Ética & Cidad.

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ÉTICA E

CIDADANIA

INSTITUTO ALIANÇA DE LINGUÍSTICA, TEOLOGIA


E HUMANIDADES
Rua Odon Rodrigues de Moraes Rego, 20. Várzea,
Recife/PE
Tel: 81 3033-5004/ 99683-6705
e-mail: secretaria@ialth.com.br
www.ialth.com.br | @instituto_alianca

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APRESENTAÇÃO

O cenário de liquidez e volatilidade em que vive o Brasil é real. As


pessoas estão cada vez mais vivendo pelo que sentem em 15 segundos. A
preocupação é com o agora e se distanciam da fé, da esperança e do amor.
Vivencia-se a era do esfriamento espiritual, apostasia, desconhecimento
da Palavra de Deus. “Errais, não conhecendo as Escrituras” são palavras de
Jesus para alertar o estado de letargia espiritual.
O mundo jaz do maligno, este reino está sob o seu domínio.
A missão do IALTH, de instrumentalizar a Igreja do Senhor através da
interpretação correta da Bíblia, é frear e capacitar os alunos a lutarem contra o
domínio das trevas.

Artur Eduardo da Silva Neto


Diretor-presidente do IALTH. Doutor em Ciências da Educação e em Teologia.
Doutorando e mestre em Filosofia. Pós-graduado em Doc. do Ensino Superior, Gestão
EaD, Teologia Bíblica e Letras e Linguística. Graduado em Teologia e Filosofia. Pastor
da Igreja Evangélica Aliança (IEVCA), escritor e conferencista.

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SUMÁRIO

1. ÉTICA: HISTÓRIA E FILOSOFIA............................................................... 7


2. A ÉTICA COMO DISCIPLINA FILOSÓFICA .............................................. 9
2.1. CONCEITO DE ÉTICA ......................................................................... 9
2.2. TEORIA ÉTICA RELATIVISTA E OBJETIVISTA ................................ 10
3. BREVE HISTÓRIA DA ÉTICA (ANTIGA, ESTOICA, MEDIEVAL E
MODERNA) .................................................................................................. 15
3.1. ÉTICA ANTIGA ................................................................................... 16
3.2. ESTOICA ............................................................................................ 21
3.3. MEDIEVAL .......................................................................................... 23
3.4. MODERNA ......................................................................................... 26
4. A FILOSOFIA MORAL E ÉTICA: SUJEITO, CRISTIANISMO, POLÍTICA E
CIDADANIA .................................................................................................. 29
4.1. SENSO E CONSCIÊNCIA MORAL .................................................... 29
4.2. O VALOR DA CONSCIÊNCIA MORAL .............................................. 30
4.3. A IMPORTÂNCIA TEOLÓGICA DA ÉTICA: HÁ UMA “ÉTICA
CRISTÔ? .................................................................................................. 31
4.4. ÉTICA E POLÍTICA, CIDADANIA E SOLIDARIEDADE ...................... 31
5. CONCEITO, FUNDAMENTOS E DESENVOLVIMENTO DA CIDADANIA
34
5.1. FUNDAMENTOS ................................................................................ 34
5.2. DESENVOLVIMENTO ........................................................................ 34
6. CIDADANIA: HISTÓRICO DA CIDADANIA E DIREITOS HUMANOS .... 35
7. TIPOS DE CIDADANIA ............................................................................ 37
7.1. CIDADANIA FORMAL OU LEGAL...................................................... 37
7.2. CIDADANIA SOCIAL .......................................................................... 37
7.3. CIDADANIA POLÍTICA ....................................................................... 38
7.3. CIDADANIA ECONÔMICA ................................................................. 38
7.4. CIDADANIA CULTURAL .................................................................... 38
7.5. CIDADANIA GLOBAL ......................................................................... 39
7.6. CIDADANIA DIGITAL ......................................................................... 39
8. CIDADANIA E PSICOLOGIA DA RELIGIÃO ........................................... 39
9. CIDADANIA E A IGREJA ......................................................................... 41
10. CIDADANIA E EDUCAÇÃO ................................................................... 41

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1. ÉTICA: HISTÓRIA E FILOSOFIA

Ética, a disciplina que se preocupa com o que é moralmente bom e ruim


e moralmente certo e errado. O termo também é aplicado a qualquer sistema
ou teoria de valores ou princípios morais.

Como devemos viver? Devemos ter como objetivo a felicidade ou o


conhecimento, a virtude ou a criação de objetos bonitos? Se escolhermos a
felicidade, será a nossa própria felicidade ou a de todos? E quanto às questões
mais específicas que enfrentamos: é correto ser desonesto por uma boa
causa? Podemos justificar viver em opulência enquanto em outras partes do
mundo as pessoas estão passando fome? É justificável ir à guerra nos casos
em que é provável que pessoas inocentes sejam mortas? É errado clonar um
ser humano ou destruir embriões humanos em pesquisas médicas? Quais são
nossas obrigações, se é que temos alguma, para com as gerações de seres
humanos que virão depois de nós e para com os animais não humanos com os
quais compartilhamos o planeta?

A Ética lida com essas questões em todos os níveis. Seu tema consiste
nas questões fundamentais da tomada de decisões práticas, e suas principais
preocupações incluem a natureza do valor final e os padrões pelos quais as
ações humanas podem ser julgadas certas ou erradas.

Os termos ética e moralidade estão intimamente relacionados.


Atualmente, é comum referir-se a julgamentos éticos ou a princípios éticos
quando antes seria mais preciso falar de julgamentos morais ou princípios
morais. Essas aplicações são uma extensão do significado de Ética. No uso
anterior, o termo não se referia à moralidade em si, mas ao campo de estudo,
ou ramo de investigação, que tem a moralidade como objeto de estudo. Nesse
sentido, a Ética é equivalente à Filosofia Moral.

Embora a Ética sempre tenha sido vista como um ramo da Filosofia, sua
natureza prática abrangente a vincula a muitas outras áreas de estudo,
inclusive antropologia, biologia, economia, história, política, sociologia e

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teologia. No entanto, a Ética permanece distinta dessas disciplinas porque não
é uma questão de conhecimento factual como as ciências e outros ramos de
pesquisa. Em vez disso, ela tem a ver com a determinação da natureza das
teorias normativas e a aplicação desses conjuntos de princípios a problemas
morais práticos.

Quando a Ética começou e como ela se originou? Se tivermos em mente


a Ética propriamente dita, ou seja, o estudo sistemático do que é moralmente
certo e errado, fica claro que a Ética só poderia ter surgido quando os seres
humanos começaram a refletir sobre a melhor maneira de viver. Esse estágio
de reflexão surgiu muito depois de as sociedades humanas terem desenvolvido
algum tipo de moralidade, geralmente na forma de padrões costumeiros de
conduta certa e errada. O processo de reflexão tendeu a surgir a partir de tais
costumes, mesmo que, no final, tenha sido considerado insuficiente. Dessa
forma, a Ética começou com a introdução dos primeiros códigos morais.

Praticamente toda sociedade humana tem alguma forma de mito para


explicar a origem da moralidade. No Louvre, em Paris, há uma coluna
babilônica negra com um relevo que mostra o deus-sol Shamash apresentando
o código de leis a Hamurabi (falecido por volta de 1750 a.C.), conhecido como
Código de Hamurabi. O relato da Bíblia Hebraica (Antigo Testamento) sobre o
fato de Deus ter dado os Dez Mandamentos a Moisés (floresceu entre os
séculos XIV e XIII a.C.) no Monte Sinai pode ser considerado outro exemplo.
No diálogo Protágoras, de Platão (428/427-348/347 a.C.), há um relato
declaradamente mítico de como Zeus teve pena dos infelizes humanos, que
fisicamente não eram páreo para os outros animais. Para compensar essas
deficiências, Zeus deu aos seres humanos um senso moral e a capacidade de
ter leis e justiça, para que pudessem viver em comunidades maiores e
cooperar uns com os outros.

É inegável que toda civilização tem consciência do que deve ou não ser
feito, do certo e do errado, do bom ou mau; a pergunta que fica, é: de onde
vem essa percepção inerente a todos? O apóstolo Paulo, escrevendo aos
romanos, responde:

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“Quando, pois, os gentios, que não têm a lei, fazem, por natureza,
o que a lei ordena, eles se tornam lei para si mesmos, embora não
tenham a lei. Estes mostram a obra da lei gravada no seu
coração, o que é confirmado pela consciência deles e pelos seus
pensamentos conflitantes, que às vezes os acusam e às vezes os
defendem,...”. (ROMANOS 2.14-15).

2. A ÉTICA COMO DISCIPLINA FILOSÓFICA

2.1. CONCEITO DE ÉTICA


A ética é uma das áreas que maior interesse desperta atualmente no
campo da filosofia, sobretudo porque diz respeito diretamente à nossa
experiência cotidiana, levando-nos a uma reflexão sobre os valores que
adotamos, o sentido dos atos que praticamos e a maneira pela qual tomamos
decisões e assumimos responsabilidades em nossa vida. Hoje, por exemplo, a
grande maioria das profissões tem seus códigos de ética, numa tentativa
precisamente de sistematizar os princípios de orientação para seus
profissionais. No entanto, sentimos cada vez mais que vivemos uma crise ética
que vai desde a situação política do país, passando por questões de corrupção
na sociedade e no governo, até problemas de relacionamento familiar.

