Educação Bilíngue E Geografia Nas Escolas de Surdos: Fernanda Santos Pena
Educação Bilíngue E Geografia Nas Escolas de Surdos: Fernanda Santos Pena
Educação Bilíngue E Geografia Nas Escolas de Surdos: Fernanda Santos Pena
UBERLÂNDIA
2018
2
Uberlândia/MG
INSTITUTO DE GEOGRAFIA
2018
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Sistema de Bibliotecas da UFU, MG, Brasil.
CDU: 910.1
Gerlaine Araújo Silva - CRB-6/1408
3
______________________________________________________
Profª. Drª. Adriany de Ávila Melo Sampaio (IG/UFU) – Orientadora
______________________________________________________
Prof. Dr. André Luiz Sabino (ESEBA/UFU) – Examinador
______________________________________________________
Profª. Drª. Flaviane Reis (FACED/UFU) – Examinadora
______________________________________________________
Profª. Dr. Ivanilton José de Oliveira (IESA/UFG) – Examinador
______________________________________________________
Prof. Dr. João Donizete Lima (UAE IGEO/UFCat) – Examinador
______________________________________________________
Prof. Dr. Nelson Rego (IGEO/UFRGS) – Examinador
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, por iluminar meu caminho, ser fortaleza e proteção na conquista de
meus sonhos.
À minha orientadora, Dra. Adriany de Ávila Melo Sampaio, pela sabedoria, carinho e
confiança em mim depositada para a realização deste trabalho.
Aos professores Dr. André Luiz Sabino e Dra. Lázara Cristina da Silva, pelos
apontamentos e sugestões na defesa do projeto de pesquisa e na Banca de Qualificação. À
professora Dra. Flaviane Reis, por compartilhar suas impressões e sugestões, também na
Banca de Qualificação, a partir de sua experiência surda.
Aos professores e aos pós-graduandos do Programa de Pós-Graduação do Instituto de
Geografia da Universidade Federal de Uberlândia, assim como aos da Faculdade de
Educação, pelas discussões e aprendizagens ao longo da trajetória acadêmica.
Aos amigos e professores surdos Paulo Oliveira, Lúcio Amorim, Márcia Lima,
Cristiano Ribeiro, Danilo Rischiteli e Cida Rossi, pelo acolhimento, incentivo e auxílio nos
momentos de dúvidas.
Agradeço às Escolas de Surdos pesquisadas, principalmente aos professores bilíngues
de Geografia e aos estudantes, que permitiram a realização da pesquisa ao compartilharem
suas opiniões, sentimentos e experiências.
Aos professores, intérpretes de Libras e aos meus queridos estudantes surdos da
Escola Municipal Professor Leôncio do Carmo Chaves, por tantos momentos enriquecedores
compartilhados.
Agradeço a minha família e, de forma muito carinhosa, a dedicação de minha mãe,
Cláudia, no período de construção deste trabalho, assim como durante toda a minha vida. A
meu pai, Luís Henrique, e aos meus irmãos, Ana Carolina, Renata e Silvio Luiz, pelo amor e
apoio constantes.
A João Paulo, pelo carinho, paciência, incentivo e por se dedicar à nossa felicidade.
6
Shirley Vilhalva
7
PENA, Fernanda Santos. Educação Bilíngue e Geografia nas Escolas de Surdos. 2018. 257
f. Tese (Doutorado em Geografia) – Instituto de Geografia, Programa de Pós-Graduação em
Geografia, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2018.
RESUMO
A tese apresentada se insere no debate sobre o ensino de Geografia para estudantes surdos,
considerando os pressupostos da Educação Bilíngue. Como objetivo geral, propõe-se analisar
como o ensino de Geografia está sendo realizado nas Escolas de Surdos pelo uso da pesquisa
qualitativa. Foram pesquisadas seis Escolas de Surdos, localizadas nos estados de Minas
Gerais, São Paulo, Goiás e no Distrito Federal, durante os anos de 2015 a 2017. As pesquisas
se iniciaram após a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres
Humanos (CEP), realizando-se a observação não participante; a entrevista com cinco
professores de Geografia; a aplicação de questionários com 42 estudantes surdos do 9º ano do
Ensino Fundamental; e a análise dos Projetos Político Pedagógicos das escolas pesquisadas,
de Decretos e de Leis municipais e estaduais específicas sobre a oferta da Educação Bilíngue
para surdos. Para as análises dos dados, utilizou-se a metodologia da Análise de Conteúdo. O
estudo verificou que as Escolas de Surdos possuem histórias de luta e resistência no cenário
atual, cujas políticas de inclusão defendem a matrícula dos estudantes surdos na escola
comum. A maioria das escolas pesquisadas atua na perspectiva bilíngue de ensino, adotando a
Libras como primeira língua e o português escrito como segunda língua, além de valorizar a
cultura surda e as metodologias de ensino bilíngues. Possuem professores ouvintes
proficientes em Libras, professores surdos, eventos e atividades culturais, o que desperta o
sentimento de pertencimento nos seus estudantes. Todavia, constatou-se que ainda existem
Escolas de Surdos que trabalham pautando-se no ouvintismo, pois suas práticas não
reconhecem a cultura surda e utilizam a Libras apenas como meio para se ter acesso ao
conhecimento produzido em português. Mesmo nessas escolas, os estudantes surdos se dizem
mais bem atendidos, quando comparadas às escolas comuns, pois se identificam com as
práticas pedagógicas visuais, encontram cotidianamente com seus pares e se comunicam em
Libras. Sobre os conhecimentos geográficos, a maioria dos estudantes pesquisados considerou
que a aprendizagem nas Escolas de Surdos é ótima, justificando que os professores se
comunicam e ministram aulas em Libras, além de utilizarem recursos didáticos que exploram
a visualidade, como o computador, projetor multimídia, TV, Internet, mapas, imagens, dentre
outros. Concluiu-se que o ensino de Geografia realizado na Escola Bilíngue de Surdos, com
professores de Geografia formados na área, proficientes em Libras e com conhecimentos
metodológicos para surdos, é realizado de modo satisfatório. São utilizados recursos didáticos
visuais, aliados aos conhecimentos geográficos e pedagógicos dos professores, com aulas
expositivas/dialogadas em Libras, a partir da experiência visual dos surdos. Como demandas
para a melhoria do ensino nas Escolas Bilíngues de Surdos, verificam-se a criação e a
divulgação de sinais em Libras de Geografia, assim como de materiais bilíngues desse
conteúdo, incluindo a produção do livro didático.1
1
O resumo está disponível em Libras no YouTube, no link https://youtu.be/wfUSTD95_CE.
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ABSTRACT
This work is about the teaching of Geography for deaf students, considering the
presuppositions of Bilingual Education. The objective is to analyze the teaching of Geography
in schools for deaf students using the qualitative research. We studied six schools located in
the states of Minas Gerais, São Paulo, Goiás, and the Federal District from 2015 to 2017. The
research began after the approval of the project by the Research Ethics Committee with
Human Beings, with non-participant observation. We interviewed five Geography teachers;
42 deaf students from the 9th grade of elementary school answered de questionnaires. We
analyzed Pedagogical Political Projects, Decrees, and specific municipal and state laws on the
offer of Bilingual Education for the deaf. We also used the Content Analysis methodology.
The results show that the schools for deaf students have stories of struggle and resistance,
whose inclusion policies advocate the enrollment of deaf students in the common schools.
Most of the schools work in the bilingual perspective of teaching, adopting Libras as the first
language and written Portuguese as a second language, as well as valuing deaf culture and
bilingual teaching methodologies. They have teachers who are proficient in Libras, deaf
teachers, events and cultural activities, as well as architectural adaptations, which awaken the
sense of belonging in their students. However, there are still schools for deaf people who
work based on the listener, since their practices do not recognize the deaf culture. They use
Libras only as a means to have access to the knowledge produced in Portuguese. Meanwhile
deaf students feel better in the schools for them because they identify themselves with the
visual pedagogical practices, meet their peers on a daily basis and communicate in Libras.
Regarding the geographic knowledge, most of the students considered that learning in the
schools for the death is great, justifying that teachers communicate and teach classes in
Libras, besides using didactic resources that explore visualization, such as computers, data
show, TV, Internet, maps, images, among others. We conclude that the teaching of Geography
carried out in the bilingual school for the deaf is satisfactory when they have Geography
teachers trained in the area, proficient in Libras and with methodological knowledge for those
students. Also when they use visual teaching resources, together with the teachers
geographical and pedagogical knowledge, with lectures/dialogues in Libras, based on the
visual experience of the deaf. This way the demands for the improvement of teaching in the
bilingual schools for the deaf are the creation and diffusion of signs in Libras for Geography,
as well as bilingual materials of this content, including the production of a Geography
textbook.2
2
The abstract is available in Libras on YouTube on the link https://youtu.be/wfUSTD95_CE.
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LISTA DE FIGURAS
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 1 – Faixa etária e sexo dos estudantes surdos participantes da pesquisa ............. 182
GRÁFICO 2 – Tempo de matrícula dos estudantes surdos na Escola de Surdos .................. 184
GRÁFICO 3 – Aprendizagem dos conhecimentos geográficos na Escola Comum ............... 190
GRÁFICO 4 – Materiais e recursos didáticos para o ensino de Geografia, de acordo com
os estudantes pesquisados ............................................................................... 192
GRÁFICO 5 – Aprendizagem dos conhecimentos geográficos nas Escolas de Surdos,
segundo os estudantes pesquisados ................................................................. 194
LISTA DE MAPAS
MAPA 1 – Localização das Escolas de Surdos Pesquisadas .................................................... 31
MAPA 2 – Localização da Escola para Surdos Dulce de Oliveira – Uberaba-MG ................. 69
MAPA 3 – Localização do Instituto Santa Inês – Belo Horizonte-MG ................................... 79
MAPA 4 – Localização da Escola Bilíngue Libras e Português-Escrito – Taguatinga-DF ..... 89
MAPA 5 – Localização do Centro Especial Elysio Campos – Goiânia-GO .......................... 100
MAPA 6 – Localização da EMEBS Helen Keller – São Paulo-SP ........................................ 108
MAPA 7 – Localização do Colégio Seli – São Paulo-SP....................................................... 121
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 – Características das escolas pesquisadas na perspectiva da Educação
Bilíngue ......................................................................................................... 129
QUADRO 2 – Dissertações sobre o ensino de Geografia para surdos ................................ 136
QUADRO 3 – Características gerais dos professores de Geografia das Escolas de Surdos 159
QUADRO 4 – Cursos de formação dos professores entrevistados ....................................... 161
QUADRO 5 – Metodologias de ensino e materiais didáticos citados pelos professores ..... 173
QUADRO 6 – Estudantes surdos participantes da pesquisa ................................................. 182
QUADRO 7 – Recursos didáticos para o ensino de Geografia nas Escolas de Surdos ........ 223
14
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...............................................................................................................16
Apresentação da Autora...................................................................................................21
Percursos Metodológicos da Pesquisa .............................................................................29
REFERÊNCIAS ............................................................................................................236
APÊNDICES .................................................................................................................246
Apêndice A - Roteiro de entrevista para professores de Geografia ..............................247
Apêndice B - Questionário de pesquisa para estudantes surdos ....................................249
Apêndice C - Documentos exigidos pelo CEP ..............................................................250
16
INTRODUÇÃO
3
Línguas de Sinais são línguas naturais que utilizam o canal visuo-manual, criadas por comunidades surdas
através de gerações. Essas línguas, sendo diferentes em cada comunidade, têm estruturas gramaticais próprias,
independentes das línguas orais dos países em que são utilizadas. (GOLDFELD, 2002).
4
Neste trabalho, refere-se à Escola de Surdos como todas aquelas que atendem os estudantes surdos, utilizando a
Libras como primeira língua e a Língua Portuguesa como segunda língua. Considera-se Escola Bilíngue de
Surdos ou Escola Bilíngue aquela que atende o seu alunado na perspectiva da Educação Bilíngue para Surdos,
analisada no Capítulo II.
18
5
Em 2011, a então diretora de Políticas Educacionais do MEC, Martinha Claret, comunicou que o serviço de
Ensino Básico do Instituto Nacional dos Surdos (INES) fecharia até o final do ano. O Movimento Surdo ganhou
notoriedade, pois organizou uma grande manifestação nacional, realizada em Brasília nos dias 19 e 20 de maio
de 2011, em defesa das Escolas Bilíngues para Surdos. O INES não fechou, entretanto, ainda ocorrem
fechamentos de classes e escolas, como foi o caso da Escola para Surdos Dulce de Oliveira, que teve suas turmas
de 6º ao 9º ano fechadas no ano de 2016.
20
apenas a inclusão de estudantes com deficiência, mas a de todos os alunos, por meio,
principalmente, da observação, intervenção e elaboração de relatórios individuais.
Apenas com as observações e visitas eu não compreendia, ao certo, como acontecia a
inclusão dos estudantes surdos e os seus desafios. Começava a perceber como funcionava a
inclusão, mas apenas quando me tornei professora, alguns anos depois, pude sentir as
diferentes demandas para esse processo.
Para que os resultados do projeto de pesquisa fossem divulgados para os graduandos
em Geografia, realizei mini-cursos na UFU sobre a Educação Inclusiva para estudantes surdos
na perspectiva do ensino de Geografia. Acredito que eles contribuíram positivamente para a
formação docente dos graduandos, pois, até o momento, pouco se discutia no Ensino Superior
sobre a inclusão dos estudantes com deficiência.
Com o término da Licenciatura em Geografia, em 2008, iniciei o Curso de
Especialização em Educação Inclusiva, oferecido pela Faculdade Católica de Uberlândia. O
curso foi de grande valia para a ampliação dos conhecimentos sobre Educação Especial,
metodologias inclusivas e materiais didáticos adaptados, direcionados para as mais diversas
necessidades educacionais especiais que o estudante possa contemplar e, dentre elas, a surdez.
Ainda durante a especialização, comecei minha participação em cursos a distância, na
função de tutora, sendo esses direcionados para a formação continuada de professores para
atuação no Atendimento Educacional Especializado. Os cursos eram oferecidos pelo
Ministério da Educação (MEC), com o apoio da Universidade Aberta do Brasil (UAB), e
realizados pelo CEPAE / UFU.
Todas as dez edições do curso em que fui tutora, nos anos de 2009 a 2015,
propiciaram-me conhecer professores de todo o Brasil que atuavam ou possuíam interesse em
atuar no AEE. Foram lidos muitos textos, assistidas palestras dos professores formadores
(responsáveis pela produção do material) e realizados debates nos Fóruns de Discussão do
curso, ocorrendo inúmeras trocas de experiências profissionais sobre Educação Especial e
Atendimento Educacional Especializado, principalmente para os estudantes surdos.
Em 2010, já havia concluído o curso de Geografia na modalidade Licenciatura, mas
também optei por finalizar o Bacharelado. Defendi a monografia “Escolarização de pessoas
surdas no contexto do ensino e aprendizagem de Geografia” (PENA, 2010), a qual concluiu
que, para que as necessidades educacionais dos estudantes surdos sejam contempladas, deve-
se ter como referência concepções de surdez que valorizem suas potencialidades e sua cultura,
assim como considerar a importância da Educação Bilíngue. Também verifiquei ser
necessário repensar a formação docente dos graduandos em Geografia para que a inclusão dos
24
6
Os resultados da pesquisa realizada durante o curso de mestrado são apresentados no Capítulo VI “Pesquisas e
práticas de Geografia para surdos: experiências de professores pesquisadores em diferentes contextos
educacionais”.
25
No período em que atuei nessa escola, entre os anos de 2011 a 2013, atendíamos
estudantes com deficiência visual, deficiência intelectual, deficiências múltiplas, transtorno
global do desenvolvimento e surdos. Os surdos encontravam-se todos no Ensino Médio, nos
períodos da manhã e noite, mas também, foram oferecidas vagas para o Ensino Fundamental e
Séries Iniciais. O número de intérpretes de Libras contratados foi onze, sendo que todos os
estudantes surdos foram contemplados.
No início de meu trabalho, fui convocada para participar das reuniões de módulo dos
professores com a supervisão para explicar sobre o atendimento da Sala de Recursos e
oferecer informações sobre a inclusão dos estudantes com deficiência. De modo geral, percebi
que os professores não possuíam conhecimentos sobre eles, principalmente com relação à
surdez, nem como poderiam conduzir suas aulas para incluí-los.
Durante meu trabalho, houve a possibilidade de oferecer palestras para os professores,
sobre a Educação Inclusiva. Nas mesmas, os professores foram muito participativos e
demonstraram conhecimento sobre como o processo de inclusão está sendo realizado.
Manifestaram-se acerca do excesso de legislações a respeito, mas ressaltaram a falta de
condições apropriadas, decorrentes, direta ou indiretamente, dos órgãos governamentais, tais
como: ausência de formação inicial e continuada; salários baixos; excesso de estudantes em
uma mesma sala de aula; inexistência de materiais adaptados e recursos tecnológicos
escassos; dupla jornada de trabalho e pouco tempo para pesquisa e estudos; falta de tempo
durante o horário de trabalho para dialogar com os intérpretes e professores do AEE.
Os intérpretes de Libras também se mostraram insatisfeitos, por, muitas vezes, não
terem seu trabalho reconhecido pelos professores e não serem questionados sobre seus
conhecimentos relacionados aos estudantes surdos.
Infelizmente, foram poucos os momentos disponibilizados para os encontros. As
conversas com os professores acerca da inclusão dos estudantes com necessidades
educacionais especiais ficaram restritas ao período de início e término das aulas e ao intervalo
(recreio).
Nos anos trabalhados, alguns professores tomaram a iniciativa de falar sobre os
avanços e limitações desses estudantes na sala de aula, assim como questionar sobre
metodologias e materiais didáticos diferenciados para um ensino mais significativo. Outros
professores não se demonstraram interessados, havendo, ainda, aqueles que criaram barreiras
para a inclusão escolar do estudante com deficiência, dizendo muitas vezes que: “os alunos é
que devem correr atrás do material diferenciado”; “os intérpretes é que são responsáveis pelos
alunos surdos”; “eu não fui formada para trabalhar com eles, não devem me cobrar resultados
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satisfatórios”; “eu não recebo o salário para esta função”. Era comum alguns professores
apresentarem ideias e comportamentos que sugeriam que os estudantes com deficiência eram
alunos apenas do AEE, não sendo necessário incluí-los durante as aulas comuns.
Com relação ao atendimento dos estudantes surdos no AEE, buscou-se o
aprimoramento da Língua Portuguesa escrita, assim como do raciocínio lógico-matemático,
por meio de materiais didáticos diferenciados, principalmente com o auxílio da Internet.
Comumente, os estudantes também solicitavam o auxílio em trabalhos e estudos de provas
das disciplinas do ensino comum. Para isso, era reservado um tempo das aulas.
Foi verificado que o atendimento na Sala de Recursos contribuiu para que os
estudantes surdos atendidos ficassem mais entrosados e se dedicassem mais aos estudos, pois
começaram a valorizar o entendimento da Língua Portuguesa, indispensável para a vida em
sociedade.
Em 2012 fui aprovada no concurso para professora de Geografia da Rede Municipal
de Ensino de Uberlândia, iniciando meu trabalho em uma escola de bairro periférico de
Uberlândia, a qual apresentava uma das piores posições nos indicadores educacionais do
município. Havia apenas uma estudante surda, matriculada no 2º ano do Ensino Fundamental,
com quem eu me comunicava em Libras durante os intervalos.
Minha experiência como professora de Geografia se iniciava, com entusiasmo. As
dificuldades encontradas eram muitas, principalmente na modalidade de Educação de Jovens
e Adultos, onde eram ministradas seis aulas. A comunidade do bairro sofria constantemente
com a violência, principalmente pelo tráfico de drogas. De modo geral, os familiares não se
importavam com a educação escolar e ignoravam as transformações que esta poderia
proporcionar à vida de seus filhos. Na tentativa de estimular os estudantes e despertar o seu
interesse para o conhecimento geográfico, eu buscava contextualizar os conceitos e
concepções, a partir das experiências cotidianas dos mesmos. Desenvolvi projetos
interdisciplinares, os quais, a meu ver, produziram resultados pouco significativos. Era
necessário um trabalho mais amplo, em que todos os profissionais da escola, assim como os
governantes do município, estivessem dispostos a mudar a realidade daquela comunidade.
Em 2015, surgiu a oportunidade de transferir meu cargo para uma escola em que
estavam matriculados muitos estudantes surdos, com a oferta do AEE. Inclusive, essa escola
foi uma das pesquisadas durante meu mestrado, tendo eu me identificado com as práticas nela
desenvolvidas. Assim que fui transferida, assumi aulas de Geografia no turno da manhã e
aulas no turno vespertino no AEE. A escola estava precisando desse profissional há um
tempo, mas não havia professor capacitado.
27
Como professora de Geografia, ministrei aulas para estudantes surdos na sala de aula
comum apenas durante um semestre, o que me possibilitou perceber algumas situações e
inquietações. Até o momento, eu acreditava que, por ser fluente em Libras, conseguiria
atender as necessidades daqueles estudantes, pois me comunicaria e debateria os conteúdos
geográficos de forma direta, além de conhecer metodologias de ensino e recursos didático-
pedagógicos que possibilitariam um aprendizado mais significativo para os surdos.
De fato, eu percebia que os estudantes surdos possuíam mais interesse em minhas
aulas, principalmente pela proximidade com que nos relacionávamos. As narrativas sobre o
cotidiano de suas vidas e os conteúdos geográficos eram tratados diretamente, assim como as
dúvidas e a maioria das explicações. Estas eram realizadas primeiramente na Língua
Portuguesa oral, com interpretação do intérprete de Libras, para todos os estudantes da sala.
Posteriormente, ministrava os conteúdos de forma direta, entre eu e os surdos.
Claramente, meu domínio na Libras e os meus conhecimentos acerca do ser surdo e
das práticas pedagógicas baseadas na visualização propiciaram uma aprendizagem de
Geografia mais significativa para os estudantes surdos. Entretanto, fui percebendo as
limitações que a escola comum possui para a inclusão deles.
Minha maior inquietação foi o fato dos surdos, já cursando o 7º e 8º ano do Ensino
Fundamental, não possuírem um domínio satisfatório da Língua Portuguesa escrita.
