Dissertação de Mestrado - Ciro Campelo

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UNIVERSIDADE VILA VELHA - ES

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SOCIOLOGIA POLÍTICA

CONVERGÊNCIA DE INTERESSES: A RELAÇÃO ENTRE A


FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO ESPÍRITO SANTO E O PODER
PÚBLICO CAPIXABA (1958-1971)

CIRO CAMPELO OLIVEIRA

VILA VELHA

AGOSTO / 2016
UNIVERSIDADE VILA VELHA - ES

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SOCIOLOGIA POLÍTICA

CONVERGÊNCIA DE INTERESSES: A RELAÇÃO ENTRE A


FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO ESPÍRITO SANTO E O PODER
PÚBLICO CAPIXABA(1958-1971)

Dissertação apresentada à Universidade


Vila Velha/ES, como pré-requisito do
Programa de Pós-graduação em
Sociologia Política, para obtenção do
Grau de Mestre em Sociologia Política.

CIRO CAMPELO OLIVEIRA

VILA VELHA

AGOSTO / 2016
Catalogação na publicação elaborada pela Biblioteca Central / UVV-ES

O48j Oliveira, Ciro Campelo.


Convergência de interesses: a relação entre a federação
das indústrias do Espírito Santo e o Poder Público capixaba
(1958/1971). / Ciro Campelo Oliveira – 2016.
168 f.: il.

Orientador: Vitor Amorim.


Dissertação (mestrado em Sociologia Política) -
Universidade Vila Velha, 2016.
Inclui bibliografias.

1. Sociologia Política. 2. Industrialização – ES. 3. Poder


Executivo. I. Amorim, Vitor. II. Universidade Vila Velha.
III. Título.

CDD 306.2
Dedico à pessoa mais importante da
minha vida, minha amada esposa,
Rosangela Carlos Pinto; meus pais que
sempre acreditaram em mim; minha avó
Perciliana que, ainda na década de 90,
preveu esse momento.
AGRADECIMENTOS

Após vários anos, afundado numa inércia enorme potencializada por uma
terrível depressão causada pela obesidade mórbida, essa lista de agradecimentos
àqueles que de alguma forma me conduziram a esse momento será enorme.

Mesmo avesso a proselitismos, preciso agradecer primeiramente a Deus,


por tudo que ELE é e por tudo que ELE fez por mim nesses 35 anos de vida. Além
de manter-me vivo e saudável, deu-me uma bela esposa e dotou-me de inteligência
para a obtenção desse grau de mestre em sociologia. Uma pessoa que no início da
década passada trabalhava fritando pastéis de vento numa pracinha, hoje possui um
nível de conhecimento razoável, pratica a profissão que ama e está casado com a
mulher que ama e admira. A ti, oh Deus, todo louvor!

À minha amada esposa Rosangela, por ter acreditado em mim todos


esses dias, por não ter duvidado da minha capacidade e, por sempre estar ao meu
lado nos momentos de dor, tristeza e frustração. Amo você!

Aos meus pais, principalmente meu amado pai. Não apenas por ser o
financiador particular desse mestrado, mas por sempre incentivar-me a estudar,
ensinando-me o caminho dos livros e da música popular brasileira. Agradeço à
minha mãe, por ter sofrido comigo em alguns momentos e por sempre encorajar-me
a seguir em frente.

Ao meu orientador, Prof. Dr. Vitor Amorim de Ângelo, pela paciência e


pelas proveitosas dicas durante a redação desse trabalho, e pelo bom
relacionamento que criamos nos decorrer desses dois anos.

À minha maior incentivadora, amiga e pedagoga preferida, Cione Manske,


por incentivar-me a cursar esse mestrado e por ajudar-me sempre que necessário.
Você foi uma grande inspiração para mim.

Ao meu ex-diretor, Rodrigo Santos, pela sua humanidade, afeto e


amizade em todos os anos que convivemos e trabalhamos juntos. Sem sua ajuda,
não teria conseguido.
Aos funcionários do Arquivo Público do Estado do Espírito Santo,
principalmente na pessoa de Tiago Alves com quem mantive conversas excelentes.

Aos membros da banca examinadora, professora Marta Zorzal, pelas


excelentes dicas na banca de qualificação, pelos empréstimos dos livros e, pela
disponibilidade em participar da banca; professor Paulo Costa, que desde o primeiro
contato foi extremamente generoso com a minha pessoa e, por ter aceitado ao
convite de participar da banca; ao professor Riberti Felisbino, pela amizade
desenvolvida no período do mestrado.

Ao amigo e professor Uéber Oliveira, que me acompanha desde a


graduação e ajuda com seu jeito peculiar de ser, sempre buscando o crescimento de
seus alunos enquanto pesquisadores. Suas indicações contribuíram muito para a
elaboração e desenvolvimento do meu trabalho.

Aos professores do PPGSP-UVV, em especial à Maria da Penha S.


Siqueira, Riberti Felisbino, Tereza Rosa, Pablo Rosa e Aloísio Krolling, pela troca de
conhecimento, paciência e aprendizado nesse período.

Aos colegas do curso de mestrado, em especial ao amigo Arlindo Palassi,


por todas as nossas resenhas, discussões e ajuda em todos os momentos que
solicitei. Ao colega Vitor Beno Vervloet, pela doação do livro do Gramsci, pela ajuda
na formatação da dissertação e pelos carinhosos papos. Aos amigos Renan Subtil,
Anselmo Hudson, Ione Miranda, Ricardo e Ester.

Aos professores, colegas de trabalho, Gabriel Fontelles, Édson, Diego e


André, pela força e incentivo desde que decidi seguir o caminho do mestrado
acadêmico.

Aos cunhados, Roselaine e Marcelo, pela doação do livro da professora


Marta e por todos os livros de sociologia doados no período do mestrado. Obrigado!

A todos que me ajudaram de alguma forma, mas que não foram


lembrados aqui. Muito Obrigado!
“Enganam-se os que me julgam
vencido. No desterro dessas grades
forjo as armas do combate da batalha
do oprimido. Crescem-me na alma os
germens dos proscritos e irrompe no
meu peito um brado de revanche em
surdos gritos: Eu não fui vencido!
Repouso no sepulcro sem nunca ter
morrido. Neste desterro de grades
guarnecido onde às vezes brilham
luzes estelares dos livros sorvo o
saber e as lições de lutas milenares.
Embora da derrota a lança sangre-me
ainda o coração não temerei novas
batalhas se empunho agora a arma da
razão. Regressarei à vida onde me
espera a luta, no corpo levo o
execrável estigma das grades, no
coração uma esperança nova, na alma
uma paixão que arde liberdade,
liberdade!” (André Borges)
RESUMO

OLIVEIRA, Ciro Campelo, M. Sc, Universidade Vila Velha – ES, Agosto de 2016.
Convergência de interesses: A relação entre a Federação das Indústrias do
Espírito Santo e o Poder Público Capixaba (1958-1971). Orientador: Prof. Dr.
Vitor Amorim de Angelo.

Este estudo analisa a relação de poder e interesse existente entre a Federação das
Indústrias do Espírito Santo e o Poder Executivo capixaba, no recorte temporal entre
1958-1971. No desenvolvimento da pesquisa não traçamos uma linha teórica única,
mas optamos por trabalhar com teorias destintas que dialogam entre si.
Primeiramente, definimos a FINDES como Grupo de Interesse que, segundo nossa
visão, utilizam métodos distintos para influenciar o Poder Público, sendo eles: a
pressão e o lobby. Em seguida, analisamos as eleições do governo capixaba,
ocorridas entre 1947 e 1962, discorremos sobre as disputas que ocorreram entre
duas elites políticas atuantes no Estado. A atuação da FINDES junto ao poder
público oscilava entre um governo e outro, até que o golpe militar em 1964
consolidou o posicionamento da Federação frente ao poder público capixaba. A
partir do governo de Christiano Dias Lopes Filho (1967-1971), a FINDES participou
das ações governamentais de forma muito intensa: primeiro, formulando o
documento que originou o programa de governo; segundo, com representantes
dentro do secretariado; terceiro, participando diretamente da reforma administrativa
realizada pelo governo; quarto, tomando assento nos principais órgãos do governo;
quinto, ajudando na formulação e incentivos fiscais para o Estado; sexto e mais
importante, a FINDES exerceu forte pressão para a implantação do Centro
Industrial. Buscamos nas Atas da Federação, jornais e revistas da época, indícios
que demonstrassem a relação da FINDES com o Poder Público, e como essa
entidade utilizava meios como a pressão e o lobby para ter seus interesses
atendidos.

Palavras-Chave: FINDES. Poder Executivo. Industrialização. Espírito Santo.


ABSTRACT

OLIVEIRA, Ciro Campelo, M. Sc, Universidade Vila Velha – ES, Agosto de 2016.
Convergência de interesses: A relação entre a Federação das Indústrias do
Espírito Santo e o Poder Público Capixaba (1958-1971). Orientador: Prof. Dr.
Vitor Amorim de Angelo.

This study analyzes the relationship of power and interest existing between the
Federation of Industries of the Espírito Santo and the Executive Capixaba, in time
frame between 1958-1971. The development of research do not draw a single
theoretical line, but we chose to work with differents theories that interact with each
other. First, we define the FINDES as “Interest Group” that, in our view, use different
methods to influence the government, namely: the pressure and lobby. Then we
analyze the Capixaba government elections that took place between 1947 and 1962,
commented above on the disputes that occurred between two active political elites in
the state. The performance of FINDES with the government oscillated between a
government and another, until the military coup in 1964 consolidated the position of
the Federation against the Capixaba government. From the government Christiano
Dias Lopes Filho (1967-1971), the FINDES part of government actions in a very
intense: first, formulating the document that originated the government program;
second, with representatives in the secretariat; third, directly participating in the
administrative reform carried out by the government; fourth, taking a seat in the main
organs of government; fifth, helping in the formulation and tax incentives for the state;
sixth and most importantly, FINDES exerted strong pressure for the implementation
of the Industrial Center. We seek the Federation Minutes, newspapers and
magazines of the time, evidence demonstrating the relationship of FINDES with the
government, and how the entity used as a means to pressure and lobby to get their
interests.

Key Words: FINDES. Executive Power. Industrialization. Espírito Santo.


LISTA DE QUADROS, TABELAS E GRÁFICOS

Quadro 1 – As cinco ondas sobre o empresariado...................................................43

Quadro 2 – Cronograma de trabalho do conselho técnico .......................................72

Quadro 3 - Quadro 2 – Lei 2296/1967.....................................................................108

Quadro 4 - Sistema de Administração Indireta........................................................109

Tabela 1 - Censo Industrial 1920 ..............................................................................19

Tabela 2 - Censo Industrial 1960 ..............................................................................61

Tabela 3 - Número de estabelecimentos por operário..............................................62

Tabela 4 - Comparativo dos Censos Industriais – 1920 e 1960................................63

Tabela 5 - Estabelecimentos por Classe e Gênero Industrial....................................64

Tabela 6 - Participação em % dos três setores econômicos na renda líquida do


Espírito Santo.............................................................................................................64
Tabela 7 - Filiação dos Deputados Estaduais do ES – Arena e MDB ......................87

Tabela 8 - Secretariado de Rubens Rangel – Final de 1966 ....................................89

Tabela 9 - Leis Relevantes para a Indústria – Rubens Rangel.................................96

Tabela 10 - Secretariado de Dias Lopes – Início do Governo ................................107

Tabela 11 - Leis Delegadas – 1967 ........................................................................110

Tabela 12 - Equipe Administrativa – após Reforma Administrativa ........................112

Tabela 13 – Representação da FINDES nos Órgãos Colegiado.............................114

Gráfico 1 – Crescimento Industrial em % .................................................................63

Figura 1 – Liberalização, inclusividade e democratização .......................................50

Figura 2 – Atuação Esquemática do Conselho técnico da FINDES ........................71

Figura 3 – Esquematização das Elites Capixabas .................................................132


LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ACV – Associação Comercial de Vitória


ARENA – Aliança Renovadora Nacional
BANDES – Banco de Desenvolvimento Econômico do Espírito Santo
CIESP – Centro Industrial do Estado de São Paulo
CIVIT – Centro Industrial da Grande Vitória
CNI – Confederação Nacional da Indústria
CODEC – Conselho de Desenvolvimento Econômico do Espírito Santo
CODES – Companhia de Desenvolvimento do Espírito Santo
CVRD – Companhia Vale do Rio Doce
DL – Decreto Lei
FIESP – Federação das Indústrias do Estado de São Paulo
FINDES – Federação das Indústrias do Estado do Espírito Santo
FIRJAN – Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro
FUNDAP – Fundo de Desenvolvimento das Atividades Portuárias
FUNRES – Fundo de Recuperação Econômica do Espírito Santo
GERES – Grupo Poder Executivo de Recuperação Econômica
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
MDB – Movimento Democrático Brasileiro
MOCCA – Mobilização Cívica Contra o Analfabetismo
PRP – Partido da Representação Popular
PSD – Partido Social Democrático
PSP – Partido Social Progressista
PTB – Partido Trabalhista Brasileiro
SESC – Serviço Social do Comércio
SENAI – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SESI – Serviço Social da Indústria
SUDENE – Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste
UDN – União Democrática Nacional
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 15

CAPÍTULO I - ECONOMIA E ELITES ECONÔNICAS NO ESPÍRITO SANTO ....... 19

1.1. A hegemonia do café no Espírito Santo ............................................................ 19


1.2. As associações de classe no Rio de Janeiro e São Paulo: Aspectos histórico-
sociológicos ............................................................................................................... 24
1.3. Grupo de interesse ............................................................................................. 30
1.4. A criação da Assoiação Comercial de Vitória: Industrialização à vista? ............. 35
1.5. E empresariado como ator político ..................................................................... 41

CAPÍTULO II - O PROCESSO DE CRIAÇÃO DA FINDES E SUA RELAÇÃO COM


O PODER PÚBLICO CAPIXABA..............................................................................46

2.1. Introdução às disputas eleitorais no Espírito Santo (1947-1962): Democracia e


elites ......................................................................................................................... 46
2.2. As disputas eleitorais no Espírito Santo e a Criação da FINDES (1947- 1958)
....................................................................................................................................54
2.3. O segundo governo Lindemberg e o Conselho técnico da FINDES................... 66
2.3.1. O Seminário Pró-Desenvolvimento e a criação da Companhia Vale do Rio
Doce .......................................................................................................................... 70
2.4. 1964: O golpe no Espírito Santo e o caráter industrializante do regime militar .. 78

CAPITULO III - A FINDES E O GOVERNO DE CHRISTIANO DIAS LOPES ......... 84

3.1 Rubens Rangel e a inserção da FINDES no Aparelho Estatal ............................ 84


3.1.1 As atas da FINDES no governo de Rubens Rangel e as leis ordinárias de
autoria do Poder Executivo (1966-1967)..................................................................90
3.2 O Governo Dias Lopes: Eleição e plataforma de governo.................................. 98
3.3 O Governo Dias Lopes: O secretariado e a reforma administrativa de 1967.....106
3.4 As atas da FINDES (1697-1968) ....................................................................... 114
CAPÍTULO IV - ATUAÇÃO DA FINDES NA IMPLANTAÇÃO DO CIVIT .............. 125

4.1. O Centro Industrial de Vitória: A pressão da FINDES sobre o governo ........... 125
4.2. Da COPLAN-ES à SUPPIN: Empresa pública ou Sociedade de economia mista?
................................................................................................................................ 139
4.3. A implantação do CIVIT e a perda de espaço político ...................................... 147

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................ 154

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................ 162

ÍNDICE DOS APÊNDICES ..................................................................................... 167


INTRODUÇÃO

A presente pesquisa busca analisar a relação existente entre a Federação


das Indústrias do Espírito Santo (FINDES) e o poder público capixaba –
representado pelo poder Executivo. Abordaremos as engrenagens dessa relação no
recorte temporal (1958-1971), bem como, a luta da FINDES pelo desenvolvimento
industrial capixaba e os desdobramentos da sua relação com o Poder Executivo
capixaba a partir do ano de 1958.

A FINDES apresenta-se como uma instituição de grande envergadura no


Espírito Santo. Contudo, apesar de sua importância no contexto político-econômico
capixaba, inexiste um trabalho acadêmico que aborde sua relação com o poder
público regional.

Gurgel (1998) e Ribeiro (2008) elaboraram trabalhos comemorativos


sobre a instituição na celebração de seus quarenta e cinquenta anos de existência,
mas são trabalhos históricos que não objetivavam analisar de forma mais profunda a
atuação da federação. Silva (1993), em sua dissertação sobre a reforma
administrativa como instrumento do poder público, abordou a atuação da FINDES,
entretanto, não houve uma consulta de fontes primárias, tais como as atas
elaboradas pela FINDES. E é esse caminho que pretendemos percorrer.

No primeiro capítulo, buscamos analisar a economia capixaba, identificar


as elites econômicas da época e apresentar o conceito de grupo de interesse, onde
nos apoiamos nos pressupostos teóricos de Almond &Powell (1972), Wotton (1975)
e Aragão (2000). Ressaltamos que, grupo de interesse é a categoria na qual
encaixamos a FINDES e procuramos demonstrar que um grupo de interesse age
através de duas formas diferentes: pressão e lobby.

Visando compreender a conjuntura de criação da FINDES em 1958, fez-


se necessário analisar a tendência agrícola do Estado do Espírito Santo que, à
época, era fundamentada num rentável setor cafeeiro.

15
Durante a década de 1930, em decorrência da “crise de 29”, a economia
cafeeira sofreu uma queda drástica, pressionando os Estados agroexportadores a
fortalecerem a atividade industrial. Todavia, o Espírito Santo obteve altos lucros na
exportação de café - pois exportava um café de baixa qualidade - e as elites
econômicas capixabas, aglutinadas na Associação Comercial de Vitória (ACV), não
identificavam um motivo concreto para fomentar a industrialização no Espírito Santo.
Compreendemos ser esse um dos fatores preponderantes para o atraso da
industrialização do Estado.

Sendo assim, o primeiro capítulo analisa esse contexto, apresentando um


comparativo entre o surgimento das associações de classe no Rio de Janeiro, em
São Paulo e no Espírito Santo, avaliando o atraso da industrialização capixaba.
Encerrando o capítulo, abordamos o empresariado como ator político, e como
ocorreu esse balanço bibliográfico – Diniz & Boschi (2004), Mancuso (2007) –, na
Sociologia Política.

O segundo capítulo analisa o período pós-redemocratização do país,


ocorrida em 1945, quando o Espírito Santo entrou no contexto político das eleições
diretas para o governo do Estado.

Esse novo contexto analisado de forma minuciosa por Zorzal e Silva


(1995) apontou para uma disputa política entre duas elites antagônicas que
buscavam o poder do aparelho estatal capixaba: de um lado, uma emergente elite
urbano-industrial, concentrada entorno do Partido Social Democrático (PSD) e do
seu maior expoente, o ex-interventor varguista Jones dos Santos Neves; de outro
lado, uma elite agrofundiária, que defendia os interesses dos grandes produtores
rurais – esta que não tinha um partido fixo de atuação, mas foi representada pelo ex-
governador capixaba Francisco Lacerda de Aguiar, o popular Chiquinho.

A FINDES surge nesse contexto de disputas políticas, tendo seu papel


ampliado junto ao Poder Executivo sempre que o PSD ocupava as posições de
poder, e perdendo espaço quando “Chiquinho” governava o Estado.

16
Essas elites alternaram-se até o fim das eleições diretas para governador,
com o advento do início do regime militar. Encerramos o capítulo dois discorrendo
sobre a implantação do período militar e o caráter industrializante desse regime.

O capítulo três aborda a inserção definitiva da FINDES no aparelho


estatal a partir do governo de Rubens Rangel (1966-1967). Analisamos mais
cuidadosamente as atas da instituição com o objetivo de encontrar indícios da
relação existente entre o governo e a federação, mais precisamente algo que não
tenha sido veiculado por nenhum meio de comunicação em massa, ou mesmo, algo
que não tenha sido citado por nenhum dos atores em entrevistas.

O capítulo é longo e demonstra a inserção intensa da FINDES no Poder


Executivo capixaba, identificada nas atas, na formulação de leis e nos processos
decisórios do Poder Executivo capixaba. Abordamos ainda, o processo de mudança
na política brasileira, no que diz respeito às eleições indiretas a partir da posse de
Christiano Dias Lopes (1967). Desenvolvemos sobre suas medidas e como as
mesmas beneficiaram a FINDES, destacando que, a referida Federação, patrocinou
seu programa de governo.

Identificamos que, a reforma administrativa e a composição do


secretariado, objetivavam um ajuste da máquina administrativa a fim de equalizar as
contas públicas. A composição dos conselhos e autarquias demonstrava uma
grande aproximação da FINDES, que tomou assento em todos os conselhos e
autarquias recém-criados no Estado.

Por fim, temos as atas da Federação nos anos de 1967/1968 que


elucidavam a participação da FINDES no Governo, bem como, a proximidade entre
Dias Lopes e o então presidente da FINDES Jones dos Santos Neves Filho.

O capítulo quatro foi um mergulho nas fontes primárias que procuraram


desvendar a atuação da FINDES na criação do Centro Industrial da Grande Vitória.
Trabalhamos com as atas dos anos de 1969/1970, com a Revista da FINDES -
Indústria Capixaba - e com a revista “Espírito Santo Agora”, além de analisar as
matérias do jornal “A Gazeta”, identificando este como grande parceiro da instituição
dentre os meios de comunicação da época. Destacamos a figura do ex-conselheiro

17
da federação, Gutman Uchôa de Mendonça, como maior articulador entre a
instituição e o referido jornal.

As análises das atas e da revista da FINDES são amplas e as citações


muitas vezes são longas, porém necessárias, considerando-se o objetivo de
posicionar o leitor em relação à atuação da instituição que é exercida de forma
intensa a partir do final de 1970, quando ocorre a primeira ruptura entre uma ação
do governo e os interesses da Federação. A reação é imediata e o bombardeio
midiático se inicia, tanto em sua revista como no jornal “A Gazeta”, como veremos
adiante.

Descobrimos em nossa pesquisa que a FINDES ansiava a implantação


do Centro Industrial de Vitória – CIVIT. No entanto, apenas saber disso não daria
consistência ao trabalho.

Sendo assim, buscamos no referido capítulo, pesquisar os meios


utilizados pela FINDES para alcançar a implantação do centro industrial. Nesse
sentido, os documentos pesquisados responderam de forma satisfatória à nossa
questão.

Concluindo o capítulo quatro, abordamos a implantação do Centro


Industrial e a progressiva diminuição do campo de atuação da FINDES
considerando-se que, a partir de 1970 os governos estaduais concentraram-se na
implantação de grandes projetos definidos pelo governo federal, superando o viés
local de desenvolvimento da economia industrial defendido pela FINDES.

Por fim, desenvolveremos as considerações finais do trabalho.

18
1 ECONOMIA E ELITES ECONÔMICAS NO ESPÍRITO SANTO

1.1. A Hegemonia do café no Espírito Santo

Em 1945, na transição entre os governos de Getúlio Vargas e Eurico


Gaspar Dutra, São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais já possuíam uma indústria
consolidada (LEOPOLDI, 2000). Em contraste, o Estado do Espírito Santo não
acompanhou o dinamismo regional e as mudanças conjunturais da região sudeste,
pois, com uma indústria ainda incipiente, o Espírito Santo era dependente da cultura
do café e não possuía uma indústria consolidada (SIQUEIRA, 2010).

Durante a primeira metade do século XX, o Espírito Santo se apresenta


basicamente como um Estado rural, sem uma grande população urbana. Não havia
um setor industrial urbano consolidado, sua economia era baseada no setor
primário, especificamente no cultivo do café, apoiada na pequena propriedade com
mão de obra familiar (SIQUEIRA, 2010). O colono capixaba era um sitiante, que “[...]
executava todos os trabalhos, contando, apenas, com o auxílio de pessoas da
família; quando esta não pode levar a cabo a tarefa, recorre à ajuda dos vizinhos.
Quase nunca lança mão de trabalho assalariado” (WAGEMANN apud CAMPOS
JÚNIOR, 1996, p. 96).

Para dimensionar a diferença que havia entre o Espírito Santo e os


demais Estados do sudeste, faremos um comparativo de cada Estado pelo número
de estabelecimentos industriais. Tal comparativo será analisado através do
recenseamento industrial realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) em 1920, conforme tabela 1:

Tabela 1 – Censo Industrial de 1920


Estado Nº Estabelecimentos
Espírito Santo 75
São Paulo 4.145
1
Distrito Federal 1.995
Minas Gerais 1.243
Fonte: Elaboração própria a partir de http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv14642_1.pdf.

1
Em 1920, o Distrito Federal era o que foi chamado, após 1960, de Estado da Guanabara, hoje
Região Metropolitana do Estado do Rio de Janeiro. Nessa tabela, somamos os valores do Distrito
Federal com o restante do Estado do Rio de Janeiro.

19
Segundo Siqueira (2010), a primeira Guerra Mundial atua como um fator
de desestruturação no mercado, pois ela rompe com o comércio exterior
(exportação/importação), deixando alguns países sem entrada de capital
estrangeiro. Nessa conjuntura, foi necessário fortalecer o comércio interno
acelerando automaticamente a industrialização.

A Grande Depressão de 1929 ocasionou a crise cafeeira e demonstrou a


fragilidade da monocultura. No âmbito da política nacional, a “Revolução de 30, ao
traduzir o declínio do latifúndio, marca a ascensão da burguesia ao poder”
(SIQUEIRA, 2010, p. 24).

Enquanto o Brasil vivia, entre 1930 e 1950, uma fase de grande


consolidação industrial, o grau de industrialização do Espírito Santo era

[...] insignificante (inferior a 10%) e intimamente ligado à transformação de


produtos primários. O crescimento industrial do Estado permanecia
inexpressivo, em função não apenas da estrutura econômica, como também
pela precariedade das ligações viárias com outras regiões geoeconômicas
do país [...] (SIQUEIRA, 2010, p. 34).

Segundo ROCHA & MORANDI (1991), a cafeicultura, mesmo após o fim


da escravidão, manteve um papel de primazia na economia brasileira. Entretanto, no
Espírito Santo a sua dinâmica foi diferente, uma vez que o café passou a ser
desenvolvido

[...] em pequena escala de produção, de acordo com a disponibilidade de


força das famílias de pequenos proprietários e dos parceiros. A unidade
produtiva era praticamente autossuficiente e tinha no café a sua quase
cultura mercantil. Essa estrutura produtiva e essa dinâmica muito particular
fizeram com que, desde que se introduziu a cafeicultura no Espírito Santo
(em meados do século XIX) até a década de 1950, a economia capixaba
não tivesse grande dinamismo e se apresentasse altamente dependente da
cafeicultura, sem vislumbrar nenhuma alternativa de diversificação
econômica (ROCHA & MORANDI, 1991, p. 24).

Por outro lado, tal processo ocorre de forma diferente em outras partes do
Brasil, especialmente em São Paulo, onde a ascensão da cafeicultura e do trabalho
livre começa “[...] a criar as bases para o deslocamento do sistema produtivo do
campo para a cidade” (Campos Júnior, 1996, p. 42). Essa dinâmica do café

20
baseada no regime de colonato2 fez com que algumas regiões do país –
especialmente São Paulo - começassem a acumular mais capitais que outras.

Com grau de acumulação maior, surge uma nova classe de produtores


rurais que ascendem ao poder após a proclamação da república, especialmente nos
Estados produtores de café. Dessa maneira direcionamos nossa questão para a
aplicação do capital excedente na cultura do café: onde as elites rurais investiam
esse excedente?

Enquanto em São Paulo os excedentes foram direcionados para o


investimento em bancos, indústria e comércio em geral, no Espírito Santo esse
excedente gerado na produção do café ficou concentrado na esfera da
comercialização. Essa situação levou o Espírito Santo a manter tendências agrícolas
durante boa parte do século XX, o que foi gerado por um processo denominado por
Campos Júnior (1996) cadeia de subordinação.

No interior dessa cadeia identificamos quatro atores envolvidos no


processo: o colono, o vendeiro, o comerciante de segunda classe e os grandes
comerciantes, representados pelas casas comerciais exportadoras em Vitória.

O colono era livre e dono de sua terra. Seu trabalho era materializado no
café enquanto mercadoria, por conseguinte, o colono não vendia seu trabalho para
ser consumido na produção de mercadorias. Contudo, o dinheiro obtido pelo colono
com a venda do café não era o único meio de sobrevivência, visto que o mesmo
produzia alimentos para subsistência em sua propriedade.

Para Campos Júnior (1996), essa situação dava ao colono uma falsa
sensação de independência, não deixando que este percebesse a situação de
subordinação imposta.

Como o colono sobrevivia na entressafra do café? Afinal, além do café,


era produzido o necessário à sua subsistência.

2
Sistema de exploração de grandes propriedades entre diversos colonos ou meeiros, que ficam
incumbidos de cultivar uma determinada área e entregar parte da produção ao proprietário,
conservando outra parte para seu próprio consumo.

21
Nesse período de entressafra, o colono recorria ao vendeiro – dono do
armazém – para a compra de artigos que não eram produzidos em sua propriedade.
Este, que “[...] através de fiados, fornecia-lhe o indispensável às suas necessidades”
(CAMPOS JÚNIOR, 1996, p. 106).

O vendeiro fornecia fiado esperando receber na hora da colheita. O


colono entregava ao vendeiro o café recém-colhido (café coco), para pagar suas
dívidas ou pelo menos amortizá-las. Dessa forma estava estabelecido o primeiro elo
dessa cadeia de subordinação.

Na pequena propriedade o colono só tem contato comercial com o vendeiro.


Executa com este o ciclo da produção simples de mercadoria. Produz uma
mercadoria, no caso o café, utilizando o seu meio de produção – a terra e a
força de trabalho. Vende a mercadoria para adquirir outra mercadoria de
seu uso, intermediado ou não pelo dinheiro (CAMPOS JÚNIOR, 1996, p.
110).

O vendeiro por sua vez executa a venda do café para o comerciante de


segunda classe. Vale ressaltar que, ele recebe o café coco3 do colono, porém, uma
de suas margens de lucro é repassar o café para o comerciante de segunda classe
já beneficiado, superando o preço maior que o próprio poderia receber se já
vendesse o café beneficiado. O vendeiro,

“[...] de posse da mercadoria café, beneficiando-a, executa a sua venda ao


comerciante de segunda classe. Isto é, aqueles comerciantes estabelecidos
nas cidades próximas à região produtora que mantém maior ligação
comercial com Vitória. [...] Quando não dirigia o café ao comerciante de
segunda classe, o vendeiro remetia-o diretamente às casas comerciais
estabelecidas em Vitória. Estas é que faziam a exportação do café e
controlavam todo comércio de exportação.” (CAMPOS JÚNIOR, 1996, p.
110).

Vemos então que, vendeiros e comerciantes de segunda classe têm a


função de concentrar o café produzido nas propriedades e vendê-los às casas
comerciais exportadoras de Vitória. É importante destacar que, de seis casas
comerciais listadas por Campos Júnior (1996), apenas uma era brasileira.
Percebemos dessa forma como o comércio de café ficou subordinado a meia dúzia
de casas mercantis e que, o excedente desse comércio permanecia nas mãos
desses comerciantes.

3
Café recém-colhido, não processado.

22
Essa dinâmica da economia cafeeira capixaba foi um dos principais
motivos para a manutenção da tendência agrícola do Estado nos primeiros anos do
século XX marcada pela subordinação dos pequenos e médios cafeicultores às
grandes casas comerciais estabelecidas em Vitória.

A situação de estagnação apresentada acima perdurou durante


significativo período do século XX. Entretanto, diante da nova conjuntura econômica
ocasionada na Revolução de 30, salienta-se o fato do Espírito Santo não ter seguido
o padrão de industrialização de outros Estados como, São Paulo e Rio de Janeiro.
Rocha & Morandi (1991), apontam a seguinte explicação:

Nos momentos de crise de superprodução e de queda dos preços do café, a


economia capixaba, ao contrário do que acontecia na região de São Paulo,
não apresentava mudanças estruturais, nem realizava movimentos
significativos de substituição de culturas. As unidades produtoras, a
despeito da brutal redução do nível de renda advinda da queda dos preços
do café, mantinham a lavoura cafeeira e reforçavam a produção de
subsistência de forma a compensar a redução de compra [...] (ROCHA &
MORANDI, 1991, p. 24).

Sendo assim, qualquer crise que se apresentava em relação ao café, o


Espírito Santo direcionava seus esforços para a produção de subsistência. Essas
unidades produtoras tornavam-se cada vez mais autossuficientes, pois “os fluxos de
comércio se reduziam e o processo de acumulação estagnava” (ROCHA &
MORANDI, 1991, p. 23).

Vale lembrar que isso só era possível no Espírito Santo, pois a mão-de-
obra nas unidades produtoras era familiar, com o serviço assalariado sendo
pequeno em relação aos outros Estados.

Referimo-nos, aqui, ao período anterior à Grande Depressão.


Demonstraremos mais adiante como a cultura do café no Espírito Santo foi
determinante para a diferenciação do padrão econômico do Estado em relação a
São Paulo e Rio de Janeiro. Enquanto na década de 1930 vários Estados
caminhavam rumo à industrialização, o Espírito Santo superava seus números na
exportação do café a cada ano, sendo esse, um dos motivos para o lento processo
de industrialização capixaba.
Na década de 1960, esses números em relação ao trabalho assalariado
sofrem modificações, mas a dependência do Estado em relação ao café continua.
Eis alguns números que elucidam essa dependência:

23
Em 1960, o PIB estadual apresentava a seguinte composição: 41,8%
gerado pela agropecuária e pesca, 5,3% pelo setor industrial e 52,9 % pelo
setor terciário. Neste ano, a cafeicultura empregava 55% da população
economicamente ativa capixaba e gerava 22% da renda estadual. Por outro
lado, o beneficiamento do café representava, aproximadamente, 17 % do
valor da produção industrial e o ICMS café respondia por 62% da receita
pública estadual (ROCHA & MORANDI, 1991, p. 29).

Esse quadro do início da década de 1960 é caracterizado pela extrema


dependência econômica à cultura do café, o que favoreceu um significativo atraso
industrial. Segundo Campos Júnior (1996), esse atraso ocorreu devido a essa
cadeia de produção que beneficiava apenas às casas mercantis de Vitória, ou seja,
mesmo com crises econômicas globais, o Estado sobrevivia apenas através da
cultura de café e a elite mercantil capixaba não possuía interesse em industrializar o
Estado, uma vez que, o cultivo do café no modelo da cadeia de subordinação rendia
altos lucros aos proprietários dessas casas de comércio.

Em suma, esse atraso não é fruto apenas da dependência do Estado em


relação à monocultura, mas também, do modelo de desenvolvimento que ocorreu no
Estado, em que a acumulação de capitais permaneceu nas mãos da elite mercantil-
exportadora.

No decorrer dessa pesquisa, demonstraremos como o Estado procura


solucionar essa situação de dependência e como a FINDES atua no fomento da
industrialização no Estado.

1.2. As associações de classe no Rio de Janeiro e São Paulo: Uma


perspectiva histórico-sociológica

Compreender o surgimento das associações de classe nos dois Estados


mais desenvolvidos do país (Rio de Janeiro e São Paulo), processo iniciado no final
do século XIX, é de suma importância para o desenvolvimento desse trabalho, uma
vez que faremos o comparativo entre essas associações e a FINDES.

Até 1930, o Brasil possuía uma economia basicamente agroexportadora e


a oligarquia brasileira era formada pelos grandes produtores de café, conhecidos

24
como “barões do café”. Essa oligarquia governou o país desde o início do século XX
até 1930.

Após 1930, “criou-se um processo de crescimento industrial,


acompanhado da derrubada da hegemonia econômica das oligarquias cafeeiras, um
forte aumento da população urbana, crescentes centralização e burocratização do
Estado” (LOSS, 2010, p. 227).

A indústria no final do século XIX, mesmo que embrionária, firmava-se e


progredia no Rio de Janeiro, então capital federal. Para Leopoldi (2000), esse
crescimento da indústria fluminense relacionava-se à organização dos industriais
que, sentindo-se ameaçados por todas as variações cambiais recorrentes no
período, solicitaram ao governo uma proteção tarifária.

Essas “campanhas industrialistas se sucediam, mas delas saíram


associações de classe de caráter efêmero, que não sobreviveram às campanhas
que lideravam” (LEOPOLDI, 2000, p. 60). Para a referida autora, esse processo
originou uma relação dialética visto que, essa organização dos industriais favoreceu
sua entrada no aparelho estatal, fortalecendo a própria classe que, alocada no
aparelho estatal pressionava para o surgimento de novas indústrias, contribuindo
com novos surtos de industrialização.

Portanto, o crescimento da indústria fluminense foi gerado pelo


movimento dos industriais e por sua respectiva organização nas associações de
classe (LEOPOLDI, 2000).

Apesar da dissolução dessas primeiras associações, destaca-se que elas


tiveram um papel especial no que diz respeito à sedimentação da união regional dos
industriais, uma vez que várias entidades se formaram no Rio de Janeiro no final do
século XIX.

[...] a Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional – SAIN (especialmente


nos anos 1870 e 1880), a Associação Industrial (1881), o Centro Industrial
(1890-1892) e o Centro de Indústrias de Fiação e Tecelagem de Algodão do
Rio de Janeiro (1902-1904), foram marcos simbólicos na luta da indústria
para sobreviver e crescer numa economia agroexportadora na qual se
reafirmava constantemente a vocação agrária e importadora de bens de
consumo do país (LEOPOLDI, 2000, p. 61).

25
Nessa perspectiva, Leopoldi (2000) descreve o processo de criação da
Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (FIRJAN), importante órgão que visava
defender o interesse dos industriais cariocas:

Serzedelo Correia assumiu a presidência da SAIN em 1902 e terminou por


fundi-la com o Centro de Fiação e Tecelagem do Rio de Janeiro, dando
origem ao Centro Industrial do Brasil (1904). O CIB foi a primeira entidade
de caráter permanente de classe da indústria organizada sem qualquer
interferência estatal. Ele sobreviveu até 1931 e, com o advento da
legislação sindical daquele ano, deu lugar a uma organização corporativa, a
Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (LEOPOLDI, 2000, p. 63-64).

Demonstramos como o Rio de Janeiro surgiu no cenário nacional


enquanto precursor das associações de classe, porém nas primeiras décadas do
século XX, São Paulo assume a vanguarda da industrialização brasileira.

Dentre os fatores que posicionam São Paulo no epicentro da economia


dinâmica, citamos a “crescente demanda produzida pelo complexo cafeeiro, o
acúmulo de capital e a constante necessidade de inversões” (BAROBOSA, 2008, p.
45). Tais fatores possibilitavam um crescimento industrial mais acentuado em São
Paulo do que em outros Estados. Leopoldi (2000, p. 71) destaca que a força da
indústria paulista estava no “capital da cafeicultura, dos grupos exportadores e das
casas bancárias nacionais e estrangeiras”.

Desse modo,

São Paulo, devido à sua maior capacidade de inversão de capital, ao


excedente de mão-de-obra assegurada pela imigração e pelo êxodo rural
que garantiam estoques de mão-de-obra, às facilidades de transportes
devido à malha ferroviária para escoamento da produção agrícola, ao
desenvolvimento de uma densa rede urbana, a um amplo mercado
consumidor e sistema de crédito fácil, pôde operar sobre melhores
condições e menores custos para a instalação da indústria. [...] Assim, São
Paulo ia alocando a maior parte dos estabelecimentos industriais e o maior
número de operários no setor fabril (BARBOSA, 2008, p. 45-46).

Assim como no Rio de Janeiro, São Paulo também apresentou


associações de caráter efêmero que surgiram no final do século XIX e
permaneceram até o início do século XX.

As associações rurais organizaram-se separadamente, enquanto os


interesses do comércio e da indústria tenderam a se organizar, nas duas
primeiras décadas do século, no interior da Associação Comercial de São
Paulo, ACSP (fundada em 1894). Numerosas organizações setoriais da
indústria emergiram em São Paulo nesta mesma fase, dentre as quais um
Centro de Fiação e Tecelagem de Algodão, em 1905, o qual, juntamente
com o CIB, pressionou o Congresso para o aumento da quota-ouro nas
importações (LEOPOLDI, 2000, p. 71).

26
Todas essas associações de classe, criadas nos Estados brasileiros,
tanto no final do século XIX quanto no início do século XX, convergiram para
objetivos comuns, sendo o principal deles: pressionar o Estado a fim de garantir que
o poder público atendesse seus interesses. Ainda que a conjuntura de cada Estado
fosse diferente, o caráter de tais associações era o mesmo.

Nesse sentido, através dessa relação é que,

[...] se estabelece o pacto tácito (por vezes formulado e explícito) de


dominação de classe. Ao contrário de outras burguesias, que forjaram
instituições próprias de poder especificamente social e só usaram o Estado
para arranjos mais complicados e específicos, a nossa burguesia converge
para o Estado e faz sua unificação no plano político, antes de converter a
dominação socioeconômica [...]. As próprias “associações de classe”, acima
de interesses imediatos das categorias econômicas envolvidas, visavam
exercer pressão e influência sobre o Estado (FERNANDES, 2006, p. 240).

Ainda que as burguesias estaduais apresentassem especificidades, cada


associação comercial/industrial buscava seus interesses de classe. Arranjos
políticos, pressão, lobby e uma forte influência junto ao poder público eram
características de tais associações (DINIZ & BOSCHI, 2004).

Por exemplo, a Associação Comercial de São Paulo, criada em 1894


tinha por objetivo atender aos interesses de diversos grupos empreendedores que
faziam parte da sociedade paulista4, dentre eles comerciantes, industriais e
proprietários de terra. Nota-se que, os industriais - enquanto classe - não haviam
criado nenhuma entidade com o objetivo de atender seus interesses, talvez porque a
industrialização no Brasil ainda fosse muito tímida.

A partir de 1920, a indústria paulista traça novos rumos, pois alcançara


um novo grau de desenvolvimento, e começa a

[...] procurar uma arena específica de representação de interesses, na qual


pudesse tratar da questão tarifária e da regulamentação do trabalho nas
fábricas. Começaram a surgir divergências entre industriais e importadores
no interior da ACSP em torno da questão tarifária. Este foi também um
período de grande mobilização política em São Paulo, e os industriais
dentro da ACSP tenderam então a se ligar mais profundamente ao Partido
Republicano Paulista, o PRP, enquanto os comerciantes apoiaram o Partido
Democrático (LEOPOLDI, 2000, p. 71).
A partir da década de 1920, mesmo com o avanço da industrialização em
São Paulo, industriais e comerciantes já não possuíam interesses em comum. Esse

4
Disponível em: http://portal.acsp.com.br/quem-somos/historia. Acesso em 07/02/2015.

27
antagonismo tornou-se inconciliável à medida que “se desenvolviam as indústrias e
os interesses de comerciantes importantes iam de encontro com as lutas por política
protecionistas por parte dos industriais” (BARBOSA, 2008, p. 98).

A organização da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo


(FIESP) só foi possível a partir de 1928, quando ocorre uma cisão dentro da ACSP e
surge o Centro das Indústrias do Estado de São Paulo. Sendo assim, em 28 de
março de 1928 é fundada a CIESP no Estado de São Paulo com o objetivo de
agrupar os interesses dos industriais paulistas (BARBOSA, 2008).

Podemos afirmar que a década de 20 foi emblemática para a

[...] construção da identidade das associações industriais. Sua liderança


aprofunda as relações com o Congresso e com o Poder Executivo, participa
da regulamentação das relações de trabalho e conquista um assento no
Conselho Superior de Comércio e Indústria, um órgão consultivo do governo
criado em 1923. No Final da década os industriais envolveram-se na
campanha presidencial, apoiando o candidato Washington Luís
(LEOPOLDI, 2000, p. 74).

Quando Vargas ascende ao poder em 1930, os industriais estão


organizados em associações setoriais e regionais. O Rio de Janeiro contava com o
Centro Industrial do Brasil (1904), São Paulo com a CIESP (1928), Minas Gerais
com o Centro Industrial de Juiz de Fora (1926), e o Rio Grande do Sul com o Centro
da Indústria Fabril do Rio Grande do Sul (1930). Entretanto, o burocrático Ministério
de Trabalho, Indústria e Comércio ficou responsável por elaborar uma nova
legislação sindical em que planejava organizar os empresários de uma forma
diferente do existente (LEOPOLDI, 2000).