O termo “ética” deriva de ηθος (gr. ēthos), que significa “costume” e, por
isso, a ética foi definida com frequência como a doutrina dos costumes,
sobretudo nas correntes de orientação empirista. A distinção aristotélica entre
as virtudes éticas, διανοητικαι αρεται (gr. dianoētikai aretai), indica que o
termo “ético” é tomado primitivamente só num sentido “adjetivo”: trata-se de
saber se uma ação, uma qualidade, uma “virtude” ou um modo de ser são
“éticos”.

As virtudes éticas são para Aristóteles aquelas que se desenvolvem na


prática e que estão orientadas para a consecução de um fim, enquanto as
dianoéticas são as virtudes propriamente intelectuais. Às primeiras pertencem
as virtudes que servem para a realização da ordem na vida do Estado – a
justiça, a amizade, o valor, etc. – e têm sua origem direta nos costumes e no

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hábito, razão pela qual podem chamar-se virtudes de hábito ou tendência. Às
segundas, em contrapartida, pertencem as virtudes fundamentais, as que são
como os princípios das éticas, as virtudes da inteligência ou da razão:
sabedoria, σοφία (sophía), e prudência, φρόνησις (phrónēsis). Na evolução
posterior do sentido do vocábulo, o ético identificou-se cada vez mais com o
moral, e a ética chegou a significar propriamente a ciência que se ocupa dos
objetos morais em todas as suas formas, a filosofia moral.

2.2. TEORIA ÉTICA RELATIVISTA E OBJETIVISTA

RELATIVISMO ÉTICO

O relativismo moral foi difundido no século XX principalmente pelo


filósofo australiano J. L. Mackie (1917-1981), o proponente do relativismo
filosófico moral, como veio a ser conhecido. Mackie defendeu basicamente dois
argumentos distintos, cujo propósito era a comprovação da inexistência de
padrões objetivos da moralidade. O primeiro é o “argumento da relatividade”.
Os valores morais seriam, grosso modo, produzidos pelos aspectos
multiculturais do mundo, sendo relativos às expressões culturais dos povos. De
fato, para Mackie, os valores morais objetivos, éticos, e os valores não-morais,
os estéticos (beleza, feiura), não existem, não fazem parte da “tessitura do
mundo”. Sua invenção é, todavia, útil para que a sociedade seja regida por
normas, que teriam como fim apenas a ordem. Desta forma, alguém que seja
monogâmico, o é apenas porque nasceu em uma sociedade monogâmica,
construindo os valores que seguirá a partir estritamente do que defende esta
sociedade.

O segundo argumento de Mackie é conhecido como “argumento a


estranheza”. Sabe-se o que é, por exemplo, algo redondo, vermelho, macio,
aquoso, mas o que seria a justiça ou o bem? É a partir de analogias similares
que Mackie defende a ideia de que estas entidades, caso existissem, seriam
estranhas. Qual a forma da justiça? Dada a “estranheza” do que tais termos
significam, Mackie deduz que os tais não existem. São ontologicamente
“estranhos”. Entende-se aqui que “estranho”, para Mackie, é tudo o que não

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pode, de certa forma, ser mensurado. O vermelho e o redondo podem; o belo,
a bondade, não.

Algumas considerações podem ser feitas mediante os argumentos de


Mackie. Em primeiro lugar, quanto ao primeiro argumento, o da “relatividade”,
pode-se dizer que as opiniões sobre determinado assunto não validam ou
invalidam o mesmo. Especialistas podem ter opiniões contrárias sobre
determinados temas de seu domínio e as mesmas nada terem a ver com a
veracidade ou falsidade daqueles temas. Outro contraponto é a aparente falta
de conformidade cultural numa mesma cultura. O fato de vivermos em
determinada cultura não implica que aceitaremos todos os seus preceitos e
morreremos sob os tais. Podemos estar sob aspectos culturais, cujos atos se
mostram reprováveis até para os maiores defensores daquelas culturas.

Um exemplo recente que se alinha ao que estamos falando é o caso do


infanticídio que acontecia, e provavelmente ainda acontece, em pelo menos 13
etnias indígenas no Brasil. Algumas tribos, como as da etnia ianomâmi,
matavam recém nascidos que nascessem com graves problemas de saúde. O
conhecimento que o grande público teve dessas práticas suscitou um debate
nacional, que ainda acontece em várias frentes, principalmente na esfera
política e religiosa. Embora antropólogos defendam a não interferência nas
práticas indígenas, outros entendem que o infanticídio violava um preceito
constitucional básico, o direito à vida, e como essas etnias estão em território
nacional, precisam se submeter a este princípio legal. O que queremos chamar
à atenção, aqui, é que não podemos esperar a objetividade ou a subjetividade
do infanticídio, indígena ou não, esteja meramente nas opiniões que são
proferidas. A verdade “não está nos olhos de quem vê”.

Por fim, ainda em relação ao primeiro argumento de Mackie, pode-se


dizer que, a despeito das diferenças culturais entre os povos, valores morais de
caráter universal parecem perfilar em todos os códigos de leis existentes. Há,
sem dúvidas, diferenças quanto a alguns aspectos dos códigos e as leis dos
países e seus respectivos povos, mas os princípios que regem estes códigos
não são os mesmo? E se são, não seriam objetivos? Como exemplo, citemos a
Declaração Universal dos Direitos Humanos. Por que esta declaração é

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“universal”? Porque foi criada para ser universal, ou porque se entendeu que
tais direitos humanos são necessários e, portanto, invioláveis? Se a resposta é
construída sobre valões que na prática são objetivos – e é o que tudo indica -,
então o que nos resta é perguntar de onde vem o padrão a partir do qual
estabelecemos a Declaração Universal de Direitos dos Homens.

Em relação ao segundo argumento de Mackie, é importante que primeiro


definamos o que se quer dizer com “estranho”. Se se quer dizer sobre algo que
“não seja mensurável”, admitimos muitas coisas que não o são e, ainda assim,
ninguém discordaria da sua existência, e. g., os elétrons ou o espaço-tempo.
Se a questão partir para a querela dos universais, então deve-se esclarecer o
que é que se quer dizer com os temos aplicados. Quando dizemos que um
círculo ou o número 1 não têm forma (lembre-se que o número “1” não é o
número em si, mas uma representação do mesmo), estamos dizendo que não
podem ser “vistos”, mas suas propriedades sim: algo ser circular (como uma
janela ou um banco) ou existir numa relação numérica (quatro artigos mais um
artigo dão cinco artigos).

Destarte, quando falamos da ontologia do bom ou do justo, referimo-nos


a algo como a ontologia dos números. O número 1, por exemplo, pode ter um
aspecto qualitativo ou quantitativo. Observe que isto depende da maneira como
o predico: “Carlos foi UM dos candidatos que veio” (quantitativo); Paulo é UM
pai em mil” (qualitativo). Mas, observe que também podemos dizer “UM é o
primeiro dos números naturais divisíveis por si mesmos”. Neste caso, apesar
de não apontarmos para nenhum “um”, referimo-nos ao número “puro”, à ideia
em si. Se ela não existisse, nenhum dos primeiros exemplos seria possível.
Apesar das predicações ressaltarem aspectos distintos, ambas se atrelam ao
número 1 (um), dando-nos a entender que existe algo ao qual se relacionam
exemplos de coisas concretas e abstratas.

Podemos fazer uma analogia com o justo. Quando dizemos “Ló era um
JUSTO”, entendemos predicar algo concreto, a pessoa de Ló. Todavia, quando
falamos “O JUSTO é pertinente aos homens que temem a Deus”, referimo-nos
acerca do justo como algo em essência e que não é outra coisa senão o que
estamos dizendo. Portanto, assim como “UM” é “UM”, o “JUSTO” é “JUSTO”, e

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tal conceito não pode desembocar em mero nominalismo cultural (ou
relativismo ético) pois, estaríamos falando de coisas distintas. Observe que
aqui a questão não é simplesmente de semântica ou linguística: um povo pode
ter uma nomenclatura completamente diferente para números naturais, mas se
entendê-los em essência, não importa o nome que se dê, eles serão a mesma
coisa, operarão do mesmo modo, terão as mesmas funções, o um será o um e
assim sucessivamente. No caso do justo, não é simplesmente “o que se
entende por justo” ou “o que se estabelece por justo” ou “o que se sente
quando dizemos que algo é justo”, porque desta forma, não estaríamos lidando
com o justo, mas com o que entendemos do justo. Note que, analogamente,
uma coisa é lidar com o número natural um; outra, completamente diferente, é
“com o que se entende do um”. Em ambos os casos, podem ou não ser a
mesma coisa.

OBJETIVISMO ÉTICO

Os filósofos normalmente classificam o subjetivismo e o objetivismo


éticos como duas nuances do Cognitivismo Ético. A ética cognitivista, como o
nome sugere, é aquela que se dedica a sistemas de cognitivismo ético, ligados
a pessoas (subjetivistas) ou aos objetos (objetivistas). O relativismo individual
ou cultural é um sistema cognitivista ético subjetivista. Ambos os tipos de
relativistas éticos creem que as sentenças éticas possuem algum valor de
verdade, mas estas dependem do que as pessoas creem, defendem, enfim,
pensam. É o compartilhamento de uma crença, na concepção relativista, que
lhe dará o status de verdadeira, tanto para um indivíduo como um grupo.