Conheciam poucas palavras e não conseguiam interpretar sozinhos os textos e atividades
propostas, assim como elaborarem respostas e ideias mais complexas. Era necessário que eu
ou as intérpretes de Libras discutissem com os estudantes, inicialmente na Libras, para depois
eles tentarem formular as ideias, na língua escrita. Essa prática é adequada para a
aprendizagem dos estudantes surdos. O problema era que eles conheciam os sinais em Libras,
mas precisavam que a sua tradução para a Língua Portuguesa fosse soletrada, mesmo quando
se tratavam de palavras corriqueiras.
As escolas comuns não estão oferecendo a alfabetização adequada para os estudantes
surdos em seus anos iniciais do Ensino Fundamental. É delas a responsabilidade de garantir a
todos os seus estudantes o acesso aos saberes linguísticos, necessários para o exercício da
cidadania. Aprovando os surdos sem que tenham um conhecimento mínimo da Língua
Portuguesa escrita seus direitos como cidadãos estão sendo negados.
Todas as disciplinas escolares são baseadas nessa língua: sejam os livros didáticos, os
textos complementares, os conteúdos e atividades escritas no quadro escolar, os trabalhos e
pesquisas realizadas no computador. Os estudantes surdos que não dominam a Língua
Portuguesa escrita são a maioria nas escolas comuns, ficando totalmente dependentes dos
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intérpretes ou dos poucos professores que dominam a Libras, para que haja a interpretação e
auxílio de modo integral.
A Geografia escolar e as suas diferentes possibilidades de utilização do contato visual
me possibilitaram planejar e realizar aulas que procuravam a inclusão dos estudantes surdos,
mesmo com a falta do domínio da Língua Portuguesa escrita. Entretanto, as dificuldades
foram inúmeras: as salas de aula não eram equipadas com recursos tecnológicos (TV, projetor
multimídia, computadores), sendo difícil o agendamento das aulas no laboratório de
informática (devido ao grande número de professores e a necessidade do técnico de
laboratório exercer o cargo de professor eventual, indo para a sala de aula quando um
professor faltava); não havia na escola impressão de cópias coloridas; os estudantes surdos
não conseguiam ler e interpretar os materiais encaminhados em Língua Portuguesa escrita
para casa, pois seus familiares não dominavam a Libras e não poderiam auxiliá-los; eram
escassos os vídeos que possuíam interpretação em Libras; são poucos os sinais em Libras dos
diferentes termos utilizados na Geografia; os estudantes surdos não possuíam um domínio
mais complexo da Libras.
A partir de minhas limitações como professora de Geografia, capacitada para atender
os estudantes surdos, percebi que a formação docente não consegue atender, sozinha, os
desafios impostos pela inserção desses estudantes na escola comum. As Escolas de Surdos se
tornaram ainda mais desejadas por mim, pois percebia nelas a possibilidade de realizar
práticas pedagógicas que contemplassem as peculiaridades comuns aos estudantes surdos.
Todos estes fatos e experiências me motivaram a pesquisar, durante o doutorado,
iniciado em 2014, o ensino e a aprendizagem de Geografia nas Escolas de Surdos. Aprofundei
as leituras na área, pesquisei sobre as escolas próprias para esse grupo de estudantes, entrei
em contato com professores e pesquisadores surdos, continuei me aperfeiçoando na Libras e,
ainda, realizei o curso de Pedagogia a distância, concluindo-o no ano de 2016.
Por meio de meus relatos, percebemos que esta tese é também resultado daquilo que
experimentei, estudei e produzi. O convívio, a admiração e o amor que construí pelos
estudantes surdos me impulsionam para o encontro de um ensino de Geografia que contemple
as suas necessidades, assim como uma escola capaz de ofertar a Educação Bilíngue.
Espero que esta tese divulgue e fortaleça o trabalho que vem sendo realizado nas
Escolas de Surdos, permitindo a expressão dos sentimentos e opiniões dos estudantes e dos
professores de Geografia entrevistados, assim como a divulgação das práticas pedagógicas
que estão sendo efetivadas.
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Para a realização deste trabalho, optou-se pelo uso da pesquisa qualitativa. De acordo
com Chizzotti (2008, p.79), “a abordagem qualitativa parte do fundamento de que há uma
relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o
objeto, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito”. Desse
modo, o conhecimento não se reduz a um rol de dados isolados, conectados por uma teoria
explicativa, tendo em vista que o sujeito-observador é parte integrante do processo de
conhecimento e interpreta os fenômenos, atribuindo-lhes um significado. O objeto não é um
dado inerte e neutro, pois está tomado de significados e relações que sujeitos concretos criam
em suas ações.
Bogdan; Biklen (1994), por sua vez, apresentam cinco características que configuram
a pesquisa qualitativa: possui o ambiente natural como sua fonte direta de dados e o
pesquisador como seu principal instrumento; os dados coletados são predominantemente
descritivos; a preocupação com o processo é maior do que com o resultado ou produto; os
investigadores tendem a analisar os seus dados de forma indutiva; o significado que as
pessoas dão às coisas e à sua vida são focos de atenção especial pelo pesquisador.
A pesquisa qualitativa requer, então, o contato direto do pesquisador com o ambiente e
a situação que está sendo investigada, pois o contexto influencia os fenômenos. Todos os
dados da realidade são considerados importantes e verificados em seu processo, buscando
também considerar as diferentes perspectivas ou pontos de vista dos pesquisados. Tais
características foram consideradas durante a escolha e aplicação dos métodos e instrumentos
de pesquisa desta tese.
O método é um dos elementos mais importantes de uma investigação, pois tem o
poder de disciplinar a conduta do pesquisador, adequar o esforço que é empregado em função
dos requerimentos do objeto de estudo, estabelecer os demais meios necessários ao bom
termo do estudo, guiar a sequência da pesquisa e garantir a segurança e a economia de
recursos e de trabalho. (LUDWIG, 2014).
De acordo com o mesmo autor, o método é o conjunto das atividades sistemáticas e
racionais que, com maior segurança e economia, permite alcançar o objetivo (conhecimentos
válidos e verdadeiros), traçando o caminho a ser seguido, detectando erros e auxiliando as
decisões do pesquisador.
30
estados de Minas Gerais, São Paulo e Goiás, e no Distrito Federal, como observado no mapa
1.
Também foram identificadas outras Escolas de Surdos no Brasil, as quais não foram
pesquisadas, devido à maior distância territorial ou pela falta de autorização para efetivação
da pesquisa.
A pesquisa de campo foi realizada nos anos de 2015 a 2017, utilizando-se as seguintes
técnicas de pesquisa: a) observação não participante; b) entrevista; c) questionário; d) análise
documental.
Ruiz (2008) define que “a técnica é a instrumentalização específica da ação, e que o
método é mais geral, mais amplo, menos específico” (p.138). Também se entende por técnicas
de pesquisa recursos peculiares que tornam possível empregar um método escolhido para o
alcance dos objetivos da investigação.
As técnicas foram utilizadas para a etapa de coleta de dados, momento em que foram
obtidas as informações necessárias para posterior análise. O problema de pesquisa e o que se
queria conhecer também guiaram a escolha dessas técnicas.
As observações não participantes foram planejadas anteriormente à sua realização,
tendo-se claro o que seria presenciado. A pesquisadora visitou e analisou as instituições
pesquisadas, examinando os eventos e espaços.
Segundo Vianna (2003), as observações não participantes dirigem o pesquisador para
a compreensão do caso. É preciso fazer um registro muito detalhado e claro dos eventos de
modo a fornecer uma descrição incontestável que sirva para futuras análises e para o relatório
final.
Nos registros escritos de observação foram explorados os seguintes núcleos temáticos:
espaço físico e recursos didáticos; uso do espaço e de gestão de sala de aula; uso de materiais
concretos e da visualidade; metodologias de ensino de Geografia; relação professor-estudante
e estudante-estudante; uso da Libras e outras formas de comunicação; formas de avaliação do
desempenho dos estudantes; a valorização da cultura surda.
Observaram-se ainda as falas dos professores e funcionários da escola além do diálogo
com a pesquisadora, para saber seus pontos de vista e demandas para a melhoria do ensino nas
instituições.
As entrevistas foram escolhidas como um dos instrumentos de coleta de dados por
envolver uma relação pessoal entre pesquisador e sujeito, facilitando o esclarecimento de
dúvidas.
Ruiz (2008) define entrevista como “diálogo com o objetivo de colher, de determinada
fonte, de determinada pessoa ou informante, dados relevantes para a pesquisa em andamento”
(p.51).
33
7
Em uma Escola de Surdos o professor não foi entrevistado, pois, apenas no momento da pesquisa, informou-se
que seria necessária autorização da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, a qual a escola estava
vinculada, o que não foi possível obter durante o período.
34
8
Todos os documentos foram elaborados e autorizados de acordo com as exigências do Comitê de Ética em
Pesquisa com Seres Humanos (CEP-UFU).
35
PARTE I
CAPÍTULO I
A surdez, como construção de um olhar sobre aquele que não ouve, é estabelecida
dentro de distintas narrativas associadas e produzidas no interior de diferentes campos
discursivos – clínicos, linguísticos, religiosos, educacionais, jurídicos, filosóficos, entre outros
–, e os discursos de vários campos criam significados diferentes para a surdez e a educação de
surdos. Tais discursos influenciam as práticas, ao mesmo tempo em que são produzidos por
elas. (LOPES, 2007).
No decorrer deste capítulo serão abordadas questões primordiais para se compreender
a educação ofertada aos sujeitos surdos. Para dar início aos estudos, a formação de
concepções e significados sobre os surdos e a surdez é analisada.
O capítulo também apresenta uma trajetória histórica da educação ofertada aos sujeitos
surdos, inclusive em âmbito nacional. Ressalta-se que conhecer esse histórico não apenas
adiciona conhecimentos, mas também possibilita refletir e questionar sobre os eventos
relacionados com a educação em várias épocas, assim como compreender as políticas
educacionais atuais voltadas para esses sujeitos.
Por fim, faz-se uma revisão sobre as principais abordagens que embasaram e ainda
embasam as concepções educacionais e as práticas pedagógicas para surdos: o Oralismo, a
Comunicação Total e o Bilinguismo. Este último será melhor explanado no capítulo posterior,
devido à sua importância para os desenvolvimentos cognitivo, identitário e cultural do surdo.
surda como possuidora de uma patologia, um indivíduo que sempre “precisa de”, sendo
definida pelo que não tem e nomeada “deficiente auditivo”. Nesse entendimento, a surdez é
vista como um déficit a ser combatido mediante terapias, tratamentos orofaciais, protetização
e implantes cocleares. Os profissionais adeptos a essa visão acreditam que o melhor caminho
para os sujeitos que não ouvem é o combate à surdez, levando a uma tentativa de anulação da
diferença.
Conforme apontam Bisol; Sperb (2010), no modelo clínico-terapêutico:
Observa-se que a ênfase está nos efeitos da restrição das experiências de linguagem 9
no desenvolvimento global do surdo. Defende-se a ideia de que o pensamento não se
desenvolve sem uma língua, compreendida apenas no seu aspecto oral.
Tais crenças acometeram não apenas os tratamentos realizados em clínicas, mas
também aspectos familiares e educacionais referentes aos surdos:
Em 1998, Skliar definiu que os Estudos Surdos em Educação poderiam ser pensados
como:
[...] um território de investigação educacional e de proposições políticas que,
através de um conjunto de concepções linguísticas, culturais, comunitárias e
de identidades, definem uma particular aproximação – e não uma
apropriação – com o conhecimento e com os discursos sobre a surdez e sobre
o mundo dos surdos. (SKLIAR, 1998, p. 29).
Os Estudos Surdos surgem dos Movimentos Surdos, os quais se dão a partir dos
espaços articulados pelos surdos, como as associações, as cooperativas, as escolas, os clubes,
42
onde jovens e adultos surdos estabelecem o intercâmbio cultural e linguístico e fazem o uso
oficial da Língua de Sinais. (FENEIS, 1995). Estes Estudos enfatizam o modelo social
antropológico da surdez, sendo essenciais para que a surdez não seja interpretada como
deficiência, falta, doença e sofrimento, mas como uma diferença linguística e cultural.
Segundo Perlin (2003), estudiosa dos Estudos Surdos, o ser surdo se constitui na
própria experiência de si, sendo:
Nessa perspectiva, todos os surdos possuem uma identidade surda, mas esta não se
apresenta sempre da mesma forma. Existe uma pluralização de identidades, diretamente
relacionada com a história de vida de cada um.
Perlin; Quadros (2006) levantam três aspectos que consideram determinantes na
formação do ser surdo:
A imagem do ser surdo é híbrida, pois é construída tanto pelo ouvinte como pelos
próprios surdos, com representações complexas. Cada surdo possui suas representações
identitárias, as quais mudam com o passar do tempo: alguns são filhos de ouvintes, outros de
surdos; uns dominam com fluência a Libras, enquanto outros possuem contato restrito com a
mesma; podem compreender e escrever a Língua Portuguesa escrita, ou não. Além do mais,
para Skliar (1997), a identidade surda é apenas uma das diversas características manifestadas
pelos sujeitos, pois existem identidades voltadas ao gênero, à cor, à raça, família, religião,
língua e situação econômica.
Além das múltiplas identidades, Skliar (2013) define a surdez na base de níveis
diferenciados, porém politicamente interdependentes, para além dos modelos conceituais
43
Desde os tempos mais remotos há registros que indicam a existência de pessoas que
não ouviam. Sempre existiram surdos, porém, nos diferentes momentos históricos, nem
sempre eles foram respeitados em suas diferenças, ou mesmo, reconhecidos como seres
humanos.
Nas sociedades da Antiguidade, os surdos não eram vistos como cidadãos de direitos
por não conseguirem exprimir suas vontades, acreditando-se serem, eles, incapazes de
desenvolver pensamento pelo fato de não adquirirem uma língua. Dava-se à palavra oral um
papel hegemônico, com a ideia de que o que oferecia condição de ser humano para o
indivíduo era o domínio da língua expressa pela fala. (MOURA, 2000).
Segundo essa concepção, os surdos também estariam privados do desenvolvimento
das estruturas de pensamentos, sendo proibidos de usufruírem dos mesmos direitos dos
ouvintes como, por exemplo, o direito de receber herança e constituir família.
Na Idade Média, período marcado pelos valores teológicos, a Igreja afirmava que os
surdos não teriam a salvação da alma, pois não podiam falar os sacramentos. Também
continuavam os problemas de aspectos jurídicos, em que os surdos não eram considerados
capazes de gerenciar suas próprias vidas. A surdez era vista como um problema filosófico,
social e religioso. (MOURA, 2000).
De acordo com Fernandes (2011), os surdos se comunicavam utilizando poucos sinais
e gestos rudimentares, já que na família não havia comunicação sistematizada, e eram
isolados do convívio da comunidade de seus iguais.
Apenas na Idade Moderna surgiram os primeiros estudiosos que acreditavam e
defendiam que o surdo poderia aprender utilizando sua forma de comunicação “natural” –
gestos e sinais, sendo eles: Bartolo della Marca d’Ancona (Itália, século XIV); Girolamo
Cardamo (Itália, século XVI) e, em especial, Pedro Ponce de León (Espanha, século XVI).
O monge espanhol Pedro Ponce de León (1520 - 1584) foi um monge considerado o
primeiro professor para surdos. Ele estabeleceu uma Escola de Surdos no Mosteiro de San
Salvador em Oña Burgos e seus alunos eram filhos de aristocratas ricos, interessados em
garantir a seus primogênitos surdos o direito de receber títulos e heranças. Seu trabalho
focalizou o ensino da língua escrita, utilizando o alfabeto através da configuração das mãos.
46
Segundo a autora Fernandes (2011), no século XVII destacaram-se três autores que
praticavam abordagens oralistas10: John Wallis (1616-1703) nas Ilhas Britânicas, Johann
Konrad Amman (1669-1724) nos países de língua alemã e Jacob Rodrigues Pereira (1715-
1780), nos países de origem latina. Todos consideravam fundamental a oralização como
elemento constituinte de humanidade, utilizando os sinais com o único objetivo de servir
como instrumento para desenvolvimento da fala.
A metodologia do alemão Samuel Heinicke (1727-1790) também ganhou notoriedade
no intento de fazer os surdos falarem. Ele é conhecido como fundador do oralismo, filosofia
educacional que tinha como pressuposto que o pensamento era dependente da mediação da
fala, retomando as crenças dominantes na Antiguidade greco-romana. Em 1778 fundou a
primeira Escola de Surdos na Alemanha, com técnicas e metodologias oralistas que proibiam
a utilização de gestos ou mímicas. (FERNANDES, 2011).
As ideias dos períodos apresentados trouxeram uma consequência na construção
histórica e cultural de percepção do sujeito surdo pelo ouvinte. Observa-se de maneira
predominante que, no senso comum, há uma crença de que, por ser minoria, a adequação é o
melhor e o mais fácil a ser feito. Os surdos precisariam ser ensinados a falar, como se isso
fosse um processo simples, e a realizar a leitura labial, como se fosse facilitado devido à
própria surdez.
Após mais de 200 anos, as ideias da nocividade da comunicação gestual ainda
prevalecem nos fundamentos que estruturam práticas oralistas da atualidade, como será
discutido no próximo item deste capítulo.
Já no século XVIII, a eficácia da proposta oralista começou a ser questionada,
aumentando os adeptos da utilização da língua gestual como comunicação própria dos surdos,
a qual deveria ser usada como principal referência no processo educativo. Esse século, de
acordo com Sá (1999), foi considerado a época áurea da história dos surdos no mundo, pois
diversos deles se destacaram na vida social e cultural dos países onde tinham liberdade de
utilização da língua gestual. Exemplo disso são os diversos trabalhos desenvolvidos por
surdos da época, como escritores, poetas e professores, dentre outros.
No mesmo período em que o alemão Heinicke criava a escola oralista para surdos, o
francês Charles Michel de L´Epée foi um grande representante para a corrente não-oralista da
época. Em 1775 fundou a primeira escola onde professores e alunos usavam os “sinais
10
As abordagens oralistas, ou o Oralismo, utilizam métodos de ensino para surdos que defendem a língua oral,
ou falada, como a maneira mais eficaz de ensinar o surdo e inseri-lo na sociedade. Nela, a fala oral é considerada
condição de humanização. Para mais informações, ver item 1.3.
47
metódicos” – uma combinação da língua de sinais utilizada pelos surdos com a gramática
sinalizada francesa, uma abordagem gestualista11 que obteve êxito. Sua metodologia pregava
que os professores deveriam aprender os sinais para se comunicarem com os surdos, para
depois ensinar a língua falada e escrita do grupo socialmente majoritário. (SILVA; NEMBI,
2008).
Em 1817, Thomas Hopkins Gallaudet, junto com Laurent Clerc, fundou a primeira
escola permanente para estudantes surdos nos Estados Unidos da América, a qual utilizava
como forma de comunicação o francês sinalizado, adaptado para o inglês. A partir de 1821,
todas as escolas públicas americanas passaram a caminhar na direção da Língua de Sinais
Americana (ASL). Em 1864 foi fundada a primeira universidade nacional para surdos, a
Universidade Gallaudet.
A partir de 1860, com a evolução das tecnologias e a possibilidade de ensinar o surdo
a falar por meio destas, alguns educadores começam a rejeitar os avanços conquistados com o
ensino dos sinais e adotaram o Oralismo. Essa filosofia teve seu ápice em 1880, durante o
Congresso de Milão, na Itália.
O Congresso de Milão foi uma conferência internacional de educadores ouvintes que
ensinavam estudantes surdos, realizado em 1880. Lima (2004) assinala a participação de
apenas um professor surdo entre os 174 congressistas.
Em Milão declarou-se que a educação oralista era mais apropriada que a de língua
gestual, sendo aprovado em uma resolução que o uso da língua oral deveria ser utilizado nas
escolas. A conferência é considerada um marco histórico para a corrente oralista, na qual
definiram oficial e internacionalmente pelo Oralismo.
Segundo Skliar (1995) o Congresso de Milão impôs a superioridade da língua falada
com respeito à comunicação gestual e decretou, sem fundamentação científica, que a primeira
deveria constituir o único objeto de ensino.
Cabe ressaltar que o Congresso não instituiu o começo da ideologia oralista
dominante, mas sim sua legitimação oficial, pois a decisão de acabar com o gestualismo já
havia sido escrita anteriormente e era aceita em grande parte do mundo, com oposições
individuais e isoladas.
Nessa época, o Brasil passava por momentos importantes para a educação de surdos, a
nível nacional. Em 1857 foi fundado o Collégio Nacional para Surdos-Mudos, o atual
11
De acordo com Costa (2010), a palavra gesto significa movimento do corpo, especialmente da cabeça e dos
braços, para exprimir ideias; sinal; mímica. No gestualismo tem-se a ideia de gesto como linguagem corporal
que complementa e enfatiza a língua oral, como seu enriquecimento, e não como língua plena, completa em si
mesma.
48
12
Para mais informações sobre a história do INES, sugere-se a leitura da obra “O INES e a educação de surdos
no Brasil: aspectos da trajetória do Instituto Nacional de Educação de Surdos em seu percurso de 150 anos”
(ROCHA, 2007).
13
Este cenário foi agravado com o Congresso de Milão, em 1880, citado anteriormente.
49
oferecida aos estudantes surdos como segunda língua; a formação de profissionais bilíngues; e
também a regulamentação do uso e difusão dessa língua em ambientes públicos e privados.
Tais conquistas foram importantes para a aproximação dos surdos à Educação
Bilíngue, a qual será abordada no próximo capítulo.
Além da criação e da trajetória do INES, destaca-se o surgimento de diversas Escolas
de Surdos no Brasil, como as que foram pesquisadas neste trabalho: Escola Municipal de
Educação Bilíngue para Surdos Helen Keller (1952 - São Paulo/SP); Escola para Surdos
Dulce de Oliveira (1956 - Uberaba/MG); Instituto Santa Inês (1978 - Belo Horizonte/MG );
Escola Bilíngue Libras e Português-Escrito de Taguatinga (1989/2013 - Taguatinga/DF);
Centro Especial Elysio Campos (1992 - Goiânia/GO); Instituto Seli (2002 - São Paulo/SP).
Elas também passaram por mudanças, em suas nomenclaturas e filosofias educacionais, as
quais serão expostas nos Capítulos III, IV e V.
Na seção subsequente, discute-se sobre os principais fundamentos educacionais que
influenciam a educação dos surdos no Brasil, tanto no INES como nas Escolas de Surdos
pesquisadas. São eles: o Oralismo, a Comunicação Total e o Bilinguismo.
