Garantias Das Obrigações
Garantias Das Obrigações
Garantias Das Obrigações
1
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
CC, por exceder manifestamente os limites impostos pela boa fé, a invocação judicial da
nulidade de uma garantia prestada por uma sociedade, ao abrigo do art. 6.º n.º 3 CSC,
quando quem assim atua é uma sociedade representada pela mesma pessoa física que
propôs a constituição da garantia, interveio na ata da assembleia geral que aprovou a sua
prestação afirmando expressamente a existência de interesse próprio e, além disso, teve
prévio conhecimento do negócio sem opor nenhuma objeção.”
Nos termos do art. 605.º n.º 2 CC, a declaração de nulidade aproveita todos os
credores pois tendo a mesma efeito retroativo, determina a restituição de tudo o que tiver
sido prestado para o património do devedor de acordo com o art. 289.º CC. Essa
restituição ao património do devedor faz com que o credor que requereu a nulidade não
obtenha qualquer preferência no pagamento.
à Sendo o ato nulo, pode o autor/credor optar entre intentar uma ação de nulidade
ou uma ação pauliana ou ainda ambas desde que configure os pedidos como subsidiários;
2. Sub-rogação do credor ao devedor
i. Modalidades da ação sub-rogatória
Vem prevista nos art. 606.º a 609.º CC e, pese embora a ação sub-rogatória possa
ser direta ou indireta, só esta última hipótese vem aqui regulada.
A ação sub-rogatória indireta, nos termos do n.º 1 do art. 606.º CC, consiste num
meio de conservação da garantia geral que permite aos credores exercerem contra
terceiros, os direitos de conteúdo patrimonial que competem ao devedor. Esta não atribui
qualquer preferência no pagamento aos credores que a ela recorrem uma vez que é
exercida no proveito de todos, repercutindo os seus efeitos na esfera jurídica do devedor,
como resulta do art. 609.º CC.
à Embora o art. 2067.º CC remeta para este regime, não se está perante as
mesmas situações pois o credor não pratica um ato omitido pelo devedor mas sim destrói
os efeitos de um ato por este praticado.
A ação sub-rogatória direta consiste na possibilidade de os credores exercerem em
proveito próprio os direitos que competem ao devedor, de modo a obterem a satisfação
imediata dos seus créditos. Assim, não é um meio de conservação e só é conferida em
casos especiais – art. 1063.º e 1181.º n.º 2 CC.
2
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
3
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
4
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
5
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
6
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Sendo a prova dos factos integrantes do conceito de má-fé, cujo ónus cabe ao
credor, bastante difícil porque se desconhece o circunstancialismo específico em que agiu
o terceiro, pode-se entender, como o fez o Ac. STJ de 09/02/2012 já citado que assume
“particular importância a demonstração dos factos instrumentais, através dos quais o
Tribunal pode concluir, dentro de um plano de razoabilidade e de normalidade, pela
existência da má fé. Aliás, as presunções judiciais encontram um dos seus campos de
eleição naquelas situações em que a prova direta se torna difícil, como acontece nas
hipóteses de impugnação pauliana, no sentido de demonstrar o conluio entre duas pessoas
para enganar ou prejudicar terceiros, pois que aquelas, dada a sua qualidade de réus na
ação, concertam-se entre si, acabando o documento do contrato por constituir a única
parte visível do negócio.
E, sendo da competência das instâncias extrair ilações lógicas do andamento
natural das coisas ou da normalidade dos factos, tendo em conta a factualidade disponível,
lançando mão, frequentemente, de presunções naturais ou judiciais, regras de experiência
comum para, de um facto conhecido inferir outro que dele, logicamente, se deduz,
limitando-se a extrair as consequências de um ato importante, tem-se entendido que, no
contexto de um negócio oneroso celebrado entre familiares próximos, maxime, esposa e
filho, não dispondo o devedor-executado de bens penhoráveis, de montante significativo,
existe, por parte dos intervenientes, consciência de que iriam prejudicar o credor do
alienante, o qual, aliás, in casu, optou por um valor de meação, significativamente,
inferior ao do seu ex-consorte, a troco de compensação em tornas, agindo,
consequentemente, de má fé.”
d. Impossibilidade de o credor obter a satisfação integral do crédito
ou agravamento dessa impossibilidade
Para o preenchimento deste requisito poderá estar em causa os casos em que o ato
implique a colocação do devedor numa situação de insolvência ou que agrave esse prévia
situação e ainda os casos em que o ato produza ou agrave a impossibilidade fáctica de o
credor obter a execução judicial do crédito (ex: aliena todos os bens imóveis ficando só
com dinheiro que é facilmente dissipável ou ocultável)
Provado o montante das dívidas cujo ónus cabe ao credor nos termos do art. 611.º
CC, cabe ao devedor provar que tem bens penhoráveis no seu património de igual ou
superior valor, por força do mesmo preceito.
7
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
8
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
que a coisa produziu ou que poderia ter produzido se detida por um proprietário
diligente – art. 1271.º CC;
b. Efeitos na relação entre o devedor e terceiro
Por efeito da impugnação pauliana, o credor impugnante pode executar o bem
alienado no património do adquirente, na medida da satisfação do seu crédito, o que
significa que um bem do património do adquirente vai responder por uma dívida alheia.
Assim, ainda que o negócio entre o devedor e o adquirente se mantenha válido, por força
daquela possibilidade e como meio de tutela dos direitos deste, decorre do art. 617.º n.º 1
CC a possibilidade do alienante responder perante este nos seguintes termos:
• Ato impugnado é gratuito – devedor é responsável nos termos do art. 957.º CC;
• Ato impugnado é oneroso – o terceiro tem direito a exigir ao devedor aquilo com
que ele se enriqueceu de acordo com o regime do enriquecimento sem causa;
Se o negócio impugnado for nulo como funciona a obrigação de responsabilidade?
A obrigação de restituição ao credor resultante da impugnação pauliana prevalece sobre
a obrigação de restituição dos bens aos devedor pelo que o terceiro tem apenas que
cumprir esta última na medida em que tal afete o direito do credor.
Nos termos do art. 617.º n.º 2 CC, “os direitos que terceiro adquira contra o
devedor não prejudicam a satisfação dos direitos do credor sobre os bens que são objeto
da restituição.” Ou seja, os direitos de crédito do terceiro adquirente sobre o devedor,
resultantes da aplicação do disposto no n.º 1 deste artigo, só poderão constituir-se após a
satisfação total ou parcial do crédito do credor impugnante através dos bens transmitidos
para o património do terceiro.
O que acontece se for proposta uma ação de impugnação pauliana por um dos
credores do devedor e outra nomear o bem à penhora?
• Antunes Varela – cria-se um direito de preferência;
• Menezes Leitão – princípio da igualdade de credores. Parece ser a posição com
apoio na lei nos termos dos art. 616.º e 619.º CC. Há uma preferência mas
subordinada à propositura de um arresto e não à procedência da ação de
impugnação pauliana;
• Paula Costa e Silva – sendo a ação de impugnação procedente cria-se um
património autónomo;
9
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
c. O regime registal
Nos termos do art. 3.º n.º 1 al. a) CRPr, as ações de impugnação pauliana estão
sujeitas a registo que, de acordo com o art. 8.º-A n.º 1 al. b) CRPr, não é obrigatório.
O registo da ação tem como vantagem o facto dos seus efeitos se repercutirem na
esfera jurídica do terceiro adquirente, não sendo necessário preencher os requisitos do art.
613.º CC, nos termos do art. 263.º n.º 3 CPC.
à Em sentido contrário, Catarina Serra defende que o registo não tem nenhum
efeito útil pois não permite a aplicação do referido preceito do CPC tendo que se aplicar
na mesma os requisitos do art. 613.º CC. Entende ainda que o registo não constitui sequer
uma presunção da má-fé do terceiro tendo que ser o autor a prová-la. Assim, retira
qualquer efeito à alteração legislativa (anteriormente não estava sujeito a registo – Ac.
STJ de UJ n.º 6/2004).
d. Extinção do direito à impugnação pauliana
Extinção do direito à impugnação pauliana:
• Com o cumprimento da obrigação;
• Com a aquisição do bem pelo devedor ou de outros bens que aumentem a garantia
patrimonial do crédito do credor;
• Esgotado o prazo de 5 anos desde o ato impugnável – art. 618.º CC;
à Este não se suspende nem interrompe nos termos do art. 328.º CC;
e. Natureza
A natureza da ação pauliana é controvertida. Menezes Leitão entende que a
impugnação pauliana não é uma ação de indemnização pois com esta não se repara os
danos sofridos pelo credor; não é uma ação de declaração de nulidade pois a validade dos
atos não é avaliada nesta ação – art. 615.º n.º 1 CC; não é uma ação de anulação de
transmissão pois a procedência da ação não faz com que o bem retorne ao património do
devedor; e também não é uma ação de declaração de ineficácia dos atos pois o credor
adquire pretensões próprias contra o terceiro adquirente.
Neste sentido, para este autor, a ação pauliana consiste numa ação pessoal que
visa restituir ao credor os bens com que ele contava para garantia do seu crédito.
10
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
4. Arresto
i. Generalidades
O último meio de conservação da garantia geral é o arresto, previsto nos art. 619.º
a 622.º CC e nos art. 391.º a 396.º CPC, que consiste na apreensão judicial de bens que
são entregues a um depositário que os guarda e administra em nome do tribunal, com
obrigação de contas, de modo a obviar preventivamente à diminuição do património do
devedor.
Tal como a penhora, oferece ao credor que o requeira e obtenha o direito de ser
pago com preferência a qualquer outro credor que não tenha garantia real anterior à data
em que é efetuado nos termos do art. 822.º n.º 2 CC. Assim, o arresto é, na opinião de
Lebre de Freitas, uma garantia real, embora de natureza provisória uma vez que, estando
em causa um procedimento cautelar, tem de ser sempre proposta a ação principal nos
termos do art. 364.º CPC. Este é, como aliás qualquer outro, um processo urgente (mesmo
na fase de recurso – Ac. STJ de UJ n.º 9/2009).
Para que produza efeitos em relação a terceiros é necessário que o requerente
proceda ao registo da ação nos termos dos art. 2.º n.º 1 al. n) e o) (e 101.º n.º 1 al. a) CRPr)
e 3.º n.º 1 al. d) e e) CRPr.
Em tudo o que não for especialmente regulado, é aplicável ao arresto as normas
relativas à penhora de acordo com o art. 391.º n.º 2 CPC e 622.º n.º 2 CC.
ii. Pressupostos
O arresto pode ser requerido por qualquer credor comum ou por um credor com
garantia, real ou pessoal, desde que esta se tenha tornado insuficiente nos termos dos art.
633.º, 665.º, 678.º e 701.º CC, tendo que alegar, neste último caso, justificadamente, o
receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito, ainda que este não esteja vencido.
Para que o arresto seja decretado é necessário que o credor alegue, nos termos dos
art. 619.º n.º 1 CC, 391.º n.º 1 e 392.º n.º 1:
• A titularidade do direito;
à Por força do art. 392.º n.º 1 CPC, o requerente deve deduzir os factos que
tornam prováveis a existência do crédito;
à O crédito não precisa de ser certo e exigível nem tem de ser líquido;
• Factos bastantes para justificar o justo receio de perda da garantia patrimonial do
seu crédito;
à Qualquer causa idónea a provocar num homem normal esse receio é
concretamente invocável pelo credor. Pode ser, por exemplo, um receio de
11
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
insolvência do devedor, ocultação dos seus bens ou transferência dos mesmos para
o estrangeiro;
à O art. 396.º CPC dispensa a prova deste requisito nos casos nele previstos, ou
seja, quando o arresto seja requerido contra tesoureiros, funcionários ou agentes
do Estado ou de outras Pessoas Coletivas públicas quando forem encontrados em
alcance. Alcance é, nos termos do art. 59.º n.º 2 Lei n.º 98/97, 26 de agosto, a
situação em que “independentemente da ação do agente nesse sentido, haja
desaparecimento de dinheiros ou de outros valores do Estado ou de outras
entidades públicas.” Quem tem legitimidade para este procedimento é o MP, o
que se compreende tenho em conta do que o credor é o Estado ou um a autarquia
local;
12
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
iv. Objeto
Como se aplicam as regras da penhora, só podem ser arrestados bens suscetíveis
de penhora sendo excluídos os bens impenhoráveis de acordo com os art. 736.º e 739.º
CPC.
Se for requerido em mais bens do que os necessários, o arresto é reduzido como
estabelece o art. 693.º n.º 2 CPC.
v. Efeitos
Os bens ficam apreendidos para garantia do cumprimento da obrigação como se
estivessem penhorados o que implica, de acordo com os art. 622.º n.º 1 e 819.º CC, a
ineficácia dos atos de disposição, oneração ou arrendamento dos bens arrestados em
relação ao requerente e, nos termos do art. 622.º n.º 2 e 822.º n.º 2 CC, a atribuição de
preferência sobre os mesmos. Esta preferência fica sem efeito em caso de insolvência do
devedor, como determina o art. 140.º n.º 3 CIRE.
Assim, o ato de disposição do bem arrestado é válido mas ineficaz em relação ao
requerente do arresto pelo que o seu adquirente recebe o bem onerado com o arresto.
Assim, pode o arrestante, em sede de execução, fazer-se pagar à custa dele nos termos do
art. 819.º CC. O arresto, aquando da execução do crédito, pode vir a ser convertido em
penhora de acordo com o art. 762.º CPC.
Nos termos do art. 620.º CC, e igualmente no art. 374.º n.º 2 CPC, “o requerente
do arresto é obrigado a prestar caução, se esta lhe for exigida pelo tribunal.” Esta norma
tem dois fundamentos:
• Surge como forma a obstar contra recursos abusivos a um meio que restringe os
poderes de livre disposição do proprietário dos bens, numa fase em que a prova
exigida quanto à violação do direito do credor é meramente indiciária;
• E para garantir o preceituado no art. 621.º CC;
A prestação de caução pode ser oficiosamente determinada ou requerida pelo
devedor sendo que, neste caso, tem o mesmo de alegar e provar factos que convençam da
existência de prejuízos advenientes do decretamento do arresto, geradores da obrigação
de indemnizar.
A caução pode, nos termos do art. 624.º n.º 1 CC, ser efetuada “por meio de
qualquer garantia, real ou pessoal”. Se as partes não estiverem de acordo quanto à
idoneidade da caução prestada, cabe ao Tribunal decidir como determinam os art. 623.º
n.º 3 CC, ex vi, art. 624.º n.º 2 CC e 909.º CPC.
13
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
14
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Hipoteca
I. Introdução
A hipoteca, nos termos do art. 686.º CC, consiste num direito real de garantia que
“confere ao credor o direito de ser pago pelo valor de certas coisas imóveis ou
equiparadas, do devedor ou de terceiro, com preferência sobre os demais credores que
não gozem de privilégio especial ou prioridade de registo.”
à O credor titular de uma hipoteca tem uma preferência na satisfação do seu
crédito perante outros credores do titular do bem onerado em sede de venda executiva.
II. Caracterização
A hipoteca consiste num direito real de garantia que incide sobre imóveis ou
equiparados do devedor ou de terceiro, pese embora o contrato que o cria também tenha
a mesma designação.
É um direito acessório de um crédito, atual ou futuro de acordo com o art. 686.º
n.º 2 CC, pelo que em caso de incumprimento o beneficiário da hipoteca pode recorrer à
ação executiva para obter a satisfação do seu crédito mediante o produto da venda do bem
hipotecado. A acessoriedade implica também a extinção da hipoteca no caso de o crédito
que a hipoteca garante se extinguir.
à Se a hipoteca garantir um crédito futuro esta produz os seus efeitos, inclusive
o direito de preferência, a partir do momento em que é constituída e não apenas com o
nascimento do crédito garantido.
Sendo um direito real, a hipoteca goza da sequela e da preferência pelo que
prevalece sob os demais direitos reais de garantia posteriormente constituídos e, sendo
inerente à coisa, segue-a nas suas transmissões.
15
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
16
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Pode ser constituída pelo devedor ou por terceiro sendo que neste caso tem de se
ter em conta os art. 717.º e 701.º n.º 2 CC.
