEORIA DE SOMMERFELD PARA OS METAIS
Nesta expressão, aparece o módulo de ∇k E(k), para ter em conta que a densidade de
estados tem necessariamente um valor positivo.
Introduzindo o factor 2, uma vez que cada estado contém 2 estados de spin, obtém-se:
Z
V dS
D(E) = 2 (2.18)
(2π)3 S(E) |∇k E|
Esta expressão é geral para qualquer E(k), mesmo que a superfície de Fermi não seja
esférica. No modelo do gás de Fermi, o integral S(E) dS = 4πk 2 . Calculando ∇k E =
R
p
dE/dk = ~2 k/m e fazendo k = 2mE/~2 , obtém-se para a densidade de estados:
r
2V 4πk 2 Vm Vm 2mE
D(E) = 3 dE
= 2 2k= 2 2 (2.19)
(2π) dk π ~ π ~ ~2
É ainda usual tomar, como unidade de volume, o volume atómico, V0 = 34 πr03 , em que
r0 é o raio metálico, definido anteriormente. Obtém-se, então, depois de um rearranjo:
3/2
2m r02
1
D(E) = E 1/2 (2.21)
3π ~2
que representa o número de estados por unidade de energia e por átomo3 É, por vezes,
útil conhecer a densidade de estados na vizinhança do nível de Fermi, em termos de kF
ou de EF :
m kF 3 n
D(EF ) = 2 2 ou D(EF ) = (2.22)
~ π 2 EF
3 Asunidades são o eV (1 eV = 1.60219 × 10−19 J ) para a energia, o Å( 1 Å= 10−10 m), para a unidade
de comprimento e o volume do átomo para unidade de volume.
43
PROPRIEDADES TERMODINÂMICAS DO GÁS DE FERMI
Velocidade de Fermi
0
dk E(k) 0
dk ~2m 3 ~2 kF2 3
< E >= R kF = R kF = = EF (2.23)
dk dk 5 2m 5
0 0
valor que contrasta com o da teoria de Drude, na qual < E >= 21 m < v 2 >= 32 kB T .
Notar que a T = 0 K, o valor previsto por Drude seria zero, enquanto que no modelo
de Sommerfeld o valor é bastante grande, cerca de 100 vezes o valor de Drude para a
temperatura ambiente.
pelo que, por definição de nível de Fermi, como último nível preenchido a T = 0 K, vem:
limT →0
44
TEORIA DE SOMMERFELD PARA OS METAIS
1
f (E) = (2.27)
1+ e(E−EF )/kB T
O cálculo das propriedades dos sólidos envolve normalmente o cálculo da densidade elec-
trónica, n = N V , e da densidade de energia electrónica, u = VU ; (U = energia interna
total), que são dados pelas expressões:
Z +∞
n= D(E) f (E) dE (2.28)
−∞
Z +∞
u= D(E) f (E) E dE (2.29)
−∞
45
PROPRIEDADES TERMODINÂMICAS DO GÁS DE FERMI
com Z µ
∂g
G(µ) = g(E) dE; G”(µ) = (2.31)
−∞ ∂E E=µ
na qual retivemos apenas os dois primeiros termos, que são suficientes para a maior parte
dos problemas. Esta expansão tem o nome de expansão de Sommerfeld.
Vamos primeiramente ver como varia o potencial químico, µ, com a temperatura. Isso
vê-se fazendo com que a densidade electrónica, n, permaneça constante quando T varia.
Escrevemos o integral correspondente a n e expande-se em ordem a T . Neste caso
g(E) = D(E), que é a densidade de estados por unidade de energia e por unidade
de volume. Teremos
Z
π2 2
n = D(E) f (E) dE = G(µ) + (kB T ) G”(µ) (2.32)
6
Agora a energia de Fermi difere do seu valor ao zero absoluto, µ0 , por um termo de
segunda ordem em T , como veremos. Podemos, então, escrever
e
π2 2
n = G(µ0 ) + G0 (µ0 )(µ − µ0 ) + (kB T ) G”(µ) (2.34)
6
O primeiro termo é igual à densidade electrónica ao zero absoluto que por sua vez é igual
a n, i.e., G(µ0 ) = n. Podemos portanto resolver a equação 2.34 em ordem a µ, (e fazendo
µ ≈ µ0 ) de modo a obter o resultado de segunda ordem em T .
π 2 G”(µ0 ) 2 π 2 D0 (µ0 ) 2
µ = µ0 − 0
(kB T ) = µ0 − (kB T ) (2.35)
6 G (µ0 ) 6 D(µ0 )
46
TEORIA DE SOMMERFELD PARA OS METAIS
Poderia assim verifica-se, como dissemos, que µ difere de EF em apenas cerca de 0.0%,
mesmo à temperatura ambiente, devido à contribuição em T 2 .
π2
Z
2
u = D(E) f (E) E dE = G(µ) + G”(µ) (kB T ) + . . . (2.37)
6
π2 2
u = u0 + (kB T ) D(EF ) (2.38)
6
Podemos agora obter o calor específico electrónico, que é a derivada da energia electrónica
em ordem a T e que pode ser calculado directamente, retendo apenas os termos de menor
ordem em T e fazendo como anteriormente µ ≈ µ0 = EF .
du π2 2
Cv = = D(EF ) kB T (2.39)
dT 3
π 2 kB T
Cv = n kB (2.40)
2 EF
Nos metais simples, a densidade de estados é da ordem de 1/EF e cada derivada de D(E)
contem um factor adicional da ordem de 1/EF . Assim o nosso termo de expansão foi
47
PROPRIEDADES TERMODINÂMICAS DO GÁS DE FERMI
kB T /EF , que é da ordem de 1/200. Note-se, em primeiro lugar (expressão 2.39), que
a contribuição electrónica para o calor específico é directamente proporcional à densi-
dade de estados na vizinhança do nível de Fermi. Em segundo lugar, note-se que essa
contribuição é linear com a temperatura e portanto tende para zero quando T → 0.
Note-se ainda que o calor específico electrónico é da ordem de kB T multiplicado pela
densidade de estados, tudo multiplicado pelo valor clássico por electrão. Fisicamente,
isto significa que o calor específico electrónico envolve apenas os electrões com energias
da ordem de kB T relativamente à energia de Fermi. Os electrões com energias muito
abaixo do nível de Fermi estão impedidos de ser excitados porque os estados vizinhos
estão ocupados. Verifica-se ainda que a contribuição electrónica para o calor específico
é muito pequena comparada com o valor da contribuição das vibrações da rede crista-
lina, como veremos. No entanto, a muito baixas temperaturas a contribuição electrónica
é dominante, uma vez que como veremos, o calor específico da rede varia com T 3 . A
expressão (2.39) permite-nos calcular a densidade de estados no nível de Fermi a par-
tir de resultados experimentais do calor específico a muito baixas temperaturas. Esta
densidade de estados no nível de Fermi é de grande importância para a compreensão de
muitas das propriedades dos metais.
Figura 2.6: Calor específico de um metal. O calor específico total contem também
a contribuição devida às vibrações dos átomos em torno das posições de equilíbrio.
Para um metal como o níquel, que tem um calor específico electrónico elevado devido
à contribuição dos níveis d para a densidade de estados no nível de Fermi, a gama de
temperaturas representada na figura é da ordem de 20 K.
48
TEORIA DE SOMMERFELD PARA OS METAIS
do nível de Fermi de cerca de kB T para cima do nível de Fermi. Uma vez que o nú-
mero de electrões que é transferido é da ordem de kB T D(EF ), a variação de energia é
2 2
kB T D(EF ). Esta estimativa difere da avaliação rigorosa feita acima de um factor π 2 /6.
Os electrões longe do nível de Fermi não são afectados porque não existem estados vazios
que possam ocupar.
Quando uma força é aplicada ao gás de electrões, a esfera de Fermi vai deslocar-se como
indicado na Fig. 2.7 até atingir um estado estacionário em que a força aplicada e as
colisões se equilibram dinamicamente. Por razões que serão claras quando estudarmos
a equação de Boltzmann, apenas os electrões junto à superfície de Fermi são acelerados
(uma vez que existem estados disponíveis para estes electrões aumentarem a sua energia
cinética) e sofrem colisões. Por isso, no cálculo do livre percurso médio, deve agora
utilizar-se a velocidade de Fermi, vF .
49
PROPRIEDADES TERMODINÂMICAS DO GÁS DE FERMI
1 2
κ= v τ Cv (2.41)
3 F
Uma vez que o calor específico calculado utilizando a estatística de Fermi-Dirac é mais
pequeno do que o estimado classicamente por Drude de um factor da ordem de kB T /EF ,
e que a estimativa de Sommerfeld para v 2 é mais elevada do que o valor clássico de um
factor da ordem de EF /kB T , é possível reescrever a lei de Wiedermann-Franz, eliminando
τ : A lei de Wiedermann-Franz continua a verificar-se, sob a forma:
2
π2
κ kB
= T (2.42)
σ 3 e
Verifica-se que obtemos o valor obtido fortuitamente por Drude, devido à compensação
de duas correcções da ordem de EF /kB T .
O poder termoeléctrico, pode agora ser derivado introduzindo o calor específico de Som-
merfeld:
π 2 ~ kB T
S=− (2.43)
6 e EF
O valor obtido é mais pequeno do que a estimativa de Drude de um factor da ordem de
kB T /EF , cerca de 0.01 à temperatura ambiente.
50
TEORIA DE SOMMERFELD PARA OS METAIS
Uma vez que um buraco no estado ψk0 corresponde realmente à remoção de um electrão
do sistema, a criação do buraco corresponde à remoção de uma energia εk0 . A energia
do buraco é portanto negativa:
εbk0 = −εk0
51
PROPRIEDADES TERMODINÂMICAS DO GÁS DE FERMI
Mas para criar o buraco tenho de despender εk0 — tenho que gastar essa energia para
remover o electrão.
O spin total do gás de Fermi, no estado fundamental, é também nulo, uma vez que para
cada valor de k existem dois estados de spin, ms = +1/2 e ms = −1/2, ou, de um modo
mais geral, σ e −σ.
Figura 2.9: No estado excitado, alguns electrões saem para fora da esfera de Fermi.
gás de Fermi como o estado designado por “vácuo” , ignorando nesta descrição todos os
electrões da esfera de Fermi totalmente preenchida. Uma excitação resulta na criação
de um electrão fora da esfera de Fermi e de um buraco (estado não ocupado) dentro da
esfera de Fermi. Este buraco pode ser considerado uma quase-partícula.
52
TEORIA DE SOMMERFELD PARA OS METAIS
em que nkσ toma os valores 0 se o estado não ficar ocupado e o valor 1 se o estado
for ocupado—é o número de ocupação. Daqui resulta que não contamos estados vazios
(ocupados por buracos). k é o índice associado ao momento ou vector de onda (ou número
de onda) e σ é o spin. A primeira parcela da direita é a soma das energias de todos os
estados ocupados dentro e fora da esfera de Fermi. A segunda parcela corresponde a E0 ,
que é o valor da energia da esfera de Fermi completamente cheia, ou seja, a energia do
estado fundamental ou vácuo. É fácil verificar que, através de um rearranjo da expressão
acima, se obtém ∆E como a soma das energias dos electrões acima do nível de Fermi e
dos buracos abaixo do nível de Fermi.
cada buraco num estado kσ contribui com um momento −~k para o balanço do momento.
Neste formalismo, fazemos como que uma contabilidade ou recenseamento dos electrões
do sistema, somando apenas as energias dos estados ocupados, como é lógico.
Três aproximações importantes formam a base dos modelos desenvolvidos até agora: a
aproximação do electrão livre, a aproximação do electrão independente e a aproximação
do tempo de relaxação. Na aproximação do electrão livre, ignora-se: i) o efeito dos
átomos sobre os electrões entre colisões (esta constitui a aproximação do electrão livre
num sentido restrito); ii) de que modo é que os electrões colidem com os iões; iii) o
movimento iónico. Na aproximação do electrão independente, ignoram-se as interacções
interelectrónicas. Finalmente, na aproximação do tempo de relaxação, assume-se que o
tempo de relaxação τ é uma constante independente de qualquer outra grandeza (por
exemplo, energia, temperatura, etc.), e também que o sistema perde a memória após
cada colisão.
Procedemos agora a uma enumeração das falhas mais importantes dos modelos de elec-
trão livre. Uma série de problemas encontrados será resolvido quando se levantar a
aproximação do electrão livre no seu sentido restrito, isto é, quando se considerar a
influência da rede cristalina nas propriedades electrónicas entre colisões. Entre estes
problemas, encontram-se o do sinal do efeito de Hall e do poder termoeléctrico, o facto
experimental de que a condutividade eléctrica é um tensor, a existência de contribui-
ções adicionais para a condutividade a.c. além do termo de Drude, como determinar
quais são os electrões de valência que contribuem para o gás de electrões, e, finalmente,
53
LIMITAÇÕES DO MODELO DO ELECTRÃO LIVRE
O modelo do gás de Fermi ignorava a existência dos iões, no que dizia respeito às in-
teracções coulombianas. Apenas admitia a sua existência como objectos com os quais
os electrões colidiam. Embora bem sucedido em explicar muitas das propriedades dos
metais, não explica porque é que alguns sólidos são metais e outros isoladores. Também
não explica, por exemplo, porque é que alguns metais têm coeficientes de Hall positivos,
indicando a presença de cargas móveis positivas.
Veremos mais tarde como a introdução de um potencial periódico, criado pelos iões
nas suas posições de equilíbrio, afecta o comportamento dos electrões, explicando assim
muitas outras propriedades dos sólidos.
Podemos, numa outra perspectiva, partir dos átomos livres, aproximá-los até ás posições
de equilíbrio num cristal e vêr como os níveis atómicos se separam em grupos de níveis
que formam bandas de energia.
Seja qual for o ponto de partida, constata-se que a consideração de um potencial periódico
implica a existência de bandas de energia permitidas, separadas por hiatos de energia ou
bandas proibidas. A esta descrição da estrutura electrónica dos sólidos, dá-se o nome de
estrutura de bandas. Ela é crucial para a compreensão das propriedades dos sólidos, tal
como a estrutura electrónica dos átomos isolados é determinante das suas propriedades
físicas e químicas.
54
TEORIA DE SOMMERFELD PARA OS METAIS
No capítulo seguinte faremos uma breve análise da simetria translacional, dos tipos de
estruturas cristalinas e dos conceitos de espaço recíproco e de zonas de Brillouin, que
permitem compreender as reflexões de Bragg.
PROBLEMAS
3. . . .
55
Página 56 (propositadamente em branco).
3.1 INTRODUÇÃO
Olhemos para uma tabela periódica dos sólidos1 (3.1) e comecemos por considerar os
gases raros—o hélio (He), o néon (Ne), o árgon (Ar), o crípton (Kr), etc. Estes elemen-
tos têm estruturas electrónicas muito estáveis. Os seus níveis de energia ocupados estão
totalmente preenchidos. As forças entre átomos do mesmo elemento são necessariamente
fracas. São forças de van der Waals, devidas apenas a flutuações na simetria das suas
densidades electrónicas. Por isso são muito pouco reactivos e são gases nas condições nor-
mais de pressão e temperatura. A baixas temperaturas, solidificam, formando estruturas
compactas, cúbicas de faces centradas (Fig.??), ou hexagonal (Fig.??). Note-se que
1 Esta versão da tabela periódica, agrupando os elementos de acordo com as propriedades no estado
sólido é devida a Harrison, (ver p. ex.: Walter Herrison, Electronic Structue and the Properties of
Solids, Freeman, 1980).
59
INTRODUÇÃO
a) b)
Figura 3.2: a) Arranjo dos átomos numa estrutura cúbica de faces centradas. b)
Estrutura hexagonal compacta.
Passando agora para a coluna à esquerda da dos gases raros, encontramos o hidrogénio
(H), o flúor (F), o cloro (Cl), o bromo (Br), o iodo (I), etc. A estes elementos falta um
electrão na última camada para terem a estrutura electrónica de um gás raro. Nestas
condições, a tendência é para formarem uma ligação química na qual partilham os elec-
trões com os átomos vizinhos formando moléculas diatómicas, como o F2 , o Cl2 , etc.
No estado sólido estas moléculas geram forças de van der Waals, fracas, dando origem a
sólidos de muito baixo ponto de fusão.
O hidrogénio também poderia estar por cima da lítio, na medida em que tem um electrão
na orbital 1s. Nesse caso deveria ser um metal, como o lítio. E é a pressões superiores a
260 GPa e à temperatura de 30 K.
Nestes sólidos, a tendência é que o elemento que está à direita perca um electrão, tomando
a estrutura de gás raro, e que o elemento que está à esquerda receba esse electrão,
tomando também a estrutura de gás raro. Forma-se assim uma ligação iónica, como no
caso do cloreto de sódio, Na+ Cl− . Este é um tipo de ligação onde a coesão é mantida
pelas forças de atracção electrostática. As suas estruturas cristalinas são, em geral,
descritas como a combinação de duas estruturas cúbicas idênticas, interpenetradas, de
modo a satisfazer a neutralidade eléctrica. Sendo esta uma estrutura típica, diz-se que
os sólidos que têm este tipo de estrutura, têm a estrutura do cloreto de sódio.
60
TIPOS DE SÓLIDOS E SIMETRIA
a) b)
Consideremos agora um sólido como o arseneto de gálio (GaAs), que é formado por um
elemento à esquerda, o gálio, e um à direita, o arsénio, relativamente ao germânio que é
um sólido covalente típico. Este sólido tem o mesmo tipo de estrutura que o germânio.
Acontece, porém, que o gálio recebeu um electrão do arsénio, ficando com uma ligação
parcialmente iónica. O mesmo raciocínio poderia ser aplicado a sólidos, como o sulfureto
de cádmio (CdS), onde dois electrões transitam do enxofre para o cádmio formando uma
ligação mista, isto é, com carácter simultaneamente iónico e covalente. A estrutura típica
destes sólidos com ligação mista é a da blenda de zinco (ZnS) (ver Fig.??). São exemplos,
os semicondutores III-V (GaAs, etc.) e os semicondutores II-IV (CdS, etc), que, tal como
o silício e o germânio são materiais de grande importância na indústria electrónica, sendo
os semicondutores III-V e II-IV, particularmente importantes para a chamada electrónica
rápida e lasers de estado sólido. As suas estruturas cristalinas consistem em duas redes
de Bravais cúbicas de faces centradas, interpenetradas e deslocadas ao longo da diagonal
da célula cúbica (1/4 do comprimento da diagonal).
61
SIMETRIA NOS CRISTAIS
O diamante tem estrutura idêntica, na qual os átomos designados na figura por "anião" e
"catião" são átomos idênticos de carbono (C). Neste tipo de estruturas, a célula primitiva
tem dois átomos e cada átomo está ligado a 4 vizinhos que ocupam os vértices de um
tetraedro (ligação covalente por coalescência de orbitais híbridos sp3 ).
Poderíamos elaborar um pouco mais estas considerações introdutórias mas deixemos isso
para mais tarde. Por agora consideremos a importância da simetria nos cristais.
Uma rede de Bravais é um arranjo infinito de pontos discretos, no espaço (um por cada
célula primitiva), com simetria translacional.
Os pontos da rede de Bravais podem ser definidos por vectores de translação, T, da forma
T = n1 a + n2 b + n3 c (3.1)
em que os vectores base a, b, c são quaisquer três vectores de translação, não complanares
e n1 , n2 , n3 são números inteiros. T representa uma translação, tal que, quaisquer dois
pontos, r e r0 , numa rede, estão relacionados por uma expressão da forma r0 = r + T,
como se mostra na figura 3.4 para uma rede a duas dimensões, em que T = 2a + b
é um vector de translação. Todos os pontos da rede são definidos por combinações
lineares destes vectores, com coeficientes inteiros. Note-se que pode ser escolhido, como
base, qualquer conjunto de vectores cujas combinações lineares com coeficientes inteiros
definam a mesma rede.
Os vectores a, b, c, definem uma célula que se pode tomar como célula unitária. A célula
unitária é, assim, um volume que, por aplicação sucessiva de translações, preenche todo
62
TIPOS DE SÓLIDOS E SIMETRIA
o espaço, sem sobreposição. Note-se, que, para uma dada rede de Bravais, há vários
conjuntos de vectores base possíveis e por conseguinte várias células unitárias possíveis.
Por conveniência, pode optar-se por uma célula unitária convencional, escolhida de modo
a ser mais intuitiva e evidenciar melhor as simetrias. Essa célula pode ser maior do que
a célula primitiva, e conter portanto mais do que um ponto (nó) da rede de Bravais.
Pode ainda optar-se por colocar cada ponto da rede de Bravais no meio de cada célula
primitiva, Fig.3.5. A célula assim definida contem as posições do espaço que são mais
próximas do nó da rede considerado do que quaisquer outras. Essa célula tem o nome de
célula de Wigner-Seitz. Pode construir-se do seguinte modo:
63
SIMETRIA NOS CRISTAIS
Os 6 lados da célula bissectam as linhas que unem o ponto da rede aos seus vizinhos
próximos
b b b
a a a
b b
a a
Estruturas cristalinas
A rede de Bravais, juntamente com os átomos ou moléculas nas suas posições de equilíbrio
(base de átomos) constituem a estrutura cristalina.
2 Entende-sepor eixo de simetria rotacioanl de ordem n quando uma rotação de 2π/n, em torno desse
eixo, conduz o sistema a uma configuração idêntica à configuração inicial.
64
TIPOS DE SÓLIDOS E SIMETRIA
65
SIMETRIA NOS CRISTAIS
As figuras 3.8, 3.9, bem como a figura ?? mostram alguns tipos de estruturas cristalinas
comuns. Na estrutura cúbica de corpo centrado ou cúbica I, os vectores base são da
forma: a = a ex , b = a ey , c = a ez . Alguns metais elementares como o ferro (a=2.87
Å), o césio (a=6.05 Å) e o crómio (a=2.88 Å) têm este tipo de estrutura. O cubo é a célula
convencional, e tem 2 átomos com coordenadas (0,0,0) e (1/2, 1/2, 1/2) em termos de a. A
célula
√ primitiva tem apenas um átomo. A célula primitiva é um romboedro de lado igual a
1 0 a 0 a
2 3 a e pode ser definida pelos vectores: a = 2 (ex + ey − ez ); b = 2 (−ex + ey + ez );
c0 = a2 (ex − ey + ez ).
66
TIPOS DE SÓLIDOS E SIMETRIA
A estrutura hexagonal compacta (Fig. ??) pode ser vista como a sobreposição de duas
redes hexagonais simples, uma das quais foi rodada de 60o relativamente à primeira. Na
rede hexagonal simples a = b 6= c. a e b formam um ângulo
√ de 60o e c é perpendicular
a 3a
ao plano ab. Os vectores base são: a = aex , b = 2 ex + 2 ey e c = cez . Na estrutura
hexagonal compacta as coordenadas dos 2 átomos da célula primitiva (definida pelos
vectores a, b, c) são (0 0 0) e (2/3, 1/3, 1/2).
As operações dos grupos pontuais em cristais são menos do que as que existem em
moléculas, porque num cristal todo o espaço deve ser preenchido. Por exemplo, só existem
rotações de 60o e 90o ou múltiplos desses valores. Estas limitações reduzem os grupos
pontuais para cristais a 32 grupos distintos e todas as estruturas cristalinas podem ser
classificadas como tendo uma dessas simetrias. Também se podem classificar os cristais
de acordo com os grupos espaciais, havendo 230 grupos espaciais diferentes. O estudo
destes grupos constitui a crsitalografia.
Tensores Físicos
67
SIMETRIA NOS CRISTAIS
68
TIPOS DE SÓLIDOS E SIMETRIA
J = σE
sendo σ o tensor, que não é mais do que uma matriz de componentes σij que representa
a condutividade do cristal. Qualquer operação de simetria que deixe o cristal invariante,
deixa também o tensor da condutividade invariante.
Pode demonstrar-se que, em cristais com certos tipos de simetria, como nas estrutiras
cúbicas, o tensor da condutividade se reduz a um escalar, implicando que a condutividade
é isotrópica. Para tal, teremos de aplicar as operações do grupo de simetria do cristal ao
tensor e ver como ele se comporta.
σ 0 = S σ S −1
69
ESPAÇO RECÍPROCO
Uma vez que os electrões se comportam como ondas, eles podem sofrer reflexões devido
à periodicidade da rede cristalina. Essas reflexões chamam-se reflexões de Bragg. A sua
discussão vai conduzir-nos às noções de espaço recíproco e de zonas de Brillouin.
No caso simples de uma rede bidimensional, de vectores base ortogonais, as ondas planas
com a periodicidade da rede e que se propagam na direcção de a, têm vectores de onda
da forma k = 2π
a n1 ex , sendo n1 , um número inteiro, como se pode ver na figura 3.11.
70
TIPOS DE SÓLIDOS E SIMETRIA
Extrapolando para três dimensões, as ondas planas, com a periodicidade da rede e que
se propaguem na direcção dos outros vectores base terão forma correspondente, nome-
adamente, k2 = 2π 2π
b n2 ey e k3 = c n3 ez . Esta forma sugere a definição de um espaço,
chamado espaço recíproco, com vectores base da forma:
2π
g1 = a ex
2π
g2 = b ey
2π
g3 = c ez
Note-se que, mesmo no caso geral, de vectores base não ortogonais, teremos sempre
ei [G.(r+T)] = ei (G.r) (3.2)
uma vez que as ondas planas da forma ei (G.r) têm a periodicidade da rede.
ei (G.T) = 1 (3.3)
Note-se que uma rede recíproca é definida relativamente a uma rede de Bravais particular.
A rede de Bravais que determina uma dada rede recíproca pode chamar-se rede directa,
quando considerada em relação à sua recíproca.
A expressão 3.2 pode ser generalizada para qualquer função periódica com a periodicidade
da rede de Bravais. De facto, a simetria translacional implica, para qualquer função f (r)
f (r + T) = f (r) (3.4)
para todos os pontos r do espaço e para todos os vectores T. Nessas circunstâncias pode
escrever-se f (r) sob a forma de série de Fourier:
X
f (r) = AG ei (G.r)
G
Z (3.5)
1
AG = f (r) e−i (G.r) dr
Vc clula
71
ESPAÇO RECÍPROCO
2π 2π 2π
G = h g1 + k g2 + l g3 = h ex + k ey + l ez (3.6)
a b c
T = n1 a + n2 b + n3 c = n1 a ex + n2 b ey + n3 c ez (3.7)
(G.T) = (h n1 + k n2 + l n3 ) 2π = 2π m (m=inteiro)
pelo que
(g1 .a) = 2π (g1 .b) = 0 (g2 .a) = 0 (g3 .a) = 0
(g2 .b) = 2π (g1 .c) = 0 (g2 .c) = 0 (g3 .b) = 0
(g3 .c) = 2π
ou seja
(
1 se i = j,
(gi .τ j ) = 2π δij ; τ j = a, b, c ; δij = (3.8)
0 se i 6= j.
Relações que também devem ser válidas para eixos não ortogonais.
Da relação (gi .τ j ) = 0 com (j 6= i), conclui-se que os gi são normais aos τ j quando
j 6= i, e consequentemente,
g1 = constante.b × c
72
TIPOS DE SÓLIDOS E SIMETRIA
forma
b×c
g1 = 2π
a. (b × c)
c×a
g2 = 2π (3.9)
a. (b × c)
a×b
g3 = 2π
a. (b × c)
que se pode tomar como definição. a. (b × c) = Vc é o volume da célula unitária.
Pode verificar-se que esta definição, de facto, satisfaz a definição de rede recíproca (ex-
pressão 3.3).
Os vectores G que geram a rede recíproca, são translações dessa rede e podem portanto
escrever-se sob a forma
Notar que as unidades do espaço recíproco são L−1 (m−1 , cm−1 , Å−1 , etc.). Os parâ-
metros de rede (módulos dos vectores a, b, c) para uma rede cristalina real são da ordem
do Å (10−10 m) pelo que os valores dos módulos de G são da ordem do Å−1 (1010 m−1 ).
73
ESPAÇO RECÍPROCO
(10)
r'
T
r'
T
g2
b
θ d 10
a
d10 G= g 1
(10)
d
d
74
TIPOS DE SÓLIDOS E SIMETRIA
Por outras palavras, todos os vectores T que, para um dado G satisfazem a equação
3.14, terminam num plano normal a G. Então cada vector G, isto é, os seus indices h k l,
podem ser usados para indicar um conjunto de planos da rede directa. Uma vez que só
a direcção de G interessa, os h k l são definidos a menos de um factor comum. Se este
factor for escolhido de modo a que os h k l sejam os menores inteiros possíveis, G é (para
uma dada direcção) a mais curta translação na rede recíproca.
De facto, é fácil verificar (ver Fig. 3.13) que n e n0 relativos a planos adjacentes, diferem
apenas de uma unidade, pelo que
2π(n − n0 )
dhkl = d − d0 =
|G|
75
ESPAÇO RECÍPROCO
A Fig.3.14. poderá ajudar a visualizar estas relações entre a rede directa e a rede
recíproca.
iii) Os índices de Miller, h k l, são os inversos das intersecções dos respectivos planos
com as direcções a, b, c, depois de suprimidos factores comuns, (Fig.3.15a). Note-se
que a equação de um plano pode ser escrita como xx0 + yy0 + zz0 = 1, sendo x0 , y0 ,
z0 as intersecções com os respectivos eixos. Portanto a equação do plano (h k l) pode
escrever-se: hx + ky + lz = 1. Se considerarmos a direcção a, teremos na expressão
c
c c
c/l
b
b/k b b
a/h a
a a
(200) (110)
a) Eixos intersectados por
b) Planos (200) b) Planos (110)
plano cristalino (hkl)
Figura 3.15: Os planos cristalinos são definidos pelos inversos das intersecções
com os eixos cristalinos (a/h, b/k, c/l) e designados por (h k l). Na figura estão
representados os planos (200) e (110). Note-se por exemplo que um plano (200)
corta os eixos a, b, c para os valores a/2, ∞ e ∞, respectivamente, sendo
portanto os seus inversos 2, 0, 0.
76
c c
c/l
b
b/k b b
a/h a
a a
(200) (110)
a) Eixos intersectados por !
b) Planos (200) b) Planos (110)
! plano cristalino (hkl)
Fig. 2.31. Os planos cristalinos são designados pelos inversos das intersecções com os eixos cristalinos (a/h, b
e designados por (h k l). Na figura estão representados os planos (200) e (110). Note-se por exemplo que um
(200) corta os eixos a, b, c para os valores a/2, ∞ e ∞, respectivamente, sendo portanto os seus inv
2, 0, 0.
TIPOS DE SÓLIDOS E SIMETRIA
Os índices negativos são representados com o sinal menos sobre o índice. Na Fig. 2.32 repres
-
plano (11 1) e o vector G = g1 - g2 + g3 que lhe é normal.
(3.14), n2 = n3 = 0 e portanto n1 = n/h. A distância à origem, da intersecção do plano
Os planos
que corta a nestas condições representam-se
é dada, em unidadespor de(hkl)
a =e |a|,
o conjunto
por d1 =den/h.
todosDo
os mesmo
planos simetricamente equivale
modo, considerando representam-se por {hkl}.
as outras direcções, As direcções
teremos d2 = n/k nume dcristal podem
3 = n/l. também
Os seus ser indicadas por três índices,
inversos,
depois de suprimirrepresentam
o factor comum n, são h k l. Na Fig. 3.15 representa-se um plano
as suas componentes nas direcções a, b, c. Os três inteiros menores com a mesma rel
(h k l) e as suas intersecções com os eixos, e os planos (200) e (110), como exemplo.
entre eles são os índices da direcção e representam-se por [hkl]. Na maior parte dos cristais (mas não
Os índices negativostodos)
são estes índices são
representados comoso mesmos
sinal menos que sobre
os índices de Miller
o índice. Na Fig.dos3.16
planos a que esta direcçã
representa-se o plano (1 1̄ 1)
perpendicular.e o vector G = g1 − g 2 + g 3 que lhe é normal.
-
[111]
-
Fig. 2.32. Representação da direcção [111] e do
-
c (111). Os índices negativos são representados com
menos sobre o índice. Para os planos usam-se pa
curvos, (hkl) e para as direcções normais a esses
b-
(111) usam-se parentesis rectos [hkl].
a
Análise de von da
Figura 3.16: Representação Laue
direcção [1 1̄ 1] e do plano (1 1̄ 1). Os índices
negativos são Consideremos
representadosacom
Fig. o2.33,
sinalidêntica
menos àsobre
Fig.2.25, mas onde
o índice. Paraseosrepresenta
planos também o vector Ghkl que
usam-se parêntesis curvos, (h k l) e para as direcções normais a esses planos
conjunto dos planos (hkl).
usam-se parêntesis rectos [h k l].
77
DIFRACÇÃO
planos (de átomos) à distância d uns dos outros, se a diferença de percurso entre dois
raios paralelos for um múltiplo do comprimento de onda de (2d sin θ = nλ).
2d sin θ = n λ (3.17)
a) λ b)
λ
(k=2π/λ) (k’=2π/λ)
k’
θ
G
d
θ
d sen θ d sen θ
k
θ
|G|=2k sen θ
Figura 3.17: a) Uma onda plana (e.g. feixe de raios-X) será reflectida pela família
de planos (de átomos) à distância d uns dos outros, se a diferença de percurso
entre dois raios paralelos for um múltiplo do comprimento de onda (2d sin = nλ).
É a conhecida lei de Bragg. b) A condição de Laue implica que sempre que é
satisfeita a condição ∆k = G existe interferência construtiva. E como se pode
2π
ver na figura, |G| = 2k sin θ, e d = |G |, as duas relações são equivalentes.
Embora a difracção possa ser usada para a determinação de estruturas cristalinas, o seu
fundamento é relevante para muitos fenómenos da física do estado sólido, e pode ser
generalizado para muitas situações em que há interacção da radiação electromagnética
com a matéria no estado sólido, nomeadamente com cristais.
78
TIPOS DE SÓLIDOS E SIMETRIA
Consideremos um cristal com os átomos fixos nas suas posições de equilíbrio, o que gera,
naturalmente, um potencial periódico. Se fizermos incidir sobre o cristal um feixe de
partículas ou ondas (e.g., electrões, neutrões, raios-X) em que cada uma delas se propaga
com vector de onda k, temos que a probabilidade de difracção, ou reflexão, que provoca
a transição para um estado de vector de onda k0 é proporcional ao momento de transição
Z
hk |V |ki = ψk∗ 0 (r) V (r) ψk (r) d r
0
sendo dr, o elemento de volume. Podemos expandir V (r) em série de Fourier, de acordo
com 3.5, V (r) = G VG ei(G.r) em que G é um vector da rede recíproca. Considerando
P
que a onda incidente é da forma ψk (r) = ei(k.r) e que a onda difractada ou reflectida é da
0
forma ψk0 (r) = ei(k .r) , que é a situação de, por exemplo, radiação electromagnética, ou
electrões livres (gás de Fermi), a probabilidade da transição é proporcional ao momento
de transição, que será da forma
Z Z
0
−i(k0 .r) i(G.r) i(k.r)
VG ei[(k+G−k ).r] dr
X X
0
hk |V |ki = VG e e e dr = (3.18)
G G
∆k = k0 − k = G (3.19)
Atendendo a 3.16 e 3.19, que implica |G| = 2k sin θ, como se pode ver na figura 3.17 b),
e e a que k = 2π/λ, chega-se inevitavelmente à lei de Bragg, 2 d sin θ = nλ.
Vejamos qual a contribuição dos vários átomos da célula unitária para a intensidade da
difracção, ou de um modo geral, da probabilidade da transição de um estado k para
um estado k0 de qualquer partícula/onda, que se propague no seio de um cristal. É
natural que qualquer partícula/onda que se propague no interior de um cristal interactue
com os electrões dos átomos, uma vez que os núcleos estão blindados pela distribuição
electrónica. A partícula/onda irá sentir o potencial periódico V (r) devido às núvens
electrónicas envolventes dos núcleos, que nesta primeira aproximação, consideramos fixos,
nas suas posições de equilíbrio. Esse potencial periódico no ponto r será naturalmente
79
DIFRACÇÃO
e-
r - Rj
Átomo
Rj r
0 Célula unitária
Figura 3.18: Célula unitária onde se indica a posiçde um átomo, Rj , bem como
a posição de um electrão pertencente a esse átomo, relativamente à origem r, e
relativamente à posição do átomo, r − Rj , considerado pontual.
a sobreposição dos potenciais centrados nos vários átomos em posições Rj . V (r) será
portanto da forma (ver Fig.3.18)
N
X
V (r) = v (r − Rj )
j=1
Se usarmos ondas planas como base de expansão das funções de onda, o elemento matri-
cial hk0 |V |ki será dado por
Z N
0 1 0 X
hk |V |ki = e−i(k .r) v (r − Rj ) ei(k.r) d r
Vcristal j=1
Trocando a ordem do somatório pelo integral e multiplicando e dividindo cada termo por
0
ei(k −k).Rj e se considerarmos ainda que o volume do cristal é o número de células, Nc ,
vezes o volume da célula, Vc , (V = Nc Vc ), vem
N Z
1 X −i[(k0 −k).Rj ] 1 0
hk0 |V |ki = e e−i[(k −k).(r−Rj )] v (r − Rj ) d r
Nc j=1 Vc
Considerando que existem s átomos por célula, o primeiro somatório pode ser factorizado
numa soma sobre as s posições em cada célula primitiva e numa soma estendida a todas
as translações:
" #
N s
0 0 0
e−i(k −k).Rj = e−i(k −k).Rj e−i(k −k).T
X X X
j=1 j=1 T
80
TIPOS DE SÓLIDOS E SIMETRIA
De acordo com 3.18 e 3.19 (condição de Laue) o momento da transição só será não nulo
se k0 − k = G, só havendo difracção ou reflexões de Bragg se essa condição for satisfeita.
s
X
SG = e−iG.Rj (3.21)
j=1
6É
fácil demonstrar, usando uma expressão (2.97(?)), que vem adiante, para k. Teremos, a uma dimensão:
PN −i n 2π ma PN −i m0 2π √
= N N
P
me = m0 e N 1 = 0 (a soma das raízes de índice N de 1 é nula).
N a
m0
81
DIFRACÇÃO
Combinando SG com fGj obtém-se o factor de estrutura (total) (SG é apenas a compo-
nente geométrica). Poderíamos escrever para o factor de estrutura total,
s
X
VG = fGj e−iG.Rj (3.23)
j=1
A título de exemplo determinemos o factor de estrutura para uma rede cúbica de corpo
centrado. Existem dois átomos por célula unitária (cubo de aresta a) com coordenadas
em termos do parâmetro a (uj vj wj ), respectivamente (0 0 0) para j = 1 e ( 1/2 1/2
1/2 ) para j = 2. Usando a expressão do factor de estrutura, e atendendo a que só existe
um tipo de átomos cujo factor de forma supomos f , vem:
n
X n
X
−i(G.rj
VG = fj (G) e = fj (G) e−i2π(uj h+vj k+wj l)
j=1 j=1
h i
= f 1 + e−iπ(h+k+l)
= 2f se h + k + l = par
=0 se h + k + l = ímpar
Vê-se assim que, para uma estrutura cúbica de corpo centrado, só os planos cujos índices
de Miller somam um número par, dão origem a picos de difracção.
Determinação de Estruturas
82
TIPOS DE SÓLIDOS E SIMETRIA
Por seu turno, feixes de electrões com velocidades da ordem de 2 × 107 m s−1 , (acelera-
dos por uma diferença de potencial da ordem de 4 kV) têm comprimentos de onda da
ordem de 0.04 nm (0.4 Å) podendo ser também utilizados para análise de estruturas.
Existem também métodos baseados em feixes de neutrões térmicos (moderados) que têm
comprimentos de onda idênticos.
O conhecimento dos ângulos de difracção, que se pode obter a partir das posições dos
picos de difracção num alvo (película fotográfica ou detector) dá-nos informação sobre as
distâncias entre os planos de cada família. As intensidades dos picos de difracção contêm
os factores de estrutura (I = |VG |2 ) pelo que é possível, por métodos iterativos, obter
informação sobre a posição (coordenadas) dos átomos.
Um feixe de raios X com vector de onda k (comprimento de onda λ = 2π/k) dará origem
a um pico de difracção (ou reflexão de Bragg) se e só se for satisfeita a lei de Bragg
(ou a condição de Laue). Deste modo, para um dado comprimento de onda fixo e para
uma dada direcção de incidência fixa, não se observarão, em geral, picos de difracção.
