Brasileiro Fala Portugues

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 10

Brasileirofala português:

monolingüismo ee preconceito
TUDO P lingüístico
CEG
PROISIO Gilvan Müller de Oliveira

ENDA
A concepção que se tem do país éa de que aquise fala
uma única língua, a língua portuguesa. Ser brasileiro e falar o
português (do Brasil) são, nessa concepço, sinônimos. Trata-se
de preconceito, de desconhecimento da realidade ou antes de um
projeto político - intencional, portanto - de construir um país
monolíngüe?
Em algum nível todos esses fatos andam juntos. Não é
por casualidade que se conhecem algumas coisas e se desconhe
cem outras: conhecimento e desconhecimento são produzidos
ativamente, a partir de óticas ideológicas determinadas, cons
truídas historicamente. No nosso caso, produziu-se o 'conheci
mento' de que no Brasil se fala oportuguês, eo'desconhecimen
to» de que muitas outras línguas foram e são igualmente faladas.
O fato de que as pessoas aceitem, sem discutir, como se fosse um
"tatonatural', que o »português é a língua do Brasil' foi eé funda
mental paraobter consenso das maiorias para as políticas de re
pressão às outras línguas, hoje minoritárias.
Para compreendermos a questão épreciso citar alguns
dados: no Brasilde hoje são falados por voltade 200 idiomas. As
Federal de
1 Lingüista, coordenador do Núcleo de Estudos Potugueses da Universidade
Investigação e
Santa Catarina (NEP/UFSC)e pesquisador- associado do lnstituto de
Desenvolvimento em Política Lingüística (IPOL). E-mail: gilvan @
cce.ufsc.br
83
nações indíigenas do país falam cercade 170 linguas (chamadas
de autóctones), e as comunidades de descendentes de imigrantes
outras 30 línguas (chamadas de línguas alóctonmes). Somos, por
tanto, como amaioria dos países do mundo - em 94% dos países
do mundo é falada mais de uma línguà um país de muitas
línguas, plurilíngüe.
Se olharmos para nosso passado veremos que fomos, du
rante amaior parte da nossa história, ainda muito mais do que
hoje, um território plurilíngüe: quando aqui aportaram os portu
gueses, há 500 anos, falavam-se no país, segundo estimativas de
Rodrigues (1993: 23), cerca de 1.078 línguas indígenas, situação
de plurilingüismo semelhante àque ocorre hoje nas Filipinas (com
160línguas), no México (com 241), na India (com 391) ou, ainda.
na Indonésia (com 663 línguas).
O Estado Portuguêse, depois da independência, o Estado
Brasileiro tiveram por política, durante quase toda a história,
impor o português como a única língua legítima, considerando
acompanheira do Império (Fernão de Oliveira, na primeira gra
máticada língua portuguesa, em 1536 ). Apolítica lingüística do
Estado sempre foi a de reduzir onúmero de línguas, num pro
cesso de glotocídio (assassinato de línguas), através de desloca
mento lingistico, isto é, de sua substituiço pela língua portugue
sa. A história lingüística do Brasil poderia ser contada pela se
qüência de políticas lingüísticas homogeneizadoras e repressi
vase pelos resultados que alcançaram: somente na primeira me
tade deste século, segundo Darcy Ribeiro, 67 línguas indígenas
desapareceram no Brasil - mais de uma por ano, portanto
(Rodrigues, 1993:23). Das 1.078 línguas faladas no ano de 1500,
ficamos com cerca de 170 no ano 2000 (somente 15% do total), e
várias destas 170encontram-se já moribundas,faladas por popu
lações diminutas e com poucas chances de resistir ao avanço da
língua dominante.
2 Outros gramáticos da época afinaram essa mesma relação entre a línguaea domina
ção, como Antonio de Nebrija, opimeiro gramático da língua castelhana: "a língua sem
pre acompanhou a dominação e a seguiu, de tal modo que juntas começaram, juntas
cresceram, juntas florescaram e, afinal, sua queda foi comum" (Nebrja, 1492, Introdução,
citado a partir de Gnerre,1987:10).
3 Ou mesmo pela eliminação pura e simples das populações falantes destas línguas.
84
Canila T. Salda
Prot. Espanh
DLLE/UFSC