Forma do contrato – art. 714.º CC – se bem imóvel tem de ser escritura pública,
testamento ou documento particular autenticado, se for móvel a forma é escrita. Exceções:
à Art. 1.º DL 255/93 – contratos de compra e venda com mútuo referente a
edifício para habitação;
à Art. 8.º n.º 3 DL 263.º-A/2007 – transmissão, oneração e registo de imoveis
que preencham o âmbito do DL;
É necessário haver registo da hipoteca para que esta produza efeitos, mesmo que
entre as partes – art. 687.º CC e 4.º n.º 2 CRPr.
à O registo não tem caráter constitutivo da hipoteca, o facto do qual esta emerge
é o próprio contrato (só não é assim nas demais espécies de hipotecas). Este é apenas
condição de produção dos efeitos do negócio;
Legitimidade – art. 715.º CC uma vez que está em causa uma oneração de bens.
à O facto de haver previamente uma hipoteca sobre o bem não impede que seja
constituída outra – art. 713.º CC. Prevalece a hipoteca primeiramente constituída;
A hipoteca tem de especificar os bens sobre a qual incide sob pena de nulidade –
art. 716.º n.º 1 e 2 CC.
IV. Registo da hipoteca
Nos termos dos art. 687.º CC e 4.º n.º 2 CRPr, é obrigatório o registo da hipoteca
sob pena de a mesma não produzir efeitos quer inter partes quer em relação a terceiros.
Há quem entenda que o registo da hipoteca é, neste caso, uma condição da sua eficácia
absoluta e quem entenda, como o faz a jurisprudência maioritária que este tem eficácia
constitutiva.
Quanto às legais e judiciais o registo tem caráter constitutivo da garantia nos
termos do art. 50.º CRPr.
O facto de no registo, por força do art. 96.º n.º 1 al. a) CRPr, ter de contar o teto
máximo da garantia, acaba por permitir que a hipoteca que garanta obrigações futuras
tenha um critério de determinabilidade.
V. As regras gerais
1. Créditos assegurados
Pode ser constituída uma hipoteca global de modo a garantir uma série de
obrigações futuras desde que esteja estabelecido um critério suficiente para a sua
determinação.
17
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
18
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
19
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
20
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
21
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
No caso da hipoteca ter sido prestada por 3.º que não o devedor, determina o art.
701.º n.º 2 CC que:
• Se houve intervenção do devedor na constituição da hipoteca, o credor pode exigir
ao devedor o reforço da garantia e se este não o fizer, exigir o imediato
cumprimento da obrigação ou registar nova hipoteca se a obrigação for futura, nos
mesmos termos que prevê o n.º 1 – 1.ª Parte;
• Se a hipoteca for constituída sem intervenção do devedor, não é aplicável o n.º 1
– 1.ª Parte;
• Se a diminuição da garantia se deveu a culpa do terceiro, seu prestador, o credor
hipotecário “tem o direito de exigir deste a substituição ou o reforço, ficando o
mesmo sujeito à cominação do número anterior em lugar do devedor” – 2.ª Parte;
5. A não celebração do seguro
Nos termos do art. 702.º CC, se o devedor se comprometeu a segurar a coisa e não
o fez, pode o credor optar por uma de duas coisas: promover à realização do seguro sendo
as despesas da responsabilidade do devedor (n.º 1) ou exigir o imediato vencimento da
obrigação (n.º 2).
O seguro funciona como uma garantia adicional, tendo em conta a garantia
estabelecida no art. 692.º CC, uma vez que, em caso de perecimento ou deterioração da
coisa, o credor tem direito, por via da sub-rogação, ao crédito indemnizatório que a
seguradora vier a pagar ao proprietário ou titular do direito hipotecado.
6. A redução
Pode haver interesse na redução da hipoteca seja porque os bens aumentaram de
valor seja porque o devedor efetuou pagamentos parciais da dívida.
Nos termos do art. 718.º CC, “a hipoteca pode ser reduzida voluntária ou
judicialmente.”
i. Redução voluntária
Vem regulada no art. 719.º:
• Sendo equiparada a uma modificação da hipoteca, a redução tem de obedecer aos
requisitos formais e substanciais previstos nos art. 714.º e 715.º CC;
• Nos termos do art. 719.º CC, tem de haver consentimento expresso do titular da
garantia, que tem de ser dado em cumprimento da forma exigida para a sua
constituição;
22
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
• É aplicável, por remissão do próprio art. 719.º CC, o regime estabelecido no art.
731.º CC;
• A redução só produz efeitos quando registada;
ii. Redução judicial
Esta vem regulada no art. 720.º CC sendo que pode incidir sobre uma hipoteca
voluntária, judicial ou legal, não sendo em qualquer dos casos livre dependendo portanto
da verificação de certos pressupostos.
• Hipoteca judicial ou legal:
à Nos termos do n.º 1, as “hipotecas legais e judiciais são suscetíveis de redução,
mediante requerimento de qualquer interessado, quer quanto aos bens sobre que
incidem quer quanto ao montante indicado no registo como sendo o montante
assegurado. Tal só não poderá acontecer se tiver sido convencionado ou
estabelecido em sentença que a hipoteca incide sobre certos bens ou o montante
assegurado tiver sido especialmente indicado;
à No entanto, resulta do n.º 2 que mesmo nos casos excecionados na parte final
do n.º 1 pode haver redução judicial se:
# Al. a) – “se, em consequência do cumprimento parcial ou outra causa de
extinção, a dívida se encontrar reduzida a menos de dois terços do seu montante
inicial;”
# Al. b) – “se, por virtude de acessões naturais ou benfeitorias, a coisa ou
o direito hipotecado se tiver valorizado em mais de um terço do seu valor à data
da constituição da hipoteca”;
• Hipoteca voluntária – n.º 2 – a redução judicial de hipoteca voluntária só é
admissível se verificada alguma das suas alíneas;
A realização da redução judicial resulta do n.º 3 do art. 720.º CC.
7. A expurgação
As coisas ou os direitos hipotecados são livremente transmissíveis, pelo que a lei
pretende com o art. 721.º CC assegurar os direitos dos adquirentes. O efeito da sequela,
que caracteriza a hipoteca implica que, em caso de alienação, o adquirente da coisa
hipotecada sofra as consequências da ação executiva, podendo ter de abrir mão do bem
adquirido se este vier a ser vendido judicialmente.
Assim, o adquirente não fica totalmente desprotegido pois tem a possibilidade de
expurgar a hipoteca nos termos do art. 721.º CC e pode opor-se à execução enquanto o
23
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
direito do credor puder ser satisfeito por compensação com um crédito do devedor ou
tiver a possibilidade de se valer da compensação com uma dívida do credor.
A expurgação da hipoteca é admissível nos termos dos art. 721.º e 722.º CC.
Requisitos do art. 721.º proémio CC:
• Aquisição de um bem onerado com hipoteca;
• Registo do título de aquisição;
• Adquirente não pode ser responsável pessoalmente pelo cumprimento da dívida
garantida;
A expurgação da hipoteca pode ser efetuada por uma de duas formas:
• Pagamento das dívidas garantidas (al. a);
à Se for uma hipoteca sobre um bem constituído posteriormente em propriedade
horizontal qual a quantia que tem de ser paga?
# Ac. STJ de 12/02/2004 (Pires de Rosa), proc. n.º 03B2831 in dgsi.pt
– para expurgar a hipoteca da sua fração autónoma basta pagar a proporção face
ao edifício indivisível caso o credor pignoratício admita o distrate face a qualquer
uma das frações autónomas pois entende que tal consubstancia uma renúncia ao
direito de exigir a totalidade do crédito a qualquer uma das frações ou seja, uma
renúncia ao princípio da indivisibilidade;
# Menezes Cordeiro – por força dos princípios da indivisibilidade e da
irredutibilidade do crédito, o pagamento tem de ser da totalidade da dívida pois
não se admite, sem o acordo do credor pignoratício, que haja distrate da hipoteca
com o pagamento parcial da dívida;
• Declarando a vontade de no futuro entregar a coisa se necessário (al. b);
De acordo com o art. 723.º CC, têm de ser citados todos os credores hipotecários
para que se possa expurgar a hipoteca em sentença.
Por força do art. 830.º n.º 4 e 721.º CC, os efeitos da expurgação podem ser
requeridos pelo promitente adquirente na ação de execução específica de contrato-
promessa de transmissão ou constituição de direito real sobre um edifício onerado por
uma hipoteca. Assim a sentença proferida tem caráter constitutivo (quanto à execução
especifica) e de condenação (pagamento da quantia). A expurgação da hipoteca te de ser
realizada nos termos do art. 721.º CC.
Nos termos do art. 724.º CC, se o adquirente da coisa hipotecada tinha, antes da
aquisição, algum direito real sobre essa coisa, o mesmo extingue-se com a sua
24
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
25
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
26
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Art. 730.º:
• Al. a) – tendo em conta a acessoriedade da hipoteca, extinguindo-se o crédito
garantido, independentemente do fundamento com que tal ocorreu, aquela
também se extingue;
à Levanta-se a questão de saber se, em caso de incumprimento da obrigação
garantida, pode o devedor dar em dação em cumprimento o imóvel que a garante
de modo a extingui-la.
# Para que possa haver dação em cumprimento tem de ocorrer duas coisas:
acordo do credor e avaliação do imóvel procedida por um terceiro independente, tanto
jurídico como económico, de modo a não se cair na proibição do pacto comissório;
• Al. b) – a prescrição da hipoteca estabelecida nesta alínea não determina a
prescrição da própria obrigação garantida, estando então sujeita ao regime geral;
• Al. d) – a renúncia enquanto causa de extinção da hipoteca vem regulada no art.
731.º CC.
à Esta consiste numa declaração unilateral em que o credor expressa a sua
vontade de abdicar da garantia hipotecária. Tem de ser efetuada de forma expressa
e está sujeita à mesma forma exigida para a constituição da garantia. Esta é livre
pelo que não necessita do consentimento do devedor ou do autor da hipoteca;
à A renúncia à hipoteca não faz presumir, como indica o art. 867.º CC, a remissão
da dívida (esta só opera por contrato celebrado entre o credor e o devedor – art.
863.º n.º 1 CC);
à A renúncia à hipoteca não é admissível se efetuada pelos administradores de
patrimónios alheios nos casos em que as mesmas são constituídas em benefício
das pessoas cujos patrimónios administram – art. 731.º n.º 2 CC;
10. A execução da hipoteca
Havendo incumprimento da obrigação garantida, pode o credor executar a
hipoteca através do recurso à ação executiva.
Se o bem for do devedor a penhora inicia-se pelo mesmo nos termos do art. 752.º
CPC. Neste sentido, o dono da coisa pode opor-se a que outros bens sejam penhorados
sem que se reconheça a insuficiência da garantia por força do art. 697.º CC.
Se o autor da garantia for um terceiro, estabelece o art. 54.º n.º 2 e 3 CPC a
possibilidade de o credor com garantia real demandar esse terceiro proprietário dos bens.
Este pode defender-se através do recurso ao art. 698.º n.º 1 e 2 CC
27
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
28
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
– tendo no entanto que ser ouvido o credor hipotecário – art. 164.º n.º 2 CIRE. Este pode
propor a aquisição do bem – art. 164.º n.º 3 CIRE.
Art. 166.º n.º 1 CIRE – compensação do credor hipotecário pelo atraso na venda
do bem objeto da garantia desde que não lhe imputável assim como a desvalorização do
mesmo.
à O administrador pode pagar ao credor hipotecário a dívida à custa da massa
insolvente antes de proceder à venda do bem de modo a evitar a aplicação deste preceito.
Ver n.º 2 do mesmo;
Após a venda dos bens e abatidas as despesas de liquidação, procede-se ao
pagamento dos credores de acordo com a prioridade que lhes caiba – art. 174.º n.º 1 CIRE
– antes dos comuns mas sempre depois de satisfeitas as dívidas da massa (art. 172.º n.º 2
e 174.º n.º 1 CIRE).
à Se pelo produto da venda do bem hipotecado não for possível liquidar na
totalidade a dívida garantida, o restante é tido como crédito comum;
Quanto às hipotecas judiciais cabe referir que se extinguem com a declaração da
insolvência pelo que o crédito é graduado como comum à exceção das custas pagas pelo
autor que constituem dívidas da massa – art. 140.º n.º 3 CIRE.
As hipotecas legais têm a especificidade resultante do art. 97.º n.º 1 al. c) e 2 CIRE.
29
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
O penhor
I. Caracterização
Decorre do art. 666.º n.º 1 CC que o penhor confere ao seu titular uma preferência
na satisfação do seu crédito pelo produto da alienação da coisa móvel, direito ou outro
bem sobre o qual incida. Este prevalece sobre todos os credores quirografários e sobre os
titulares de direitos reais posteriores, de gozo ou garantia, pelo valor de bens móveis
determinados, de créditos ou de outros direitos.
A doutrina dominante entende que o penhor sobre coisas consubstancia um direito
real de garantia mas já não é assim quanto ao penhor de direitos uma vez que não aceita
a existência de direitos sobre direitos, pelo que entende o penhor de direitos como uma
garantia especial (mas não real).
O penhor caracteriza-se, então, pela acessoriedade, indivisibilidade, especialidade
e pela proporcionalidade.
Nos termos do art. 678.º CC, aplica-se subsidiariamente e por remissão as normas
que regulam a hipoteca.
II. Regras gerais
1. A legitimidade
Resulta do art. 667.º n.º 1 CC que “tem legitimidade para dar bens em penhor
quem os puder alienar.” Ou seja, desde que efetuado pelo proprietário, o bem dado em
penhor pode ser do devedor ou de terceiro. Se o autor do penhor não foi o proprietário do
bem, no caso de contrato oneroso, aplicar-se-á o regime da venda de bens alheios previsto
no art. 892.º e ss por força do art. 939.º CC.
Por força do art. 717.º ex vi, art. 678.º CC, o penhor extingue-se se não puder haver
sub-rogação do terceiro nos direitos do credor se o penhor for constituído por terceiro nos
termos do art. 592.º CC.
2. A forma
Em regra o penhor nasce de um contrato não formal nos termos do art. 219.º CC,
ainda que existam algumas exceções sendo as mais relevantes a do penhor de direitos –
art. 681.º CC – e a do penhor mercantil – art. 400.º CCom.
3. As obrigações garantidas
As obrigações garantidas podem ser presentes, condicionais ou futuras, é o que
resulta do n.º 3 do art. 666.º CC
30
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
31
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
32
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
33
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
34
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
35
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Se o autor do penhor não for o credor e este pretender a venda antecipada da coisa,
pode aquele impedir a mesma mediante oferta de outra garantia real idónea nos termos
do n.º 3 do art. 674.º CC.
Como a venda antecipada não implica o vencimento da obrigação mas apenas
pressupõe um receio fundado de perda ou deterioração da coisa, não pode o credor pagar-
se de imediato pelo respetivo produto da venda. Assim, nos termos do art. 674.º n.º 2 1
CC, “sobre o produto da venda fica o credor com os direitos que lhe cabiam em relação à
coisa vendida, podendo o tribunal, no entanto, ordenar que o preço seja depositado.” Ou
seja, o penhor mantém-se apesar da mudança do seu objeto havendo lugar a sub-rogação
real.