Se quisermos procurar experimentalmente as posições dos picos de difracção, temos que
fazer uma de duas coisas: ou variar o comprimento de onda do feixe incidente, ou variar
a sua direcção (na prática, variar a orientação do cristal relativamente à direcção do feixe
incidente).
Construção de Ewald
Em geral, a esfera, no espaço dos k, com a origem na sua superfície, não terá outros pontos
na superfície. A construção de Ewald confirma assim, que, para um feixe incidente com
vector de onda arbitrário, não haverá picos de Bragg. Podemos, no entanto, assegurar o
seu aparecimento usando várias configurações experimentais.
83
Se quizermos procurar experimentalmente as posições dos picos de difracção, temos qu
fazer uma de duas coisas: ou variar o comprimento de onda do feixe incidente, ou variar
sua direcção (na prática, variar a orientação do cristal relativamente à direcção do feix
incidente).
Os vários métodos de determinação de estruturas baseiam-se nessas opções.
Construção de Ewald
A construção da esfera de Ewald (Fig.2.19) é um método gráfico de "resolver"
DIFRACÇÃO
equação de difracção. É de grande utilidade para vizualizar os vários métodos de difracção
e deduzir a estrutura cristalina a partir dos picos observados.
Neste método, o cristal está fixo e utiliza-se um feixe de raios X policromático, i.e. com
uma larga gama de comprimentos de onda. Os comprimentos de onda que satisfazem
a condição de Bragg para as várias famílias de planos cristalográficos darão origem a
picos de difracção, a menos que o factor de estrutura seja nulo. Este método é sobretudo
utilizado para determinar a orientação de cristais com estrutura conhecida. Se a direcção
incidente fôr a de um eixo de simetria do cristal, os picos de difracção estarão dispostos
com a mesma simetria.
Este método utiliza radiação monocromática. O cristal roda em torno de um eixo fixo,
c, expondo as várias famílias de planos de modo a satisfazer a condição de Bragg com
a película fotográfica disposta cilindricamente à volta do eixo de rotação. Um processo
alternativo para resolver reflexões individuais consiste em mover também o filme em
concordância com a rotação do cristal. Numa das variantes deste método, chamado o
método de precessão de Buerger, é possível obter uma imagem não distorcida da rede
recíproca e atribuir índices a cada uma das reflexões (Fig. 3.20).
84
REDES CRISTALINAS 5
6
2θ. Na figura, estão representadas algumas dessas orientações (normais aos planos). Os
picos de difracção vão aparecer distribuídos em camadas, cada uma correspondendo a
um valor de l. A camada l=0 fica no plano do feixe incidente. As camadas l=1 e l=-1 ficam
dispostas ao longo a distâncias iguais, para baixo e para cima .
300
feixe incidente
2θ
DIFRACÇÃO
Na figura 3.22 mostram-se diagramas de pós para estruturas cúbicas. Note-se a ausência
de riscas de acordo com os factores de estrutura. A determinação completa de5 uma estru-
REDES CRISTALINAS
8
Cúbica de corpo centrado (h+k+l = par)
2θ
Cúbica de faces centradas (h,k,l todos pares ou todos impares )
2θ
Fig. 2.28. Diagramas de pós para vários tipos de estruturas cúbicas. Notar a ausência de riscas de
Figura acordo Diagramas
3.22: com os factores dede
estrutura.
pós para vários tipos de estruturas cúbicas. Notar a
ausência de riscas de acordo com os factores de estrutura.
A determinação completa de uma estrutura cristalina pode conseguir-se, no caso de
dispormos de monocristais, pelo método de precessão e atendendo a que as intensidades
tura cristalina pode
dos picos conseguir-se,
de difracção no casoaos
são proporcionais dequadrados
dispormos de monocristais,
dos factores pelovezmétodo de
de estrutura. Uma
que uma dada intensidade não determina univocamente as coordenadas dos
precessão e atendendo a que as intensidades dos picos de difracção são proporcionais átomos, torna- aos
se necessário proceder por processos iterativos e por aproximações ou refinações
quadrados dos factores de estrutura. Uma vez que uma dada intensidade não determina
sucessivas. Existem programas de computador bastante sofisticados, através dos quais é
univocamente as coordenadas dos átomos, torna-se necessário proceder por processos
possível obter imagens estereoscópicas de células unitárias relativamente complexas.
iterativos e por aproximações ou refinações sucessivas. Existem pacotes de software bas-
Nos casos, bastante comuns, em que não se dispõe de um monocristal é em muitos
tante sofisticados, através
casos possível dosà quais
proceder é possível
determinação obter imagens
de estruturas a partir deestereoscópicas
diagramas de pós,de células
unitárias relativamente complexas.
recorrendo a processos sofiscados de computação.
Nos casos, bastante comuns, em que não se dispõe de um monocristal é em muitos casos
possível proceder à determinação de estruturas a partir de diagramas de pós, recorrendo
a processos sofiscados de computação.
Vimos com algum detalhe como a propagação de ondas num cristal é afectada pela
5Segundo de Broglie, partícula e onda são duas descrições possíveis de uma mesma entidade. O movimento
periodicidade da rede. h
de uma partícula de momento p=mv, pode ser descrito por uma onda de comprimento λ = p , sendo h a
A terminarconstante
esta
onda,
de Planck. Assim, podemos tratar qualquer partícula, como por exemplo um electrão, como uma
secção,
e qualquer façamos
onda, como porum breve
exemplo um resumo
raio de luzsobre
ou umaasvibração
consequências da periodicidade
da rede cristalina, como
da rede nopartículas. A partícula associada
comportamento a um quantados
ondulatório de luz é um fotão, a partícula associada a um quanta
electrões.
vibracional chama-se fonão, etc.
86
TIPOS DE SÓLIDOS E SIMETRIA
Se for k a direcção de propagação de um electrão, a sua onda poderá ser reflectida pelos
planos (h k l), definidos pelo vector G se for possível uma transição para um estado k0 ,
que satisfaça a condição de Laue, k0 = k + Gh k l , ou por outras palavras, se for satisfeita
a condição de Bragg, i.e., se a diferença de percurso entre as ondas incidente e reflectida
for um múltiplo do comprimento de onda de de Broglie, λ = 2π/k. E isso é verdade se
2d sin θ = nλ, em que n é um inteiro e d, a distância entre planos adjacentes de índice
(h k l).
Da condição de Laue, k0 = k + Gh k l , e uma vez que para dispersão elástica |k|2 = |k0 |2 :
2 2
k0 = (k + Gh k l ) = k2
= k2 + 2 k.Gh k l + G2h k l = k2
2 k.Gh k l + G2h k l = 0
Pelas definições de rede recíproca, é fácil de ver que, se G é um vetor da rede recíproca,
então −G também é. Isso faz com que seja possível escrever a condição acima como
2
1 1
k. G = G (3.24)
2 2
Consideremos dois exemplos. Um primeiro muito simples de uma rede a uma dimensão.
Os vectores G são da forma G = h g1 com g1 = 2π a e a zona de Brillouin vai de
1 2 3 x
a −π/a 0 k π/a
x=0 x=Na
87
DIFRACÇÃO
3
1/2 G 1
X 2
Plano de Bragg
ou face da zona
de Brillouin
Fig. 2.36.a) Zonas de Brillouin para uma rede quadrada. Partindo de um ponto da rede recíproca, como
origem,
Figuraimaginemos
3.24: Zonas linhasde
para os os pontos
Brillouin vizinhos
para umadarede
rede equadrada.
desenhemos osPartindo
planos que bissectam essas
de um ponto
linhas. Esses planos, que satisfazem (2.85), são os planos de Bragg. b) As regiões delimitadas pelos planos de
da rede
Bragg são asrecíproca, imaginemos
zonas de Brillouin. Os númeroslinhas
indicam para os os pontos vizinhos da rede e dese-
a sua ordem.
nhemos os planos as que bissectam. Esses planos, que satisfazem (3.24), são os
Asplanos de Bragg.pelos
regiões delimitadas b) As regiões
planos delimitadas
de Bragg são as zonaspelos planosPode
de Brillouin. de ver-se
BraggnasãoFig as
2.36zonas
que os
de Brillouin. Os números indicam a sua ordem.
quatro triângulos adjacentes ao quadrado central, que constitui a primeira zona de Brillouin, têm no seu
conjunto a mesma área. Podemos “rebatê-los” (ou deslocá-los de vectores G apropriados) e colocá-los sobre
o quadrado. Chama-se a esta operação, redução à primeira zona de Brillouin. Veremos em breve que um
de Bragg são as zonas de Brillouin. Pode ver-se na Fig 3.24 que os quatro triângulos
estado do cristal descrito por uma função de Bloch com um vector de onda k pode ser descrito por uma
adjacentes ao quadrado central, que constitui a primeira zona de Brillouin, têm no seu
função da mesma forma mas com um vector k’ relacioando com k através de k’=k+G, em que G é um vector
conjunto a mesma área. Podemos “rebatê-los” (ou deslocá-los de vectores G apropriados)
da rede recíproca (vem de 2.59).
e colocá-los sobre o quadrado. Chama-se a esta operação, redução à primeira zona de
Os 8 triângulos seguintes têm também a mesma área e podem igualmente ser rebatidos sobre a primeira
Brillouin.
zona. Estas áreas (volumes a 3 dimensões) que podem ser reduzidas do modo descrito, à primeira zona de
Os 8 triângulos
Brillouin constituem asseguintes têm também
zonas de Brillouin de ordemasuperior:
mesma2ª,área
3ª, 4ª,eetc.
podem igualmente ser rebatidos
sobre a primeira zona. Estas áreas (volumes a 3 dimensões) que podem ser reduzidas do
A primeira zona de Brillouin é, assim, o conjunto de pontos no espaço k aos quais se pode chegar a partir
modo descrito, à primeira zona de Brillouin constituem as zonas de Brillouin de ordem
da origem (k=0)a sema atravessar nenhum plano de Bragg. A segunda zona de Brillouin é o conjunto de pontos
superior: 2 , 3 , 4a , etc.
aos quais se pode chegar a partir da primeira zona, atravessando apenas um plano de Bragg. A zona de
Brillouin de ordem
A primeira zonan+1
de éBrillouin
o conjuntoé,de pontoso aos
assim, quais sede
conjunto pode chegarnoa espaço
pontos partir dakzona
aos de ordem
quais n,
se pode
atravessando apenas um
chegar a partir daplano de Bragg.
origem (k = 0) sem atravessar nenhum plano de Bragg. A segunda
Oszona de Brillouin
electrões, é o de
cujos vectores conjunto de pontos
onda, k, terminam nos aos quais
limites se pode
de zona chegar
(eq. 2.80) a partir
são dispersos porda primeira
reflexões
dezona,
Bragg.atravessando
O grau de dispersão
apenas depende da probabilidade
um plano de Bragg.daAtransição
zona dedo Brillouin
estado k, para o estadonk’,
de ordem + ou
1éo
melhor, do elemento
conjunto da matriz
de pontos aos de transição,
quais <k’|V|k>,
se pode que analisaremos
chegar a partir daadiante.
zona de ordem n, atravessando
apenas um
Apliquemos plano
estas ideiasde Bragg.
à análise da superfície E(k), que no caso de electrões livres a duas dimensões tem a
2
forma E(k) = 2m (kx2+ky2) . Obtem-se uma superfície de energia dividida em partes cujas projecções no
plano kx,ky seriam as da fig 2.36. Na Fig 2.37.b) representa-se
88 E(k) ao longo de kx. Na Fig 2.37.c) faz-se a
redução à 1ª z,B. As curvas E(k) surgem como funções contínuas nos limites de zona mas com derivadas
descontínuas. Mais adiante identificaremos cada uma das superficies de energia, E(k), como bandas de
energia. Veremos também, que as reflexões de Bragg dão origem a descontinuidades (hiatos) nas bandas de
energia, quando se considera um potencial não nulo.
TIPOS DE SÓLIDOS E SIMETRIA
Os electrões, cujos vectores de onda, k, terminam nos limites de zona são dispersos por
reflexões de Bragg. O grau de dispersão depende da probabilidade da transição do estado
k, para o estado k0 , ou seja, do elemento da matriz
2. OS Ede E AS FUNÇÕES
transição,
STADOS 0 ONDA
hkDE|V |ki. Apliquemos
61
_______________________________________________________________________________________
2
Fig.2.37. Superfície E(k) = 2m (kx2+ky2) . b)2Representação de E(k) ao longo de kx. c) Redução à primeira
Figura 3.25:
zona de Superfície E(k) = 2m
a)Brillouin. ~
(kx2 + ky2 ). b) Representação de E(k) ao
longo de kx . c) Redução à primeira zona de Brillouin.
Se considerarmos que um electrão com momento k sofre uma reflexão de Bragg
(transição para um estado k'), a probabilidade da transição (intensidade da refexão) é dada
pelo
estas ideias quadradoda
à análise do superfície
módulo do E(k),
momento
quedenotransição,
caso de|<k'|V(r)|k>| 2 , sendo
electrões livres V (r)
a duas o
dimensões
potencial da ~2 cristalina.
rede 2 2 Esse potencial no ponto r será naturalmente a sobreposição
tem a forma E(k) = 2m (kx + ky ). Obtém-se uma superfície de energia parabólica, como
dos potenciais centrados nos vários átomos em posições rj. V(r) será da forma
a representada na figura 3.25.a. Na Fig. 3.25.b) representa-se E(k) ao longo de kx . Na
j=N
Fig. 3.25.c) V(r)
faz-se a redução à primeira
= ∑ v(r-rj)
zona de Brillouin. As curvas E(k)(2.86)
(N=nº de átomos no cristal)
surgem como
funções contínuasj=1nos limites de zona mas com derivadas descontínuas. Mais adiante
identificaremos cada uma das superfícies de energia, E(k), como uma banda de energia.
Se usarmos ondas planas como base de expansão das funções de onda, o elemento matricial < k ' | V(r)| k >
Veremos também,
será dado por que as reflexões de Bragg dão origem a descontinuidades (hiatos) nas
bandas de energia, quando sej=Nconsidera um potencial não nulo.
1⌠ -ik’.r
< k ' | V ( r ) | k > = V⌡ e ∑v ( r - r j ) eik . r d τ (V=volume do cristal, dτ=d3r) (2.87)
j=1
PROBLEMAS
Trocando a ordem do somatório pelo integral e multiplicando e dividindo cada termo por ei( k ' - k ) . r j e se
considerarmos ainda que o volume do cristal é o número de células, Nc, vezes o volume da célula, Vc,
(V=NcVc), vem
1. Considere uma rede linear de átomos ABAB...AB com uma ligação A − B de
comprimento a/2 j=N rede). Os factores de forma são fA e fB para
1 (a =parâmetro 1 ⌠ -i da
< k ' | V ( r ) | k > = N ∑e-i( k ' - k ) .r j V ⌡e (k'-k).(r-rj) v(r-rj)dτ (2.88)
os átomos A e B, c respectivamente. c O feixe de raios-X incidente é perpendicular à
j=1
linha de átomos.
Atendendo a que existem s átomos por célula, o primeiro somatório pode ser factorizado numa soma sobre as
s posições em cada célula primitiva e numa soma estendida a todas as translações:
(a) Mostre que a condição de interferência é dada por nλ = a cos θ, onde θ é o
ângulo
j=N
(b) Mostre
j=1
entre o feixe
j=s
=
que a intensidade
j=1
[∑
difractado e a linha de átomos.
∑e-i( k ' - k ) .r j e-i( k ' - k ) .r j ][∑ e-i( k ' - k ) .T ]
do feixeT difractado é proporcional a |fA − fB |2 para
(2.89)
2
n ímpar e |fA +
Se k’-k fôr um vector
fB |recíproca,
da rede
n par.
para isto é, se k’-k=G, cada termo da segunda soma é igual a um e a
(c)soma é igual ao número
Explique o quedeacontece
células. Se k’-k não fôr um
quando f5 Avector
= fB da.rede recíproca, a soma torna-se no produto
de três factores, em que pelo menos um deles é nulo . Conclui-se assim, que < k ' | V ( r ) | k > é nulo, excepto
2. Desenhe uma rede quadrada no papel (bidimensional).
89
DIFRACÇÃO
3. Assuma que temos uma rede linear de dispersores idênticos espaçados de d. Calcule
a forma da figura de difracção assumindo uma rede finita de n partículas (isto é,
calcule como é que a intensidade difractada varia com o vector de onda). A soma
finita pode ser feita analiticamente.
4. (a) Qual é o factor de estrutura duma célula unitária e como é que está relacionado
com of factores de forma atómicos dos átomos na base?
(b) Assuma uma rede cúbica simples com constante de rede a e uma base de dois
átomos. O átomo A está situado num nó da rede e o átomo B em ( a2 a2 a2 ).
Assuma também que o factor de estrutura pode ser adequadamente construído
a partir dos factores de forma atómicos (fA(G) , fB(G) ). Se fB(G) = −fA(G) ,
qual é o factor de estrutura e o que é que isto implica para a dispersão de
raios-X.
(c) O mesmo que na parte (b) mas com fB(G) = (−1)|G|/(2π/ao) fA(G) .
(a) Determine a que ângulos, 2θ, surgem as várias reflexões (todas) de índices
(h k 0) e qual a sua disposição no filme.
(b) E as reflexões (0 0 l)? Justifique.
6. Foi feito um diagrama de pós do CsCl, usando a radiação CuK? (λ = 1.54). As pri-
meiras riscas de difracção foram obtidas para θ = 10.72o , 15.31o , 18.88o , 20.91o , 24.69o e 27.24o .
Diga a que índices de Miller correspondem as riscas e diga qual o valor do parâmetro
de rede, a. ( A estrutura do CsCl é cúbica simples).
7. Suponha um cristal com uma estrutura definida por uma rede de Bravais cuja célula
unitária tem vectores base a, b, c.
90
TIPOS DE SÓLIDOS E SIMETRIA
8. No seu livro "Raios-X e Estruturas Cristalinas"(que começa "Faz agora dois anos
que o Dr. Laue concebeu a ideia.....), os Bragg dão alguns exemplos de análises de
raios-X. Num dos exemplos referem que a reflexão (1 0 0) do KCl ocorre a 5o 230 ,
mas que a mesma reflexão ocorre a 6o 00 no NaCl, usando o mesmo comprimento
de onda.
(a) Sabendo que o parâmetro de rede do NaCl é 564 pm, determine esse mesmo
parâmetro para o KCl.
(b) Sabendo que as massas específicas do KCl e do NaCl são respectivamente 1.99
g cm−3 e 2.17 g cm−3 , diga se os valores referidos acima estão correctos.
(a) Explique por que razão os picos de difracção estão dispostos deste modo.
(b) As distâncias da linha equatorial até às 3 primeiras linhas acima e abaixo dessa
linha equatorial foram medidads, obtendo-se valores médios de 8.50, 18.80 e
35.0 mm. Calcule o parâmetro de rede c.
91
Página 92 (propositadamente em branco).
4.1 INTRODUÇÃO
r k − ri
k
i
Núcleos
R Electrões
O r
em que as coordenadas dos núcleos R são consideradas como parâmetros. Note-se que
V (r, R) contém todas as interacções, em particular as interacções electrões-núcleos, e as
interacções electrão-electrão que são de dois tipos: interacções de Coulomb (repulsão) e
interacções de permuta ou escambo, e não inclui outras interacções de natureza quântica
chamadas de correlação.
95
INTRODUÇÃO
Actualmente, a grande maioria dos cálculos ab initio de estruturas de bandas, tal como
aliás, da estrutura electrónica de moléculas, baseiam-se na teoria do funcional da densi-
dade (DFT). Esta teoria usa a densidade electrónica como variável fundamental (em vez
da função de onda). A teoria é baseada na noção de que a energia total de um sistema,
incluindo todas as interacções (permuta e correlação), é um funcional único da densidade
electrónica, e que o mínimo desse funcional é a energia do estado fundamental.
As energias de Kohn-Sham não são, de facto, energias dos estados de um electrão num
sólido. É contudo, comum, interpretar as soluções das equações de Kohn-Sham como
estados monoelectrónicos.
Os cálculos de bandas por DFT dão, em geral, boa conta dos resultados experimentais,
sendo a forma das bandas fidedigna, embora com alguns erros sistemáticos, sobretudo no
que respeita aos valores do hiato em semicondutores. A teoria DFT é, em princípio boa
para cálculos do estado fundamental, mas não é adequada para o cálculo de propriedades
de estados excitados. A estrutura electrónica calculada por DFT não tem um significado
físico tão realista e o teorema de Koopman relativo às energias das orbitais de Kohn-
Sham não tem o verdadeiro significado das energias de Hartree-Fock. A utilização de
DFT para cálculo de bandas deve portanto ser encarada com especial atenção.
O nosso objectivo neste curso não é, no entanto, discutir os métodos computacionais para
o cálculo de bandas de energia em cristais, e mesmo que fosse seria necessário começar
por descrever algumas das ideias básicas que constituem os seus fundamentos, para que
fosse possível interpretá-las. Essas ideias tem a ver com a existência de um potencial
periódico resultante da simetria translacional da rede cristalina.
96
TEORIA DE BANDAS
Vimos já que a existência de um potencial periódico implica dispersão dos electrões devido
às reflexões de Bragg. Vamos ver ainda outra consequência da periodicidade do potencial.
A simetria translacional das redes cristalinas finitas impõe algumas condições aos estados
dos electrões que nelas se movem. Na aproximação do electrão independente, que vamos
seguir, essas interacções são englobadas num potencial monoelectrónico efectivo V (r), de
simetria esférica. A escolha de V (r) é um problema complexo a que voltaremos. Nesta
fase, vamos apenas ter em conta que, qualquer que seja a forma detalhada desse potencial
monoelectrónico efectivo, numa rede cristalina perfeita, ele deverá satisfazer a condição
de simetria translacional
V (r + T) = V (r) (4.1)
para qualquer translação T, da rede cristalina. A partir deste facto, podem desde já
tirar-se conclusões importantes.
V(r)
r
~2 2
− ∇ + V (r) ψ(r) = E ψ(r) (4.2)
2m
Vamos demonstrar que as funções de onda dos electrões de Bloch poderão ser escolhidas
de modo a ter a forma do produto de uma onda plana, ei k.r , por uma função unk (r),
97
INTRODUÇÃO
As funções ψnk (r), também designadas por |ki, da equação 4.3 chamam-se funções de
Bloch 2 .
u k (r)
ei(k.r)
|k >
Figura 4.3: Representação das funções uk (r), onda plana, ei(k.r) e função de onda
cristalina, ψ(r) = |ki. Um electrão de Bloch é representado por uma onda plana
modulada pela periodicidade da rede.
Imaginemos uma rede cristalina unidimensional com N células primitivas (p. ex. uma
cadeia linear de átomos) de parâmetro de rede a.
ψ(x) = ψ0 eik.x
2π
em que ψ0 é a amplitude da onda de comprimento de onda λ tal que k = |k| = λ .
98
TEORIA DE BANDAS
Quer isto dizer que os vectores de onda se circunscrevem à primeira zona de Brillouin e
que os seus valores são da forma k = 2πm m 2π
N a ou k = N g1 , em que g1 = a ex .
Esta ideia pode generalizar-se ao caso de uma rede cristalina tridimensional, pelo que se
pode concluir que os vectores de onda independentes, numa rede cristalina tridimensional,
se circunscrevem à primeira zona de Brillouin e são da forma
m1 m2 m3
k= g1 + g2 + g3 (4.5)
N1 N2 N3
sendo g1 , g2 , g3 os vectores base da rede recíproca e m1 , m2 , m3 são números inteiros
(zero incluído) no intervalo [− N2 , N2 ]. A primeira zona de Brillouin (ou simplesmente
zona de Brillouin) conterá N estados (N =número de células primitivas), cada um dos
quais ocupará um volume no espaço recíproco
1 1 1 1
δk = δ 3 k = g1 . g2 × g3 = g1 . (g2 × g3 )
N1 N2 N3 N
Como g1 . (g2 × g3 ) é o volume da célula primitiva no espaço recíproco e atendendo à
definição de g1 , g2 , g3 , vê-se que
(2π)3
δk = δ 3 k = (4.6)
V
em que V é o volume do cristal.
3 Atendendo a que k é o vector de onda, interessa considerar valores de k negativos os quais representam
ondas que se deslocam no sentido negativo do eixo dos xx.
4 Se k = 0, a amplitude da onda seria constante em qualquer posição no cristal.
5 O intervalo [−π, +π] cobre todos os valores independentes da função ψ(x). Se tomarmos como valor
99
INTRODUÇÃO
Enunciado:
Demonstração:
Para cada translação T de uma rede de Bravais, define-se um operador linear T , que ao
actuar sobre uma função qualquer f (r), transforma o seu argumento em r + T, i.e.,
T f (r) = f (r + T)
pelo que
TH =HT
Além disso, a aplicação sucessiva de duas translações não depende da ordem pela qual
são aplicadas, uma vez que para qualquer ψ(r)
100
TEORIA DE BANDAS
Se agora considerarmos uma rede de Bravais cúbica, por exemplo, e uma translação,
T = na, teremos
T ψ(r) = ψ(r + na) = cn (a) ψ(r)
Se aplicarmos uma translação T0 = N1 a , em que N1 seja o número total de células
primitivas do cristal na direcção de a, podemos satisfazer a condição aos limites, de
Born-von Karman (condição de ciclicidade), se fizermos
T ψ(r) = ψ(r + N1 a) = cN1 (a) ψ(r) = ψ(r)
√
pelo que cN1 (a) = 1, ou c(a) = N1 1 que é da forma c(a) = e2πi m1 /N1 sendo m1 inteiro.
2π m1
Se fizermos k = a N1 , então os valores próprios dos operadores T são da forma
101
INTRODUÇÃO
Uma vez que a energia potencial pode ser escolhida a menos de uma constante, podemos
R
impor a condição célula dr V (r) = 0.
Uma função que satisfaz as condições fronteiras de Born-von Karman pode ser da forma
X
ψ(r) = cq ei q.r (4.13)
q
onde q satisfazem as propriedades de k (4.5). Para V (r) ser real, V−G = VG∗ . Vamos
também assumir V (r) = V (−r), ou seja, simetria de inversão. Esta condição implica
que V−G = VG = VG∗ ou seja, que VG é real. Substituindo ψ(r) e V (r) na equação de
Schrödinger, obtemos para o termo de energia cinética
~2 2 X ~2
− ∇ ψ(r) = q 2 cq ei q.r
2m q
2m
Este último passo foi dado fazendo q0 = G + q. Mudando os índices da soma q0 para q
e G para G0 e fazendo (H − E)ψ = 0, obtemos
" #
~2 2
X X
i q.r
e q − E cq + VG0 cq−G0 = 0
q
2m 0 G
−i qr
e
Multiplicando por volume , integrando em r sobre o volume do cristal, e substituindo
q = k − G, de modo que k esteja na primeira zona de Brillouin, e G é o vector de onda
apropriado para isso acontecer, obtemos, trocando os índices G0 e G0 − G
2
~ 2
X
(k − G) − E ck−G + VG0 −G ck−G0 = 0 (4.14)
2m 0 G
102
TEORIA DE BANDAS
ou seja X
ψk (r) = ei k.r ck−G ei G.r = ei k.r uk (r)
G
X (4.15)
uk (r) = uk (r + T) = ck−G ei G.r
G
que são as funções de Bloch e em que unk (r) tem a periodicidade da rede e k é da forma
m1 m2 m3
k= g1 + g2 + g3 (4.17)
N1 N2 N3
103
INTRODUÇÃO
que não é, em geral, apenas o produto de uma constante por ψnk , isto é, ψnk , não é
um estado próprio do operador momento. No entanto, em muitos aspectos ~k é uma
extensão natural de p para o caso de um potencial periódico. É conhecido pelo nome
de momento cristalino da partícula, para evidenciar essa semelhança, mas não devemos
ser levados a concluir que ~k é um momento (mv). Só se pode ter uma compreensão
do significado dinâmico do vector de onda k quando se considera a resposta de electrões
de Bloch a campos magnéticos aplicados. Por agora, k deve encarar-se como um índice
característico da simetria translacional de um potencial periódico, associado aos números
quânticos m1 , m2 , m3 .
Devido às condições de periocidade, podemos encarar (4.18) como uma equação de valores
próprios relativa a uma única célula primitiva do cristal. Uma vez que esta equação se
refere a um volume finito fixo, é de esperar um conjunto infinito de soluções com valores
próprios de Ek discretos6 , que se identificam com o índice n.
Note-se que em termos da equação de valores próprios (4.18), o vector de onda k aparece
apenas como um parâmetro no hamiltoniano Hk . Espera-se portanto que, para um dado
k, cada um dos níveis de energia Ek varie continuamente com k. Deste modo, chega-se a
uma descrição dos níveis de energia para um electrão num potencial periódico, em termos
de uma família de funções contínuas En (k). O facto de que as condições aos limites de
Born-von Karman impõem valores discretos a k, da forma 4.17 com m1 , m2 , m3 inteiros
no intervalo [− N21 , N21 ] para m1 , etc. não influencia a continuidade de En (k) como uma
função contínua de uma variável contínua k, pois a equação de valores próprios (4.18)
não faz referência ao tamanho do cristal e é bem definida para qualquer valor de k. Deve
6 Talcomo a equação de valores próprios de uma partícula livre numa caixa de dimensões finitas tem um
conjunto de níveis de energia discretos.
104
TEORIA DE BANDAS
notar-se também que o conjunto dos k se torna denso no espaço dos k, no limite de um
cristal infinito7 .
Para cada valor de n, o conjunto dos níveis especificados por En (k) chama-se banda de
energia.
A energia de cada estado, Enk , pode ser, em princípio, calculada pela expressão
hnk|H|nki
Enk = (4.21)
hnk|nki
7 um cristal real tem da ordem de 1023 átomos, o que para este efeito é como se fosse infinito.
105
INTRODUÇÃO
Na Fig. 4.4a) representam-se E1,k , E1,k+G , E1,k−G e E2,k , segundo o esquema da zona
estendida (todos os valores de k). Pode verificar-se que En,k+G = En,k . Em b) faz-se a
redução à primeira zona de Brillouin. Uma vez que E(k) = E(−k), podemos representar
a banda só para valores de k positivos.
a) b)
E(k) E(k)
E 1,k
E2
E2,k
E1,k-G E1
E 1,k+G
- G -1/2 G 0 1/2 G G kx 0 1/2 G k x
5. Pode demonstrar-se que, em geral, um electrão num nível especificado pelo índice de
banda n e vector de onda k tem uma velocidade média dada por
1
vn (k) = ∇k En (k) (4.22)
~
Para obter a dependência de ψ(r) no tempo, multiplica-se pelo factor de fase apropriado,
e−(i/~) E(k)t , que resulta da equação de Schrödinger dependente do tempo (ou e−iω(k)t ,
106
TEORIA DE BANDAS
dE(k)
uma vez que E(k) = ~ω(k) ), Se expandirmos E(k) = E(k0 ) + dk (k − k0 ) + ..., vem
2 1 dE(k)
uk (r) e−α(k−k0 ) ei (k−k0 ).[r− ~ ]
X
ψ(r) = ei [k0 .r−E(k0 )t/~] dk t
k
X 2
ψ(r) = ei [k0 .r−E(k0 )t/~] uk (r) e−α(k−k0 ) ei (k−k0 ).[r−vg t]
k
1 dE ∂ω(k)
em que vg = ~ dk = ∂k é a velocidade de grupo:
1 dE 1
v= = ∇k E(k) (4.23)
~ dk ~
De um modo muito aproximado, podemos sugerir uma lei de Newton para um electrão
num cristal, se considerarmos um electrão sujeito a uma força exterior, por exemplo, a
resultante de um campo eléctrico, E: Fext = −eE. A variação de energia após um inter-
valo de tempo ∆t é ∆E = (Fext .v)∆t. Escrevendo ∆E = dE dk ∆k e usando a aproximação
a 4.22, v = ~ dk ≈ ~ ∆k vem ∆E = ~v.∆k, ou seja ∆k = Fext
1 dE 1 ∆E
~ ∆t , e, finalmente,
dk
Fext = ~ (4.24)
dt
Embora derivada de um modo não rigoroso, esta expressão é uma expressão de aplicação
geral.
Aqui ficava bem revisitar o conceito de massa efectiva e de buraco — ver Galperin
No estudo das propriedades dos sólidos, como por exemplo a condutividade eléctrica e a
condutividade térmica, é importante considerar processos colisionais envolvendo duas ou
mais partículas (fonões no caso da condutividade térmica e electrões e fonões no caso da
condutividade eléctrica). Em todos estes processos colisionais se considera que a energia
total e o momento cristalino total se conservam. Atendendo a que todos os valores
107
INTRODUÇÃO
ky ky
k1 k1
kx kx
k2
k2 k3 k3
G k1 + k 2
Na Tab. 4.1.4. faz-se um resumo comparativo dos estados de Bloch com os estados no
modelo de Sommerfeld.
108
TEORIA DE BANDAS
Sommerfeld Bloch
(electrão livre) (electrão num potencial periódico)
Números quânticos k n, k
~k é o momento, mv ~k é o momento cristalino
n é o indice de banda
Gama de números k estende-se a todo o espaço recíproco i) para cada n, k estende-se a
quânticos consistente com as condições toda a zona de Brillouin
de Born-von Karman ii) n ∈ Z
(Z: conjunto dos números inteiros)
~2 k 2
Energia E(k) = 2m
En (k) sem forma explícita simples.
1
E(k) = 2
mv 2 Periódica na rede recíproca:
En (k + G) = En (k)
Velocidade média Velocidade média de um electrão Velocidade média de um electrão
de um electrão num estado com vector de onda k num estado com vector de onda k
p ~k 1
v= m
= m
vn (k) = ∇ E (k)
~ k n
Função de onda Função de onda de electrão Função de onda de electrão com índice
num estado k: de banda n e vector de onda k:
ψk = |ki = V −1/2 ei k.r ψn,k = |ki = un,k (r) ei k.r
(V =volume do cristal) un,k sem forma explícita simples.
Periódica na rede directa
un,k (r + T) = un,k (r)
109
ONDAS QUASE PLANAS
Pode tomar-se a função de onda monoelectrónica como uma combinação linear de ondas
planas: X
ψ(r) = |ki = ak |ki (4.26)
k
~2 2
− ∇ + V (r) ψ(r) = E ψ(r)
2m
Multiplicando à esquerda pelos vários hk0 |, obtém-se um sistema de N equações (1 para
cada k):
X ~2 2 X X
ak hk0 | − ∇ |ki + ak hk0 |V (r)|ki = E ak hk0 |ki
2m
k k k
2 2 2
Atendendo a que − 2m
~ k
∇2 |ki = ~2m |ki e hk0 |ki = δk0 k e fazendo Vk0 k = hk0 |V (r)|ki, vem
o sistema de N equações—uma para cada valor de k0 :
2 02
~ k X
− E ak0 + ak Vk0 k = 0 (4.27)
2m
k
Note-se que o primeiro factor de Vk0 k é o factor de estrutura geométrico, Shkl , e que,
hk 0 |V (r)|ki =
6 0 só quando ∆k = G. Deste modo, o sistema de equações (4.27) pode
ser simplificado tomando apenas os Vk0 k em que ∆k = k0 − k = G, e atendendo ainda
ao facto de que Vk0 k → 0 quando G → ∞, podemos fazer a aproximação de truncar o
P
somatório k ak Vk0 k , tomando apenas um conjunto razoável de Vk0 k .
110
TEORIA DE BANDAS
Se tomarmos, por exemplo os primeiros 100 Vk0 k , obtemos um sistema de 100 equações
homogéneas cujo determinante secular dá as 100 primeiras bandas de energia.
Para visualizar o efeito de V (r) sobre as bandas de energia E(k), vamos resolver o sistema
(4.27), tomando apenas a componente de Fourier maior, VG(mínimo) . Note-se que VG é
pequeno comparado com as outras energias em jogo. (Fazer k0 = k e k0 = k − G):
2 2
k
~2m − E(k) ak + VG ak−G = 0
(4.29)
~2 (k−G)2
VG ak + − E(k) a = 0
k−G
2m
~2 k 2 ~2 (k−G)2
Fazendo 2m = Ek0 e 2m
0
= Ek−G , obtém-se o determinante secular:
Ek0 − E(k) VG
=0
0
VG Ek−G − E(k)
que dá as soluções
1 1 q 2
E(k)± = Ek0 + Ek−G
0
± Ek0 + Ek−G
0 + 4|VG |2 (4.30)
2 2
111
ONDAS QUASE PLANAS
! ! 2!G 2
2m
2 |VG|
0 1/2 G
Figura 4.6: Bandas de energia no modelo das ondas quase planas. Notar a
1
abertura de um hiato (”gap”) no limite da zona de Brillouin, k = 2 G. O valor
desse hiato é 2|VG |.
Se atendermos a que nos metais simples, pelo menos nos monovalentes (Z = 1), kF <<
1 − ~2 k 2
2 G, a curva E (k) correspondente à primeira banda coincide com a curva E(k) = 2m .
Esse facto explica o sucesso do modelo do electrão livre (V (r) = 0) para interpretar as
propriedades dos metais simples.
Vamos agora tentar justificar algumas das aproximações feitas acima. Consideremos o
potencial como uma perturbação dos estados do electrão livre. Podemos escrever então
X |hk|V |k0 i|2
E(k) = E 0 (k) + hk|V |ki +
E 0 (k) − E 0 (k0 )
k0 6=k
2 2
k
em que E 0 (k) = ~2m . Uma vez que V (r) tem a periodicidade da rede cristalina, os
seus elementos de matriz são nulos a não ser que k0 − k seja igual a um vector da rede
recíproca, G. Vem então
X |VG |2
E(k) = E 0 (k) + V0 +
E 0 (k) − E 0 (k − G)
G0 6=0
112
TEORIA DE BANDAS
não é válida quando k estiver numa (ou perto duma) fronteira da zona de Brillouin. Se
considerarmos a função de onda monoelectrónica (expandindo uk (r) em série de Fourier)
1 i k.r X
ψ(k, r) = e u(Gm ) ei Gm .r
V m
Multiplicando por V1g e−i(k+Gm ).r e integrando sobre Vg (notar que V1g ei G.r dτ = δG,0 ),
R
vem 2
~ 2
X
(k + Gn ) − E(k) u(Gn ) + V (Gn − Gm ) u(Gm ) = 0 (4.32)
2m m
113
ESTRUTURA DE BANDAS DOS METAIS E SUPERFÍCIES DE FERMI
~2 k 2
E= ± |V (Gp )| (4.34)
2m
Vimos que para o método dos electrões quase livres a série das componentes de Fourier
VG deve convergir rapidamente. V (r) é o potencial duma rede de iões. Sabemos que
o campo perto do núcleo de um ião é muito forte, ou seja, que V (r) tem um poço de
potencial profundo e estreito em cada ponto da rede. Isto significa que tem componentes
de Fourier de muito pequeno comprimento de onda, de modo que VG pode ser elevado
para valores de G que são muito grandes comparados com as dimensões da 1a zona
de Brillouin. Este argumento levaria provavelmente ao abandono deste método para
cálculos de estrutura de bandas. No entanto, veremos que este método pode ser tornado
formalmente válido pela introdução da ideia de pseudo-potencial.
As bandas de energia podem eventualmente sobrepor-se, i.e., uma parte dos estados
de uma dada banda, En (k), pode ficar acima dos estados de menor energia da banda
En+1 (k). Neste caso, os estados com a mesma energia somam-se e a densidade de estados
total é o somatório em k estendido a todas as bandas En (k).
114
TEORIA DE BANDAS
D(E)
D(E 1)
D(E 2) D(E 3)
115
ESTRUTURA DE BANDAS DOS METAIS E SUPERFÍCIES DE FERMI
En (k) = EF (4.36)
Uma vez que En (k) é periódica na rede recíproca, a solução completa da equação (4.36)
para cada valor de n é uma superfície no espaço k, com a periodicidade da rede recíproca.
Quando um ramo da superfície de Fermi é representado pela sua estrutura periódica
completa, diz-se que é descrita num esquema de zona estendida. Em certos casos é útil
representar repetidamente a primeira zona de Brillouin—esquema de zona repetida, (ver
p. ex. Fig.
