Vinicius Gomes de Vasconcellos PDF
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1. Introduo
*
Doutorando em Direito pela Universidade de So Paulo (USP). Mestre em Cincias Criminais na Pontifcia
Universidade Catlica do Rio Grande do Sul (PUCRS) (2014), bolsista integral CAPES. Ps-graduado em
Justia Penal pela Universidade Castilla-La Mancha (UCLM - Espanha) (2013). Bacharel em Direito pela
PUCRS (2012), com pesquisas como bolsista de iniciao cientfica CNPq/PIBIC (2009/2012). Professor das
Faculdades Integradas Campos Salles (SP).
1 Sobre isso, ver: LANGER, 2005, pp. 103-104.
2 Entretanto, o contedo perceptivo da disposio citada, do modo como vem formulada, resulta
inevitavelmente impreciso, devido utilizao de uma definio (sistema acusatrio) que no possui um
significado unvoco e universalmente aceitado. O verdadeiro problema, de fato, reside em individualizar os
caracteres distintivos que identificam o modelo processual acusatrio, caracteres sobre os quais nem sempre
existe unanimidade entre os juristas, dependendo de quais sejam suas opes ideolgicas em relao
hierarquia de valores implicada na justia penal. (ILLUMINATI, 2008, p. 136, traduo livre).
3 (...) no vamos superar a dualidade sem demarca-la. Sem os modelos de referncia, corremos o risco de
no compreender adequadamente a nova inquisitoriedade. (MARINHO MARQUES, 2013, p. 16).
4 O sistema jurdico vigente no Brasil - tendo presente a natureza dialgica do processo penal acusatrio,
hoje impregnado, em sua estrutura formal, de carter essencialmente democrtico impe, ao Ministrio
Pblico, notadamente no denominado reato societario, a obrigao de expor, na denncia, de maneira
precisa, objetiva e individualizada, a participao de cada acusado na suposta prtica delituosa.
5 A mera invocao da condio de scio ou de administrador de sociedade empresria, sem a
correspondente e objetiva descrio de determinado comportamento tpico que o vincule, concretamente,
prtica criminosa, no constitui fator suficiente apto a legitimar a formulao de acusao estatal ou a
autorizar a prolao de decreto judicial condenatrio.
6 Para o acusado exercer, em plenitude, a garantia do contraditrio, torna-se indispensvel que o rgo da
acusao descreva, de modo preciso, os elementos estruturais (essentialia delicti) que compem o tipo penal,
sob pena de se devolver, ilegitimamente, ao ru, o nus (que sobre ele no incide) de provar que inocente.
7 Cumpre apontar, respeitosamente, que, conforme afirmado em diversos trabalhos, pensa-se que a
expresso adequada trancamento do processo, posto que o direito de ao se implementa no momento
do oferecimento da denncia, sem a possibilidade de um trancamento posterior. Sobre isso, ver: LOPES
JR., 2012, pp. 357-360.
8 Dito isso, consigno que, no modelo acusatrio definido pelo inciso I do art. 129 da Constituio Federal
(So funes institucionais do Ministrio Pblico: I - promover, privativamente, a ao penal pblica, na forma da
lei), a imputao do fato-crime, como regra, compete ao Ministrio Pblico.
9 Como curial, o fato de ser o Ministrio Pblico o titular da persecuo penal no impede o controle
jurisdicional da instaurao de procedimento formal de investigao por atipicidade do fato objeto do
inqurito. So inmeros os casos em que o Supremo Tribunal Federal no apenas reconhece a possibilidade
de trancamento de inqurito por atipicidade do fato, mas tambm o determina, at mesmo, de ofcio (v.g.,
HC n. 83.166/MG, Segunda Turma, da relatoria do Ministro Nelson Jobim, DJ 12/3/04; HC n. 71.466/
DF, Primeira Turma, da relatoria do Ministro Celso de Mello, DJ de 19/12/94; HC n. 83.233/RJ, Segunda
Turma, da relatoria do Ministro Nelson Jobim, DJ de 19/3/04; RE n. 467.923/DF, Primeira Turma, da
relatoria do Ministro Cezar Peluso, DJ de 4/8/06; e RE n. 459.024/PR, deciso monocrtica, Relator o
Ministro Seplveda Pertence, DJ de 15/2/07).
10 O sistema processual penal acusatrio, mormente na fase pr-processual, reclama deva ser o juiz
apenas um magistrado de garantias, merc da inrcia que se exige do Judicirio enquanto ainda no
formada a opinio delicti do Ministrio Pblico.