6. Disposições da hipoteca aplicáveis ao penhor
Por força do art. 678.º CC, são aplicáveis as seguintes disposições da hipoteca ao
penhor:
• Art. 696.º CC – o penhor é indivisível o que implica que:
à Se o crédito garantido se fracionar (por exemplo, por força de uma sucessão mortis
causa), qualquer credor goza do poder de executar o seu crédito por inteiro sobre a coisa
empenhada;
à Se o penhor recair sobre mais do que uma coisa, a garantia recai por inteiro sobre cada
uma delas e não apenas parcelarmente em proporção do valor de cada uma delas;
• Art. 694.º CC – não se admite pacto comissório. A ratio desta proibição é a tutela
do garante pois pode ter dado um bem em garantia de valor superior ao da dívida
aproximando-se assim dos negócios usurários; proteção de terceiros pois pese
embora o bem responda preferencialmente pela dívida, o remanescente fica para
os credores comuns o que ficaria prejudicado se este pacto fosse válido; e
limitação da justiça privada pois cabe ao Estado executar as garantias e não o
recurso a figuras de autotutela. O primeiro e segundo argumento poderiam ser
ultrapassados se se admitisse um pacto marciano uma vez que neste embora o
credor fique titular da coisa, fica também obrigado a restituir a diferença entre o
valor real do bem e o da dívida incumprida;
à Neste sentido levanta-se a questão de saber se o pacto marciano é inválido. Há quem
entenda que não porque não estão em causa razões de ordem pública e este é um meio de
agilizar as garantias. Acresce que a execução extrajudicial vem permitida na lei em vários
artigos;
36
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
• Art. 695.º CC – não se admite convenção que proíba o titular do bem de vender
ou onerar, podendo apenas convencionar o vencimento do crédito se tal ocorrer;
• Aplicam-se ainda as disposições quanto à substituição ou reforço da garantia –
art. 701.º CC – e ao seguro da coisa empenhada – art. 702.º CC;
• Art. 697.º CC – se o credor pignoratício propuser uma ação executiva em vista da
execução do penhor, e tiver sido o devedor a prestar a garantia, pode este opor-se
a que outros bens sejam penhorados na execução enquanto não se reconhecer a
insuficiência da garantia e a que, relativamente ao bem onerado, a execução se
estenda além do necessário à satisfação do direito do credor;
• Art. 698.º CC – se o autor do penhor for um terceiro, pode este:
à N.º 1 – opor ao credor, “ainda que o devedor a eles tenha renunciado, os meios de
defesa que o devedor tiver contra o crédito, com exclusão das exceções que são recusadas
ao fiador”;
à N.º 2 – opor-se “à execução enquanto o devedor puder impugnar o negócio donde
provém a sua obrigação, ou o credor puder ser satisfeito por compensação com um crédito
do devedor, ou este tiver a possibilidade de se valer da compensação com uma dívida do
credor”;
Por força dos art.727.º e ss, aplicáveis por força do art. 676.º n.º 1 CC, admite-se
a cessão da garantia sem o crédito garantido.
7. A execução
Em conformidade com o art. 666.º n.º 1 CC, estabelece o art. 675.º n.º 1 CC que,
“vencida a obrigação, adquire o credor o direito de se pagar pelo produto da venda
executiva da coisa empenhada, podendo a venda ser feita extraprocessualmente, se as
partes assim o tiverem convencionado.”
Em regra a execução do penhor faz-se pela via executiva embora não haja um
processo judicial especial para o efeito pois o mesmo foi revogado pelo DL n.º 329-A/95.
Assim, segue os termos gerais do processo de execução.
Se o bem for do devedor, a penhora inicia-se por este nos termos do art. 752.º CPC
podendo, no entanto, o devedor opor-se com os fundamentos estabelecidos no art. 697.º,
ex vi art. 678.º CC. Para que o credor pignoratício seja o primeiro a ser pago é necessário
que não haja outro credor com um crédito graduado antes do penhor.
37
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
38
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
39
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
3. Regime geral
i. O mecanismo de satisfação do credor
Não sendo uma figura típica, podem as partes acordar o mecanismo de satisfação
do credor que melhor satisfizer os seus interesses.
A execução desta figura levanta algumas dúvidas: ocorre mediante compensação
ou alienação em garantia? PESTANA VASCONSELOS entende que é por esta última
pois as partes pretenderam que o bem ficasse à disposição do credor para que este pudesse
obter satisfação do seu crédito em caso de incumprimento. Ou seja, o bem inicialmente
integra o património do credor com a função de garantia passando, com o incumprimento,
a desempenhar uma função solutória. Estamos perante um mecanismo de autotutela.
Havendo excedente o mesmo terá de ser entregue ao garante e faltando dinheiro só haverá
extinção parcial da obrigação.
Este mecanismo assemelha-se ao previsto no art. 840.º CC.
Este bem responde pelas dívidas anteriores ao incumprimento? Não – aplicação
analógica do art. 1184.º CC.
ii. A aplicação de algumas disposições do penhor
PESTANA VASCONSELOS entende que o penhor irregular é uma figura
autónoma diversa da do penhor mas à qual se pode aplicar parte do regime deste.
Aproxima-se do penhor na exclusiva medida que ambas consistem num reforço
qualitativo sobre um determinador bem pese embora aquele consiste no recurso à
titularidade de um direito e não há criação de um direito real de garantia sobre um de
outrem como este.
As partes ao qualificar este contrato como penhor estão a remeter para as normas
aplicáveis a esta figura pois remetem para um modelo regulativo do tipo. No entanto não
sendo aplicável todo o regime, releva apenas aquele que é aproveitável tendo em conta as
diferenças entre as duas figuras.
Excluem-se: normas relacionadas com a estrutura e execução;
Aplicável: art. 671.º (incluindo 701.º pela al. c) quando esteja em causa valores
mobiliários) e 672.º CC;
iii. Regime insolvencial
Declarada a insolvência do devedor, o credor poderá satisfazer o seu crédito
através dos bens integrados no seu património. Havendo excedente o mesmo tem de ser
entregue ao administrador da insolvência para que seja integre na massa. Assim, ao
contrário do penhor regular, na há necessidade de reclamação do crédito garantido.
40
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
41
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Pode haver vários penhores sobre o mesmo crédito para garantir vários créditos
desde que haja notificação ao devedor cedido prevalecendo o penhor primeiramente
constituído.
3. Regime do penhor de créditos
Constituído o penhor, o autor é obrigado a entregar ao credor pignoratício os
documentos comprovativos desse direito que estiverem na sua posse caso não tenha um
interesse específico quanto à sua conservação, como resulta do art. 682.º CC. A entrega
destes documentos visa, essencialmente, uma função probatória do negócio celebrado,
assim como evitar eventuais fraudes por parte do devedor, nomeadamente a alienação do
direito empenhado. Sem os respetivos documentos afigura-se, efetivamente, mais difícil
dispor do direito empenhado. Assim, esta entrega não é essencial para a constituição ou
eficácia do penhor, se se constitui validamente mediante o acordo das partes, produzindo
os seus efeitos, no caso do penhor de créditos, com a notificação ou a aceitação do
devedor.
O incumprimento desta obrigação não afeta a validade ou eficácia do penhor,
apenas debilita a sua prova.
Sendo entregues, é o credor obrigado a guardar esses documentos nos termos do
art. 671.º al. a), ex vi, art. 679.º CC.
4. As relações entre o obrigado e o credor pignoratício
Nos termos do art. 684.º CC, “dado em penhor um direito por virtude do qual se
possa exigir uma prestação, as relações entre o obrigado e o credor pignoratício estão
sujeitas às disposições aplicáveis, na cessão de créditos, às relações entre o devedor e o
cessionário.” Ou seja, neste caso são aplicáveis os art. 583.º a 585.º CC:
• O penhor produz efeitos em relação ao devedor do crédito empenhado desde que
lhe seja notificado ou desde que este o aceite – art. 583.º n.º 1 CC;
• Se antes da notificação ou aceitação o devedor do crédito empenhado pagar ao
autor da garantia ou celebrar com ele algum negócio jurídico relativo ao crédito,
nenhum dos dois é oponível ao credor pignoratício se este provar que o devedor
tinha conhecimento do penhor – art. 583.º n.º 2 CC;
• Se o mesmo crédito for dado em garantia a várias pessoas, prevalece o penhor que
primeiro for notificado ao devedor ou que por este tenha sido aceite -art. 584.º
CC;
42
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
• Pode o devedor opor ao credor pignoratício todos os meios de defesa que lhe seria
lícito invocar contra o autor da garantia, exceto se posteriores ao conhecimento
do penhor – art. 585.º CC;
5. Os deveres do credor pignoratício
Nos termos do art. 683.º CC, “o credor pignoratício é obrigado a praticar os atos
indispensáveis à conservação do direito empenhado e a cobrar os juros e mais prestações
acessórias compreendidas na garantia”. Assim o é porque se se permitisse ao titular do
direito/autor do penhor a realização destes atos era possível que este causasse danos ao
credor pignoratício.
6. Extinção do penhor de crédito
Nos termos dos art. 679.º, o penhor extingue-se pelas mesmas causas que a
hipoteca exceto o caso previsto no art. 730.º al. b) CC.
Ver o que disse sobre o penhor de coisas.
7. A cobrança de crédito empenhado
Retira-se do n.º 1 e 4 do art. 685.º CC que o penhor retira ao seu autor a
legitimidade de, pelo menos por si só, receber a respetiva prestação sem o consentimento
do credor pignoratício. Assim, se o crédito empenhado não tiver por objeto coisa fungível
ou dinheiro, “o credor pignoratício deve cobrar o crédito empenhado logo que este se
torne exigível, passando o penhor a incidir sobre a coisa prestada em satisfação desse
crédito.” Assim, cobrado o crédito, há uma sub-rogação real passando o penhor a incidir
sobre a coisa prestada.
Nos termos do n.º 2, se “o crédito tiver por objeto a prestação de dinheiro ou de
outra coisa fungível, o devedor não pode fazê-la senão aos dois credores conjuntamente;
na falta de acordo entre os interessados, tem o obrigado a faculdade de usar da
consignação em depósito.” Assim, o poder de cobrar o crédito pertence em conjunto ao
seu titular e ao credor pignoratício podendo estes acordar o modo de exercício desse poder
devendo este ser respeitado se comunicado ao devedor do crédito. Se o mesmo não lhe
for comunicado, o devedor tem de fazer o pagamento a ambos. Na falta de acordo pode
o devedor consignar a prestação em depósito.
Por fim, decorre do n.º 3 que “se o mesmo crédito for objeto de vários penhores,
só o credor cujo direito prefira aos demais tem legitimidade para cobrar o crédito
empenhado; mas os outros têm a faculdade de compelir o devedor a satisfazer a prestação
ao credor preferente.”
43
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Penhor de participações sociais – o direito aos lucros só pode ser exercido pelo
credor pignoratício quando assim for convencionado pelas partes.
i. Crédito pignoratício e crédito empenhado
Penhor de créditos – estão em causa 2 créditos: o empenhado e o garantido. Aqui
é possível a existência de 3 situações:
• Crédito pignoratício vence antes do empenhado:
# Se o devedor do crédito pignoratício realizar a prestação extingue-se a garantia por força
do caráter acessório da garantia;
# Se o devedor incumprir o contrato então o credor pignoratício pode executar a
garantia – art. 675ª CC
• Crédito pignoratício vence ao mesmo tempo do empenhado;
# Se o devedor do crédito pignoratício não cumprir o devedor pode exigir o
cumprimento ao devedor do crédito empenhado extinguindo-se assim ambos os
créditos.
# Se a obrigação do crédito empenhado for exigível a todo o tempo e o devedor
pignoratício incumprir o credor deste pode recorrer ao crédito empenhado para
satisfazer o seu crédito- Ex: se o crédito empenhado for um crédito ao saldo de
uma conta à ordem.
• Crédito pignoratício vence após o vencimento do empenhado;
# O credor deve cobrar o crédito empenhado passando o penhor a incidir sobre a
coisa prestada – art. 685.º n.º 1 CC.
# Se a prestação for pecuniária não pode ser feita ao credor pignoratício mas a
ambos – art. 685.º n.º 2 CC. PESTANA VASCONSELOS defende que, havendo
acordo, pode a mesma ser realizada ao credor pignoratício mas nunca ao autor do
penhor (credor do direito empenhado). Assim, esta norma é supletiva.
ii. Cumprimento face ao credor pignoratício e ao autor do penhor
A consequência deste cumprimento não é a cessação do penhor pelo que as partes
devem atuar de forma a manter a garantia. Para tal devem depositar a quantia numa conta
bancária aberta em nome do devedor passando o penhor a incidir sobre esse crédito. A
instituição bancária deve ser notificada desse crédito – art. 681.º n.º 2 CC
44
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
45
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
46
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Sempre que se deva proceder à venda do bem objeto do penhor deve recorrer-se a
um corretor notificado o devedor – art. 401.º CCom. Esta norma suscitou algumas dúvidas
quanto a saber se estava a permitir a venda extrajudicial da coisa, como entende Rui Pinto,
ou se estava a consagrar uma modalidade específica de venda judicial como refere
Fazenda Martins. Parece no entanto que é a primeira solução que é adequada seguindo
assim o regime geral.
Pacto marciano – admissibilidade de acordo com o DL 75/2017 – o pacto
marciano já era admissível no CC pelo art. 675.º n.º 2 pelo que o DL em causa não inovou
nesse aspeto tendo apenas criado um processo especial que permita concretizar essa
faculdade como resulta do preâmbulo.
2. O penhor em garantia de créditos de estabelecimentos bancários
DL n.º 29833 – regula o penhor em garantia de créditos de estabelecimento
bancário:
• Art. 1.º – o penhor produz os seus efeitos, entre as partes e perante terceiros, sem
necessidade de entrega do bem empenhado.
• Art. 1.º 1.º Parágrafo – se o bem ficar na posse do dono este será considerado
possuidor em nome alheio sendo-lhe aplicável as penas de furto;
• Art. 2.º – o contrato terá de constar de documento autêntico ou autenticado sendo
o momento em que o mesmo for autenticado (ou celebrado no primeiro caso)
relevante para o início da produção dos seus efeitos;
• Figueiredo Dias entende que o art. 1.º 1.º e 2.º parágrafo foram revogados pelo CP
pelo que a tutela penal desaparece – esse artigo seria inconstitucional por violação
do princípio da proporcionalidade e da igualdade;
3. O penhor financeiro
i. Introdução
O penhor financeiro é uma modalidade de contratos de garantia financeira
regulado pelo DL n.º 105/2004 sendo uma modalidade especial de penhor sobre direitos.
Os contratos de garantia financeira têm duas modalidades: penhor financeiro e
alienação fiduciária em garantia.
47
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
ii. Requisitos
Para se estar perante um penhor financeiro é necessário preencher-se os requisitos
do DL como resulta do art. 2.º n.º 1:
1. Subjetivo – art. 3.º – o garante e o garantido têm de pertencer a uma das
categorias do elenco desta norma. Pode no entanto uma das partes ser uma
Pessoa Coletiva desde que a outra preencha uma das alíneas do artigo;
2. As obrigações garantidas têm de ter por objeto uma liquidação em
numerário, ou seja o cumprimento de uma obrigação financeira, ou a
entrega de instrumentos financeiros – art. 4.º. As obrigações garantidas
podem ser futuras ou condicionais – art. 2.º n.º 1 al. f) Diretiva;
3. A garantia prestada tem de ser um objeto numerário, na aceção de saldo
disponível numa conta bancária, ou instrumentos financeiros – art. 5.º;
4. O objeto dado em garantia tem de ser efetivamente prestado pelo que se
exige o desapossamento – art. 6.º;
5. O contrato de garantia financeira tem de ser suscetível de prova por
documento escrito ou forma juridicamente equivalente. Como refere
MENEZES CORDEIRO exige-se forma escrita para que o contrato seja
válido pelo que a exigência de forma não é uma forma ad probationem
como parece resultar da letra da lei – art. 7.º;
iii. Regime geral
a. O direito de disposição do objeto da garantia
As partes podem acordar que o credor pignoratício (beneficiário da garantia) tenha
direito a dispor do objeto desta podendo aliená-lo ou onerá-lo como se fosse seu
proprietário – art. 9.º DL.
Este direito tem vantagens para ambas as partes pois o autor do penhor receberá
uma quantia pecuniária em troca da atribuição dessa possibilidade e o credor poderá
recorrer a esse bem para o usar tornando-o em liquidez.
Se o credor pignoratício recorrer ao exercício desse direito terá que transferir uma
quantia equivalente, nos termos do art. 13.º DL, que substituía a garantia financeira
original – art. 10.º n.º 1 DL.
Tendo as partes acordado neste direito estamos perante, nas palavras de
MENEZES LEITÃO, um penhor financeiro com direito de disposição.
48
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
b. O close-out netting
As partes podem acordar o vencimento antecipado da obrigação de restituição do
credor pignoratício e o cumprimento da mesmo por compensação com o crédito da outra
parte contratual se ocorrer um facto que desencadeie a execução – art. 12.º n.º 1 e 2 DL
c. A execução da garantia
Art. 11.º n.º 1 DL – o credor deve poder escolher como forma de execução da
garantia entre a sua venda e apropriação, nos termos previstos na lei. No entanto só poderá
recorrer a esta última modalidade de execução se as parte tiverem convencionado essa
possibilidade.