Esse ministério elaborou um modelo corporativo de representação


industrial que foi proposto através do decreto 19.770 de 1931.

Segundo esse decreto, as associações de classe denominadas sindicatos


(âmbito local), federações (âmbito estadual) e confederações (âmbito
nacional) deveriam ter a aprovação do Ministério do Trabalho, Indústria e
Comércio para se instalarem e deviam submeter-se ao seu controle. Por
seu lado, a entidade “oficial” de classe ganhava um lugar no interior do
Estado, como “órgão consultivo e técnico” do Estado, em questões que
dissessem respeito aos seus interesses de classe (LEOPOLDI, 2000, p. 76).

Segundo Diniz & Boschi (2004), tal arranjo tinha um caráter dicotômico,
uma vez que

[...] permitiu aos setores empresariais o acesso a arenas estratégicas para a


defesa de seus interesses e para a criação e condições favoráveis à

28
acumulação capitalista; por outro, a centralidade assumida pelo sistema
corporativo nesse período colocou o conjunto da classe empresarial em
uma situação de dependência em face do Estado (DINIZ & BOSCHI, 2004,
p. 48-49).

Esse decreto possibilitou às Federações – que funcionavam em nível


estadual – a agregação de sindicatos. Sendo assim, por exemplo, a CIESP passou a
ser denominada Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP). Desde
a sua fundação, a FIESP “passou a ser porta-voz dos industriais paulistas frente ao
governo federal e suas ações ganhariam importância à medida que seu poder de
barganha crescia com o desenvolvimento industrial brasileiro” (BARBOSA, 2008, p.
100).

Para Leopoldi (2000, p. 60) existe uma relação clara entre o crescimento
industrial e o processo de organização dos industriais em associações de classe,
estabelecendo, para a referida autora, uma relação circular, uma vez que essa
classe gera pressão sobre o poder público para que haja novos surtos de
crescimento dos próprios industriais, que, por sua vez, acabam por reforçar o poder
do governo sobre o qual estabeleceu pressão.

O período que segue após 1930 é de consolidação da classe industrial


mesmo que sob uma legislação que a coloque numa posição de dependência em
relação ao governo. Apesar disso,

[...] os empresários puderam estabelecer um estilo de interação entre os


setores privado/público abrindo um espaço à participação direta em
questões-chave relacionada aos seus interesses enquanto classe. Essas
questões referem-se, genericamente, às possibilidades de acumulação de
capital para a promoção do crescimento industrial (BOSCHI, 1979, p. 53-
54).

As associações de classe que surgiram no Brasil a partir da década de


1930, como fruto de uma nova legislação implantada pelo governo Vargas, mesmo
estando dependentes do governo, mantêm seu caráter capitalista e sua principal
característica de defender seus interesses. Assim, tais associações são classificadas
na Sociologia Política como grupos de interesses.

29
1.3. Grupo de Interesses

Nesse tópico, analisaremos o conceito de grupos de interesses e como


este é desenvolvido nos debates políticos contemporâneos. Segundo Wotton (1972,
p.11), os grupos de interesse “[...] são todos os grupos ou associações que
procuram influenciar a política pública na direção que eles próprios escolhem, ao
mesmo tempo em que se recusam a aceitar a responsabilidade direta pelo governo
do país”. Tal autor aponta ainda para o aglomerado de termos que permeiam os
grupos de interesse, tais como pressão e lobby5.

Para Aragão (2000), existe uma confusão entre os termos “grupo de


pressão”, “grupo de interesse” e o lobby. No entanto, vamos procurar diferenciar
aqui os termos pressão e lobby, que compreendemos como táticas utilizadas pelos
grupos de interesse para alcançar seus objetivos.

A definição da palavra pressão pode ser uma “influência constrangedora e


coercitiva”, porém dentro da ciência política, sua concepção é distinta, pois para
(Pasquino apud Aragão, 2000), essa pressão só seria realizada através do uso de
sanções sobre o poder político. Dessa forma a pressão “seria toda ação destinada a
obter vantagens, benefícios, resguardar interesses ou impor determinados pontos de
vista. Tais ações podem incluir aspectos de constrangimento e de coação”
(ARAGÃO, 2000, p. 37).

Já o lobby, seria a ação de homens que agem com o objetivo de


influenciar o governo. Contudo, fazer lobby, seria “assediar e preocupar os membros
das legislaturas com persuasões para votar a favor de um projeto ou lei (WOTTON,
1972, p. 12).

Ou seja, pressão e lobby, são praticamente a mesma coisa, o que as


diferencia é a intensidade com que são aplicadas. Enquanto a pressão tem aspectos
mais rígidos como constrangimento e coação, o lobby seria feito pelo poder da
persuasão. No entanto, ambas ações buscam influenciar o poder público de alguma
forma.

5
No presente trabalho, a FINDES será considerada como grupo de interesse.

30
Para Santos (2002), não existe ainda um consenso entre cientistas
políticos acerca do termo grupo de interesses, uma vez que tal conceito está sempre
permeado por expressões como grupos de pressão e lobby. Esse autor procura
superar a questão definindo os conceitos de grupo de interesse, pressão e lobby.

Grupos de interesse são organizações apartadas do governo – embora


muitas vezes em estreito contato ou parceria com órgãos governamentais –,
cujo objetivo é exercer influência sobre políticas públicas [...]. “Pressão” é
empregada quando os canais de acesso para um grupo estiverem
obstruídos ou quando for ínfima a possibilidade do grupo ter seus interesses
levados em consideração pelos tomadores de decisão. O termo inglês
“lobby” é uma metáfora do vestíbulo diante da sala de reunião dos
parlamentares e refere-se a uma atividade particular dos grupos de
interesse, a tentativa de influenciar a deliberação de novas leis [...].
"“Pressão” e “lobby” indicam, portanto, possíveis técnicas de influência que
podem ser empregadas pelos grupos, não possuindo qualquer caráter de
definição.” (SANTOS, 2002, p. 197).

Almond & Powell Jr (1972) apontam para uma subdivisão nos grupos de
interesses. Dentre as classificações estão: os grupos não associativos de interesses,
grupos institucionais de interesses e grupos associativos de interesses. Apenas esta
terceira definição nos interessa, uma vez que tal expressão se encaixa em nosso
objeto de estudo.

Para os referidos autores, os grupos associativos de interesses são

[...] as estruturas especializadas de articulação de interesses – sindicatos


trabalhistas, organizações de homens de negócios ou industriais,
associações étnicas, associações organizadas por grupos religiosos, etc.
Suas características particulares são a representação aberta dos interesses
de um grupo determinado, uma equipe profissional em tempo integral e
procedimentos ordenados para a formulação de interesses de demandas
(ALMOND & POWELL JR, 1972, p. 55-56).

Independentemente da definição de tais grupos, o fato é que, a ação


destes sobre o processo político é um fato antigo na história. Desde a Idade Média,
as “corporações profissionais e de mercadores foram organizadas na Inglaterra,
Suécia e Suíça, objetivando maior participação no processo decisório de suas
respectivas comunidades” (DEUTSCH apud ARAGÃO, 1994, p. 17).

Assim, percebemos como a gênese de tais grupos tem sua raiz em


questões econômicas. A atuação desses grupos aumenta e se consolida a partir do
século XIX: novos fatores econômicos, a organização dos trabalhadores em
sindicatos e o fortalecimento do Estado são fatores-chave para esse crescimento
(ARAGÃO, 1994).

31
O crescimento e a consolidação dos grupos de interesse ocorreram em
especial nos países democráticos, uma vez que a democracia pressupõe fatores
como a independência do poder público, liberdade de imprensa, a livre escolha dos
governantes e a pluralidade partidária e ideológica, sempre reconhecendo que a
sociedade agrupa uma série de interesses divergentes.

Originalmente, estes grupos surgiram como contraponto à tentativa de


expansão do intervencionismo estatal. Sua proliferação decorre da
dificuldade e incapacidade dos partidos de manterem o monopólio da
representação e o terceiro fator que explica essa proliferação está nas
oportunidades abertas pelas regulamentações (MENY Apud RAINHA, 2012,
p. 23-24).

O primeiro ponto exposto por Meny (apud RAINHA, 2012) é a oposição à


expansão do aparelho estatal. Os grupos de interesse emergem com o intento de
influenciar, seja no campo político ou econômico, através da atuação no interior da
sua própria faixa de interesse e de seus associados.

Sendo assim, sua função concentra-se na atividade de influir nas


decisões do poder público, uma vez que o Estado se organiza, arrecada e
estabelece normas mais complexas, seja para o comércio, para a indústria, para a
proteção social e trabalhista e para a educação. Percebe-se então que, a sociedade
civil se organiza através de tais grupos para

[...] melhor participar dos debates sobre as políticas públicas e exercer, em


melhores condições, seu poder político. A organização dos interesses é a
chave para intermediar o diálogo entre o mundo privado e o oficial,
assegurar privilégios e defender interesses (ARAGÃO, 1994, p. 20).

Ainda sobre essa temática, salientamos que, grupos de interesse e


partidos políticos são termos que se confundem, visto que, ambos são
“característicos dos sistemas políticos democráticos contemporâneos nos quais são
tidos como instrumentos de mediação entre a sociedade e o Estado” (MANCUSO,
2004, p. 395).

Caracterizá-los e diferenciá-los não é uma tarefa simples, pois alguns


autores insistem em conceder aos partidos políticos o mesmo status que aos grupos
de interesse. Tal tentativa torna-se inviável devido a alguns fatores, principalmente,
que os grupos de interesse, diferente dos partidos políticos, não buscam o controle
do aparelho estatal (SANTOS, 2002).

32
Sucintamente, o partido político6 é “uma organização que tem como
objetivo colocar seu representante no poder, mesmo em países não democráticos,
ou mesmo em democracias mais frágeis” (MANCUSO, 2010).

Essa diferenciação de partido político e grupo de interesse é algo que


Wotton (1972, p. 42) desenvolve com bastante clareza quando define grupo de
interesse como “um ator particular, diferente de um partido político, que tenta
influenciar um alvo público para atingir algum objetivo”.

Dessa forma, o partido político tem duas funções específicas: “a disputa


eleitoral e a gestão direta do poder público. Assim, os partidos políticos são
organizações que participam diretamente da arena eleitoral e que procuram, por
esse meio, ascender à arena decisória” (MANCUSO, 2010, p. 400). Em
contrapartida, os grupos de interesses são “organizações que não disputam
eleições, mas cujas atividades visam interferir em decisões do poder público que
lhes dizem respeito”. (MANCUSO, 2010, p. 400).

Conforme apresentado anteriormente, Meny (apud RAINHA, 2012)


afirmou que a proliferação dos grupos de interesse relaciona-se à limitada
capacidade dos partidos políticos na manutenção do monopólio da representação.

Nessa perspectiva, três questões emergem:

Os partidos políticos alcançam o mesmo grau de representação que os


grupos de interesse?

Para Almond & Powell Jr. (1972) a articulação de interesses poderia ser
desempenhada por vários grupos diferentes e de várias formas distintas. A
articulação de interesses é colocada como a fronteira entre a sociedade e o sistema
político, e, tanto os grupos de interesse quanto os partidos políticos realizam a
função de articulação.

Existe alguma relação direta entre o partido político e o grupo de


interesse?

Segundo Panebianco (apud MANCUSO, 2010), existem três tipos de


relações entre os partido políticos e os grupos de interesse. Sendo elas: dominação,
subordinação e intercâmbio equilibrado7.

6
Nas páginas seguintes os partidos políticos serão definidos de forma precisa.

33
A relação de dominação ocorre quando

[...] a liderança do grupo de interesse depende dos recursos oriundos do


partido político (recursos financeiros e/ou simbólicos) para manter sua
organização e quando não há dependência no sentido inverso. Nesse caso
[...], o grupo de interesse dominado não pode usufruir de autonomia para
realizar suas atividades (MANCUSO, 2010, p. 403).

A relação de subordinação é o contrário. Ela ocorre quando

[...] o partido político depende dos recursos proporcionados pelo grupo de


interesse e o grupo de interesse não precisa dos recursos disponibilizados
pelo partido político. Quem padece de heteronomia é a liderança do partido,
pois a liderança do grupo de interesse possui condições para interferir de
forma decisiva no recrutamento dos candidatos, na definição das propostas
políticas que o partido irá defender e em vários outros aspectos da vida
partidária. O partido político torna-se um mero porta-voz das demandas
particulares dos grupos de interesse (MANCUSO, 2010, p. 403).

Nesse caso, o partido político só consegue manter o monopólio da


representação quando exerce sobre o grupo de interesse uma relação de
dominação, o que não tem sido o caso, pois o próprio modelo político brasileiro
aponta para uma relação de subordinação dos partidos em relação aos grupos de
interesse.

Segundo Mancuso (2010), os dados necessários para estabelecer essa


relação de subordinação é algo que só pode ser comprovado empiricamente. Assim,
dois fatores apontam para as dificuldades de se conseguir dados concretos sobre
essa questão:

Por um lado, uma parcela significativa dos grupos de interesse brasileiros


(sindicatos, federações, confederações, centrais sindicais, em suma, todas
as entidades que compõem o sistema corporativo oficial de representação
de interesses de trabalhadores e de empresários) está legalmente proibida
de destinar contribuições financeiras para os partidos políticos. Por outro
lado, as informações referentes às contribuições de campanha e
consignadas nas prestações de conta enviadas pelos partidos políticos aos
Tribunais Eleitorais são pouco confiáveis (MANCUSO, 2010,p 403-404).

Entre os poucos textos que tratam do assunto citamos Kinzo (Apud


MANCUSO, 2010), o qual avalia que os partidos políticos não estão identificados
como grupos de interesse, pois segmentos sociais importantes têm sido
representados por agrupamentos suprapartidários, dentre os quais, podemos
destacar: a “bancada ruralista”, presente na Câmara dos Deputados, formada por

7
Nesse estudo serão detalhadas apenas as relações de dominação e subordinação, tendo em vista a
relevância destas para o desenvolvimento do tema proposto.

34
grandes produtores rurais que, independentemente dos partidos a qual pertençam,
estarão sempre buscando atender os interesses do agronegócio.

Soma-se ainda outro exemplo: a “bancada evangélica”, à qual se


vinculam religiosos que, independentemente dos partidos políticos aos quais estão
filiados (mesmo que sejam governo ou oposição), tendem a se posicionar contra
questões que afetem a moral religiosa, tais como, a união homoafetiva e a
legalização do aborto.

Embora não pertençam à mesma legenda, percebemos que essas


“bancadas” formam grupos de interesse que atuam em prol de objetivos comuns, o
que os caracteriza enquanto grupo de interesses suprapartidários. Dessa forma,
nesse caso brasileiro, concordamos com Meny (1996) no sentido de que os partidos
políticos, de fato, perderam o monopólio da representação de interesses.

Destacamos ainda que, não existe qualquer tipo de regulamentação que


cerceie a ação dos grupos de interesse e o direito de agir em benefício próprio. Isso
nos leva à terceira questão, pois no Brasil a ação de tais grupos é regulamentada:

Assim, praticamente em todo Estado democrático em que exista a garantia


constitucional e/ou legal para o direito de livre associação para fins lícitos e
o direito de petição, ocorrem ações de defesa de interesses por parte dos
grupos organizados da sociedade. No Brasil, a organização dos grupos de
pressão possui amparo constitucional [...] (ARAGÃO, 1994, p. 21).

Ao decorrer desse subcapítulo procuramos apresentar elementos que


viabilizassem a compreensão do termo grupo de interesse. A seguir, analisaremos a
primeira associação de classe criada no Espírito Santo, a Associação Comercial de
Vitória (ACV).

1.4. A criação da Associação Comercial de Vitória: Industrialização à vista?

Conforme visto anteriormente, o processo de desenvolvimento das


associações de classe, tanto no Rio de Janeiro como em São Paulo, começaram da
mesma forma. Em ambos Estados, as associações de classe surgiram com os
comerciantes e, foram as divergências de interesses existentes entre comerciantes e

35
industriais que contribuíram para a criação de associações industriais antes de 1930
(LEOPOLDI, 2000).

O Espírito Santo, ainda que tardiamente (comparado aos outros Estados


supracitados), também assistiu na atuação dos comerciantes o primeiro processo de
organização dos empresários. Nesse sentido,

[...] o primeiro grande projeto político de desenvolvimento econômico e


social do Espírito Santo, capitaneado por figuras como Muniz Freire (1892-
1896 e 1900-1904) e Jerônimo Monteiro (1908-1912), na virada do século
XIX para o XX, escorou-se na atuação dos comerciantes, que eram os
principais interessados em que o Espirito Santo abandonasse a timidez
econômica que havia prevalecido na maior parte de sua história (SANTOS,
2011, p. 104). (grifo nosso)

Mesmo com todo atraso do ciclo econômico capixaba e sua dependência


da cultura do café, os comerciantes radicados no Estado sabiam que, para a
sobrevivência da cafeicultura no Espírito Santo, era necessária
[...] a ativação e a operação paralela de um relativamente eficaz setor
comercial que se encarregou de efetuar a ligação entre a economia regional
e a economia nacional e internacional, viabilizando-a. Nesse contexto, os
comerciantes e homens de negócio da capital e dos nascentes centros
urbanos do interior tiveram um papel social e político que não foi nada
desprezível (SANTOS, 2011, p. 104).

Em 1909, durante o governo de Jerônimo Monteiro (1908-1912), foi criada


a Associação Comercial de Vitória (ACV) que reunia em torno de si comerciantes,
banqueiros, proprietários capitalistas, agentes comerciais, leiloeiros, e tinha por
objetivo,
[...] a defesa dos legítimos interesses das classes empresariais; o
desenvolvimento e a prosperidade das atividades empresariais; [...] exercer
perante os poderes públicos as funções de órgão técnico e consultivo, para
o estudo e a solução dos problemas relacionados com os interesses das
classes que congrega e a economia nacional (Estatuto ACV apud SANTOS,
2011, p. 106).

Dentre as funções que a ACV exercia, podemos destacar: “arbitrar


questões entre empresários, negociar com os trabalhadores de uma determinada
categoria, buscar preços mais baixos para produtos de um determinado ramo
comercial [...]”. (CALIMAN, 2006, p. 132).

Identificamos relativo atraso na criação da ACV em relação às demais


Associações criadas no Brasil, principalmente as de São Paulo e Rio de Janeiro que
surgem no final do século XIX. Nesse período, tanto a industrialização como as

36
associações industriais eram incipientes, o comércio detinha mais força e a maior
acumulação de capitais.

Esse quadro modifica-se a partir da primeira guerra mundial, como


apresentado anteriormente.

A Grande Guerra de 1914-1918 dará grande impulso à indústria brasileira.


Não somente a importação dos países beligerantes, que eram nossos
habituais fornecedores de manufaturas, declina e mesmo se interrompe em
muitos casos, mas a forte queda do câmbio reduz também
consideravelmente a concorrência estrangeira. No primeiro grande censo
posterior à guerra, realizado em 1920, os estabelecimentos industriais
arrolados somaram 13.336, com 1.815.156 contos de capital e 275.512
operários. Destes estabelecimentos, 5.936 foram fundados no quinquênio
1915-1919, o que revela claramente a influência da guerra (PRADO
JÚNIOR, 1994, p. 261).

A produção de café no Espírito Santo também sofreu com a primeira


Guerra Mundial. No entanto, as exportações do produto se recuperam,
principalmente, no governo de Florentino Avidos (1924-1928).

Com as exportações recuperadas, os grandes comerciantes de café do


Estado voltam a alcançar altos lucros com o sistema da cadeia de subordinação à
qual os grandes comerciantes submetiam colonos e pequenos comerciantes. Nesse
novo contexto, os comerciantes tinham uma associação de classe que representava
seus interesses.

Dessa forma, a ACV deveria exercer,

“[...] as funções de órgão técnico e consultivo na análise de questões


relacionadas aos interesses das empresas e economia como um todo [...]".
Em suma, tudo que dizia respeito ao empresariado capixaba, no início do
século XX, necessariamente passava pela Associação Comercial de Vitória
(CALIMAN, 2006, p. 132).

A atuação dessa associação não se resumiu apenas às questões


relacionadas à economia. Dois episódios ocorridos no início da década de 1930
demonstraram sua força política no Espirito Santo e sua capacidade de influenciar e
exercer pressão sobre os órgãos públicos capixabas (ainda que fosse uma
associação comercial). Os episódios ocorreram durante a Revolução de 19308.

8
Getúlio Vargas assumiu o poder em 1930, após comandar a Revolução de 1930 que derrubou o
Presidente eleito Washington Luís. Seus quinze anos de governo seguintes caracterizaram-se pelo
nacionalismo e populismo. Sob seu governo foi promulgada a Constituição de 1934. Em 1937, fecha
o Congresso Nacional, instala o Estado Novo e passa a governar com poderes ditatoriais até 1945.

37
O país passava por grandes tensões, fruto da Revolução de 1930, porém,
no Espírito Santo, Aristeu Borges Aguiar governava o Estado desde 1928 e foi
solidário ao governo deposto de Washington Luís. Vários Estados apoiaram Vargas
no decorrer da revolução, inclusive Minas Gerais, mas, ao saber do apoio de Aristeu
Borges ao presidente deposto, noticiou-se uma invasão do Estado pela região
fronteiriça de Manhumirim, deixando o Estado em alerta (ZORZAL E SILVA, 1995).

Receosos das consequências que o Estado sofreria se enfrentasse uma


invasão, a diretoria da ACV tentou dissuadir o então governador acerca da
resistência:

[...] a Diretoria da Associação Comercial por nós representada, esteve em


íntimo contato com os elementos oficiais, procurando demovê-los de uma
resistência inútil, que apenas poderia fazer sacrifício de vidas. Assim é que,
em companhia do presidente honorário dessa Associação, dirigimo-nos ao
Presidente do Estado, Aristeu de Aguiar, a quem fizemos ver os
inconvenientes de uma resistência, em benefício da nossa população (ATA
ACV 6-11-1930 apud ACHIAMÉ, 2010, p. 328).

O segundo episódio que demonstrou a força política da ACV no Estado


configurou-se com a indicação do interventor após a vitória de Vargas.

[...] Getúlio Vargas decidiu-se pelo nome do capitão João Punaro Bley que,
apesar de não ser do Espírito Santo, foi indicado pela Associação Comercial
de Vitória e tivera participação importante na luta revolucionária no Espírito
Santo. Além disto, ele pertencia ao grupo de militares revolucionários [...]
(ZORZAL E SILVA, 1995, p. 115).

Esse episódio nos traz a compreensão da importância dessa associaçãos


de classe e, como um grupo de interesse bem organizado, consegue exercer
pressão sobre o poder público mesmo não fazendo parte do espectro político-
partidário.

A ACV seria apenas um órgão consultivo/comercial. No entanto, na


prática, observa-se que essa associação, através da pressão exercida sobre o
Estado, buscava influenciar as decisões governamentais em prol de seus interesses.

No Brasil, a Revolução de 1930 foi vitoriosa e estava consolidada. No


mundo, os efeitos da “crise de 1929” influenciavam as economias nacionais. Esses
dois fatores foram determinantes para que o Brasil entrasse em um “profundo
processo de transformações e de mudanças sociais e econômicas que iriam resultar
na superação do antigo modelo agrário-exportador, cuja economia baseava-se na
exportação do café” (SANTOS, 2011, p. 110).

38
Contudo, o Espírito Santo manteve-se estagnado em relação à
dependência do café e à industrialização. Destacam-se dois fatores principais:

Primeiramente, a difícil situação financeira do Estado no início da gestão


Punaro Bley que, em sua interventoria, preocupou-se em

[...] sanear as finanças públicas, a nível tanto de Estado como dos


municípios; reorganizar e racionalizar as atividades administrativas, e,
principalmente, a preocupação em reduzir os gastos públicos aos limites
possíveis previstos para a receita estadual [...], [...] a ação esteve
nitidamente voltada par o atendimento das demandas do setor social –
saúde, educação, assistência social, etc (ZORZAL E SILVA, 1995, p. 118).

Punaro Bley manteve essa linha administrativa durante todo o período em


que esteve nesse cargo, ou seja, não houve ações que visassem à industrialização
do Estado e, tampouco, pressões advindas da elite nesse sentido. O foco dessa
administração manteve-se em sanear as finanças do Estado, “quando muito, sugeria
alguma diversificação na agricultura” (SANTOS, 2011, p. 119).

Outro fator relevante para a estagnação industrial do Espírito Santo foi a


inércia da ACV em relação à industrialização. As ações da ACV, enquanto entidade
comercial, restringiam-se ao desenvolvimento do comércio.

Enquanto vários Estados redirecionaram suas atividades econômicas


para a industrialização – originando as associações de classe industriais como a
FIESP e FIRJAN -, a elite econômica capixaba, alocada na ACV, manteve suas
apostas na atividade agroexportadora, pois a década de 1930 foi o período de maior
exportação do café capixaba.

Sendo assim, para que investir na indústria se, mesmo em meio à crise, o
Estado superava seus recordes na exportação do café?

Conforme apresentado, pelo menos na visão da ACV, não havia motivos


óbvios para uma tentativa de industrialização do Estado naquele momento, visto que
os comerciantes alcançavam lucros altíssimos.

A análise da evolução do Porto de Vitória, realizada por Araújo Filho


(apud SANTOS, 2011), que interpreta as estatísticas da exportação fornecidas pelo
IBGE é uma das fontes que corrobora para as afirmações supracitadas. Verificou-se
que “entre 1927/1930, o porto de Vitória exportou uma média de 1,18 milhões de
sacas de café; mas que, no apogeu da crise, por exemplo, entre 1931 e 1934

39
exportou uma média de 1,34 milhões de sacas” (ARAÚJO FILHO apud SANTOS,
2011, p. 116). Em outras palavras, o Estado exportou mais café durante a crise do
que antes dela, tratava-se de uma grande “euforia exportadora”.

Araújo Filho (apud SANTOS, 2011), também explica esse fenômeno. Para
o referido autor, tal movimento econômico relaciona-se ao fato de “os cafés do
Espírito Santo serem de baixo preço, em função da sua inferior qualidade, [...] e por
isso entrarem na formação de “blends” europeus ou norte-americanos, quer para
torrados, quer para solúveis” (ARAÚJO FILHO apud SANTOS, 2011, p. 116).

Criou-se uma grande contradição, pois a área onde era cultivado um dos
piores cafés do Brasil apresentou superação de recordes e toda sua produção foi
comercializada num período de crise econômica, ao contrário dos outros Estados
produtores.

A segunda fonte, que fundamenta a afirmação defendida, é uma carta de


Jones dos Santos Neves ao então presidente Getúlio Vargas, escrita em 21 de julho
de 1943. A carta fazia grandes elogios a Punaro Bley e destacava os números da
exportação do café, deixando bem claro e patente que,

[...] o intercâmbio comercial do Espírito Santo repousa, principalmente,


sobre a estrutura das suas tradicionais relações com os mercados externos.
Ao passo que o total exportado para o estrangeiro atingiu, de 1931 a 1942,
Cr$ 1.525.373.000,00, o movimento de cabotagem para as demais
unidades da Federação apenas totalizou, em idêntico lapso de tempo,
690.283.000,00, ou seja, menos da metade daquele valor. (NEVES, 1988,
p. 24).

Concluímos que, tais números são responsáveis pela inércia do


empresariado capixaba em buscar a industrialização do Estado. Enquanto a
mentalidade do país seguia rumo à industrialização, o governo capixaba se
beneficiava do PIB gerado pelos recordes nas exportações de café. A elite mercantil-
exportadora estava satisfeita com os números da exportação e a ACV via o
comércio local ser movimentado por essa atividade.

Os números alcançados pelo comércio capixaba eram tão significativos


que a ACV sugere a Punaro Bley a criação de um banco de crédito. O interventor
cria, em 1937, o Banco de Crédito Agrícola do Espírito Santo que tinha como
objetivo atender à lavoura, proporcionando empréstimos aos agricultores através de
taxas módicas (SANTOS, 2011).

40
No aspecto político, Punaro Bley permanece como interventor do Estado
9
até 1943 , quando é substituído por Jones dos Santos Neves. Com efeito, podemos
dizer que foi Santos Neves quem deu os primeiros passos rumo à industrialização
do Espírito Santo.

Mesmo estando à frente do Estado como interventor por apenas dois


anos, Santos Neves imprimiu maior dinâmica ao desenvolvimento do Estado do que
Punaro Bley10 realizou em treze anos. Santos Neves seguiu

[...] a lógica de urbanização e industrialização nos moldes e influência de


Vargas, a preocupação de Jones estava voltada para reestruturar a
economia do Estado, imprimindo-lhe diretriz diferente, com direção e
sentido industrial, orientando-a para uma base mais sólida, pela
diversificação econômica e diminuição de dependência da produção rural.
(VILLASCHI; FELIPE & OLIVEIRA, 2011, p. 49).

Compreendemos Jones dos Santos Neves como o primeiro político a se


preocupar com a industrialização do Estado desde a revolução de 1930. Sendo que,
nos anos anteriores, a ação do governo Punaro Bley “se voltou, em primeiro lugar,
para o saneamento das finanças públicas. Procurou reduzir em 67% o montante das
despesas orçadas para o exercício de 1931 [...]” (VILLASCHI; FELIPE & OLIVEIRA,
2011, p. 45).

Santos Neves permaneceu na interventoria do Espírito Santo entre 1943


e 1945 quando se encerra a ditadura varguista no Brasil. “A redemocratização do
país, ocorrida em 1945, inaugura uma nova fase no processo de mudança do
Estado brasileiro, posto que, a partir daí, o espaço político institucional é reaberto a
uma maior participação da sociedade” (ZORZAL E SILVA, 1995, p. 155).

1.5. O empresariado como ator político

9
Punaro Bley saiu da interventoria para assumir a presidência da recém-criada Companhia Vale do
Rio Doce (CVRD).
10
Punaro Bley e Jones dos Santos Neves tinham projetos diferentes para o estado. Enquanto Punaro
Bley concentrava-se em implantar o projeto varguista de desenvolvimento, trazendo dessa forma uma
maior modernização para a agricultura, Jones dos Santos Neves propunha um projeto modernizador
para o estado, procurando dessa forma desenvolver a indústria no Espírito Santo (ZORZAL E SILVA,
1995).

41
A atuação da ACV no cenário político nos direciona para a seguinte
questão: o empresariado é um ator político forte no Brasil?

Segundo Mancuso (2007), uma vasta produção acadêmica tem sido


apresentada no Brasil e no exterior tendo como temática a ação do empresariado
como um ator político. Tais trabalhos apresentam pontos de vista antagônicos; de
um lado, estudos que caracterizam os empresários enquanto atores políticos fortes e
capazes de influenciar o campo político; e, por outro lado, alguns estudos (BOSCHI,
1979; DINIZ & BOSCHI, 2004; LEOPOLDI, 2000) que, além de caracterizarem o
empresariado como um ator político forte, tem como foco o empresariado industrial.

A outra vertente, que caracteriza o empresariado como um ator político


fraco, está nos clássicos brasileiros das Ciências Sociais como Fernando Henrique
Cardoso, Celso Furtado, Nelson Werneck Sodré, Caio Prado Júnior, entre outros.

Entretanto, Mancuso (2007) compartimenta essas análises sobre o


empresariado em cinco ondas distintas, com recortes temporais e teóricos distintos,
conforme quadro abaixo:

42
QUADRO 1 – AS CINCO ONDAS DE TRABALHOS SOBRE O EMPRESARIADO

Primeira Onda Segunda Onda Terceira Onda Quarta Onda Quinta Onda

Década de 1950 até Década de 1960 até a Segunda metade da Segunda metade de Primeira Metade da
meados da década década de 1970 década de 1970, 1980 1990 até hoje Década de 2000 até
de 1960 e meados 1990. hoje

Argumento Argumento Argumento Argumento Argumento

A parcela A liderança A burguesia O empresariado que O empresariado


nacionalista do industrial brasileira é industrial brasileira atua no Brasil é empenhou-se em um
empresariado incapaz de exercer teve atuação política incapaz de uma ação grande processo de
industrial brasileiro é liderança. intensa durante política. Essa mobilização ao longo
incapaz de liderar todas as fases do incapacidade é a da década de 1990,
uma aliança com os processo de razão de sua no plano doméstico
trabalhadores. industrialização do fraqueza política, e os desdobramentos
país. sua principal causa é são as campanhas
o sistema pela redução do
corporativista de custo Brasil liderada
representação de pela Confederação
interesses. Nacional da
Indústria.

ATOR POLÍTICO ATOR POLÍTICO ATOR POLÍTICO ATOR POLÍTICO ATOR POLÍTICO

FRACO FRACO FORTE FRACO FORTE

AUTORES AUTORES AUTORES AUTORES AUTORES

Hélio Jaguaribe e Fernando Henrique Renato Raul Boschi, Bem Ros Schineider, Amâncio Jorge de
Nelson Werneck Cardoso, Celso Eli Diniz e Maria Kurt Weyland. Oliveira e Wagner
Sodré. Furtado, Caio Prado Antonieta Leopoldi. Pralon Mancuso.
Júnior.

Fonte: Elaboração Própria a partir de MANCUSO, 2007, p. 132-133.

Como nosso estudo é regional e concentra-se apenas na FINDES e em


sua atuação no contexto político e econômico do Espírito Santo, seguiremos a linha
da terceira onda, trabalhando com Diniz & Boschi (2004) e Leopoldi (2000). No
pressuposto teórico de tais autores, procuraremos apontar para a importância da
FINDES na industrialização do Espírito Santo e como, a partir do regime militar, tal
entidade passa a atuar como um ator político forte.

Segundo Diniz & Boschi (2004, p. 48), analisando a evolução histórica do


empresariado brasileiro, é possível perceber quatro momentos distintos que, com o
passar do tempo, indicam “uma progressiva diferenciação e o fortalecimento de seu
papel enquanto ator político”.

43
O primeiro momento, com o recorte temporal 1930-1945, caracteriza-se
por “um amplo processo de diferenciação do empresariado industrial em face dos
seguimentos agroexportadores”. Esse momento está bem caracterizado no tópico
1.3 dessa pesquisa, quando percebemos a ascensão da indústria através da
formação das associações de classe que buscavam, paralelamente, conquistar seu
espaço político.

O segundo momento refere-se aos anos 1950 que ficam marcados com a
projeção nacional da FIESP – a principal entidade de classe do setor industrial
brasileiro. Nesse segundo momento, observou-se “um amadurecimento das
propostas do empresariado, com a formulação de um projeto industrializante que
veio a integrar a matriz ideológica desenvolvimentista do governo Kubitschek” (DINIZ
& BOSCHI, 2004, p, 49). Nota-se, nessa fase, como o empresariado cria uma
coalizão que acaba dando suporte ao modelo criado por Juscelino Kubitschek,
assumindo, assim, um papel ativo nesse novo modelo de desenvolvimento.

O terceiro momento ocorreu a partir da instauração do regime militar, em


1964, pois a partir de então, no campo econômico,

[...] penetramos no contexto do capitalismo monopolista. Para tanto, uniram-


se numa nova aliança todos os setores capitalistas, sob a hegemonia do
capital estrangeiro, e, com a participação de militares e tecnocratas, instala-
se um regime autoritário, em que é anulado qualquer espaço de
participação popular, e a participação das classes médias urbanas quase
reduz ao plano das aparências (SIQUEIRA, 2010, p. 27).

Concomitante à ascensão do regime militar, implantou-se “um projeto do


aprofundamento do capitalismo brasileiro, o qual contou com substancial suporte do
empresariado” (DINIZ & BOSCHI, 2004, p. 49). Esse terceiro período, por sua vez, é
marcado por três momentos distintos: o primeiro momento ocorreu entre 1964-1967
e correspondeu a um contexto de forte repressão política e execução de políticas de
estabilização econômica; o segundo momento correspondeu ao surto
desenvolvimentista do “milagre econômico”, quando se verificou

[...] um marcante aperfeiçoamento da capacidade organizacional do


empresariado industrial com a consolidação do sistema de dupla
representação de interesses, constatando-se considerável aumento das
associações paralelas. Esta expansão se dá particularmente nos setores
industriais de ponta, configurando-se um processo de diferenciação
marcado pela emergência de um segmento moderno e bem articulado com
esferas decisórias governamentais na área de política econômica (DINIZ &
BOSCHI, 2004, p. 49-50).

44
A terceira fase, a partir do governo de Ernesto Geisel caracterizou-se
exatamente pelo fechamento desse processo decisório que levou “a uma
progressiva exclusão dos empresários das instâncias estratégicas para a definição
das grandes diretrizes da política econômica” (DINIZ & BOSCHI, 2004, p. 50). Tal
ciclo se fechou a partir do momento em que o governo militar iniciou uma campanha
pela estatização da economia, o que culmina na retirada do apoio das elites
industriais face ao governo (DINIZ & BOSCHI, 2004).

Na quarta e última fase, a partir da Nova República em 1985, o


empresariado passou por um processo de reestruturação, assumindo um papel mais
influente junto ao governo federal, dessa forma,

[...] o empresariado tornou-se mais visível em sua atuação política,


assumindo um papel mais ativo, quer por intermédio de suas lideranças,
quer por intermédio de suas entidades de cúpula, como a FIESP[...].
Paralelamente, verificou-se um estreitamento dos vínculos empresariais
com segmentos de uma nova tecnocracia, que passa a ocupar posições
centrais no aparelho de Estado, particularmente durante o governo Sarney.
(DINIZ & BOSCHI, 2004, p. 50).

Para essa pesquisa, interessa-nos o segundo momento da terceira fase


do processo de inserção e fortalecimento do empresariado como ator político, pois a
partir de 1967, como já citado, ocorre o chamado “milagre econômico” e a inserção e
maior participação do empresariado junto ao poder público. Como veremos adiante,
esse empresariado no Estado do Espírito Santo era representado pela elite
empresarial11 capixaba que se organizou em torno de Federação das Indústrias do
Espírito Santo.

11
O termo elite empresarial “refere-se a um grupo que possui ou controla diversos tipos de capital e,
portanto, possui poder econômico relevante frente à sociedade, mas dentro desse grupo são
considerados apenas aqueles que se destacam no processo de representação política do próprio
grupo. Isso permite que a elite empresarial seja considerada mais do que uma elite econômica, mas
também como uma elite política [...]” ( COSTA, P.R.N.; ENGLER, I.G.F., 2008, p. 493).

45
2 O PROCESSO DE CRIAÇÃO DA FINDES E SUA RELAÇÃO COM O
PODER PÚBLICO CAPIXABA

2.1 Introdução às disputas eleitorais no Espírito Santo (1947-1962):


democracia e elites

Segundo Souza (1983), após o fim da segunda Guerra Mundial houve um


descrédito internacional em relação aos regimes ditatoriais, o que “desautorizava” os
regimes nazistas e fascistas. No Brasil, esse fato fortaleceu a oposição interna ao
governo Vargas, pois o Brasil ainda estava sob o jugo do Estado Novo.

A primeira manifestação pública oficial que marcou o início dessa


oposição é o “Manifesto dos Mineiros”12. A partir daí, esses protestos contra a
ditadura varguista “assumiram uma forma mais organizada, e a imprensa, menos
tímida, difundia o pensamento de civis e militares favoráveis à implantação de um
governo liberal-democrático no país” (SOUZA, 1983, p.63).

Após sofrer uma série de pressões, Getúlio Vargas assumiu algumas


medidas que demonstraram certo abrandamento do autoritarismo exercido pelo
Estado Novo, apontando assim para a redemocratização do país.

Nesse contexto, Vargas concedeu

[...] anistia aos presos políticos e, em maio de 1945 lançou mão do Decreto-
lei nº 7.586, por meio do qual criara um código eleitoral provisório, que
regulamentaria as eleições presidenciais e para a Assembleia Nacional
Constituinte (função que se revestiria o Congresso Nacional). Esta Lei,
também conhecida como Lei Agamenon, introduziu na legislação eleitoral
brasileira a exigência de organização de partidos políticos de bases
nacionais (OLIVEIRA, 2013, p. 66).

Em contrapartida, Souza (1983), sinaliza para um diferencial no processo


de reabertura política ocorrida em 1945. Para a referida autora, essa restauração
democrática, ocorrida em 1945, foi ocasionada

“ [...] muito mais por eventos internacionais que por dissensões econômicas
internas graves que estabelecessem sérios conflitos de classes, não

12
O Manifesto dos Mineiros foi uma carta aberta, publicada em 1943, por intelectuais de Minas
Gerais onde defendiam a redemocratização e o fim do Estado Novo.

46
produziu uma substituição radical dos grupos no poder, embora exigisse
uma reformulação político-institucional”. (SOUZA, 1983, p. 65)

Sendo assim, mesmo que a atuação fosse com os mesmos atores, essa
redemocratização representou uma “nova fase no processo de mudanças do Estado
brasileiro, posto que, a partir daí até 1964, o espaço político-institucional foi reaberto
a uma maior participação das forças sociais”. (ZORZAL E SILVA, 1995, p. 155).

Com o novo sistema político, em vigor a partir de 1945, são retomadas as


eleições diretas e o pluripartidarismo e a sociedade voltou a participar de forma mais
efetiva na política. Entretanto, segundo Souza (1983) esse novo sistema partidário
também agregou e articulou interesses trazendo consigo uma característica herdada
da ditadura varguista: a fragilidade dos partidos políticos frente a um Executivo forte.

Dessa forma, mesmo que o regime anterior tenha acabado e o Brasil


retomasse elementos democráticos como pluripartidarismo, sistema partidário e
eleições diretas, ainda assim, a autora destacou uma continuidade do antigo
sistema.
O advento do pluralismo partidário, de eleições diretas, e o retorno à
separação formal dos poderes do Estado, determinados pela Carta
Constitucional de 1946, foram superpostos ou acoplados à estrutura
anterior, marcada pelo sistema de interventorias, por um arcabouço sindical
corporativista, pela presença de uma burocracia estatal detentora de
importante capacidade decisória, para não mencionar a plena vigência, na
quadra histórica a que nos referimos, de uma ideologia autoritária de
Estado. (SOUZA,1983, p. 105-106)

Com esse novo sistema partidário implantado foi necessário que se


articulassem os principais atores para a realização dos processos políticos que
envolvessem o novo sistema: os partidos políticos.

Para Duverger (1970) o desenvolvimento do partido político estava


claramente ligado à democracia, uma vez que o sufrágio popular, as prerrogativas
parlamentares e as assembleias políticas possibilitaram que os membros da
sociedade se agrupassem a fim de desenvolverem afinidades comuns.

Ou seja, “quanto mais o direito de voto se estende e se multiplica, tanto


mais se torna necessário enquadrar os eleitores por comitês capazes de tornar
conhecidos os candidatos e de canalizar os sufrágios em sua direção”.
(DUVERGER, 1970, p.20).

47
Citamos como ponto de partida para a definição de partido político
(BURKE apud SARTORI, 1982, p. 29), onde o autor destaca que o partido é

[...] um grupo de homens unidos para a promoção, pelo seu esforço


conjunto, do interesse nacional com base em algum princípio com o qual
todos concordam. Os fins exigem os meios, e os partidos são o “meio
adequado” que permite a esses homens “levar seu planos comuns à prática,
com todo poder e autoridade do Estado".

Após a redemocratização, os partidos políticos se articularam


nacionalmente, mas era necessário que também se articulassem nos Estados. No
Espírito Santo, o partido que agregou grande parte das lideranças políticas
capixabas no referido período foi o Partido Social Democrático (PSD).

O PSD foi criado na perspectiva de reforçar as alianças políticas


estaduais vinculadas a Getúlio Vargas. Surgiu em 1945 e teve como primeiro
presidente o ex-interventor varguista Jones dos Santos Neves (OLIVEIRA, 2013).

O PSD não atuou isoladamente na cena política capixaba, pois o próprio


pluripartidarismo, retomado a partir de 1945, criava condições para o surgimento de
novas legendas. Nesse sentido, outros partidos também tiveram diretórios abertos
no Estado, como, por exemplo: União Democrática Nacional (UDN), Partido
Trabalhista Brasileiro (PTB), Partido Renovador Popular (PRP) e Partido Social
Popular (PSP), todos em oposição ao PSD (ZORZAL E SILVA 1995).