Apesar de serem narrados em uma sequência histórica, os fundamentos educacionais
apresentados coexistiram e coexistem, ainda hoje. Foram enfraquecidos ou fortalecidos ao
longo das décadas, mas, como ideologias dominantes, extrapolam a instituição escolar e
implicam todo um contínuo de senso comum, de estereótipos e de imaginários sociais
difundidos em vários níveis da sociedade.
Após o Congresso de Milão, a maior parte das escolas em todo o mundo deixou de
usar a comunicação gestual. A oralização passou a ser o principal objetivo da educação das
crianças surdas e, para aprenderem a falar, passavam a maior parte do seu tempo nas escolas
recebendo treinamento oral. A aprendizagem da escrita e o domínio dos conteúdos
curriculares ficaram em segundo plano. Eram os próprios professores que realizavam o ensino
da oralização, tendo em vista que ainda não existia a profissão de fonoaudiólogos.
(FERNANDES, 2011).
A abordagem educacional do Oralismo objetiva a integração do surdo na comunidade
de ouvintes, por meio da sua capacitação para utilizar a língua da comunidade ouvinte na
51
modalidade oral (no caso do Brasil, a Língua Portuguesa), utilizando-se apenas a voz e a
leitura labial.
De acordo com Brito (1993, p.27):
O Oralismo percebe a surdez como uma deficiência que deve ser minimizada pela
estimulação auditiva, buscando uma reabilitação da criança surda em direção à normalidade.
Percebe, então, o surdo como aquele que precisa se aproximar do modelo ouvinte, quando o
trata para alcançar uma possível normalidade, como se os surdos não fossem normais.
(GOLDFELD, 2002).
Essa percepção pode ser considerada como clínica e terapêutica da surdez, pois,
conforme afirmou Quadros (1997), a oralização era mais enfatizada do que os objetivos
educacionais, além de negar a identidade e a cultura da comunidade surda.
Os autores que defendiam o Oralismo acreditavam que a comunicação por gestos
prejudicava o aprendizado da oralização. Desse modo, não reconheciam a língua de sinais
como uma língua e a consideravam prejudicial para o aprendizado da língua oral, seu maior
objetivo. (GOLDFELD, 2002).
Silva (2003) aponta ainda alguns fatores históricos que contribuíram para o
predomínio do Oralismo durante o período histórico compreendido entre as décadas de 1880 a
1960:
Observa-se que os interesses pelo Oralismo não eram baseados em garantir ao ser
surdo os seus direitos como cidadãos, mas de manter a hegemonia da cultura ouvinte para a
garantia do domínio dos Estados Nacionais.
Diante das imposições oralistas e, principalmente, da proibição da utilização das
línguas de sinais, surgiram formas de resistência que, no caso dos surdos, expressam-se de
múltiplas maneiras. Os matrimônios entre surdos, as produções artísticas e culturais
diferenciadas, o refúgio das crianças surdas nos banheiros das escolas oralistas para
52
comunicar-se, as lutas pelos direitos humanos e pelo direito específico que têm os surdos à
aquisição de uma primeira língua e a criação de associações de surdos. (SKLIAR, 1998).
As ideias do Oralismo foram impostas até meados de 1970, sendo enfraquecidas pelo
fortalecimento dos movimentos de resistência dos surdos, assim como a percepção da
dificuldade de aprendizagem da língua oral e suas sérias consequências para o
desenvolvimento da criança.
Ao ser privada de uma comunicação natural na língua de sinais, a criança surda sofre
atraso de linguagem e bloqueio de comunicação, tendo em vista que a linguagem é
fundamental para a sua constituição, como ferramenta do pensamento e como forma de
comunicação para as informações e a cultura.
Segundo Dorziat (1997) as técnicas mais utilizadas no modelo oral são o treinamento
auditivo, o desenvolvimento da fala e a leitura labial. O treinamento auditivo é realizado por
meio da estimulação auditiva para reconhecimento e discriminação de ruídos, sons ambientais
e sons da fala, geralmente por meio de aparelhagens de ampliação sonora. O desenvolvimento
da fala é buscado com exercícios para a mobilidade e tonicidade dos órgãos envolvidos na
fonação, lábios, mandíbula, língua, entre outros, e exercícios de respiração e relaxamento. A
leitura labial é um treino para a identificação da palavra falada através da decodificação dos
movimentos orais do emissor.
Apesar dos esforços oralistas, os surdos, na maioria das vezes, não falam, passando
por métodos mecânicos, artificiais e penosos. Strobel (2008) afirma que a técnica de leitura
labial – “ler” a posição dos lábios e captar os movimentos dos lábios de alguém que está
falando – é só útil quando o interlocutor formula as palavras de frente, com clareza e devagar.
Além disso, a seu ver, a maioria de surdos só consegue ler 20% da mensagem através da
leitura labial, perdendo a maioria das informações. Geralmente os surdos “deduzem” as
mensagens de leitura labial através do contexto dito.
Com relação à escolarização, Sacks (2010) complementa que o Oralismo e a supressão
das línguas de sinais resultaram em um retrocesso das conquistas educacionais dos surdos,
pois muitos se tornaram iletrados funcionais.
53
Apesar dos métodos oralistas continuarem sendo utilizados até hoje, acredita-se que a
língua de sinais, a cultura e a identidade surda ganharam mais força, após os Movimentos
Surdos.
Em meio à corrente oralista, surgiu uma proposta que permitia o uso de sinais com o
objetivo de desenvolver a linguagem na pessoa surda, mesmo que sendo usada apenas como
um recurso ou estratégia para o ensino da língua oral: a Comunicação Total.
Em oposição ao Oralismo, a Comunicação Total acredita que somente o aprendizado
da língua oral não assegura o desenvolvimento da criança surda. Defende que os aspectos
cognitivos, emocionais e sociais não devem ser deixados de lado, utilizando-se recursos
espaço-viso-manuais como facilitadores da comunicação. Como o próprio nome diz,
privilegia a comunicação e a interação e não apenas a língua. Seu principal objetivo é
desenvolver a comunicação entre surdos e ouvintes utilizando todas as formas possíveis de
comunicação: auditivas, orais, manuais, visuais, incluindo o uso de sinais.
Segundo Goldfeld (2002) a visão de pessoa surda nesse modelo educacional também é
diferente, pois ela não é vista como uma portadora de patologia que deveria ser eliminada,
mas como uma pessoa, e a surdez como uma marca que repercute nas relações sociais e no
desenvolvimento.
Apesar de uma visão mais sociointeracionista do surdo, a Comunicação Total se
transformou em um método que se centralizou no uso simultâneo de códigos manuais (Libras,
datilologia14, português sinalizado, dentre outros) com a língua oral, o que ficou conhecido
14
Datilologia é um alfabeto manual, ou seja, a representação manual das letras do alfabeto.
54
como Bimodalismo15. Observa-se que os sinais são utilizados dentro da estrutura da Língua
Portuguesa, descaracterizando a estrutura da Língua de Sinais. Esta língua não é utilizada de
forma plena, pois não é considerada como uma língua natural com estrutura própria. Criam-se
recursos artificiais para facilitar a comunicação e a educação dos surdos, o que pode provocar
uma dificuldade de comunicação entre surdos que dominam códigos diferentes da língua de
sinais. (GOLDFELD, 2002).
Perlin; Strobel (2008) ressaltam que a mistura de duas línguas, a Língua Portuguesa e
a língua de sinais, resultando numa terceira modalidade que é o ‘português sinalizado’, causa
um grande problema para os surdos. Afirmam que essa prática da Comunicação Total
encoraja o uso inadequado da língua de sinais, já que a mesma tem gramática diferente da
Língua Portuguesa.
Avaliando-se os processos de ensino e de aprendizagem, na Comunicação Total há
uma priorização da língua oral, o que a caracteriza como uma variação do Oralismo, pois o
uso de sinais é utilizado apenas como instrumento comunicativo de auxílio ao acesso à língua
falada e escrita.
Desse modo, a concepção oralista e a concepção da Comunicação Total se mostraram
insuficientes para garantir o aprendizado da pessoa surda, pois ambas negam-lhe a
oportunidade de se desenvolver por meio de sua língua natural 16: a língua de sinais. Elas se
aproximam do conceito de Ouvintismo, ou seja, de: [...] uma forma particular e específica de
colonização dos ouvintes sobre os surdos. Supõem representações, práticas de significação,
dispositivos pedagógicos, etc., em que os surdos são vistos como sujeitos inferiores,
primitivos e incompletos. (SKLIAR, 2013, p.7).
De acordo com o mesmo autor, Ouvintismo seria ainda “um conjunto de
representações dos ouvintes, a partir do qual o surdo está obrigado a olhar-se e narrar-se como
se fosse ouvinte”. (SKLIAR, 1998, p 15).
Após lutas e reivindicações do Movimento Surdo, começa-se a preocupar com o
pressuposto básico de que o surdo deve ser bilíngue, ou seja, precisa adquirir como primeira
língua a língua de sinais e, como segunda língua, a língua oficial do país na modalidade
escrita.
15
Bimodalismo é o uso combinado de sinais com a língua oral.
16
De acordo com Ferreira-Brito (1993), afirmar que as Línguas de Sinais são línguas naturais para os surdos não
significa que haja uma pré-disposição para seu uso em decorrência da surdez, porém considera que o organismo
do surdo não apresenta nenhum impedimento para adquiri-la. Ela não precisa ser aprendida de maneira
sistemática como a língua oral, pois é adquirida por meio de interações com interlocutores usuários desse
idioma.
55
CAPÍTULO II
No final dos anos de 1990, a educação de surdos era pautada principalmente pelos
discursos clínicos sobre os surdos e a surdez, sendo esses voltados à questão da deficiência. A
partir dessa época, houve um fortalecimento dos discursos pedagógicos e linguísticos em
detrimento dos discursos clínicos17.
Pesquisas pioneiras como a de Quadros (1997) contribuíram para a mudança na
concepção de abordagens educacionais na educação de surdos. A autora apresenta dados
diversos sobre os resultados acadêmicos de estudantes que vivenciaram o Oralismo. De
acordo com a pesquisa, a maioria dos estudantes não concluía o 1º grau (atual Ensino
Fundamental) e, a maioria dos 5% da população surda total, que estudava em universidades,
era incapaz de lidar com o português escrito. Concluiu que, por meio dessa abordagem
educacional, os surdos não desenvolviam uma comunicação sistematizada e tampouco
aprendiam a escrever.
A grande insatisfação de pais, educadores e pessoas surdas, com relação ao
desenvolvimento global de seus filhos e alunos, motivou um movimento pela mudança.
Observava-se que, até então, os resultados obtidos na escolarização e na integração social dos
surdos não foram os esperados, pois os mesmos dependiam do aprendizado da fala para serem
integrados no ensino comum. (FERNANDES, 2011).
Ganha destaque o bilinguismo, uma proposta educacional que, dentre as suas
características, leva em consideração que a língua de sinais é a primeira língua (L1) dos
surdos, de modo que possam, através dela, aprender uma segunda língua (L2), no caso do
Brasil, a Língua Portuguesa. Segundo Quadros (1997), a L1 é fundamental para que as
crianças surdas tenham acesso à língua de sinais para garantir o desenvolvimento da
linguagem e, consequentemente, do pensamento; e o domínio da L2, na modalidade escrita, é
necessário para que os sujeitos surdos possam fazer valer os seus direitos em sociedade.
Cabe destacar que o termo ‘bilíngue’ na educação dos surdos pode manifestar uma
ambiguidade no que se refere ao seu sentido. Tradicionalmente, bilinguismo na escola é
17
Os discursos clínicos não foram negados e excluídos da história surda, pois eles continuam até os dias de hoje
fazendo investigações e ações de profilaxia. Entretanto, tais concepções não entram nos Estudos Surdos.
57
entendido como oferta de ensino em duas línguas, seja na escola onde os alunos são
estrangeiros, ou quando seus pais optam por oferecer a seus filhos, nativos, no seu próprio
país, o contato com uma segunda língua. No Brasil também existe o caso dos índios, cidadãos
que pertencem a um grupo social em que a cultura e língua são bastante diferentes da
majoritária. Algumas escolas, com o apoio do MEC, oferecem o ensino bilíngue 18.
Ao contrário do que se acredita a Educação Bilíngue para surdos é mais do que o
domínio em duas línguas: Libras e Língua Portuguesa escrita. Skliar (2013, p.7) afirma que:
A proposta de educação bilíngue para surdos pode ser definida como uma
oposição aos discursos e às práticas clínicas hegemônicas – características da
educação e da escolarização dos surdos nas últimas décadas – e como um
reconhecimento político da surdez como diferença.
Este, constituído por surdos e ouvintes, acadêmicos ou não, que lutam pelos
direitos da comunidade surda, tem importante papel articulador, que
propiciou – e continua mobilizando – mudanças de perspectivas linguísticas
e educacionais no que se refere à educação de surdos. Muitas conquistas
estão ligadas à aprovação da Lei 10.436/2002 e do Decreto 5.626/2005,
18
Na cidade de Benjamin Constant, no Amazonas, formou-se o Centro de Formação de Professores Ticuna/Torü
Nguepatü, o qual possui a Organização Geral de Professores Ticuna Bilíngues. (KELMAN, 2008).
58
Muitas medidas têm sido tomadas quanto à educação para as pessoas com deficiência (em que
se incluem os surdos19), de forma que sua matrícula escolar seja efetivada no ensino comum, a
partir da oferta do Atendimento Educacional Especializado (AEE) como forma de garantir a
participação e a aprendizagem do público da Educação Especial.
19
As produções feitas no campo da educação de surdos têm contribuído para a ruptura com a concepção de
Educação Especial e o enquadramento desses sujeitos como pessoas com deficiência.
60
sua identidade, as imagens que constrói de si como Surdo, as projeções que faz de si como
cidadão”. (LACERDA, 2000, p.7).
Os professores, sem formação específica para atender à educação de surdos, não
conseguem se comunicar em Libras, ministrar os conteúdos de forma adequada, ou mesmo
avaliar a aprendizagem. Não compreendem a experiência visual que os caracteriza e, mesmo
se o fizessem, teriam dificuldades para utilizar recursos didáticos20 que explorem os aspectos
visuais, associando a imagem com o conceito em Libras. Os surdos recebem as informações
por via indireta da tradução/interpretação, com a presença dos intérpretes de Libras.
Amorim (2015, p.50) enfatiza que:
20
As escolas, em sua maioria, estão sucateadas e não possibilitam a utilização de recursos didático-pedagógicos
eficientes, como os computadores, a TV, o projetor multimídia, dentre outros.
63
que nela trabalham. Tem-se o problema dos poderes e saberes dos ouvintes em torno das
modalidades de comunicação e de linguagem que consideram adequadas para os surdos.
Afirma ainda, que a Educação Bilíngue não pode ser assimilada à escolarização
bilíngue, isto é, não se deve justificar somente como ideário pedagógico a ser desenvolvido
64
Lopes (2007) defende que “os surdos devem ser vistos a partir de outras lentes que não
as da educação especial, nem as do simples enquadramento linguístico do surdo.” (p.70).
Nessa perspectiva, o Movimento Surdo luta em prol de uma Educação Bilíngue para surdos
que contemple todos os direitos e demandas desse grupo, o que será discutido na seção 2.2.
[...] com base nos nossos irrenunciáveis direitos humanos, entre os quais o
de ter uma língua, nossas escolhas ouvidas, nossas opções respeitadas,
queremos que as Escolas Bilíngues para Surdos sejam uma realidade no
Brasil e que, por fim, Nada (seja dito, feito ou decidido) sobre nós, sem nós!
(FENEIS, 2011, p. 37).
[...] imaginam o benefício que poderiam usufruir de escolas nas quais a sua
cultura e a sua língua natural fossem prioritariamente disponibilizadas, nas
quais a língua de sinais fosse a língua de instrução, escolas nas quais todas as
pessoas usassem a língua de sinais (ainda que fossem ouvintes) e os modelos
perseguidos não fossem os “modelos ouvintes”, escolas que tivessem
professores surdos e trabalhadores surdos de modo geral. (SÁ, 2011, p.21).
Para a aquisição de uma Educação Bilíngue, que valoriza a cultura e a cidadania surda,
deve-se ter um ambiente linguístico “natural” em um espaço em que todas as pessoas sejam
proficientes na língua. As Escolas de Surdos possibilitam esse ambiente, pois é um espaço
comunitário de contatos duradouros, permeado pela cultura surda. “Um ambiente linguístico
‘natural’ [...] não se cria num espaço com hora marcada e com poucos indivíduos (ou
nenhum) proficientes na língua que se precisa adquirir” (SÁ; SÁ; 2015, p. 31) – como é o
caso da escola comum e do AEE.
É importante destacar que para Skliar (1998) uma Escola Bilíngue não se resume
àquela que utiliza em seu cotidiano duas línguas, trata-se de uma abordagem filosófica
bilíngue que aborda todos os aspectos relacionados a concepções de surdez, de escolarização
das pessoas surdas, de língua, de currículo, de estratégias pedagógicas.
Amorim (2015) define ‘espaço bilíngue’, no tocante à educação de surdos, como
aquele no qual se circula livremente a língua de sinais e a língua oral do país, que nesse
espaço ainda sejam reconhecidos e valorizados aspectos históricos, culturais, filosóficos
próprios da comunidade surda. Nesses espaços é necessário haver pessoas surdas e ouvintes
falantes da língua de sinais, eventos culturais que valorizem o ser surdo, aspectos estruturais
apropriados à comunicação com essas pessoas como: campainha com luz, painéis com avisos
em língua de sinais, entre outros.
67
As Escolas Bilíngues também são importantes tendo em vista que os surdos são
sujeitos que não nascem territorialmente próximos, necessitando de espaços que aproximem
uns dos outros. As escolas e as associações de surdos são lugares onde tem ocorrido tal
aproximação.
Essas escolas aparecem atravessadas por sentimentos de exaltação, de reconhecimento
e de possibilidades de existência e de aproximação surda. Elas vêm funcionando como
espaços em que a maioria dos surdos brasileiros consegue interagir com seus pares sem a
intervenção proibitiva das famílias. A escola como espaço surdo está constituindo uma forma
particular de ser surdo. (LOPES, 2007).
São nestes espaços que pessoas surdas comprometidas com sua comunidade,
podem exercer o direito de preservar uma cultura, fortalecendo uma
identidade que não se envergonha da diferença e, a partir desta, constrói
imprescindíveis vínculos de solidariedade e resistência política a todas as
formas de sabotagem daquilo que funciona em termos de bem-comum neste
país. (AZEVEDO; REBOUÇAS, 2011, p.180).
Nesse sentido, uma Escola Bilíngue é considerada uma das melhores opções
educacionais para os surdos, pois valoriza a língua de sinais, assumindo uma postura política
e ideológica que os reconhece enquanto pertencentes a uma minoria linguística, com uma
cultura própria. Há a necessidade de se romper com o medo de se criar “guetos” linguísticos
ao proporcionar à população surda brasileira o seu direito à Educação Bilíngue em escola e/ou
salas bilíngues.
Todavia, a criação de Escolas Bilíngues de Surdos tem sido apenas uma possibilidade,
considerando que, na atualidade, não há apoio e subsídios financeiros por parte das políticas
públicas educacionais para promovê-la. Muitas têm sido fechadas e “as Escolas de Surdos que
ainda se sustentam estão debaixo de pressão, ao ponto de ter que ‘concordar’ em ir se
extinguindo devagar, para que consigam uma sobrevida”. (SÁ; SÁ, 2015, p. 33).
Para uma melhor compreensão sobre as Escolas de Surdos, os capítulos III, IV e V
analisam a caracterização e o histórico das escolas pesquisadas durante o trabalho, sendo
espaços de resistência nesse cenário atual.
68
CAPÍTULO III
A Escola para Surdos Dulce de Oliveira (mapa 2) localiza-se bairro São Benedito, no
município de Uberaba, na mesorregião do Triângulo Mineiro, no estado de Minas Gerais. A
população de Uberaba, em outubro de 2017, segundo a estimativa do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), era de 328.272 pessoas, sendo a oitava mais populosa do
estado e a 82ª mais populosa do Brasil.
O Bairro São Benedito fica na área central, sendo um dos mais antigos da cidade, onde
se localizam o Cine Teatro Municipal Vera Cruz, o Terminal Rodoviário de Uberaba, o
Shopping Center Uberaba, além de diversos hotéis, bancos e comércios.
A Escola para Surdos Dulce de Oliveira matricula estudantes surdos desde o ano de
1956. É uma instituição de ensino sem fins lucrativos, tendo como mantenedora a Associação
Dulce de Oliveira de Assistência aos Surdos de Uberaba, provedora de recursos financeiros
70
Autora: PENA, F, S., 2015. Fotografia da entrada da Escola para Surdos Dulce de
Oliveira em Uberaba.
A Escola para Surdos Dulce de Oliveira foi criada por sua idealizadora Dulce de
Oliveira em 15 de janeiro de 1956, com a finalidade de promover o ensino e a educação das
pessoas surdas.
De acordo com o PPP da escola (DULCE DE OLIVEIRA, 2015), as primeiras aulas
aconteceram na casa da professora Dulce, situada no bairro São Benedito, onde começou a
72
ensinar aos seus três sobrinhos surdos, pois na escola eles não conseguiam aprender de forma
satisfatória. Logo, surdos que residiam em Uberaba e regiões vizinhas souberam do trabalho
diferenciado oferecido pela professora e vieram à sua procura. Como o número de surdos
vindos de diversas localidades em busca dessa educação diferenciada era cada vez maior,
Dulce sentiu a necessidade de mudar-se para um local maior que atendesse à nova demanda
de alunos. Assim, a primeira escola para surdos de Uberaba teve como sede a União
Estudantil Uberabense, pois a professora Dulce não dispunha de recursos financeiros para
adquirir uma sede própria.
Com o passar do tempo, um grupo de rotarianos sensibilizados pela causa da
professora Dulce doou o espaço físico situado também no bairro São Benedito, para que a
escola passasse a ter uma sede própria – a qual recebeu o nome de sua fundadora – e pudesse
atender ainda mais estudantes surdos. Surgiu, então, a Associação Dulce de Oliveira de
Assistência aos Surdos de Uberaba, atual mantenedora da Escola para Surdos Dulce de
Oliveira.
Em sua história, a escola sofreu influência de diferentes abordagens educacionais para
surdos, de acordo com as ideias que estavam sendo defendidas e adotadas a nível nacional,
principalmente no INES.