A venda pode ser judicial ou extrajudicial tendo que se realizar de acordo com os
critérios comerciais razoáveis tendo a diferente entre o valor em dívida e o resultado da
venda ser restituído ao prestador da garantia – art. 11.º n.º 3 e 4 DL. O art. 11.º n.º 1 al.
b) DL não se aplica à modalidade da venda tendo que se fazer uma interpretação restritiva
da mesma.
A apropriação é admissível desde que convencionada pelas partes quanto à sua
admissibilidade – art. 11.º n.º 1 al. a) DL – e ainda quanto à avaliação do seu objeto –
art. 11.º n.º 1 al. b) DL. No entanto este último acordo não afasta a necessidade de
avaliação da garantia e cálculo das obrigações financeiras garantias de acordo com
critérios comerciais razoáveis – art. 11.º n.º 3 DL. O credor pignoratício que se aproprie
do objeto da garantia nestes termos fica obrigado a restituir ao autor do penhor a diferença
entre o valor do mesmo e o montante das obrigações financeiras garantidas – art. 11.º n.º
2 DL.
Execução do penhor que tenha por objeto créditos sobre terceiros – art. 11.º n.º 4
DL.
iv. A penhora em ação executiva dos bens empenhados
Uma questão que se levanta prende-se com saber se o bem empenhado pode ser
penhorado numa ação executiva interposta por outro credor do titular do bem onerado
pois a lei não trata a questão. Admitir essa possibilidade seria atentar contra a teleologia
deste regime que pretende assegurar de forma clara a sua execução sem que estejam
sujeitos a interferências de terceiros. Assim, se se protegem estes contratos na insolvência,
então também terão que ser protegidos na execução singular de forma a se assegurar
sempre a execução nos termos acordados. Estamos perante uma lacuna que deve ser
integrada nos termos referidos.
49
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
50
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Quem tenha uma quantia depositada num banco pode constituir um penhor sobre
o crédito à restituição dessa quantia a favor de terceiro ou mesmo do próprio banco. Neste
último caso o banco torna-se beneficiário de um penhor sobre um crédito que ele próprio
é devedor. Em caso de incumprimento o banco satisfaz-se pela própria quantia ai
depositada.
O depósito pode ser à ordem ou a prazo sendo que naquela caso normalmente
bloqueia-se a sua movimentação para que não haja um esvaziamento da garantia.
Se preenchidos os requisitos do DL n.º 105/2004 o penhor é financeiro pelo que
se aplica esse regime com duas ressalvas: não se aplica a proibição do pacto comissório
porque o facto de estar em causa dinheiro leva a que não se preencha os fundamentos da
proibição; o mecanismo de satisfação não é o mesmo podendo haver convenção das partes
no sentido da venda extrajudicial do objeto do penhor – art. 675.º n.º 1 in fine e 2 CC.
7. O penhor de participações sociais
i. Constituição
Art. 23.º n.º 3 CSC – segue as regras quanto à admissibilidade e forma de
transmissão das participações sociais entre vivos.
à Sociedades em nome coletivo – art. 182.º n.º 1 e 2 e 242.º-A CSC + 3.º als. e)
e f) CRCom – redução a escrito e consentimento expresso dos outros sócios;
à Sociedade por quotas – art. 228.º n.º 1 e 2 e 242.º-B CSC + 3.º als. e) e f)
CRCom – escrito particular e consentimento da sociedade a não ser que se realize entre
cônjuges, descendentes, ascendentes ou entre sócios;
à Sociedade anónima
# Ações escriturais – art. 81.º n.º 1 e 2 CVM;
# Ações tituladas – art. 103.º CVM;
a. Exercício dos direitos sociais
Empenhadas as ações ou quotas quem é que pode exercer os direitos sociais? As
obrigações face à sociedade continua a ser o sócio.
O art. 23.º n.º 4 CSC é supletivo pelo que embora seja em regra o autor da garantia
a exercer os direitos, as partes podem acordar outra regulação.
ii. O direito de voto
à Exercício cabe ao credor pignoratício – o exercício do mesmo estará regulado
no contrato de penhor ou, não o tendo sido, será regulado pelo princípio da boa-fé
atendendo ao fim do contrato (manutenção do valor da participação social como bem
transacional). O credor tem o direito à informação – art. 293.º CSC direta ou
51
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
52
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
53
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
à Embora este requisito não se verifique no penhor de créditos de bancos, o art. 1.º 1.º
Parágrafo admite ao devedor a alienação ou modificação do objeto do penhor pelo que
também lhe será permitido a substituição;
• Seria incoerente admitir um penhor rotativo quanto ao penhor financeiro e não
admiti-lo nos demais casos;
• Esta figura é admissível em Itália que tem normas semelhantes às nossas sendo
algumas até mais limitativas;
Requisitos:
• Convenção inicial da rotatividade do penhor;
• Determinação dos bens que irão ser substituídos que terão de ter o mesmo valor;
• Qual o critério para determinar o momento da alteração do objeto;
54
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
O direito de retenção
I. Introdução
O direito de retenção é um direito de garantia e um modo de compelir o devedor
a cumprir a obrigação consagrado em geral no art. 754.º CC e com um elenco amplo de
casos no art. 755.º CC. Pode ser definido como o direito que assiste ao devedor de recusar
a restituição de uma coisa até que o credor efetue uma prestação conexa com a sua
obrigação.
à Outro direito de retenção é o concedido ao achador da coisa – art. 1323.º n.º 4
CC;
O direito de retenção atribui também ao seu titular o direito a ser pago com
preferência pelo valor da coisa retida nos termos do art. 604.º n.º 1 CC.
II. Caracterização
O direito de retenção representa duas funções:
à Garantia – de origem legal;
à Coerciva – é um meio de compelir o devedor ao cumprimento através de uma
recusa lícita de cumprimento da obrigação de entrega de uma coisa que lhe pertence por
parte do credor que a tem em seu poder;
O objeto da garantia é a coisa retida e tem publicidade reduzida pois não está
sujeita a registo pelo que a mesma se limita à posse da coisa.
O titular do direito de retenção tem duas faculdades:
à Recusa lícita da entrega da coisa ao credor da entrega enquanto este não
cumprir a obrigação garantida – tem um caráter compulsório;
# O direito de retenção, neste contexto, constitui uma exceção dilatória de
direito material que permite ao retentor recusar-se licitamente a cumprir.
à Execução da coisa nos mesmos termos que um credor pignoratício ou
hipotecário consoante a coisa seja móvel ou imóvel – art. 758.º e 759.º CC – tendo assim
o direito a ser pago preferencialmente pelo produto da venda da coisa.
III. Requisitos constitutivos
A constituição do direito de retenção resulta do preenchimento da previsão legal
do art. 754.º CC ou da subsunção aos demais casos previstos na lei, como é exemplo o
art. 755.º CC que consagra uma conexão jurídica.
55
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
56
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
direito pois o empreiteiro poderia sempre munir-se de outras garantias fazendo constá-
las, se assim desejasse, do contrato de empreitada;
à A favor – maioria da doutrina, nomeadamente Calvão da Silva e, na
jurisprudência, Ac. STJ de 10/05/2011 (Gabriel Catarino), proc. n.º 661/07.0TBVCT-
A.G1.S1 in dgsi.pt– para que o empreiteiro realize a obra é necessário que incorra em
despesas seja em materiais como em salários. Neste sentido, as mesmas são despesas
feitas com a obra e por causa da obra pelo que preenche o pressuposto do art. 754.º CC.
Quanto ao argumento cronológico apontado por Antunes Varela este também não
prossegue na medida que o que se exige neste preceito é uma imputação objetiva dessa
despesa à coisa não relevando se a mesma resulta de melhoramentos, arranjos ou
demolições. Se tal fosse um requisito iria levar a uma discriminação entre as modalidades
da empreitada. Acresce por fim o facto de em lei especial – art. 25.º DL 201/98 – conferir
direito de retenção ao construtor do navio sendo este um claro caso de empreitada:
Para quem sufrague este último entendimento há ainda outro problema a resolver
– o direito de retenção limita-se às despesas realizadas ou cobre por inteiro o preço
incluindo assim o lucro?
à Ferrer Correia e Sousa Ribeiro – numa interpretação mais ligada à letra da lei
entendem que o direito de retenção apenas cobre as despesas efetivamente feitas para
custear a execução da obra ficando o restante do crédito sujeito ao regime comum.
à Pestana Vasconcelos e Calvão da Silva (na jurisprudência, Ac. STJ de
29/01/2014 (João Bernardo), proc. n.º 1407/09.3TBAMT.E1.S1 in dgsi.pt) –
entendem que o direito de retenção cobre todo o valor do crédito pois é esse o
entendimento nos demais contratos de prestação de serviços, veja-se os art. 1156.º e 755.º
n.º 1 al. c) e e) CC, não existindo qualquer motivo para entender noutro sentido. Acresce
que, como refere o acórdão, “importa sempre ter em conta a razão de ser garantística da
figura do direito de retenção. Visando tutelar o interesse do credor, em ordem a compelir
o devedor ao cumprimento e, concomitantemente, a considerar o crédito como
privilegiado, ficaria sem se compreender que deste se excluísse o motor que, não obstante
as ressalvas supra referidas, está na base da celebração dos contratos de empreitada.”
57
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
58
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
59
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
60
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
61
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
art. 604.º n.º 2 CC e também a todos aqueles que, após a sua constituição, venham a
adquirir outro direito real sobre a coisa retida, mas não já ao proprietário da coisa retida
que não seja o devedor do contra crédito conexo.
Nos termos do n.º 2 do art. 759.º CC, “o direito de retenção prevalece neste caso
sobre a hipoteca, ainda que esta tenha sido registada anteriormente”, consagrando-se
assim uma oponibilidade reforçada (derroga a regra da prioridade registal).
à Só não é assim nos casos de obrigações hipotecárias uma vez que resulta do
art. 3.º n.º 2 DL n.º 59/2006 que quanto a estes créditos as hipotecas prevalecem sobre os
privilégios creditórios imobiliários. Assim, tendo em conta que por força do art. 751.º CC
estes prevalecem sobre o direito de retenção, não faz sentido que estas hipotecas também
não prevaleçam sobre este.
O retentor de coisa imóvel é equiparado ao credor hipotecário, nos termos do art.
759.º n.º 3 CC, quanto à faculdade de executar a coisa retida e de ser pago com preferência
relativamente aos demais credores do devedor. como até ao momento da entrega da coisa
retida o retentor tem a detenção da coisa, são aplicáveis, quanto aos direitos e obrigações,
as regras do penhor com as necessárias alterações.
1. Transmissibilidade do direito de retenção
Nos termos do art. 760.º CC, “o direito de retenção não é transmissível sem que
seja transmitido o crédito que ela garante.” Assim, ao contrário do penhor (art. 676.º CC)
e da hipoteca (art. 727.º e ss CC), o direito de retenção não pode ser por si só transmitido,
sendo necessário para o efeito a cessão do crédito garantido.
Tendo em conta que o art. 582.º n.º 1 CC estabelece que “a cessão do crédito
importa a transmissão, para o cessionário, das garantias e outros acessórios do direito
transmitido, que não sejam inseparáveis da pessoa do cedente”, e o direito de retenção
pressupõe uma especial ligação entre o seu objeto e o crédito garantido, a maioria da
doutrina, sendo Menezes Leitão exemplo, tem entendido que a sua transmissão não é
automática tendo de haver também um acordo neste sentido. Para que haja transmissão
do direito de retenção é necessário que haja acordo nesse sentido e, nos termos do n.º 2
do mesmo artigo, que a coisa seja entregue.
2. Extinção do direito de retenção
Nos termos do art. 761.º CC, o direito de retenção extingue-se pelas mesmas
causas por que cessa o direito de hipoteca (art. 730.º a 732.º CC) e ainda pela entrega
voluntária da coisa.
62
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
à Extinção por confusão – embora não resulte da lei, tem-se entendido que só
pode extinguir-se por confusão quando a propriedade da coisa a reter é adquirida pelo
retentor. Se a aquisição for feita em ação executiva, Menezes Leitão entende que se deve
aplicar analogicamente o art. 724.º n.º 1 CC renascendo o direito de garantia e o seu
atendimento nos termos do art. 824.º n.º 2 CC;
Se a coisa for penhorada em ação executiva movida por outro credor do seu dono,
o retentor não pode recorrer aos embargos de terceiro podendo apenas intervir como
credor beneficiário da garantia real. Se o retentor não intervir na ação executiva o seu
direito extingue-se?
à Sim – Romano Martinez e Pires de Lima/Antunes Varela – todos os direitos de
garantia caducam com a venda executiva uma vez que a exceção do art. 824.º n.º 2 in fine
não se aplica a estes direitos;
à Não – Menezes Cordeiro – a exceção da parte final do art. 824.º n.º 2 CC
abrange os direitos reais de garantia que produzam efeitos perante terceiros
independentemente do registo;
VI. Regime insolvencial
Declarada a insolvência do dono da coisa, o retentor tem de entregar a coisa ao
administrador da insolvência pois esta entrega a massa insolvente – art. 46.º n.º 1 CIRE –
pelo que o administrador terá de a apreender – art. 149.º e 150.º CIRE. No entanto o seu
direito de garantia não se extingue pelo que terá de o exercer, reclamando-o, no processo
insolvencial – art. 47.º n.º 4 al. a) CIRE.
No concurso com outros credores garantidos aplicam-se as regras do penhor ou
da hipoteca, consoante seja um bem móvel ou imóvel – art. 758.º e 759.º CC – exceto
quanto às hipotecas anteriormente constituídas – art. 759.º n.º 2 CC
Liquidada a coisa garantida serão pagos os credores garantidos de acordo com a
sua prioridade sendo que se o retentor não vir o seu crédito totalmente pago verá o que
sobra incluído entre os créditos comuns – art. 174.º n.º 1 CIRE.
63
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Os privilégios creditórios
I. Introdução
Os privilégios creditórios são uma garantia especial, legal e oculta, que
consubstanciam uma causa de preferência no pagamento de determinados créditos dada
pela lei a certos credores nos termos do art. 733..º CC.
Nem todos os privilégios creditórios constituem garantias reais. Os privilégios
especiais são verdadeiros direitos reais gozando do direito de sequela enquanto os
privilégios gerais não o são sendo apenas garantias especiais das obrigações pois não
incidem sobre bens determinados nem gozam de sequela.
Os privilégios mais importantes são os atribuídos ao Estado e às autarquias
locais pelo pagamento dos impostos e à segurança social relativamente às contribuições.
II. Caracterização
Resultam obrigatoriamente da lei não podendo ser acordados pelas partes – art.
733.º CC.
Os privilégios creditórios tutelam o crédito e ainda os juros devidos dos últimos
2 anos – art. 734.º CC .
Podem ser mobiliários ou imobiliários dependendo se incidem sobre bens
móveis ou imóveis; e gerais ou especiais dependendo se incidem sobre um conjunto de
bens ou sobre um bem certo e determinado.
Têm algumas semelhanças com as hipotecas legais embora sejam diferentes:
à As hipotecas legais são sempre publicitadas e só se constituem com o registo;
os privilégios não têm publicidade e não estão sujeitos a registo.
à O objeto também difere pois enquanto as hipotecas legais incidem apenas
sobre bens imóveis ou móveis equiparados, os privilégios não têm qualquer limitação
quanto a este ponto.
à A hipoteca legal abrange os acessórios constantes do registo podendo incluir
os juros até 3 anos; os privilégios apenas abrangem os juros relativos aos 2 anos anteriores
se devidos,
à As hipotecas incidem sobre bens certos e determinados sendo sempre direito
reais enquanto que os privilégios gerais não incidem sobre bens determinados e ao são
garantias reais.
à A hipoteca é mais sólida que os privilégios imobiliários gerais mas cede
perante os especiais mesmo se for constituída anteriormente.
64
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
III. Espécies
Objeto
Imobiliários – incidem sobre bens
imóveis
→ No CC são sempre especiais – art.
735.º n.º 3 CC
Previlégios creditórios
Especiais – abrajem o valor
de determinados bens – art.