Retomada a experiência das eleições diretas, após quinze anos de


ditadura, é necessário destacar que tal mecanismo pressupõe um caminho rumo à
democracia, pois “[...] a característica-chave da democracia é a contínua
responsividade do governo às preferências de seus cidadãos, considerados como
politicamente iguais” (DAHL, 2005, p. 25). Em outras palavras, segundo Dahl (2005),
para que haja uma democracia, é necessário consultar seus cidadãos –
considerados politicamente iguais –, e que estes possuam condições plenas de
escolher livremente os candidatos a serem eleitos.

Robert Dahl foi um dos precursores de uma corrente teórica da


democracia que convencionou-se chamar de pluralismo, essa corrente teórica
procura explorar as “ [...] interconexões entre a competição eleitoral e as atividades
de grupos de interesse organizados, os pluralistas argumentam que a moderna
política democrática é, na verdade, muito mais competitivas [...]” (HELD, 1987, p.
169).

48
Com efeito, os pluralistas surgem como uma opção para remediar as
deficiências que encontraram na teoria democrática de Schumpeter13. Para sanar
esse deficiência os pluralistas partem da existência de várias determinantes da
distribuição de poder, ou seja, seriam vários centros de poder. A essência desses
estudos buscam investigar a distribuição de poder nas democracias ocidentais
(HELD, 1987).

Vale frisar que, apesar de eleições diretas, as bases da democracia


brasileira retomada em 1945 eram excludentes e elitistas, uma vez que os
analfabetos estavam excluídos de tal processo, por isso, esse processo não pode
ser considerado uma democracia plena na visão de Dahl (1956), mas uma oligarquia
competitiva.

O processo da democracia compreendido por Dahl (1956), tinha três


caminhos possíveis: oligarquia competitiva, hegemonias exclusivas e poliarquias.

Vejamos a figura abaixo:

13
Joseph Aloir Schumpeter em sua teoria democrática relata o cidadão como um ator isolado e
vulnerável no mundo político, onde o que ocorre é um embate das elites para ocupar o poder. No
entanto, Schumpeter despreza o papel dos grupos intermediários, tais como: associações, grupos
religiosos, sindicatos, etc.. Os pluralistas procuram sanar essa deficiência através da análise direta da
dinâmica política dos grupos no jogo democrático (HELD, 1987).

49
Figura 1 – Liberalização, inclusividade e democratização.

Fonte: DAHL (2005, p. 30)

O Brasil acabara de sair de uma hegemonia fechada, pois esteve durante


quinze anos debaixo do governo de Getúlio Vargas, sendo, desses quinze, os
últimos oito num regime de exceção – o Estado Novo. Ou seja, em 1945 o Brasil sai
desse regime e dá seus primeiros passos rumo à democracia. No entanto as bases
desse novo regime excluíam os analfabetos, além de articular, na política, vários
quadros oriundos do Estado Novo. Isso quer dizer que os atores políticos eram os
mesmos, apenas o sistema que era diferente.

Lima Júnior (1983), ao analisar o novo sistema partidário e eleitoral


brasileiro em vigor com a constituição de 1946, caracterizou o novo sistema como
excludente e elitista. Tal conjuntura, segundo esse autor, ocorreu por três condições:

[...] O liberalismo preconizado era elitista, restrito e permeado por três


contradições, pelo menos: a primeira favoreceu, simultaneamente, a criação
de grandes partidos nacionais e de pequenos partidos regionais; a segunda,
garantiu a representação de minorias políticas, mas ao mesmo tempo,
excluiu da participação eleitoral grandes segmentos sociais e limitou o
espectro da disputa ideológica; finalmente, a terceira, fortaleceu a
organização partidária e, simultaneamente, a liderança individual (LIMA
JÚNIOR, 1983, p. 58). (grifo nosso)

50
Esses pequenos partidos regionais tinham como lideranças aqui no
Espírito Santo representantes das forças agorfundiárias e mercantis-exportadoras
como já citado. Dessa forma, percebemos que à luz da teoria dalsiana, o Espírito
Santo seguia para uma oligarquia competitiva, onde ele passa para uma maior
contestação pública, se tornando um regime competitivo, mas, não uma poliarquia.

Nesse caso, o sistema político brasileiro que surge em 1945 tinha um


caráter dicotômico, pois, ao mesmo tempo que dá oportunidades de participação,
exclui os eleitores analfabetos; e ao mesmo tempo que abre espaço para uma
participação na política, ele não articula novos atores, mas o velhos oligarcas que
era ativos durante o Estado Novo.

Na visão de Weffort (2003), esta participação, ainda que restrita aos


alfabetizados, não pode ser desprezada, pois "[...] desde 1945, o povo pode influir –
e efetivamente o faz, ainda que apenas indiretamente na composição de forças com
as elites” (WEFFORT, 2003, p. 16).

Dessa forma, seria correto não menosprezar o sufrágio estabelecido,


pois mesmo que restrito, foi decisivo como forma de expressão política das massas
populares. É necessário não confundir massa eleitoral com povo, pois o alijamento
dos analfabetos excluiu do processo eleitoral grande parte da massa urbana, e
quase toda população rural. Esse caráter dicotômico se constituiu como “[...] uma
das mais clamorosas injustiças da democracia parcial instalada no pós-guerra,
precisa ser compreendida em seus efeitos políticos” (WEFFORT, 2003, p. 17).

Dessa forma, o país abandona um regime ditatorial (hegemonia fechada)


e, se desloca para uma maior contestação pública, envolvendo a liberalização do
mesmo e se tornando mais competitivo (oligarquia competitiva), porém restritamente
e com antigos atores, levando o Estado, à luz da teoria dalsiana a uma oligarquia
competitiva.

Entretanto, para potencializar a participação e a contestação, era


necessário que os indivíduos (povo), grupos (partidos políticos e grupos de
interesses) e interesses (manutenção de status quo vigente), estivessem livres para
atuar.

51
Como já citamos, para que ocorressem eleições seria necessário que os
atores políticos se organizassem em partidos políticos.

No Espírito Santo, o PSD despontou como o partido mais forte, tendo sido
necessário que houvesse articulação a nível local com as forças sociais da época.
Essas articulações eram de extrema importância para a definição dos resultados
eleitorais (ZORZAL E SILVA, 1995).

As duas forças políticas supracitadas representavam regiões interioranas


do Espirito Santo com interesses antagônicos, uma vez que a região do Sul tinha
como seu principal alicerce econômico o município de Cachoeiro de Itapemirim,
onde estava concentrada a oligarquia cafeeira capixaba.

Na região serrana, havia os imigrantes alemães e italianos, em sua


maioria pequenos proprietários enquadrados no sistema de colonato e submetidos
aos grandes comerciantes da capital.

Na região norte, São Mateus era a referência, produzindo mandioca e


café. Ao noroeste do Estado, Colatina apresentava uma grande participação política.

Por fim, a região da Grande Vitória com a elite mercantil-exportadora, os


grandes comerciantes que estavam na ponta da já citada cadeia de subordinação
(ZORZAL E SILVA, 1995).

Com interesses e atividades tão diversificadas era necessário um líder


político que conseguisse articular tais interesses influenciando os votos. O ator
político que conseguiu articular esses interesses no Espírito Santo foi Jones dos
Santos Neves que, após a redemocratização, aglutinou boa parte das lideranças
políticas capixabas em torno do PSD. É necessário ressaltar que, na articulação
partidária, Santos Neves obteve relativo êxito; já como governante, apresentou certa
dificuldade para colocar seus projetos em prática, como veremos mais a frente.

Segundo Lima Júnior (1983), o novo regime fortalecia a organização


partidária e, consequentemente, a liderança individual. Para expandir suas bases
eleitorais, o PSD, capitaneado por Jones, dependia de criar estratégias no sentido
de “[...] atrair líderes naturais de cada um dos conjuntos de forças sociais [...]
constituindo-os em lideranças políticas atuantes na órbita política estadual e
nacional [...]." (ZORZAL E SILVA, 1995, p. 163).

52
Vale ressaltar que, com o novo regime, especialmente no Brasil e em
seus Estados, surgiu ao mesmo tempo, uma nova classe dirigente - os novos
governantes e políticos que assumiram cargos políticos, eleitos pela vontade
popular. Ou seja, os estados passaram agora, depois de quinze anos, a eleger seus
governantes.

O Brasil teve uma situação política específica após 1930, com Vargas no
poder até 1945. No entanto, apoiada no principio representativo, a democracia
emergiu de forma definitiva em vários países ocidentais a partir do final da segunda
guerra mundial (1945), esse foi um dos motivos que fez o Estado Novo perder força.

Para analisar a classe de governantes que emergiram a partir do


fortalecimento da democracia, surgiram as teorias de “Gaetano Moca (1858-1941),
Vilfredo Pareto (1848-1923) e Robert Michels (1876-1936), autores que se
constituem como cânones do que se convencionou chamar de teoria das elites”.
(HOLANDA, 2011, p. 9).

Nessa teoria, a soberania popular, igualdade política e sufrágio universal,


tornaram-se pura abstração, uma vez que, no mundo real, pequenos grupos sempre
dominam os maiores, e esse pequeno grupo é chamado genericamente de elite.
Dessa forma, o estudo da teoria das elites aponta para a “teoria segundo a qual, em
toda sociedade, existe, sempre e apenas, uma minoria que, por várias formas, é a
detentora do poder, em contraposição a uma maioria que dele está privada”
(BOBBIO; MATEUCCI; PASQUINO, 1983, p.405). Ou seja, para a teoria elitista
clássica, a democracia era sempre um governo de elite, e não de participação, visto
que a maioria elegia uma minoria para estar no governo, e era essa minoria que
ditava as regras, dirigindo a maioria (massa), empregando astúcia e/ou força.

Gaetano Mosca apontou para uma tendência que ocorre em todos os


meios políticos, afirmando que em todas as sociedades

“[...] existem duas classes de pessoas: a dos governantes e a dos


governados. A primeira, que é sempre menos numerosa, cumpre todas as
funções públicas, monopoliza o poder e goza de vantagens que a ela estão
anexas; enquanto que a segunda, mais numerosa, é dirigida e regulada
pela primeira, de modo mais ou menos legal ou de modo mais ou menos
arbitrário e violento, fornecendo a ela, ao menos aparentemente, os meios
materiais de subsistência [...]”. (MOSCA apud BOBBIO; MATEUCCI;
PASQUINO, 1983, p. 405).

53
É necessário retomar as bases teóricas das elites para compreender as
disputas que ocorriam dentro do arcabouço político capixaba.

Na visão de Mosca (1896), existem apenas duas classes sociais: uma


que dirige (elite), e outra que é dirigida (massa). O grupo melhor organizado e
poderoso é a elite, que é o menor grupo e que tem o poder de decisão.

O outro grupo (massa) se submete e sofre as ações do poder exercido


pelo primeiro grupo, nascendo assim a relação entre massas versus elite.

Podemos afirmar que “a democracia, no estrito sentido tradicional de


governo do povo, é impossível: todos os governos são governos das elites ou pelo
menos de uma entre as várias elites em competição”. (ABLASTER apud RESENDE,
1988, p. 79).

Contudo, esse trabalho não pretende criar uma discussão da polaridade


elite versus massa, nem mesmo debater se a democracia é ou não um governo de
elite. Mas concordamos com a teoria elitista clássica que defende que, a
democracia, ainda que seja um regime de participação, é elitista, pois destaca um
pequeno grupo que se aloca no poder e trabalha pela sua manutenção.

2.2 As disputas eleitorais no Espírito Santo e a criação da FINDES (1947-


1958)

Nesse subcapítulo, abordaremos os processos eleitorais ocorridos entre


1947 e 1962 no Espírito Santo.

Durante quase duas décadas, as elites políticas capixabas disputaram o


poder pelo Executivo estadual através de cinco eleições diretas. Essas duas elites
antagônicas defendiam planos políticos divergentes, porém economicamente
complementares, uma vez que a elite agrofundiária produzia e a elite mercantil-
exportadora comercializava o café.

Apesar de pertencer a uma elite agrofundiária, Jones dos Santos Neves


possuía um ideal industrializante para o Espírito Santo, contraditoriamente,
apresentava dificuldades em romper com a lógica de ganho dos grandes produtores
de café.

54
É interessante ressaltar que a Assembleia Legislativa nos anos 1950 era
composta em sua maioria por representantes do setor agrofundiário e Santos Neves
sofria resistências inclusive dentro do seu partido, como veremos mais à frente
(ZORZAL E SILVA, 1995).

A primeira eleição direta para governador do Espírito Santo, após a Era


Vargas, ocorreu em 19 de janeiro de 1947. Essa eleição, além de definir o
governador do Estado, também elegeria um senador e os membros da Assembleia
Legislativa. O resultado foi a vitória de Carlos Lindemberg14, do PSD, com 64,9%
dos votos válidos. Para o Senado, o candidato eleito foi Jones dos Santos Neves,
que obteve 57,6 % 15.

Carlos Lindemberg concluiu seu mandato em janeiro de 1951, porém,


deixa a direção do Estado inovando muito pouco em termos de ação governamental.
Segundo Zorzal e Silva (1995), apesar de

[...] se poderem visualizar, em sua política econômica, embrionárias


medidas no sentido de se favorecer a emergência de um setor industrial no
Espírito Santo, estas não se constituíram no conteúdo básico de sua política
de desenvolvimento. [...] a industrialização não é sua meta prioritária. Não
da mesma forma como era para Jones dos Santos Neves. Para Carlos
Lindemberg ele deveria caminhar ao lado do desenvolvimento agrícola,
portanto, não deveria provocar grandes rupturas no processo de
transformação em curso (ZORZAL E SILVA, 1995, p. 233).

Os dois “caciques” do PSD possuíam algumas divergências no plano


político quando o assunto era desenvolvimento econômico. Enquanto Jones dos
Santos Neves era oriundo de família do norte do Estado, ligado a culturas como
mandioca e açúcar, Carlos Lindemberg pertencia à oligarquia cafeeira do sul do
Estado. Santos Neves era totalmente voltado para a industrialização, enquanto
Lindemberg acreditava que o desenvolvimento agrícola caminhava junto ao
desenvolvimento industrial (ZORZAL E SILVA, 1995).

Durante os primeiros anos de democratização, após a Era Vargas, houve


predomínio do PSD sobre as outras siglas na primeira eleição direta. Além de

14
Carlos Fernando Monteiro Lindenberg exerceu, por dois mandatos, o cargo de governador do
estado do Espírito Santo, de 29 de março de 1947 a 31 de janeiro de 1951 e de 31 de janeiro a 10 de
outubro de 1959.
15
Dados disponíveis em: http://www.tre-es.jus.br/eleicoes/eleicoes-anteriores/eleicoes-anteriores-a-
2006. Acesso em 22/01/2015.

55
ocupar as vagas para o Governo e o Senado, o PSD também ficou com 14 das 32
vagas em disputa na Assembleia Legislativa16.

Esse domínio do PSD nas primeiras eleições corroborou a ideia de Zorzal


e Silva (1995), apontando para a intenção de Santos Neves de, ao fundar o PSD,
tentar agregar em torno de si o maior número de lideranças políticas, independente
da corrente ideológica de cada quadro. Desse modo, quanto mais lideranças
políticas houvesse dentro do partido, mais cargos o partido conquistaria nas eleições
subsequentes. Como demonstram os números da eleição de 1947, foi exatamente
isso que aconteceu.

As eleições de 1950 eram de caráter geral, com disputa de cargos em


todos os níveis. Na esfera regional, PSD compôs uma chapa com o PTB e lançou
Jones dos Santos Neves ao governo do Estado. Por sua vez, a UDN estruturou uma
coalizão com seis partidos, denominada Coligação Democrática (ZORZAL E SILVA,
1995).

Dessa vez o resultado foi apertado, porém o PSD consegue mais uma
vez a eleição para o Poder Executivo capixaba com Jones Santos Neves no
comando, derrotando o candidato Afonso Schwab, da Coligação Democrática17.
Auxiliado pelo PTB, o PSD consegue grande maioria na Assembleia Legislativa,
somando, juntos, 21 das 32 vagas disputadas. Essas eleições demonstram a força
do PSD à época, pois mesmo contra uma coligação de seis partidos, manteve
hegemonia no Estado.

À frente do Estado, Santos Neves tentou executar seu projeto


industrializante, obtendo relativo êxito.

O esforço de industrialização do Estado tem um primeiro impulso na gestão


do governador Jones dos Santos Neves (1951-1955). Aquele governador
oferece ao Espírito Santo um projeto tecnocrático de gestão e investe em
estradas, energia, porto e educação através do Plano de Valorização
Econômica do Espírito Santo. Foi contemporâneo do Presidente Vargas e
tenta aplicar no Estado a ideologia desenvolvimentista-modernizadora
daquele Presidente (SILVA, 1993, p. 27).

O Plano de Valorização Econômica foi “o eixo central da administração”


de Jones Santos Neves e “visava dotar o Estado de estrutura econômica e de
16
Dados disponíveis em: http://www.tre-es.jus.br/eleicoes/eleicoes-anteriores/eleicoes-anteriores-a-
2006. Acesso em 22/01/2015.
17
Dados disponíveis em: http://www.tre-es.jus.br/eleicoes/eleicoes-anteriores/eleicoes-anteriores-a-
2006. Acesso em 22/01/2015.

56
mecanismos institucionais capazes de funcionar como força motriz para um futuro
desenvolvimento industrial” (VASCONCELLOS; PANDOLFI, 2004, p. 132).

Apesar de todo o esforço de Jones para industrializar o Estado, o Espírito


Santo ainda se mostrava com uma indústria frágil e uma representação patronal
insignificante. Em 1951, exatamente no primeiro ano do governo de Jones, o Espírito
Santo não sediava nenhuma das 39 federações de sindicato dos empregadores, o
que se tornava um problema para o Estado e para o projeto de Jones, pois a
existência de federações de empregadores atraía recursos federais, além de facilitar
o acesso de empresários capixabas às decisões nacionais.

Ainda havia a questão que, para se formar uma federação, era necessário
o mínimo de cinco entidades sindicais registradas, ou seja, cinco sindicatos
representantes de atividades ligadas ao setor (RAINHA, 2012).

Como já citamos, o modelo corporativo de representação industrial datava


de 1931, entretanto, vinte anos após a publicação do decreto que implantava tal
modelo, o Espírito Santo possuía apenas quatro sindicatos de empregadores
(SANTOS, 2011). Esses números demonstravam como o Espírito Santo ainda
carecia de uma representação patronal forte.

Contudo, é preciso salientar que, para dar impulso à industrialização,


como ansiava Santos Neves, era necessário que os empresários estivessem
organizados. Dessa forma, como organizar os empresários no Espírito Santo?

Órgãos nacionais como SESC, SESI e SENAI iniciaram suas atividades


no Espírito Santo no início da década de 1950, graças ao incentivo de Américo
Buaiz18 - diretor dessas entidades (SANTOS, 2011, p. 135). Américo Buaiz e Jones
dos Santos Neves tinham um bom relacionamento e ambos apresentavam uma
agenda industrializante para o Espírito Santo. Santos Neves, desde os tempos de
interventor, já sinalizava para essa direção e Américo Buaiz herdara do pai um grupo
de empresas que o levaram a diversificar os negócios da família.

Santos Neves, em seu mandato como governador do Estado, percebeu


que ao tentar industrializar o Estado precisava da

18
Filho de imigrantes libaneses, criou em 1943 a Buaiz Alimentos, se tornando empresa pioneira na
área alimentícia no Espírito Santo, em 1958 por iniciativa própria cria a FINDES.

57
[...] legitimação política do seu governo e com a formação e constituição de
apoios políticos modernos, mais consistentes, ao projeto modernizante que
ele e Lindemberg estavam tentando implantar, Jones viu na emergência de
um empresariado ativo e bem organizado uma base em que aquele projeto
também poderia se apoiar (SANTOS, 2011, p. 136).

Concomitante ao governo de Santos Neves, Américo Buaiz se preocupou


em organizar e fortalecer os empresários visando criar uma federação de sindicato
de empregadores. Deu o primeiro passo para essa consolidação no dia 07 de janeiro
de 1954 que, ao reunir sete sindicatos patronais, o empresário Américo Buaiz funda
a Federação do Comércio do Espírito Santo (Fecomércio)19, com assentimento de
Jones dos Santos Neves (SANTOS, 2011).

A Fecomércio foi criada no último ano do governo de Santos Neves, isso


quer dizer que, para o desenvolvimento da recém-criada entidade, era necessário
que o próximo governador estivesse alinhado com as ideias de Santos Neves e
Américo Buaiz. Porém,

[...] o resultado foi que, perderam-se as eleições e a possível sinergia que


se divisara entre um governo regional reformista e modernizador, mas
austero, e um movimento empresarial incipiente, mas disposto a apoiar
essa linha, liderado pela figura inovadora, carismática e patriótica de
Américo Buaiz, interrompeu-se (SANTOS, 2011, p 141).

Além da derrota no pleito de 1954, a Fecomércio “não resolveria a


defasagem de representação patronal de que padecia o Estado, nem representaria
grandes avanços na industrialização do Estado” (RAINHA, 2012, p. 60).

Segundo Zorzal e Silva (1995) e Oliveira (2013), o governo de Santos


Neves foi eficiente na gestão administrativa, mas, no plano político, foi desastroso.
Jones se desentendeu com seus aliados do PTB (partido que dava sustentação ao
seu governo), além de ter sido desfavorável às opiniões oriundas de seus colegas
de partido. Alguns analistas atribuem a essa pouca habilidade política de Santos
Neves a perda do apoio do PTB e a consequente derrota do PSD no pleito de 1954
(OLIVEIRA, 2013).

Santos (2011) condiciona a derrota do pleito de 1954 ao modelo de


administração de Santos Neves que, ao tentar “enxugar” a máquina pública, deixa
de conferir favores pessoais. Agindo assim, ele extirpa do seu governo a prática

19
Disponível em: http://www.fecomercio-
es.com.br/default_frame.asp#[AbreEmDIV]ajax.asp?link=indep&id=58. Acesso em 09/02/2015.

58
clientelística de favores pessoais, diminuindo a adesão de muitos eleitores e
políticos.

O fato é que o PSD estava dividido e havia um impasse para o nome que
concorreria ao pleito de 195420. Além disso, o partido não conseguiu um leque
significativo de alianças para o referido pleito, diferentemente da oposição, que
lançou seu candidato pela Coligação Democrática (PR, PSP, UDN, PDC, PRP,
PRT). Nesse sentido, as eleições de 1954 foram um marco para a política capixaba,
pois além de retirar o PSD do Poder Executivo, trouxeram à tona um dos mais
emblemáticos políticos do Espírito Santo: Francisco Lacerda de Aguiar, o popular
Chiquinho.

Essa eleição marcava o retorno,

[...] após 25 anos, das lideranças constituídas no seio das classes


mercantis-exportadoras, à direção do Aparelho Regional do Estado; e, por
outro, o ingresso de representantes das camadas populares urbanas e da
pequena produção rural nos quadros dirigentes do Estado e, portanto o
maior acesso dessas classes no referido aparelho (ZORZAL E SILVA, 1995,
p. 285).

O pleito de 1954 é de suma importância para compreender o contexto


político capixaba. Essa eleição se tornou um marco na política estadual no período
1945-1964, pois o PSD manteve sua hegemonia nos dois primeiros pleitos
realizados, em 1947 e 1950.

Contudo, esse marco demonstra que a elite política - que estava em torno
do PSD e de seus dois ícones (Jones dos Santos Neves e Carlos Lindemberg) - não
conseguiu se sustentar no poder por mais uma eleição. Concluímos que, apesar de
forte, a elite não estava consolidada no poder. Essa consolidação ocorre de fato
apenas no final da década de 196021.

Pareto (1984) propôs uma teoria que explica essas alternâncias de poder.
Para o referido autor, a sociedade está dividida em dois estratos, um estrato
superior, onde estão os governantes, e um estrato inferior onde estão os
governados.

20
Segundo OLIVEIRA (2013, p.77), o PSD estava dividido entre Ary Viana, este que era o preferido
de Jones dos Santos Neves, e Eurico Salles, que era considerado de maior consenso dentro do
Partido.
21
A Consolidação da elite urbano-industrial no arcabouço político capixaba será um assunto tratado
com mais propriedade adiante.

59
A grande questão debatida é que ocorre uma circulação entre esses dois
estratos. Essa mudança ocorre por meio da “[...] circulação das classes eleitas, a
classe eleita do governo encontra-se em Estado de contínua e lenta transformação,
corre como um rio, e a de hoje é diferente da de ontem” (PARETO, 1984, p. 82).
Essas mudanças também ocorrem “[...] seja pelo afrouxamento da circulação da
classe eleita, seja por outra causa, se acumulam nos estratos superiores elementos
decadentes que não têm mais os resíduos aptos a mantê-los no poder [...]”
(PARETO, 1984, p. 82).

Sendo assim, Chiquinho se elege no pleito de 1954 com 55,2 % dos votos
válidos, derrotando o candidato Eurico Salles do PSD22. Como afirmou Zorzal e Silva
(1995), o governo do Estado estava agora na mão de um típico representante do
setor rural, pois Chiquinho era de uma família aristocrata do sul do Espírito Santo,
altamente ligado à produção de café. Entretanto, as forças políticas que deram
sustentação à campanha e à consequente vitória de Chiquinho eram vinculadas a
elites mercantis-exportadoras.

Apesar de contraditório, ao mesmo tempo em que Chiquinho era um


representante da oligarquia rural, era também um fenômeno de massas, sendo o
primeiro candidato capixaba a se eleger através de um modus operandi populista.
Para Weffort (2003), o populismo se estabelece como prática política a partir de
1945, permanecendo no processo político brasileiro até 1964.

Em que consistia o populismo? Um liberal paulista23, após a derrota de


seu partido, escreve em 1947 alguns conselhos para quem pretendia ter algum
sucesso na política: “Evite por todos os meios obrigar o povo a refletir. A reflexão é
um trabalho penoso a que o povo não está habituado. Dê-lhe sempre razão.
Prometa-lhe tudo o que ele pede e abrace-o quando puder” (BARRETO apud
WEFFORT, 2003, p. 24).

Para Weffort (2003), o populismo brasileiro só pode ser compreendido de


forma adequada como expressão política de interesses de uma determinada classe.
Com efeito, o populismo brasileiro é, de fato, um fenômeno de massas.

22
Dados disponíveis em: http://www.tre-es.jus.br/eleicoes/eleicoes-anteriores/eleicoes-anteriores-a-
2006. Acesso em 22/01/2015.
23
Plínio Barreto. O Estado de São Paulo, 26/01/1947.

60
Além da massificação que desvincula os indivíduos de suas verdadeiras
classes, e uma falsa perda de representatividade da classe dirigente, o populismo
tem como marca fundamental a “[...] presença de um líder dotado de carisma de
massas” (WEFFORT, 2003, p. 26).

Weber (1996) já apontava essa questão quando escreveu seu ensaio


“Política como vocação”. Na sua visão, para se alcançar o poder político, é preciso
dominar, pois o Estado não passa de uma relação de domínio, ou seja, homens
dominando homens. Entretanto, a via da dominação possui três caminhos que a
legitimam: a legalidade, a tradição e o carisma (WEBER, 1996).

Fiquemos apenas com a terceira opção, que na visão do autor é a

“[...] autoridade do dom da graça (carisma) extraordinário e pessoal, a


dedicação absolutamente pessoal e a confiança pessoal na revelação,
heroísmo ou outras qualidades da liderança individual." É o domínio
“carismático”, exercido pelo profeta ou, no campo da política, pelo senhor de
guerra eleito, pelo governante plebiscitário, o grande demagogo ou o líder
do partido político. (WEBER, 1996, p. 56)

No caso de Chiquinho, além do carisma, conseguiu agregar dois fatores


preponderantes para sua vitória na referida eleição: elementos do coronelismo
(amplo arco de alianças com líderes locais) e do populismo (aproximação das
massas). Somado a isso, Chiquinho se mostrou uma figura altamente carismática,
que passou a proceder no período eleitoral como nenhum candidato antes dele
havia feito.

Dentre as táticas de campanha podemos citar: (1º) a mudança de um


nome formal para um apelido que dialogasse com as massas; (2º) Chiquinho visitava
as comunidades para fazer o chamado “corpo-a-corpo” com seu eleitorado (antes
dele ninguém fizera isso); (3º) inovações como o uso carro de som, avião com faixa
e um jingle de campanha “Chiquinho vem aí!” (OLIVEIRA, 2013b).

O projeto político de industrializar o Estado, iniciado por Santos Neves, foi


interrompido, pois a administração de Chiquinho “[...] marcou uma redução no ritmo
acelerado da política de desenvolvimento que vinha sendo implementada por Jones
dos Santos Neves, no sentido de criar bases para o processo de industrialização”
(ZORZAL E SILVA, 1995, p. 309).

Nessa nova conjuntura, o projeto empresarial de desenvolver a indústria


passou a ser encabeçado por Américo Buaiz, mesmo que fora do arcabouço

61
estatal24. Dessa forma, Buaiz precisava organizar os empresários numa entidade
que representasse os reais interesses dos industriais do Estado.

É importante frisar que, ainda no final da década de 1950, a indústria


capixaba era extremamente tímida, principalmente se comparado aos Estados da
região sudeste. O censo industrial, realizado pelo IBGE em 1960, demonstrou esse
caráter incipiente da indústria capixaba, conforme tabela 2:

Tabela 2 – Censo Industrial de 1960


Estado Estabelecimentos Operários
ESPÍRITO SANTO 1.608 7.580
SÃO PAULO 36.254 650.072
25
RIO DE JANEIRO 9.871 228.490
MINAS GERAIS 12.327 114.575
26
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE .

O número não era tão tímido assim se compararmos com os números da


tabela 1. Entretanto, outra variável desse mesmo censo do IBGE demonstra como
1608 estabelecimentos industriais não correspondiam necessariamente a uma
indústria desenvolvida.

A tabela 3 destaca o número de estabelecimentos por operários. Das


1608 indústrias, 1242 tinham até quatro operários, demonstrando que a maioria dos
estabelecimentos era de pequeno porte.

Tabela 3 – Número de estabelecimentos por operários.


Operários 1a4 5a9 10 a 19 20 a 49 50 a 99 100 a 250 a 500 a
249 499 999
ES 1292 192 67 42 02 10 03 -
27
RJ 5469 1763 1073 799 358 244 95 39
MG 9492 1496 612 393 150 97 41 24
SP 23042 5072 3266 2541 1015 729 311 127

24
Apenas no pós-64 é que se forma um contexto propício para a convergência de interesses entre o
estado e os empresários. O assunto será abordado no capítulo 3.
25
Somados os resultados do Estado da Guanabara com o Estado do Rio de Janeiro.
26
Disponível em http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/monografias/GEBIS%20-
%20RJ/censoindustrial/Censo%20Industrial_1960_BR.pdf. Acesso em 23/09/2015.
27
Somados os resultados do Estado da Guanabara com o Estado do Rio de Janeiro.

62
Entretanto a tabela 4 e o gráfico abaixo demonstram que em quarenta
anos, percentualmente, o Espírito Santo foi o Estado da Região Sudeste que mais
cresceu em relação à industrialização.

Tabela 4 – Comparativo dos Censos Industriais – 1920 a 1960.


Estado Nº Estabelecimentos – 1920 Nº Estabelecimentos - 1960
ES 75 1.608
28
RJ 1.995 9.871
SP 4.145 36.254
MG 1.243 12.327
29
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE .

O gráfico demonstra o percentual de crescimento:

Gráfico 1 – Crescimento Industrial em % - 1920-1960

1400,00%
1324,00%

1200,00%

1000,00% 891,71%

774,64%
800,00%

% Crescimento
600,00%
390,28%
400,00%

200,00%

0,00%
ES RJ SP MG

30
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE .

É possível realizar outras afirmações com esses números. Além de


possuir o menor número de estabelecimentos entre os quatro Estados do Sudeste,
os estabelecimentos eram, em sua maioria voltada para a produção de alimentos,
madeira, minerais não metálicos e mobiliário, conforme tabela 5:

28
Tanto na tabela como no gráfico somamos o Estado da Guanabara com o Rio de Janeiro.
29
Disponível em http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/monografias/GEBIS%20-
%20RJ/censoindustrial/Censo%20Industrial_1960_BR.pdf. Acesso em 15/11/2015.
30
Disponível em http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/monografias/GEBIS%20-
%20RJ/censoindustrial/Censo%20Industrial_1960_BR.pdf. Acesso em 15/11/2015.

63
Tabela 5 – Estabelecimentos por Classe e Modalidade Industrial
Classe e Modalidade Estabelecimentos
Produtos Alimentares 584
Madeira 349
Minerais Não Metálicos 243
Mobiliários 172
Vestuário, Calçados e Tecidos 56
Bebidas 43
Editora e Gráfica 40
Couros, Peles e Similares 29
Metalúrgica 27
Diversos 14
Mecânica 09
Material de Transportes 08
Extrativa de Produto Mineral 08
Borracha 07
Perfumaria 07
Papel e Papelão 04
Química 03
Têxtil 03
Farmacêuticos 01
Material Elétrico e Comunicações 01
Fumo -
Plástico -
Total 1608
31
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE .

Para encerrar os comparativos entre os dados, a tabela 6 é reveladora


quanto à participação da indústria na receita capixaba Tais números são
corroborados pela renda líquida capixaba da década de 1960.

Tabela 6 – Participação em % dos três setores econômicos na renda Líquida do Espírito Santo
ANO Agricultura Indústria Serviço
1960 49,9 % 5,9% 44,2 %
Fonte: Elaboração própria a partir de Siqueira (2011).

Procuramos demonstrar através desses dados, como a indústria


capixaba, mesmo com 1.608 estabelecimentos, ainda era embrionária, e como sua
participação na receita capixaba era insignificante se comparado à participação do
setor de serviços por exemplo. Em quarenta anos, a indústria se desenvolveu
apenas em número de estabelecimentos e carência de tecnologia, investimentos e
representatividade.

31
Disponível em http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/monografias/GEBIS%20-
%20RJ/censoindustrial/Censo%20Industrial_1960_BR.pdf.

64
Para mudar a questão da representatividade, surge a figura de Américo
Buaiz. Após a conclusão do Moinho Vitória, suas empresas faziam parte de um
empreendimento industrial. Destaca-se que, a Fecomércio não desenvolveu a
representação industrial no Estado e não possuía o apoio do poder público.

Com a representação patronal nula e com um representante do poder


público que não sinalizava para nenhuma cooperação e parceria com a indústria, o
empresário Américo Buaiz cria em fevereiro de 1958 a Federação das Indústrias do
Espírito Santo (FINDES). Eis uma parte do registro da Ata da Assembleia Geral
Constituída da Federação das Indústrias do Espírito Santo:

Aos doze do mês de fevereiro de mil novecentos e cinquenta e oito, às 20


horas, na sede da Federação do Comércio do Estado do Espírito Santo,
gentilmente cedida pelo Sr. Presidente Rubens Gomes, sita. À Avenida a
República, Edifício dos Estivadores 3º andar sala seis, reuniram-se os
Delegados dos Sindicatos da Indústria da Mecânica do Estado Espírito
Santo, da Indústria de Torrefação e Moagem do Café de Vitória, das
Indústrias da Marcenaria, Serrarias, Carpintarias e Tanoarias do Estado do
Espírito Santo, da Indústria da Construção Civil do Estado do Espírito Santo
e da Indústria de Panificação e Confeitaria de Gêneros Alimentícios e
Biscoitos de Vitória, Senhores Manoel Jair Gonçalves, Carlos Moreira Lima,
Democrito Silva, José Meira-Quadros e Jeronimo Namandréa Netto, com o
propósito previamente anunciado de fundarem a Federação das Indústrias
do Estado do Espírito Santo. [...] Nada mais havendo a tratar, foi encerrada
a sessão, da qual, para constar, eu José Saade, lavrei a presente ata que,
depois de lida e achada conforme, vai assinada por todos os membros
32
presentes. Vitória, 12 de fevereiro de 1958 .

Américo Buaiz destacava-se como um empresário arrojado e um homem


de visão, representando assim, uma elaboração social superior caracterizada pela
sua capacidade técnica e de direção. No entanto, é necessário analisar que havia
dois esforços distintos pela industrialização do Estado: por um lado, o esforço
político na figura do PSD e de suas lideranças; por outro lado, um esforço
empresarial na figura de Américo Buaiz. Veremos adiante como esses dois pólos se
unem por um interesse comum.

A criação da FINDES foi algo realmente diferente se correlacionarmos


com outras associações de classe criadas pelo Brasil afora. Ela foi fruto do esforço
individual de Américo Buaiz - no sentido de tomar para si todos os esforços para
criação e reconhecimento da entidade - pois segundo o próprio Américo, a FINDES
32
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – Livro 1 – Pg. 1,2.

65
nasceu “de alguns gatos pingados, mas homens de muita fibra, muito bem
intencionados”. (BUAIZ, 1988, p. 8)

Lavrada a Ata da primeira reunião, faltava apenas o reconhecimento da


nova entidade pelo Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio. Esse
reconhecimento ocorreu no dia 29 de julho de 1958 e a FINDES estava totalmente
legalizada e reconhecida, saindo, agora, da informalidade e podendo atuar no
aspecto legal (GURGEL, 1998).

2.3 O segundo governo de Lindemberg (1959-1962) e a criação do Conselho


técnico da FINDES

A FINDES foi criada um ano antes da posse de Carlos Lindemberg. Eleito


no pleito de 1958, Lindemberg assume o Poder Executivo capixaba pela segunda
vez e a instituição passa a participar ativamente do seu governo.

Essa situação é lembrada pelo próprio Américo Buaiz, quando diz que
“nós fomos governo durante algum tempo com Carlos Lindemberg” (BUAIZ apud
GURGEL, 1998, p. 23). Nessa conjuntura, é necessário analisar os motivos que
fizeram com que a FINDES fosse tão ativa no segundo governo de Lindemberg.

Apesar de liderar o PSD ao lado de Jones dos Santos Neves, Lindemberg


possuía algumas divergências com o correligionário.

[...] ficaram evidentes as cisões no interior do próprio PSD, especialmente


entre seus dois principais caciques: Carlos Lindemberg – que expressava
os interesses agrofundiários, especialmente do café - , e Jones dos Santos
Neves – representante da emergente fração industrial e demais forças
políticas identificadas com o processo de industrialização em curso no país -
cada um visualizando ritmos distintos para o processo de desenvolvimento
econômico e industrial do Estado (OLIVEIRA, 2013, p. 78).

Ambos defendiam um ideal industrializante para o Estado, porém em


ritmos distintos. Enquanto Jones dos Santos Neves

[...] partilhava as ideias getulistas de desenvolvimento industrial acelerado,


induzido pelo Estado, como forma de desenvolvimento, Carlos Lindenberg
solidarizava-se com a alternativa mais conservadora, também presente na
formação social brasileira. Ou seja, aquela preconizada pela burguesia

66
agromercantil, cuja base fundamental de interesses era expressa pela
economia cafeeira (ZORZAL E SILVA, 1995, p. 355).

Para Lindemberg a industrialização estava ligada ao desenvolvimento


agrícola, ao passo que, para Jones, esse processo deveria ocorrer de forma
acelerada visto que, a industrialização seria a única saída para a superação das
limitações econômicas do Estado.

Além disso, Lindemberg assume o governo em fevereiro de 1959, com


dois problemas econômicos sérios: primeiro, a crise do café, que teve início em
meados da década de 1950 e se agravou no início dos anos 1960, atingindo seu
auge no Espírito Santo entre os anos de 1962 e 196733; segundo, Chiquinho havia
deixado as finanças do Estado em déficit, por exemplo, a folha de pagamento do
funcionalismo público consumia 105% das receitas estaduais (RIBEIRO, 2008).

A priori, Lindemberg inicia sua gestão com o propósito de “recuperar as


finanças públicas, apoiar a lavoura e promover uma industrialização moderada a
partir do desenvolvimento agrícola” (SILVA, 1993, p. 98). Tal afirmativa é
corroborada nas palavras do próprio Lindemberg,

“[...] não compreendo industrialização sem produção agrícola, entendo que


a agricultura, em todos os seus ramos, deverá ter todo o amparo, toda
assistência técnica, social e financeira [...]. A meu ver a industrialização, em
nosso País, está intimamente ligada ao desenvolvimento agrícola.
Precisamos caminhar paralelamente [...]” (LINDEMBERG apud ZORZAL E
SILVA, 1995, p. 355).

Lindemberg, nos dois primeiros anos de governo, preocupou-se com o


saneamento financeiro, mas também se atentou para duas questões: produção
cafeeira e energia elétrica (ZORZAL E SILVA, 1995). Mesmo com essa postura
moderada de Lindemberg em relação à industrialização a FINDES ocupou espaço
significativo em seu governo e criou o seu conselho técnico com o objetivo de

[...] estudar os problemas do Estado e fornecer dados sobre a realidade


capixaba. A proposta era estudar as dificuldades pelas quais o Estado
estava passando e auxiliar os poderes públicos no que se refere à
implantação de um projeto de desenvolvimento capitaneado pela
industrialização (GURGEL, 1998, p. 24).

33
A crise do café se agravou no início da década de 1960 quando o governo federal, por meio do
Instituto Brasileiro do Café (IBC), iniciou uma política de erradicação dos cafezais ditos
antieconômicos. Entre 1962 e 1967 essa crise se agrava no Espírito Santo, onde 53,8% dos cafezais
capixabas são erradicados, eliminando 60 mil empregos e provocando a migração de 200 mil
pessoas para a região metropolitana no Estado, além da saída de 80 mil pessoas do Espírito Santo.
(ROCHA & MORANDI, 2012; OLIVEIRA, 2013)

67
O mais importante jornal do Estado na época, A Gazeta34, era
diretamente ligado ao governo. O referido jornal realizou uma cobertura laudatória à
criação do conselho técnico, citando os conselheiros do grupo como: “os mais
representativos elementos da classe especializada e com o objetivo de apreciar os
mais sérios problemas regionais [...]”35.

Esse conselho técnico foi formado em maio de 1959, apenas três meses
após a posse de Lindemberg, e era composto por:

Eliezer Batista, Alberto Stange, Arthur Carlos Gehardt dos Santos,


Humberto Pinheiro Vasconcelos, Aloísio Simões, Jorge Faria Santos e
Bolívar Abreu. Batista era engenheiro e superintendente da CVRD; Stange
era professor, advogado, escritor e político; Gerhardt era engenheiro do
DER. Vasconcelos era coronel do exército e economista; Bolívar era médico
sanitarista e secretário de educação do governo Lindemberg. Enfim, tratava-
se de um órgão que reunia o que talvez houvesse de melhor na
“inteligência” do Espírito Santo naquele momento (SANTOS, 2011, p. 158).

Os conselheiros eram vistos como “os homens que passaram a se reunir


a cada 15 dias, a fim de colaborar na solução dos sérios problemas locais”
(GURGEL, 1998, p. 24).

Os estudos realizados pelo conselho técnico eram direcionados para


várias áreas. Desde a diversificação da agricultura, passando pela siderurgia,
industrialização e geografia industrial, bem como temas como a geração de capitais
e ecologia social, elucidando, a ideia ainda era de uma industrialização atrelada à
agricultura (GURGEL, 1998). Dessa forma, o conselho técnico, reunindo-se com
certa periodicidade, tinha duas atribuições: fazer um levantamento socioeconômico
do Estado e formular políticas para a geração de capitais (RIBEIRO, 2010).

Um mês após a sua criação, o conselho técnico da FINDES agregou mais


alguns membros, dentre eles,

Guy Prado de Freitas, economista; Eugênio Queiroz, representante de


imprensa; o arcebispo da diocese Dom João Batista de Mota e Albuquerque
e, como convidado especial Carlos Fernando Monteiro Lindemberg Filho
(Cariê), que, na ocasião, segundo o jornal “levou ao conhecimento dos
conselheiros os diversos aspectos da atuação do governo no sentido de
ampliar o desenvolvimento industrial do Estado [...]” (SANTOS, 2011, p.
159).