11 O trancamento do inqurito policial deve ser reservado apenas para situaes excepcionalssimas, nas
quais no seja possvel, sequer em tese, vislumbrar a ocorrncia de delito a partir dos fatos investigados.
Precedentes (RHC n. 96.713, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em
07/12/2010; HC n. 103.725, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Segunda Turma, julgado em 14/12/2010;
HC n. 106.314, Relator(a): Min. CRMEN LCIA, Primeira Turma, julgado em 21/06/2011; RHC n.
100.961, Relator(a): Min. CRMEN LCIA, Primeira Turma, julgado em 06/04/2010).
12 O conceito de sistema acusatrio equvoco na doutrina brasileira. Sabe-se que sistema, na clssica
definio de Canaris, um estado de coisas intrnseco racionalmente apreensvel que tem por fundamento
um princpio ou pequeno conjunto de princpios que impede(m) a disperso de seus elementos numa
multiplicidade de valores singulares desconexos (CANARIS, Claus-Wilhelm. Pensamento sistemtico e
conceito de sistema na Cincia do Direito. Trad. A. Menezes Cordeiro. 3a ed. Lisboa: Calouste Gulbenkian,
2002. passim). O princpio fundante do sistema ora analisado, a toda evidncia, o princpio acusatrio,
norma decorrente do due process of law (art. 5o, LIV, CRFB) e prevista de forma marcante no art. 129, I,
da CRFB, o qual exige que o processo penal seja marcado pela clara diviso entre as funes de acusar,
defender e julgar, considerando-se o ru como sujeito, e no como objeto da persecuo penal.
13 A separao entre as funes de acusar defender e julgar o signo essencial do sistema acusatrio
de processo penal (Art. 129, I, CRFB), tornando a atuao do Judicirio na fase pr-processual somente
admissvel com o propsito de proteger as garantias fundamentais dos investigados (FERRAJOLI, Luigi.
Derecho y Razn Teora del Garantismo Penal. 3a ed., Madrid: Trotta, 1998. p. 567).
14 Fica claro, diante dessas premissas, que o magistrado s deve atuar na fase pr-processual assumindo
a funo de juiz de garantias, de modo a proteger os direitos fundamentais dos investigados, sob pena
de assumir a feio de acusador. Na etapa administrativa da persecuo penal, o indivduo pode se ver
manietado em sua locomoo ou sofrer restrio em seu patrimnio, motivo pelo qual no se pode afastar a
atividade jurisdicional, que se encarregar de analisar a juridicidade das cautelares pessoais e reais.
15 A possibilidade de o magistrado ouvir outras testemunhas, consoante artigo 209, caput, do Cdigo de
Processo Penal (O juiz, quando julgar necessrio, poder ouvir outras testemunhas, alm das indicadas pelas
partes) , segundo lio de NUCCI, decorrncia do princpio da verdade real, vigente no processo penal,
alm de ser, ainda, consequncia do princpio do impulso oficial (Cdigo de Processo Penal Comentado.
10a edio. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 495). O sentido conferido locuo, verdade
material, neste contexto, no no sentido de pretender a busca de uma verdade absoluta ou ontolgica,
e sim com vistas a explicitar a limitao de disponibilidade probatria das partes no processo penal, em
face da indisponibilidade da res judicanda, a exigir, assim, uma verdade no integralmente dependente da
influncia que, atravs de seu comportamento processual, as partes queiram sobre ela exercer (DIAS, Jorge
de Figueiredo. Direito processual penal. Coimbra: Coimbra, 1974. p. 193-195).
16 Decorre do princpio da ampla defesa a necessidade de um justo equilbrio entre as partes envolvidas em
processo judicial ou administrativo. Esse equilbrio (ou princpio da paridade das armas) est devidamente
em harmonia com o sistema processual penal acusatrio institudo pela Constituio Federal de 1988.
17 A isonomia entre as partes deve ser vista tanto pelo aspecto formal, como pelo material, j que no
basta a mera aplicao das regras inseridas na legislao processual penal sem sua ponderao com o
caso concreto. Deve o magistrado conduzir o julgamento de modo que as partes, sempre, disponham de
idnticas armas para acusar e/ou defender.
18 No obstante a legislao processual penal seja silente a respeito, a doutrina penal define o indiciamento
como sendo o ato de formalizao da convico, por parte da autoridade policial, que os elementos
indicirios at ento colhidos na investigao indiquem ser uma pessoa autora do crime.