A grande questão se encontra efetivamente na gênese do pensamento


relativista ético. Friedrich Nietzsche, como pontuado, cria que a moral é como
uma “ficção necessária” para a manutenção da própria civilização. O problema
– e que se constitui um erro -, é pensar que a invenção humana é,
necessariamente, algo desprovido de verdades objetivas. Se os valores
oriundos da moral são subjetivos, e, portanto, relativos por que são “invenções
humanas”, então não há valores objetivos em quaisquer invenções humanas.
Mas, o cálculo, por exemplo, é uma invenção humana e não prescinde de

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verdades objetivas para existir, antes as utiliza. É realmente difícil acreditar que
algo que é necessário seja, ao mesmo tempo, uma invenção humana e uma
ficção. Se admitirmos que uma ficção é necessária, então estamos admitindo
que a realidade de algumas ideias abstratas é ao mesmo tempo necessária e
falsa, o que é um contrassenso e um problema aparente insolúvel para o
relativismo ético.

Outro problema que surge é entender, como defende o relativista ético


individual ou cultural, que o que se estabelece como moral depende do que se
acredita ser moral. Não necessariamente! É verdade que algo que era
moralmente aceito pode se estabelecer como imoral ao longo de tempos ou
espaços geográficos distintos. Pragmaticamente falando, os relativistas dirão
que o que se estabelece como moral e imoral é o que as pessoas acreditam
que são. Mas, se se estabelece que moral ou imoral é o que as pessoas creem
que são, então se defende a relatividade moral porque já se crê que a moral é
relativa, o que é outro absurdo para efeitos argumentativos. Este tipo de
confusão conceitual é chamado petição de princípio (petitio principii).

As consequências do relativismo moral também podem ser


perturbadoras. Imagine o nazismo. Se o que é moral é o que as pessoas
pensam ser moral, então o nazismo foi algo moral (não imoral), porque as
pessoas que o propagaram de fato acreditaram que o nazismo era correto.
Assim, quem lutou contra o nazismo, qualquer voz dissidente, era imoral, o que
obviamente se constitui um absurdo dadas as atrocidades nazistas. Mas,
observe que não é porque tais atrocidades o são “para nós, hoje”, que
classificamos o nazismo como essencialmente mau. Há algo em nós que
parece ver movimentos como o nazismo imorais em si mesmos. E se temos
boas razões para crermos que ideologias como o nazismo são más, como há
outras que se nos parecem inerentemente boas independentemente das
crenças ou opiniões humanas, então o relativismo ético e moral não em
sentido.

Pelo contrário, os que acreditam que falsidade ou verdade de


proposições ou sentenças sobre moral não dependem da crença dos
indivíduos são objetivistas éticos. A ética objetivista também é conhecida como

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realismo moral. Este, por sua vez, se relaciona com o naturalismo ético ou com
o não naturalismo ético. Para os naturalistas éticos, são as ciências naturais
que objetivamente definirão as propriedades morais de sentenças sobre os
valores morais, sendo as ciências as grandes validadoras do que vem a ser ou
não moral. Teorias do direito natural advém desta percepção, que originou
alguns sistemas éticos de grande influência até os nossos dias, como o
utilitarismo.

3. BREVE HISTÓRIA DA ÉTICA (ANTIGA, ESTOICA, MEDIEVAL


E MODERNA)

Em suas teorias morais, os filósofos antigos dependiam de várias


noções importantes. Entre elas estão a virtude e as virtudes, a felicidade
(ευδαιμονία – gr. eudaimonia) e a alma (ψυχη – gr. psychē). Podemos
começar com a virtude.

Virtude é um termo geral que traduz a palavra grega aretê (αρετη). Às


vezes, aretê também é traduzida como excelência. Muitos objetos, naturais ou
artificiais, têm sua aretê particular ou tipo de excelência. Há a excelência de um
cavalo e a excelência de uma faca. Além disso, é claro, há a excelência
humana. As concepções de excelência humana incluem figuras tão díspares
como o chefe guerreiro homérico e o estadista ateniense do período de sua
expansão imperial. O personagem de Platão, Meno, resume uma importante
linha de pensamento quando diz que a excelência para um homem é
administrar os negócios da cidade de modo que ele beneficie seus amigos,
prejudique seus inimigos e não se prejudique (Meno 71e). A partir dessa
descrição, podemos ver que algumas versões da excelência humana têm uma
relação problemática com as virtudes morais.

No mundo antigo, a coragem, a moderação, a justiça e a piedade eram


as principais instâncias da virtude moral. Uma virtude é uma disposição

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estabelecida para agir de uma determinada maneira; a justiça, por exemplo, é a
disposição estabelecida para agir, digamos, de modo que cada um receba o
que lhe é devido. Essa disposição estabelecida consiste em um conhecimento
prático sobre como fazer com que, em cada situação, cada um receba o que
lhe é devido. Ela também inclui uma forte atitude positiva em relação a fazer
com que cada um receba o que lhe é devido. As pessoas justas, portanto, não
são aquelas que ocasionalmente agem de forma justa, ou mesmo que
regularmente agem de forma justa, mas o fazem por algum outro motivo; em
vez disso, são pessoas que agem dessa forma de forma confiável porque
atribuem um valor intrínseco positivo e elevado ao fato de dar a cada um o que
lhe é devido e são boas nisso. A coragem é uma disposição estabelecida que
permite que a pessoa aja de forma confiável para buscar fins corretos em
situações de medo, porque valoriza intrinsecamente essa ação. A moderação é
a virtude que lida de forma semelhante com os apetites e as emoções.

Por fim, algumas palavras sobre a alma são necessárias, pois,


normalmente, os filósofos argumentam que a virtude é um bem da alma. De
certa forma, essa afirmação é encontrada em muitas tradições. Muitos
pensadores argumentam que ser moral não necessariamente proporciona
beleza física, saúde ou prosperidade. Em vez disso, como algo bom, a virtude
deve ser entendida como pertencente à alma; é um bem psicológico. Embora
Platão sustente que a alma é imortal e que sua virtude é um bem que
transcende a morte, seu argumento para a virtude como um bem psicológico
não depende da imortalidade da alma. Ele argumenta que a virtude é um bem
psicológico nesta vida. Viver uma vida humana mortal com esse bem é, por si
só, felicidade.

3.1. ÉTICA ANTIGA

3.1.1. SÓCRATES

A principal característica do ensino socrático é sua qualidade heroica.


Na Apologia, Sócrates diz que um homem que vale alguma coisa não avalia se
seu curso de ação põe em risco sua vida ou ameaça de morte. Ele olha apenas

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para uma coisa - se o que faz é justo ou não, se é obra de um homem bom ou
ruim (28b-c). Dita no contexto de seu julgamento, essa declaração é tanto
sobre ele mesmo quanto uma afirmação fundamental de seu ensino moral.
Sócrates coloca as considerações morais acima de todas as outras. Se
pensarmos em justiça como, grosso modo, a maneira como tratamos os outros,
as ações justas às quais ele se refere abrangem uma ampla gama. É injusto
roubar templos, trair amigos, roubar, quebrar juramentos, cometer adultério e
maltratar os pais (Rep. 443a-b). Uma declaração igualmente forte sobre a ação
injusta é encontrada no Críton, onde a questão é se Sócrates deve salvar sua
vida escapando da prisão em Atenas e abortando a sentença de morte.
Sócrates diz que o fato de ele fugir ou não deve ser governado apenas pelo
fato de ser justo ou injusto fazer isso (48d). Obviamente, ao contrapor a ação
injusta à perda da própria vida, Sócrates quer enfatizar que nada supera em
valor positivo o desvalor de praticar ações injustas. Nessas passagens, então,
Sócrates parece ser um herói moral, disposto a sacrificar sua própria vida em
vez de cometer uma injustiça, e a recomendar esse heroísmo a outros.

Entretanto, esse heroísmo também inclui um importante elemento de


autoconsideração. Na passagem da Apologia, Sócrates continua descrevendo
sua abordagem aos cidadãos de Atenas. Ele os repreende por estarem
absorvidos pela aquisição de riqueza, reputação e honra, enquanto não se
preocupam nem pensam na sabedoria, na verdade e em como melhorar suas
almas (Ap. 29d-e). À medida que ele desenvolve essa ideia, fica claro que a
perfeição da alma, tornando-a melhor, significa adquirir e ter virtude moral. Em
vez de acumular riquezas e honras, os atenienses deveriam procurar
aperfeiçoar suas almas na virtude. A partir dessa exortação, podemos concluir
que, para Sócrates, o bem psicológico supera o bem material e que a virtude é
um bem psicológico de primeira importância. O Críton apresenta outra
perspectiva sobre o bem psicológico. Sócrates diz (como algo óbvio para
todos) que a vida não vale a pena ser vivida se aquilo que é prejudicado pela
doença e beneficiado pela saúde - ou seja, o corpo - for arruinado. Mas, ainda
mais, ele acrescenta que a vida não vale a pena se aquilo que é prejudicado
pela ação errada e beneficiado pelo certo - a alma - for arruinado, na medida
em que a alma é mais valiosa do que o corpo (47e-48a). Podemos entender

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essa afirmação em termos positivos. A virtude é o principal bem psicológico; a
ação errada destrói a virtude. Portanto, o forte compromisso de Sócrates com a
virtude reflete sua crença no valor dela para a alma, bem como a importância
da condição da alma para a qualidade de nossas vidas.

3.1.2. PLATÃO

O maior discípulo de Sócrates, Platão, aceitou as principais crenças socráticas


na objetividade da bondade e na ligação entre saber o que é bom e fazer isso.
Ele também adotou o método socrático de conduzir a filosofia, desenvolvendo
o caso de suas próprias posições ao expor erros e confusões nos argumentos
de seus oponentes. Ele fez isso escrevendo suas obras na forma de diálogos,
nos quais Sócrates é retratado discutindo com outros, geralmente sofistas. Os
primeiros diálogos são geralmente aceitos como relatos razoavelmente
precisos dos pontos de vista do Sócrates histórico, mas os últimos, escritos
muitos anos após a morte de Sócrates, usam-no como porta-voz de ideias e
argumentos que, na verdade, eram originais de Platão.

