Iurisprudentia Est Divinarum Atque Humanarum Rerum Nostitia, Iusti Atque Iniusti Scientia - A Jurisprudência É o Conhecimento Das Coisas

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Para começar, de forma introdutória, quero começar por explicar em que

consistia a jurisprudência na Roma antiga:

A jurisprudência era, inicialmente, na Roma Antiga, o conjunto das


respostas ou pareceres - responsa prudentium - dos que pensavam o
direito, dos jurisprudentes. Era uma fonte do Ius civile; um saber puro – a
ciência do saber agir.
Iurisprudentia est divinarum atque humanarum rerum nostitia, iusti
atque iniusti scientia – a jurisprudência é o conhecimento das coisas
divinas e humanas, a ciência do justo e do injusto (digesto, Ulpiano)

O processo histórico da construção do ius como iurisprudentia teve 3


fases:

A divulgação do ius Flavianum;


O comentário pelos jurisprudentes aos preceitos da lei das XII tábuas;
O fim do secretismo;

O iurisprudente é o que distingue o certo do errado, ao pensar o direito,


mediante a justiça
Eram pessoas que, de forma livre, sem conexão com as instancias políticas
oficiais, pensavam o direito de forma gratuita, ou seja, não eram
remunerados. E tinham uma outra característica: a de publicidade, visto
que, as responsas eram dadas e argumentadas publicamente, ao contrário
da atividade dos sacerdotes pontífices que, antes da laicização da
iurisprudentia era feita de forma secreta, em segredo - secretismo
Os iurisprudentes não tinham poderes alem da auctoritas prudentum -
que é o saber socialmente reconhecido e respeitado – autoridade dos
jurisprudentes.

A tradição romana apresenta como primeiros e até exclusivos


jurisprudentes os membros de colégios sacerdotais, os pontífices, os
áugures, etc. Mais tarde, os grandes nomes da jurisprudência romana
foram: Papiniano, Paulo, Modestino, Ulpiano e Gaio. Contudo, Gaio ainda
é uma incógnita em relação à sua existência – se realmente existiu.

Posto isto, passamos àquilo que foi o primeiro momento de diferenciação


no estatuto da jurisprudência: A sua laicização.
A laicização da jurisprudência, como a Énia explicou na sua apresentação
ontem, de forma mais completa do que aquela que eu vou apresentar
hoje, veio retirar a jurisprudência da sacralidade e do domínio dos
pontífices - vai deixando de estar no domínio dos pontífices para entrar
noutros domínios, para que os pontífices não cidadãos possam pensar o
direito. Isto é, com a laicização a iurisprudentia perdeu a uniformidade de
respostas dadas em exclusivo pelos pontífices garantida pela tradição e
pelo colégio sacerdotal.

Esta laicização dividiu-se em 3 momentos:

- Positividade de preceitos do ius civile na Lei das XII tábuas;


- Ius Flavianum;
- Ensino público do Direito por Tibério Coruncânio;

Esta laicização da jurisprudência veio criar uma maior subjetividade,


diversificando as opiniões, as respostas, resultando em discussões. E
assim, inicia-se a atividade polémica dos jurisprudentes. Esta atividade
polémica coloca a jurisprudência no interesse dos romanos, pois, tal como
nós, apaixonados por discussões, eram apaixonado pelas discussões entre
os jurisprudentes sobre a melhor forma de conseguir uma solução que
resolvesse cada conflito com justiça pelo Direito.

Como visto anteriormente a jurisprudência, inicialmente, era livre, visto


que não estava vinculada a ninguém. No inicio da fase da transição da
republica para o principado, no tempo de Augusto, rezam as crónicas que
haveria em Roma cerca de 300 jurisprudentes. A existência de tantos
jurisprudentes poderia causar insegurança jurídica, então Augusto vai criar
um expediente: Ius publice respondendi ex auctoritas. A jurisprudência
livre, a partir de Augusto, passa a ser limitada - A única jurisprudência que
vincula os tribunais são apenas a dos jurisprudentes com ius publice
respondendi.
Ius publice respondendi ex auctoritate principis - Expediente subjetivo de
uma criação de Augusto para controlar a jurisprudência e determinar a
vinculatividade da opinião dos jurisprudentes – tornou os jurisprudentes
autoridade do principe. Foi o privilégio conferido por Augusto a alguns
jurisprudentes para emitirem as suas opiniões a pedido das partes em
litigio. A partir da criação dos ius publice respondendi o princepe poderia
escolher determinados jurisprudentes a quem atribuía a vinculatividade
da opinião - Aquelas opiniões dos jurisprudentes com ius publice e
respondendi vinculava o juiz e o próprio principe.
O jurisprudente com ius publice respondendi ex auctoritate principis vai
não só vincular o pretor e o seu tribunal (até finais do século II) como vai
vincular o tribunal do principe. A lista de ius respondendi é movel - os
princepes podem ir alterando quem são os jurisprudentes em cada
momento quem têm ius respondendi. A lista nunca foi superior a 30
nomes. Ou seja, apesar de haver inúmeros jurisprudentes, o máximo de
jurisprudentes que podiam ser vinculativos foram reduzidos a 30.