735.º n.º 2 in fine
Valor
IV. Elenco
1. Os privilégios mobiliários gerais
Estado e Autarquias Locais – art. 111.º CIRS e 116.º CIRC;
Segurança Social – art. 204.º n.º 1 CRCSPSS;
Trabalhadores – art. 333.º n.º 1 al. a) CT;
Devedor – art. 737.º n.º 1 CC + 98.º n.º 1 e 17.º-H CIRE;
2. Os privilégios imobiliários gerais
Art. 205.º CRCSPSS + 111.º IRS + 116.º IRC;
3. Os privilégios mobiliários especiais
Art. 738.º, 739.º, 741.º e 742.º CC + 47.º n.º 1 CIS;
4. Os privilégios imobiliários especiais
Art. 743.º e 744.º CC + 47.º n.º 1 CIS + 39.º CIM + 122.º n.º 1 CIMI + 333.º n.º
1 al. b) CT;
65
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
66
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
67
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
68
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
69
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
A penhora
70
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
71
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Consignação de rendimentos
I. Introdução
Na consignação de rendimentos, prevista nos art. 656.º a 665.º CC, o credor não
se satisfaz pelo valor de certos bens mas sim pelo rendimento de certos bens imóveis ou
móveis sujeitos a registo. Tal direito pode ser adquirido por acordo ou por decisão
judicial, sendo que os bens podem manter-se na posse do devedor ou passar para o poder
do credor ou de um terceiro. Não é necessário o incumprimento do contrato para o credor
garantido ir, através dos rendimentos, extinguindo parcialmente o seu crédito.
Nos termos do n.º 1 do art. 656.º CC, esta pode tutelar uma obrigação condicional
ou futura e, por força do seu n.º 2, pode limitar-se a garantir o crédito principal, abarcar
igualmente os juros ou só garantir a obrigação de pagamento deste últimos.
II. Legitimidade
Decorre do art. 657.º n.º 1 CC que “só tem legitimidade para constituir a
consignação quem puder dispor dos rendimentos consignados”, ou seja, não se exige que
o garante tenha poderes de disposição sobre os bens mas apenas sobre os rendimentos.
à Usufrutuário pode constituir esta garantia;
A consignação em depósito pode ser constituída pelo devedor ou por terceiro, daí
que o n.º 2 deste artigo determine que neste caso é aplicável o disposto no art. 717.º CC.
III. O objeto, a forma e a publicidade
O objeto da consignação, como estabelece o art. 656.º n.º 1 CC, é constituído por
rendimentos provenientes de bens imóveis ou móveis sujeitos a registo.
A forma do contrato vem estabelecida no n.º 1 do art. 660.º CC:
• Bens imóveis – escritura pública, documento particular autenticado ou
testamento;
• Bens móveis – escrito particular;
Em ambos os casos, impõe o n.º 2 a sujeição a registo “salvo se tiver por objeto
os rendimentos de títulos de crédito nominativos, devendo neste caso ser mencionada nos
títulos e averbada, nos termos da respetiva legislação.”
à A consignação voluntária é registada por inscrição cujo extrato deve referir o
prazo de duração ou, se for por tempo indeterminado, a quantia por cujo pagamento se
estabeleceu a garantia e a importância a descontar em cada ano, se tiver sido extipulada
uma quantia fixa (art. 2.º n.º 1 al. h) e 95.º n.º 1 al. p) CRPr);
72
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
73
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Se tiver sido estabelecido um prazo fixo releva interpretar a declaração das partes
de modo a se depreender que pretenderam ou não ver extinta a obrigação findo esse prazo
ainda que não tenha sido totalmente satisfeita.
VI. As modalidades
A lei distingue no art. 661.º n.º 1 CC três modalidades de consignação de
rendimentos consoante os bens cujos rendimentos são consignados permaneçam em
poder do concedente (al. a) , passem para o poder do credor (al. b) ou para o poder de
terceiro (al. c).
à Al. a) – “que continuem em poder do concedente os bens cujos rendimentos
são consignados;”
# Os rendimentos têm de ser entregues ao credor sendo que se não estiver
convencionado que este terá o direito a receber ao fim de cada período uma
importância fixa, pode exigir a prestação anual de contas por força do n.º 1 do art.
662.º CC (art. 941.º CPC);
à Al. b) – “que os bens passem para o poder do credor, o qual fica, na parte
aplicável, equiparado ao locatário, sem prejuízo da faculdade de por seu turno os locar;”
# Este contrato é de locação e não de sublocação, cessando nos termos do
art. 1051.º al. c) CC;
# Se o credor não locar os bens, dever-se-á estabelecer qual o montante
dos rendimentos periódicos a produzir por esses bens para se poder determinar o
montante da dívida que vai sendo abatido;
# Decorre do art. 663.º CC que o credor deverá administrar os bens como
um proprietário diligente e pagar as contribuições e demais encargos da coisa, só
se podendo liberar dessas obrigações através da renúncia à garantia, à qual se
aplica o art. 731.º CC;
# Incumprida a obrigação de entregar o bem ao credor, pode o credor
lançar mão da ação executiva para entrega de coisa certa;
# O autor da garantia tem o poder de exigir ao credor a prestação anual de
contas nos termos do n.º 2 do art. 662.º CC;
à Al. c) – “que os bens passem para o poder de terceiro, por título de locação ou
por outro, ficando o credor com o direito de receber os respetivos frutos”;
# O autor da garantia tem o poder de exigir ao credor a prestação anual de
contas nos termos do n.º 2 do art. 662.º CC;
74
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Em qualquer caso, decorre do n.º 2 do art. 661.º CC, “os frutos da coisa são
imputados primeiro nos juros, e só depois no capital, se a consignação garantir tanto o
capital como os juros.”
75
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
I. Fiança
II. Mandato de crédito
III. Aval
IV. Garantia autónoma
V. Cartas de conforto
VI. Seguro de crédito
VII. Seguro-caução
VIII. Solidariedade passiva
IX. Assunção cumulativa de dívida
A fiança
I. Introdução
A fiança é uma garantia pessoal típica regulada nos art. 627.º a 655.º CC que
consiste na situação pela qual uma pessoa se obriga, perante o credor, a cumprir uma
prestação devida por outra pessoa caso se verifiquem determinadas circunstâncias. Neste
sentido, ao património do devedor principal soma-se o património do fiador pelo que esta
consiste num incremento quantitativo da probabilidade de satisfação do crédito garantido.
Assim, há um alargamento quantitativo da massa de bens responsáveis pois, a par do
património do devedor, temos o património de um terceiro a responder pela dívida.
Nos termos do art. 627.º CC, o terceiro garante a satisfação do crédito, ficando
pessoalmente obrigado perante o credor.
à Discute-se na doutrina se esta situação implica a constituição de uma obrigação
própria do fiador ou se existe uma prestação única.
# Gomes da Silva entende que não pois defende que não é possível
configurar o fiador como verdadeiro devedor.
# No sentido oposto temos Menezes Leitão, Menezes Cordeiro e Pestana
Vasconcelos que entendem que o fiador constitui um verdadeiro devedor pois tem um
dever de prestar perante o credor ainda que a sua função seja apenas a de assegurar a
realização do pagamento pelo devedor.
76
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
77
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
78
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
79
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
80
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
ser tácita o que ocorre se por exemplo for prestada uma fiança com o
consentimento/conhecimento e sem oposição do devedor.
VI. Relações entre credor e fiador
Na situação jurídica de fiança temos uma obrigação entre o credor e o fiador que
está funcionalizada ao cumprimento da obrigação principal. Assim, quase todo o
conteúdo da fiança se traduz em relações entre o credor e o fiador, reguladas nos art. 634.º
a 643.º CC.
1. Meios de defesa do fiador
Decorre do art. 637.º n.º 1 CC que “além dos meios de defesa que lhe são próprios,
o fiador tem o direito de opor ao credor aqueles que competem ao devedor, salvo se forem
incompatíveis com a obrigação do fiador.”
São pelo menos dois os casos em que o fim da garantia da fiança justifica a
ressalva da incompatibilidade da obrigação do fiador com o meio de defesa próprio do
devedor, sendo eles:
• Falecendo o devedor principal, os herdeiros podem invocar a eventual exceção
material de insuficiência do património hereditário para pagar a dívida, mas o
fiador não o poderá fazer porque isso seria contrário ao fim da garantia da fiança;
• Ocorrendo insolvência do devedor, podem verificar-se situações como a
concordata entre o devedor e os credores que não pode ser invocada pelo fiador;
Meios de defesa do devedor invocáveis pelo fiador:
• Prescrição da obrigação principal – fiador é tido como terceiro para efeitos do art.
305.º n.º 1 CC;
• Exceção do não cumprimento;
• Nulidade e anulabilidade do negócio de que provém a obrigação garantida;
• Direito de retenção;
• Inexigibilidade do crédito principal;
• Moratória concedida pelo credor;
• Não verificação do termo ou condição da obrigação principal;
• Impossibilidade do cumprimento ou mora não imputável ao devedor;
• Extinção da obrigação principal por cumprimento, remissão, confusão...;
• Caso julgado entre credor e devedor favorável a este – art. 635.º n.º 1 CC;
• Abuso do direito;
• Caráter manifestamente excessivo da cláusula penal;
81
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
82
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
das coisas sobre as quais recaia uma garantia real. Consagra-se assim o beneficio da
excussão real prévia.
à Ratio – se a fiança foi prestada após a existência de garantias reais entende-se
que o mesmo sabia dessa condição e portanto só se pretendeu responsabilizar para os
montantes não cobertos pela execução do bem garantido;
Perda do benefício da excussão pessoal e real:
à Renúncia expressa ou tácita – o fiador pode ser demandado à ação executiva
em litisconsórcio com o devedor ou sozinho. Neste caso pode chamar o devedor à
demando através da intervenção provocada – art. 316.º CPC. Se não o fizer entende-se
que renunciou ao benefício da excussão a não ser que declare expressamente o contrário
– art. 641.º n.º 1 e 2 CC;
à Exclusão pela vontade das partes – art. 640.º CC;
à Se for uma obrigação comercial – art. 101.º CCom;
2. Caso julgado
Decorre do art. 635.º n.º 1 CC que “o caso julgado entre credor e devedor não é
oponível ao fiador” pois este não interveio no processo e, portanto, não teve a
possibilidade de aí se defender. Contudo pode fazer valer-se dele, a não ser que respeite
a circunstâncias pessoais do devedor que não excluam a responsabilidade do fiador.
à Casos de anulação do negócio principal pelos motivos contidos no art. 632.º
n.º 2 CC;
Por seu turno, nos termos do n.º 2 do art. 635.º CC “o caso julgado entre credor e
fiador aproveita ao devedor, desde que respeite à obrigação principal, mas não o prejudica
o caso julgado desfavorável.”
3. Prescrição
Ocorrendo a prescrição da obrigação principal, a mesma deixa de ser exigível em
Tribunal (art. 304.º n.º 1 CC) sendo tal facto um meio de defesa do fiador nos termos do
art. 637.º n.º 1 CC. No entanto, sendo a fiança uma obrigação paralela à obrigação
afiançada, é igualmente suscetível de prescrição.
Resulta do art. 636.º CC uma regra de autonomia das duas obrigações pois
consagrou-se a independência das prescrições relativamente às duas obrigações em causa,
atenuada quanto à interrupção face ao fiador. Ora, decorre da 2.ª Parte do seu n.º 1 que se
o credor interromper a prescrição em relação ao devedor e der conhecimento do facto ao
fiador, interrompe-se igualmente a prescrição contra este, a contar da comunicação.
83
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
84
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
O Código Civil prevê deveres de aviso entre o fiador e o devedor que são um
afloramento dos deveres de proteção e lealdade impostos pela boa-fé.
• Dever de aviso do fiador:
à Resulta do art. 645.º n.º 1 CC que o fiador que cumpra a obrigação deve avisar
o devedor desse cumprimento sob pena de, caso o devedor por erro também efetue
a prestação, perder o seu direito contra este. Se o fiador avisar o devedor do
cumprimento e este ainda assim efetuar a prestação, esta foi entregue a quem já
não é credor pelo que pode ser repetida, ou seja, pode o devedor exigir a sua
devolução nos termos do enriquecimento sem causa, por força do art. 476.º n.º 1
CC;
à Perdendo o direito de crédito adquirido por sub-rogação, tem o fiador direito a
exigir do credor a repetição da prestação por si realizada como se a mesma fosse
indevida nos termos do n.º 2 do art. 645.º CC;
• Dever de aviso do devedor:
à Decorre do art. 646.º CC que “o devedor que cumprir a obrigação deve avisar
o fiador, sob pena de responder pelo prejuízo que causar se culposamente não o
fizer”;
• Dever de aviso do credor:
à Também o credor tem deveres de aviso no caso de um dos devedores ter
cumprido e o outro se apresentar a cumprimento. Se não o fizer, haverá direito a
indemnização pelos prejuízos sofridos, incluindo-se os danos morais, por violação
direta da boa-fé nos termos do art. 762.º n.º 2 CC;
O fiador pode, nos casos estabelecidos nas várias alíneas do art. 648.º CC, exigir
a sua liberação (através do cumprimento pelo devedor da sua obrigação ou através de
qualquer meio alternativo de satisfação do crédito) ou a prestação de caução, de modo a
garantir o seu direito à eventual sub-rogação. A prestação de caução pode ocorrer por
qualquer dar formas do art. 623.º CC.
à Alguns autores, como Menezes Cordeiro, defendem a necessidade de um ajuste
interpretativo de modo a só se aplicar este preceito se entre o devedor e o fiador existir
uma relação que o justifique (por exemplo, um contrato ou pelo menos uma forte relação
de confiança, estando excluída nos casos em que o devedor não consentiu ou não soube
da prestação da fiança);
85
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
86
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
87
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
88
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
à Art. 654.º CC – se a obrigação afiançada for futura (art. 628.º n.º 2 CC) e
enquanto a mesma não se constituir, o fiador pode liberar-se da garantia se:
# 1.ª Parte – a situação patrimonial do devedor se agravar em termos de
pôr em risco os direitos eventuais do fiador contra este (direito previsto no art. 644.º CC)
– poder de liberação por justo motivo;
# 2.ª Parte – tiverem decorridos 5 anos sobre a prestação da fiança ou outro
prazo de convencionado – poder de liberação ad nutum;
à Art. 2.º Lei 6/2006 ou 655.º CC (se vigor aquando da celebração do contrato);
XI. Modalidades particulares da fiança
1. A subfiança
Decorre do art. 630.º CC que “subfiador é aquele que afiança o fiador perante o
credor”, ou seja, é aquele que garante ao credor o cumprimento do fiador. Embora o que
esteja em causa é uma garantia de cumprimento de outra garantia, substancialmente o
subfiador está a garantir o cumprimento pelo devedor principal. Assim, estabelece este
preceito a admissibilidade da subfiança.
À subfiança são aplicáveis com as devidas alterações o regime legal da fiança e o
seu regime especifico:
• O subfiador goza de um duplo benefício da excussão – art. 643.º CC – em relação
ao devedor principal e em relação ao fiador. Este não existe caso a obrigação seja
comercial ou se as partes acordarem o contrário;
• Havendo vários fiadores e um deles tiver um subfiador, em princípio a
responsabilidade deste é apenas perante o credor e não perante os demais fiadores
nos termos do art. 650.º n.º 4 CC;
• Se o subfiador for demandado e cumprir, adquire o crédito principal por sub-
rogação mantendo-se o mesmo garantido por fiança – art. 582.º ex vi 594.º CC;
• Se o devedor cumprir, a fiança e subfiança extinguem-se. Se for o fiador a
cumprir, adquire o crédito por sub-rogação face ao devedor – art. 644.º CC – e a
subfiança extingue-se;
2. A retrofiança
Não está prevista diretamente na lei, sendo admissível por força da autonomia
privada nos termos do art. 405.º CC, e consiste na fiança do crédito que o fiador que
cumpre a obrigação garantida adquire por sub-rogação face ao devedor. Ou seja, esta é
89
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
prestada por terceiro a favor do fiador, na qualidade de potencial sub-rogado nos direitos
do credor a quem tenha satisfeito o crédito.
Em suma, na retrofiança o fiador assegura o crédito adquirido por sub-rogação
nos termos do art. 644.º CC, pelo que se destina a tutelar a posição do fiador no caso de
ter de cumprir a obrigação garantida através da transmissão do risco de incumprimento
ou de insolvência do devedor principal para terceiro.