19 Ressalte-se, ainda, que a deciso de recebimento da denncia faz com que o ento suspeito deixe de
ser objeto das investigaes e passe a figurar como ru na ao penal, o que demonstra a incompatibilidade
entre o ato de recebimento da denncia, que j pressupe a existncia de indcios mnimos de autoria, e a
posterior determinao de indiciamento, ato que atribui a algum no curso do inqurito a suposta autoria
delitiva e que visa a subsidiar o oferecimento da pea acusatria.
20 Ao impor autoridade responsvel pelas investigaes quem ela deve considerar como autor do
crime, o rgo Judicirio se sobrepe, em tese, as suas concluses, sendo essa, a toda evidncia, atribuio
estranha atividade jurisdicional e que no se coaduna com o sistema acusatrio imposto pela Constituio
de 1988.
21 A Constituio de 1988 fez uma opo inequvoca pelo sistema penal acusatrio. Disso decorre uma
separao rgida entre, de um lado, as tarefas de investigar e acusar e, de outro, a funo propriamente
jurisdicional. Alm de preservar a imparcialidade do Judicirio, essa separao promove a paridade de
armas entre acusao e defesa, em harmonia com os princpios da isonomia e do devido processo legal.
22 Conforme o voto do relator: Houve flagrante violao do princpio acusatrio, pelo qual o Ministrio
Pblico o autor da ao penal e detentor da opinio delicti. Ao determinar o aditamento da denncia o Juzo
adentrou na esfera prpria e exclusiva da acusao. dever do Ministrio Pblico, diante da concluso de
investigao criminal, emitir a opinio delicti, seja oferecendo denncia, determinando a continuidade das
diligncias ou manifestando-se sobre o arquivamento formal ou material dos autos.
23 O fenmeno dos sistemas processuais, de bom alvitre frisar, no pode se resumir a uma compilao de
textos histricos, investigados no presente, tentando-se atribuir um fio de sentido a perpassa-los. De forma
amide os juristas procuram enfrentar uma evoluo histrica, oferecendo uma pretensa continuidade
justamente onde esta no pode ser encontrada. (GLOECKNER, 2013, p. 133).
24 Importante esclarecer que os termos inquisitivo, inquisitrio e inquisitorial sero utilizados
indistintamente durante este trabalho. Embora parte da doutrina realize distino entre inquisitrio (ao
acusatrio e ao misto) e inquisitorial (em oposio ao adversarial), discorda-se da suposta dicotomizao da
classificao dos sistemas processuais. Ilustrativamente, j que no sustentada neste trabalho, ver para uma
tentativa de distino entre tais denominaes: ZILLI, 2003, p. 36, nota 07.
46 MARINHO MARQUES, 2009, p. 148; RANGEL, 2008, p. 51; BADAR, 2013, p. 30.
47 BADAR, 2003, pp. 102-109; GRINOVER, 2000, p. 78.
48 GRINOVER, 2000, p. 78.
49 BADAR, 2008, pp. 38-39; GRINOVER, 2000, pp. 78-81.
50 DIAS, 2011, p, 14; DIAS, 2004, p. 71. De modo semelhante, se referindo ao processo penal brasileiro
como acusatrio com laivos de inquisitivo: TOURINHO FILHO, 2012, p. 118.
51 Tudo quanto fica apontado servir para convencer que a estrutura fundamental do processo penal
portugus , tipicamente e em princpio, a de um processo sem partes. Do nosso ponto de vista porm, e
como j atrs pusemos suficientemente em relevo, grave erro cometeria quem se servisse dessa concluso
para aparentar o nosso processo penal com as notas constitutivas de um modelo inquisitrio, ou mesmo
com as de um modelo misto que comungasse de notas acusatrias e inquisitrias. O nosso processo penal
basicamente acusatrio e simplesmente integrado por um princpio de investigao; tanto a conformao
dinmica que possui como a dialctica prpria que nele vive o afastam por completo de uma estrutura
processual total ou parcialmente inquisitria. (DIAS, 2004, p. 254).
princpio unificador ser inquisitivo (gesto das provas nas mos do juiz) ou acusatrio (gesto das provas
nas mos das partes). (CASARA; MELCHIOR, 2013, p. 69). Tambm nesse sentido: LOPES JR., 2012, pp.
134-136; COUTINHO, 2001a, pp. 28-29. Sobre as perspectivas esttica e dinmica, ver: PRADO, 2006,
pp. 102-153.