Essaação do Estadopode ser observada, por exemplo, no


Diretório dos Indios,de 1758, documento com o qual o Marquês
de Pombal pretendeu legislar sobre a vida dos índios - primeiro
sóda Amazônia, depoisde todo o Brasil- no período subseqüente
àexpulsão dos Jesuítas. Aintenção expressa, de 'civilizar' os ín
dios, realiza-se através da imposição do português, língua do
Príncipe, comomostra este fragmento com a grafia da época:
Sempre foi maxima inalteravelmente praticada em todas
1s Naçoens, que consquistarað novos Dominios, introduzir logo
nos Póvos conquistados oseu proprio idiôma, por ser indisputarel.
que este he hum dos neios mais effcazes para desterrar dos Póvos
rusticos a barbaridade dos seus antigos costumes; e ter mostrado
a erperiencia, que a0mesmo passo, que se intodiuz nelles o usoda
Lingua do Principe, que os c0nguistou, se lhes radica tambem o
affecto, a veneraçaõ, e a obediencia ao mesmo Principe. (...)será
hum dos principáes cuidados dos Directores, estabelecer nas suas
respectivas Povoaçoens ouso da Lingua Portugueza, naõ consen
tindo de modo algum, que os Meninos,e Meninas, que pertence
rem ás Escólas, e todos aquelles Indios, que forem capazes de
instrucçaõ nesta nateria, usem da Lingua propria das suas
Naçoens, ou da chamada geral; nas unicamente da Portugueza,
na forna, que Sua Magestade tem recõnendado em repetidas or
dens, que até agora se nað obseruáraõ com total ruina Espiritual.
e Temporl doEstado (Directorio,p. 3-4, cap. 6, grifo meu).
Naquele momento histórico, odocumento de Pombal vol
ta-se sobretudo contra a ingua geral, o tupi da costa do Brasil,
sformado em língua veicular de índios, brancos e negros
vastas porções do território, especialmente na Amazônia, onde é
chamada de nheengatu. O documento marca o início do ocaso desta
importante língua veicular, ocasoque vai se acelerar com a chaci
na de cerca de 40.000 pessoas falantes de nheengatu, índios e
negros que pegaram em armas contra a dominaço branca' na
revoluço denominada Cabanagem, entre 1834 e1841 (Bessa Freire,
4 Nome abreviado do 'Directorio que se deve observar nas Povoações dos Indios do Pará, e
Maranhão em quanto Sua Magestade naõ mandar ocontrario', publicado em edição fac
similar por Almeida (1997).
85
1983:65).Oprocesso vaise consumar como desaparecimentod
nheengatu em grande parte da Amazônia - mas não em tod
fato causado pela chegada de 300 a 500 mil nordestinos, faalantes
monolíngües de português, entre 15/0, quando começa o ciclo
da borracha, e 1918, final da Primeira Guerra Mundial.
sar desse processo de deslocanento lingiistico queeoo: Hoje, ape-
português nas calhas da maioria dos grandes rios,o
substituiu pelo
resiste "entre a cidade de Manause as malocas do
gro, numa área aproximada de 300.000 km² (..) o
nheengatu
Alto Rio Ne-
instrumento de comunicação usual da população que nheengatu
aí resice a
éo
a língua de comércio" (Bessa Freire, 1983:73). Isso é demonstra.
do, para tomar um exemplo, nesta propaganda política de um
candidato do Partido dos Trabalhadores (PT)a deputado estads
alna eleição de 1998:
Alto Rio Negro Mirailá Art
Se' Muitá,
Mbuessara Aloysio Nogueira candidato
Depmutado Estadual ari.
Aé nira katu, ti mira puxt.
Aé yane'anana.
Deputado Estadual yawé,Mbuessara
Aloysio Nogueira uss1l yane
maranunhangara kirimnbawa kuri.
Aé tussuAlto RioNegro miraitá
nheenga kri Assemblia Legislativn
upé.
Lxé ayumana penhé, se'anamaitá.
Mbuessara Auxilionar Silva Ugarte suí
Não devemos imaginar, entretanto, que leis como
Diretório tenham, por si só, mudado o perfil lingüístico do Pab,
5 "Aos povos do Alto Rio Negro. MeusImãos: O Professor Aloysio Nogueiraécandidato a
deputado estadual. Ele égente boa. Ele é nosso amigo (parente). Como deputado estadu-
al, o Professor Aloysio Nogueira vai ser o nosso valente guerreiro. Ele vai seravozdos
povoss do Alto Rio Negro na Assembléia Legislativa. Eu vos abraço, meus parentes. Pro-
fessor Auxiliomar Silva Ugarte". (0texto ea tradução me foram gentilmente cedidos pelo
própio Aloysio Nogueira -a quem agradeço -em SãoGabriel da Cachoeira -AM).
86
ou que tenham sido obedecidas' tranqüilamente pela popula
c§o, O historiador José Honório Rodrigues chama nossa atenção
para a resistência que os diversos grupos lingüísticos do país
opuseram às politicas de homogeneização e glotocídio, numa
verdadeira guerrade linguass :
Numa sociedade dividida emn castas, em raças, classes,
mesmo guando é evidente oprocesso de unificação da língua,
especialmente nIM continente comO o Brasil, onde durante
três séculos combateram várias luguas indígenas e negras
contra uma branCa, não havia nem paz cultural, nem paz Iin
giitstica. Havia, sim, unm permanente estado de guerra. (...)O
processo cultural que impôs uma lngua vitoriosa sobre
outras não foi assinntão pacífico, nenn tão fácil. Custou esfor
cos inauditos, custou sague de rebelados, custou suicídios.
custou vidas (Rodrigues, 1985: 42).
Não sóos índios foram vítimas da política lingüística dos
Estados lusitanoe brasileiro: também os imigrantes - chegados
principalmente depois de 1850 - e seus descendentes passaram
por violenta repressão lingüística e cultural - jáque a língua na
turalmente é parte da cultura. O Estado Novo (1937-1945), regi
me ditatorial instaurado por Getúlio Vargas, marca o ponto alto
da repressão às línguas alóctones, através do processo que ficou
conhecido como "nacionalizaçãodo ensind' e que pretendeu selar
odestino das línguas de imigração no Brasil, especialmente o do
alemão e doitaliano na região colonial de Santa Catarina e do Rio
Grande do Sul. Foi nesses dois estados, nos quais a estrutura
minifundiária e a colonizaço homogênea de certas regiões ga
rantiram condições adequadas para a fixação do alemão e do ita
Ilàno, que a repressão lingüística, através do conceito jurídico de
"crime idionáticd', inventado pelo Estado Novo, atingiu sua mai
or dimensão.

