Psico Cultural 2

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

DISCENTE: MANUELLA QUETSIA TRINDADE BACELLAR

DOCENTE: PANDITA PEREIRA

RELATO AUTOBIOGRÁFICO

O que tenho de lembrança da minha adolescência foi de ter sido uma fase um
tanto quanto conflituosa, quando comecei a entender que muitas coisas
aconteciam no mundo das quais eu não concordava, entretanto nunca assimilei
que isso pudesse ser “um problema de adolescente”, mas sim de todo e
qualquer indivíduo que começa a perceber o mundo e ter uma relação mais
crítica com ele. Vigotski chama esse fenômeno como “crise” do
desenvolvimento, tratando como um novo impulso ao pensar. Sempre fui uma
pessoa questionadora e que jamais aceitou meias palavras, e acredito que isso
fez de mim o grande estereótipo de “adolescente problemática”, aquela que
não segue regras, quando na verdade apenas buscava por uma espécie de
autonomia que me fizesse entender pelo menos qual o meu lugar no mundo. E
foi difícil encontra-lo, mesmo sendo uma pessoa de pele clara, classe média e
com inúmeros privilégios sempre tive dúvidas do que seguir, e esse medo do
futuro perpassa todas as classes e pessoas, a gente sempre pensa muito
sobre o que pode acontecer ou não. Entendendo a adolescência como um
fenômeno histórico (SOUZA, SILVA 2018), ser de uma família basicamente
cristã me fez também questionar o porquê eu deveria apenas seguir o que me
diziam mesmo que eu encontrasse muitas situações as quais eu não
concordava, lembro da vez que questionei a minha mãe o porquê de irmos à
missa todo domingo sendo que eu preferia estar em outros espaços, obvio que
ela achou um absurdo, já que pra ela era quase que natural estar naquele
lugar, acredito que para ela a opinião de uma simples “aborrecente” (como me
chamava) não deveria ser levada em consideração. Entendo hoje que o fato de
você questionar te dá diversos estigmas porque a sociedade espera de nós
uma completa subserviência porque sermos considerados “inexperientes” na
vida, mas como poderia adquirir experiências se sempre somos tratados como
eternas crianças pelos nosso pais. As relações interpessoais nos influenciam
de forma que muitas vezes é difícil entender o que é real e o que é a visão do
outro. Outro ponto que sempre me assustou num processo de desenvolvimento
foram as minhas mudanças corporais, e como a partir de 12 anos já não era
mais lida como uma criança mas sim uma adolescente, e isso me assustou
porque nessa parte principalmente sofri assédios de pessoas, comentários
maldosos e logo comecei a entender que o lugar da mulher no mundo é
sempre muito carregado de estereótipos e de julgamentos, uma menina do
interior que começa a desenvolver seios só pode estar fazendo coisas erradas,
essa era uma das concepções descabidas as quais tive que enfrentar. Mas não
só o meu corpo mudava como toda a minha leitura de mundo e concepções
dos acontecimentos também foram mudando ao longo dessa jornada. Logo
muito nova me dei conta que a modernidade me faria pensar muito sobre o que
fazer depois dos estudos, afinal eu não poderia decepcionar minha mãe, nessa
época tivemos que vim para a capital pois as chances de ascenção financeira
não eram tão favoráveis naquele local, foi aí que me dei conta que o mundo era
muito maior que a janelinha do meu quarto, e que a demanda social daquele
lugar me fazia entender que eu precisava ter uma espécie de maturação das
minhas ideias.

Muito ao contrário do que se dizem os estudos, a minha relação com a minha


mãe sempre foi de amizade, e ela sempre dizia que eu lembrava muito a ela
quando tinha minha idade, ambas com sede de conhecer o novo. Meu pai
faleceu quando eu tinha 6 anos, e foi nesse contexto de perda que eu tive que
seguir a vida com a minha mãe, aquela que sempre foi meu porto-seguro,
esperei um pouco mais de compreensão dela, mas entendo que a forma dela
de pensar também diz respeito com a educação e o meio social que ela teve.
Logo ao terminar o ensino médio nossa situação mudou, e eu precisei
urgentemente entender como conciliar estudar para entrar na faculdade que
era o meu sonho e também trabalhar para ajudar nas despesas de casa, essa
também foi uma situação que reteve de mim muitos questionamentos, mas na
sociedade que vivemos o desemprego estrutural é algo extremamente
preocupante, e eu coloquei a cara a tapa para enfrentar todos os problemas
que o mercado de trabalho apresentava, todos os “nãos” que recebi. Mas
finalmente consegui e a parte mais difícil tem sido conciliar faculdade e
trabalho, mas dado as estatísticas, uma estudante de ensino público estar
numa Universidade pública é algo a se vangloriar e acreditar que mesmo com
todas as dificuldades a educação ainda é capaz de te proporcionar coisas
inimagináveis, mesmo que seja difícil de se pensar para muitos e que também
muitos tenham esse espaço negado, precisamos resistir e acima de tudo
entender nossos privilégios de raça e espaços sociais, afinal desde cedo me foi
incentivado os estudos e a busca pela educação.
REFERENCIAS

SOUZA, Candida de; SILVA, Daniele Nunes Henrique. ADOLESCÊNCIA EM DEBATE:


CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS À LUZ DA PERSPECTIVA HISTÓRICO-
CULTURAL. Psicologia em Estudo, v. 23, p. 23-34, 8 abr. 2018. Disponível
em: https://doi.org/10.4025/psicolestud.v23i0.35751. Acesso em: 14 set. 2023.

LEAL, Z. F. R. G.; FACCI, M. G. D. Adolescência: superando uma visão biologizante a partir da


psicologia histórico-cultural. In: LEAL, Z. R. F. G.; FACCI, M. G. D.; SOUZA, M. P. R. (Orgs.).
Adolescência em foco: contribuições para a psicologia e para a educação. Maringá: Eduem,
2014.

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