116
TEORIA DE BANDAS
Figura 4.8: Construção da superfície de Fermi para uma rede quadrada. a) Dese-
nhamos uma superfície de Fermi de raio kF , que vai até à 4a zona, como exemplo.
Podemos ver quais as porções das varias zonas de Brillouin ocupadas (em c):
a primeira zona está totalmente cheia. As zonas 2, 3, e 4 estão parcialmente
ocupadas. As partes ocupadas obtêm-se transferindo (mediante translações G)
as partes ocupadas dessas zonas para a primeira zona. b) Método de Harrison:
traça-se uma esfera de Fermi com centro em cada nó da rede recíproca. A su-
perfície de Fermi nas quatro primeiras zonas, é identificada contando o número
de esferas a que simultaneamente pertencem os estados ocupados. c) Aqui estão
representados os estados ocupados nas primeiras quatro zonas de Brillouin. A
superfície de Fermi em cada zona é a superfície de separação entre os estados
ocupados, (a sombreado) e os estados vazios.
117
ESTRUTURA DE BANDAS DOS METAIS E SUPERFÍCIES DE FERMI
L.Z.
kF
SF
Figura 4.9: Efeito do limite de zona de Brillouin quando esta corta ou se aproxima
da superfície de Fermi. A descontinuidade na superfície de Fermi é equivalente
ao hiato no diagrama de bandas de energia.
118
TEORIA DE BANDAS
119
ESTRUTURA DE BANDAS DOS METAIS E SUPERFÍCIES DE FERMI
120
TEORIA DE BANDAS
mente, e estes vão deixando a superfície de Fermi, que é pouco afectada. As flutuações na
densidade de estados poderão ser detectadas, por exemplo, medindo a susceptibilidade
magnética em função do campo. O período das oscilações de Haas-van Alphen é deter-
minado pelas secções extremas (máximos e mínimos) da superfície de Fermi, normais
ao campo magnético. Por exemplo, no caso do cobre, Fig. 4.10, vemos que há secções
extremas na superfície de Fermi, consoante as direcções (a barriga e o pescoço). Me-
dindo essas oscilações para várias orientações do campo magnético é possível reconstruir
a superfície de Fermi.
Antes de prosseguir com outros modelos, convém referir algumas propriedades das bandas
de energia devidas à simetria.
Seja S uma das operações de simetria pertencentes ao grupo de simetria pontual , (i.e.,
rotações, reflexões,...) que convertem o cristal em configurações idênticas e consequen-
temente deixam o hamiltoniano invariante. As operações de simetria, S, (representadas
pelos operadores S) também convertem |ki em S|ki , i.e.
S ψk = ψSk
En (k) = En (Sk)
Isto implica que a função En (k) na zona de Brillouin possui a simetria completa do grupo
pontual e que a todos os vectores k0 = Sk corresponde o mesmo valor da energia, i.e., as
bandas de energia convertem-se em si próprias por acção de qualquer das operações de
simetria pontual do cristal.
121
SIMETRIA DAS BANDAS DE ENERGIA
Se considerarmos, por exemplo, num cristal cúbico, um estado com k na direcção [111],
na zona de Brillouin, o grupo desse k é o grupo de simetria do triângulo equilátero,
C3v , que tem três classes de simetria e três representações irredutíveis, Λ1 , Λ2 , Λ3 . De
acordo com a teoria de grupos, podemos esperar ao longo da direcção [111], bandas não
degeneradas (Λ1 = A1 , Λ2 = A2 ) e bandas duplamente degeneradas (Λ3 = E).
122
TEORIA DE BANDAS
H ψk∗ = E ψk∗
En (k ↑) = En (−k ↓)
significando que os estados ψk com spin +1/2 e ψ−k com spin −1/2 são degenerados. É
o teorema de Kramers completo.
123
MÉTODO DAS COMBINAÇÕES LINEARES
energia elevada, que são parecidos com ondas planas. Consideramos agora a aproximação
das combinações lineares, CL, a qual assume uma base de funções, que eventualmente
podem ser orbitais atómicas. Esta aproximação funciona bem, por exemplo, para as
bandas de valência de semicondutores, mas pode falhar na descrição de bandas de con-
dução. Originalmente este método foi chamado de "tight binding"porque era usado para
o cálculo das bandas que descrevem os electrões do cerne (internos). Começou a ter uma
grande utilização quando se constatou que se podiam fazer determinadas aproximações
válidas, nos integrais de transferência e sobretudo devido às ideias desenvolvidas por
Woodward e Hoffmann (1971) sobre a ligação química, ideias essas que foram depois
utilizadas para descrever a estrutura electrónica dos sólidos. Hoje é possível obter bons
resultados com o método CL para, praticamente todos os tipos de sólidos cristalinos,
desde que se utilizem as combinações apropriadas e se façam as devidas correcções por
métodos de perturbações ou outros.
Comecemos por considerar uma situação muito simples, em que temos apenas um átomo
por célula primitiva e em que tomamos apenas uma orbital por átomo.
N
X
ψ(r) = ci φ(r − Ri ) (4.37)
i=1
124
TEORIA DE BANDAS
1
ci = √ ei k.Ri (4.38)
N
Utilizemos uma linguagem matricial e designemos por Ψ, a matriz cujas N colunas cons-
tituem as N soluções, isto é:
Ψ = ΦC (4.39)
em que Ψ = (ψ1 ...ψq ...ψN )
Φ = φ1 ... φi ... φN
C = c1 ... cq ... cN = (ciq )
.
.
.
cq =
ciq
.
.
.
Os valores da energia obtêm-se por diagonalização da matriz
hΨ|H|Ψi = E (4.40)
C† hΦ|H|ΦiC = E
ou
C† H C = E
com
H = hΦ|H|Φi
sendo C† = c∗qi ; H = (Hij ); E = (Eqq ) .
125
MÉTODO DAS COMBINAÇÕES LINEARES
Ou, considerando que todos os átomos i são idênticos e estendendo o somatório a todos
PN
os vizinhos, j, de um dado i, incluindo ele próprio (j = i): Eqq = j ei k(Rj −Ri ) Hij ,
sendo Rj − Ri os vectores distância do átomo j ao átomo i.
Note-se que, como já vimos, o conjunto de valores discretos de k se torna denso no limite
de um cristal infinito, podendo identificar-se o conjunto dos valores próprios Eqq ≡ Ek
com a função E(k):
N
X
E(k) = ei k(Rj −Ri ) Hij (4.42)
j
Conclui-se, assim, que no caso em que temos apenas um átomo por célula primitiva
e em que tomamos apenas uma orbital por átomo, a diagonalização da matriz (4.40)
conduz-nos à obtenção de uma banda de energia, E(k), da forma (4.42), que depende
das distâncias entre átomos e dos integrais Hij . Os N valores próprios da energia são
identificados pelos N valores de k, na zona de Brillouin. Os elementos matriciais Hij são
os integrais de Coulomb (se i = j) e os integrais de escambo ou transferência (se i 6= j):
Z
Hij = hφi |H|φj i = φ∗ (r − Ri ) H φ(r − Rj ) dτ (4.43)
~2
Z
∗
Hii = hφi |H|φi i = φ (r − Ri ) − ∇ + V (r) φ(r − Ri ) dτ (4.44)
2m
Se V (r) fosse exactamente o potencial atómico e φi exactamente uma orbital atómica, este
termo resultaria na energia atómica, ε0 , (energia do átomo isolado). Note-se, no entanto,
que as orbitais atómicas a figurar na expressão (4.37) não deverão ser as orbitais dos
átomos isolados dado que num cristal as funções de onda locais (as que deverão figurar
126
TEORIA DE BANDAS
em 4.37) não são exactamente as funções de onda do átomo isolado. As funções de onda
locais exactas, deveriam ser da forma
1 X −i k.Ri
φi = φ(r − Ri ) = √ e |ψk i (4.45)
N k
obtidas por inversão da expressão (4.37) e atendendo a que os ci são dados por (4.38).
As funções (4.45) chamam-se funções de Wannier e podem ser obtidas por métodos au-
tocoerentes. Na prática, utilizam-se vários tipos de aproximações que permitem fazer
cálculos de bandas pelo método CL com a aproximação desejada (e dificuldade corres-
pondente).
Veremos adiante como é possível obter resultados aceitáveis para muitos fins, recorrendo
a aproximações baseadas na experiência e na intuição e a dados compilados da literatura.
Para já façamos Hii = εi , admitindo que podemos obter o seu valor, quer por cálculo,
quer recorrendo a tabelas.
~2
Hij = hφi |H|φj i = hφi | − ∇ + V (r)|φj i
2m (4.46)
= ε0 hφi (r − Ri )|φj (r − Rj i + hφi (r − Ri )|V (r)|φj (r − Rj )i
A fim de adquirir uma certa sensibilidade ao problema vamos recorrer a alguns exemplos
simples.
127
MÉTODO DAS COMBINAÇÕES LINEARES
de cada átomo. Um sistema concreto seria uma cadeia linear de iões de hidrogénio, H + ,
ao longo da qual se passeia um único electrão. Note-se que o cálculo é feito, partindo
da situação em que existe um único electrão em todo o cristal e que as funções de onda
descrevem os vários estados possíveis desse electrão. Uma vez feito o cálculo das bandas
de energia, é, nestas circunstâncias lícito preencher as bandas com o número total de
electrões do cristal. Todas as interacções estão incluídas no potencial médio. No nosso
cálculo vamos desprezar os integrais de sobreposição e considerar apenas o integral de
transferência entre vizinhos adjacentes. A expressão (4.42) dá-nos directamente E(k),
a ZB=2!/a
Figura 4.14: Representação de um átomo e dos seus primeiros vizinhos num cris-
tal unidimensional. À direita, a zona de Brillouin de um cristal unidimensional.
Os limites de zona são planos que passam pelos pontos k = −π/a e k = π/a.
N
X
E(k) = eik(Rj −Ri ) Hij
j
128
TEORIA DE BANDAS
E E
!o+2V ! 2"
!o LB= |-4V| !2 ( a )
LB=
(N estados) 2m
!o -2V 0 !/a
0 !/a
~2 (π/2)2 ~2 π 2
−4V = =
2m 2ma2
π 2 ~2 ~2 π2
V =− = η ; η = −
8 ma2 ma2 8
129
MÉTODO DAS COMBINAÇÕES LINEARES
cloreto de césio, CsCl, é um sólido iónico, podendo ser descrito por uma rede cúbica
simples de iões Cl− interpenetrada por uma rede idêntica de iões Cs+ . A estrutura de
Cl -
! X kz
z
Cs+
y ky
K
x 2!/a kx
bandas do CsCl pode ser obtida fazendo separadamente o cálculo das bandas do Cl− e
as bandas do Cs+ .
Cl[1s2 2s2 2p6 3s2 3p5 ] Cs[1s2 2s2 2p6 3s2 3p6 3d10 4s2 4p6 5s1 ]
podemos, nesta aproximação simples, ignorar os electrões internos de cada um dos iões e
considerar apenas o último nível preenchido dos iões Cl− e o primeiro nível vazio dos iões
Cs+ . Estes são os níveis dos quais dependem, em primeira aproximação, as propriedades
do sólido.
Da tabela periódica dos sólidos10 podemos tirar os valores dos parâmetros (aproximados)
a utilizar na expressão (4.42):
d = 4.11 Å
Se atendermos ao facto de que o nível 5s do Cs+ (vazio) está muito acima dos níveis 3s e
3p (últimos preenchidos) do Cl− , podemos admitir que não haverá combinações entre as
10 Ver
tabela periódica dos sólidos de Harrison. Os valores da tabela periódica dos sólidos, embora sejam
apenas válidos em aproximações rudimentares, foram obtidos por cálculo e correspondem a funções de
Wannier, portanto adaptadas ao sólido.
130
TEORIA DE BANDAS
orbitais do Cl− e as do Cs+ até porque sabemos da experiência, que o CsCl é um sólido
iónico.
Dada a grande diferença de energias entre os níveis s e p do Cl− , não havendo portanto
tendência a hibridação, podemos calcular separadamente as bandas s e p da rede dos
Cl− e separadamente a banda s do Cs+ recorrendo à expressão (4.42) .
z
3
2 y
4
a
1 x
i
5
6
e os vectores posição:
Ri − Ri = 0
R1 − Ri = a e x
R2 − Ri = a e y
R3 − Ri = a e z
R4 − Ri = −aex
R5 − Ri = −a ey
R6 − Ri = −a ez
6
X 6
X
Es (k) = εs + eik(Rj −Ri ) Hij = εs + Vssσ exp i[(kx ex + ky ey + kz ez )(Rj − Ri )]
j=1 j=1
131
MÉTODO DAS COMBINAÇÕES LINEARES
~2 1 ~2 2
Vssσ = ηssσ = −1.40 × 7.62 = −0.63 eV; com = 7.62 eV Å
md2 4.112 m
Por processo idêntico ao anterior, podem obter-se as bandas px , py e pz (ver Fig. 4.18).
- + - +
x
Vpp !
A expressão da banda 5s da rede Cs+ será da mesma forma da banda 3s da rede Cl− ,
com os valores apropriados dos parâmetros.
132
TEORIA DE BANDAS
E E
s (Cs) pz
EF py
py pz
"p
px
px
" 2!
" s+4V s –h2( a )
-4Vss # s
2m
K ! X ! X
Bandas CLOA Bandas Gás de Fermi
~2 π2
Vssσ = ηssσ ; com ηssσ = − = −1.23
md2 8
Pelo mesmo processo, poderíamos calcular η para os vários tipos de estruturas. Na tabela
seguinte apresentam-se alguns desses valores corrigidos para sistema reais11 . Se houver
mais do que um átomo por célula, ou melhor, mais do que uma orbital por célula, a
combinar para formar bandas de energia, devemos considerar
Φ = φ11 φ12 ... φ1N φ21 ... φs1 ... φsN (4.48)
em que o índice superior se refere à orbital e o índice inferior se refere à célula. Isto é,
temos que tomar como componentes do vector base todas as orbitais de cada célula (de
1 a s) e todas as células (de 1 a N ).
133
MÉTODO DAS COMBINAÇÕES LINEARES
H11
kk H12
kk ... H1s
kk
21
Hkk ... ... ...
H= (4.49)
... ... ... ...
Hs1
kk ... ... Hss
kk
Tal como anteriormente, k funciona como um parâmetro e cada bloco será da forma
αβ
Hkk = Hαβ (k):
N
X
Hαβ (k) = ei k(Rj −Ri ) Hij (4.50)
j
134
TEORIA DE BANDAS
A aplicação directa do método CLOA aos sólidos covalentes (C, Si, Ge) exige cálcu-
los bastante laboriosos para obter resultados satisfatórios pois não é possível fazer as
aproximações que são válidas para outros tipos de sólidos (e.g. sólidos iónicos).
De facto, se considerarmos, por exemplo, o silício [1s2 2s2 2p6 3s2 3p2 ] e construirmos
um gráfico da evolução da largura das bandas de energia em função da distância inter-
atómica, somos levados, numa primeira aproximação ingénua, ao diagrama representado
na Fig. 4.20, em que a banda 3s está completamente preenchida e a banda 3p (triplamente
degenerada) está preenchida até 1/3, levando a concluir que o silício deveria ser um
metal, contrariamente ao facto bem conhecido de que o silício é um semicondutor. Só
E
!p
!s
1/d
A compreensão actual da ligação química implica que se estabelece uma ligação extre-
mamente forte (ligação covalente) quando os electrões dos níveis mais elevados podem
”ganhar” energia ao passar para outros níveis, que sendo descendentes em energia, se
cruzam com eles.
Nos sólidos covalentes, como o diamante, o silício e o germânio o que se passa é represen-
tado esquematicamente na Fig. 4.22. À medida que as distâncias inter-atómicas d, vão
135
ESTRUTURAS DE BANDAS DE SEMICONDUTORES E DE METAIS
#u
E "g
!p
#g
"u
#u
!s
#g
1/d
136
TEORIA DE BANDAS
Em princípio deveriam ser usadas combinações ligantes e anti-ligantes das híbridas sp3
como base das combinações lineares para obter a estrutura de bandas nos sólidos co-
valentes, diagonalizando a respectiva matriz. De facto, devido à existência de ligação
covalente entre os átomos, deveríamos, em primeiro lugar, escrever as híbridas sob a
forma de combinações lineares das orbitais atómicas s, px , py e pz .
h = Φc (4.51)
em que
h = h1 h2 h3 h4
Φ = s px py pz
e a partir dessas 4 híbridas sp3 escrever combinações ligantes, b1j , e antiligantes, b2j ,
envolvendo pares de átomos, uma vez que a célula primitiva tem dois átomos.
b = h c0 (4.52)
sendo
1
b1j = √ (h1j + h2j )
2
1
b2j = √ (h1j − h2j )
2
com h1j e h2j dos átomos vizinhos em cada para j, e finalmente diagonalizar a matriz 8×8
de base b (que é constituída por 4 orbitais ligantes e 4 anti-ligantes). No entanto, dado
que do ponto de vista matemático posso diagonalizar uma matriz a partir de qualquer
base, posso diagonalizar a matriz H na base das 8 orbitais atómicas s, px , py , pz dos 2
átomos que constituem a célula primitiva.
A necessidade de tomar como base as orbitais de valência do par de átomos que resultou
aqui da aplicação da expressão (4.50) é também uma consequência de considerações sobre
a ligação química e da necessidade de que as combinações lineares satisfaçam o teorema
de Bloch. De facto, o teorema de Bloch implica que as orbitais base da expansão, os
φ(r − Rj ), estejam relacionados por translações T. Ora, num sólido covalente, como por
exemplo o silício, há dois átomos por célula primitiva e as orbitais de um dos átomos
137
ESTRUTURAS DE BANDAS DE SEMICONDUTORES E DE METAIS
da célula não estão relacionadas com as suas análogas do outro átomo da célula por
nenhuma translação T.
py
+ z=-a/4 + z=a/4
- ++ - +
px
- -
[111] s
Catião - d3 d1
[111]
-
+
- +
Anião
d4 d2
- --
+ --
[111] [111] +
- + - +
z=a/4 z=-a/4
a - -
138
TEORIA DE BANDAS
Para não alongar demasiado, vamos calcular em detalhe apenas alguns. Por exemplo:
N
X
Hsc sa (k) = Vssσ eik.dj = Vssσ (eik.d1 + eik.d2 + eik.d3 + eik.d4 ) = Ess g0
j
Vspσ
Hsc pax (k) = − √ (eik.d1 + eik.d2 − eik.d3 − eik.d4 ) = Esp g1
3
√
O factor −1/ 3 resulta da projecção de pax na direcção [111]. É evidente também que
Hsc sc = εs , etc.
Deste modo poderíamos calcular todos os 64 elementos matriciais Hαβ (k) o que aliás
pode ser simplificado visto que alguns são nulos e Hαβ (k) =H∗αβ (k) (matriz hermitiana).
εcs Ess g0 0 0 0 Esp g1 Esp g2 Esp g3
Ess g ∗ εas −Esp g1∗ −Esp g2∗ −Esp g3∗ 0 0 0
0
0 −Esp g1 εcp 0 0 Exx g0 Exy g3 Exy g1
0 −Esp g2 0 εcp 0 Exy g3 Exx g0 Exy g1
H=
εcp
0
−Esp g3 0 0 Exy g1 Exy g2 Exx g0
Esp g1∗ 0 Exx g0∗ Exy g3∗ Exy g1∗ εap 0 0
E g ∗ 0 Exy g3∗ Exx g0∗ Exy g2∗ 0 εap 0
sp 2
Esp g3∗ 0 Exy g1∗ Exy g1∗ Exx g0∗ 0 0 εap
139
ESTRUTURAS DE BANDAS DE SEMICONDUTORES E DE METAIS
E E
(eV) (eV)
8 8
4 4
L1c
0 0 !2v X1c
-4 -4
K
-8 -8 !
X
L
- 12 - 12 W
L ! X K ! L ! X K !
a) Bandas CLOA para o Ge b) Bandas "verdadeiras" para o Ge.
(Método do pseudopotencial)
10
2
Energy [eV]
0
~ 0.5 eV
-2
-4
-6
-8
-10
-12
U W Γ X W L Γ
140
TEORIA DE BANDAS
bandas de energia. Essas soluções estão representadas na Fig.2.61. Note-se que o método
CLOA só é aceitável para bandas preenchidas, como se pode ver na Fig. 4.24, em que
as bandas CLOA são comparadas com as bandas chamadas "verdadeiras"calculadas por
métodos semi-empíricos do pseudopotencial.
141
OUTROS MÉTODOS PARA CÁLCULO DE ESTRUTURA DE BANDAS
142
TEORIA DE BANDAS
conhecido por tight binding) funciona bem, próximo dos iões, mas é mau para a parte de
elevado comprimento de onda, (Fig. 4.28.)
Figura 4.28: Função de onda típica do modelo CLOA. Notar a sua forma nas
regiões vizinhas dos iões e nos espaços internucleares.
O método das ondas planas ortogonalizadas resulta da necessidade de que todas as fun-
ções de onda, nomeadamente as que descrevem os electrões do cerne e as que descre-
vem os electrões de valência, devem ser ortogonais. Vamos então tomar ondas planas e
ortogonalizá-las em relação às funções de onda do cerne.
Esperamos, assim, que sejam necessárias menos ondas planas ortogonalizadas, para re-
presentar a função de onda do cristal, do que as necessárias a uma representação com
base em ondas planas simples.
143
OUTROS MÉTODOS PARA CÁLCULO DE ESTRUTURA DE BANDAS
|c >
P P P
em que |ki é uma onda plana, c = i n , sendo i , o índice dos átomos da base na
célula primitiva e n, os estados dos átomos do cerne (1s, 2s, 2p,...)13 :
sendo, portanto Z
1
hc|ki = √ χ∗n (r − Ri ) ei k.r dτ (4.55)
V
odemos vêr que os |φ(k)i são, de facto, ortogonalizados relativamente aos estados do
cerne, |ci, multiplicando à esquerda por um estado do cerne hc0 |, e integrando, atendendo
a que
X
hc0 |ki − hc0 |cihc|ki = hc0 |ki − hc0 |ki = 0
c
0
uma vez que hc |ci = δcc0 .
13 Notarque |cihc| é a decomposição da unidade, i.e., |cihc| = 1, segundo Dirac. Ver por ex. Livro
"Introdução à Química Quântica Computacional", pag. 78, eq: 3.50.
144
TEORIA DE BANDAS
Elementos Matriciais
vem X X
H |ki − H |cihc|ki = E |ki − E |cihc|ki (4.57)
c c
ou X
H |ki + (E − H) |cihc|ki = E |ki (4.58)
c
fazendo
~2 2
H=− ∇ + V (r)
2m
vem
~2 2 X
− ∇ |ki + V |ki + (E − H) |cihc|ki = E |ki
2m c
equação que tem a forma de uma equação de valores próprios para os vectores |ki:
" #
~2 2 X
− ∇ + V (r) + (E − H) |cihc| ki = E |ki (4.59)
2m c
A este potencial, que, de facto, contém uma contribuição de energia cinética (dos electrões
do cerne, contida em En ), chama-se pseudopotencial. Note-se que W (r, r0 ) depende de
Ek , é não local e não é único.
145
OUTROS MÉTODOS PARA CÁLCULO DE ESTRUTURA DE BANDAS
~2 2 ~2 kF
2
e uma vez que 2m ∇ |ki =− 2m = −EF ,
!
X X
W =V − V |cihc| = V 1− |cihc| (4.63)
c c
P
Note-se que os c são da forma |ci = |χn (r − Ri )i e que portanto a parcela c |cihc| só é
significativa e da ordem de 1, na vizinhança dos iões que estão nas posições Ri . Assim,
o pseudopotencial é praticamente nulo na proximidade dos iões e reduz-se ao potencial
V (r) no espaço entre os iões.
2
Introduzindo o conceito de raio do cerne, vem para r > rc |φk i ≈ |ki e W ≈ − Zer e
P
para r < rc , |φk i ≈ c |cihc|ki e W ≈ 0, o que daria um pseudopotencial da forma
representada na Fig. 4.30. Este potencial resulta de que os electrões do cerne geram uma
rc
rc r
W 0
-Z e 2
r
W
2
W - Zre
146
TEORIA DE BANDAS
ou
hk + G|W |ki = S(G) wG (4.66)
1 −i G.Ri
P
em que S(G) = N i e é o factor de estrutura geométrico e N o número de iões.
147
CONSEQUÊNCIAS DA ESTRUTURA DE BANDAS EM SEMICONDUTORES
0
1 2 G/k F
wG
(2EF /3)
-1
Calor Específico Electrónico dos Semicondutores Já vimos qual era a contribuição dos
electrões livres para o calor específico dos metais e veremos depois, a contribuição das
vibrações da rede cristalina para o calor específico.
Vamos agora analisar a contribuição electrónica para o calor específico no caso dos semi-
condutores.
148
TEORIA DE BANDAS
"
! k
EF
!
a banda de condução fica à energia ∆ e a banda de valência, à energia −∆. Nos semicon-
dutores, ∆ é da ordem de 1 eV e portanto muito maior do que kB T . Nestas condições,
a função de distribuição é dada aproximadamente por:
1
f (E) = ≈ e−E/kB T (4.68)
1+ e(E−EF )/kB T
que não é mais do que a distribuição de Boltzmann. Fisicamente, isto significa que a
probabilidade de ocupação de estados é tão pequena que a probabilidade de um estado
vir a ser ocupado simultaneamente por dois electrões é desprezável, sendo irrelevante
considerar o princípio de exclusão de Pauli. Tomando EF como independente da tempe-
ratura, podemos calcular a energia dos electrões excitados que por simetria será igual à
energia dos ”buracos”. A energia total dos electrões na banda de condução será:
X X
Eel = En f (En ) ≈ En e−En /kB T (4.69)
n n
Convertendo a soma num integral no espaço dos k e usando o conceito de massa efectiva,
para descrever as energias, numa aproximação em que se toma a base da banda de
condução como uma banda calculada pelo método do pseudopotencial (exp.4.64), com
massa efectiva isotrópica, para simplicidade.
~2 k 2
E(k) = ∆ + (4.70)
2 m∗
149
CONSEQUÊNCIAS DA ESTRUTURA DE BANDAS EM SEMICONDUTORES
~2 k 2
Z
2 2 2 ∗
Eel = dk 4πk 2
∆ + e−(∆+~ k /2 m )/kB T
(2π)3 2 m∗
3/2 (4.71)
∆ 2 m∗ kB T
3 kB T
= 1 + e−∆/kB T
4 ~2 π 2 ∆
que é da ordem de ∆ por electrão excitado. Podemos adicionar a esta quantidade uma
contribuição igual devida aos ”buracos”, para obter a energia total. Para obter o calor
específico bastaria achar a derivada em ordem à temperatura. Note-se que ∆ será muito
maior do que kB T e portanto o factor exponencial será extremamente pequeno. Vê-se
assim que, de acordo com a experiência, os valores da contribuição dos electrões e buracos
para o calor específico é muito pequena. Como veremos, a contribuição da rede é muito
mais importante.
A força que actua num electrão na presença de campos (E e B) é, como já vimos (ex-
pressão 4.24), dada por
dk
Fext = ~ = −e (E + v × B) (4.72)
dt
Por outro lado, como já vimos, a velocidade média (velocidade de grupo) de um electrão
num estado com vector de onda k é dada por
1
vg (k) = ∇k E(k)
~
recordando que esta expressão se pode deduzir qualitativamente se atendermos a que a
velocidade média do electrão é a velocidade do grupo de ondas vg = dω
dk e que E = ~ω.
De facto,
dω d(E/~) 1 dE
vg = = =
dk dk ~ dk
As equações do movimento do grupo de ondas, para electrões numa banda En (k), são
então
1
vgn (k) = ∇k En (k)
~
(4.73)
dk̄
~ = −e E (r̄, t) + vgn k̄ × B (r̄, t)
dt
A evolução de r̄ e k̄ (médios) para o electrão no grupo de ondas, com o tempo entre
colisões, é determinada pelas equações acima e, portanto, pode ser estimada unicamente
através do conhecimento da estrutura de bandas do sólido, En (k).
150
TEORIA DE BANDAS
Esta aproximação só é válida se o grupo de de ondas for formado com estados exclusiva-
mente duma só banda, e falha se tiver transições interbandas, nomeadamente através de
efeito de túnel, transições ópticas ou magnéticas.
Um sólido para o qual todas as bandas estão completamente preenchidas ou vazias será
um isolador eléctrico e térmico. Uma vez que o número de níveis em cada banda é igual
ao número de células primitivas do cristal e que cada banda pode conter dois electrões,
só nos sólidos com um número par de electrões por célula primitiva as bandas serão
totalmente preenchidas ou vazias. Note-se que o inverso não é necessariamente verdade.
Existem sólidos (e.g. metais divalentes) com um número par de electrões por célula
primitiva que são condutores, uma vez que podem existir sobreposições de bandas que
originem bandas parcialmente preenchidas, como já vimos e como se mostra na Fig.4.34.
151
CONSEQUÊNCIAS DA ESTRUTURA DE BANDAS EM SEMICONDUTORES
II
II I II
II
Há dois pontos importantes que interessa referir para compreender como é que os elec-
trões numa banda de energia podem contribuir para correntes eléctricas atribuíveis a
transportadores com carga positiva.
Deste modo, embora as únicas cargas que existem sejam electrões, podemos quando con-
veniente, considerar que a corrente é transportada por cargas positivas que correspondem
a estados vazios. A essas partículas fictícias chama-se buracos.
Quando se opta por encarar a corrente como sendo transportada por buracos positivos em
vez de electrões negativos, os electrões devem ser encarados como ausência de buracos, i.
152
TEORIA DE BANDAS
e. os níveis ocupados por electrões devem ser considerados como vazios de buracos. Se se
desejar considerar que são os electrões que transportam corrente, então os "buracos não
contribuem. Se, pelo contrário se quiser considerar os buracos como transportadores de
corrente, então os electrões não contribuem. Pode, no entanto, considerar-se que algumas
bandas são bandas de electrões e outras são bandas de buracos conforme for conveniente.
ko
dv dk
F=m =~ = −e (E + v × B) (4.77)
dt dt
153
CONSEQUÊNCIAS DA ESTRUTURA DE BANDAS EM SEMICONDUTORES
~2
=A
2m∗
Para níveis na vizinhança de k0 ,
1 ~(k − k0 )
v(k) = ∇k E(k) ≈ −
~ m∗
e portanto a aceleração será
d ~ dk
a= v(k) = − ∗ (4.79)
dt m dt
dk
isto é, a aceleração é oposta a dt .
1 1 ∂v(k) 1 ∂ 2 E(k)
= = (4.80)
m∗ ~ ∂k ~2 ∂k2
d
que se pode obter fazendo dt v = m~∗ dk
dt (semelhante a (4.79), mas com aceleração paralela
dk 1 dt
a dt ), multiplicando por ~ dv e recorrendo a (4.75).
Outro modo mais simples de derivar a expressão da massa efectiva, (4.80), poderia con-
sistir em substituir a velocidade pela sua expressão, v(k) = ~1 dE(k)
dk , na definição de
aceleração, a = dv
dt , fazer a derivada de uma função de função15
d2 E
dv 1 d dE 1 dk
a= = =
dt ~ dt dk ~ dk2 dt
154
TEORIA DE BANDAS
dp
atender a que p = mv e recorrer à lei de Newton, F = ma,e portanto
F= dt = ~ dk
dt e
1 d2 E
finalmente identificar o inverso da massa (efectiva) com ~2 dk2 .
Vê-se assim que a massa efectiva m∗ terá o sinal da segunda derivada da curva E(k).
Note-se que o segundo membro de (4.80) é um tensor (e função de k) pelo que se poderiam
explicitar as componentes do tensor massa efectiva, M, por
−1 1 ∂ 2 E(k)
M (k) ij = ± 2
~ ∂ki ∂kj
M(k).a = ±e [E + v(k) × B]
Em geral, como o nome indica, podemos dizer que semicondutores são simultaneamente
maus isoladores, e maus condutores. A estrutura de bandas dum semicondutor é ca-
racterizada por um hiato pequeno (≤ 3 eV), de modo que é possível obter um número
significativo de portadores à temperatura ambiente. Esta densidade de portadores é
uma função rápida da temperatura, e, consequentemente, a condutividade eléctrica varia
muito com a temperatura.
Existem semicondutores de hiato directo (Fig. 4.36a) como, por exemplo, o GaAs para os
quais o topo da banda de valência e o fundo da banda de condução ocorrem para o mesmo
valor de k (em geral para k = 0). Como consequência, fortes transições ópticas (dipolo
155
CONSEQUÊNCIAS DA ESTRUTURA DE BANDAS EM SEMICONDUTORES
a) b)
E Banda de condução E
Banda de Banda de
buracos leves buracos leves
k k
permitidas, i.e., verticais (kf otão ≈ 0)) são observadas. Existem também semicondutores
de hiato indirecto (Fig.4.36.b) como o Si e o Ge (ver Fig.4.24.b).
156
TEORIA DE BANDAS
Ec − EF kB T
EF − Ev kB T
1
E > Ec : ≈ e−(E−EF )/kB T
e(E−EF )/kB T + 1
157
CONSEQUÊNCIAS DA ESTRUTURA DE BANDAS EM SEMICONDUTORES
pv (T ) = dE Dv (E)e−(EF −E)/kB T
Ev ,f undo
e, para o germânio, em
1/2
m∗c 3/2 (Ge) = 4 m∗L m∗T 2
158
TEORIA DE BANDAS
Se tivermos uma banda de valência degenerada (isto é, as bandas dos buracos pesados e
leves têm a mesma energia quando k = 0) vem, para a massa efectiva da densidade de
estados,
m∗v 3/2 = m∗lh 3/2 + m∗hh 3/2
em que m∗lh e m∗hh são, respectivamente, as massas efectivas para os buracos leves e
buracos pesados.
o produto np
3
kB T 3/2 −Eg /kB T
np = 4 (m∗c m∗v ) e = Nc (T )Nv (T )e−(Ec −Ev )/kB T
2π~2
159
CONSEQUÊNCIAS DA ESTRUTURA DE BANDAS EM SEMICONDUTORES
Para calcular a condutividade temos que somar as contribuições dos electrões e dos
"buracos"
σ = n e µe + p e µp
A condutividade será portanto proporcional a e−Eg /2kB T . Uma vez que a mobilidade é,
em geral, uma função da temperatura da forma µ ∝ T x , o factor exponencial é dominante,
pelo que podemos em geral escrever:
σ = σ0 e−Eg /2kB T
n = p = ni
O nível de Fermi para um semicondutor intrínseco pode também ser facilmente calculado:
1 1 Nv
EF = Ev + Eg + kB T ln
2 2 Nc
160
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 4
4A.1 INTRODUÇÃO
Vamos aqui aplicar os conceitos desenvolvidos no capítulo 4, secção 4.5, sobre o método
das combinações lineares, CL, e em particular em 4.5.1 para sólidos 1D (equações 4.49 e
4.50).
O problema do cálculo de bandas num sólido com vários átomos por célula reduz-se
sempre à diagonalização da matriz H de dimensão sN × sN em que s é o número de
orbitais que se considerem por célula e N é o número de células no cristal. A matriz H é,
como vimos, redutível a s × s blocos de sub-matrizes N × N , e atendendo a que Hkij0 k = 0
para k0 6= k, podemos escrever:
H(k)11 H(k)12 ... H(k)1s
H(k)21
... ... ...
H= (4A.1)
... ... ... ...
em que k funciona como um parâmetro e cada bloco se reduz a uma função contínua da
forma Hαβ (k):
N
X
Hαβ (k) = ei k(Rj −Ri ) Hij (4A.2)
j
162
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 4
depende apenas das distâncias (Rj −Ri ) e da natureza das orbitais. O número de orbitais
a considerar depende da aproximação que se fizer.
Em primeiro lugar interessa escolher a base das combinações lineares. Como sabemos,
os átomos de carbono estão ligados entre si por uma ligação σ, envolvendo as orbitais
híbridas sp2 e uma ligação π envolvendo a orbital pz que fica com um electrão. Numa
1 Defacto, durante muito tempo pensou-se que o poliacetileno deveria ser um metal, mas quanto mais se
purificava mais isolador ficava. Num feliz acaso de serenedipidade, um estudante do grupo do Professor
Hideki Shirakawa polimerizou o acetileno com mil vezes mais catalizador do que o normalmente usado,
tendo obtido um filme de poliacetileno prateado e condutor. Mais tarde Shirakawa colaborou com Alan J.
Heeger e Alan MacDiarmid e descobriram, em 1976, que a oxidação do poliacetileno com iodo resulatava
num aumento da condutividade de 108 . Pela descoberta receberam os três professores, o prémio Nobel
da Quimica no ano 2000. O aluno que fez a descoberta continua um ilustre desconhecido.
163
BANDAS DE ENERGIA EM POLÍMEROS CONJUGADOS
E = ε0 − 2t cos ka
Uma vez que há um electrão por unidade CH e portanto dois electrões por célula, a
banda π, ou banda de valência está cheia e a banda π ∗ (banda de condução) vazia.
A estrutura de bandas do PPV (poli(p-fenileno vinileno)), pode ser vista como a sobre-
posição das estruturas de bandas do benzeno e do etileno (este com bandas localizadas)
— Fig. 4A.4. Atendendo a que há 8 electrões π por célula, as quatro primeiras bandas
(a última das quais é a banda de valência) estão preenchidas. O espectro electrónico do
PPV (Fig. 4A.4) pode ser compreendido com a ajuda da estrutura de bandas. Tal como
numa molécula, o espectro electrónico é devido a transições entre o estado fundamental
(nível de energia HOMO ou banda de valência) e o primeiro estado excitado (nível de
energia LUMO ou banda de condução). No esquema c) da Fig. 4A.4, essas transições
são verticais, começando para o valor de energia mais baixa que corresponde a k = 0,—a
distância na escala de energias entre a banda de valência e a banda de condução para
k = 0 chama-se hiato óptico—e estendendo-se, num contínuo, até aos valores mais ele-
vados da separação entre as duas bandas, que no esquema sucede no extremo da zona de
Brillouin.
164
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 4
a) b) c)
Fig. 16. A estrutura de bandas do PPV pode ser vista como devida às estruturas do benzeno e do etileno sobrepostas. Em
Figura 4A.4: A estrutura de bandas do PPV pode ser vista como devida às
estruturas do benzeno e do etileno sobrepostas. Em a) mostra-se o mero do
PPV; em b) o benzeno com os seus níveis de energia e a respectiva estrutura de
bandas; em c) a estrutura de bandas do PPV como sobreposição das estruturas
de bandas do benzeno e do etileno.
a) b)
165
BREVE NOTA SOBRE A TEORIA DO FUNCIONAL DA DENSIDADE
respectivo.
166
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 4
As equações 4A.3 constituem um sistema de equações não lineares acopladas que de-
pendem da densidade electrónica, a qual surge, assim, como uma variável fundamental.
Para efeitos de cálculo computacional, podemos usar um procedimento, que se inicia por
uma densidade ρ0 (r) criteriosamente escolhida e com a qual se calcula um primeiro VKS .
Esse potencial é introduzido nas equações de Kohn-Sham, que, resolvidas, dão as orbi-
tais e as energias. Com as orbitais calcula-se nova densidade ρ(r), com a qual se calcula
novo VKS , e assim por diante, até se obter convergência. O ciclo autocoerente é dado
por terminado quando é alcançado o critério de convergência preestabelecido. Os dois
critérios mais comuns baseiam-se nas diferenças das energias totais ou das densidades
para duas iterações sucessivas. Por outras palavras, quando |E (i) − E (i−1) | < δE ou
R (i)
|ρ − ρ(i−1) |dτ < δρ em que E (i) e ρ(i) são os valores da energia total ou da densidade
para a iteração i, e δE e δρ são as tolerâncias definidas pelo utilizador.
Quando se usa uma base para as orbitais de Kohn Sham (que podem ser funções do tipo
Gauss ou Slater, torna-se necessário diagonalizar a matriz FKS (tal como no método de
Hartree-Fock-Rootham é preciso diagonalizar a matriz F). Nota-se que a minimização da
energia é feita pelo método dos multiplicadores de Lagrange, em que a condição restritiva,
R
equivalente à condição de normalização, é na teoria DFT, ρ(r)dτ = N .
167
DEFEITOS TOPOLÓGICOS —SOLITÕES E POLARÕES
No final, podemos calcular várias observáveis, a mais importante das quais é a energia
total. A partir da energia total, podem obter-se configurações de equilíbrio (minimizando
E(R)), energias de ionização, etc.
