1 Conceituando Políticas Educacionais
1 Conceituando Políticas Educacionais
1 Conceituando Políticas Educacionais
Resumo: Neste texto, assume-se como objetivo conceituar políticas educacionais, a partir
de sua compreensão como política pública. Busca-se estabelecer suas relações com os
Introdução
superação das injustiças e da exclusão social a que está submetida grande parte da
população brasileira.
políticas educacionais, pois, como dizia Paulo Freire (1980) ninguém transforma
aquilo que não conhece. É com esse objetivo que se propôs, neste texto, abordar a
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educação, enquanto política pública, inserida nas contradições da sociedade mais
analíticas. Busca-se, para esta tarefa, o apoio teórico de clássicos como Aristóteles,
analisa-se a educação como política pública. Para tanto, recorreu-se a autoras como
públicas.
atuação de políticos profissionais, na maioria das vezes, maus políticos. Isto faz com
que várias pessoas tomem aversão a tudo o que diz respeito à política. Mas será
Este é um tema muito complexo para ser tratado com rapidez, pois seu uso
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construídos na história da humanidade e por diferentes sentidos adquiridos na
experiência de vida de cada pessoa. Por isso, vamos voltar um pouco na história,
originado de polisiv, que se refere a tudo que se relaciona com a cidade, portanto ao
persuasão, que repercutirá daí em diante, naquilo que pensarão os homens sobre o
Como analisa Brzezinski (2009, p.2): [...] Persuadir (peithein) era a forma de falar
em Atenas. Ter habilidade para usar a palavra (logos), efetivar a comunicação, portanto
convívio entre os diferentes na polis passa a ser, cada vez mais, compreendido
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Neste sentido, refere-se, hoje, principalmente ao conjunto de atividades, que,
de alguma maneira são atribuídas ao Estado moderno, ou que dele emanam. Vale à
pena, neste momento, nos perguntarmos, então, sobre o que é Estado? Qual sua
função? Como surgiu? A resposta a estas perguntas não é muito simples. Podemos
teorias:
• Teorias com enfoque liberal: baseam-se numa interpretação feita pela burguesia
neutro e está acima dos interesses das classes sociais, pois tem como objetivo a
conjunto.
universais, de todo o corpo social. Esse enfoque constituí-se, deste modo, uma
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Para Hobbes (1983), teórico político e filósofo inglês, o Estado soberano
crueldade,a ambição, naturais dos indivíduos, gerariam uma luta sem tréguas,
levando-os à ruína. Para evitar este fim e promover o bem comum, os homens
selariam um pacto, um contrato, que evita a sua destruição. Hobbes atribui a este
[...] O fim último, causa final e desígno dos homens (que amam
naturalmente a liberdade e o domínio sobre os outros), ao introduzir
aquela restrição sobre si mesmos sob a qual temos que viver nos
Estados, é o cuidado com sua própria conservação e com uma vida
mais satisfeita. Quer dizer, o desejo de sair daquela mísera condição
de guerra que é a consequência necessária (conforme se mostrou)
das paixões dos homens, quando não há um poder visível capaz de
os manter em respeito, forçando-os, por medo do castigo, ao
cumprimento de seus pactos e respeito àquelas leis da natureza [...]