60 A ausncia de um princpio unificador que seja capaz de reger os componentes do sistema permite
concluir que o chamado sistema misto uma falcia do ponto de vista de uma teoria dos sistemas.
(CASARA; MELCHIOR, 2013, p. 84). Assim, tambm: GLOECKNER, 2013, p. 142; THUMS, 2006, p. 213.
61 O dito sistema misto, reformado ou napolenico a conjuno dos outros dois, mas no tem um
princpio unificador prprio, sendo certo que ou essencialmente inquisitrio (como o nosso), com algo
(caractersticas secundrias) proveniente do sistema acusatrio, ou essencialmente acusatrio, com alguns
elementos caractersticos (novamente secundrios) recolhidos do sistema inquisitrio. (COUTINHO,
2001b, pp. 17-18). Nesse sentido, ver: GLOECKNER, 2013, pp. 176-177.
62 FERRAJOLI, 2014, p. 521.
63 ILLUMINATI, 2008, p. 145.
64 FERRAJOLI, 2014, pp. 521-522. Nesse sentido, tambm: BOVINO, 1998, p. 06.
65 (...) havendo separao de funes, sendo a acusao conferida a uma pessoa distinta do julgador,
que ter a misso exclusiva de julgar, sendo-lhe vedado exercer conjuntamente a acusao, ter ou no
este juiz poderes instrutrios algo que no diz respeito com a essncia do sistema. (BADAR, 2003,
pp. 112-113). Assim tambm em: BADAR, 2008, pp. 38-39. Conforme Marcos Zilli: (...) no haveria
qualquer incompatibilidade no estabelecimento de poderes instrutrios ao juiz em uma forma processual
penal que se adequasse ao padro acusatrio, desde que as atividades de acusar e julgar permanecessem em
mos distintas. Em suma: o enfrentamento da questo no passaria pela anlise detida das caractersticas
inerentes ao sistema acusatrio. (ZILLI, 2003, p. 26).
66 GRINOVER, 2000, pp. 79-80.
67 (...) independentemente de provocao das partes, movido pela necessidade de descobrir a verdade, o
juiz pode determinar, no curso da instruo, ou antes de proferir a sentena, portanto, durante o andamento
da ao penal, a realizao de diligncias para dirimir dvida sobre ponto relevante. (BARROS, 2013, p.
164).
68 GRINOVER, 2000, p. 81; BADAR, 2003, p. 119; ARMENTA DEU, 2012, p. 50; ZILLI, 2003, pp.
143-145.
69 Partindo da distino entre fontes de provas e meios de prova, percebe-se, facilmente, que perigo
para a imparcialidade est no juiz que um pesquisador, um buscador de fontes de provas. J o juiz
que, diante da notcia de uma fonte de prova, como a informao de que uma certa pessoa presenciou os
fatos, determina a produo do meio de prova necessrio o testemunho para incorporar ao processo as
informaes contidas na fonte de prova, no est comprometido com uma hiptese prvia, no colocando
em risco a sua posio de imparcialidade. (BADAR, 2003, pp. 119-120). Sustentando a legitimao do
poder instrutrio do julgador em uma suposta limitao pelas regras do devido processo penal: ZILLI,
2003, pp. 133-134.
70 Pela anlise que se propem os defensores de um sistema acusatrio (ou inquisitrio) reformado, no
difcil perceber que as degeneraes permitidas pela amplitude de tais poderes instrutrios tm o mesmo
efeito de sedante psquico da posio assumida pelo inquisidor nos sistemas inquisitivos maximizados.
(GLOECKNER, 2013, p. 182).
71 THUMS, 2006, p. 252.
72 As faculdades inquisitivas reconhecidas aos juzes costumam ser justificadas apelando existncia
de interesse pblico na persecuo dos fatos punveis e sua consequncia natural, o princpio da
legalidade processual . Entretanto, o carter pblico desse interesse no exclui, nem pode excluir, o carter
interessado da persecuo penal. O interesse persecutrio, por outro lado, se ope ao interesse do imputado
em resistir a persecuo, ou seja, em defender-se da imputao formulada contra ele. (BOVINO, 2005, p.
47, traduo livre).
73 No sistema inquisitrio, nasce a (inalcanvel e mitolgica) verdade real, em que o imputado nada
mais do que um mero objeto de investigao detentor da verdade de um crime, e, portanto, submetido
a um inquisidor que est autorizado a extra-la a qualquer custo. Recordemos que a intolerncia vai fundar
a inquisio. A verdade absoluta sempre intolerante, sob pena de perder seu carter absoluto. (LOPES
JR., 2012, p. 136). Sobre isso, ver: KHALED JR., 2013; MOREIRA, 2005, pp. 66-67.
exemplo, pois quem tem o contato com o caso e com suas possveis teses
so as partes, que devem ficar encarregadas da produo de provas89.