5 G.R. Hutchison, Yu-Jun Zhao, B. Delley, A. J. Freeman, M. A. Ratner, and T. J. Marks, ”Electronic
structure of conducting polymers: Limitations of oligomer extrapolation approximations and effects of
heteroatoms”, PHYSICAL REVIEW B 68, 035204 (2003)
168
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 4
Figura 4A.6: Níveis de energia calculados por DFT para sistemas de um a seis
meros e densidade de estados para uma cadeia infinita de polititofeno.
Figura 4A.7: Bandas de energia do politiofeno calculadas por DFT. Neste cálculo
o zero foi tomado como o máximo da banda de valência.
169
DEFEITOS TOPOLÓGICOS —SOLITÕES E POLARÕES
Figura 4A.8: Solitão neutro, separando dois segmentos com direcções opostas da
ligação dupla alternada.
responde a níveis não ligantes no meio do hiato que separa as bandas π e π ∗ . Por dopagem
é possível criar solitões com carga positiva e negativa, e spin zero, bem como solitões neu-
tros com spin 1/2 e até com cargas fraccionárias, como se mostra na figura 4A.9. Além
do poliacetileno, também uma das formas de polianilina tem um estado fundamental de-
generado. Os outros polímeros conjugados (incluindo outras formas de poliacetileno) têm
estados fundamentais não degenerados—não há equivalência entre duas cadeias com du-
plas ligações conjugadas, deslocadas de uma posição (de −Cn−1 = Cn − a −Cn = Cn+1 −
). A diferenciação entre as duas direcçãoes de ligações alternadas é exemplificada no es-
quema da figura 4A.10 para o poli(p-fenileno vinileno), (PPV). A criação de solitões,
polarões e bipolarões pode ser seguida de absorpção óptica.
170
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 4
171
PROPRIEDADES DE TRANSPORTE
4A Propriedades de transporte
Os polímeros conjugados com condutividades elevadas têm sido descritos como metais
desordenados na proximidade da transição metal-isolador. Têm uma densidade de esta-
dos finita junto do nível de Fermi, como se pode concluir da observação de susceptilidade
magnética do tipo Pauli, característica dos metais, bem como uma componente linear
na dependência com a temperatura do poder termoeléctrico e do calor específico. No
entanto, a condutividade d.c. (corrente directa) é termicamente activada (assistida por
fonões), que decresce à medida que se baixa a temperatura, ou, na melhor das hipóteses,
com um mínimo abaixo da temperatura ambiente.
4A Propriedades Ópticas
172
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 4
funde, o que é bom para a estabilidade, mas mau para o processamento. Ambos estes
problemas podem ser ultrapassados por modificações químicas. Também já foi observada
acção laser em polímeros conjugados por excitação fotónica no PPV e noutros polímeros
luminescentes, havendo um grande esforço para obter acção laser por excitação eléctrica.
4A Aplicações
173
APLICAÇÕES
A primeira geração de electrónica orgânica está (em 2009) a caminhar para a indus-
trialização e comercialização, e uma segunda geração está no processo de concepção e
desenvolvimento. Estão identificadas as seguintes gamas de aplicações: etiquetas de ra-
diofrequência para identificação (RFID) ou código de barras electrónico, matrizes activas
de transistores de filme fino para displays, indicadores, cartões inteligentes, sensores,
actuadores e fontes de alimentação como baterias e células fotovoltaicas de plástico.
174
5
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
Página 176 (propositadamente em branco).
5.1 INTRODUÇÃO
Um dos conceitos que mais se tem afirmado como unificador de uma teoria do estado
sólido é o conceito de excitações elementares. Vejamos em que consistem.
Como já deve ser claro do estudo que fizemos dos electrões, quando estudamos um sólido,
ele está num estado excitado. A energia de excitação pode ser térmica, pode ser imposta
do exterior, ou pode resultar de perturbações na estrutura da rede cristalina. Essa energia
pode ser absorvida pelos electrões de valência ou pela rede. Pode aparecer como energia
cinética dos átomos, ou pode surgir de interacções magnéticas.
Se pensarmos na rede cristalina, podemos tomar como estado fundamental o cristal com
os átomos nas suas posições de equilíbrio. A excitação térmica provoca movimentos
vibracionais dos átomos em torno das posições de equilíbrio, que podem, em primeira
aproximação ser descritos como osciladores harmónicos. Um sólido com N iões (ou áto-
mos) tem 3N − 6 graus de liberdade vibracionais que em coordenadas normais constituem
os modos normais de vibração. Numa descrição quântica, a energia vibracional do sólido
é descrita em termos de quanta vibracionais a que chamamos fonões. Os fonões são
um exemplo de excitações elementares. São equivalentes aos fotões, que são osciladores
quantizados da radiação ou excitações elementares do campo electromagnético.
Os fonões são excitações colectivas, na medida em que todos os átomos estão, em prin-
cípio, envolvidos colectivamente nesses movimentos vibracionais.
As interacções colectivas num sistema de muitas partículas pode ser bastante simplificado
do ponto de vista formal. Por exemplo, uma partícula carregada que se mova no seio
de um gás de partículas semelhantes, vai desviar as outras partículas da sua trajectória.
Esta situação pode ser formalmente descrita por um modelo em que não existem interac-
ções. Basta que consideremos que a partícula é acompanhada de uma nuvem de cargas
de sinal oposto. A interacção, ou, por outras palavras, o efeito das outras partículas é
substituído pela inércia do conjunto partícula-nuvem que a partícula transporta consigo.
Substui-se, assim, um sistema de partículas em interacção por um sistema equivalente
de partículas sem interacções. A dinâmica das partículas originais é substituída pela di-
nâmica, diferente e mais simples, destas novas quase-partículas. As quase-partículas são
outro exemplo de excitações elementares. Podemos, por exemplo, como veremos, descre-
ver excitações colectivas do gás de electrões em interacção, como plasmões (excitações
do plasma), ou excitações de um sistema de spins como magnões.
177
INTRODUÇÃO
Neste capítulo vamos estudar algumas das excitações elementares mais comuns nos sóli-
dos, e começaremos pelos fonões, que resultam das interacções átomo-átomo.
178
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
Q1 Q2 Q3
Figura 5.1: Modos normais de vibração para um sistema de 3 massas não coline-
ares. As setas indicam as direcções dos movimentos de cada massa. Os Q, que
representam os movimentos colectivos do sistema, são as coordenadas normais
que diagonalizam a matriz 3 × 3 das constantes de força.
nos, tal como no caso dos electrões de Bloch, reduzir o sistema de 3rN equações a um
sistema de 3r equações, definido-se um vector de onda, q, com N valores na zona de
Brillouin.
Uma vibração da rede pode ser especificada descrevendo, para cada átomo do cristal, o
deslocamento em relação à posição de equilíbrio, em função do tempo. Se a cada átomo
atribuirmos um número i, este conjunto de deslocamentos pode ser designado por ui (t).
Num modo normal de vibração, a variação temporal é sinusoidal e tem a mesma frequên-
cia para todos os átomos. É portanto possível especificar estes deslocamentos como a
parte real de ui e−iωt , onde ω é a frequência angular do modo normal (ω = 2πν) e ui é
179
INTERACÇÕES ÁTOMO-ÁTOMO: FONÕES
180
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
na direcção j (x, y ou z) dado pela componente umσj (t) do vector deslocamento, u(t),
0
relativamente à posição de equilíbrio, Rmσj :
0
umσj = Rmσ − Rmσ j
(5.2)
1X ∂2V 1X
uα uα0 = Φ(αα0 ) uα uα0 (5.6)
2 0 ∂Rα ∂Rα0 2 0
αα αα
Podemos então escrever a equação do movimento, atendendo a que F = −∇V = −∂V /∂uα :
∂V X
Mσ üα = − =− Φ(αα0 ) uα0 (5.7)
∂uα 0 α
Podemos escrever uma equação do movimento (expressão 5.7) para cada componente
cartesiana do vector posição para cada átomo da base da célula unitária.
181
INTERACÇÕES ÁTOMO-ÁTOMO: FONÕES
Para melhor ver o problema, podemos, para simplificar, começar por considerar uma
rede unidimensional com um só átomo por célula, com parâmetro de rede a (Fig. 5.2). A
Figura 5.2: Rede unidimensional com um átomo por célula e parâmetro de rede
a. Os vectores u representam os desvios às posições de equilíbrio.
força que actua sobre o átomo n é, tomando só uma constante de força, K, entre átomos
vizinhos,
M d2 un
= Fn
dt2
− M ω 2 = −K 2 − eiqa − e−iqa
(cortando factores comuns)
2
− M ω = 2K (cos qa − 1)
2 4K 2 1 2 1
ω = sen qa (atendendo a que 1 − cos x = 2 sen x
M 2 2
ficando
r
K 1
ω(q) = 2 sen qa (5.9)
M 2
q = qx = q
2π N
q= m m = ±1, .... ±
Na 2
182
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
a) b)
ω(q)
LA
TA
TA
0 π/a 0 π/a
Figura 5.3: Curvas de dispersão para uma cadeia linear de átomos com um
átomo por célula, considerando apenas as interacções entre os vizinhos mais
próximos. a) Considerando apenas os deslocamentos dos átomos ao longo da
cadeia. b) Considerando também os deslocamentos dos átomos perpendicular-
mente à cadeia—modos acústicos longitudinal e transversais. Note-se que ω
é linear para pequenos valores de q, e que ∂ω/∂q é nulo nos limites de zona
(q = +π/a).
Convém discutir agora quais os valores que cada q pode tomar. Se considerarmos con-
dições fronteira periódicas, obtemos, imediatamente, para a cadeia linear, q = πm/N a,
em que m é inteiro. Da simetria translacional da rede de átomos, resulta que apenas os
valores de q situados dentro da primeira zona de Brillouin dão origem a soluções distintas.
Há exactamente N soluções distintas, que correspondem aos N valores permitidos para
q na zona de Brillouin. Isto é consistente com os N graus de liberdade da rede original
(um átomo por célula numa cadeia).
Atendendo a que 5.9 diz respeito às ondas que se propagam segundo uma das coordenadas
cartesianas, pode concluir-se que no caso geral de um sólido a três dimensões, há 3r
ramos da função de dispersão ω(q): um ramo longitudinal (vibrações que se propagam
na mesma direcção dos deslocamentos dos átmos) e dois ramos transversais (vibrações
183
INTERACÇÕES ÁTOMO-ÁTOMO: FONÕES
que se propagam perpendicularmente aos deslocamentos dos átomos), ver figuras 5.3 b)
e 5.4 .
u1 u2 u3 u4 u5 u6
LA
(longitudinal acústico)
z
y
x
TA
(transversal acústico)
TA
(transversal acústico)
∂ω
vg = (5.10)
∂q
Consideremos agora o caso mais complicado de uma cadeia linear de átomos com o
2a
mesmo espaçamento, e constanteM1 de força, K, que anteriormente, mas com duas massas
M2
diferentes, M1 > M2 , alternadamente, como se pode ver no esquema da figura 5.5. As
2n-1 2n 2n+1 2n+2
184
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
2a
M1 M2
2n-1 2n 2n+1 2n+2
Figura 5.5: Rede unidimensional com dois átomos de massas M1 e M2 , por célula
e parâmetro de rede 2a. Para simplicidade consideraremos que só existe uma
constante de força, K.
ou
(
2 K − ω 2 M1 u1 − 2 K cos qa u2 = 0
2 K cos qa u1 − −2 K − ω 2 M2 u2 = 0
ou seja,
" 2 #1/2
4 sen 2 qa
2 1 1 1 1
ω =K + ±K +1 − (5.12)
M1 M2 M1 M2 M 1 M2
A partir de (5.12) podemos traçar as curvas de dispersão ω(q). Há duas soluções (des-
prezando as soluções ω < 0). O traçado de ω(q) pode fazer-se, atribuindo valores a q na
zona de Brillouin e calculando (5.12).
185
INTERACÇÕES ÁTOMO-ÁTOMO: FONÕES
1 1 1 1
Para q = 0, vem ω 2 = K M1 + M2 ±K M1 + M2 , ou
ω0,λ1 = 0
h i1/2 (5.13)
ω0,λ = 2 K 1 + 1
2 M1 M2
[2K( 1 !+ !1 )]1/2 !
M M !!
1 2
! 2K
M2
! 2K
M1
M1 > M2
0 q π/2a
Surgem assim 2 ramos longitudinais – um acústico e outro ópti
Figura 5.6: Rede unidimensional com dois átomos de massas M1 e M2 , por célula
e parâmetro de rede 2a. Para simplicidade consideraremos que só existe uma
constante de força, K.
É claro que as situações reais são mais complicadas, mas as linhas gerais são as mesmas,
podendo sempre os ramos das curvas ω(q) ser descritos separadamente para as três com-
ponentes cartesianas. A título de exemplo, mostram-se, na Fig.5.7, os modos vibracionais
do cloreto de sódio, que é um sólido iónico com dois iões por célula primitiva (Na+ e
Cl− ). Para q perto de 0 (i.e., oscilações de comprimento de onda muito elevado), no
modo acústico, os deslocamentos dos dois átomos
LUZ
da base efectuam-se na mesma direc-
!
ção, correspondendo ao movimento duma entidade com massa M = M1 + M2 , (Fig.5.8a).
A dinâmica é dominada pela interacção intercelular. No modo óptico, (Fig.5.8b), os des-
locamentos dos átomos da base efectuam-se em sentidos opostos. Os iões em cada célula
LO
TO
186
LA
TA
0 q LZ
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
ω
LUZ
!
LO
TO
LA
TA
0 q LZ
a)
Modo acústico
b) Modo óptico
Figura 5.8: Posições extremas dos dois iões de uma célula (p. ex. NaCl) no
caso de um dos modos transversais óptico e acústico. No modo acústico, os iões
movem-se em fase. No modo óptico os iões movem-se em sentidos opostos.
M1 M2
187
Célula primitiva
[100]
INTERACÇÕES ÁTOMO-ÁTOMO: FONÕES
primitiva efectuam o que é essencialmente uma vibração molecular, alargada a uma banda
de frequências devido a interacções intercelulares.
Para q = π/2a, (Fig.5.9), os átomos da base de um dado tipo (M1 ou M2 ) estão nos
nodos de vibrações de comprimento de onda 4a. No modo acústico, os átomos pesados
movem-se, enquanto os leves estão parados, enquanto que no óptico passa-se o contrário.
Figura 5.9: Desvios dos dois iões de uma célula (p. ex. ClNa) no caso dos modos
longitudinais óptico e acústico par q = 2π/a, ao longo da direcção [100]. No
modo acústico, os iões movem-se em fase. No modo óptico os iões movem-se em
sentidos opostos.
Em geral, no caso de haver r átomos por célula unitária, haverá 3 ramos acústicos e 3(r −
1) ramos ópticos. Para pequenas amplitudes de vibração, cada vibração tridimensional
de uma cadeia de átomos pode ser decomposta em três componentes independentes, um
modo longitudinal e dois transversais. As duas vibrações transversais têm lugar ao longo
de dois planos perpendiculares cuja linha de intersecção é a posição de equilíbrio da
cadeia.
188
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
Note-se, no entanto, que estes nomes não devem ser tomados à letra.
Notemos ainda que ~ω é uma energia e q um vector do espaço recíproco, que no caso
unidimensional só tem uma componente q. A função ω(q), ou para o caso geral a três
dimensões, ω(q) tem portanto o mesmo significado para as vibrações da rede que tinha
a função E(k) para os electrões numa rede periódica. Podemos portanto adoptar os
conceitos consequentes de E(k) para o caso das vibrações da rede.
2. O conjunto dos valores de q é finito em resultado das condições aos limites impostas
no cristal. Se o cristal tiver N células primitivas, haverá N valores de q na zona de
Brillouin. Uma vez que há três graus de liberdade por átomo, haverá 3rN graus
de liberdade internos ao cristal (atendendo a que N é grande, 3rN − 6 ≈ 3rN ), ou
seja, 3rN frequências ω(q).
80
Si
LO
PHONON ENERGY ( meV )
60 TO
40
20 LA LA
TA
TA
0
L Γ X K Γ
Figura 5.10: Curvas de dispersão de fonões para o silício. Note-se que o silício
tem 2 átomos por célula e portanto terá 3 × 2 = 6 ramos: um longitudinal e
ECE618 Spring 2010 153
dois transversais acústicos, um longitudial e dois transversais ópticos.
189
INTERACÇÕES ÁTOMO-ÁTOMO: FONÕES
em que α = mσj; m= índice da célula unitária no cristal, ou nó da rede (1, 2, ...m, ..., N ),
σ = átomo da base (1, 2, ..., σ, ..., r) em cada célula unitária; j = x, y, z.
Uma vez que estamos à procura de soluções periódicas no tempo, podemos fazer, absor-
vendo a massa em uα (t),
1
uα (t) = √ uα e−iωt (5.16)
Mα
e as equações do movimento2 (ver 5.7) são então da forma
X Φ
ω 2 uα = D(α0 α) uα0 , D= √ (5.17)
α0
Mα Mα0
Invocando a simetria translacional da rede, Φ (ou D) não podem depender dos índices
m0 e m da célula, separadamente, mas apenas da sua diferença m − m0 :
e se escrevermos
umσj = cσj eiq.Rm (5.19)
2
p
1 Equivalente a H = 2M + 12 ω 2 M x2 .
2 Força = massa×aceleração.
3 Em linguagem matricial, podemos escrever a equação (5.17) sob a forma: ω 2 u = Du em que u tem
3rN componentes uα = umσj na base cartesiana, (x, y, z) e uλ na base que diagonaliza a matriz D
(de dimensão 3rN × 3rN ). Notar que as componentes uλ são vectores na base (x, y, z), (coordenadas
cartesianas).
190
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
obtemos
" #
2
X X 1 0 iq.(Rm0 −Rm
ω cσj = √ φσ0 j 0 ,σj (m − m) e cσ0 j 0 (5.20)
σ0 j 0 m0
Mσ Mσ 0
ou seja, uma vez que o somatório em m0 pode ser transformado num somatório em m0 −m
X
ω 2 cσj = Dσ0 j 0 ,σj (q) cσ0 j 0 (5.21)
σ0 j 0
Para os deslocamentos umσ (t), relativos a cada átomo do cristal, de componentes cartesi-
anas umσj (t) temos então, como soluções particulares das equações de movimento (5.7),
recorrendo a (5.22), (5.19) e (5.16)
1 i(q.Rm −iωt)
u(λ)
mσ (q, t) = √ Qλ (q) ε(λ)
σ (q) e (5.23)
Mσ
a partir das quais podemos construir soluções gerais.
(λ)
Fazemos agora a substituição em (5.15) de uma combinação linear dos umσ (q, t), de
componentes cartesianas
1 X (λ)
umσj (t) = √ Qλ (q, t) εσj (q) eiq.Rm (5.24)
N Mσ λq
em que c(q) tem 3r componentes cλ (q) na base que diagonaliza a matriz D(q), de dimensão 3r × 3r e
q assume N valores (na zona de Brillouin). As 3r componentes cλ (q) são vectores na base (x, y, z) (em
P (λ)
coordenadas cartesianas), i.e., cλ (q) = σj cσj (q). Também se poderiam considerar as r coordenadas
(λ) (λ) (λ)
relativas a cada átomo da base, cσ (q) , tais que cσj = cσ (q).ĵ, com (ĵ = x̂, ŷ, ẑ).
191
INTERACÇÕES ÁTOMO-ÁTOMO: FONÕES
em que o factor exponencial do tempo foi incluído em Qλ (q, t) e o factor N −1/2 resulta
do somatório em q. Através desta substituição, é possível escrever o hamiltoniano em
termos das coordenadas normais Qλ . Para esta conversão, note-se que
0
ei(q −q).Rm = N δ(q0 −q).G
X
(5.25)
m
192
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
A transição para uma descrição quântica pode ser feita interpretando P e Q como ope-
radores sujeitos às relações de comutação
h i
Qλ (q), Pλ0 (q0 ) = i~ δqq0 δλλ0 (5.33)
Cada um dos estados é definido por um par (q, λ) e está ocupado por nλ (q) fonões de
energia ~ ωλ (q), em que nλ (q) são os valores próprios do operador a+
λ (q) aλ (q), tal que:
a+
λ (q) aλ (q) |nλ (q)i = nλ (q) |nλ (q)i (5.36)
A contribuição deste estado (modo normal) para a energia total é nλ (q) ~ωλ (q) e a
energia total é
X 1
E= nλ (q) + ~ ωλ (q) (5.37)
2
λq
Os operadores a+
q e aq têm por efeito, respectivamente:
a+
p
q |nq i = nq + 1 |nq + 1i
√ (5.38)
aq |nq i = nq |nq − 1i
193
INTERACÇÕES ÁTOMO-ÁTOMO: FONÕES
Na aproximação harmónica que utilizámos, o gás de fonões consiste em fonões que não
interactuam uns com os outros. Se compararmos com o gás de electrões livres, vemos que
a diferença básica entre eles resulta de que os electrões são fermiões enquanto os fonões
são bosões. Cada estado no espectro das vibrações da rede pode portanto ser ocupado
por um número qualquer de fonões (indiscerníveis ou indistinguíveis uns dos outros).
Além disso, o número de fonões depende do teor em energia das vibrações da rede, i.e.,
da temperatura. A T = 0 K, nenhum fonão está excitado e a rede tem apenas a ener-
gia do ponto zero, 21 λq ~ ωλ (q); (λ é o índice do ramo de ω(q) e vai de λ = 1 a λ = 3r).
P
Note-se como surge aqui a noção de excitação elementar. Recorde-se, em primeiro lu-
gar, que as ondas de luz foram, em 1900, consideradas por Planck, como osciladores
quantizados da radiação, (oscilações quantizadas do campo electromagnético) e em 1905,
como partículas, por Einstein, as quais vieram mais tarde a chamar-se fotões, cada um
com energia ~ω = hν. Isto sugere que as ondas de som se podem considerar do mesmo
modo. Se olharmos para a expressão 5.37 vemos que, em vez de encarar uma onda de
som com vector de onda q como um objecto fictício (oscilador harmónico) com energia
quantizada Eq = ~ ωq nq + 12 , podemos, em alternativa, encará-la como um conjunto
Este modo de ver a onda de som como fonão proporciona uma nova interpretação da
função de onda e dos operadores sobe e desce a+ q , e aq , respectivamente. É claro que
a função de onda ψ (ou u) descreve um sistema com nq1 fonões de vector de onda q1 ,
nq2 fonões de vector de onda q2 , etc. Portanto o operador a+ q cria um fonão de vector
de onda q, enquanto que o operador aq destroi um tal fonão, e a+ q aq = nq é o operador
número para fonões de vector de onda q. Por isso se chama aos operadores a+ q , e aq
operadores de criação e de aniquilação de fonões.
194
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
sistema de todas as ondas de som quantizadas não é igual à soma das energias de todos
os fonões. Na expressão 5.37 vê-se que a energia de qualquer estado excitado do sistema é
a soma da energia do estado fundamental com a colecção de fonões independentes acima
do estado fundamental. Assim, teremos para o hamiltoniano
X 1X
H= H(pi , ri ) + V (ri , rj ; pi , pj )
i
2 ij
X
⇒ H = E0 + q a+
q aq + termos pequenos
q
Este resultado obtido para os fonões é perfeitamente geral. Na maioria dos problemas
envolvendo muitos corpos (many-body systems) é possível transformar o sistema de mui-
tas partículas em interacção, num sistema de excitações elementares aproximadamente
independentes acima do estado fundamental. Há que ter, no entanto, em conta, que há
partículas que seguem a estatística de Bose-Einstein, como os fotões e os fonões, e há
partículas que como os electrões, seguem a estatística de Fermi-Dirac. Esta distinção
implica que os operadores de criação e de aniquilação têm propriedades de comutação
diferentes.
1
nλ (q) = hωλ (q)
(5.39)
e kB T
−1
Se não tivéssemos terminado a expansão (5.5) no segundo termo, não teria sido possível
diagonalizar o hamiltoniano. A consideração de termos de maior ordem, não-harmónicos,
introduz interações fonão-fonão.
195
INTERACÇÕES ÁTOMO-ÁTOMO: FONÕES
Note-se, entretanto, que um somatório sobre todos os vectores do espaço recíproco para
qualquer função F (ω), pode sempre escrever-se como8 :
Z Z ∞
X V 3
F (ω) = F (ω) d q = F (ω) D(ω) dω (5.41)
q
(2π)3 0
Z ∞
E − E0 = hn(ω, T )i D(ω) ~ω dω (5.42)
0
Para o cálculo do calor específico, são geralmente consideradas duas aproximações para a
densidade de estados D(ω): a aproximação de Einstein (modos ópticos) e a aproximação
de Debye (modos acústicos).
MODELO DE EINSTEIN
Neste modelo, todos os osciladores têm a mesma frequência: ωλ (q) = ωE . Vem então
para a densidade de estados:
196
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
Esta aproximação é geralmente utilizada para descrever a contribuição dos modos ópticos.
Ponderando com um factor 3 para os três modos ópticos (quando r = 2), vem
2
e~ωE /kB T
∂E ~ωE
Cv = = 3N kB 2 (5.45)
∂T kB T e~ωE /kB T − 1
x2 ex
θE θE
Cv = 3 N kB fE com fE (x) = 2 e x= (5.46)
T (ex − 1) T
2
θE 1
Cv = 3N kB (5.47)
T eθE /T
Quando T → 0 Cv → 0
ΘE
Para altas temperaturas, isto é, quando T >> ΘE , a exponencial e T → 1 e podemos
expandi-la em série9 dando eΘE /T − 1 ≈ 1 + ΘTE + . . . − 1 ≈ ΘTE , donde
Cv ≈ 3 N kB (5.48)
que é a conhecida lei de Dulong e Petit. De facto, Dulong e Petit observaram em 1819 que
o calor específico a volume constante de todo sos sólidos elementares é aproximadamente
igual a 2.49 J mole−1 K−1 , isto é, 3R em que R é a constante dos gases perfeitos.
A lei de Dulong e Petit pode ser explicada pelo princípio de equipartição de energia
tratando cada átomo do sólido como um oscilador harmónico linear com seis graus de
liberdade. O estudo mais aprofundado mostra que o calor específico de um sólido varia
com a temperartura e tende para zero quando a tempeartura tende para zero, com se vê
no modelo de Einstein e como se verá a seguir no modelo de Debye.
MODELO DE DEBYE
9 ex x2 x3
=1+x+ 2!
+ 3!
+ ...
197
INTERACÇÕES ÁTOMO-ÁTOMO: FONÕES
3) Faz-se uma aproximação linear aos modos acústicos, ωλ (q) = vλ q, em que a velocidade
do som é constante e igual a vλ .
dN
D(ω) = (5.49)
dω
O número de modos com vector de onda entre 0 e q será
q
V ω3
Z
dN V 4
N= dq = 3
. πq 3 = (5.50)
0 dq (2π) 3 6π 2 v 3
ω
atendendo a que na aproximação de Debye q = v, em que v é a velocidade do som e V ,
o volume do cristal.
qz
q
qy
qx
Figura 5.11: Esfera de raio q onde estão contidos todos os modos normais com
3
. = (2π)
2π 2π
vectores de onda entre 0 e q. dq = δqx .δqy .δqz = L2πx . Ly Lz V é o elemento
de volume no espaço recíproco.
dN V ω2
D(ω) = = por ramo λ (5.51)
dω 2π 2 v 3
Substituindo (5.51) e (5.39) em (5.42),para os três ramos acústicos
∞ ∞
V ω2 4 4
x3
Z Z
~ω 3V kB T
E − E0 = 3 dω 2 3
= dx (5.52)
0 2π v e ~ω/kB T −1 2π v 3 ~3
2
0 ex−1
198
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
em que se fez10 x = ~ω
kB T .
e, derivando em ordem a T ,
3 Z xD
x4 ex
∂E T
Cv = = 9N kB dx (5.53)
∂T θD 0 (ex − 1)2
ou
xD
x4
Z
θD 3 θD
Cv = 3 N kB f com fD (x) = 3 dx e x = (5.54)
T x 0 (ex − 1)2 T
4π 4
que dá a lei de Dulong e Petit para T → ∞ e dá para T → 0, e fazendo fD (x) ≈ 5x3 :
3
12π 4 N kB
T
Cv (T → 0) ≈ (5.55)
5 ΘD
10 Note-se que, se x = ~ω
, dx = ~
dω
kB T kB T
199
INTERACÇÕES ÁTOMO-ÁTOMO: FONÕES
D(ω)
Modelo de Debye
Cristal real
ωD ω
Figura 5.12: Densidade de estados D(ω) num cristal real e modelo de Debye.
D(ω) = αω 2 para ω < ωD ; D(ω) = 0 para ω > ωD .
Cv
3kB
Debye
Einstein
θD T
Elemento ΘD /K Elemento ΘD /K
Li 400 C (diamante) 1860
Na 150 Si 625
Be 1000 Cu 315
Al 394 Fe 420
200
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
Em contraste, se utilizarmos fotões, com uma energia de 100 m eV, obtemos vectores de
onda da ordem de 103 cm−1 , ou seja, o fotão só tem acesso a uma parte muito reduzida
da zona de Brillouin (q ≈ 0). Um fotão com k ≈ 108 cm−1 tem uma energia da ordem
dos 104 eV que é muito maior do que a energia do fonão.
VG eiG.r
P
em que se expandiu o potencial dispersor, V (r), em série de Fourier, V (r) = G
A condição de dispersão é
δk+G,k0 ou δ (k + G − k0 ) ou k0 = k + G (5.57)
e se k for fixado, i.e., se o feixe incidente for monocromático e de direcção bem defi-
nida, então podemos observar feixes difractados apenas nas direcções correspondentes a
vectores de onda que satisfazem a condição de dispersão acima.
201
INTERACÇÕES ÁTOMO-ÁTOMO: FONÕES
11 Note-se ~ 2π
que p = ~q = 2π λ
= h/λ.
202
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
pt = pi ± ~q1 ± ~q2 ± . . .
(5.66)
Et = Ei ± ~ωλ (q1 ) ± ~ωλ (q2 ) ± . . .
Podemos também considerar a dispersão de Brillouin para medir os fonões acústicos, que
consiste na medição das frequências de fonões acústicos absorvidos ou emitidos quando
um feixe de luz (p.ex. de um laser) é disperso inelasticamente por um cristal. Na Fig.
5.14 esquematiza-se o procedimento experimental. As leis de conservação a satisfazer são
as seguintes12 (para G = 0). k é o vector de onda do raio incidente e ~ω a sua energia.
k0 e ~ω 0 são as correspondentes grandezas do raio disperso. q e ~ωλ referem-se ao fonão
absorvido (sinal +) ou emitido (sinal −):
~ω 0 = ~ω ± ~ωλ
k0 = k ± q (5.68)
0 0
(~ω, ~ω >> ~ωλ , |k| ≈ |k |
12 Os vectores de onda dos raios incidente, k, e disperso, k0 , devem ser multiplicados pelo índice de
refracção, n, quando este for significativamente diferente de n = 1.
203
INTERACÇÕES ÁTOMO-ÁTOMO: FONÕES
a) b) Feixe incidente
ℏ !ω λ ℏ !ω ℏ !ω λ E
c) d)
q q
k' k'
k k
Fig.3.12.a) Esquema do procedimento experimental. b) Espectro observado. c) Geometria do ângulo
Figura 5.14: a) Esquema do procedimento experimental. b) Espectro observado.
c) Geometria do ângulo recto. d) Geometria de retrodifusão ("backscattering").
k é o vector de onda do raio incidente e ~ω a sua energia. k0 e ~ω 0 são as cor-
respondentes grandezas do raio disperso. q e ~ωλ referem-se ao fonão absorvido
ou emitido.
Para ter acesso às maiores frequências dos fonões, possíveis com este método (maior
∆k), utiliza-se a geometria de retrodifusão ("backscattering"). Neste caso, as ordens de
grandeza são as seguintes:
204
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
emissão
de fonão absorção
de fonão
E
ℏ! ω
∆E ≈ ℏ! ωóptico >> 0 , q ≈ 0
luz
luz
Stokes
0 k
⇒
2 x acústico
2 x acústico
0 k 1 fonão
Figura 5.16: Processo Raman de segunda ordem. A luz interactua com o sólido
produzindo (ou absorvendo) dois fonões com momentos opostos (esquema da
esquerda). À direita, vemos bandas satélites da risca de Stokes produzidas por
decaimento dum (ou criação dum) fonão óptico (com q = 0) em dois fonões
acústicos com momentos opostos e com energia correspondente a 1/2 da energia
do fonão óptico.
^
¨
205
INTERACÇÕES ELECTRÃO-ELECTRÃO: QUASE-ELECTRÕES E PLASMÕES
5.3.1 INTRODUÇÂO
rk e rk0 são as coordenadas espaciais dos electrões designados pelos números quânticos
k e k 0 . Em segunda quantização, podemos escrever13 :
1 X
He−e = hk4 , k3 |V |k2 , k1 i c+ +
k4 ck3 ck2 ck1 (5.70)
2
k1 k2 k3 k4
com
e2 1
V (r − r0 ) = (5.71)
4πε0 |r − r0 |
termo que descreve a interacção de Coulomb entre os electrões nas posições r e r0 .
Uma vez que o spin não aparece no hamiltoniano, podemos supor feito o somatório
sobre os estados de spin, cujas funções próprias são ortogonais. Obtemos um factor
δσk2 σk4 δσk1 σk3 .
206
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
No nosso estudo vamos supor que as funções próprias |ki i são ondas planas e usar a
aproximação de Hartree-Fock.
As interacções deste tipo são muitas vezes representadas graficamente, Fig. 5.35. Nestes
gráficos, os electrões de vector de onda ki são representados por vectores, cujas setas
indicam a direcção do tempo. A linha tracejada representa a interacção. A Fig.5.35
setas indicam a direcção do tempo. A linha tracejada representa a interacção.
207
INTERACÇÕES ELECTRÃO-ELECTRÃO: QUASE-ELECTRÕES E PLASMÕES
208
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
1 1Y X
hΨ|V (r−r0 )|Ψi = hk 0 , k|V |k, k 0 i c+ + 0 0 0 +0 +
+
h0|cki k0 ck ck ck + hk , k|V |k , kick ck ck ck cki |0i
0
2 2 0
ki k6=k
(5.78)
O produto é sobre os estados ocupados ki e a soma é sobre todos os k diferentes de k 0 .
Para uma melhor visualização do seu significado físico, estes elementos matriciais representam-
se esquematicamente na Fig. 5.18. Estes integrais de escambo tornam as equações de
209
INTERACÇÕES ELECTRÃO-ELECTRÃO: QUASE-ELECTRÕES E PLASMÕES
determinantes de Slater e portanto a solução exacta será uma combinação linear deles:
X Y
Ψi = An c+
k |0i (5.80)
n (k)n
Tal como com os termos de Hartree-Fock da equação (5.78), haverá apenas um elemento
matricial que mistura Ψi com cada um dos novos determinantes de Slater gerados por um
termo de (5.70) no qual os spins de |k1 i e |k2 i são diferentes, mas haverá dois elementos
matriciais quando os spins são idênticos. O termo adicional da interacção para spins
paralelos é, outra vez, o termo de escambo.
Se todos os termos fossem incluídos poder-se-ia obter uma solução exacta do problema.
Quando se desprezam todos os elementos não diagonais da matriz e se incluem apenas
os elementos matriciais da interacção directa e de escambo da equação (5.78) estamos a
usar a aproximação de Hartree-Fock. Esta é a aproximação que vamos usar. Note-se que
ainda se ignoram nesta aproximação contribuições que se designam, de um modo geral,
por energia de correlação.
Se fizermos a aproximação das funções de onda como ondas planas, isto é, da forma
em que cada vector de onda menor que kF aparece duas vezes (uma para cada orientação
do spin) no determinante de Slater, pode obter-se uma solução exacta do problema. Este
é o caso de um sistema em que todos os estados dentro da esfera de Fermi estão ocupados
e os de fora vazios.
Quando se utilizam ondas planas a densidade de carga electrónica que determina o inte-
gral de interacção directa vai ser uniforme. Como no modelo do gás do electrão livre o
potencial devido aos iões é substituído por uma distribuição uniforme de carga positiva
com a mesma densidade que a da carga electrónica, o potencial dos iões vai cancelar
exactamente o termo de interacção directa. Portanto, só o termo de escambo sobrevive.
Nestas circunstâncias, a energia de escambo para um gás de electrões com todos os es-
tados k < kF ocupados (e k > kF vazios) e tomando o estado fundamental 5.73 para
210
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
1 e2 X nk 0 nk
=−
2 ε0 0
|k0 − k|2
k6=k
Uma vez que a expressão (5.81) é linear em nk0 e nk podemos somar sobre todos os
valores de k 0 para calcular a energia de escambo de um electrão de vector de onda k. O
resultado vai depender do vector de onda k, em contraste com a energia de interacção
directa que se pode incluir em V (r). Sendo assim, não é possível usar métodos iterativos
e calcular um valor autocoerente. Mesmo se tentássemos adicionar um potencial de
escambo dependente de k iríamos encontrar dificuldades. É que a transformação do
somatório (5.81) em integral conduz a uma singularidade logarítmica para k = kF .
Vale a pena mencionar que os estados estacionários do gás de electrões livres (ondas
planas) não são estados estacionários dum hamiltoniano que inclua interacções electrão-
electrão (5.69). Isto significa que um electrão num estado kσ (σ=coordenada de spin)
14 Ver,por exemplo, C. Kittel, Quantum Theory of Solids, p.91. Para avaliar este integral, ter-se-ia de
escrever a interacção de Coulomb em termos da sua transformada de Fourier:
e2
Z
1 X 1 iq.(r−r0 dq 1 iq.(r−r0 )
0
= 4πe2 2
e → 4πe2 e
|r − r | V q q (2π)3 q 2
211
INTERACÇÕES ELECTRÃO-ELECTRÃO: QUASE-ELECTRÕES E PLASMÕES
do sistema não perturbado pode ser disperso (scattered ) para um outro estado através
da interacção de Coulomb. O electrão tem portanto um certo tempo de vida no estado
kσ o qual é determinado pela probabilidade de colisão. Se considerarmos um electrão
situado fora da esfera de Fermi este, através da interacção electrão-electrão pode sofrer
uma "colisão" e trocar energia e momento com um electrão no interior da esfera de Fermi.
Sejam as energias anteriores à colisão E1 (k) e E2 (k) e posteriores à colisão E3 (k) e E4 (k).
E1 , E3 , E4 > EF e E2 < EF . Energia e o momento devem ser conservados na colisão,
vem E1 + E2 = E3 + E4 e k1 + k2 = k3 + k4 , assim como o princípio de exclusão de Pauli,
limitando as regiões onde E2 , E3 e E4 se podem situar.
Para estes cálculos assumiu-se, como dissemos, que todos os estados no esfera de Fermi
estão ocupados e os estados fora da esfera de Fermi estão vazios.
A partir de (5.86), uma vez que estamos a usar ondas planas, podemos escrever:
X 0 0
ρescambo
k (r, r0 ) = −e ei(k−k ).(r−r ) (5.87)
k0 k
212
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
Esta função está representada na Fig. 5.19. A figura representa o resultado médio de
um processo dinâmico, sujeito a flutuações. Nos metais, kF ∼ 1 Å, pelo que a dimensão
do buraco de escambo é da ordem de alguns Å.
213
INTERACÇÕES ELECTRÃO-ELECTRÃO: QUASE-ELECTRÕES E PLASMÕES
2 2
A relação E(k) = ~2mk pode ser formalmente mantida se substituirmos a massa do
electrão, m, por uma massa efectiva, m∗ (k) que depende de k e que terá um valor
superior a m. A massa do electrão é aumentada pelo facto de este ter de arrastar consigo
o buraco de escambo, Fig.5.20.
de escambo, Fig. 3.18.
Electrão
Buraco de
escambo
(carga positiva)
Mar de electrões
Blindagem. Plasmões
214
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
aspecto.
e2 e2 Vq0
Vq = = = 2 (5.92)
ε0 (q 2 + λ2 ) ε(q) 1 + λq2
λ2
ε(q) = 1 + (5.93)
q2
X 0
V (r − r0 ) = Vq eiq.(r−r ) (5.95)
q
215
INTERACÇÕES ELECTRÃO-ELECTRÃO: QUASE-ELECTRÕES E PLASMÕES
~2 k 2 ~2 k 2
E(k) = + ∆E(k) =⇒ (5.98)
2m 2 m∗ (k)
O electrão com a sua nuvem de bosões (∆E(k)) comporta-se como uma partícula inde-
pendente com uma massa efectiva dependente de k.