OO conceito 'guerra de línguas' nos possibilita entender que as línguas (isto é, as diversas
Comunidades lingüísticas) não convivem pacificamente, mas se valem das diferenças
inguisticas nas suas lutas políticas de defesa ou de conquista. (Calvet, 1999)

87
Durante o Estado Novo, mass sobretudo entre 1941 e1945,
comunitárias?e as desapronri
O governo ocupou as escolas
fechougráficas de jornais em alemão e italiano, perseguiu, pren
deu e torturou pessoas simplesmente por falarem suas línguas
maternas em público ou mesmo privadamente, dentro de suas
casas, instaurarndo uma atmosfera de
terror e vergonha que
que
inviabilizou em grande parte a reprodução dessas línguas, aue as
pelo número de falantes eram bastante mais importantes
línguas indígenas na mesma época: 644.458 pessoas, em sua
maioria absoluta cidadãos brasileiros, nascidos aqui, falavam ale
mão cotidianamente no lar, numa população nacional total esti
mada em 50 milhões de habitantes, e 458.054 falavam italiano.
dados do censo do IBGE de 1940 (Mortara, 1950). Essas línguas
perderam sua forma escrita e seu lugar nas cidades, passando
seus falantes ausá-las apenas oralmentee cada vez mais na zona
rural, em âmbitos comunicacionais cada vez menos extensos.
O
governo de Santa Catarina montou campos de trabalho
forçado, sobretudo para descendentes de alemães que insistis
sem emn falar sua língua; a Polícia Militar,não só neste estado,
prendeu e torturou, obrigou as pessoas adeixar suas casas em
determinadas "zonas de segurança nacional". Mais grave que
tudo isso:a escola da "nacionalização" estimulou as crianças a
denunciar os pais que falassem alemão ou italiano em casa, cri
ando seqüelas psicológicas insuperáveis para esses cidadãos que,
em sua grande maioria, eram e se consideravam brasileiros, em
bora falando alemão.