A esta aplica-se também o regime da fiança.
3. A fiança geral ou omnibus
Estamos perante uma fiança geral quando o fiador garante um conjunto de dívidas
do devedor, presentes e/ou futuras, que não se encontrem logo fixadas. Esta figura emerge
da prática bancária sendo o credor e beneficiário desta um banco e é também
frequentemente utilizada pelos sócios, gerentes ou administradores como forma de
financiamento da sociedade.
A questão que se tem levantado quanto a este assunto é se a garantia prestada
nestes moldes não é nula por indeterminabilidade do seu objeto (obrigações garantidas)
nos termos do art. 280.º CC, especialmente quanto às obrigações futuras. Isto releva uma
vez que nestes casos não é possível aplicar o art. 400.º CC quando não seja fornecido um
critério para a determinação do objeto.
Embora seja certo que a lei permite a fiança de obrigação futura, podendo aliás
garantir mais do que um através de uma interpretação extensiva do art. 628.º n.º 2 CC, é
necessário que estas obrigações sejam determináveis, ou seja, exige-se a fixação de um
critério que permita ao fiador estimar nesse momento a responsabilidade futura em que
corre o risco de incorrer ou que lhe permita delimitar a extensão da própria
responsabilidade (permitir que seja o fiador a controlar a constituição das obrigações
garantidas do devedor face aquele credor. Ex: sócio gerente da sociedade ou sócio único).
Foi o decidido no Ac. STJ de UJ n.º 4/2001 que fixou jurisprudência no sentido
de ser “nula por indeterminabilidade do seu objeto, a fiança da obrigações futuras, quando
o fiador se constitua garante de todas as responsabilidades provenientes de qualquer
operação em direito consentida, sem menção expressa da sua origem ou natureza e
independentemente da qualidade em que o afiançado intervenha.”
Os critérios que podem ser utilizados são: existência de limites temporais,
quantitativos (teto máximo), indicação das fontes das obrigações afiançadas. Às vezes é
necessário a articulação de mais do que um dos critérios para que se possa concluir que,
90
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
91
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Uma vez que esta cláusula é um perigo para o fiador, são poucos os casos reais
em que a mesma é estipulada e quando o seja exige-se um especial dever de informação
nos termos do art. 6.º CCG.
Embora seja clara a sua admissibilidade, questiona-se se a ser acordada pelas
partes, se ainda se está perante uma fiança ou uma figura atípica.
• A cláusula é compatível com a fiança pelo que ainda se configura como uma –
Mónica Jardim – o fiador não responde de forma mais gravosa pois tem sempre a
possibilidade de posteriormente opor ao credor os meios de defesa que num
primeiro momento lhe foram vedados.
• Contra – Januário da Costa Gomes – uma vez que se afasta a acessoriedade num
momento em que o fiador é chamado a responder, este responde autonomamente
sob pena de sofrer as consequências do incumprimento contratual mesmo que
decida não o fazer por ter ao seu dispor meios de defesa que à partida o
permitissem negar o cumprimento. Assim, tem de se concluir que responde de
forma mais gravosa que o devedor principal pelo que se afasta do art. 631.º n.º 1
CC. Assim, a fiança à primeira solicitação é uma figura intermédia entre a fiança
e a garantia autónoma automática à qual se aplica o regime desta na primeira fase
e daquela na segunda dentro do possível.
5. O regime insolvencial
i. Insolvência do devedor
O fiador cumpriu a obrigação anteriormente?
à Sim – fica sub-rogado no direito do credor – art. 644.º CC – pelo que o tem de
reclamar o crédito;
à Não – o fiador pode reclamar em processo de insolvência o seu direito contra
o devedor decorrente de um pagamento futuro da dívida, como crédito sob condição
suspensiva – art. 95.º n.º 2 CIRE. No entanto só o poderá fazer se o próprio credor não o
reclamar;
ii. Insolvência do fiador e do devedor
O credor poderá concorrer pela totalidade do seu crédito a cada uma das massas
insolventes, mas o somatório das quantias que receber de ambas não pode exceder o
montante do seu crédito – art. 95.º n.º 1 CIRE.
iii. Insolvência do fiador
A fiança pode estar sujeita à resolução condicional do art. 121.º CIRE tendo que
estar preenchida a al. d) do mesmo. Este regime vale para a subfiança.
92
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Mandato de crédito
O art. 629.º CC prevê a figura do chamado mandato de crédito que mais não é que
o contrato no qual um sujeito encarrega outrem de conceder crédito a um terceiro, em
nome e por conta própria. Se este encargo for aceite conclui-se o contrato, fincando o
mandante responsável como fiador perante a contraparte que assume o encargo de
conceder o crédito relativamente à futura obrigação derivada dessa concessão (n.º 1) e
regulando alguns aspetos do contrato (n.º 2 e 3). O mandatário fica vinculado a conceder
o crédito e, para contrabalançar essa obrigação, a lei, se as partes não estipularem o
contrário, constitui-o beneficiário de uma garantia fidejussória contra o mandante,
supostamente interessado na concessão do crédito.
Discute-se se a fiança surge assim que haja contrato de mandato, ou seja, assim
que o mandatário assuma a obrigação de conceder o crédito, ou se só quando o mesmo é
concedido. Parece que a solução mais adequada é a de entender que a fiança se constitui
com a celebração do contrato de mandato de crédito sendo inicialmente uma fiança de
obrigação futura até que o crédito seja efetivamente concedido, caso em que se transforma
em fiança de obrigação presente.
Decorre do n.º 2 do mesmo preceito que “o autor do encargo tem a faculdade de
revogar o mandato enquanto o crédito não for concedido, assim como a todo o tempo o
pode denunciar, sem prejuízo da responsabilidade pelos danos que haja causado.” Ou
seja, dispõe-se que:
• O encargo é revogável pelo seu autor enquanto o crédito não for concedido;
• Que é denunciável a todo o tempo;
• E que, ocorrendo a denúncia, o seu autor responde pelos danos que desse modo
tenha causado;
O n.º 3 respeita à posição do mandatário ou encarregado de conceder o crédito,
estabelecendo que é-lhe licito “recusar o cumprimento do encargo, sempre que a situação
patrimonial dos outros contraentes ponha em risco o seu futuro direito.” Há quem entenda
que a insuficiência patrimonial tem de ser objetivamente superveniente porquanto tem o
mandatário o dever de se informar não podendo valer-se da sua falta de diligencia para
recusar o cumprimento do encargo assumido, e quem considere que está igualmente
abrangida por esta previsão legal a superveniência subjetiva.
93
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Aval
O aval é uma garantia que aparece ligada às obrigações cartulares. Aquele que
presta o aval garante dessa forma, no todo ou em parte, o cumprimento da obrigação de
um determinado obrigado. A sua fonte é um negócio jurídico unilateral.
Trata-se de uma garantia que surge no âmbito dos títulos de crédito sendo regulada
nos art. 30.º a 32.º e 77.º LULL e 25.º a 27.º LUCh.
O aval pode ser dado por terceiro ou por um signatário da letra (art. 30.º LULL).
Forma – é escrito na própria letra ou numa folha anexa e exprime-se pela fórmula
“bom para aval” ou outra equivalente, sendo assinado pelo seu dador (art. 31.º I e II
LULL).
O aval considera-se como resultando da simples assinatura do dador aposta na
face anterior da letra, a não ser que se trate das assinaturas do sacado ou do sacador (art.
31.º III LULL).
Deve ser indicada a pessoa por quem se dá o aval sendo que, na sua falta entende-
se que é dado pelo sacador (art. 31.º IV LULL) ou pelo subscritor da livrança (art. 77.º
LULL).
O avalista responde da mesma maneira da pessoa por ele afiançada (art. 32.º
LULL), tendo a sua obrigação o conteúdo e extensão da obrigação do avalizado. No
entanto ele sobrevive independentemente da obrigação garantida, se esta for nula, exceto
nos casos em que a nulidade seja determinada por vício de forma (art. 32.º II LULL).
O avalista que cumpre fica sub-rogado nos direitos emergentes da letra, não só
contra o avalizado mas igualmente contra os obrigados para com este em virtude da letra
(art. 32.º III LULL). Além disso, o avalista não pode opor ao demandante o benefício da
excussão, respondendo solidariamente com o avalizado (art. 47.º I LULL).
I. O aval geral
Diz-se que estamos perante um aval geral quando a obrigação cartular garantida
não foi ainda determinada. Com efeito, emite-se um título de crédito sem que seja
determinado o montante da obrigação, a data da emissão, a época e o lugar do pagamento.
Esta figura, além de constituir uma garantia pessoal das obrigações especialmente
útil para os bancos, porque dotada de um flexibilidade que lhe permite cobrir diversos
negócios de crédito concluídos entre as partes, constitui igualmente um forte instrumento
de pressão sobre os gerentes/administradores da sociedade no que toca à gestão a realizar.
94
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
95
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Garantia autónoma
I. Introdução
Estamos perante uma garantia autónoma em regra prestada por um banco quando
o garante assume pessoalmente o cumprimento de uma obrigação assumida por um
terceiro decorrente de um outro contrato independentemente da validade ou eficácia dessa
obrigação garantida e dos meios de defesa que lhe possam ser opostos. Assim, verificados
os factos acordados pelas partes no contrato base, o garante terá de cumprir a obrigação
garantida podendo opor apenas os meios de defesa próprios da relação do credor e do
garante (contrato de garantia).
Esta figura não se encontra prevista na lei pelo que a sua admissibilidade resulta
do art. 405.º CC.
II. A estrutura da operação
Na garantia autónoma podemos distinguir três relações contratuais entre sujeitos
distintos:
• Contrato-base – pode ser de compra e venda, de empreitada, de fornecimento,
entre outros – é aquele que constitui a obrigação garantida sendo celebrado entre
o credor e o devedor e estabelece a relação de atribuição;
• Contrato de cobertura – contrato entre o devedor e o garante (geralmente um
banco) mediante o qual este se vincula, mediante uma remuneração, a celebrar
com o credor do primeiro contrato um contrato de garantia autónoma. Este
contrato é um mandato pois o mandante (banco) se obriga a praticar um ato em
nome próprio por conta do ordenante (devedor);
• Contrato de garantia autónoma – celebrado entre o garante e o credor do qual o
primeiro, emitindo o competente título, se obriga a pagar o montante
convencionado estabelecendo a relação de execução.
III. O contrato da garantia autónoma em si
É neste contrato que se define o valor da garantia prestada, as condições em que a
mesma é prestada, a sua extensão e o condicionalismo que o credor tem de adotar para a
exercer. É um contrato unilateral do qual só nasce obrigações para o garante.
Qual a forma exigida?
• Menezes Leitão – forma escrita devido ao risco corrido pelo garante;
• Romano Martinez– como é um negócio atípico aplica-se a liberdade de forma
prevista no art. 219.º CC
96
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Não se trata de um negócio abstrato mas sim causal na medida em que tem como
finalidade assegurar uma obrigação emergente de um outro contrato que lhe serve de base
pelo que essa é a sua causa.
IV. Modalidades
1. Quanto à garantia em si
Distingue-se entre garantia autónoma simples e à primeira solicitação:
• Simples – aquela em que o beneficiário só pode exigir o pagamento da quantia
garantida desde que prove o facto constitutivo do seu direito.
• On first demand – o garante deve pagar desde logo, face ao mero pedido do
beneficiário não tendo sequer tal pedido de ser justificado ou fundamentado.
Assim, mal o pedido seja feito nos termos acordados no contrato, o garante tem
de cumprir imediatamente.
2. Quanto à obrigação garantida
A doutrina tem dividido entre:
• Garantia relativa a uma oferta – feita uma oferta de contrato, o proponente oferece
uma garantia de manutenção da mesma, mesmo em caso de ela ser retirada pelo
proponente;
• Garantia de boa execução – destinam-se a garantir o adequado cumprimento de
uma obrigação;
• Garantia de reembolso – destinam-se a assegurar o reembolso de determinadas
quantias que vierem a ser dispensadas pelo beneficiário;
• Garantia de retenção – destinam-se a assegurar ao exportador o pagamento
integral do preço acordado mesmo perante uma situação de retenção parcial
efetuada pelo adquirente;
V. A autonomia
A autonomia, em contrapartida à acessoriedade, significa que a obrigação do
garante não se molda na obrigação garantida e é independente desta não sendo afetada
pelas suas vicissitudes. Neste sentido, o garante não pode opor ao credor quaisquer meios
de defesa que advenham da relação base de onde emerge a obrigação garantida.
Acresce que a obrigação do garante não tem o mesmo conteúdo que a obrigação
do devedor pois aquela é necessariamente uma prestação pecuniária e esta pode não o ser.
97
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
98
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
As cartas de conforto
I. Introdução
As cartas de conforto são uma modalidade de garantias recente. Numa formulação
bastante geral, sempre se poderá dizer que consistem em declarações de um ente que, de
uma forma mais ou menos intensa, procura que seja concedido crédito a um terceiro,
manifestando determinadas intenções face ao creditado, ou mesmo assumindo
determinadas obrigações perante o creditante, de maneira a “confortá- lo”, ou seja, a, de
alguma forma, incrementar a sua expetativa de que as obrigações do creditado serão
cumpridas.
Como esclarece o Ac. TRL de 09/06/2017 (Maria Teresa Pardal), proc. n.º 916-
14.7TVLSB.L1-6 in dgsi.pt estas “são documentos atípicos, não previstos na lei, que,
como o nome indica, se destinam a tranquilizar uma instituição de crédito no sentido do
cumprimento das obrigações de uma entidade que beneficie do crédito dessa instituição
e são subscritos por outra entidade que tem interesses junto da beneficiária. A carta de
conforto apenas constituirá uma garantia pessoal se contiver uma obrigação de resultado
por parte da entidade subscritora, em que esta se responsabiliza expressamente pelo
pagamento da obrigação.”
Em regra surgem nas relações societárias em que a sociedade mãe procura que
seja concedido crédito à sociedade filha, enviando ao creditante, normalmente um banco,
uma declaração que pode ir de uma simples declaração de que toma conhecimento do
crédito, passando por um compromisso de manter a sua participação social na creditada
e vigiar os negócios desta, a responsabilizar-se mesmo pelo incumprimento da outra
sociedade.
Ainda que anteriormente se levantasse a questão da juridicidade das cartas de
conforto, havendo quem entendesse que em causa estariam meros acordos de cavalheiros,
atualmente é consensual que estão em causa verdadeiros negócios jurídicos uma vez que
deles resultam compromissos assumidos por uma parte, validamente aceites pela outra.
Uma questão que se levante é a de saber se as cartas de conforto têm natureza
unilateral ou contratual uma vez que a ser afirmada a sua unilateralidade, levantam-se
sérias dificuldades no nosso ordenamento, uma vez que o art. 457.º CC só admite os
negócios jurídicos unilaterais constitutivos de obrigações nos casos previstos na lei. O
que aqui não sucederia.
99
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Contudo, entende-se que estas, ainda que resultem de um papel assinado apenas
pelo seu remetente, são verdadeiros contratos estando dependentes da aceitação do seu
beneficiário, podendo a mesma ser tácita nos termos do art. 234.º CC.
II. Modalidades
O valor e a eficácia jurídica das cartas de conforto depende do sentido das
declarações concretamente feitas por quem as subscreve, ou seja, trata-se,
fundamentalmente, de um problema de interpretação e até de integração negocial.
Como explica o Ac. STJ de 08/02/2018 (Rosa Tching), proc. n.º
1194/14.3TVLSB.L1.S2 in dgsi.pt, as cartas de conforto distinguem-se, no que concerne
ao seu conteúdo, entre fracas, médias ou fortes.
1. Fracas
“As cartas de conforto fracas apresentam um conteúdo meramente informativo:
comportam, nomeadamente declarações da patrocinante relativas ao conhecimento que
tem do crédito a conceder à patrocinada, à sua participação social na patrocinada, à
situação empresarial desta e à política do grupo em que ambas se inserem. (...)
Segundo o Acórdão do STJ, de 05.05.2016 (revista nº 3798/13. 2TBBRG.G2.S1),
nelas há uma concessão de informações e um dever genérico de diligência. E porque
assim é, a sua subscrição pode gerar responsabilidade para o emitente – nos termos do
art. 485.º CC, no caso de não serem fidedignas as informações delas constantes; nos casos
de culpa in contrahendo (art. 227.º CC); ou de ser identificado um venire contra factum
proprium (art. 334º CC).”