Muitas vezes, quando se tenta descrever um sistema de fermiões que interactuam forte-
mente entre si, não é possível ou é muito difícil utilizar o gás de fermiões livres como
aproximação de ordem zero. É muitas vezes possível encontrar um conjunto de esta-
dos de uma-só-partícula que pode formar uma base para o tratamento da interacção
por métodos perturbativos. As partículas associadas com estes estados chamam-se en-
tão quasi-partículas (e.g., o electrão blindado). Os plasmões, por seu lado, pertencem
ao conjunto das excitações colectivas, os quais não têm partículas reais correspondentes
quando as interacções são removidas. As excitações colectivas são bosões.
Da discussão anterior resulta a existência duma interacção residual entre duas quase par-
tículas com um alcance da ordem de 1 Å. Esta interacção desaparece a não ser que exista
sobreposição das lacunas de blindagem associadas a estas quase-partículas. Esta interac-
ção residual deveria resultar numa secção eficaz de colisão entre duas quase-partículas,
s da ordem de 1 Å2 . Em consequência, o livre precurso médio das quase-partículas será
1/(ns) e o tempo de relaxação virá t = 1/(nsvF ). Podemos agora utilizar o princípio de
incerteza para estimar o alargamento dos níveis de energia de uma-só-partícula, ∆E:
h ns
∆E = = h n s vF ≈ EF
t kF
216
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
Transição de Mott
Se resolvermos a equação de Schrödinger para este potencial podemos verificar que es-
tados ligados só existem quando o comprimento de blindagem ` for maior que o raio de
Bohr a0 . A condição para comportamento isolador (isolador de Mott) é portanto ` > a0 .
Inserindo um valor para ` vem que n0 < π/192a30 (de facto, utilizando esta expressão vem
que n0 ≈ 1029 m−3 , superior à densidade electrónica da maioria dos metais, indicando
que o potencial escolhido é uma aproximação grosseira). Porque é que a localização
ocorre a baixas densidades uma vez que poderíamos intuitivamente esperar que ocorresse
a altas densidades onde o efeito das interacções electrónicas é maior? De facto, mostra-se
que a contribuição das interacções para a energia cresce com n3/2 , enquanto a energia
cinética dos electrões livres aumenta com n5/3 , como vimos na discussão do modelo de
Sommerfeld. Deste modo, a altas densidades electrónicas o termo de energia cinética
domina, favorecendo estados extensos (deslocalizados) e comportamento metálico.
217
INTERACÇÕES ELECTRÃO-ELECTRÃO: QUASE-ELECTRÕES E PLASMÕES
Oscilações do plasma—plasmões
n e2
Para a frequência do plasma, definida como ωp2 = m ε0 (equação 1.35), a constante die-
ω2
léctrica torna-se zero, ε(ωp ) = 0, atendendo a que ε(ω) = ε0 (1 − ωp2 ) (expressão 1.34).
Da relação D = εE, conclui-se que se D for finito, E é infinito, isto é, podemos ter "E
sem D", significando isto, que podemos ter oscilações livres. A essas oscilações chama-
se oscilações do plasma, ou plasmões. O gás de electrões pode apresentar oscilações de
densidade de carga do tipo das que se observam num fluído.
Este fenómeno pode também explicar-se de outro modo: Imaginemos que os electrões
de um bloco de metal se deslocam de uma distância x (Fig.5.21). Da lei de Gauss,
Ne-
+ -
+ E -
+ -
+ -
+ -
x
N/Z iões
∇.E(ω) = ρ(ω)/ε0 , ρ(ω) = densidade de carga = ne. Portanto, E = nex. A força por
electrão é F = −eE = −ne2 x, que substituindo na equação do movimento dá um mo-
2
vimento oscilatório: N m ddt2x = −N (ne2 x), cuja solução é x ∼ e−iωt , sendo, portanto
(fazendo as contas):
ne2
ω2 = = ωp2
ε0 m
A esta onda de densidade de carga chama-se plasmão de volume (bulk plasmon)
^
¨
218
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
5.4.1 INTRODUÇÃO
No estudo das excitações elementares feito até agora, ignorámos o spin e as interacções
spin-spin. O spin só foi considerado no âmbito do princípio de exclusão de Pauli. Vimos
já, no entanto que ele era responsável pela interacção de escambo ou permuta. Por outro
lado também não considerámos ainda os spins da rede de átomos.
219
INTERACÇÕES SPIN-SPIN: MAGNÕES
Todos os estado excitados ii com todos os spins paralelos menos um são degenerados, e
P
devemos tomar uma combinação linear Ψ = i ai |ii.
Esta excitação (inversão de um spin) pode ser tratada de modo idêntico a outros já
encontrados, como a criação de fonões e de plasmões. A energia da excitação vai espalhar-
se por todo o cristal, podendo a excitação ser descrita (em coordenadas normais) em
termos de oscilações colectivas dos estados de spin que se designam por magnões.
Para descrever este tipo de excitação elementar não vamos usar a aproximação de Hartree-
Fock, mas sim um formalismo mais geral. Os spins, cuja correlação no ferromagnetismo,
ou em outros fenómenos relacionados, dão origem a momentos magnéticos espontâneos,
estão, em geral localizados nos átomos da rede (não estão necessariamente associados
apenas aos electrões de condução). Além disso, os átomos da rede podem ter vários
electrões que contribuem para o spin total de cada átomo. O estado ferromagnético é
então o resultado da interacção de escambo entre os spins totais dos diferentes átomos
da rede.
em que Si e Sj são os operadores de spin total associados a cada átomo. A soma é sobre
todos os pares de átomos da rede.
220
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
S + = Sx + iSy S − = Sx − iSy
tais que
S+α = 0 S+β = α S−α = β S−β = 0
Estes operadores satisafzem as seguintes regras de comutação:
[Sλ , Sµ ] = i Sν (λ, µ, ν = x, y, z)
+ −
S , S = S + S − − S − S + = 2 Sz
−
S , Sz = S − Sz − Sz S − = S −
Sz , S + = Sz S + − S + Sz = S +
221
INTERACÇÕES SPIN-SPIN: MAGNÕES
Uma vez que a interacção entre os vizinhos mais próximos é dominante, vamos limitar-nos
a esses termos.
Consideremos então uma rede com um átomo de spin total S por célula primitiva. Se N
for o número de células primitivas (número de átomos) e se cada átomo tiver v primeiros
vizinhos, podemos escrever:
i=N,j=v
X
X 1 + −
Si .Sj + Si− .Sj+
H = −J Si .Sj = −J Siz .Sjz + (5.101)
i=1,j=1
2
i6=j
podemos, recorrendo às formas dos operadores de spin, obter a energia do estado funda-
mental (com todos os spins paralelos), E0 :
i=N,j=v
X
E0 = hΨ0 |H|Ψ0 i = −J S 2 1 = −J S 2 v N (5.103)
i=1,j=1
Consideremos agora o estado excitado com todos os spins paralelos menos um, o spin de
−
índice m: A função própria pode obter-se aplicando o opeardor Sm a Ψ0 :
−
Ψm = Sm Ψ0
e o valor próprio de H pode obter-se:
X 1
HΨm = −J Siz Sjz Sm− + Si+ Sj − Sm− + Si− Sj + Sm− Ψ0
2
i6=j
X
HΨm = E0 Ψm + 2JS (Ψm − Ψm0 ) ; m0 = vizinhos de m
m0
222
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
Uma vez que todos os estados Ψm (com diferentes valores de m) são degenerados, temos
que tomar como função própria uma combinação linear de todos os Ψm :
X
Ψ1 = a m Ψm (5.104)
m
Atendendo à simetria translacional que implica que as funções próprias devem satisfazer
o teorema de Bloch, podemos tomar os coeficientes am como am = √1N eik.Rm , sendo Rm
a posição do átomo m. k tem valores na primeirra zona de Brillouin. Vem então:
1 X ik.Rm
HΨ1 = √ e H Ψm = [E0 + 2 J v S(1 − γk )] Ψ1 (5.105)
N m
com
1 X ik.dm
γk = e com: dm0 = Rm0 − Rm (5.106)
v 0
m
Das expressões anteriores, podemos concluir que a energia desta excitação elementar é:
Ek − E0 = 2 J v S (1 − γk ) (5.107)
Vejamos, a título de exemplo, a forma da excitação para o caso de uma cadeia linear de
átomos. Atendendo a que o átomo de índice m tem dois primeiros vizinhos separados
pelo parâmetro de rede a, obtém-se para γk :
1 ika
e + e−ika = cos ka
γk =
2
e portanto,
ka
Ek − E0 = 4 J S (1 − cos ka) = 8 J S sen 2 (5.108)
2
que é a curva de dispersão da excitação em função de k.
Esta excitação é uma oscilação nas orientações relativas dos spins da rede, como se vê
na Fig.5.22. É uma onda de spin ou magnão.
223
INTERACÇÕES SPIN-SPIN: MAGNÕES
e propaga-se por todo o cristal. À semelhança do formalismo que usámos para os fonões,
podemos usar coordenadas normais e definir frequências próprias, tais que
~ωk = 2 J v S (1 − γk ) (5.109)
que são os quanta de energia da excitação ou magnões. Os magnões são, assim, excitações
colectivas do estado ferromagnético.
em que os operadores b+
k , (bk ) criam, (aniquilam) magnões.
Para redes com uma base de átomos (mais do que um) obtêm-se, de modo análogo ao
caso dos fonões, vários ramos no espectro de magnões.
Se houver uma base com mais do que um átomo, naturalmente que cada átomo da base
pode ter um spin diferente ou orientação diferente. Isso leva à necessidade de considerar
sub-redes constituídas por cada tipo de átomos relacionados por translações.
Exemplos:
1. Para duas sub redes com spins opostos, mas de módulo diferente, a resultante, em
cada célula será a diferença dos spins. Temos o que se chama um ferrimagneto.
2. Se as duas sub redes têm spins opostos, mas do mesmo módulo, a resultante é nula.
É um antiferromagneto.
224
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
antiferromagneto.
J>0 J<0
Nestes casos, as sub-redes dão origem a equações acopladas, tal como vimos no caso
dos fonões com mais de um átomo por célula e também no caso das bandas CL (de
combinações lineares.
X N
X
H=− Jij Si .Sj − g µB B. Si (5.111)
i6=j i=1
Este hamiltoniano não se pode resolver porque o 1o termo não é linear. Pode, no entanto
fazer-se a aproximação do campo molecular que consiste em tomar o valor médio hSj i
dos spins de índice j:
XN X
H=− g µB B + N Jij hSj i .Si (5.112)
i=1 j=1(6=i)
225
INTERACÇÕES SPIN-SPIN: MAGNÕES
Susceptibilidade Magnética
M µ0 M
χ= ≈
H B
uma vez que B ≈ µ0 H (ver apêndice B sobre unidades).
Aparecem na liteartura a susceptibilidade por unidade de massa que será χ/ρ em que ρ
é a densidade e a susceptibilidade molar que será χVM (VM =volume molar).
B = µ0 (1 + χ)H
B = µH com µ = µ0 µr
χT = χD + χS + χV V + χL
N Z e2 µ0 2
χD = diamagnetismo = − hr i
4m
χS = paramagnetismo (Pauli ou Curie); Metais: Pauli: χP = µ0 µ2B D(EF )
χV V = Van Vleck
1
χL = Orbital Landau = − χP auli
3
226
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
Além do campo externo, B, surge, assim, um campo interno médio, BM , chamado campo
de Weiss:
N
1 X
BM = Jij hSj i (5.113)
g µB
j=1(6=i)
M = N µm = g µB hSj iN (5.114)
Nos casos mais usuais (kB T >> g µB B), para os quais é válida a distribuição de Boltz-
mann, podemos dizer que o número de iões ou átomos cujos momentos magnéticos estão
orientados segundo o ângulo θ (i.e, com energia E = −µm B cos θ) (B = |B|)16 por
unidade de ângulo sólido será dado por
em que n0 é o número total de átomos no mesmo ângulo sólido. Por outro lado, o número
total de átomos por unidade de volume, N , será o produto de n0 pelo ângulo sólido da
esfera que é 4π. Será então n0 = N/4π.
16 Para
representar vectores usa-se normalmente o negrito (bold) e o módulo do vector em roman (normal)
como em B = |B|
227
INTERACÇÕES SPIN-SPIN: MAGNÕES
N µ0 µ2
χ= (5.120)
3 kB T
N g 2 µ0 µ2B S(S + 1) C
χ= = Lei de Curie (5.121)
3 kB T T
Vê-se assim que a componente paramagnética da susceptibilidade, para o caso em que as
interacções são desprezáveis, é inversamente proporcional à temperatura. Esta relação é
conhecida por lei de Curie. C é a constante de Curie.
17
Rπ Rπ
0 cos θ sen θdθ = 0; 0 cos2 θ sen θdθ = 1/3
228
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
C C C
χ =T χ = T-T χ = T+Θ
c
0 Τ
O modelo até agora só considerou a interacção de permuta entre spins localizados nos
vizinhos próximos.
Ocorrem por vezes interacções a longas distâncias por intermédio de átomos ou iões
paramagnéticos que transmitem a interacção. É o exemplo do MnO: cada electrão d
229
INTERACÇÕES SPIN-SPIN: MAGNÕES
interactua com um dos dois electrões p do par de electrões externos do oxigénio. Isso
implica uma interacção entre os electrões d do Mn, dando origem a super-escambo ou
super-permuta.
D(E)
3d
4s
Fe Co Ni Cu E
o cobre, EF situa-se acima da banda 3d, que fica totalmente preenchida. Nos outros
metais EF situa-se no seio da banda 3d, havendo electrões d desemparelhados que dão
origem a momentos efectivos de acordo com o número de electrões desemparelhados. Do
gráfico, vê-se que depois de se considerar que o nível de Fermi dos dois sub-sistemas (de
230
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
spin ↑ e ↓ se estabilizou, existem no estado final mais electrões de spin ↑ do que de spin
↓, daí resultando um um ferromagnetismo chamado ferromagnetismo de bandas.
Num material real, a magnetização não é homogénea mas sim distribuída por domínios
ferromagnéticos, com orientações diferentes, Fig.5.27. Em princípio, num volume de ma-
231
INTERACÇÕES SPIN-SPIN: MAGNÕES
^
¨
232
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
Tal como os plasmões, os excitões são quase-bosões. Embora tenham spin inteiro e os
estados do hamiltoniano do par electrão-buraco sejam estados próprios, não são verda-
deiros bosões. De facto, as relações de comutação dos operadores de criação e aniquilação
de excitões diferem das regras de comutação dos operadores para os bosões puros—as
funções de onda de estados multi-excitões construídas com funções de onda de estados de
um só excitão não são ortogonais. No entanto, as propriedades não-bosónicas de excitões
separados não impedem que o gás de excitões possa ser considerado como um gás de
bosões.
Como veremos, os excitões propagam-se nos cristais e podem ser descritos por funções
de Bloch, o que implica que se possa considerar que formam bandas, tal como outras
quase-partículas.
É conveniente rearranjar esta expressão de modo a que as funções de Bloch sejam soluções
da equação
~2 2
− ∇ + U (r)|mki = Em (k)|mki (5.127)
2m
233
INTERACÇÕES ELECTRÃO-BURACO. EXCITÕES
O potencial U (r) que aparece aqui é a soma do potencial sentido por um electrão de-
vido aos iões da rede V (r) com a interacção média electrão-electrão, W (r), ou seja
U (r) = V (r) + W (r). Portanto, o primeiro termo da direita de (5.126) é da forma
hmk|Em (k) − W (r)|mki (5.128)
A energia monoelectrónica que devém da equação de Hartree-Fock quando se usam fun-
ções de Bloch é
X X
Wm (k) = hmk|Em (k)−W (r)|mki+ 2hmk, mk0 |g|mk, mk0 i− hmk, mk0 |g|mk0 , mki
k0 k0
(5.129)
em que a soma sobre os spins já está incluída. A energia do estado fundamental (5.126) é
assim a soma sobre todas as energias monoelectrónicas (5.129), devendo apenas metade
dos termos de interacção ser contados.
Agora temos de considerar as possíveis direcções de spin, que, como no caso do átomo
de hélio, no primeiro estado excitado [1s(1) 2s(2)] dão origem a um estado tripleto e
um estado singuleto (ver Fig.5.30. Devido ao requisito de antissimetria imposto para
as funções de onda, pela troca de dois electrões, as componentes de spin têm de ser
simétricas ou antissmétricas (ver Fig-5.30):
α(1)α(2) S = 1, Ms = 1
β(1)β(2) S = 1, Ms = −1
1 (5.130)
√ [α(1)β(2) + β(1)α(2)] S = 1, Ms = 0
2
1
√ [α(1)β(2) − β(1)α(2)] S = 0, Ms = 0
2
Os três primeiros estados de spin contituem o tripleto (S = 1) e o quarto, o singuleto
(S = 0).
234
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
E
E n,k
ke
En
K k
kh
Em
E m,k
Para obter os valores da energia nesta nova descrição devemos realizar uma mudança
de base, fazendo cominações lineares dos determinantes de Slater |mki e diagonalizar a
matriz da energia na nova base |mnKi.
235
INTERACÇÕES ELECTRÃO-BURACO. EXCITÕES
Fig. 1.
Figura 5.30: a) Estados singuleto e tripleto num esquema de níveis de orbitais
(HOMO e LUMO). Neste esquema, as energias de Coulomb e permuta estão
incluídas nas posições das orbitais fronteira. Para o estado tripleto só está re-
presentada uma configuração de spins. b) Diagrama vectorial ilustrativo das
orientações relativas dos dois electrões nos estados singuleto e tripleto. Os spins
precessam em torno de um campo magnético local na direcção z. As confi-
gurações anti-paralela e desfasada de 180o correspondem ao estado singuleto,
enquanto que as outras três correspondem ao estado tripleto. c) Diagrama de
níveis de energia dos estados singuleto e tripleto e indicação das transições ra-
diativas (a cheio) e não radiativas (a tracejado). Num esquema de bandas de
energia os níveis fronteira HOMO e LUMO devem ser substituídos pelos topos
das bandas de valência e condução, respectivamente
236
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
Atendendo à simetria translacional, que implica que as funções de onda do par devem
satisfazer o teorema de Bloch (são, tal como as |mki funções de Bloch), ou seja, devem
ser da forma
ΨmnK (R) = UmnK (R) ei K.R
Do ponto de vista formal, o par electrão-buraco (no seu conjunto) constitue um problema
idêntico ao do átomo de hidrogénio—duas cargas de sinais contrários em interacção.
Naturalmente, a interacção mais importante é a interacção (atractiva) de Coulomb
e2
hn r, m|g|n r, mi =
4πε0 r
~2 2 ~2 2 e2
− ∇e − ∇h − ψexc = Eexc ψexc (5.132)
2me 2mh 4πε0 |re − rh |
237
INTERACÇÕES ELECTRÃO-BURACO. EXCITÕES
~2
2
e2
2 ~ 2
− ∇ + − ∇rel − ψexc = Eexc ψexc (5.133)
2(me + mh ) cm 2µ 4πε0 |r|
O movimento do centro de massa, que só tem energia cinética tem como solução uma onda
~2 K 2
plana da forma ψcm = eiK.R , sendo o valor da energia 2(m e +mh )
. O termo idêntico ao do
átomo de hidrogénio tem naturalmente uma solução idêntica à do átomo de hidrogénio,
4
da forma Fn`m , e um valor da energia − 32πµ2 eε2 ~2 n12 . Podemos então escrever a equação
0
~2 K 2 µ e4
1
− 2 eiK.R Fn`m = Eexc eiK.R Fn`m (5.134)
2(me + mh ) 32π ε0 ~ n2
2 2
que é, naturalmente uma função que satisfaz o teorema de Bloch (ver Fig.5.31)
µ e4 1 ~2 K 2
En (K) = EG − + (5.135)
32π 2 ε2 ~2 n2 2(me + mh )
238
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
Fnℓm
Rede cristalina
Onda plana
e iK.R
E
E c = EG
E exc
E n (K)
EG
0 Ev
239
INTERACÇÕES ELECTRÃO-BURACO. EXCITÕES
1 ε m0
Fn`m = p e−r/aexc , aexc = a0
π a3exc µ
Os excitões de Frenkel são fortemente ligados, e são localizados—o buraco está no mesmo
átomo que o electrão ou na sua proximidade.
A propagação de um excitão de Frenkel pode ser descrita por uma função de onda de
Bloch como vimos na secção 4.5 (equação 4.37), sendo os valores da energia E(k) para
um caso simples de propagação ao longo de uma cadeia, na aproximação dos primeiros
vizinhos, dados por
XN
E(k) = eik(Rj −Ri ) Hij
j
em que
Hii = Eexc
Hi,i±1 = T, (integral de transferência)
O integral de Coulomb é a energia do excitão no átomo (ou molécula) e o integral de
transferência é energia associada à transferência do excitão de um átomo para um dos
seus primeiros vizinhos, i + 1 e i − 1. Os integrais entre vizinhos afastados consideram-se
nulos: Hi,j 0 >|i±1| = 0. Fazendo as correspondentes substituições, obtém-se:
240
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
tripletos podem combinar-se para dar um excitão singuleto de energia 3.15 eV, sendo o
excesso de energia dissipado por interacção com fonões. O estado S1 de 3.15 eV pode
decair para o estado fundamental S0 por uma transição permitida (fluorescência).
E
S1
T
3.15 eV
1.80 eV
S0
D∗ + A (acoplamento) −→ D + A∗
1 2
k= β ρE
~
em que ρE é a densidade de estados e está associada à sobreposição dos espectros, J
entre a emissão do dador e a absorção do aceitador, β é o integral de acoplamento
β = hψf |H|ψi i, que tem um termo de Coulomb e um termo de permuta (exchange)
β = βC − βE ,
241
INTERACÇÕES ELECTRÃO-BURACO. EXCITÕES
fD fA
kC ∼ J k E = e−2R/L J
R6
fD , fA são as forças dos osciladores do dador e do aceitador (que são proporcionais aos
momentos de transição—-quadrados dos momentos dipolares). No mecanismo de Föster
predomina o termo de Coulomb. É também um processo de ressonância.
k E = e−2R/L J
em que R é a separação entre moléculas e L corresponde à soma dos raios de van der Waals
dos dador e aceitador. A taxa de transferência decai exponencialmente com a distância
e o mecanismo de permuta tem um alcance da ordem dos 10 Å—donde a designação de
curto alcance. O mecanismo de troca é baseado no princípio da conservação do spin.
242
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
243
INTERACÇÕES ELECTRÃO-BURACO. EXCITÕES
244
EXCITAÇÕES ELEMENTARES
245
CONCLUSÃO
5.6 CONCLUSÃO
Plasmões Polarões
(Flutuações ou ondas de densidade de carga) (Electrões com nuvens de fonões)
Magnões Polaritões
(Flutuações ou ondas de densidadede spin (Acoplamentos fonão-fonão)
X 1X X X
H= H(pi , ri ) + V (ri , rj , pi , pj ) ⇒ H = E0 + k c+
k ck + q a+
q aq + interac.
i
2 ij q
k
246
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 5
A descrição quântica das excitações elementares torna-se muito mais clara quando se usa
a representação do número de ocupação ou formalismo de segunda quantização da teoria
quântica do campo (quantum field theory), que usa como base o número de partículas que
ocupam cada estado num conjunto completo de estados de partículas individuais. Este
formalismo difere da primeira quantização que usa como base os estados de partículas
individuais.
X 1
+
H= ak ak + ~ ωk (5A.3)
2
k
a+
k ak |n1 . . . nk . . .i = nk |n1 . . . nk . . .i (5A.6)
ak , a+ + +
k = ak ak − ak ak = δkk (5A.7)
0
Os operadores a+
k e ak têm por efeito, respectivamente:
√
a+k |nk i = nk + 1 |nk + 1i
√ (5A.8)
ak |nk i = nk |nk − 1i
[a, a+ ] = aa+ − a+ a = 1
(5A.9)
[aa+ , H] = [a+ a, H] = a+ aH − Ha+ a = 0
Da última expresão, vê-se que o hamiltoniano comuta com n, tendo portanto as mesmas
funções próprias, isto é,
H ψn = En ψn
(5A.10)
a+ a ψn = n ψn
constituindo os ψn o conjunto completo das soluções da equação de Schrödinger para o
oscilador harmónico linear.
concluindo que
a+ a(a+ ψn ) = (n + 1)(a+ ψn ) , (5A.12)
o que implica que o operador a+ aplicado a ψn faz subir o índice n de 1. De facto,
aplicando a+ a ψn vem √
a+ ψn = n + 1 ψn+1 (5A.13)
√
O factor n + 1 pode ser obtido se impusermos que ψn+1 seja normada e fazendo com
que o factor c que relaciona ψn com ψn+1 seja real: tomando a+ ψn = c ψn+1 e fazendo
hψn+1 |ψn+1 i = 1, vem
hψn+1 |ψn+1 i = 1 = (1/c2 )ha+ ψn |a+ ψn i = (1/c2 )hψn |aa+ |ψn i (5A.14)
248
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 5
e
aa+ = n + 1 (5A.15)
pelo que
n+1 n+1
hψn+1 |ψn+1 i = (1/c2 )hψn |n + 1|ψn i = , hψn |ψn i = =1 (5A.16)
c2 c2
donde √
c= n+1 (5A.17)
Analogamente, poderíamos mostrar que a é um operador, tal que
√
a ψn = n ψn−1 (5A.18)
Tudo isto implica que podemos obter o vector próprio |n1 n2 . . . nk . . .i pela aplicação
sucessiva do operador criação a+ k ao estado vácuo |0 0 . . . 0 . . .i
nk n1
|n1 n2 . . . nk . . .i = a+
k . . . a+
1 |0 0 . . . 0 . . .i (5A.19)
Note-se que a relação de comutação 5A.7 da qual se deduzem muitas das propriedades
dos operadores a+ e a, só é válida para bosões (e.g., fonões, fotões).
deve então ser lida de modo a que são criadas sucessivamente partículas nos estados 2,
3, . . . k. A ordem dos estados é agora importante. A troca de duas partículas significa a
249
SEGUNDA QUANTIZAÇÃO. REPRESENTAÇÃO DO NÚMERO DE OCUPAÇÃO
troca de dois nk , nk0 no vector próprio, portanto de acordo com 5A.21, a troca de dois
ck do lado direito. Para que a troca implique a mudança de sinal
c+ + + +
k ck0 = −ck0 ck (5A.22)
e correspondentemente
ck ck0 = −ck0 ck , ck c+ +
k0 = −ck0 ck , (k 6= k 0 ) (5A.23)
Para k = k 0 a relação 5A.22 e a primeira das 5A.23 são igualmente válidas, uma vez que
de 5A.20 os produtos c+ +
k ck e ck ck dão zero. De 5A.20 vem que para a segunda equação
de 5A.23
ck c+
k |0i = |0i, c+
k ck |0i = |0i, ck c+
k |1i = |0i, c+
k ck |1i = |1i, (5A.24)
e portanto
ck c+ +
ck , c+
k + ck ck = 1 ou k0 + = δkk (5A.25)
0
Conclui-se que nas relações de comutação para fermiões os comutadores são substituídos
por anticomutadores ck , c+
k0 + . As relações 5A.20 e as relações de comutação levam a
equações análogas a 5A.8 que descrevem o efeito dos operadores
√ ν
c+
k | . . . nk . . .i = 1 − nk (−1) k | . . . nk + 1 . . .i
√ ν (5A.26)
ck | . . . nk . . .i = nk (−1) k | . . . nk − 1 . . .i
P
em que νk = i<k ni . Assim, temos sinal positivo quando há um número par de estados
no vector próprio à esquerda de nk , e sinal negativo quando o número é ímpar.
Consideremos o caso de bosões. A função de onda, que é invariante mediante uma troca
de partículas, é uma soma de todas as permutações de partículas
1 X
Φ= √ P φα (r1 ) . . . φα (rn1 ) . . . φω (rN ) (5A.27)
N !n1 !n2 ! . . . P
250
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 5
sendo Z
0
hλ |h|λi = φ∗λ0 (r) h φλ (r)dτ (5A.29)
Para fermiões, a função de onda muda sinal cada vez que duas partículas permutam. A
função de onda será portanto a soma de todas as permutações de pares de partículas
alternadamente com sinal mais e menos:
1 X
Ψ= √ (−1)P φk1 (r1 )φk2 (r2 ) . . . φkN (rN ) (5A.30)
N! P
E o hamiltoniano X
H= h(ri )
i
X (5A.34)
H= k c+
k ck
k
Por sua vez, os elementos matriciais envolvendo dois estados electrónicos podem escrever-
se como
X Z
V (r) = hk0 |V |ki c+
k 0 c k , hk 0
|V |ki = φ∗k0 (r) V φk (r) dτ (5A.35)
k,k0
251
SEGUNDA QUANTIZAÇÃO. REPRESENTAÇÃO DO NÚMERO DE OCUPAÇÃO
em que
Z
hk4 , k3 | V |k2 , k1 i = dτ1 dτ2 φ∗k4 (r1 )φ∗k3 (r2 ) V (r1 − r2 ) φ∗k2 (r2 )φ∗k1 (r1 ) (5A.37)
252
6
INTERACÇÕES ELECTRÃO-FONÃO. PROPRIEDADES DE
TRANSPORTE
Página 254 (propositadamente em branco).
6.1 INTRODUÇÃO
Vamos ocupar-nos de electrões numa só banda, a banda de condução, pelo que omitiremos
o índice n sempre que não haja ambiguidade. Também omitiremos o spin, uma vez que
nas transições no interior da banda de condução a orientação do spin se mantém. O
electrão será então descrito apenas pelo seu vector de onda k.
Por seu turno, os fonões são excitações da rede cristalina. O estado vibracional da rede
é caracterizado pelo número de fonões dos estados de vector de onda q e do ramo j do
espectro de dispersão ωj (q).
k-q k
k k+q
q q
Emissão de um fonão Absorção de um fonão
k-q k
q q
k
k+q
Aniquilação de um par Criação de um par
electrão-buraco com electrão-buraco
emissão de um fonão por um fonão
255
EQUAÇÃO DE TRANSPORTE DE BOLTZMANN
As propriedades dos sólidos estão directamente relacionadas com a sua estrutura e mor-
fologia e com a estrutura de bandas, densidade de estados e grau de ocupação.
O cálculo das propriedades dos sólidos envolve normalmente, como já vimos, o cálculo
do número de electrões—a densidade electrónica, n, na banda de condução que se obtém
pelo integral Z ∞
n= D(E)f0 (E)dE (6.1)
0
pelo que, por definição de nível de Fermi, como último nível preenchido a T = 0 K, vem:
lim µ = µ0 = EF
T →0
256
INTERACÇÕES ELECTRÃO-FONÃO. PROPRIEDADES DE TRANSPORTE
electrões são acelerados e a energia absorvida é dissipada nas vibrações da rede cristalina,
ou seja, com a emissão de fonões. Neste processo estabelece-se um regime de corrente
estacionária no qual a aceleração dos electrões pelo campo eléctrico é compensada pela
sua desaceleração com emissão de fonões. A energia assim dissapada é a responsável,
em particular, pelo efeito Joule (aquecimento do sólido). Quando se deixa de aplicar o
campo eléctrico, os processos de interacção reestabelecem a situação de equilíbrio ter-
modinâmico. A interacção electrão-fonão não é a única responsável pela dissipação de
energia no sistema electrónico. Muitos outros processos contribuem para essa dissipação,
tais como a difusão devida a imperfeições da rede, impurezas, limites de grão, etc. Neste
capítulo limitar-nos-emos á interacção electrão-fonão, e consideraremos o sólido como in-
finito e perfeito. O transporte de carga ou de energia é assim influenciado pela interacção
electrão-fonão e constitui um dos temas mais importantes da física do estado sólido. As
propriedades de transporte podem, em princípio, ser calculadas se conhecermos o número
de electrões com um dado momento e num dado local, em função do tempo. A função
de distribuição correspondente deriva da chamada equação de Boltzmann, que pode ser
resolvida, em muitos casos, na aproximação de um tempo de relaxação, que é a cons-
tante de tempo do decaimento exponencial da perturbação do sistema electrónico. Além
da perturbação do sistema electrónico devida ao campo devemos também considerar as
perturbações ao sistema de fonões provenientes de variações da temperatura.
1 Note-se,no entanto, que o princípio de incerteza implica que, em sistemas (quânticos) microscópicos
não se possam definir simultaneamente o momento e a posição de uma partícula.
257
EQUAÇÃO DE TRANSPORTE DE BOLTZMANN
por
dN 2 dk/4π 3
f [E(k)] dk = f [E(k)] dk = (6.4)
dk (2π)3 1 + e[E(k)−µ]/kB T
em que dN/dk é a densidade de estados, sendo, naturalmente, f [E(k)] a probabilidade
desses estados estarem ocupados.
1
dn = f (k, r, t) dk dr, dk = d3 k, dr = d3 r (6.5)
4π 3
Para tal, fixemos a nossa atenção num valor particular do momento e numa posição
particular do sistema e procuremos a derivada da função de distribuição em ordem ao
tempo. Poderíamos recorrer ao teorema de Liouville que estabelece que a densidade de
pontos no espaço das fases (k, r, t) é constante ao longo das trajectórias de fase. É, no
entanto, mais simples, chegar ao resultado desejado fazendo algumas considerações de
ordem física.
258
INTERACÇÕES ELECTRÃO-FONÃO. PROPRIEDADES DE TRANSPORTE
df ∂f ∂f ∂k ∂f ∂r ∂f
= + + = (6.6)
dt ∂t ∂k ∂t ∂r ∂t ∂t col
∂f ∂f 1 ∂f ∂f
= − .v − .F + (6.7)
∂t ∂r ~ ∂k ∂t col
A taxa de variação da função de distribuição para uma dada posição e momento, tem
três contribuições. A primeira é um termo de deslocação—os electrões deslocam-se com
uma velocidade v e se a função de distribuição varia no espaço, o número de electrões que
saem dessa região difere do número dos que nela entraram. O segundo termo representa
a variação da função de distribuição devida à variação de momento, em consequência da
aceleração provocada pela força F. Finalmente, o terceiro termo representa a variação
da função de distribuição no tempo, devida a colisões. Se considerarmos apenas colisões
elásticas, podemos escrever
Z n
∂f h i h io
= f (k0 ) 1 − f (k) − f (k) 1 − f (k0 ) Q(k, k0 ) dk0 (6.8)
∂t col
Devido à complexidade dos processos colisionais, que além do mais são irreversíveis,
tornando o seu tratamento matemático extremamente difícil, é usual fazer os cálculos no
contexto da aproximação do tempo de relaxação. É claro que se a função de distribuição
fosse a distribuição de equilíbrio, não haveria variação de f devido às colisões. No
entanto, se a distribuição difere da distribuição de equilíbrio, é de esperar que decaia
exponencialmente com o tempo para a sua forma de equilíbrio. Esta premissa pode ser
posta sob a forma
∂f f − f0 f1
=− =− (6.9)
∂t col τ τ
em que τ é o tempo de relaxação.
259
EQUAÇÃO DE TRANSPORTE DE BOLTZMANN
(f − f0 )t = (f − f0 )t=0 e−t/τ
Esta aproximação é bastante razoável e está de acordo com um grande número de factos
experimentais. É, no entanto evidente que não será válida nos detalhes dos processos
colisionais a nível microscópico. Usando a forma (6.7), podemos escrever a equação de
transporte sob a forma
∂f ∂f 1 ∂f f − f0
+ .v + .F = − (6.10)
∂t ∂r ~ ∂k τ
Na maior parte dos casos, estamos interessados em estudar o efeito de campos aplica-
dos e procuramos uma resposta linear. Quer dizer que podemos escrever a função de
distribuição sob a forma f = f0 + f1 , em que f0 é a distribuição de equilíbrio baseada
na densidade electrónica média (que não varia com a posição) e f1 é o desvio relativa-
mente ao equilíbrio. Se substituirmos na equação (6.10) e retivermos apenas os termos
de primeira ordem (lineares nos campos aplicados), obtemos a equação de Boltzmann
linearizada.
No estado estacionário, o primeiro termo da equação (6.10) será nulo. Por outro lado,
1
f0 (k) = = f0 [En (k)] (6.11)
1+ e(E−µ)/kB T
em que µ é o potencial químico e En (k) corresponde à banda de energia.
2 Representamos o gradiente (em ordem a r), por ∇ (ou ∇r ), sendo ∇k , o gradiente em ordem a k.
260
INTERACÇÕES ELECTRÃO-FONÃO. PROPRIEDADES DE TRANSPORTE
Para simplificar, vamos considerar um cristal de simetria cúbica e supor que o campo
é aplicado na direcção x, i.e., E = Ex . Quando integrarmos, a única componente da
corrente será a componente em x. Podemos portanto substituir v por vx e fazer a média
hvx2 i = v 2 /3. Obtemos
2e2 τ Ex
Z
3 2 ∂f0
jx = d kv (6.17)
3(2π)3 ∂E
que podemos transformar num integral em E 4 . Atendendo ainda que (− ∂f ∂E ) é uma
0
∂f0
função δ(E − EF ), como já se referiu (cap. 2). De facto, a função ∂E tem um pico
261
EQUAÇÃO DE TRANSPORTE DE BOLTZMANN
e2 τ
σ= hvF iSF (6.20)
12 π 3 ~
em que Z Z
1 1 1
hvF i = dS |v(k)| = dS ( ∇k E)
SF S(EF ) SF S(EF ) ~
é a velocidade média sobre a superfície de Fermi e SF a área da superfície de Fermi.
nef e2 τ
σ= (6.21)
m∗
sendo nef a densidade electrónica efectiva, dada por
m∗
Z
nef = dS |∇k E| (6.22)
12 π 3 ~2 S(EF )
262
INTERACÇÕES ELECTRÃO-FONÃO. PROPRIEDADES DE TRANSPORTE
kF3
nef = =n (6.23)
3π 2
A fórmula (6.15) mostra que f1 só tem valor elevado na superfície de Fermi. Alguma
densidade de portadores é adicionada ao lado onde vk .eE é positivo, onde os electrões
são acelerados pelo campo. A mesma quantidade é subtraída do outro lado (Fig. 6.2)
Formalmente, esta translação da esfera de Fermi pode ser obtida do seguinte modo:
v f
e τ v.E
- ∂ f0 / ∂E
e τ E/ ℏ
∂f0 ∂E e τ eτ
f = f0 − E = f0 k − E (6.24)
∂E ∂k ~ ~
Podemos também escrever h i
f = f0 E(k) − e τ vk .E (6.25)
isto é, é como se cada electrão no estado k tivesse ganho uma energia δEk entre colisões
δEk = e τ vk .E (6.26)
263
EQUAÇÃO DE TRANSPORTE DE BOLTZMANN
e se tivessemos n partículas por unidade de volume, sendo j = ne δv, vem σ = ne2 τ /m.
Para metais, assumindo o modelo do gás de electrões livres, poderíamos ter escrito (6.20)
como
1 2
σ = (e vF ) τ D(EF ) (6.28)
3
que realça que a condutividade só depende das propriedades dos electrões junto ao nível
de Fermi, e que estes electrões transportam uma corrente elevada, (e vF ), em vez de uma
alta densidade de electrões a derivar lentamente, como assume o método cinético.
σ = ne e µe + nh e µh (6.29)
em que
e τe.h
µe,h = (6.30)
m∗e,h
sendo e a carga elementar, e referindo-se os índices e e h a electrões e buracos, respecti-
vamente.
264
INTERACÇÕES ELECTRÃO-FONÃO. PROPRIEDADES DE TRANSPORTE
Esta equação é verificada quando temos uma superfície de Fermi esférica, com |vk | cons-
tante, e D(k, k0 ) = D(θ). Vem logo
Z
1
= (1 − cos θ) D(θ) dΩ0 (6.33)
τ
O tempo de relaxação é portanto inversamente proporcional a um integral da probabili-
dade de dispersão sobre todos os processos de dispersão, mas ponderado através do factor
(1 − cos θ) a favor dos que envolvem dispersão com grandes ângulos.
em que o sinal + (−) se refere a emissão (absorção) de fonões. Esta equação limita o
número de fonões que podem participar em processos colisionais a processos envolvendo
apenas um fonão, nomeadamente
1h i
ω(q) = ± Ek+q − Ek (6.35)
~
Consideremos, em primeiro lugar, o limite das altas temperaturas, para o qual kB T ~ω(q)
para os modos possíveis, i.e., para temperaturas acima da temperatura de Debye, θD .