No mais famoso dos diálogos de Platão, Politeia (a República), o


personagem Sócrates é desafiado pelo seguinte exemplo: Suponha que uma
pessoa obtivesse o lendário anel de Gyges, que tem a propriedade mágica de
tornar o usuário invisível. Essa pessoa ainda teria alguma razão para se
comportar de forma justa? Por trás desse desafio está a sugestão, feita pelos
sofistas e ainda ouvida hoje, de que a única razão para agir com justiça é o fato
de que não se pode escapar impune de agir injustamente. A resposta de Platão
a esse desafio é um longo argumento que desenvolve uma posição que parece
ir além de qualquer coisa que o Sócrates histórico tenha afirmado. Platão
sustentava que o verdadeiro conhecimento não consiste em saber coisas
particulares, mas em saber algo geral que é comum a todos os casos
particulares. Essa visão é obviamente derivada da maneira como Sócrates
pressionou seus oponentes a irem além da mera descrição de atos particulares
que são (por exemplo) bons, temperantes ou justos e, em vez disso, a
apresentarem um relato geral de bondade, temperança ou justiça.

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Certamente, a questão central em torno da qual toda a ética ocidental
girou pode ser atribuída ao debate entre os sofistas, que afirmavam que a
bondade e a justiça são relativas aos costumes de cada sociedade - ou, pior
ainda, que são apenas um disfarce para o interesse do mais forte - e os
platônicos, que sustentavam a possibilidade de conhecimento de uma forma
objetiva do Bem.

De acordo com Platão, a justiça existe no indivíduo quando os três


elementos da alma - intelecto, emoção e desejo - agem em harmonia uns com
os outros. A pessoa injusta vive em um estado insatisfatório de discórdia
interna, tentando sempre superar o desconforto do desejo insatisfeito, mas
nunca conseguindo nada melhor do que a mera ausência de desejo. A alma da
pessoa justa, por outro lado, é harmoniosamente ordenada sob o governo da
razão, e a pessoa justa obtém um prazer verdadeiramente satisfatório com a
busca do conhecimento. Platão observa que o maior prazer, de fato, vem da
especulação intelectual. Ele também apresenta um argumento para a crença
de que a alma humana é imortal; portanto, mesmo que um indivíduo justo que
viva na pobreza ou sofra de doenças não será negligenciado pelos deuses na
próxima vida, mas terá as maiores recompensas de todas. Em resumo, Platão
afirma que devemos agir com justiça porque, ao fazê-lo, estamos “em harmonia
com nós mesmos e com os deuses”.

Hoje, isso pode parecer uma concepção estranha de justiça e uma visão
rebuscada do que é necessário para alcançar a felicidade humana. Platão não
recomenda a justiça por si só, independentemente de qualquer ganho pessoal
que se possa obter por ser uma pessoa justa. Isso é característico da ética
grega, que se recusava a reconhecer que poderia haver um conflito irresolúvel
entre o interesse do indivíduo e o bem da comunidade. Foi somente no século
XVIII que um filósofo afirmou vigorosamente a importância de fazer o que é
certo simplesmente porque é certo, independentemente da motivação de
interesse próprio (veja abaixo Kant). Sem dúvida, Platão não sustentava que a
motivação para todo e qualquer ato justo fosse algum ganho pessoal; pelo
contrário, a pessoa que se dedica à justiça fará o que é justo porque é justo. No
entanto, ele aceitou a suposição de seus oponentes de que não se poderia

19
recomendar a adoção da justiça, em primeiro lugar, a menos que isso pudesse
ser demonstrado como vantajoso para si mesmo e para os outros.

Embora muitas pessoas hoje pensem de forma diferente sobre a


conexão entre moralidade e interesse próprio, a tentativa de Platão de
argumentar que aqueles que são justos são, a longo prazo, mais felizes do que
aqueles que são injustos teve uma enorme influência na ética ocidental. Assim
como as opiniões de Platão sobre a objetividade da bondade, a alegação de
que a justiça e a felicidade pessoal estão ligadas ajudou a estruturar a pauta de
um debate que continua até hoje.

3.1.3. ARISTÓTELES

Platão fundou uma escola de filosofia em Atenas conhecida como Academia.


Aristóteles, contemporâneo mais jovem de Platão e seu único rival em termos
de influência no curso da filosofia ocidental, foi estudar lá. Aristóteles muitas
vezes criticava ferozmente Platão, e seus escritos são muito diferentes em
estilo e conteúdo, mas o tempo que passaram juntos se reflete em uma
quantidade considerável de pontos em comum. Assim, Aristóteles concorda
com Platão que a vida de virtude é gratificante para o virtuoso e benéfica para
a comunidade. Aristóteles também concorda que a forma mais elevada e
satisfatória de existência humana envolve o exercício de suas faculdades
racionais em toda a sua extensão.

Todos os seres vivos, segundo Aristóteles, têm potencialidades


inerentes, que é de sua natureza desenvolver. Essa é a forma de vida
adequada a eles e constitui seu objetivo. Qual, entretanto, é a potencialidade
dos seres humanos? Para Aristóteles, essa pergunta é equivalente a perguntar
o que é característico dos seres humanos; e isso, é claro, é a capacidade de
raciocinar. O objetivo final dos seres humanos, portanto, é desenvolver seus
poderes de raciocínio. Quando fizerem isso, estarão vivendo bem, de acordo
com sua verdadeira natureza, e acharão essa existência a mais gratificante
possível. Para Aristóteles, um exame de uma faca revelaria que sua
capacidade distintiva é cortar e, a partir disso, poderíamos concluir que uma

20
boa faca é uma faca que corta bem. Da mesma forma, um exame da natureza
humana deveria revelar a capacidade distintiva dos seres humanos e, a partir
disso, seria possível inferir o que é ser um bom ser humano.

Aristóteles também é responsável por um pensamento muito posterior


sobre as virtudes que devemos cultivar. Em seu tratado ético mais importante,
a Ética a Nicômaco, ele classifica as virtudes como eram popularmente
entendidas em sua época, especificando em cada caso o que é
verdadeiramente virtuoso e o que é erroneamente considerado como tal. Aqui
ele aplica uma ideia que mais tarde veio a ser conhecida como Justa Medida.
Assim, a coragem, por exemplo, é o meio entre dois extremos: pode-se ter uma
deficiência dela, que é a covardia, ou pode-se ter um excesso dela, que é a
imprudência. A virtude da cordialidade, para dar outro exemplo, é a média entre
a obsequiosidade e a indelicadeza.

Aristóteles não pretende que a ideia do meio seja aplicada


mecanicamente em todos os casos: ele diz que, no caso da virtude da
temperança, ou autocontrole, é fácil encontrar o excesso de autoindulgência
nos prazeres físicos, mas o erro oposto, a preocupação insuficiente com esses
prazeres, quase não existe. A lista de virtudes e vícios de Aristóteles é
diferente das listas compiladas por pensadores cristãos posteriores. Embora a
coragem, a temperança e a liberalidade sejam reconhecidas como virtudes em
ambos os períodos, Aristóteles também inclui uma virtude cujo nome grego,
megalopsyche, às vezes é traduzido como “orgulho”, embora signifique
literalmente “grandeza de alma”. Essa é a característica de ter uma opinião
justificadamente elevada sobre si mesmo. Para os cristãos, o excesso
correspondente, a vaidade, era um vício, mas a deficiência correspondente, a
humildade, era uma virtude.

3.2. ESTOICA
O estoicismo teve origem nas opiniões de Sócrates e Platão,
modificadas por Zenão de Cítio (335 a 263 a.C.) e depois por Crisipo (280 a
206 a.C.). Gradualmente, ganhou influência em Roma, principalmente por meio
de Cícero (106-43 a.C.) e, mais tarde, por meio de Sêneca, o Jovem (4 a.C.-65

21
a.C.). Notavelmente, seus principais defensores incluem tanto uma pessoa
escravizada, Epicteto (55-c. 135), quanto um imperador, Marco Aurélio (121-
180). Essa é uma excelente ilustração da mensagem estoica de que o
importante é a busca da sabedoria e da virtude, uma busca que está aberta a
todos os seres humanos devido à sua capacidade comum de raciocínio,
independentemente das circunstâncias externas de suas vidas.

Atualmente, o significado mais comum da palavra estoico é o de uma


pessoa que permanece impassível diante das tristezas e aflições que afligem o
resto da humanidade. Essa é uma representação precisa do ideal estoico, mas
deve ser colocada no contexto de uma abordagem sistemática da vida. Platão
sustentava que as paixões humanas e os desejos físicos precisam ser
regulados pela razão. Os estoicos foram além: eles rejeitaram totalmente as
paixões como base para decidir o que é bom ou ruim. Embora os desejos
físicos não possam ser simplesmente abolidos, a pessoa sábia perceberá a
diferença entre desejar algo e julgar que é bom. Somente a razão pode julgar a
bondade ou a maldade do que é desejado. Se alguém for sábio, ele se
identificará com a razão e não com o desejo; portanto, não esperará a
satisfação dos desejos físicos nem se preocupará com a possibilidade de eles
não serem satisfeitos. O estoico sentirá dor física como os outros sentem, mas
saberá que a dor física deixa intocado o verdadeiro eu racional. A única coisa
que é verdadeiramente boa é viver em um estado de sabedoria e virtude. Ao
buscar uma vida assim, a pessoa está protegida do jogo da sorte que aflige
aqueles que almejam o prazer físico ou a riqueza material, pois a sabedoria e a
virtude são questões do intelecto e estão sob o controle do indivíduo. Além
disso, se as coisas se tornarem muito sombrias, há sempre uma maneira de
acabar com a dor do mundo físico.