A justificação dada para a criação do ius respondedi é a segurança jurídica


no âmbito das opiniões, pois na altura de augusto, no final da república,
havia cerca de 300 jurisprudentes e cada um podia dar a sua opinião livre,
ou seja, para uma situação podia haver uma duplicidade de opiniões.
Augusto veio de alguma maneira controlar essa situação. Só os 30
jurisprudentes que ele escolheu é que podem vincular as partes, os
restantes apenas podem ter opinião.
Contudo, a criação do ius publice respondendi levou à degradação da
iurisprudentia. A iurisprudentia caracterizava-se pela liberdade e
independência dos jurisprudentes e assentava na sua auctoritas
prudentium (é o elemento que permite aos jurisprudentes interpretar
regras existentes visando a sua aplicação a casos concretos, criar regras
novas a partir de soluções idênticas dadas a casos semelhantes,
fundamentar soluções próprias, etc).
O seu prestígio social e o seu saber socialmente aceite implicavam a base
casuística. O princeps com a desculpa de que queria impedir a degradação
da jurisprudência pelas constantes divergências entre jurisprudentes,
introduziu um critério político imposto pelo seu imperium na
hierarquização da auctoritas entre jurisprudentes e deixava claro que
quem tinha imperium é que o podia fazer. O ius publice respondendi criou
as condições para corroer essas bases destruindo a auctoritas prudentium
e corrompendo a jurisprudência: A perda da liberdade para decidir sobre
as soluções a dar aos conflitos; o condicionamento resultante de ter de
agradar a quem decide (o princeps) sobre a sua auctoritas para ser
consultor; a transferência da livre escolha das partes e do grau de
aceitação social das opiniões de cada jurisprudente para o princeps e a sua
decisão política.
Mais tarde, com Adriano, o desprestígio social dos jurisprudentes era
evidente, visto que os jurisprudentes eram submissos ao imperador ao
aceitarem desempenhar cargos de governo e na administração. A partir de
Adriano intensificou-se a inserção dos Rescripta imperiais (decisões do
imperador) como critério corretor das divergências opinativas entre os
jurisprudentes.
Na segunda metade do séc. II os jurisprudentes, além de integrarem os
conselhos dos órgãos do imperador, passam a integrar a burocracia
imperial, assistindo-se à sua completa funcionalização.
Em 240 d.c., Diocleciano cessa a atividade jurisprudencial com a
oficialidade interpretativa, em que só o imperador tinha poder normativo
e fazia leges generales.
A partir do séc. IV começa a haver uma necessidade de reorganizar a
jurisprudência. No séc. IV já estavam mais do que sedimentados o
pensamento dos vários juristas: Gaio através das Institutas; Paulo através
da obra "ascendências de Paulo"; Papiniano; Ulpiano;
Havia já uma pluralidade de homens, todos eles com ius publice
respondedi, que as suas obras eram não só para o ensino e aprendizagem
do direito (escola de Roma, Constantinopla e Escola de Beirute), mas estas
escolas também elas começam a ter duvidas e contradições o que faz com
que os imperadores decidam tomar uma posição clara relativamente à
jurisprudência: são elaboradas várias constituições imperais para
disciplinar a jurisprudência e determinar quem é podia ser invocado ou
lido em tribunal.

1º constituição imperial em 322:


Constantino vem proibir as citações de constituições imperiais sem
indicação da data e a sua origem - É proibido ao tribunal citar
constituições imperiais sem verificar a sua data e origem. Ainda
Constantino, em 321, vem proibir em tribunal a invocação dos
comentários de Paulo e Ulpiano se contrários aos textos de Papiniano - O
jurisprudente de referência é Papiniano.
Em 328, Constantino, vem dizer que as sentenças de Paulo devem ser
tidas como fonte primária dos juízes desde que não contrariem Papiniano.
O último momento para a destruição da jurisprudência foi através da lei
das citações - Lei mais importante para oficializar/funcionalizar a
jurisprudência - conhecida como tribunal dos mortos, pois todos os
juristas que constam desta lei já tinham morrido.
A lei das citações é a 7 de novembro de 426 e é do imperador
valentiniano III. Esta constituição imperial foi previamente aprovada
através de uma oratia princeps.
É uma constituição imperial que vai definir a disciplina da jurisprudência
e tem como destinatários diretos os tribunais.

Esta lei:
 Fixa os 5 jurisprudentes que podem ser aceites pelo juiz - os 5
princepes do direito (Papiniano, gaio, Paulo, Ulpiano e Modestino)
 Mantém o afastamento das notas criticas de Paulo e Ulpiano ao
pensamento de Papiniano
 Confirma a autoridade como fonte primária das Pauli sententiae.
 Confirma aa auctoritas dos vários compiladores do direito em
matéria de doutrina a ser invocada em tribunal, principalmente se
for as opiniões de Papiniano, Paulo e Ulpiano.
 Fixa o critério quantitativo e qualitativo de invocação das opiniões -
o iudex perante opiniões diversas entre os 5 jurisprudentes deve
seguir a opinião quantitativa. Se houver empate relativamente à
posição (para haver empate basta que um dos juristas não tenha
opinião) segue-se a opinião expressada por Papiniano. Se Papiniano
não tiver expressado opinião naquela matéria o iudex segue a
opinião que considerar mais justa para resolver o caso concreto.
Papiniano foi sempre considerado aquele que tinha a opinião mais
justa.

Esta destruição da jurisprudência resultou na submissão do ius à lex.

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