34
Fundado em 11 de setembro de 1928. A partir de 1948 foi adquirido pelo grupo Lindemberg,
tornando-se assim um veículo de Imprensa que apoiava abertamente o PSD.
35
Findes cria Conselho Técnico. A Gazeta, Vitória, p. 6, 22 mai. 1959.

68
Ora, Cariê, além de filho de Lindemberg, era também secretário de
Estado à época. Percebe-se, dessa forma, como o próprio governo estava no
conselho técnico da FINDES e, como essa ligação era estreita.

Zorzal e Silva (1995) defende que, o estreitamento dessa relação foi além
de uma simples paridade ideológica. Tal vínculo não se configurava apenas na
presença de Cairê nas reuniões do Conselho técnico, pois os vínculos entre,

[...] o governo estadual e o empresariado eram tão fortes que, naquele fim
de década, que o Governador Carlos Lindemberg participava ativamente
das discussões do Conselho técnico da FINDES, que era um auxiliar do
governo nas suas propostas de desenvolvimento do Estado (RIBEIRO,
2010, p. 46).

Conforme apresentado, as áreas prioritárias estabelecidas por


Lindemberg no início do seu governo foram: produção cafeeira e energia elétrica.
Entretanto, os limites ultrapassaram sua expectativa e fugiram do controle de sua
administração, sendo assim,

[...] os contornos estabelecidos por Carlos Lindemberg para pautar sua


administração foram extrapolados para além das demarcações iniciais. Na
verdade, sua gestão foi, em certo sentido, interseccionada pelos
movimentos políticos e econômicos ensejados pela transformação
capitalista em curso, que, na década de 50, foi acelerada a nível nacional
(ZORZAL E SILVA, 1995, p. 359).

Atrelado à crise do café, o desenvolvimento obtido a partir do governo JK


e as transformações capitalistas em curso que privilegiavam o desenvolvimento
industrial, fizeram com que Lindemberg mudasse a pauta de seu governo e abrisse
espaço para a FINDES em seu governo, pois tais transformações “começaram a se
refletir mais intensamente no espaço político-ideológico espírito-santense, bem
como na economia estadual" (ZORZAL E SILVA, 1995, p. 359).

Houve um debate intenso na imprensa estadual, em relação à


industrialização. Questões sobre o desenvolvimento do Estado e o crescimento
industrial foram assuntos que passaram a ser tratados com mais frequência. Cobria-
se ainda, a questão da crise do café e quais medidas o governo tomaria para sair de
tal crise.

Tais desdobramentos foram de imensa importância para a consolidação


de um

novo embrião de forças políticas que começaram a ganhar corpo e maior


poder de luta. Assim, apesar do reduzido setor industrial existente, nessa
época configurou-se um núcleo de forças políticas identificadas com o

69
projeto de industrialização acelerada, a nível nacional, as quais passaram a
buscar formas de inserir o Espírito Santo em tal processo. Essas forças se
agregavam em torno da recém-criada Federação das Indústrias do Espírito
Santo (ZORZAL E SILVA, 1995, p. 359).

Uma questão de sobrevivência política ou não, o que sabemos é que a


atuação da FINDES na gestão de Lindenberg deu um novo fôlego ao seu governo. A
instituição não se configurou enquanto força política, mas dentro do nosso estudo
ela é analisada como um grupo de interesse.

Zorzal e Silva (1995) aponta, não para um grupo político dentro da


FINDES, mas um grupo político que está em torno dela.

Para conduzir um projeto de industrialização em um Estado deficitário


nessa área, seria necessário um corpo técnico competente apto a analisar os
problemas regionais a fim de desenvolver a indústria. Tal corpo técnico se
encontrava no Conselho técnico da FINDES e foi vital em duas situações no durante
o governo Lindemberg: primeiro, desenvolvendo o Seminário Pró-Desenvolvimento
Econômico do Espírito Santo; e, segundo, sendo peça-chave para a nomeação de
Eliezer Batista na direção da Companhia Vale do Rio Doce.

Essas duas situações serão analisadas no próximo tópico.

2.3.1. O Seminário Pró-Desenvolvimento e a instalação da Companhia Vale do


Rio Doce

Em depoimento de 2004, Arthur Carlos Gehardt Santos, governador do


Estado durante o Regime Militar, relembrou como foi estruturado o Conselho técnico
da FINDES:

E aí Américo Buaiz, que era membro do Conselho de Desenvolvimento que


Dr. Carlos Lindemberg havia criado, me chamou para que eu e o Alvino
36
Gatti estruturássemos a área técnica da Federação das Indústrias. E nós

36
Jornalista, advogado, cronista e poeta. Exerceu várias funções públicas e privadas, entre elas a de
Assessor Jurídico do DER, Diretor Administrativo da CONDUSA, membro do Conselho diretor do
SENAI, na Federação das Indústrias, Secretário de Administração, no governo Christiano Dias Lopes,
Secretário da Casa Civil, no Governo de Rubens Rangel. Criou o Conselho do Desenvolvimento

70
resolvemos fazer uma experiência interessante. Nós resolvemos fazer um
levantamento socioeconômico do Espírito Santo (SANTOS, 2004, p. 43).

Na instalação do Conselho ficou definido que o cronograma de trabalho


estabeleceria as seguintes diretrizes para estudos:

Quadro 2 – Cronograma de Trabalho do Conselho técnico

• Posição do Estado em relação à produção


Nacional;
A Siderurgia
• Diretrizes a serem tomadas em relação à posição
geográfica;

B Geografia Industrial • Levantamento de uma carta geoeconômica;

C Agricultura • Tipos de cereais e grãos para produzir com vistas

Industrial à industrialização;

D Levantamento da realidade econômico-social do Espírito Santo

Fonte: Elaboração própria a partir de dados de ZORZAL E SILVA (1995).

Criada a pauta de trabalho, o conselho técnico iniciou a parte prática do


seu trabalho. Em 1960, com o apoio logístico da CNI e apoio político do governo do
Estado, é

[...] realizado em fevereiro de 1960 o SEMINÁRIO PRÓ-


DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO DO ESPÍRITO SANTO, que redundou
na elaboração do primeiro diagnóstico socioeconômico do Espírito Santo,
cujo documento síntese recebeu o título de Desenvolvimento Municipal e
Níveis de Vida (Serviço Social Rural – 1962) (SILVA, 1993, p. 99).

O resultado mais importante desse seminário foi consequente mudança


na conjuntura política e a alteração na articulação dos interesses
governo/empresários, pois esse processo de planejamento, enquanto atividade
tecnocrática, “tem início na nova esfera de agregação e articulação de interesses, e
avança para o interior do Aparelho do Estado produzindo modificações na sua
estrutura institucional” (ZORZAL E SILVA, 1995, p. 360).

Econômico (depois transformado em Coordenadoria de Planejamento). Foi membro do Conselho


Municipal de Turismo. Faleceu em 25/06/1982.

71
O Organograma abaixo esquematiza a atuação do Conselho técnico da
FINDES durante o segundo governo Lindemberg.

FIGURA 2 – Atuação Esquemática do Conselho técnico da FINDES (1959/1962).

FINDES

Conselho
Técnico

Estudos/ Seminário Pró


Levantamentos Desenvolvimento

Geografia Agricultura Levantamento


Siderurgia
Industrial Diagnóstico Apoio CNI Governo
Industrial Realidade

Resultado GT

Conclusões CODEC

Fonte: Elaboração própria a partir de dados de Silva (1993).

O Seminário Pró-Desenvolvimento foi organizado paralelamente aos


estudos realizados pelo Conselho técnico, resultando no “primeiro diagnóstico sócio-
geo-econômico do Estado do Espírito Santo, cujo documento síntese recebeu o
título de Desenvolvimento Municipal e Níveis de Vida [...]” (SILVA, 1993, p. 99). As
conclusões desse diagnóstico propuseram “incentivar a industrialização; amparar a
agricultura; e institucionalizar a atividade de planejamento econômico no interior do
aparelho de Estado” (ZORZAL E SILVA, 1995, p. 361).

Segundo SILVA (1993, p.100), as conclusões do estudo Desenvolvimento


Municipal de Níveis de Vida apontam quatro eixos específicos:

a) Fixação do Plano Diretor para o leste-meridional do Espírito Santo,


ressaltando a necessidade de ajuda federal para as ações governamentais;

72
b) Objetivos setoriais de infraestrutura: Energia Elétrica e Fomento à
Industrialização, pavimentação de estradas pioneiras e indústria siderúrgica;
c) Diversificação da economia;
d) Interesses Sociais: Programa de casas populares, educação formal e
educação industrial.

Com o diagnóstico em mãos, o governo movimentou-se a fim de colocar


em prática as recomendações para às quais as conclusões do documento
apontavam. O governador Lindemberg cria, em 1960, um grupo de trabalho com a
finalidade de “sugerir ao governo, medidas necessárias ao incentivo de atividades
econômicas criadoras e aceleradoras do progresso do Estado" (Decreto nº 301,
19/10/60).

Analisando as mensagens de Lindemberg, Zorzal e Silva (1995),


percebeu uma radical mudança em seus discursos, pois após a criação desse grupo
de trabalho,

[...] a tônica de suas falas era a necessidade de restaurar o equilíbrio


financeiro do Estado, fortemente marcadas por uma conotação revanchista.
Posteriormente, elas tocam na questão financeira, mas a ênfase é a
necessidade de se promover o desenvolvimento (ZORZAL E SILVA, 1995,
p. 367).

O grupo de trabalho era presidido pelo Secretário da Fazenda e composto


pelos seguintes membros: “Secretário da Fazenda, Agricultura, da Viação e Obras
Públicas, de Governo; Presidente da ESCELSA, da Federação das Indústrias, da
Federação do Comércio, da Federação das Associações Rurais [...]” (SILVA, 1993,
p. 101).

Para desenvolver o trabalho de forma satisfatória, o grupo foi subdividido


em áreas específicas a fim de criar uma carteira de Desenvolvimento Econômico,
estudar a possibilidade da instalação de uma Caixa Econômica Estadual, estudar a
criação de um Conselho de Desenvolvimento Econômico e a possiblidade da
obtenção de recursos para viabilizar tal desenvolvimento (SILVA, 1993).

O grupo de trabalho, após iniciar seus estudos, entrou numa fase

[...] ininterrupta de trabalho. A 14 de dezembro, seus integrante concluíram


a análise dos anteprojetos que lhes foram encaminhados pelo Governador
Carlos Lindemberg. As medidas sugeridas foram três: o Poder Executivo

73
deveria incentivar a industrialização, amparar a agricultura e institucionalizar
o planejamento como prática de governo (GURGEL, 1998, p. 39).

Em 1960, após estudos realizados pelo Grupo de Trabalho, foram


encaminhados à Assembleia Legislativa do Estado três projetos de leis. Uma lei
visava a criação do Conselho Econômico de Desenvolvimento (CODEC); outra lei, a
criação do Fundo de Crédito Rural; por último, uma lei concederia uma série de
benefícios fiscais às indústrias, com o objetivo de incentivar o setor industrial e
fomentar, assim, a industrialização. (SILVA, 1993).

As duas primeiras leis foram aprovadas sem maiores contratempos. A


aprovação da “Lei nº 1613”, de 10/02/1961, criou o Conselho de Desenvolvimento
Econômico do Espírito Santo - CODEC, com a finalidade de estudar o
desenvolvimento econômico, elaborar planos e programas sobre a economia,
finanças e atividades governamentais (SILVA, 1993, p. 102). Já em “21/08/61 a Lei
nº 1634, criou o Fundo de Crédito Rural” (ZORZAL E SILVA, 1995, p. 361).

A não aprovação da lei de incentivos fiscais no Espírito Santo remete à


conclusão que

[...] a luta intercapitalista entre os interesses industriais emergentes, que


buscam uma forma de articulação a nível de Estado, e os interesses
agromercantis que, no momento, se constituem enquanto força política
majoritária e cuja presença se reflete na composição da Assembleia
(ZORZAL E SILVA, 1995, p. 361).

A afirmação mencionada ajuda a esclarecer o processo iniciado após o


Governo Lindemberg, quando o PSD não consegue retornar ao Poder Executivo
capixaba, perdendo mais uma vez o pleito para Chiquinho37, um típico representante
da classe agrofundiária.

Isso indicaria falta de apoio de quadros do Legislativo na composição de


alianças para disputa das eleições?

Segundo Gurgel (1998), o CODEC foi criado após uma intensa


movimentação política da FINDES, pois o que a entidade ansiava, era a criação de
um órgão, no caso uma Secretaria de Planejamento, voltado exclusivamente para
seus interesses.

37
Abordaremos eleição adiante.

74
Presidida pelo governador, o Codec teve como tarefa estudar o
desenvolvimento econômico e elaborar projetos sobre economia e finanças.
Era integrado também pelos secretários estaduais e representantes da
FINDES, da Federação do Comércio e de associações rurais (GURGEL,
1998, p. 40).

Sobre a questão da instalação da Companhia Vale do Rio Doce,

[...] a discussão que estava se dando no plano do Conselho técnico da


FINDES, a partir de 1959, com a presença e a participação de Eliezer
Batista, o homem que logo depois seria nomeado presidente da CVRD,
inclusive transferindo sua sede para Vitória, por influência da própria
atuação do Conselho, como é amplamente reconhecido [...] (SANTOS,
2011, p. 161).

Foi a partir de uma discussão sobre a problemática do minério de ferro de


siderurgia que

[...] o Conselho técnico da FINDES, sob a liderança de Américo Buaiz, se


convertia assim em lócus privilegiado dessa campanha nacionalista em
defesa da CVRD, conectando essa discussão à formulação de um projeto
de desenvolvimento regional para o Espírito Santo que tinha na indústria
siderúrgica em particular e na indústria em geral o seu horizonte mais amplo
(SANTOS, 2011, p. 164).

Em 1961, Jânio Quadros toma posse como novo presidente da República


e, os ânimos em relação à nomeação do presidente da CVRD, bem como o local da
sua nova sede, foram colocados em pauta novamente, nascendo assim, um grande
debate em torno dessas decisões que seriam tomadas pelo então presidente.

Eliezer Batista, membro do conselho técnico da FINDES, foi nomeado


presidente da companhia, emergindo, nesse momento, a questão relativa à
localização da empresa.

[...] depois de um duro embate em que se perfilaram na contenda os três


Estados pretendentes, a saber, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Minas
Gerais; e o Espírito Santo, por influência da FINDES e de seu presidente
Américo Buaiz, acabaria sendo contemplada com sua reivindicação, o que
foi considerado uma grande vitória em todo o Espírito Santo (SANTOS,
2011, p. 169).

Para Zorzal e Silva (1995), a FINDES representava um canal corporativo


de suma importância para a instalação da CVRD no Estado, uma vez que a
instituição conseguia articular interesses, executando-os em prol de uma influência
na condução de uma política de desenvolvimento para o Espirito Santo.

Desse modo, a FINDES se articulou para que um membro do conselho


técnico fosse presidente da companhia.

75
A partir da decisão do então presidente Jânio Quadros em transferir a
sede da CVRD para Vitória, a empresa adquire maior dinamismo e passou a “investir
mais intensamente no Espírito Santo, rumo à criação de condições para a instalação
da indústria siderúrgica acoplada ao Porto de Vitória” (ZORZAL E SILVA, 1995, p.
363).

A realização do Seminário Pró-Desenvolvimento, a transferência da


CVRD para o Estado, e a nomeação de um dos membros do conselho técnico como
presidente da companhia, demonstravam a força ideológica que a FINDES havia
alcançado no segundo governo de Lindemberg.

É importante ressaltar o contexto capixaba e brasileiro no início da


década de 1960.

O Espírito Santo passava por uma grave crise econômica, fruto da


erradicação dos cafezais. No entanto, a FINDES criou a ideia da necessidade de
industrializar o Estado, pois através dessa via industrializante o Estado alcançaria
desenvolvimento econômico, salientando que sua ideologia convergia ao Poder
Executivo Estadual.

Já o Brasil, passou por um processo de industrialização acelerada


durante o governo JK, porém tal processo contemplou apenas o centro-sul do país,
ficando as regiões Norte e Sudeste alijadas de tal processo. Para compensar os
Estados nordestinos, o governo federal criou a Superintendência do
Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) 38.

É nesse contexto que aparece a forte ideia de industrialização no Espírito


Santo, que, apesar de pertencer à região Sudeste, o Estado não tinha alcançado o
grau de industrialização dos Estados vizinhos. Por outro lado, também não pertencia
à região Nordeste, ficando fora da SUDENE.

38
A Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste, criada pela Lei no 3.692, de 15 de dezembro
de 1959, foi uma forma de intervenção do Estado no Nordeste, com o objetivo de promover e
coordenar o desenvolvimento da região. Sua instituição envolveu a definição do espaço que seria
compreendido como Nordeste e passaria a ser objeto da ação governamental: os estados do
Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e
parte de Minas Gerais. Esse conjunto, equivalente a 18,4% do território nacional, abrigava, em 1980,
cerca de 35 milhões de habitantes, o que correspondia a 30% da população brasileira.

76
Toda essa influência que a FINDES conquistara em quatro anos de
governo Lindemberg, bem como, a forte atuação no aparelho estatal, através do
CODEC, teve um enorme retrocesso após o pleito de 1962 com a vitória novamente
de Francisco Lacerda de Aguiar, que, como apresentado, não tinha preocupação em
desenvolver a industrialização no Espírito Santo (ZORZAL E SILVA, 1995).

Nesse sentido, a vitória de Chiquinho não significou apenas a derrota de


Jones dos Santos Neves, mas significou a derrota de todo um projeto do PSD, que
estava atrelado à FINDES no sentido de industrializar o Estado.

Chiquinho não conseguiu imprimir ritmo à sua administração que fosse


capaz de inserir o Espírito Santo no compasso acelerado de desenvolvimento em
nível nacional. Pelo contrário, suas ações eram de cunho populista, direcionadas
para o atendimento do pequeno produtor rural e às camadas populares que, nessa
época, devido à crise do café, já inchavam as cidades (SILVA, 1993).

A FINDES, por outro lado, não conseguiu ver realizado seu plano de criar,
através do CODEC, uma secretaria de planejamento constituída, especificamente,
para atuar executando o planejamento do Estado em todos os setores, incluindo
saúde, educação, assistência social e diversificação da agricultura. Era o plano
ideológico da entidade de seguir a via da industrialização para alcançar o
desenvolvimento.

As medidas tomadas pela FINDES, durante o segundo governo


Lindemberg, representavam uma ruptura na história econômica do Espírito Santo,
pois nasceu “a nível de concepção ideológica, o projeto de desenvolvimento
socioeconômico para o Espírito Santo, que consolidar-se-ia nos anos 70/80”
(ZORZAL E SILVA, 1995, p. 359).

No entanto, no Espírito Santo não havia uma burguesia industrial


consolidada no poder que tivesse força política e econômica suficiente para
reivindicar a industrialização no Estado. Tal quadro só mudaria a partir da
implantação do regime militar com seu projeto industrializante a nível nacional.

77
2.4 1964: O golpe no Espírito Santo e o caráter industrializante do regime
militar

“Chiquinho” assume o poder em 1963 - ano em que João Goulart gozava


de plenos poderes na Presidência da República - e manteve fortes relações políticas
com o então presidente, obtendo pleno apoio para as realizações do seu plano
regional (ZORZAL E SILVA, 1995).

Todavia, esse governo apresentava algumas dificuldades, pois pesava


sobre o então governador, fortes denúncias de corrupção. Além disso, havia a
excessiva oposição do jornal “A Gazeta”: quase todos os dias eram veiculadas
matérias criticando o governo ou fazendo acusações de corrupção.

Completando o quadro, havia a oposição da bancada do PSD, liderada


pelo então Deputado Christiano Dias Lopes, configurando-se numa verdadeira
cruzada "Anti-Chiquinho" (ZORZAL E SILVA, 1995; OLIVEIRA, 2013).

Os rumos do Espírito Santo e do Brasil mudariam a partir de 1964. No dia


1º de abril o país sofreu um golpe de Estado e, consequentemente, o então
presidente João Goulart foi deposto. Tal acontecimento histórico ainda gera uma
série de trabalhos sobre sua execução, mas analisar a instauração do regime militar
não é nosso objetivo.

Abrimos espaço, nesse tópico, para analisar o caráter industrializante do


regime, bem como os seus rebatimentos na esfera regional, especificamente, o caso
do Espírito Santo.

Apesar da resistência ocorrida em alguns Estados, o golpe não encontrou


no Espírito Santo

[...] grande resistência por parte daqueles poucos que defendiam o


presidente João Goulart e as Reformas de Base. Reproduziu-se, portanto,
no Estado, a inoperância dos setores contrários ao Golpe, assim como a
inércia da maioria da população à derrubada de Jango, com raras exceções
do movimento estudantil, que tentou organizar algumas manifestações [...]
(OLIVEIRA, 2013, p. 103).

A posição de “Chiquinho” em relação ao golpe militar foi de indecisão, não


houve uma aceitação rápida ou mesmo uma recusa apressada pelo golpe. Talvez,

78
pela sua indecisão e falta de apoio imediato ao golpe, sua imagem junto aos
militares não tenha sido a de um político alinhado com o novo regime (OLIVEIRA,
2013).

“Chiquinho” adere ao golpe39, talvez tardiamente, mas não o suficiente


para gerar uma cassação imediata. Contudo, à medida que os militares se
perpetuavam no poder, o governo de “Chiquinho” foi sendo pressionado pela forte
oposição, ao mesmo tempo em que estava sendo gradativamente desestabilizado.

Diante das acusações e de todas as pressões sofridas por “Chiquinho”, a


governabilidade tornou-se insustentável. Sendo assim, “Chiquinho” licencia-se do
governo do Estado, no dia 1º de fevereiro de 1966, alegando problemas de saúde, e
o vice-governador Rubens Rangel assumiu o poder (OLIVEIRA, 2013).

O Golpe de 1964 e a consequente transição de um regime democrático


para um regime autoritário prevalecente permitiu

[...] a reorganização do aparelho do Estado, liquidou o sistema partidário


anterior (e com ele a representação política das classes populares e
trabalhadoras urbanas, bem como de setores importantes das antigas
classes dominantes) e incorporou ao processo político, sob novas
condições, as Forças Armadas e os grupos sociais que expressam os
setores monopólicos da economia. Essas modificações contribuíram para
moldar o “milagre econômico” nos termos em que se deu: concentração de
renda e desigualdade social (CARDOSO, 1975, p. 225).

Além dessa reorganização do aparelho estatal, que causou diversas


transformações na ordem política e social, Siqueira (2010), chama atenção para o
campo econômico, que após

[...] a tomada do Estado pelo partido orgânico do grande capital,


penetramos no contexto do capitalismo monopolista. Para tanto, uniram-se
numa nova aliança todos os setores capitalistas, sob a hegemonia do
capital estrangeiro, e, com a participação de militares e tecnocratas, instala-
se um regime autoritário, em que é anulado qualquer espaço de
participação popular, e a participação das classes médias urbanas quase
reduz ao plano das aparências (SIQUEIRA, 2010, p. 27).

39
Existem versões de que “Chiquinho” tenha apoiado o Golpe Militar, inclusive fazendo um acordo
com o governador de Minas Gerais na época, Magalhães Pinto, caso o mesmo precisasse utilizar o
Porto de Vitória.

79
Segundo a análise de Siqueira (2010), o país ingressava num contexto do
Capitalismo Monopolista, onde os setores capitalistas seriam beneficiados. E como
expandir esse projeto industrializante para o país?

Além dos militares instalados no poder, o país necessitava de tecnocratas


que seriam o cérebro desse novo modelo de desenvolvimento do Estado Brasileiro.

Nesse sentido, não só a FINDES, mas todas as entidades industriais do


Brasil ocuparam um enorme espaço no Governo Militar, pois um projeto
industrializante para uma nação não poderia ser implantado sem a participação de
quadros técnicos.

Os políticos que apoiaram o golpe desejavam manter o status quo,


independentemente de sua ideologia política, e permaneceram no partido criado
pelos militares, a Arena40, enquanto o poder econômico se configurava na figura do
empresário. No caso do Espírito Santo essa elite econômica estava alocada na
FINDES.

Sobre essa aliança entre militares e tecnocratas, O´Donnel (1986)


destaca a

“[...] quintessência do Estado capitalista, nascida com o apoio unânime da


burguesia para salvar a condição capitalista da sociedade, mas que
empreende políticas hostis a boa parte dela." Ao contrário do que se poderia
supor, as queixas que isto suscita reforçam a determinação dos militares e
tecnocratas de aprofundar suas tarefas e sua aliança (O´DONNEL, 1986. p.
57).

Nesse momento, uma nova elite estava no poder: os militares. No


entanto, os quadros técnicos necessários para a realização do projeto de
desenvolvimento industrial estavam nas grandes empresas e nas entidades
patronais ligadas à indústria e, na retaguarda desse projeto estariam as classes
econômicas detentoras do capital nacional.

O´Donnel (1986), a partir de seus estudos, classificou tais regimes como


Burocrático-Autoritário, sendo “respaldo e organizador da dominação exercida por

40
No próximo capítulo, vamos falar sobre o implementação do Ato Institucional 2 e do Ato
Complementar 4, que implementaram as eleições indiretas e extinguiram o pluripartidarismo, criando
no Brasil um sistema Bipartidário.

80
uma estrutura de classe subordinada às frações superiores de uma burguesia
altamente oligopolizada e internacionalizada” (O´DONNELL, 1986, p. 21).

Este autor aponta ainda para

[...] mudanças no sistema econômico, dirigidas principalmente para o alto


grau de integração vertical e de concentração da indústria e da estrutura
produtiva em geral, orientadas em beneficio de grandes organizações –
públicas e privadas, nacionais e estrangeiras (O´Donnel apud Silva, 1993, p.
66).

O Estado brasileiro se caracterizava como um Estado repressivo,


burocratizado e tecnocrata. Contudo, o nosso trabalho não se direciona para o
caráter burocrático, ou mesmo repressivo do regime, mas sim, para o seu caráter
tecnocrata e industrializante.

Dessa forma Cardoso (1975), debate a tecnocracia escudada na esfera


pública, na empresa privada e no próprio Estado, que garante a

[...] dominação do empresariado sobre as metas de outras classes e


assegura a reconstituição e o funcionamento dos mecanismos de
acumulação; e realiza uma modernização do aparelho do Estado, adotando
políticas econômicas claramente favoráveis à ação empresarial (CARDOSO
apud SILVA, 1993, p. 69).

Cardoso (1975) ainda sinalizava para o surgimento de um “modelo


político” e o define como o sistema de poder que

[...] assumiu a forma burocrático-autoritária e que tem funcionalmente dois


eixos não excludentes, um tecnocrático e outro militar. Por trás dele, estão
os interesses da expansão capitalista, nas suas vertentes, a empresa
estatal e o conglomerado internacional, aos quais se liga uma burguesia
local que nem por ser caudatária e dependente deixa de ser importante
como força econômica e social. Em conjunto, o setor dirigente deste bloco
de poder se recruta nas Forças Armadas e depende delas como
corporação, tendo nos setores tecnocráticos um apoio decidido
(CARDOSO, 1975, p. 225-226).

Essa burguesia local, no caso do Espírito Santo, é representada pela


FINDES, que, a partir do Regime Militar - mais precisamente a partir de 1966 – foi
inserida de forma decisiva no aparelho Estatal, favorecida pelo caráter capitalista,
industrializante e repressivo dos militares.

81
Cardoso (1975) buscando analisar a organização política da sociedade
brasileira e o papel desempenhado pelo Estado no processo de industrialização,
formula a teoria dos anéis burocráticos, quando preconiza que a burocracia
funcionava

[...] como parte de um sistema mais amplo e segmentado: não existindo


eficazmente como vimos, partidos de classes, sindicatos e associações de
grupos e classes, os interesses organizavam-se em círculos múltiplos, em
anéis, que cortavam perpendicularmente e de forma multifacetada a
pirâmide social, ligando em vários subsistemas de interesse e cumplicidade
segmentos do governo, da burocracia, das empresas e dos sindicatos etc.
(CARDOSO, 1972, p. 99-100). (grifo nosso)

O Estado regulador brasileiro não estava fundamentado nos interesses da


sociedade civil e nem em sua representação, mas, a partir da emergência de um
Estado Burocrático Autoritário, surgiu uma nova burocracia estatal planejadora, onde
as alianças entre interesses políticos e econômicos se organizavam de forma mais
sofisticada.

E essa sofisticação teria ocorrido essencialmente porque se formaram no


interior da burocracia estatal “ilhas de racionalidade” que permitiram
justificar políticas públicas em nome de critérios “meramente” técnicos.
Entretanto, como essas “ilhas de racionalidade” se formaram dentro de uma
estrutura administrativa tradicional, caracterizada pelo clientelismo político,
elas acabaram por não servir ao “interesse público”, mas aos interesses
privados que se organizaram no interior do Estado e foram catalisados a
partir do próprio Estado (MATTOS, 2006, p. 145)

Diante disso, entendemos que dois fatores favoreceram a inserção


definitiva da FINDES no poder público capixaba.

O primeiro fator é estrutural, ou seja, seria o próprio regime militar


instaurado em 1964. Como vimos, o Regime tinha um caráter industrializante e
modernizador, e com isso, não é só a FINDES que ganhou espaço, mas todas as
entidades patronais do país.

Numa democracia representativa, as forças político-econômicas e político-


partidárias alternam-se no poder conforme a vontade popular; por exemplo, o caso
da própria FINDES, onde sua atuação e participação no arcabouço político variavam
de um governo para outro, com a alternância de poder: ora ela perdia espaço, ora
retomava esse espaço. Nesse caso, sua atuação dependia dos interesses do
governador eleito.

82
Numa ditadura isso não é possível, pois o governo ditatorial age
repressivamente e alija do meio político qualquer indivíduo ou instituição que não
estiver alinhada com seu projeto de governo.

O segundo fator é conjuntural, se configurou na ação do novo governador


do Estado, Rubens Rangel, que assumiu após a saída de “Chiquinho” em janeiro de
1966. Rangel assumiu o governo, a partir de 1º de fevereiro de 1966, e iniciou uma
grande reforma no seu secretariado, priorizando a nomeação de quadros técnicos,
excluindo desse processo os quadros políticos.

Essa situação, criada a partir do governo de Rubens Rangel será exposta


de forma mais detalhada no Capítulo 3, uma vez que compreendemos que é no seu
governo que a FINDES se alocou de forma definitiva no poder público, pois pela
primeira vez, cargos técnicos da Federação vão ocupar secretarias de governo.

83
3 A FINDES E O GOVERNO DE CHRISTIANO DIAS LOPES (1967-
1971)

3.1 Rubens Rangel e a inserção da FINDES no aparelho estatal

Para analisar a conjuntura política estadual, a partir da saída de


“Chiquinho”, é necessário abordar o que ocorria a nível federal, considerando-se que
os militares se alocaram no poder a partir de 1964. Os militares, apesar de
finalizarem o pluripartidarismo e estabelecer eleições indiretas, mantiveram alguns
elementos democráticos.

Por exemplo, não aboliram

[...] o Legislativo e o Judiciário, embora seus poderes tenham sido


posteriormente restringidos. Não eliminou eleições periódicas, embora
tenha mantido sobre controle. Inicialmente, não extinguiu os partidos
políticos existentes, embora tenha expurgado seus elementos “anti-
revolucionários”. Tampouco suprimiu a Constituição de 1946, que vigorou
até 1967, embora tenha sido alterada substancialmente pelos atos
institucionais[...]. O fato de o Comando Supremo da Revolução, após a
queda de João Goulart, ter convocado o presidente da Câmara dos
Deputados, Ranieri Mazzili, para assumir a Presidência da República,
respeitando assim o procedimento constitucional, parecia que os fatos iriam
se desenvolver como anteriormente (KINZO, 1988, p. 15-16).

Mesmo mantendo tais elementos, o novo governo não abriu mão do


processo eleitoral, possivelmente como uma forma de legitimar o novo governo.
Dessa forma foi indicado para presidente da República em 11 de abril de 1964 o
general Humberto de Alencar Castelo Branco. Já no Espírito Santo, Chiquinho
permanecia como governador, apesar de sua delicada posição junto aos militares
(OLIVEIRA, 2013).

No espectro político nacional, o ano de 1965 foi decisivo no que diz


respeito à política partidária, pois Castelo Branco, após tomar posse em 1964,
prometeu entregar “[...] ao iniciar-se 1966, meu sucessor legitimamente eleito pelo
povo em eleições livres [...]” (BRANCO Apud KINZO, 1988, p. 16).

84
A promessa de uma transição legítima afim de “manter a ordem” fez com
que os partidos começassem a se movimentar para disputar as prováveis eleições
presidenciais que iriam ocorrer em 1966. A UDN (partido que foi a base civil para o
golpe) estava convicta de que lançaria Carlos Lacerda como candidato, pois nunca
havia chegado à Presidência através do voto.

Dessa forma, o apoio dado aos militares seria retribuído nas eleições
seguintes. A UDN viu no apoio ao golpe

“[...] uma forma de derrotar a forte aliança eleitoral PSD-PTB, e assim via na
“Revolução” de 1964 a sua vitória definitiva. Portanto, o movimento
“revolucionário” destinava-se a possibilitar a esse partido, que havia Estado
na oposição durante grande parte do período desde 1945, chegar ao poder”
(KINZO, 1988, p. 18).

A crise político-institucional começa em outubro de 1965, quando Castelo


Branco decidiu manter o calendário das eleições e realizou o pleito para
governadores em onze Estados brasileiros.

Após essa decisão, Castelo Branco enfrentou uma oposição dupla.


Primeiro, “[...] a oposição da linha dura que as considerava um risco
desaconselhável e desnecessário para uma revolução que ainda não estava
consolidada” (KINZO, 1988, p. 22).

Em segundo, a pressão vinha de dois governadores da UDN, Magalhães


Pinto, de Minas Gerais e Carlos Lacerda, da Guanabara. Ambos estavam receosos
com a possibilidade de perder o cargo de govenador, pois isso “[...] significaria sua
perda de controle sobre as máquinas dos governos estaduais, que eram
fundamentais para se assegurar a vitória da UDN nas eleições presidenciais a
serem realizadas em 1966"(KINZO, 1988, p. 22-23).

Em meio a uma série de tensões ocorridas no mês de outubro de 1965, e


uma série de manobras para acalmar seus opositores41, Castelo Branco decreta o
Ato Institucional N º 2, em 27 de outubro de 1965. Este novo ato,

[...] além de implementar medidas que provavelmente seriam rejeitadas pelo


Legislativo, outorgava ao presidente poder de suspender o Congresso,
governar por decreto, decretar Estado de sítio, dispensar funcionários

41
Abordar tais tensões e manobras realizadas por Castelo Branco foge ao escopo desse trabalho.
Para uma leitura mais apurada ver KINZO, 1988, p. 15-27.

85
públicos, cassar mandatos e suspender direitos políticos, e aumentava
significativamente o controle do Poder Executivo sobre os gastos do
governo. O novo ato também facilitava a aprovação de emendas
constitucionais, tornava indireta a eleição para a Presidência da República
e, finalmente, extinguia os partidos políticos existentes (KINZO, 1988, p.
27).

Após implementar tais medidas, cabia ao governo a organização da


nova vida partidária, e, para resolver essa questão, foi editado o Ato Complementar
Nº 4 (AC-4) que estabelecia um sistema bipartidário compulsório. De forma sucinta,
a ideia do novo sistema partidário era

[...] criar uma estrutura partidária organizada em termos de apoio – ou


ausência deste – ao governo: agrupar em um único partido todos os
membros do Congresso que endossassem as tendências políticas de
sustentação do regime, e, em um fraco partido de oposição, as forças
políticas remanescentes. (KINZO, 1988, p. 28-29)

Durante o período 1945-1964, o sistema partidário brasileiro era


composto por treze partidos políticos. Dentre esses, três dominavam o cenário
nacional: UDN, PSD e PTB, sendo este último uma linha mais progressista e voltada
para a cooptação de massas urbanas emergentes.

Com a implantação do bipartidarismo, foram criados a Arena (Aliança


Renovadora Nacional) e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro), sendo este o
partido de oposição ao governo. Salvo raras exceções, os parlamentares do PSD e
da UDN formaram as fileiras da Arena, ao passo que os membros do MDB eram em
sua maioria oriundos do PTB.

Na realidade, a própria formação do MDB foi problemática por dois


motivos: primeiro, um partido de oposição, que atuaria num sistema de governo
autoritário, não era atrativo para quem buscava proximidade com o poder; e,
segundo, os oposicionistas mais veementes do regime militar que se arriscaram a
fazer uma oposição mais arrojada ao golpe já haviam sido banidos da vida política
brasileira.

Mesmo com todas essas dificuldades, o MDB foi formado, assim como a
Arena, sendo reconhecidos legalmente como organizações partidárias pelo Tribunal
Superior Eleitoral em março de 1966 (KINZO, 1988).

86
No Espírito Santo, os políticos conservadores que atuavam em partidos
como PSD, UDN, PRP foram em sua grande maioria para a Arena, ao passo que os
políticos do PTB em sua maioria foram para o MDB, conforme demonstra a tabela 7:

Tabela 7 – Filiação dos Deputados Estaduais do ES – Arena e MDB


Partidos Arena MDB Total
PSD 13 1 14
UDN 6 1 7
PRP 3 - 3
PTB 2 7 9
Total 24 9 33
Fonte: Elaboração própria a partir de dados de OLIVEIRA (2013).

Com a renúncia de Chiquinho e a posse de Rubens Rangel, surgiu uma


nova concepção política capixaba42, mesmo que Rangel estivesse apenas um ano
no poder, sua plataforma de governo estava direcionada para uma administração
técnica, ao invés de política, com o Estado novamente retomando o rumo à
industrialização.

No depoimento de Arthur Carlos Gerhardt Santos, a ideia do novo


governo era deixar “a casa arrumada para o próximo governador”. Ao alijar os
quadros políticos e priorizar a nomeação de quadros técnicos43, Rangel se
direcionou para a FINDES, pois era ali que estavam os quadros técnicos do Espírito
Santo. Dessa forma, mesmo que Rangel tivesse composto chapa com Chiquinho em
1962, devido às circunstâncias ele tinha que se aproximar dessa elite política (PSD)
e dos quadros técnicos da Findes. Ainda que ele não tivesse esse ideal
modernizante, foi para essa plataforma que seu curto governo se voltou.

Durante o regime militar, os tecnocratas passam a ser responsáveis pela


aplicação de novas tecnologias na administração do poder do Estado. O governo

42
Segundo Zorzal e Silva (1995), a saída de Chiquinho do governo se deu mais pela pressão dos
setores urbano-industriais que estavam alocados no PSD, Findes e jornal A Gazeta. A elite política
em torno do PSD ainda se ressentia da derrota da eleição de 1962. Dessa forma os líderes do PSD
como Jones dos Santos Neves, Carlos Linemberg (dono da Gazeta) e Christiano Dias Lopes (líder do
PSD na Assembleia Legislativa), fizeram forte pressão para a saída do então governador.
43
Dentro do regime militar, o período 1968-1973 é conhecido como “milagre” econômico brasileiro,
em função das extraordinárias taxas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) então verificadas,
11,1% ao ano (a.a.). Uma característica notável do “milagre” é que o rápido crescimento veio
acompanhado de inflação declinante e relativamente baixa para os padrões brasileiros, além de
superávits no balanço de pagamentos. Atrelado ao “milagre econômico”, os militares também criaram
o discurso na época de que os responsáveis pela economia, planejamento e desenvolvimento do país
deveriam ser tecnocratas e não políticos, pois o cerne da corrupção estava no meio político. Esse
discurso foi propagado pelos Estados, governadores e veículos de imprensa da época.

87
dos tecnocratas, na ciência política é denominado “tecnocracia” (FERREIRA
JÚNIOR; BITTAR, 2008). Já Bresser Pereira (1981), usa o conceito de
“tecnoburocracia”, que em sua visão decorre de técnico.

Tecnoburocracia é o governo de técnicos. É o sistema em que o poder está


nas mãos dos técnicos, sejam eles economistas, engenheiros,
administradores públicos, e privados ou militares profissionais. Colocada
nesses termos, tecnocracia seria um tipo de oligarquia: a oligarquia dos
técnicos. Opõe-se, portanto, a outros sistemas políticos, particularmente à
democracia (BRESSER PEREIRA, 1982, p. 81).

Durante a ditadura militar brasileira, veio à tona o discurso “técnico x


político”. Ou seja, os militares passaram a disseminar a ideia de que o governo
deveria ser composto por “quadros técnicos”, ao invés de políticos. Esse discurso
começou a tomar corpo no governo Costa e Silva, quando esse presidente nomeia
Delfim Neto como Ministro da Economia e Hélio Beltrão como Ministro do
Planejamento. A partir do seu governo os tecnocratas passam a tomar as decisões
no campo econômico. Todavia, compreendemos que esse discurso fora criado na
época, com outros objetivos.

No entanto, esse discurso, ainda hoje é utilizado pelos governantes em


várias regiões do país. Contudo, compreendemos que, mesmo que um Ministro ou
Secretário de Governo seja um “quadro técnico” a sua tomada de decisão dentro do
poder público sempre se dará no campo político, e, que essa distinção feita pelo
regime militar tinha como objetivo a demonização da política e sua legitimação como
espaço de corrupção.

Como supracitado, os tecnocratas capixabas da época estavam alocados


na FINDES, nesse período a entidade contava com o próprio Arthur Gerhartd e com
Alvino Gatti na estruturação da área técnica, e esses dois quadros foram
convocados para estruturar a nova administração. Vejamos o referido depoimento,
que, apesar de longo, é esclarecedor:

“[...] Então um dia, eu estou lá na casa de papai, em Domingos Martins, e


chega a Polícia Rodoviária me procurando [...]. [...] o policial me disse
assim: “O vice-governador, o Rubens Rangel, quer conversar com o Sr. lá
em Vitória e pediu que o Sr. fosse lá”. Aí o tio Rubens me disse o seguinte:
“Olha, o governador vai renunciar amanhã e eu tenho que formar um
gabinete, e desse bando de políticos aí fora eu não quero nenhum no
governo." Eu quero que o senhor, com o Dr. Alvino Gatti e com o José
Carlos da Fonseca (que também era funcionário do DER), queria que vocês
dessem nomes, sugerissem para o governo” [...]. Então o Gatti foi secretário
de governo nessa época. Áureo Antunes, que era funcionário

88
conhecidíssimo, muito sério e muito competente na Secretaria da Fazenda,
foi ser secretário da Fazenda e por aí foi. Sobrou para mim a Secretaria de
Viação e Obras Públicas e a Secretaria de Planejamento (SANTOS, 2000,
p. 47-48).

O Jornal A Gazeta, no início de fevereiro de 1966, já noticiava sobre o


secretariado do recém empossado governador:

O secretariado do novo Governador do Estado está assim constituído,


carecendo naturalmente de algumas confirmações: Agricultura – Baiardo
Cisne; Fazenda – Áureo Antunes; Obras Públicas – Jorge Minassa;
Educação – Telmo Mota da Costa; Saúde – Dr. Luiz Buaiz; Planejamento –
Arthur Carlos Gerhardt Santos; Gôverno – Heráclito Rodrigues de Morais;
Interior e Justiça Sebastião da Rocha Machado. [...] De um modo geral, o
Secretariado do Sr. Rubens Rangel é considerado altamente técnico e fora
de qualquer injunção política. Nos setores políticos na tarde de ontem a
44
escolha era altamente elogiada .

Apesar de algumas mudanças que ocorreram no seu ano de governo, o


secretariado de Rangel, no final de 1966, é detalhado na tabela 8:

Tabela 8 – Secretariado de Rubens Rangel – Final de 1966.


45
Novo Secretariado Secretaria Profissão
Áureo Antunes Fazenda Funcionário Sec. Fazenda
Ary Queiroz da Silva Interior e Justiça Funcionário Público
Telmo Mota Costa Educação -
Darcy Moraes de Matos Saúde e Assistência -
Alvino Gatti Governo Advogado – Ligado à FINDES
Arthur Gerhardt Obras Públicas Engenheiro – Ligado à FINDES
Bayardo Cysne Agricultura e Colonização Correligionário de Rangel
Fonte: Diário Oficial do Espírito Santo (1966)

Com a exceção de Bayardo Cysne, vereador em Mimoso do Sul e


correligionário de Rubens Rangel, seu secretariado era altamente técnico, como já
havia sido dito pelo próprio governador e corroborado pela citação anterior do jornal
A Gazeta.