No entanto, talvez o legado mais importante do estoicismo seja sua


convicção de que todos os seres humanos compartilham a capacidade de
raciocinar. Isso levou os estoicos a uma crença fundamental na igualdade, que
ia além da concepção grega limitada de cidadania igualitária. Assim, Sêneca
afirmou que uma pessoa sábia estimará a comunidade de seres racionais
muito acima de qualquer comunidade particular na qual o acidente de
nascimento a tenha colocado, e Marco Aurélio disse que a razão comum torna

22
todos os indivíduos concidadãos. A crença de que a capacidade de raciocinar é
comum a todos os seres humanos também foi importante porque dela os
estoicos tiraram a implicação de que existe uma lei moral universal, que todas
as pessoas são capazes de apreciar (veja lei natural). Assim, os estoicos
fortaleceram a tradição que considerava a universalidade da razão como a
base para rejeitar o relativismo ético.

3.3. MEDIEVAL
Os novos padrões éticos cristãos levaram a algumas mudanças na
moralidade romana. Talvez a mudança mais importante tenha sido um novo
senso de igualdade de status moral de todos os seres humanos. Como
mencionado anteriormente, os estoicos foram os primeiros a elaborar essa
concepção, fundamentando a igualdade na capacidade comum de raciocinar.
Para os cristãos, os seres humanos são iguais porque todos são
potencialmente imortais e igualmente preciosos aos olhos de Deus. Isso fez
com que os cristãos condenassem uma ampla variedade de práticas que
haviam sido aceitas pelos moralistas gregos e romanos, incluindo muitas
relacionadas à morte de seres humanos inocentes: desde os primeiros dias, os
líderes cristãos condenaram o aborto, o infanticídio e o suicídio. A princípio, até
mesmo matar na guerra era considerado errado, e os soldados que se
converteram ao cristianismo se recusavam a continuar portando armas. No
entanto, quando o império se tornou cristão, essa foi uma das ideias incômodas
que teve de ceder. Apesar do que Jesus havia dito sobre dar a outra face, os
líderes da igreja declararam que matar em uma “guerra justa” não era pecado.
A condenação cristã de matar em jogos de gladiadores, por outro lado, teve um
efeito mais permanente. Por fim, mas talvez o mais importante, enquanto os
imperadores cristãos continuavam a defender a legalidade da escravidão, a
igreja cristã aceitava as pessoas escravizadas como iguais, admitia-as em suas
cerimônias e considerava a concessão de liberdade às pessoas escravizadas
como um ato virtuoso, se não obrigatório. Essa pressão moral levou, ao longo
de centenas de anos, ao desaparecimento gradual da escravidão na Europa.

23
3.3.1. AGOSTINIANA

Em seu início, o cristianismo tinha um conjunto de escrituras que


incorporava muitas injunções morais, mas não tinha uma filosofia moral. A
primeira tentativa séria de fornecer tal filosofia foi feita por Santo Agostinho de
Hipona (354-430). Agostinho conhecia uma versão da filosofia de Platão e
desenvolveu a ideia platônica da alma racional em uma visão cristã na qual os
seres humanos são essencialmente almas, usando seus corpos como um meio
para atingir seus objetivos espirituais. O objetivo final continua sendo a
felicidade, como na ética grega, mas Agostinho concebeu a felicidade como
consistindo na união da alma com Deus após a morte do corpo. Foi por meio
de Agostinho, portanto, que o cristianismo recebeu o tema platônico da relativa
inferioridade dos prazeres corporais. Havia, sem dúvida, uma diferença
fundamental: enquanto para Platão os prazeres corporais eram inferiores em
comparação com os prazeres da contemplação filosófica neste mundo, para os
cristãos eles eram inferiores aos prazeres da existência espiritual no mundo
vindouro. Além disso, os cristãos passaram a considerar os prazeres corporais
não apenas como inferiores, mas também como uma ameaça positiva à
conquista da felicidade espiritual.

Também era importante que Agostinho não aceitasse a visão, comum a


tantos filósofos gregos e romanos, de que o raciocínio filosófico era o meio de
alcançar a sabedoria e a felicidade. Para um cristão, é claro, a sabedoria e a
felicidade só podem ser obtidas por meio do amor a Deus e da fé em Jesus
Cristo como Salvador. O resultado foi, por muitos séculos, a rejeição do uso do
raciocínio irrestrito na ética.

Agostinho estava ciente da tensão entre as motivações cristãs duplas de


amor a Deus e ao próximo, por um lado, e recompensa e punição na vida após
a morte, por outro. Ele se posicionou firmemente a favor do amor, insistindo
que aqueles que guardam a lei moral por medo de punição não a estão
guardando de fato. Mas também não é o amor humano comum que é suficiente
como motivação para a verdadeira vida cristã. Agostinho acreditava que todos
os seres humanos carregam o fardo do pecado original de Adão e, portanto,
são incapazes de se redimir por seus próprios esforços. Somente a graça

24
imerecida de Deus torna possível a obediência ao “primeiro grande
mandamento” de amar a Deus e, sem ela, não se pode cumprir a lei moral.
Esse ponto de vista fazia uma distinção clara entre os cristãos e os moralistas
das antigas religiões gregas e romanas, por mais humildes e puros que fossem
os últimos; somente os primeiros poderiam ser salvos, porque somente eles
poderiam receber a bênção da graça divina.

3.3.2. TOMÁS DE AQUINO

Depois de Agostinho, não houve grandes desenvolvimentos em ética no


Ocidente até o surgimento do escolasticismo nos séculos XII e XIII. Os escritos
éticos de Aristóteles não eram conhecidos pelos estudiosos da Europa
Ocidental na época de Abelardo. As traduções para o latim ficaram disponíveis
somente na primeira metade do século XIII, e a redescoberta de Aristóteles
dominou a filosofia medieval posterior. Em nenhum lugar sua influência é mais
marcante do que no pensamento de São Tomás de Aquino (1224/25-74), que é
frequentemente considerado o maior dos filósofos escolásticos e, sem dúvida,
o mais influente, já que seus ensinamentos se tornaram a filosofia semioficial
da Igreja Católica Romana.

A combinação dos ensinamentos de Aristóteles e do cristianismo


também é evidente nas opiniões de Aquino sobre o certo e o errado e sobre
como se chega a saber a diferença entre os dois. Aquino é frequentemente
descrito como defensor de uma ética de “lei natural”, mas esse termo é
facilmente mal interpretado. A lei natural à qual Aquino se referiu não requer
um legislador, assim como as leis da natureza que governam os movimentos
dos planetas. Um erro ainda mais comum é imaginar que essa concepção de
lei natural se baseia no contraste entre o que é natural e o que é artificial. A
teoria de Aquino sobre a base do certo e do errado foi desenvolvida como uma
alternativa à visão de que a moralidade é determinada simplesmente pela
vontade arbitrária de Deus. Em vez de conceber o certo e o errado dessa
maneira, como algo fundamentalmente não relacionado às metas e aos
propósitos humanos, Aquino via a moralidade como derivada da natureza
humana e das atividades que são objetivamente adequadas a ela.

25
É uma consequência dessa ética da lei natural que a diferença entre o
certo e o errado pode ser apreciada pelo uso da razão e pela reflexão sobre a
experiência. Embora a revelação cristã possa complementar esse
conhecimento em alguns aspectos, até mesmo os filósofos pré-cristãos, como
Aristóteles, podiam entender os fundamentos da vida virtuosa. No entanto, é
provável que alguém erre ao aplicar esses princípios gerais aos casos
particulares com os quais se depara na vida cotidiana. Costumes corruptos e
educação moral deficiente podem obscurecer as conclusões da razão natural.
Portanto, as sociedades devem promulgar suas próprias leis para
complementar a lei natural e, quando necessário, coagir aqueles que, por
causa de suas próprias imperfeições, estão sujeitos a fazer o que é errado e
socialmente destrutivo.

Segue-se também que a virtude e o florescimento humano estão ligados.


Quando as pessoas fazem o que é certo, elas fazem o que é objetivamente
adequado à sua verdadeira natureza. Assim, a promessa do céu não é uma
mera sanção externa, que recompensa ações às quais a pessoa seria
indiferente ou que podem até ser contrárias aos seus interesses. Pelo
contrário, Aquino escreveu que “Deus não é ofendido por nós, exceto pelo que
fazemos contra o nosso próprio bem”. A recompensa e a punição na vida após
a morte reforçam uma lei moral que todos os seres humanos, tanto cristãos
quanto outros, têm motivos prévios adequados para seguir.

3.4. MODERNA

3.4.1. UTILITARISMO

O utilitarismo é uma das abordagens mais poderosas e persuasivas da


ética normativa na história da filosofia. Embora não tenha sido totalmente
articulado até o século XIX, posições proto-utilitaristas podem ser discernidas
em toda a história da teoria ética.