Segundo o PPP da escola, ao longo dos anos de funcionamento foi adotado o
Oralismo, realizando-se sessões de oralização e terapia de fala como o centro do fazer
pedagógico. Assim como em outras escolas brasileiras, acreditou-se que o desenvolvimento
cognitivo dos estudantes surdos estaria condicionado aos conhecimentos que pudessem ter da
língua oral.
O Oralismo, ainda dominante em muitas escolas e setores da sociedade, trouxe para as
salas de aula um modelo de educação que visava a reabilitação da pessoa com deficiência,
vista como incapaz, em detrimento da carga horária prevista para o desenvolvimento do
currículo comum.
Seguindo a tendência nacional, o fracasso do Oralismo trouxe à tona, também na
Escola para Surdos Dulce de Oliveira, a Comunicação Total. Pregava-se a utilização de todas
as formas de comunicação (língua oral, língua sinalizada, língua escrita, gestos, mímica) para
o aprendizado da pessoa surda. Essa teoria teve como premissa básica o uso dos sinais
colocados na estrutura da Língua Portuguesa, gerando o português sinalizado, ou seja, uma
forma de comunicação que desrespeitava a estrutura gramatical da língua de sinais.
O PPP da escola não apresentava a data na qual a Comunicação Total deixou de ser
utilizada como abordagem educacional na Escola para Surdos Dulce de Oliveira. Afirmava
73
que, perante o cenário de fracasso escolar dos estudantes surdos, assim como da mistura de
concepções educacionais, surgiu o Bilinguismo, o qual emergiu e rompeu com o paradigma
clínico-terapêutico da surdez.
Pautada no Bilinguismo, a escola assumiu a língua de sinais como primeira língua e o
aprendizado da Língua Portuguesa como segunda língua, abrindo espaço para enfoque social,
cultural e político da surdez.
No ano de 2004 a escola passou por reformas de parte do espaço físico, acolhendo as
necessidades da demanda crescente de estudantes surdos matriculados. Foi feita a cobertura
do pátio conjugado ao espaço interno da escola, a construção de sala ambiente apropriada para
crianças de 0 a 3 anos, participantes do Programa de Estimulação Essencial, a ampliação de
sala para instalação do Laboratório de Informática, a construção da sala de coordenação
pedagógica, assim como de banheiros masculinos e femininos.
A reforma seguiu o programa de acessibilidade, construindo espaços adaptados e
incluindo sinais luminosos (em todas as salas e pátio) programados para atender aos horários
de intervalo convencionais de uma escola, numa perspectiva visual. Na figura 2 observa-se a
porta de uma sala de aula da escola, com placa de sinalização em Libras e na Língua
Portuguesa, assim como o sinal luminoso.
74
FIGURA 2 – Sala de aula com sinal luminoso na Escola para Surdos Dulce de Oliveira
Autora: PENA, F. S., 2015. Fotografia do pátio da Escola para Surdos Dulce de
Oliveira, o qual é amplo e apresenta diversos trabalhos e ações realizadas sobre a
educação dos surdos. Possui sinal luminoso na parede, acima da porta de entrada e
saída, mesas de convivência, bancos, livros e a entrada para as salas de aula e os
banheiros. Uberaba, 2015.
Autora: PENA, F. S., 2015. Fotografia de sala de aula da Escola para Surdos Dulce
de Oliveira com estudantes surdos, durante aula de Geografia. Os estudantes
sentavam em formato de semicírculo, dialogando com os colegas e professores em
Libras. Uberaba, 2015.
76
Com relação aos recursos, as salas de aula dos estudantes surdos possuíam apenas o
quadro negro. Entretanto, cotidianamente os professores utilizavam os recursos
disponibilizados pela escola, sendo eles: aparelho de televisão, aparelho de DVD,
computadores, máquina fotográfica, retro-projetor, filmadora, nootebooks, aparelhos de
projeção multimídia, telão para projeção, impressoras, máquinas de fotocópias e uma lousa
digital. Os recursos possibilitavam a realização de práticas de ensino que consideravam a
experiência visual dos surdos.
A figura 5 mostra livros, materiais e jogos diversos para a Educação Bilíngue,
presentes na biblioteca.
Também previa recuperação paralela e final para alunos que precisavam de apoio para vencer
as necessidades escolares.
A estrutura organizacional da escola era composta por direção escolar, coordenação
pedagógica, corpo docente e projetos permanentes, sendo eles o “Programa de Estimulação
Essencial” e o “Atendimento Educacional Especializado”, com apoio da secretaria escolar,
biblioteca e laboratório de informática. A escola também oferecia cursos de Libras para a
comunidade e funcionários.
Os profissionais que atuavam na Educação Básica da Escola, a partir da Educação
Infantil, eram fluentes em Libras e conhecedores das especificidades que envolvem o aluno
surdo. A escola orientava aos professores que participassem de programas de capacitação
relacionados à área da surdez, assim como cursos de Libras para aprofundarem seus
conhecimentos.
Todos os professores eram graduados em Pedagogia ou em licenciaturas específicas,
sendo que muitos possuíam pós-graduação na área da surdez ou em Língua de Sinais e alguns
apresentavam a certificação do Prolibras21. A escola contava com uma professora surda, a
qual ministrava a disciplina de Libras, além de conteúdos sobre a cultura surda.
Com relação ao público atendido, a escola matriculava estudantes surdos oriundos de
famílias de diferentes classes sociais, moradores da cidade de Uberaba e região, inclusive da
zona rural, e do estado de São Paulo.
Eram, na maioria, filhos de pais ouvintes, tendo chegado à escola sem uma língua
adquirida, com comunicação e expressão insatisfatórias. Cabia à escola viabilizar estratégias e
programas que garantiam o acesso à língua de sinais mediante a interação social e cultural
com pessoas surdas e ouvintes, fluentes em língua de sinais, além de fornecer orientações aos
pais sobre a importância de uma língua compartilhada no ambiente familiar e propor-lhes o
aprendizado da Libras, por meio de cursos gratuitos ministrados pelos professores da escola.
A partir das observações e análises documentais realizadas pela pesquisadora,
verificou-se que a escola propunha e realizava a Educação Bilíngue em seu espaço escolar.
Contava com professores qualificados, os quais dominavam Libras e possuíam cursos na área
da educação de surdos. Todos os funcionários se comunicavam com os estudantes e, durante
os intervalos recreativos, discutiam sobre questões pertinentes a eles, procurando solucionar
eventuais problemas ou aprimorar as práticas pedagógicas.
21
Programa Nacional para a Certificação de Proficiência no uso e Ensino da Libras e para a Certificação de
Proficiência em Tradução e Interpretação da Libras/Língua Portuguesa.
78
O Instituto Santa Inês (ISI) está localizado em Belo Horizonte, capital do estado de
Minas Gerais. Com população estimada, em outubro de 2017, de 2.523.794 pessoas, Belo
Horizonte é o município mais populoso do estado de Minas Gerais. (IBGE, 2017).
No mapa 3, observa-se a localização do Instituto Santa Inês, sediado no bairro Barro
Preto, localizado na Zona Centro Sul de Belo Horizonte. Considerado um dos bairros mais
tradicionais da capital, o Barro Preto foi colonizado por imigrantes italianos, no início do
século XX. Oferece boa infraestrutura, sediando importantes corredores de tráfego que
acessam outras regiões. Também se destacam no bairro as agências bancárias, supermercados,
bares e restaurantes, além da sua proximidade com o Mercado Central, Mercado Novo, o
shopping Diamond Mall, entre outros pontos importantes, como a igreja de São Sebastião,
79
A figura 6 mostra a entrada do Instituto, com a placa onde se lê “Instituto Santa Inês -
Especializada para Deficientes Auditivos”. De acordo com ela, o Instituto ainda apresentava
traços de uma filosofia clínico-terapêutica dos surdos, pois sua nomenclatura possuía o termo
“deficientes auditivos”. Essa terminologia também estava presente no PPP da escola, cuja
missão era:
Oferecer à pessoa de deficiência auditiva escolaridade a partir da
estimulação precoce maternal passando pela Educação Infantil, Ensino
80
Autora: PENA, F, S., 2015. Fotografia da entrada do Instituto Santa Inês. Belo Horizonte, 2015.
22
A história do Instituto Santa Inês foi conhecida por meio do Projeto Político Pedagógico e pela Página da
Internet do Instituto.
82
Autora: PENA, F, S., 2015. Fotografia da porta da sala de Fonoaudiologia do Instituto Santa Inês e de
atividade realizada nesse espaço, pelos estudantes surdos. Belo Horizonte, 2015.
Autora: PENA, F, S., 2015. Fotografia do Colégio Monte Calvário, cujo espaço
também é utilizado pelos estudantes do Instituto Santa Inês, seu vizinho. Belo
Horizonte, 2015.
A figura 9 mostra o pátio onde os estudantes ficavam durante o recreio, para brincar e
lanchar, além de se comunicarem utilizando a Libras. O pátio também era utilizado para a
realização de atividades beneficentes, como Festival de Sorvete, bazar, dentre outros. Não foi
identificada a realização de eventos voltados para a comunidade surda.
O prédio do Instituto, apesar de ser amplo, possuía infraestrutura antiga e sem indícios
de reformas recentes. As salas de aula eram identificadas por meio da Língua Portuguesa
sinalizada, por exemplo, ao invés do sinal em Libras de “4º ano”, tem-se o sinal de 4 e a
datilologia “A” “N” “O”, assim como observado na figura 10.
Na Figura 11, apresenta-se a sala de leitura e uma sala dos anos iniciais do Ensino
Fundamental. A sala de informática estava desativada, sendo que a escola não possuía
internet para os estudantes.
84
Autora: PENA, F, S., 2015. Fotografias do prédio do Instituto Santa Inês, com área de recreação. Belo
Horizonte, 2015.
Autora: PENA, F, S., 2015. Fotografia de uma porta da sala de aula do Instituto
Santa Inês que, assim como as demais, é identificada com datilologia. Belo
Horizonte, 2015.
85
Autora: PENA, F, S., 2015. Fotografias da biblioteca e de uma sala de aula do Instituto Santa Inês. Belo
Horizonte, 2015.
Autora: PENA, F. S., 2015. Fotografia da sala de aula com estudantes surdos
enfileirados, no Instituto Santa Inês. Belo Horizonte, 2015.
86
23
No Regimento Interno do Instituto não foi observado o domínio em Libras como pré-requisito para seus
docentes.
87
A partir da pesquisa, observou-se que ainda existem Escolas de Surdos que trabalham
na perspectiva da educação especial, considerando o sujeito surdo como uma “pessoa
deficiente” que precisa ser trazida para a normalidade. Essas escolas estão pautadas no
Ouvintismo, ou seja, no conjunto de representações dos ouvintes, a partir do qual o surdo está
obrigado a olhar-se e narrar-se como se fosse ouvinte. (SKLIAR, 1998).
Mesmo trabalhando na perspectiva da Comunicação Total, a escola apresentava
pontos relevantes para a educação dos estudantes surdos: possibilitava o encontro cotidiano
entre os sujeitos surdos que, na maioria das vezes, eram filhos de ouvintes e não conviviam
com seus pares; contava com professores que dominavam a Libras e planejavam suas aulas na
perspectiva do grupo específico de estudantes surdos; possuía salas de aula com número
reduzido de alunos e espaço físico amplo.
A partir das pesquisas realizadas nas duas Escolas de Surdos localizadas em Minas
Gerais, constatou-se que cada uma realizava suas práticas a partir de concepções diferentes de
surdez e de sujeitos surdos. A Escola para Surdos Dulce de Oliveira promovia uma educação
pautada nas concepções sociais antropológicas de surdez, percebendo o surdo em uma
perspectiva da diferença linguística e cultural. A Libras era valorizada como língua natural
dos surdos e suas experiências visuais eram consideradas. Já no Instituto Santa Inês a
educação efetivada se baseava na concepção clínico-terapêutica de surdez, sem o
reconhecimento da Libras e da cultura surda, desconsiderando os pressupostos da Educação
Bilíngue.
O Capítulo IV apresenta as Escolas de Surdos pesquisadas em Goiás e no Distrito
Federal, refletindo-se sobre os mesmos parâmetros de análise considerados para a
caracterização das escolas apresentadas neste capítulo, como: o histórico, os espaços físicos e
adaptações arquitetônicas, a equipe pedagógica, os recursos didáticos, e a Educação Bilíngue.
88
CAPÍTULO IV
Autora: PENA, F. S., 2016. Fotografia do muro da Escola Bilíngue Libras e Português-Escrito.
Taguatinga, 2016.
Sua primeira nomenclatura foi Escola Classe nº 21, passando a chamar-se Escola
Classe 21 de Taguatinga, uma das primeiras escolas integrantes da rede oficial de ensino do
DF. A instituição matriculava, desde 1989, crianças surdas, assim como crianças com outros
tipos de deficiências.
Em agosto de 2013 a Escola Classe 21 de Taguatinga foi transformada em Escola
Bilíngue Libras e Português-Escrito pela Portaria nº 171/2013, da Secretaria de Estado de
Educação do Distrito Federal (SEEDF). A escola foi instituída com a sanção da Lei nº
5.016/2013, após a comunidade surda do DF, juntamente com professores da SEEDF, lutarem
por aproximadamente doze anos para que a Escola Classe 21 de Taguatinga fosse
transformada em Escola Bilíngue para surdos.
O objetivo era a aprendizagem tendo a Libras como primeira língua e o português
escrito como segunda língua. A implantação da Escola Bilíngue ocorreu no início do segundo
semestre de 2014, após estudos e discussões entre profissionais, governo e comunidade.
A escola contemplava os projetos sociais e pedagógicos da rede de ensino, de acordo
com as etapas/modalidade que comportava, e obedecia as Diretrizes Pedagógicas do Distrito
Federal, a LDB - Lei nº 9.394/96, além das Diretrizes de Avaliação do Processo de Ensino e
Aprendizagem para a Educação Básica, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Regimento
Interno da SEEDF e seguia o Currículo da Educação Básica, direcionado aos projetos
específicos implementados pela rede e desenvolvidos pela instituição.
Autora: PENA, F, S., 2016. Fotografia da sala de aula de Geografia, com carteiras
organizadas em semicírculo, mapas e computadores. Taguatinga, 2016.
Fonte: PENA, F.S., 2016. Fotografia do refeitório, onde os estudantes surdos lancham, ficam durante o
período de almoço e participavam de atividades escolares diversas. Taguatinga, 2016.
No que diz respeito aos recursos didáticos, a escola possuía projetor multimídia, lousa
digital, notebook, mapas históricos, geográficos e políticos, globo terrestre, revistas e jornais,
livros didáticos, material de papelaria e artesanato, materiais recicláveis, materiais esportivos,
jogos diversos, DVD, clássicos da literatura, literatura surda e laboratório de informática.
De acordo com o PPP da escola, procuravam-se levar em consideração as
especificidades linguísticas, culturais e identitárias do estudante surdo, no espaço inclusivo da
Escola Bilíngue.
Autora: PENA, F, S., 2016. Fotografia dos estudantes e professora surda da Escola
Bilíngue Libras e Português-Escrito, com o Hino Nacional sinalizado em Libras.
Taguatinga, 2016.
Autora: PENA, F, S., 2016. Fotografia de um dos teatros realizados pelos estudantes
surdos, durante projeto de Literatura Surda, na Escola Bilíngue Libras e Português-
Escrito. Taguatinga, 2016.
24
O implante coclear é um aparelho eletrônico colocado cirurgicamente dentro do ouvido que capta o som, com
um microfone colocado atrás da orelha, e o transforma em impulsos elétricos diretamente sobre o nervo da
audição.
101
A Associação dos Surdos de Goiânia surgiu com a iniciativa de alguns surdos que,
conhecedores de outras localidades onde funcionavam Associações de Surdos, resolveram
fundar uma Associação em Goiânia, buscando orientações, em especial, da Associação dos
Surdos do Rio de Janeiro.
Em 12 de julho de 1975, a ASG foi instalada definitivamente em uma sala no então
"Centro de Apoio ao Deficiente", onde existiam salas especiais para estudantes surdos, com
apoio pedagógico.
Dentro de seus objetivos, a Associação dos Surdos de Goiânia desejava ter um
ambiente educacional que atendesse não só os seus associados, mas a toda comunidade surda
de Goiânia e região metropolitana.
25
O Atendimento Educacional Especializado era oferecido aos alunos que quisessem complementar e
suplementar os estudos oferecidos na sala de aula comum, a partir de estratégias de ensino diferenciadas.
102
Autora: PENA, F.S., 2016. Fotografia da sala de aula do Centro Especial Elysio Campos. Goiânia, 2016.
Autora: PENA, F.S., 2016. Fotografia da porta da sala de aula da Oficina de Língua
Portuguesa, identificada pela Língua Portuguesa Escrita e pela Escrita das Línguas de Sinais
(ELiS). Goiânia, 2016.
Autora: PENA, F.S., 2016. Fotografia de atividades artísticas realizadas pelos estudantes do
Centro Especial Elysio Campos. Goiânia, 2016.
105
Autora: PENA, F.S., 2016. Fotografia da quadra poliesportiva da ASG, utilizada pelos estudantes surdos do
Centro Especial Elysio Campos. Goiânia, 2016.
O surdo adulto, no momento que estabelece contato com a criança surda, estará
transmitindo a base linguística necessária para a aquisição de outras "línguas", identidade e
cultura surda. A presença do professor surdo em sala de aula recebe ainda maior importância
quando, muitas vezes, em suas casas, os alunos surdos não possuem uma boa comunicação
com sua família devido à barreira da língua.
O CEEC, por estar inserido na Associação de Surdos de Goiânia, oportunizava um
contato maior dos estudantes com a comunidade surda. Se preocupava com a identificação
desses estudantes com a cultura surda e com o aprendizado da Libras, assim como defendido,
em seu PPP:
CAPÍTULO V
Este capítulo apresenta duas escolas pesquisadas no município de São Paulo, capital
do estado de São Paulo, a saber: Escola Municipal de Educação Bilíngue para Surdos Helen
Keller (EMEBS Helen Keller) e Colégio Seli, ambas visitadas no ano de 2017.
Inicialmente, foram realizadas pesquisas nos sites institucionais das escolas, buscando-
se informações sobre suas características gerais e localização. Foram agendadas as visitas,
com a equipe de direção e supervisão das escolas, informando os objetivos da pesquisa, as
técnicas a serem utilizadas, assim como a aprovação da pesquisa pelo Comitê de Ética em
Pesquisa com Seres Humanos da UFU.
Durante a visita, foram observados os espaços escolares, recursos didáticos, aulas de
Geografia, e o cotidiano escolar dos estudantes, como os horários de entrada e saída e os
momentos recreativos. Além dos registros escritos, a pesquisadora realizou registros
fotográficos.
A EMEBS Helen Keller disponibilizou o Projeto Político Pedagógico (PPP) para
pesquisa. A partir do histórico da escola, presente no PPP, a pesquisadora também buscou
informações complementares sobre os seus avanços, em Decretos municipais e entrevistas
com profissionais, disponibilizados na Internet.
Não foi possível a realização da entrevista com o professor de Geografia e a aplicação
de questionários para os estudantes da EMEBS Helen Keller, pois a diretora alegou que
deveria ter sido solicitada autorização para a aplicação desses instrumentos de pesquisa,
perante a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo. A visita foi agendada com a
supervisora pedagógica, que não tinha conhecimento sobre a autorização externa, ocorrendo
um erro de comunicação. Todavia, a ausência da entrevista e dos questionários não
comprometeu a pesquisa, pois foram adquiridas informações suficientes para analisar os
parâmetros estabelecidos pela pesquisa, por meio da visita e de documentos diversos, como o
PPP e o site institucional.
Com relação ao Colégio Seli, além das aulas de Geografia observadas, foram
aplicados questionários para os estudantes do 9º ano, assim como realizada entrevista com a
professora, após o término das aulas.
108
O diretor do Colégio Seli justificou que o PPP estava desatualizado, não sendo
possível o acesso ao documento. As informações sobre o histórico e as políticas pedagógicas
do Colégio foram adquiridas por meio de conversa com o diretor e funcionários, assim como
no site institucional do mesmo.
As próximas seções deste capítulo expõem a localização das escolas pesquisadas em
São Paulo, informações sobre os históricos institucionais, as propostas político-pedagógicas e
a caracterização dos espaços escolares das duas escolas paulistas, dos seus profissionais e
estudantes, apresentando-se fotografias, observações e análises da pesquisadora.
A Escola Municipal de Educação Bilíngue para Surdos Helen Keller pertence à Rede
Municipal de Ensino de São Paulo e submete-se à Diretoria Regional de Educação do
Ipiranga. Localiza-se na Zona Central da área urbana de São Paulo, no bairro Aclimação,
conforme observado no mapa 6.
MAPA 6 – Localização da EMEBS Helen Keller – São Paulo-SP
Autoria: PENA, F.S., 2017. Fotografia da EMEBS Helen Keller, localizada no entorno do Parque Aclimação, na
região central da cidade de São Paulo.
5.1.1 História e Conquistas da Escola Municipal de Educação Bilíngue para Surdos Helen
Keller26
Pai de três crianças surdas, o então capitão da Polícia Militar, Francisco Vieira
Fonseca propôs à Secretaria de Educação de São Paulo a criação de um Núcleo de
Recuperação que prestasse assistência à criança surda. Em 1951, instituiu-se o I Núcleo
Educacional para Crianças Surdas, no bairro de Santana. Realizaram-se entrevistas e seleções
de alunos, para dar início ao trabalho em 1952.
Em 1954, o Núcleo foi transferido para o bairro do Ipiranga. Em caráter experimental,
as atividades se restringiam às aulas de recreação, iniciação à leitura labial, educação física,
educação sanitária, atividades manuais, jogos sensoriais educativos, alfabetização, dentre
outros.
As práticas eram restritas, principalmente, porque não havia profissionais qualificados
em São Paulo, sendo necessária a luta por parte do capitão para a realização de curso
preparatório para professores em São Paulo, capital. Apenas em 1969 o curso foi realizado.
No ano de 1956, o Núcleo foi novamente transferido, desta vez para o bairro da
26
A história da constituição da EMEBS Helen Keller foi conhecida por meio de visita, quando se dialogou com a
assistente de direção, funcionária da escola há mais de 20 anos, e pelo acesso ao Projeto Político Pedagógico da
escola. (HELEN KELLER, 2017).