Analisamos, dessa forma, a relação do governo de Rubens Rangel com a


FINDES em duas frentes. Primeiro, através das atas dessa instituição, investigando
sua relação com o Poder Executivo capixaba. Segundo, pesquisamos as leis
ordinárias de autoria do Poder Executivo com o objetivo de encontrar uma ligação
entre as leis propostas e o fomento à industrialização no Espírito Santo.

44
Rubens Rangel assume Gôverno hoje (10h) com secretariado inteiramente técnico. A Gazeta,
Vitória, p. 01, 01 fev. 1966.
45
Conseguimos, através de pesquisas na internet, jornais e revistas localizar a profissão de alguns
secretários à época. Os que se encontram em branco não foram identificados.

89
3.1.1 As atas da FINDES no governo de Rubens Rangel e as leis ordinárias de
autoria do Poder Executivo (1966-1967)

Para Boschi (2010), o cerne do Estado se constituiu numa burocracia


amplamente ligada ao Poder Executivo, sendo que tal modelo remonta os anos
1930, período marcado pelo “[...] privilégio concedido a um modelo de
desenvolvimento industrial voltado à superação do atraso econômico e da
implantação do corporativismo como forma de ordenação das relações
público/privadas [...]” (BOSCHI, 2010, p.89).

Esse modelo corporativo que ordena as relações público/privado tem sua


gênese a partir de 1930 com Getúlio Vargas no poder, porém no Espírito Santo,
essa relação ocorre com um relativo atraso em relação a São Paulo e Rio de
Janeiro.

Essa relação entre o público e o privado é operada

[...] por intermédio de contatos pessoais, vínculos clientelistas,


estabelecimento de redes, enfim, no espaço cinzento entre as duas esferas
[...] Por outro lado [...], o corporativismo significou mobilização e
organização das classes sociais pela via da representação de interesses
(BOSCHI, 2010, p. 92).

Buscando encontrar vestígios da relação entre a FINDES e o Poder


Executivo capixaba, vamos analisar o livro de Atas nº 1 das reuniões do Conselho
de Representantes da Federação da Indústria do Espírito Santo. Esse livro possui
cinco reuniões registradas no período em que Rubens Rangel fora governador do
Espírito Santo, e foram realizadas respectivamente em 25 de junho, 15 de julho, 29
de julho, 18 de agosto e 31 de agosto de 1966.

Na primeira reunião analisada notamos a ligação entre o Executivo


estadual e a FINDES:

A seguir, o Senhor Presidente determinou ao Dr. Alvino Gatti, Assessor


Técnico da Federação, que lesse a proposta apresentada pelo Grupo de
Trabalho dirigido pelo Sociólogo Arthur Rios, contratado pela Federação,
para proceder à reforma administrativa do Estado do Espírito Santo, bem
como elaborar planos de desenvolvimento econômico para o governo do
46
Estado .

46
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – Livro 1 – Pg. 18.

90
A presença do secretário de governo, Alvino Gatti, na reunião de
conselheiros de uma entidade industrial é um fato digno de nota. Ora, politicamente
esse não era o papel dele, mas havia um interesse em comum entre a FINDES e o
governo do Estado.

É interessante ressaltar a presença do grupo de trabalho criado pelo


sociólogo Arthur Rios para proceder com uma reforma administrativa e elaborar
planos para o desenvolvimento econômico do Estado. É nítida a atuação de Gatti
como elo entre a FINDES e o poder público, visto que, como secretário de governo,
presumivelmente, ele atuava como um porta-voz do governo nas reuniões da
instituição.

Ao mesmo tempo, percebemos como o governador estava à margem das


decisões, uma vez que, esse estudo seria implementado no governo seguinte.
Concluímos que Gatti era o “mensageiro” do governo dentro da FINDES.

O fato que mais notório é a autonomia que o governo concedeu à


federação, ficando claro que o projeto do governo seria o projeto da instituição. É
importante salientar que foi a FINDES quem financiou o estudo viabilizado por Arthur
Rios, que se tornou o projeto do futuro governador para o Espírito Santo47,
Christiano Dias Lopes. Dessa maneira, a atuação da federação, ainda que atrás dos
holofotes, demonstrou a representatividade que a entidade havia conquistado no
governo Rubens Rangel, persistindo no governo posterior.

Salienta-se que, ao mesmo tempo em que a FINDES alcançava uma


grande representatividade dentro do governo, ainda era bem frágil no plano
organizacional. Como veremos adiante, dez anos após sua criação, a entidade ainda
se ressentia de sindicatos filiados48 e, por conta dessa defasagem, foi sugerido
nessa mesma ata de reunião, que um “prêmio fosse dado a qualquer pessoa que
constituísse um sindicato, podendo ser funcionário da federação ou mesmo estranho
aos quadros da entidade” 49.

47
No próximo tópico, abordaremos o assunto de forma mais detalhada no próximo tópico.
48
Até 1970, a Findes permaneceu apenas com os cinco sindicatos de sua fundação: Sindicato da
Indústria da Mecânica do Estado Espírito Santo; Sindicato da Indústria de Torrefação e Moagem do
Café de Vitória; Sindicato das Indústrias da Marcenaria, Serrarias, Carpintarias e Tanoarias do
Estado do Espírito Santo; Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado do Espírito Santo e o
Sindicato da Indústria de Panificação e Confeitaria de Gêneros Alimentícios e Biscoitos de Vitória.
49
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – Livro 1 – Pg. 19.

91
A discrepância entre sua representatividade dentro do Poder Executivo
estadual e sua fragilidade organizacional, pode ser demonstrada também com outro
fragmento da referida ata:

A seguir, o Senhor Presidente comunicou que, conforme rádio que a


Federação recebeu do Governador do Estado, a entidade tinha que indicar,
dentro de quarenta e oito horas, uma lista tríplice para efetivo e outro para
suplente de membros da junta comercial e que esperava uma sugestão do
50
Conselho para como proceder na escolha de tais nomes .

O governador além pedir uma indicação ao Conselho de Representantes


da FINDES, ainda esperava uma sugestão do conselho. Tais exemplos demonstram
uma ligação forte entre governo e a federação, entre o setor público e o setor
privado capixaba e, como uma entidade industrial conseguiu se inserir no poder
público e participar de decisões importantes para o rumo do Estado.

Na reunião subsequente, foi tratada mais uma vez a questão do grupo de


trabalho criado por Arthur Rios:

[...] o Senhor Presidente teve oportunidade de apresentar o economista


Luciano de Figueiredo Mesquita, que compõe o grupo do sociólogo Arthur
Rios e que está trabalhando no planejamento para o governo do Estado [...].
O Sr. Luciano Mesquita fez explanação sobre as suas observações no que
se relaciona com a administração pública do Espírito Santo e o que deverá
ser feito para o equacionamento de um programa de governo em bases
desenvolvimentistas, tendo em vista as nossas magníficas peculiaridades
51
geográficas [...] .

A citação é esclarecedora quanto ao fato do Estado formular, através


desse estudo, um governo subsequente ao de Rubens Rangel com bases
desenvolvimentistas. No entanto, a ata é clara ao dizer que o programa de governo
seria feito através dos direcionamentos que seriam dados pelo grupo de estudos do
sociólogo Arthur Rios, ou seja, o próximo governador52 já teria seu programa de
governo nas mãos.

É interessante frisar que esse projeto de base desenvolvimentista foi


realizado em escala federal e que, aderindo a tal projeto, o próximo governador
estaria apenas seguindo a cartilha imposta pelos militares.

50
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – Livro 1 – Pg. 19.
51
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – Livro 1 – Pg. 20-21.
52
Como veremos no próximo tópico, Dias Lopes, na data da referida reunião, já fora eleito
indiretamente como governador do Espírito Santo.

92
Nessa mesma reunião foi debatido o tema do financiamento para a
construção civil. Os industriais do ramo reclamavam da falta de crédito na “praça” de
Vitória e consequente limitação das atividades da construção civil.

Um dos conselheiros argumentou sobre “[...] o envio de um telegrama ao


presidente do Banco Central para uma providência sobre a questão creditícia em
53
Vitória, e, se possível, a vinda de um técnico para cuidar do assunto [...]” . Outro
conselheiro argumentou que o [...] Banco do Brasil não tem faixa para atender a
construção civil, que luta, desesperadamente, e que, apesar da questão ser
constantemente debatida, não houve uma solução para o problema [...] 54.

Apontados os problemas, o conselho adota duas medidas para resolver a


situação,

[...] foi aprovado para que se desse publicidade pela imprensa, a solicitação
que a Federação ia fazer ao Banco Central sobre a questão de crédito na
praça de Vitória. O Sr. José Maria Bivaque dos Santos sugere que o ofício
fosse feito pelo Governador Rubens Rangel, no sentido de ser criada uma
55
carteira de crédito industrial [...] .

Essa citação deixava claro que a relação da FINDES não era apenas com
o Poder Executivo, mas que também possuía amplos contatos na imprensa, como
será apresentado adiante.

Por fim, nessa mesma reunião foi debatida a questão da madeira no


Estado, pois segundo os conselheiros, a divisão da receita do Estado com os
madeireiros prejudicava os mesmos. Eles explicavam que “[...] da maneira como
estão às coisas ninguém mais vai querer trabalhar com madeira [...]” 56.

Para solucionar o caso, o presidente da federação à época, Américo


Buaiz, declarou que “[...] a Federação iria interferir junto ao governo do Estado no
sentindo de que quando a publicação da pauta sôbre a madeira fosse ouvido antes o
sindicato da classe [...]”57.

53
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 21.
54
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 21.
55
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 21-22.
56
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 22.
57
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 22.

93
A reunião de 15 de julho de 1966, realizada pelos Conselheiros da
Federação das Indústrias do Espírito Santo, evidenciou a forma como a instituição
estava alinhada como poder público, como os industriais capixabas possuíam o
apoio da imprensa e, como se articulavam para atender seus interesses.

É importante ressaltar que os contatos eram realizados diretamente com


o poder Executivo, uma vez que, ao ler as atas não percebemos qualquer
aproximação da FINDES com o poder Legislativo. Nesse sentido, vemos durante o
governo Rubens Rangel, o secretário Alvino Gatti transitando nas duas esferas,
tanto na esfera pública, como secretário de governo, como na esfera privada
atuando como conselheiro da federação.

A reunião do dia 29 de julho de 1966 foi suspensa devido ao falecimento


da esposa do presidente da FINDES à época Américo Buaiz58.

Na ata de 18 de agosto de 1966 não houve nenhuma citação relevante


em que poderíamos analisar a relação da instituição com o governo do Estado,
porém, uma parte da ata demonstra a fragilidade da FINDES, e, como supracitado,
sua estrutura era precária e contava com poucos sindicatos. Sobre esse assunto,
um dos conselheiros chamou a atenção para “[...] a criação de novos sindicatos,
salientando que a federação não podia ficar nestas condições e que sua extinção
poderia ocorrer logo se desligasse ou acabasse um sindicato”59.

Como o número mínimo de sindicatos para formar uma federação eram


cinco e, após oito anos a federação continuava com os mesmos cinco, a entidade
corria o risco de acabar caso um dos sindicatos acabasse ou pedisse uma
desfiliação.

Por outro lado, a FINDES era realmente forte politicamente, ou era


apenas a única entidade no Espírito Santo capaz de representar os interesses de
uma emergente elite urbano-industrial que tinha no seu projeto de industrializar o
Estado uma confluência com o projeto nacional de industrialização implantado pelos
militares?

58
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 22-23.
59
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 23.

94
Tendo em vista a fragilidade que a instituição demonstrou em suas
reuniões, compreendemos que, ainda que, com uma estrutura pequena, este órgão
era a única saída para o governo e para essa elite urbano-industrial que defendiam o
projeto de industrializar o Estado, pois após passar décadas, dependente do café, o
Estado não conseguiu formar uma burguesia industrial forte o suficiente para
desenvolver esse projeto. Entretanto, mesmo que a entidade apresentasse essas
limitações, ela se uniu ao Poder Executivo estadual para realizar o projeto
industrializante para o Estado.

Na ata da reunião do dia 31 de agosto de 1966, os conselheiros explanam


sobre mais um dos membros da equipe do sociólogo Arthur Rios, o professor
Henrique Ariente que, “[...] veio ao Espírito Santo realizar pesquiza junto à secretaria
de educação para elaboração da reforma administrativa que a federação das
indústrias contratou para ser entregue ao futuro governador [...]”60

Logo após a fala do professor, o presidente

“[...] manda ler ofício do secretário do gôverno do Estado do Espírito Santo


solicitando a indicação de um nome para representar a Federação no
Conselho de Desenvolvimento Econômico. O Conselho deliberou que os
atuais representantes junto ao Codec (Srs. Américo Buaiz e Antônio Paulo
61
Rodrigues) sejam reindicados[...]” .

Após investigar as atas da reunião de conselheiros da FINDES,


buscamos nas leis de autoria do Poder Executivo se houve alguma lei que favoreceu
a indústria ou algum membro da federação, ou se buscou o favorecimento da própria
entidade como um todo.

Durante seu curto mandato, Rubens Rangel enviou à Assembleia


Legislativa 50 leis ordinárias. Dentre essas, destacamos seis que eram de interesse
específico da indústria ou do empresariado em geral.

Era um número relevante, tendo em vista que, dentre as leis ordinárias


pesquisadas, havia todo tipo de alteração na legislação do Estado, desde a
mudança no orçamento até a nomeação de um policial militar, ou mesmo pensão
para viúvas de policiais falecidos.

Segue a tabela abaixo com as leis:

60
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 25.
61
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 25.

95
Tabela 9 – Leis Relevantes para a Indústria – Rubens Rangel
Lei Texto Objetivo / Resultado Esperado
02231/1966 Os recursos provenientes da Lei Federal nº Desenvolver a industrialização
4425, de 08/10/64, ficam destinados ao através da ampliação da malha
Departamento de Estradas e Rodagem para rodoviária.
aplicação e desenvolvimento do Plano
Rodoviário Estadual.
02237/1966 Autoriza o Poder Executivo a extinguir a Venda da estrada de ferro para
Estrada de Ferro Itapemirim aplicar recursos na malha rodoviária
da região
02240/1966 Autoriza o Poder Executivo a alienar o Com a receita da venda, o governo
"Radium Hotel", de propriedade do Estado, vai tentar resolver o problema da
situado em Guarapari. * Os artigos 8º e 9º água em Guarapari.
foram revogados pela Lei nº 2345/68.
02248/1966 Autoriza o Poder Executivo a alienar à Com os 5 milhões de cruzeiros
Central das Cooperativas do Espírito Santo a arrecadados com a alienação,
área de terra desmembrada de maior porção construir armazéns e fábricas da
da Fazenda Santana, no município de propriedade citada, fomentando a
Cariacica. industrialização.
02255/1966 Abre crédito especial para atender as Atender o interesse dos
despesas de conclusão das instalações para empresários do ramo da
os serviços de retransmissão de televisão - comunicação.
canal 2.
02275/1966 Autoriza o Poder Executivo a doar à Fomentar a industrialização na
Cooperativa Agro Industrial de Pedra Azul Região de Pedra Azul, através da
(CAIPA) área de terras situada em Pedreiras, doação de terras, beneficiando a
Domingos Martins. referida cooperativa.
Fonte: http://www.conslegis.es.gov.br/ - acesso em 04/03/2016.

Após o levantamento desses dados, podemos inferir como o governo de


Rubens Rangel trabalhou com o objetivo de realmente “deixar a casa arrumada”,
para o próximo governador.

Dias Lopes já fora indicado para ser o próximo governador capixaba,


participava ativamente de reuniões no interior do Estado, enquanto Rangel concluía
seu mandato, ao mesmo tempo em que o plano de governo já estava pronto. O que
restava agora para Dias Lopes era assumir e governo e desenvolver seu projeto
industrializante para o Estado.

Contudo, dentre as leis analisadas, a mais importante não foi assinada


em 1966, mas em 1967, assim que Dias Lopes tomou posse de seu cargo. A lei
2.279 de 1967 criava uma sociedade de economia mista denominada Companhia de
Desenvolvimento Econômico do Espírito Santo (CODES). O artigo 3º descrevia seus
objetivos:

Art. 3º - São objetivos da Companhia: I – criar novas fontes de renda e de


emprego, prioritariamente, nas áreas de diversificação da cafeicultura; II –
programar a industrialização do Estado e assistir a sua economia
projetando, fomentando, organizando e financiando, observada neste caso

96
a legislação federal, as atividades econômicas nos setores primário e
secundário; III – promover a execução de estudos e pesquisas, programas
de assistência técnica e pré-inversões em geral, com ou sem ressarcimento;
IV – promover a formação e treinamento do pessoal como diretriz para a
criação de novas condições de trabalho e produtividade, tanto no setor
público como no privado com ou sem ressarcimento; V – adotar medidas
que estimulem o artesanato e a pequena indústria, promovendo no setor as
pesquisas e investimentos necessários; VI – incentivar iniciativas de capital
privado que visem à criação, instalação ou reaparelhamento de empresas
agrícolas e industriais; VII – contratar, com entidades públicas ou privadas,
nacionais, internacionais ou estrangeiras, empréstimos ou gestão de
recursos oriundos de programas de ajuda ou cooperação ou de qualquer
outra natureza, celebrando os ajustes, acordos, contratos e convênios
62
necessários .

A CODES foi idealizada no governo de Rubens Rangel e sua criação


estava pronta para a assinatura assim que Dias Lopes tomou posse. Vale ressaltar
que, Dias Lopes tomou posse em 31 de janeiro de 1967 e a lei que criou a CODES
foi assinada em 11 de fevereiro do mesmo ano. Essa foi a primeira ação do seu
governo.

Dias Lopes tinha ciência da difícil situação financeira e já se movimentava


durante o governo de Rubens Rangel, buscando criar um órgão que pudesse captar
dinheiro para recuperar a economia capixaba, tão abalada pela erradicação dos
cafezais. Era necessário um entendimento com o Instituto Brasileiro do Café (IBC)
para que o Estado pudesse recuperar as perdas econômicas que ocorreram face à
erradicação dos cafezais.

Dessa forma, Rubens Rangel delega a Dias Lopes as negociações com o


IBC.

Sobre o assunto, o próprio Dias Lopes conta como ocorreu:

Quando eu ainda não tinha tomado posse, já o IBC executava aqui no


Espírito Santo, aquela política tremenda da erradicação de café, que esteve
apavorando todo mundo, era uma erosão tremenda na economia do Estado.
Então, seu Rubens (Rangel) no governo, me autorizou a falar em nome do
Estado, nos entendimentos com o IBC, para ver se encontrava uma forma
de não levar o Estado a uma derrocada total. Dos contatos que nós
fazíamos com o IBC, ficou combinado que o IBC estudaria uma forma de
compensar o Estado, em termos econômicos. Foi constituída uma
comissão, um grupo de trabalho para estudar a constituição de uma
empresa, através da qual o IBC injetasse dinheiro na economia do Estado,
por intermédio do GERCA – Grupo Poder Executivo da Racionalização da
63
Cafeicultura .

62
Disponível em http://www.conslegis.es.gov.br/. Acesso: 30/06/2016.
63
Revista Espírito Santo Agora, Vitória, p. 20-33. Ano I, n. 19, out 1977. Entrevista de Christiano Dias
Lopes concedida a Oswaldo Oleair, Rogério Medeiros, Joaquim Neri e Vitor Martins.

97
Estavam lançadas as bases da CODES, pois era necessário que o
governo requeresse alguma compensação pelas perdas econômicas ocasionadas
pela erradicação dos cafezais. O interessante nesse caso, não é a articulação do
governo, mas o espaço que o governador tinha, ainda que não empossado, pois foi
ele mesmo quem tomou cabo das negociações com o IBC.

Vejamos o que Dias Lopes falou sobre a constituição da CODES:

[...] ele (Arthur Gerhardt) e o Gatti já vinham trabalhando comigo no projeto


da reforma administrativa. O Arthur foi para essa comissão, que contratou
estudos, um projeto para a criação da CODES e, pronto o projeto, foi o Seu
Rubens que o encaminhou para a Assembleia, de forma que, quando eu
assumi o Governo, dez dias depois já estava sancionando lei que constituía
64
a CODES, que passou a receber dinheiro do Gerca [...] .

Concluímos que o governo Dias Lopes foi uma extensão do governo de


Rubens Rangel, pois manteve as práticas de priorizar quadros técnicos, ao invés de
políticos na composição do secretariado; e, participar ativamente da Federação das
Indústrias através de seus conselheiros Alvino Gatti e Rubens Rangel.

Essa atuação de Dias Lopes, ainda sem tomar posse, demonstrava o


empenho do governo de Rubens Rangel em criar um ambiente propício no Estado
para o fomento à industrialização.

3.2 O Governo Dias Lopes: Eleição e plataforma de governo

Esse tópico tem como objetivo discorrer sobre a eleição indireta de


Christiano Dias Lopes, o primeiro governador biônico65 do Espírito Santo, e sua
plataforma de governo exposta no discurso de posse.

Suscintamente, o processo de eleição indireta dos anos de 1966, 1970,


1974 e 1978 ocorria basicamente em três etapas:

[...] 1º) ocorria um amplo debate no interior do partido governista, a Arena,


entre as principais lideranças e/ou grupos, para a confecção de uma lista ou
indicação de um nome, se fosse alcançado o consenso; 2º) em seguida, a
lista escolhida era submetida ao Presidente da República para a indicação

64
Revista Espírito Santo Agora, Vitória, p. 20-33. Ano I, n. 19, out 1977. Entrevista de Christiano Dias
Lopes concedida a Oswaldo Oleair, Rogério Medeiros, Joaquim Neri e Vitor Martins.
65
Governador eleito de forma indireta.

98
da sua preferência; 3º) em seguida, o nome era remetido à Assembleia
Legislativa do Estado para ser aprovado. (OLIVEIRA, 2013, p. 25)

Dias Lopes foi um político militante, natural de Bom Jesus do Norte, e


começou sua carreira política como oficial de gabinete de Jones dos Santos Neves,
por quem nutria uma grande admiração. Em 1958 foi eleito deputado estadual – nos
anos anteriores havia ficado na suplência, nesse período foi líder do governo Carlos
Lindemberg na Assembleia Legislativa e presidente da mesma casa.

Foi reeleito em 1962, alcançando uma grande ascensão política após se


destacar na liderança de um grupo de parlamentares que faziam oposição ao então
governador Francisco Lacerda de Aguiar (VASCONCELLOS , 2010).

Após ter forjado toda sua vida pública ao lado de Santos Neves, podemos
dizer que Dias Lopes estava alinhado com os objetivos modernizantes e
industrializantes do ex-governador. Além de acompanhar toda a trajetória de Santos
Neves – de 1943 a 1945 como interventor e de 1951 a 1955 como governador –,
Dias Lopes também participou ativamente da elaboração do plano de governo do
candidato Jones, derrotado no pleito de 1962 por Chiquinho. Sobre essa
aproximação e admiração, o próprio Dias Lopes relatou que:

A presença de Jones no governo do Estado foi marcante [...]. Quando ele


assumiu o governo, ainda como interventor, o porto de Vitória era
subordinado ao porto da Bahia, de Salvador, e nós não tínhamos nem
estrada para aquela região. Não tínhamos nada. Ele mostrou que o porto de
Vitória tinha que ficar na linha de jurisdição do Rio de Janeiro e conseguiu.
[...] ele deixou plantado, deixou estruturado um projeto de desenvolvimento
econômico que raramente poderia se desenvolver aquela época.
Depois, eleito governador em 1950, tomou posse em 1951 e então executou
o seu projeto, seu plano de desenvolvimento econômico que aproveitou
vários itens, várias projeções e várias formulações do primeiro projeto [...].
Aqueles procedimentos do Jones, aqueles estudos do Jones, aquela
dedicação do Jones, do qual fui oficial de gabinete, influenciaram tanto na
formação do jovem de 20 anos que eu era [...]. (LOPES, 2002, p. 26)

Vale lembrar que o governador, indicado em 1966, só tomaria posse em


1967, porém as movimentações para a formação da lista tríplice já começaram em
maio de 1966 como nos relata A Gazeta66. Vale ressaltar também as diretrizes
políticas que o governo exigia de um postulante ao cargo de governador:

[...] a) Dispor de bom trânsito nos meios políticos e revolucionários; b) Ser


filiado à Arena; c) Não ter antagonismos frontais com o presidente da

66
ESCOLHA do candidato a Governador do estado movimenta a Assembleia. A Gazeta, Vitória, p.
01, 20 mai. 1966.

99
República e o governador do Estado nem, de modo geral, com a orientação
política e administrativa de cada um deles; d) Não ser elemento de posições
radicalizadas, nem ter comprometimento com erros e vícios do passado,
notadamente com a corrupção e a subversão; e) Poder reunir em torno do
seu nome a maioria dos representantes da ARENA na Assembleia
Legislativa; f) Permitir, por sua formação moral, plena confiança quanto à
manutenção dos compromissos com o atual esquema político da Arena ou
do partido em que ela se transformar e bem assim com o presidente da
República a ser eleito pela ARENA. (MAGALHÃES apud ABREU, 1972, p.
410).

Essas diretrizes, mesmo que indiretamente, impediam qualquer político


do MDB candidatar-se ao pleito. Dessa forma, os candidatos que tivessem o perfil
desejado pelo regime militar, cumprindo os requisitos e aceitando as condições
descritas acima, estariam aptos a participar de uma votação prévia pelo governo do
Estado.

Entretanto, outros fatores foram determinantes para a indicação de Dias


Lopes para o Poder Executivo capixaba. Para Oliveira (2013), seguindo os critérios
adotados pelo regime militar, Dias Lopes era o que possuía o melhor perfil, pois

[...] além de possuir ótimo trânsito entre as diversas forças políticas locais,
especialmente nos setores industriais emergentes, representava uma
renovação política, uma vez que também fazia parte da antiga Ala Moça do
PSD, o que naquele momento pesava de forma muito favorável. (OLIVEIRA,
2013, p. 145)

Vasconcellos (2010) destacou o fato de Carlos Lindemberg Von Shilgen,


o Carlito Von Shilgen, um dos integrantes de maior envergadura do PSD e aliado do
ex-governador Carlos Lindemberg ter se filiado ao MDB. Dessa forma, Carlito deixou
o caminho aberto para Dias Lopes alcançar grande relevância dentro da Arena,
principalmente junto aos correligionários do PSD. Esse fato é lembrado pelo próprio
Christiano, quando aponta que o “[...] Carlito (Carlos Lindemberg Von Shilgen)
cometeu, naquela ocasião, o gravíssimo erro de não ter vindo para a Arena com o
pessoal do PSD [...]”67.

Apontar as disputas internas dentro da Arena para a composição da lista


tríplice foge ao escopo desse trabalho. No entanto, os nomes que foram levados ao
presidente da República para a indicação de um nome a ser submetido à
Assembleia Legislativa foram: Christiano Dias Lopes, Raul Gilberti e Jefferson de

67
Revista Espírito Santo Agora, Vitória, p. 20-33. Ano I, n. 19, out 1977. Entrevista de Christiano Dias
Lopes concedida a Oswaldo Oleair, Rogério Medeiros, Joaquim Neri e Vitor Martins.

100
Aguiar. Dias Lopes fora o mais votado na convenção da Arena com 43 votos dos 81
membros da arena regional (OLIVEIRA, 2013).

Segundo Oliveira (2013), a crise econômica que se abateu no Espírito


Santo - decorrente da política de erradicação dos cafezais empreendida pelo IBC -
foi o principal elemento gerador de uma ruptura na composição política do Estado.

Nossa pesquisa aponta que essa ruptura resultou na renúncia de


Lacerda de Aguiar e a posse de Rubens Rangel, a partir daí uma convergência de
interesses permeia o debate público capixaba. De um lado, o novo governador
(Rangel), com um ideal modernizante para o Estado, abriu espaço para que a
FINDES se alocasse em seu governo. Do outro lado, a FINDES, que caminhava
lado-a-lado com o PSD na preocupação de industrializar o Estado.

É importante salientar que o discurso de posse de Dias Lopes foi uma


síntese do documento encomendado pela FINDES ao sociólogo Arthur Rios, que foi
chamado de “Diagnóstico para o Planejamento Econômico do Estado do Espírito
Santo, 1966” (SILVA, 1993). Tal documento seria a plataforma do então governador
e dissecava

[...] as característica econômicas do Estado (renda interna, transportes,


energia elétrica), e levanta a evolução recente do conjunto do Estado, da
estrutura industrial e das zonas fisiográficas; analisa as atividades
dinâmicas tradicionais: café, cacau, açúcar e madeira; analisa, ainda, as
atividades dinâmicas ligadas à exportação de minérios e a agricultura de
abastecimento; contempla o alargamento das potencialidades dinâmicas
relacionadas com as rodovias federais BR’s – 101, 259 e 262; avalia os
órgãos regionais de desenvolvimento e apresenta sugestões para um
programa de investimentos (SILVA, 1993, p. 108).

Silva (1993) preconiza que tal documento está em consonância com o


regime militar brasileiro, pois “segue a lógica do planejamento, a da orientação
racional dos investimentos públicos como indutores de desenvolvimento” (SILVA,
1993, p. 108).

De posse dessas informações, vamos analisar alguns fragmentos do


discurso que Dias Lopes proferiu em sua posse no dia 31 de janeiro de 1967. Tais
fragmentos corroboram a versão de Silva (1993) e demonstram que realmente sua
plataforma de governo tinha o compromisso de industrializar o Estado. Logo no
início, Dias Lopes afirma que pretendia marcar seu

101
“[...] governo pelo sentido da mudança: mudança nos métodos de
administração pública; mudança nas atitudes diante dos problemas do
Estado; mudança no comportamento diante das nossas potencialidades
adormecidas; mudança nas perspectivas de desenvolvimento do nosso
68
Estado” .

Ainda no discurso de posse, Dias Lopes reafirmou seu compromisso em


desenvolver o Estado.

[...] vamos lutar diariamente, diuturnamente, todas as horas, todos os dias,


todos os meses desses próximos quatro anos para que possamos mudar a
fisionomia do Espírito Santo. [...] criaremos novas fontes de sustentação
econômica. Para essa dinamização da economia estadual, sem qualquer
preocupação de obter resultados imediatos, objetivando repercussões
eleitorais, nosso plano de governo embasa-se no binômio: racionalização
69
administrativa e desenvolvimento .

Prosseguindo em seu discurso, Dias Lopes indica como essas rotas


desenvolvimentistas seriam trilhadas.

O primeiro termo da equação compreende ampla reforma administrativa,


não limitada apenas a uma estrutura nova, mais leve, mais arejada, mais
descentralizada e mais dinâmica; a reforma abrangerá, ainda, providências
inflexíveis para prosseguir o processo de saneamento da administração
iniciado no Governo de Rubens Rangel, em moldes a que se possa
restabelecer, em sua plenitude, o primado de responsabilidade, austeridade
e da autoridade nos atos do governo [...]. No segundo termo do binômio
programático, estarão compreendidas todas as providências destinadas a
ordenar esforços e recursos capazes de criar condições mínimas
necessárias a fim de que o Estado possa decolar no rumo de seu efetivo
70
desenvolvimento econômico .

Após analisar a participação econômica do Espírito Santo comparando


aos Estados do centro-sul, Dias Lopes também argumentou que o cultivo de culturas
como açúcar, cacau e o próprio café não seriam benéficas economicamente para o
Estado, defendendo que a produção de madeira geraria lucros a longo prazo.
Segundo o novo governador, o Estado tinha

[...] limitados dos chamados produtos tradicionais, para uma decisiva


participação no incremento da economia capixaba, e partindo do
pressuposto de que o “desenvolvimento do Estado dar-se em função da
existência de mercados amplos em rápido crescimento”, não temos dúvida
de que as melhores perspectivas para o processo de aceleração de nossa
economia encontram-se nas atividades dinâmicas ligadas à importação de
minérios e à agricultura de abastecimento. Sem duvida, a construção, pela

68
Espírito Santo tem novo Governador: discurso. Revista Capixaba, Nº 1. Ano I, Vitória, mar. 1967, p.
13.
69
Espírito Santo tem novo Governador: discurso. Revista Capixaba, Nº 1. Ano I, Vitória, mar. 1967, p.
13.
70
Espírito Santo tem novo Governador: discurso. Revista Capixaba, Nº 1. Ano I, Vitória, mar. 1967, p.
13.

102
companhia Vale do Rio Doce dos terminais de minério e de carvão do Porto
de Tubarão e a montagem da usina de “Pellets”, possibilitando a empresa
uma política agressiva de exportação de minérios; o projeto de uma Usina
Siderúrgica Integrada por que vem lutando a Ferro e Aço, a ser construída
em área de que é proprietária em Ponta de Tubarão; os audaciosos
Projetos do Grupo Antunes já aprovados pelo Governo Federal que vão
desde os entendimentos com a Vale do Rio Doce para a exportação de
Minério do Vale do Paraopeba através do Porto de Tubarão até a
construção de uma Usina de Peletização de uma Siderúrgica, criam
perspectivas extraordinárias para um grande complexo industrial na região
71
de Vitória .

O ideal de Dias Lopes era modernizador e industrializante, como o do


governo federal, e projetava a implantação de grandes projetos como uma
siderúrgica e indústria de pelotização.

Percebemos que esses grandes projetos não estavam alinhados com a


FINDES, pois, como vimos anteriormente, o interesse da federação era desenvolver
a indústria local.

Mais adiante, veremos que os esforços da entidade eram voltados


principalmente para a implantação do Centro Industrial da Grande Vitória (CIVIT).
Todavia, Dias Lopes não estava alheio aos problemas dessa instituição e prometeu
favorecer a indústria local. Após falar dos esforços que o Estado faria para que
esses projetos permanecessem no Espírito Santo, Dias Lopes acreditava na

[...] implantação de um sistema de estímulos e suportes às atividades no


campo da agroindústria [...]. Os planos do Governo voltados para o
desenvolvimento do Estado incluirão ainda, a criação de entidades
destinadas a financiar pequenas e médias empresas nos setores agrícolas
e industrial. Além disso, é prevista a reformulação de órgãos já existentes e
que devem ligar-se mais dinamicamente à política de desenvolvimento
como o Banco de Crédito Agrícola do Espírito Santo que, segundo estudos
preliminares, vem regredindo nos últimos dez anos, e o Conselho de
Desenvolvimento Econômico (CODEC), ao qual pretendemos atribuir, de
fato, importante missão na programação de investimentos de infraestrutura
e no estabelecimento das linhas prioritárias de ação das instituições
72
financeiras .

Em suma, o governo não tinha condições de investir no setor da


mineração, pois o Estado ainda sofria os efeitos da crise cafeeira. Dessa forma, o
Diagnóstico Para o Planejamento Econômico preconizava que o “Governo do Estado

71
Espírito Santo tem novo Governador: discurso. Revista Capixaba, Nº 1. Ano I, Vitória, mar. 1967, p.
13.
72
Espírito Santo tem novo Governador: discurso. Revista Capixaba, Nº 1. Ano I, Vitória, mar. 1967, p.
15-16.

103
se concentre na tarefa de coordenação sem pensar em investimentos próprios”
(SILVA, 1993, p. 111). Dessa forma,

[...] os trabalhos de coordenação para criação de um Grande Complexo


Industrial, deve ser precedido das seguintes providências: a) Criação do
órgão Específico para Coordenação do Desenvolvimento do Estado; b)
Estudo preliminar para Coordenação do Complexo Industrial; c) Estudo de
localização de um Distrito Industrial e das necessidades da infraestrutura
correspondente (SILVA, 1993, p. 111).

O desfecho do diagnóstico apontava a industrialização como a saída para


a crise. No entanto, a crise que pairava sobre o Estado à época não proporcionaria
condições ao Estado para investir na criação desse complexo industrial, tampouco
no setor da mineração. Ficava evidenciada a “[...] necessidade da criação de
mecanismos que permitissem ao Poder Executivo Estadual a centralização e o
direcionamento das ações relativas ao desenvolvimento econômico e social do
Estado [...]” (SILVA, 1993, p. 113).

Analisamos nesse tópico, a indicação de Dias Lopes para o governo do


Estado e seu discurso de posse, pois o mesmo demonstrava, além de sua
plataforma de industrializar o Estado, uma aliança clara com a FINDES. Todavia, a
formação de sua equipe de governo, a reforma administrativa, a criação de novos
órgãos de governo, as medidas tomadas pelo governo que foram sugeridas pelo
Diagnóstico Para o Planejamento Econômico serão analisadas nos tópicos a seguir,
não perdendo de vista a atuação da federação na figura de seus respectivos
membros, seja nas autarquias ou nas secretarias de governo.

A influência da FINDES no governo capixaba tem sua gênese na gestão


de Carlos Lindemberg (1959-1962). Após o mandato de Lindemberg, a instituição
ficou alijada do governo, pois o Estado estava sob a direção de Chiquinho, que tinha
uma agenda diferente do PSD e da FINDES.

Contudo, sua influência cresceu a partir de 1964, como lembra Américo


Buaiz: “[...] a Revolução de 1964 não prejudicou o Espírito Santo, tendo inclusive
escolhido governadores ligados à FINDES: Eurico Rezende foi advogado da
Federação, Arthur Carlos era engenheiro e trabalhava na FINDES. No Palácio
Anchieta, eles abraçaram o processo de industrialização” (BUAIZ, 1988, p.10).

Nesse período a FINDES viu crescer sua área de influência dentro do


governo capixaba, pois as eleições, a partir de 1966, passaram a ser indiretas e o

104
governador eleito tinha que estar alinhado com as propostas do militares – que
tinham uma agenda desenvolvimentista para o Brasil.

A partir de 1966, a FINDES passou a atuar como um grupo de interesse


intimamente ligado ao Poder Executivo, seja exercendo pressão ou lobby, com o
objetivo de direcionar o governo para a criação de mecanismos capazes de induzir a
industrialização no Estado.

No governo de Dias Lopes, a atuação da FINDES se intensificou por dois


motivos:

Primeiro, por que o novo governador via com simpatia a alternativa


industrializante para o Espírito Santo. [...] A segunda razão para a aceitação
de um projeto industrializante tem a ver com a conjuntura econômica da
época: a própria crise da economia cafeeira abriu uma brecha para a
penetração de ideias defendidas pela FINDES, pois era necessário
encontrar (e rápido) uma solução para preencher o vazio que estava sendo
aberto com o declínio da produção cafeeira (GURGEL, 1998, p. 48).

Dessa forma, o discurso de posse e as ações de Dias Lopes conduziram


o Estado ao cruzamento de diversas variáveis influenciadoras do processo de
industrialização do Espírito Santo: a influência do governo federal, as convicções
político-ideológicas do governador e a ação política da FINDES (SILVA, 1993).

Nosso trabalho se direciona para essas variáveis, procurando


desenvolver acerca dessa convergência de interesses entre o Poder Executivo
capixaba e a FINDES no contexto do regime militar.

No entanto, é necessário analisar o governo Dias Lopes por partes.


Assim, após a análise de seu discurso de posse, apresentaremos suas primeiras
medidas como novo governador, bem como a composição do seu governo. Quando
falamos composição de governo, não estamos nos referindo apenas ao seu
secretariado, mas também à criação de órgãos e composição de leis que alteram os
rumos do Estado.

É necessário frisar que Dias Lopes impôs ao Estado uma profunda


reforma administrativa, pela qual alterou a estrutura das secretarias, do
funcionalismo público, criou autarquias, fundações, empresas de economia mista,
etc.

Sobre essas reformas, Silva (1993) realizou um trabalho de grande


envergadura na década de 1990. Contudo, é necessário fazer uma análise simples

105
dessa reforma para identificarmos a alocação dos membros da FINDES dentro do
governo Dias Lopes.

Segundo Oliveira (2013), a federação, durante o regime militar, não


esteve restrita apenas à atuação econômica – o que seria coerente, sendo uma
entidade industrial –, mas sua natureza tecnocrática influenciou o campo político.

Essa influência ocorreu pela racionalidade tecnocrata do regime militar.


Dessa forma, o autor apontou para atuação da FINDES em duas frentes: primeiro a
instituição passou a ser responsável pelo recrutamento e indicação dos principais
quadros que ocupariam os espaços de poder no Espírito Santo; segundo,
“delineando as principais diretrizes governamentais” (Oliveira, 2013, p. 165).

Concordamos com a ideia do autor em parte, uma vez que, não


encontramos vestígios da indicação da FINDES na eleição de Arthur Gerhardt e,
sobre o segundo ponto, a federação realmente passou a delinear essas diretrizes
governamentais apenas no governo de Dias Lopes, perdendo espaço nos governos
subsequentes.

Procuraremos demonstrar, de que forma seu campo de influência foi


reduzido.

3.3 O Governo Dias Lopes: O secretariado e a reforma administrativa de 1967

Colocando em prática a racionalização administrativa, Dias Lopes propõe


a lei 2296/1967, que preconizava princípios da administração pública como
programação, coordenação, descentralização, delegação de competência e controle
(SILVA, 1993).

Segundo Dias Lopes, o quadro vigente era caótico:

[...] irracionalidade, baixa remuneração, nepotismo, indisciplina, ineficiência


de processos seletivos racionais para a administração, subordinação da
dinâmica técnico administrativa a um regime de favores pessoais, corrupção
sobre variadas formas, tudo isso minava irremediavelmente a máquina
administrativa e a tornava inteiramente inadequada para servir de suporte a
qualquer programa de governo (LOPES FILHO Apud VASCONCELLOS,
2010, p. 169).

106
Para Vasconcellos (2010), a máquina administrativa necessitava de uma
reforma urgente, pois não havia

[...] sequer unicidade das leis que regiam órgãos estatais, faziam-se
modificações aleatórias, que ora levavam ao conflito de atribuições das
diversas secretarias e órgãos públicos, ora engessavam ações devido à
sobrecarga burocrática e à falta de zelo com a coisa pública por parte dos
funcionários. A balburdia era tanta que, para se ter uma ideia, a Secretaria
de Educação não sabia quantas unidades escolares primárias,
funcionavam em prédio próprio (VASCONCELLOS, 2010, p. 170).

Todavia, antes de implantar a reforma administrativa, era necessário


compor o secretariado.

Tabela 10 – Secretariado de Dias Lopes – Início Governo.


73
Secretário Secretaria Profissão
Ivan Neves de Andrade Agricultura -
Darcy Werther Vervloet Educação e Cultura Professor
Paulo Augusto Costa Alves Governo -
José Dias Lopes Segurança Pública Delegado/irmão do Gov.
Antônio Dias de Souza Interior e Assuntos da Justiça -
Alvino Gatti Planejamento Advogado – Ligado à FINDES
Hamilton Machado de Carvalho Saúde e Assistência Médico
Luiz Paulo de Souza Indústria e Comércio Economista
Rubens Vieira de Oliveira Fazenda Economista
Henrique Del Caro Serviços Sociais Médico
74
José Carlos Pereira Netto Direção do DER Engenheiro
Fonte: Governo Christiano Dias Lopes. Relatório de governo. Vol. 1. 1968.

Cumprida essa etapa, Dias Lopes sistematizaria o quadro administrativo,


pois o mesmo era realmente complicado à época. A par da “confusão administrativa”
em que o Espírito Santo se encontrava, o governador percebeu a flexibilização
criada pela reforma administrativa federal reformulada pelo Decreto-Lei 200, de 25
de fevereiro de 1967.

Tal decreto estabelecia as diretrizes que passariam a reger o serviço


público em todo país. O DL Nº 200 remodelou o serviço público, regulamentando a
administração indireta, por meio de autarquias, empresas públicas, fundações e
sociedade de economia mista.

Dessa forma, Dias Lopes, embasado no DL Nº 200 e compreendendo a


necessidade de uma reforma administrativa para o Espírito Santo, incorporou

73
Procuramos as profissões de todos os secretários no arquivo público, diário oficial, revistas e
jornais. Os que estão em branco não foram encontrados.
74
Nesse período a direção do DER (Departamento de Estradas e Rodagem), respondia pela
Secretaria de Serviços Públicos Especiais.