Embora existam muitas variedades da visão discutida, o utilitarismo é


geralmente considerado como a visão de que a ação moralmente correta é a

26
ação que produz o maior bem. Há muitas maneiras de explicar essa afirmação
geral. Um aspecto a ser observado é que a teoria é uma forma de
consequencialismo: a ação correta é entendida inteiramente em termos das
consequências produzidas. O que distingue o utilitarismo do egoísmo tem a ver
com o escopo das consequências relevantes. Na visão utilitarista, a pessoa
deve maximizar o bem geral, ou seja, considerar o bem dos outros, bem como
o seu próprio bem.

O utilitarismo também se distingue pela imparcialidade e neutralidade do


agente. A felicidade de todos tem a mesma importância. Quando alguém
maximiza o bem, é o bem considerado imparcialmente. Meu bem não conta
mais do que o bem de qualquer outra pessoa. Além disso, o motivo que tenho
para promover o bem geral é o mesmo motivo que qualquer outra pessoa tem
para promover o bem. Ela não é peculiar a mim.

Todas essas características dessa abordagem da avaliação moral e/ou


da tomada de decisões morais provaram ser um tanto controversas e as
controvérsias subsequentes levaram a mudanças na versão clássica da teoria.

3.4.2. KANTIANA

É interessante notar que Kant reconheceu que desprezava as massas


ignorantes até que leu Rousseau e passou a apreciar o valor que existe em
cada ser humano. Por outras razões também, Kant faz parte da tradição
derivada de Spinoza e Rousseau. Como seus predecessores, Kant insistiu que
as ações resultantes de desejos não podem ser livres. A liberdade só pode ser
encontrada na ação racional. Além disso, o que quer que seja exigido pela
razão deve ser exigido de todos os seres racionais; portanto, a ação racional
não pode se basear nos desejos pessoais de um indivíduo, mas deve ser uma
ação de acordo com algo que ele possa desejar que seja uma lei universal.
Essa visão é mais ou menos paralela à ideia de Rousseau da vontade geral
como aquilo que, em oposição à vontade individual, uma pessoa compartilha
com toda a comunidade. Kant estendeu essa comunidade a todos os seres
racionais.

27
A contribuição mais marcante de Kant para a ética foi sua insistência em
que as ações de uma pessoa possuem valor moral somente quando ela
cumpre um dever por si mesma. Kant primeiro apresentou essa ideia como
algo aceito pela consciência moral comum dos seres humanos e só depois
tentou mostrar que ela é um elemento essencial de qualquer moralidade
racional. A afirmação de Kant de que essa ideia é central para a consciência
moral comum expressou, embora de forma explícita e extrema, uma tendência
da ética judaico-cristã; ela também revelou o quanto a consciência ética
ocidental havia mudado desde a época de Sócrates, Platão e Aristóteles.

A ética de Kant baseia-se em sua distinção entre imperativos hipotéticos


e categóricos. Ele chamou qualquer ação baseada em desejos de imperativo
hipotético, o que significa que é um comando da razão que se aplica somente
se a pessoa desejar o objetivo em questão. Por exemplo, “Seja honesto, para
que as pessoas pensem bem de você!” é um imperativo que se aplica somente
se a pessoa deseja que pensem bem dela. Em contraste com essa abordagen,
Kant disse que os comandos da moralidade devem ser imperativos
categóricos: eles devem se aplicar a todos os seres racionais,
independentemente de seus desejos e sentimentos. Para a maioria dos
filósofos, isso representa um problema insuperável: uma lei moral que se
aplicasse a todos os seres racionais, independentemente de suas vontades e
desejos pessoais, não poderia ter metas ou objetivos específicos, porque todos
esses objetivos teriam de se basear nas vontades ou desejos de alguém. Foi
necessário o gênio peculiar de Kant para aproveitar exatamente essa
implicação, que para outros teria refutado suas afirmações, e usá-la para
derivar a natureza da lei moral. Como nada além da razão é deixado para
determinar o conteúdo da lei moral, a única forma que essa lei pode assumir é
o princípio universal da razão. Assim, o princípio formal supremo da ética de
Kant é: “Aja apenas com base naquela máxima por meio da qual você pode, ao
mesmo tempo, desejar que ela se torne uma lei universal.”

28
4. A FILOSOFIA MORAL E ÉTICA: SUJEITO, CRISTIANISMO,
POLÍTICA E CIDADANIA

4.1. SENSO E CONSCIÊNCIA MORAL


A consciência moral é a capacidade que os indivíduos têm de discernir
entre o certo e o errado, de acordo com seus valores e princípios éticos. Ela é
responsável por orientar nossas ações e escolhas, promovendo o bem-estar
individual e coletivo. A consciência moral é desenvolvida ao longo da vida,
influenciada pela educação, cultura e experiências vivenciadas.

Serve como um guia interno que nos ajuda a tomar decisões éticas e a
agir de forma coerente com nossos valores. Quando estamos em sintonia com
nossa consciência moral, somos mais propensos a agir de maneira justa,
solidária e compassiva.

Alguns exemplos de situações em que a consciência moral pode se


manifestar incluem: ajudar uma pessoa em necessidade, recusar-se a
participar de atos prejudiciais a outros, denunciar injustiças e agir de acordo
com os princípios éticos, mesmo que isso implique em sacrifícios pessoais.

A consciência moral é um aspecto fundamental da nossa natureza


humana, que nos guia na distinção entre o certo e o errado, o bom e o mau.
Ela se manifesta como um senso interno de responsabilidade moral, que nos
orienta em nossas ações e decisões, levando em consideração o impacto que
estas terão sobre nós mesmos e sobre os outros.

O que define a consciência moral é a capacidade de discernir e avaliar


as consequências éticas de nossas escolhas. Ela nos permite refletir sobre
nossos valores e princípios, e nos ajuda a tomar decisões que estejam em
conformidade com nossa própria noção de justiça e equidade. A consciência
moral também nos alerta quando estamos prestes a violar nossos próprios
padrões morais, provocando sentimentos de culpa e remorso.

29
A consciência moral serve como um guia moral interno, que nos ajuda a
viver de forma ética e a contribuir para o bem-estar da sociedade como um
todo. Ela nos encoraja a agir de acordo com nossos valores e a considerar o
impacto de nossas ações sobre os outros. Além disso, a consciência moral nos
ajuda a desenvolver um senso de empatia e compaixão pelos outros,
promovendo relações mais saudáveis e harmoniosas.

Alguns exemplos de situações que envolvem a consciência moral incluem a


decisão de devolver um objeto perdido a seu dono, mesmo que ninguém esteja
olhando, ou de denunciar um ato de injustiça, mesmo que isso possa trazer
consequências negativas para nós mesmos. Nessas situações, a consciência
moral atua como um farol, iluminando o caminho que devemos seguir e nos
lembrando de nossos valores e princípios mais profundos.

4.2. O VALOR DA CONSCIÊNCIA MORAL


A consciência moral é uma parte fundamental da vida de uma pessoa,
pois nos permite entender que tipo de pessoa é. Portanto, a consciência moral
tem um ponto de vista interno e externo que depende dela.

No sentido interno, é a possibilidade de escolher, com base em um


código ético, o caminho ou a ação a seguir. Essa escolha também se baseia
em saber que cada ação tem sua consequência e que, como tal, o ser humano
é responsável. Essa interioridade também permite avaliar pensamentos, atos,
hábitos e modo de vida; Obviamente, julgamentos de valor aparecem nesta
avaliação. Além disso, essa interioridade tem uma relação direta com o
exterior, pois, com base nesses valores morais, é que o homem agirá, e não
apenas isso, mas também julgará as ações dos outros.

Portanto, a consciência moral é o que permite que os seres humanos


percebam o que vale, o que é valioso na vida, o que é bom ou, pelo menos,
percebem o que não vale a pena ou não fugir.

30
4.3. A IMPORTÂNCIA TEOLÓGICA DA ÉTICA: HÁ UMA “ÉTICA CRISTÔ?
A ética compartilha com outros empreendimentos humanos a busca da
verdade, mas distingue-se deles na sua preocupação com aquilo que o homem
deve fazer, à luz da verdade desvendada. Ela não é simplesmente descritiva,
mas também prescritiva no seu caráter.

O campo da pesquisa ética pode ser dividida em ética em ética


filosófica, teológica e cristã. A ética filosófica aborda a responsabilidade
humana a partir daquilo que pode ser conhecido pela razão natural e no que
diz respeito à existência temporal. A ética teológica trata daquilo que pode ser
aproveitado dos alegados entendimentos de uma determinada comunidade, no
tocante a esta vida ou a do porvir. A ética cristã é formato cristão da ética
teológica. Entende que “havendo Deus, outrora, falado muitas vezes, e de
muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, nestes últimos dias falou pelo Filho”
(Hb 1.1-2). Ela pesa as obrigações morais do homem à luz desta revelação
distinta.

Há, dentro da ética teológica de modo geral, e na ética cristã em


particular, uma preocupação com uma “ordem superior”. O compromisso
religioso da pessoa tem precedência sobre a obrigação à autoridade humana,
por mais legítima que seja esta última em outras circunstâncias. Devemos
obedecer a Deus mais do que aos homens (cf. At 4.18-19). De qualquer
maneira, vemos nossa responsabilidade dentro do escopo de qualquer fator ou
ideal integrante que esteja operante.