111
Aclimação, onde já funcionava uma biblioteca infantil. Nesse mesmo ano, o projeto de Lei nº
162 criou o Instituto Municipal de Surdos-Mudos, pela iniciativa de um vereador. Em agosto
daquele ano criou-se também a Rede de Ensino Municipal de São Paulo.
Dois anos depois, o Instituto passou a ser denominado Escola Municipal de Crianças
Surdas, pelo decreto nº 3827/1958, ficando subordinado à Secretaria de Educação e Cultura.
No mesmo ano, iniciou-se a construção do prédio que sediaria, definitivamente, a escola. Em
setembro de 1960, por meio do decreto nº 4884, criou-se, então, o Instituto Municipal de
Educação de Surdos (IMES). Também em 1960 ocorreu a primeira formatura de alunos que
haviam ingressado no curso primário.
Em 1967, por meio da Lei nº 7037, o IMES passou a denominar-se Instituto de
Educação de Crianças Excepcionais (IECE) e ficar subordinado ao departamento de
Assistência escolar. Dois anos depois, seu nome foi mudado para Instituto de Educação de
Crianças Excepcionais Helen Keller.
O Instituto passou por uma situação difícil, com abandono do prédio, por falta de
reparos, a falta de uma política mais específica para a educação dos surdos, de profissionais e
equipamentos. Além disso, havia profissionais que não eram ligados ao Instituto que
começaram a usar o seu espaço, descaracterizando sua proposta original.
Procurando manter o propósito de educar e promover a inclusão do surdo na
sociedade, a diretora Maria Regina Rodrigues da Silva, a partir de 1971, conseguiu uma
equipe multidisciplinar composta por professores, fonoaudiólogos, psicólogos, médicos
otorrinolaringologistas e assistentes sociais.
Na época, a escola possuía uma concepção Oralista, em que os surdos deveriam ser
reabilitados para participar da sociedade ouvinte.
Em 1976, após ser criada uma lei que organizava a educação de “Deficientes
Auditivos no Ensino Municipal”, a denominação Instituto de Educação de Crianças
Excepcionais Helen Keller passou a ser “Escola Municipal de Educação Infantil e 1º Grau
para Deficientes Auditivos Helen Keller". A partir do ano de 1988, pela Lei nº10.567/88,
foram criadas mais cinco Escolas Municipais de Educação para “Deficientes Auditivos” em
São Paulo, capital, sendo elas: EMEDA “Anne Sullivan”, EMEDA “Neusa Basseto”,
EMEDA “Madre Lucie Bray”, EMEDA “Vera Lúcia A. Ribeiro” e EMEDA “Mário Pereira
Bicudo”. Começou, também, a ser oferecido o Ensino Fundamental (anos iniciais e anos
finais), abrindo a matrícula de alunos surdos para o período noturno, pois muitos jovens e
adultos trabalhadores não tinham sido escolarizados.
No ano de 1998, a escola passou a se chamar Escola Municipal de Educação Especial
112
Helen Keller.
Ao longo dos anos de história da escola, destacou-se a dificuldade de encontrar
professores especializados para assumirem classes da escola. A Libras ainda era pouco
difundida e os cursos de graduação não preparavam os futuros docentes para atuarem com os
estudantes surdos. Acredita-se que esse desafio ainda esteja presente nas Escolas de Surdos.
Apenas no ano de 2011, após o Decreto 52.785/2011, que instituiu as Escolas
Municipais de Educação Bilíngue para Surdos na Rede Municipal de Ensino, começou um
investimento na formação em nível de pós-graduação em surdez, realizado pela Secretaria
Municipal de Educação. Assim, os alunos puderam ter aulas com especialistas das diversas
áreas do conhecimento.
Anterior a isso, no ano de 2007, o Ministério da Educação e Cultura-MEC criou uma
equipe para discutir a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva. Dentre as deliberações, estava que as Escolas de Surdos deveriam transformar-se
em Centro de Referência e Apoio, e os surdos deveriam estudar em escolas regulares.
(BRASIL, 2008).
O professor surdo da EMEBS Helen Keller, Neivaldo Zovico, que também é
Coordenador Nacional de Acessibilidade para Surdos da Feneis, afirmou no ano de 2014 que:
O Decreto foi um grande avanço para a comunidade surda da capital paulista, pois
instituiu que as escolas deveriam constituir espaços onde a primeira língua dos surdos fosse a
Libras; oferecer aos alunos surdos o acesso a todo conteúdo por meio dessa língua, para que
pudessem conviver plenamente a cultura surda, construindo e desenvolvendo a sua própria
identidade; garantir a formação de profissionais para que fossem fluentes em Libras; e que
tivessem instrutores de Libras e guia-intérprete.
Sobre a formação docente dos profissionais, o Decreto 52.785/2011 em seu Artigo 5º
afirma:
§ 1º. Para atuar na regência das classes/aulas, o profissional de educação,
além da habilitação na área de atuação, deverá apresentar habilitação
específica na área de surdez, em nível de graduação ou especialização, na
forma da pertinente legislação em vigor, e domínio de LIBRAS.
§ 2º. O professor a que se refere o § 1º deste artigo também poderá atuar com
alunos surdo-cegos, desde que detenha certificação específica na área da
surdo-cegueira. (SÃO PAULO, 2011, p.1).
O decreto incentiva, também, em seu Artigo 7º, que todos os profissionais das EMEBS
sejam fluentes em Libras: "As EMEBS deverão prever, em seu Projeto Pedagógico, atividades
de formação continuada em Libras, envolvendo a equipe docente, equipe gestora e equipe de
apoio da unidade educacional"(SÃO PAULO, 2011, p.1), além de se preocupar com a família
dos estudantes surdos, a partir de ações que ofereçam às famílias o conhecimento de Libras.
O professor Neivaldo, sujeito surdo que participou e participa ativamente das
discussões e lutas por direitos para a comunidade surda, também fez considerações com
relação às conquistas apresentadas no Decreto 52.785/2011:
Aponta, ainda, nova demanda para a Educação Bilíngue: que os professores surdos
tenham formação em diversas áreas do conhecimento e possam ministrar aulas para os alunos
surdos. Desse modo, desenvolver-se-ia a instrução por meio da Libras e a cultura surda nas
diversas Escolas Bilíngues para Surdos.
Essa nova luta possui alguns desafios, pois, para que os professores surdos cheguem
114
até os espaços educacionais, eles precisam ingressar no Ensino Superior, nos diversos cursos
que contemplem a grade curricular da Educação Fundamental. É necessário que tenham uma
boa formação na Educação Básica, para estarem aptos ao ingresso nos cursos superiores. Os
vestibulares também devem contemplar avaliações que considerem as diferenças linguísticas
dos surdos, assim como os cursos precisam ter intérpretes de Libras e docentes capacitados.
No ano de 2016, a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo se mostrou
novamente empenhada com a Educação Bilíngue para os surdos, quando criou a Portaria nº
8.764, de 23 de dezembro de 2016, a qual regulamentou o Decreto nº 57.379/2016, instituindo
no Sistema Municipal de Ensino a Política Paulistana de Educação Especial, na Perspectiva
da Educação Inclusiva.
Dedica seu Capítulo IV à Educação Bilíngue, orientando as Escolas Municipais de
Educação Bilíngue para surdos, as Unidades Pólo de Educação Bilíngue e as Escolas
Comuns, garantindo profissionais e atendimentos qualificados para as crianças da Educação
Infantil, até o término do Ensino Fundamental.
A EMEBS Helen Keller estava localizada na região central da cidade de São Paulo, no
bairro da Aclimação. A área foi adquirida em 1892 por Carlos Botelho, médico natural de
Piracicaba e formado em Paris, para a criação de um jardim, semelhante ao Jardin
d'Acclimatation da capital francesa. Daí originou-se o atual Parque Aclimação e todo o bairro.
A escola foi construída ao lado do Parque, em uma área cedida que antes pertencia ao
mesmo. A localização privilegiada da EMEBS Helen Keller favorecia o desenvolvimento de
práticas pedagógicas que explorassem o cotidiano e o espaço dos estudantes surdos. Os
conteúdos de Geografia poderiam ser mais bem estudados, para além da sala de aula. Dentro
mesmo da escola havia uma vasta área verde, bosque e quatro portões de acesso em ruas
diferentes.
Na proximidade localizava-se ainda a Escola Municipal de Ensino Fundamental
Brigadeiro Faria Lima, com a qual a EMEBS Helen Keller compartilhava experiências e
vivências, como palestras, interação entre alunos, contato social e linguístico cultural, e a
Unidade Básica de Saúde do Cambuci, na qual realizava o Projeto Programa Saúde na Escola
(PSE).
Em seu espaço físico, a escola possuía salas de aula, salas ambiente de todos os
115
Autora: PENA, F.S., 2017. Fotografia de documentos, materiais e recursos do Memorial da EMEBS Helen
Keller, os quais apresentam a abordagem oralista, adotada pela escola em um momento da história. São
Paulo, 2017.
Autora: PENA, F. S., 2017. Fotografia de espaço externo da escola, com parque de
brinquedos e quadra poliesportiva ao fundo, onde eram realizadas as aulas de
Educação Física. São Paulo, 2017.
119
Na fotografia percebe-se que a cultura surda era valorizada pelos estudantes em seus
desenhos, onde apareciam pessoas dialogando em Libras, a representação da Escola de Surdos
e dos recursos tecnológicos presentes no seu cotidiano.
No ano de 2017 a escola possuía 137 alunos matriculados. De acordo com a assistente
de direção, a escola já teve matriculados, aproximadamente, 500 estudantes surdos em um
ano. Com as políticas de inclusão na escola comum, os surdos estavam sendo direcionados
pela Secretaria Municipal de Educação para essas escolas ou para as demais EMEBS que se
localizavam mais próximas de suas residências.
A maioria dos estudantes surdos matriculados na escola (99%) provinha de famílias
ouvintes que não utilizavam a Libras como forma de comunicação no ambiente familiar. Isso
significa que chegavam à escola com atraso linguístico acentuado, ou sem uma língua
constituída, demandando atenção especial dos profissionais da Escola Bilíngue, tendo em
vista que a ausência de linguagem pode ter como consequência limitações cognitivas e
afetivas. (HELEN KELLER, 2017).
A escola era o principal ambiente social para a maioria dos estudantes surdos, sendo
que em seu espaço o aluno era exposto à Libras, aprendendo junto com seus pares de forma
mais rápida e significativa. Enfatiza-se que é por meio dela que o surdo será inserido no
processo dialógico de sua comunidade, trocando ideias, sentimentos e compreendendo o que
se passa em seu meio. Além disso, a linguagem apresenta grande importância na formação da
consciência, promovendo a ampliação da concepção de mundo, assegurando o processo de
abstração e de generalização, sendo o elo de transmissão de informação e cultura entre a
criança e o mundo (DIZEU; CAPORALI, 2005), construindo novas formas de concepção de
mundo.
A partir das observações, dos diálogos e das análises documentais, acredita-se que a
EMEBS Helen Keller desenvolvia suas atividades na perspectiva da Educação Bilíngue. A
valorização da Libras e da cultura surda estava presente em seus espaços, os quais
apresentavam imagens, sinais em Libras e atividades bilíngues. A cultura surda também era
valorizada, com a contratação de professores surdos e o domínio da Libras pelos professores,
os quais utilizavam metodologias de ensino baseadas na experiência visual dos surdos.
O ensino de Geografia dessa escola estava sendo realizado baseado nos pressupostos
da Educação Bilíngue. Eram dadas condições físicas e materiais para que o professor,
capacitado, buscasse e elaborasse recursos didático-pedagógicos de Geografia baseados na
visualidade, o que será analisado no Capítulo VI.
121
O Instituto Seli é uma escola particular especializada em educação para surdos, a qual
ofertava serviços diversificados, como: o Colégio Seli (Educação Infantil, Ensino
Fundamental e Médio), Cursos de Libras, Cursos de Extensão, Capacitação e Pós-Graduação.
Localizava-se no município de São Paulo, capital do estado de São Paulo, no Setor
Sudeste, conforme mostra o mapa 7. Estava sediado no bairro do Tatuapé, o qual possui
terrenos valorizados e comércio de alto padrão, com intensa verticalização e adensamento
urbano. O bairro conta com quatro bibliotecas municipais, escolas e universidades,
construções históricas e museus, além de hipermercado, shopping e bancos.
No ano de 2017, o Colégio Seli possuía turmas de 5º ano (com oito estudantes), 6º ano
(sete estudantes), 7º ano (dezoito estudantes), 9º ano (dezenove estudantes), sendo uma turma
para cada ano. Devido ao número reduzido de estudantes, a turma de 8º ano não foi oferecida.
122
O Colégio também atendia estudantes do Ensino Médio, com quatro turmas de 1º ano, sendo
uma de estudantes surdos que possuíam outras deficiências, duas turmas de 2º ano e uma
turma de 3º ano.
O Colégio Seli tinha como missão: "Formar e educar cidadãos surdos com consciência
e capacidade crítica para atuarem na sociedade em geral e na comunidade de surdos
permitindo, ao mesmo tempo, a livre expressão de suas individualidades". (SELI, 2017).
Na figura 31, observa-se a entrada do prédio de três andares do Instituto Seli, onde os
serviços oferecidos e o Colégio Seli se localizavam.
O Colégio Seli foi criado em 2002, com o atendimento aos surdos na Educação
Infantil e no Ensino Fundamental I (1º ao 5º ano), utilizando a Língua Brasileira de Sinais
como primeira Língua e a Língua Portuguesa, em suas modalidades oral e escrita, como
segunda Língua.
No ano de 2006, começou a ofertar, também, a escolarização do Ensino Fundamental
II (6º ao 9º ano) e do Ensino Médio, disponibilizando uma sala para alunos com deficiência
múltipla, associada à surdez.
Nesse mesmo ano, iniciaram-se os cursos de Libras (Básico, Intermediário e
Avançado), voltados para a comunidade, para os estudantes e para os seus familiares. “O
Instituto, atento à importância da interação família-escola, oferece aos pais dos seus
estudantes a oportunidade de participar dos cursos de Libras sem pagamento das parcelas”.
(SELI, 2017).
Em 2010, além da escolarização na Educação Básica, o instituto se preocupava com a
empregabilidade dos estudantes, o que levou a iniciaram-se parcerias com empresas privadas
para a inserção de alunos do Ensino Médio – maiores de 16 anos, no mercado de trabalho (em
horários complementares ao período de aulas).
A nossa meta é oferecer recursos para que estes alunos possam trabalhar em
horários alternados ao colégio, e possam arcar com as despesas dos estudos.
Estamos sempre atentos para não permitir que alunos e familiares se
acomodem com esse auxílio, mas sim, busquem, juntos a nós, um
crescimento pessoal e profissional, atingindo sua independência financeira e
cidadania plena. (SELI, 2017).
Na figura 32 é possível observar a evolução dos serviços prestados pelo Instituto Seli.
Em parceria com a Faculdade XV de Agosto, começaram a ser ofertados cursos de
Pós-Graduação. No ano da pesquisa, foi oferecido o curso “Pós-Libras: Tradução e
Interpretação”; o “Pós-Libras: Educação para Surdos”; o “Diversidade e Inclusão: recursos
humanos e outros segmentos”, nas modalidades presencial e semi-presencial, além do curso
de extensão pedagógica “Libras e como ensinar o Aluno Surdo”.
27
As informações sobre o Instituto foram adquiridas por meio do site oficial do mesmo, assim como entrevista
com o diretor. O PPP do Colégio não foi disponibilizado para a pesquisadora, com a justificativa de que estava
sendo reestruturado.
124
De acordo com o site institucional, em 2015 o Instituto Seli elaborou o seu material
didático próprio, criando uma editora. As publicações foram realizadas por profissionais de
educação – surdos e ouvintes, que se dedicavam ao trabalho de inclusão. Foram editadas
apostilas pedagógicas, apostilas do curso de Libras em seis níveis, incluindo um CD, e
apostila de sinais religiosos.
Com relação ao espaço físico, o Colégio Seli possuía salas de aula com lousa de vidro,
TV digital e computador com Internet para o professor, sendo três salas de aula adaptadas
para cadeirantes. Também havia laboratório de informática, lanchonete, auditório, quadra
poliesportiva, secretaria, sala do diretor, sala dos professores, coordenação pedagógica e
cozinha. O Colégio não possuía biblioteca.
Os espaços eram identificados por placas, com o nome em Língua Portuguesa escrita e
o sinal em Libras, assim como observado na figura 33. Não havia sinais luminosos para
identificar o término das aulas.
125
Todas as salas de aula eram equipadas com TV digital, sendo utilizadas pelos
professores com o notebook ligado pelo cabo HDMI. Era possível a visualização de slides,
imagens, mapas, vídeos e pesquisas na Internet, simultaneamente à aula, o que despertava o
interesse dos estudantes surdos.
A figura 34 apresenta um momento da aula de Geografia, onde é possível verificar
alguns dos recursos mencionados.
As carteiras ficavam dispostas em formato de semicírculo, possibilitando a
comunicação em Libras entre todos os estudantes e a professora. Durante as aulas, além do
recurso tecnológico, a professora de Geografia utilizava folhas de atividades com imagens
coloridas, mapas e aula expositiva dialogada em Libras.
126
Autora: PENA, F.S., 2017. Fotografia da sala de aula do Colégio Seli com
professora de Geografia e estudantes surdos. São Paulo, 2017.
A lanchonete era o local onde os estudantes se reuniam antes e depois das aulas, assim
como no recreio. A figura 35 apresenta, à esquerda, o espaço da lanchonete com as mesas e
cadeiras. No auditório, observado à direita, eram realizadas peças teatrais, palestras e demais
atividades escolares que necessitassem de um espaço maior.
Autora: PENA, F.S., 2017. Fotografias da lanchonete e do auditório do Colégio Seli. São Paulo, 2017.
127
mapas e TV conectada ao notebook, além de atividades com textos curtos e debates em Libras
entre professor e alunos, os quais sentavam em formato de semicírculo durante as aulas.
O Colégio também se preocupava com a inclusão do surdo na sociedade, realizando
atividades complementares para o ingresso nas Universidades e no mercado de trabalho.
O espaço físico da escola possuía placas com sinais em Libras e adaptações
arquitetônicas para estudantes com deficiência física. Na sala de aula e no espaço da
lanchonete, os estudantes surdos se comunicavam constantemente, demonstrando gostar da
escola e do contato constante com os colegas surdos e professores fluentes em Libras.
Professores Bilíngues
Estudantes Surdos Bilíngues
Documentos com Ed. Bilíngue
Valorização da Cultura Surda
Professor Surdo
Disciplina de Libras
Avaliações em L1 e L2
AEE
Salas de Aula adequadas
Placas Sinalizadoras Bilíngues
Intérpretes de Libras
Sinais Luminosos
Fonte: Pesquisa de campo realizada em Escolas de Surdos, entre os anos de 2015 a 2017. Org.: PENA, F.S., 2018.
pesquisadas, alunos com diferentes níveis de fluência em Libras, assim como diferentes
domínios da Língua Portuguesa.
Uma demanda escolar percebida com relação ao professor surdo foi a necessidade de
sua formação nas diversas áreas do conhecimento. As Escolas de Surdos carecem de
professores surdos que ministrem aulas especializadas, além da disciplina de Libras.
Outra necessidade observada foi a de capacitarem todos os profissionais que atuavam
nas Escolas de Surdos para se comunicarem em Libras, pois alguns diretores e funcionários
ouvintes não possuíam o domínio dela. De acordo com os documentos das cinco escolas que
trabalhavam na perspectiva bilíngue, havia o incentivo à participação dos funcionários
escolares nos cursos de formação continuada na área da surdez, oferecidos, muitas vezes, em
seus espaços. Os familiares também eram estimulados a participarem dos cursos de Libras
para adquirirem a língua natural dos surdos.
Com relação aos professores, em todas as escolas pesquisadas eles eram fluentes em
Libras e português, para ministrarem os conteúdos de forma acessível aos alunos surdos.
Desse modo, a Libras era colocada no centro das atividades de ensino e procurava-se ensinar
com ela. De acordo com Lacerda (2015, p.15), “a efetividade do ensino passa pelo acesso ao
conteúdo em uma língua que faça sentido para o aluno, na relação com professores e demais
profissionais da educação fluentes em Libras”. Todas as escolas pesquisadas possuíam
professores bilíngues, mesmo que com diferentes domínios dessa língua.
Sobre a presença dos Intérpretes de Libras nas Escolas de Surdos, a princípio pode
parecer desnecessária, pois as aulas são ministradas pelos professores bilíngues que dominam
essa língua. Entretanto, os intérpretes podem auxiliar na apresentação de vídeos e na
mediação de situações em que estejam presentes alunos e professores surdos e pessoas
ouvintes que não dominem a Libras, como em trabalhos de campo e palestras, exercendo uma
função importante na Escola Bilíngues de Surdos. Dentre as seis escolas pesquisadas, apenas
duas contavam com esse profissional.
Com relação às avaliações de conteúdo escolar, considerou-se que na Educação
Bilíngue devem ser realizadas de duas maneiras: em Libras (L1) e na Língua Portuguesa
escrita (L2). Desse modo, valorizam-se os conhecimentos dos estudantes surdos na sua
primeira língua, tendo em vista que eles podem dominar os conceitos, mas não as palavras em
português. Também são importantes as avaliações na Língua Portuguesa, a qual também faz
parte do mundo surdo, sendo indispensável para a sua escolarização, para a defesa dos seus
direitos e da sua cidadania.
131
PARTE II
CAPÍTULO VI
31
Apesar da importância da pesquisa e do material desenvolvido pelo pesquisador surdo, infelizmente a
Universidade não disponibilizou o material em formato digital pela Internet. Teve-se acesso ao Trabalho de
Conclusão de Curso por meio de solicitação ao e-mail pessoal do autor, sendo que o CD não foi adquirido.
Recomenda-se que, para os novos trabalhos, sejam criados websites que facilitem o acesso de todos os
interessados aos materiais.
136
Para o autor, deve-se ter o objetivo de “proporcionar o contato com a língua escrita
para que o aluno surdo consiga interagir com a mesma no sentido de conseguir ler, interpretar
e produzir textos da maneira que ele melhor conseguir” (p.210). Dessa forma, valoriza-se
tanto a Libras como a Língua Portuguesa escrita, em uma perspectiva Bilíngue.