(HOBBES, 1983, p. 103)
a idéia de que o homem seria livre no seu estado natural. Para evitar que um
homem pudesse subjulgar o outro a seu poder absoluto, os homens, por meio de um
contrato social, delegaram poderes ao Estado, que deveria ter o papel de assegurar
seus direitos naturais, assim como, a sua propriedade, que ele explica da seguinte
forma:
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ninguém sujeito, por que abrirá mão ele dessa liberdade, por que
abandonará o seu império e sujeitar-se-á ao domínio e controle de
qualquer outro poder? Ao que é óbvio responder que, embora ao
estado da natureza tenha tal direito, a fruição do mesmo é muito
incerta e está constantemente exposta à invasão de terceiros porque,
sendo todos reis tanto quanto ele, todo homem igual a ele, e na
maior parte pouco observadores da equidade e da justiça, a fruição
da propriedade que possui neste estado é muito insegura, muito
arriscada. Estas circunstâncias obrigam-no a abandonar uma
condição que, embora livre, está cheia de temores e perigos
constantes; e não é sem razão que procura de boa vontade juntar-se
em sociedade com outros que já estão unidos, ou pretendem unir-se,
para mútua conservação da vida, da liberdade e dos bens a que
chamo de “propriedade”. (LOCKE, 1978, p. 82)
Vale destacar que, enquanto, para Hobbes (1983), o contrato social resulta
num Estado Absoluto, para Locke (1978), o Estado poderia ser feito e desfeito, como
delineva com maior clareza a estrutura de classes, que tornou-se elemento central
burguesa, a sociedade civil também nasceria por meio de um contrato social. Para
Estado. Isto quer dizer que o Contrato é um pacto de associação, não de submissão,
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[...] só a vontade geral pode dirigir as forças do Estado de acordo
com a finalidade de sua instituição, que é o bem, comum, porque se
a oposição dos interesses particulares tornou necessário o
estabelecimento das sociedades, foi o acrodo destes mesmos
interesses que o possibilitou. O que existe de comum nesses vários
interesses forma o liame social e, se não houvesse um ponto em que
todos os interesses concordassem, nenhuma sociedade poderia
existir. Ora, somente com base nesse interesse comum é que a
sociedade deve ser governada. (ROUSSEAU, 1983, p. 44)
próprias palavras: [...] Afirmo, pois que a soberania não sendo senão o exercício da
vontade geral, jamais pode alienar-se, e que o soberano, que nada é senão um ser coletivo,
só pode ser representado por si mesmo. O poder pode transmitir-se; não, porém, a vontade.
Ele enfatizava que não há liberdade onde não existe igualdade. Ao contrário
explorada.
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No pensamento marxista, o Estado consiste numa organização burocrática,
respectivas burocracias, que exerce a dominação das classes exploradas, por meio
sociedade.
Visto que não existe organização social sem Estado, pelo menos após a
existência do domínio bruto de uma classe social sobre a outra, por meio, apenas,
camadas dirigidas. A classe dominante, muitas vezes, sacrifica parte dos seus
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dois segmentos distintos, a sociedade política e a sociedade civil. Esta distinção é
histórica, que a sociedade civil pôde ser capturada teoricamente. Antes disso, o
Estado-coerção era muito superior em sua base material para se permitir tal
percepção.
do século XX. Embora tenha se inspirado nos exemplos e ensinamentos dos antigos
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análises sobre os grandes conflitos contemporâneos, como o nazismo e outras
opressivos que recorrem à dominação pela força, pela exclusão social e suspensão
priorizam as reflexões sobre a política tomada como sua referência fundante para
do público como do espaço privado. Nesse estudo, tomamos como referência suas
isso, tem como seu principal pilar a pluralidade dos homens e o agir “entre-os-
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As críticas apresentadas nas obras de Arendt sobre o autoritarismo e os
das “coisas comuns” a todos e pautar as ações e políticas do interesse de todos. Por
não pode ser negligenciada pelos grupos sociais dominados, que pretendem
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em ação”. [...] Sendo assim, quando se enfoca as políticas públicas em um plano mais geral
e, portanto, mais abstrato isto significa ter presente as estruturas de poder e de dominação,
os conflitos sociais infiltrados por todo o tecido social e que tem no Estado o lócus de sua
que os meios de produção são apropriados por uma determinada classe social, o
Estado acaba por ser apropriado, também, por esta classe, a fim de gerir seus
interesse econômicos.
(Saviani, 2007).
cultura e educação.
políticas sociais e da ação do Estado que deve ser compreendida [...] para além de
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uma concepção abstrata dos “requerimentos da cumulação”, que pouco auxilia na
sociedade.
A autora adverte que isto não significa que não se deve considerar a
correlação entre as forças sociais, que se articulam para defender seus interesses.
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Ao longo da História do Brasil, a educação redefiniu seu perfil, ao mesmo
tempo reprodutor e inovador da estrutura social, ou seja, ela consiste em uma das
organização social e a escola é um dos locais privilegiados para sua realização. Por
nacional.
as políticas educacionais. Elas são reflexo das relações de dominação e poder que
crise educacional revela [...] as questões principais do nosso século [séc.XX] e não podem
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ser analisadas como “um fenômeno local” de um país ou região, mas como um dos maiores
neutro diante das lutas das entidades nas quais seus pares se articulam a fim de
social e educacional.
docente; expansão e qualidade do ensino, dentre outros que afetam a vida cotidiana
refletir e agir de forma coerente com suas opções éticas, teóricas e políticas.