4.4. ÉTICA E POLÍTICA, CIDADANIA E SOLIDARIEDADE

4.1. POLÍTICA

O problema Ética e Política nasce na antiguidade, não tanto como


problema entre Ética e Politica, mas com a problemática distinção entre bom
governo e mau governo, que daí deriva a distinção entre rei e tirano. Nessa
época, predominava o monismo entre ética e política, a prática de uma
implicava a prática da outra, desconsiderando, inclusive, a existência dessa

31
integração entre os dois sistemas normativos (moral e política) por
considerarem um só sistema. A política é a ética exata só que em um âmbito
geral, enquanto a ética aparecia na vida particular do indivíduo a política
aparecia na polis.

Embora nem sempre haja convergência entre as práticas políticas e os


princípios morais, é fato hoje que a sociedade em geral está cansada de tantas
notícias envolvendo escândalos de corrupção e posturas não condizentes com
nossos representantes políticos (tanto na esfera do poder executivo quanto do
legislativo) e clama por uma sociedade mais justa, no mesmo sentido em que
desde a antiguidade Platão e Aristóteles já destacavam o importante papel que
a justiça deve desempenhar para a vida em sociedade.

4.2. CIDADANIA

Ética e cidadania são dois conceitos fulcrais na sociedade humana. A


ética e cidadania estão relacionados com as atitudes dos indivíduos e a forma
como estes interagem uns com os outros na sociedade.

Ética é o nome dado ao ramo da filosofia dedicado aos assuntos morais.


Cidadania significa o conjunto de direitos e deveres pelo qual o cidadão, o
indivíduo está sujeito no seu relacionamento com a sociedade em que vive. O
termo cidadania vem do latim, civitas que quer dizer “cidade”.

Um dos pressupostos da cidadania é a nacionalidade, pois desta forma


ele pode cumprir os seus direitos políticos. No Brasil os direitos políticos são
orquestrados pela Constituição Federal. O conceito de cidadania tem se
tornado mais amplo com o passar do tempo, porque está sempre em
construção, já que cada vez mais a cidadania diz respeito a um conjunto de
parâmetros sociais.

A cidadania pode ser dividida em duas categorias: cidadania formal e


substantiva. A cidadania formal é referente à nacionalidade de um indivíduo e
ao fato de pertencer a uma determinada nação. A cidadania substantiva é de

32
um caráter mais amplo, estando relacionada com direitos sociais, políticos e
civis.

A ética e a moral têm uma grande influência na cidadania, pois dizem


respeito à conduta do ser humano. Um país com fortes bases éticas e morais
apresenta uma forte cidadania.

4.3. SOLIDARIEDADE

A ética é um ramo da filosofia que estuda os princípios morais que


orientam o comportamento humano. Solidariedade, por sua vez, é a disposição
de agir em benefício dos outros, especialmente daqueles que estão em
situações de vulnerabilidade ou que necessitam de apoio. A solidariedade vai
além de um sentimento de compaixão; ela envolve ações concretas de ajuda e
colaboração mútua, promovendo a justiça social e o bem-estar coletivo.

A relação entre ética e solidariedade é intrínseca. A ética, ao nos


orientar sobre o que é correto e justo, muitas vezes nos leva a práticas de
solidariedade, em que reconhecemos nossa responsabilidade para com o
outro. Ser ético inclui reconhecer que nossas ações não ocorrem em
isolamento, e que temos o dever de contribuir para a construção de uma
sociedade mais equitativa e inclusiva. Dessa forma, a solidariedade se
apresenta como uma expressão concreta de princípios éticos, uma vez que
envolve colocar o bem-estar dos outros como uma prioridade em nossas
ações.

Em resumo, ética e solidariedade caminham juntas na construção de


uma sociedade mais justa e humana. A ética nos fornece as bases morais para
entender nossa responsabilidade para com o outro, enquanto a solidariedade
nos impulsiona a agir em prol dessa responsabilidade, promovendo o bem
comum e o respeito mútuo.

33
5. CONCEITO, FUNDAMENTOS E DESENVOLVIMENTO DA
CIDADANIA

A cidadania é o conjunto de direitos e deveres que um indivíduo tem


enquanto membro de uma sociedade organizada. Ser cidadão implica em
participar ativamente da vida pública e política, influenciando e sendo
influenciado pelas decisões tomadas pelo Estado, visando o bem comum.

5.1. FUNDAMENTOS

Os fundamentos da cidadania baseiam-se em três pilares principais:


Direitos civis, Direitos políticos e Direitos sociais. Os Direitos civis referem-se à
proteção das liberdades individuais, como o direito à vida, à propriedade, à
segurança, à justiça e à privacidade. Esses direitos protegem o indivíduo de
abusos por parte do Estado ou de outros cidadãos. Já os Direitos políticos,
englobam o direito de participar no governo, seja votando ou sendo votado,
além da liberdade de expressão e de associação política. Estes direitos
permitem ao cidadão influenciar diretamente as decisões que afetam a
coletividade. Enquanto que os Direitos sociais, incluem o direito à condições de
vida dignas, como educação, saúde, moradia e trabalho. Esses direitos buscam
garantir a igualdade de oportunidades e a justiça social.

5.2. DESENVOLVIMENTO

O desenvolvimento da cidadania é um processo contínuo que evolui ao


longo da história. Ele pode ser dividido em diferentes fases:

• Cidadania Antiga - Na Grécia e Roma antigas, a cidadania era restrita a um


grupo seleto de pessoas (homens livres), excluindo escravos, mulheres e
estrangeiros. A participação política era vista como um privilégio.

34
• Cidadania Moderna - Com a Revolução Francesa e Americana no final do
século XVIII, o conceito de cidadania passou a se expandir, baseado nos ideais
de liberdade, igualdade e fraternidade. O Estado começou a ser visto como
responsável por garantir os direitos fundamentais de todos os indivíduos.

• Cidadania Contemporânea - Atualmente, a cidadania está vinculada ao


Estado democrático de direito e abrange não só os direitos políticos e civis,
mas também os direitos sociais e ambientais. A cidadania global é um conceito
emergente, que reconhece os indivíduos como parte de uma comunidade
internacional, com responsabilidades e direitos que transcendem fronteiras
nacionais.

6. CIDADANIA: HISTÓRICO DA CIDADANIA E DIREITOS


HUMANOS

Evolução do conceito de cidadania ao longo da história, marcada por


transformações políticas, sociais e culturais. A cidadania está ligada aos
direitos e deveres dos indivíduos dentro de uma sociedade e, ao longo do
tempo, seu significado e abrangência foram mudando.

Na Grécia Antiga, a cidadania estava associada ao status político dos


homens livres que podiam participar das decisões da pólis (cidade-estado).
Estrangeiros, mulheres e escravos estavam excluídos. Em Atenas, por
exemplo, ser cidadão era um privilégio restrito, mas implicava também uma
série de deveres como a participação em assembleias. Em Roma, o conceito
de cidadania foi expandido. Inicialmente, apenas os habitantes de Roma eram
considerados cidadãos, mas com o crescimento do império, diferentes classes
de cidadania foram criadas, estendendo direitos limitados a povos
conquistados. No final, com o Édito de Caracala (212 d.C.), todos os habitantes
livres do Império Romano passaram a ser considerados cidadãos.

Com o declínio do Império Romano e o surgimento do feudalismo, o


conceito de cidadania perdeu força. A lealdade era mais relacionada à figura do

35
senhor feudal e à Igreja. A ideia de cidadão foi substituída pela de súdito, e a
noção de participação política foi quase inexistente durante grande parte da
Idade Média. A ideia de cidadania começou a ser resgatada com o
Renascimento e as mudanças trazidas pela Revolução Industrial e pela
ascensão do Estado-nação.

Após a Segunda Guerra Mundial, com a criação da Declaração


Universal dos Direitos Humanos (1948), a cidadania passou a incorporar um
conjunto de direitos humanos fundamentais que transcendiam as fronteiras
nacionais, como o direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.

Os Direitos Humanos são a liberdade e os direitos que todos os seres


humanos têm independente de raça, gênero, classe social, idioma, etnia, entre
outros. Dentre os direitos humanos, temos o direito à vida digna, à saúde, à
liberdade (direito de ir e vir); à educação; ao trabalho digno.

A Lei 12.986/14, que aborda o Conselho Nacional dos Direitos Humanos


– CNDH, afirma em seu artigo 1º, inciso 1º:

§ 1º Constituem direitos humanos sob a proteção do CNDH os direitos e


garantias fundamentais, individuais, coletivos ou sociais previstos na
Constituição Federal ou nos tratados e atos internacionais celebrados pela
República Federativa do Brasil.

Os Direitos Humanos e Cidadania se interligam pois a cidadania é a


busca pela implementação de direitos fundamentais, individuais e sociais. Por
meio da participação dos cidadãos e cidadãs na vida política, busca-se a
construção de um Estado com maior garantia de direitos. Os dois andam lado a
lado, fazendo com que a Constituição Federal seja minimamente cumprida. Por
meio da cidadania, é possível buscar por direitos básicos, como por exemplo,
educação, informação, saneamento básico, e com isso garantir os direitos
fundamentais.

36
7. TIPOS DE CIDADANIA

Existem diferentes tipos de cidadania, cada um relacionado a uma forma


específica de vínculo entre o indivíduo e o Estado ou a sociedade. Vamos
explorar os principais tipos de cidadania:

7.1. CIDADANIA FORMAL OU LEGAL

Este é o tipo mais comum e refere-se à cidadania conferida pela lei de


um país. Uma pessoa é considerada cidadã de um país quando possui direitos
e obrigações estabelecidos pela constituição e pelas leis desse território. A
cidadania formal é normalmente adquirida pelo nascimento (jus soli ou jus
sanguinis) ou por naturalização. No Brasil, por exemplo, alguém que nasce em
território brasileiro é considerado cidadão brasileiro.