107
conceitos da legislação federal e implementou a Lei 2296, de 17 de julho de 1967,
juntamente com 26 leis delegadas75 (VASCONCELLOS, 2005).

Analisar toda a Lei 2296 foge ao escopo desse trabalho. Sendo assim,
nos ateremos aos quatro primeiros artigos da Lei, que seguem no quadro abaixo:

Quadro 3 – Lei 2296/1967.

Administração Estadual

Art. 1º A Administração do Estado é exercida pelo Chefe do Poder Executivo, auxiliado


pelos Secretários de Estado.

Art. 2º O Governador e os Secretários de Estado exercem as atribuições de sua


competência constitucional, legal e regulamentar, com auxílio dos órgãos que
compõem a administração estadual.

Art. 3º Respeitadas as limitações constitucionais e observadas as disposições desta lei,


compete ao Poder Executivo dispor sobre a estruturação e funcionamento dos
órgãos da administração estadual.
A administração estadual compreende:
Art. 4º
I – a administração direta, que se constitui dos órgãos integrados na estrutura
administrativa da Governadoria e das Secretarias de Estado;

II – a administração indireta que compreende as seguintes categorias de


entidades, dotadas de personalidade jurídica própria:

a) – autarquias;
b) – empresas públicas;
c) – sociedade de economia mista;
d) – fundações;
e) – outras entidades instituídas por lei estadual.

Fonte: http://www.conslegis.es.gov.br/. Acesso em 03/05/2016.

A partir do quadro 2, especificaremos os órgãos que constituíram a administração


indireta do Estado à época:

75
A Lei Delegada era uma prerrogativa legal, na qual o Legislativo concedia ao executivo o poder de
elaborar leis.

108
Quadro 4 – Sistema de Administração Indireta.

Administração Indireta

É o serviço autônomo criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio


e receita próprios, para a execução de atividades típicas da administração
Art. 7º - Autarquia
pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão
administrativa e financeira descentralizada.

Empresa pública é a entidade dotada de personalidade jurídica de direito


privado, com patrimônio próprio e capital exclusivo do Estado ou de suas
Art. 8º - Empresa
entidades de administração indireta, criada por lei para desempenhar
Pública
atividade de natureza empresarial.

É de economia mista a sociedade anônima cujas ações com direito de voto


Art. 9º - Economia Mista
pertençam, em sua maioria, ao Estado, a uma empresa pública ou a outra
sociedade de economia mista.

Equiparam-se às empresas públicas, para os efeitos desta lei, as


Art. 10 - Fundações fundações instituídas em virtude de lei e de cujos recursos participe o
Estado, quaisquer que sejam as suas finalidades

Fonte: http://www.conslegis.es.gov.br/. Acesso em 03/05/2016.

Podemos aferir que a Lei 2296/1967 foi o início da racionalização


administrativa proposta por Dias Lopes, pois ela muda todo arcabouço administrativo
do Estado. Essa lei preconizou as

[...] diretrizes, a nomeação das Secretarias de Estado assim como dos


órgãos da administração indireta que até aquela época já estavam
definidos. A regulamentação, tanto dos órgãos integrantes da administração
direta e das entidades componentes da administração indireta, foi feita
pelas referidas Leis Delegadas (SILVA, 1993, p. 120).

Durante o ano de 1967, o governador estabelece vinte e seis leis


delegadas com o objetivo de otimizar a máquina administrativa do Estado. Entre as
vinte e seis leis delegadas, a maioria estabelece a estrutura e define a competência
de órgãos.

Nesse universo de leis, selecionamos as mais relevantes para o objetivo


proposto por essa pesquisa, seguem na tabela abaixo:

109
Tabela 11 – Leis Delegadas – 1967.
Leis Delegadas Texto da Lei
Lei Delegada nº 4 Estabelece a estrutura e define a competência básica dos órgãos da
Secretaria de Saúde e Assistência.
Lei Delegada nº 9 Estabelece a estrutura e define a competência básica da Secretaria de
Indústria e Comércio (SIC) do Estado do Espírito Santo.
Lei Delegada nº 10 Estabelece a estrutura e define a competência básica dos órgãos da
Secretaria de Serviços Públicos Especiais.
Lei Delegada nº 12 Estabelece a estrutura e define a competência básica dos órgãos da
Secretaria de Serviços Sociais (SSS).
Lei Delegada nº 13 Estabelece a estrutura e define a competência básica dos órgãos da
Secretaria da Fazenda (SF) do Estado do Espírito Santo.
Lei Delegada nº 20 Estabelece a estrutura e define a competência básica dos órgãos da
Secretaria de Educação e Cultura.
Lei Delegada nº 24 Estabelece a estrutura e define a competência básica dos órgãos da
Secretaria de Segurança Pública.
Lei Delegada nº 26 Estabelece a estrutura e define a competência básica dos órgãos da
Secretaria do Interior e Assuntos da Justiça. (SIAJ)
Lei Delegada nº 23 Estabelece a estrutura, define a competência básica dos órgãos
integrativos da Governadoria do Estado.
Fonte: http://www.conslegis.es.gov.br/. Acesso em 03/05/2016.

Após analisar as 26 leis delegadas, destacamos a lei delegada nº 19,


criada para reestruturar a administração pública estadual, e para isso

[...] foi criado o cargo de Secretário Extraordinário para Assuntos de


Reforma (LD nº 19), que ficou sob a responsabilidade de Alvino Gatti, antigo
colaborador e homem de confiança de Christiano, que, sobretudo contava
com largo leque de conhecimento na área (VASCONCELLOS, 2010, p.
172).

O texto da Lei preconizava a criação de dois cargos de secretário


extraordinário de Estado, onde os referidos secretários teriam as mesmas
prerrogativas, vantagens, direitos e remuneração dos secretários de Estado. Já as
atribuições do cargo seriam definidas a partir de um decreto criado pelo governador
(SILVA, 1993).

Como vimos nos tópicos anteriores, Gatti fora homem de confiança de


Rubens Rangel, e, ao mesmo tempo, era um conselheiro importante dentro da
FINDES onde compunha o quadro técnico da entidade. É nítido como a importância
de Gatti e sua atuação não foi alterada de um governo para o outro.

No governo de Rangel, Gatti era secretário de governo; no mandato de


Dias Lopes ele assume o cargo de Secretário Extraordinário, no qual se mantém até
o fim do mandato (VASCONCELLOS, 2010).

Sobre a atuação de Alvino Gatti no governo, Silva (1993, p. 126) salienta


que Dias Lopes encontrou nele “[...] toda substância filosófica para a implantação de

110
práticas da racionalidade da empresa privada preconizada pelo governador, uma
vez que era oriundo dos quadros técnicos da Federação das Indústrias do Espírito
Santo”.

Acerca da reforma administrativa de Dias Lopes, podemos ponderar que,

Foram criados 12 (doze) Conselhos de âmbito das Secretarias, além do


Conselho e Desenvolvimento Econômico – CODEC, vinculado diretamente
ao Governo do Estado. A ação desses colegiados era a de discutir e definir
políticas e diretrizes, tanto na administração direta quanto na administração
indireta. A existência de diversos órgãos e entidades realizando partes de
um mesmo tema justificava a criação desses conselhos que permitiam, pelo
menos no plano teórico, a harmonização das ações programáticas e
possibilitava ao Governador repassar com menos dificuldade as suas
diretrizes para transformá-los em planos concretos (SILVA, 1993, p. 124-
125).

A reforma administrativa foi levada à frente pelo então governador. Com a


criação de uma série de conselhos, entidades, autarquias, órgãos que
representavam uma administração indireta e descentralizada.

Contudo, a atuação da FINDES não se direcionava para a reforma


administrativa, mas sim, para o desenvolvimento. No entanto, com a implantação da
reforma administrativa, criam-se “[...] espaços de participação colegiada junto aos
diversos órgãos da Administração Direta e as Entidades da Administração Indireta,
sob a forma de Conselhos Consultivos, Deliberativos ou Administrativos (SILVA,
1993, p. 211).

Após a reforma administrativa, o secretariado apresentou a seguinte


composição:

111
76
Tabela 12 – Equipe Administrativa – após Reforma Administrativa .
Secretário Secretaria Profissão
77
Guilherme Pimentel Filho Agricultura Médico Veterinário
78
Darcy Werther Vervloet Educação e Cultura Professor
Paulo Augusto Costa Alves Interior e Assuntos da Justiça Advogado
Alvino Gatti Assuntos Reforma Adm. Advogado – Ligado à FINDES
Hamilton Machado de Carvalho Saúde e Assistência Médico
Luiz Paulo de Souza Indústria e Comércio Economista
79
Adyr Maya Fazenda General da Reserva
80
Henrique Del Caro Serviços Sociais Médico
José Carlos da Fonseca Assuntos de Gabinete Civil Advogado
81
José Carlos Pereira Netto Serviços Públicos Especiais Engenheiro
Gutman Uchôa de Mendonça Secretário Particular Jornalista – Ligado à FINDES
82
Arthur Carlos Gerhardt Santos Presidente CODES Engenheiro – Ligado à FINDES
83
José Dias Lopes Segurança Pública Delegado/irmão do Gov.
Fonte: Governo Christiano Dias Lopes. Relatório de governo. Vol. 2. 1969.

Percebemos como três atores altamente ligados à federação compõem o


quadro do secretariado capixaba à época.

Gatti, como Secretário Extraordinário para Assuntos da Reforma


Administrativa; Arthur Gerhardt como presidente da CODES, que à época possuía
status de secretaria; na secretaria pessoal do govenador Guttman Uchôa de
Mendonça (este que, assim como Gatti, era íntimo da FINDES, sua presença era
constante nas reuniões dos conselheiros); Uchôa de Mendonça, bem como Alvino
Gatti, redigiu por um tempo as atas da reunião de representantes da referida
entidade.

Desse modo, cabe trazer à tona novamente o pensamento de Cardoso


(1973), uma vez que sua análise buscou analisar o papel do Estado no processo de
industrialização, principalmente durante do regime burocrático-autoritário, onde o
Estado assumia o papel planejador desenvolvimentista.

É nesse contexto que grupos, como a FINDES, alijados de governos


populistas como o de Lacerda de Aguiar, ganharam força a partir de 1964:

76
A Reforma Administrativa empreendida pelo Governo de Dias Lopes alterou boa parte da estrutura
administrativa do Espírito Santo, tal reforma será tratada no próximo tópico.
77
Foi Vice-Presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Espírito Santo. Também foi Prefeito
de São Matheus e Deputado Estadual.
78
Formação em técnico de contabilidade aprovado no concurso para auditor da Receita Federal.
79
Diretor Técnico da Confederação Nacional da Agricultura.
80
Também foi deputado estadual entre 1962 e 1966.
81
Continuou como Diretor do DER.
82
A CODES tinha status de Secretaria nesse período.
83
Também acumulou a função de Superintendente da Polícia Civil à época.

112
Entretanto, também ganharam influência os setores das Forças Armadas e
da tecnocracia que - por serem anti-populistas – estavam excluídos do
sistema anterior, mas que em função de suas afinidades ideológicas e
programáticas com o novo eixo de ordenação política e econômica
constituíram-se em peça importante do regime atual: assumiram tanto
funções repressivas no plano social, como modernizadoras, no plano
administrativo (CARDOSO, 1978, p. 54-55).

A partir de 1964, ocorreu uma ruptura com o populismo, as decisões


passaram a ser tomadas pelo exército – que à frente do governo federal tomavam as
decisões para o país. Os anéis burocráticos se tornam mais sofisticados, uma vez
que “as relações políticas centralizam-se ainda mais no interior do Estado e na figura
dos funcionários públicos tecnocratas” (MATTOS, 2010, p. 45).

A participação da FINDES foi ativa na composição nos conselhos e


autarquias. No entanto, convém ressaltar que esses órgãos e conselhos criados pelo
governo Dias Lopes se tornaram um espaço de articulação política no referido
período, pois a federação passou a “[...] participar de todos os Conselhos que
diretamente estavam vinculados aos seus objetivos [...]. Essa participação se dava
por iniciativa do próprio Executivo ou por articulações da Federação” (SILVA, 1993,
p. 211).

Dessa forma, a FINDES toma assento em vários conselhos, órgãos e


autarquias que possuíam alguma ligação com os interesses dessa instituição.

Durante o governo Dias Lopes, a Federação participou do Conselho de


Investimentos do Fundo de Fomento à Pesca e do Conselho Rodoviário
Estadual. Integrou, também, o Conselho Deliberativo da Superintendência
de Projetos de Polarização Industrial (SUPPIN), o Conselho de
Investimentos da Companhia de Desenvolvimento Econômico do Espírito
Santo (CODES), do Conselho Estadual de Recursos Fiscais da Secretaria
da Fazenda e do plenário do Conselho de Desenvolvimento Econômico
(CODEC). Presente em tantos órgãos e colegiados (dos 28 conselhos
existentes na administração pública estadual, a FINDES estava
representada diretamente em dez e indiretamente em sete), a Federação
mantinha uma posição privilegiada que possibilitava, ainda, ter acesso a
muitas informações (GURGEL, 1998, p. 49).

Silva (1993) demonstrou o quantitativo da representação da FINDES nos


órgãos colegiados da administração pública direta a indireta, conforme tabela 13.

113
Tabela 13 – Representação da FINDES nos órgãos colegiado.
Órgão FINDES TOTAL PERCENTUAL %
COPESA 1 5 20 %
DER 1 10 10 %
SUPPIN 1 5 20 %
CODES 1 7 12 %
MOCCA 1 17 33 %
APV 1 10 10 %
PREMEM 1 5 20%
CSS 12 67 25%
Fonte: Elaboração própria a partir de dados de SILVA (1993).

A tabela acima demonstra como a FINDES esteve representada em cada


um dos órgãos recém-criados pelo governo. No entanto, não cabe nesse trabalho
analisar a atuação da FINDES dentro de cada um dos órgãos, nem mesmo ponderar
quais foram os atores empresariais envolvidos nos órgãos de governo.

O objetivo ao discorrer sobre a reforma administrativa foi demonstrar que,


através da alteração do arcabouço administrativo capixaba, os quadros da FINDES
foram alocados em vários órgãos recém-criados pelo poder público, e, que tendo
representantes em cada um desses órgãos a federação ficava à par de todas as
decisões tomadas pelo governo.

A pressão exercida pela instituição sobre o Poder Executivo capixaba


visava alcançar o desenvolvimento via industrialização. Dessa forma, a FINDES
passa a requerer um tripé que daria sustentação ao desenvolvimento industrial do
Espírito Santo: a criação de um Banco de Desenvolvimento, a implantação de um
sistema de Incentivos Fiscais e a criação de um Centro Industrial (SILVA, 1993).

O próximo tópico analisará as atas da FINDES, redigidas durante a


gestão Dias Lopes (março de 1967 a fevereiro de 1971), procurando as ligações –
através de fontes primárias e nunca antes pesquisadas –, entre o governo e a
federação.

3.4. As atas da FINDES (1967/1968)

Na pesquisa realizada na biblioteca da FINDES, tivemos acesso ao livro


número 01, que foi aberto em 12 de fevereiro de 1958. Esse livro serviria para

114
lavratura das atas das reuniões do Conselho de Representantes da federação. São
cento e cinquenta páginas que compreendem o registro de reuniões que ocorreram
entre 1958 e 1972.

Analisaremos as reuniões ocorridas a partir do ano de 1967 – ano que Dias


Lopes assume o governo. As reuniões registradas em 1967 foram realizadas nas
seguintes datas: 23/02, 28/03, 27/06, 25/08, 20/12.

Vale ressaltar que o conteúdo das atas é bem diversificado, variando de


indicação de representantes aos pagamentos de abono aos conselheiros. Porém,
buscamos nas atas apenas as comprovações da relação entre a instituição e o
governo de Dias Lopes.

Nada de importante entre governo e FINDES foi encontrado nas três


primeiras reuniões. No entanto, a partir da reunião de 25 de agosto, começamos a
detectar a estreita relação entre a federação e o Executivo capixaba.

A primeira pauta da reunião apresentava o seguinte assunto: “1º)


Nomeação de Representante da Federação junto ao Conselho Estadual de
Mobilização Cívica Contra o Analfabetismo, presidido pelo Governador do Estado”84.

Ora, a Lei Delegada nº 20, dispõe sobre a Reforma da Educação do


Espírito Santo e criou a Mobilização Cívica Contra o Analfabetismo85 (MOCCA). Nos
questionamos o motivo pelo qual a FINDES deveria ter um representante dentro de
um órgão que executaria um programa de escolarização intensiva?

Na tabela acima, havíamos chamado a atenção para a participação da


federação no MOCCA, porém, conseguimos através da ata, descobrir quando e
como foi a indicação da instituição junto ao governo do Estado. Um dos conselheiros
achou que

[...] a Federação deveria indicar um industrial que fôsse professor, para


representar a Federação junto ao MOCCA. Os senhores Conselheiros

84
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 31.
85
Sobre as atribuições do MOCCA: “Art. 9º - A MOCCA, órgão em regime especial de administração
(art. 5º – 2.296, de 17/07/67), dirigida por um coordenador estadual, tem por finalidade: executar um
programa especial de escolarização intensiva, de alfabetização de adolescentes e adultos, de
construção e equipamento de prédios escolares e de aperfeiçoamento das técnicas de educação
primária. Parágrafo único - Para a execução de suas atribuições, a MOCCA organizará serviços
especializados de contabilidade, de estudos e levantamentos, de aperfeiçoamentos das técnicas de
educação de alfabetização de adolescentes e adultos e educação de base, de reajustamento e
ampliação da rede escolar. Disponível em: http://www.conslegis.es.gov.br/. Acesso 28/05/2016.

115
lembraram vários nomes de industriais do Estado, sendo por fim escolhido o
nome do industrial Antônio de Oliveira Santos, que foi aprovado por
86
unanimidade .

Antes de ser professor, o referido conselheiro era um industrial, ou seja,


qualquer ação do governo do Estado no MOCCA, que entrasse em conflito ou em
divergência com os industriais do Estado, rapidamente seria comunicado através de
seu representante. Provavelmente, a construção de novas unidades escolares – já
que o ensino primário no Espírito Santo era precário87 –, bem como, os
investimentos que o governo faria na educação, passavam pela MOCCA, que
através de Antônio de Oliveira, automaticamente seriam comunicados à FINDES.

Nessa mesma reunião, o conselheiro Arnaldo Magalhães Filho


“[...] teceu diversos comentários sobre o problema do imposto de circulação de
mercadorias88, que no momento agita o comércio, achando que o telegrama,
passado pelo Presidente da Federação das Indústrias ao governador, foi
oportuno89”. Nesse trecho da reunião, um dos conselheiros elogiou a iniciativa de
Américo Buaiz em ter enviado um telegrama ao governador para falar sobre a
questão do Imposto de Circulação de Mercadorias (ICM).

Tentamos achar o referido telegrama, sem sucesso. Porém, pesquisando


as Leis Ordinárias do ano de 1967, encontramos uma que falava especificamente
sobre a questão do ICM - Lei Ordinária 02261/1967 de 31 de dezembro. Essa Lei
nos chama a atenção pelo seguinte artigo

“Art. 11 - Com base nos preços ou valores vigentes no mercado interno do


Estado, a Secretaria da Fazenda baixará semestralmente, uma pauta de
valores para mercadorias com circulação no território estadual, cujos preços
serão considerados mínimos para efeito de cálculo do imposto. Parágrafo
único - A pauta será elaborada por uma comissão composta de um
representante de cada uma das seguintes entidades: Federação da

86
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 31.
87
Para maiores detalhes sobre o assunto ver: CAMPOS, Dulcineia. ALFABETIZAÇÃO DE
CRIANÇAS NO ESPÍRITO SANTO EM TEMPOS DE DITADURA MILITAR. Tese (Doutorado em
Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação. Universidade Federal do Espírito Santo.
2013.
88
Após a reforma tributária adotada pelo Governo Militar em 1966, o Espírito Santo, passou a sofrer
perdas com a arrecadação do ICM, pois os estados produtores angariavam mais recursos que os
estados consumidores, por isso o ano de 1967 foi de grandes perdas para o Espírito Santo. A queda
na arrecadação do estado está vinculada a produção de café, que a partir da década de 1960 entra
em crise e tem sua produção comprometida. No entanto, cabia aos governadores a arrecadação do
ICM.
89
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – Livro 1 – Pg. 31.

116
Indústria, Federação do Comércio, Federação da Agricultura, Secretaria da
90
Fazenda e Secretaria da Agricultura, Terras e Colonização .

É compreensível que Américo Buaiz (autor do telegrama) trabalhasse


com algum pedido em favor dos industriais – talvez uma regulação, ou mesmo um
incentivo aos industriais. Mesmo não sabendo o conteúdo do referido telegrama,
podemos aceitar essa hipótese.

Nesse caso, destacamos a resposta do governo em atender às demandas


dos industriais e das demais classes empresariais do Espírito Santo. Não apenas a
FINDES, mas os agricultores e comerciantes participariam das reuniões que
definiriam quais mercadorias iriam ter reduzido o valor do seu ICM. Esse exemplo
evidencia como a pressão exercida pela federação e seus industriais interferiam
diretamente na formulação das leis pelo Poder Executivo.

Analisando as cinco reuniões ocorridas durante o ano de 1967, foram


esses dois assuntos vinculados ao governo do Estado.

O ano de 1968 foi mais movimentado para a FINDES, não apenas no que
diz respeito à participação da entidade no governo do Estado, mas também, por que
foi o ano em que a Federação pela primeira vez mudou seu presidente.

Américo Buaiz presidiu a FINDES desde sua criação, em 1958, até 13 de


agosto de 1968, quando Jones dos Santos Neves Filho91 assume a presidência. No
referido ano, ocorreram quatorze reuniões, respectivamente em: 16/01, 19/03, 15/05,
28/06, 01/08, 12/08, 13/08, 14/08, 12/09, 19/09, 31/10, 14/11, 28/11 e 27/12.

É importante ressaltar que o ano de 1968 foi marcado por dois momentos
importantes, no que diz respeito à federação: primeiro, a realização do Simpósio
sobre os Problemas do Espírito Santo; segundo, a mudança de presidente na
Federação das Indústrias.

Nesse sentido, é necessário analisar o que ocorria em nível federal,


paralelamente ao governo Dias Lopes.

Em 1967, o Marechal Arthur da Costa e Silva assume a Presidência da


República. Para conduzir a economia Antônio Delfim Neto é nomeado Ministro da

90
Disponível em: http://www.conslegis.es.gov.br/. Acesso em 28 de maio de 2016.
91
Jones dos Santos Neves Filho assume a FINDES com uma postura arrojada e inovadora. Dentre
suas principais metas como Presidente da Federação, podemos destacar a filiação de novos
sindicatos, aquisição de uma sede própria e a criação de um centro industrial.

117
Fazenda e Hélio Beltrão como Ministro do Planejamento. Tal período é marcado
pela retomada de crescimento92, em comparação ao governo de Castelo Branco
(MACARINI, 2006).

No nível estadual, era necessário tomar medidas que alavancassem o


desenvolvimento do Espírito Santo.

O ano de 1967 já estava no fim, Dias Lopes já havia conseguido elaborar


e colocar em prática a sua reforma administrativa, e agora restava “[...] fazer ecoar
nacionalmente os problemas do Espírito Santo para que o Estado pudesse criar
peso político e sair da condição de abandono” (VASCONCELLOS, 2005, p. 201).
Era necessário evidenciar ao governo federal a realidade do Espírito Santo, suas
reais necessidades, mas principalmente, como era necessário um incentivo fiscal
para alavancar a industrialização e alcançar o desenvolvimento esperado.

Ainda em 1964, a FINDES pleiteava um incentivo fiscal através da criação


da Comissão de Desenvolvimento Econômico do Médio Leste93 (COMLESTE). O
projeto propunha a criação de um incentivo a exemplo da SUDENE e da SUDAM.

O documento foi entregue por Américo Buaiz ao então Ministro do


Planejamento Roberto Campos em 1964, quando este veio ao Estado participar de
uma reunião articulada pela federação. Segundo Américo Buaiz, o ministro colocou
o documento no braço, disse que não era viável e negou na hora a implantação da
COMLESTE (BUAIZ, 1988).

Com outro panorama político e econômico no Espírito Santo, o governo


do Estado promove, em janeiro de 1968, o Simpósio sobre os Problemas do Espírito
Santo. Tal evento foi patrocinado pelo Clube de Engenharia do Rio que mantinha
estreitas relações com Alvino Gatti e Arthur Gerhardt.

Gatti foi de extrema importância para o Simpósio, tendo assumido o papel


de coordenador geral, cuidando das conferências e da participação das classes
produtoras, de autoridades nacionais e de técnicos (VASCONCELLOS, 2010). A

92
Não é nosso objetivo discorrer sobre a política implantada por Delfim Neto, basta compreender a
direção que o Governo Federal havia tomado à época.
93
A COMLESTE tinha uma abrangência geográfica que cobriria todo território do Espírito Santo, norte
do Estado do Rio de Janeiro e leste mineiro. As reinvindicações contidas na COMLESTE consistiam
em: 1% da renda tributária, da União; 0,5% da renda tributária da União para a constituição do Fundo
de Desenvolvimento do Médio Leste – FIDEMLESTE; dotação orçamentária de 800 milhões de
cruzeiros e dotação orçamentária para cobrir riscos de câmbio. Além desses incentivos o projeto
também requeria algumas isenções de impostos (SILVA, 1993, p. 153-154).

118
organização do Simpósio foi excelente e o governo alcançava seu objetivo de
chamar a atenção do Presidente para os problemas do Estado, pois além do
Presidente Costa e Silva - que permaneceu dois dos três dias do Simpósio no
Espírito Santo - vieram também seus dois principais Ministros, Delfim Neto e Hélio
Beltrão.

Nos dois dias em que Costa e Silva esteve no Espírito Santo, Dias Lopes
entregou ao presidente um “[...] memorial em que relatava a realidade do Espírito
Santo e reivindicava, dentre outros assuntos, a concessão de incentivos fiscais
federais para o Estado” (SILVA, 1993, p. 155-156). O presidente prometeu criar
grupos de trabalho para encontrar uma solução viável para o Espírito Santo.

Na ata da reunião de 19 de março de 1968, um dos conselheiros sugeriu


que a FINDES defendesse na próxima reunião da Confederação Nacional das
Indústrias (CNI) a

“[...] implantação da COMLESTE, cujo projeto foi entregue ao ex-Ministro


Roberto Campos [...] projeto êsse que o Governo do Estado deu a devida
atenção, mas que é de alto interesse da classe empresarial do Estado, face
aos incentivos que seriam concedidos a exemplo da Sudene e da
94
SUDAM .

Percebe-se, através desse trecho da ata, que a ação política da


federação possuía total respaldo do governo do Estado, e que a entidade não media
esforços em ter seus interesses atendidos, pois mesmo depois de quatro anos, a
instituição ainda pleiteava junto ao governo federal – em parceira com o Poder
Executivo –, incentivo fiscal para o Espírito Santo.

Ainda nessa mesma reunião, o conselheiro Carlos Fernando Monteiro


Lindemberg Filho, sugere que a Federação

“[...] além de defender a COMLESTE, junto a CNI, deve mandar um


95
representante junto ao Coordenador do Grupo de Trabalho criado pelo Sr.
Presidente da República [...] para apresentar seu ponto de vista, e também
defender junto aos dois organismos, a diminuição das exigências
96
constantes do Decreto-Lei 157 [...]. Resolveu-se, então, criar uma
comissão composta dos Senhores Carlos Fernando Monteiro Lindemberg
Filho, Jones dos Santos Neves Filho, Arthur Carlos Gerhardt Santos[...],

94
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 36-37.
95
O Presidente Costa e Silva prometeu, após o encerramento do Simpósio, criar um grupo de
trabalho para analisar a situação capixaba (SILVA, 1993).
96
Decreto de 10 de fevereiro de 1967, concede estímulos fiscais à capitalização das empresas;
reforça os incentivos à compra de ações; facilita o pagamento de débitos fiscais.

119
para preparar um memorial a ser apresentado na reunião da CNI, com
97
cópias para os diversos órgãos interessados .

Nesse episódio, percebe-se a proximidade da FINDES com o governo


Dias Lopes, através da presença de Arthur Gerhardt na reunião da Federação. Além
disso, ele participaria de uma comissão formada por este órgão para defender a
ideia de um incentivo fiscal para o Estado junto à reunião da CNI.

Gerahrdt, assim como Gatti, transitava pelos dois pólos: governo e


federação, atuando como secretário no governo e como conselheiro na Federação.

O saldo do Simpósio foi muito bom para o Estado. Nas palavras do então
governador, o ano de 1968 foi decisivo para o desenvolvimento do Espírito Santo,
após a realização do Simpósio, o governo federal mudou seu foco para o Espírito
Santo, tendo Hélio Beltrão, se tornado o “padrinho” do Estado, pois foi através do
então Ministro, que foi viabilizado o Decreto-Lei 88098, que permitia usar recursos do
Imposto de Renda, fortalecia o BANDES e autorizava a utilização de recursos do
Fundo de Recuperação do Espírito Santo - FUNRES (LOPES FILHO, 1968).

Prosseguindo com a análise das atas, dois fatos na ata de 15 de maio de


1968 nos chamaram a atenção. Era discutida a elaboração de um convênio entre a
FINDES, o SESI e o SENAI para a concessão de bolsas de estudos para industriais.
Contudo, o Presidente da Federação, Américo Buaiz, ao abrir os trabalhos “[...]
convidou para fazer parte da mesa o Secretário de Estado, Dr. Alvino Gatti99”.

Ora, mais uma passagem que registra a presença de dois secretários de


governo junto à Federação. Na mesma reunião, ao encerrar os trabalhos, o

97
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 36-37.
98
Tal medida legal estabelecia que o contribuinte do imposto de renda, física ou jurídica, domiciliado
no Espírito Santo, poderia aplicar deduções do imposto relativo aos Decretos-lei 221 (pesca), 55
(turismo) e 157 (compra de ações) em empreendimentos agrícolas e industriais. O mesmo Decreto
criou o Fundo de Recuperação Econômica do Espírito Santo – FUNRES – constituído de orçamentos
oriundos do estado, União e de outras fontes. O Grupo Executivo de Recuperação Econômica do
Espírito Santo – Geres – foi criado para administrar os recursos e as políticas fiscais do FUNRES. Ao
Decreto, associou-se a Lei n.24 de 1969, que permitia ao contribuinte deduzir 5% do ICM. Essa
massa de recursos propiciou ao Geres, entre 1970 e 1977, a aprovação de 123 projetos,
concentrados, sobretudo, na Indústria de transformação.
99
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 38.

120
Presidente continuou a reunião “[...] com o sindicato da Construção Civil, juntamente
com o Dr. Arthur Carlos Gerhardt Santos, Presidente da CODES”100.

O mais interessante, além da presença dos dois, foi a continuação da


reunião sem o registro em ata, ou seja, Gerhardt continuou a reunião com o
sindicado da construção civil sem registrar nada em ata. Achamos esse
acontecimento digno de nota, pois o que poderia ser tratado numa reunião entre um
sindicato patronal e um secretário de governo que não poderia ser registrado? Fica,
além da pergunta, a certeza de que, interesses empresariais eram tratados
diretamente com secretários de governo em reuniões fechadas.

Na reunião de 31 de outubro de 1968, o terceiro assunto da pauta da


reunião era a Reforma do Código Tributário do Estado, e o sétimo assunto da pauta
era a Representação da FINDES à Junta de Recursos Fiscais do Estado. Vejamos o
que o Conselho decidiu sobre cada ponto:

“[...] sôbre o novo Código Tributário, esclareceu o Sr. Presidente já ter sido
composta uma comissão integrada pelos senhores Alvino Gatti, Orestes
Sonegheth e Assessores Jurídicos da FINDES e da Federação do Comércio
que se encarregará de um estudo minucioso do problema. Pediu a palavra o
conselheiro Ennio Edmyr Modenesi Pereira que sugeriu que, no estudo a
ser feito pela mencionada comissão, fôsse inserido um artigo,
101
responsabilizando o Fiscal do Estado pela aplicação errônea da Lei ”.

Nesse caso específico, não é possível saber qual papel Gatti assumiria na
referida comissão. Estaria nessa comissão como um representante do governo,
intermediando as negociações e alterações no código tributário capixaba, ou como
assessor da FINDES, para defender os interesses da entidade. Vale lembrar que,
até então, os interesses da Federação e do Estado eram complementares.

Também se faz necessário ressaltar a influência da FINDES em compor,


inclusive, artigos específicos para as Leis Estaduais. Esse fato fica perceptível a
partir da fala do Conselheiro Ennio Modenesi, pois o mesmo sugere a inserção de
um artigo em que colocava a responsabilidade pela aplicação errada da Lei na
atuação dos fiscais estaduais.

Segundo Almond & Powell (1966), as decisões políticas envolvem


vantagens e desvantagens para vários indivíduos. Nesse processo, é preciso
100
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 38.
101
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – Livro 1 – Pg. 47-48.

121
compreender o momento que o Brasil vivia em relação à vida política, pois a FINDES
articulava seus interesses diretamente com o Executivo. Isso se torna uma realidade
mais evidente a partir dos governos militares, pois o sistema político era autoritário, o
chefe do Poder Executivo era eleito de forma indireta e o Poder Legislativo vai se
tornando cada vez mais frágil, sem poder de decisão.

A instituição, além de ter financiado o Plano de Governo de Dias Lopes,


compunha secretarias, tinha assentos em conselhos e autarquias e dispunha de um
livre trânsito no Poder Executivo capixaba. Foi o grupo mais beneficiado durante
este governo, tendo seus interesses atendidos. Segundo Oliveira (2013), a
aproximação de Dias Lopes com a FINDES foi, inclusive, fator desagregador entre
componentes da Arena Capixaba e Dias Lopes.

Prosseguindo a análise, atentamos ao item sete da pauta:

Em debate, o assunto referente à indicação pela FINDES, de representante


à Junta de Recursos Fiscais, concluíram os senhores Conselheiros, pela
indicação ao Senhor Governador do Estado, dos nomes dos Doutores
Armando, para membro efetivo e Guilherme Santos para membro suplente.
[...] Em virtude de ter que afastar-se momentaneamente o Senhor
102
Presidente, para atender ao telefonema da Governadoria do Estado .(grifo
nosso)

A governadoria do Estado, sabendo da reunião de representantes,


telefona para a FINDES para conversar com o então presidente da entidade Jones
dos Santos Neves Filho. Possivelmente, a ligação foi de um dos secretários que
ligados à federação (Gatti, Gerhardt ou Uchôa de Mendonça), ou provavelmente fora
do próprio Governador. Contudo a ata não deixa nenhuma pista do assunto que foi
tratado, ou quem foi o autor da ligação, porém essa passagem, ainda que pequena,
não pode ser desprezada, pois corrobora a íntima relação que havia entre as partes.

Durante o ano de 1969 foram registradas onze reuniões do Conselho de


Representantes da FINDES, respectivamente em: 03/02, 03/03, 14/03, 25/03, 30/04,
12/ 05, 23/ 06, 11/08, 29/ 09, 10/11 e 22/12.

Na primeira reunião a federação tem que decidir quem seriam seus


representantes para a CODES e para a Junta Comercial do Espírito Santo103

102
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – Livro 1 – Pg. 48.
103
A Junta Comercial do Estado do Espírito Santo (JUCEES) foi criada pela Lei Estadual número
537, de 10 de novembro de 1908, durante o Governo de Jerônimo Monteiro. Durante 59 anos
pertenceu a Administração Direta, quando no Governo de Christiano Dias Lopes Filho (1967-1961),

122
(JUCEES), além da leitura de um ofício enviado por Dias Lopes, tratando sobre a
criação da Coordenação do Planejamento Industrial do Espírito Santo104 (COPLAN –
ES):

“Em seguida, foi discutido o item segundo, que trata da indicação da lista
tríplice, do Representante da FINDES junto à CODES. Debatido o item, foi
mantida a indicação do nome do doutor José Maria Miguel Feu Rosa [...].
[...] referente a indicação [...], de representante da Federação à Junta
105
Comercial, foi indicado o nome do Sr. Oswaldo Vieira Marques” .

Essa primeira reunião de 1969 demonstrou uma mudança no conteúdo


das atas da FINDES a partir de então. Percebemos, ao analisar as reuniões
seguintes, que o interesse maior da instituição estava voltado para a implantação do
Centro Industrial – esse que deveria ser desenvolvido a partir da ação
governamental, através de um órgão criado pelo governo –, esse órgão, a priori foi a
COPLAN.

Dessa forma, ao ler as atas de 1969, percebemos que assuntos


recorrentes como os que foram citados nas atas de 1967 e 1968, desapareceram
em 1969, sendo frisado com muita contundência a criação e desenvolvimento da
COPLAN.

Isso confirmava as palavras do novo presidente da FINDES, Jones dos


Santos Neves, que cria a Revista Indústria Capixaba – periódico mensal lançado
pela federação para abordar assuntos de interesse da indústria do Espírito Santo –
e, logo no primeiro exemplar, aborda vinte e dois pontos de sua gestão. Dentre
esses, três chamaram nossa atenção, pois também demonstravam a influência da
FINDES junto ao governo Estadual, além de abordar a questão da criação do
Complexo Industrial:

05 - Articulação com as entidades de planejamento estadual para, através


de convênios ou de acordos, objetivar, mais especificamente, o rápido
desenvolvimento do nosso complexo industrial. 06 – Contato permanente
com os Governos Estadual e Federal no sentido de se obter a criação de
Organismo Federal de Desenvolvimento Regional, do qual faça parte Setor
específico de atendimento em todos os níveis ao nosso desenvolvimento
industrial. 07 – Elaboração imediata e urgente através dos órgãos existentes
de desenvolvimento estadual do Plano Diretor de Implantação de nosso
Centro Industrial fixando a sua localização delimitando a sua área
ocupando-a e dando-lhe condições tecno-econômicas e tecno-estruturais de

transformou-se em autarquia estadual. Disponível em: https://www.jucees.es.gov.br/jucees/. Acesso


em 02/06/2016.
104
Trataremos da COPLAN-ES mais a frente.
105
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – Livro 1 – Pg. 59.

123
desenvolvimento. 12 – Maior representatividade da Federação nas
Diretorias e Conselhos relacionados com o setor de Planejamento e
Desenvolvimento Industriais Regionais incluindo-se a Secretaria de Estado
específica da Indústria. 16 – Elaboração de documentos amplo e
minunciosamente estudado, que deverá ser encaminhando ao Governo do
Estado, situando a posição e as reivindicações da indústria em face a todos
os problemas de projeção ou conjunturais. 21- Articulação mais direta da
Federação com os órgãos Diretores da Companhia Vale do Rio Doce,
objetivando colaborar e sob certos aspectos até, patrocinar o
desenvolvimento do parque industrial siderúrgico e metalúrgico que
fatalmente, se desenvolverá em decorrência da implantação das usinas de
106
transformação já em andamento na Ponta de Tuabarão ”.

Nosso primeiro objetivo ao analisar as atas era comprovar, através de


fontes primárias, a estreita relação existente entre a Federação das Indústrias e
Governo do Estado. Desenvolvemos os trechos analisados no tópico e podemos
concluir que esse objetivo foi alcançado.

Partiremos para o próximo tópico, com o objetivo de analisar a atuação da


FINDES na implantação do CIVIT, corroborando com a fala do ex-presidente da
federação, Jones dos Santos Neves. Também verificaremos de que forma esse
assunto foi desenvolvido pela FINDES em suas atas e em sua revista mensal, além
de comprovar a pressão e o lobby realizado pela Federação para a realização de
seu mais audacioso projeto: O Centro Industrial de Vitória.

106
Revista Indústria Capixaba. A palavra do Presidente. Ano I, Vol. I, 1968.

124
4 A ATUAÇÃO DA FINDES NA IMPLANTAÇÃO DO CIVIT

4.1 O Centro Industrial de Vitória: A pressão da FINDES sobre o Governo do


Estado

Segundo Silva (1993), a FINDES requereu do então governador


Christiano Dias Lopes, um tripé indispensável para o desenvolvimento do Espírito
Santo através da industrialização: a formação de um sistema de incentivos fiscais; a
criação de um banco de desenvolvimento; e a implantação de um complexo
industrial.

Com a criação da DL 880, o desenvolvimento e consolidação do FUNDAP


em 1970, a primeira questão estaria resolvida. A criação do Banco de
Desenvolvimento foi suprida pela atuação da CODES, que meses depois se
transformaria no Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (BANDES).

Analisar o desenvolvimento do FUNDAP e do BANDES foge ao escopo


desse trabalho, uma vez que o mesmo se direciona para a atuação da FINDES
enquanto grupo de interesse e sua atuação junto ao Executivo.

Dessa forma, o tópico analisará as atas da federação de 1969 e 1970, a


revista Indústria Capixaba e o jornal A Gazeta. Buscaremos nessas fontes as
medidas tomadas pela FINDES para a criação do CIVIT.

A atuação da FINDES, visando a implantação do Complexo Industrial,


registrado em ata, começa no início de 1969. A reunião de 03 de fevereiro de 1969,
possui seis assuntos em sua pauta de reunião, sendo o 5º assunto um ofício de Dias
Lopes sobre a criação da COPLAN. Eis o registro em ata:

Continuando, deu a Presidência conhecimento aos Conselheiros, do ofício


do Senhor Governador do Estado, comunicando a criação, por decreto
Governamental, da COPLAN-ES, inspirado pela Presidência da FINDES,
que terá no dito órgão, o seu representante que será um técnico,
107
engenheiro ou economista .

107
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 59.

125
Para Silva (1993), a criação da COPLAN-ES é fruto de um entendimento
entre a CODES, CVRD e FINDES. No entanto, podemos questionar a ideia de Silva
(1993), a partir da citação dessa ata, pois segundo a mesma, o projeto da COPLAN
foi idealizado pela FINDES, tendo Dias Lopes tomado a medida de criar tal órgão a
partir da pressão da Federação. A entrevista de Manfred Walter Düenk108, também é
esclarecedora nesse sentido:

[...] Em 1969 a pedido do Dr. Jones Santos Neves Filho (FINDES), foi feito
um pedido ao Governador Christiano Dias Lopes Filho, para criar uma
comissão com o objetivo de estudar, naquela época, a viabilidade da
implantação de uma área industrial [...]. Então, o Christiano Dias Lopes
criou, por meio da legislação, uma comissão que se denominou COPLAN-
ES. (DÜENK Apud SUPPIN, 2006, p. 26).

A ata de 14 de março de 1969 é esclarecedora em dois aspectos: 1º)


Deixa claro que havia reuniões sigilosas na FINDES, ou seja, não havia participação
de todos os representantes tampouco havia o registro em atas; 2º) A pressa da
FINDES na instalação da COPLAN e sua aproximação da CVRD, como citado por
Jones dos Santos Neves Filho no item 19 de suas 22 propostas como Presidente da
federação.

Manda o Senhor Presidente que seja registrada em ata a presença do


Senhor Guttman Uchôa de Mendonça, encarregado de divulgação e que o
mesmo estaria presente às reuniões para acompanhar os trabalhos e
divulga-los, salvo nas reuniões sob sigilo ou que devessem os assuntos ser
de conhecimento restrito dos senhores delegados. [...] Sobre a próxima
instalação da COPLAN, disse o Presidente que, por sua determinação havia
o Secretário Poder Executivo alugado uma sala no Rural bank e estava
providenciando a sua instalação e que êle Presidente tinha marcado uma
audiência na Guanabara com o atual Presidente da Companhia Vale do Rio
Doce, o Engenheiro Raymundo Pereira Mascarenhas, para a designação do
Representante daquela Companhia junto ao COPLAN e que a Federação
109
indicaria o nome de um técnico para a sua representação . (grifo nosso)

A COPLAN contaria com o financiamento e atuação em três frentes:


CODES, CVRD e FINDES. As “[...] despesas financeiras para gerir e manter a
COPLAN-ES foram rateadas em três partes: o Governo do Espírito Santo ficou
responsável, por meio da CODES, em custear 45%, a CVRD por outros 45%, e a
FINDES, responsável por 10% do custeio” (SUPPIN, 2006, p. 26).