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aprendizagens de cunho metodológico a que, segundo ambos os autores estão
submetidos os cursos de Licenciaturas no Brasil. Para eles, estes cursos [...] nada
Nesse sentido, Patto (2004, p. 66) cita as teses de Azanha, que rejeitam de
dificuldades de escolarização.”
A autora recorre, ainda, a crítica às teses sobre Feuerbach, de Karl Max, que
reafirma que a concepção transformadora da sociedade [...] só pode ser concebida [...]
como práxis [...] como uma ação sobre o real. (PATTO, 2004, p. 66)
atividades essenciais na sociedade humana, uma vez que tem como tarefa a
renovação do mundo, [...] que jamais permanece tal e qual é, porém renova-se
continuamente através do nascimento e da vinda de novos seres humanos [...] que nele
chegam. Assim, a pensadora indaga, porque as políticas públicas têm falhado nesse
sentido:
Para Arendt, é por amor ao mundo, que os adultos precisam educar suas
crianças – novos seres “chegantes” ao mundo. Essa é uma tarefa para a família,
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para o professor e para os governos. A crise da educação nos tempos modernos
proteger o mundo do que elas se tornarão no futuro, se não forem educadas hoje.
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Texto elaborado, inicialmente, para compor o Material Didático do Curso de Licenciatura
em Física a Distância do Consórcio Setentrional - UCG, UFG, UEG (ARAÚJO, 2008).
Revisto e ampliado para a publicação na Revista Educativa.
ii
Pedagoga (UCG), doutora em educação (UFG). Professora da da UFG, desde 2010 e da
PUC Goiás, desde 1986. Nesta Instituição, assumiu, de maio de 2000 a março de 2008, a
coordenação do Colegiado das Licenciaturas da UCG. Atualmente, ministra a disciplina
Políticas Educacionais, nos cursos de Licenciatura; Tópicos de Currículo, no Programa de
Mestrado e Doutorado de Educação da PUC Goiás, onde atua na linha "Estado, Instituições
Políticas Educacionais" e exerce a função de Vice-coordenadora. Pesquisadora do Núcleo
de Pesquisa e Educação (NUPPE), sua produção está direcionada principalmente para as
áreas de políticas educacionais, formação de professores, educação profissional, educação
infantil, infância e família. E-mail: deniseucg@gmail.com
iii
Pedagoga (UCG); mestre em História e Filosofia da Educação (UNICAMP); Doutora em
História (UNB). Professora na PUCGOIÁS. Atua no curso de mestrado em Educação do
PPGE, vinculada à linha de pesquisa: Estado e Políticas e Instituições Educacionais. Integra
rede goiana de pesquisadores que leva a mesma denominação. Tem livros e artigos
publicados na área de História da Educação, Gestão e Políticas Educacionais, em revistas e
anais de eventos nacionais e internacionais. E-mail: zeneide7@bol.com.br
iv
Polis - Termo grego que se refere à cidade, compreendida como a comunidade
organizada, formada pelos cidadãos, isto é, pelos homens nascidos no solo da Cidade,
livres e iguais. Fonte: CHAUÍ, Marilena. Convite a Filosofia, Editora Ática, 2003.
v
Iluminismo ou Esclarecimento (em alemão Aufklärung, em inglês Enlightenment, em
italiano Illuminismo, em francês Siècle des Lumières, em espanhol Ilustración) designam
uma época da história intelectual ocidental. Iluminismo é um conceito que sintetiza diversas
tradições filosóficas, correntes intelectuais e atitudes religiosas. O uso do termo Iluminismo
na forma singular justifica-se, contudo, dadas certas tendências gerais comuns a todos os
iluminismos, nomeadamente, a ênfase nas idéias de progresso e perfectibilidade humana,
assim como a defesa do conhecimento racional como meio para a superação de
preconceitos e ideologias tradicionais. O Iluminismo é, para sintetizar, uma atitude geral de
pensamento e de ação. Os iluministas admitiam que os seres humanos estão em condição
de tornar este mundo um mundo melhor - mediante introspecção, livre exercício das
capacidades humanas e do engajamento político-social.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Iluminismo Acesso em 26/06/2008.