• Jus Soli (Direito de Solo) - Cidadania adquirida pelo local de nascimento. Se


uma pessoa nasce em determinado país, ela automaticamente adquire a
cidadania desse país, independentemente da nacionalidade dos pais.

• Jus Sanguinis (Direito de Sangue) - Cidadania adquirida pela descendência.


Ou seja, uma pessoa pode se tornar cidadã de um país se seus pais ou avós
forem cidadãos desse país, independentemente de onde ela nasceu.

• Naturalização - Processo pelo qual um indivíduo estrangeiro adquire a


cidadania de outro país, após cumprir certos requisitos, como tempo de
residência, conhecimento da língua, entre outros.

7.2. CIDADANIA SOCIAL

Cidadania social refere-se aos direitos que garantem a participação


plena do indivíduo na sociedade, assegurando o acesso a serviços e benefícios
sociais, como educação, saúde, segurança social e trabalho. Esse tipo de

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cidadania não se limita apenas ao reconhecimento formal, mas está ligado à
efetiva inclusão do cidadão nas esferas de bem-estar social.

7.3. CIDADANIA POLÍTICA

Está relacionada à participação ativa do indivíduo no processo político


de uma nação, por meio do direito de votar, ser votado e de se engajar em
atividades políticas, como a filiação a partidos políticos, a participação em
debates públicos e a realização de manifestações. A cidadania política é um
dos pilares da democracia, permitindo que os cidadãos influenciem as decisões
que afetam suas vidas.

7.3. CIDADANIA ECONÔMICA

Este tipo de cidadania está vinculado ao direito de participar da vida


econômica de uma nação, tendo acesso ao mercado de trabalho, ao
empreendedorismo e à propriedade privada. Além disso, inclui o direito de
participar de políticas que impactam diretamente a economia, como decisões
sobre impostos, investimentos públicos e regulamentos econômicos.

7.4. CIDADANIA CULTURAL

A cidadania cultural se refere ao direito de participar e preservar o


patrimônio cultural de uma comunidade ou nação. Isso inclui o respeito e a
promoção das diversas expressões culturais, como a língua, tradições, religião
e outras práticas culturais. Além disso, abrange o direito de se expressar
livremente, sem discriminação, dentro de uma sociedade multicultural.

38
7.5. CIDADANIA GLOBAL

O conceito de cidadania global extrapola as fronteiras nacionais. A


cidadania global diz respeito à responsabilidade que todos os indivíduos têm
em relação ao bem-estar global, independentemente de seu país de origem.
Inclui a defesa de direitos humanos, questões ambientais e o combate à
pobreza e desigualdade em escala mundial. Embora não seja formalmente
reconhecida em termos legais, a cidadania global é um conceito cada vez mais
relevante em um mundo interconectado.

7.6. CIDADANIA DIGITAL

Com o avanço da tecnologia e o uso massivo da internet, a cidadania


digital tornou-se uma forma contemporânea de participação social e política.
Refere-se aos direitos e deveres dos indivíduos no ambiente digital, incluindo o
acesso à informação, a liberdade de expressão online e a privacidade, bem
como a responsabilidade de respeitar as regras e normas que regem o
comportamento na internet.

8. CIDADANIA E PSICOLOGIA DA RELIGIÃO

A relação entre cidadania e Psicologia da Religião é um campo de


estudo que busca entender como crenças religiosas e práticas espirituais
influenciam o comportamento dos indivíduos em suas interações como
cidadãos e membros de uma sociedade. Esses dois temas estão interligados,
uma vez que as religiões, ao longo da história, têm desempenhado um papel
crucial na formação de valores éticos e normas sociais que afetam a vida
comunitária, a política e os direitos dos cidadãos.

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A Psicologia da Religião é uma área da Psicologia que investiga as
crenças, experiências e práticas religiosas e espirituais a partir de uma
perspectiva científica. Ela busca entender como a religião molda as emoções,
cognições e comportamentos dos indivíduos. A intersecção entre cidadania e
Psicologia da Religião pode ser vista em várias áreas. Muitas religiões
promovem princípios éticos como a justiça, a compaixão e o respeito pelos
outros, que também são fundamentais para o exercício da cidadania. A
psicologia da religião estuda como essas crenças religiosas moldam o
comportamento moral e cívico dos indivíduos, incentivando práticas que
contribuem para o bem-estar coletivo. As crenças religiosas podem motivar os
indivíduos a se engajarem em atividades comunitárias, filantrópicas ou
políticas.

Do ponto de vista da cidadania, a promoção da tolerância religiosa é


fundamental para a coesão social. A Psicologia da Religião também examina o
papel das crenças e práticas religiosas na mediação de conflitos, tanto
pessoais quanto sociais. A psicologia da religião tem mostrado que a
religiosidade pode ser um fator de resiliência em situações de crise, como luto,
doença ou desemprego. A cidadania, por outro lado, garante o acesso a
serviços de saúde e apoio social, criando um ambiente no qual os indivíduos
podem lidar com dificuldades com o apoio tanto do Estado quanto de suas
comunidades religiosas.

A relação entre cidadania e psicologia da religião é complexa e


multifacetada, e envolve uma interseção profunda entre os valores pessoais de
fé e espiritualidade e as responsabilidades e direitos do indivíduo como
membro de uma sociedade democrática. As religiões podem desempenhar um
papel positivo na formação de cidadãos comprometidos com o bem comum.

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9. CIDADANIA E A IGREJA

A responsabilidade da Igreja pela boa cidadania não é uma


responsabilidade implícita. Tampouco é uma responsabilidade incidental. É
uma responsabilidade que está enraizada no próprio coração do propósito
cristão, como a vida e o ensino de Jesus, a prática da igreja primitiva e as mais
altas expressões da consciência cristã deixam evidente.

É preciso lembrar que Jesus e seus seguidores eram um povo sem


cidadania política. Eles não apenas eram membros de uma nação ocupada e
governada pelo conquistador romano, mas, naquela época e nos séculos
seguintes, a soberania era prerrogativa do monarca individual ou de poucos
poderosos.

Os homens da época de Jesus, no entanto, eram cidadãos sociais e o


peso do ensinamento de Jesus, como evidencia o Sermão da Montanha,
estava relacionado à cidadania social - com o relacionamento do homem sob o
comando de Deus com seu semelhante em todas as áreas da vida em que
uma vida poderia compensar a outra.

O surgimento da cidadania política, no sentido pleno da palavra, com o


advento e o desenvolvimento da democracia, aumentou muito a esfera da
responsabilidade cristã. Com a transferência da soberania do monarca para o
povo, uma nova obrigação para com Deus foi acrescentada. A culpa decorrente
da injustiça é agora compartilhada pelo povo como indivíduo, uma vez que o
povo, agindo como indivíduo, reivindica corretamente a autoridade terrena
suprema.

10. CIDADANIA E EDUCAÇÃO

A educação é o principal instrumento para o desenvolvimento da


cidadania. Através do processo educativo, os indivíduos não apenas aprendem
conteúdos formais, como matemática, história ou ciências, mas também
desenvolvem valores e habilidades necessárias para uma convivência

41
harmoniosa em sociedade. É na escola que se constrói o entendimento sobre
direitos humanos, justiça social, democracia, respeito às diferenças e à
diversidade.

Educação e cidadania estão intimamente conectadas. Uma educação de


qualidade promove o desenvolvimento de cidadãos críticos, conscientes e
participativos. Ao compreender seus direitos, o cidadão se torna mais
capacitado para exigir que eles sejam respeitados. Ao mesmo tempo, a
educação também ensina sobre os deveres que cada pessoa deve cumprir
para o bom funcionamento da sociedade.

Apesar de seu papel fundamental, a educação enfrenta desafios quando


se trata de formar cidadãos plenos. Muitas vezes, o foco excessivo em
conteúdos teóricos e em avaliações de desempenho pode deixar em segundo
plano a formação cidadã. Para superar desafios como este, é necessário que
as políticas educacionais valorizem não apenas o conteúdo formal, mas
também a formação ética dos estudantes. A cidadania, nesse sentido, deve ser
vista como uma competência a ser desenvolvida, da mesma forma que outras
disciplinas são trabalhadas. Cidadania e educação são pilares fundamentais
para a construção de uma sociedade mais justa. Através da educação, as
pessoas aprendem a exercer sua cidadania de forma consciente, entendendo
seus direitos. Promover uma educação que valorize a cidadania é, portanto,
essencial para o bem-comum da sociedade.

42
BIBLIOGRAFIA

SILVA NETO, Artur Eduardo da. A Arte da Filosofia: Uma Perspectiva


Cristã. Curitiba: Luz & Vida, 2018.

ELWELL, Walter A. Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã. São


Paulo: Vida Nova, 2009.

MARCONDES, Danilo. Textos Básicos de Ética : De Platão a Foulcault. Rio


de Janeiro: Zahar, 2007.

SEARLE, Robert W. The Church Responsability for Good Citizenship. 1949.

https://www.britannica.com/topic/history-of-ethics/Later-Greek-and-Roman-
ethics

https://plato.stanford.edu/entries/ethics-ancient/

https://philosophynow.org/issues/153/Ethics_in_Politics

https://institutoaurora.org/direitos-humanos-e-cidadania/

https://www.significados.com.br/etica-e-cidadania/

https://www.sabedoriapolitica.com.br/etica-e-politica/

https://maestrovirtuale.com/consciencia-moral-caracteristicas-para-que-serve-e-
exemplos/

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