108
Manfred Walter Düenk foi Superintendente Geral da SUPPIN no período de 12/02/1971 a
05/05/1983. Entrevista concedida à SUPPIN. IN: livro SUPPIN 35 anos Apoio ao Desenvolvimento do
Espirito Santo
109
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 63.

126
A partir dessa informação, compreende-se a pressa da FINDES em alugar
uma sala e iniciar os trabalhos da COPLAN-ES. Na área da atuação técnica a
COPLAN-ES contava com Arthur Gherhardt (CODES), Marcus Viana (CVRD) e
Jones dos Santos Neves Filho (FINDES).

A ata de 26 de março corrobora alguns dados e demonstra o empenho de


Jones dos Santos Neves Filho para a instalação da COPLAN-ES.

[...] Ainda pelo Senhor Presidente foi comunicado aos Conselheiros, a


instalação pelo Governo do Estado, CODES e FINDES, no próximo dia 28,
às 17 horas, na sala 801, do 18º andar do Edifício Rural Bank, dos escritório
da Coordenação do Planejamento Industrial do Espírito Santo (COPLAN-
ES), criada pelo decreto nº 3008, dotado de 22 de janeiro do corrente ano,
pelo Governo do Estado, cujos representantes seriam indicados pela
CODES, Companhia Vale do Rio Doce e Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo. Disse mais que em contato com o atual
presidente da Companhia Vale do Rio Doce, o engenheiro Raymundo
Pereira Mascarenhas, foi por êle informado de que até o dia 28, seria
110
indicado o representante da Vale .

A ata do dia 30 de abril apenas corrobora a decisão da Diretoria Plena da


FINDES, que votou pela indicação de Jones dos Santos Neves Filho para
representar a entidade junto à COPLAN-ES111. Em maio de 1969, Jones dos Santos
Neves Filho faz a seguinte declaração sobre a implantação da COPLAN-ES:

“Para o Empresariado Capixaba de um modo geral, e para a Federação das


Indústrias em particular, um dos acontecimentos mais importantes dos
últimos anos foi, sem dúvida alguma, a criação da Coordenação do
112
Planejamento Industrial do Espírito Santo (COPLAN-ES) ”.

A COPLAN-ES estava instalada, seus representantes já haviam sido


escolhidos, faltava apenas sua atuação definitiva. Mas, afinal, quais eram as
atribuições da COPLAN-ES?

Segundo Silva (1993, p. 183), as atribuições da COPLAN-ES eram:

[...] promover e coordenar levantamentos de interesse para o planejamento


industrial do Espírito Santo; realizar e contratar pesquisas de natureza
econômica e financeira e divulgar essas pesquisas para atração de
investidores; sugerir a localização, custos e características de um ou mais
centros industriais no Estado; recomendar as medidas prioritárias para
execução em curto prazo de um Plano Diretor para a implantação de um
Centro Industrial localizado nas vizinhanças da capital do Estado – CIVIT –
com especificação de seus objetivos essenciais e da política fiscal, creditícia
e jurídica para alcança-los; participar dos trabalhos técnicos do

110
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 65.
111
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 69.
112
Revista Indústria Capixaba. A palavra do Presidente. Ano II, Vol. 6, maio,1969.

127
planejamento e implantação do CIVIT, em seus aspectos físico, social e
econômico; recomendar e promover a aquisição de áreas destinadas ao
CIVIT ou a outro Centro Industrial; orientar empresários quanto ao
funcionamento do CIVIT. (grifo nosso)

É importante salientar que, todo o regimento interno da COPLAN-ES foi


aprovado a partir de um anteprojeto elaborado por técnicos da FINDES, esta que era
a maior interessada na implantação do CIVIT. Ao analisar apenas um fragmento das
atribuições da COPLAN-ES, observamos como suas ações eram voltadas para a
implantação e funcionamento do CIVIT.

A Revista Indústria Capixaba noticiou da seguinte forma: “O Anteprojeto


do Regimento Interno aprovado pelo Conselho foi apresentado pelo Engenheiro
Jones dos Santos Neves Filho e elaborado por uma equipe de técnicos da
Federação das Indústrias”113.

A COPLAN-ES utilizaria como referência para a criação do CIVIT o Centro


Industrial de Aratu (BA).

A primeira medida para iniciar o projeto do CIVIT seria um estudo de


viabilidade técnico-econômico. Para a realização desse estudo, foi contratada a
CLAN S/A, empresa baiana que havia desenvolvido o estudo no Centro de Aratu
(SUPPIN, 2006).

Em janeiro de 1970, a FINDES noticia em sua revista:

Será no Gabinete do Sr. Governador do Estado a próxima reunião do


Conselho da Coordenação do Planejamento Industrial do Espírito Santo –
COPLAN-ES, juntamente com a Comissão de Alto Nível e técnicos da
CLAN, que realizam os estudos de viabilidade técnico econômica do Centro
Industrial (CIVIT) da Grande Vitória. Na segunda quinzena de Fevereiro em
curso, estarão concluídos os estudos, quando então a emprêsa entregará o
relatório final. Possivelmente neste oportunidade o Sr. Christiano Dias
Lopes Filho definirá quando serão iniciados os estudos visando o Plano
114
Diretor do CIVIT .

A FINDES sempre expressava através de sua revista certa urgência na


implantação do CIVIT. A reunião do Conselho de Representantes, registrada em 22
de maio de 1970, demonstrava um esforço excessivo da Federação em apressar a
implantação do Centro Industrial, corroborando com as matérias de seu periódico.

113
Revista Indústria Capixaba. COPLAN-ES já tem regimento interno. Ano II, Vol. 6, maio,1969.
114
Revista Indústria Capixaba. Governador vai presidir próxima reunião da COPLAN-ES. Ano III, Vol.
14, jan.,1970.

128
Após o estudo realizado pela CLAN S/A, o presidente da instituição,
Jones dos Santos Neves Filho, enviou um ofício ao Governador Dias Lopes. Na
respectiva ata, o presidente ordenava ao secretário que transcrevesse os ofícios em
ata (tanto o ofício da federação quanto a resposta e o despacho enviado pelo
govenador) “para que os pósteros tenham conhecimento dos esforços da FINDES,
para conseguir o seu objetivo115”.

Antes da redação do ofício, houve uma reunião entre o governo do


Estado, a Clan S/A e a COPLAN-ES para a análise do estudo de viabilidade. Essa
reunião foi noticiada da seguinte forma pela FINDES:

Após longos debates, o Governador Christiano Dias Lopes decidiu autorizar


que a COPLAN comece a estudar a contratação da elaboração do Plano
Diretor do Centro Industrial da Grande Vitória, para a institucionalização de
uma área que possa, em princípio, receber as primeiras indústrias que
desejam se instalar no Espírito Santo, isso dentro de uma primeira etapa
para a concretização da importante meta de se estabelecer no Planalto de
116
Carapina um Centro Industrial .

Na mesma edição da Revista, na sessão “Palavra do Presidente”, Jones


dos Santos Neves Filho demonstrava preocupação e expôs o ponto de vista da
Federação:
[...] defendemos a tese de solicitar ao Senhor Governador a desapropriação
(ainda que parcial) de uma determinada área destinada a receber as
primeiras indústrias e, a elaboração em primeira fase, do Plano Diretor do
Centro Industrial. Assim, propomos: a) Que seja autorizado o imediato
empreendimento da etapa seguinte, já correspondente à Plano Diretor; b)
que dentro deste estudo de Plano Diretor seja dado uma prioridade absoluta
à definição e implementação de uma determinada área, destinada à
implementação de pequenas e médias indústrias; c) que em paralelo seja
institucionalizado o Centro Industrial de Vitória, quer em regime de autarquia
quer de emprêsa, quer de Fundação [...]. Entendemos que efetivamente
tomadas essas medidas preliminares estaremos dando um passo real à
frente e já estamos nos retardando um pouco para darmos êsse passo à
117
frente .

Compreendemos ser necessária a transcrição de todo o ofício no corpo


dessa dissertação, uma vez que ele evidencia um claro instrumento de pressão da
FINDES junto ao poder público, o que corrobora a nossa ideia de que a federação
agia como grupo de interesse.

115
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 89.
116
Revista Indústria Capixaba. Christiano determina elaboração do Plano Diretor do CIVIT. Ano III,
Vol. 18, maio,1970.
117
Revista Indústria Capixaba. A palavra do Presidente. Ano III, Vol.18, maio,1970.

129
É evidente que a FINDES era parceira do Estado, mas essa relação era
fundamentada em interesse mútuo. Afinal, a instituição patrocinou o plano de
governo de Dias Lopes, deu suporte à realização do Simpósio sobre os problemas
do Espírito Santo, além possuir três de seus conselheiros diretos como secretários
de Estado. Conforme apresentado anteriormente, a entidade possuía interesse em
industrializar o Estado, desenvolvendo a indústria local, o que aumentaria o número
de sindicatos e, consequentemente, aumentaria o campo de influência e a receita da
federação.

Mesmo após a reunião ocorrida em abril e as matérias veiculadas em sua


revista, a FINDES encaminhou um ofício ao governador. O tom do ofício é forte e
denota uma pressão da entidade para um posicionamento mais firma do então
governador. Abaixo, o ofício Nº 175 data de 05 de maio de 1970:

Senhor Governador: A reunião de 28/04/1970, concernente à apreciação do


Estudo de viabilidade do Centro Industrial de Vitória (CIVIT), na nossa
interpretação, respondeu V. Exa., pela oportunidade imediata de se dar
início ao processo de sua institucionalização. Esta institucionalização se
daria, no seu ponto de vista, em primeiro tempo, com a indicação, o
dimensionamento e a implementação de sua área industrial preliminar,
dentro da área integrada do Centro destinado à implantação das principais
pequenas e médias indústrias. Face, entretanto, a dúvidas posteriores
quanto a essa decisão, levantadas dentro do Conselho da COPLAN-ES,
vemo-nos no dever, agora, de solicitar a V. Exa. que se digne retificá-la
oficialmente. Dentro do exposto, cumpre-nos solicitar-lhe, para perfeito
esclarecimento do assunto, que confirmem terem sido os seguintes os
pontos básicos de sua decisão. 1- Que o Gôverno do Estado na figura de V.
Exa., acatou a localização recomendada pelo estudo, isto é, ao norte de
Vitória, na área de influência de Tubarão; 2 – Que V. Exa. determinou
urgente demarcação de uma área prioritária para receber as primeiras
indústrias, e capaz de se integrar posteriormente, à área reservada para a
planta siderúrgica e sua expansão, ficando claro que essa área pioneira se
enquadre harmonicamente no consequente Plano Diretor do Centro
Industrial; 3 – Que, afim de que este processo de definição geográfica
preliminar se retardasse, prejudicando a fixação dos primeiros industriais
que procurem o nosso Estado atraídos pela recente conquista da DL 880,
recomendou V. Exa. que os trabalhos para a definição daquela área
prioritária fossem contratadas ainda sob a responsabilidade da COPLAN-
ES, se possível, com a mesma empresa que estudou a viabilidade técnico-
econômica do Centro. Permitimo-nos ainda sugerir, Senhor Governador
para que estas deliberações oficiais alcancem nível de mais completa
objetividade, que sem eu pronunciamento oficial V. Exa. determine ainda: a)
O prazo máximo de 90 dias da data de contratação para que a empresa
responsável demarque a área que se construirá no Núcleo Inicial destinado
a receber as primeiras indústrias, equacionando a infraestrutura básica de
energia, água, esgotos, comunicação e sistema viário; b) A realização dos
estudos preliminares para a institucionalização do Centro Industrial de
Vitória (CIVIT), a ser alcançado ainda no corrente ano, estabelecida a forma
jurídica que lhe assegure flexibilidade suficiente para disciplinar o processo
de industrialização da Grande Vitória, e contratar e implementar as fases
seguintes de seu Plano Diretor de Implantação. Na certeza de que V. Exa.
compreenderá em profundidade os propósitos da presente, e dará a ela a

130
resposta cristalina e indebatível da sábia e corajosa decisão que tomar em
favor do futuro industrial de nossa terra – que a nós nos cabe também
construir e defender – valemo-nos da oportunidade para renovar-lhe os
votos sinceros de estima e consideração. Atenciosamente Jones dos
118
Santos Neves – Presidente . (grifo nosso)

O ofício de Jones Filho surpreende pela ousadia, porém, se analisarmos a


relação entre Jones Filho e Dias Lopes, perceberemos que ela remonta aos anos
1950 quando Jones dos Santos Neves assumiu como governador e tinha ao seu
lado o jovem Christiano Dias Lopes. Suas biografias se cruzam, pois ainda jovens os
dois conviviam lado a lado, Santos Neves era considerado um pai para Dias
Lopes119.

Conforme figura abaixo, podemos afirmar que a elite política do Espírito


Santo estava intimamente ligada à elite empresarial. Santos Neves e Carlos
Lindemberg representavam a elite política da época, enquanto Américo Buaiz
representava a elite empresarial e os interesses da classe industrial.

É interessante ressaltar como os filhos das lideranças políticas


ingressaram no mundo empresarial de forma intensa. Jones dos Santos Neves
Filho, no ramo da construção civil, se torna presidente da FINDES, e Carlos
Fernando Monteiro Lindemberg Filho (Cariê), também da construção civil, torna-se
conselheiro importante da federação.

118
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 90.
119
Revista Espírito Santo Agora, Vitória, p. 20-33. Ano I, n. 19, out 1977. Entrevista de Christiano Dias
Lopes concedida a Oswaldo Oleair, Rogério Medeiros, Joaquim Neri e Vitor Martins.

131
Figura 3 – Esquematização das Elites Capixabas.

Elites
Capixabas

Elite Elite Elite


Política Política Industrial

Jones dos Carlos Américo


Santos Neves Lindemberg Buaiz

Jones Dias
"Cariê" FINDES
Filho Lopes

Governo Arthur
Alvino Gutman
FINDES do FINDES Carlos
Gatti Uchôa de
Estado Gerhardt
Mendonça

Secretaria
de Governo/
Governo CODES/ Gazeta/
Coplan- Governo/
ES
Coplan-
ES
Governo
do
Estado

FONTE: Elaboração Própria.

A partir dessa abordagem, compreende-se que o relacionamento dessa


elite ultrapassava o consenso sobre a industrialização do estado, esses atores eram
amigos de infância. Enquanto os pais conversavam na sala, as crianças brincavam
do lado de fora da casa120, esses laços eram tão fortes quanto a convicção política
dos atores envolvidos no processo de industrialização do Estado.

Dessa forma, Dias Lopes responde a Jones dos Santos Neves Filho:

120
Entrevista feita pelo autor da dissertação com Carlos Fernando Monteiro Lindemberg Filho (Cariê),
o mesmo citou a intimidade que havia entre Jones dos Santos Neves, Carlos Lindemberg e Américo
Buaiz. Em certo trecho o entrevistado diz: “Américo não saía lá de casa!”. Outro fato interessante
citado pelo entrevistado foi a indicação de Arthur Gerhardt para o DER, ainda no governo do seu pai.
Segundo Cariê, com a saída do Dr. Dido Fontes da direção o DER, ele indicou diretamente Arthur
Gerhardt para o a cargo ainda no governo do seu pai. Entrevista realizada em 09/12/2015.

132
“(Estado do Espírito Santo – OF. N. G./ 0806 – Vitória, 12 de Maio de 1970
– Do: Senhor Governador do Estado do Espírito Santo – Ao: Ilmo. Senhor
Dr. Jones dos Santos Neves Filho – Presidente da Federação das Indústrias
do Estado do Espírito Santo. Senhor Presidente: Tenho o prazer de
transmitir-lhe, por cópia, o despacho que exarei no processo nº 2.183,
constante do expediente que me dirigiu tratando de assunto relacionado
com o estudo de viabilidade do Centro Industrial de Vitória. Com protestos
de alto aprêço, Cordialmente – Christiano Dias Lopes Filho – Governador do
121
Estado)” .

O ofício do então governador para o presidente da FINDES abordava


alguns pontos sobre o estudo de viabilidade realizado pela CLAN S/A e as decisões
que seriam definidas por ele. Para um melhor entendimento, faremos a transcrição
de forma particionada:

“O primeiro parágrafo do expediente, retrata, em linhas gerais, minha


decisão na reunião de 28-4-970. E nêste despacho, reafirmo: 1 – ninguém
contestou, nenhum outro estudo existe indicando, como mais apropriada,
para o futuro Centro Industrial de Vitória, área diferente da que foi
aconselhada no trabalho da CLAN. Não tenho argumento para contestar a
solução. Antes, convenceu-me a argumentação do estudo. A área de
localização do Centro deve ser pois na região de Carapina. 2 – não se pode
negar que a firma responsável pelo estudo de viabilidade, amarrou demais a
criação do Centro à implantação da Usina Siderúrgica que, mais hoje, mais
amanhã, será implantada em Vitória e, segundo tudo indica, nas imediações
do Porto de Tubarão. Também o estudo da CLAN não desceu a análise dos
elementos que, em composição, indicam ou não a viabilidade econômica de
122
um projeto .

Ou seja, Dias Lopes não contestava a localização do Centro Industrial.


Apesar de a CLAN ter vinculado a criação do CIVIT à implantação da Siderúrgica, o
governo não afirmou sua posição sobre isso.

O então governador aponta para a viabilidade econômica do projeto, pois


a CLAN não explanou sobre a viabilidade da implantação do CIVIT.

Sendo assim, Dias Lopes colocou a questão da seguinte forma: a


implantação da Usina Siderúrgica era certa, o sistema de incentivos fiscais no
Estado iria, de qualquer forma, atrair a implantação de indústrias no Estado. Diante
da obviedade - segundo Dias Lopes - tanto da implantação de uma Usina
Siderúrgica como da vinda de indústrias para o Estado a partir dos incentivos fiscais,
restava agora ao governo decidir: “ou deixa que os novos projetos industriais

121
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 90.
122
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 91.

133
enfrentem todos os azares da localização desordenada, ou oferece aos investidores
as vantagens da localização em núcleo industrial”123.

Diante desses dois ângulos, o então governador colocou no mesmo ofício


a posição que lhe pareceu melhor:

[...] gizar um Centro Industrial, pensando na Siderurgia, mas conceber,


dentro dessa solução ideal, uma solução imediata, para a realidade criada
pelos incentivos fiscais. Dentro deste raciocínio, entendo que se deve
contratar a elaboração de um Plano Diretor de um núcleo industrial, com
projeções tais que o leve, num processo de desdobramento, ao Centro
Industrial do porte, que desejamos, mas que depende da implantação da
Siderurgia, problema para cuja solução o Centro de decisões se localiza em
124
outras áreas de competência .

Por último, Dias Lopes ainda apontava para as principais providências


que deveriam ser tomadas, essas que foram enumeradas por

[...] ordem de prioridade: 1 – dimensionamento da área global necessária


para o Centro Industrial, contando com a planta siderúrgica; 2 – descrição
da área e providências seguintes para a elaboração do decreto, declarando
de utilidade pública tôda ela e, em seguida, a desapropriação; 3 –
elaboração do plano diretor partindo do particular para o geral, isto é, um
núcleo industrial dentro da área global, com projeções de um processo de
desdobramento para se transformar no Centro Industrial ou, inversamente,
partindo do particular para o geral, isto é, um núcleo industrial dentro da
área global, com projeções de um processo de desdobramento para se
transformar no Centro Industrial ou, inversamente, partindo do geral para o
particular, um pré-estudo do plano diretor do Centro Industrial prevendo a
siderurgia e toda a malha de indústrias subsidiárias, mas enfatizando a
implantação, inicialmente, de um núcleo industrial; 4 – estruturação do
órgão que vai responsabilizar-se pela implantação do Centro Industrial; 5 –
estudo sobre as oportunidades industriais do Estado; 6 – estudo para o
remanejamento conceptual e estrutural dos órgãos que atuam nas
atividades de desenvolvimento, com vistas à fixação mais nítida das faixas
de atuação. Para debater as indicações acima e estudar as providências a
serem tomadas, pedirei nos próximos dias, uma reunião com os membros
125
da COPLAN-ES [...]” .

Após a resposta de Dias Lopes, apenas uma definição: A criação de um


plano diretor126. No entanto, é interessante ressaltar dois aspectos: em primeiro
lugar, o governador havia passado toda responsabilidade do desenvolvimento do

123
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 91.
124
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 91.
125
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 91-92.
126
O Plano Diretor é o instrumento básico da política de desenvolvimento do Município. Sua principal
finalidade é orientar a atuação do poder público e da iniciativa privada na construção dos espaços
urbano e rural na oferta dos serviços públicos essenciais, visando assegurar melhores condições de
vida para a população.

134
plano diretor para a COPLAN-ES, e, ainda que Jones Filho fosse do Conselho da
referida entidade, ela contava com um membro do governo e outro CVRD. Isso quer
dizer que, dependendo da decisão dos outros dois conselheiros, Jones Filho poderia
ser voto vencido.

Em segundo lugar, nos bastidores políticos, a ARENA movimentava-se


para escolher o seu candidato ao governo do Estado. Vale lembrar que nomes como
os de Arthur Gerhardt e Alvino Gatti estavam entre os indicados.

Isso quer dizer que todos os esforços políticos, durante os meses de


definição do futuro governador, estavam concentrados na eleição interna da Arena,
o que interromperia momentaneamente os trabalhos da COPLAN-ES em relação ao
CIVIT.

Essa situação é evidenciada quando analisamos as atas da FINDES dos


meses de junho, julho e agosto e não houve nenhuma citação sobre a COPLAN-ES,
bem como nada foi dito nessas reuniões sobre a implantação do Centro Industrial.

Da mesma forma, a Revista Indústria Capixaba também não publicou


sequer uma matéria sobre o assunto, nos meses citados. Apenas em setembro de
1970 a FINDES voltou a se manifestar sobre o assunto através de ata. É
interessante ressaltar que essa reunião, datada de 02 de setembro do referido ano,
registrou uma palestra proferida por Arthur Carlos Gerhardt Santos. Eis o registro da
ata:

[...] disse mais o Senhor Presidente, que iria inverter a ordem da Pauta dos
Trabalhos para que se ouvisse, em primeiro lugar a palestra informal que
iria fazer o engenheiro Arthur Carlos Gerhardt Santos candidato ao Govêrno
do Estado sôbre o CIVIT e que o Doutor Arthur Carlos não necessitava de
apresentações por ser êle por demais conhecido em nosso meio. O
auditório da FINDES estava inteiramente lotado de convidados para a
127
aludida palestra [...] .

Após a palestra, a federação abriu espaço para a realização de perguntas


e, após perguntas sobre a educação, um dos palestrantes fala sobre o assunto do
Centro Industrial:

[...] sobre o Centro Industrial de que tanto falam os jornais e que até agora
nada de positivo aconteceu, apenas dos esforços que tem feito o Doutor
Jones dos Santos Neves para o êxito da sua criação. O Doutor Arthur
Carlos Gerhardt Santos faz então uma explanação do assunto, contando a
história da criação da Coplan-ES pelo Governador do Estado. A seguir, com

127
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 98.

135
a palavra o Doutor Jones dos Santos Neves, Presidente da FINDES, e lê a
cópia do ofício dirigido ao Senhor Governador do Estado e a resposta do
128
Governo .

A resposta do governo foi transcrita de forma completa na Revista


Indústria Capixaba. Segue alguns fragmentos do referido ofício:

“Desejo confirmar meu acordo, em que sejam deferidas para após 30/09 as
medidas efetivas destinadas à institucionalização do CIVIT e demarcação
de sua área, porquanto se há de reconhecer que os resultados dos
entendimentos que se processam com vistas à instalação da Siderúrgica de
Vitória haverão de influir decisivamente na condução do problema [...].
Por outro lado, no caso de vencido êsse prazo, resultarem infrutíferas as
conversações sobre a implantação da Siderúrgica, entendo que devemos
encontrar uma solução para que Vitória tenha um Distrito Industrial,
concebido e institucionalizado dentro dos condicionamentos decorrentes de
nossas reais perspectivas: desenvolvimento industrial estimulado pelo
129
sistema de incentivos [...] ”.

Com a promessa do governo em iniciar o Plano Diretor, a FINDES


direciona seus esforços para a institucionalização do CIVIT. A ata de outubro de
1970 trouxe a seguinte citação sobre o assunto:

[...] Dando continuidade aos trabalhos, o Sr. Presidente colocou em


discursão o trabalho elaborado pelos órgãos técnicos da FINDES, relativo à
posição da entidade quanto à institucionalização e implantação do CIVIT, o
qual, após exame atento, foi aprovado pelo Conselho, à unanimidade,
ficando decidido, ainda, a sua apresentação ao Exmo. Sr. Governador do
Estado, no mesmo dia em audiência já marcada, à qual todo conselho
130
compareceria .

Quanto à pressão da FINDES, através da imprensa, destacamos o papel


de Gutman Uchôa de Mendonça, pois o mesmo transitava em todas as esferas
relacionadas. Além de secretário pessoal do governador do Estado, ele era
conselheiro da federação, colunista do jornal A Gazeta e secretário Poder Executivo
da COPLAN-ES.

Através desse trânsito livre nas esferas de poder – governo/federação das


indústrias/imprensa –, podemos concluir que Uchôa de Mendonça era o principal elo
entre a FINDES e a Imprensa, o que será comprovado mais à frente.

Segundo Almond & Powell (1972, p. 57), não basta apenas analisar as
estruturas dos grupos de interesse, mas é necessário também “[...] levar em conta o

128
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 98.
129
Revista Indústria Capixaba. Christiano determina elaboração do Plano Diretor do CIVIT. Ano III,
Vol. 18, maio,1970.
130
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – Livro 1 – Pg. 101.

136
grau em que os grupos têm acesso às elites políticas engajadas na tomada de
decisões apropriadas”. No entanto, para os autores, a questão dos canais de acesso
dos grupos de interesse às elites políticas que estão no bojo das decisões é uma
questão de comunicação política.

Dessa forma, os canais e meios de acesso dos grupos de interesse aos


meios políticos não têm apenas um caráter de transmissão de informação, pelo
contrário, os grupos de interesse procuram “[...] articular seus interesses junto
àquelas elites encarregadas de tomar decisões referentes a tais interesses e
buscam fazê-lo de modo que, muito provavelmente, possam ser levados a obter
resposta favorável” (ALMOND & POWELL, 1972, p. 57).

Buscando defender seus interesses, esses grupos dispõem de alguns


meios, dentre eles a demonstração de violência física – o que não se encaixa na
atuação da FINDES. Para os autores,

[...] a ligação pessoal constitui o segundo meio importante de acesso às


elites políticas. Entendemos por canais de ligação pessoal a utilização de
laços familiares, escolares, locais e sociais como instrumento. [...] Estudos
sobre a formação de opinião demonstram claramente que o contato pessoal
é um dos meios mais efetivos de moldagem de atitudes. Quando o contato
ocorre numa atmosfera de cordialidade e amizade, cresce a possibilidade
de uma resposta favorável (ALMOND & POWELL, 1972, p. 59).

Além do acesso pessoal,

[...]os meios de comunicação de massa também constituem um desses


canais de acesso [...]. Quando os meios de comunicação em massa são
controlados pelas elites políticas e as mensagens são sujeitas à sua
aprovação, até certo ponto esses meios são eliminados como um canal útil
de acesso, ou reservados apenas aos grupos favorecidos (ALMOND &
POWELL, 1972, p. 61).

Diante dessa situação, podemos identificar na atuação da federação,


diferentes táticas de pressão ou canais de acesso para que a instituição
influenciasse no governo.

Inicialmente, temos as veiculações de matérias no periódico da entidade.


Em segundo lugar, a pressão sobre o próprio governo, ou seja, a ligação pessoal,
realizada de forma direta através de reuniões e/ou ofícios encaminhados ao
governador. Por último, essas pressões se faziam ecoar de forma mais contundente
no maior veículo de comunicação de massas da época, o jornal A Gazeta.

137
A ata de 15 de outubro de 1970 registrava a reunião que o Conselho de
Representante da FINDES teria no mesmo dia com o governador. O jornal A gazeta
do dia 16 do mesmo mês, em sua capa, noticiava:

Em sua reunião de ontem, o Conselho de Representantes da Federação


das Indústrias, unanimemente, aprovou a ideia do Eng. Jones dos Santos
Neves Filho, de encaminhar no dia de hoje ao Governador Christiano Dias
Lopes o trabalho elaborado pelos técnicos da FINDES, em que se
recomenda a necessidade urgente da criação do Centro Industrial de
Vitória. Na entrevista como Governador do Estado, o Sr. Jones dos Santos
Neves Filho far-se-á acompanhar alguns conselheiros, para mais “mais uma
prova de consideração e aprêço para com o chefe do Poder Executivo
Estadual”, manifestando-lhe compreensão pelos esforços que tem
131
despendido em favor do desenvolvimento capixaba.

Na página cinco, da mesma edição, o jornal detalhava a proposta da


federação:
O Presidente da FINDES declarou que tinha entrevista marcada com o
Governador do Estado sexta-feira (hoje), para as 11 horas, quando então
entregaria o documento em suas mãos como uma proposta da unanimidade
do empresariado capixaba. Ressalta o trabalho sôbre a importância da
implantação do Centro Industrial: [...] 5) que a necessidade de tal medida
(implantação do CIVIT) ainda se faz mais imperiosa face à muito provável
instalação de uma siderurgia de grande porte nessa região, o que acelerará
consideravelmente o processo de nossa industrialização ; 6) que de
qualquer forma é urgente essa medida , para assegurarmos,
dinamicamente, condições de promover o nosso desenvolvimento industrial,
atual e futuro; [...] 8) que urge desapropriar e equipar uma área de cerca de
132
100 ha na região indicada, capaz de receber as primeiras indústrias [...] .

Após abordar os pontos expostos pela instituição, o jornal encerrava a


reportagem afirmando que o Presidente da FINDES

[...] fêz questão de ressaltar o entusiasmo com que tem tratado do problema
o Governador Dias Lopes, pugnando na mesma linha de pensamento o
Governador eleito do Estado, Arthur Carlos Gerhardt Santos, a quem
também será levado uma cópia do documento para que êle o examine em
133
todos os seus aspectos .

Essa matéria foi veiculada no dia da referida reunião. No dia seguinte, o


jornal A Gazeta faz uma reportagem de capa, transmitindo a posição do governo:

131
Empresariado vai ao Governador para fazer apelo: Urgência para o Centro Industrial. A Gazeta,
Vitória, Capa, 16 out. 1970.
132
Empresariado oferece apoio a Christiano pedindo a criação do Centro Industrial. A Gazeta, Vitória,
p. 5, 16 out. 1970.
133
Empresariado oferece apoio a Christiano pedindo a criação do Centro Industrial. A Gazeta, Vitória,
p. 5, 16 out. 1970.

138
Logo após ouvir do Presidente da Federação das Indústrias do Espírito
Santo o apêlo do empresariado para que fosse dada urgência à implantação
do Centro Industrial, o Governador Dias Lopes garantiu que o primeiro
núcleo do CIVIT é medida urgente e que não pode esperar que se implante
primeiro a siderúrgica programada para o Planalto de Carapina. Acha Dias
Lopes que uma medida necessariamente, não depende da outra e que
quando a siderurgia vier o Centro Industrial já estará então, confirmado. Os
industriais pretendem agora, um encontro com o Governador eleito Arthur
134
Carlos Gerhardt Santos, para tratar do mesmo assunto .

Ao analisar os documentos redigidos pela FINDES em relação ao CIVIT,


percebemos que existe pressão, mas, ao mesmo tempo, um clima amistoso entre
Dias Lopes e Jones Filho, revelando o clima de “camaradagem” que existia entre
eles. Essa relação entre a FINDES e o governo do Estado entra em crise a partir de
dezembro de 1970.

4.2 Da COPLAN-ES à SUPPIN: Empresa pública ou sociedade de economia


mista?

O estudo de viabilidade do CIVIT estava concluído, assim como o plano


diretor. No entanto, restava a sua institucionalização, o que seria realizado por meio
da COPLAN-ES. Nesse ponto, as negociações ficaram emperradas e, somente após
algumas tensões, foram contornadas pelo governo do Estado.

Esse tópico abordará os problemas da institucionalização do CIVIT, bem


como da transformação da COPLAN-ES na Superintendência dos Projetos de
Polarização Industrial (SUPPIN) e a consequente implantação do CVIT, no governo
de Arthur Gerhardt.

Na reunião realizada com Dias Lopes em outubro de 1970, a FINDES


entregou ao governador o documento intitulado Federação das Indústrias do Espírito
Santo – Posição na Institucionalização e Instalação do Centro Industrial da Grande
Vitória. Nesse documento, a federação, além de tentar evidenciar para o Estado a
força propulsora e catalizadora que seria a implantação do Centro Industrial,
também se posiciona em relação à institucionalização do CIVIT.

134
Governador comunga da opinião do empresariado: Centro Industrial Prometido para já. A Gazeta,
Vitória, Capa, 17 out. 1970.

139
Sobre a institucionalização do CIVIT, desde 1969, existiam arranjos para
que a COPLAN-ES se constituísse como fundação entre janeiro e fevereiro de 1970,
posteriormente tornando-se uma sociedade de economia mista. Entretanto, os
debates sobre esse assunto

[...] prosseguiam quanto à sua forma: uma autarquia ou sociedade de


economia mista? A posição de autarquia era defendida pelo governo e por
Marcus Viana, representante da CVRD. Eles entendiam que o Estado já
possuía instalada toda estrutura burocrática para o funcionamento do CIVIT,
ou seja, já possuíam empresas que podiam fazer a obra de infraestrutura e
complementares [...]. E a FINDES defendia a estruturação do CIVIT em uma
empresa de economia mista, firmada no documento intitulado “Posição da
Institucionalização e Implantação do Centro Industrial da Grande Vitória”,
pois assim poderia ser sócia do CIVIT junto com outra empresa interessada
(SUPPPIN, 2006, p. 26-27).

Essa questão foi solucionada na reunião da COPLAN-ES em dezembro


de 1970, como registrado em ata:

O Senhor Presidente da COPLAN-ES, José Carlos Pereira Neto, esclareceu


que mantivera entendimento com o Sr. Governador eleito do Estado, Sr.
Arthur Carlos Gerhardt Santos, e o governador Christiano Dias Lopes Filho,
a respeito da institucionalização do órgão que virá no futuro substituir a
COPLAN-ES (...) ficando então definido, em acordo com o governador eleito
(...) que dentro da nova estrutura a ser dada à Secretaria de Indústria e
Comércio, fosse criada uma coordenação para tratar da implantação de
áreas industriais, abolindo a ideia de se criar uma empresa pública de
direito privado, por ser ainda muito duvidosa as pretensões de se ver,
estabelecido, uma planta siderúrgica no planalto de Carapina ( ATA
COPLAN-ES apud SUPPIN, 2006, 27-28).

Ou seja, essa era posicionamento do governo e da CVRD – dois dos três


órgãos que compunham a COPLAN–ES –, ao passo que a FINDES foi voto vencido.

Sobre a posição da federação em relação ao impasse, vejamos como o


jornal A Gazeta, a Indústria Capixaba e a ata da Federação tratam o assunto.

A reunião registrada em ata ocorreu em 03 de dezembro de 1970. No


entanto, A Gazeta, já no dia 05 de dezembro, noticiava o seguinte:

[...] O Conselheiro Jones dos Santos Neves Filho, que representa a


Federação das Indústrias no Conselho da COPLAN-ES, disse que aquela
posição era diferente da conceituação esposada em diversas oportunidades
pela FINDES sôbre a institucionalização do órgão para gerir o Centro
Industrial da Grande Vitória e, diante disso não tinha alternativa senão
135
solicitar seu afastamento do conselho da COPLAN-ES .

135
Jones deixa conselho da COPLAN-ES. A Gazeta, Vitória, p. 05, 05 dez. 1970.

140
A notícia veiculada no periódico da FINDES era idêntica à notícia
veiculada pelo jornal A Gazeta. Vejamos a ata da FINDES de 10 de dezembro de
1970, onde a pauta dois da reunião era o “Relatório sobre a Situação da COPLAN-
ES”. Após a leitura do relatório, o Presidente

[...] faz uma exposição sobre os esforços desenvolvidos pela FINDES no


sentido de obter a institucionalização imediata e inicio da implantação do
CIVIT, de acordo com a posição da entidade exposta em trabalho elaborado
pelas suas acessórias técnicas, aprovado pelo Conselho de Representantes
e também por este entregue ao atual governador, bem como ao Governador
eleito. [...] na última reunião tomara conhecimento da decisão adotada pelo
futuro governador, que era de criar simplesmente uma coordenação na
órbita da Secretaria de Indústria e Comércio para o estudo da matéria, o
que implicava na rejeição do encaminhamento dado à matéria pela FINDES,
daí porque se afastara imediatamente da representação daquele conselho.
[...] Amplamente debatida a matéria, o Conselho resolve aprovar a indicação
do nome de Carlos Fernando Monteiro Lindemberg Filho para a COPLAN-
ES, aprovando ainda a publicação, em todos os jornais de Vitória, da Nota
136
Oficial do teor seguinte [...] .

Acrescentando o que foi apontado por Silva (1993), a questão da FINDES


não era apenas a forma como o CIVIT seria criado - seja por empresa pública,
economia mista ou mesmo autarquia.

Havia ainda, outras duas questões que permearam a saída de Jones


Filho. Primeiro, ao eliminar a COPLAN-ES e criar uma coordenação dentro da
Secretaria de Comércio e Indústria, o futuro governador retirava o poder de decisão
da FINDES, concentrando no próprio governo. Em segundo lugar, Jones Filho
percebeu que Gerhardt usou essa estratégia para atrelar a implantação do CIVIT à
implantação da Siderúrgica que estava “prometida” para o Espírito Santo.

Sobre essa questão, Dias Lopes havia se manifestado contrário.

Vale ressaltar que, mesmo Gerhardt sendo oriundo da FINDES, suas


concepções nem sempre iam ao encontro das concepções de Jones Filho. Ora,
mesmo que fossem engenheiros, seria natural divergirem sobre assuntos de ordem
técnica e econômica.

Além disso, Gerhardt precisava defender os interesses do Estado,


enquanto Jones Filho defendia de todas as formas os interesses dos industriais
capixabas. Percebe-se, então, que a federação realmente encontrara em Dias Lopes

136
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – livro 1 – pg. 113-114.

141
um parceiro em todas as suas convicções (nossas pesquisas demonstraram que
não houve divergência entre as ações da FINDES e o seu programa de governo).

A nota oficial da FINDES, datada de 10 de dezembro de 1970, Foi


publicada na íntegra no jornal A Gazeta do dia seguinte. Segue fragmentos do
conteúdo na nota oficial que estava registrado em ata:

“A Federação das Indústrias do Estado do Espírito Santo, de acordo com a


deliberação adotada pelo seu Conselho de Representantes, na sessão
extraordinária do dia dez do mês em curso, vem declarar sua posição sôbre
o problema da implantação do Centro Industrial da Grande Vitória, na forma
seguinte: 1 – Ao ser instituída a Coordenação do Planejamento Industrial do
Espírito Santo (COPLAN-ES) [...] entendeu a FINDES dever igualmente
prestigiar a atuação daquela entidade, designando como representante seu
próprio Presidente. A par disso, a FINDES, fundamentada na concepção de
que o Centro Industrial era o instrumento que se fazia necessário [...], para
a aceleração do processo de industrialização do Estado, empenha-se a
fundo no cumprimento do programa da COPLAN-ES, erigindo até mesmo
êsse projeto como sua meta prioritária no biênio 1969/1970; 2 – Ante as
divergências suscitadas sobre a importância de um Centro Industrial [...] a
FINDES enfatizou sua posição [...]. Nesse documento, a par de demonstrar
a significação do Centro Industrial como indutor do processo de
desenvolvimento integrado, a FINDES reivindicou a institucionalização
imediata do CIVIT, com a participação efetiva da iniciativa privada no
empreendimento, a fim de lhe emprestar maior flexibilidade e cumprir sua
137
política de atuação integrada com o Poder Público [...] .

A FINDES evidencia que sua ideia para a constituição do CIVIT era uma
sociedade de economia mista, pois a entidade queria ter participação direta no
centro industrial, enquanto o governo seguinte propunha uma empresa pública.

Ainda nesse mesmo documento, a federação destaca a saída de Jones


Filho devido a esse impasse criado pela decisão de Gerhardt em torno da
coordenação do CIVIT. Além de alguns elogios ao governo do Estado, a FINDES
reitera a indicação de “Cariê” para o cargo de Jones Filho no conselho da COPLAN-
ES.

A medida que levou ao afastamento de Jones foi tomada por membros da


COPLAN-ES em conjunto com o futuro governador, o que quer dizer que Dias Lopes
não participou dessa negociação.

Nesse caso, qual postura assumida por Dias Lopes sobre o assunto?

Segundo Oliveira (2013), a indicação de Arthur Gerhardt ao governo do


Estado e sua atuação dentro da Arena foi tensa no que diz respeito ao seu

137
Livro de Atas das Reuniões do Conselho de Representantes da Federação das Indústrias do
Estado do Espírito Santo – Livro 1 – Pg. 114-115.

142
relacionamento com Dias Lopes. No entanto, Dias Lopes ainda era governador do
Estado no período da saída de Jones Filho da COPLAN-ES.

Mesmo após intensa pesquisa em jornais, atas e documentos, não


descobrimos qual articulação foi realizada entre Dias Lopes e Jones Filho para a
resolução do impasse criado na COPLAN-ES. O que sabemos é que doze dias após
a saída de Jones Filho, o governo do Estado finalizou o impasse que fora criado na
reunião realizada no dia 03 de dezembro de 1970.

Para resolver essa questão, o governo criou a SUPPIN.

O jornal A Gazeta, veiculou a notícia no dia 17de dezembro de 1970:

O Governador Dias Lopes assinou mensagem elaborada pela Secretaria de


Reforma Administrativa criando a Superintendência dos Projetos de
Polarização Industrial (SUPPIN), em nível de autarquia com a finalidade de
promover e/ou executar a elaboração de estudos viabilizando a implantação
de decisões destinadas à localização de indústrias, com especificação do
seu objetivo e de política fiscal e jurídica necessário a consecução desse
objetivo. A mensagem explica que foi adotado o critério sintetizado em
expressão polarização industrial por entender que esta supera em termos
138
de conceituação, expressão Distrito Industrial .

Em dezembro de 1970, Jones Filho concedeu uma entrevista ao Jornal A


Gazeta, em que tratou da criação da SUPPIN. Eis fragmentos da entrevista:

[...] Manifestou o Presidente da Federação das Indústrias, considerando as


providências já tomadas e os resultados já obtidos em relação ao Centro
Industrial da Grande Vitória, que “há uma diferença considerável entre o que
se pretende e o que se consegue fazer”. - Desde o primeiro instante de vida
da COPLAN, o Governador Dias Lopes e eu concordamos em que o
assunto estava definido e se prescindia da realização de qualquer estudo de
viabilidade para definir a localização do CIVIT; no entanto tivemos que
realiza-lo. - Se homologada a criação da SUPPIN até o final do ano, que
acha V. Sa. que deve ser feito em seguida? – perguntou o repórter. -
Mesmo antes que o seja, a sequência da providência não foi prejudicada: o
nosso representante na COPLAN-ES, o dinâmico industrial Carlos Fernando
Monteiro Lindemberg Filho, está perfeitamente sintonizado com a
Federação das Indústrias e o pensamento do empresariado industrial.
Assim sendo, está êle providenciando, na sua atividade junto à COPLAN, as
seguinte medidas prioritárias, que em parte do cronograma emergencial que
a FINDES apresentou no seu trabalho “Posição da Federação das
139
Indústrias na Implantação de Institucionalização do CIVIT” .

Sobre seu relacionamento com o governo do Estado e um possível


desgaste, Jones Filho foi enfático:

138
SUPPIN vai substituir COPLAN-ES. A Gazeta, Vitória, p. 05, 17 dez. 1970.
139
Presidente da Federação das Indústria considerou um “passo admirável” a futura criação da
SUPPIN. A Gazeta, Vitória, p. 11, 24 dez. 1970.