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vi
Do Contrato social - obra prima do suíço Jean-Jacques Rousseau, em que ele expõe a
sua noção de homem, de Estado e de sociedade. Para obtê-la na Internet, acesse:
http://www.cfh.ufsc.br/~wfil/contrato.pdf
vii
Para compreender a concepção marxista de Estado, vale a pena ler o Manifesto do
Partido Comunista, disponível, no site: http://ateus.net/ebooks/geral/marx_manifesto_comunista.pdf
viii
Antonio Gramsci - Político, filósofo e cientista político, comunista e anti-fascista italiano,
nascido em Ales, 22 de janeiro de 1891 e falecido em Roma, 27 de abril de 1937. A
influência de Gramsci encontra-se associada, principalmente, aos mais de trinta cadernos
de análise histórica e filosófica que escreveu durante o período em que esteve na prisão,
conhecidos como Cadernos do Cárcere, que contêm o pensamento maduro de Gramsci
sobre a História da Itália e o nacionalismo, bem como idéias sobre teoria crítica e
educacional que são freqüentemente associadas com o seu nome.
ix
Em política, o conceito de hegemonia foi formulado por Antonio Gramsci para descrever o
tipo de dominação ideológica de uma classe social sobre outra, particularmente, da
burguesia sobre o proletariado e outras classes de trabalhadores.
x
Johanna Arendt nasceu em Hannover (Alemanha) em 14 de outubro de 1906, numa
família de origem judia. Estudou e doutorou-se pela Universidade de Heidelberg, sob a
orientação de Martin Heidegger e Karl Jaspers. Foi perseguida pelo nazi-facismo.
Aproximou-se dos frankfurtianos, como Walter Benjamin. Tornaram-se amigos nos tempos
de refugiados alemães judeus e comunistas. Exilou-se em Paris e faleceu em Nova York em
1975. Sua principal obra, A Condição Humana (1958), trata de experiências políticas
fundadoras da vida dos homens na sociedade, no mundo. Suas obras priorizam as reflexões
sobre a política tomada como sua referência fundante para compreender a crise da
modernidade, em suas diferentes esferas tanto no espaço do público como do espaço
privado. Nesse estudo, tomamos como referência suas obras e ensaios sobre Política e
seus diferentes sentidos. (c.f.citações e referências).
xi
Políticas públicas - Este é um conceito que comporta várias significações. Para alguns,
pode parecer uma redundância, visto que toda política, pela prórpia natureza etmológica da
palavra é essencialmente pública. Este termo pode referir-se a diferentes áreas ou campos
de atuação governamental, por exemplo política econômica, políticas sociais, ou ainda,
ambientais. Pode remeter aos processos próprios da ação política, no que diz respeito aos
instrumentos, regras e organização das forças que se enfrentam ou se articulam no espaço
dos embates. Pode significar, ainda, as instituições políticas, como o Estado e suas normas,
regras e marcos jurídicos.
Referências bibliográficas
Q2/o-papel-da-sociedade-civil-e-do-direito-no-pensamento-politico-de-gramsci.html.
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ARAÚJO, Denise Silva. Políticas educacionais In: MARTINS, Alessandro; VIANNA,
Miguel Antônio de; SIQUEIRA, Vera Lúcia de. Curso de Licenciatura em Física a
Brasil, 1998.
AZEVEDO, Janete M. Lins de. A educação como política pública. 3 ed. Campinas,
CODATO, Adriano Nervo. Estado como instituição: uma leitura das "obras históricas"
19
FREIRE, Paulo. Educação como Prática da Liberdade. Petrópolis: Paz e Terra,
1980.
civil. Tradução de João Paulo Monteiro e Maria Beatriz Nizza da Silva. 3 ed. São
LOCKE, John. Carta acerca da Tolerância; Segundo Tratado sobre governo; Ensaio
Terra, 1980.
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introduções e notas de Paul Arbousse-Bastides e Lourival Gomes Machado. 3 ed.
SAVIANI, Demerval. Da nova LDB ao FUNDEB/; por uma outra política educacional.
Disponível em <
http://seer.pucgoias.edu.br/files/journals/6/articles/1141/submission/review/1141-3676-1-
RV.doc> Acesso em 16 de julho de 2021.
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