7 "Apartir do ano de 1932 se inicia uma série de medidas contra o uso da língua alema nas
escolas teuto-brasileiras. Esta se explica,de um lado, como uma resposta aos reclamos
de políticos e intelectuais nacionalistas,que se filiariam, em 1937, ao govemo esta
novista,
eno uSOe,dedeum
outro, àsidioma
único recomendações
em todoo de políicos
país, liberais, que
uma condição sineenxergavam
qua non paranaoinstruça
exercício
da cidadania."(Brepohl de Magalhães, 1998:48).
8 De todos os censos brasileiros, somente os de 1940 e 1950se interessaram por pergu
tar qual língua os brasileiros usavarm no lar, e se sabiam falar português.
9 Chamada, no Rio Grande do Sul, de Brigada Militar. Éinteressante que eFiori, que na
documenta-
muitos anos pesquisa o processo de nacionalização do ensino, ao procurarra
arquivos
ção da polícia(DOPS) referente a Santa Catarina no período estadonovista nos anosda
de Curitiba, tenha descoberto que elafoi suprimida, e quenada consta"'sobre os
repressão lingüísica (comunicação pessoal).
88
Camila T. Sollonh
Prof. Espanho
DLLE/UFSC

Um dos fatos mais trágicos, entretanto, é que encontra


mos na nossa história muito poucas vozes que se opuseram ao
esmagador processo de homogeneização, mesmo entre inte
lectuais brasileiros. "Causa perplexidade", afirma Simon
Schwartzman (et all: 1984, 72) "ofatode nunca ter havido, por parte
das diversas correntes polfticas de algumna signifcaçãona história bra
sileira, quem dgfendesse para opais a constituição de una sociedade
culturalnente pluralista'"
Na lingüística brasileira, da forma como ela está
estruturada nas nossas universidades hoje, o estudo da diversi
dade lingüística, istoé, do plurilingüismo, tem um lugar apenas
modesto nos esforços de pesquisa. Quando se fala em diversida
de lingüística muitas vezes se pensa na diversidade interna à
própria língua portuguesa, o que decorre, entre outras razões,
do predomínio, no país, de uma sociolingüística de cunho
laboviano, que poderíamos chamar de 'sociolingüística do
monolingüismo. Menor ainda é preocupaçãode contribuir para
garantir, às populações que não falam português, seus direitos
lingüisticos",através, por exemplo,de intervenções políticas nos
órgãos responsáveis ou na mídia. Nesse sentido, não temos um
quadro muito diferente do que o que Dora Pellicer (1993:36-7)
afirmaa respeito da lingüística mexicana em um texto intitulado
"Foi então que as línguas indígenas passaram das mãos dos mis
sionários para as mãos dos eruditos":
Noobstante, la labor de los especialistas mexicanos en el
mundo académico no tuvo efecto alguno en la legitimación del
uso de estos idiomas lindigenasl en el contexto de la nación
independiente. Pueden argumentarse arias razones de que ello
oCurriera así. Pero una determiante principal es que aparente
mente no hubo, por parte de este gremio, tan interesado en
descripciones, comparaciones y estudios dialectales, el proposito
de lograr, mediante sus conocimientos cumulados, la
reivindiaación del uso de estas lencuas. Para esa recién constituida