143
“[...] sempre encontramos no Governador Dias Lopes um defensor
entusiasta e vibrante da implantação da área industrial”. E aduziu: - Agora
mesmo, acaba o Chefe do Poder Executivo Estadual, de dar prova
irrefutável disto, ao encaminhar à Assembleia Legislativa mensagem
propondo a criação de uma entidade que, malgrado contrarie a forma
flexível e dinâmica de empresa pública que a Federação sugeriu e
defendeu, tem também corolário importante à implementação prioritária do
140
Centro Industrial da Grande Vitória

Por que A Gazeta dava tanto espaço à FINDES?

Como dito anteriormente, a ligação entre a federação e o jornal era


Gutman Uchôa de Mendonça. No entanto, essa nossa suspeita pôde ser
comprovada a partir de um bilhete que achamos em uma das atas da FINDES com
os seguintes dizeres: “Fernando, Dr. Jones pede para você colocar na pauta da
reunião o pagamento de 1.200 cruzeiros ao jornal A GAZETA, pela publicação da
entrevista sobre o CIVIT141”. O bilhete é assinado por Gutman Uchôa de Mendonça,
e o pagamento é aprovado em 22 de janeiro de 1971.

Pelas datas das atas e da entrevista, podemos concluir que esse bilhete
foi destinado para o pagamento da entrevista de Jones Filho veiculada dia 24 de
dezembro de 1970.

A conclusão é simples quando olhamos a ata. Percebemos que a última


reunião do Conselho de Representantes em 1970 foi em 10 de dezembro, e a
primeira reunião de 1971 em 29 de janeiro. Ora, o pagamento foi aprovado no dia 22
de janeiro, e colocado na pauta reunião seguinte. Em outras palavras, Jones Filho
concedeu a entrevista no final de 1970 e, na primeira reunião de 1971, a federação
efetuaria o pagamento ao jornal.

Em janeiro de 1971 foi veiculada uma série de reportagens142 no jornal A


Gazeta frisando a criação da SUPPIN, a implantação do Centro Industrial e uma
pressão de Jones Filho sobre Dias Lopes para a criação definitiva da SUPPIN, pois
faltava ainda sancionar a lei de criação.

140
Presidente da Federação das Indústria considerou um “passo admirável” a futura criação da
SUPPIN. A Gazeta, Vitória, p. 11, 24 dez. 1970.
141
Ver anexo II.
142
Do Suppin ao Civit. A Gazeta, Vitória, p. 05, 12 jan. 1971; Centro Industrial da hora decisiva. A
Gazeta, Vitória, Capa, 22 jan. 1971; Assembleia aprova hoje a criação da Suppin. A Gazeta, Vitória,
p. 05, 22 jan. 1971; Tudo pronto para o Centro Industrial. A Gazeta, Vitória, Capa, 26 jan. 1971;
Assembleia (por unanimidade) cria o Suppin. A Gazeta, Vitória, p. 05, 26 jan. 1971; O
Desenvolvimento Industrial. A Gazeta, Vitória, p. 05, 28 jan. 1971; Suppin é o Projeto mais Importante
do Governo. A Gazeta, Vitória, p. 05, 29 jan. 1971; Governo sancionou a criação da Suppin. A
Gazeta, Vitória, p. 05, 11 fev. 1971.

144
Em termos legais, a SUPPIN ainda não estava em pleno funcionamento.
Mesmo assim, Jones Filho argumenta: “[...] a autarquia SUPPIN somente terá
sentido prático e objetivo na medida em que consiga implantar, na realidade da área
física adequada, o Núcleo Indústria Preliminar do Centro Industrial de Vitória”143.

Com a proximidade do encerramento do governo Dias Lopes e a


indefinição quanto o Centro Industrial, Jones Filho assumiu uma postura mais
aguerrida, o que é lembrado pelo próprio Jones:

“[...] Depois da criação da COPLAN foram contratados diversos estudos,


foram feitas reuniões de debates. Mas nós continuávamos pressionando o
governador, e o Arthur Carlos dizia: “Vamos fazer o Distrito Industrial”. Foi
chegando o final do Governo Christiano Dias Lopes e o negócio não saía.
144
Então publicamos uma página inteira no jornal A Gazeta cobrando uma
posição do governo. Em alguns trechos, aquilo teve uma tônica muito forte”
(NEVES FILHO Apud GURGEL, 1998, p. 57). (grifo nosso)

A situação ficou tão tensa que Jones Filho recebeu uma ligação do
próprio governador: “[...] ele telefonou dizendo: “ Puxa, eu quero fazer o negócio e
você fica botando terra”. Eu respondi: “ Você vai sair do governo daqui dois meses e,
depois, ninguém sabe quem vai entrar. Podemos perder o trabalho todo” (NEVES
FILHO apud GURGEL, 1998, p. 57-58).

Restava ao governo agora, após tanta pressão, sancionar a criação da


SUPPIN e tocar o Distrito Industrial. A FINDES pressionava de um lado e o jornal A
Gazeta, parceiro da Federação, pressionava de outro. Dessa forma, Dias Lopes,
dias antes de deixar o governo, cedeu à uma última pressão da instituição.

Quando o projeto de lei da criação da SUPPIN foi encaminhado à


Assembleia Legislativa, a FINDES se manifestou da seguinte forma:
O Eng. Jones dos Santos Neves Filho, Presidente da Federação das
Indústrias e do Centro de Indústrias do Espírito Santo, considerou um
“passo admirável” do Gôverno do Estado o envio de projeto-de-lei à
Assembleia Legislativa, criando, na órbita da Secretaria da Indústria e
Comércio uma autarquia denominada SUPPIN [...]. Segundo o Sr. Santos
Neves Filho, após a nota oficial divulgada pelo Conselho de Representantes
da Federação das Indústrias em todos os jornais de Vitória, o empresariado
industrial “reagiu com admiração e entusiasmo” à iniciativa governamental
de encaminhar ao Legislativo Estadual a mensagem de criação do SUPPIN.
[...] a Federação das Indústrias do Espírito Santo, como órgão legítimo de
representação da classe industrial capixaba, considera a institucionalização

143
Revista Indústria Capixaba. A Palavra do Presidente. Ano IV, Vol. 26, jan.1971

145
da SUPPIN um passo admirável, por que terá como consequência lógica a
145
imediata implantação do Centro Industrial da Grande Vitória (CIVIT) .

Após ampla divulgação no jornal A Gazeta, a SUPPIN foi criada pela Lei
2572 de 10 de fevereiro de 1971. O que chama atenção é a semelhança do texto da
lei com a matéria proposta pela FINDES em outubro de 1970. Vejamos alguns
pontos da lei:
Art. 1º - Fica criada a Superintendência dos Projetos de Polarização
Industrial (SUPPIN), com personalidade jurídica e autonomia técnica,
financeira e administrativa, vinculada à Secretaria de Indústria e Comércio.
Art. 3º - A Superintendência dos Projetos de Polarização Industrial tem por
finalidade: I – promover e/ou executar a elaboração de estudos, visando
à implantação de núcleos destinados à localização de indústrias com
especificação de seu objetivo e da política fiscal e jurídica necessária à
consecução desse objetivo; II – executar, fiscalizar e atualizar planos
diretores que forem estabelecidos para implantação de núcleos ou centros
industriais; III – promover, direta ou indiretamente, a execução de todas as
obras de infra estrutura necessárias à instalação de indústrias; IV – prestar
assistência aos empreendimentos adequados aos planos diretores; V –
promover estudos tendo em vista o desenvolvimento equilibrado das áreas
adjacentes aos núcleos e centros industriais e sugerir as medidas
necessárias à obtenção desses resultados; VI – prover as áreas
selecionadas para nucleação industrial de base habitacional de baixo custo,
atendendo ao problema social e evitando especulação sobre o custo dos
terrenos e benfeitorias beneficiadas pelas obras de urbanização; VII –
participar, inclusive mediante subscrição de capital de entidades públicas e
privadas cujos programas se ajustem às finalidades da entidade; VIII –
promover a obtenção de financiamento interno ou externo inclusive através
de convênios, acordos ou contratos, obedecidas as formalidades legais; IX
– promover providências junto a órgãos ou entidades públicas ou privadas
no interesse da execução de medidas, especialmente no que diz respeito à
elaboração de projetos de natureza rodoviária, ferroviária, hidroviária ou
portuária, de saneamento, comunicação e urbanismo que tenham por
objetivo o aproveitamento de recursos hidrológicos, energéticos, e outros
relacionados com a implantação de indústrias; Art. 5º - O Conselho
Deliberativo será integrado por representantes dos seguintes órgãos: I –
Secretaria da Indústria e do Comércio; II – Secretaria Executiva do
Conselho de Desenvolvimento Econômico; III – Banco de Desenvolvimento
do Espírito Santo; IV – Federação das Indústrias do Estado do Espirito
146
Santo; V – Superintendência dos Projetos de Polarização Industrial .

Em suma, a SUPPIN ficaria responsável pelo desenvolvimento de


estudos determinantes da localização de indústrias, promoção e execução de obra
de infraestrutura, alienação e arrendamento de terrenos para atração de
investimentos (SUPPIN, 2006).

Dessa forma, percebemos como a SUPPIN ia além da implantação de


desenvolvimento do CIVIT. Essa autarquia seria o órgão responsável por

145
Revista Indústria Capixaba. Federação das Indústrias considerou como “passo admirável” a
criação da SUPPIN. Ano IV, Vol. 26, jan.1971
146
Texto completo disponível em: http://www.conslegis.es.gov.br/. Acesso em 23/06/2016.

146
desenvolver projetos de industrialização, implantação de centros industriais,
captação de novas indústrias, estudos de viabilidade, infraestrutura e
desapropriações para todo Estado do Espírito Santo.

A FINDES obteve essa grande vitória, além de conseguir desvincular a


implantação do Centro Industrial da alçada da Secretaria de Indústria e Comércio,
ela consegue que seja criada uma autarquia específica para a implantação de
plantas industriais no Espírito Santo.

Dessa forma, estavam consolidadas as três realizações desejadas pela


FINDES para o desenvolvimento capixaba durante o governo Dias Lopes: os
incentivos fiscais, que vieram pela DL 880, criação do FUNRES, GERES e FUNDAP;
o banco de desenvolvimento que surgiu a partir da criação da CODES, tornando-se
BANDES, ainda no governo de Dias Lopes; por último, a implantação do CIVIT, que
como procuramos demonstrar, foi fruto da pressão da federação sobre o governo
capixaba. Primeiro, criando a COPLAN-ES, depois a pressão da Federação para a
implantação do Plano Diretor e, por fim, a luta da instituição para transformar o CIVIT
numa sociedade de economia mista (o que não acabou ocorrendo, mas houve uma
vitória parcial com a criação da SUPPIN e a consequente criação do Civit em 1974).

Portanto, podemos afirmar que o CIVIT foi fruto de um trabalho intenso na


FINDES, não só através da pressão sobre o governo, mas também, através de
seminários, divulgação e da atuação de seu Presidente à época, Jones dos Santos
Neves Filho.

4.3. A implantação do Civit e a perda de espaço político

Passando à fase da legalização, era necessário estruturar a SUPPIN para


iniciar a implantação do CIVIT. A estrutura administrativa do SUPPIN era composta
por dois órgãos:

[...] o colegiado, que é o Conselho Deliberativo, e o Poder Executivo,


ocupado pelo Superintendente. Os representantes do Conselho Deliberativo
(vindos da CVRD, FINDES e Escelsa), seriam escolhidos de uma lista
tríplice encaminhada ao governador. Já a presidência do Conselho
Deliberativo seria sempre do representante da FINDES. Os empregados da
extinta Coplan-ES seriam aproveitados no quadro da Suppin em cargos
correspondentes às atividades que exerciam no extinto órgão. O primeiro

147
superintendente da Suppin foi Walter Manfred Düenk (SUPPIN, 2006, p.
30).

O próprio Walter Düenk, em entrevista, explanou sobre a sua escolha


para o cargo:

[...] o Dr. Jones pediu ao Christiano a criação da Suppin [...], o final do


governo Christiano e início do governo de Arthur, Dr. Jones pediu aos dois
que eu fosse indicado para ser superintendente da Suppin e dar início ao
processo de implantação da área industrial (Düenk apud SUPPIN, 2006, p.
30).

Quanto ao desenvolvimento dos trabalhos da SUPPIN, no final de 1971


ocorreu uma mudança no texto da lei que criou a superintendência. Sendo assim,
sua regulamentação ocorreu apenas em 1973, através do decreto Nº 372-N. O
inciso 4º do seu artigo 4º é esclarecedor nesse sentido:

Como autarquia se constitui em ente administrativo autônomo, criado por


lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita própria. Tinha a
finalidade de estudar e planejar geograficamente áreas ou regiões para a
instalação e ordenação de organizações industriais, promovendo e
harmonizando o crescimento urbano e o industrial, visando a dinamização
da economia do Estado, conforme a lei que a criou. Compete a ela, além de
promover, executar e fiscalizar a implantação de núcleos destinados à
localização de indústrias, providenciar áreas para núcleos habitacionais de
baixo custo para o que trabalham nas indústrias próximas, no Centro
Industrial da Grande Vitória (Decreto Nº 372-N, 20 maio de 1973 Apud
SUPPIN, 2006, p. 31).

O que de fato ocorreu foi que, o governo iniciou o processo de


desapropriação da área e inaugurou o Setor I (área piloto) do Centro Industrial de
Vitoria em 12 de novembro de 1974.

Na época da inauguração, a área industrial disponível de 5.987.842 metros


quadrados dividida em 22 módulos industriais possuía uma ocupação
efetiva e uma reserva de 4.858.242 metros quadrados. Foi feita a
terraplanagem numa extensão de nove quilômetros de ruas (incluindo o
acesso ao Civit). O sistema de abastecimento de água utilizava a lagoa
Jacuném como manancial. Além disso, no dia da inauguração, o Civit já
contava com sistema de esgoto e energia elétrica instalada (GURGEL,
1998, p. 59).

O FINDES noticiou esse assunto com grande destaque em seu periódico:

“Já vem se tornando um hábito - às vezes entendido como demasiado,


teimoso e renitente –, o de nos valermos dessa página de abertura da
nossa revista para fustigarmos o permanente tema da implantação do CIVIT
[...] Desta feita, entretanto, sobejam especiais razões para que o tema seja
mais uma vez abordado, face à grande conquista alcançada, no dia 27 de
novembro último, com a inauguração do Setor I do Centro, pelo Senhor
Governador do Estado [...]. Por que ela (inauguração do civit) representa um
efetivo triunfo da classe industrial capixaba, pilotada valentemente pelos

148
nossos companheiros da diretoria da Federação e do Centro da Indústria do
Espírito Santo. É a primeira coroação de uma luta que se iniciava mesmo
147
instante em que 13 de setembro de 1971 , assumíamos pela primeira vez
a Presidência da FINDES, e na qual, entre outras metas, situávamos a da
elaboração imediata e urgente, através dos órgãos existentes de
desenvolvimento estadual do Plano Diretor da Implantação do nosso Centro
Industrial, fixando sua localização, delimitando a sua área, ocupando-a e
dando-lhe as condições tecno-econômicas e tecno-estruturais de
desenvolvimento”. Luta que teve prosseguimento ao se conseguir do então
Governador do Estado, Christiano Dias Lopes Filho, ao final de 1969, a
criação da COPLAN [...], e ao apagar do seu governo a SUPPIN [...]. E que
prosseguiu persistente e teimosamente, ao lado dos demais companheiros
da entidade e Conselho da SUPPIN, até serem vencidas as fases de
aquisição do terreno, de elaboração do Plano Diretor de Implantação, e da
execução das obras de infraestrutura de água, esgoto, pavimentação,
sistema viário, iluminação e energia, que então agora, a 27 de novembro,
148
foram inauguradas para o primeiro setor .

O processo histórico da criação do CIVIT é contado em detalhes por


Manfred Walter Düenk na mesma edição da revista, onde ele contava todos os
esforços da FINDES, desde a frustrada implantação da COMLESTE, passando pela
criação da COPLAN-ES e o nascimento da SUPPIN.

Criada a SUPPIN, seus estudos partiram para os

“[...] levantamentos necessários à concretização da meta prioritária


preconizada pelos estudos da COPLAN-ES, ou seja, definir e criar no
Estado do Espírito Santo áreas especialmente urbanizadas com todos os
requisitos técnicos indispensáveis ao pleno funcionamento da atividade
industrial. Assim, a Suppin adquiriu no planalto de Carapina duas áreas
totalizando 330 há. [...] partimos para o programa de infraestrutura da área
de 170 ha que recebeu a denominação de Setor I ou seja a área piloto do
CIVIT e em paralelo foram feitos estudos que culminaram com o Decreto
653-E, em 19/09/1972, que declarou de utilidade pública para fins de
desapropriação uma área de 1,195 ha, com vistas a expansão do CIVIT.
Definimos a área piloto e as áreas de expansão, contratamos a elaboração
do Plano Diretor do Setor I para seguir iniciar os trabalhos de implantação
149
de infraestrutura da área piloto que ora se inaugura” .

Inaugurado o CIVIT, a FINDES havia cumprido sua principal meta desde


a sua criação em 1958. Porém, segundo Jones Filho, o trabalho dessa instituição
não seria encerrado com a criação do Centro Industrial.

A nova diretoria da federação, empossada em setembro de 1971, possuía


18 metas principais, dentre as quais, destacamos a segunda:

147
Entendemos que houve um erro na edição da revista, pois o primeiro mandato de Jones dos
Santos Neves Filho como Presidente da Findes foi em 1968.
148
Revista Indústria Capixaba. A palavra do Presidente. Ano V, Vol. 73, dez.1974.
149
Revista Indústria Capixaba. CIVIT (Centro Industrial de Vitória) FANTASIA E IDEALISMO DE
ONTEM, REALIDADE CONCRETA DE HOJE. Ano V, Vol. 73, dez.1974

149
[...] Continuidade de apoio à Suppin [...], no sentido de complementação,
dentro do mais curto prazo viável, das obras de implantação física do CIVIT
[...], nas duas etapas iniciais, e na sua área de expansão, bem como na
implementação e implantação de novas áreas indústrias planificadas, nos
150
principais municípios do Estado .

Através dessa meta percebemos que era interesse da FINDES continuar


apoiando a SUPPIN, bem como sua política de industrialização, através do plano de
expansão. Obviamente que, quanto mais as indústrias se expandissem em território
capixaba, melhor seria para a federação, pois ainda em 1971, a FINDES possuía
apenas seis sindicatos filiados. O que nos leva a crer que um dos motivos para a
implantação e expansão das áreas industriais dizia respeito ao surgimento de novas
indústrias no Estado e, consequentemente, a formação de novos sindicatos, que,
para terem uma representação legal, deveriam estar filiados à FINDES.

A matemática era simples: mais indústrias, mais sindicatos, mais filiações,


mais dinheiro, mais representatividade, mais poder e mais meios de pressionar os
governos buscando ter seus interesses atendidos.

Aliado a isso, podemos concluir que a instalação de novas empresas


movimentaria de forma intensa o mercado da construção civil, cujo presidente do
referido sindicato era Jones dos Santos Neves Filho, possivelmente, um dos
beneficiados diretos desse processo.

Em 1975, toma posse do governo do Estado o deputado federal Élcio


Álvares151, cujo mandato teve fim em 1979. Não cabe aqui, desenvolver sobre a
eleição ou mandato de Élcio Álvares, mas, sim, um episódio que demonstrou a
perda de espaço da FINDES no referido governo.

Preocupada em continuar com a expansão do CIVIT, a federação enviou


uma série de ofícios e “telex” ao governador do Estado, em que considerava de
extrema importância a participação dos industriais no destino do CIVIT,
posicionando-se em relação à continuidade do processo expropriatório da região do
Centro Industrial.

Em seu periódico, a FINDES veiculou duras críticas à morosidade do


processo de resposta do governo, bem como ao ofício enviado à Federação pela

150
Revista Indústria Capixaba. CIVIT (Centro Industrial de Vitória) FANTASIA E IDEALISMO DE
ONTEM, REALIDADE CONCRETA DE HOJE. Ano V, Vol. 73, dez.1974
151
Para maior esclarecimento sobre a indicação e governo de Élcio Álvares, ler SILVA (1993);
OLIVEIRA (2013).

150
Secretaria de Indústria e Comércio, onde o mesmo foi considerado bizarro e de um
teor altamente ofensivo. A revista definiu tal resposta como “antológica”. Vejamos
trechos do expediente:

Decorrido quase um mês do envio dos últimos expedientes de vasta


correspondência dirigida ao governador do Estado por todas as entidades
patronais do Espírito Santo apelando veementemente um retrocesso na
ação simultânea de mutilação do CIVIT e a caotização do desenvolvimento
industrial capixaba, a SEIC, mais uma vez, manifestou-se pelo inesperado.
Demonstrando extrema morosidade protocolar, no último dia 13 de
dezembro o presidente da Federação das Indústrias do Espírito Santo foi
surpreendido com a chegada às suas mãos do Ofício/SEIC/GS No. 272/77
“atenciosamente” assinado pelo secretário de Estado da Indústria e do
Comércio. O ofício em seu primeiro parágrafo informava que o titular
daquela pasta governamental acabava de tomar conhecimento do
“contexto” (sic) do telex enviado ao governador do Estado em 18 de
Novembro (21 dias após). [...] o teor cognominado “contexto” pelo titular da
SEIC reiterava o posicionamento contrário das duas entidades quanto à
decisão do Conselho Deliberativo da Suppin que naquele mesmo dia (18 de
novembro), por força de voto de minerva exercido pelo secretário de Estado
da Indústria e do Comércio resolvera interromper o processo
desapropriatório das áreas reservadas ao CIVIT [...]. Ainda mal refeito do
espanto sobre o moroso ofício [...], embora sempre tenha tratado do caso
CIVIT diretamente com o Governador, outra surpresa estava reservada ao
Sr. Osvaldo Vieira Marques na última frase do primeiro parágrafo do bizarro
ofício. Referindo-se aos problemas relacionados ao Centro Industrial de
Vitória, o secretário classificou-os textualmente como “de responsabilidade
152
exclusiva da alçada do Governo” .

Esse episódio demonstrou como o poder e influência da FINDES diminuiu


ao longo dos anos, e que as decisões do então governo, já não passavam mais pela
sua alçada, ainda que participasse de diversos conselhos e autarquias.

Diante disso, podemos concluir que o período de maior influência da


federação foi durante o governo de Christiano Dias Lopes Filho (1967-1971), onde a
federação tinha trânsito livre com o governador e conseguiu, por meio de pressão,
alcançar todos os seus objetivos para o referido período. Soma-se a isso, a
convergência de interesses que havia entre as agendas da FINDES, do poder
público capixaba, nesse período representado por Dias Lopes, e também do regime
militar, que procurou implantar uma agenda desenvolvimentista para o país.

No entanto, compreendemos que essa perda de espaço da FINDES no


campo das decisões se deve, muito mais, a uma conjuntura nacional do que
necessariamente à conjuntura estadual. Nesse caso, Pereira (1997), divide a

152
Revista Indústria Capixaba. CIVIT (Centro Industrial de Vitória) FANTASIA E IDEALISMO DE
ONTEM, REALIDADE CONCRETA DE HOJE. Ano V, Vol. 73, dez.1974

151
implementação de uma política industrial de âmbito estadual em três fases, das
quais apenas as duas primeiras nos interessa apresentar. Segundo ao autor:

A primeira fase vai aproximadamente de 1967 a 1975, e é uma resultante


direta da firme mobilização de interesses locais em favor da industrialização
que, agrupados na Federação das Indústrias do Espírito Santo [...]. Na
segunda fase, iniciada em meados dos anos setenta e condicionada tanto
pela centralização do planejamento e de recursos no governo federal
quanto pela expectativa do de implantação no Estado de diversos projetos
de grande porte [...] (PEREIRA, 1997, p. 264-265).

Os projetos de grande impacto no Estado foram idealizados a partir do


governo de Arthur Gerhardt, porém, são implantados na segunda metade da década
de 1970: “Das unidades industriais que iriam marcar a nova fase econômica
capixaba, algumas entraram em operação a partir de 1977 e outras no início dos
anos 80” (SIQUEIRA, 2010, p. 83):

Todavia, no campo ideológico, esse processo ocorreu não apenas na


esfera regional, mas no contexto de uma ideologia que emerge do governo federal
para os Estados, ficando conhecido como o milagre econômico brasileiro (1968-
1973).

Neste período, o país se constituía de um grande espaço de intervenção


econômica com vistas à manutenção de uma alta taxa de crescimento do produto
interno bruto. Como citamos, esse período é marcado por uma convergência entre
as agendas federal e estadual. No caso do Espírito Santo:

Politicamente, merecem destaque nesse período, as questões de


especificidades temporais que fizeram convergir os objetivos de
racionalização da administração pública entre o governo Federal e os
Governos Estaduais. Esses objetivos refletiam, no âmbito estadual,
principalmente na predominância do conteúdo técnico, na formação e
ocupação dos quadros burocráticos-estatais e no aprofundamento do
distanciamento e do pouco peso que foi dado ao poder Legislativo na
condução e direcionamento das decisões estruturais que estavam
transformando a economia capixaba de agrário exportadora para industrial-
urbana ((VILLASCHI; FELIPE & OLIVEIRA, 2011, p. 82)

A captação de grandes projetos para o Espírito Santo foi colocado em


ação a partir do governo de Arthur Gerhardt, como citado mais acima. Esse fato é
lembrado pelo próprio governador, quando em conversa com o então ministro Delfim
Neto:

“[...] reforcei ainda mais a minha posição com referência aos investimentos
externos, quando definimos que o Espírito Santo só poderia ter um
processo de demarragem econômica com a execução de um projeto igual

152
ou maior envergadura que a companhia Vale do Rio Doce” (SANTOS, 2004,
p.20).

Desse modo, percebemos as condicionantes que fizeram a FINDES


perder seu espaço junto ao poder público. Temos, nas agendas dos governos
federais e estaduais, a implantação de grandes projetos industriais, onde o capital
local é suplantado pelo capital industrial internacional, abrindo espaço para
interesses internacionais, o que saía da alçada da FINDES e fazia com que o
governo local voltasse seus interesses para a consolidação desses projetos.

Dessa forma,

A partir de meados dos anos 70, tem início outra etapa do processo
econômico quando se concretizam as decisões de se implantarem no
Estado os “Grandes Projetos Industriais”, orientados basicamente para
mercados externos, que vão proporcionar uma nova dimensão à economia
do Espírito Santo e transformar radicalmente a estrutura produtiva estadual
(SIQUEIRA, 2010, p. 80).

Essa nova dimensão econômica que os grandes projetos deram à


economia capixaba, acabaram por excluir a FINDES do processo decisório, pois
nesse período, as agendas da federação, do poder público capixaba e do regime
militar eram antagônicas. Basta analisar que, em 1977, quando já estavam em fase
de implantação alguns dos grandes projetos no Espírito Santo, a maior preocupação
da FINDES era continuar a desapropriar áreas para o CIVIT, ou seja, seu programa
ainda estava associado ao incentivo da indústria local.

153
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Todo e qualquer sistema político tem um modo de lidar e processar as


suas demandas, nesse caso, as decisões políticas envolvem vantagens e
desvantagens para uma série de grupos, pessoas e partidos. Mesmo que uma
demanda política seja de interesse individual, esse indivíduo deverá se dirigir aos
tomadores de decisões para defender esse respectivo interesse. No caso de
demandas para grupos específicos, esses grupos se organizam e utilizam diferentes
meios para defender seus interesses. No caso desses grupos de interesse, os meios
mais utilizados para alcançar essas demandas são a pressão e o lobby (ALMOND &
POWELL, 1972).

Mesmo que alguns trabalhos desenvolvidos apresentassem o objetivo de


abordar o empresariado capixaba, nosso estudo se direcionou para o
aprofundamento do tema, principalmente, no que diz respeito à articulação de
interesses entre o empresariado local e o governo estadual durante o regime militar.
Dessa forma, essa pesquisa buscou contribuir para o entendimento da articulação
entre atores do setor privado - mais precisamente o grupo de empresários industriais
alocados na Federação das Indústrias do Estado do Espírito Santo - e os atores
ligados à direção do governo estadual.

Além de analisar essa relação, procuramos compreender como essa


relação entre a FINDES e o Poder Executivo capixaba modificou a estrutura
administrativa e econômica estadual a partir de 1966, principalmente no que diz
respeito à mudança de mentalidade e as ações do poder público, o que acabou
ecoando na política de desenvolvimento industrial. Dessa forma, procuramos trazer
maiores conhecimentos sobre a questão do empresariado local e sua relação com o
governo estadual.

Até 1929, o Espírito Santo apresentava forte tendência agrícola, assim


como grande parte do Brasil. No entanto, a partir década de 1930, outros Estados do
país como, São Paulo e Rio de Janeiro, buscaram ampliar a indústria local, visto que
a exportação apresentava forte diminuição em relação aos anos anteriores.
Enquanto os outros Estados do Sudeste se industrializavam, o Espírito Santo

154
alcançava recordes na exportação de café, contribuindo para a inércia industrial do
Estado.

No aspecto político, o Estado era governado pelo interventor varguista


João Punaro Bley, que durante seu governo manteve as contas equilibradas e não
apresentou nenhum interesse em industrializar o Estado. Vale salientar que, estando
num regime autoritário (“Estado Novo”), não havia qualquer obrigação do poder local
em atender o interesse das elites, principalmente pelo fato do referido governo não
depender de articulações políticas para uma futura eleição.

Com a queda de Vargas, a retomada da democracia e o advento de


eleições diretas, o jogo político voltou a ser composto por partidos, eleitores,
candidatos e grupos de interesse, que buscavam de alguma forma influenciar o
poder público na tomada de decisões sobre as demandas que lhe favorecessem.

Havia à época na política capixaba, dois nomes de peso: Jones dos


Santos Neves e Carlos Lindemberg, ambos do PSD.

Na época, o PSD demonstrou sua força, vencendo duas eleições


seguidas: em 1946, com Carlos Lindemberg e em 1950, com Jones dos Santos
Neves. É importante ressaltar a gestão extremamente dinâmica e inovadora de
Santos Neves (1951-1955), com um projeto desenvolvimentista que marcou a
história do Estado “antes e depois” de sua administração, pois foi a partir dele que
surgiu uma concepção mais arrojada para o desenvolvimento capixaba.

Contudo, Santos Neves ressentia-se de dois problemas, o primeiro, se


tratava de uma forte oposição do Legislativo; além disso, a falta de um empresariado
industrial organizado que buscasse o desenvolvimento do Estado. É importante
lembrar que a elite econômica capixaba, até a década de 1960 era basicamente
formada por grandes proprietários rurais exportadores de café e uma elite mercantil-
exportadora, que vivia das exportações de café.

Encerrando-se o mandato de Santos Neves, o PSD planejava eleger


Eurico Salles como seu sucessor. Entretanto, o fracasso do PSD nessa empreitada
se deu com a vitória de Francisco Lacerda de Aguiar, o popular “Chiquinho”.
Aglutinado num grande arco de alianças políticas denominada Aliança Democrática,
“Chiquinho” derrotou o candidato do PSD, Eurico Salles, nas eleições de 1954.

155
A mudança política, nesse caso, tornou-se uma mudança de mentalidade
e de projeto para o Estado. Enquanto Santos Neves almejava transformar o Espírito
Santo num Estado industrial, “Chiquinho” via a agricultura como carro-chefe da
economia capixaba.

Com o PSD na oposição, restava apenas aguardar o pleito de 1958 para


buscar o retorno ao poder.

Nesse período, o Espírito Santo, ainda com uma indústria incipiente,


começa a se organizar empresarialmente, com Américo Buaiz, criando em 1955 a
Fecomércio - órgão que representava os comerciais capixabas. Ressaltamos que a
Fecomércio não conseguiu atender as demandas desejadas por Américo Buaiz, que
criou em 1958 a Federação das Indústrias do Estado do Espírito Santo153.

Américo era intimamente ligado à Jones dos Santos Neves e Carlos


Lindemberg. E quais os desdobramentos disso?

Nasce no Espírito Santo, a partir da criação da FINDES, a concepção de


aliança entre poder político local e empresariado industrial. Contudo, para conseguir
espaço no governo, seria primordial que o governador fosse filiado ao PSD.

Com apoio da federação, do jornal A Gazeta e com uma aliança política


sólida, Carlos Lindemberg volta ao comando do Poder Executivo capixaba em 1959.
Esse governo foi o primeiro em que a FINDES pôde participar de forma direta, seja
na elaboração de seminários ou na composição de grupos de trabalho, ou mesmo
na formulação de políticas econômicas visando o desenvolvimento do Estado.

Todavia, podemos afirmar que o grau de participação do empresariado


junto ao poder público dependia de qual elite política estivesse no governo à época.
Pareto (1984), explica essa alternância no poder político, em que os governantes
(extrato superior), vão se intercalando no poder, a partir de sua teoria da circulação
das elites, podemos compreender que essa circulação afetava diretamente a
FINDES, pois para sua ativa participação no governo, era necessário que fosse

153
Vale lembrar que a Findes nasce no governo Kubistchek, e que esse período (década de 1950) foi
caracterizado pela ascensão da FIESP, bem como do destaque do empresariado industrial no que diz
respeito a estruturação e evolução da política econômica nacional. Ou seja, do ponto de vista
histórico-sociológico, a Findes nasce num período de grande proeminência do empresariado indústria
junto ao governo federal.

156
eleito um candidato que estava alinhado com o seu projeto, caso contrário ela
perderia espaço no espectro político.

Diferentemente de um regime democrático com alternância de poder, o


regime militar, quando instaurado em 1964, ocasionou uma reorganização estrutural
que liquidou a participação política a partir dos atos institucionais, gerando, dessa
forma, a quebra da alternância política. Havendo essa quebra no sistema
democrático, ocorreu a indicação de nomes que apoiavam o governo para a direção
dos Poder Executivos estaduais, ou seja, para ser governador era necessário estar
do lado do regime, não havendo a possibilidade de um governador fazer oposição
ao governo federal.

Nesse contexto, qual o lugar ocupado pela FINDES?

A FINDES, como grupo de interesse com pretensões de industrializar o


Espírito Santo, atuava em conjunto com os governos estaduais. Nesse caso, a
gestão Lindemberg (1959-1962) é um grande exemplo.

Todavia, após esse período de quatro anos de atividade intensa dentro do


Poder Executivo capixaba, o PSD e a FINDES amargaram mais uma vitória de
“Chiquinho” no pleito de 1962, derrotando justamente o maior aliado da federação:
Jones dos Santos Neves. No caso de “Chiquinho”, mais uma vez a FINDES estava
alijada da participação política junto ao Poder Executivo estadual.

Contudo, é necessário avaliar que a concepção econômica do regime


militar estava intimamente atrelada à concepção empresarial, onde o Estado
brasileiro assume uma forma burocrático-autoritária, funcionando nos eixos militares
e técnicos. Cardoso (1975) afirma que por trás desses dois eixos estão os interesses
capitalistas, a empresa estatal e os conglomerados internacionais, e esses eixos se
ligam a uma burguesia local.

A burguesia local capixaba estava em torno da FINDES, que se aloca de


forma definitiva no poder a partir de 1966 quando assume as funções de governador
do Espírito Santo, Rubens Rangel. O regime militar proporcionou à FINDES uma
inserção definitiva junto ao aparelho estatal capixaba favorecida pela mentalidade
dos governadores indicados à época.

Dias Lopes assume o Poder Executivo Estadual em 1967, sendo


importante ressaltar que: primeiro, a FINDES financiou um estudo chamado

157
“Diagnóstico para o Planejamento do Econômico do Espírito Santo”, que seria o
plano de governo de Dias Lopes e estava direcionado no binômio: racionalização
administrativa e desenvolvimento; segundo, a Lei que criava a CODES já havia sido
desenvolvida no governo de Rangel, sendo aprovada no primeiro mês da gestão
Dias Lopes. Isso quer dizer que, as bases para um banco de desenvolvimento foram
criadas no governo anterior; terceiro, Dias Lopes imprime uma arrojada reforma
administrativa no Estado, inclusive concedendo acesso à FINDES em várias
autarquias e órgãos do Estado.

Realizada a Reforma Administrativa, restava ao então governador a


captação de incentivos fiscais para o Estado, o que o governo consegue a partir da
realização do seminário realizado em 1969 para debater os problemas econômicos
do Espírito Santo. Em seguida, o governo Federal cria a DL 880, onde o FUNRES e
o GERES cuidam de uma política de incentivos fiscais para o Estado.

Cabia à FINDES defender seus interesses para a criação de um Centro


Industrial, objetivo principal dessa instituição. Analisar como foi criado o CIVIT é
desnecessário a partir do que já foi apresentado. O que concluímos aqui é sobre a
forte influência que a federação exercia no governo de Dias Lopes, a ponto de Dias
Lopes ser acusado pela sua base partidária de ser um Governador da FINDES
(RIBIEIRO, 2008).

A FINDES atuou em três frentes específicas no governo Dias Lopes:


Primeiramente, na composição do secretariado, com Alvino Gatti, Arthur Gerhardt e
Uchôa de Mendonça. Também atuou na composição de conselhos, autarquias,
empresas públicas e órgãos do governo, onde mantinha assento cativo e sabia de
tudo que era resolvido em cada órgão e secretaria do Estado. E por fim, na relação
direta com o governo, através de pressão e lobby, realizado através de ofícios,
contatos pessoais, cartas, reportagens de jornal e expedientes na Revista Indústria
Capixaba.

No caso da FINDES com o Governo Dias Lopes, a relação ultrapassava a


confluência de agendas, tratando-se de um relacionamento mais íntimo, tendo em
vista a convergência de interesses mútuos em industrializar o Estado.

No entanto, a convergência de interesses que procuramos desenvolver


ocorreu entre FINDES/Governo Estadual/Regime Militar. Essa convergência é

158
evidenciada nas ações de cima para baixo, ou seja, o regime militar possuía um
projeto para o país e endossava a indicação do candidato ao governo estadual. O
Poder Executivo estadual possuía um programa de governo e precisava articular
seus interesses dentro do Estado para colocá-lo em prática, daí a aliança com a
FINDES. A federação, da mesma forma, necessitava do governo para a realização
do seu projeto desenvolvimentista para o Estado.

Com efeito, o papel do governo federal vai além de um simples pano de


fundo, pois, mesmo parecendo um papel secundário, foi através de sua ação que o
Estado conseguiu articular a criação de incentivos fiscais para a arrecadação e
isenção de capital para a implantação dos investimentos necessários para o
desenvolvimento capixaba. Todavia, essa ação do governo Federal, só foi possível a
partir da articulação entre governo estadual e Federação das Indústrias.

A federação necessitava de algo além dos incentivos fiscais e do banco


de desenvolvimento. Ela pleiteava a instalação de um Centro Industrial no Espírito
Santo e, para isso, realizou lobby junto ao governo, que aprovou a criação da
COPLAN-ES (órgão que ficaria responsável pelos estudos da instalação de um
Centro Industrial no Espírito Santo).

Analisando as atas da FINDES, sua revista e o jornal A Gazeta, vimos


como a FINDES exercia forte pressão para que o Centro Industrial fosse instalado o
mais rápido possível. Ofícios, cartas, reuniões, negociações e reportagens, a
federação utilizava todos os canais possíveis para pressionar o governo estadual.

Após uma celeuma na reunião da COPLAN-ES em dezembro de 1970,


quando representantes da CVRD e governo decidiram a institucionalização da
COPLAN-ES como empresa pública - contrariamente aos anseios da FINDES que
defendia uma sociedade de economia mista - Jones dos Santos Neves Filho se
retira da COPLAN-ES e pressionou o governo através de A Gazeta e da Revista da
federação.

Faltava força ou convicção à Dias Lopes para contrariar a FINDES?

Nenhum dos dois. Dias Lopes estava alinhado com os projetos da


FINDES e suas decisões nunca contrariaram a Federação. Nesse caso a decisão da
institucionalização da COPLAN-ES foi tomada pelos membros internos do referido
órgão, Dias Lopes não tinha como saber no momento que a decisão foi tomada. No

159
entanto, Dias Lopes logo que percebeu a insatisfação da FINDES, contorna a
situação criando a criando a SUPPIN.

Nesse caso, podemos apontar a conclusão para dois pontos diferentes:


1º) Dias Lopes estava insatisfeito com a indicação de Gerhardt para o governo do
Estado – lembrando que quem decidiu sobre a COPLAN foi Gerhartd –, e fez isso
para impor sua condição de governador em exercício; 2º) Dias Lopes não sabia da
decisão da COPLAN-ES e atendeu ao pedido de Jones, criando a SUPPIN – nem
tanto pela pressão de Jones Filho, mas por ter seu projeto alinhado com a FINDES.

Entendemos que era desejo dele instalar o CIVIT. Enquanto Gerhardt


estava preocupado com a instalação da Siderúrgica e a viabilização dos grandes
projetos.

Com a criação da SUPPIN, a FINDES realizou sua grande ambição. O


CIVIT foi inaugurado em 1974, porém alguns fatores fizeram com que a federação
perdesse espaço junto ao poder público capixaba ao longo dos anos.

A FINDES ainda possuía menos espaço no governo de Gerhardt do que


no de Dias Lopes. Por quê?

Não deveria ser o contrário, visto que Gerhardt era consultor da federação
desde o final da década de 1950?

Concluímos que, alguns fatores levaram a FINDES a uma perda


significativa de espaço na atuação política, dentre eles: o Estado agora era saudável
economicamente, com um programa completo de incentivos fiscais, um banco de
desenvolvimento, e uma administração enxuta e bem organizada; Gerhardt, mesmo
sendo quadro técnico da FINDES, realizou um governo técnico, ou seja, ele era um
tecnocrata de carreira e sua racionalização administrativa e econômica não o
deixaria se render às pressões e lobby de quem quer que fosse; por último, Gerhard
tinha uma visão macro para a industrialização capixaba, tendo voltado seus esforços
para a implantação dos Grandes Projeto de Impacto.

O auge da FINDES na atuação política junto ao poder público ocorreu no


governo de Christiano Dias Lopes (1967-1971), quando a agenda da FINDES/
Governo Estadual/ Regime Militar estavam numa convergência perfeita. Somado a
isso, tínhamos a relação de intimidade entre o então governador e Jones Filho; por

160
último, o patrocínio da FINDES para diversas questões estaduais, além da
participação direta nos órgãos do governo.

No entanto, a agenda do regime se modifica: primeiro, a partir de 1970, o


governo passa a priorizar a indicação de quadros técnicos para os Poder Executivos
estaduais, o que torna as administrações mais racionalizadas, técnicas,
burocratizadas e menos políticas, ou seja, os governadores não precisavam
barganhar com grupos de interesse; segundo, o governo passa a captar capital
estrangeiro para a implantação dos Grandes Projetos, dessa forma os Poder
Executivos Estaduais tem que seguir a mesma linha do Governo Federal, o que faz
com que empresários locais fiquem alijados desse processo, tendo que se
preocupar com o desenvolvimento da indústria local, porém sem o grau de
participação de outrora.

Para finalizar compreendemos que, economicamente, o Governo de Dias


Lopes e o regime militar potencializaram a industrialização no Espírito Santo, tendo
como pano de fundo a atuação da FINDES, que possui o mérito de ter lutado pela
implantação do CIVIT, trazendo crescimento ao município da Serra, geração de
empregos e aumento de renda, tanto ao povo capixaba, como ao governo do
Estado.

O Governo Federal procurou resolver o problema do atraso econômico


capixaba e através do FUNRES criar a DL 880, que foi uma grande vitória para o
governado da época. Já Dias Lopes tem seu grande feito na implantação do
FUNDAP, esse sim, foi “filho” de Dias Lopes. Sem a participação da FINDES ou do
governo Federal, o FUNDAP acelerou o processo de crescimento do Estado,
gerando empregos e renda para o povo capixaba.

Concluímos então, que dessa convergência de interesses, cada um dos


atores envolvidos teve participação no processo de desenvolvimento do Espírito
Santo e que, sem essa convergência de interesses e a atuação das três instituições
em conjunto, o Espírito Santo, certamente não alcançaria o grau de crescimento
econômico que apresenta nos dias de hoje.

161
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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166
ANEXOS

ANEXO I

CAPA JORNAL A GAZETA, REUNIÃO DA FINDES COM GOVERNO DO ESTADO

167
ANEXO II

BILHETE ENCONTRADO NA FINDES

168

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