Ademais, outro argumento em favor da possibilidade de iniciativa pro-
batria pelo julgador relaciona-se com o princpio da obrigatoriedade da
ao penal pblica, apontado majoritariamente pela doutrina brasileira
como reitor do sistema ptrio90. Conforme descrito por Geraldo Prado, h
quem sustente que, para assegurar a efetividade do referido preceito o
qual, em breves termos, impe dever ao acusador pblico de propor a de-
nncia sempre que tiver informaes suficientes do cometimento de um
crime deve-se possibilitar a atitude ativa do juiz, para suprir eventual de-
ficincia na instruo do processo, j que no h como obrigar o represen-
tante do Ministrio Pblico a produzir as provas necessrias91. Contudo,
pensa-se que tal pretensa relao no se justifica, visto que, alm dos pos-
sveis questionamentos ao princpio da obrigatoriedade da ao92, a estru-
turao democrtica da instituio do Ministrio Pblico, cujos represen-
tantes devem pautar suas posturas em respeito legalidade e ao interesse
pblico, afasta qualquer ilusria pretenso de que eventual falha possa ser
suprida pelo magistrado, j que tal controle deveria ser interno no mbito
do prprio rgo ministerial93. Alm disso, os riscos imparcialidade do
julgador trazidos pela autorizao de sua atuao probatria no processo
no justificam a ilusria busca pela concretizao da obrigatoriedade94.
89 Conforme pesquisa emprica desenvolvida acerca da eficcia dos sistemas inquisitivo e acusatrio para
a produo do lastro probatrio que possibilite uma deciso adequada, concluiu-se que, em um cenrio
onde ambas partes tm acesso informao (descrio que parece ser caracterizada com o inqurito policial
brasileiro documentado), o processo de partes se mostrou apto (e at melhor que o inquisitorial) para o
fornecimento de provas ao julgador (BLOCK; PARKER; VYBORNA; DUSEK, 2000, pp. 172-189).
90 JARDIM, 1998, pp. 92-99.
91 O sistema do Cdigo de Processo Penal pretende fechar as possibilidades de manipulao da
obrigatoriedade da ao penal pblica ao interditar ao Ministrio Pblico a faculdade de desistir da
ao penal proposta. O fechamento, porm, no seria eficaz se tambm no se pudesse contemplar a
obrigatoriedade da produo da prova. Com efeito, em um regime jurdico de obrigatoriedade da ao
penal pblica, por considerao de uma razo de estado, como ser visto, o sistema do Cdigo necessitou
atribuir poderes de instruo ao juiz para compensar eventuais dficits na atuao probatria do Ministrio
Pblico. (PRADO, 2014, p. 22).
92 Em crtica ao princpio da obrigatoriedade, ver por exemplo: BINDER, 2005, pp. 205-217.
93 Sobre a consolidao da instituio do Ministrio Pblico no processo penal democrtico, ver: JARDIM;
AMORIM, 2013, p. 48; CARVALHO, 2009, p. 173.
94 Diversos so os autores que apontam o carter ilusrio da crena no princpio da obrigatoriedade diante da
complexidade das cifras ocultas e dos mecanismos de seleo na justia criminal. Ver, exemplificativamente:
BOVINO, 2005, pp. 19-20.
4. Consideraes Finais
95 Nesse sentido: Em suma, o ncleo ou essncia do modelo acusatrio a separao das funes de
acusar, defender e julgar em sujeitos distintos, com partes em igualdade de condies e um juiz imparcial
para julgar. (BADAR, 2003, p. 112).
96 Sobre isso, ver: VASCONCELLOS, 2014, pp. 91-165.
97 Frisa-se que a imparcialidade essencial para que a tese defensiva seja considerada, pois em uma
situao de aderncia anterior do julgador acusao no h qualquer possibilidade de defesa efetiva.
Conforme Antonio Melchior, a imparcialidade condio epistemolgica estratgica tomada de decises
num processo penal democrtico (MELCHIOR, 2013, p. 165). Sobre imparcialidade do julgador e seus
contornos contemporneos ver: MAYA, 2011; GIACOMOLLI, 2014, pp. 231-256.
Referncias Bibliogrficas