Apesar de o trabalho ter sido resultado de uma experiência de inclusão de alunos
surdos na escola comum, Silva (2003) concluiu com a sua pesquisa que a inclusão desses
alunos no ensino regular é inviável. Em primeiro lugar, justificou sua opinião destacando o
caráter ideológico de imposição da cultura majoritária em detrimento da cultura surda, cuja
especificidade constitui-se como diferença. Afirmou que a inclusão de surdos no ensino
regular não garante a inserção da cultura surda, dificultando a possibilidade do aluno construir
sua identidade, tendo como referência o surdo adulto, assim como a participação da
comunidade surda na elaboração da proposta pedagógica.
Outro fator considerado foi que, na escola comum, as oportunidades de
desenvolvimento cognitivo dos surdos ficam prejudicadas em função de que o ensino
processa-se em uma segunda língua e não em sua língua natural.
Por fim, afirmou que a leitura e o conhecimento de mundo dos surdos se dão pela sua
capacidade viso-espacial, sendo que a proposta de ensino deve valer-se dessa capacidade.
Desse modo, uma política de inclusão de surdos no ensino regular, para o autor, torna-se
inviável, pois a escola comum tem a sua estruturação curricular por base na modalidade oral-
auditiva.
Já no ano de 2008, a professora de Geografia e intérprete de Libras, Cármen Cristina
Pereira da Silva desenvolveu a dissertação “Respeitando as diferenças no trânsito: alunos
surdos em ação e movimento”. O trabalho realizou reflexões sobre experiências pedagógicas
em uma Escola de Surdos, também do município de Canoas-RS, articulando à experiência do
dia-a-dia um olhar mais elaborado, mediado pelas categorias geográficas e pela Língua de
Sinais.
Ao se apresentar, a autora relatou em sua dissertação que foi professora de Geografia e
intérprete de Libras em uma escola comum, onde surdos estudavam juntos com ouvintes,
inclusive sendo colega do pesquisador Claudionir Silva (2003). Sobre a inclusão dos surdos
na escola comum e a posterior escolha por serem transferidos para a nova Escola de Surdos,
onde se realizou a pesquisa, a autora afirmou que:
Além dos desafios apresentados, a autora acrescentou que os professores não estavam
preparados para atender as especificidades do grupo de surdos que havia sido agregado às
turmas. Apenas a boa vontade dos professores era o aspecto positivo ressaltado pela mesma,
além da receptividade dos demais alunos, pois, em termos de espaço, número de alunos,
material didático e visual, alegou que havia muita carência.
Quando a Escola de Surdos foi inaugurada, apesar de embates políticos buscarem a
permanência dos surdos na EJA da escola comum, os alunos surdos foram unânimes em
escolher uma educação direcionada a eles, relatando suas dificuldades para acompanhar os
processos de ensino e aprendizagem pautados numa base ouvinte. (SILVA, 2008).
Silva (2003) e Silva (2008) abordaram as Escolas de Surdos como “espaços de
resistência”, em que se territorializar significa criar as condições espaciais para que o grupo
consiga exercer poder e ter o controle sobre o espaço vivido. Para os autores, a territorialidade
de resistência presente no contexto linguístico da Libras está mediando esse empoderamento,
esse controle, à medida que alimenta e é alimentada pelos processos de comunicação
realizados nestes espaços conquistados e constituídos pelos surdos.
Em sua pesquisa, Silva (2008) elencou conceitos da Geografia como territorialidade,
lugar e ambiências à dinâmica das relações do vivido, como possibilidade de tornar o
aprendizado para os alunos em geral, mas especialmente para os alunos surdos, mais coerente
com as suas necessidades. Ampliou as discussões ao trazer questões práticas envolvendo
alunos surdos e suas vivências diárias no contexto da cidade, assim como o processo de
apropriação do espaço vivido, presente em trânsito.
A autora abordou a ideia de lugar como uma categoria de análise presente nos eventos
cotidianos da vida dos surdos, assim compreendidos desde as ações individuais mais banais,
através de seu deslocamento pelas ruas, pelo bairro, e mesmo os acontecimentos políticos e
sociais onde os surdos se fazem presentes.
passagem para o aluno: de uma condição de observador pouco atuante, para uma condição de
agente. Sendo o em torno melhor compreendido, o estudante pode sentir-se protagonista de
outras leituras de mundo.
No ano de 2012, o professor de Geografia Ricardo Lopes Fonseca publicou sua
dissertação intitulada “Praticando Geografia com alunos surdos e ouvintes: uma contribuição
para o ensino de Geografia” pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade
Estadual de Londrina, no estado do Paraná. O estudo discutiu as principais características e a
situação do modelo de inclusão de alunos surdos nas escolas públicas do Brasil, onde esses
alunos estudavam junto com os alunos ouvintes. As reflexões foram direcionadas para a
variedade de implicações sobre o ensino de Geografia para os alunos surdos.
Para a realização da pesquisa, foram escolhidas escolas distribuídas entre dois Núcleos
Regionais de Educação do Norte do Paraná, sendo Maringá (3) e Londrina (3), e mais duas
cidades do entorno: no caso de Maringá foram escolhidas Marialva (1) e Mandaguari (1), e
Cambé (1) e Rolândia (1) para o entorno de Londrina. Consideraram-se colégios que
possuíam alunos surdos matriculados conjuntamente com alunos ouvintes, em todas as séries,
desde o ensino fundamental até o ensino médio.
Foram realizadas entrevistas, por meio de questionários sobre inclusão escolar e
metodologias de ensino de Geografia, com diretores, pedagogos, professores, alunos surdos e
alunos ouvintes. Também foram elaboradas metodologias para o ensino de Geografia em salas
de aulas com alunos surdos e ouvintes. A partir das metodologias, aplicaram-se instrumentos
de ensino, reproduzidos por três vezes em escolas distintas, com o objetivo de averiguar a
validade de cada uma das possibilidades pedagógicas aplicadas, ou seja, se era possível seu
aproveitamento em sala de aula com os dois grupos de alunos. A expectativa foi de verificar,
por meio dessas metodologias desenvolvidas para os dois grupos, se todos os alunos tinham a
mesma compreensão do conteúdo ensinado. (FONSECA, 2012).
Com as entrevistas, o autor constatou que:
numa sala de aula haverá sempre um aluno com dificuldade para compreender determinado
assunto através de uma metodologia específica. Para isso, considerou importante o professor
usar um “plano b” e administrar satisfatoriamente suas aulas.
Com relação ao desenvolvimento das atividades, inicialmente o autor percebeu que
“quando o professor utiliza recursos diferenciados como instrumentos de ensino, os alunos
manifestam, espontaneamente, o interesse por esse tipo de aula e a aceitação e participação
acontecem de maneira totalmente satisfatória”. (FONSECA, 2012, p.108).
Para cada sugestão de metodologia, o autor realizou análises sobre a aplicação dos
instrumentos de ensino, sobre os questionários aplicados aos professores de Geografia e
alunos, assim como sugeriu dicas para melhor utilização de cada uma.
As atividades avaliadas como excelentes e boas foram: brincadeiras e jogos; charges,
tiras e quadrinhos; filmes e vídeos; imagens e fotos; literatura; mapas e atlas; maquetes;
pinturas e saída de campo. Como bom e regular, observaram-se: desenhos; globo terrestre;
gráficos, quadros e tabelas; Internet e computadores; jornais e revistas; músicas; seminário.
Como ruim ou péssima não foi citada nenhuma atividade.
Deve-se levar em consideração que os pesquisados avaliaram não apenas os
instrumentos de ensino, mas a forma como foram utilizados. As opiniões sobre as atividades
propostas apontaram que alguns aspectos precisam ser averiguados para que haja o
aperfeiçoamento das técnicas realizadas, com a finalidade de melhor ensinar os educandos
envolvidos. Ainda de acordo com Fonseca (2012), compete aos educadores estarem mais
atentos aos detalhes que podem fazer os estudantes se dedicarem e se interessarem mais ou
menos pela Geografia. Deve o educador, ainda, procurar em cada conteúdo aprofundar o
conhecimento crítico e os aspectos cognitivos, que envolvam suas aulas, em cada aluno.
O autor constatou que, com referência às linguagens didáticas, elas devem ser visuais
e, consequentemente, devem chamar a atenção dos alunos. Acreditava que seria possível
ensinar um conteúdo para alunos surdos e ouvintes, por meio de uma mesma metodologia de
ensino, desde que fosse desenvolvida sem afetar o rendimento de um e/ou ambos os grupos de
alunos.
Em suma, Fonseca (2012) afirmou que a escassez de recursos metodológicos para o
ensino de Geografia é evidente: “em diversas escolas falta retroprojetor, globo terrestre, atlas,
mapas, enfim, recursos básicos para o bom andamento do ensino geográfico, que com certeza
auxiliariam de maneira significativa o aprendizado do aluno surdo” (Ibid., p.174). Destacou
que esse fato aumenta as falhas do sistema de ensino, já que a falta de instrumentos didáticos
144
A pesquisa concluiu que a maioria dos professores de Geografia não é capacitada para
lecionar para estudantes surdos. Os professores não faziam uso da Libras, com dependência
integral do intérprete, além de desconhecerem as peculiaridades e demandas de ensino para
estudantes surdos.
A autora considerou que “os cursos de Libras e de metodologias de ensino para
estudantes surdos precisam ser oferecidos em horários flexíveis, de preferência, durante os
módulos escolares, no âmbito escolar.” (PENA, 2012, p.166).
A relação dos professores de Geografia com os professores do AEE foi tida como
deficitária. Observou-se a necessidade da criação de momentos em que esses profissionais
pudessem dialogar e, juntos, construir as alternativas para a melhoria do ensino dos estudantes
surdos.
Considerou-se que os entraves apresentados dificultam a realização de práticas
pedagógicas significativas ao processo de escolarização de estudantes surdos e, também,
acabam por restringir a participação deles na sociedade.
A autora constatou que as demandas atuais mais urgentes para a inclusão escolar dos
estudantes surdos na escola comum são: a capacitação dos professores, incluindo o
aprendizado da Libras; a aproximação entre o AEE e os professores da sala de aula comum; a
presença constante do intérprete de Libras, bem habilitado, na sala de aula; e a pesquisa e a
utilização de metodologias e materiais didáticos de Geografia significativos para esses
estudantes.
147
Sobre a inclusão de estudantes surdos em escolas comuns, Pena (2012) concluiu que a
realidade investigada em Uberlândia ilustra um paradoxo. A escola tem a intenção de incluir o
estudante surdo e valorizar o uso da Libras; entretanto, no momento em que ela o insere na
sala de aula comum, composta de alunos surdos e alunos ouvintes que não sabem a Libras,
com o professorado sem formação e sem um apoio pedagógico adequado, há, de fato, uma
integração. Nesse modelo, são os estudantes surdos quem devem se adaptar às práticas
pedagógicas realizadas na escola comum, e não o contrário.
“Caso essa realidade não seja transformada, os estudantes surdos continuarão sendo
vítimas de uma cultura ouvintista, a qual privilegia as metodologias direcionadas para os
estudantes ouvintes” (PENA, 2012, p.170). Diante do exposto, a autora enfatizou que a
comunidade surda defende, cada vez mais, a educação ofertada nas Escolas Bilíngues de
Surdos, sendo, também, defensora dessa causa.
Em 2013, Sarah Andrade publicou pela Universidade Federal de Santa Catarina a
dissertação intitulada “A educação geográfica de estudantes surdos em uma escola polo da
grande Florianópolis”. O objetivo do trabalho foi investigar como ocorria a inclusão de
estudantes surdos na disciplina de Geografia, em uma Escola de Educação Básica localizada
em São José-SC, a qual possuía 36 estudantes surdos.
A autora analisou na escola duas possibilidades de educação de estudantes surdos no
ensino comum: a) educandos surdos inseridos com todos os alunos em diferentes
séries/turmas; b) uma turma formada apenas por estudantes surdos33. Na primeira, a língua de
comunicação e ensino era o português, tendo um intérprete de Libras. No segundo caso, a
Libras era a primeira língua e o português era aprendido ou utilizado em situações
necessárias, constituindo o que se designa de turma bilíngue.
O processo educativo dos alunos surdos foi pesquisado, inicialmente, por meio da
análise de documentos escolares, como o Projeto Político Pedagógico da escola e os
planejamentos dos professores de Geografia. Posteriormente, foram observadas aulas de
diferentes disciplinas e, especialmente, as aulas de Geografia. Por fim, realizaram-se
entrevistas com a comunidade escolar (professores da Sala de Recursos, intérpretes de Libras
e professores de Geografia) e com alunos surdos.
33
De acordo com a autora, a sala de aula bilíngue da escola foi formada em 2005, na 2ª série do ensino
fundamental, através de um projeto elaborado pela direção e coordenação da escola. Entretanto, a Secretaria do
Estado da Educação não permitiu a abertura de novas turmas bilíngues nas escolas estaduais, já que a política
educacional predominante no Brasil é de tentar incluir alunos surdos com alunos ouvintes. Esse caso é a primeira
turma Bilíngue de Santa Catarina.
148
34
Tablet é um tipo de computador portátil, de tamanho pequeno, fina espessura e com tela sensível ao toque
(touchscreen).
151
Enfatizou que, da mesma forma que em uma aula para ouvintes não basta saber falar
português para um bom ensino de Geografia, para os surdos também não basta saber Libras.
A singularidade visuoespacial do sujeito surdo deve referenciar de forma construtiva as
estratégias pedagógicas.
Afirmou ser imprescindível que as escolas contem com salas de vídeo, onde seja
possível apresentar seleção de imagens e vídeos que acompanhem e complementem as aulas.
Um livro didático de Geografia em Libras também permitiria ao professor superar algumas
limitações. No INES, as salas de aula possuíam TV LCD de 46”, quadro interativo, e
estudantes com tablets, com os quais podiam ampliar as possibilidades do aprendizado na sala
de aula e em casa.
Sobre a possibilidade de educação de surdos em dois modelos de ensino, na escola
comum e na Escola de Surdos, o autor se disse cada vez mais convicto, ao lado do movimento
surdo, na defesa da existência das Escolas Bilíngues para Surdos como espaços importantes
para o aprendizado e constituição linguística e cultural dessa comunidade.
O autor destacou a importância das Escolas Bilíngues para Surdos, tendo em vista não
apenas os aspectos pedagógicos, mas também sua centralidade territorial, política e cultural
para a comunidade surda. Considerava que esse espaço de ensino “é o lugar ideal para o
desenvolvimento da Libras, para o surgimento de novos sinais, termos e conceituações para as
diferentes disciplinas, uma questão importante para a construção do conhecimento”.
(ARRUDA, 2015, p.90).
Também acreditava que as escolas comuns devem ser capazes de atender dignamente
aos surdos, respeitando e valorizando sua língua, sua cultura e suas potencialidades. Além do
intérprete em sala, disse ser fundamental um material didático bilíngue, adaptado às
necessidades visuais do surdo, favorecendo a acessibilidade aos conteúdos e ao conhecimento
e, não apenas, o compartilhamento do espaço escolar com os ouvintes.
Diante das questões apresentadas, assim como da escassez de trabalhos científicos e de
debates que abordam o ensino de Geografia para surdos, vinculados à falta de material
152
sujeitos podem ser aliadas aos conhecimentos geográficos, propiciando construções teóricas e
espaciais.
Com relação ao ensino de Geografia, algumas considerações foram recorrentes na
maioria dos trabalhos, como, por exemplo, a necessidade da utilização de metodologias de
ensino que explorem os recursos visuais como instrumento de ensino, aliados à valorização da
Libras e sua utilização como primeira língua – como forma de comunicação e expressão,
durante as aulas e nas avaliações.
A centralidade da questão visual foi recorrente nas dissertações, enfatizando-se que ela
seja aliada à contextualização dos conceitos em Libras e às vivências dos estudantes. Para
isso, destacou-se a importância da utilização das novas tecnologias de informação e
comunicação, como: notebook, projetor multimídia, TV, Internet, Tablets, dentre outros,
tendo em vista que esses recursos possibilitam a apresentação de slides, vídeos, filmes,
imagens, fotografias, palavras, frases e textos curtos, os quais exploram a visualidade e
despertam o interesse e o aprendizado dos estudantes surdos.
Os autores também destacaram como práticas pedagógicas promissoras para o ensino
de Geografia para surdos: o trabalho de campo e o estudo do meio; o uso de mapas, atlas e
maquetes; os mapas conceituais; os desenhos e pinturas; as brincadeiras e jogos; as charges,
tiras e quadrinhos; as dramatizações; a literatura, os jornais e revistas; os gráficos, quadros e
tabelas; e os cartazes.
Observou-se que a Geografia é um conteúdo escolar capaz de empregar recursos
variados no estudo dos diferentes conceitos apresentados, como: espaço, territorialidade,
lugar, paisagem, ambiência, tempo e ser social. Entretanto, notou-se ser necessária a
utilização desses recursos aliada à mediação significativa do professor de Geografia bilíngue
capacitado, o qual deve atender as demandas linguísticas, pedagógicas e culturais dos
estudantes surdos.
Sobre a realidade das escolas, dentre as nove dissertações analisadas, foram cinco as
que abordaram o ensino de Geografia para surdos matriculados na escola comum, incluindo a
pesquisa realizada em uma classe bilíngue de surdos. Os demais trabalhos foram
desenvolvidos pesquisando-se profissionais e/ou práticas pedagógicas em Escolas de Surdos.
Os cinco autores que realizaram suas pesquisas em escolas comuns concluíram que a
maneira como o ensino de Geografia vem ocorrendo na sala de aula não está conduzindo os
surdos à educação geográfica. Concluiu-se que a inclusão escolar de surdos nesse espaço
escolar, apesar de atender à maioria dos surdos brasileiros, não tem sido realizada de maneira
satisfatória.
156
CAPÍTULO VII
Nas escolas comuns, onde estudantes surdos estudam com estudantes ouvintes,
pesquisas35 apontaram que os professores de Geografia não estão ministrando aulas que
consigam atender as demandas educativas dos dois grupos de alunos. Dentre as dificuldades
para a inclusão dos surdos, constatou-se a falta de formação docente – inicial e continuada –,
a ausência de recursos visuais e materiais, a falta de comunicação entre alunos e professores, a
necessidade de contato com seus pares, o grande número de alunos por turmas, a falta de
metodologias de ensino e de recursos adequados, assim como a realização dos processos de
ensino e aprendizagem pautados numa base ouvinte.
Já nas Escolas de Surdos, autores como Arruda (2015) defendem que as possibilidades
dos estudantes aprenderem Geografia são maiores, tendo em vista que as aulas são
direcionadas para eles, utilizando-se, principalmente, recursos visuais e a Libras como
primeira língua.
Para se conhecer melhor a forma como o ensino de Geografia está sendo desenvolvido
nas Escolas de Surdos, este capítulo propõe apresentar e discutir a formação docente, as
concepções, e as práticas pedagógicas dos professores de Geografia das escolas pesquisadas.
Para isso, realizaram-se entrevistas com cinco professores das seguintes escolas: Instituto Seli
(SP); Escola para Surdos Dulce de Oliveira (MG); Instituto Santa Inês (MG); Escola Bilíngue
Libras e Português-Escrito (DF); Centro Especial Elysio Campos (GO).
Na seleção dos sujeitos da pesquisa, seguiu-se o critério do professor estar ministrando
aulas de Geografia nas Escolas de Surdos, para os anos finais do Ensino Fundamental (6º ao
9º ano). As entrevistas foram realizadas pela doutoranda, no âmbito das escolas pesquisadas,
entre os anos de 2015 a 2017, seguindo um roteiro de entrevista semiestruturado (Apêndice
A). As entrevistas tiveram seus áudios gravados e, posteriormente, foram transcritas e
analisadas.
Para a apresentação das informações e suas análises, este capítulo foi dividido de
acordo com as categorias temáticas criadas, a saber: a) a formação docente dos professores
entrevistados; b) suas concepções com relação à Escola de Surdos; c) os materiais didáticos e
35
As pesquisas foram desenvolvidas por professores de Geografia, como Silva (2003), Fonseca (2012), Pena
(2012) e Andrade (2013).
159
- Especialização em Educação
Letras, História Especial
P3 Sim
e Geografia - Especialização em Metodologia de
Ensino de História
- Especialização em Libras (cursando)
P4 Geografia Sim
- Especialização em Geografia
- Especialização em Libras
Estudos Sociais
P5 - Especialização em Deficiência Sim
e Geografia
Intelectual
Fonte: Pesquisa de campo realizada em Escolas de Surdos, de 2015 a 2017. Org: PENA, F.S., 2017.
Para mim é uma surpresa conhecer você, uma professora de Geografia que
também domina Libras. Se vê hoje muitos professores de História que
ensinam Geografia para Surdos, devido à falta de professores capacitados.
(P5).
Esse fato pode comprometer o ensino dos conhecimentos geográficos, uma vez que o
curso de licenciatura em Geografia possibilita o domínio sobre o conteúdo curricular, que
abrange tanto as competências e habilidades docentes, como os conceitos que perpassam os
conteúdos programáticos.
Também, segundo a professora P5, a falta de profissionais que saibam Libras é um
problema para a educação dos surdos. A mesma teve facilidade em atuar nesta área,
meramente por ter aprendido a língua.
Deve-se considerar que o fato de saber Libras não significa que o professor consiga
ministrar aulas significativas para os estudantes surdos, do mesmo modo que não basta saber
a Língua Portuguesa para ministrar boas aulas para os estudantes ouvintes. São necessários
conhecimentos sobre a cultura surda, as metodologias de ensino e os recursos didáticos que
podem contribuir para aulas inclusivas com surdos.
Também sobre a formação inicial, os professores foram questionados se, durante o
curso de licenciatura em Geografia, foram formados para ministrar aulas para estudantes
surdos. Duas professoras afirmaram que foram parcialmente formadas, sendo que a professora
P3 cursou uma disciplina de Libras, e a professora P5 disse que foi convidada a estagiar na
Prefeitura Municipal, em um programa de inclusão de alunos com deficiência e com surdos,
durante o segundo ano da Graduação. “Neste estágio aprendi Libras com os próprios surdos”
(P5).
Os demais professores disseram que não foram formados, durante a graduação, para a
educação de surdos. Entretanto, com relação aos cursos de formação continuada, na área da
surdez, todos os professores participaram de cursos de Libras – básico, intermediário e
avançado, oferecidos por Associações de Surdos, Igrejas, escolas e institutos. Duas
professoras estavam cursando, também, Especialização em Libras, e outra já havia concluído.
O professor P1 havia cursado Especialização em Educação Especial.