Neste limite, o número de fonões de frequência ω é
1 kB T
n(q) = ≈ (6.36)
e~ω(q)/kB T − 1 ~ ω(q)
Assim, o número total de fonões que participam nestes processos é directamente propor-
cional a T e portanto a resitividade será também proporcional a T (e a condutividade
inversamente proporcional a T ), mais concretamente, poderia demonstrar-se que
2~
τ≈ (6.37)
kB T
Note-se que τ depende da energia dos electrões intervenientes nas colisões através dos
seus vectores de onda, k. No entanto, nos metais simples, esses electrões estão na vizi-
nhança do nível de Fermi, pelo que é aceitável utilizar um único τ , que é inversamente
proporcional à temperatura.
nef e2 2 ~
σ= ; T θD (6.38)
m∗ kB T
265
EQUAÇÃO DE TRANSPORTE DE BOLTZMANN
266
INTERACÇÕES ELECTRÃO-FONÃO. PROPRIEDADES DE TRANSPORTE
CONDUTIVIDADE TÉRMICA
jq = κ(−∇T )
1 (2) (6.47)
κ= K
T
267
EQUAÇÃO DE TRANSPORTE DE BOLTZMANN
f
- ∂ f0 / ∂E
f0
µ k
Frio Quente
∂f0
f = f0 − (τ vk .∇T ) = f0 (T − τ vk .∇T ) (6.50)
∂T
Os electrões na direcção de ∇T < 0 (descendo o gradiente de temperatura) estão mais
quentes da quantidade
δT = τ vk .∇T (6.51)
enquanto que os que vão na direcção oposta estão mais frios do que a temperatura média
do gás de electrões (Fig-6.4).
268
INTERACÇÕES ELECTRÃO-FONÃO. PROPRIEDADES DE TRANSPORTE
Processo
EF
horizontal
Processo
vertical
Frio Quente
E F
jq
e j
EFEITOS TERMOELÉCTRICOS
1 (0) −1 (1)
j=0 ⇒ E=(K ) K ∇T = Q ∇T (6.52)
eT
em que Q é o poder termoelétrico absoluto ou coeficiente de Seebeck (Fig.6.5).
π 2 kB
2
T σ 0 (E)
Q=− (6.53)
3 e σ E=EF
em que
∂
σ 0 (E) = σ(E)
∂E E=EF
π 2 kB
2
T π 2 kB T
Q=− =−
2 eEF 2 e TF
269
EQUAÇÃO DE TRANSPORTE DE BOLTZMANN
Para o sódio e para o potássio, por exemplo, TF ≈ 3 × 104 K, dando Q = −14 m eV K−1 .
No entanto, para o lítio e para o césio, o sinal é diferente devido a efeitos de arrastamento
de fonões (phonon drag)
EFEITO DE SEEBECK
Material A
T1 T2
To To Material B
270
INTERACÇÕES ELECTRÃO-FONÃO. PROPRIEDADES DE TRANSPORTE
Metal A
T0
T1 V
T0
Metal B
EFEITO DE PELTIER
∏A j
A
j
( ∏ A - ∏B ) j ( ∏ A - ∏B ) j
∏Bj
B
jq = eK(1) E
j = e2 K(0) E
e portanto
1 (0) −1 (1)
jq = (K ) K j = Π j (6.56)
e
O coeficiente de Peltier pode, assim, ser definido como
Π = QT
271
EQUAÇÃO DE TRANSPORTE DE BOLTZMANN
De acordo com a figura 6.7 é gerada uma contribuição para a corrente de calor
jq = (ΠA − ΠB )j = T0 (QA − QB )j
significando que se pode controlar a transferência de calor entre dois reservatórios por
uma corrente eléctrica.
Pode chegar-se a resultado idêntico ao obtido no segundo capítulo para o efeito de Hall,
recorrendo à equação de transporte de Boltzmann. Conclui-se igualmente que quando se
aplica um campo magnético a um sistema no qual flui uma corrente, há uma tendência
para que os transportadores de carga sejam deflectidos lateralmente.
272
INTERACÇÕES ELECTRÃO-FONÃO. PROPRIEDADES DE TRANSPORTE
ou h eτ i
vk . E + (B × G) − G = 0 (6.60)
m
Em (6.60) atendemos a que A.(B × C) = B.(C × A). Esta equação terá uma solução
para todos os valores de vk , se e só se
eτ
E=G− (B × G) (6.61)
m
Note-se que a corrente associada à nossa função de distribuição de primeira ordem pode
ser obtida do mesmo modo que no caso da condutividade eléctrica e o resultado será da
mesma forma, j = σG.
Note-se que o sinal do coeficiente de Hall é o mesmo dos transportadores de carga, que
considerámos negativo, −e.
1 1
R=− para electrões; R=+ para buracos (6.64)
ne ne
Note-se também que a magnetorresistência é nula (eq. 6.62) no caso dos electrões serem
livres.
273
Página 274 (propositadamente em branco).
A 8 de Abril de 1911, Heike Kamerlingh Onnes e os colegas Cornelis Dorsman, Gerrit Jan
Flim, e Gilles Holst descobriram, por serenedipidade, o fenómeno da supercondutividade.
Kamerlingh Onnes, que tinha previamente conseguido liquefazer o hélio (Teb = 4.12 K)
(em 1908), procurava comprovar experimentalmente a teoria de Drude para as muito
baixas temperaturas a que tinha agora acesso. Dada a necessidade de o metal a usar ter
de ser muito puro (para eliminar a componente residual da resistividade, que se torna
muito importante a baixas temperaturas), usaram mercúrio por ser mais fácil a sua pu-
rificação. Esperavam encontrar uma diminuição gradual da resistividade à medida que,
baixando a temperatura, se aproximasse do limite que conseguia atingir (aproximada-
mente 1 K). Contudo, o que observou surpreendeu-o. De facto, a diminuição gradual da
resistividade era observada até cerca de 4 K, ocorrendo então uma diminuição brusca até
uma resistência que ele media como sendo 10−5 ohm.
Figura 7.1: Gráfico obtido por Kamerlingh Onnes, para uma amostra de mercú-
rio.
Posteriormente verificou que nem para todos os metais se observava esta queda brusca
277
ASPECTOS QUALITATIVOS
da resistividade e que, para os metais nos quais essa queda ocorria, a temperatura a que
se evidenciava (temperatura crítica, Tc ), não era igual para todos.
Metal Tc /K
Mercúrio 4.153 K
Chumbo 7.193
Nióbio 9.50
Tálio 2.39
Índio 3.404
Gálio 1.091
Dois anos depois foi atribuído a Onnes o prémio Nobel pela sua ”investigação sobre as
propriedades da matéria a baixas temperaturas, que conduziu inter alia à produção de
hélio líquido”
278
INTERACÇÃO ELECTRÃO-ELECTRÃO MEDIADA POR FONÕES
SUPERCONDUTIVIDADE
As propriedades mais importantes dos supercondutores que são bem definidas e conhe-
cidas são as seguintes:
— Condutividade perfeita, i.e., resistência eléctrica nula (Kamerlingh Onnes, 19111 ) para
T < Tc . Tc é chamada a temperatura crítica.
— Correntes persistentes: o próprio Kamerlingh Onnes, depois de muitas outras experi-
ências, relatou, em Abril de 1914, a descoberta de correntes eléctricas que continuam
a circular indefinidamente sem o circuito ser alimentado—correntes persistentes—em
anéis de materiais supercondutores. Kamerlingh Onnes queria saber quão pequena era
a resistência eléctrica no estado supercondutor, pois não acreditava que fosse mesmo
zero. Fez muitas experiências e numa delas resolveu medir o tempo que levava a decair
a corrente eléctrica induzida por um íman num pequeno anel de chumbo arrefecido
a 1.8 kelvin, e portanto no estado supercondutor. A certa altura retirou o íman e
esperou ver a corrente diminuir rapidamente para zero. No entanto, a corrente conti-
nuou a circular durante uma hora, sem diminuição perceptível. Durante o seu relato à
Academia Real Holandesa das Artes e Ciências, onde tinha em Abril de 1911 relatado
a sua descoberta da supercondutividade, Kamerlingh Onnes disse ter muita pena de
não poder ter levado o anel com a corrente persistente, porque o equipamento para a
refrigeração a hélio era muito pesado e complicado. Em 1932, um dos seus colabora-
dores na descoberta da supercondutividade, Gerrit Jan Flim, foi de avião a Londres
levando um crióstato portátil com um anel de chumbo mergulhado em hélio líquido,
onde circulava uma corrente persistente de 200 amperes. Fez a viagem, para demons-
trar o efeito sensacional da supercondutividade numa das animadas conferências das
sextas feiras tradicionais da Royal Institution.
— A supercondutividade pode ser destruída por um campo magnético exterior superior
a um campo crítico Hc (1914). Verifica-se empiricamente que
" 2 #
T
Hc (T ) = Hc (0) 1 −
Tc
1 H. K. Onnes (1911). "The resistance of pure mercury at helium temperatures". Commun. Phys. Lab.
Univ. Leiden 12: 120.
2 Esta regra não é válida para filmes finos.
3 W. Meissner and R. Ochsenfeld, Naturwissenschaften 21, 787 (1933)
279
ASPECTOS QUALITATIVOS
netra no interior do material (B = 0). Para ser mais exacto, o campo, de facto, existe
numa camada superficial do material com espessura da ordem de λ ≈ 10−5 − 10−6 cm,
na qual as correntes persistentes fluem. Verifica-se a lei empírica
1
λ(T ) = λ(0) p
1 − (T /Tc )4
a)
B
b) B
r
0
280
INTERACÇÃO ELECTRÃO-ELECTRÃO MEDIADA POR FONÕES
SUPERCONDUTIVIDADE
Íman
N S
N S
Supercondutor
Correntes induzidas
281
ASPECTOS QUALITATIVOS
ρ T3 Cv T
Cv e -Δ/kB T
ρ=0
1 T/Tc 2 3
— A contribuição dos electrões para o calor específico segue uma lei empírica proporcional
a e−∆/kB T , sugerindo a existência de um hiato no espectro das excitações elementares.
No entanto esse hiato tem uma forte dependência da temperatura, contrariamente ao
que acontece nos semicondutores. E deveria anular-se para T = Tc .
282
INTERACÇÃO ELECTRÃO-ELECTRÃO MEDIADA POR FONÕES
SUPERCONDUTIVIDADE
— Se, para T < Tc , o material for sujeito a um campo magnético exterior, o fluxo
magnético não penetra no seu interior.
283
ASPECTOS QUALITATIVOS
— Estes electrões estão “emparelhados”, de modo a que em cada par, os dois electrões
têm spins opostos e quantidades de movimento, iguais em módulo mas com sentidos
opostos.
O mecanismo conducente à formação dos pares de Cooper, consiste numa interacção dos
electrões com as vibrações da rede (interacção electrão-fonão). O facto de a temperatura
crítica (Tc ), depender quer da rigidez do material quer da massa dos átomos que o
constituem (efeito isotópico), constitui uma prova em favor deste mecanismo.
Verifica-se ainda que os metais e ligas metálicas com maiores valores de Tc são maus
condutores à temperatura ambiente.
Têm sido feitos vários testes à teoria, que têm revelado uma boa concordância entre a
experiência e os resultados experimentais, para os metais e ligas metálicas que apresentam
uma transição para o estado supercondutor. No entanto, a teoria não tem ajudado muito
no design de materiais supercondutores.
Para um metal a 0 K, o último nível ocupado (nível de Fermi) está situado no interior da
banda de condução. Por aumento de temperatura, os electrões são facilmente promovidos
nos níveis dessa banda. Para um supercondutor a 0 K, há, onde estava o nível de Fermi,
um hiato de alguns milielectrões volt com um nível a meio o qual contém os pares de
Cooper (que não têm de satisfazer o princípio de exclusão de Pauli).
284
INTERACÇÃO ELECTRÃO-ELECTRÃO MEDIADA POR FONÕES
SUPERCONDUTIVIDADE
de um supercondutor, ambos a 0 K .
EF E Eg
F
cheia cheia
Metal Supercondutor
Figura 4.2. Diagrama de bandas de energia, a 0 K, para um metal e para um supercondutor. A
Figura 7.6: Diagrama de bandas de energia, a 0 K, para um metal e para um
supercondutor. A largura do hiato (“gap“) do supercondutor está exagerada.
Este hiato representa a quantidade de energia necessária para quebrar um par de Cooper,
promovendo os electrões que o constituíam, à banda superior. Esta banda está pois vazia
a 0 K, aumentando a sua ocupação com a temperatura.
Na ausência de campo magnético exterior, um metal que apresente transição para o estado
supercondutor à temperatura crítica Tc , permanece nesse estado para temperaturas entre
0 K e Tc .
Acontece no entanto que, como foi já referido, com aumento da temperatura diminui o nú-
mero de pares de Cooper até que, para T = Tc , já só temos electrões “normais”. Significa
isto que, atingida a temperatura crítica, ocorre a transição entre o estado supercondutor
e o estado normal. Esta transição é uma transição de segunda ordem:
285
ASPECTOS QUALITATIVOS
a) b)
Hc(T) χ
Hc(0) Hc (T)
0
Normal H
Supercondutor
-1
0
Tc T
5 A.C. Rose-Innes, E.H. Rhoderick; “ Introduction to Superconductivity “, Pergamon Press Ltd. , 2.ed
(1980)
286
INTERACÇÃO ELECTRÃO-ELECTRÃO MEDIADA POR FONÕES
SUPERCONDUTIVIDADE
vortex—caracterizado por uma distribuição regular das porções normais no seio do ma-
terial supercondutor) e, para valores superiores a Hc2 , todo o material readquire o com-
portamento metálico normal. Este comportamento é ilustrado na figura 7.8. Para este
a) b)
χ
Hc2 (0) Hc2 (T) Hc1 (T) Hc2 (T)
0
Estado misto Normal H
-1
Supercondutor
0
Tc T
Até 1986, os materiais supercondutores com temperaturas críticas mais elevadas eram
metais e ligas metálicas, tendo a liga Nb3 Ge o valor mais alto (Tc = 23 K).
Além desta classe de materiais, eram também conhecidos materiais orgânicos supercon-
dutores (com Tc ≈ 12 K) e materiais cerâmicos como por ex.: BaPb1−x Bix O3 (Tc = 12 K)
e Li1+x Ti2−x O4 (Tc = 12 K)6 . Estes valores de temperatura crítica podiam, no entanto,
287
ASPECTOS QUALITATIVOS
A partir do composto inicial, foi obtida toda uma família La2−x Mx CuO4−y (M = Ca,
Sr, Ba), com Tc ≈ 40 K 8 . Posteriormente, Chu et al.9 , sintetizaram o YBa2 Cu3 Oδ , que
apresentava uma temperatura de transição de cerca de 90 K.
Ainda à base de óxidos de cobre, foram descobertas mais duas famílias de supercon-
dutores: Bi-Ca-Sr-Cu-O e Tl-Ba-Ca-Cu-O. Um dos valores de Tc mais elevados, que
foi conseguido, foi de 125 K, para o composto Tl2 Ba2 Ca2 Cu3 Oδ 10 . Posteriormente, foi
referido em 1993, um valor de Tc = 138 K, para o composto de fórmula HgBa2 CaCu3 Ox .
No final dos anos 50, havia uma grande excitação nos meios científicos relacionada com as
teorias da supercondutividade, nomeadamente com a teoria microscópica de BCS (Bar-
deen, Cooper e Schriffer, 1957) e ainda com a teoria fenomenológica de Ginsburg-Landau
(1955). A teoria de BCS baseava-se na hipótese de que a interacção atractiva entre os
electrões, que formam os pares de Cooper, era mediada por fonões, o que implicava
temperaturas críticas muito baixas. Porque não procurar outra entidade mediadora da
interacção atractiva que permitisse temperaturas críticas mais altas? Assim nasceram
várias ideias mais ou menos brilhantes embora todas infrutíferas. Uma delas, a ideia de
Little11 , de conceber sistemas moleculares em que possíveis “excitões” pudessem mediar a
interacção atractiva, a temperaturas elevadas, deu origem a grande optimismo. Começou
então a desenhar-se uma nova perspectiva para os sólidos moleculares.
288
INTERACÇÃO ELECTRÃO-ELECTRÃO MEDIADA POR FONÕES
SUPERCONDUTIVIDADE
Claro que ninguém conseguiu sintetizar as moléculas sugeridas por Little, mas a des-
coberta sucessiva de materiais sintéticos cada vez mais condutores levou a grandes in-
vestimentos em I & D e lançou a corrida aos supercondutores orgânicos. A procura
de supercondutores com altas (ou mesmo baixas!) temperaturas críticas, em materi-
ais orgânicos moleculares continuou, até que, finalmente em 1979, foi anunciado por K.
Bechgaard e D. Jerome, o primeiro supercondutor orgânico com Tc da ordem de 1 K.
H3 C Se Se CH 3
H3 C Se Se CH3
TMTSF
(Tetrametiltetraselenofulvaleno)
H S S S S H
H H
H H
H S S S S H
BEDT-TTF = ET
percondutor orgânico com temperatura crítica mais elevada, actualmente, é um sal com
a fórmula (BEDT-TTF)2 Cu[N(CN)2 ]Cl (Tc = 12.8 K).
289
ASPECTOS QUALITATIVOS
As aplicações possiveis dos materiais supercondutores são consequência das duas pro-
priedades: ausência de resistência eléctrica e diamagnetismo perfeito.
O facto de possuirem resistência eléctrica nula significa que, por passagem de corrente,
não há libertação de calor por efeito de Joule.
Os materiais condutores normais, têm na libertação de calor uma das maiores limitações
ao seu uso. Na electrónica, particularmente na construção de computadores, este facto
constitui um forte factor limitativo da miniaturização, pois é necessário que haja espaço
para dissipar o calor libertado. A utilização dos supercondutores permitiria evitar este
problema.
290
INTERACÇÃO ELECTRÃO-ELECTRÃO MEDIADA POR FONÕES
SUPERCONDUTIVIDADE
Uma das aplicações mais promissoras destas junções, resulta da construção de SQUID’s
(Superconducting Quantum Interference Devices) que são constituídos por duas junções
Josephson em paralelo. Os SQUID’s podem ser usados como detectores de campos
magnéticos muito fracos, na construção de memórias, etc. Uma das características mais
espectaculares dos supercondutores é o seu carácter diamagnético. Este efeito pode ser
visível por levitação de um íman, sobre uma placa de material supercondutor. Tendo em
conta esta característica, projectam-se comboios que se moveriam suspensos no ar. Têm
havido na Europa e no Japão protótipos deste tipo de comboios. Os exemplos dados são
apenas algumas das aplicações possiveis.
A utilização destes novos materiais, permite por um lado o emprego de azoto líquido,
muito mais barato que o hélio e, por outro, a sua preparação apresenta-se como mais
simples e barata. Contudo, estes materiais encerram alguns problemas que é necessário
resolver, antes de se encarar a sua aplicação tecnológica. O método usual de preparação
(pastilhas e filmes), dá materiais que, além de nalguns casos serem heterogéneos, são
multigranulares. As junções intergrãos, constituem descontinuidades de que resulta uma
diminuição da quantidade de corrente que podem transportar, sem atingir a densidade
de corrente crítica (limite máximo de densidade de corrente que podem transportar sem
ocorrer a transição para o estado normal).Tratando-se de materiais cerâmicos, têm pro-
blemas mecânicos característicos - dureza e fragilidade. Torna-se assim extremamente
difícil a obtenção de fios que sejam maleáveis (forma necessária para a maioria das apli-
cações previstas, como por exemplo a construção de enrolamentos).
291
UM POUCO DE TEORIA
Nesta altura os esforços estão dirigidos quer para a melhoria das propriedades mecânicas
e físicas dos compostos já conhecidos, quer para a procura de novos materiais.
Isto tudo implica que a função de onda dos electrões supercondutores deve permanecer
estacionária à volta do anel.
292
INTERACÇÃO ELECTRÃO-ELECTRÃO MEDIADA POR FONÕES
SUPERCONDUTIVIDADE
Quando Schrödinger descobriu a sua equação, imaginou que, no caso da partícula ser um
electrão, a probabilidade, que ele próprio associou à função de onda, era a densidade de
carga eléctrica, mas quando resolveu a equação para o átomo de hidrogénio, constatou
que essa ideia não funcionava. Foi nessa altura que Max Born interpretou a função de
onda como uma amplitude de probabilidade—a ideia de que o seu quadrado não era a
densidade de carga mas apenas a probabilidade por unidade de volume de encontrar o
electrão num dado sítio.
Segundo a teoria quântica, a amplitude de probabilidade para uma partícula com carga
q ir de um ponto a até um ponto b, na presença de um campo magnético (descrito por
um potencial vector13 A) é
A · ds
i
Hb
hb|ai = ψ = ψA=0 e ~ q a (7.3)
Se for à volta de um anel, bem no seu interior (além da distância de penetração, 1/λ, da
superfície, onde a corrente é zero),
i
ψ = ψA=0 e ~ qΦ (7.4)
Hb
em que Φ = a A · ds é o fluxo magnétco. Por outro lado, num supercondutor, é válida a
(eq:7.3). Como a função de onda ao longo do anel tem de ter o mesmo valor quando volta
ao mesmo sítio, só pode ter um comprimento de onda que seja submúltiplo do perímetro
do anel: θ tem de ser um múltiplo de 2π, isto é, θ = n 2π, com n inteiro. Igualando os
ψ nas eqs. 7.4 e 7.3, vem ~q Φ = n 2π e portanto
2π~ h
Φ=n =n
q q
como tinha sido previsto por Fritz London14 . Mas quando em 1961 foi observado experi-
mentalmente por Deaver e Fairbank e independentemnte por Doll e Nabauer, o valor do
13 As relações entre o campo eléctrico E, o campo magnético B o potencial eléctrico φ e o potencial vector,
A, são as seguintes: 1) E = −∇φ − ∂A ∂t
e B = ∇ × A no sistema SI; 2)E = −∇φ − 1c ∂A ∂t
no sistema cgs.
14 A observação de que o fluxo magnético no interior de um anel supercondutor é quantizado confirma a
293
UM POUCO DE TEORIA
quantum de fluxo medido era metade do previsto por London. Hoje, percebe-se porquê!
Segundo Bardeen, Cooper e Schrieffer, o valor da carga eléctrica deve ser a carga de
um par de electrões, ou seja, q = 2e, em que e é o valor absoluto da carga do electrão,
h
também chamada a carga elementar, dando Φ = n 2e ou
h
Φ = n Φ0 ; Φ0 =
2e
sendo Φ0 o quantum de fluxo. O valor concreto é
Φ0 = 2.067833667(52) × 10−15 Wb ou V s
Por outras palavras, a onda, que representa a função de onda, tem de ter a mesma
amplitude senpre que passe pelo mesmo sítio. Portanto só pode ter um comprimento
de onda que seja um submúltiplo do perímetro do anel. Assim, se dermos uma volta
completa ao longo do anel, o factor de fase tem de ser um múltiplo de 2π. Isso implica
que o fluxo magnético tenha de ser da forma Φ = n hq em que h é a constante de Planck, q
é a carga eléctrica da partícula descrita pela função de onda e responsável pelo fenómeno,
e n é um número inteiro: 0, 1, 2, 3, . . .
em que
m
Λ = µ0 λ2 = (7.7)
ns e2
294
INTERACÇÃO ELECTRÃO-ELECTRÃO MEDIADA POR FONÕES
SUPERCONDUTIVIDADE
sendo
E = campo eléctrico microscópico
B = campo magnético microscópico
Λ = parametro fenomenológico
ns = densidade de electrões supercondutores
λ = profundidade de penetração
Js = densiadde de corrente supercondutora
µ0 = permitividade do vácuo
A equação (7.5) descreve a condutividade perfeita, uma vez que o campo eléctrico acelera
os electrões em vez de simplesmente manter a sua velocidade em oposição à resistência
de um condutor normal.
∇ × B = µ0 J (7.8)
B = B0 e−r/λ (7.10)
A equação (7.10) implica que o campo magnético não penetra no interior do supercon-
dutor, decaindo exponencialmente com uma profundidade característica, λ (ver Fig.7.2).
295
UM POUCO DE TEORIA
Um dos problemas destas deduções consiste em ter suposto que a função de onda era
rígida. Pippard18 introduziu um parâmetro, ξ0 , a que chamou comprimento de coerência
e que está relacionado com a extensão da função de onda dos electrões supercondutores.
Com o argumento simples do príncipio de incerteza pode concluir-se que
~ vF
ξ0 ≈ a (7.14)
kB Tc
sendo a, uma constante numérica da ordem de um. O argumento é o seguinte: Só os
electrões no intervalo kB Tc da energia de Fermi, poderão ter relevância para um fenómeno
que tem lugar a Tc e estes electrões têm uma gama de momentos ∆p ≈ kB Tc /vF (vF =
velocidade de Fermi). Então ∆x ≥ ~/∆p ≈ ~vF /kB Tc .
ξ0 representa de certo modo o tamanho dos grupos de onda dos electrões supercondutores.
Já em 1950, sete anos antes de BCS, Ginsburg e Landau19 introduziram uma função de
onda complexa, ψ, como parâmetro de ordem para os electrões supercondutores, tal que
a densidade local de electrões supercondutores era dada por
ns = |ψ(x)|2 (7.15)
17 E = −∇φ − ∂A∂t
; B=∇×A
18 A.B. Pippard, Proc. Roy. Soc. (London) A 216, 547(1953)
19 V.L.Ginsburg and L.D. Landau, Zh. Eksperim. i Teor. Fiz. 20, 1064(1950)
296
INTERACÇÃO ELECTRÃO-ELECTRÃO MEDIADA POR FONÕES
SUPERCONDUTIVIDADE
que é análoga à equação de Schrodinger para uma partícula livre mas com um termo não
linear. ψ pode ser considerada como a função de onda do movimento do centro de massa
dos pares de Copper. A teoria de GL introduz um comprimento característico
~
ξ(T ) = (7.17)
|2 m∗ α(T )|1/2
A ξ(T ) chama-se comprimento de coerência e caracteriza a distância sobre a qual ψ(r)
pode variar sem indevido aumento de energia.
SUPERCONDUTORES DO TIPO II
Tipo II
Tipo I
0
Hc1 Hc Hc2 H
297
UM POUCO DE TEORIA
A ideia básica da teoria BCS reside na existência dos pares de Cooper, resultantes do
potencial atractivo entre 2 electrões, mediada por um fonão. A importância da interac-
ção electrão-fonão na explicação da supercondutividade foi primeiramente sugerida por
Frölich20 em 1950. Esta sugestão foi confirmada experimentalmente
√ pela descoberta do
efeito isotópico, segundo o qual Hc e Tc são proporcionais a 1/ M para isotopos do
mesmo elemento.
k-q k’+q
-q
ωD
k
k’
298
INTERACÇÃO ELECTRÃO-ELECTRÃO MEDIADA POR FONÕES
SUPERCONDUTIVIDADE
O formalismo BCS implica que os 2 electrões que formam o par de Cooper têm momento
k e −k e spins opostos. O potencial atractivo −V deve ser da ordem de grandeza da
energia de Debye ~ ωD = kB ΘD . ( ΘD = temperatura de Debye).
Cvn ≈ γ T (7.21)
Na teoria de BCS demonstra-se que mesmo uma atracção muito fraca entre electrões,
como a que surge na interacção electrão-fonão, pode provocar uma instabilidade na su-
perfície de Fermi e provocar a formação de pares de electrões com momentos e spins
opostos. Estes pares de electrões (pares de Cooper) têm uma extensão espacial da ordem
299
UM POUCO DE TEORIA
PARES DE COOPER
No estado supercondutor, cada par de electrões, também chamado par de Cooper, consti-
tui como que uma partícula única—uma espécie de molécula formada por dois electrões—
com spin zero. E deixam, por isso, de obedecer ao princípio de exclusão de Pauli, podendo
vários pares ocupar o mesmo nível de energia. Diz-se que seguem a estatística de Bose-
Einstein, ou que são partículas de Bose-Einstein, ou bosões24 .
Para ver como surge a ligação entre os 2 elctrões, consideremos um modelo simples de 2
elctrões adicionados ao mar de Fermi a T = 0 K com a condição de que estes 2 electrões
interagem um com o outro mas não com os outros (do mar de Fermi) excepto através do
princípio de exclusão. Por argumentos relacionados com o teorema de Bloch é natural
que o estado fundamental tenha momento total nulo e que portanto, os electrões tenham
momentos opostos. Isto sugere uma função de onda
X
ψ0 (r1 , r2 ) = gk ei(k.r1 ) e−i(k.r2 ) (7.23)
k
24 Muitos
físicos preferem chamar ”condensado fermiónico” aos pares de Cooper do estado supercondutor,
uma vez que os electrões são individualmente partículas que seguem a estatística de Fermi-Dirac.
300
INTERACÇÃO ELECTRÃO-ELECTRÃO MEDIADA POR FONÕES
SUPERCONDUTIVIDADE
em que Ek são as energias dos electrões não perturbados e Vkk0 , os elementos matriciais
da interacção (ver expressão 7.19). Se existirem soluções tais que E < 2 EF haverá
formação de pares de Cooper. Cooper fez a aproximação Vkk0 = −V para estados entre
kF e kF ± ~ωD (ωD = frequência de Debye) e Vkk0 = 0 para estados fora desse intervalo.
1 X −1
= (2Ek − E) (7.27)
V
k>kF
Esta expressão mostra que existe um estado ligado com energia negativa relativamente ao
nível de Fermi, sendo esse estado constituído por um par de electrões que separadamente
teriam energia E > EF . Note-se o envolvimento da densidade de estados no nível de
Fermi.
e à expressão
1/2
Ek = ∆2k + ξk2 (7.31)
para os estados excitados. Nesta expressão ξk = Ek − EF = energia relativamente ao
nível de Fermi.
301
UM POUCO DE TEORIA
∆(0) ≈ 1.76 kB Tc
1/2 (7.32)
∆(T ) T
≈ 1.74 1 − para T ≈ Tc
∆(0) Tc
Figura 7.12: Razão entre o valor do hiato para as excitações elementares e o valor
para T = 0 K, vs. temperatura. Reproduzido de J. Bardenn, L. N. Cooper and
J. R. Schrieffer, Phys.Rev. vol.108,(1957), 1175
O significado físico do grau de liberdade fase, foi evidenciado por Josephson25 que previu
que os pares de Cooper poderiam passar, por efeito túnel, de um supercondutor para
outro (separados por um isolador) mesmo a diferenças de potencial nulas, com uma
densidade de corrente
J = J0 sen (θ1 − θ2 ) (7.33)
302
INTERACÇÃO ELECTRÃO-ELECTRÃO MEDIADA POR FONÕES
SUPERCONDUTIVIDADE
Brian Josephson, previu, e a experiência confirmou, vários efeitos, em 1962, quando tinha
22 anos e fazia o trabalho de tese de doutoramento em Cambridge:
Figura 7.13: Junção entre dois supercondutores, separados por uma película
muito fina de material isolador.
3. A aplicação uma diferença de potencial alterna (AC) gera uma corrente através da
junção cuja característica I − V apresenta picos a intervalos de ~q ω, em que ω é a
frequência da corrente AC. Pela medida destes intervalos pode calcular-se a razão
2e
h que é
2e
= 483.5912 MHz/µV
h
4. Se for aplicado um campo magnético na região entre duas junções (Figs.7.14 e
7.15) observam-se oscilações rápidas da corrente com variações no campo magnético
devidas ao termo de interferência cos(eΦ/~) da equação
eΦ
Jtotal = J0 sen δ0 cos
~
303
UM POUCO DE TEORIA
304
INTERACÇÃO ELECTRÃO-ELECTRÃO MEDIADA POR FONÕES
SUPERCONDUTIVIDADE
∂ψ1
i~ = µ1 ψ1 + Kψ2
∂t (7.34)
∂ψ2
i~ = µ2 ψ1 + Kψ1
∂t
em que K é uma constante que representa o acoplamento através da junção, e µ1 , µ2 são
os potenciais químicos de cada lado (energias de Fermi, se forem metais).
∂ρ1 ∂ρ2 √
~ = −~ = 2K ρ1 ρ2 sen (θ1 − θ2 )
∂t ∂t
∂
−i~ (θ2 − θ1 ) = µ2 − µ1
∂t
Estas são as equações que governam os efeitos de Josephson, mas podem ser escritas de
forma mais compacta. A derivada em ordem ao tempo da densidade de pares de Cooper
descreve uma densidade de corrente e podemos escrever J = ∂ρ 1
∂t . Se aplicarmos um
diferença de potencial V através da junção, os níveis de energia deslocam-se de acordo
√
com µ2 − µ1 = 2eV . Escrevendo J0 = 2K ρ1 ρ2 /~ e δ = θ1 − θ2 vem
J = J0 sen δ (7.36)
∂δ 2e
= V (7.37)
∂t ~
305
UM POUCO DE TEORIA
EFEITO DE JOSEPHSON DC
Das equações (7.36) e (7.37) é claro que a corrente DC pode fluir através da junção
mesmo a tensão nula, V = 0 enquanto a densidade de corrente DC for menor do que J0 .
A diferença de fase ajustar-se-á de acordo com a equação (7.36)
EFEITO DE JOSEPHSON AC
1 2
Ψ1 Ψ2
Se for aplicada uma tensão V (ou uma corrente DC maior do que I0 ) na junção obtém-se
das equações (7.36,(7.37)
2e
J = J0 sen Vt (7.38)
ψ ~
Assim, quando é aplicada uma tensão a corrente de Josephson irá oscilar com uma
frequência angular
t 2e
ωJ = V (7.39)
~
em que 2e
h = 483.5912 MHz/µV . Este é um resultado notável—de que um campo eléctrico
DC (corrente directa) vai induzir uma corrente alterna—foi, não só observado, mas tem
sido a base para técnicas de medição da relação fundamental e/h com grande precisão.
Consideremos o caso ainda mais notável de um dispositivo com duas junções em paralelo
(Fig.7.14) na presença de um campo magnético B.
306
INTERACÇÃO ELECTRÃO-ELECTRÃO MEDIADA POR FONÕES
SUPERCONDUTIVIDADE
307
UM POUCO DE TEORIA
sendo n um número inteiro. Quer dizer, a corrente tem máximos para valores do fluxo
múltiplos do quantum de fluxo Φ0 .
(7.45).
O valor de 2e
h que agora se chama constante de Josephson, e é, como se pode verificar, o
inverso do quantum de fluxo magnético
2e
KJ = = 4.83597891(12) × 1014 s−1 V−1
h
308
INTERACÇÃO ELECTRÃO-ELECTRÃO MEDIADA POR FONÕES
SUPERCONDUTIVIDADE
relaciona a carga elementar e com a constante de Planck h. Pode ser medida com a
precisão de 1 em 108 . O seu valor é independente do tamanho, da forma, ou composição
do anel, desde que seja de material supercondutor27 e esteja abaixo da temperatura
crítica.
A constante de Planck pode ser calculada com grande precisão, por exemplo, pelo efeito de
Hall quântico, descoberto por Klaus von Klitzing, e que é a versão quantizada, com valores
discretos, do efeito de Hall, que consiste na observação de uma diferença de potencial entre
dois pontos de um material semicondutor por onde flui uma corrente eléctrica, gerada por
um campo magnético aplicado perpendicularmente á direcção da corrente. A diferença de
potencial é proporcional à corrente eléctrica, sendo a constante de proporcionalidade, a
resistência, dada pela lei de Ohm V = IR. Neste caso, a resistência chama-se resitência
de Hall e tem um valor muito bem definido, agora chamado constante de von Klitzing:
h
RK = = 25 812.8056(12) Ω
e2
Todas essas constantes envolvem a constante de Planck e o valor absoluto da carga do
electrão! E isso permite calcular a constante de Planck com uma grande precisão:
h = 6.62606896(33) × 10−34 J s
e o valor da carga elementar e, também pode ser medido com muita precisão com uma
simples experiência de electroquímica:
e = 1.602176487(40) × 10−19 C
^
¨
27 do tipo II
309
Página 310 (propositadamente em branco).
Introduction
According to the 2nd law, free energy decreases for a spontaneous process.
Thus for an arbitrary phase transition α → β, µ α > µβ or (µβ − µ α )< 0
At 0 °C, the chemical potential of the solid is equal to the chemical potential of
the liquid µs = µ l .
7A TRANSIÇÕES DE FASE
Above 0 °C, the chemical potential of the solid must be higher than the chemical
potential of the liquid µs > µ l .
É uma condição necessária para a ocorrência de qualquer processo espontâneo, a de
que a energia de Temperature
Gibbs do Dependence
sistema diminua. Portanto, numa transição de fase α → β
of Free Energy
teremos (µβ − µα ) < 0, em que µα e µβ são os potenciais químicos1 das fases α e β
respectivamente. Recall the Gibbsian relationship for Gibbs free energy (which is true molar quantities also)
dG = −SdT + V dp ⇒ dG = dµ = −SdT + V dp
Atendendo a que G = H −T S e que dH = dq+V dp, teremos para um processo adiabático
dG = V dp − Sdt eConsidering
portantoonly the temperature change yields
dµ
= −S
dT dµ
= −S
i.e., a derivada do potencial químico em relação dT à temperatura é a entropia negativa
molar (Fig.7A.1).
That is, the slope of a µ vs. T is the negative of the molar entropy.
µsolid
µ µliquid
Tm T
Note the transition temperature occurs when µs = µ l .
Figura 7A.1: Variação do potencial químico com a temperatura numa transição
como a fusão de um sólido—há uma descontinuidade no potencial químico µ.
dµ
— dT é descontínua na temperatura de transição.
µ dµ V H Cp
— dT é contínua na temperatura de transição.
∂S
— O calor específico cp = T ∂T é descontinuo na temperatura de transição.
Lambda Transitions
— As derivadas do volume molar e da entalpia, vs. temperatura, são descontínuas na
1. temperatura
Heat capacity deattransição.
transition temperature is discontinuous.
2. Theoretically, the transition has a specific transition enthalpy, though in practice
Há the
umtransition enthalpy exists
tipo de transições only aspor
provocadas a limit in infinite
fonões, para astime.
quais a variação do calor
3. Molar volume , entropy and enthalpy are continuous at transition
específico com a temperatura consiste num máximo estreito e assimétrico temperature.
com a forma
4. Lambda
da letra gregatransitions include
λ, e, que, por transitions
isso são chamadasbetween phases
transições of liquidesse
λ. Embora crystals
nome or
nãothe
tenha
onset of ferromagnetism.
sido dado pela primeira vez em que apareceu, no N H4 Cl sólido, em 1922, foi a primeira
5. A lambda transition is a like a second-order transition except that it has an infinite
transição λ genuína a ser descoberta. O nome começou a ser dado a partir da descoberta
heat capacity 4at the transition temperature (theoretically!).
da transição no He. Tem sido observada em transições para estados ferroelétricos,
ferromagnéticos, antiferromagnéticos, diamagnéticos (supercondutores). A transição λ
µ V
é considerada uma transição H do tipo pares/singles
ordem/desordem Cp e foi analisada em
312
T trans T T trans T T trans T T trans T
T trans T T trans T T trans T T trans T
Há outros tipos de transições de entre as quais se salienta a transição vítrea entre uma
fase líquida e uma fase vítrea, que ocorre, por exemplo, em polímeros. O estado vítreo é
um estado em que há uma desordem congelada, e a sua entropia e densidade dependem
da história térmica.
Nas transições de segunda ordem, a simetria do sistema varia continuamente. São carac-
terizadas por uma susceptibilidade divergente, um comprimento de correlação infinito e
2 R.
J. Thorn, ”On the origin of the lambda-type transition in heat capacity”, J. Chem. Thermodynamics
2002, 34, 973–985.