10 Vide a DECLARACÁO UNIVERSAL DOS DIREITOS LINGÜISTICOS, promulgada em


Julho de 1996,e publicada no Brasilpelo Instituto de Investigação e Desenvolvimento em
Política Lingüística, Florianópolis, (no prelo).
89
intelectualhdad mexicana - cuyos niembros,
poseedores de una
profusaeudición, s mantenian al día de la moderna filoloçía
losidionuas 1Latiios onstitueron n ayastonante objeto de estudi
pero nada Ás. En el terrenoideológico todos cllos
sinsometerloa dis usiön yrofumda, cl ideal nacionalIde una
Coún (.y". lengua compartieron,
A História nos mostra que poderíamos ter sido umm
país
ainda muito mais plurilingüe,1 não fossem as repetidas investidas
do Estado (e das instituições aliadas, ou ainda a omissão de gran
de parte dos intelectuais) contra a diversidade cultural e
tica. Essa mesma História nos mostra, entretanto, que nãolingüís
fomos
apenas um país multicultural e plurilingüe: somos um país
pluricultural e multilíngüe, não só pelaatual diversidade de lin
guas faladas no território, mas ainda pela grande diversidade
interna da língua portuguesa aqui falada, obscurecida por outro
preconceito, ode que oportuguês éuma língua sem dialetos.
Finalmente, ainda, somos plurilíngües porque estamos presenci
ando o aparecimento de 'novos bilingüismos', desencadeados
pelos processos de formação de blocos regionais de países, no
nosso caso o MercCosul, que acompanhaoutras iniciativas como a
União Européia eo Tlcan (Nafta). Esses processos desencadeiam
novos movimentos migratórios, novos fatos demolingüísticos e
novas configurações para ochamado "bilinguismo por opçao ;
isto é, novas orientações para o aprendizado de línguas estran
geiras. E de se esperar que ocasionem ainda novos tipos de desio
camentos lingüisticos.
E porque, também, da mesma forma que se resistiu aos
processos de homogeneização na época da Colônia, resistência
11 "Contudo, o trabalho dos especialistas mexicanos nomundo
acadêmico não teve eo
algum na legitimação do uso destes idiomas [indígenasi no contexto
te. Podem ser apontadas várias razões para gue isso
da nação indepenoell
tenha ocorrido dessa foma. A P
pal, todavia, éque aparentermente não houve, por parte deste grupo, tão interessauo
descrições, comparações e estudos dialetais, o propósito de apoiar, mediante seus
mentos acumulados,a reivindicação do uSo destas Iínguas, Para essa n
xicana recém constituída - cujos membros, intelectuallda0e
possuidores
tinham a par da modema filologia -os idiomas de uma profusa
nativos constituiram erudiçao,bieto
um apaixonante objeto
de estudo, mas nada mais. No terrenoideológico todos eles compartilharam, semsubmeter
a uma discussão aprofundada, o ideal
nacional de uma língua comum (..)
90
continua sendooposta, seja pelos movinentos indígenas organi
zados,seja por outros grupos, falantes das línguas de imigração
Ou de variedades discriminadas do português. Prova disso é que
aConstituição de 1988 reconhece aos índios odireito às suas lín
(210 e 231),
guas, pelo menos no aparato escolar, em dois artigos Bases
fatoque foi regulamentado pela nova Lei de Diretrizes e
da Educação Nacional, de 1996,também em dois artigos (78 e
79). Esseé um dadomuito novo na históriadas legislações brasi
leiras, tão ciosas em "integrar o índio", isto é, fazer com que ele
outra coisa:
deixasse de ser oque era, para se transformar em
mão-de-obra nas grandes propriedades ou nas periferias das gran
foram anco
des cidades. Diga-se de passagem que esse direitos indí
rados na Constituição por ativa participaçãodo movimento
constituinte.
gena no processo da
Conceber uma identidade entre a 'língua portuguesa' e aa
importantes
'nação brasileira' sempre foi uma forma de excluir
grupos étnicos e lingüísticos da nacionalidade; oude querer
duzir estes grupos, no mais das vezes àforça, ao formato "luso
brasileiro. Muito mais interessante seriaredefinir o conceito e
nacionalidade, tornando-o plural e aberto àdiversidade: seria mais
democrático e culturalmente mais enriquecedor, menos violento
relacionar
e discricionário, e permitiria que conseguíssemos nos nem
de uma forma mais honesta com a nossa própria história:
horrores
tentando camuflare maquiar o passado, escondendo osconstituí
que nos
das guerras, dos massacres e da escravidão
seqüência de de
ram, nem vendoahistória apenas como uma
núncias a seremn feitas.
Brasil de
Encerro com um libelo ao plurilingüismo no na sua
se dedicado a escrever
Darcy Loss Luzzato, autor que tem rio-grandense)-amplamente
lingua materna, o tlian (ou vêneto
nas regiões coloniais italianas do Rio Grande do Sul e, em
Talado manutenção,
menor escala, de Santa Catarina - e a lutar pela sua
imigração nem os
num quadro jurídico que não dáàs línguas deaos índios. Ele nar
reconhecem
mesmos e poucos direitos que se
ra, neste trecho, um sonho que teve:
Mego insoniàche
Che bel insÒnio che go buol'altrn sera. due léngue: fra de
in tuto elSud del Brasile tuti parlinoalmuaco
91
noantri, ogni uno edlyarleva talian eportoghese;iii dissendenti dei
tedeschi ise fena intender tantoin tedesco come in bbrasilian; i
polachi iyarkva tanto in polaco cometn, portoghese; i giaponesii
dopereva co la medéstinuafassilità el brasillian eelgiaponese; vissin
ale frontierc col Uruguay e la Argentima, tanto se sentiva che ii
parlea in brasilian come in spagnolo. Eghen era de quei che
ala
era franchi in tre oquatro léngue! Quando me son desmissià
matina, ensàndoçhe sora, me go 1ncorto che sto bel insònio el
podaria cSSer stato vero: bastaria che gavéssinnO buo Governi
invesse de governi. Bastaria che nvesSe e polhtico-buròcrati
garéssino buo la fortuna de esser governadi paròmini de vision.
stadisti, enò gente de vistacurta e storta. Ma, n0antri, podemo
cambiar la stòria. Me non0, el diseva che tuto lè scominsiar!
Alora, sCOmIinsicmo n0a1tri talia11, che semo stati sempre
vanguardieri. Dedrio de noantri, dopo verta la strada, i veguarà i
altri. So siCuro!/"2 (Tonial, 1995: capa)