Três professores relataram que, anteriormente aos cursos, haviam tido contato com
pessoas surdas e se interessaram em aprofundar o aprendizado da Libras. A professora P3
163
afirmou que o seu interesse pela área de educação de surdos iniciou devido ao convívio com
um irmão mais novo, o qual é surdo. Entretanto, de acordo com ela “conhecer uma pessoa
surda não significa que você sabe Libras. Eu comecei a me comunicar, de fato, em Libras,
após os cursos” (P3).
Apesar dos professores não terem sido contemplados com uma formação inicial
adequada para os estudantes surdos, observou-se que todos buscaram cursos complementares
para atender as peculiaridades desse grupo de estudantes.
Sobre a importância de o professor dominar a Libras na educação dos surdos, todos os
professores entrevistados afirmaram ser fundamental, justificando que:
Não existe contato efetivo entre o aluno surdo e o professor, se não for por
meio da Libras. (P1).
Você vai encontrar surdos bem oralizados, que entendem bem a fala, mas
existem surdos que não falam nada. E tem surdos que não falam e que não
sabem Libras. Então, você utiliza todos os recursos: Libras, oralização e
mímica. Na aula o mais importante é se comunicar. Vai depender do que o
aluno sabe. (P3).
A Libras, sendo a língua utilizada pela comunidade surda brasileira, é primordial para
a comunicação e a construção dos conhecimentos, junto aos estudantes surdos, sendo
valorizada pelos professores entrevistados.
Assim como afirmou a professora P3, há também uma grande diversidade linguística
do alunado, em uma mesma turma: alunos com distintos níveis de fluência em Libras, sendo
que alguns também são oralizados. O estágio cognitivo também pode variar, pois alguns
alunos possuem maiores conhecimentos prévios e outros adquiriram uma língua tardiamente.
Essas diferenças exigem do professor uma dedicação extra, na intenção de atender todas as
demandas linguísticas e cognitivas dos estudantes.
Sobre o domínio da Libras, duas professoras de Geografia afirmaram que possuem
domínio avançado, mas que não utilizam muitos sinais próprios da Geografia. Três
professores, além do domínio avançado, utilizam sinais na área de Geografia.
164
As duas professoras que disseram não dominar muitos sinais na área de Geografia
justificaram que não há padronização ou sistematização dos sinais geográficos, assim como
ocorre em outras áreas escolares. São utilizados classificadores36 e combinam-se sinais com
os estudantes.
As pesquisas estudadas no Capítulo VI, em especial aquelas dos autores Machado
(2007) e Arruda (2015), enfatizam essa questão. Elas afirmam a necessidade de se compilar,
criar e divulgar os sinais específicos de Geografia, para que haja um ensino mais significativo.
Ao se analisar o perfil dos professores de Geografia das Escolas de Surdos, percebe-se
que, apesar de não terem sido formados para a educação desses estudantes durante a
graduação, buscaram se capacitar e especializar para atender as demandas desse grupo de
alunos. Se identificam e acreditam na proposta da Educação Bilíngue, reconhecendo a
importância da Libras.
Entretanto, deve-se questionar o fato de professores de outras áreas estarem
ministrando Geografia, e vice-versa. Espera-se que a inserção da disciplina de Libras nos
cursos de licenciatura incentive os novos professores a se envolverem com a comunidade
surda e aperfeiçoarem suas competências para a educação de surdos.
sempre esse aluno sabe Libras. E as outras tantas coisas que ele precisa?
Aqui na escola eles têm um atendimento mais especializado. (P3).
que contemplou o “Dia do Surdo”. O resultado, de acordo com a mesma, foi ótimo,
justificando que foram trabalhadas a identidade e a cultura surda.
A equipe pedagógica da escola da professora P5 realizava reuniões mensais, onde os
professores e a direção conversavam sobre os estudantes. A professora entrevistada também
afirmou que eram realizados trabalhos interdisciplinares pelos professores. No ano de 2016,
trabalharam com os estudantes sobre as drogas e as doenças sexualmente transmissíveis. No
ano de 2017, estava sendo realizado um projeto de contação de histórias, com temas diversos.
Nota-se que todas as Escolas de Surdos pesquisadas desenvolvem encontros e projetos
em que são contempladas as necessidades educacionais dos estudantes surdos. São realizadas
discussões e parcerias entre os professores, os quais buscam trabalhar conceitos e temas de
forma interdisciplinar.
Foi observado que a escola não disponibilizava material em Libras, sendo a própria
professora quem elaborava e criava materiais com imagens e materiais concretos.
Com relação aos materiais didáticos, a professora P5 utilizava, no ensino de
Geografia: folha A4 com impressões coloridas, mapas, maquetes, sua coleção particular de
rochas, e materiais de reciclagem. Utilizava sua impressora pessoal para fazer os materiais,
por considerar um pouco burocrático solicitar as impressões na escola.
De acordo com a mesma, “eu vejo a Geografia em várias situações e adapto o ensino
em vários materiais”. (P5).
Um exemplo dado sobre a adequação de material foi a elaboração, pela professora e
pelos alunos, de um mapa com bolinhas de papel crepom coloridas e os sinais em Libras.
A professora acreditava que esses materiais didáticos eram eficazes para os alunos
surdos, principalmente quando contextualizados com a realidade dos estudantes.
Além de dominar a Libras, a professora P5 afirmou que era fundamental o professor
de estudantes surdos ter conhecimento do conteúdo a ensinar e das metodologias a serem
utilizadas.
O trabalho de campo era realizado pela professora que já havia visitado com os
estudantes uma Serra na região e um Edifício histórico, para ver a estrutura urbana do
município onde atuava. Disse que pretendia realizar outros trabalhos, pois, como para
qualquer outro aluno, considerava ser uma atividade muito rica.
A professora justificou sua opinião sobre trabalho de campo, afirmando que: É uma
observação feita com um orientador, não é um passeio. Nós fazemos um roteiro e elaboramos
um manual para os alunos preencherem. Eles podem ter outra visão dos lugares. (P5).
Em síntese, podem-se verificar as metodologias de ensino e os materiais didáticos
mais utilizados pelos professores de Geografia, nas escolas pesquisadas, no quadro 5. Por se
tratar de uma entrevista semiestruturada, os professores ficaram livres para falarem quais
materiais didáticos e metodologias de ensino utilizavam.
O livro didático, um dos recursos mais utilizados na escola comum, não foi citado por
nenhum professor. Apenas a professora P3 citou o mesmo, informando que: Eu não adoto
173
livro didático, pois o aluno não consegue, por exemplo, estudar o livro sozinho, fazer a
leitura do capítulo. Uso uma coisa ou outra. Vou tirando xerox e trago para a escola. (P3).
O professor pesquisador Arruda (2015), assim como discutido no Capítulo VI, aborda
a necessidade da criação de livros didáticos bilíngues, com textos traduzidos em Libras, por
meio de CD, juntamente com os conceitos e imagens.
Metodologias e Materiais P1 P2 P3 P4 P5
Aula expositiva dialogada em Libras
Imagens
Mapas
Computador / Notebook
Internet
Vídeos
Trabalho de Campo
Cartaz
Sala de Informática
Projetor Multimídia
TV
Jogos
Maquete
Recortes de Jornais e Revistas
Impressões Coloridas
Apresentações de trabalhos em Libras
Estúdio de vídeos em Libras
Fonte: Pesquisa de campo realizada em Escolas de Surdos, de 2015 a 2017. Org: PENA,
F.S., 2017.
O trabalho de campo foi realizado com frequência, sendo que a única professora que
não havia desenvolvido essa atividade estava na escola há apenas sete meses e não era
formada em Geografia.
As escolas, apesar de apresentarem dificuldades para financiar trabalhos de campo e
adquirirem novos materiais, disponibilizavam diferentes recursos tecnológicos, como
notebook, computadores, projetor multimídia e TV nas salas de aula. Tais recursos são
essenciais para a educação dos surdos, uma vez que permitem a utilização de imagens, vídeos
e informações diversas para os estudantes.
Uma demanda observada foi a criação de estúdios de Libras nas escolas, pois ele
possibilita a gravação de materiais em Libras, como a videoaula e a tradução de textos, os
quais podem ser utilizados tanto na sala de aula, como em casa, pelos estudantes surdos.
Apenas na escola da professora P2 há a utilização desse estúdio.
Também se analisou a necessidade da criação e disponibilização de materiais de
Geografia bilíngues, em Libras e português escrito, sendo identificado que os professores
elaboravam seus próprios materiais, associando imagem, palavras e Libras.
No Capítulo IX será aprofundada a discussão sobre os recursos didáticos utilizados nas
Escolas de Surdos, a partir das observações realizadas nas pesquisas de campo.
Com relação à forma como os professores avaliavam o desenvolvimento dos
estudantes surdos, de acordo com os conhecimentos geográficos adquiridos, o professor P1
afirmou que realizava avaliações por meio de prova bimestral, seminários e atividades
continuadas. Ele procurava imprimir as atividades com imagens, mapas coloridos e textos
curtos, para que os estudantes Surdos tivessem melhor compreensão do que estava sendo
solicitado.
A professora P2 afirmou que os estudantes eram avaliados de forma escrita e,
principalmente, em Libras, pois considerava que por meio de sua língua natural o surdo teria
maior facilidade em expressar o que aprendeu.
A professora P3 informou que a escola exigia uma prova na Língua Portuguesa escrita.
Os demais pontos eram os professores que organizavam, em trabalhos em sala de aula,
participação e atividades da sala e de casa, em uma avaliação continuada.
No que diz respeito ao aprendizado dos estudantes, na Escola de Surdos, a professora
afirmou:
A professora P4 disse que os surdos eram avaliados pela Libras, pela Língua
Portuguesa escrita, por trabalhos e atividades, assim como pela participação em sala de aula.
A figura 36 apresenta um momento em que os estudantes estavam realizando uma
prova de Geografia na Língua Portuguesa, sendo auxiliados pela professora com a
interpretação de algumas palavras desconhecidas (tanto na leitura como na escrita).
avaliação. Com auxílio do projetor multimídia, a professora projetava os slides com imagens e
questões sobre os temas estudados (figura 37). Era solicitado que o aluno explicasse, em
Libras, características e questões pré-definidas sobre as imagens.
Observou-se que os alunos se sentiam confortáveis durante as avaliações em sua
primeira língua, pois utilizavam muitos sinais e classificadores em Libras para apresentarem
os seus conhecimentos geográficos. Conseguiam discorrer mais amplamente sobre as questões
solicitadas, do que nas provas em português, por seu domínio limitado dessa Língua.
Autora: PENA, F.S., 2015. Fotografia da realização de prova em Libras, utilizando-se slides,
projetados no quadro negro.
A opinião da professora P5 está de acordo com o que propôs Arruda (2015), quando o
mesmo afirma que as avaliações em Língua Portuguesa escrita privilegiam os estudantes
surdos que dominam mais essa língua, e não necessariamente aqueles que compreenderam
melhor os conhecimentos geográficos.
Observou-se que os professores de Geografia entrevistados, durante as suas
avaliações, procuravam avaliar os estudantes surdos não apenas por meio da Língua
Portuguesa escrita, como ocorre na maioria das escolas comuns. Eles valorizavam os
conhecimentos que os estudantes surdos construíram, por meio de avaliações em Libras.
Quando as avaliações eram escritas, os professores utilizavam imagens e textos curtos,
fazendo com que o estudante compreendesse, sozinho, o que era lhe solicitado. A forma
singular dos estudantes surdos escreverem, similar à estrutura da Libras, não era considerada
como um erro.
todas as maneiras, os conceitos geográficos, assim como fazer uma ligação com a realidade
dos estudantes surdos.
Assim como a professora P2, a professora P5 acreditava que o maior desafio era a falta
de sinais de Libras específicos da Geografia. “Para não ficar soletrando as palavras, crio e
combino sinais com os alunos. Explico para eles que aquele sinal não existe, mas que
podemos combinar para utilizar nas aulas”. (P5). A professora complementou que os maiores
desafios do ensino de Geografia para os estudantes surdos são encontrados na escola comum.
As pesquisas da área, discutidas no Capítulo VI, confirmam o que a professora P5
afirmou. São muitos os desafios na escola comum, para o ensino de Geografia para surdos.
Além da falta de sinais de Libras específicos da Geografia, os professores não são formados
para atender esse grupo de alunos, não possuem recursos didáticos e atendem a um número
grande de alunos por turma, sendo eles, na maioria, ouvintes.
Para além dos desafios, todos os professores também discorreram sobre a importância
do ensino de Geografia para os estudantes surdos.
O professor P1 informou que:
A professora P4 afirmou:
A professora P5 alegou:
Não vou falar para eles adaptarem o currículo, o que a maioria tem falado. É
preciso adaptar a metodologia de ensino. O professor deve ser capaz de
trazer para a escola novas formas de ensinar. Às vezes ele tem em casa
caixinhas de leite, pedrinhas do quintal, e muitas outras coisas que podem
fazer uma aula diferente. Quando ele adapta sua forma de ensinar Geografia,
ele não precisa saber Libras. Ele consegue ensinar qualquer aluno – Surdo,
ouvinte, aluno com deficiência intelectual – porque ele vai utilizar outros
tipos de recursos para chegar naquele aluno. (P5).
CAPÍTULO VIII
Cada vez mais, a Geografia escolar vem se colocando como uma área de
conhecimento envolvida socialmente com a produção da condição humana e com a produção
consciente dos espaços, sejam eles naturais, sociais, culturais ou políticos. A aprendizagem de
Geografia na educação básica contribui para a formação de uma consciência espacial, desde
suas dimensões locais às mais globais, assim como de cidadania, sendo comprometida com a
realidade socioespacial.
Essa ciência é um instrumento curricular que possibilita aos estudantes surdos
conhecer, analisar, interpretar e agir na realidade espacial construída e materializada como
produto e processo das relações socioespaciais. Para que ocorra um melhor ensino e
aprendizado dos conhecimentos geográficos, é preciso verificar como esse grupo de
estudantes percebe a Geografia e compreende melhor os seus conceitos.
O presente capítulo considera que a opinião e os sentimentos dos estudantes precisam
ser conhecidos e analisados. No que tange ao ensino e à aprendizagem de Geografia, foram
aplicados questionários em cinco Escolas de Surdos, apresentadas nos Capítulos III, IV e V,
durante as pesquisas de campo realizadas pela pesquisadora. Participaram os alunos do 9º ano
do Ensino Fundamental, por entender-se que eles possuem mais experiências e vivências,
quando comparados aos alunos dos anos anteriores.
Os questionários foram aplicados pela pesquisadora, no espaço escolar, durante as
aulas de Geografia. Optou-se por pesquisar os estudantes surdos por meio de questionários na
Língua Portuguesa escrita, devido à variação da Libras que ocorre nos estados brasileiros e às
demandas de maior tempo e de autorizações para se fazerem as filmagens. Respeitando-se a
língua natural dos surdos, as questões foram interpretadas em Libras e os estudantes foram
auxiliados durante o seu preenchimento. Muitas vezes, quando desconheciam a palavra que
queriam expressar, respondiam em Libras para que a pesquisadora ou os professores
pudessem transcrever para a Língua Portuguesa, sem comprometer o conteúdo das respostas.
As ideias dos estudantes foram transcritas neste capítulo de acordo com a norma
gramatical da Língua Portuguesa, para melhor entendimento das respostas, pois a escrita dos
surdos apresenta particularidades relacionadas à língua de sinais, as quais podem incidir na
estrutura sintática da Língua Portuguesa.
182
Instituto SELI 16
Total 42
Fonte: Pesquisa de campo realizada em cinco Escolas de Surdos, de 2015 a 2017.
Org. PENA, F. S., 2017.
12
10
0
14 anos 15 anos 16 anos 17 anos 18 anos 19 anos 20 anos Mais de 20
anos
Masculino Feminino
1 a 2 anos
3 a 4 anos
5 a 6 anos
7 a 8 anos
9 a 10 anos
11 a 12 anos
0 2 4 6 8 10 12
A maioria dos estudantes entrevistados conheceu a Escola de Surdos por meio de seus
familiares, quando os pais tiveram conhecimento das escolas e os matricularam. Também
conheceram a escola quando amigos surdos foram transferidos para a mesma, sugerindo a
transferência dos colegas.
Eu não sabia que tinha uma escola para surdos. Minha melhor amiga se
transferiu para cá e minha mãe decidiu me matricular. (E14).
O motivo principal que levou a estudar nessa escola, de acordo com os estudantes, foi
o fato da Libras ser a língua de instrução e de comunicação com os colegas e os professores.
Observam-se algumas opiniões, nas quais enfatizam tais motivos:
Porque é mais fácil aprender quando a professora usa Libras para ensinar.
(E13).
Porque a escola é muito boa. Converso com os surdos, tem professores que
sabem Libras. Posso brincar, passear, etc. (E11).
185
Assim como defendido pelos pressupostos da Educação Bilíngue, o fato da Libras ser
a primeira língua da escola confere legitimidade e prestígio a ela como língua curricular e
constituidora da pessoa surda. É uma língua visual que atende as necessidades dos estudantes
surdos, possibilitando relações de pensamento, comunicação e aprendizagem. Além disso, o
encontro de usuários de uma língua comum, como ocorre nas Escolas de Surdos, possibilita o
seu fortalecimento e a ampliação da fluência dos estudantes.
Além de apresentarem a importância da Libras ser a L1, os estudantes demonstraram o
sentimento de pertencimento à escola. Nesse espaço, eles tinham a oportunidade de conviver e
estudar com seus pares, em um ambiente pensado e planejado para eles.
As opiniões dos estudantes destacam o sentimento apresentado:
Porque essa escola é dos surdos e é minha também. Sou surda! (E33).
Gosto muito. Consigo fazer as provas e tenho muitos amigos surdos. (E8).
Gosto de tudo, porque todos os amigos são surdos e usam Libras. (E16).
186
Gosto das amizades, das aulas em Libras, é tudo o que eu queria. (E14).
Eu não gostava porque era difícil entender a aula. Também atrapalhava ter
intérprete. (E2).
Os outros sete estudantes citaram que gostavam dos amigos surdos, de brincar, do
professor, dos colegas ouvintes e do recreio.
Questionados sobre o que não gostava na Escola de Surdos, a maioria (62%) informou
que “nada” ou que “gosta de tudo”. Destaca-se a fala da aluna E42: “Nada, eu gosto muito de
estudar na Escola Bilíngue”.
Dez alunos (14%) citaram que não gostam nas Escolas de Surdos de brigas e bagunça,
e outros consideraram alguns conteúdos escolares. Também foi citado, uma vez: fofoca,
castigo, uma colega em específico, Matemática e Português.
As opiniões dos estudantes com relação ao que não gostam na Escola de Surdos
mostram que nenhum aspecto específico dessa instituição foi considerado ruim. Eles citaram
questões pertinentes a todos os estudantes em idade escolar, como as discussões, conversas e,
até mesmo, conteúdos escolares com os quais possuem menos afinidade.
Sobre o que não gostavam na escola comum, apareceram alguns problemas
semelhantes. Alguns pesquisados discorreram sobre “bagunça”, “brigas” e “confusões”.
Também falaram sobre bullying37, devido à diferença de comunicação dos surdos:
Outra questão levantada foi o fato da Língua Portuguesa ser a língua de instrução da
escola comum. Nessa escola, os aspectos educacionais de ensino propostos aos alunos surdos
têm sido elaborados a partir de uma perspectiva dos professores ouvintes, tendo-se a língua
oral como principal forma de comunicação.
Os conteúdos desenvolvidos pelos educadores ouvintes, em sua maioria, são
elaborados desconsiderando as necessidades dos alunos surdos. A Língua Portuguesa escrita é
ensinada para eles utilizando-se metodologias direcionadas para os ouvintes. Com isso, a
maioria dos surdos não consegue interpretar textos ou escrever, até mesmo, palavras do
cotidiano. Foram expostas algumas dificuldades enfrentadas:
Tinha poucos amigos para conversar. Não gostava, pois era o único surdo e
tentava ler, mas não entendia. (E18).
37
Entende-se como bullying os atos de violência física ou psicológica, intencionais e repetidos, realizados em
uma relação desigual de poder, no caso, pela maioria ouvinte com a minoria surda.
188
Na escola comum têm sido corriqueiras as concepções de que o surdo não é capaz e
não vai aprender, devido à falta de audição. Alguns estudantes, durante a aplicação dos
questionários, informaram que os professores da escola comum, muitas vezes, mostravam as
respostas e distribuíam notas, sem que eles estivessem aprendendo.
Quando os professores observam que os estudantes surdos não estão obtendo sucesso
escolar é necessário refletir sobre as práticas pedagógicas, as quais, em sua maioria, são
inadequadas para esse grupo de alunos, na busca por transformá-las.
As respostas expressas pelos estudantes surdos causam desconforto e angústia, pois
são diversos os problemas que encontram na escola comum. Os sentimentos de muitos podem
ser resumidos na fala da aluna E4:
Com relação aos professores de Geografia, onze estudantes tiveram aulas com
professores de conteúdo específico na escola comum, pois estudaram nos anos finais do
189
Ensino Fundamental. Dentre eles, nove informaram que o professor não sabia Libras e dois
que o professor sabia alguns sinais.
A estudante E15 considerou que:
Sobre a forma como eram avaliados na escola comum, apenas dois estudantes
disseram que eram avaliados utilizando a Libras. Um estudante afirmou que:
Difícil. (E18).
aplicadas na Língua Portuguesa escrita, o que não propicia aos estudantes surdos
demonstrarem os seus conhecimentos geográficos aprendidos. Diante do insucesso escolar,
com as notas baixas, muitos professores permitem que os estudantes surdos copiem as
respostas, ou, até mesmo, distribuem nota sem a devida avaliação dos seus conhecimentos,
assim como exposto pela estudante surda.
Esse tipo de atitude assistencialista tira o direito dos surdos de aprender, pois eles não
recebem uma educação adequada para as suas diferenças linguísticas e culturais, não
aprendem e, mesmo assim, são avaliados como aptos para ingressarem no próximo ano
escolar. Igualmente como mostrou o gráfico 3, a maioria dos estudantes acredita ter aprendido
pouco os conhecimentos geográficos, ensinados na escola comum. Eles memorizavam alguns
nomes, sem compreender de forma crítica os conceitos que estavam sendo ensinados.
aprendizagem. Supõe-se práticas imagéticas mediadas, uma vez que o professor precisa
contextualizar e criar significados para o que é apresentado, em Libras. A aluna E22 destacou:
Os estudantes foram questionados sobre como deveria ser a aula de Geografia para
que eles pudessem aprender melhor. A maioria citou a necessidade do professor realizar aulas
em Libras. A aluna E15 destacou:
Aqui é melhor, aprendo rápido, pois entendo a Libras que a professora fala.