Estas não são garantias pessoais.
2. Médias
“Nas cartas de conforto médias, para além do conteúdo informativo, que nalguns
casos pode até nem existir, o elemento característico é a vinculação da patrocinante a
atuações instrumentais dotadas de incidência na patrocinada, como por exemplo medidas
de acompanhamento ou vigilância, de refinanciamento, de angariação de clientes, de
influência ou empenho, de manutenção da participação social, respondendo o
patrocinante pelo não cumprimento dos seus deveres instrumentais, assumidos no
propósito de acautelar a posição do credor.”
Pestana Vasconcelos entende que assume neste grupo de casos uma obrigação de
meios, traduzida na realização dos melhores esforços, tanto na vigilância da sociedade
filha, como numa sã gestão dos negócios desta, para que a patrocinada esteja em
condições de cumprir as obrigações decorrentes do contrato de crédito. Essa obrigação
100
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
101
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Não há, por isso, dúvidas que nas cartas de conforto forte estamos mesmo perante
verdadeiras garantias pessoais em sentido estrito, quer atípicas, quer, por vezes, típicas.
102
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
O seguro de crédito
I. Introdução
Esta figura consiste num contrato celebrado entre um segurador e um credor
destinado a cobrir os riscos previstos no contrato, essencialmente de falta ou atraso no
cumprimento da obrigação. Assim, o risco é parcialmente transferido para a seguradora
que recebe como contrapartida prémios pagos pelo segurado.
No conteúdo deste contrato resultam ainda deveres de informação da parte da
seguradora quanto aos terceiros que o segurado se propõe a contratar.
II. Caracterização
O contrato de seguro de crédito é um contrato nominado e típico regulado pelo
DL n.º 183/88 e pelo RJCS. É celebrado entre o credor e o segurador – art. 9.º n.º 1 DL
– que visa cobrir determinados riscos previstos no art. 3.º DL fixados pelas partes.
O segurador obriga-se a indemnizar o credor caso se verifique o evento previsto
pelos contraentes – art. 99.º RJCS. Fazendo-o, fica sub-rogado nos direitos do credor na
medida do montante que pagou – art. 136.º n.º 1 e 165.º n.º 1 RJCS
Nunca é assegurado a totalidade do crédito mas sempre apenas uma percentagem
a estabelecer pelo segurador, exigindo-se um descoberto obrigatório – art. 5.º n.º 1 DL.
Assim o é para que o assegurado corra parte do risco de modo a manter o interesse pelo
destino do crédito.
O segurador por fixar na apólice limites máximos para os montantes
indemnizáveis – art. 5.º n.º n.º 3 DL.
Não são indemnizáveis os lucros cessantes nem os danos não patrimoniais – art.
12.º DL.
Em contrapartida do risco que o segurador corre, tem direito a uma
contraprestação pelo segurado que são os prémios – art. 11.º DL.
III. Modalidades
A lei distingue três modalidades de seguro de crédito:
• Seguro de crédito de exportação de bens e serviços – art. 1.º n.º 2 DL;
• Seguro de crédito no mercado interno – art. 1.º n.º 3 DL;
• Seguro de créditos financeiros – art. 1.º n.º 4 DL;
103
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
IV. Riscos
A lei elenca, no art. 3.º n.º 1 DL, os riscos que podem ser cobertos por este contrato
dividindo-os em quatro grupos:
• Art. 3.º n.º 1 al. c) DL – falta ou atraso no pagamento dos montantes devidos ao
credor. Pode tratar-se de mora ou já de incumprimento definitivo, total ou parcial;
• Art. 3.º n.º 1 al. b) DL – suspensão ou revogação da encomenda ou resolução
arbitrária do contrato pelo devedor na fase anterior à da constituição do crédito;
• Art. 3.º n.º 1 al. a) DL – despesas realizadas com iniciativas de expansão
internacional de uma empresa que não venham a ser amortizadas;
• Art. 3.º n.º 1 al. d) e e) DL – risco cambiário e de alteração dos custos de produção;
Por fim os riscos cobertos podem ser comerciais, se resultarem de dificuldades de
ordem financeira ou qualquer outra ordem ligada ao devedor, ou políticas, se resultarem
de atos ou decisões do governo ou de causas naturais, guerras ou revoluções. Estes
últimos trazem uma vantagem para os seguradores pois beneficiam de uma garantia do
Estado – art. 15.º n.º 1 DL.
V. O sinistro
O sinistro consiste no facto baseado no risco e suscetível de acionar o seguro. O
art. 4.º DL elenca um conjunto de factos geradores do sinistro cabendo às partes
determinar no contrato qual o que desencadeará o dever de pagar a indemnização.
VI. Distinção da fiança
No seguro de crédito visa-se indemnizar o dano sofrido pelo credor em resultado
de um sinistro ainda que apenas parcialmente. Na fiança o que se pretende é que o fiador
cumpra a obrigação do afiançado constituindo-se para si uma obrigação de conteúdo
idêntico.
VII. Acessoriedade ou autonomia
Questiona-se se o seguro de crédito é acessório da obrigação assegurada ou
autónomo desta.
À partida ambos os modelos são admissíveis dependendo daquilo que for
acordado pelas partes. Se não se conseguir perceber do contrato entende-se que é uma
obrigação acessória pois trata-se de uma garantia pessoal pelo que deve seguir o regime
daquela que é tipificada na lei que é a fiança.
104
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
105
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Seguro-caução
I. Caracterização
Seguro-caução consiste num contrato concluído entre um devedor e um segurador
a favor de um credor pelo qual o segurador se obriga a indemnizar o segurado pelos danos
patrimoniais sofridos em caso de incumprimento ou mora do tomador do seguro – art.
162.º RJCS. A obrigação pode ser futura.
É um contrato nominado, típico pois regulado pelo DL n.º 183/88 e bilateral cujas
partes são o segurador e o tomador do seguro – art. 9.º n.º 2 DL.
Estamos perante um contrato a favor de terceiro pois do contrato estabelecido
entre o tomador do seguro e o segurador, nasce de imediato um direito para terceiro.
A lei admite duas modalidades – seguro de caução direta e indireta – art. 1.º n.º 5
DL. No entanto não as define. Seguindo a doutrina, é direta se é o próprio segurador que
presta a caução e indireta se o segurador assegura um terceiro.
II. Estrutura e regime
Embora seja um contrato bilateral, este estabelece uma relação entre três sujeitos:
as partes e o beneficiário e pressupõe a celebração de um outro contrato entre o tomador
de seguro e o beneficiário do mesmo do qual emerge o crédito objeto do contrato de
seguro.
Do contrato de seguro resulta a atribuição a um terceiro o direito a ser
indemnizado pelo segurador se o risco que pode ter por objeto se verificar – art. 6.º n.º 1
DL e 162.º RJCS. Em contrapartida o tomador do seguro obriga-se a realizar uma
prestação à seguradora que consiste nos prémios.
106
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Pode ser oposta uma cláusula de inoponibilidade – art. 11.º DL. Se não for
convencionada – art. 164.º n.º 1 RJCS.
III. Regime insolvencial
Insolvência do tomador de seguro – o beneficiário pode exigir que o segurador o
indemnize que, fazendo-o, adquire um direito de crédito perante o tomador do seguro que
terá de fazer valer em sede insolvencial. O crédito será comum ou garantido consoante o
segurador tenha ou não exigido a prestação de uma garantia cujo objeto fosse esse crédito
eventual.
Insolvência do beneficiário – o seguro mantém-se – art. 98.º n.º 1 CIRE – pelo que
verificando-se o sinistro o crédito indemnizatório face ao segurador integrará a massa
insolvente e poderá ser feito valer pelo administrador da insolvência.
107
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Solidariedade passiva
I. Introdução
Na prática contratual, o recurso à solidariedade passiva consiste num instrumento
bastante utilizado para responsabilizar duas pessoas pela mesma dívida. Tal acontece
muitas vezes com os cônjuges, em que que se condiciona a celebração do contrato à
intervenção de ambos. Assim, a solidariedade é imperfeita pois ainda que haja dois
devedores, na relação entre estes há apenas um.
II. Regime geral da solidariedade passiva
A obrigação pode ser:
• Parciária – devedores só respondem perante o credor por uma parte da dívida;
• Solidária – cada um dos devedores responde pela totalidade da dívida;
à Nas relações internas, entre os devedores, cada um só responde pela sua
quota da prestação que se presumem iguais nos termos do art. 516.º CC, pelo que tendo
o credor exigido o pagamento total da dívida deve estar ser paga tendo depois o direito
de regresso sobre os demais devedores de acordo com o art. 524.º CC;
III. Adaptação do regime para efeito de constituição de uma garantia pessoal
O credor tem interesse em que a dívida tenha mais do que um codevedor
solidariamente obrigado pois aumenta assim a sua possibilidade de ver o seu crédito
ressarcido.
Assim, ao exigir que um terceiro também se obrigue solidariamente com o
pretenso devedor, estará a utilizar a solidariedade passiva como uma garantia pessoal na
medida em que o devedor que será adicionado desempenhará uma função de garante
porquanto nas relações internas dos devedores só um se encontra verdadeiramente
obrigado.
108
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
I. Introdução
Na assunção cumulativa de dívida um sujeito celebra um contrato com o credor
ou com o antigo devedor ratificado pelo credor, através do qual se coloca ao lado do
primitivo devedor, sem o exonerar, ficando obrigado solidariamente com este no
cumprimento da obrigação.
Esta figura, regulada no âmbito da transmissão singular de dívidas, pode
desempenhar uma função de garantia pois a par do património do primitivo devedor, há
outro que também responde pela dívida.
II. Regime geral da transmissão singular de dívidas
1. Fonte contratual
Nos termos do art. 595.º n.º 1 CC, a transmissão singular de dívidas pode ocorrer
de duas formas:
• Al. a) – “por contrato entre o antigo e novo devedor, ratificado pelo credor;”
• Al. b) – “por contrato entre o novo devedor e o credor, com ou sem consentimento
do antigo devedor”;
Ainda que a lei não o preveja, a transmissão de dívida pode ainda resultar, ao
abrigo da liberdade contratual estabelecida no art. 405.º CC, de contrato em que
intervenham em simultâneo o antigo devedor, o credor e um terceiro que assume a dívida.
No caso de a transmissão da dívida resultar de contrato entre o antigo e o novo
devedor (al. a), ainda que esteja em causa uma assunção cumulativa, determina o art.
596.º n.º 1 CC que “enquanto não for ratificado pelo credor, podem as partes distratar o
contrato.” Esta ratificação pode ser expressa ou tácita, valendo como tal a interpelação do
novo devedor para cumprimento.
Determina o seu n.º 2 que quer o antigo quer o novo devedor têm “o direito de
fixar ao credor um prazo para a ratificação, findo o qual esta se considera recusada.” Este
prazo pode ser fixado extrajudicialmente ou em juízo através do recurso ao processo
especial regulado nos art. 1026.º e 1027.º CPC.
A ratificação tem efeitos retroativos, no entanto não é consensual o alcance desta
retroatividade.
• Há quem entenda que é plena pelo que ficam afetados também os atos
conservatórios do crédito praticados perante o devedor primitivo durante o
período de tempo entre a celebração do contrato de transmissão de dívida e a
109
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
110
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
111
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
112
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Locação-venda
I. Introdução
A locação-venda insere-se num conjunto de contratos típicos em que uma das
partes conserva na sua esfera a propriedade do bem que a outra passa a gozar e, neste
caso, adquire com o pagamento da última prestação.
Esta vem definida no art. 936.º n.º 2 CC como o contrato pelo qual se dá em
locação uma coisa com a cláusula de que ela se tornará propriedade do locatário depois
de satisfeitas todas as rendas ou alugueres pactuados.
Podem ser objeto deste contrato todos os bens que possam ser objeto da locação,
sejam estes móveis como imóveis. Na prática, porém, o contrato incidirá principalmente
sobre móveis.
Este contrato desempenha uma função semelhante à venda a prestações com
reserva de propriedade, ou seja, uma função de conceção de crédito e de garantia, uma
vez que visa permitir a aquisição do bem pelo locatário-comprador em condições de
segurança acrescida para o locador-vendedor, que só deixa de ser proprietário com o
pagamento da última prestação ou aluguer.
II. O regime geral
Se o locatário incumprir o contrato, pode o locador resolver o contrato se
verificados os pressupostos gerais do art. 934.º CC, ex vi n.º 1 do art. 936.º CC.
Decorre do n.º 2 do art. 936.º CC que esta “tem efeito retroativo, devendo o
locador (vendedor) restituir as importâncias recebidas, sem possibilidade de convenção
em contrário, mas também sem prejuízo do seu direito a indemnização nos termos gerais
e nos do artigo anterior.”
à Resolvido o contrato, a coisa terá de ser devolvida, o que significa que de
acordo com o art. 566.º n.º 2 CC, se terá que ter em conta no cálculo indemnizatório o
valor atual de mercado do bem restituído, o que permite diminuir o montante da
indemnização;
à O montante indemnizatório pode ser pré-fixado em cláusula penal sendo
aplicável as limitações impostas no art. 935.º n.º 1 CC;
O locador tem a obrigação de assegurar à outra parte o gozo da coisa para os fins
a que ela se destina (aet. 1031.º CC), tendo assim nomeadamente o dever de a reparar (art.
1036.º CC).
113
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
114
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Locação financeira
I. Caracterização
Noção – art. 1.º DL n.º 149/95.
É um mecanismo de garantia para o locador do crédito que concede assente na
propriedade do bem comprado a terceiro ou ao próprio locatário financeiro. É um contrato
de crédito e garantia na medida em que consiste para o locador numa operação de
concessão de crédito garantido pela propriedade do bem.
Deveres principais do locador financeiro – art. 9.º DL; o locatário financeiro
deverá pagar as rendas acordadas.
A locação financeira conduz sempre à celebração de um outro contrato que
consiste na construção ou compra do bem locado havendo entre ambos uma coligação
genética. É ainda celebrado um outro contrato, neste caso de compra e venda, na
eventualidade do locatário financeiro, passado o prazo contratual, opte pela compra do
bem.
II. A forma e publicidade
Forma – art. 3.º n.º 1, 2, 3 e 4 DL
Publicidade – está sujeita a registo, a locação financeira que tenha por objeto bens
imóveis ou móveis sujeitos a registo – art. 3.º n.º 5 DL.
III. Os sujeitos
Não há limitações quanto aos sujeitos desde que não exerçam a título profissional
a atividade de locação financeira.
IV. O objeto
Art. 2.º n.º 1 DL – pode ter como objeto quaisquer bens suscetíveis de serem dados
em locação.
V. As funções
A locação financeira é maioritariamente um contrato de crédito e garantia.
Cumpre uma função de financiamento pois o locador ao adquirir o bem escolhido pelo
locatário e lhe conceder o gozo do mesmo mediante o pagamento de rendas está a
financiar o uso do bem durante parte da sua vida útil. Tem ainda uma função de garantia
pois mantém a propriedade do bem.
115
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
VI. As modalidades
1. Locação financeira trilateral
Nesta modalidade o locador financeiro não é inicialmente proprietário do bem que
é escolhido pelo locatário perante terceiro a quem aquele compra entregando-o
posteriormente ao locatário pare que este o goze. É neste sentido que se fala em relação
trilateral pois implica a existência de 3 intervenientes e implica a celebração de dois
contratos: compra e venda ou empreitada entre um terceiro e o locador e o contrato de
locação financeira.
2. Locação financeira restitutiva (sale and lease back)
Neste caso o locatário vende ao locador financeiro um bem seu que de imediato
que lhe dá em locação financeira. Neste caso não há a compra de um bem a um terceiro.
Aqui também existe dois contratos em coligação externa entre si por serem
celebrados em simultâneo, uma coligação genética e uma dependência bilateral o que leva
a que a invalidade de um contrato implique a invalidade do outro.
O fim aqui visado é o financiamento do vendedor sendo que a propriedade
transmitida ao comprador funciona como garantia. Este financiamento é distinto do
financiamento da outra modalidade pois naquela financia-se a aquisição de um certo bem
enquanto nesta se está perante uma mera concessão de crédito garantido.