12 "Que belo sonho tive noutra noite. Sonhei que em todo o sul do Brasil todos falávamos
pelo menos duas línguas:entre nós, falava-se talian e portuguôs; os descendentes de
alemães se faziam entender tanto em alemão como em brasileiro: os poloneses falavam
tanto em polonésquanto em português; os japoneses operavam com a mesmíssima fa
lidade obrasileiro e ojaponês; perto da fronteira com o Uruguai e a Argentina, tanto se
escutava
em três ouquanto
quatrose falava em
linguas! brasileiro
Quando como em
me acordei pela espanhol. Ehavia quem
manhã, pensando nisso,fosse
me deifluente
conta
que este belo sonho poderia ter sido verdadeiro: bastaria gue tivéssemos tido Governo
invés de govemos. Bastaria que invés de políticos burocratas tivéssemos tido a fortuna
ser govemados por homens de visão, estadistas, e não gente de vista curta e torta. Mas
nós podemos mudaral história. Meu avô mne dizia que tudo é começar! Então comecemos
nós talianos, que fomos sempre vanguardistas. Depois de nós, uma vez aberta a estrada,
viro os outros. Tenho certeza!

92

Você também pode gostar

pFad - Phonifier reborn

Pfad - The Proxy pFad of © 2024 Garber Painting. All rights reserved.

Note: This service is not intended for secure transactions such as banking, social media, email, or purchasing. Use at your own risk. We assume no liability whatsoever for broken pages.


Alternative Proxies:

Alternative Proxy

pFad Proxy

pFad v3 Proxy

pFad v4 Proxy