(E13).
194
Sim, porque não precisamos copiar tanto, a professora explica bem com as
imagens. (E17).
Ótima
86%
Outra questão a ser analisada é a de que “não precisamos copiar tanto”. Na escola
comum, geralmente, os professores solicitam aos seus alunos muitas cópias do quadro negro,
de textos, nas atividades e trabalhos.
Para os estudantes surdos, as cópias não têm significado e sentido, pois a maioria não
interpreta os textos extensos, quando se está lendo ou escrevendo, sendo necessária a tradução
para a Libras.
Na Escola de Surdos, os professores possuem a tendência de trabalhar com imagens e
textos menores. As palavras-chave e conceitos podem ser explicados em Libras, para que o
estudante faça a associação. Desse modo, eles não irão apenas copiá-los, mas compreendê-los.
Um estudante que afirmou aprender “médio” justificou que:
Para ver o que o mundo é, o que acontece com os climas de cada país. O
mundo é diferente. (E15).
CAPÍTULO IX
Autora: PENA, F.S., 2015. Fotografia de aula de Geografia em que a professora apresentou
um evento ocorrido em município do estado de Minas Gerais, relacionando conteúdos de
Geografia como economia, cultura, impactos ambientais e localização. Uberaba, 2015.
201
Autora: PENA, F.S., 2015. Fotografia do Livro Ilustrado de Língua Brasileira de Sinais, com a capa
apresentada do lado esquerdo e, do lado direito, o exemplo de uma folha com sinais dos estados brasileiros. O
livro apresenta o sinal em Libras, o nome do estado com um desenho dos seus limites, assim como uma
descrição do sinal, identificando a configuração de mãos (CM), o ponto de articulação (PA), o movimento (M),
e a orientação (O) de cada sinal. Uberaba, 2015.
a confecção de mapas com sinais em Libras, pesquisas sobre a região Sudeste, exposição de
trabalhos e levaram para a escola comidas típicas.
Na figura 47, observa-se um mapa do Brasil, com os nomes dos estados identificados
na Língua Portuguesa. Ao lado, estão sinais de regiões do Brasil e de alguns estados. O mapa
poderia ser mais bem elaborado, utilizando-se cores e outros elementos cartográficos, como o
título, a rosa dos ventos, legenda e escala. Também se notou que os sinais em Libras não
identificaram todos os estados brasileiros do mapa.
Autora: PENA, F.S., 2015. Fotografia de um mapa do Brasil, com a localização dos
estados brasileiros, e de sinais referentes às Regiões do Brasil, no Instituto Santa
Inês. Belo Horizonte, 2015.
Na sala de aula do Instituto Santa Inês não foi verificado nenhum recurso didático
visual para o ensino de Geografia, apenas o quadro negro. A professora relatou, durante a
entrevista, que os mapas e imagens eram expostos no projetor multimídia e também impressos
nas atividades e textos de estudos.
Também foi relatado que, ao serem realizados trabalhos de campo, utilizavam-se
mapas e croquis para que os estudantes surdos pudessem se localizar espacialmente.
Com a visita ao Instituto Santa Inês, verificou-se que não havia na escola materiais
didáticos de Geografia, bilíngues ou não. Também não foi possível constatar se, de fato, a
professora utilizava durante as suas aulas a Libras para se comunicar com os estudantes
209
surdos, ou os recursos visuais. Havia uma restrição de recursos oferecidos pelo Instituto e as
práticas pedagógicas eram pautadas nos pressupostos da Comunicação Total.
Com relação à Escola Bilíngue Libras e Português-Escrito, na semana em que a
pesquisa foi realizada não foram ministradas aulas de Geografia, devido à escola estar
comemorando o Setembro Azul com atividades culturais, como teatros e palestras.
Na sala de aula de Geografia da Escola Bilíngue Libras e Português-Escrito foram
observados dois mapas. Conforme ilustra a figura 48, do lado esquerdo da parede encontra-se
o Mapa-múndi impresso e, do lado direito, um mapa do Brasil confeccionado, com os nomes
dos estados e seus respectivos sinais, em Libras.
Autora: PENA, F.S., 2016. Fotografia de mapas fixados na sala de aula de Geografia da Escola Bilíngue Libras e
Português-Escrito. Taguatinga, 2016.
Autora: PENA, F.S., 2016. Fotografia do mapa do Brasil com sinais em Libras,
elaborado pela professora de Geografia e pelos estudantes surdos da Escola
Bilíngue Libras e Português-Escrito. Taguatinga, 2016.
Autora: PENA, F.S., 2016. Fotografia de trabalho realizado sobre as regiões do Brasil, cujas folhas impressas
foram fixadas na parede da Escola Bilíngue Libras e Português-Escrito. Taguatinga, 2016.
211
Autora: PENA, F.S., 2016. Fotografia de atividades com mapas realizadas por estudantes surdos do 9º ano do
Ensino Fundamental, no Centro Especial Elysio Campos. Goiânia, 2016.
As salas de aula dos estudantes surdos, apesar de não serem exclusivas para o ensino
de Geografia, possuíam mapas anexados em seus murais. A figura 52 mostra uma sala de aula
do 7º ano do Ensino Fundamental, onde se visualizam quatro mapas de regiões brasileiras do
IBGE.
212
Autora: PENA, F.S., 2016. Fotografia de estudantes surdos do 7º ano do Ensino Fundamental, na sala
de aula do Centro Especial Elysio Campos, em aula de Geografia. Goiânia, 2016.
Autora: PENA, F.S., 2017. Fotografia do corredor da escola EMEBS Helen Keller, onde
estava sendo realizada uma aula de Geografia com estudantes do 7º ano do Ensino
Fundamental. São Paulo, 2017.
Autora: PENA, F.S., 2017. Fotografia de Mapa do Brasil, elaborado por professores e estudantes
surdos da EMEBS Helen Keller. São Paulo, 2017.
216
Autora: PENA, F.S., 2017. Fotografia de Planisfério elaborado por professores e estudantes surdos
da EMEBS Helen Keller. São Paulo, 2017.
países com os seus sinais em Libras, sendo que, periodicamente, o tema geográfico era
alterado.
Autora: PENA, F.S., 2017. Fotografias da sala de aula ambiente de Geografia, localizada na EMEBS Helen
Keller. São Paulo, 2017.
Autora: PENA, F.S., 2017. Fotografia de materiais adaptados para o ensino de Geografia na EMEBS Helen
Keller. São Paulo, 2017.
com sinais em Libras, impressos e colados. A figura 59 apresenta uma imagem do Sistema
Solar, adaptada com os sinais dos planetas em Libras e fixada na parede esquerda da sala,
assim como uma maquete, localizada acima do quadro negro.
Na figura 60, observa-se um Planisfério produzido pelos estudantes surdos do 9º ano e
pelo professor de Geografia, utilizando bolinhas de papel crepom colorido, papelão, letras e
fotografias dos estudantes surdos, fazendo os sinais dos continentes, em Libras.
Autora: PENA, F.S., 2017. Fotografia do mural presente na sala de aula ambiente de Geografia,
localizada na EMEBS Helen Keller. São Paulo, 2017.
Fonte: Arquivo pessoal da professora de Geografia do Colégio Seli. São Paulo, 2017.
aspectos visuais na educação dos surdos, a professora utilizava recursos visuais variados ao se
trabalhar o espaço geográfico. Porém, não foram verificados materiais didáticos adquiridos ou
adaptados com os sinais em Libras.
TIC
Atividades impressas com imagens
Mapas interativos
Mapas bilíngues
Maquetes
Globo terrestre
Material didático bilíngue
Fonte: Pesquisa de campo realizada em Escolas de Surdos, de 2015 a 2017. Org.: PENA, F.S., 2018.
No CEEC e no Colégio Seli havia TV fixada na sala de aula, facilitando sua utilização
pelos professores. No CEEC também foi observado um laboratório de informática com
computadores conectados à Internet, os quais eram utilizados pelos estudantes. O projetor
multimídia foi observado na Escola para Surdos Dulce de Oliveira, sendo montado pela
professora nas salas de aula e guardado após o término do horário.
É importante que as escolas possam oferecer aos professores e estudantes os recursos
tecnológicos, de forma acessível. O ideal seriam todas as salas de aula serem equipadas com
projetor multimídia e TV, além dos professores e estudantes terem acesso à computadores
com Internet.
Sobre as atividades impressas com imagens, o seu uso foi considerado constante pelos
professores nas entrevistas. Elas foram observadas em três escolas durante as visitas, sendo
que a sua utilização é importante, pois permite a interação das imagens com a Libras e seus
classificadores, e desta com a Língua Portuguesa escrita. Deve-se considerar que não é a
quantidade de imagens que irá desempenhar um ensino satisfatório, pois a visualidade, por si
só, não garante a aprendizagem. Supõem-se práticas imagéticas mediadas, uma vez que o
professor precisa contextualizar e criar significados para o que é apresentado, em Libras.
A Cartografia escolar foi observada em todas as escolas, com representações do
espaço geográfico visíveis nos corredores, murais e salas de aula. A partir das entrevistas com
os professores de Geografia e dos questionários respondidos pelos estudantes surdos também
se verificou a importância do uso constante da linguagem cartográfica durante as aulas nas
Escolas de Surdos, especialmente dos mapas.
Deve-se destacar que a Cartografia escolar contribui não apenas para que os estudantes
compreendam os mapas e demais recursos cartográficos, mas também para o
desenvolvimento de capacidades relativas à representação do espaço. Eles precisam ser
preparados para a construção de conhecimentos sobre a linguagem cartográfica, como
cidadãos que representam e codificam o espaço.
Foram observadas atividades cartográficas interessantes e criativas, das quais os
estudantes surdos participaram ativamente, inclusive identificando os seus lugares de
vivência. Aliaram-se mapas, elementos cartográficos, Língua Portuguesa escrita e sinais em
Libras, possibilitando uma aprendizagem significativa. Acredita-se que essas atividades
podem ser reproduzidas nas diferentes aulas de Geografia, de acordo com a realidade de cada
escola.
Todavia, nem sempre os mapas foram construídos pelos professores pesquisados de
forma adequada, desconsiderando-se as normas cartográficas ou a utilização dos sinais em
225
Libras. Segundo Simielli (1986), é importante a criação de uma linguagem cartográfica que
seja eficiente, ou seja, que apresente a informação adequadamente, e que respeite as regras da
comunicação. Assim, para se obter uma leitura eficaz do mapa é preciso que ele tenha uma
boa qualidade e adequação informacional ao nível do leitor. Nesse sentido, deve-se considerar
para os estudantes surdos, além dos elementos fundamentais de um mapa – título, escala,
legenda, orientação e projeção – os sinais em Libras.
De acordo com as autoras Almeida; Passini (2004) a representação do espaço através
de mapas permite ao aluno atingir uma nova organização estrutural de sua atividade prática e
concepção do espaço. É importante que o aluno elabore mapas, acompanhando
metodologicamente cada passo do processo: reduzir proporcionalmente, estabelecer um
sistema de signos ordenados, obedecer a um sistema de projeções para que haja coordenação
de pontos de vista e para se familiarizar com a linguagem cartográfica.
Em cinco escolas pesquisadas verificaram-se mapas interativos, em que os estudantes
surdos participaram da sua construção ou complementação. Deve-se enfatizar que, antes de o
estudante ser um leitor de mapas, precisa fazer/desenhar mapas e passar por todas as suas
fases de preparação e organização. São as experiências com a construção de noções espaciais
que permitirão a existência de um cidadão-usuário de mapas mais eficientes. (SAMPAIO;
SAMPAIO; MENEZES, 2011).
Os mapas bilíngues, com identificações em português e em Libras, estavam presentes
em quatro escolas. Para conhecer os sinais específicos de cada lugar, alguns professores
recorreram à internet, outros aos professores surdos e, ainda, a dicionários de Libras e livros
ilustrados. Esses mapas são importantes para que os estudantes possam se sentir
contemplados pela linguagem cartográfica, pois também possuem sua primeira língua.
As maquetes foram encontradas em três escolas pesquisadas. Elas são recursos
didáticos importantes por permitirem noções de representação tridimensional do espaço, do
concreto ao abstrato. Sua elaboração como representação reduzida do espaço auxilia os
estudantes surdos a compreenderem os conhecimentos geográficos.
O globo terrestre foi encontrado em apenas duas escolas pesquisadas. Esse recurso tem
grande importância para o ensino de Geografia, pois com ele há a visualização de uma forma
mais real do planeta Terra, a possibilidade de mostrar os elementos físico-geográficos, as
divisões políticas dos países, a rede de coordenadas geográficas sem distorções e a simulação
dos movimentos da Terra, além de suscitar indagações e despertar curiosidade àqueles que a
manuseia. (SCHÄFFER et al, 2005). As escolas deveriam adquirir diversos exemplares de
globos terrestres, permitindo aos estudantes surdos sua aproximação, visualização e manuseio.
226
CONSIDERAÇÕES FINAIS
possibilitado o encontro cotidiano entre os sujeitos surdos que, em sua maioria, eram filhos de
ouvintes e não conviviam com seus pares, havia salas de aula com número reduzido de alunos
e espaço físico amplo, os professores dominavam a Libras e planejavam suas aulas na
perspectiva do grupo específico de estudantes.
Para se conhecer os indicadores relacionados ao ensino bilíngue de Geografia,
considerado adequado para os estudantes surdos, a tese também propôs discutir sobre as
pesquisas já concretizadas. Analisaram-se oito dissertações de mestrado, referentes ao tema
pesquisado.
A importância da Geografia se tornou mais evidente, pois os autores das dissertações
enfatizaram a contribuição desse conteúdo curricular para a formação dos estudantes surdos
como cidadãos e sujeitos de sua aprendizagem, principalmente ao ser pensada no contexto de
vida dos estudantes. Quando o surdo não encontra nos espaços cotidianos de sua vivência a
comunicação de forma plena em Libras, os conhecimentos geográficos podem propiciar
construções teóricas e espaciais, a partir da prática pedagógica bilíngue do professor.
Nos processos de ensino e aprendizagem de Geografia para surdos as pesquisas
indicam a necessidade de informar e discutir sobre os acontecimentos cotidianos importantes,
contextualizando com as experiências vivenciadas pelos estudantes e os conteúdos
geográficos.
Também foi destacada a utilização de recursos didáticos que explorem a visualidade,
como as novas tecnologias de informação e comunicação, a realização do trabalho de campo e
do estudo do meio, o uso de mapas, atlas e maquetes, de mapas conceituais, de desenhos e
pinturas, de brincadeiras e jogos, de charges, tiras e quadrinhos, de dramatizações, da
literatura, jornais e revistas, de gráficos, quadros e tabelas, e dos cartazes.
Verificou-se que tais recursos precisam ser mediados por um professor de Geografia
bilíngue, formado para atender as demandas linguísticas, pedagógicas e culturais dos surdos,
valorizando a Libras como primeira língua e a Língua Portuguesa escrita como segunda
língua.
Para se identificar e analisar a forma como o ensino de Geografia estava sendo
desenvolvido nas Escolas de Surdos, foram realizadas pesquisas de campo, com entrevistas,
aplicação de questionários, observações e análises documentais.
Ao se analisar o perfil dos professores de Geografia das Escolas de Surdos, percebe-se
que, apesar de não terem sido formados para a educação desses estudantes durante a
graduação, buscaram se capacitar e especializar para atender as demandas desse grupo de
230
Os recursos didáticos visuais foram eleitos pelos estudantes surdos como os mais
promissores, sendo que os mapas foram alguns dos recursos mais citados por eles, assim
como as imagens e as tecnologias de informação e comunicação.
Durante as observações realizadas nas seis Escolas de Surdos pesquisadas, foram
analisados os recursos didáticos que estavam sendo utilizados para o ensino de Geografia.
Como apenas duas escolas possuíam a sala ambiente de Geografia, foi possível uma
observação parcial dos recursos materiais utilizados, tendo em vista que eram descartados ou
guardados nas residências dos professores, após o seu uso.
Na Escola para Surdos Dulce de Oliveira a professora de Geografia procurava utilizar
os recursos didáticos em uma perspectiva bilíngue. A Libras e o português escrito eram
constantes nas aulas e a professora explorava a visualidade dos recursos. A Cartografia estava
presente em diversos momentos, na intenção de compreender o espaço geográfico e para
representar espacialmente os conceitos e acontecimentos estudados. Os estudantes
participavam de forma interativa, utilizando a Libras em sua construção. Como materiais
bilíngues adquiridos, foram encontrados o Livro Ilustrado de Língua Brasileira de Sinais e o
Atlas Geográfico Interativo Bilíngue.
Com a visita ao Instituto Santa Inês, verificou-se que não havia na escola materiais
didáticos de Geografia, bilíngues ou não. Também não foi possível constatar se, de fato, a
professora utilizava durante as suas aulas a Libras para se comunicar com os estudantes
surdos, ou os recursos visuais. Havia uma restrição de recursos oferecidos pelo Instituto e as
práticas pedagógicas eram pautadas nos pressupostos da Comunicação Total.
Na Escola Bilíngue Libras e Português-Escrito, a partir das observações, verificou-se
que a professora de Geografia buscava utilizar recursos visuais durante suas aulas. Todavia,
no momento da pesquisa de campo, a escola não possuía recursos didáticos bilíngues para o
ensino de Geografia, o que provavelmente se deve ao fato da professora não ter a licenciatura
desse componente curricular, o que pode prejudicar a construção e aquisição de recursos
geográficos.
O Centro Especial Elysio Campos também não possuía recursos geográficos bilíngues,
contudo, o professor de Geografia recorria ao uso de mapas interativos, mapas coloridos,
imagens e recursos tecnológicos, como televisão e computadores, durante a sua prática
pedagógica. As aulas eram ministradas em Libras, na perspectiva do bilinguismo.
A partir da observação realizada na EMEBS Helen Keller, verificou-se que os
professores de Geografia da escola, por possuírem uma sala própria para o ensino desse
conteúdo, mantinham os materiais expostos e acessíveis para todas as aulas. O professor de
233
pois ainda são observados diretores, secretários administrativos, dentre outros, que não
dominam a língua de sinais.
Tendo em vista o melhor aprendizado dos conhecimentos geográficos, o Estado
precisa incentivar a elaboração de livros didáticos bilíngues, com imagens, conceitos e textos
traduzidos em Libras, por meio de CD-ROM, assim como a criação e disponibilização de
materiais didáticos diversos de Geografia, com imagens, português escrito e Libras. Outra
demanda para o ensino bilíngue de Geografia é a sistematização, criação e divulgação de
sinais geográficos na língua de sinais, pelos professores surdos.
Também foi verificada a necessidade de se compartilharem as atividades
desenvolvidas nas Escolas de Surdos e os seus resultados, relacionados à aprendizagem dos
seus estudantes, pois os professores de Geografia estão trabalhando de forma isolada. Eles não
conheciam os demais professores de Geografia das Escolas de Surdos, impossibilitando a
discussão de suas experiências e sucessos educacionais.
Após as análises dos resultados obtidos pela pesquisa, concluiu-se que o ensino de
Geografia está sendo realizado de forma adequada nas Escolas Bilíngues de Surdos. Elas se
baseavam nos pressupostos da Educação Bilíngue, possuíam professores bilíngues de
Geografia, além de utilizarem recursos didáticos de Geografia que exploravam a visualidade
dos estudantes surdos.
Infelizmente, os anos finais do Ensino Fundamental não estão mais sendo oferecidos
pela Escola para Surdos Dulce de Oliveira, desde o ano de 2016, devido às imposições do
MEC a favor da suposta Educação para Todos. As escolas bilíngues de surdos estão sendo
sucateadas ou fechadas, sem que se considerem os seus resultados e os desejos da comunidade
surda.
Verifica-se que as demandas apresentadas pelas Escolas de Surdos são menores
àquelas encontradas nas escolas comuns, o que inviabiliza a matrícula dos estudantes surdos
nesses espaços escolares. Dentre os problemas das escolas comuns, constatados pela pesquisa,
estão: os ritmos diferenciados de surdos e ouvintes para aprender, a ausência de recursos
visuais e materiais, a especificidade linguística dos surdos, a falta de comunicação entre
alunos e professores, a necessidade de contato com seus pares, o grande número de alunos por
turmas, a falta de metodologias de ensino e de recursos adequados, assim como a realização
dos processos de ensino e aprendizagem pautados numa base ouvinte.
A realização deste estudo foi importante para reafirmar que as Escolas Bilíngues de
Surdos são espaços que possuem aspectos pedagógicos importantes para os estudantes.
Favorecem as condições para que eles consigam exercer poder e controle sobre o espaço
235
vivido, principalmente por meio dos processos de comunicação com o uso da Libras. São
espaços que representam a comunidade surda, possibilitando a aproximação de seus pares,
pois os surdos interagem entre eles, preservam a sua cultura e fortalecem sua identidade.
As Escolas Bilíngues consideram a especificidade dos estudantes como expressão
política e cultural, e valorizam a Libras em todos os momentos da escolarização. A língua de
sinais é adotada como forma de comunicação, de expressão e de trabalho em sala de aula,
usada nas relações estabelecidas e na construção de conhecimentos. Essas escolas também
prezam pelas potencialidades e vivências dos estudantes, assim como pelas práticas
pedagógicas baseadas na experiência visual.
Almeja-se que as lutas, conquistas e demandas das Escolas Bilíngues apresentadas
sejam inspiração para as novas políticas e práticas de ensino voltadas para os surdos. Essas
escolas são espaços de resistência que desejam a melhoria da educação dos surdos brasileiros,
considerando a construção do conhecimento por meio da sua primeira língua, da experiência
visual e da valorização da cultura surda.
Recomenda-se que as cidades do Brasil sigam a iniciativa das políticas públicas
destinadas às Escolas Bilíngues de Surdos da cidade de São Paulo e do Distrito Federal, as
quais possuem Decretos e Leis próprias para a Educação Bilíngue, a fim de melhorar a
educação dos surdos brasileiros. Caso não tenham escolas públicas bilíngues, que elas possam
ser criadas, respeitando o direito à Educação Bilíngue desses estudantes.
236
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246
APÊNDICES
247
APÊNDICE A
Roteiro de entrevista para Professores de Geografia
248
249
APÊNDICE B
Questionário de pesquisa para Estudantes Surdos
250
APÊNDICE C