313
TRANSIÇÕES DE FASE
Parâmetro
de
ordem
em
função
da
temperatura
para
transições
de
ordem vs. temperatura em transições de 2a e 1a
2ª
e
1ª
ordem.
de
Figura 7A.5: Parâmetro
ordem. 1
fase acima do ponto crítico e não nulas abaixo. É o parâmetro de ordem que define o
início da transição de fase. Para um sistema ferromagnético que passa por uma transição
de fase, o parâmetro de ordem é a magnetização.
314
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 7
Quando a simetria é quebrada, é necessário introduzir uma ou mais variáveis para descre-
ver o estado do sistema. Por exemplo, para a fase ferromagnética é necessário considerar
a magnetização, cuja direcção foi espontaneamente assumida quando o sistema foi arre-
fecido abaixo do ponto de Curie. Essas variáveis são exemplos de parâmetros de ordem.
Um parâmetro de ordem é uma medida do grau de ordem no sistema—varia desde zero
para a desordem total até um valor de saturação para a ordem completa.
As transições de fase contínuas são caracterizadas por certos parâmetros chamados ex-
poentes críticos. O mais importante é talvez o expoente que descreve a divergência do
comprimento de correlação térmica na vizinhança da transição. Um bom exemplo de um
expoente crítico é o do calor específico: quando se varia a temperatura T , mantendo to-
das as outras variáveis termodinâmicas fixas: quando T é próximo de Tc o calor específico
tem um comportamento exponencial
−α
Cp ∝ [Tc − T ]
Para −1 < α < 0, o calor específico tem uma descontinuidade à temperatura de transição.
Este é o comportamento do hélio líquido na chamada transição lambda quando passa do
estado normal para o estado de superfluido para o qual α = −0.0127 ± 0.0003. Este é
considerado o teste mais preciso até agora (2003) das previsões teóricas para os fenómenos
críticos3 .
Os expoentes críticos não são independentes uns dos outros: só dois são independentes
podendo os outros ser deduzidos a partir deles, recorrendo a relações de escala.
3 ’Specific
heat of liquid helium in zero gravity very near the lambda point”, J. A. Lipa et al.,PHYSICAL
REVIEW B 68, 174518 (2003).
315
TRANSIÇÕES DE FASE
A ⫺ ⫺␣
C p⫽ t 共 1⫹a ⫺ ⌬ ⫺ 2⌬ ⫺
c t ⫹b c t 兲 ⫹B , T⬍T
␣
A ⫹ ⫺␣
⫽ 兩 t 兩 ⫹B ⫺ , T⬎T ,
␣
ln f to
TABLE II. Results from curve fitting (t)the specific-heat measurements using Eq. 共9兲 except where noted. Statistical uncertaint
given in parentheses λ = lim
beneath thet→0
values.ln t
⫹ ⫺ ⫺ ⫺ ⫺ ⫺
␣
Junto da temperatura Constraint
crítica Tc , a função f (t)A é/Adominada
A
por Btλ . Na tabela
ac bc
(7A.1) P Range of fit
dos共9兲expoentes críticos
dão-se as definições Eq. ⫺0.01264e amplitudes
1.05251 5.6537 ⫺0.0157
460.19 a intensidade
que definem 0.3311
das 4.154 5⫻10⫺10⬍ 兩 t 兩 ⬍1
共0.00024兲 共0.0011兲 共0.015兲 共7.3兲 共0.0015兲 共0.011兲 共0.022兲
principais singularidades. Em princípio, deveriam considerar-se dois expoentes: um para
Eq. 共10兲 ⫺0.01321 1.05490 5.6950 443.76 ⫺0.0253 ⫺128.4 4.155 5⫻10⫺10⬍ 兩 t 兩 ⬍1
t > 0 e outro para t < 0, mas pode demonstrar-se
共0.00025兲 que são
共0.0011兲 iguais. 共7.0兲
共0.092兲 共0.0015兲 共2.5兲 共0.022兲
Reduced range ⫺0.01254 1.05210 5.6458 463.11 ⫺0.0136 0.3035 4.154 5⫻10⫺10⬍ 兩 t 兩 ⬍3⫻
Note-se que as amplitudes críticas A 共0.00043兲
para o 共0.0018兲 共0.030兲 são
calor específico 共13.4兲 共0.0043兲
proporcionais a共0.044兲
um 共0.022兲
Reduced a
factor 1/α, o qual permite descrição⫺0.01264
range 1.05251
de situações 5.6537
para as quais o460.20 ⫺0.0157
expoente 0.3311
α é positivo, 4.154 10⫺9 ⬍ 兩 t 兩 ⬍10⫺
共0.00024兲 共0.0011兲 共0.015兲 共7.4兲 共0.0015兲 共0.012兲 共0.022兲
negativo ou zero. Na tabela 7A.2 dão-se
T ⫹ 1 nK
alguns1.05307
⫺0.01278
dos expoentes
5.6623
críticos
455.80
teóricos,
⫺0.0165
valores
0.3372 4.151 5⫻10⫺10⬍ 兩 t 兩 ⬍1
experimentais e ordens de grandeza aproximadas.
共0.00024兲 共0.0011兲 共0.015兲 共7.2兲 共0.0015兲 共0.012兲 共0.022兲
P 5 ⬎10⫺7 W ⫺0.01269 1.05273 5.6570 458.55 ⫺0.0160 0.3335 4.154 5⫻10⫺10⬍ 兩 t 兩 ⬍1
4 Para sistsemas ferromagnéticos é o campo 共0.00026兲
magnético
共0.0012兲
mas a noção
共0.017兲
é
共8.0兲
extrapolável para
共0.0017兲
outras
共0.013兲
situações.
共0.025兲
P 5 ⬍5⫻10⫺4 W ⫺0.01323 1.05498 5.6970 443.27 ⫺0.0228 0.3853 4.156 5⫻10⫺10⬍ 兩 t 兩 ⬍1
共0.00042兲 共0.0018兲 共0.029兲 共11.6兲 共0.0038兲 共0.028兲 共0.022兲
⬎0.02% ⫺0.01275 1.05297 5.6620 456.89 ⫺0.0176 0.3473 4.154 5⫻10⫺10⬍ 兩 t 兩 ⬍1
共0.00041兲
316 共0.0018兲 共0.028兲 共12.3兲 共0.0034兲 共0.025兲 共0.022兲
174518-21
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 7
317
TRANSIÇÕES DE FASE
É notável que há muito pouca variação entre os valores dos expoentes críticos entre
sistemas para a mesma dimensão espacial d. A três dimensões, β é da ordem de 1/3, γ
da ordem de 4/3, ν da ordem de 2/3, e o expoente do calor específico, α, da ordem de zero.
Há, no entanto diferenças substanciais entre sistemas de dimensão diferente. O método
baseado no grupo de renormalização introduzido por Kenneth Wilson nos anos de 1970
permite calcular os expoentes e estabelece que eles devem depender da dimensão espacial
do sistema, da simetria do parâmetro de ordem, e da simetria e ordem de grandeza das
interacções, mas não dos detalhes da forma e da intensidade das interacções. Assim, há
classes de universalidade e todas as transições da mesma classe têm os mesmos expoentes
críticos.
Outro aspecto notável das transições de segunda ordem é o de que nem todos os expoentes
críticos são independentes. Por exemplo, γ é sempre da ordem de 2ν e α + 2β + γ é da
ordem de 2. Estas relações são o resultado da homogeneidade das propriedades de escala
das funções de correlação e das variáveis termodinâmicas na vizinhança de Tc , as quais
podem ser deduzidas a partir do grupo de renormalização.
———————————-
318
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 7
7A.3 RENORMALIZAÇÃO
Na física dos sólidos, num transição de fase de 2a ordem Dmin =distância entre átomos;
Dmax = ∞.
hs(x)s(y)i ∼ e−|x−y|/L
Mas quando nos aproximamos do ponto crítico, o comprimento de correlação tende para
infinito, i.e., L → ∞, e mesmo no ponto crítico hs(x)s(y)i decai segundo uma potência
da distância:
1
hs(x)s(y)i ∼
|x − y|d
d = expoente crítico
319
INSTABILIDADES EM SÓLIDOS QUASE-UNIDIMENSIONAIS. CONDUTORES E
SUPERCONDUTORES ORGÂNICOS.
7B.1 INTRODUÇÃO
A anisotropia nas propriedades destes sólidos pode atingir valores muito grandes, sendo
típico que, por exemplo, a condutividade eléctrica seja 103 ou 105 vezes maior ao longo da
cadeia, em que há interacções π − π entre moléculas empilhadas, ou ao longo de cadeias
de polímeros conjugados.
Uma vez que, para T > 0, há sempre flutuações na rede, um sistema 1D não pode
ser efectivamente ordenado, a não ser a T=0. Este facto torna os sistemas 1D reais
interessantes, uma vez que nunca são estritamente 1D e apresentam muitos tipos de
flutuações, instabilidades e transições de fase.
320
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 7
Em metais quase 1D, a baixa T , a energia elástica necessária para modular a rede cris-
talina é menor do que o ganho em energia dos electrões de condução, de modo que o
estado fundamental é uma CDW.
Peierls e Fröhlich1 mostraram que um sistema electrónico a uma dimensão numa rede
deformável é instável relativamente a uma modulação da rede com vector de onda 2kF ,
em que kF é o vector de onda de Fermi. Um tal sistema é descrito pelo hamiltoniano
X X g X +
εk a+ ω q b+ ak+q,s aks bq + b+
H= ks aks + q bq + √ −q (7B.1)
ks q L kqs
1 Peierls,
R. E., 1955, Quantum Theory of Solids (London: Oxford University Press), p. 108; Fröhlich,
H., 1954, Proc. R. Soc. A, 223, 296.
321
INSTABILIDADES EM SÓLIDOS QUASE-UNIDIMENSIONAIS. CONDUTORES E
SUPERCONDUTORES ORGÂNICOS.
INSTABILIDADES A 1D
Formação
do
hiato
de
energia
• Devido
à
interacção
electrão
-‐fonão
forma-‐se
uma
CDW.
INSTABILIDADES A 1D 1
Transição
de
Peierls
Figura 7B.1: Ondas de densidade de carga e formação do hiato
O
poliace7leno
puro
é
isolador
(semicondutor)
—
o
estado
metálico
é
instável
(Peierls)
transição
de
Peierls
metal
isolador
(semicondutor)
322
1
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 7
2 g hb2kF i
∆= √ (7B.5)
L
A origem deste hiato é a mesma da teoria de bandas: reflexão de Bragg devida à modu-
lação periódica da rede. Naturalmente, a energia dos electrões diminui com a abertura
do hiato. Por outro lado, aumenta a energia elástica descrita pelo segundo termo da
primeira equação (7B.4). A energia total dos electrões pode ser calculada por
kF
X
Eel (∆) = 2 Ek
k=−kF (7B.6)
|∆|2
L n EF 2 EF
=− 1 + 2 ln + termos de ordem superior
2 EF |∆|
323
INSTABILIDADES EM SÓLIDOS QUASE-UNIDIMENSIONAIS. CONDUTORES E
SUPERCONDUTORES ORGÂNICOS.
Note-se que o termo logarítmico em (7B.6) só aparece se o hiato abre exactamente a ±kF ,
i.e., o comprimento de onda da modulação da rede é determinado pelo preenchimento da
banda electrónica e é igual a π/kF . A modulação é
s
2 |∆|
hu(x)i = cos(2kF x + φ) (7B.8)
ω2kF g
324
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 7
325
INSTABILIDADES EM SÓLIDOS QUASE-UNIDIMENSIONAIS. CONDUTORES E
SUPERCONDUTORES ORGÂNICOS.
Figura 7B.5: Evolução da anomalia de Kohn com a temperatura (T3 > T2 >
T1 > Tc0 ).
326
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 7
em que a and b são operadores que descrevem electrões que se movem para a direita e
0
para a esquerda, respectivamente, e σαss são elementos das matrizes de spin de Pauli.
Os operadores OCDW (q) e OSDWα (q) são as compoenentes de Fourier das densidades
de carga e de spin, de vector de onda (2kF + q) respectivamente. Os OSS (q) e os três
possíveis OT Sα (q) são os operadores singuleto e tripleto dos pares de Cooper do estado
supercondutor.
Para procurar estados ordenados teríamos de calcular valores expectáveis destes opera-
dores.
A temperatura de transição é
2C 1
Tc = EF e λSS (7B.14)
π
O mesmo argumento pode ser aplicado às outras transições de fase, substituindo λSS por
2g1 − g2
λCDW = − (7B.15)
2π vF
g2
λSDW α = (7B.16)
2π vF
g1 − g2
λT Sα =− (7B.17)
2π vF
A fase mais estável é a que tiver temperatura de transição mais elevada. Além da CDW
do tipo Peierls todas as outras fases são possíveis consoante os valores das constantes de
acoplamento g1 , g2 , g3 , g4 . As fases singuleto (SS, CDW ) e tripleto (T S, SDW ) ocorrem
para g1 < 0 e g1 > 0 respectivamente. As fases de ondas de densidade e supercondutora
são separadas pela linha g1 = 2g2 (Fig.7B.6).
A título de ilustração da teoria apresentada acima, dão-se alguns exemplos típicos quer
das estruturas cristalinas, quer das propriedades electrónicas e de efeitos precursores.
327
INSTABILIDADES EM SÓLIDOS QUASE-UNIDIMENSIONAIS. CONDUTORES E
SUPERCONDUTORES ORGÂNICOS.
As ondas de densidade de carga são processos colectivos e podem dar origem a conduti-
vidades levadas memso na presença de um hiato. Acima da transição de fase, quando o
comprimento de coerência transversal (entre cadeias) se torna menor do que a distância
intercadeias, podem existir flutuações nas ondas de densidade de carga que se manifestam
como efeitos precursores e podem ser observados por difusão de raios-X (Fig.7B.9).
328
COMPLEMENTOS DO CAPÍTULO 7
c
b
a
Triclinic
Figura 7B.7: Estruturas cristalinas dos sais de Bechgaard (T M T SF2 )X.
329
INSTABILIDADES EM SÓLIDOS QUASE-UNIDIMENSIONAIS. CONDUTORES E
SUPERCONDUTORES ORGÂNICOS.
330
8
SEMICONDUTORES
Página 332 (propositadamente em branco).
8.1 INTRODUÇÃO
Vimos em capítulos anteriores grande parte dos aspectos gerais da física do estado sólido,
que são aplicáveis a sólidos cristalinos, nomeadamente as noções decorrentes dos modelos
de Drude e de Fermi, as estruturas cristalinas e a teoria de bandas, bem como excitações
elementares e excitões.
Em geral, como o nome indica, podemos dizer que semicondutores são simultaneamente
maus isoladores, e maus metais. A estrutura de bandas dum semicondutor é caracterizada
por um hiato pequeno (≤ 3 eV), de modo que é possível obter um número significativo
de portadores à temperatura ambiente. Esta densidade de portadores é uma função
rápida da temperatura, e, consequentemente, a condutividade eléctrica varia muito com
a temperatura.
Existem semicondutores de hiato directo (fig. 8.1a) (por exemplo, GaAs) para os quais o
topo da banda de valência e o fundo da banda de condução ocorrem para o mesmo valor
de k (em geral (sempre!) para k = 0). Como consequência, fortes transições ópticas
(dipolo permitidas, i.e., verticais (kfotão ≈ 0)) são observadas. A taxa de transições
directas pode ser calculada utilizando a regra de ouro de Fermi (em que ω é a frequência
da radiação incidente e f e i referem-se aos estados finais e iniciais, respectivamente):
2π
taxa de transição ≈ |hf |Hdipolo |ii|2 δ(Ef − Ei + ~ω) (8.1)
~
Para semicondutores de hiato indirecto (fig. 8.1b) (por exemplo, Si e Ge) a transição
é dipolo proibida até ~ω > Eg (directo). É possível observar absorção óptica através da
assistência de fonões. Quantitativamente, é necessário invocar a teoria das perturbações
de segunda ordem para descrever este processo.
2
2π X hf |Hfonão |βihβ|Hfotão |ii 1 1
taxa de transição ≈ δ(Ef − Ei − ~ω ± ~ωq ) nq + 2 ± 2 +
~ Ei − Eβ − ~ω
β
2
2π X hf |Hfotão |βihβ|Hfonão |ii 1 1
+
~ Ei − Eβ − ~ωq δ(Ei − Ef − ~ω ± ~ωq ) nq + 2 ± 2
β
(8.2)
333
ESTRUTURAS DE BANDAS TÍPICAS DE SEMICONDUTORES
a) b)
E E
banda de condução
banda de condução
E g (directo) E g(directo)
E g(indirecto)
banda dos
banda dos
buracos pesados
buracos pesados
banda dos banda dos
buracos leves buracos leves
banda de split-off banda de split-off
spin orbital spin orbital
k k
Duas imagens são frequentemente utilizadas para visualizar este processo (fig. 8.2) que
envolve transferência entre estados electrónicos com participação simultânea de um fotão
e um fonão. A figura 8.2a) mostra correctamente quais os estados que participam na
absorção (estados na banda de valência e na banda de condução do semicondutor) mas
as energias em jogo estão erradas (a energia do fotão aparece ~ω, enqunato o fonão
aparece com energias da ordem de eV, em vez de meV como devia ser). Por outro lado,
a figura 8.2b) e c) indica correctamente a conservação de energia durante a absorção,
mas utiliza estados no meio do hiato que não existem (estados virtuais). É possível ter,
quer absorção de fonão (fig. 8.2b), quer emissão de fonão (fig. 8.2c), durante a transição.
Para os processos envolvendo absorção de fonões, a absorção é proporcional ao número
de fonões nq (com a absorção a começar para ~ω = Eg − ~ωq ), enquanto que para os
processos envolvendo emissão de fonões, a absorção é proporcional a (nq + 1) (com a
absorção a começar para ~ω = Eg + ~ωq ). Uma vez que, para os processos de absorção
indirecta, q, o vector de onda do fonão envolvido é da ordem de G, ~ωq é elevado (20-50
meV) e portanto os fenómenos envolvendo absorção de fonões tendem para zero à medida
que T é reduzida.
334
SEMICONDUTORES
a) b) c)
Frequentemente, semicondutores de hiato directo têm bandas esféricas. Neste caso, te-
mos:
∂ 2 E(k)
1
∗
∝ m∗xx = m∗ yy = m∗ zz = m∗ (8.3)
m ij ∂ki ∂kj
Quando os campos são elevados, os portadores que se movem num vale de massa mais
leve podem ganhar energia suficiente para saltarem, através da interacção com fonões,
para vales com massa mais elevada ( dispersão, ou "scattering"inter-vales). Neste ca-
pítulo, vamos assumir sempre que os campos são suficientemente pequenos para que a
redistribuição entre vales não ocorra (ou seja, é possível fazer a média sobre todos os
vales e obter uma massa efectiva isotrópica).
335
ESTRUTURAS DE BANDAS TÍPICAS DE SEMICONDUTORES
L Γ X K Γ
b) Caso do germânio Estrutura de bandas de um semicondutor a) Caso do silício
Ec − EF kB T EF − Ev kB T (8.5)
336
SEMICONDUTORES
e, para o germânio, em
1/2
m∗c 3/2 (Ge) = 4 m∗L m∗T 2 (8.12)
Se tivermos uma banda de valência degenerada (isto é, as bandas dos buracos pesados e
leves têm a mesma energia quando k = 0) vem, para a massa efectiva da densidade de
estados,
m∗v 3/2 = m∗lh 3/2 + m∗lh 3/2 (8.13)
337
ESTRUTURAS DE BANDAS TÍPICAS DE SEMICONDUTORES
em que m∗lh e m∗hh são, respectivamente, as massas efectivas para os buracos leves e
buracos pesados.
E E E
nc
Ec
Eg x EF =
Ev
pv
338
SEMICONDUTORES
Para calcular a condutividade temos que somar as contribuições dos electrões e dos
"buracos"
σ = n e µe + p e µp (8.16)
A condutividade será portanto proporcional a e−Eg /2,˛BT . Uma vez que a mobilidade é,
em geral, uma função da temperatura da forma µ ∝ T x , o factor exponencial é dominante,
pelo que podemos em geral escrever:
σ = σ0 e−Eg /2 kB T (8.17)
n = p = ni (8.18)
O nível de Fermi para um semicondutor íntrínseco pode também ser facilmente calculado:
1 1 Nv
EF = Ev + Eg + kB T ln (8.20)
2 2 Nc
O grande interesse tecnológico dos semicondutores resulta do facto de que as suas proprie-
dades eléctricas podem ser modificadas com precisão, mediante a introdução controlada
de átomos estranhos na sua rede cristalina e às propriedades das junções (contactos entre
dois semicondutores). A introdução de átomos estranhos na rede cristalina dos semicon-
dutores tem o nome de dopagem. Vamos considerar dopantes pouco profundos, isto é, que
339
SEMICONDUTORES DOPADOS
têm um electrão ou buraco que é facilmente removido. Consideremos o silício cuja estru-
tura electrónica é Si:[...3s2 3p2 ]. Se substituirmos um átomo de Si por um átomo de P (ou
As, Sb ou Bi) que tem mais um electrão de valência, os átomos substitucionais formam
4 ligações covalentes com o silício, e o quinto electrão fica fracamente ligado ao fósforo
(que tem mais um protão que os átomos de silício da rede), sendo facilmente excitável
para a banda de condução do silício. Os níveis de energia deste electrão deverão portanto
estar localizados muito próximo de Ec (Fig.8.5). Estes dopantes pouco profundas têm
energias de ionização, EI , da ordem dos 50-60 meV. Os átomos dadores [...np3 ] geram,
E
Electrão livre Banda de condução
Si Si Ec
ED níveis dadores EI
EF
+
P
Si Si Ev
Banda de valência
Do mesmo modo, poderíamos dopar o silício com elementos aceitadores [...ns2 np1 ], como
o boro (B), que dariam origem a semicondutores do tipo p. Dopantes geralmente utili-
zados incluem também o Ga e o Al. Como cada um destes átomos tem 3 electrões de
valência, pode formar três ligações covalentes, e a quarta e última ligação pode facilmente
roubar um electrão a uma ligação de silício próxima (ou equivalentemente, corresponde a
um buraco fracamente ligado). Este buraco fica fracamente ligado ao átomo de boro, que
tem uma carga negativa quando comparado com os átomos de silício da rede (Fig.8.6).
Os dadores acima referidos têm 2 estados de carga possíveis. Um nível aceitador é neu-
tro quando ocupado por um buraco e negativo quando ocupado por um electrão. Um
nível dador é neutro quando ocupado por um electrão e positivo quando vazio. Podemos
também considerar dadores anfotéricos, em que o dopante pode actuar quer como dador,
quer como aceitador. Por exemplo, se introduzirmos Si em GaAs, se o silício substituir
um átomo de Ga, actua como dador (4 electrões de valência substituem 3), se substituir
um átomo de As, actua como aceitador (4 electrões de valência substituem 5). Dopantes
anfotéricos têm 3 estados de carga possíveis (correspondendo à ocupação por 0, 1 ou 2
electrões) e dão origem a dois estados no hiato do semicondutor.
340
SEMICONDUTORES
E
"buraco" Banda de condução
Si Si + Ec
B-
EF
EA níveis aceitadores
Si Si Ev
Banda de valência
A presença de dopantes num cristal pode ser interpretada como uma perturbação na rede
cristalina, e consequentemente na estrutura de bandas.
Se U (r) não variar muito rapidamente, não necessitamos de misturar muitos estados, isto
é, muitos k. Neste caso, podemos ainda escrever E(k) = ~2 k 2 /2m∗ . Se a perturbação for
suficientemente fraca para só misturar estados de uma só banda, obtemos uma equação
para a função envelope, F (r).
~2 e2
− ∗ ∇2 − F (r) = (En − E0 ) F (r) (8.23)
2m 4πε r
341
SEMICONDUTORES DOPADOS
m∗ 1
EI = × 13.6 eV (8.25)
m κ2
A função de onda envelope para o estado fundamental, n = 1, será
1 ∗
F (r) = p ∗
e−r/a0 (8.26)
π a0 3
2
Nestas equações, a0 = 4πε 0~
m e2 é o raio de Bohr e m a massa do electrão livre. Para o
silício, com constante dieléctrica κ ≈ 10 e m∗ ≈ 0.1, vem que a∗0 ≈ 50 Å, e EI ≈ 25 meV.
A figura 8.7 ilustra os níveis hidrogenóides para um dador, cujos estados são largamente
feitos de funções de onda da banda de condução. A teoria da massa efectiva exige um
potencial de longo alcance para o dopante. Se o potencial for de muito curto alcance, é
necessario misturar k0 s de toda a zona de Brillouin, e de várias bandas, se for um nível
profundo. Note-se que um procediemnto semelhante foi utilizado no capítulo 5, para os
excitões de Wannier.
Para o cálculo da número médio de electrões, hni, que ocupam um dado nível dador
em função da posição do nível de Fermi, µ, vamos usar a "grande função de partição"
indicada a seguir (equivalentemente, para o cálculo do número médio de buracos que
ocupam um dado nível aceitador, hpi):
−(Ej −µNj )/kB T
P
j Nj e
hni = P −(E −µN )/k T (8.27)
je
j j B
342
SEMICONDUTORES
E
Ec
E4
EI E3
E2
E1
k x
E (D) µ≈EF
I
Ev
ocupado tem energia infinita (devido à repulsão coulombiana), de modo que apenas
necessitamos de calcular o somatório sobre os três estados restantes. Por convenção, o
dador ionizado tem energia zero, e, quando coloco um electrão, este tem energia ED .
Vem então
2 e−(ED −µ)/kB T 1
hni = −(E −µ)/k T
= 1 −(E −µ)/k T (8.28)
1 + 2e D B
2 e
D B +1
obtemos, finalmente, para a densidade de electrões nD devidos ao número de dadores
por uniadde de volume (densidade de dadores), ND
ND ND
hnD i = 1 −(ED −µ)/kB T = 1 −(ED −µ)/kB T (8.29)
2e +1 ge +1
Num semicondutor de hiato indirecto, deveria ter tido em conta que os electrões poderiam
ocupar qualquer dos vales, e g = 2 × #vales. No entanto, a degenerescência é levantada
pelo campo cristalino e a fórmula acima pode ser utilizada com g = 2.
343
SEMICONDUTORES DOPADOS
Ec
E I (A)
µ≈EF
E
A
o - + E
A A A v
e
NA
hpA i = NA hpi = 1 −(µ−E
e A )/kB T +1
g
Consideremos a densidade de estados dum semicondutor extrínseco (em que foram in-
troduzidas densidades ND e NA de dadores e aceitadores, respectivamente) indicada na
figura 8.10. O cálculo da densidade de electrões e buracos pode ser feito resolvendo o
344
SEMICONDUTORES
banda de NA ND banda de
D(E) valência condução
E
Ev Ec
EA ED
E I (A) E I (D)
345
SEMICONDUTORES DOPADOS
Os electrões, neste caso, são apelidados portadores maioritários, enquanto que os buracos
são os portadores minoritários. EF pode ser obtido através da condição:
n = ND = Nc (T ) e−(Ec −EF )/kB T
(8.35)
Nc
EF = Ec − kB T ln
ND
A baixas temperaturas, a equação acima mostra que, quando kB T tende para zero, EF
aproxima-se de EC . Se EF ≈ ED não podemos assumir que todos os dopantes estão
ionizados. É então necessário olhar para a estatística de ocupação dos dopantes para ver
como é que o n depende de T . Podemos escrever a condição de neutralidade da carga,
nc − pv = ND − nd − (NA − pa ) (8.36)
em que nc e pv são as densidades dos electrões e buracos livres, respectivamente, Nd
e Na são as densidades totais de dadores e aceitadores, respectivamente, e nd e pa são
as densidades de electrões e buracos nos estados dadores e aceitadores, respectivamente.
Para um material tipo n, pv e pa podem ser desprezados na equação acima, e obtemos
nc ≈ ND − nd − NA
ND (8.37)
nc = Nc e−(Ec −µ)/kB T ≈ ND − NA − 1 (ED −µ)/kB T
2 e +1
Para temperaturas moderadamente baixas, obtém-se
r
Nc (ND − NA ) −(Ec −ED )/2kB T
nc = e (8.38)
2
+
A equação acima resulta da condição de n ≈ ND . Neste caso, a maior parte dos dopantes
está neutra e EF > ED . A 0 K, na ausência de aceitadores, o nível de Fermi deveria
situar-se a meio caminho entre ED e EC . Na prática, isto nunca acontece, uma vez
que existem sempre pequenas concentrações (dopantes) de carácter aceitador, nas quais
electrões dos dadores podem cair. Neste caso, o nível de Fermi converge para ED . Para
temperaturas muito baixas (e na presença de alguns aceitadores), obtém-se, utilizando a
+
condição ND ≈ NA :
Nc (ND − NA ) −(Ec −ED )/kB T
nc = e (8.39)
2NA
A figura 8.11 mostra a dependência da densidade de electrões e a variação da posição do
nível de Fermi com a temperatura de acordo com a discussão anterior.
Pode ocorrer (e é, de facto, muito frequente) que um semicondutor não seja dopado
com um só tipo de dopante, mas com dois, e opostos. No caso, por exemplo com boro e
346
SEMICONDUTORES
a)
n -E g /kT b)
EF
Ec
ND
-(E c -E D )/2kT ED
1/T 1/T
nc + NA− = pv + ND +
(8.40)
em que NA− e ND+
são, respectivamente,lnasTdensidades de dadores e aceitadores ionizados.
Se assumirmos que a condição de ionização completa é verificada, então podemos escrever:
NA− = NA +
ND = ND
1
q
nc = (ND − NA + (ND − NA )2 + 4 n2i ) (material tipo-n) (8.41)
2
ni 2
pv =
nc
Se assumirmos que um dopante domina, isto é, se
(ND − NA ) ni (material tipo-n) : nc ≈ (ND − NA )
(8.42)
(NA − ND ) ni (material tipo-p) : pv ≈ (NA − ND )
347
SEMICONDUTORES DOPADOS
E − Ec µ − Ec
η= ηF = (8.44)
kB T kB T
obtemos
" 3/2 # Z ∞
2 1 2 m∗c kB T η 1/2 dη 2
nc = 2 (η−η )
= Nc (T ) F1/2 (η) (8.45)
π 4 π~ 0 1+e F π
o integral F1/2 (ηF ) pertence à família dos integrais de Fermi, que são do tipo
∞
ηp
Z
Fp (ηF ) = dη (8.46)
0 1 + e(η−ηF )
σ = nc e µn + pv e µp
348
SEMICONDUTORES
v µn
d µp
v sat 10 7 cm/s
10 3 V/cm E
uma vez que neste vale residem 1/6 dos electrões da banda de condução. De modo
análogo, para os restantes 5 vales. Somando as seis contribuições, resulta:
2 1 1 2
J = ne τ + E
3 mL mT
(8.49)
1 1 1 2
= +
m∗c 3 mL mT
Para outros arranjos de vales, procede-se de modo análogo. No caso do germânio, por
exemplo, teríamos de considerar os vales nas direcções [111]. No caso dos buracos, temos
de ter em conta que, junto a k=0, as bandas de valência para os buracos leves e pesados
são degeneradas. Neste caso, temos de tomar em conta a fracção de electrões na banda
dos buracos pesados e na dos buracos leves. Se considerarmos como factor de ponderação
a densidade de estados, vem
3/2
D(E) ∝ (m∗ ) : phh ∝ m∗hh 3/2 , plh ∝ m∗lh 3/2 (8.50)
349
SEMICONDUTORES DOPADOS
ln µ
3/2 T -3/2
T colisões com fonões
acústicos
colisões com
impurezas ionizadas
T -5/2
colisões com fonões
ópticos
ln T
________________________________________________
350
SEMICONDUTORES
E p n p n
E
B. condução B. condução B. condução
Ec Ec
EF B. condução ∆E = eVο
EF
EF
Ev Ev
B. valência B. valência B. valência
B. valência
30 nm
zona de deplexão
E p n E p n
Ec Ec
∆E = eVο eVο
eV1
eV1
Ev Ev
351
DISPOSITIVOS ELECTRÓNICOS DE SEMICONDUTORES
V(t) V(t)
n p
t t
Chama-se caracteristica do díodo à curva I(V ) que tem a forma que se mostar na Fig.4.17.
O TRANSÍSTOR
352
SEMICONDUTORES
JΕ JC
p n p
input ouput
+- +-
"forward bias" promove o fluxo de cargas. A região emissora está mais fortemente dopada
do que a base e tem portanto uma condutividade maior. A junção do colector tem uma
"reverse bias". A base é muito fina, de modo que a maioria dos buracos pode difundir
através dela sem se recombinar com os electrões. Os "buracos" que atingem o colector
fluem facilmente através dele sob as condições de "negative bias" em Jc . É assim possível
injectar uma corrente de "buracos" do emissor e ter 90% ou mais deles que fluem através
do colector. Neste exemplo, transístor p-n-p, o emissor e o colector são do tipo p, pelo
que a corrente transportada é predominantemente uma corrente de "buracos". É, no
entanto, possível ter transístores n-p-n nos quais a situação é invertida.
O transístor foi descoberto em 1948 por Bardeen, Brattain e Schockley nos Laboratórios
da "Bell Telephone" e deu origem à era da electrónica e da informática. No estado actual
da indústria electrónica, o material de base é fundamentalmente o silício, obtido sob a
forma de monocristais com um nível de dopantes inferior a 1 ppm (parte por milhão).
Esses monocristais são cortados em bolachas, "wafers", com espessuras da ordem de 100
µm sobre as quais são implantados ou "integrados" os circuitos, utilizando processos
fotolitográficos extremanente sofisticados. As "wafers" são então cortadas em "chips",
cada um dos quais pode conter mais de um milhão de transistores. Embora o silício vá
provavelmente continuar a ser o material base da indústria electrónica, por muitos anos,
outros materiais começam a ser utilizados em componentes especiais, nomeadamente os
semicondutores III-V ou II-VI (e.g. GaAs, CdS, etc.) especialmente para electrónica
rápida e optoelectrónica.
353
Página 354 (propositadamente em branco).
9.1 INTRODUÇÃO
As ondas electromagnéticas são soluções das equações de Maxwell, que num meio material
e polarizável têm a forma (no sistema SI) (ver Apêndice).
D = εE = ε0 E + P = ε0 (1 + χ)E; P = ε0 χE ; χ = Nα
(9.2)
B = µH = µ0 (H + M)
em que
357
FOTÕES. PERSPECTIVA MACROSCÓPICA
1 Recorda-se que para o quadrado de um número complexo z = a+i b podem considerar-se duas situações:
i) z 2 = (a + i b)2 = (a + i b)(a + i b) = a2 − b2 + i 2ab
ii) |z|2 = (a + i b)(a − i b) = a2 + b2 . Também se chama a atenção para o facto de que é comum (e
indiferente) usar para a permitividade (e constante dieléctrica) complexa o complexo conjugado, ou seja
σ
εcomplexo = ε + i ω .
358
PROPRIEDADES ÓPTICAS
A partir daqui deduz-se directamente a solução para uma onda plana monocromática
359
FOTÕES. PERSPECTIVA MACROSCÓPICA
2ωk
K= (9.7)
c
e R é o coeficiente de reflexão
(n − 1)2 + k 2
R= (9.8)
(n + 1)2 + k 2
Note-se que para chegar a estas expressões é necessário considerar que a intensidade da
luz é dada pelo quadrado da amplitude I = |E|2 . Para uma onda que se propaga segundo
z e incide perpendicularmente sobre a superfície do sólido temos
|ET |2 |ER |2
K= ; R=
|EI |2 |EI |2
Luz reflectida EI x
Luz transmitida κI
z y
E z
BI
ER
−κI BR
Luz incidente
z=0
Vácuo Sólido
Atendendo a (9.4), podemos considerar que a onda incidente tem um vector de onda
κI = ω/c e que a onda transmitida tem um vector de onda κT = NκI = (n + i k)κI .
360
PROPRIEDADES ÓPTICAS
κI κI κT
EI − ER = ET ; κT = NκI = (n + i k)κI (9.10)
ω ω ω
Multiplicando por ω/ε0 ,
κI EI − κI ER = κT ET
Usando a equação 9.9 para eliminar ET obtém-se
(κI − κT )EI = (κI + κT )ER
ER κI − κT κI − (n + i k)κI 1 − (n + i k) 1−N
= = = =
EI κI + κT κI + (n + i k)κI 1 + (n + i k) 1+N
Donde se pode concluir que
|ER |2 |1 − N|2
R= = =
|EI |2 |1 + N|2
|1 − (n + i k)|2
= =
|1 + (n + i k)|2
|(n − 1) + i k|2
= =
|(n + 1) + i k|2
(n − 1)2 + k 2
=
(n + 1)2 + k 2
Vê-se, assim, que medições independentes dos coeficientes de absorção e reflexão são
suficientes para fixar os valores de n e de k (de notar que os coeficientes n e k não são
completamente independentes, estando ligados pelas relações de dispersão de Kramers-
Kronig.
Vamos supor um sistema sujeito a um campo eléctrico, E, o qual actua sobre os momentos
dipolares das moléculas, µ, gerando uma energia da forma −(E.µ). O hamiltoniano da
361
DISPERSÃO E ABSORÇÃO. PERSPECTIVA MICROSCÓPICA
λH 0 = −(E.µ) (9.11)
O cálculo da interacção do campo com o sistema (moléculas) pode ser seguido, para
maior simplicidade, através das componentes em x da interacção. No final, podemos
adicionar as componentes em y e em z. Façamos
1 0 iωt
E = Ex = Ex0 cos ωt = E (e + e−iωt ) (9.12)
2 x
0
Podemos então usar λHmn = −hm|Ex µx |ni = −Ex0 hm|µx |ni(eiωt + e−iωt ) e obter
dcm i h i
= + Ex0 hm|µx |ni ei(ωmn −ω)t + ei(ωmn +ω)t (9.13)
dt 2~
em que hm|µx |ni é a componente em x do momento de transição. É importante notar
que hm|µ|ni depende da molécula e é uma observável. Integrando (9.13) em t, obtém-se2
i(ωmn −ω)t
− 1 ei(ωmn +ω)t + 1
i 0 e
cm (t) = + Ex hm|µx |ni + (9.14)
2~ ωmn − ω ωmn + ω
2 eax
eax dx =
R
a
362
PROPRIEDADES ÓPTICAS
No caso da absorção, vemos facilmente que é o primeiro termo dentro do parêntesis recto
que é relevante. De facto, quando a frequência da radiação incidente ω se aproxima da
frequência da transição ω = ωmn , esse termo cresce, dando um valor grande, embora não
infinito3 , para ω = ωmn . Nestas condições o coeficiente cm adquire valores significativos
e a probabilidade da transição, isto é, de atingir o estado final, é grande — a transição
ocorre com uma probabilidade |cm (t)|2 .
Por outro lado, se o sistema estiver num estado excitado, pode transitar para um estado
de menor energia, com emissão de radiação (um fotão). A emissão pode ser espontânea,
se o sistema se encontrar num estado excitado ou induzida se o sistema for previamente
excitado, mediante a acção de uma radiação incidente. Vejamos estes processos em
E
o
Em ψ om(q)
!
hν o
Emissão Ψ(q,t) =∑ ! cn(t) ψ n(q)
Absorção Emissão n
induzida
induzida espontanea
Eon o
ψn(q)
maior detalhe. Comecemos pela absorção induzida. Analisemos em primeiro lugar qual
a relação de Ex0 (amplitude do campo) com a intensidade da radiação.
x Campo
eléctrico
y Campo
magnético
3 lim eita −1
a→0 a
= it
363
DISPERSÃO E ABSORÇÃO. PERSPECTIVA MICROSCÓPICA
1 c 2 1 1 2
hSi = |S| = Ex0 (cgs); hSi = |S| = cε0 Ex0 (SI) (9.15)
2 8π 2 2
Se considerarmos uma secção de área A, perpendicular à direcção de propagação, a ener-
c
2 2
gia que passa por essa secção durante o tempo t, será 8π Ex0 At (cgs) ou 12 cε0 Ex0 At
(SI). Durante esse tempo, o feixe percorreu a distância ` = ct, e a energia que passou
através de A espalha-se pelo volume A` = Act. Então a densidade de radiação ρx , defi-
nida como a energia da radiação electromagnética por unidade de volume é (para uma
radiação polarizada segundo x)
1 2 1 2
ρx = Ex0 cgs; ρx = ε0 Ex0 SI (9.16)
8π 2
Para calcular a probabilidade da transição, que é |cm (t)|2 podemos usar a expressão
2
(9.14) e nela substituir Ex0 em função de ρx . Note-se que |eiθ − 1|2 = 4 sen 2 21 θ. Vem:
21
1 0 2 2 sen 2 (ωmn − ω) t
|cm (t)|2 = c∗m (t).cm (t) =
Ex |hm|µx |ni| 2 (9.17)
~2 (ωmn − ω)
2
Substituindo Ex0 (expressão 9.16 (4.24)) em função de ρx , vem, no sistema SI5 , fazendo
hm|µx |ni = µxmn :
21
2 2 sen 2 (ωmn − ω) t
|cm (t)|2 = |µxmn | 2 ρx (ω) (9.18)
ε 0 ~2 (ωmn − ω)
Até aqui considerámos que a radiação era monocromática (9.18-eq. 4.20). No entanto, as
experiências de espectroscopia são, em geral, feitas numa banda relativamente larga de
frequências, salvo se se utilizar um laser, sendo nesse caso a banda de frequências bastante
estreita. Se considerarmos que a energia electromagnética por unidade de volume com
4 De facto, no sistema SI as unidades são [|H|] =[A m−1 ] e [|E|] =[V m−1 ]. Para converter nas mesmas
unidades é preciso fazer |H| = cε0 |E|: [A m−1 ]=[m s−1 C V−1 m−1 V m−1] = [C s−1 m−1 ]. Ver
apêndice sobre unidades.