Esta figura aproxima-se da alienação em garantia e consiste num negócio
fiduciário típico.
i. Questão do pacto comissório
Um obstáculo que se tem apontado a esta figura é a de que consubstancia um pacto
comissório pelo que é proibida por lei. Em sentido contrário tem-se argumentado que não
tem aplicação o art. 694.º CC pois o mesmo se limita ao penhor, hipoteca e consignação
em rendimentos e mesmo que se aplicasse não se verificam os pressupostos do art. 694.º
CC pois a transmissão do bem ao locador financeiro se dá previamente com a celebração
do contrato e não apenas na eventualidade de incumprimento.
Pestana Vasconcelos não concorda com estes argumentos pois o que o preceito
visa evitar aplica-se às demais figuras. O que se deve verificar é se a locação financeira
restitutiva conduz aos efeitos que a proibição do pacto comissório visa evitar. Tal ocorre
sempre que o locador financeiro possa fazer definitivamente seu o bem locado de valor
superior sem uma prévia avaliação do mesmo. Quando se está perante este caso o negócio
é nulo por proibição do pacto comissório.
116
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
117
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
118
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
119
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Depósito em garantia
I. Caracterização
O devedor celebra com um banco, como forma de assegurar o cumprimento de
uma obrigação sua perante um credor, um contrato de depósito, nos termos do qual a
instituição de crédito deverá entregar a quantia ao credor garantido, se o garante incumprir
a sua obrigação ou restituir-lhe em caso de cumprimento.
Assim, o credor garantido é titular de um crédito face ao banco, condicionado pelo
incumprimento do devedor/garante, enquanto este último é, ao mesmo tempo, titular de
um crédito face ao banco à restituição da quantia depositada, condicionado ao
cumprimento.
A conta é aberta com este único propósito não sendo admitidos quaisquer
movimentos após o deposito da quantia devida, tal deve ficar estipulado no contrato.
II. Distinção de figuras próximas
1. Penhor de conta bancária
Distingue-se do penhor de conta bancária por assentar numa estrutura fiduciária
em que intervém um terceiro e o credor (beneficiário da garantia). Assim, este
beneficiário não tem um penhor sobre o crédito do devedor à restituição das quantias
depositadas, mas uma mera expectativa jurídica à aquisição do crédito à entrega do
montante depositado, se o devedor não cumprir.
2. Alienação fiduciária
Na alienação fiduciária em garantia o objeto corresponde a um crédito à restituição
das quantias já depositadas, ou seja, de um depósito já constituído.
120
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
I. Configuração geral
A alienação fiduciária em garantia consiste na situação que se verifica quando o
devedor ou terceiro procede à alienação de um bem para o credor de modo a garantir o
cumprimento de uma obrigação, vinculando-se o credor apenas a utilizar o bem para
realização do seu crédito devendo ser restituí-lo em caso de cumprimento da obrigação
garantida.
Assim, o credor adquire a propriedade do bem como garantia de um crédito sem
ter o direito de exercer todos os direitos de um proprietário. Inclusivamente o bem pode
ficar na posse do garante sendo transmitido apenas a propriedade sobre o mesmo.
Pode ser realizado mediante a aposição de uma condição resolutiva.
II. O problema da proibição do pacto comissório
Embora entre esta figura e o pacto comissório não haja uma identidade total na
medida em que este corresponde à possibilidade de o credor da obrigação garantida fazer
seu o bem em caso de incumprimento por parte do devedor e naquela essa transferência
de propriedade é prévia ao incumprimento. É neste sentido que Menezes Cordeiro
defende que a lei portuguesa não permite, em geral, esta figura acrescentado ainda que
como não pode ter natureza real nos termos do art. 1306.º n.º 1 CC acaba por ser muito
violenta para o devedor.
III. A regulação no DL 105/2004
A alienação fiduciária em garantia (financeira) veio a ser expressamente prevista
no DL 105/2004 com a alteração que sofreu em 2011 – art. 2.º n.º 2 DL. No entanto o
âmbito é restrito pois, nos termos do art. 2.º n.º 1 DL, é necessário o preenchimento dos
âmbitos deste diploma contidos nos art. 3.º a 7.º.
Preenchidos os requisitos de aplicação do diploma, a alienação fiduciária em
garantia é admitida nos termos do art. 14.º DL.
IV. Conteúdo da garantia
A alienação fiduciária em garantia transmite de forma plena a propriedade do bem
dado em garantia para o credor ainda que, na relação entre as partes, se comprometa a
respeitar o fim da garantia. Assim, o credor pode ceder a coisa tendo o devedor apenas
um direito de crédito à restituição da mesma aquando o pagamento da dívida garantida.
Este direito não é oponível a terceiros pois, estando em causa uma cláusula contratual,
vigora o princípio da relatividade das obrigações.
121
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Pode no entanto ser convencionado um direito pessoal de gozo do devedor face ao bem
permitindo assim a defesa da posse face a terceiros.
V. As alienações de coisas corpóreas móveis em garantia
1. A questão da violação do princípio da tipicidade dos direitos reais
Neste negócio não há a criação de um direito real pelas partes, negado pelo art.
1306.º n.º 1 CC, pois o direito de propriedade é transmitido na sua plenitude estando
apenas limitado quanto ao seu exercício por cláusulas obrigacionais.
122
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
Património autónomo
I. Introdução
A criação de patrimónios autónomos não pode resultar da vontade das partes tendo
de constar da lei, o que ocorre no caso das obrigações hipotecárias e das obrigações
titularizadas.
O critério a que se recorre para afirmar a existência de um património autónomo
é o da responsabilidade por dívidas uma vez que um património autónomo só responde
por dívidas próprias, e por essas dívidas só ele responde (autonomia patrimonial perfeita).
Só assim não é, havendo autonomia patrimonial imperfeita nos caso em que o património
autónomo não é suficiente para responder pelas suas próprias dívidas, caso em que os
seus credores podem recorrer ao património em geral do mesmo devedor.
II. Casos particulares
1. Obrigações hipotecárias – DL n.º 59/2006, 20 de março.
2. Obrigações titularizadas – DL n.º 453/99, 5 de novembro
123
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
I. Introdução
A exceção de não cumprimento do contrato consiste numa das manifestações do
sinalagma funcional. Qualquer das partes nos contratos bilaterais sinalagmáticos não
pode ser compelida a cumprir enquanto a outra não o fizer ou não se oferecer para o fazer
ao mesmo tempo. Assim, o credor não corre o risco de realizar a sua prestação sem obter
a contraprestação.
Nos contratos bilaterais não havendo prazos diferentes para o cumprimento,
qualquer das partes pode recusar-se a realizar a sua prestação enquanto a outra não o fizer
ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo nos termos do art. 428.º n.º 1 CC, não
podendo a mesma ser afastada mediante a prestação de garantias como refere o seu n.º 2.
à Se na compra e venda o vendedor realizar a entrega da coisa e se se transferir
a propriedade, fica vedada a via da resolução do contrato por falta de pagamento do preço
nos termos do art. 886.º CC, um dos principais meios de tutela do alienante.
Se forem estabelecidos prazos distintos para o cumprimento, aquele que tiver de
cumprir primeiro renuncia à exceção correndo o risco de não vir a obter a contraprestação
após a realização da sua prestação. No entanto, nos termos do art. 429.º CC, “ainda que
esteja obrigado a cumprir em primeiro lugar, tem o contraente a faculdade de recusar a
respetiva prestação enquanto o outro não cumprir ou não der garantias de cumprimento,
se, posteriormente ao contrato, se verificar alguma das circunstâncias que importam a
perda do benefício do prazo”, ou seja, se verificada alguma das situações do art. 780.º
CC.
Como resulta do Ac. STJ de 17/05/2015 (Maria Clara Sottomayor), proc. n.º
2545/10.5TVLSB.L1.S1 in dig.pt, “a invocação da exceção de não cumprimento do
contrato, nas hipóteses de cumprimento defeituoso ou parcial, deve ser restringida aos
casos em que não contrarie o princípio geral da boa fé consagrado nos art. 227.º e 762.º
n.º CC e desde que sejam observados critérios de proporcionalidade a aferir segundo as
circunstâncias do caso, tendo em conta não só o valor da prestação que ficou por
124
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
125
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
A compensação
I. Introdução
A compensação é uma das causas de extinção das obrigações prevista nos art.
847.º a 856.º CC com uma função de:
• Simplificação de pagamentos, pois permite a dispensa de cumprimentos cruzados;
e de
• Garantia uma vez que assegura ao credor um meio supletivo de realização do seu
crédito, porquanto este pode ser extinto não apenas pelo pagamento, mas através
da declaração de compensação com o contra crédito que sobre ele tem o devedor.
Assim, o credor não tem de exigir o cumprimento da obrigação, arriscar-se ao
incumprimento e sujeitar-se aos meios judiciais para fazer valer o seu direito. É,
neste sentido, um meio suplementar de realização do crédito;
A faculdade de recurso à compensação é um importante instrumento de tutela do
crédito, quer em ação executiva singular quer em insolvência.
Não pode ser considerada um direito real de garantia pois não tem como objeto
uma coisa corpórea nem permite ao titular do direito de ser pago com preferência.
Constitui, no entanto, uma super garantia pois:
• Pode ser oposta a terceiros nos termos do art. 853.º n.º 2 CC;
• Faz com que um credor comum que tinha de pagar as dívidas da massa deixe de
responder por qualquer obrigação bastando para o efeito, nos termos do art. 99.º
CIRE, que a situação de compensação exista ao tempo da insolvência;
II. Regime geral
A compensação pode ser legal ou convencional sendo que, neste caso, tudo
depende daquilo que for acordado pelas partes.
Requisitos da compensação legal:
• Reciprocidade dos créditos – art. 847.º n.º 1 e 851.º CC;
• Validade, exigibilidade e exequibilidade do crédito do declarante/compensante –
art. 847.º n.º 1 al. a) CC;
à É judicialmente exigível a obrigação que, não sendo voluntariamente
cumprida, dá direito à ação de cumprimento ou à execução do património do
devedor;
• Homogeneidade das prestações, ou seja, ambos os créditos têm de ter como
objeto coisas fungíveis da mesma espécie e qualidade – art. 847.º n.º 1 al. b) CC;
126
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
127
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
128
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
o n.º 1 do art. 855.º CC sendo que, “na falta de escolha, é aplicável o disposto nos artigos
784.º e 785.º” por força do n.º 2 do mesmo preceito.
Nos termos do art. 856.º CC, “declarada nula ou anulada a compensação,
subsistem as obrigações respetivas; mas, sendo a nulidade ou anulação imputável a
alguma das partes, não renascem as garantias que em seu benefício foram prestadas por
terceiro, salvo se este conhecia o vício quando foi feita a declaração de compensação.”
III. Regime insolvencial
A compensação é bastante relevante em sede de insolvência pois permite a
satisfação total do crédito do credor.
No anterior regime a compensação estava totalmente excluída em caso de
insolvência pois entendia-se que consubstanciava uma violação do princípio da igualdade
de credores que deve prevalecer nesta sede e ainda porque a ser permitida levaria a que o
credor seria totalmente pago beneficiando de uma garantia oculta que reduziria o
património do insolvente prejudicando os demais credores. Atualmente é admissível em
certas condições. Argumentos a favor da admissibilidade:
à É injusto que o insolvente pretenda o cumprimento de uma obrigação por um
credor se ele próprio não realiza esse cumprimento;
à Esta tem como função evitar a frustração de alguns créditos evitando a
insolvência em cascata;
à Reduz a exposição do crédito aos riscos e consequentemente os seus custos;
à Evita a reclamação judicial do crédito e consequentes custos judiciais;
à Evita que o devedor seja declarado insolvente por um crédito que não deve
efetivamente se a compensação for declarada;
Admissibilidade da compensação – art. 99.º n.º 1 com a exclusões do seu n.º 4
CIRE. Não releva a perda do benefício do prazo (art. 780.º CC) e o vencimento antecipado
e a conversão em dinheiro resultantes dos art. 91.º n.º 1 e 96.º CIRE.
129
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
I. Caracterização
Esta figura consiste na celebração de um contrato mediante o qual um sujeito
transmite um direito de crédito de que é titular em garantia do cumprimento de uma
obrigação de que é devedor.
O contrato base na cessão de créditos é, à partida, um mútuo.
A cessão pode ser total ou parcial, sendo que, neste último caso o devedor passa
a ter dois credores.
II. Forma
Como a cessão de crédito se insere num negócio base (à partida mútuo) tem de
respeitar os requisitos desse negócio – art. 578.º n.º 1 CC.
Se estiver em causa a cessão de um crédito hipotecário, se a hipoteca incidir sobre
imóveis, este contrato tem de ser celebrado por escritura pública ou documento particular
autenticado – art. 578.º CC – e está sujeito a registo – art. 2.º n.º 1 al. i) e 101.º n.º 1 al. b)
CRPr.
III. Objeto
O objeto da garantia são os créditos pecuniários transmitidos para o credor. À
partida serão de valor económico superior ao montante em dívida pois é essa diferença
que integra a margem de segurança do credor.
Os créditos podem ser presentes ou futuros desde que determináveis de modo a
não implicar a sua nulidade nos termos do art. 280.º n.º 1 CC.
Decorre do art. 579.º n.º 1 CC a proibição da cessão de créditos ou de direitos
litigiosos a juízes ou magistrados do Ministério Público, funcionários de justiça ou
mandatários judiciais se o processo decorrer na área em que exercem habitualmente a sua
atividade ou profissão e ainda a peritos ou outros auxiliares da justiça que tenham
intervenção no respetivo processo. O n.º 3 do mesmo artigo define direito litigioso como
aquele “que tiver sido contestado em juízo contencioso, ainda que arbitral, por qualquer
interessado.”
As sanções do incumprimento deste preceito são:
• Nulidade atípica pois não pode ser invocada pelo cessionário – art. 579.º n.º 1 e
580.º n.º 2 CC;
à Pode ser conhecida oficiosamente nos termos gerais do art. 286.º CC;
• Obrigação de reparar os danos causados – art. 580.º n.º 1 CC;
130
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
131
INÊS DE ALMEIDA DUARTE
houver. Caso o montante recebido não seja suficiente para cobrir a dívida na totalidade
há uma extinção parcial da mesma.
O cedente, após cumprir a obrigação garantida, pode requerer a retransmissão do
crédito cedido podendo recorrer à execução específica se tal pretensão for recusada pelo
cessionário.
i. A questão do pacto comissório
Embora a proibição desta figura seja aplicável aos demais casos não previstos na
lei, no caso de cessão de crédito em garantia a questão não se coloca pois o cessionário
não pode, aquando o incumprimento pelo cedente, fazer seu o crédito garante. A figura
em causa aquando a liquidação neste é o pacto marciano.
VII. Regime insolvencial
1. O regime insolvencial do negócio constitutivo do crédito cedido em
garantia
Administrador pode resolver os contratos nos termos do art. 120.º CIRE desde que
verificados os requisitos do mesmo ou seja, exige-se a má-fé de terceiro.
No entanto, também podem ser resolvidos pelo administrador estes contratos se
preenchidos os requisitos do art. 121.º n.º 1 al. e) CIRE – embora não resulte da letra da
lei a aplicação a esta figura, PESTANA DE VASCONCELOS entende que se deve
proceder a uma interpretação extensiva do preceito com base num argumento de maioria
de razão. Uma vez que o que se pretende evitar com este art. é que um dos credores
obtenha um benefício em detrimento dos demais em resultado da constituição de uma
garantia real, deve ter a mesma tutela aqueles casos em que o benefício em relação ao
credor é maior do que nesses casos.
2. Regime dos contratos base das cessão de crédito em garantia na
insolvência
Na insolvência do credor, por aplicação analógica do art. 1184.º CC, o crédito
garante não faz parte da massa insolvente só a integrando o crédito garantido. Assim, se
o devedor não cumprir o administrador deverá liquidar o crédito garante integrando na
massa insolvente o produto daí resultante exceto o excedente que tem de ser devolvido
ao devedor.
Insolvência do devedor – Pestana Vasconcelos defende a aplicação do art. 104.º
n.º 3 e 5 CIRE. A garantia surge na insolvência do devedor como um negócio em curso
que o administrador pode optar por executar ou recusar o cumprimento.
132