5 Note-se que (9.18 — 4.26) está no sistema SI. Para converter para o sistema cgs, (Gauss) basta multi-
plicar por 4πε0 . Note-se também que, no sistema SI, ρx (ω) vem em [J m−3 ] o que é natural, visto ser
uma densidade de energia. O momento dipolar, µ, vem em [C m], no SI, embora seja usual os químicos
usarem como unidade de momento dipolar, o debye, sendo 1 D = 3.34 × 10−30 C m.
364
PROPRIEDADES ÓPTICAS
A integranda só tem valores significativos para ν ≈ νmn . Podemos então substituir ux (ν)
por ux (νmn ). Podemos ainda estender o integral de −∞ a +∞; e uma vez que a radiação
é isotrópica, ux (νmn ) = uy (νmn ) = uz (νmn ) = (1/3)u(νmn ). Podemos finalmente obter6
2π
|cm (t)|2 = |µmn |2 u(νmn )t (9.20)
3~2 (4πε 0)
d |cm (t)|2 2π
= 2 |µmn |2 u(νmn ) = Bmn u(νmn ) SI (9.21)
dt 3~ (4πε0 )
com
1 2 2
|µ ||µmn | =
3 mn
uma vez que para um sistema isotrópico, podemos tomar o valor médio do quadrado do
módulo do momento dipolar
2 2 2 2 2 2
|hn|µ|mi| = |hn|µx |mi| + |hn|µy |mi| + |hn|µz |mi| = 3 |hn|µ|mi| = 3 |µmn |
2π 2π
Bmn = |µ |2 cgs; Bmn = |µ |2 SI (9.22)
3~2 mn 3~2 (4πε0 ) mn
Absorção:
dNm
= Nn Bmn u(νmn ) (9.23)
dt
6
R +∞ sen 2 (pθ)
−∞ θ2
dθ = πp; p = πt.
365
DISPERSÃO E ABSORÇÃO. PERSPECTIVA MICROSCÓPICA
Atendendo a que Nm /Nn = e−hνmn /kB T e fazendo Bnm = Bmn , podemos escrever
Anm 1
u(νmn ) =
Bnm ehνmn /kB T − 1
Para que esta expressão seja consistente com a conhecida lei da densidade da radiação
de Planck7
8πhν 3 1
u(ν) = 3 hν /k
c e mn BT − 1
Anm ν 3
mn
= 8πh
Bmn c
vindo para Anm :
64π 4 νnm
3
Anm = |µmn |2 (9.25)
3hc3
O coeficiente de Einstein Bmn pode relacionar-se com a chamada, força do oscilador, f ,
pela relação
8π 3 1 1 e2
2
|µmn |2 =⇒ π f
3h 4πε0 4πε0 me
4π me νmn 2 me ωmn
fmn = 2
|µmn |2 = |µmn |2 (9.25)
3 ~e 3 ~e2
que é uma quantidade adimensional com a mesma expressão, tanto no sistema de Gauss
como no sistema SI.
7 [ρ] = [u(νmn )dν] = J m−3
366
PROPRIEDADES ÓPTICAS
If = Ii e−αC` ou If = Ii 10−εC`
Podemos fazer uma dedução quântica da força do oscilador recorrendo à regra da soma
de Thomas-Reiche-Kuhn que estipula que a soma das probabilidades de um electrão
passar do estado fundamental para todos os estados excitados m é 1, uma vez que a
energia absorvida envolve todas as transições possíveis. Assim, teremos para a regra de
Thomas-Reiche-Kuhn X
fmn = 1
m6=n
Consideremos, para simplificar um sistema a uma dimensão (x), sendo portanto a força
do oscilador
fmn = cmn |xmn |2
Aplicando a regra de Thomas-Reiche-Kuhn, vem sucessivamente
X X
fmn = 1 = cmn |xmn |2 =
m m
X
= cmn hn|x|mihm|x|ni = (9.25)
m
X1
= cmn hn|x|mihm|x|ni + hn|x|mihm|x|ni
m
2
Se agora considerarmos que para o oscilador harmónico linear a energia total (ou o
hamiltoniano) é8
p2 1
+ ω 2 mx2
2m 2
e que a energia cinética se transforma na potencial e vice-versa, podendo escrever-se
p2 = −ω 2 m2 x2
8A 1
energia cinética é p2 /2m e a energia potencial, V = 2
Kx2 , uma vez que a força de restituição é
p
F = −∇V = −Kx, sendo ω = K/m
367
DISPERSÃO E ABSORÇÃO. PERSPECTIVA MICROSCÓPICA
hm|p|ni
p = i m ωmn x ⇒ hm|p|ni = i m ωmn hm|x|ni ⇒ hm|x|ni =
i m ωmn
Podemos então escrever, recorrendo a (9.25)
X cmn
1= hm|x|nihn|p|mi − hm|p|nihn|x|mi
m
2 i m ωmn
c0
1= hm|[x, p]|ni
2im
c0 c0 ~ 2 m ωmn 2 2 m ωmn 2
1= i~hn|ni = ⇒ fmn = xmn =
mn
2im 2m ~ e2
µ
~
Temos portanto, a uma dimensão
2 m ωmn 2
fmn =
mn
~ e2
µ
368
PROPRIEDADES ÓPTICAS
Por outro lado, o modelo mais simples de um sólido é o de uma assembleia de áto-
mos neutros independentes e fixos. Interessa saber agora qual é o efeito duma onda
electromagnética neste sistema. Consideremos um caso simples em que cada átomo con-
tém apenas um electrão, no estado fundamental φ0 (r), o qual pode ser excitado para
uma orbital φj (r). Atendendo a que os átomos têm várias frequências naturais, ωj cor-
respondentes a transições com forças de oscilador fj que quando temos N átomos de
polarizabilidade α, por unidade de volume, a parte real da constante dieléctrica pode ser
escrita como
e2 X fj
εr (ω) = 1 + = 1 + χ = 1 + Nα
ε0 m j ωj2 − ω 2
(9.25)
e2 X fj
α=
ε0 m j ωj2 − ω 2
369
CONSTANTE DIELÉCTRICA
em que x0j é o elemento de matriz do momento dipolar (a menos da carga e que foi
incluída em α) do electrão na direcção do vector campo eléctrico entre os estados φ0 (r) e
φj (r). A eq.(9.4) é prototípica duma fórmula de dispersão. No caso dos electrões serem
"livres", ou seja, que todos os ωj sejam 0 e a soma dos fj seja 1, vem
ne2
ωp2 = (9.25)
ε0 m
que define a frequência de plasma para um gás de n electrões por unidade de volume,
como vimos num dos primeiros capítulos.
que é maior que a unidade. À medida que ω aumenta, εr (ω) aumenta até encontrar-
ε(ω)
ε (0)
ω1 ω 2 ω
370
PROPRIEDADES ÓPTICAS
N e2 X h 1 π i
εr (ω) = 1 + fj 2 2
+i δ(ω 2 − ωj2 ) (9.25)
ε0 m j ωj − ω 2ω
2Γ
ε
Im(ε)
Re(ε)
ωj ω
Uma última correcção à eq.(9.4) deriva do facto de que na análise acima considerámos
que o campo local que polarizava cada átomo era o mesmo que o campo macroscópico, E.
De facto, a equação P = ε0 N αE deve ser substituída por P = ε0 N αEloc , em que Eloc é
o campo visto por cada átomo9 , e que pode deduzir-se, recorrendo à lei de Gauss10 :
9 Considera-se o átomo no centro de uma esfera oca, sob a acção do campo devido aos outros átomos
10 Ver, por exemplo, Feynman Lectures on Physics II-6-6
371
CONSTANTE DIELÉCTRICA
σpol
n
ez a
θ E
Figura 9.6: Cavidade esférica num dielétrico. A posição do átomo está marcada
com um ponto.
Conclui-se que11
P 2π 2 P
Eat = =
4πε0 3 3ε0
11 1
cos2 ax sen ax dx = − 3a cos3 ax
R
372
PROPRIEDADES ÓPTICAS
Vem portanto
1
Eloc = E + P
3 ε0
(9.25)
1
E = Eloc 1 − Nα
3 ε0
Deve então escrever-se
N α ε0
P= E
1 − N3α
N αε0
donde se deduz que na equação εr = 1 + N α se deve usar 1− N3α
em vez de ε0 N α. Vem
então
Nα
εr − 1 =
1 − N3α
que leva à obtenção da relação de Clausius-Mossoti:
εr − 1 Nα
= (9.25)
εr + 2 3
Para baixas frequências (ω ω0 , αat = Zi e2 /ε0 m ω02 ). Embora esta aplicação do modelo
de Lorentz seja obviamente demasiado simplificada para descrever as transições electró-
nicas interbandas, é uma aproximação conveniente quando descrevermos a contribuição
dos movimentos atómicos para a polarizabilidade (cujas ressonâncias ocorrem a ω ω0 ).
Consideremos que aplicamos uma onda electromagnética ao nosso sólido. Como é que essa
onda interactua com as vibrações da rede? Se tomarmos o modelo simples duma cadeia
diatómica linear, uma onda electromagnética (fotão) de grande comprimento de onda
(de modo que cos κa ≈ 1, κ é o vector de onda do fotão), e se os átomos tiverem cargas
opostas, como num cristal iónico típico, temos (analogamente ao que vimos anteriormente
373
MODOS ÓPTICOS EM CRISTAIS IÓNICOS — INTERACÇÃO FOTÃO-FONÃO
para os fonões, mas adicionando a força causada pelo campo electrico da onda incidente):
∂ 2 u+
M+ = −(u+ − u− ) + e E0 e−iωt
∂t2 (9.25)
− ∂ 2 u−
M = −(u− − u+ ) − e E0 e−iωt
∂t2
P0 eU e2
αdis = = = (9.25)
ε0 E0 ε0 E 0 ε0 M (ω̄ 2 − ω 2 )
Uma vez que ω̄ é a frequência duma vibração de elevado comprimento de onda da rede
(fonão), é muito mais pequena que qualquer transição electrónica dos átomos ou iões.
A polarizabilidade total pode ser escrita como αtot = (α+ + α− ) + αdis (considerando
dois átomos por célula unitária). Introduzindo estas polarizabilidades na equação de
Clausius-Mossotti (para ω ω0 ), vem
e2
εr − 1 1
= α+ + α− + (9.25)
εr + 2 3 Vcel ε0 M (ω̄ 2 − ω 2 )
e2
εr (0) − 1 1 + −
= α +α + (9.25)
εr (0) + 2 3 Vcel ε0 M ω̄ 2
εr (∞) − 1 1
α+ + α−
= (9.25)
εr (∞) + 2 3 Vcel
εr (∞) − εr (0)
εr (ω) = εr (∞) + ω2
(9.25)
ω2
−1
T
com
εr (∞) + 2 εr (0) − εr (∞)
ωT2 = ω̄ 2 = ω̄ 2 1 − < ω̄ 2 (9.25)
εr (0) + 2 εr (0) + 2
374
PROPRIEDADES ÓPTICAS
ε(ω)
εo
ε∞
ωT ωL ω
∇.D = 0 (9.25)
∇×E=0 (9.25)
Vamos também considerar que temos um cristal de simetria cúbica de modo que εr seja
um número, e não um tensor. Neste caso, E é paralelo a D e a P e proporcional a eiq.r .
Da equação (9.5), resulta portanto que q.D = 0, ou seja, ou D = 0, ou D, E e P são
perpendiculares a q. Da equação (9.5), resulta que q × E = 0, ou seja, ou E = 0, ou
D, E e P são paralelos a q. Resultam então duas situações que não são simultaneamente
compatíveis: (i) D = 0 e D, E e P são paralelos a q, ou (ii) E = 0 e D, E e P são
perpendiculares a q.
2 εr (0) 2
ωL = ω (9.25)
εr (∞) T
Uma vez que εr > εr (∞), ωL é sempre maior que ωT . A eq.(9.5) chama-se a relação LST
(de Lyndanne, Sachs and Teller). No caso do silício, por exemplo, em que os átomos são
não iónicos, εr (0) = εr (∞) e, portanto, ωL = ωT .
375
MODOS ÓPTICOS EM CRISTAIS IÓNICOS — INTERACÇÃO FOTÃO-FONÃO
ω ck -
tipo- ω =ck(ε ∞) 1/2
fotão - 1/2
ω =ck(εo)
TO
ωL LO
tipo-fonão região
proibida
ωT
TO
tipo-fonão
tipo-fotão
k
(Note-se, finalmente, que é possível ao cristal absorver no infravermelho, e que esta inte-
racção é descrita como a interacção dum fotão com um ou mais fonões. Estes processos
foram abordados no capítulo 3 quando falámos da dispersão de Raman e de Brillouin).
376
PROPRIEDADES ÓPTICAS
e2 X fk
εr (k, ω) ≈ 1 + (9.25)
ε0 m ωk2 − ω 2
k
e2 f (ω 0 ) Nd (ω 0 ) 0
Z
εr (0, ω) ≈ 1 + dω (9.25)
ε0 m ω 02 − ω 2
em que Nd (ω 0 )dω 0 é o número de níveis que têm uma diferença de energia vertical de ~ω 0
no intervalo dω 0 e f (ω 0 ) é a força do oscilador, isto é, um número da ordem da unidade
- para as transições neste intervalo. Utilizando as relações de Kramers-Kronig, pode
calcular-se a parte imaginária da constante dieléctrica:
πe2
2 n(ω)k(ω) = f (ω) Nd (ω) (9.25)
2ε0 m
377
ABSORÇÃO PELOS PORTADORES LIVRES
a) b)
E
E
q Ec
Ec
Eg E g = hν
hνo
Ev Ev
k k
Figura 9.9: a) Transição vertical, num semicondutor. Note-se que todas as tran-
sições verticais requerem mais energia do que o hiato Eg . b) Transição indirecta
representada como uma transição vertical virtual seguida da emissão de um
fonão. q é o vector de onda do fonão emitido. [Harrison pag. 332]
Consideremos a expressão
σ
N2 = (n + i k)2 = εrL + i (9.25)
ω ε0
em que εrL é chamada a constante dieléctrica estática e o índice L significa que a sua
principal contribuição vem da rede cristalina (Lattice). Quando o sólido é um bom
condutor, podemos ignorar o εrL e obtemos imediatamente13
σ
N2 = (n + i k)2 = i
ω ε0
1/2 (9.25)
σ
N = n + ik = (1 + i)
2 ω ε0
13
√ √
i = (1/ 2)(1 + i)
378
PROPRIEDADES ÓPTICAS
(n − 1)2 + k 2 n2 − 2n + 1 + k 2 n2 + 2n + 1 + k 2 − 4n 4n
R≈ 2 2
= 2 2
= =1− 2
(n + 1) + k (n + 2n + 1 + k n2 + 2n + 1 + k 2 2n + 2n + 1
Para 2n + 1 << 2n2 , i.e., baixas frequências (e.g., no infravermelho), para as quais
n >> 1 r
2 ωε0
R≈1− =1−2
n σ
que é conhecida por relação de Hagen-Rubens. Uma consequência óbvia é que o poder
reflectivo de um sólido bom condutor se torna muito elevado.
Olhemos, primeiro para εr1 . Além do termo εrL devido à rede, temos um termo adicional
(negativo) proporcional à densidade electrónica n. εrL é a contribuição de todos os
mecanismos de polarização para além dos electrões livres.
379
Página 380 (propositadamente em branco).
Até agora, utilizámos a hipótese de que tínhamos um cristal infinito. Como resultado, o
k não podia ser imaginário. Um cristal finito permite a existência de k0 s imaginários, de
que resulta um crescimento (ou decaimento exponencial) da função de onda ao atravessar
a superfície do cristal.
semicondutor vácuo
giões: o interior do cristal x < 0, em que o potencial é nulo, V (x) = 0, para electrões
livres (modelo de Sommerfeld), ou negativo para electrões ligados, V (x) = V (x+na) < 0;
e o vácuo x > 0, onde o potencial é V (x) = V0 > 0
A equação de Schrödinger
~2 d2
− + V (x) ψ(x) = E ψ(x)
2m dx2
d2 ψ(x) 2m
= K 2 ψ(x) ; K2 = (V − E)
dx2 ~2
cujas soluções são da forma
383
ESTADOS EM SUPERFÍCIES
No exterior do cristal, ou seja, no vácuo, faz sentido haver uma solução que decaia
exponencialmente fora do cristal.
~2 k 2
E= ± |V (Gp )| (10.0)
2m
Estas soluções não são relevantes para um cristal infinito, uma vez que a densidade elec-
trónica é finita em todo o cristal, mas, se houver uma superfície plana perpendicular a
k, então poderíamos tentar uma solução do tipo acima, que cresce exponencialmente à
medida que nos aproximamos da superfície, ajustada a uma solução que decaia expo-
nencialmente fora do cristal (Fig. 10.1. É possível deste modo obter estados próprios de
superfície localizados na interface.
384
SUPERFÍCIES
Estes estados estão localizados no espaço, e podem dar origem a ligações na interface.
Numa escala de energia, os estados de superfície podem estar sobre uma banda, dando
uma densidade de estados extra para os electrões perto da interface, ou podem estar
situados no hiato, circunstância particularmente importante, resultando que à superfície
da amostra pode não haver hiato.
~2
ky2 + kz2
E(k) ≈ E0 + (10.0)
2m
sendo E0 , por exemplo, da forma (10.1).
Se (as , bs ) forem os vectores unitários (da célula primitiva) da superfície real e (ai , bi ),
os vectores unitários (da célula primitiva) da superfície ideal, os vectores de translação
são respectivamente
Ts = n as + m bs
(10.0)
Ti = n ai + m bi
sendo n e m inteiros. A relação entre a superfície real e a superfície ideal é definida
unicamente pela matriz 2 × 2, G
385
CRISTALOGRAFIA DAS SUPERFÍCIES
! !
as ai
=G (10.0)
bs bi
O determinante de G, |G| é igual à razão entre as áreas das células primitivas da rede
real e da rede ideal. Se |G| for um número inteiro, as redes estão simplesmente relacio-
nadas; se |G| for um número racional, as redes estão racionalmente relacionadas; se |G|
for um número irracional, a rede real é incomensurável relativamente à superfície ideal
(substrato).
(2x1)
p(2x2)
c(4x2)
Embora a notação matricial seja exacta, não é muito usada. Em vez dela, usa-se mais,
uma notação introduzida por Wood1 (1964) que é mais conveniente para redes comensu-
ráveis. Essa notação usa a razão entre as dimensões dos vectores unitários da rede real e
da rede ideal e o ângulo relativamente ao qual a rede real é rodada com respeito à rede
386
SUPERFÍCIES
ideal. A figura 10.2 ilustra essa notação para representar várias reconstruções possíveis
na superfície Si(001).
De um modo geral as estruturas das superfícies são obtidas por técnicas de difracção e
consequentemente através das suas redes recíprocas. Para uma superfície, a periodicidade
só existe paralelamente à superfície, de modo que a lei de conservação do momento se
aplica apenas às componentes dos vectores de onda paralelos à superfície
em que k0k e kk são paralelos às componentes dos vectores de onda incidente e difractado.
Ghk é um vector da rede recíproca expresso por
Ghk = h a∗ + k b∗ (10.0)
k 2 = k02 ou kk2 + k⊥
2 2
= k0k 2
+ k0⊥ (10.0)
Estas condições podem ser visualizadas usando a construção de Ewald como na Fig.3.19.
Em geral usam-se feixes de electrões ou raios-X nas técnicas de difracção para análise de
superfícies, nomeadamente LEED (low energy electron difraction) realizada com incidên-
cia quase normal e RHEEED (reflection high energy electron difraction) em incidência
rasante, bem como técnicas de difracção de raios-X de incidência rasante. Uma vez que
as estruturas das superfícies são derivadas indirectamente das suas representações no
espaço recíproco, há por vezes dificuldade em encontrar as verdadeiras estruturas das
superfícies. É normalmente mais fácil construir o modelo correcto da superfície que cor-
responde aos dados das técnicas de difracção recorrendo a imagens das superfícies no
espaço real obtidas por técnicas de varrimento (scanning probes), como AFM e STM.
387
RELAXAÇÃO E RECONSTRUÇÃO DAS SUPERFÍCIES
As superfícies reais não retêm a estrutura cristalina do interior. Os átomos das camadas
da superfície e da sua vizinhança são geralmente deslocados das suas posições ideais do
interior do cristal, ficando em posições que minimizem a energia. Os rearranjos dos áto-
mos implicam modificações em várias camadas junto da superfície, mas as modificações
mais acentuadas ocorrem na camada superficial. A estrutura desta camada domina a
maior parte das propriedades da superfície. A relaxação da superfície envolve apenas
deslocações de átomos que não alteram a simetria translacional da superfície (i.e., a pe-
riodicidade da superfície), como, por exemplo, deslocações colectivas de todos os átomos
na camada superficial. A reconstrução da superfície implica deslocações de átomos que
alteram a periodicidade da superfície. A relaxação da superfície não deve ser confundida
com a relaxação em defeitos (lacunas, átomos adicionais, degraus, etc.) em que a peri-
odicidade já está afectada. Uma vez que os átomos à superfície ficam com coordenação
deficiente, faltando todos os átomos no lado do vácuo, serão adicionados ou retirados
átomos da camada superficial de modo a minimizar a energia livre da superfície.
388
SUPERFÍCIES
[001]
(111) [110]
(111)
(110)
(110)
Híbrida
flutuante
(001) (001)
389
FUNÇÃO DE TRABALHO
Escala electroquímica
(potenciais de redução)
Vácuo
0 -4.5 V
Ea
W W φ 0/V
E/eV I
Ec
EF EF + -
0 H +e 1/2 H 2
Ev
Metal Semicondutor
uma vez que EF está localizado no hiato e é em geral controlado por efeitos extrínsecos
(impurezas), é mais útil por vezes definir a afinidade electrónica, Ea = Evac − Ec,f undo
(fig. 10.4).
POTENCIAL DE CONTACTO
390
SUPERFÍCIES
sólido superfície
vácuo
ρ(x)
V(x)
E(x)
Ws
Figura 10.5: Formação da camada dupla, com densidade de carga ρ(x), e conse-
quentes variações de potencial V (x) e energia E(x), onde se mostra a energia
Ws adicional para o valor da função de trabalho.
Evác (s)
E
Ws Evác (∞)
W
EF
Superfície
Figura 10.6: Nível do vácuo junto da superfície Evac (s), a função de trabalho W
e o nível do vácuo longe da superfície Evac (∞). A transição entre os dois níveis
marca a atenuação do efeito da dupla camada, que corresponde à energia Ws
adicional para o valor da função de trabalho, da figura 10.5.
391
FUNÇÃO DE TRABALHO
a) E vac
W
EF
b) W1 W2
E F1
E F1
V W2
W1
c)
Vapp = W1 - W2
e
392
SUPERFÍCIES
que as faces das duas amostras formam um condensador plano. O método da sonda de
Kelvin consiste em variar a distância entre os metais, alterando deste modo o campo
eléctrico no vácuo. A carga transferida (σ = ε0 E = ε0 V /d) é proporcional ao campo, e
por isso, podemos medir a corrente à medida que a capacitância varia (Q = CV ), com
C variável e V fixo: V = (W2 − W1 )/e). Em geral, introduz-se uma bateria no circuito
e observamos qual é o potencial necessário para anular a corrente (fig. 10.7(c)). Obtém-
se assim W do metal a estudar relativamente a um metal que se escolhe com W bem
conhecida.
EMISSÃO TERMIÓNICA
Neste caso, a ideia do método é que podemos "evaporar" os electrões para fora do me-
tal, por aquecimento. Podemos colocar o metal numa caixa e determinar a densidade
de equilíbrio de electrões à volta dele (vêr "inset" da Fig.10.9). Para obter uma cor-
rente, adicionamos as componentes da velocidade que se afastam da superfície. Podemos
calcular a distribuição dentro do metal:
hν
eφ eφ
EF EF
1 1
fin (k) = =
exp [(En (k) − EF ) /kB T ] + 1 exp [En (k)/kB T ] + 1
e fora do metal, En (k) deve ser tomado com a forma correspondente à da partícula livre
~2 k 2
1 1
fout (k) = = ~2 k 2
≈ exp − W + /kB T
exp [En (k)/kB T ] + 1 exp W + 2m /kB T + 1 2m
(10.0)
393
FUNÇÃO DE TRABALHO
W
EF
tomar E=0 em EF
j
ln
T2 W
1
T
EMISSÃO FOTOELÉCTRICA
A ideia subjacente a este método é a de fazer incidir sobre o metal (ou semicondutor)
um feixe de luz (e.g., ultravioleta), (figs. 10.10. Se hν = ~ω > W , podemos extrair um
electrão.
394
SUPERFÍCIES
hn (Fotão) Electrão
T
Metal
0 no =W/h n
a) b)
Figura 10.10: Efeito fotoeléctrico. a) Um raio de luz (hν) incide sobre a superfície
de um metal. Parte da energia é absorvida no metal e a restante é usada para
arrancar um electrão com energia cinética T . b) A energia cinética do electrão
ejectado T = 21 v 2 , varia com a frequência da luz incidente.
título de exemplo, refere-se um artigo recente, de D. Vouagner et al3 , em que foi usada
a técnica de Fowler combinada com impulsos ultracurtos de laser para medir a função
de trabalho de várias superfícies metálicas. Esta técnica, embora com menor resolução
do que a da sonda de Kelvin, dá uma medida directa da função de trabalho, e é mais
fiável, sendo também mais barata do que as técnicas de espectroscopia do fotoelectrão
no ultarvioleta, de onde também se podem retirar as funções de trabalho.
4πmk 2 T 2
NB = 3
φ(x)
h −2x
e−3x
1 2 π e hν − hν0
φ(x) = x + − + − . . . para x = ≥0
2 6 22 32 kB T
2x
e3x
e hν − hν0
φ(x) = ex − 2
+ 2 − ... para x = ≤0
2 3 kB T
395
FUNÇÃO DE TRABALHO
A expressão final é
4πme2
Sω = αA T 2 φ(x); com A =
h3
A é a constante de Richardson a T = 0,
Sω = 0 para x ≤ 0
1 αA 2
Sω = (hν − hν0 ) para x ≥ 0
2 k2
Numa primeira aproximação, pode ter-se uma boa estimativa da função de trabalho a
partir da relação
Sω1/2 ∝ (hν − hν0 ) (10.0)
O método de Fowler consiste em fazer um gráfico da equação 10.4.1 em escala logarítmica
Sω
log = B + F (x)
T2
em que B = log αA e F (x) = log φ(x) é a função de Fowler e B é uma constante
independente da frequência e da temperatura.
396
A
APÊNDICE A. TEORIA DOS GRUPOS DE SIMETRIA
Página 398 (propositadamente em branco).
HΨ = EΨ
Se duas ou mais partículas são trocadas por aplicação de uma operação de simetria sobre o
sistema, o hamiltoniano deve permanecer invariante. Uma operação de simetria conduz
o sistema a uma configuração equivalente, por definição, indiscernível da configuração
original. É claro que a energia do sistema tem de ser a mesma antes e depois de efectuar
a operação de simetria. Isto é, os operadores H e R comutam:
RH = HR
Esta equação implica que tanto faz medir a energia do sistema antes ou depois de aplicar
a operação de simetria R.
Note-se que em mecânica, que é uma álgebra linear com operadores, os operadores actuam
sobre qualquer coisa, e quando se escreve RH = HR, está implícita a equação RHΨ =
HRΨ. E RHΨ deve ser entendida como R(HΨ) que significa que se efectua primeiro a
operação HΨ e em seguida a operação R sobre o resultado.
Um grupo é um conjunto não vazio de elementos A, B, C... em que pode ser definida
uma operação que associa um terceiro elemento a um par ordenado. Essa operação tem
de satisfazer os seguintes postulados:
399
POSTULADOS DA TEORIA DE GRUPOS
A.E = A E = A, (E ∈ G)
A A−1 = E, (A−1 ∈ G)
A (BC) = (AB)C
Exemplos
B = X A X −1 ou A = X −1 B X, X∈G
400
APÊNDICE A. TEORIA DOS GRUPOS DE SIMETRIA
Um conjunto completo de elementos que são conjugados uns dos outros constitui uma
classe do grupo. Para saber quais os elementos pertencentes à classe de um determinado
elemento A é suficiente determinar todos os produtos da forma B = X A X −1 usando
todos os elementos, X, do grupo.
Para a física e para a química é importante fazer uso do facto que as operações de simetria
de um qualquer sistema constituem um grupo.
Para uma molécula, por exemplo, devemos consderar: i) Elementos de simetria: pontos,
rectas e planos relativamente aos quais se podem realizar operações de simetria. ii)
Operações de simetria: rotações, reflexões, inversão, etc.
401
POSTULADOS DA TEORIA DE GRUPOS
Começar
(passo 2)
Sem eixos de rotação:
C 1 , C s , Ci
(passo 4) (passo 5)
Sem C2 a C n n C2 a Cn
σh n σv sem σ σh n σd sem σ
C nh C nv Cn Dnh Dnd Dn
402
APÊNDICE A. TEORIA DOS GRUPOS DE SIMETRIA
σv
x
H
(A) σ’’
v
N σ’v
H N y
(C)
H (z)
(A)
H
(B) H H
(B) (C)
C3
de eixos (x, y, z) em que se considera a origem como o centro do triângulo definido pelos
pontos A, B, C; o eixo z perpendicular a esse plano e passando por N; o eixo x, passando
por exemplo por A e o eixo y perpendicular a x.
403
TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES
Poderia desde já verificar-se que as operaçoes C3 e C32 são conjugadas e formam uma
classe—a classe C3
Poderíamos ter escolhido outra base, como por exemplo a base de elementos (N, A, B, C)
e a matriz que permuta esses elementos quando aplicadas as operações de simetria. Notar
que só o N fica na mesma quando aplicada qualquer operação de simetria. Para as outras
operações de simetria, verifica-se que os elementos (A, B, C) permutam ciclicamente.
Teremos Para C3 , por exemplo:
N 1 0 0 0 N N
A
= 0 0 1 0 A = B
C3
B 0 0 0 1 B C
C 0 1 0 0 C A
etc.
404
APÊNDICE A. TEORIA DOS GRUPOS DE SIMETRIA
das bases. Verifica-se, porém, que, todas as representações de um dado grupo de simetria
(para as operações de simetria de objectos no espaço a três dimensões) se reduzem a um
conjunto finito de representações, de dimensão menor ou quando muito igual a três, e
cujo número é igual ao número de classes. Para tal basta verificar que o conjunto dessas
matrizes se podem dividir em blocos, de submatrizes com estrutura homóloga.
No caso das matrizes do grupo das permutações também poderia verificar-se que essa
representação de dimensão 4 se reduz a outras de menor dimensão, nomeadamente de
dimensão 1 e de dimensão 2.
Curioso é que os traços ou caracteres (que são as somas dos elementos diagonais) das ma-
trizes das representações, nomeadamente das representações irredutíveis são suficientes
para a maior parte das aplicações da teoria de grupos na física e na química.
Os caracteres das representações dos vários grupos de simetria pontual estão tabelados.
A tabela do grupo C3v é um exemplo de uma tabela de caracteres. Nessa tabela podemos
405
NOTAÇÕES
No campo central (colunas 2, 3 e 4) estão os caracteres das matrizes das várias represen-
tações irredutíveis.
Toda esta informação sobre as representações irredutíveis a que pertencem estas bases,
como funções, ou orbitais atómicas, é de grande utilidade na química, em particular na
espectroscopia e na teoria do campo de ligandos, especialmente na química dos metais
de transição.
A.4 NOTAÇÕES
E = identidade
Cn = rotação de 2π/n
406
APÊNDICE A. TEORIA DOS GRUPOS DE SIMETRIA
σh = reflexão num plano horizontal, i.e., perpendicular ao eixo de simetria (de maior
ordem)
σv = reflexão num plano vertical, i.e., contendo o eixo de simetria (de maior ordem)
Índices g (do alemão gerade, par) e u (do alemão ungerade, ímpar) têm χ(i) = 1 e
χ(i) = −1, respectivamente
Xh ih i h
Γi (R)mn Γj (R)m0 n0 = p δij δmm0 δnn0
R
`i `j
407
APLICAÇÕES DA TEORIA DE GRUPOS DE SIMETRIA EM ESPECTROSCOPIAS
Pode demonstrar-se pela teoria de grupos de simetria que um integral cuja integranda
não contenha a representação totalmente simétrica é nulo. Esse facto pode ser visto como
R +a
uma extensão da regra, fácil de verificar, de que um integral do tipo −a f (x) dx cuja
integranda é uma função impar, é nulo.
não contiver a representação totalmente simétrica. Por outras palavras, o chamado mo-
mento de transição hψf |T |ψi i tem de conter a representação totalmente simétrica para
que a transição tenha probabilidade não nula:
A.6.1 EXEMPLOS
Espectro vibracional do N H3
408
APÊNDICE A. TEORIA DOS GRUPOS DE SIMETRIA
ΓT ransl = A1 + E
ΓRot = A2 + E
Γvib = 2A1 + 2E
409
APLICAÇÕES DA TEORIA DE GRUPOS DE SIMETRIA EM ESPECTROSCOPIAS
Espectro vibracional da H2 O
410
APÊNDICE A. TEORIA DOS GRUPOS DE SIMETRIA
411
TABELAS DOS GRUPOS DE SIMETRIA PONTUAIS
412
APÊNDICE A. TEORIA DOS GRUPOS DE SIMETRIA
413
TABELAS DOS GRUPOS DE SIMETRIA PONTUAIS
414
APÊNDICE A. TEORIA DOS GRUPOS DE SIMETRIA
415
TABELAS DOS GRUPOS DE SIMETRIA PONTUAIS
416
APÊNDICE A. TEORIA DOS GRUPOS DE SIMETRIA
417
TABELAS DOS GRUPOS DE SIMETRIA PONTUAIS
418
APÊNDICE A. TEORIA DOS GRUPOS DE SIMETRIA
419
TABELAS DOS GRUPOS DE SIMETRIA PONTUAIS
420
APÊNDICE A. TEORIA DOS GRUPOS DE SIMETRIA
421
TABELAS DOS GRUPOS DE SIMETRIA PONTUAIS
422
APÊNDICE A. TEORIA DOS GRUPOS DE SIMETRIA
423
TABELAS DOS GRUPOS DE SIMETRIA PONTUAIS
424
APÊNDICE A. TEORIA DOS GRUPOS DE SIMETRIA
425
Página 426 (propositadamente em branco).
B1 ALFABETO GREGO
A α alfa N ν niu
B β beta Ξ ξ csi
Γ γ gama O o ómicron
∆ δ delta Π π pi
E épsilon P ρ ró
P
Z ζ zeta σ sigma
H η eta T τ tau
Θ θ teta Y ϑ υ úpsilon
I ι iota Φ φ fi
K κ kapa X χ qui
Λ λ lambda Ψ ψ psi
M µ miu Ω ω ómega
429
CONSTANTES UNIVERSAIS MAIS COMUNS
430
APÊNDICE B
É fácil provar a expressão de cn , multiplicando (B3) por e−ikp x e integrando entre −L/2
e +L/2:
+L/2
Z +∞
Z +L/2
Z
−ikp x
e f (x) dx = cn ei(kn −kp )x f (x)dx = Lcp δnp
−L/2 n=−∞ −L/2
Transformadas de Fourier
Consideremos agora f (x) não necessariamente periódica. Seja fL (x) uma função perió-
dica de período L igual a f (x) no intervalo [−L/2, +L/2]:
+∞
Z
f (x) = cn eikn x
n=−∞
+L/2
Z
1
cn = e−ikn x f L(x) dx (B3.-1)
L
−L/2
431
SÉRIES DE FOURIER E TRANSFORMADAS DE FOURIER
2πn 2π
Quando L → ∞, fL (x) = f (x). Se atender a que kn = L , posso fazer kn+1 − kn = L
−kn
e L1 = kn+1
2π .
Substituindo em (B3):
+∞ +L/2
kn+1 − kn
Z Z
fL (x) = e−ikn ξ f (ξ) eikn x dξ
2π
n=−∞ −L/2
Faz-se notar que k e x têm dimensões inversas, isto é, se x tem dimensões de espaço, k
tem dimensões chamadas de espaço recíproco.
432
APÊNDICE B
y = S −1 x
em que S = [sij ] é a matriz de mudança de base (matriz cujas colunas são as componentes
dos vectores da nova base em relação à base original
n
X
vj = sij ui ou v =Su
i=1
b = B y = B S −1 x = S −1 a = S −1 Ax
B = S −1 A S (B4.0)
433
SISTEMA INTERNACIONAL DE UNIDADES SI
1 Os
nomes das unidades devem ser escritos em caracteres minúsculos, mesmo que as unidades sejam em
maiúsculas.
434
APÊNDICE B
B6 EQUAÇÕES DE MAXWELL
2) ∇ × E = − ∂B
δt Lei da indução de Faraday
2) ∇ × E = − ∂B
δt Lei da indução de Faraday
D = ε0 E + P (B4.1)
B = µ0 (H + M) (B4.2)
435
EQUAÇÕES DE MAXWELL
Susceptibilidade Magnética:
M
χ= H (B4.3)
B = µ0 (1 + χ)H
B = µH com µ = µ0 µr
As equações podem ser convertidas do sistema cgs (Gauss) para o sistema mks (SI) ou
vice-versa, de acordo com a correspondência dada na Tabela seguinte:
436
APÊNDICE B
B7 REVIÃO DE ELECTROSTÁTICA
a) b) c) d)
+q -q E
E φ2 > φ1 φ1
r
∆ + --
r E=- φ
-- +
q μ
μ = qr
+ + v
Figura B7.1: a) Campo eléctrico devido a uma carga positiva. b) O campo eléctrico
é o simétrico do gradiente de potencial; uma carga positiva desloca-se na direcção do
campo eléctrico. c) O momento dipolar devido a duas cargas de módulo q de sinais
opostos, é o vector produto da carga pelo vector distância entre cargas. Note-se que
os químicos usam uma notação em sentido oposto, colocando um sinal + na origem
do vector. d) O momento dipolar num campo eléctrico orienta-se na sua direcção.
E = −∇φ (B7.0)
W = qφ (B7.0)
sendo as unidades J=C V (joule = coulomb volt) Quando duas cargas da mesma mag-
nitude mas de sinais opostos estão à distância r uma da outra gera-se um momento
437
REVIÃO DE ELECTROSTÁTICA
dipolar µ, que é o vector produto da carga q pelo vector distância entre cargas, r. No
sistema SI, o momento dipolar tem unidades [µ]=C m. No entanto, os químicos usam
frequentemente o debye, D, tal que 1 D=3.336 × 10−30 C m (coulomb metro).
438
APÊNDICE B
B8 UNIDADES ATÓMICAS
me = 1
e=1
~=1
1
k0 = =1 (ε0 = permitividade do vácuo)
4πε0
e são de particular vantagem nos cálculos computacionais, pois evitam lidar com números
muito pequenos ou muito grandes (em termos de potências de 10)
Em unidades atómicas − 12 ∇2 − 1
r ψ(x, y, z) = E ψ(x, y, z)
439
Página 440 (propositadamente em branco).